centro de investigaÇÕes regionais e urbanas. os modelos... · 2004-11-16 · os elementos...
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UNIVERSIDADE TÉCNICA DE LISBOA
INSTITUTO SUPERIOR DE ECONOMIA E GESTÃO
CENTRO DE INVESTIGAÇÕES REGIONAIS E URBANAS
E C O N O M I A
R E G I O N A L E U R B A N A
Coordenação: Manuel Brandão Alves
4º ANO DO CURSO DE ECONOMIA
2001/2002
3. OS MODELOS DE DESENVOLVIMENTO
E A
POLÍTICA ECONÓMICA ESPACIAL
António Mendes Baptista
CIRIUSCentro de Investigações Regionais e Urbanas
SÉRIE DIDÁTICA
Documento de Trabalho nº 3 / 2001
1
3. OS MODELOS DE DESENVOLVIMENTO E
E A POLÍTICA ECONÓMICA ESPACIAL 1
António Mendes BaptistaAssistente Convidado do ISEG
Outubro de 1999
1 Este texto é da exclusiva responsabilidade do autor, com excepção do ponto
3.5. que foi redigido pelo Prof. Natalino Martins. Ele é, no entanto, o resultado decontribuições dos docentes que ao longo de vários anos participam, ou participaramna leccionação da disciplina de Economia Regional e Urbana no ISEG,nomeadamente, o Prof. António Natalino Martins, a Prof.ª Luísa Vaz Pinto, o Dr.Paulo Madruga e a Dr.ª Sara Vilas. A sua vocação é de índole essencialmentepedagógica.
2
3
ÍNDICE
ÍNDICE 3
3. OS MODELOS DE DESENVOLVIMENTO E A
POLÍTICA ECONÓMICA ESPACIAL 5
3.1. OS FUNDAMENTOS DA ORGANIZAÇÃO DO
ESPAÇO: ORGANIZAÇÃO PELA OFERTA E
ORGANIZAÇÃO PELA PROCURA 7
3.1.1. As questões que necessitam de resposta 7
3.1.2. Os elementos fundamentais de uma teoria do
desenvolvimento regional 9
3.1.3. O papel da oferta e o papel da procura 12
3.2. A ORGANIZAÇÃO PELA OFERTA NO CONTEXTO
DA ANÁLISE NEOCLÁSSICA 14
3.2.1. As hipóteses e o modelo 15
3.2.2. As conclusões do modelo e algumas das suas
incoerências 21
3.2.3. A mobilidade da mão de obra 27
3.2.4. A mobilidade do capital 33
3.2.5. A difusão espacial da inovação 36
3.2.6. Mobilidade dos factores: questões para a política
regional 40
3.3. A ORGANIZAÇÃO PELA PROCURA NO
CONTEXTO DA ANÁLISE KEYNESIANA 41
3.3.1. As hipóteses e o modelo 42
4
3.3.2. O modelo da base económica de exportação 43
3.3.3. O modelo da causalidade cumulativa 50
3.3.4. Os ciclos de crescimento no espaço 54
3.4. OUTRAS ABORDAGENS 59
3.4.1. As limitações dos modelos anteriores 59
3.4.2. Os pólos de crescimento 62
3.4.3. Os eixos de desenvolvimento 67
3.4.4. Os distritos industriais e o desenvolvimento
territorial 73
3.5. PRINCÍPIOS DE POLÍTICA COMUNITÁRIA PARA O
ESPAÇO 78
3.5.1. As origens e evolução da política regional europeia 80
3.5.2. A estrutura actual das Acções Estruturais e da
política regional 88
3.5.3. Os princípios de funcionamento dos Fundos
Estruturais 92
3.5.4. A natureza e a programação das intervenções dos
Fundos Estruturais 99
3.5.5. A gestão das intervenções dos Fundos Estruturais 103
3.5.6. O Fundo de Coesão 106
3.5.7. Breve análise dos QCA a Portugal e seus impactos
macro-económicos 108
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 118
5
3. OS MODELOS DE DESENVOLVIMENTO E A
POLÍTICA ECONÓMICA ESPACIAL
A necessidade da existência da política económica é reconhecida
por todos os grandes paradigmas da teoria económica; tanto pelos que
a justificam com vista a superar falhas de mercado, como pelos que,
dadas as suas características estruturais de funcionamento, a
consideram imanente ao funcionamento das economias.
A consideração do espaço, como dimensão relevante da
compreensão do funcionamento das economias, apenas reforça aquela
necessidade. Neste capítulo, procuraremos encontrar suportes vários
que permitam fundamentar a política económica no espaço. As duas
referências teóricas, até há pouco dominantes, justificam as medidas de
política económica:
- Por insuficiências da oferta (modelos neo-clássicos) dando
relevo à discussão do seu pressuposto - base da mobilidade dos
factores, apoiando essa discussão nos resultados de estudos
empíricos sobre os movimentos interregionais dos factores de
produção (secção 3.2.)
- Por insuficiências da procura (modelos keynesiansos), incluindo
extensões que integram nestes modelos a mobilidade de
factores; a teoria da base económica de exportação, um modelo
de causalidade cumulativa e uma abordagem em termos de
“ciclos espaciais” darão uma visão de um processo de
desenvolvimento regional, essencialmente, desequilibrado
(secção 3.3.)
A formulação das políticasexige um suporte teórico
Os modelos dominantes
6
O reconhecimento que nem uma nem outra das duas grandes
inspirações teóricas são susceptíveis de permitir uma abordagem
realista do comportamento actual da maioria dos fenómenos
económicos no espaço, tem levado ao aparecimento de outras
formulações que, embora não constituindo, ainda, um corpo teórico
suficientemente seguro, permitem uma compreensão mais sustentável
das economias espaciais. Trata-se de abordagens que, embora podendo
ter uma inspiração dominante por via da dinamização da oferta, ou de
dinamização da procura, tentam ter em conta os dois pontos de vista.
A análise dos pólos de desenvolvimento, dos distritos industriais, dos
meios inovadores e, mais genericamente, do desenvolvimento
territorial, são bons exemplos dessas novas tentativas. Serão objecto de
tratamento na secção 3.4.
Não se faz o aprofundamento dos debates mais recentes sobre o
desenvolvimento das regiões, na medida de que o que se pretende é dar
conta do estado da arte no que respeita à teoria do desenvolvimento
regional. Embora com breves referências, procurar-se-á, sempre,
extrair as consequências de cada modelo para a fundamentação das
políticas regionais.
Na secção 3.5. serão explicitados os fundamentos da política
económica para o espaço da União Europeia, os seus instrumentos de
intervenção e, finalmente, serão estudados os seus principais impactos
na evolução da política regional em Portugal.
Novas abordagens
7
3.1. OS FUNDAMENTOS DA ORGANIZAÇÃO DO
ESPAÇO: ORGANIZAÇÃO PELA OFERTA E
ORGANIZAÇÃO PELA PROCURA
A formulação de medidas de política económica pressupõe que,
previamente, se possa realizar o diagnóstico dos problemas que devem
merecer a atenção dos analistas e ser objecto daquelas medidas.
Nesta secção procura-se, em primeiro lugar, identificar quais são
as principais questões do funcionamento espacial das economias a que
a política económica deve dar resposta; depois, e tendo em conta essas
questões, serão explicitados os elementos que devem caracterizar uma
teoria do desenvolvimento regional, com vista a que ela possa suportar
a política. Num último ponto, procura-se avaliar em que medida é que
a dinamização da oferta e a dinamização da procura podem constituir
pontos de partida para a formulação das medidas de política
económica.
3.1.1. As questões que necessitam de resposta
As teorias do desenvolvimento espacial centram a sua atenção na
compreensão dos processos de organização espacial das actividades
económicas. Uma teoria aceitável do desenvolvimento espacial deveria
poder dar resposta às seguintes cinco questões fundamentais:
1ª- Porque crescem as regiões a ritmos diferentes?
2ª- Se o crescimento não é espacialmente uniforme, quais os
factores que explicam o seu surgimento em determinadas
localizações e quais os mecanismos da sua difusão espacial?
A teoria e a política
As questões relevantes
8
3ª- Existem no sistema económico mecanismos auto-correctores
que permitam inverter os desequilíbrios económicos
regionais?
4ª- Quais os problemas que são gerados pelos desequilíbrios
económicos regionais?
5ª- Quais as variáveis sobre que se pode (deve) actuar para
corrigir o padrão regional de desenvolvimento económico?
Estas questões têm tido um tratamento desigual pela teoria e,
frequentemente, a atenção polariza-se nos processos de surgimento e
reprodução dos desequilíbrios regionais. Assim, Armstrong e Taylor
(1978) dão relevância apenas à primeira, à terceira e à quarta questões,
como ponto de partida da excelente discussão que fazem sobre o
surgimento, persistência e custos dos desequilíbrios regionais. No
entanto, quando nos colocamos numa perspectiva em que não está
apenas em causa a explicação da realidade, mas também a sua
transformação, mais do que as questões anteriores, será a quinta
questão que irá permitir avaliar a utilidade de uma dada teoria.
A quarta questão tem alimentado múltiplos debates ligados à
necessidade da adopção de políticas territoriais e assume, deste modo,
uma importância particular. Por um lado, remete-nos para a discussão
antiga sobre o impacte das políticas regionais no comportamento
eficiente da economia. A visão tradicional de que as políticas regionais
privilegiavam a equidade territorial, em vez da eficiência, vem sendo
progressivamente substituída por uma maior consciência de que o
território integra factores específicos de desenvolvimento, passando a
questão a ser a de preparar o território para a competitividade global
da economia. Nesta perspectiva, a gestão do espaço desliga-se da
preocupação dos desequilíbrios regionais e passa a ser um instrumento
A importância que lhes temsido dada
Os desequilíbrios regionais ea gestão do território
9
da política de desenvolvimento nacional, uma vez que a eficiência da
economia exige sempre uma gestão do território.
Por outro, liga-se à discussão actual sobre a mudança no
conteúdo da noção de desequilíbrios regionais, face à convicção
crescente de que a divergência espacial é inerente ao funcionamento do
sistema económico, começando a surgir referências à noção de
desequilíbrios suportáveis. Como veremos, as abordagens económicas
do desenvolvimento regional privilegiam medidas como o PIB por
habitante ou o crescimento do produto, avançando muito pouco para a
compreensão das implicações dos desequilíbrios regionais nas
dimensões não - económicas do desenvolvimento.
Infelizmente, porque a análise das implicações económicas dos
desequilíbrios regionais exigiria modelos globais e inter-regionais
complexos que apenas pontualmente foram desenvolvidos em situações
particulares (p.e., o modelo REGINA, em França e a tentativa do
modelo MORENA, em Portugal), a terceira questão é claramente
aquela a que as diferentes abordagens teóricas permitem dar uma
resposta mais insuficiente.
3.1.2. Os elementos fundamentais de uma teoria do
desenvolvimento regional
Modelo e Teoria são dois termos que são usados,
frequentemente, de forma indiferenciada. Segundo Jones (1975), pode
dizer-se que uma tal distinção não é necessária nem desejável, embora
se possa argumentar que o termo teoria deva ser reservado para
afirmações não ambíguas e irrefutáveis sobre as interrelações
complexas da economia real, e que o termo modelo deva ser reservado
A relação entre Teoria eModelo
10
para designar uma construção abstracta, lógica (e usualmente
matemática), que elabora uma teoria inicial (ou na base de um
conjunto de postulados iniciais) de forma a gerar uma afirmação
teórica.
Jones cita Koopmans (1957) para quem o melhor caminho seria
olhar a teoria económica como uma sequência de modelos
conceptuais que procuram expressar de forma simplificada diferentes
aspectos de uma sempre mais complicada realidade. Nesta linha de
raciocínio, acrescenta que os modelos de crescimento, embora
individualmente possam representar uma teoria particular, podem ser
considerados como blocos de construção de uma genuína teoria do
crescimento económico.
Neste entendimento, a teoria do desenvolvimento regional,
apesar das insuficiências que podem ser apontadas aos diversos
modelos e das contradições entre os mesmos, começa a ser um campo
onde dispomos de vários blocos que nos permitem uma razoável
compreensão dos processos de desenvolvimento espacial. O esforço de
integração desses blocos, continua, no entanto, a ser uma área
subdesenvolvida
Tendo em conta os diversos factores que podem influenciar o
desenvolvimento económico, uma teoria aceitável do desenvolvimento
regional deveria, no mínimo, conter elementos que permitissem
compreender 2:
1. O impacte das constantes locacionais (p.e. recursos naturais
imóveis, a estrutura de povoamento ou a existência de uma
grande cidade, a heterogeneidade do solo, etc.) que, para
A abordagem por blocos
Características de umateoria aceitável
11
Richardson (1973) constituem pontos de referência que
moldam e, talvez mesmo predeterminem, a estrutura espacial
da economia;
2. O surgimento e o papel das economias de aglomeração (bem
como o das economias de escala e das indivisibilidades), que
Richardson distingue em economias de aglomeração sociais
(afectando todos os grupos da sociedade), economias de
aglomeração das famílias e economias de aglomeração das
empresas;
3. Os determinantes da inovação e o processo da sua difusão
espacial, incluindo o processo de exposição à inovação e a
capacidade regional de a absorver;
4. Uma função de mobilidade dos factores que tenha
adequadamente em conta as preferências locacionais
(factores não - económicos), a fricção da distância (física,
económica, cultural, tecnológica,...), e a inércia das
localizações;
5. Os determinantes do investimento regional (produtivo e em
infraestruturas e equipamentos), com o adequado
reconhecimento dos factores de natureza social e políticos, e os
factores condicionantes dos recursos empresariais regionais.
A ambição seria a de construir um modelo que integrasse todos
estes blocos. Porém, dificuldades (teóricas) para construir indicadores
representativos (p.e. um índice de economias de aglomeração) e as
carências de informação estatística tornam tarefa difícil esta integração.
Uma tentativa pode encontrar-se em Richardson (1973), onde é
2 Ver, nomeadamente, Richardson, 1973, em particular os capítulos 7 e 8.
A difícil integração dosblocos
12
proposta uma versão reduzida de um modelo que procura integrar as
economias de aglomeração, as preferências locacionais, a dimensão e
distribuição espacial do stock de capital, a taxa de crescimento natural
da população, as remunerações relativas do capital e do trabalho e a
capacidade regional para absorver as inovações de origem exógena.
Sobre cada um dos blocos referidos têm vindo a ser
desenvolvidos trabalhos que possibilitam uma compreensão cada vez
mais globalizada do desenvolvimento espacial, aprofundando aspectos
particulares de algumas componentes do sistema económico territorial.
No entanto, o grau de formalização desses trabalhos é muito
díspar e nos modelos de desenvolvimento regional a seguir
apresentados serão imediatamente reconhecidas as insuficiências no
tratamento de aspectos fundamentais para a teoria do desenvolvimento
regional.
3.1.3. O papel da oferta e o papel da procura
Frequentemente, os modelos de desenvolvimento regional são
distinguidos pelas conclusões que dos mesmos se retiram quanto à
convergência dos processos de desenvolvimento espacial. Opõem-se,
assim, os modelos de desenvolvimento regional convergente aos
modelos de desenvolvimento regional desequilibrado. No entanto, em
qualquer dos modelos, como a seguir se verificará, a convergência é,
quando muito, uma possibilidade teórica. Mesmo no modelo
neoclássico, a convergência regional é uma conclusão incoerente.
Mais relevante é a tipificação dos modelos de desenvolvimento
regional segundo a forma como é equacionada a determinação do
rendimento, o que leva a distinguir os modelos que vêem o
Os critérios diferenciadoresdos modelos: convergência
vs divergência
Dinamização da oferta vsdinamização da procura
13
desenvolvimento regional determinado pelo aumento da capacidade
produtiva (oferta) dos que põem a ênfase nos determinantes da
procura.
O primeiro tipo de modelos insere-se na tradição neoclássica e na
impossibilidade (nesse quadro teórico) de um excesso generalizado de
produção. As críticas à ideia de que a oferta cria a sua própria
procura são bem conhecidas, mas a visão do desenvolvimento
determinado pelas capacidades produtivas parece particularmente
adequada a uma perspectiva de longo prazo. Com efeito, no longo
prazo o que está em causa é a capacidade regional de inovação, a
capacidade de organizar os factores de produção e a capacidade de
organizar novos mercados. Isto remete-nos directamente para a
problemática do empresariado regional que, no entanto, tem estado
normalmente (a excepção são as abordagens territorialistas) arredada
das reflexões teóricas sobre o desenvolvimento espacial.
O segundo tipo de modelos, inseridos numa lógica mais
keynesiana, tem subjacente a ideia de que a procura cria a necessária
oferta. Pressupõe uma disponibilidade de factores de produção para
responderem aos estímulos da procura, parecendo mais adequados a
uma perspectiva de curto prazo, em que exista capacidade de produção
disponível, ou a processos de crescimento por “reprodução/imitação”
de actividades já presentes na região.
No entanto, como refere Hoover (1971, pág. 221), a actividade
regional requer quer inputs quer um mercado para os outputs, e não
faz sentido argumentar que só a oferta ou só a procura são o
determinante do crescimento.
O mesmo autor chama a atenção para o facto de as duas
perspectivas implicarem diferenças substantivas na abordagem dos
Dinamização pela oferta edinamização pela procura
14
factores regionais. Se olharmos a procura como a explicação do
crescimento regional, primeiro inquirimo-nos de onde surge essa
procura e, depois, como a procura por um determinado produto se
repercute nas outras actividades regionais. Se olharmos a oferta como
a explicação para esse crescimento, a pergunta será a forma como a
disponibilidade de recursos leva ao desenvolvimento de actividades
produtoras de determinados bens ou serviços na região. As duas
abordagens são partes relevantes e necessárias de uma adequada teoria
do desenvolvimento regional.
Seria desejável que no mesmo modelo fossem explicitadas, quer
as funções de produção, quer as funções de procura, com a
consequente necessidade de equações de equilíbrio e a explicitação dos
mecanismos de equilíbrio considerados relevantes. Não tem sido esta a
abordagem usual e nos modelos determinados pela oferta as condições
de procura apenas manifestam indirectamente os seus efeitos pela
influência que poderão ter nos preços e, por essa via, nos lucros,
enquanto os modelos que põem a ênfase na procura esquecem a
interrogação sobre a origem da capacidade produtiva.
3.2. A ORGANIZAÇÃO PELA OFERTA NO CONTEXTO DA
ANÁLISE NEOCLÁSSICA
Richardson (1979, 135) considera que a teoria dominante tem
sido o modelo neoclássico com a sua ênfase no lado da oferta.
No entanto, os estudiosos da teoria regional têm gasto mais
tempo e papel a criticarem e a porem em relevo as insuficiências desta
abordagem do que na produção de novos modelos ou teorias
A valorização da perspectivada mobilidade dos factores
15
alternativas. Com efeito, algumas das hipóteses deste modelo (p.e. a
concorrência perfeita) são incompatíveis com a realidade do espaço e
as suas conclusões são incoerentes.
Só que a integração de um modelo de mobilidade do trabalho e
do capital e a possibilidade de contemplar a flexibilização de algumas
das hipóteses mais restritivas (embora, por vezes, com o risco de
destruir a lógica do modelo), continuam a fazer do modelo neoclássico
um esquema de raciocínio atraente, dotado de beleza formal, que não
pode ser ignorado. Para além disso, o modelo neoclássico aponta,
dentro do seu quadro conceptual e teórico, uma linha de acção política:
a melhoria da mobilidade dos factores, que favorece a redução das
disparidades regionais e que aumenta o seu interesse em termos de
política.
Por outro lado, algumas evoluções recentes da organização
espacial 3, com convergência das regiões em termos de PIB por
habitante e outros indicadores de níveis de desenvolvimento, a par de
maiores disparidades na distribuição regional da população, parecem
adequar-se razoavelmente às conclusões da visão neoclássica do
desenvolvimento regional.
3.2.1. As hipóteses e o modelo
Como é sabido, a versão mais simples do modelo neoclássico (a
um sector) parte de uma função de produção (produto dependente do
3 Por exemplo em Portugal, a nível de NUT 3 e na década de 80, conforme
MPAT (1993, 159 e seguintes).
16
capital e do trabalho) bem comportada, que satisfaz as seguintes
condições 4:
- Substituibilidade do trabalho e do capital;
- Rendimentos constantes em escala 5;
- Rendimentos marginais positivos e decrescentes;
- Nenhum input implica nenhum output (a função de produção
tem origem na origem das coordenadas).
Adicionalmente, pode admitir-se um factor tecnologia, neutro em
relação ao capital e ao trabalho. Pressupõe-se, naturalmente, todo o
pano de fundo das premissas neoclássicas como a concorrência perfeita
e total flexibilidade para ajustamentos marginais nos preços, nos
factores e outputs.
Pode demonstrar-se que, numa economia regional fechada 6 :
- No médio prazo, com tecnologia constante, o produto por
trabalhador (produto per capita para uma dada taxa de
actividade) pode crescer por via do aumento do coeficiente de
capital / produto (Y´-L´=v(K´-L´), onde Y´,L´,K´ são as taxas
de crescimento do produto, do trabalho e do capital e v é o
coeficiente capital / produto 7;
4 Ver Jones (1975, 25-36 e 74-75). Sugere-se que os estudantes tentem
verificar as conclusões a partir de uma função Cobb-Douglas Y=AK ß
L(1-ß)
5 ) Matematicamente, isto significa que se trata de uma função homogéneade grau 1. Para as propriedades das funções homogéneas, ver Dias Agudo (1977,30).
6 Apesar de economia regional fechada ser uma contradição com o próprioconceito de região.
7 Ver, por exemplo, Armstrong e Taylor,1978, Apêndice A
As hipóteses do modelo
As tendências de médio elongo prazo
17
- A longo prazo, o coeficiente de intensidade capitalística (K/L)
tende, com uma dada propensão à poupança, para uma
constante, significando um crescimento zero para o produto
por trabalhador;
- O montante a que irá estabilizar o produto por trabalhador
dependerá da taxa de crescimento natural da população (n) e da
propensão à poupança (s): Y/L=(n/s).(K/L);
- No longo prazo, o crescimento do produto por trabalhador
(admitindo uma taxa de actividade constante) pode crescer por
efeito do progresso técnico: Y´-L´=A´/(1-ß), onde A´ é taxa de
progresso técnico.
Daqui decorre, conforme se pode verificar pela Figura 1 que, se
não houver movimento de factores entre regiões e as funções de
produção forem idênticas, as disparidades regionais a longo prazo
seriam explicadas pelas diferenças na taxa de crescimento (natural) do
trabalho (a região com menor crescimento do trabalho atingiria
maiores PIB por habitante) e pelas diferenças na propensão à poupança
(maior propensão à poupança implicaria maior nível de
desenvolvimento).
A longo prazo, o progresso técnico será o único factor de
crescimento do produto por trabalhador: as diferenças nas taxas de
crescimento do produto por habitante, para iguais taxas de actividade,
entre duas regiões resultariam, a longo prazo, de diferentes ritmos de
progresso técnico.
18
Figura 1
(I)
k=K /L
( I I I )
( IV )(V )
( I I )
y=Y /L
y 0
y 1
y 2
k 0 k 1 k 2
(I) Y/L =f(k).; Das propriedades da função de produção tem-se:
Y=F(K,L)=L F(K/L,1) de onde resulta Y/L=F(K/L,1)=f(k)
(II) Poupança por trabalhador: S/L = sY/L = s f(k)
(III) Investimento por trabalhador necessário para manter K/L ao
nível já atingido, quando o trabalho cresce à taxa n. Extraindo I
de K1/L1= (K0 + I)/L0 (1+ n) resulta I / L0 = n K0/L0
(k0,y0) equilíbrio de longo prazo. I=S implica I / L = S / L de onde n
k = s f(k). Note-se que à esquerda de k0 as poupanças são
superiores ao investimento necessário para manter K / L e o
coeficiente capital trabalho tenderia a subir. O inverso se passaria
à direita.
(k2,y2) Equilíbrio de longo prazo com propensão à poupança
superior. A curva (IV) representa s1 f(k) > s f(k).
(k2,y2) Equilíbrio de longo prazo com menor taxa de crescimento da
mão de obra. A curva (V) representa n1 k > n k.
19
No médio prazo essas diferenças poderiam resultar quer do
progresso técnico quer de diferentes graus de intensificação do capital
(diferentes taxas de crescimento de K/L). No entanto, ao admitirem-se
desiguais ritmos de progresso técnico deixa de fazer sentido a hipótese
de iguais funções de produção nas diversas regiões.
O próprio conceito de região implica um elevado grau de
abertura, obrigando a admitir movimentos dos factores de produção
entre as diversas regiões. Teremos, assim, que o crescimento da mão-
de-obra e do capital numa dada região não resulta apenas do seu
crescimento fisiológico ou das suas poupanças, mas que estes virão
acrescidos (ou diminuídos) pelos saldos dos movimentos do trabalho e
do capital com as outras regiões. A existência destes movimentos exige
que o modelo contenha um bloco que explicite a mobilidade dos
factores.
Uma versão simplificada do modelo, considerando a região i face
às restantes, poderia ser:
Yi= A(t) . F(K, L)
Ki=S
i+Σ
j K
j i
Li=N
i+Σ
j M
j i
Kj i
=h (r i - r j)
Mj i
=m (w i-w j )
onde Kji, Mji são fluxos (positivos ou negativos) de capital e trabalho
entre a região j e a região i. Y, K, L representam o produto, o capital e
Uma versão do modelo
20
o trabalho, enquanto S são as poupanças e N, o saldo fisiológico da
região.
As duas últimas equações são os elementos críticos da
abordagem neoclássica do desenvolvimento regional. Ela pressupõe
que os fluxos de mão-de-obra e de capital se orientam pelos
diferenciais nos salários (w) e na taxa de lucro (r). Com efeito, a
hipótese de que os ajustamentos se fazem instantaneamente e sem
custos é um dos pressupostos da teoria neoclássica, devendo as
funções h(x) e m(x) respeitar essas condições de ajustamento. No
entanto, a visão neoclássica do desenvolvimento regional não é
substancialmente afectada se se admitir alguma viscosidade nestas
mobilidades.
Poderá ser interessante escrever este modelo em termos de taxas
de crescimento, o que tomaria a forma 8:
yi = ßi ki+(1-ßi) li + ti
ki = si/vi + Σj kj i
li = ni +Σj mj i
kj i = h (ri-rj)
mj i=m (wi-wj)
onde y, k, l e t são taxas de crescimento, respectivamente, do produto,
do capital, do trabalho e da tecnologia, n é a taxa de crescimento
natural da população e mji e kji correspondem às taxas de crescimento
8 Ver Richardson (1979, 139). Para a compreensão da segunda equação
note-se que S/K=(S/Y)/(K/Y)=s/β
O modelo expresso emtermos de taxas de
crescimento
21
da população e do capital da região i devidas aos saldos das migrações
(de população e de capital) da região j para a região i.
3.2.2. As conclusões do modelo e algumas das suas
incoerências
Dado o rigor lógico subjacente ao desenvolvimento do modelo,
as suas conclusões são uma consequência inevitável das hipóteses que
lhe estão subjacentes. Uma das suas hipóteses fundamentais é a da
mobilidade perfeita dos factores. Quando se realiza a projecção do
modelo no espaço a mobilidade deixa de ser apenas sectorial e passa,
também, a ser espacial.
Na formulação do modelo acima apresentada, mesmo quando a
mobilidade incorpora alguma viscosidade, admite-se que o capital e o
trabalho migram enquanto se verificarem diferenças nos salários e nas
taxas de lucro marginais, dirigindo-se para as regiões onde essas
remunerações possam ser maiores.
Com funções de produção idênticas em todas as regiões, é fácil
demonstrar que:
- Diferenças de rendimentos marginais entre duas regiões só são
possíveis se forem diferentes os coeficientes de intensidade
capitalística (K/L);
- A região com um maior coeficiente de intensidade capitalística
possui rendimentos marginais do trabalho mais elevados e
rendimentos marginais do capital mais baixos, correspondendo a
salários mais elevados e menores rendimentos para o capital.
As conclusões do modelodecorrem das hipóteses quelhe estão subjacentes
Os mecanismos redutoresdas desigualdades
22
As diferenças salariais serão sempre de sentido contrário ao das
diferenças nas taxas de lucro, implicando sentidos inversos nos fluxos
de mão-de-obra e de capital.
O esquema das relações seria o seguinte:
OL → K/L ← Ok↑ | | ↑ | + | | - | | ↓ ↓ |
w ← Y/L Y/K → r
Adaptado de Aydalot (1980, 44)
Por exemplo, se a partir de uma situação de equilíbrio, se
verificar um aumento exógeno da oferta de trabalho (O l), em virtude
de um afluxo migratório para a região, esta irá ver reduzir-se o seu
coeficiente de intensidade capitalística (K/L), o que implicaria:
- Menor produtividade do trabalho (Y/L)9, menores salários e,
consequentemente, redução da atractibilidade da mão-de-obra;
- A redução da atractibilidade da mão de obra tenderia a fazer
aumentar a produtividade do capital (Y/K), gerando maiores
lucros e atraindo capital (O k), o que teria como consequência
tender a fazer subir K/L.
Se forem desprezados os custos associados às migrações da mão
de obra, os fluxos inter-espaciais de factores continuarão a verificar-se
até ao ponto em que se igualem, os salários, as taxas de lucro, o
coeficiente de intensidade capitalística, o coeficiente capital/produto e,
23
consequentemente, o produto por trabalhador (para iguais taxas de
actividade).
Assim, nada surpreende que com as hipóteses de mobilidade dos
factores e de iguais funções de produção (mobilidade perfeita do
conhecimento e do progresso técnico), a abordagem neoclássica acabe
por concluir pela convergência regional e pela inexistência de
desequilíbrios regionais, a longo prazo. Estes, a existirem, terão um
carácter meramente transitório.
Só por mera distracção se pode pensar que este modelo é uma
reprodução, ainda que simplificada, da realidade. Trata-se apenas de
um esquema de raciocínio que pode fornecer alguns elementos para a
apreensão da complexidade dos processos espaciais.
Assim, decorre da lógica do modelo que os desequilíbrios
regionais são resultado da deficiente mobilidade dos factores ou de
imperfeita difusão dos conhecimentos. Por isso, o combate às
disparidades regionais deverá, à luz destes ensinamentos, passar,
precisamente, pela lubrificação dessa mobilidade, na medida em que a
existência de mobilidade perfeita dos factores e do progresso
tecnológico leva à convergência entre as diferentes regiões.
O problema com que somos confrontados é que não se pode
admitir que toda a imobilidade pode ser facilmente eliminada. O
simples facto da existência de distâncias a percorrer constitui um
elemento de fricção, nem sempre facilmente ultrapassável 10.
9 Para um coeficiente de capital/produto constante.10 A fricção da distância constitui, como se sabe, um dos fundamentos da
economia espacial.
A promoção da mobilidadecomo fundamento dapolítica económica regional
24
São sete os principais objectos de crítica a que o modelo está
sujeito 11:
1. O modelo é incoerente nos seus pressupostos e conclusões.
Nos pressupostos, porque o ponto de partida é a
homogeneidade do espaço e a mobilidade perfeita dos factores, o
que, se fosse verdade, levantava a questão de saber como e
porque surge o desequilíbrio inicial. Aydalot (1980, 47) afirma
que assim, a mobilidade é apenas uma aptidão, não podendo
tomar forma excepto no caso de um choque exógeno acidental.
É incoerente nas conclusões, porque a convergência só se
verificará na sequência da migração de grandes massas de
população e mão de obra. Aydalot (1980, 48) partindo de uma
função de produção de Cobb-Douglas (Y=KßL(1-ß)) com ß=0,25
conclui que uma emigração de 50% da população activa não
elevaria a produtividade mais do que 6,2%! A reposição de
níveis reduzidos de divergência poderia implicar a emigração da
quase totalidade da população, o que é um absurdo.
Note-se que a convergência relativa (em termos de
produto/trabalhador) prevista pelo modelo não significa que as
regiões não cresçam a ritmos diferentes, bastando que sejam
diferentes as taxas de crescimento da população activa. A
convergência relativa é compatível com o acréscimo das
disparidades na ocupação do espaço, processos cuja
simultaneidade parece ter-se evidenciado recentemente.
11 Para uma crítica aprofundada da abordagem neoclássica do
desenvolvimento regional ver Aydalot,1980
A incoerência dospressupostos e das
conclusões
Hipótese mais realistaspodem conduzir à destruiçãoda coerência interna domodelo
25
2- Como afirma Richardson (1979), no esquema de raciocínio neo-
clássico cabem adaptações que podem tornar mais realistas as
suas hipóteses, só que o risco é o de poderem conduzir a
conclusões opostas (divergência).
É usual referir a versão do modelo a dois sectores, que introduz
a possibilidade de substituição da mobilidade inter-regional pela
mobilidade inter-sectorial e da mobilidade dos factores pelo
surgimento do comércio (inter-regional ou internacional).
As economias de aglomeração são razões suficientes para
diferenciar as funções de produção, de que podem decorrer
movimentos de factores no mesmo sentido. O mesmo efeito
poderão ter os rendimentos crescentes em escala, também
facilmente incorporados no modelo pela modificação da função
de produção12, podendo a região que atingir maiores volumes de
produção pagar remunerações mais elevadas quer ao trabalho
quer ao capital. Nestes casos, estaríamos, evidentemente, em
presença de processos divergentes e, por isso, de modelos de
desequilíbrio.
3- O modelo tem carácter a-espacial. O espaço cria, só por si,
condições de monopólio ou oligopólio, sendo incompatível com
a hipótese de concorrência perfeita.
As regiões são convertidas a meros pontos sem dimensão. Os
custos das migrações são ignorados, desprezando o papel da
distância. Se fossem considerados o processo de ajustamento
terminaria antes de se ter verificado o equilíbrio da remuneração
dos factores.
O modelo é não dimensional
26
As constantes locacionais são desprezadas, em particular no que
respeita à forma como modificam as funções de produção e
determinam as especializações regionais.
4- Os bens de capital são não - específicos (Jones, 1975),
podendo ser combinados com o trabalho em diferentes
proporções para a mesma tarefa produtiva. Isto é contraditório
com o peso que assume o passado nas decisões relativas à
concretização dos investimentos em bens de equipamento. O
número de trabalhadores que pode ser associado a uma dada
máquina tem limites muito estreitos.
Pelas razões anteriores, a função de produção neo-clássica
poderá ser bem comportada mas o seu comportamento está
muito longe de reproduzir a realidade.
5- Não é tido em conta o papel do Estado na dotação das
regiões em capital social (infra-estruturas e equipamentos), nem
o seu impacte nas funções de produção. Estes fluxos de capital e
a redistribuição do rendimento pelas transferências públicas não
são determinados por diferenças de rentabilidade do capital. O
Estado é um elemento adicional a pôr em causa os pressupostos
da mobilidade dos factores, em particular do capital.
6- Os agentes económicos estão como que ausentes do modelo.
Trata-se de uma consequência que decorre das hipóteses, uma
vez que, no quadro das mesmas, o seu comportamento é
irrelevante. Em particular, o empresário, com as suas
preferências locacionais, não tem qualquer papel a desempenhar.
12 ) Ver, por exemplo, Richardson (1973,. 212)
A substituibilidade rejeita aexistência de limites nacombinação relativa de
factores
O Estado é um agente semfunções específicas,
nomeadamente, em termosda infra-estruturação do
território
Os restantes agentes sãopuros autómatos sem
capacidade de decisãoprópria
27
A consideração do empresário obrigaria, pelo menos, a colocar a
discussão no quadro da teoria da localização.
7- Neste modelo não existe uma função para o investimento,
dado que a completa flexibilidade dos preços e a total
substituabilidade dos factores implicam que tudo o que é
poupado é necessariamente investido13.
3.2.3. A mobilidade da mão de obra
A mobilidade neoclássica pressupõe migração de factores sem custos,
total flexibilidade no preço dos factores face às variações da oferta ou
da procura e informação perfeita sobre a remuneração dos factores em
todas as regiões.
Em relação ao factor trabalho, isso significa uma função de migrações
em que o trabalho, suposto homogéneo, migra de uma qualquer região
i para uma qualquer região j desde que se verifique um diferencial na
taxa marginal de salários.
Esta concepção da mobilidade do trabalho tem sido objecto de
vários testes empíricos, que procuram avaliar o papel das diferenças
nos níveis de remuneração e da situação nos mercados de trabalho
sobre os fluxos interregionais de população. Os seus resultados
permitem questionar, fortemente, a visão simplista da mobilidade
neoclássica e fundamentar as conclusões que abaixo se explicitam.
13 A depreciação do capital também não é considerada, mas, aqui, apenas
por simplificação, podendo ser facilmente incorporada. Ver, por exemplo,Armstrong e Taylor, 1978, Apêndice A.
Não existe função deinvestimento
O sentido da mobilidadeneo-clássica
A diferença deremunerações como factorexplicativo das migrações
28
Os diferenciais de níveis de remunerações e a situação nos
mercados de trabalho não são factores que só por si expliquem as
migrações interregionais.
Alguns estudos apresentem correlações elevadas entre as
migrações líquidas e o nível médio de salários ou os níveis de
desemprego. No entanto, esses resultados nada esclarecem sobre a
questão levantada, porque nada adiantam sobre a relação de causa -
efeito que lhe está subjacente.
Tem sido questionado se, após a correcção das diferenças de
custo de vida, a real diferenciação entre os salários regionais continua a
sustentar a relação migrações/desemprego. Em particular, Aydalot
(1980) refere as pesquisas de Todaro que quebram a relação clássica
entre desemprego e zonas de emigração de baixos salários.
Os salários elevados atrairiam os candidatos à emigração a um
ritmo superior às possibilidades de novo emprego, criando assim um
desemprego elevado que não é, só por si, suficiente para desincentivar
a continuação da imigração (Aydalot, 1980, 173).
Frequentemente, essas relações não são verificadas
empiricamente quando se consideram diferentes classes de migrantes
ou fluxos migratórios em vez dos respectivos saldos. Por exemplo,
Baptista e Moniz (1985), analisando as correlações entre as migrações
inter - distritais (migrações de i para j no período 1973-1981
relativizadas pela população de i) e algumas outras variáveis
(calculadas como relação entre o valor do indicador no distrito de
destino e no de origem), obtiveram os seguintes resultados:
- com a taxa de desemprego em 1970: -0.11;
- com os salários médios na construção civil (1976-1979): 0,16
29
- com a taxa de crescimento do emprego não agrícola (1970-
1981): - 0.10
Por outro lado, outros estudos apontam para que os migrantes
tenham, frequentemente, uma consciência pouco clara e, por isso,
sejam pouco sensíveis às diferenças interregionais nos níveis de
rendimento e na situação dos mercados de trabalho.
A decisão de migrar corresponde a uma expectativa de
promoção social e de ganhos acrescidos.
A abordagem em termos de capital humano vê a decisão de
migrar de i para j a partir do valor actual dos ganhos esperados
Ri j=Σt
T[yj t/(1+d)t- yi t/(1+d)t], onde yj t e yi t são os ganhos
esperados na região j e na região i no ano t, T o número de anos de
vida activa que restam ao migrante e d a taxa de desconto (preferência
temporal do migrante). Esta visão em termos de ganhos esperados dá
relevo aos factores estruturais e, em particular, à evolução passada da
região, na medida em que constituem a informação disponível para
formar as expectativas quanto aos ganhos futuros.
É provavelmente aqui que reside a explicação para os resultados
obtidos por Baptista e Moniz onde são factores estruturais que
explicam as migrações entre os 18 distritos do Continente no período
1973-81. Nesse trabalho, depois de se demonstrar a fraca relação das
migrações com factores conjunturais, as saídas dos diferentes distritos
são explicadas por:
Yt=3.783-0.075X1t+0.0638X2t+0.0041X3t
em que, Yt = taxa de saídas do distrito t no período 1973-1981, X1t = %
dos activos no sector secundário e terciário em 1970, X2t = % de
A decisão das migrações e agestão de expectativas
30
assalariados nos activos agrícolas em 1970 e X3t = densidade
populacional em 1970. Nesta estimativa R2 = 0,85 e os
correspondentes testes t para as três variáveis independentes tinham os
valores -5,047, 7,422, 2,553. Por sua vez, o destino das migrações é
explicado por um conjunto de equações do tipo:
Mi j=AiX1jα i.X2 j
β i.X3 jε i
onde, Mij representa as migrações do distrito i para o distrito j, X1j , o
quociente entre as percentagens de activos nos sectores secundário e
terciário em j e i em 1970, X2j o quociente entre as taxas de
crescimento dos activos não agrícolas em j e i no período 1970-1981,
X3j as distâncias entre as capitais dos distritos i e j. Ai, αi, βi, e εi são
constantes estimadas.
Para os 18 modelos assim estimados, o valor de Ai apresenta
grandes variações conforme a dimensão populacional do distrito de
origem, o seu grau de repulsão populacional e a sua posição
geográfica. Os valores de αi variam entre 0,65 e 3,24 e são mais baixos
quanto mais desenvolvido é o distrito de origem. Os valores de βi
situam-se entre 0,34 e 2,40, não têm regularidade espacial e, no geral,
revelam uma fraca contribuição desta variável para explicar o destino
das migrações, confirmando a fraca relação com factores conjunturais.
Finalmente, εi apresenta valores entre -2,97 e -0,89 e estabelece um
duplo contraste entre o litoral e o interior e entre o norte e o sul,
devendo esta influência negativa da distância ser interpretada numa
perspectiva mais ampla do que o simples custo para transpor o espaço.
As migrações são selectivas. Migram os mais jovens, os mais
qualificados e os mais instruídos.
A selectividade dasmigrações
31
Esta selectividade é consistente com a abordagem em termos
de capital humano, na medida em que são estes grupos que têm
maiores probabilidades de um Rij (conforme ponto anterior) mais
elevado. Esta selectividade, significa uma redução do potencial de
crescimento das regiões de origem e ganhos para a região de destino.
Os migrantes levam à região de destino novos factores produtivos,
nova procura e, em certa medida, novo potencial empresarial.
As migrações são cumulativas. Em Portugal, no período 1973-
81 a correlação entre as saídas de um distrito e a percentagem de
naturais residindo fora do mesmo apresentava um valor de 0,87 e a
correlação entre os destinos dos migrantes com origem num dado
distrito nos períodos nos períodos 1965-1970 e 1973-1981 situava-se
sempre acima de 0,93 (Baptista e Moniz, 1985).
O carácter cumulativo das migrações, que leva à reprodução
dos padrões do passado, só pode ser explicado em termos de acesso à
informação e em termos de minimização do risco. O acesso à
informação sobre a situação regional pode fazer-se preferencialmente
através de amigos ou familiares. Os migrantes podem minimizar os
riscos seguindo destinos já experimentados. A presença de familiares e
amigos pode significar apoios na instalação e na procura de emprego.
Todas estas influências significam que as variáveis do passado
têm uma grande importância na explicação das migrações actuais,
tendo o padrão das migrações uma grande inércia.
A distância é uma variável determinante. Ao contrário da
visão neoclássica, as migrações envolvem custos e o espaço representa
uma grande fricção aos movimentos migratórios.
O carácter cumulativo dasmigrações
A noção de distância
32
A influência da distância não deve ser ingenuamente tomada
como a influência da distância física. O que estará, provavelmente, em
causa são cinco tipos de distância:
- A distância física e os custos do movimento, cuja influência
será menos actual e mais o resultado do peso do passado nos
actuais fluxos migratórios;
- A distância psíquica, traduzindo os custos psíquicos do
afastamento da região de origem;
- A distância social, ligada às diferenças nos valores, padrões de
comportamentos, estilos de vida e, por vezes, mesmo códigos
e linguagens (língua);
- A distância tecnológica, que determinará as condições de
empregabilidade na região de destino e as dificuldades de
adaptação a novas tarefas produtivas;
- A distância ligada à incerteza, que releva o papel dos amigos
e familiares na escolha do destino das migrações.
A distância tem, assim, um conteúdo social, tecnológico e de
informação. Muitos dos aspectos referidos podem ser aproximados
pela noção usual de distância, mas outras variáveis serão necessárias,
tais como o nível de urbanização, a hierarquia urbana ou o nível de
desenvolvimento.
Por último, importa assinalar que o acréscimo de mobilidade está
a ter duas importantes consequências. Por um lado, a mudança de
residência está a ser progressivamente substituída por migrações
pendulares a maiores distâncias e de maior período. Por outro,
emergem como factores relevantes para a escolha residencial as
preferências locacionais dos indivíduos, dando relevo a factores
A mobilidade dos factores eas tendências mais recentes
33
ligados a amenidades naturais ou sociais como o clima, a paisagem, a
vida cultural e social do meio, etc.
3.2.4. A mobilidade do capital
Uma das componentes mais marcantes do processo de
globalização é a mundialização dos mercados financeiros e a grande
mobilidade do capital. As transacções em tempo real envolvendo
lugares situados em pontos extremos do Globo são possíveis porque o
que circula são bits. A moeda deixou de ter suporte material.
Esta enorme mobilidade não significa, no entanto, uma maior
aderência à realidade das hipóteses neoclássicas de mobilidade perfeita
e sem custos do capital.
Em primeiro lugar, porque o que está em causa na teoria
neoclássica é o capital financeiro entendido como os meios de
financiamento das actividades produtivas (capital fixo e capital
circulante). O que se transacciona nos mercados financeiros globais são
títulos de propriedade ou de dívida e só uma pequena parte
corresponde a transacções reais de financiamento das empresas 14.
Depois, porque, entendido como meio de financiamento das
empresas, o capital dispõe de mobilidade espacial limitada e não se
orienta necessariamente para as regiões que lhe asseguram maiores
níveis de remuneração.
14 Os números apresentados por Piot (1995) apontam para que as
transacções anuais nos mercados financeiros correspondam a cerca de 20 vezes oPIB mundial. Para este autor, a evolução confirma uma clara fractura entre afinança e a economia.
A mobilidade do capitalfinanceiro e do capital parafins de investimentoprodutivo
34
Alguma reflexão teórica e os ensinamentos dos estudos
empíricos (estes limitados por dificuldades estatísticas) permitem
suportar que as mobilidades espaciais do capital são muito mais
complexas do que as pressupostas pela visão neoclássica. Assim:
- Os movimentos espaciais do capital destinado ao financiamento
das actividades produtivas são sempre mediatizados pelo
empresário, que é uma figura absolutamente ausente da
abordagem neoclássica. É o empresário que, ao assumir o papel
central de organização dos factores de produção e da
organização do mercado, vai determinar a procura de capital e
as oportunidades para a sua rentabilização. A problemática da
mobilidade do capital acaba por converter-se na problemática
da localização.
A hipótese neoclássica ficaria salvaguardada se pudéssemos
admitir a mobilidade perfeita e um comportamento do
empresário ditado pela maximização do lucro. No entanto, são
hoje bem reconhecidos a fraca mobilidade do empresário e o
seu comportamento mais ditado por critérios de satisfação do
que por critérios de maximização.
- Grande parte dos meios de financiamento das empresas não são
livres. Uma parte substancial circula nos circuitos internos às
respectivas organizações (grupos económicos), frequentemente
de âmbito mundial. Outra parte tem a sua localização pré -
determinada pelas decisões do passado, designadamente na
parte relativa às necessidades de modernização ou ampliação de
unidades produtivas já instaladas. Apesar de se referirem a uma
data já recuada, merece a pena referir os números citados por
Holland (1976, 52), com base em comparações internacionais
Na lógica neo-clássica tudofunciona como se o
empresário não existisse.
A localização doinvestimento está, em grandemedida, predeterminada pela
capacidade de auto-financiamento e pelas
decisões do passado
35
nos anos 60, segundo os quais apenas cerca de 1/5 do total do
investimento líquido nas economias industrializadas toma a
forma de um investimento num estabelecimento inteiramente
novo, de modo que só uma proporção menor do total do
investimento está normalmente disponível para uma
localização em novas iniciativas nas regiões problema.
- A dimensão dos projectos não permite, frequentemente,
ajustamentos marginais. O capital aflui no volume adequado ou
não aflui de todo. É o conhecido problema das indivisibilidades
que justifica, frequentemente, a intervenção dos poderes
públicos no desenvolvimento de grandes projectos.
- O financiamento das actividades produtivas não depende
necessariamente da prévia geração de poupanças. O
financiamento junto do sistema bancário pode corresponder à
simples capacidade que os bancos possuem de criar moeda.
Não tem que haver redução numa região para que estejam
disponíveis mais meios de financiamento do capital produtivo
noutra.
- O desenvolvimento do sistema bancário e dos mercados
financeiros permitem a obtenção de capital em qualquer
localização, desde que seja assegurada uma remuneração do
investimento dentro de parâmetros normais. Nos países
avançados, as taxas de juro não parecem diferir muito entre
regiões.
Os empresários, ao decidirem os seus investimentos, e os
intermediários financeiros, ao aplicarem os seus capitais, não atendem
apenas à taxa de remuneração, mas ao binómio rentabilidade/risco. Isso
pode levar à preferência por regiões mais industrializadas, mais
Também aqui os raciocíniosà margem têm poucorealismo
O sistema bancário podecriar capacidade definanciamento com algumaautonomia em relação àcapacidade de poupança
Não são as taxas de juro quediferenciam o espaço
Os empresários não se regemapenas por critérios derentabilidade estritos
36
urbanizadas ou mais conhecidas, onde o risco é minimizado, embora
não sejam as que oferecem maiores níveis de rentabilidade. Os
trabalhos de Olsen para os Estados Unidos, citados por Richardson
(1973), revelaram uma relação negativa, ainda que estatisticamente
insignificante, do ritmo de crescimento do stock de capital de uma
região com a taxa de rentabilidade do capital, apontando para que os
investidores sentem-se mais confortáveis quando o seu capital é
investido nas regiões ricas e estão dispostos a pagar por isso (Olsen,
1971, citado por Richardson).
Acrescem a tudo isto os mecanismos de transferência de
rendimentos e o papel do Estado, que modificam radicalmente a oferta
e procura de capital nas diversas regiões. Frequentemente, as regiões
menos desenvolvidas apresentam um excesso de capital face às
iniciativas de projectos produtivos, mas a ideia de que as regiões mais
atrasadas, com abundância de mão-de-obra, oferecerão maiores
rentabilidades do capital terá de ser demonstrada caso a caso.
Convém, no entanto, ter presente que as nossas sociedades
criaram mecanismos de transferência diversos (investimentos públicos,
segurança social, serviços sociais, remessas de migrantes, juros
bancários, etc.) que, na prática, correspondem a importantes
transferências de rendimentos e poupanças para as regiões menos
desenvolvidas, tudo isto tornando muito complexa a análise dos fluxos
de capital entre as regiões.
3.2.5. A difusão espacial da inovação
A hipótese de uma difusão instantânea e sem custos da
informação (subjacente à hipótese de igualdade das tecnologias) não
As intervenções do Estadopodem modificar as regras
do jogo
A análise dos fluxos decapital entre as regiões é
complexa.
A difusão da inovaçãoconsome tempo e não se
difunde uniformemente noespaço
37
se adequa aos resultados dos trabalhos teóricos e empíricos sobre este
tema15 .
Em primeiro lugar, a difusão da informação consome tempo. A
função logística parece particularmente adequada à representação da
evolução da taxa de aceitação de uma inovação (P) em função do
tempo (t): P = K/(1+ae-bt), com K, a e b, constantes.
Esta função sugere três fases: uma fase em que a taxa de
adopção progride lentamente, uma fase de adopção rápida e a fase de
saturação (K = tecto de aceitação).
Figura 2 – Tempo e Adopção da Inovação
1
K
P
P=K/ (1+a e-bt)
t
Em segundo lugar, a aceitação de uma inovação diminui com a
distância. O modelo mais frequentemente proposto é a exponencial
inversa: P(d)=ae-bd, traduzindo a ideia de que a aceitação de uma
inovação depende não só da uma propensão a essa aceitação mas,
15 Richardson (1973), Pred (1973) e Planque (1983)apresentam referências a
alguns desses trabalhos
38
como condição prévia, do contacto com a inovação. E a frequência dos
contactos depende da distância.
Figura 3 – Distância e Adopção de Inovação
1
a
P
P= a e-bd
t
Aos lugares situados a maiores distâncias dos centros produtores
de inovação ela chega mais tarde e a taxa de aceitação é mais baixa.
Esta conclusão reporta-se já aos trabalhos de Hagerstrand no
início dos anos 50, que puseram em evidência estes processos de
difusão da inovação, a partir de modelos que reproduziam uma elevada
concentração da adopção da inovação à volta do centro inovador e
uma difusão radial, consumidora de tempo, com uma taxa de adopção
mais baixa na periferia.
A distância que aqui interessa, não é distância física mas uma
medida da probabilidade de comunicação e de contacto.
A probabilidade de contacto está, também, fortemente
condicionada pela hierarquia urbana. De acordo com os ensinamentos
da teoria dos lugares centrais, dois centros em níveis imediatos da
hierarquia terão maior frequência e contactos do que centros do
O grau de equilíbrio da redeurbana também condiciona
a difusão da inovação
39
mesmo nível. Reside aqui o fundamento para o modelo de difusão
hierárquica, apontando para que:
- A inovação surge numa grande metrópole;
- Num primeiro momento, a inovação difunde-se para baixo ao
longo da hierarquia urbana: as cidades de níveis mais elevado
têm acesso à inovação antes das pequenas cidades que se
situam (fisicamente) entre elas;
- Num segundo momento, a inovação difunde-se de cada cidade
para a sua área de influência, diminuindo fortemente a taxa de
adopção com a distância física.
As facilidades de comunicação e o reforço das interdependências
urbanas questionam a rigidez do modelo de difusão hierárquica, mas
não é posto em causa o papel da rede urbana na difusão e adopção da
inovação. Os factores económicos e sociais têm, naturalmente, um
peso significativo na adopção das inovações e condicionam a
capacidade dos espaços para adoptarem a inovação. Um papel decisivo
caberá à rentabilidade da inovação e à dimensão das empresas.
Refiram-se ainda quatro notas adicionais:
- O investimento proveniente do estrangeiro é uma das vias
privilegiadas de acesso à tecnologia, o que de novo nos remete
para a problemática da localização;
- A passagem da inovação de uma região a outra pode incorporar
um processo de aprendizagem (testes e aperfeiçoamentos) que
poderão significar uma mais rápida aproximação das duas
regiões no que respeita aos benefícios e vantagens da inovação;
a região que adopta a inovação no segundo momento tem
acesso a uma inovação testada e aperfeiçoada;
Nenhuma análise simplistapermite compreender, comfacilidade, toda acomplexidade do processo dedifusão da inovação
40
- A aceleração dos processos de inovação, na medida em que se
mantenham os tempos de difusão, tende a aumentar a vantagem
do centro e a agravar as disparidades entre as regiões;
- As possibilidades oferecidas pelas novas tecnologias de
informação e comunicação para a disjunção espacial das
funções das empresas tendem a agravar as disparidades do
conteúdo tecnológico e de conhecimento entre as diversas
regiões.
3.2.6. Mobilidade dos factores: questões para a política
regional
O conhecimento dos mecanismos de mobilidade do trabalho, do
capital e da inovação é de enorme utilidade quando às administrações
públicas se colocam os problemas de formular e julgar da eficácia das
políticas regionais. Merecem reflexão, em particular, as seguintes
questões:
1. A dificuldade de inverter os fluxos migratórios impõe que se
trate a demografia como uma constante territorial; em geral,
terão pouco sucesso atitudes voluntaristas visando a
recuperação demográfica das áreas em risco de
despovoamento e confrontadas com saldos fisiológicos
negativos, sobretudo se estas políticas não forem conduzidas
de forma persistente a longo prazo;
A mobilidade demográficaapenas pode ser considerada
no muito longo prazo
41
2. A mobilidade do capital é mediatizada pelo empresário; o
enfoque nas políticas de acesso ao capital (políticas de
incentivos, acesso ao capital de risco, etc.), actuando a jusante
do empresário e do projecto, corre o risco de acentuar o
carácter cumulativo dos processos de desenvolvimento e ser
incapaz de dinamizar as regiões menos desenvolvidas;
3. A inovação consome tempo e sofre a fricção da distância; a
aceleração dos processos de inovação torna mais relevantes os
instrumentos de difusão espacial de inovação e de
transferência de tecnologia; uma atenção particular deverá ser
prestada à aptidão do meio para internalizar a inovação.
4. O sistema urbano é o caminho privilegiado de difusão da
inovação; a política regional não pode prescindir de uma forte
dimensão de política urbana; em particular, está em causa
assegurar uma eficaz articulação dos diferentes nós e níveis da
rede urbana.
3.3. A ORGANIZAÇÃO PELA PROCURA NO CONTEXTO
DA ANÁLISE KEYNESIANA
No modelo neoclássico a afectação de factores tinha como
pressupostos a total flexibilidade dos preços dos factores e a sua
completa substituibilidade. O confronto da realidade com estes
pressupostos leva-nos a concluir que o seu grau de verificação é
relativamente limitado; é diverso segundo as variáveis e os horizontes
temporais considerados.
A promoção da mobilidadedo capital se não forconvenientementeenquadrada pode acentuaros desequilíbrios
A inovação promove odesenvolvimento na medidaem que for possívelendogeneizá-la
A rápida difusão dainovação pressupõe umarede urbana equilibrada
42
3.3.1. As hipóteses e o modelo
A indivisibilidade e a especificidade dos factores, apontam para
que as possibilidades tecnológicas sejam melhor representadas por
uma função descontínua do tipo Y= min [K/v, L/u], (v = coeficiente
capital/produto, u = inverso da produtividade do trabalho). A
constância dos coeficientes desta função de produção pode ser
interpretada menos como uma restrição tecnológica e mais como uma
imposição económica, em particular se atendermos que na lógica
keynesiana os preços dos factores de produção, sobretudo do capital,
são determinados, em grande medida, fora da esfera produtiva. A
relação entre o produto e o capital fica também determinada (produto
marginal igual ao custo), uma vez que a taxa de juro é fixada na esfera
financeira.
Com uma função de produção de coeficientes constantes e com
inflexibilidade, ou resistência significativa, no preço dos factores,
nada garante a verificação das condições que assegurem a sua plena
utilização. Em particular, não existe um mecanismo que assegure
espontaneamente o ajustamento da procura de capital ao volume das
poupanças.
Como é sabido, a distinção entre as motivações da poupança e
os factores de investimento está no centro da visão keynesiana do
funcionamento das economias. Numa perspectiva de longo prazo,
necessitamos, assim, de uma teoria do empresário que, no mínimo,
esclareça as razões que levam os empresários a investir.
A resposta da teoria keynesiana é a de que o elemento central da
solução reside em qualquer decisão que provoque um fluxo adicional
de procura, dando origem a decisões em cadeia que levam a um
A função de produção decoeficientes constantes
A função de produção e opleno emprego
Como é que as poupanças setransformam em
investimentos?
43
acréscimo do nível de rendimento. A propagação desses efeitos é,
como é sabido, traduzida na teoria do multiplicador e na teoria do
acelerador. A questão que se coloca é a de saber o que é que justifica
esse acréscimo exógeno da procura.
3.3.2. O modelo da base económica de exportação
Sendo as regiões sistemas abertos, a resposta mais imediata é a
de procurar obter o aumento exógeno da procura por via da procura
externa. Em particular, para as pequenas regiões de economia muito
especializada, é a procura que os seus bens e serviços possam obter
nos mercados externos que determinará as condições de crescimento
regional; dito de outra forma, o crescimento da região depende do que
a região oferecer aos mercados extra-regionais.
Muitas regiões tiveram o seu desenvolvimento assente na
procura extra-regional dirigida aos seus recursos naturais e às
amenidades (utilidades não renováveis, como o clima, a paisagem, o
património cultural, etc.) ou às actividades que sobre os mesmos se
apoiam. A competitividade das exportações regionais pode, no
entanto, estar associada a outras vantagens comparativas como os
recursos humanos (custo e/ou qualidade) ou a excelência do
conhecimento e do saber-fazer em determinados domínios.
Na sua formulação mais simples16, o modelo da base económica
de exportação parte da partição do produto regional (Y) entre o
produto das actividades (básicas) destinadas à exportação (X) e o
16 Uma versão mais elaborada, introduzindo a balança comercial, pode ver-
se em Lopes (1980)
O desenvolvimento por viada dinamização da procuraexterna
Uma formulação simples domodelo
44
produto das actividades (não-básicas) destinadas a satisfazer o
consumo interno (D):
Y = D + X (1)
Admitindo que as actividades que satisfazem a procura interna
dependem do rendimento regional (Y), através de uma relação
funcional do tipo:
D = a + bY (2)
Pelo que se obtém, substituíndo (2) em (1):
Y = a / (1-b) +X / (1-b) (3)
Onde, 1/(1-b) é o multiplicador da base, podendo escrever-se, em
termos incrementais:
∆Y = ∆X / (1-b) (4)
Note-se que b representa a propensão a afectar o rendimento à
procura de bens e serviços produzidos internamente. Quanto maior for
o valor de b (<1) maior será o impacte de um acréscimo das
exportações. Em consequência, o impacte de um acréscimo das
exportações regionais poderá ser insignificante se b for muito baixo
(p.e. em resultado de uma forte propensão a importar). Por outro lado,
é fácil concluir que se y’ (∆Y / Y) e x’ (∆X / X) representarem
taxas de crescimento se tem:
y’ = x’.[X / (a+X)] (5)
Assim, a taxa de crescimento do produto será maior ou menor
do que a taxa de crescimento das exportações , conforme o sinal de a
(negativo ou positivo). Se a > 0, a taxa de crescimento do produto
será inferior à taxa de crescimento das exportações e inversamente.
45
Infelizmente, não é clara a relação entre o sinal de a e as
características estruturais da região.
O desenvolvimento analítico realizado até aqui é uma mera
justaposição de equações. No entanto, permite já obter elementos de
reflexão sobre as dificuldades do desenvolvimento de regiões onde o
mercado local não é suficiente para suportar actividades não - básicas,
implicando a drenagem, para o exterior, dos impactes de actividades
exportadoras que eventualmente se venham a desenvolver. Nas
regiões fracamente povoadas e empobrecidas a exploração das
vantagens comparativas para a criação de uma base económica tem de
ser acompanhada por um grande esforço de integração e de
desenvolvimento do mercado local.
É evidente que para termos uma teoria de crescimento regional,
deveríamos, no mínimo, possuir a identificação dos factores que
determinam as exportações e conhecer a forma como alguns desses
factores se relacionam com outras variáveis endógenas à economia
regional. Esse passo é dado, por exemplo, por um dos modelos que
ilustram a teoria da causalidade cumulativa (ver, adiante, 3.3.3).
Por agora refira-se, apenas, que entre os factores que explicam
as exportações regionais poderão encontrar-se o nível da procura
mundial (Z), o nível de preços na região (pi) e o nível de preços no
resto do mundo (pe). Uma função vulgar para as exportações poderá
ser:
X= piλ . peε. Zµ, onde
λ<0, ε>0 e µ>0.
Em termos de taxas de crescimento:
A necessidade de introduzirconsiderações decomportamento
O comportamento dasexportações
46
x’=λ pi’+ ε pe’ + µ z’ onde
x’, pi’, pe’ e z’ representam taxas de crescimento das exportações, dos
preços e da procura mundial.
Assim, as exportações regionais perdem competitividade com o
aumento dos preços internos e respondem positivamente ao aumento
dos preços externos e da procura mundial.
A actividade regional (tendo em conta a noção de região) não
tem significado na determinação, da procura mundial e dos preços
externos, que funcionam, então, como variáveis exógenas. A excepção
poderá ser encontrada em algumas regiões que possuem recursos
naturais muito localizados, ou tenham atingido posição de relevo
mundial nalgum sector de actividade. A posição competitiva da
região, implicando preços internos mais baixos, conduzirá à
especialização da região em sectores e tecnologias que utilizem os
factores previamente mais abundantes na região.
A questão da determinação das actividades que constituem a
base económica regional é central para avaliar as perspectivas de
crescimento da região. Basicamente, podemos recorrer a dois métodos:
1. O método dos requisitos mínimos
Segundo este método consideram-se como exportadoras
todas as actividades que tenham na região uma presença superior a um
determinado valor padrão.
Esse padrão pode ser o que corresponde, ao menor valor
encontrado no conjunto das regiões, ao valor médio nacional ou outro.
A ideia é a de que esse padrão corresponda a uma situação de auto-
suficiência. A presença na região de um nível de actividade superior
àquele padrão significaria a existência de capacidade exportadora.
A determinação dasactividades da base
47
Este método pressupõe que a estrutura de consumos se mantém
invariante e que existe equilíbrio nas trocas externas da unidade
tomada como padrão.
Em vários trabalhos empíricos, as actividades exportadoras têm
sido identificadas recorrendo ao quociente de localização. Seriam
exportadoras as actividades que tivessem um QL>1. A capacidade
exportadora (dimensão da base) seria o excesso relativamente à
proporção correspondente à participação da região na variável padrão.
Este padrão poderá ser a população, o rendimento (hipótese de padrão
de consumo constantes) ou outra variável indicativa dos consumos
regionais. Frequentemente também, por falta de base estatística, a
presença na região de actividades exportadoras é avaliada em termos
de emprego, o que implica a hipótese adicional de iguais
produtividades nas diversas regiões.
2. O quadro input-output regional
Teoricamente, um quadro input-output deveria permitir
quantificar o valor das exportações e o valor das importações de cada
um dos sectores em que se considerasse decomposta a economia
regional. Infelizmente, nem sempre esse nível de informação é
atingido e, por vezes, a determinação das exportações e importações
regionais acaba por recorrer a qualquer variante do método anterior.
No entanto, as igualdades básicas de um quadro I-O (input-output)
permitirão, pelo menos, determinar as exportações líquidas para os
sectores superavitários e as importações líquidas para os deficitários.
Há cerca de 15 anos, uma equipe do ISE (Instituto Superior de
Economia) – NERU ( Núcleo de Estudos Regionais e Urbanos )
coordenada pelo Prof. Simões Lopes construiu, a solicitação da, então,
DGPU (Direcção Geral de Planeamento Urbanístico) um quadro
A utilização dos quocientesde localização
Os quadros input-outputpermitem conhecer aimportância do comércioexterno de uma região
Alguma experiênciasrealizadas em Portugal
48
input-output para a economia do Algarve, referente ao ano de 1980 17.
Grosso modo, a metodologia baseou-se na determinação do valor de
produção dos 49 sectores e da procura interna final e da sua
desagregação por origem dos inputs a partir de inquéritos junto das
empresas regionais. Por outras palavras, a matriz de relações
intersectoriais foi construída por colunas. As relações extra-regionais
(importações e exportações) foram tratadas em termos de saldo.
Esses dados confirmaram, também no Algarve, uma das
características dominantes das economias regionais: a sua grande
abertura ao exterior. As importações regionais correspondiam a 92% e
as exportações a 69% do PIB regional18, sendo a economia algarvia
uma economia deficitária, com uma taxa de cobertura das importações
pelas exportações de apenas 75%.
As principais actividades básicas eram os restaurantes, cafés
e hotéis (33% da base), a agricultura (22%), os transportes marítimos
e aéreos (16%), as pescas (13%) e as conservas de peixe (10%).
Outras actividades básicas de menor importância eram a silvicultura,
os minerais e produtos minerais não metálicos, a madeira e cortiça, os
transportes terrestres e as comunicações. No total registe-se o peso das
17 Outras equipes, têm-se envolvido em projectos de construção de matrizes
regionais de que se podem citar como mais relevantes, o levado a cabo pelas CCR epelo GEBEI, com metodologias homogéneas e para o conjunto das regiões,referente ao ano de 1987 e, posteriormente, a construção de uma matriz para aregião Norte, sob a responsabilidade da CCRN, para o ano de 1990. Maisrecentemente, tem-se conhecimento de estar em construção uma matriz para aregião Algarve, sob a responsabilidade da Universidade do Algarve e tendo comoreferência o ano de 1994. Em todos estes projectos têm estado envolvidosinvestigadores e docentes do ISEG e do CIRIUS.
18 O grau de abertura ao exterior era ainda superior ao que estes númerosindicam porque, dada a forma de construção do quadro, aqueles valores referem-seàs importações líquidas dos sectores deficitários e às exportações líquidas dossectores superavitários
49
actividades ligadas ao turismo, enquanto serviços consumidos por não
residentes.
O exemplo da economia algarvia é ilustrativo de vários aspectos
críticos da teoria da base económica de exportação.
Em primeiro lugar, a base económica não se reduz às
actividades produtoras de bens materiais. Nalgumas regiões os
serviços podem ser a principal componente da base e entre elas o
turismo merece particular destaque.
Em segundo lugar, a teoria da base esquece que podem existir
muitas outras operações económicas com efeitos equivalentes aos das
exportações, porque se traduzem num acréscimo da procura regional.
No Algarve era evidente que o financiamento do défice comercial da
região era, no essencial, assegurado pela exportação do imobiliário: o
investimento externo em produtos da construção (habitações, hotéis,
etc.) financiado por capitais extra-regionais era muito superior àquele
défice.
Os investimentos públicos e o investimento privado de origem
extra-regional são outras formas de injecção de rendimento no circuito
económico da região, frequentemente, com impacte superior ao das
exportações. No caso português, principalmente no caso das regiões
do interior, merece especial atenção o papel das transferências, quer as
associadas às remessas de emigrantes ou às prestações sociais (p.e. em
1992 as prestações sociais correspondiam a quase 1/4 do rendimento
disponível bruto das famílias no Alentejo), quer as resultantes de
aplicações de capitais, designadamente juros bancários. A ruptura de
alguns destes mecanismos de transferências pode ter efeitos
dramáticos na economia das regiões mais atrasadas.
A base económica éconstituída não apenas poractividades de base material,mas também por actividadesde serviços
Mas o crescimento doproduto não depende apenasdas exportações
Nomeadamente, por via detransferências de naturezafinanceira ou social
50
É possível construir modelos que incorporem todas estas
operações económicas, como o faz, por ex. Richardson (1973). Poder-
se-ia também refinar o modelo para introduzir um efeito acelerador do
investimento regional. No entanto, a teoria da base económica de
exportação, formulada nos já longínquos anos 50, tem vindo a ser
objecto de diversas e violentas críticas. Talvez a mais significativa e
antiga seja a sua sensibilidade à dimensão económica da região. Se é
verdade que uma pessoa individualmente depende inteiramente da
procura de outros para os seus serviços, a nível do mundo inteiro as
exportações não podem ser a explicação para o crescimento
económico. Para uma grande região as suas exportações não podem
constituir a explicação principal do seu crescimento.
Como qualquer outro modelo, a teoria da base económica de
exportação corresponde a uma certa visão, ou interpretação do
funcionamento da economia. A ênfase dada à procura é
particularmente relevante para compreender os mecanismos de
arranque do processo de crescimento de algumas regiões.
3.3.3. O modelo da causalidade cumulativa
Diversos autores têm vindo a argumentar, seguindo Myrdal, que
as forças de mercado tendem a reforçar cumulativamente as vantagens
ou desvantagens de umas regiões em relação a outras. Uma forma de
ilustrar esta perspectiva é através de um modelo auto-alimentado que
combina a teoria da base económica de exportação com o efeito das
economias de escala e das economias de aglomeração.
A importância da dimensãoda região
O recurso ao modelo da baseeconómica, às economias de
escala e às economias deaglomeração
51
Nesse modelo19 haverá dois mecanismos centrais: o efeito Verdoon e a
função de exportações.
1. O efeito de Verdoon, liga a produtividade ao volume do
produto.
Essa relação q = f(Q), onde q representa a produtividade e Q o
volume de produção, é susceptível de verificação estatística. Por
exemplo, em Portugal, se tomarmos 1980 para base (=100) os índices
da produtividade (q) e do PIB (Q) entre 1980 e 1996 apresentam
uma relação q = 31.76 + 0.71Q (com R2=0.96 e o valor de t
correspondente ao coeficiente igual a 19.4). A relação linear entre as
taxas de crescimento seria, para este período, bastante menos evidente
obtendo-se o seguinte ajustamento linear q’=0.735 + 0.447Q’, com
t=3.15, mas R2=0.398.
Como é sabido, as relações estatísticas não são relações de causa
e efeito e, por isso, a racionalidade do efeito de Verdoorn terá de ser
procurada por outra via, nas economias de escala, nas economias de
aglomeração, no progresso técnico, no saber incorporado, etc., que
uma economia em crescimento possibilita.
Assim, uma equação central do modelo seria:
q = f(Q) (com df / dQ>0) (1)
ou, admitindo uma relação linear em termos de taxas de crescimento,
q’ = a + πQ’ (1’)
19 Retemos uma versão do modelo próxima da apresentada em Lopes (1980).
Uma versão do modelo menos dependente do papel das exportações pode encontrar-se em Richardson (1973).
O efeito Verdoon
52
2. A procura para as exportações regionais
Como atrás se viu, pode reter-se
X= piλ . pe ε. Zµ, onde
λ<0, ε>0 e µ>0 (2)
ou, em termos de taxas de crescimento,
x’=λ pi’+ ε’ pe’+ µ z’ (2’)
onde (X- exportações, pi- preços internos à região, pe- preços
mundiais e Z- a procura mundial, como anteriormente). Note-se que
µ (elasticidade das exportações regionais relativamente à procura
mundial) assume um papel crítico e estará muito dependente da
capacidade inovadora da região. Como já vimos pe e Z podem ser
tomados como variáveis exógenas.
3. Uma função explicativa dos preços internos.
Poderemos pensar que o preço pode corresponder ao quociente
entre o custo global de empregar um trabalhador e a produtividade:
pi = C / q (3)
ou, em termos de taxas de crescimento:
Pi’= C’- q’ (3’)
A região terá fraca possibilidade de influenciar os custos
(salários negociados nacionalmente, matéria primas e equipamentos
importados, custo do capital determinado no mercado financeiro),
pelo que a variação dos custos se poderá tomar como exógena.
A função de exportações
O comportamento dos preçosinternos
53
4. As equações que relacionam o produto com as
exportações (ver 3.3.2)
Q = c + aX (4) ou
Q’ = ßx’ (4’)
A conjugação destas equações origina um modelo com
retroacções positivas. Uma variação exógena das exportações implica,
por (4), um acréscimo de produto, o qual, por (1), conduz a ganhos
de produtividades. Maiores ganhos de produtividade repercutem-se
favoravelmente, por (3), no nível de preços internos implicando, por
(2), novo acréscimo das exportações. E aqui teríamos o início de um
novo ciclo.
Figura 4 – Causalidade CumulativaAumento da
Procura Mundia lAumento dasExpor tações
Aumento daProdução Regional
Aumento daProdut iv idade
Diminu ição dospreços internos
∆X= µ ∆ Z ∆Q= β ∆ X
∆ q = a + π ∆Q
∆ Pi =- ∆ q
∆ X = λ ∆ Pi
O carácter explosivo, ou não, deste processo vai depender dos
valores das elasticidades π, λ, ß. A resolução das equações (1’), (2’),
(3’) e (4’) em ordem a Q’ permite concluír que o processo será tanto
mais explosivo quanto o produto πλß se aproximar de -1.
Este modelo é pleno de consequências para a fundamentação de
instrumentos de política regional. Nele podem fundamentar-se políticas
como: a reserva de mercados públicos (em tempos utilizado em Itália),
O produto e as exportações
O funcionamento do modelo
As consequências para apolítica económica
54
os subsídios ao funcionamento (para reduzir os custos e o crescimento
dos preços internos) de efeitos equivalentes à desvalorização da moeda
para as economias nacionais ou as políticas de aumento autónomo da
produtividades (p.e. formação profissional) aumentando o valor de a
na equação (1’).
3.3.4. Os ciclos de crescimento no espaço
O carácter cumulativo dos desequilíbrios regionais pode ser
fundamentado a partir de uma outra perspectiva teórica apoiada numa
síntese do modelo de Harrod com a mobilidade dos factores, em
resposta a diferenças interregionais nas respectivas remunerações.
Como é sabido, a explicação do crescimento no modelo de
Harrod reside na permanente tentativa de as empresas ajustarem o
stock de capital às condições de procura e às condições da esfera
financeira que, ao determinarem a taxa de juro, determinam o
coeficiente capital-produto desejado (vr). A condição de equilíbrio ex-
ante seria g w.v r= s e a condição de equilíbrio ex-post g.v = s, onde g
w representa a taxa de crescimento de equilíbrio (warranted growth rate
ou a taxa que, a verificar-se, significaria que as empresas haviam
produzido na dimensão adequada e, em consequência, manteriam os
comportamentos assegurando idênticas taxas de crescimento futuro) e
g, v e s são, respectivamente, a taxa de crescimento real, o coeficiente
capital-produto real e a propensão à poupança. Temos, então, que:
g w.v r = g.v.
Se g > g w (taxa de crescimento real superior à taxa de
crescimento de equilíbrio) então v r > v, isto é, os empresários
O modelo de Harrod e osmecanismos de reequilíbrio
55
encontram-se numa situação de insuficiência de capital (coeficiente
capital-produto desejado superior ao coeficiente capital-produto real).
A reacção será um aumento de investimento que, pelo efeito
multiplicador, irá implicar uma maior taxa de crescimento real,
aumentando ainda mais a diferença entre g e g w. A combinação entre o
efeito acelerador e do multiplicador traduzir-se-ia num processo de
crescimento cumulativo, que só tenderia a desacelerar e a inverter-se
quando a economia atingisse o tecto de pleno emprego. Inversamente,
se g < g w a economia entraria num processo de declínio que só
tenderia a inverter-se quando fosse atingido um limite inferior do
crescimento, associado, por exemplo, a uma procura mínima que
sempre se terá de verificar (subsistência das famílias, investimentos
essenciais da administração, investimentos de substituição, etc.).
A economia serpentearia, assim, entre um tecto de pleno
emprego e um limite inferior de crescimento, que não têm de ser
estáveis, mas antes evoluem com o crescimento da população e da
própria economia.
Se juntarmos a este mecanismo a migração dos factores, tendo
em conta que, quer a remuneração do trabalho quer as oportunidades
de investimento lucrativo tenderão a ser menores numa região em
declínio, o processo poderia ser visto relativamente a duas regiões
segundo o seguinte esquema adaptado de Holland (1976).
A migração de factores entre as duas regiões, da menos
desenvolvida (Interior) para a mais desenvolvida (Litoral), possibilitaria
à região mais desenvolvida que o seu tecto de pleno emprego fosse
continuamente empurrado para cima permitindo-lhe um crescimento
sustentado.
Os limites superior e inferiorde crescimento
56
A região menos desenvolvida confrontar-se-ia com uma dinâmica
de sentido contrário, vendo as suas possibilidades de crescimento
(tecto de pleno emprego e limite inferior de crescimento)
continuamente reduzidas. Teria lugar um processo cumulativo de
desequilíbrios que se desenrolaria durante um período longo.
Teoricamente esse processo poderia inverter-se, quando a região
Interior deixasse de poder continuar a alimentar as migrações de
factores em direcção ao Litoral. Esta região poderia aproximar-se
rapidamente do tecto de pleno emprego e entrar numa fase
descendente do ciclo. Ao mesmo tempo a região Interior, uma vez
atingido o limite inferior de crescimento, poderia entrar numa fase
ascendente.
Teríamos, assim, uma fase de convergência regional. Mas, como
se pode deduzir do gráfico seguinte, essa fase de convergência tenderia
a ser, por um lado, extremamente curta e, por outro, incapaz de
inverter os desequilíbrios gerados na fase anterior.
O modelo realça o papel das migrações na sustentação dos ciclos
longos de crescimento das regiões mais desenvolvidas, retomando a
ideia, já referida anteriormente, de que as migrações reduzem as
potencialidades de crescimento da região de origem e aumentam as da
região de destino. No entanto, o pressuposto de no efeito acelerador só
entrar o comportamento da procura da região é extremamente
restritivo, na medida em que significa que o modelo não tem em conta
a existência de comércio inter-regional e, por consequência, as relações
cruzadas (de uma região sobre a outra) da procura e investimento
(multiplicador e acelerador).
A fragilidade dosmecanismos de convergência
As consequências em termosde política regional
57
Figura 5
T ime
C6
C5
C 4
C 3
C 2
C1
B 5
B 4
B 3
B 2
B 1
I I II II
A 1
A 2
A 3
Ou
tpu
t /
Em
plo
ym
en
t
Regional Ful l EmploymentCei l ing (R.F.E.C.)
M.D.R.
Growth Path
L.D.R.Growth Path
M.D.R. Lower Equil ibrium Line
L.D.R. Lower Equil ibrium Line
Em termos de política regional, este modelo chama a atenção
para dois aspectos. Por um lado, destaca o papel central das
expectativas dos empresários, remetendo para a necessidade de criação
de imagens positivas da região. Uma região que se desenvolve
desencadeia mecanismos que tendem a auto-sustentar esse
desenvolvimento.
Por outro, põe em relevo a importância das transferências
(públicas e privadas) e dos investimentos públicos como forma de,
mantendo elevado um mínimo de procura, impedir, nas regiões menos
desenvolvidas, a degradação dos limites inferiores de crescimento a
níveis que não permitam a recuperação. A descentralização dos
serviços públicos (ensino, saúde, administração, etc.) têm no
desenvolvimento um papel mais importante do que o de simples
resposta às necessidades da população.
58
LITORAL INTERIOR
1) Região mais desenvolvida. Remuneraçõesdos factores iguais ao Interior: algumdesemprego ou sub - emprego.
⇓2) Aumento exógeno na taxa de investimento:
aproximação do tecto de pleno emprego⇓
3) Efeito multiplicador. Aumento dasremunerações dos factores relativamente aoInterior
⇓4) Aumento do coeficiente capital - produto
desejado (tecnologias mais capital-intensivasà medida que se aproxima do tecto de plenoemprego). Aumento da taxa de crescimentode equilíbrio (efeito acelerador)
⇓5) Aumento do tecto de pleno emprego (taxa de
crescimento natural) pela importação detrabalho e de capital do Interior. Aumento dolimite inferior de crescimento, pela expansãoda economia.
⇓6) Aumento da taxa de investimento
(acelerador) financiado por maiorespoupanças internas e pelo afluxo depoupanças do interior
⇓7) Efeito multiplicador. Maiores taxas de
crescimento. Maiores remunerações dosfactores. Afluxo de factores provenientes doInterior. Etc.
1) Região menos desenvolvida. Remuneraçõesdos factores iguais ao Litoral: desempregoou sub - emprego substanciais
⇓2) Investimento a taxa idêntica à anterior
⇓3) Efeito multiplicador. Remunerações de
factores mais baixas do que o Litoral.Migração de factores de produção para oLitoral, mas proporcionalmente maiscapital do que trabalho (menor rigidezespacial do capital).
⇓4) Declínio na taxa de crescimento de
equilíbrio e no coeficiente capital produtodesejado (redução da procura motivadapela migração do capital e maiorabundância relativa do factor trabalho).
⇓
5) Redução do tecto de pleno emprego (taxa decrescimento natural) por saída de factoresde produção. diminuição do limite inferiorde crescimento, por contracção daeconomia.
⇓6) Declínio do investimento, por menores
poupanças internas.
⇓7) Efeito multiplicador. Menores taxas de
crescimento. Menores remunerações defactores. Aumento de migrações para oLitoral. Etc.
Fonte: Holland (1976,. 239), adaptação nossa
59
3.4. OUTRAS ABORDAGENS
Os modelos anteriores tendem a privilegiar mecanismos
automáticos de indução dos efeitos de desenvolvimento.
No caso dos modelos de inspiração neo-clássica admitindo que
os desequilíbrios territoriais têm carácter temporário e que sempre se
podem reabsorver mediante mecanismos de mobilidade dos factores.
Também, nos modelos com fundamentação keynesiana, o
desenvolvimento de efeitos de expansão, ou contracção, verificam-se
de forma mais ou menos automática, na sequência de impulsos
exógenos.
Os modelos que serão abordados nesta secção são, do ponto de
vista dos automatismos, muito menos optimistas. Eles admitem que os
automatismos são mais uma verificação à posteriori que uma
constatação à priori. À partida, há condições de natureza cultural,
organizacional e de circulação que têm que ser promovidas com vista a
que os objectivos de política possam ter êxito.
Tanto os modelos de polarização, como os dos eixos de
desenvolvimento, ou do desenvolvimento territorial sublinham, de um
modo, ou de outro, estas preocupações.
3.4.1. As limitações dos modelos anteriores
Os modelos de desenvolvimento regional atrás apresentados
correspondem a contributos, sempre parcelares, para compreender
porque as regiões crescem a ritmos diferentes e para identificar as
Porque é que são necessáriasnovas explicações
As explicações fornecidaspelos modelos anteriores sãoparcelares
60
variáveis sobre as quais poderá incidir uma acção política visando
corrigir as disparidades de crescimento entre as regiões.
Trata-se de modelos a - territoriais, onde não estão presentes
variáveis que são fundamentais para a compreensão do espaço
(distância, economias de aglomeração, invariantes locacionais, factores
político - administrativos, ...) e que pouco contribuem para
compreender como se processa a organização espacial do
desenvolvimento (ordenamento do território) e as consequências
espaço - temporais dessa organização.
Quais as condições que podem despoletar os mecanismos de
crescimento numa dada região? Como se difundem esses processos de
desenvolvimento sobre o território? Qual a organização territorial a
que esses mecanismos conduzem?
Estas questões são centrais para a formulação de uma teoria do
desenvolvimento regional, e têm vindo a receber respostas diversas.
Em Lösch é possível encontrar uma explicação assente na
conjugação das forças dispersivas (concorrência/domínio de um
mercado) com as forças aglomerativas (economias de aglomeração)
que conduzia a um espaço organizado por um centro, localização das
diversas actividades, e por sectores radiais (12 nas hipóteses do
modelo) com alternância de sectores de presença industrial forte e
diversificada e sectores de indústria escassa, com raios de acção de
nível local.
Outros autores (Colin Clark, Rostow) apontaram para um
processo de desenvolvimento por etapas. Seriam factores de natureza
institucional, sociológica e ideológica, bem como a dotação em
A falta de territorialidadedos modelos
O modelo de Lösch
Os modelos do big-push
61
recursos que determinariam quais as primeiras regiões onde se daria o
arranque.
A ideia de ciclo do produto associada à ideia da disjunção
espacial das funções empresariais, tornada possível pelas novas
tecnologias de comunicação, conduziram à teoria da divisão espacial
do trabalho. Os espaços seriam definidos por técnicas e
comportamentos sociais (Aydalot, 1980) e as funções de concepção e
de controlo da economia seriam retidas nas regiões mais desenvolvidas
enquanto as funções de produção seriam filtradas para áreas
intermédias ou áreas pobres, de acordo com os níveis de qualificações
técnicas requeridas. Esta divisão espacial do trabalho é potenciada
pelas empresas inseridas em grupos económicos transnacionais cuja
lógica territorial tem vindo a ser rapidamente alterada pelos processos
de globalização e integração.
Desenvolvimento regional endógeno, distritos industriais, meios
inovadores são algumas das expressões em que se vem corporizando a
reflexão recente sobre o desenvolvimento e organização do espaço.
Mas não é este o local para fazer uma revisão da moderna
literatura sobre a mudança de paradigma do desenvolvimento regional.
O que faremos é centrarmo-nos na questão de como surgem e se
propagam territorialmente os processos de desenvolvimento, referindo
a esse propósito três abordagens teóricas que, surgidas em momentos
diferentes da segunda metade deste século, constituem um bom quadro
de referência para a discussão daquela questão. Abordaremos,
sucessivamente, os pólos de crescimento, os eixos de desenvolvimento
e os distritos industriais.
A explicação a partir dadivisão espacial do trabalho
Outras abordagens maisrecentes
62
3.4.2. Os pólos de crescimento
Armstrong e Taylor (1978) referem-se a esta abordagem como a
hipótese de polarização. Na verdade, a noção de pólo de crescimento
foi introduzida por Perroux (1955) e baseia-se na constatação de que o
crescimento não surge em toda a parte ao mesmo tempo; manifesta-se
com intensidade variável em certos pontos ou pólos de crescimento;
propaga-se segundo vias diferentes e com efeitos variáveis no
conjunto da economia. Perroux considerava o crescimento económico
como o resultado de forças centrífugas e forças centrípetas a partir de
determinados clusters de firmas e indústrias: o pólo.
Os pólos de Perroux eram em primeiro lugar pólos no espaço
económico abstracto e pressupõem uma empresa motriz ou indústria
motriz. Uma empresa motriz é uma empresa que é relativamente
grande, gera impulsos significativos para a sua envolvente, tem
elevada capacidade para inovar, e, finalmente, pertence a um sector
de rápido crescimento (Hermansen, 1972, 22). Do mesmo modo, uma
indústria motriz será uma indústria relativamente moderna, operando a
um nível tecnologicamente avançado, em mercados de elevada
elasticidade procura/rendimento e difundindo fortes impulsos através
das relações inter-industriais.
Estas características asseguram à indústria motriz um
crescimento mais rápido do que o conjunto da economia e uma elevada
capacidade de reboque de outros sectores produtivos. A produção de
material de caminho de ferro, o automóvel ou a informática são
exemplos de actividades que, em diferentes momentos da história, se
têm assumido como indústrias motrizes.
A lógica da polarização
A empresa e a indústriamotriz
63
Associada à noção de pólo surge a noção de complexo
industrial, no sentido de um cluster organizado à volta de um núcleo
(core) de indústrias tendo uma grande força propulsora, isto é,
indústrias com uma elevada capacidade para transmitir impulsos de
crescimento através de laços a montante ou a jusante (Hermansen,
1972). Os efeitos propulsores estabelecem-se através das relações
inter-industriais a montante (por efeito da procura) ou a jusante (oferta
de inputs determinantes para as taxas de crescimento de outras
indústrias). Importante na análise das interdependências é a noção de
dominância (hierarquia nas relações fornecedor/cliente).
Um complexo industrial só será um pólo de crescimento se o seu
núcleo for constituído por indústrias motrizes.
Projectando um pólo de crescimento do espaço sectorial sobre o
espaço geográfico, chegaremos ao pólo de desenvolvimento num
contexto regional, cuja popularização se deve, principalmente, ao Prof.
Boudeville. Em termos regionais, o centro de uma região polarizada
será um pólo de desenvolvimento desde que contenha empresas
motoras pertencentes a indústrias - chave.
A partir destes pólos irradiam efeitos difusores (spread effects,
na terminologia de Myrdall, ou trickling down effects, na de
Hischman), favoráveis ao desenvolvimento das áreas periféricas. Ao
mesmo tempo, os pólos exercem sobre os espaços envolventes efeitos
centrípetos, de polarização (backwash effects ou polarization effects).
O impacte do pólo no desenvolvimento regional dependerá da
combinação concreta dos efeitos de difusão e dos efeitos de
polarização, discussão que nos coloca no contexto dos debates das
relações centro-periferia.
A noção de complexoindustrial
A noção de pólo dedesenvolvimento
Os efeitos de polarização eos efeitos de difusão
64
A compreensão dos efeitos de difusão e dos efeitos de
polarização remete para a teoria da localização industrial e para a
teoria da mobilidade dos factores. Os efeitos de polarização
encontram-se associados ao desenvolvimento de economias de
aglomeração (que reforçam a atracção das empresas pelo pólo), aos
efeitos selectivos das migrações dos factores (trabalho e capital), da
periferia para o centro (pólo) e às desvantagens competitivas das
empresas da área de influência, face a empresas que dispõem de uma
melhor qualidade do meio no pólo.
Os efeitos de difusão teriam a ver, numa primeira fase, com o
aumento da procura dirigida às actividades da área de influência e com
o aumento de rendimento dos factores (designadamente do trabalho
envolvido em migrações pendulares diárias com o pólo). Numa
segunda fase, estes efeitos poderão passar por deslocalizações de
actividades, do pólo para a periferia (em virtude do surgimento de
deseconomias de aglomeração no pólo, ou de processos de divisão
espacial do trabalho) e pela difusão da inovação a partir do pólo.
Admitindo que, inicialmente, o desenvolvimento exige fortes
efeitos de polarização, a questão crucial é a de saber se e quando se
verificará o ponto de viragem, sendo normalmente referidas uma visão
mais optimista de Hirschman e uma visão mais pessimista de Myrdal. A
avaliação dos efeitos dos pólos promovidos no contexto das políticas
regionais tende a confirmar a visão mais pessimista de Myrdal, na
medida em que esta avaliação conclui por efeitos reduzidos sobre a
área de influência e limitados a distâncias determinadas pelos
movimentos pendulares diários.
A teoria não nos diz nem o porquê nem como surge o
desenvolvimento apenas em determinados pólos. Frequentemente,
65
admite-se a existência de pólos naturais constituídos por grandes
cidades. Naturalmente, uma grande cidade poderá conter diversos
complexos dominados por actividades motrizes que lhe garantem um
desenvolvimento auto-sustentado. Por outro lado, uma grande cidade
tenderá sempre a ser um motor de desenvolvimento, em resultado de
ser:
- Um espaço de optimização da divisão de trabalho;
- Um espaço de fortes interacções económicas, sociais e culturais
que facilitam o surgimento da inovação;
- Uma área de fraco controlo social que facilita comportamentos
inovadores;
- Um nó essencial na difusão espacial da informação e da
inovação;
- Uma concentração de procura que assegura limiares na fase de
lançamento de novos produtos;
- Uma concentração de capital social e de saber, respondendo às
necessidades das actividades produtivas;
- Um foco de economias externas (economias de aglomeração)
implicando vantagens competitivas das empresas.
As grandes cidades têm, normalmente, este carácter propulsor
dos respectivos territórios, mas apenas na medida em que são lugares
onde surgem e se concentram actividades dinâmicas e motrizes.
O interesse despertado pela ideia dos pólos de desenvolvimento e
a aparente operacionalidade através do conceito de complexo industrial
levaram a que se tivessem generalizado, a partir da década de 60,
experiências de política regional visando criar pólos em regiões cujo
desenvolvimento se pretendia desenvolver. No geral, tratou-se de
promover, por iniciativa pública, a criação de um grande complexo à
As cidades e os pólos dedesenvolvimento
A teoria dos pólos dedesenvolvimento e a políticaeconómica
66
volta de uma indústria que se previa de elevado crescimento e de
concentrar, numa área limitada, importantes investimentos em
infraestruturas e equipamentos que criassem factores de atracção de
novas empresas e, por essa aglomeração, promovessem a inovação e o
desenvolvimento de novas actividades.
A política de pólos de desenvolvimento não tem, pelo menos na
Europa, uma imagem de sucesso. Isso deve-se a erros de previsão
(apostas em indústrias que não confirmaram as expectativas de
crescimento) e à insuficiência de meios que lhe foram afectados. Com
efeito, tendo os investimentos começado a atingir montantes (por
vezes duas ou três vezes superiores ao inicialmente programado) os
projectos foram revistos ou abandonados, ficando aquém dos limiares
que poderiam despoletar os efeitos pretendidos.
Já na década de 80 veio a encontrar algum acolhimento a noção
de pólo de desenvolvimento tecnológico, em que a actividade motriz
resulta da integração de actividades de tecnologia avançada
(investigação e inovação) com actividades industriais ou de serviços,
por via da acção mais ou menos esclarecida dos respectivos
empreendedores. O maior ou menor êxito das políticas baseadas na
promoção de pólos tecnológicos depende, em larga medida, da
possibilidade de entre aquelas actividades se poder realizar uma
verdadeira integração e não mera justaposição20.
Apesar da avaliação pouco positiva a noção de pólo de
desenvolvimento continua a apresentar-se como válida para a
promoção do desenvolvimento regional, quer em termos teóricos, quer
para a formulação das políticas.
A eficácia da política depólos de desenvolvimento
Os pólos tecnológicos
As leituras, apesar de tudo,possíveis
67
Em termos teóricos, porque sendo inquestionável o
desenvolvimento polarizado no sentido de Perroux (no espaço
sectorial), os pólos de desenvolvimento sectoriais terão
necessariamente uma projecção territorial. Só que esta projecção
geográfica da noção de pólo de Perroux já não aponta para a
concentração num determinado centro, mas para uma organização
territorial em vários centros complementares. As novas condições de
mobilidade, as possibilidades de disjunção espacial de funções, a teoria
da divisão espacial do trabalho, tudo aponta para que os pólos de
desenvolvimento sejam vistos na perspectiva da sua estruturação
sobre uma rede de centros. As ideias de organização das cidades em
rede ganham, assim, um novo conteúdo.
Em termos de política, porque continua a justificar-se uma
concentração territorial de intervenções e, sobretudo, porque para o
desenvolvimento regional é decisiva a capacidade inovadora de alguns
pontos singulares, em particular da rede urbana e de sistemas urbanos
territoriais.
3.4.3. Os eixos de desenvolvimento
Eixos de comunicação e desenvolvimento económico é o título
de um artigo publicado por P. Pottier (1963) e que constitui a
referência do que normalmente é conhecido por teoria dos eixos de
desenvolvimento.
20 Um bom exercício de reflexão pode tomar como referência o Tagus Park
em Oeiras.
68
Os eixos de desenvolvimento não explicam apenas as linhas
privilegiadas de propagação do desenvolvimento, mas integram,
também, a referência a factores específicos geradores de
desenvolvimento.
O eixo de comunicação distingue-se de uma simples via de
comunicação e, segundo Pottier, envolve três componentes:
a) Um itinerário , espaço natural onde é fácil passar, região ou
conjunto de regiões que estabelecem ligações inter-regionais
ou internacionais; sendo um espaço de aptidão natural a
concentrar movimentos é, também, uma cadeia de
localizações e aglomerações humanas importantes; a
localização de pólos nas extremidades reforça a circulação ao
longo do itinerário;
b) Uma infra-estrutura complexa de comunicações justapondo,
frequentemente, as diferentes técnicas de transporte, ao longo
da história e os diversos modos de transporte;
c) Uma corrente de circulação, de homens e de coisas.
A combinação destas três componentes que se reforçam
mutuamente transformam um eixo de comunicação em eixo de
desenvolvimento. E para isso, cada uma das componente é essencial.
O eixo de comunicação tem um duplo papel como factor de
desenvolvimento. Por um lado, é um agente de impulsão e, por outro,
um vector de propagação do desenvolvimento.
Os efeitos de impulsão surgem associados a quatro elementos
principais: os impulsos resultantes da construção de uma nova infra-
estrutura; os impulsos resultantes do abaixamento dos custos de
O conteúdo dos eixos dedesenvolvimento
As componentes dos eixos decomunicação
Os efeitos dos eixos decomunicação
Os elementos dos efeitos deimpulsão
69
transporte; os impulsos provocados pela expansão da procura nas
regiões de passagem e os impulsos ligados à difusão da informação.
1. Impulsos resultantes da construção de uma nova infra-
estrutura
A construção sucessiva de diferentes e novas infraestruturas
representa uma concentração de investimentos públicos. Os efeitos
multiplicadores serão particularmente importantes na fase de
construção. Esses efeitos poderão estender-se a outras regiões.
Note-se que o efeito desestruturador das actividades locais
(encarecimento dos factores, estímulo à migração da mão-de-obra uma
vez finalizados os trabalhos, etc.), frequentemente referidos como
consequência dos grandes trabalhos públicos se encontram aqui
minimizados pelas características do itinerário (cadeia de localização e
aglomerações humanas importantes).
A construção da infra-estrutura vai permitir a circulação de
novos modos de transporte que, por sua vez, vai induzir o surgimento
de novas actividades de transporte e de novas actividades de suporte
(produção de veículos, reparação, assistência aos viajantes) ou
complementares ( actividades de logística).
2. Impulsos resultantes do abaixamento dos custos de
transporte
Este efeito é de natureza tripla. Em primeiro lugar, a redução dos
custos de transporte alarga as áreas de mercado, o que vai permitir
maiores economias de escala. Relembre-se que já Adam Smith refere
que as áreas litorais por terem acesso a uma via de transporte muito
mais barata (no seu tempo) tinham vantagem no que respeita à divisão
de trabalho. Em segundo lugar, o alargamento das áreas de mercado
Na construção da infra-estrutura
Resultantes da baixa doscustos de transporte
70
permite, também, a obtenção de limiares mínimos para outras
actividades que antes não tinham condições de sobrevivência.
Em terceiro lugar, a redução dos custos de transporte, facilitando
as interdependências, facilita as especializações regionais e possibilita
vantagens competitivas das empresas através de novas estratégias de
organização empresarial. Em contrapartida, pode levar ao
desaparecimento das empresas (das regiões) mais frágeis que deixaram
de estar protegidas pela distância.
3. Impulsos provocados pela expansão da procura nas
regiões de passagem
Este impulsos resultam da necessidade de resposta à procura dos
viajantes e à possibilidade de estes fluxos contribuirem para valorizar
determinados recursos locais (património, paisagem, etc) sobretudo,
na perspectiva turística.
4. Impulsos ligados à difusão da informação
É bem conhecido o papel da informação no desenvolvimento. Ela
é factor de inovação e progresso técnico e de iniciativa empresarial.
Os modelos de difusão de informação, ao relevarem o diálogo e
os contactos interpessoais, evidenciam bem a importância dos fluxos
de pessoas e bens nesse processo de difusão. Acresce que, ao longo de
um eixo de comunicação, se maximiza a exposição à informação de
diferentes origens e natureza.
O segundo papel dos eixos de comunicação exerce-se como
vector de propagação de desenvolvimento. O que aqui esta em causa
não é qualquer tipo de adição à actividade económica, mas apenas o
impacte do eixo de comunicação na forma como a mesma de distribui
Que são consequência daexpansão da procura
Ligados à difusão deinformação
Os eixos de comunicaçãocomo vector de propagação
do desenvolvimento
71
no território. Estes efeitos estão ligados, por um lado, à teoria da
localização e, por outro, à teoria da renda fundiária.
No que respeita aos impactes sobre a localização, importa
considerar três aspectos:
1. A teoria da localização industrial identifica como pontos de
localização potencialmente preferenciais, para uma indústria
que procura minimizar os custos de transporte, o mercado, as
fontes de matérias primas, os pontos de transbordo e os nós
de vias de comunicação; pela sua natureza o eixo de
comunicação gera, ao longo dele, múltiplos daqueles pontos,
capazes de virem a ser seleccionados como a localização das
novas empresas ou como opções para a relocalização de
empresas existentes;
2. Um efeito provável de uma nova via de comunicação é o de
atrair para a sua proximidade (área de influência) actividades
das áreas marginais, não servidas; as actividades nestas
últimas áreas poderão não sobreviver face à concorrência de
empresas que, tendo acesso directo a novas vias de
comunicação, podem usufruir de custos mais baixos
(concentração linear das actividades);
3. O acréscimo de acessibilidade ao longo do eixo permite
diferentes escolhas residenciais pelas famílias e modifica a
distribuição espacial dos centros prestadores de serviços
(confrontar com a teoria dos lugares centrais de Christaller).
Os impactes através do mecanismo da renda fundiária
exercem-se, sobretudo, na distribuição das actividades agrícolas. Ao
longo do eixo as actividades agrícolas mais modernas e intensivas
Os impactes sobre alocalização
Os impactes sobre a rendafundiária
72
atingem maiores distâncias e todas as produções podem ser
rentavelmente produzidas em áreas mais distantes. Este tipo de impacte
exerce-se, também, a nível da organização intra-urbana e nas escolhas
residenciais da população.
Os efeitos de impulsão (criação) e de propagação (distribuição)
tornam os eixos de comunicação (no sentido de Pottier) em eixos de
desenvolvimento, os quais, na terminologia daquele autor, traduzem a
linearização do desenvolvimento económico. Insista-se, porém, que a
concepção de eixo de comunicação com que estamos a tratar é
distinta das infraestruturas de transporte.
É, hoje, geralmente, aceite que as infraestruturas de transportes
(rodovia, ferrovia, etc.), por mais modernas que sejam, não bastam, só
por si, para criar um eixo de desenvolvimento. Quando muito, as
infraestruturas, sem o itinerário actuarão apenas a nível dos efeitos de
propagação.
É também consensual que o impacte das infraestruturas de
transporte depende da forma como irrigam as áreas que atravessam.
Há infraestruturas ( auto-estrada, linha férrea de alta velocidade) que
têm natureza de tubo com os seus efeitos a fazerem-se sentir apenas
nas extremidades ou na envolvente dos nós ou das gares centrais. A
capilaridade das redes (vias de serviço ás áreas envolventes) é tão
importante como a capacidade das grande infraestruturas.
Um eixo de desenvolvimento pressupõe um itinerário (cadeia de
localizações e aglomerações humanas) e fluxos potenciais. É por isso
que a teoria dos eixos de desenvolvimento, apesar da sua capacidade
explicativa, tem pouca eficácia em termos de política, na medida em
que, geralmente, apenas sabemos actuar sobre uma das componentes
do conceito: a infra-estrutura.
A suficiência da construçãode infra-estruturas de
transporte
As vias de transporte e osefeitos de capilaridade
73
3.4.4. Os distritos industriais e o desenvolvimento territorial
Trata-se de uma abordagem do desenvolvimento que se insere
nos quadros conceptuais (e doutrinários) do desenvolvimento
regional endógeno ou do desenvolvimento territorial.
Nas abordagens territoriais do desenvolvimento a terminologia
não está ainda suficientemente estabilizada. O conceito de distrito
industrial de Marshall surge, hoje, muito confundido com o de sistema
produtivo local 21 .
A ideia central de todas estas abordagens é a de que o
desenvolvimento resulta da exploração dos recursos e das estruturas
sócio-culturais e organizativas locais. No desenvolvimento são
determinantes as características do meio. Segundo Marshall, os
segredos da indústria estão no ar que se respira. Os determinantes do
desenvolvimento local são as relações sociais e económicas e as
relações entre as empresas.
Garofoli (1992) explicita as características mais importantes de
um sistema produtivo local (sistema de pequenas empresas):
a) Uma forte especialização produtiva a nível local sobre
diferentes segmentos e sectores que gravitam à volta de uma
produção típica e fundamental da economia local;
b) Uma produção suficientemente importante para ter significado
em termos nacionais ou internacionais;
21 Uma apresentação genérica destas abordagens pode encontrar-se em Furió
(1996). Uma visão mais ampla dos novos paradigmas da geografia económicaencontra-se em Benko e Lipietz (1992).
A ausência de terminologiaestabilizada
As características de umsistema produtivo local
74
c) Uma divisão avançada do trabalho entre as empresas, dado
lugar a uma densa rede de interdependências produtiva;
d) Uma multiplicidade de empresas, sem existência de uma
empresa líder ou dominante, preservando a igualdade entre as
empresas envolvidas no processo de sub - contratação;
e) Um impulso a favor da especialização produtiva a nível da
empresa, estimulando a acumulação de competências
específicas e a introdução de novas tecnologias;
f) A formação progressiva de um sistema de informação eficaz,
apoiado informalmente nas relações de interdependência das
empresas, mas assegurando uma ampla e rápida circulação de
informação;
g) Competência dos trabalhadores resultantes da sedimentação
histórica de conhecimentos do produto e das técnicas;
h) Difusão das relações cara-a-cara entre os operadores locais
favorecendo a transmissão em cascata das melhorias
tecnológicas e organizativas e estabelecendo as relações
empresariais numa base de confiança e de empenho pessoais;
i) Uma forte coesão social e contínua mobilidade social.
Este conjunto de características favorece a inovação e a
competitividade do sistema produtivo local e, sobretudo, estimula o
surgimento de novo empresariado e a renovação das empresas. O
sistema estimula, o aparecimento de economias externas à empresa, a
divisão de trabalho, a inovação tecnológica e a cooperação entre as
empresas. O sistema produtivo local reúne, assim, um conjunto de
factores de sustentabilidade de desenvolvimento para o que são
estratégicos a inovação tecnológico - organizativa, o sistema de
O sistema produtivo localcria condições de
sustentabilidade para odesenvolvimento
75
informação, a capacidade de controlo de mercado e os mecanismos de
regulação social (Garofoli, 1992) combinando, de forma criativa,
concorrência e cooperação.
Para estas abordagens é determinante a relação entre as empresas
e o território. O território pode mesmo constituír um factor essencial
de desenvolvimento da empresa, nomeadamente quando o meio é
inovador (Julien e Marchesnay, 1996, pág. 89). Para estes autores,
para que um meio seja inovador é necessário que exista:
a) Troca de informação, estruturada em redes mais ou menos
formais que favorecem novas oportunidades de negócio; o
meio permite avaliar a informação, quer na base da
confiança, quer pela possibilidade de contra-verificar essa
informação;
b) Uma concertação relativamente sistemática entre diferentes
empresas com competências diversas. O meio desenvolve,
assim, um espaço de transacções a baixo custo, suportado
por uma identidade colectiva que garante a coerência do
território e uma solidariedade territorial, dando origem a
relações de cooperação-concorrência.
c) O desenvolvimento de uma cultura técnica, baseada na
partilha do conhecimento e do saber, criando um processo de
aprendizagem e inovação colectiva.
A presença de empresas inovadoras e de centros de inovação e
transferência de tecnologia é, evidentemente, condição fundamental,
mas não suficientes, para que estejamos em presença de um meio
inovador.
As condições para que ummeio seja inovador
76
Estas abordagens enfatizam as características do meio como
determinantes do desenvolvimento. Mas essas características têm
raízes na história e resultam de uma combinação complexa de
diferentes subsistemas que compõem o território: subsistemas humano,
cultural, tecnológico, económico, espacial, político e ecológico (Furió,
1996).
Estas características não são facilmente reprodutíveis ou
induzidas, pelo que a política regional tradicional surge desvalorizada.
A qualidade do meio (infraestruturas, recursos humanos,
conhecimento, ambiente) e a comunidade local passam a ser factores
determinantes e as política orientam-se preferencialmente para a
inovação, a formação e a promoção do espírito empresarial. Os
factores imateriais do desenvolvimento ganham todo o relevo nas
abordagens do desenvolvimento territorial.
As abordagens territorialistas tendem a enfatizar o papel das
pequenas e médias empresas independentes e as redes que elas
constituem, opondo um modelo de especialização flexível ao modelo
fordista de organização da produção. Mas nos espaços que serviram de
modelo a este novo paradigma as coisas parecem estar a mudar no
sentido de, pela via de aquisições de empresas, se constituírem
oligopólios e se promover uma integração vertical que facilite a
resposta aos desafios da globalização.
Como nota final, refira-se que se fez uma passagem rápida por
diversas abordagens teóricas que nos dão uma visão geral do estado da
arte das teorias do desenvolvimento regional. Sem surpresa, constata-
se que continuamos a não dispor de uma resposta satisfatória às
questões formuladas no início. Antes dispomos de diversas respostas
parcelares.
As dificuldades nopreenchimento das
condições
O papel das pequenas emédias empresas
Uma visão do estado da arte
77
A via para prosseguir parece dever passar por uma combinação
de uma abordagem em termos de empresário com o desenvolvimento
da teoria da localização.
As iniciativas empresariais têm uma mobilidade inter-regional
muito reduzida. As novas empresas tendem a localizar-se na região do
seu fundador. Deste modo, a questão central para compreender o
desenvolvimento regional é a de perceber os factores que fazem com
que alguns espaços sejam capazes de gerar, reter e atrair uma grande
proporção de iniciativas empresariais.
Essa questão levar-nos-ia, primeiro, a reflectir sobre as funções
do empresário, destacando as relacionadas com a formulação de um
projecto, com a organização dos meios de produção, e, sobretudo,
com a organização de um mercado. Depois, estaria em causa
perceber a forma como os territórios influenciariam a capacidade de
exercício destas funções. A informação, o saber-fazer, os modelos a
imitar e a capacidade de suportar o insucesso seriam, entre outros, os
factores a ter em conta.
As abordagens territorialistas têm tocado alguns destes pontos,
mas estão bloqueadas, por um lado, pelo deslumbramento com a
pequena escala e, por outro, com uma metodologia indutiva que,
dificilmente, pode ir além de descrições.
Recentemente, o empresário tem vindo a reaparecer na teoria
económica. Torna-se necessário introduzi-lo nos modelos de
desenvolvimento regional se quisermos ir além dos modelos de que
dispomos e que são, pelo menos os mais sofisticados, simples modelos
de distribuição regional do crescimento.
Hoje a questão fundamentalparece orientar-se no sentidode se saber como se atrai ese sustenta a iniciativaempresarial
78
3.5. PRINCÍPIOS DE POLÍTICA COMUNITÁRIA PARA O
ESPAÇO
A existência de grandes disparidades de desenvolvimento
territorial no seio da Comunidade Europeia justificou a criação de um
objectivo de política comunitária - a coesão económico-social. Este
objectivo veio progressivamente configurar a existência de uma política
regional comunitária, a que se pretendeu dar resposta através das
chamadas Acções Estruturais que são sustentadas em fundos de
financiamento designados por Fundos Estruturais (FE) e pelo Fundo de
Coesão (FC)22.
A Política Regional não é a única política comunitária. Desde os
tempos da CECA23, que se procurou definir políticas comuns para os
mercados do carvão e do aço, que permitissem à Europa competir em
economias de escala com os EUA e o Japão. Logo desde o Tratado de
Roma em 1957, o comércio, a agricultura e a concorrência ficaram
consignados como domínios de política comunitária. Com o
aprofundamento da integração, as políticas comunitárias, em maior ou
menor escala, alargaram-se progressivamente a outros domínios, tais
como, o emprego, o social, as pescas, a investigação científica, os
transportes, as telecomunicações, a energia, o ambiente e a
competitividade.
Actualmente, entre muitas dificuldades de consenso, que de resto
não estiveram sempre arredadas dos anteriores passos de
22 Este último só a partir de 1993, como se verá adiante.
Uma política de coesãoeconómico - social
A multiplicidade de políticascom natureza estrutural
79
aprofundamento da integração, perspectivam-se outros domínios,
visando uma integração política de carácter supra-económico: políticas
externa, de defesa e social.
Em termos de afectação de meios financeiros, a Política Agrícola
Comum (PAC) e as Acções Estruturais (AE) são largamente
dominantes, absorvendo cerca de 80% dos recursos próprios da
Comissão Europeia, como o mostram os números que referiremos
seguidamente.
A política agrícola tem absorvido a maior fatia dos recursos
financeiros da Comunidade, embora tenha vindo a perder peso: em
1988 absorveu 60,7%, em 1993 esse valor situou-se nos 50,9% e a
previsão para 1999 é de 45,7%. A partir de 2000 esta tendência deverá
acentuar-se. A parcela da PAC passará de 39,8% em 2000 para 34,8%
em 2006, embora o total das verbas destinadas à agricultura, incluindo
o desenvolvimento rural que passa a estar inscrito na política agrícola,
devam ascender a 44,5% em 2000 e a 38,9% em 2006.
O conjunto dos FE e do FC corresponde à segunda aplicação
mais importante de recursos da Comunidade. Em 1988 absorveu
19,6% dos recursos, parcela que em 1993 ascendeu aos 30,8% e que
em 1999 deverá ter atingido o seu valor máximo - 36,1%. As previsões
para 2000 e 2006 são, respectivamente, 34,8 e 27,3%.
Os meios financeiros libertados pela redução dos pesos da PAC e
das AE a partir de 2000 vão, maioritariamente, para as ajudas pré-
adesão e para as despesas com o alargamento da UE a 12 prováveis
novos membros. Entre 2000 e 2006, estas despesas passam de 3,4 para
18,6% dos recursos totais da Comunidade.
23 Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, anterior à CEE (Comunidade
O volume dos recursosenvolvidos
80
Salienta-se que, não tendo a UE capacidade tributária própria, o
seu orçamento, que não deve exceder os 1,27% do PIB comunitário, é
quase exclusivamente financiado pelos Estados membros, na sua maior
parte através de determinadas percentagens do IVA, do PNB e dos
direitos aduaneiros (em 1996, cerca de 97% das receitas, líquidas dos
saldos transitados dos anos anteriores).
3.5.1. As origens e evolução da política regional europeia
As disparidades de desenvolvimento espacial no seio da União
Europeia - UE, constituíram desde a sua fundação uma realidade e uma
fonte de preocupação política a nível comunitário. Efectivamente, logo
em 1957, quando a Comunidade foi constituída pelos seis países
fundadores24, o Tratado de Roma assumia um princípio de coesão
económica e social ao estipular que a Comunidade deveria assegurar
um desenvolvimento harmonioso reduzindo as disparidades regionais
de desenvolvimento através da recuperação dos atrasos das regiões
menos desenvolvidas.
Todavia, só em 1975 com a criação do Fundo Europeu para o
Desenvolvimento Regional (FEDER), é que essa preocupação se veio
a materializar em apoios concretos às políticas regionais dos Estados
membros, através de um sistema de quotas que visava compensar os
países com contributos para o orçamento comunitário acima da média.
Os apoios eram conferidos às regiões indicadas pelos Estados membros
e visavam programas de desenvolvimento regional definidos às escala
nacional.
Económica Europeia).
24 Alemanha, Bélgica, França, Holanda, Itália e Luxemburgo.
As referências do Tratado deRoma
A criação do FEDER
81
Só nos finais dos anos 7025 se começou a configurar uma política
regional propriamente europeia, ao definir-se uma percentagem de 5%
do FEDER a ser atribuída, independentemente das quotas dos Estados,
por decisão unânime do Conselho de Ministros da Comunidade,
através da aprovação de programas e iniciativas comuns de
desenvolvimento regional. Em 1984 houve uma tentativa de
aprofundar a política regional comunitária alargando a componente do
FEDER de atribuição independente das quotas nacionais, a qual não
recolheu o acordo unânime dos Estados membros.
Só em 198826, com a chamada reforma dos FE27, é que se
configurou uma verdadeira política regional europeia. Efectivamente,
os alargamentos sucessivos, sobretudo os últimos, vieram a agravar as
disparidades territoriais de desenvolvimento na Comunidade, ao
mesmo tempo que se decidia um passo decisivo no aprofundamento da
integração europeia - a realização do Mercado Único, o qual era
susceptível de gerar perturbações na consecução do objectivo da
coesão.
Efectivamente, com a abertura total de fronteiras, preconizada
pelo Mercado Único, pretendeu-se eliminar todas as barreiras políticas
e administrativas à livre circulação de produtos e de factores
produtivos no espaço comunitário ainda existentes (controles
aduaneiros, normas técnicas de especificação dos produtos, reservas de
quotas nacionais nas grandes obras públicas, não liberdade total de
25 Quando a Comunidade já contava com nove Estados membros, após o seu
alargamento à Irlanda, Grã-Bretanha e Dinamarca.26 Com a Comunidade alargada a doze membros, primeiro com a adesão da
Grécia e, depois, com as adesões simultâneas de Portugal e Espanha.
O aparecimento de umapolítica à escala da Europa
A primeira reforma dosFundos Estruturais
82
instalação nos mercados financeiros, etc). As reformas decididas em
1988 para a realização do Mercado Único deveriam estar integralmente
adoptadas em 1 de Janeiro de 1993 por todos os Estados membros.
Neste contexto, a reforma da política regional europeia visou
dotar a Comunidade com instrumentos de política que se destinavam a
apoiar os países e regiões menos desenvolvidos ou com maiores
problemas de desemprego e de declínio económico, a prepararem-se
para o embate competitivo resultante da abertura de fronteiras.
Deste modo, para o período de programação decorrente entre
1989 e 1993, a política regional passou a contar pela primeira vez com
financiamentos de todos os fundos comunitários e a assentar num
conjunto de princípios visando torná-la mais eficaz, entre outros,
definição de objectivos adaptados às diversas problemáticas regionais
de desenvolvimento, preparação de planos de desenvolvimento pelos
Estados membros, desenvolvimento da parceria entre a Comunidade e
as autoridades nacionais, regionais e locais na gestão dos apoios, e
compatibilidade entre as diferentes políticas comunitárias.
Em termos financeiros, esta reforma resultou numa duplicação
do esforço financeiro com os FE, que passaram de 6,3 milhares de
milhões de ECU’s em 1987 para 14,1 milhares de milhões de ECU’s
em 1989, afectados de forma a garantir a duplicação dos apoios às
regiões subdesenvolvidas.
Em 1993, com a decisão de criação da União Monetária28
(substituição das moedas nacionais por uma moeda única europeia) foi
27 Que para além do FEDER, incluíam o FSE (Fundo Social Europeu) e o
FEOGA-O (Fundo Europeu de Garantia e Orientação Agrícola - ComponenteOrientação).
28 No âmbito do Tratado de Maastricht.
O objectivo do aumento dacapacidade competitiva das
regiões
A política regional e amobilização do conjunto dos
Fundos Estruturais
Os volumes financeirosenvolvidos
A segunda reforma dosFundos Estruturais e a
criação da União Monetária
83
decidida nova reforma dos FE visando apoiar os países e regiões
economicamente mais débeis, para o esforço de convergência nominal
e real necessário para estarem aptos a aderir à moeda única29 e a
suportar os embates negativos resultantes da concorrência acrescida.
Efectivamente, com a moeda única eliminavam-se os últimos entraves
significativos ao comércio entre países da comunidade - as taxas de
câmbio, que eram habitualmente usadas pelos países menos
desenvolvidos como instrumento macro-económico de defesa da
competitividade das suas economias30. Da realização conjunta do
Mercado Único e da Moeda Única, resultou a União Económica e
Monetária, que conferiu à Comunidade a designação de União
Europeia (UE).
Com esta reforma, que configurou as condições de
implementação da política regional entre 1994 e 1999, houve novo
reforço substancial de recursos financeiros afectos aos FE, incluindo a
criação de um novo instrumento financeiro: o IFOP (Instrumento
Financeiro de Orientação das Pescas). No conjunto, FE e IFOP,
ficaram com uma dotação de 141,5 milhares de milhões de ECU’s31
para todo o período, comparativamente aos 43,8 correspondentes ao
período de programação anterior. Simultaneamente, foi criado um
29 A adesão do primeiro grupo de países à moeda única processou-se em
1998, sucedendo-se um período de transição que culminará em 2002 com a retiradade circulação das moedas nacionais daqueles países.
30 Já antes da adesão formal, que os países candidatos ao integrarem-se nosistema monetário europeu, viram as suas possibilidades de variação cambiallimitadas a uma banda restrita, perdendo assim as possibilidades de recurso efectivoà desvalorização.
31 A preços de 1992. A preços de 1999 a dotação é de 207,2 milhares demilhões de EUROS (BEUROS), correspondentes a uma média anual de 34,5BEUROS. Salienta-se que, de acordo com a decisão de fixação das taxas deconversão do EURO, estabeleceu-se uma paridade unitária com o ECU: 1 EURO =1 ECU.
Os novos volumesfinanceiros mobilizados
84
novo fundo, o Fundo de Coesão32, com uma dotação de 15,15 milhares
de milhões de ECU’s a preços de 1992.
Finalmente, em 1999 no âmbito da chamada Agenda 2000, a UE
decidiu nova reforma dos Fundos Estruturais e um novo período de
programação para os anos 2000 a 2006. Esta nova reforma decorreu
sob um signo bastante diferente do das duas últimas reformas, quer a
nível da UE, quer a nível dos Estados Membros. Face aos problemas
da globalização e às transformações na Europa de leste, a UE passou a
enfrentar alguns novos desafios.
Um desses grandes desafios é o alargamento da União para
alguns países do leste europeu e do Mediterrâneo. Há doze países
candidatos à adesão. Este alargamento, ainda que feito de forma
gradual, vai trazer fortes pressões financeiras, na medida em que se
trata de países cujos défices de desenvolvimento em relação à média
comunitária são muito maiores do que os registados em anteriores
adesões de países periféricos (Irlanda, Grécia, Portugal e Espanha).
Simultaneamente, o desafio do aprofundamento da integração,
traduzido na concretização da moeda única, implicou uma grande
responsabilidade macro-económica em termos de contenção de défices
públicos e de taxas de juro, por parte dos países membros do grupo
fundador. Particularmente, os países estruturalmente mais débeis, que
têm sido os maiores beneficiários da política regional33, e que serão
também os mais expostos à concorrência acrescida, reforçaram as suas
pressões no sentido de verem garantidos os apoios necessários para
fazerem face à nova situação.
32 Com um período de programação compreendido entre 1993 e 1999.33 Embora não estejam entre os mais beneficiados nas restantes políticas
comunitárias, principalmente a PAC.
Uma nova reforma dos F.E.face aos novos desafios
Um novo alargamento daU.E
O aprofundamento daintegração
O reforço da coesãoeconómica e social
85
Aos desafios anteriores acresce-se o do reforço da coesão em
novas dimensões. A par da coesão inter-regional, a ocorrência de
graves problemas de desemprego nalguns dos países mais ricos da UE
reforça a necessidade de coesão social interna. Deste modo,
pressionaram o desvio de recursos para as políticas sociais e de
emprego com que pretendem atacar esses problemas, e, sobretudo,
tendo em conta que são também os países contribuintes líquidos da
UE, impediram quaisquer veleidades no sentido do aumento dos seus
contributos para o orçamento comunitário libertando assim recursos
nacionais para fazer face a problemas internos.
A reforma das políticas estruturais surgiu, assim, como uma
necessidade iniludível, tanto mais que, não só as necessidades em
termos da coesão económica e social estão a sofrer grandes
transformações, como se coloca a necessidade de políticas mais activas
da UE em domínios como a competitividade e a defesa.
Neste contexto, a reforma dos fundos estruturais no âmbito da
Agenda 2000 orientou-se segundo alguns princípios que se
explicitavam já no 1º Relatório Europeu da Coesão Económica e
Social, editado no final de 1996:
- A reafirmação da necessidade permanente das políticas europeias
da coesão (económica, social e política), sublinhando, a par da
coesão inter-regional, a necessidade de reforço da coesão social
interna dos países pelo combate ao desemprego e à exclusão social;
- A necessidade de aumentar a eficácia dos fundos, em termos de
reforço da sua concentração geográfica e financeira, o que se
traduziu na redução do número de objectivos determinantes das
elegibilidades regionais e no estabelecimento de limites
populacionais mais severos relativos a essas elegibilidades;
Os princípios orientadoresda nova reforma dos F.E.
86
- Maior orientação da atribuição das ajudas pelos resultados, seja em
termos da capacidade de absorção revelada34, seja colocando aos
Estados membros a necessidade de assunção efectiva das suas
contrapartidas, nomeadamente em termos da despesa privada;
- Melhor engenharia financeira, através de um maior recurso, aos
empréstimos do BEI e de outras fontes, às participações de capital
do Fundo Europeu de Investimento e às participações de capitais
privados através do estabelecimento de parcerias com as
administrações públicas;
- Aprofundamento da subsidiariedade e da parceria35, nomeadamente
estendendo-as a acções de intervenção mais efectiva,
nomeadamente, no que se refere ao combate ao desemprego, pela
instituição de Pactos Territoriais de Emprego.
Os desafios relevados para as políticas a implementar com os
fundos estruturais, apontaram, assim, para a consideração dos
seguintes domínios de intervenção como prioritários:
O emprego, apoiando a valorização dos recursos humanos e a
criação de postos de trabalho;
A competitividade, através do aumento da produtividade das
empresas por via da sua modernização, da investigação e
desenvolvimento tecnológico e do investimento nas infra-estruturas
de apoio que visem diminuir os custos de distância (incluindo as
34 As taxas de utilização (absorção) dos fundos postos à disposição dos
Estados membros são muito variadas. Os créditos outorgados a países com baixastaxas de execução financeira dos seus QCA constituem um desperdício, quedificulta a gestão orçamental da UE.
35 Cujos significados explicitaremos adiante.
87
redes transeuropeias e a definição de um novo esquema de
ordenamento do território europeu);
A protecção do ambiente, tendo em vista um desenvolvimento
sustentável do ponto de vista dos recursos não renováveis;
A igualdade de oportunidades entre homens e mulheres.
As novas necessidades políticas, mesmo apelando para uma
maior eficiência no uso dos recursos, poderiam ter-se traduzido num
reforço dos meios financeiros respectivos, tanto mais quanto o embate
da União Monetária sobre os países menos desenvolvidos é mais
profundo do que o embate do Mercado Único. No entanto,
confrontados com a disciplina orçamental do EURO e com problemas
internos, a nível de emprego e de modernização produtiva, os Estados
Membros contribuintes líquidos do orçamento comunitário fizeram
prevalecer a contenção orçamental e a redefinição de prioridades.
Deste modo, manteve-se o orçamento comunitário ao nível dos
1,27% do PIB comunitário36, pelo que o total dos recursos deverá
crescer apenas ao ritmo do crescimento do próprio PIB. Todavia, a sua
afectação, como referimos já na Introdução a este texto, sofre grandes
alterações com a desvalorização das quotas afectas à agricultura e às
acções estruturais, sendo as verbas libertadas destinadas
maioritariamente às despesas com o alargamento da União para a
Europa de Leste e para a margem norte do Mediterrâneo.
A programação plurianual, decidida na cimeira de Berlim em
Março de 1999, previu uma dotação, a preços de 1999, de 213
36 Especialmente os países do sul ainda apresentaram reivindicações de
elevação da despesa comunitária acima do tecto dos 1,27% do PIB, como forma desatisfazer as novas necessidades assistenciais.
A contenção orçamental e aredefinição de prioridades
88
milhares de milhões de EUROS (BEUROS37) para as Acções
Estruturais, dos quais, 195 BEUROS para os FE e 18 para o FC.
Tendo em conta que este período de programação é de sete anos, a
média anual das acções estruturais é de 30,4 BEUROS, inferior à
dotação média anual do período anterior, que, como vimos
anteriormente, for a de 34,5 BEUROS.
Porque se trata da estrutura de políticas que está actualmente em
vigor, iremos tratá-la de forma detalhada na secção seguinte.
3.5.2. A estrutura actual das Acções Estruturais e da política
regional
Como vimos anteriormente, a política regional europeia, visa
essencialmente a salvaguarda da coesão económica e social no espaço
comunitário, preparando os países / regiões menos desenvolvidos para
os embates concorrenciais da integração económica e política. O
aprofundamento acentuado das disparidades de desenvolvimento
tenderia a constituir um factor de desintegração, levando os países e
regiões mais penalizados a procurarem implementar medidas
individuais de defesa em relação à concorrência movida pelos espaços
mais desenvolvidos.
Ainda que de forma implícita, a Política Regional constitui
também um factor de alargamento económico do mercado interno.
Efectivamente, as ajudas aos países e regiões menos desenvolvidos vão
criar, directa e indirectamente, condições para o aumento da produção
comunitária:
37 Notação adoptada nos documentos comunitários, que, por comodidade,
A coesão económico-social ea concorrência
O efeito de alargamento domercado interno
89
Directamente, porque os investimentos apoiados vão produzir, em
grande medida, procura de bens e serviços comunitários;
Indirectamente, porque do aumento global dos níveis de vida,
resulta maior volume de despesas de consumo, estimulador de
maior produção comunitária38.
O alargamento do mercado interno contribui para o aumento da
escala das actividades produtivas, permitindo assim ganhos de
eficiência.
Neste contexto, a política regional assume-se hoje como um
conjunto de políticas estruturais e da coesão, inseridas nas chamadas
Acções Estruturais, mas que não as esgotam. Efectivamente o seu
financiamento é assegurado pelo conjunto de todos os FE, pelo FC e
por outros instrumentos complementares, e assumem explicitamente
um conjunto de objectivos predominantemente de conteúdo regional
intrínseco. Mas algumas das intervenções apoiadas por aqueles fundos
e instrumentos financeiros no âmbito das acções estruturais visam,
sobretudo, objectivos de ordem sectorial (nomeadamente, a
agricultura, as pescas e o emprego), embora possam ter incidências
regionais diversificadas.
Os instrumentos de financiamento das políticas estruturais e da
coesão podem agrupar-se em dois grandes grupos:
passaremos a utilizar neste texto.
38 Estima-se que, em Portugal, cerca de 30% das ajudas retornam aos países
mais desenvolvidos por via daqueles efeitos.
A política regional comoconjunto de políticasestruturais e de coesão
Os instrumentos definanciamento
90
Os que atribuem principalmente apoios a fundo perdido
(subvenções), onde se incluem os Fundos Estruturais (FE) e o
Fundo de Coesão (FC);
Os que concedem empréstimos e garantias39, onde se inserem o
Banco Europeu de Investimentos (BEI), o Fundo Europeu de
Investimento (FEI) e a Comunidade Europeia da Energia Atómica
(EURATOM)40.
Os Fundos Estruturais englobam o FEDER (Fundo Europeu de
Desenvolvimento Regional), o FSE (Fundo Social Europeu), o
FEOGA-O (Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola –
Secção Orientação), e o IFOP (Instrumento Financeiro de Orientação
das Pescas)41, os quais apresentam diferentes objectivos e campos de
aplicação.
O FEDER visa promover a coesão económica e social, através
da correcção dos desequilíbrios regionais e da reconversão das regiões,
e é utilizado no apoio, aos investimentos produtivos que permitam a
criação ou manutenção de empregos duradouros, à criação e
modernização de infra-estruturas, a acções que visem desenvolver o
potencial endógeno das regiões assistidas, e aos investimentos na
educação e saúde nos casos das regiões que, adiante, são designadas
de Objectivo 1. Tem como domínios transversais das acções apoiadas;
a competitividade empresarial, especialmente das PME, a inovação
39 O BEI tem ainda a seu cargo, a gestão do Mecanismo Financeiro do
Espaço Económico Europeu, que abrange os países da União Europeia mais ospaíses da antiga EFTA que não aderiram à UE.
40 O FEI e a EURATOM são designados, nos regulamentos comunitários,por outros instrumentos financeiros.
41 Anteriormente, o IFOP, apesar de se reger por princípios semelhantes, nãoera considerado formalmente como um Fundo Estrutural.
O FEDER
91
tecnológica, a sociedade da informação, o turismo e a cultura, o
ambiente, a igualdade de oportunidades entre sexos e a cooperação
internacional, nomeadamente entre regiões.
O FSE visa promover um elevado nível de emprego, a igualdade
de oportunidades, a melhoria da empregabilidade e da mobilidade
social, o desenvolvimento sustentável e a coesão económica e social. É
utilizado em acções de educação e formação profissional, em ajudas ao
emprego e à actividade por conta própria, na formação pós
universitária e de gestores e técnicos em laboratórios e empresas e no
desenvolvimento de novas possibilidades de emprego, nomeadamente
no sector da economia social.
O FEOGA-O visa o reforço e reorganização das explorações
agrícolas e das respectivas estruturas de transformação e
comercialização, a reconversão de produções e desenvolvimento de
actividades complementares dos agricultores, o desenvolvimento do
tecido social rural, a conservação ambiental e os recursos agrícolas. É
utilizado no apoio a uma multiplicidade de acções visando os
objectivos supra, nomeadamente, acções de regularização dos
mercados, apoio à instalação de jovens agricultores, investimentos
destinados a aumentar a produtividade e a qualidade, a reduzir os
custos de produção e a melhorar os circuitos de comercialização, apoio
ao associativismo agrícola, investimento em infra-estruturas rurais,
renovação e desenvolvimento dos centros rurais e apoio à criação de
actividades geradoras de rendimentos complementares.
O IFOP visa o equilíbrio sustentável entre os recursos haliêuticos
e a sua exploração, a competitividade das empresas do sector das
pescas e aquicultura, a melhoria do abastecimento público e
valorização dos produtos da pesca e aquicultura e a revitalização das
O FSE
O FEOGA-O
O IFOP
92
zonas dependentes dessa actividade. Apoia acções estruturais nos
domínios da renovação e modernização das frotas de pesca,
transformação e comercialização do pescado, sociedades mistas,
ajustamento do esforço de pesca, equipamento dos portos de pesca,
protecção de recursos das zonas costeiras, aquicultura, promoção e
protecção de novos mercados, medidas de carácter socioeconómico,
cessação temporária de actividades, etc..
3.5.3. Os princípios de funcionamento dos Fundos
Estruturais
Os Fundos Estruturais regem-se por cinco princípios essenciais
de funcionamento: concentração de objectivos, complementaridade e
parceria, adicionalidade, compatibilidade e programação.
A concentração de objectivos significa que os fundos estruturais
devem concentrar-se num número limitado de objectivos prioritários.
Uma vez que se trata de objectivos definidores de elegibilidades
geográficas, a concentração de objectivos conduz a uma concentração
geográfica dos apoios. No actual período de programação (2000-2006)
foram definidos três objectivos prioritários42, que se explicitam adiante
O Objectivo 1 - Promover o desenvolvimento e ajustamento
estrutural das regiões em atraso de desenvolvimento, é financiado pelo
FEDER, FSE, FEOGA-O e IFOP. São elegíveis a este objectivo as
regiões de nível NUT II43 com um PIB per capita em paridades de
42 No anterior período de programação havia seis objectivos.43 Para efeitos estatísticos, a Comunidade está dividida em unidades
espaciais segundo uma nomenclatura a 3 níveis: as NUT I, II, e III. No casoportuguês a NUT I corresponde ao país, as NUT II são as cinco regiões de
Os princípios defuncionamento
O princípio da concentração
O objectivo 1
93
poder de compra inferior ao limiar de 75% da média comunitária nos
últimos três anos44, as regiões ultra-periféricas que cumpram aquele
limiar e as regiões de densidade populacional extremamente baixa45.
Cabe à Comissão definir quais são as regiões elegíveis para todo o
período de programação.
O Objectivo 2 – Apoio à reconversão económica e social das
zonas com dificuldades estruturais, em especial as zonas em mutação
socioeconómica nos sectores da indústria e serviços, as zonas rurais em
declínio, as zonas urbanas em dificuldade e as zonas em crise
dependentes da pesca, tem financiamentos do FEDER e do FSE. No
seu conjunto, as zonas apoiadas por este objectivo não podem
representar mais do que 18% da população total da UE, cabendo à
Comissão Europeia estabelecer limites populacionais relativos a cada
Estado Membro.
Dentro dos limites populacionais referidos no parágrafo anterior,
são potencialmente elegíveis a este objectivo46:
- As regiões NUT III sujeitas a mutação socioeconómica na indústria
que, cumulativamente apresentem taxas de desemprego superiores
à média comunitária nos últimos três anos, percentagem do
emprego industrial no emprego total superior à média comunitária
desde 1985, declínio do emprego industrial relativamente a 1985;
planeamento do Continente mais as Regiões Autónomas, as NUT III correspondemaos agrupamentos de concelhos (Dec.-Lei 46/89, de 15/2).
44 Neste caso e nos similares que se seguem, a expressão “últimos três anos”deve entender-se como os três anos mais recentes para os quais, em Março de 1999,se dispunha da informação estatística necessária para a aferição das elegibilidadesgeográficas.
45 Abrangidas pelo anterior objectivo 6, criado com a adesão da Suécia,Finlândia e Áustria, para apoio à Lapónia.
46 Excepto quando o território em causa já for elegível ao objectivo 1, umavez que um território só pode ser elegível a um único dos objectivos 1 e 2.
O objectivo 2
94
- As regiões NUT III em declínio rural, que apresentem densidade
populacional inferior a 100 ou peso do emprego agrícola superior ao
dobro da média comunitária em qualquer ano desde 1985, e taxa de
desemprego superior à média comunitária nos últimos três anos ou
diminuição da população desde 1985;
- As zonas urbanas com taxa de desemprego de longa duração superior à
média comunitária, nível elevado de pobreza, situação ambiental
especialmente degradada, elevada taxa de criminalidade e delinquência ou
baixo de nível de instrução da população;
- As zonas cuja quota de emprego na pesca atinja um nível significativo e
que enfrentem problemas socioeconómicos derivados da reestruturação
daquele sector;
- As zonas contíguas às NUT III industriais ou rurais, ou às NUT II
do objectivo um, que apresentem, respectivamente, problemas de
declínio industrial ou rural, zonas rurais com problemas
socioeconómicos derivados do envelhecimento ou declínio da
população agrícola, e as zonas em risco de enfrentar graves
problemas estruturais ou de desemprego devido à reestruturação de
uma ou mais actividades determinantes nos sectores agrícola,
industrial ou dos serviços.
Cabe à Comissão Europeia, sob proposta de cada Estado
Membro, proceder à elaboração da lista das regiões a apoiar pelo
Objectivo 2 entre 2000 e 2006. Em condições excepcionais, esta lista
pode ser revista em 2003.
O Objectivo 3 – Apoio à adaptação e modernização das
políticas e sistemas de educação, de formação e de emprego, é
financiado pelo FSE. Ao contrário dos objectivos 1 e 2, o objectivo 3
O objectivo 3
95
não comporta elegibilidades regionais específicas. São elegíveis ao
objectivo 3 todas as regiões não abrangidas pelo objectivo 147.
As regiões que no período de programação terminado em 1999
eram consideradas no Objectivo 1 e que, por via do seu
desenvolvimento atingiram o limiar dos 75% do PIB per capita
beneficiam de um regime de apoio transitório (phasing-out), entre
2000 e 2005. Em 2006 aquele apoio transitório manter-se-á, mas na
base de critérios do objectivo 2, o que significa que nesse ano os
apoios serão atribuídos a regiões NUT III englobadas nas regiões NUT
II que deixaram de pertencer ao objectivo 1. Na prática os apoios ao
abrigo deste regime de phasing-out apresentam uma curva cronológica
fortemente descendente, correspondendo, em 2006, a valores
marginais.
As zonas que em 1999 eram abrangidas pelos objectivos 2 e
5b)48 beneficiam também de um regime transitório no período de 2000
a 2006 ao abrigo do actual objectivo 2, complementado com o
FEOGA-Garantia que passou a financiar também o desenvolvimento
rural.
Os 195 BEUROS previstos para os FE entre 2000 e 2006,
repartem-se pelos Objectivos segundo a seguinte estrutura: 69,7% para
o Objectivo 1, 11,5% para o Objectivo 2 e 12,3% para o Objectivo 3.
Por conseguinte as intervenções subordinadas aos objectivos
prioritários absorverão 93,5% do total dos FE. Os restantes 6,5%
47 Tendo em conta as restantes condições de elegibilidade, desde logo se
pode verificar que só os objectivos 2 e 3 podem ser cumuláveis num mesmoterritório.
48 Os anteriores objectivos 2 e 5b reportavam-se, respectivamente, às regiõesem declínio industrial e às regiões rurais em declínio, que agora se agregam noobjectivo 2.
96
repartem-se pelas Iniciativas Comunitárias (5,35%), pelas Acções
Inovadoras e Assistência Técnica (0,65%)49, devendo o restante
(0,5%) abranger intervenções dos FE não compreendidas em qualquer
dos casos anteriores50.
Como se refere anteriormente, as Acções Estruturais da UE
transcendem a noção de política regional, uma vez que abrangem
intervenções e territórios que não se enquadram, em rigor, no âmbito
das políticas regionais. Deste modo, a comparação da importância
financeira atribuída à política regional no contexto das diferentes
políticas comunitárias não pode equiparar-se ao peso financeiro das
referidas Acções Estruturais.
A distribuição dos FE pelos objectivos, permite-nos já fazer uma
avaliação mais aproximada51 dessa importância. Efectivamente, pelo
que vimos nos parágrafos anteriores, o Objectivo 1 corresponde a um
objectivo específico de política regional visando a convergência das
regiões mais atrasadas. As intervenções do Fundo de Coesão podem
perspectivar-se do mesmo modo, embora visando a convergência dos
países mais atrasados à média comunitária. O Objectivo 2 enquadra-se
também na concepção da política regional, embora na sua aplicação à
recuperação de regiões em declínio. Já o Objectivo 3 cobre
intervenções espacialmente horizontais, pois, como vimos, não assenta
a atribuição dos seus apoios em critérios de natureza espacial
específica. Deste modo, não se enquadra intrinsecamente nos
49 Quer neste caso, quer no anterior, trata-se de acções preparadas
directamente pela Comissão Europeia, que abordaremos adiante.50 Caso das intervenções do IFOP fora das regiões Objectivo 1.51 Embora ainda parcial, como veremos adiante.
97
parâmetros da política regional, obedecendo mais a critérios de política
sectorial (emprego).
A complementaridade e a parceria constituem outros dos
princípios essenciais do funcionamento dos FE. A aplicação dos
fundos deve incidir sobre intervenções complementares das acções
nacionais e deve ser feita segundo uma estreita concertação entre a
Comissão Europeia e as autoridades competentes, a nível nacional,
regional e local, designadas pelos Estados membros. Dentro do
respeito pelas competências institucionais, jurídicas e financeiras, de
cada instância, comunitária e do Estado membro, a parceria significa
que as decisões são tomadas por acordo entre as partes. A
complementaridade e a parceria têm importantes implicações nos
modos de financiamento dos projectos, que exigem sempre a
conjugação de fundos comunitários e nacionais52, e nos modos de
preparação, acompanhamento e avaliação das intervenções. O princípio
comunitário da subsidiariedade53 remete, no entanto, a
responsabilidade da execução das intervenções para os Estados
Membros.
52 As taxas de cofinanciamento comunitário obedecem às regras dos FE, não
devendo, no caso das regiões do Objectivo 1, salvo algumas excepções, ser
superiores a 75% do custo total elegível do projecto, nem, como regra geral,
inferiores a 50% da despesa pública elegível associada a cada projecto. Nas
restantes regiões, aquelas taxas são, respectivamente, 50 e 25. Refere-se aqui
despesas elegíveis, uma vez que nem todos os tipos de despesa poderão beneficiar
de comparticipação comunitária.
Os princípios dacomplementaridade e daparceria
O princípio dasubsidariedade
O princípio daadicionalidade
98
A adicionalidade, outro dos princípios de funcionamento dos
FE, significa que os apoios comunitários não devem ser tomados pelos
Estados membros como substitutos dos recursos financeiros nacionais
públicos ou equiparáveis. O investimento apoiado deve ser adicional,
no sentido em que, sem os apoios comunitários, não se realizaria no
mesmo período.
Em termos práticos, a verificação da adicionalidade é efectuada
ex-ante isto e, antes do início do período de programação, a meio
desse período e no final do penúltimo ano desse período. Considera-se
que a adicionalidade está cumprida se o volume de despesa de
investimento, pública ou equiparável, for pelo menos igual ao volume
verificado em termos reais no período de programação anterior.
A compatibilidade significa que todas as intervenções apoiadas
por fundos comunitários deverão respeitar as disposições do Tratado
que institui a Comunidade Europeia, e todos os actos adoptados por
sua força, tais como, a política de concorrência, as regras de
adjudicação de obras públicas, a protecção e melhoria do ambiente, a
eliminação das desigualdades e a promoção da igualdade entre sexos.
O princípio da programação implica que a acção conjunta da
Comunidade e dos Estados Membros para a realização dos objectivos
prioritários anteriormente referidos, deve exercer-se, numa base
plurianual (no caso vertente, os sete anos do período de programação),
segundo um processo de organização, tomada de decisão e
financiamento por etapas. Adiante daremos conta dos procedimentos,
53 Princípio de descentralização que, visando aproximar o poder o mais
possível dos cidadãos, remete a responsabilidade das intervenções políticas para a
escala territorial mais pequena em que podem processar-se com eficácia.
O princípio dacompatibilidade
O princípio da programação
99
figuras de planeamento e estruturas institucionais, que consubstanciam
o exercício da programação.
3.5.4. A natureza e a programação das intervenções dos
Fundos Estruturais
A acção dos FE processa-se segundo três grandes grupos de
intervenções: os programas de iniciativa nacional, que podem assumir
as formas de programas operacionais ou de documentos únicos de
programação, os programas de iniciativa comunitária e as acções
inovadoras e medidas de assistência técnica.
Os programas operacionais são preparados pelos Estados
membros ou pelas suas regiões, na base da elaboração prévia de um
plano de desenvolvimento. Da negociação deste plano com a Comissão
Europeia, resulta um Quadro Comunitário de Apoio (QCA), que
constitui um documento de enquadramento estratégico e financeiro
global das intervenções dos FE e do Estado Membro. Os programas
operacionais constituirão os elementos de execução do Quadro
Comunitário de Apoio. São distintas as decisões comunitárias relativas
à aprovação do QCA e à aprovação de cada um dos seus Programas
Operacionais.
Um DOCUP agrupa os elementos contidos num QCA e num
programa operacional. Isto é, num DOCUP estão, simultaneamente,
contidos os elementos do enquadramento estratégico e financeiro e os
instrumentos concretos de intervenção. Deste modo, no caso do
DOCUP há lugar a uma única decisão comunitária de aprovação.
Os QCA aplicam-se normalmente no caso das regiões do
Objectivo 1, enquanto os DOCUP se aplicam nos casos das regiões
A tipologia das intervenções
O QCA
O Documento Único deProgramação
100
dos Objectivos 2 e 3. Há, todavia, a possibilidade de excepção em cada
um daqueles casos. Sendo os apoios dos FE a Portugal veiculados na
totalidade através do Objectivo 1, aplica-se-lhe a figura do QCA.
O plano de desenvolvimento é apresentado por cada Estado
antes do início de um período de programação financeira da UE e após
decisão comunitária sobre os fundos atribuídos a cada país e sobre as
regiões que são elegíveis a cada um dos objectivos prioritários dos FE.
O plano de desenvolvimento deve conter um diagnóstico da situação e
a definição de uma estratégia de desenvolvimento em função do tipo de
objectivo a que será elegível. Para além disso, o plano de
desenvolvimento deve conter um quadro de financiamento que
explicite as diferentes fontes de financiamento comunitárias (cada um
dos FE e, a título indicativo e se for caso disso, o FC e o BEI) e
nacionais (fontes de financiamento públicas de âmbito nacional,
regional e local, e fontes de financiamento privadas). O plano deve
ainda conter a avaliação ex-ante da adicionalidade, os impactos
esperados e as disposições de consulta aos parceiros.
Paralelamente, o Estado Membro prepara o programa ou
programas operacionais que enquadrarão as acções cofinanciáveis
pelos FE. Os programas operacionais dão corpo aos grandes objectivos
de desenvolvimento traçados no plano de desenvolvimento,
detalhando-os em outros objectivos mais precisos e medidas concretas,
explicitando também a tipologia das entidades beneficiárias (que
podem apresentar candidaturas de projectos) e as disposições relativas
à gestão respectiva. Como vimos anteriormente, da estrutura destes
documentos e da decisão ou decisões comunitárias respectivas,
consoante os casos, resultará um DOCUP ou um QCA.
O Plano de
Desenvolvimento
Os programas operacionais
101
Saliente-se que um programa operacional pode conter diversas
medidas em relação às quais é estabelecido um determinado quadro de
financiamento por fontes e por cada um dos anos do período de
referência. O Estado membro, através dos mecanismos institucionais
de funcionamento, que abordaremos na secção seguinte, procede à
aprovação de projectos concretos apresentados pelas entidades
beneficiárias e, de acordo com determinadas regras, financia-se junto
da Comissão Europeia de forma a pagar os apoios àquelas entidades.
Os programas de iniciativa comunitária (IC) constituem um
instrumento de afectação de recursos pela Comissão a objectivos que a
Comissão considera terem um interesse particular para a Comunidade,
tendo normalmente aplicação em todos os Estados Membros. Para o
actual período de programação foram eleitos quatro domínios a que
corresponderam outras tantas IC54, envolvendo um financiamento total
dos FE que ascende a 10.442 milhões de EUROS (MEUROS)55.
A cooperação transfronteiriça e inter-regional, visando estimular
a correcção de disparidades e a sustentabilidade do desenvolvimento
no espaço comunitário. A IC correspondente, o INTERREG, embora
com um âmbito de intervenção mais vasto, dá continuidade a IC
similares dos dois anteriores períodos de programação. Esta IC é
financiada pelo FEDER, apresentando um orçamento total de 4.875
MEUROS.
A revitalização económica e social de cidades e subúrbios em
crise, visando a sustentabilidade do desenvolvimento urbano, deu
origem à IC URBAN, a qual dá continuidade a uma IC do anterior
54 No anterior período de programação, o número de IC ascendeu a 14,
incluindo uma IC específica para a Irlanda do Norte, a PEACE.55 Milhões de EUROS.
As iniciativas comunitárias
102
período de programação. Esta IC é financiada pelo FEDER, num
montante total de 2.847 MEUROS.
Para o desenvolvimento rural criou-se a IC LEADER, dando
continuidade a uma IC similar que vigorou já durante os dois períodos
de programação anteriores. Esta IC é financiada pelo FEOGA-O, num
montante total de 2.020 MEUROS.
A promoção da cooperação transnacional na luta contra a
desigualdade e discriminação no mercado de trabalho, deu lugar à IC
EQUAL. Esta IC é financiada pelo FSE, num montante total de 700
MEUROS.
A Comissão Europeia define, para cada Iniciativa, os objectivos,
o âmbito de aplicação, a estrutura programática, as regras de execução
e os montantes financeiros, incluindo a sua afectação aos Estados
Membros.
As acções inovadoras apoiam a implementação de métodos e
práticas inovadores, destinados a melhorar a qualidade das
intervenções no âmbito dos objectivos prioritários. Por iniciativa ou
por conta da Comissão, a assistência técnica permite o financiamento
de medidas de preparação, acompanhamento, de avaliação e controlo
da aplicação do regulamento dos FE. No seu conjunto absorvem cerca
de 1.268 MEUROS.
As intervenções dos Fundos Estruturais podem conter
subvenções globais. Está-se perante uma subvenção global, quando a
execução e gestão de uma intervenção são entregues, pelo Estado
Membro em acordo com a Comissão Europeia, a uma ou várias
entidades intermediárias. Estas entidades podem ser autoridades locais
As acções inovadoras e aassistência técnica
As subvenções globais
103
ou mesmo organizações privadas de desenvolvimento (por exemplo:
associações e agências de desenvolvimento regional e local).
Saliente-se ainda que, no caso de grandes projectos, cujo valor é
superior a 50 MEUROS, a sua inclusão e aprovação no âmbito de um
programa operacional não dispensa um processo de apreciação e
avaliação específicas pela Comissão Europeia, que pode levar à
aprovação de condições de cofinanciamento diferentes das que
resultariam da sua simples aprovação no âmbito desse programa56.
3.5.5. A gestão das intervenções dos Fundos Estruturais
A gestão é feita em parceria, segundo as modalidades que,
respeitando os regulamentos comunitários, são acordadas nos próprios
QCA / DOCUP e nos programas de iniciativa comunitária. Deste
modo, no caso português57, a estrutura orgânica do QCA III assenta
em três níveis de actuação e três categorias de órgãos. Os níveis de
actuação são o global, o de cada um dos Fundos Estruturais e o de
cada um dos Programas Operacionais. As categorias de órgãos são
três: órgãos de coordenação e de gestão, órgãos de acompanhamento
e órgãos de controlo.
A coordenação política é feita por uma Comissão
Governamental, que envolve os membros do Governo com tutela de
programas operacionais, enquanto a gestão global é da
responsabilidade de uma Comissão de Gestão participada pelas
56 Foi, concretamente, o caso do Empreendimento de Fins Múltiplos do
Alqueva, o qual estando inserindo num programa operacional aprovado pela CE, sópôde ser implementado após um processo específico de análise e de decisão.
57 A estrutura institucional do QCA III está definida no Decreto Lei 54-A/2000 de 7 de Abril.
As modalidades de gestão
As categorias de órgãos
A coordenação política e agestão global
104
entidades públicas que têm a responsabilidade da gestão de cada um
dos Fundos Estruturais e do Fundo de Coesão.
Estes órgãos são os que, nos termos dos regulamentos
comunitários relativos aos FE exercem as funções de autoridade de
gestão e de autoridade de pagamento. Isto é, trata-se de órgãos que
para além das suas funções de gestão e tesouraria internas, asseguram
as relações técnicas e financeiras com a Comissão Europeia.
Para cada programa58 há uma Unidade de Gestão com
capacidade de apreciação e aprovação dos projectos candidatos,
decisões que ficam todavia sujeitas a homologação da(s) tutela(s)
política(s) dos programas. Cada Unidade de Gestão envolve um Gestor
e outras entidades com interesse específico, sectorial ou regional, no
programa. Legalmente pertence ao gestor a capacidade de aprovar os
projectos candidatados ao respectivo programa. Mas essa aprovação
fica sujeita ao parecer da Unidade de Gestão o qual, embora não
vinculando juridicamente o gestor, dentro do princípio da parceria
confere-lhe alguma responsabilização política.
A gestão de cada programa e do QCA na sua globalidade, é
objecto de acompanhamento por Comités ou Comissões de
Acompanhamento, constituídos pelos membros da Unidade de Gestão,
organismos nacionais com responsabilidades na gestão dos FE
envolvidos, um representante da Comissão Europeia e um
representante do BEI. No caso dos Comités de Acompanhamento do
QCA e dos Programas Operacionais Regionais, regista-se também a
participação dos parceiros económicos e sociais e das autarquias
locais.
58 Operacional e de iniciativa comunitária.
As funções de gestão e depagamento
As relações com a ComissãoEuropeia
As unidades de gestão
Os Comités ou Comissões deAcompanhamento
105
Os comités de acompanhamento pronunciam-se sobre os actos
de gestão anteriores (nomeadamente pela aprovação dos relatórios
anuais e final de execução do QCA e/ou dos programas operacionais e
de iniciativa comunitária) e sobre a necessidade da eventual introdução
de reprogramações financeiras e materiais dos sub-programas
(objectivos, acções elegíveis, etc.)
Estão previstos procedimentos e mecanismos institucionais de
avaliação e de controlo do QCA. A avaliação visa apurar a acuidade
dos objectivos financeiros e materiais dos programas e os seus
impactos regionais e macro-económicos, efectuando-se em três
momentos e em diferentes níveis institucionais.
A avaliação ex-ante processa-se previamente à própria
aprovação dos programas, apoiando a tomada de decisão nesse
sentido, e é da responsabilidade do órgão que preparou o respectivo
plano ou programa.
A avaliação intercalar ou de meio termo, é efectuada três anos
após a decisão comunitária relativa ao programa respectivo, e destina-
se a determinar necessidades de reprogramação e de reorganização
institucional. Esta avaliação, que é determinante para a afectação da
reserva de eficiência59, incide sobre o QCA e sobre cada um dos
programas operacionais ou programas de iniciativa comunitária, é da
responsabilidade da autoridade de gestão em colaboração com a
Comissão Europeia e o Estado Membro e é realizada por um avaliador
independente.
59 O regulamento dos FE estipula a retenção de 4% da dotação dos Fundos
Estruturais atribuída a cada país, os quais serão depois revertidos para osprogramas que revelarem maior eficácia.
A avaliação e o controlo doQCA
As modalidades de avaliação
Os objectivos da avaliação
106
A avaliação ex-post, é feita no fim do período de programação e
visa, naturalmente determinar os graus de concretização dos objectivos
(nomeadamente as capacidades de absorção financeira dos créditos
disponibilizados em cada programa) e a eficiência das modalidades de
gestão escolhidas. Esta avaliação, que é da responsabilidade da
Comissão Europeia em colaboração com o Estado Membro, é feita
também para cada programa, por avaliadores independentes.
O controlo visa fiscalizar o cumprimento das regras dos fundos
pelas diversas instâncias envolvidas na gestão dos programas. Este
controlo é feito, nacionalmente, a diversos níveis: das próprias
Unidades de Gestão (1º nível) dos órgãos nacionais responsáveis pela
gestão dos fundos (2º nível) e pela Inspecção Geral de Finanças
(controlo de alto nível). A Comissão Europeia, através das Direcções
Gerais responsáveis pelos Fundos, pelo Orçamento e pela fiscalização
do cumprimento das regras de concorrência, bem como, através do
respectivo Tribunal de Contas, procede também a acções de controlo e
de fiscalização.
3.5.6. O Fundo de Coesão
O Fundo de Coesão, tal como o FEDER, visa o reforço da
coesão económica e social da União Europeia mas, ao contrário
daquele, trata-se um instrumento financeiro aplicável aos espaços
nacionais e não aos espaços regionais. Constitui um instrumento
financeiro independente dos FE e dos QCA/DOCUP, regendo-se por
regras próprias.
Aplica-se exclusivamente aos quatro países que, à data da
decisão relativa à União Monetária, necessitavam de maiores
Os objectivos do controlo
O Fundo de Coesão
Os países envolvidos
107
transformações estruturais das respectivas economias para
conseguirem reunir as condições de adesão ao Euro: Espanha, Grécia,
Irlanda e Portugal60.
A decisão comunitária sobre o FC, estabeleceu, para 2000-2006
as quotas mínimas e máximas de cada país no acesso aos 18 mil
milhões de EUROS, a preços de 1999, que lhe foram atribuídos. À
Espanha coube entre 61 a 63,5%, à Grécia coube entre 16 e 18%, a
Portugal coube também entre 16 e 18%, e à Irlanda coube entre 2 a
6%. Relativamente ao período de programação anterior, apenas a
Espanha viu aumentadas as suas quotas. A Irlanda foi o país que
registou maior decréscimo.
Ao contrário do que sucede com os FE, cujos apoios são
concedidos, como regra geral, a partir da aprovação de projectos pelas
instâncias nacionais de gestão dos programas, no caso do FC os apoios
são conferidos a partir de decisões casuísticas da Comissão
relativamente a cada projecto que lhe é remetido pelo Estado Membro.
Trata-se de um procedimento similar ao seguido no FEDER antes da
reforma dos FE de 1988.
Só são apoiados grandes projectos, ou grupos de projectos
integrados61, que contribuam para a política ambiental da Comunidade
ou se refiram a infra-estruturas de transporte integrando as redes
transeuropeias consideradas prioritárias pela Comunidade, não
havendo lugar a qualquer discriminação regional interna nos países
elegíveis. Isto é, todas as regiões de cada um dos quatro países são
60 O critério de elegibilidade nacional considerado foi o do PNB per capita se
situar em valores inferiores a 90% da média comunitária, à data de lançamento dofundo.
61 Em regra, com valor não inferior a 10 milhões de ECU.
As quotas de cada um dospaíses
Decisão casuística daComissão na atribuição dosapoios
Restrições aos apoios
108
elegíveis ao FC, independentemente de o serem ou não em relação aos
FE.
Os apoios a conceder (taxas de cofinanciamento) podem cobrir
entre 80 a 85% das despesas consideradas elegíveis, excepto nos casos
dos projectos geradores de receitas em que as taxas de
cofinanciamento são inferiores, em função das respectivas margens de
autofinanciamento.
Os apoios deste fundo estão sujeitos ao princípio da
condicionalidade. Segundo este princípio, os países beneficiários
ficam condicionados ao cumprimento do Pacto de Estabilidade
definido em Maastricht. A verificação de défices excessivos, nos
termos daquele Tratado, origina a suspensão imediata da aprovação de
novos projectos e de novos financiamentos a projectos em curso.
Os apoios do Fundo de Coesão não são acumuláveis com apoios
dos Fundos Estruturais. Isto é, um projecto ou tranche de projecto (no
caso dos grandes projectos) não pode candidatar-se simultaneamente
aos FE e ao FC.
Os apoios do FC estão igualmente sujeitos à compatibilidade
com as restantes políticas comunitárias e a acções de controlo e
fiscalização nacional e comunitária, em termos genericamente
semelhantes aos dos FE.
3.5.7. Breve análise dos QCA a Portugal e seus impactos
macro-económicos
O QCA II a Portugal, que teve o seu período de programação
entre 1994 e 1999, encontra-se actualmente na fase de encerramento.
Os níveis de financiamento
O princípio dacondicionalidade
Restrição da acumulação deFundos
Compatibilização com asrestantes políticas
comunitárias
O encerramento do QCA IIa Portugal
109
As normas comunitárias prevêem que com o fim do período de
programação cesse a possibilidade de aprovação de projectos para
financiamento, mas estabelecem um período de dois anos para a
liquidação dos apoios já aprovados. Deste modo, o QCA II continuará
a cofinanciar investimentos, no limite, até final de 2001, coincidindo
nestes anos com a vigência do QCA III, cuja arranque se processou em
2000.
O QCA II foi inicialmente estruturado em 4 eixos estratégicos,
14 programas operacionais e uma subvenção global (Apoio ao
investimento autárquico). Alguns dos programas estão divididos em
sub-programas (a que se dá também a designação de intervenções
operacionais). Cada intervenção operacional ou programa não dividido
dispõe de um gestor e uma unidade de gestão próprias. Ao todo foram
assim estabelecidas 26 unidades de gestão.
Em 1997, com a aprovação comunitária do Empreendimento de
Fins Múltiplos do Alqueva, foi criada uma nova intervenção
operacional, O PEDIZA - Programa Específico de Desenvolvimento
Integrado da Zona do Alqueva. Tratando-se de uma intervenção já
prevista no PPDR, Programa de Promoção do Potencial Endógeno, o
PEDIZA, na prática, foi autonomizado do PPDR, embora com uma
concepção muito diferente.
No quadro 1, apresentam-se a estrutura de eixos, programas e
sub-programas com as dotações iniciais de fundos comunitários e
contrapartidas nacionais. A despesa pública total62 eleva-se a cerca de
4 mil milhões de contos, dos quais 2,8 correspondem a despesa pública
comunitária e 1,2 a despesa pública nacional. No primeiro caso é
62 Valor do investimento assegurado por fundos públicos.
A estrutura do QCA II emPortugal
A estrutura da despesa
110
financiada pelos FE e pelo IFOP. No segundo caso é financiada pelo
Orçamento de Estado, através do PIDDAC - Plano de Investimentos e
Despesas de Desenvolvimento da Administração Central, e pelos
orçamentos municipais.
No quadro 2 apresenta-se o balanço financeiro global das
intervenções, incluindo QCA, IC e Fundo de Coesão. A despesa
pública total ascende a 5,1 mil milhões de contos, dos quais 3,5 são de
fundos comunitários e 1,6 de fundos públicos nacionais.
A quase totalidade dos investimentos previstos são apoiados no
âmbito do Objectivo 1. Apenas 8% e 1% da despesa pública total
(nacional e comunitária) correspondem, respectivamente, a
investimento apoiados no âmbito dos objectivos 3 e 4, através do
FSE63.
Prevendo-se uma comparticipação privada da ordem dos 1,3 mil
milhões de contos, na sua maior parte correspondentes à parcela de
investimento produtivo não coberta pelos incentivos, e um recurso ao
crédito do BEI da ordem dos 1,2 mil milhões de contos, o investimento
total associado ao QCA ascende, no período de 1994-199964, a cerca
de 7,6 mil milhões de contos.
O QCA e restantes instrumentos de apoio financeiro comunitário
a Portugal apresentam um impacto macro-económico sensível. Deste
modo, a avaliação do efeito do QCA II65, por via da procura, aponta
para acréscimos anuais do PIB, situados entre 0,7% em 1994 (ano do
arranque) e 3,3% em 1999 (último ano de vigência). Em termos de
63 Referimo-nos, naturalmente, aos Objectivos dos FE relativos ao anterior
período de programação, 1994-1999.64 Excepto uma pequena parcela do Fundo de Coesão relativa a 1993.65 Plano de Desenvolvimento Regional 2000-2006, pp II-11 a II-13
O balanço financeiro global
Os impactos esperados
111
oferta, o efeito de longo prazo traduz-se num PIB real superior em
1,6% ao que ocorreria sem QCA. Entre 1994 e 1999, a taxa de
crescimento anual do PIB terá sido, em média, superior em 0,5 pontos
percentuais relativamente à situação sem QCA. O QCA terá sido
responsável pela criação de cerca de 106 mil postos de trabalho, dos
quais, 30% na construção civil e obras públicas. Também o seu
impacto na redução das disparidades regionais de desenvolvimento terá
sido significativo, uma vez que, entre 1993 e 1999, o coeficiente de
variação do PIB per capita em paridades de poder de compra ter-se-á
reduzido em 15,4%.
Para o período de 2000-2006 foi atribuído a Portugal um
financiamento comunitário no valor total de 4.561 milhões de contos, a
preços de 1999. Daquele valor, 3.814 milhões de contos referem-se a
FE englobados pelo QCA, 134 milhões referem-se a FE englobados
nas Iniciativas Comunitárias (IC) e 613 milhões de contos referem-se a
Fundo de Coesão. Saliente-se que os créditos atribuídos no âmbito
deste último são meramente indicativos. Ao contrário do QCA e das
IC, cujas decisões de aprovação pela Comissão Europeia representam
um compromisso de financiamentos até àqueles montantes, no caso do
FC, devido ao seu modo específico de funcionamento, o compromisso
vai sendo assumido com a aprovação dos projectos pela CE.
Os financiamentos comunitários no âmbito do QCA III e do
Fundo de Coesão deverão representar cerca de 2,75% do PIB nacional
no período de 2000-2006 e 6,75% da FBCF nacional no mesmo
período. Em resultado da sua aplicação, e tendo em conta os efeitos
directos, indirectos e induzidos66, o PIB e o emprego, naquele período,
66 Na perspectiva do modelo de Leontief.
O QCA III
112
deverão crescer, respectivamente, mais 2% e mais 1,75%,
comparativamente à situação em que não houvesse aqueles apoios e
admitindo que a adicionalidade é cumprida.
O Quadro 3 dá-nos a estrutura programática e de financiamento
do QCA III. Os valores relativos ao FC e ao BEI são meramente
indicativos, uma vez que, não integrando de facto do QCA, não
estiveram sujeitos ao respectivo processo negocial.
O actual PDR / QCA apresenta algumas características novas
relativamente ao anterior. Em primeiro lugar, por via da reforma dos
FE todos os apoios são concedidos ao abrigo do Objectivo 1, mas a
Região de Lisboa e Vale do Tejo acede a esses apoios no regime
transitório (phasing out) por o seu PIB per capita em paridades de
poder de compra ter ultrapassado o limiar dos 75% da média europeia
que lhe conferia elegibilidade ao Objectivo 1. Este facto tem como
consequência, não apenas uma limitação drástica dos apoios a
conceder a esta região no âmbito do QCA, que se ficarão pelos 619
milhões de contos a preços correntes, como haverá um maior
concentração de apoios no início do período de programação. Nos
primeiros 4 anos esta região deverá absorver 76,4% dos apoios,
percentagem que no resto do país se fica pelos 56,5%.
Em segundo lugar, as verbas do QCA em negociação, não serão
totalmente afectadas aos programas operacionais logo à partida. Para
além da reserva de eficiência, já referida anteriormente, é proposta por
Portugal a constituição de uma Reserva de Programação. Ao todo,
constitui-se assim um reserva de 302 milhões de contos de FE, que
será depois atribuída aos programas segundo a eficiência revelada na
absorção dos financiamentos programados. Estas reservas constituem
um importante meio de flexibilização da gestão do futuro QCA.
A s novas características
113
Um terceiro aspecto que interessa referir é o do reforço dos
programas operacionais de base regional. No QCA II estes programas
absorveram 22% do total dos FE. No PDR / QCA III está prevista a
sua dotação com 47% do total dos FE excluindo as reservas.
O período de programação dos FE que agora se iniciou, coloca
diversos desafios a Portugal, decorrentes das diversas reformas em
curso na UE e da nova configuração das Acções Estruturais:
Maior concorrência, face à total abertura de mercados, à moeda
única e à sujeição a uma disciplina orçamental fortemente ditada
pela UE;
Maiores dificuldades na gestão integrada dos objectivos de reforço
dos factores de competitividade externa nas regiões litorais e de
redução das assimetrias de desenvolvimento regional;
Necessidade de uma gestão mais eficaz dos apoios comunitários,
tanto mais quanto no pós 2006 as elegibilidades regionais tornar-se-
ão mais restritas67;
Gerir a combinação dos FE e dos fundos nacionais (PIDDAC e
outras fontes financeiras) num contexto de não elegibilidade total do
território aos FE e, particularmente ao objectivo 1, o que implica
menor margem de flexibilidade na afectação dos recursos
financeiros às regiões e, por conseguinte, maior imaginação em
engenharia financeira.
67 O Algarve situa-se já nas proximidades da fronteira de exclusão do
Objectivo 1. Com o alargamento da UE há mesmo o risco de a quase totalidade dopaís poder vir a ser excluído da elegibilidade à Política Regional Europeia, nãoapenas pela possível ocorrência de nova limitação dos respectivos recursosfinanceiros e novo esforço de concentração territorial da sua aplicação, mas tambémporque, com os alargamentos que estão na calha, o nível médio de desenvolvimento
Os novos desafios para onosso país
114
da UE registará um declínio sem precedentes, o que contabilisticamente vai tornardesenvolvidas muitas das regiões que hoje se inserem no objectivo 1.
115
QUADRO 1
QUADRO COMUNITÁRIO DE APOIO A PORTUGAL II - 1994-1999
DESPESA PÚBLICA PROGRAMADA A PREÇOS CORRENTES *
Unidade: milhões de contosEIXOS / PROGRAMAS /SUB-PROGRAMAS DESPESA PÚBLICA % DESP.
TOTAL COM. NAC. PÚBLICA
Eixo 1 – Qualificar os recursos humanos epromover o emprego 810 607 203 20,4
1.1. Bases do conhecimento e da inovação 442 331 111 11,21.1.1. Educação 343 257 86 8,71.1.2. Ciência e tecnologia 99 74 25 2,51.2. Formação profissional e emprego 368 276 92 9,31.2.1. Qualificação inicial e inserção nomercado de emprego 150 112 38 3,81.2.2. Melhoria da qualidade e do nível doemprego 151 113 38 3,81.2.3. Formação e gestão dos recursoshumanos 54 41 13 1,41.2.4. Formação da administração pública 13 10 3 0,3Eixo 2 – Reforçar os factores de competi-tividade da economia 1905 1258 647 48,1
2.1. Infra-estruturas de apoio ao desenvol-vimento 732 391 341 18,52.1.1. Transportes 484 274 210 12,22.1.2. Telecomunicações 108 54 54 2,72.1.3. Energia 140 63 77 3,52.2. Modernização do Tecido Económico 1174 866 308 29,62.2.1. Agricultura 471 353 118 11,92.2.2. Pescas 57 43 14 1,42.2.3. Indústria 461 338 123 11,62.2.4. Turismo e património cultural 102 76 26 2,62.2.5. Comércio e serviços 83 56 27 2,1Eixo 3 – Melhorar a qualidade de vida e acoesão social 342 248 94 8,6
3.1. Ambiente e revitalização urbana 158 110 48 4,03.1.1. Ambiente 68 51 17 1,73.1.2. Renovação urbana 90 59 31 2,33.2. Saúde e integração social 184 138 46 4,63.2.1. Saúde 98 73 25 2,53.2.2. Integração económica e social dosgrupos sociais desfavorecidos 86 65 21 2,2
Continua
116
QUADRO 1 (Continuação)
EIXOS / PROGRAMAS /SUB-PROGRAMAS DESPESA PÚBLICA % DESP.TOTAL COM. NAC. PÚBLICA
Eixo 4 – Fortalecer a base económica re-gional 870 626 244 22,0
4.1. Promoção do potencial de des. regional 105 79 26 2,74.2. Norte 143 106 37 3,64.3. Centro 95 71 24 2,44.4. Lisboa e Vale do Tejo 101 75 26 2,64.5. Alentejo 49 36 13 1,24.6. Algarve 20 15 5 0,54.7. Açores 159 127 32 4,04.8. Madeira 122 73 49 3.14.9. PEDIZA 71 40 31 1,84.10. Apoio ao Investimento autárquico 7 5 2 0,2Assistência técnica 34 26 8 0,9
TOTAL 3961 2764 1197 100,0
* Situação relativa a 31/12/97
QUADRO 2
QUADRO COMUNITÁRIO DE APOIO A PORTUGAL II ,
INICIATIVAS COMUNITÁRIAS E FUNDO COESÃO* – 1994-1999
DESPESA PÚBLICA PROGRAMADA A PREÇOS CORRENTES**
Unidade: milhões de contos
DESPESAPÚBLICATOTAL
FUNDOSCOMUNITÁ-
RIOS
CONTRA-PARTIDAS
NACIONAIS
TAXAS DECOMPARTI-CIPAÇÃO %
ESTRUTURADOS FUNDOS
%
QCA+IC 4276 2980 1296 69,7 84,2
QCA 3961 2764 1197 69,8 78,1IC 315 216 99 68,6 6,1
FEDER 2826 1891 935 66,9 53,4FSE 854 642 252 75,3 18,1FEOGA-O 536 402 134 75,0 11,4IFOP 61 45 16 73,8 1,3FC 822 561 262 68,2 15,8
QCA+IC+FC 5099 3541 1558 69,5 100,0
* No caso do Fundo de Coesão: 1993-1999.
** Situação relativa a 31/12/97.
117
QUADRO 3ESTRUTURA DOS FINANCIAMENTOS POR EIXOS
PRIORITÁRIOS E PROGRAMAS OPERACIONAIS 2000-2006
(Milhões de contos - preços correntes *)Despesa Pública Financia- Taxas de Fundo Outras
EIXOS E PROGRAMAS TOTAL Comunit. Nacional Mento Cofinanc. de Interv. BEI
(FundosEstr.)
Privado % Coesão Financei-ras
EIXO 1 1 400 842 484 74 60,1 0,0 0,0 0,0
Educação 334 234 94 6 70,1 0,0 0,0 0,0
Empr, Form Des Social 562 318 193 50 56,6 0,0 0,0 0,0
Ciência, Tecn e Inovação 192 93 94 5 48,5 0,0 0,0 0,0
Sociedade da Informação 107 54 53 0 50,7 0,0 0,0 0,0
Saúde 140 95 32 13 68,1 0,0 0,0 0,0
Cultura 66 48 18 0 72,5 0,0 0,0 0,0
EIXO 2 2 615 822 394 1 399 31,4 0 0,0 17
Agric, Des Rural e Pescas 748 281 122 346 37,5 0 0,0 0
Economia 1 867 542 272 1 053 29,0 0 0,0 17
EIXO 3 767 345 360 62 45,0 640 3,2 0
Acessib e Transportes 675 278 338 59 41,2 323 3,2 0
Ambiente 91 67 22 3 72,9 317 0,0 0
EIXO 4 3 071 1 786 1 072 212 58,2 22 0,2 248
Norte 922 539 322 62 58,4 0 0,2 35
Centro 585 342 210 32 58,6 0 0,0 18
Lisboa e Vale do Tejo 548 288 218 42 52,6 0 0,0 65
Alentejo 371 216 132 23 58,3 0 0,0 101
Algarve 147 90 52 4 61,5 0 0,0 27
Açores 247 170 50 27 68,9 4 0,0 0
Madeira 252 140 88 23 55,7 17 0,0 0
Assist Técnica e Financeira 26 20 7 0 75,0 0 0,0 22
Reserva de Eficiência 340 165 100 75 48,4 0 0,0 0
Reserva de Programação 283 137 83 63 48,4 0 0,0 0
TOTAL 8 502 4 117 2 500 1 885 48,4 661 3,4 286
118
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