contributos teóricos e histórico-políticos no contexto da educação de adultos em portugal...
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* Discente da UC de Educação de Adultos e Cidadania, do Mestrado em Educação Social da ESEC-UAlg, ministrada e
orientada pelo Professor Doutor Emílio Lucio-Villegas.
CONTRIBUTOS TEÓRICOS E HISTÓRICO-POLÍTICOS NO
CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DE ADULTOS EM PORTUGAL
Ricardo da Palma*
Resumo: As considerações desenvolvidas neste artigo apresentam os contributos de
vários autores no contexto da Educação de Adultos, bem como dos fundamentos legais,
teóricos e históricos que suportam este paradigma educativo em Portugal. Baseia-se
essencialmente na abordagem aos conteúdos históricos desde o Estado Novo à adesão de
Portugal à CEE (UE de hoje) e na subsequente evolução socioeducativa. Pretende-se também
apresentar algumas das apreciações tidas como relevantes deste panorama educativo e, de
uma forma clara e objetiva, contribuir para uma melhor elucidação quanto ao tema da
Educação de Adultos.
Palavras-chave: educação, políticas, qualificação, competências pessoais e
profissionais, empregabilidade, europeização.
Abstract: The arguments developed in this article show the contributions of several
authors in the context of adult education, as well as the legal, theoretical and historical
foundations that support this educational paradigm in Portugal. Is essentially based on the
approach to the historical contents from the Estado Novo in Portugal until joined the EEC
(EU today) and subsequent socio-educative evolution. We also intend to present some of the
assessments seen as relevant in this educational landscape and a clear and objective manner,
contribute to a better understanding on the subject of Adult Education.
Keywords: education, policies, qualification, personal and professional competences,
employability, europeanisation.
Contributos Teóricos e Histórico-Políticos no Contexto da Educação de Adultos em Portugal
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1. QUESTÕES INTRODUTÓRIAS
O presente artigo emerge dos conteúdos interiorizados quanto ao tema da Educação de
Adultos e baseia-se na abordagem aos modelos educativos decorrentes do pós 25 de abril de
1974 à adesão formal de Portugal à CEE (1986). Pretende-se ainda ilustrar as transformações
deste paradigma educativo e mostrar os impactos das políticas produzidas desde então.
Nos primeiros passos da educação e formação de adultos em Portugal, a partir da
década de 1980, vincadamente em 1986 na adesão de Portugal à CEE, o programa definido
para esta forma de educar, até então desconhecida da dimensão educativa, foi direcionado
para a vertente da formação profissional e para a vertente da compensação escolar. Este
sentido, acompanhado, em certos aspetos, para a vertente da intervenção socioeducativa, tinha
como objetivo inicial a promoção do desenvolvimento rural e regional e o combate à pobreza
e à exclusão social. Contudo, é a partir do século XIX que a educação de adultos desponta
baseada, sobretudo, em dois fenómenos sociais relevantes: o desenvolvimento de movimentos
sociais de massas, como o movimento operário, e o desenvolvimento e estabilização dos
planos escolares nacionais «(…) que conduziu, segundo uma lógica de extensão ao mundo
dos adultos, à emergência de modalidades de ensino de segunda oportunidade (…)»
(Canário, 1999, p.12).
Não obstante o tema da educação já circular pelos corredores da política no período
revolucionário, embora com uma forte carga direcionada para o mercado de trabalho e com
uma forte presença do poder político na sua regulação, é com o 1º governo constitucional que
a normalização da política educativa toma fôlego e ganha nova forma. A postura
aparentemente neutra do estado e as suas ideologias políticas deixam de condicionar o padrão
educacional, da promoção da modernização do desenvolvimento e da entrada deste novo
paradigma da educação como formas de estabelecer a legalidade democrática. Com este
programa de reestruturação da educação, que desafiou o restaurar das relações produtivas
capitalistas, limitou a construção da escola democrática e consolidou as bases da escola das
pessoas mais competentes, dedicadas e trabalhadoras, o que, do ponto de vista da
democratização da educação, dividiu os políticos e provocou uma crise no sistema educativo.
Esta crise, emergente da crise mundial da educação de finais dos anos setenta, foi vista pelo
ministro da educação da altura (de governo socialista), e numa perspetiva mais humanista,
como um atraso à normalização da educação e que tendia a retardar a sua resolução (Barros,
2013).
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Foi resistindo à conjetura política educativa para a normalização institucional que se
identificaram as principais causas da crise durante o período revolucionário, resultantes de
políticas autoritárias e centralizadas, onde a imposição de um ensino de classe; o afastamento
da educação com as relações socioeconómicas de Portugal; o constante desgaste qualitativo
da pedagogia científica e educacional (Stoer, 1982); a baixa escolarização; os claros
desajustes entre as necessidades de desenvolvimento do País e o sistema educativo e a elevada
taxa de repetência que tinha a escola como um local de insucesso (Teodoro, 1982), que leva
estrutura política a debater efetivamente a realidade educativa portuguesa, contribuindo para
se chegar ao consenso de que seria mesmo necessário reestruturar o paradigma educativo.
2. DIMENSÕES EM ANÁLISE
2.1. EVOLUÇÃO SOCIOEDUCATIVA PORTUGUESA
Em Portugal, corria o mês de maio de 1926, surge uma alteração das estruturas
educativas existentes e onde é promulgada a criação de uma Comissão de Educação Popular
com funções consultivas no âmbito da promoção da instrução popular de redução do
analfabetismo, sem que, no entanto, tivessem resultado quaisquer efeitos práticos. Em 1930,
quando a taxa de analfabetismo atinge os 61,8%, abrem-se os cursos noturnos e extinguem-se
as escolas móveis. Estes cursos eram destinados a indivíduos maiores de 14 anos, de ambos
os sexos e compreendiam as três classes do 1º grau do ensino primário. Novamente, e com a
nova legislação de 1932, é confirmada a existente até então e são autorizados cursos
dominicais, alargando os cursos ao período diurno com o objetivo da presença das mulheres.
Em 1940 o analfabetismo situa-se nos 49% e dez anos depois passa para 40,4%, com maior
incidência no sexo feminino (Candeias e Simões,1999).
É a partir desta fase do Estado Novo que em Portugal se inicia uma intensa campanha
para corrigir essa situação tão desprestigiante e que colocava o nosso país em último lugar dos
países europeus, e em 1952 são publicados dois diplomas que criam o Plano de Educação
Popular e a Campanha Nacional de Educação de Adultos, a cargo de uma comissão que põe
em prática um plano de propaganda, através de cartazes e difundido pela rádio, cinema e
imprensa.
Esta “Campanha” destinava-se
(…) a fornecer matéria acessível de leitura, a difundir os conhecimentos essenciais
entre os alunos (…) e ainda a desenvolver a doutrina específica da educação de
adultos, a informar e a registar os acontecimentos, as decisões e os resultados
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resultantes do combate ao analfabetismo. (Adão, 1999, citado em Barreto, A. &
Mónica, Mª F. [coord.]).
Durante os primeiros seis meses de Campanha funcionaram 3600 cursos, tomando
como princípio que o projeto não se devia apenas destinar a combater o analfabetismo, mas
que também deveria possuir todos os elementos de interesse para a valorização humana e
social do povo Português.
A Campanha Nacional de Educação de Adultos decorreu até 1956, e, apesar de não ter
atingido seus objetivos possibilitou uma ligeira recuperação, e é a partir de 1956 que se
regista um acentuado declínio nos inscritos nos cursos de educação de adultos.
É, no entanto, após a segunda guerra mundial, num contexto de reconstrução europeia,
que se pode falar numa explosão da educação de adultos, duma forma generalizada. Nos anos
60, na conferência internacional de Montréal (1960), os delegados estabelecem uma ligação
estreita entre a educação de adultos e o desenvolvimento económico, quer no plano nacional,
quer no plano internacional e «(…) a partir deste momento, o desenvolvimento passará a
estar no centro da ideologia da educação de adultos no Terceiro Mundo.» (Canário, 1999,
p.13). Esta interdependência entre desenvolvimento e educação dos adultos vai marcar as
próprias práticas educativas, sendo possível distinguir quatro subconjuntos destas. São elas a
alfabetização, a formação profissional, a animação sociocultural e o desenvolvimento local.
A alfabetização (e o ensino recorrente) organiza-se como sendo uma oferta educativa de
segunda oportunidade. Exemplo disto é a campanha lançada durante os anos sessenta pela
UNESCO, recorrendo ao método de alfabetização funcional, «(…) cuja orientação principal
preconizava a combinação entre a aquisição da leitura e da escrita e a formação de base,
designadamente profissional, segundo estratégias intensivas (...) e segundo programas
diversificados e flexíveis» (Silva, 1990, p.13). A posição da UNESCO contribui para
estimular o desenvolvimento sólido da educação de adultos, referindo-se como importante
«(…) assumir a educação de adultos como um domínio estratégico do sistema educativo».
(Cavaco, 2008, p. 48)
Nos anos 70 ocorreu uma alteração nas concepções da política de educação de adultos,
com um esforço de autonomia quer no plano estrutural quer pedagógico, sendo criada a
Direção-Geral da Educação Permanente, cujas competências se fundamentavam na «(…)
educação extra-escolar e as actividades de promoção cultural e profissional, tendo
especialmente como alvo a população adulta.» (Barreto & Mónica, 1999). Em virtude de o
analfabetismo ainda persistir, principalmente nos grupos etários com mais de 40 anos,
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procedeu-se a uma reestruturação dos cursos com destaque a uma pedagogia especialmente
dirigida aos adultos e preparação de programas específicos.
O termo educação de adultos, cujo significado resultou da Conferência de Nairobi, em
1976, dá à expressão educação de adultos um sentido bastante lato:
(…) totalidade dos processos organizados de educação, qualquer que seja o
conteúdo, o nível ou o método, quer sejam formais ou não formais, quer
prolonguem ou substituam a educação inicial ministrada nas escolas e
universidades ou sob a forma de aprendizagem profissional, graças aos quais as
pessoas consideradas como adultos pela sociedade a que pertencem desenvolvem
as suas aptidões, enriquecem os seus conhecimentos, melhoram as suas
qualificações técnicas ou profissionais ou lhes dão uma nova orientação, e fazem
evoluir as suas atitudes ou o seu comportamento na dupla perspectiva de um
desenvolvimento integral do homem e de uma participação no desenvolvimento
social, económico e cultural, equilibrado e independente. (Canário,1999, pp.36-37
e Santos Silva, 1990, p.16)
Portugal, partindo deste enquadramento, entende que a educação de adultos até à
década de 1970 se identificava pelo combate ao analfabetismo.
2.2. DO PÓS 25 DE ABRIL À PRÉ ADESÃO À CEE
Num imediato pós-revolução de abril, as prioridades políticas portuguesas eram a
procura do equilíbrio entre o económico e o social. Defendido por Rodrigues (1996) como o
período de reconciliação nacional, o que não se verificara até então pela clara aposta no
domínio económico do regime ditador, que assumiu uma postura capitalista, e tentativa de
aplicação de novas políticas sociais que primassem pela aplicação da democracia na sua
plenitude, com a criação de uma constituição que se regesse de direitos até então impensáveis,
como o direito ao voto e que dava ao povo a responsabilidade da escolha de quem o
representava. Contudo, e apesar de se verificar essa democracia, o 25 de abril, tendo como
objetivos gerais a democratização e a descolonização africana, essencialmente, tinha também
o grande objetivo/dever de desenvolver uma nação, o que não se viria a concretizar de forma
imediata e como se esperava (Barros, 2013). Efetivamente a teoria do desenvolvimento
existiu mas, passou do desenvolver a formação social portuguesa, ilustrando um Portugal
democrático, para, e apenas, uma via de acesso e estratégica de entrada na CEE que visava o
mercado, ocultando a conflitualidade de interesses existentes entre os países resultante da
reorganização das atividades económicas e as relações sociais de produção europeias (Santos,
1997). Essa decisão política, além de resolver os conflitos ideológicos internos pela
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legitimação externa (Teodoro, 2001a), conduziu o discurso de desenvolvimento social
(formativo) para imperativo de modernização da sociedade e voltado para um panorama mais
mercantil e que viria a definir a conceptualidade da particular realidade socioeducativa
portuguesa.
É no pós revolução de abril de 1974, e que Rodrigues (1996) aponta como os «anos da
reconciliação nacional», que se assiste a uma ampliação de ações de educação,
principalmente de educação de adultos, originada por associações comunitárias e ligadas
frequentemente a projetos de desenvolvimento local, onde as iniciativas de base popular,
cultural e educacional têm um lugar privilegiado e aparecem em todas as frentes de combate
social. Na maior parte dos casos, estas ações tiveram o apoio do Estado e visavam a promoção
cultural e social das populações locais, particularmente dos meios rurais, e a melhoria dos
seus níveis educativos, e parece ter sido no terreno, como defende Salgado (1990), onde a
passagem relâmpago (de outubro de 1975 a julho de 1976) da educação de adultos pela
Direção Geral de Educação Permanente, onde Alberto Melo liderava uma equipa sensível no
campo da valorização cultural e das práticas populares, que lhe permitiu ganhar estatuto no
contexto educativo.
As políticas de regulação social durante o período revolucionário abrandaram, e muito
(se não eliminaram), algumas sobras do aparelho ditador. Contudo, as políticas capitalistas
espelhadas nos países europeus, que optaram por esta orientação política, e a que Portugal não
foi alheio, assumindo uma desresponsabilização do estado e privatizações de determinados
setores, vieram agravar e adiar (ou anular) o modelo de reestruturação da distribuição
equitativa de rendimentos. E isto porque a dependência europeia a que Portugal ficou sujeito
com a ajuda externa, traduzindo-se, essencialmente, que toda a preocupação e prioridades do
País se concentravam na dívida e nas transações comerciais e que dominaram a agenda
política entre meados da década de 70 e meados de 80, sem que houvesse muito espaço para o
problema do social e do educacional (Barros, 2013).
Este período conturbado (política e socialmente) entre 1976 e 1986, marcado pela
inconstância governativa que não ajudava na criação de políticas socioeconómicas capazes, e
enquanto o (quase) Estado-Providência teimava em afirmar-se, fez com que Portugal se
tornasse dependente das políticas “solidárias” dos chamados “países ricos” e dos empréstimos
externos e acordos com o FMI.
No pós-adesão à CEE, a política interna é condicionada pela natural supremacia
europeia, que passa a co-conduzir (as aparências de) um Portugal europeu, imaginário mas
democrático, e ainda distante dos índices de desenvolvimento dos restantes países, resultante,
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em certa medida, da sua localização semiperiférica. Esta integração, além de ter levado
Portugal a adotar políticas supranacionais do modelo capitalista, conduziu também às suas
rápidas implementações, condicionando veemente a produção de políticas sociais
fundamentadas pelo princípio da revolução de abril, acentuando algumas tensões que
evitaram que Portugal se tronasse num Estado-Providência à imagem de grande parte dos
países da CEE. Coube ao próprio Estado, na qualidade de guardião dos seus interesses,
centralizar o discurso político na justificação de que a entrada na CEE foi um sinal de
melhoria de vida da população, onde todos beneficiam com a integração, e que foi uma das
formas de Portugal se afirmar mundialmente, apesar da sua semiperiferia, fundamentando-se
pela forte presença intrínseca do colonialismo imperial e pela imagem como país central
resultante da adesão à CEE (Barros, 2013).
É no período de pós adesão de Portugal à CEE que se verifica uma tendência da
europeização da educação, bem como do protagonismo no contexto histórico da
aprendizagem ao longo da vida que adquire uma importância central para interpretar e
distinguir das novas instituições e processos educativos e que emergem na realidade
portuguesa atual do setor da Educação e Formação de Adultos (EFA). A partir daqui, e numa
ideologia neoliberal, nasce a lei de bases do sistema educativo português (1986) e que
determina o fim de um ciclo de normalização constitucional que viria a marcar a transição de
Portugal para a integração na Comunidade Económica Europeia. Durante a primeira década
da pós integração, esta lei de bases do sistema educativo foi sendo sujeita a várias reformas,
levando a que essas medidas fossem apenas encaradas como parte da resolução das
dificuldades do processo de modernização, e que tenderiam a ser vistas como subordinadas e
compatibilizadas com as ideologias políticas da modernização, e não como solução central e
estrutural do sistema educativo nacional, indo ao encontro do pensamento de Boaventura de
Sousa Santos (1993) no que se refere à dificuldade que Portugal sempre teve para legislar, ou
melhor, para aplicar algumas das suas leis onde Portugal sempre foi flexível na sua
interpretação. E isto verifica-se pelo fato de existir o tal estado Estado paralelo,
imediatamente após a publicação constitucional de 1976, onde cada órgão estatal aplicava as
leis conforme a sua interpretação e interesse. Este autor defende ainda a existência de uma
certa apatia de produção e de gestão do Estado e que a mesma foi intencional. É esta apatia
intencional que define como heterogenia estatal, onde, sendo certo que o Estado ao atribuir
competências à sociedade civil e ao permitir que esta intervenha nas políticas sociais do
Estado, também é certo que o próprio Estado regulamenta e, logo, controla a forma como
essas intervenções são feitas. Como reforça Barros (2013), a força do Estado está
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precisamente na sua aparente (e fictícia) fraqueza… Ao redistribuir funções aos diversos
atores sociais, o Estado cria-lhes uma certa dependência que o leva a ser encarado como o
garante das suas ações e funcionalidades e assegura dessa forma a completa regulação e a
condução da própria normalização estatal.
As duradouras indefinições e renitências, que descredibilizaram o sistema educativo
português, levaram que se passasse de um estado de procura optimista da educação e que
valorizava a relação da educação-democracia para uma procura desencantada da educação que
se direcionava para uma educação de mercado e que iria ao encontro das políticas emergentes
da e com a integração europeia. Esta mutação educativa, viria a marcar vincadamente o
contexto português, sujeito aos acordos económicos (FMI) e ao planeamento e medidas
europeus, que davam prioridades à formação de técnicos tidos como imprescindíveis à
modernização económica, virados essencialmente para a criação do ensino superior
politécnico (formação dos quadros técnicos intermédios em técnicos superiores) e ao
desabrochar da que viria a ser a lei de bases do sistema educativo do ensino secundário, onde
se reorganizaram os planos curriculares, indo ao encontro das necessidades de mercado (via
profissionalizante) com o propósito da criação de técnicos profissionais e de tornar o mercado
mais apelativo, vistas como medidas fulcrais ao desenvolvimento nacional (Barros, 2013).
O período de normalização constitucional, que se mantém até aos dias de hoje uma vez
que esta normalização (ou tentativa) tem criado algumas tensões e contradições, foi sempre
um modelo adaptado a cada ciclo político e em que o Estado foi assumindo diferentes
posturas consoante a orientação política governativa. Essas transformações progressivas do
Estado, que Boaventura de Sousa Santos (1993) defende de passagem de um Estado paralelo:
em que o resultado do parto social da legislação da constituição (1976) com da entrada de
Portugal na CEE, mostrou as grandes diferenças entre o legislar e o aplicar, essencialmente no
campo laboral, e em que essas discrepâncias se verificaram, sobretudo, nos organismo e
instituições públicas, onde esses órgãos, apesar de umbilicalmente ligados ao aparelho do
Estado e onde deviam aplicar apenas a lei nacional, passam a ter autonomia e liberdade para
aplicarem a lei consoante as suas interpretações e interesses; para um Estado heterogéneo: em
que se baseava, essencialmente, na redução das diferenças entre o legislador e o que se
aplicava, mormente nas relações entre o institucional e o (sócio)económico. Esta heterogenia
estatal, vincada pelos acordos do Estado com a sociedade civil (principalmente com
instituições privadas de cariz social), contribui progressivamente para a formação social
portuguesa e que tem vindo a promover as várias revisões constitucionais e atuado no
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contexto da normalização social e política, intervindo nas decisões de cariz económico,
educativo, formativo, por marasmo de produção e de gestão do próprio Estado.
Nesta década de normalização (1976-1986), a preocupação estatal foi criar estabilidade
económica e compatível com toda a Europa e adaptar a sociedade Portuguesa, em todos os
campos (económico, social, político, cultural…), de modo a assegurar a sua efetiva adesão à
CEE.
De uma forma geral, é sabido que o período entre 1976 e 1986 é vincadamente marcado
pelo domínio das políticas económicas e da adesão à CEE. No entanto, nem tudo se resumiu a
estas políticas, sendo que foram dados passos importantes nas políticas educativas. De acordo
com o pensamento de Amaral (2010), já durante o Estado Novo começou uma nova era da
política educacional, onde, e pese embora a educação se baseasse apenas em alfabetizar
alguns adultos, foi durante o Estado Novo que a escolarização universal primária foi atingida
(em 1960). Este esforço durante o Estado Novo, embora parco é certo e onde havia alguma
resistência no que tocava à educação do povo, entendida por vezes pelo poder estatal que o
facto de estar a educar a sociedade era dar competências e força à população para reivindicar,
é hoje visível na quantidade de escolas primárias espalhadas pelas mais remotas localidades
nacionais.
Nesta era global tornou-se cliché não falar apenas em ensino universal (do básico ao
médio) mas essencialmente em ascensão dos níveis de escolaridade, baseado principalmente
no direito à certificação dos saberes escolares, embora muito direcionado para a
empregabilidade. Este fundamento assume o princípio de que ser escolarizado é considerar a
frequência escolar durante um período de tempo, dotando as pessoas da capacidade de ler,
escrever e fazer cálculos matemáticos, como condição básica de viver e participar na
sociedade de forma autónoma (Britto, 2003).
Contudo, estes esforços educativos de direcionar o modelo para o mercado de trabalho
mostram que nem tudo correu como se esperaria. Segundo o INE, em finais de 2012, o
desemprego em Portugal atingia os 16,3%, levando à primeira constatação de que as políticas
utilizadas para combater este flagelo social assumiram-se desastrosas, onde os financiamentos
públicos, aplicados nas ações de educação e formação (profissional) não resolveram o
aumento do desemprego, conduzindo ainda à instabilidade pessoal das pessoas que tendem a
não conseguir aceder ao mercado de trabalho ou que, inclusive, foram excluídas. Esta
constatação levanta ainda questões sobre a carência de avaliação e controlo objetivos e
profundos sobre a utilização desses financiamentos, sobretudo no caso da formação
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profissional, que serviram apenas de apoios as algumas empresas que nem sempre tiveram
utilizações legais (Guimarães e Ramos, 2013).
Neste campo, já Gelpi (2004) havia adiantado que as caraterísticas ou qualidades de
quem é empregável não se pode limitar apenas à procura de trabalho. Este autor reforçou
ainda que a empregabilidade, tida como um dos objetivos políticos mais proeminentes liga-se
em grande medida ao trabalho enquanto campo fértil de relações e partilha de experiências,
sendo essas funções essenciais ao quotidiano das pessoas.
2.3. O CASO DO PNAEBA E… PAULO FREIRE
Em 1979, efetuam-se os estudos preparatórios do Plano Nacional de Alfabetização e
Educação de Base dos Adultos (PNAEBA) em Portugal, a partir da aprovação na Assembleia
da República da Lei n° 3/79 de 10 de Janeiro. Tratou-se de um documento de referência
obrigatória no âmbito da educação de adultos, sendo o seu «(…) objectivo a eliminação
sistemática e gradual do analfabetismo e o progressivo acesso de todos os adultos que o
desejem aos vários graus de escolaridade obrigatória.» (artigo 3º da Lei nº 3/79).
O PNAEBA foi criado com base numa perspetiva abrangente da educação de adultos,
privilegiando as iniciativas socioeducativas, os projetos integrados e a dimensão qualitativa
dos projetos.
Paulo Freire é um dos autores com maior destaque na Educação de Adultos. Apesar de
dar maior importância aos aspetos culturais e políticos do que aos inteletivos no processo de
aprendizagem, deixa a sua marca bem vincada nos seus ideais práticos da chamada Educação
Popular e que serviu de guia orientadora e impulsionadora na criação do PNAEBA em
Portugal. Apesar de ter “sobrevivido” pouco tempo, o Plano (PNAEBA) foi importante na
medida em que revogou todo o passado da típica educação tradicional, onde no modelo
educativo predominava o discurso do educador para o educando, numa clara transmissão de
informação e sem existir qualquer tipo de diálogo, reduzindo os educandos a espetadores e a
“recipientes” vazios, a encher de uma realidade que se apresenta simultaneamente parada,
estática, compartimentada e, acima de tudo, alheia à experiência dos educandos, a que
chamou de Educação Bancária. Paulo Freire relança o futuro apontando para uma Educação
de Adultos que começa a ter mais relevância e onde desencadeia uma atitude reflexiva e
crítica sobre o ensino/aprendizagem e sobre as condições do processo de aprendizagem.
Paulo Freire, durante toda a sua vida, procurou dar voz aos grupos mais oprimidos da
sociedade para que estes pudessem ter domínio sobre a sua vida. No pensamento freiriano,
educar para intervir refere-se a mudanças reais nas relações das pessoas e na sua autonomia,
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no trabalho, na educação e na saúde e estas devem poder ter os meios para fazer uma reflexão
constante sobre a sua vida e decidir conscientemente sobre ela. É adquirindo a sua própria
liberdade que a pessoa se liberta, resultando daí a percepção do meio que a rodeia (Freire,
1983).
A consciência humana, como é sabido, está intimamente ligada ao mundo real, «(…)
por isso a conscientização é a luta que os homens travam para se livrarem dos obstáculos
que impedem uma boa perceção do mundo cotidiano.» (Sousa, 2006, p.72). É nesta base da
conscientização, que o ser humano se descobre ou luta para se descobrir a si próprio,
interrogando-se e procurando respostas aos seus desejos e observações. Tal como diria Freire
(1980) a conscientização consiste «(…) no desenvolvimento crítico da tomada de
consciência.» (p.25).
Nos pensamentos de Freire está sempre presente a ideia de que os indivíduos estão em
permanente transformação e interação, sendo seres históricos e inacabados (Osório, 2003) e
visionam na educação o instrumento primordial, senão quase único, ou único mesmo, para a
libertação e para a necessária transformação radical (estrutural e pessoal) da realidade
opressora. A superação do analfabetismo, da ignorância e da superstição com a passagem, nos
oprimidos, de uma consciência ingénua para uma consciência crítica, visa a formação de
personalidades democráticas que conduzam o povo para a decisão e para a responsabilidade
social e política na construção da vida colectiva (Freire, 1983).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Numa altura em que as políticas educativas portuguesas convergem para uma
abnegação do Estado, que se limita a pôr em prática essas políticas sem acautelar os possíveis
(e previsíveis) impactos sociais, talvez seja altura de serem reconhecidos outros modelos de
educação que não apenas o formal. Os modelos não formal e informal da educação e a
educação popular, mostram-se, pelos seus paradigmas, capazes de romper com o padrão atual
onde o campo e os princípios multifacetados vão além das normas escolares atuais.
É sabido que com o aumento da esperança de vida e o subsequente envelhecimento
societal, acrescido da baixa taxa de natalidade, leva a variadas reflexões ao nível das políticas
sociais, profissionais e de qualificação. O facto da corrente política neoliberal atual socorrer-
se de uma forte carga mercantilizada e virada para a educação profissionalizante e de
mercado, não invalida que o mercado de trabalho, como atual controlador social, aprenda a
potenciar as mais-valias resultantes da capitalização dos saberes e experiências em resposta
aos desafios da competitividade e da inovação.
Contributos Teóricos e Histórico-Políticos no Contexto da Educação de Adultos em Portugal
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No campo da educação de qualificação importa repensar as ofertas educativas e
formativas em função da sua real procura e necessidade e tentar clarificar a noção de adulto e
que deve ser esclarecido. É cada vez mais fundamental clarificar os conceitos de jovem e de
adulto, ligados indubitavelmente ao contexto sócio-histórico, tal como o define Bourdieu
(1984), à sua natural evolução ao longo dos tempos, associada acima de tudo aos percursos
pessoais e às transformações dos campos familiar e trabalho. No entanto, não é apenas com
esta significação subjetiva de adulto que ficam resolvidos os problemas, sendo que a
conclusão mais fácil, e por vezes mais útil, é socorrermo-nos da definição legal de idade
adulta em Portugal e que corresponde aos 18 anos, sem, contudo, nos desligarmos dos
restantes fatores que caraterizam a maioridade, tais como o casamento e a
paternidade/maternidade.
Até agora o sistema de educação e de qualificação tem sido traçado para responder à
diversidade da população mais jovem, afastando a educação de adultos (na qual se encaixa
agora uma população em idade sénior mas ainda ativa) para um segundo plano (o da criação
de segundas oportunidades para quem não teve a possibilidade de estudar na idade juvenil).
Todavia, é cada vez menor o número de jovens em idade escolar e, em contrapartida, é cada
vez maior o número de adultos (e até de seniores) que procuram as instituições escolares e de
formação para a obtenção de uma qualificação ou requalificação, numa lógica de verdadeira
aprendizagem ao longo da vida e, em muitas situações, de retorno ou permanência no
mercado laboral.
Hoje, os nossos modelos educativos são contra-argumentados, em contextos muito
particulares, pelo modelo educativo de Paulo Freire que, e apesar de alguns dos objetivos a
que se propunha já estarem assegurados nas sociedades contemporâneas e tendencialmente
democráticas, não retira em nada o valor dos pressupostos antropológicos, filosóficos e
pedagógicos da “pedagogia da libertação”:
As soluções não protagonizadas pelas promessas do sistema capitalista têm gerado
algumas inquietações nos campos social e político contemporâneos. Os desvios presentes na
estrutura social portuguesa, tais como a evidente diferença de poder económico entre classes
ou o próprio desprezo daqueles que a classe nenhuma pertencem, devem-nos levar a parar e a
refletir acerca dos caminhos por onde somos conduzidos politicamente, obrigando a nossa
consciência crítica a atuar e a participar ativamente em todas as questões de cidadania.
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ÍNDICE REMISSIVO
1. Questões introdutórias .......................................................................................... 2
2. Dimensões em análise .......................................................................................... 3
2.1. Evolução socioeducativa portuguesa ................................................................ 3
2.2. Do Pós 25 de abril à pré adesão à cee............................................................... 5
2.3. O caso do PNAEBA e… Paulo Freire ............................................................ 10
Considerações finais .................................................................................................... 11
Índice remissivo ........................................................................................................... 13
Bibliografia .................................................................................................................. 14
Contributos Teóricos e Histórico-Políticos no Contexto da Educação de Adultos em Portugal
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LEGISLAÇÃO CONSULTADA
Resolução de Conselhos de Ministros n.º 92/98, de 14 de Julho - Base da Agência Nacional
de Educação e Formação de Adultos (ANEFA).
Decreto-Lei nº 74/91, de 9 de Fevereiro - Estabelece o quadro geral da organização e
desenvolvimento da Educação de Adultos.
Lei n.º 46/86, de 14 de outubro - Lei de Bases do Sistema Educativo, com as devidas
alterações na Lei n.º 115/97, de 19 de setembro (1ª alteração); Lei n.º 49/2005, de 31 de
agosto (2ª alteração à Lei de Bases do Sistema Educativo e 1ª alteração à Lei de Bases
do Financiamento do Ensino Superior) e Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto (estabelece o
regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade
escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos
5 anos de idade).
V Conferência Internacional sobre Educação de Adultos, Hamburgo (1997).
Lei n° 3/79 de 10 de Janeiro - Plano Nacional de Alfabetização e Educação de Base dos
Adultos (PNAEBA).