convenção para o banimento de minas antipessoais de 2024 · caro delegado, É com muito prazer...
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GUIA DE ESTUDOS
Convenção para o
Banimento de Minas
Antipessoais de 2024
O Espaço de Armas Primitivas em um
Mundo Globalizado
Tainá Estanislau Siman Alves Diretora
Marina Nunes Bernardes
Diretora Assistente
Marcus Brandão Drummond Diretor Assistente
Rafael Licínio Tavares
Diretor Assistente
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 3
2 APRESENTAÇÃO DA EQUIPE ............................................................................................. 4
3 AS MINAS ANTIPESSOAIS ................................................................................................... 5
3.1 Definição .......................................................................................................................... 5
3.2 Implicações do Uso de Minas Antipessoais ............................................................... 7
4 O COMITÊ PARA O BANIMENTO DE MINAS ANTIPESSOAIS ....................................... 11
4.1 Histórico......................................................................................................................... 11
4.2 Estrutura ........................................................................................................................ 17
4.3 Grupos Armados Não-Estatais ................................................................................... 18
5 POSIÇÃO DOS PRINCIPAIS ATORES ............................................................................... 20
A. Estados Unidos da América ....................................................................................... 20
B. Rússia ........................................................................................................................... 21
C. China ............................................................................................................................. 21
D. Países Vítimas.............................................................................................................. 21
6 QUESTÕES RELEVANTES NAS DISCUSSÕES ............................................................... 22
1 INTRODUÇÃO
Caro Delegado,
É com muito prazer que lhe apresento o Guia de Estudos da Convenção para o
Banimento de Minas Antipessoais. A intenção desse guia é lhe apresentar o primeiro
contato do tema com os assuntos a serem abordados no comitê, lhes oferecer a
compreensão sobre o tema e ferramentas para estruturar os argumentos a serem utilizados
por vocês nos dias da simulação. Nas seguintes páginas você vai encontrar uma breve
introdução da equipe que compõe a mesa do comitê, formada por uma diretora e três
assistentes. Na seção seguinte, „As minas antipessoais‟, existem informação a definição das
minas, e as consequências civis e estatais para seu uso, e por fim, informações sobre a
assistência às vitimas e prevenção. Na terceira seção „A Convenção para o Banimento de
Minas Antipessoais‟ será levantado um histórico sobre a formação do comitê, sempre ligado
a conceitos que contextualizam o momento da formação do Comitê, além de apresentar
como é formada a estrutura da Convenção. A seguir são apresentadas a „Posição dos
Principais Atores‟, e caso seu país não esteja na lista, você pode consultar o dossiê
disponível no blog (na aba preta, ítem „Dossiês‟), e as „Questões relevantes à discussão‟,
que apresenta perguntas cuja temática será abordada nos dias de simulação, e que servirão
de guia para a elaboração do Documento de Posição Oficial de vocês.
Além do Guia, temos também canais de contato direto com vocês, como o Blog e a
página do Facebook. O endereço do blog é https://16minionuapmbc2024.wordpress.com/,
(Não se esqueça de clicar na aba „Primeiro acesso? Clique aqui‟ no seu primeiro acesso,
para que você saiba aproveitar ao máximo o conteúdo disponível no blog) e lá postaremos
curiosidades e informações extras e interessantes relativas ao tema. A página do facebook
está disponível em https://www.facebook.com/16minionuapmbc2024 e lá você vai ser
notificado através do feed de notícias sempre que tiver material novo no Blog, e não
esqueça de curtir, compartilhar e comentar. Qualquer dúvida relativa ao tema, ao comitê, às
regras ou ao MINIONU não pense duas vezes antes de nos comunicar através do inbox da
página do facebook ou pelo e-mail [email protected].
Aproveite e bons estudos,
Equipe do APMBC 2024
2 APRESENTAÇÃO DA EQUIPE
Meu nome é Tainá Estanislau Siman Alves e sou a diretora do APMBC 2024. Sou
estudante do 6º período do curso de Relações Internacionais da PUC Minas. Fui diretora
assistente da Comisión Interamericana de Mujeres no 14º MINIONU e estive na Logística do
13º MINIONU. Eu era uma estudante do segundo ano do ensino médio (assim como vocês)
quando um dia na hora do almoço liguei a televisão para ver o meu programa favorito na
época: “Não conta lá em casa”, ainda ao ar no canal pago Multishow. Era um episódio no
Afeganistão que mostrava um campo com armamentos da invasão soviética. Me chamou a
atenção como gerações que nem estavam vivas na época da guerra ainda conviviam com
parte da sua presença. Comecei o curso de Relações Internacionais, me aprofundei no
assunto, e cá estamos!
Eu sou Rafael Tavares, estou cursando o quinto período de Relações Internacionais
na PUC Minas e estou muito animado com o que é minha primeira participação como diretor
assistente no MINIONU. Vim a conhecer o projeto aqui mesmo na faculdade e desde então
passei a conhecê-lo como um meio de integração do corpo docente e de aprimoramento
pessoal e profissional. Fico à disposição dos senhores para responder quaisquer dúvidas
sobre o projeto e ajudá-los da maneira que for possível.
Olá, meu nome é Marcus Brandão, sou do 2º período de Relações Internacionais e
serei Diretor Assistente do comitê APMBC (Convenção para o Banimento de Minas
Antipessoais) nesse 16º MINIONU. Fui voluntário de Logística durante o 15º MINIONU, mas
mesmo não participando diretamente dentro dos comitês, foi uma ótima experiência e isso
fez com que eu voltasse a participar do evento. Se precisarem de alguma ajuda, vocês
podem entrar em contato comigo e farei o possível para ajudá-los.
Eu sou a Marina Bernardes e estou no terceiro período em Relações Internacionais.
Eu tive o meu primeiro contato com o MINIONU no ano passado como voluntária e aprendi
muito dentro do projeto; estou muito entusiasmada em poder ter uma participação ainda
maior esse ano como diretora assistente! Eu tenho grandes expectativas que esse
MINIONU, e mais especificamente o APMBC, seja carregado de aprendizado e nos deixe
mais conscientes da importância desse assunto tão pouco divulgado na mídia atual. Espero
conhecer todos pessoalmente durante esse período e podem me procurar se tiverem
qualquer dúvida! Até breve!
3 AS MINAS ANTIPESSOAIS
As minas terrestres antipessoais são consideradas o tipo de arma mais persistente
da atualidade, chegando a ser caracterizada como “o soldado perfeito” pelo general do
Khmer Vermelho, grupo político responsável pelo genocídio no Camboja (1975-1979): “Elas
não precisam de água ou comida, não precisam de salários ou descanso, vão apenas ficar à
espreita por anos e anos aguardando por sua vítima.” (POT, 1995, tradução nossa1). Nesse
capitulo vocês encontrará informações sobre a definição das minas, sua composição e
fabricação, sua criação e uso, e seu objetivo militar
3.1 Definição
As minas terrestres são formalmente definidas como: “Uma mina concebida para
explodir em consequência da presença, proximidade ou contato de uma pessoa e que
incapacite, fira ou mate uma ou mais pessoas.” (APMBC, 1997). O relato mais antigo de
uso de minas foi descoberto por arqueólogos no norte da China, e data mais de 600 anos de
antiguidade. Tecnicamente, elas são compostas por certa quantidade de material explosivo
dentro de uma caixa2, e por um mecanismo de fuzis para provocar a explosão. (GICHD,
2004).
Estima-se a fabricação, até os anos 1990, de mais de 600 tipos de minas
antipessoais diferentes. As mais comuns de serem encontradas são as minas de onda
explosiva (detonada abaixo do próprio solo, logo após ser acionada por uma pisada) e as
minas de fragmentação (acionadas por fios de tropeço, que “pulam” sendo projetadas acima
do solo para 1,80 m de altura, com o objetivo de liberar projéteis que atingem o abdômen ou
a cabeça). Outros tipos importantes são as minas inteligentes (programadas para se auto-
desativarem se não acionadas em um período de 2 a 48 horas), ou minas químicas, que
contêm certa quantidade de gás neurotóxico. (GICHD, 2004).
1 Do inglês original: “It doesn‟t need food or water, it doesn‟t take any salary or rest, and it will lie in
and wait for it‟s victim.” Existe divergência de informação sobre a autoria da frase, havendo inclusive outras versões dela. A ideia geral, no entanto, permanece a mesma. 2 Nas minas mais antigas, as caixas que compõem as minas eram feitas de madeira ou metal. Ao
longo do tempo, e com o avanço da tecnologia, esses materiais foram substituídos pelo plástico. Optar pelo plástico faz com que eles sejam mais leves, menores, mais estáveis, resistentes à agua, e reduzem os custos de fabricação. Além disso, é um material maleável, podendo ser facilmente moldável em formatos aerodinâmicos (possibilitando que as minas sejam despejadas de aviões e helicópteros) e mais difíceis de serem localizadas pelos detectores de metal utilizados nos processo de desminagem (MASLEN, 2004).
Tipos de minas antipessoais
Fonte: GICHD, 2004.
As minas antipessoais foram criadas com o objetivo militar de demarcar uma linha de
defesa com a intenção de “atrasar o inimigo” seja ferindo, matando, desviando ou
simplesmente parando as tropas inimigas. Também são usadas para evitar que a população
ocupe uma determinada região, ou limitar a população a uma determinada área,
desmoralizando e aterrorizando a pulação, ocupando espaço destinado a fontes de
alimentação, etc. (INTERNATIONAL COMMITTEE OF THE RED CROSS, 1997).
Por outro lado, segundo General americano Alfred Grey Gard (1997), ex-comandante
do corpo de fuzileiros navais dos Estados Unidos da América aponta, a efetividade do uso
das minas em combate é questionável: “O emprego de minas tem um alto potencial de
fratricídio –isso é, infligir baixas às suas próprias tropas”, gerando assim mais problemas do
que soluções. Outro exemplo é dado pelo baixo número de relatos de soldados feridos
durante o combate, principalmente se comparado ao grande número de civis vítimas das
minas no período pós-combate. Isso leva Gard a inferir que
Infelizmente, a única proposta para a qual as minas foram utilizadas com total sucesso pelos seus colocadores e com total impacto no alvo foi para a detenção e assolamento de civis. (...) De qualquer maneira, o uso de minas para esses propósitos não tem valor militar, e o sucesso das minas antipessoais neste papel não pode ser usado como justificativa militar para sua retenção (GARD, 1998, tradução nossa
3).
As minas antipessoais são na maior parte das vezes utilizadas em guerras civis e
conflitos regionais por serem fáceis e baratas de implantar, com o custo variando de 2 a 50
dólares por mina, sendo as armas preferidas dos grupos de guerrilha, que, muitas vezes,
têm menor quantidade de recursos do que as forças militares estatais (UNMAS, 2011). Esse
fator constitui frequentemente uma relação entre o uso das minas e o baixo índice de
desenvolvimento econômico local. (LANDMINE AND CLUSTER MUNITION MONITOR,
1999).
3.2 Implicações do Uso de Minas Antipessoais
O efeito da presença das minas antipessoais é internacional e geral, chegando a
atingir mais de 108 países. O Departamento de Estados dos EUA estima que haviam sido
implantadas aproximadamente 400 milhões de minas terrestres só no período sucessor à
Segunda Guerra Mundial (VINES, 1998). A produção anual de minas, também no período
anterior à criação do Tratado de Ottawa4 era estimada entre cinco e dez milhões de minas
por ano (AXWORTHY, 2004). Parte desses milhões de minas implantadas aguardam por
vítimas, resultando em mutilação ou morte. O número de acidentes com minas antipessoais
antes da criação do Tratado de Proibição das Minas estava entre trinta e quarenta mil por
ano.
As crianças estão entre as principais vítimas, e estima-se que haja uma mina para
cada 12 crianças no mundo. Variando de país para país, a porcentagem de crianças varia
entre 20% a 50% do total das vítimas das minas (UNICEF, 2004). O motivo principal para
isso é apontado pela ex-diretora da UNICEF, Carol Bellamy: “A curiosidade natural e a
necessidade de brincar leva as crianças inadvertidamente para os locais de perigo.” O uso
3 Do inglês original: “Sadly, the only purpose for which mines have been used with total success by
the layer and total impact in the target is for the containment or harassment of civilians (…) However, the use of mines for such purposes has no military value, and the success of the AP mines in this role cannot be used as a military justification for their retention” 4 Também conhecido como Tratado para o Banimento de Minas Antipessoais, assinado em 1998 em
Ottawa, Canadá, que deu origem à Convenção para o Banimento de Minas Antipessoais. As informações detalhadas podem ser encontradas na sessão „Histórico‟ desse guia.
de minas constitui assim em crime de guerra5 contra os direitos humanos, por serem armas
de efeitos indiscriminados segundo o Estatuto de Roma (TPI, 2002), e segundo o artigo 51
da Convenção de Genebra, por não fazer distinção entre suas vítimas, atingindo alvos não
militares.
Por diversas vezes os ferimentos causados pelas minas contaminam o corpo com
sujeiras do solo, bactérias, e fragmentos de plástico que levam a infecções secundárias. “a
onda de choque da explosão da mina pode destruir os vasos sanguíneos muitos acima da
perna, levando cirurgiões a amputarem muito acima de onde foi o ferimento inicial” (VINES,
1998, tradução nossa6). O alto número de mutilados acarreta diversas consequências
sociais e econômicas para os países atingidos. Em países de baixo nível de
desenvolvimento, as principais atividades econômicas são a agricultura e outras atividades
braçais, de forma que um grande número de mutilados representa enfraquecimento da
economia pela redução de mão de obra. O nível individual também é afetado, levando os
filhos a largarem a escola para trabalharem, o que leva a família à redução de renda, fome e
miséria.
Os custos relativos à assistência total aos mutilados e engloba o fornecimento de
próteses, seções de fisioterapia, e em alguns casos, pensão por invalidez, e se mostram,
por vezes, altos demais para que os países se disponham à prestar assistência. Em
Moçambique, por exemplo, o tratamento de vítimas de minas correspondia, em 2004, a 30%
do orçamento anual de saúde do governo (VINES, 1998). É necessário ressaltar que os
países recém-saídos de conflitos se encontram fragilizados econômica e socialmente,
muitas vezes com grande parte da infraestrutura de atendimento e auxílio (como hospitais,
por exemplo) comprometidos, e os países que permitem que suas forças coloquem minas
em territórios estrangeiros (seja pelo comando direto ou pelo fornecimento a terceiros) não
se responsabilizam por prestar assistência às vítimas ou fornecer recursos para que o país
fragilizado o faça (UNMAS, 2014).
Os campos minados ameaçam também a vida selvagem e as criações de animais.
Em 1980 foram reportadas as mortes de mais de nove mil cabeças de gado pelas minas
antipessoais, somando assim mais um importante âmbito no qual as minas causam
deficiência econômica, já que o gado para as populações pobres africanas têm funções
econômicas críticas. O problema envolve também consequências ambientais, já que parte
5 Crimes de guerra são violações dos direitos humanos internacionais que tenha ocorrido em épocas
de guerra (seja ela civil ou internacional). Mais informações sobre direitos humanos e os documentos citados nesse parágrafo podem ser encontrados a partir da página 9 desse guia. 6 Do inglês original: The shock wave from an exploding mine can destroy blood vessels wall up the
leg, causing surgeons to amputate much higher than the site of the primary wound.
dos campos se tornam pontos foco de moscas tsé-tsé, que transmitem a “doença do sono7”
resultando na morte de centenas de elefantes (VINES, 1998).
Bebê elefante vítima de mina
Fonte: Daily Mail UK, 2009
Os problemas econômicos levam parte da população a optar por maneiras não
seguras de garantir a sobrevivência, como pessoas que vão aos campos minados e
desenterram as minas na tentativa de abri-las para retirarem delas o cobre e outras partes
reaproveitáveis (como as caixas, caso elas sejam feitas de metal), que serão vendidos em
mercados. Esses materiais podem ser reaproveitados de diversas maneiras, inclusive na
fabricação de novas minas (UNMAS, 2014). Esse tipo de profissão representa um risco para
a população, sendo responsável pelo aumento no número de acidentes e trazendo à pauta a
importância de conscientizar a população.
Em países nos quais o nível de escolaridade e alfabetização é baixo, os esforços
precisam ser redobrados no que diz respeito à transmissão de informação à população
sobre os riscos das minas e prevenção de acidentes. As crianças recebem palestras nas
escolas a fim de serem educadas sobre porque, ao serem levadas pela curiosidade, não
devem se aproximar ou brincar com as minas. Elas ganham panfletos de informação
(normalmente no formato de desenhos) e ao chegar em casa, repassam a informação para
os pais, o que as tornam peça-chave nos programas de prevenção. A sinalização local e o
isolamento das áreas minadas também são essenciais (UNMAS, 2012).
7 As moscas tsé-tsé depositam suas larvas diretamente no solo, de maneira que o espaço aberto e
inutilizado dos campos minados tornam esses os lugares perfeitos para sua reprodução. A doença do sono ataca o sistema nervoso central, podendo levar a morte pessoas e animais (MIYAJI, [s. d.]).
Processo de desminagem (à esquerda), educação infantil sobre minas (à direita)
Fonte: UNMAS, 2009
De forma geral a presença física das minas enfraquece a população criando áreas
marginais à pobreza, isolando populações, desagregando a sociedade e impedindo que as
pessoas voltem aos seus lares, e que os refugiados retornem a ocupar o seu espaço. Elas
impedem fisicamente a agricultura e pecuária, bem como a reconstrução de casas e da
infraestrutura como um todo. Elas causam grandes obstáculos à reconstrução dos países,
altos custos econômicos, e aterrorizam a população a partir de sua (ameaça de) presença.
O medo causado pelas minas causa na sociedade como um conjunto uma sensação
psicológica de que, de alguma forma, a guerra ainda está presente (ICBL, 2014).
Se por um lado, as minas tem baixo valor de custo e implantação, o processo de
desminagem, por outro lado, requer um grau bem mais avançado de tecnologia que a
implantação das minas, custando aproximadamente de cem a mil dólares a remoção de
cada mina, além do alto risco de acidentes nas operações de retirada. (UNMAS, 2011).
Novamente, é necessário ressaltar que os países recentemente saídos de conflitos não têm
as condições necessárias para a retirada das minas, e a sua não retirada agrava ainda mais
os problemas enfrentado por eles nessa época tão crucial para sua reestabilização e
reconstrução pós-conflito, e novamente, os países responsáveis por produzi-las ou implantá-
las raramente as retiram ou fornecem aos Estados recursos que os possibilitem a fazê-lo
(LANDMINES MONITOR, 2014).
Esse conjunto de fatores estabelece uma barreira ao desenvolvimento nas áreas
pós-conflito. Em um resumo, as minas terrestres antipessoais agem fisicamente continuando
a ocupar as áreas da população, criando áreas marginais à pobreza e desencorajam os
refugiados a retornarem ao seu país de origem; agem psicologicamente como fantasmas de
guerra a partir de sua presença e ameaça, sendo empecilho para que a população
reconstrua a história do seu país; e agem economicamente, impedindo a atividade
agropecuária, demandando altos gastos com o processo de desminagem, assistência às
vitimas e aumento do número de mutilados, sendo muito deles incapazes de continuar suas
atividades profissionais.
4 O COMITÊ PARA O BANIMENTO DE MINAS ANTIPESSOAIS
O capítulo pretende fazer um levantamento sobre o histórico de criação do Tratado e
da Convenção de Banimento de Minas, além de introduzir informações e conceitos
necessários para contextualizar esse momento e fornecer embasamento teórico para os
argumentos dos delegados. Logo depois será apresentada a estrutura do comitê.
4.1 Histórico
Para contextualizar o processo de criação do Tratado de Ottawa, é necessário
destacar dois pontos que possibilitaram a emergência da discussão das minas terrestres
antipessoais: a emergência da pauta de direitos humanos e a governança global.
O Direito Internacional Humanitário diz respeito a todos os tratados oficiais nos quais
os países signatários se comprometem a seguir o proposto mesmo em situações de guerras
e conflitos, tendo por fim a intenção de limitar, de alguma forma, o uso da violência e de
determinadas armas, criando e impondo limites nas ações durante os conflitos armados.
Eles têm início em 1864, com a primeira Convenção de Genebra (e as Convenções de
Haia), tendo sido aplicados pela primeira vez durante a Primeira Guerra Mundial, e tendo
seu debate ainda mais intensificado após a Segunda Guerra Mundial, momento a partir do
qual os tratado ficam ainda mais específicos, e as punições mais severas. A emergência e
intensificação do debate sobre o direito humanitário é caracterizada pelo fato de que as
condutas e ações na guerra deixam de ser tratadas no ambiente doméstico para se
tornarem um assunto cada vez mais recorrente na pauta internacional, conforme explicitado
por Nye:
Os direitos humanos são cada vez mais tratados como mais do que apenas preocupações nacionais. Em 2005,
a Assembleia Geral da ONU decidiu que embora os estados tenham a responsabilidade básica de proteger os direitos humanos de seus cidadãos, a comunidade internacional deveria assumir essa responsabilidade se os estados forem incapazes ou não se dispuserem a fazê-lo. (NYE, 2001)
Para o caso das minas terrestres antipessoais, esses Tratados definem o seu uso
como Crime de Guerra por serem armas de efeitos indiscriminados (ou seja, que não fazem
a distinção entre combatentes e não-combatentes), ponto reforçado pela criação do Estatuto
de Roma em 1998, que deu origem ao Tribunal Penal Internacional.8
Juntamente com os direitos humanos, outro assunto relevante é a governança
global. A governança global é um fenômeno recente caracterizado pela atuação de
autoridades não-centralizadas, tais como Organizações Internacionais e ONG‟s, conforme
definido por Rosenau
A governança abrange as instituições governamentais, mas implica também em mecanismos informais, de caráter não-governamental, que fazem com que as pessoas e as organizações dentro de sua área de atuação tenham uma conduta determinada, satisfaçam suas necessidades e respondam às suas demandas (ROSENAU, 2000)
A governança global passa a ser importante para a formação da APMBC a partir de
1990, ano no qual surgiam inúmeras Organizações Internacionais e ONG‟s responsáveis
pelo auxílio às vítimas, área na qual havia nenhuma ou baixa atuação estatal. A Humans
Right Watch9, por exemplo, juntamente com a Médicos pelos Direitos Humanos lançaram a
pesquisa „Minas Terrestres no Camboja: A Guerra dos Covardes‟, a Fundação dos
Veteranos do Vietnã abriu a primeira clínica para próteses no Camboja, e a ONG Hadicap
International10 iniciou a advocacia política através de um programa de auxílio e desminagem.
Com o tempo ficava cada vez mais claro para essas Organizações que o seu
trabalho seria em vão enquanto as minas não fossem banidas, e, além disso, os gastos com
próteses e auxílio às vítimas aumentavam os gastos ao ponto das Organizações não
conseguirem lidar com a demanda. Assim, aliança dessas quatro Organizações deu origem
à ICBL (Campanha Internacional para o Banimento de Minas)11, que buscava a união e
8 Primeiro Tribunal Internacional, tendo sido criado em 2002 para julgar indivíduos que tenham
cometidos Crimes de Guerra, crimes contra a humanidade e crimes de agressão. 9 Organização internacional não-governamental que defende e realiza pesquisas sobre os direitos
humanos. 10 Organização internacional não-governamental que presta auxílio a refugiados. 11
Nome no inglês original: International Campaign to Ban Landmines.
articulação entre as Organizações Internacionais e ONG‟s, além de ter por objetivo o
banimento das minas Antipessoais.
Tudo mudou quando, em 1994, a ICBL se alia à Cruz Vermelha. O fato da Cruz
Vermelha se engajar no processo de apoio ao banimento de minas tem especial significado
por ser uma organização presente em mais de cem países, tendo articulação direta (e
credibilidade) com diversos atores da política internacional. Então, em 1996, o governo do
Canadá convocou uma Conferência Diplomática para a erradicação das minas terrestres,
dando início ao chamado processo de Ottawa, com a presença de 74 países, a Cruz
Vermelha e a ICBL. O clima da reunião era levemente tenso devido à presença das ONG‟s e
dos civis e todos participantes tinham espaço igual na mesa. Lloyd Axworthy, na época
ministro das Relações Exteriores do Canadá, abriu a reunião com um discurso que pedia
que os governos estivessem dispostos a trabalharem juntos e desenvolvessem e
assinassem um Tratado até o ano de 1997. O anúncio mudou completamente o tom da
reunião, causando surpresa, aplausos e incredulidade entre as autoridades ali presentes. A
expectativa da reunião agora era incerta e foi criada uma controvérsia diplomática sobre se
os países iriam aderir à proposta de formular o Tratado. Essa primeira reunião marca o
chamado Processo de Ottawa, que constitui em uma série de reuniões entre 1996 e 1997
(AXWORTHY, 2004).
Existiam diversos dilemas a respeito da elaboração e assinatura do Tratado, todos
eles relacionados às grandes potências militares. Para começar, entre os principais críticos
estavam os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança (Estados Unidos,
França, Reino Unido, Rússia e China), que alegavam a impossibilidade das minas serem
proibidas por não haver um substituto ao seu uso. Era de conhecimento geral que as
grandes potências eram as mais fortes fabricantes e exportadoras de minas, sendo que
esse consistia em um negócio relevantemente lucrativo no mercado militar (AXWORTHY,
2004).
Além disso, parte dos países se recusava a assinar o Tratado por medo de suas
consequências, ou seja, os países assinantes se tornariam vulneráveis aos que não
assinaram, principalmente levando em conta que as grandes potências militares estavam
entre os não signatários. Outro dilema que foi levantado foi a inutilidade da „coalizão dos
anjos‟, ou seja, do que adiantaria os países assinarem o Tratado, sendo que os assinantes
seriam exatamente aqueles de baixo poder militar e que fabricam minas em pequena
escala? Do que adianta um país prometer que não vai mais fabricar/usar minas, se isso não
causaria impacto no banimento internacional? Nesse caso, mesmo que um Tratado fosse
criado, ele não significaria o banimento das minas (AXWORTHY, 2004).
Foto de uma das reuniões do Processo de Ottawa
Fonte: ICBL, 2011
Por outro lado, a população civil, as ONG‟s e as Organizações Internacionais se
alinharam para mobilizar a opinião e pressionar os governos. “Algo como duas mil
organizações num trabalho em rede haviam trazido atenção ao problema. Agora esta rede
devia ser alinhada ao foco no processo do tratado (AXWORTHY, 2004)”. Os dias das
reuniões eram marcados por um forte trabalho por parte das organizações internacionais
para influenciar os delegados através de diversos eventos nas ruas, conferências à
imprensa, emissão de comunicados e alertas e exposições dentro dos salões de
conferência. A pressão civil a favor do Tratado era forte, organizada e direcionada.
O objetivo era influencia líderes específicos, um a um (...) Um dia eu recebi um telefonema de um ministro estrangeiro europeu perguntando se eu poderia ajudar a estancar o dilúvio de faxes de todo o mundo que estava inundado os escritórios dos legisladores de seu país. Eu disse a ele que isto não estava a meu alcance fazer. A mensagem estava sendo distribuída (AXWHORTY, 2004, tradução nossa
12).
12
Do inglês original: “The aim was to influence specific leaders one by one (…) One day I received a call from a European foreign minister asking if I could help turn off the deluge of faxes from all over the globe that was flooding the offices of legislators in this country. I told him it wasn‟t in my purview to do. The message was being delivered.”
Dessa forma, é possível também destacar a relevância das tecnologias de
comunicação. Se em 1992, assim que surgiram as primeiras organizações para assistências
às vítimas de minas, faltava um modo de fácil integração e articulação entre elas, a troca de
informação feita graças às tecnologias muda esse cenário.
As telecomunicações e os trabalhos em rede ligados via internet são importantes em diversos aspectos. Primeiro, elas provêm uma rede de observadores que não apenas facilitou a difundir o esclarecimento das fontes de problemas mas também vai facilitar muito o papel de monitoramento da sociedade civil a classificar os Estados e a indústria com relação ao tabu das minas terrestres antipessoais. Assim, por exemplo, com a circulação de informações da Human Rights Watch através de listas de e-mail, distribuição de notícias, e diretamente na Internet, ativistas tem posto a escrutínio público o que os Estados e as indústrias estava satisfeitas em manter fora dos olhos do público. (PRICE, 1998, tradução nossa
13)
Em 3 e 4 de dezembro de 1997, na cidade de Ottawa, Canadá, 121 países
assinaram o Tratado de Ottawa (também conhecido como Tratado para o Banimento de
Minas Antipessoais) e firmaram seu compromisso com a erradicação das minas
antipessoais. Um número tão alto de signatários em um primeiro momento apenas
exemplifica a urgência com a qual o assunto deveria ter sido debatido e erradicado. Os
países signatários se comprometem a nunca fabricar, usar, manter, exportar ou importar
minas antipessoais, nem a encorajar ou ajudar a outros países que o façam, além de
destruir todo o seu arsenal. Além disso, os países signatários são responsáveis pela
desminagem do seu território, e o Tratado encoraja as doações para desminagem e
assistências às vítimas a todos os seus signatários.
O tratado dá origem também ao UNMAS e à APMBC. O UNMAS (Serviço das
Nações Unidas para Ações Antiminas14) é um serviço das Nações Unidas que apoia a
erradicação de minas, agindo na educação preventiva da população, assistência às vítimas,
destruição de arsenal (para os países que muitas vezes não tem condições financeiras para
fazê-lo) ou processo de desminagem, além de agir em conjunto com outros 14
13
Do inglês original: “Telecommunications and hyperlinked networks on the Internet are important in several respects. First, they provide a web of surveillance that has not only facilitates widespread awareness of the sources of the problem but also will greatly facilitate the watchdog role of civil society in grading state and industry compliance with the AP land mine taboo. Thus, for example, by circulating information from Human Rights Watch through e-mail lists, news releases, and directly on the Web, activists have put under public scrutiny activities that states and industries previously were quite content to keep out of public eye.” 14
Em inglês United Nations Mine Action Service, sem sigla oficial em português.
departamentos das Nações Unidas para quaisquer outras ações necessárias15 (UNMAS,
2015). A APMBC (Convenção para o Banimento de Minas Antipessoais16) é o nome dado à
Convenção que se reúne anualmente para debater problemas e demandas relativas às
minas antipessoais e ao Tratado de Banimento de Minas.
A assinatura do Tratado estabelece um marco histórico segundo Kofi Annan, na
época secretário geral da ONU, “um passo marcante na história do desarmamento”, não só
por sua rapidez (o Tratado foi criado em pouco mais de um ano, um acontecimento até
então nunca visto), mas também pela inovação que ele trouxe no âmbito da diplomacia
(ICBL, 1999). Como consequência do Processo de Ottawa, e em reconhecimento às
inovações em diplomacia, a ICBL ganha o Prêmio Nobel da Paz de 1997 (juntamente com a
sua coordenadora, Jody Williams).
Jody Williams recebendo o Prêmio Nobel
Fonte: ICBL, 2011
15
Caso haja demanda, por exemplo, de refugiados isolados pelas minas, a UNMAS se torna responsável por entrar em contato com outras agências da ONU para que esses refugiados recebam suprimentos de emergência. “A extensão do envolvimento do UNMAS depende do âmbito do problema”. 16
Em inglês APMBC significa Anti-personnel Mine Ban Convention, e não tem sigla oficial no português. O nome completo e formal, tanto do Tratado quando da Convenção é “Tratado (ou Convenção) sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção, e Transferência de Minas Antipessoais e sobre sua Destruição”.
Essa inovação foi, claro, possível graças às condições do momento, abordadas
nesse tópico: a governança global, o crescimento da importância dos direitos humanos no
cenário internacional e as tecnologias de comunicação. E para o contexto do ano de 2024,
ainda existirá espaço para as minas antipessoais?
4.2 Estrutura
O escritório da Convenção do Banimento de Minas Antipessoais é localizado em
Genebra e é responsável por fornecer informações à mídia e institutos de pesquisa e a
receber toda documentação dos países signatários e não-signatários que façam referência á
seu status na Convenção ou assuntos a serem debatidos nas próximas reuniões. Esses
documentos podem ser pedidos de ajuda humanitária, informações relativas a extensão de
áreas minadas e em processo de desminagem, e relatórios sobre quantidades de minas no
arsenal (alguns países signatários mantém pequenas quantidades, sem poder explosivo,
para fim de treinamento do exército) e destruição de arsenal, tipo, localização e quantidade
das minas em território minado e arsenal, entre outras.
A Convenção conta também com dois tipos de reuniões: as Reuniões dos Estados
Partes e as Conferências de Revisão. As Reuniões dos Estados Partes acontecem
anualmente e tem o objetivo de considerar qualquer assunto relativo à aplicação ou
implementação da Convenção, incluindo cooperação e assistência internacional,
desenvolvimento de novas tecnologias de desminagem, solicitações de ajuda para
desminagem etc. As Conferências de Revisão acontecem de 5 em 5 anos e tem o objetivo
de revisar o funcionamento e estado da Convenção, tomar decisões sobre as solicitações de
ajuda humanitária para desminagem e assistência às vítimas e adotar conclusõs finais
relacionadas a implementação da Convenção.
Estados que ainda não assinaram o Tratado, as Nações Unidas e outras
organizações internacionais e regionais pertinentes podem ser convidadas a participarem de
ambas as reuniões como atores observadores. No caso da 5ª Conferência de Revisão
(2024) da APMBC, levando em conta que todas decisões tomadas serão Emendas ao
Tratado de Banimento de Minas Antipessoais, e que o número de atores signatários do
Tratado é relevantemente maior que o número de atores não signatários, decidiu por
declarar os Estados não-signatários como atores com direito à voto.17
17 As informações adicionais e completas sobre o funcionamento do comitê e da simulação poderão
ser encontradas no Guia de Regras disponível no blog.
4.3 Grupos Armados Não-Estatais
O objetivo do Tratado de Banimento de Minas é claro e objetivo: banir e uso e
produção de minas terrestres antipessoais sobre todos os territórios, utilizando-se de um
Tratado, no qual os Estados se comprometem a não mais produzir ou usar minas
antipessoais para alcançar esse fim. Porém, conforme apontado pelo mapa abaixo, as
ferramentas não estão exatamente garantindo o fim.
O uso de minas antipessoais
Fonte: ICBL, 2014
O mapa acima compara o uso pré-tratado de minas antipessoais, (sendo esse em
sua maior parte caracterizado pelo uso por parte do Estado, em vermelho), com o uso de
minas antipessoais em 2013-2014, em um momento pós-tratado. É possível observar que a
maior parte dos usos de minas antipessoais atualmente não é realizado pelos Estados, mas
sim por grupos armados não-estatais (representado pelas caveirinhas no segundo mapa).
Essa questão não foi, até hoje, abordada nas reuniões da APMBC. Consta apenas, no
Tratado de Banimento de Minas Antipessoais, que a responsabilidade quanto à produção e
uso de minas por Grupos Armados Não-Estatais cabe aos Estados nos quais esses grupos
têm origem:
Cada Estado Parte tomará todas as medidas legais, administrativas e outras apropriadas, inclusive a imposição de sanções penais, para prevenir e reprimir toda atividade proibida a um Estado Parte de acordo com esta Convenção executada em território ou por pessoas sob sua jurisdição ou controle. (APMBC, 1997)
A definição de grupos armados não estatais é incerta e extensa, englobando grupos
que tem apoio dos governos, milícias parcialmente controladas pelos governos, grupos de
oposição, autoridades parcialmente reconhecidas pelo governo, ou até mesmo autoridades
que de fato controlam determinadas áreas, sendo reconhecidos pela população local com
legitimidade. Os grupos armados não estatais são inclusive reconhecidos por uma infinidade
de nomes: movimentos rebeldes, movimentos de guerrilha, grupos terroristas, ou grupos
armados de oposição são apenas alguns deles (GENEVA CALL, 2000).
Esses grupos na maior parte das vezes não têm recursos financeiros comparáveis
aos dos exércitos estatais oficiais, o que os levam muitas vezes a optarem pelas minas
antipessoais como armamento devido ao seu baixo custo e facilidade de acesso à
tecnologia necessária para fabricá-las. Além disso, os grupos armados não estatais podem
estar envolvidos de outras formas, como na permissão da desminagem de áreas controlada
por eles, na articulação em contatar e engajar outros grupos armados não-estatais, ou até
mesmo pressionar governos aos quais eles se opõe, principalmente no caso desses
governos estarem fazendo o uso de minas e colocando a culpa em grupos armados não-
estatais (GENEVA CALL, 2000).
A maior dificuldade encontrada está em estabelecer diálogos com os grupos
armados não estatais. A maioria dos governos se recusa em estabelecer diálogo direto com
esses grupos pois isso é um sinal de reconhecimento de sua autoridade e existência. Para
isso, existem Organizações Internacionais responsáveis por negociar diretamente com
esses grupos. Para que a negociação seja feita além de grande quantidade de recursos
para que sejam estabelecidas essas linhas de diálogo, pois muitos desses grupos são
difíceis de serem encontrados ou contatados. Eles são então, informados sobre o mau dos
usos das minas e dependendo de seus interesses, optam ou não por banir as minas
antipessoais. Esses compromissos são então formalizados através de declarações
unilaterais ou acordos bilaterais. Eles podem também, através dessas ferramentas,
formalizar aos Estados sua pré-disposição a renunciar ao uso de minas em um futuro
próximo ou declarar seu suporte aos processos de desminagem de áreas sob seu controle
(GENEVA CALL, 2000)
A falta de objetividade no Tratado ao abordar a questão levantada demonstra
emergência a debater sobre grupos armados não estatais, caso seja realmente de interesse
das nações banir completamente as minas antipessoais, conforme apontado pela ICBL:
Qual o propósito prático de um Tratado que dialoga apenas como metade dos atores que se utilizam das minas? Um Tratado que ignora, por razões de conduta diplomática, alguns dos mais ativos usuários dessa arma? Eu aceito que existam diversas razões pelas quais governos e grupos armados não estatais possam estar restritos, por circustâncias prevalescentes, de se engajarem em um diálogo direto ou reconhecer a legalidade um do outro. Mas a ICBL é uma organização internacional em parceria com diversas ONG‟s com um mandato para parar o sofrimento humano causado pelas minas antipessoais. Nós (a ICBL) não temos restrições, nem deveríamos ter
18 (MCGRATH, 2000, tradução nossa
p. 27).
5 POSIÇÃO DOS PRINCIPAIS ATORES
A. Estados Unidos da América
O posicionamento da maior potência militar da atualidade tem variado de gestão para
gestão. Bush descartou totalmente a possibilidade de assinar o Tratado, porém prometeu
estudar alternativas que não ferissem o direito à segurança do Estado, divergindo de seu
antecessor, Bill Clinton, que pareceu favorável à aderência (ARMS CONTROL
18 Do inglês original: What is the practical purpose of a treaty which only addresses half the ‘Mine Laying Actors?’ A treaty which ignores, for reasons of diplomatic nicety, some of the most active users of the weapon? I accept that there are many reasons why governments and NSAs may be restricted by prevailing circumstances from engaging in direct dialogue or recognizing each other’s legality. But the ICBL is an international partnership of NGO’s with a mandate to stop human misery caused by landmines. We have no such restrictions, nor should we have.
ASSOCIATION, 2001). Já em julho de 2014, a Casa Branca emitiu uma nota na qual os
Estados Unidos se compromete a não fazer uso de minas antipessoais, com a exceção de
que elas sejam necessárias para a defesa da Coreia do Sul (WHITE HOUSE, 2014).
B. Rússia
A Rússia afirma sua pré-disposição em assinar o Tratado em algum momento futuro,
porém levanta sua preocupação com a ausência de uma alternativa ao uso de minas
antipessoais. Além disso, alega que os prazos apresentados no Tratado seriam curtos
demais, tornando financeiramente inviável a tarefa de destruir o estoque e desminar o seu
território. As minas de produção russa estão implantadas nos territórios das grandes vítimas
do seu uso, tais como Angola, Moçambique e Afeganistão. (LAND MINES ANS CLUSTER
MUNITION MONITOR, 2014)
C. China
A China afirma interesse em iniciar diálogo com os países signatários, porém em
nenhum momento mencionou a possibilidade de assinar o Tratado. No entanto, não existem
registros de uso de minas antipessoais chinesas em conflitos recentes. (LAND MINES ANS
CLUSTER MUNITION MONITOR, 2014)
D. Países Vítimas
São aqueles considerados as principais vítimas das minas antipessoais. Eles têm
como característica uma alta porcentagem de território minado, um alto número de vítimas e
acidentes com minas, e são signatários do Tratado. Grande parte deles possui também
baixos níveis de desenvolvimento humano e fraca economia, consequências decorrentes de
anos de conflito. As minas em seu território têm origem estatal e são majoritariamente
provenientes de guerras civis, ou guerra internacionais. Exemplos de países vítimas são:
Congo, Somália, Moçambique, Camboja, Afeganistão e Angola. (UNMAS, 2012)
6 QUESTÕES RELEVANTES NAS DISCUSSÕES
• Como incentivar a universalização de aderência ao Tratado, principalmente no que
diz respeitos às superpotências?
• Os principais países fabricantes devem passar a se responsabilizar diretamente
pelas consequências do uso de suas minas mesmo que fora do seu território, como por
exemplo no sentido de prestar assistência?
• É possível estabelecer punições aos Estados signatários que tenham o seu uso ou
produção de minas antipessoais comprovados?
• As minas inteligentes devem ser consideradas opções aos países não signatários?
• Qual a origem das minas pessoais utilizadas pelos grupos armados? Elas seriam
fabricadas por eles mesmos, ou compradas de países produtores?
• Os países devem buscar o diálogo com grupos armados não estatais produtores de
minas? Se não, quais as possíveis soluções para o problema?
REFÊRÊNCIAS
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TABELA DE DEMANDA DAS REPRESENTAÇÕES
Na tabela a seguir cada representação do comitê é classificada quanto ao nível de
demanda que será exigido do delegado, numa escala de 1 a 3. Notem que não se trata de
uma classificação de importância ou nível de dificuldade, mas do quanto cada
representação será demandada a participar dos debates neste comitê. Esperamos que essa
relação sirva para auxiliar as delegações na alocação de seus membros, priorizando a
participação de delegados mais experientes nos comitês em que a representação do colégio
for mais demandada.
Legenda
Representações pontualmente demandadas a tomar parte nas
discussões
Representações medianamente demandadas a tomar parte nas
discussões
Representações frequentemente demandadas a tomar parte nas
discussões
República Islâmica do Afeganistão
República da Albânia
República Federal da Alemanha
República de Angola
República Democrática e Popular da Argélia
Comunidade da Austrália
República da Áustria
República do Azerbaijão
Reino da Bélgica
República da Bósnia e Herzegovina
República do Burundi
Reino do Camboja
Canadá
República do Chade
República Popular da China
República da Colômbia
República Democrática Popular da Coreia
República da Coreia
República de Cuba
República da Croácia
El Salvador
Emirados Árabes Unidos
República do Equador
Estado da Eritreia
Estados Unidos da América
República da Estônia
República Democrática Federal da Etiópia
República da Finlândia
República do Iêmen
República da Índia
República Islâmica do Irã
República do Iraque
Estado de Israel
República Italiana
Japão
Reino Hachemita da Jordânia
República Democrática Popular Lau
República Libanesa
Estado da Líbia
República da União de Mianmar
República de Moçambique
República da Nicarágua
República do Níger
Reino da Noruega
Reino dos Países Baixos
República Islâmica do Paquistão
República do Peru
Reino Unido da Grã Bretanha e Irlanda do Norte
Federação Russa
República do Senegal
República de Singapura
República Árabe Síria
República Federal da Somália
República do Sudão
República do Sudão do Sul
Confederação Suíça
Reino da Tailândia
República do Tajiquistão
República Tunisina
República da Turquia
Ucrânia
República de Uganda
República Socialista do Vietnã
CICV - Comitê Internacional da Cruz Vermelha
ICBL - Campanha Internacional pelo Banimento de Minas Terrestres
UNMAS - Serviço das Nações Unidas para Ação Antiminas