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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS
Curso de Graduação em FarmáciaBioquímica
A INFLUÊNCIA DA MICROBIOTA INTESTINAL NA SAÚDE HUMANA E A
POSSÍVEL RELAÇÃO COM TRANSTORNOS MENTAIS E
COMPORTAMENTAIS
Raphael Kawashita
Trabalho de Conclusão de Curso de FarmáciaBioquímica
da Faculdade de Ciências Farmacêuticas
Orientadora:
Profa. Dra. Edna Tomiko Myiake Kato
São Paulo
2018
INDICE
LISTA DE ABREVIAÇÕES……………………………………………………..i
RESUMO………………………………………………………………………....ii
1. INTRODUÇÃO…………………………………………………………………...01
2. OBJETIVOS……………………………………………………………………...03
3. MATERIAIS E MÉTODOS……………………………………………………...03
3.1. Estratégias de pesquisa…………………………………………………...03
3.2. Critérios de inclusão……………………………………………….……….03
3.3. Critérios de exclusão……………………………………………………….03
3.4. Coleta e análise de dados…………………………………………………03
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO………………………………………………..04
4.1. Microbiota intestinal e a relação com a saúde humana………………..04
4.2. Probióticos, probióticos e simbióticos…………………………………….05
4.3. Comportamento social, transtornos mentais e comportamentais……..09
4.3.1. Estresse………………………………………………………………13
4.3.2. Depressão……………………………………………………………14
4.3.3. Ansiedade…………………………………………………………….15
4.3.4. Outros transtornos estudados……………………………………...17
4.4. Mecanismo de ação dos probióticos…………………………….………..19
5. CONSIDERASÕES FINAIS……………………………………….……………20
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………………………...23
7. ANEXOS……………………………………………………………….………….27
i
LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS
ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CID Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à
Saúde
GABA – ácio gamaaminobutírico
OMS – Organização Mundial da Saúde
RDC – Resolução de Diretoria Colegiada
SNC – Sistema Nervos Central
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso
TMC– Transtornos Mentais e de Comportamento
TOC – Transtorno ObsessivoCompulsivo
UFC – Unidades Formadoras de Colônia
WGO – World Gastroenterolgy Organisation
LISTA DE FIGURAS
página
Figura 1. Fluxograma de seleção de artigos utilizados no trabalho de conclusão de curso...........................................................................
04
Figura 2. Mecanismo dos efeitos dos probioticos no sistema nervoso central................................................................................................
18
LISTA DE QUADROS
página
Quadro 1. Linhagens de microrganismos com as alegações e condições de uso (Brasil, 2017)......................................................... 07
Quadro 2. Estudos préclínicos avaliando a influência de probióticos em transtornos mentais e comportamentais. Período de 20112018. 11
Quadro 3. Estudos clínicos avaliando a influência de probióticos em transtornos mentais e comportamentais. Período 20112018............. 12
ii
Kawashita, R. A influência da microbiota intestinal na saúde humana e a
possível relação com transtornos mentais e comportamentais. 2018. 27 p.
Trabalho de Conclusão de Curso de FarmáciaBioquímica – Faculdade de
Ciências Farmacêuticas – Universidade de São Paulo, São Paulo 2018
Palavraschave: “transtornos comportamentais e mentais”; “probióticos”, “prebióticos”
RESUMO
Os transtornos mentais e de comportamento (TMC) afetam milhões de pessoas
no mundo, influenciando as atividades no cotidiano e resultando em empecilho no
convívio social. Estimase que mais de 350 milhões de pessoas sofrem de
depressão. Alarmante é o número de indivíduos que, ou não buscam tratamento
ou, não respondem às terapias e o uso de medicamentos convencionais.
Concomitantemente, a literatura tem enfatizado a possível relação da microbiota
gastrointestinal com o desenvolvimento de diversas doenças e, mais
recentemente, em distúrbios mentais e de comportamento. Essa conexão entre o
intestino e o cérebro e suas vias conhecidas como eixo intestinocérebro, inclui
cérebro, glândulas, intestino, células que participam do sistema imunitário e a
microbiota do trato gastrointestinal. Com isso, essa microbiota vem emergindo
como um potencial modulador do comportamento do ser humano e,
pesquisadores tem sugerido a recuperação ou manutenção da saúde do
indivíduo, buscandose o equilíbrio do microbioma, por exemplo, introduzindose
prebióticos e probióticos na alimentação. Com o objetivo de avaliar o panorama
do conhecimento sobre a influência da microbiota intestinal na saúde humana,
foram analisados estudos científicos de 2011 a 2018, sobre a relação da
microbiota com a saúde e doença humanas, restringindose aos principais TMC.
No levantamento de literatura foram consultadas bases de dados disponíveis na
Universidade, artigos científicos, além de textos e manuais disponibilizados em
sítios oficiais. Na seleção dos materiais usados para compor o TCC foram usadas
palavraschave, em português e em inglês, relativas ao tema associadas a
operadores boleanos. No período, verificouse que a manutenção da microbiota
equilibrada no individuo está sendo relacionado com a prevenção e tratamento de
doenças, inclusive no sistema nervoso central (SNC). Os ensaios in vitro e in vivo
iii
mostraram indicativos de efeito promissor, e no estágio de conhecimento atual, os
poucos ensaios clínicos disponíveis, muitas vezes com pessoas sadias ou com
quadros leves de TMC, sugerem resultado positivo em casos de depressão,
ansiedade e estresse. A maior parte dos estudos analisados usaram
microrganismos do gênero Bifidobacterium (B. longum, B. breve, B. infantis) e
Lactobacillus (L. helveticuse L. rhamnosus), com doses entre 109 e 1010 UFC por
2 semanas em animais e 4 semanas em humanos. Estes probióticos, utilizados
isolados ou em associação, melhoraram transtornos de ansiedade e depressão
em animais de laboratório, mas em humanos alguns dos resultados são
contraditórios, ressalvandose que o número de voluntários em cada estudo é
pequeno (25 a 140 pessoas) e os microrganismos usados diferentes. Observa
se que falta muito a se desenvolver nessa area pois predominam ensaios com
roedores. Embora a manutenção do microbioma equilibrado no individuo seja
relacionada com a prevenção e tratamento de doenças, inclusive no SNC, mais
estudos controlados e de qualidade em humanos, são necessários para
potencializar essa estratégia. Na direção do crescimento do conhecimento
científico do microbioma na saúde e na busca de prevenção de doenças, as
indústrias de alimentos e farmacêutica tem investido na area, depositando
patentes e disponibilizando produtos contendo pré e probióticos, hoje com a
alegação de efeito benéfico no equilíbrio da flora intestinal, bem como
medicamento biológico.
1
1. INTRODUÇÃO
O trato gastrointestinal do ser humano é colonizado por microrganismos,
conhecido como microbiota, em número aproximadamente igual ao de células
no corpo humano (Sender et al., 2016). Sabese que a colonização microbiana,
que começa no nascimento do indivíduo, tem o seu desenvolvimento
influenciado por fatores, como dieta, atividade física, ciclos hormonais,
envelhecimento, doenças e terapias, entre outros. Em indivíduos saudáveis, a
microbiota é relativamente estável e mantém uma relação de simbiose com o
hospedeiro, mas alterações qualitativas e quantitativas na sua composição
podem ocasionar a disbiose patológica, que tem sido relacionada a distúrbios
intestinais e extraintestinais (D’Argenio, Salvatore, 2015; O'Toole, Jeffery,
2015).
A composição da microbiota intestinal é complexa, considerandose a
variação interpessoal e flutuações ao longo da vida do indivíduo ou de uma
população, principalmente durante a doença. A literatura mostra a dificuldade
em caracterizar o que seria a microbiota adequada para a manutenção ou
promoção da saúde, mas pesquisas realizadas principalmente na Europa e nos
Estados Unidos tem avançado nessa direção (Falony et al., 2016; D’Argenio,
Salvatore, 2015; Lozupone et al., 2012; Yatsunenko et al., 2012).
Reconhecese que esses microrganismos estão envolvidos no
desenvolvimento e funcionamento de diversos processos fisiológicos, como
digestão, crescimento e manutenção da homeostase. Pesquisadores tem
mostrado a possível relação da microbiota gastrointestinal com o
desenvolvimento de obesidade, diabetes, inflamações e, mais recentemente,
temse enfatizado o papel do eixo microbiotaintestinocérebro em distúrbios
como a depressão, ansiedade e autismo. Atualmente, essa conexão entre o
intestino e o cérebro é reconhecida, e suas vias conhecidas como eixo intestino
cérebro, que incluem cérebro, glândulas, intestino, células que participam do
sistema imunitário e a microbiota do trato gastrointestinal (Rieder et al., 2017;
Wang, Kasper, 2014).
Com isso, a microbiota vem emergindo como um potencial modulador do
comportamento do ser humano (Cryan, Dinan, 2012). Transtornos mentais e
comportamentais afetam milhões de pessoas no mundo e influenciam as suas
atividades no dia a dia. A ansiedade, um estado psicológico caracterizado por
2
apreensão e medo, é um dos transtornos mais comuns na população urbana.
De acordo com pesquisas, cerca de 34% da população mundial são afetados
pela ansiedade ao longo de suas vidas. Estimase que mais de 350 milhões de
pessoas sofrem de depressão. O mais alarmante é o número de indivíduos que,
ou não buscam tratamento ou não respondem às terapias ou ao uso de
medicamentos convencionais (Rieder et al., 2017; Wang, Kasper, 2014).
Pesquisadores (D’Argenio, Salvatore, 2015; Bäckhed et al., 2012) tem
sugerido a recuperação ou manutenção da saúde do indivíduo, buscandose o
equilíbrio do microbiota, citando como exemplos o transplante de microbiota
fecal, ou da introdução de prebióticos e probióticos na alimentação, entre outras
possibilidades.
O transplante fecal é um método novo e pouco explorado, que consiste
em alterar a microbiota intestinal, transferindose uma solução fecal de um
doador sadio para um receptor com grave quadro de diarréia devido à infecção
por bactéria resistente, normalmente em ambiente hospitalar (Castro, Ganc,
Ganc, 2015; Smits et al., 2013).
A primeira descrição de uma doação fecal humana como agente
terapêutico foi na China. O transplante do material fecal pode ser realizado por
meio de diferentes métodos, como via tubo nasogástrico, endoscopia,
colonoscopia, entre outros. O risco de transmissão de patógenos não pode ser
excluído, então é importante haver uma seleção entre os doadores, evitando
potenciais riscos. Nos os últimos anos verificase que alguns hospitais dispõem
de banco de armazenamento de microbiota (Castro, Ganc, Ganc, 2015; Smits et
al., 2013).
Assim, neste trabalho de conclusão de curso, apresentase o panorama
do conhecimento sobre a influência da microbiota intestinal na saúde humana,
analisando como os desequilíbrios na sua composição e interações com o
hospedeiro influenciam na ocorrência de doenças, principalmente as doenças
do sistema nervoso. E, com o aumento do entendimento das funções dessa
microbiota na fisiologia podese avaliar o progresso no desenvolvimento de
estratégias terapêuticas, tornando a manipulação do microbioma um adjuvante
da terapia convencional.
3
2. OBJETIVO
Este trabalho de conclusão de curso visa analisar:
• Os estudos científicos, no período de 2011 a 2018, sobre a relação da
microbiota intestinal com a saúde e doença humanas, restringindose às
principais doenças relacionadas a transtornos mentais e comportamentais;
• A possibilidade de aplicação de estratégias terapêuticas, aliadas à
manipulação da microbiota para o cuidado de pessoas acometidas por essas
doenças.
3. MATERIAIS E MÉTODOS
3.1. Estratégias de pesquisa
A revisão de literatura foi realizada, no período de 2011 a 2018, em bases
de dados como Web of Science, SciELO, Scopus e Medline, utilizandose
palavraschave como ‘intestinal microbiome’, ‘intestinal microbiota’,‘healthy’,
‘brain’, ‘review’, ‘social behavior’, associadas a operadores boleanos ‘and’ e ‘or’.
3.2. Critérios de inclusão
Os artigos, publicados no periodo de 2011 a 2018 que se mostraram em
conformidade com o tema do projeto, publicados em periódicos indexados e
disponibilizados na íntegra online em ingles, espanhol ou em português, foram
selecionados para compor o trabalho. Para o melhor entendimento do texto,
quando necessário, foram incluídos artigos científicos anteriores ao período
estabelecido.
3.3. Critérios de exclusão
Os artigos em idiomas diferentes dos mencionados no item anterior, em
duplicidade e com dados inconclusivos, foram desconsiderados.
3.4. Coleta e análise de dados
Na triagem dos artigos foram observados inicialmente os títulos, seguido
da leitura dos resumos. Os artigos que se enquadraram nos critérios de inclusão
assim selecionados foram analisados e incluídos no TCC (figura 1).
4
Figura 1. Fluxograma de seleção de artigos utilizados no trabalho de conclusão
de curso.
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO.
A relação da microbiota intestinal com a saúde e doença humanas foi restrita
aos principais distúrbios relacionados a transtornos mentais e de comportamento.
Deste modo, os resultados foram subdivididos em itens e são apresentados na
seguinte sequencia: conceitos fundamentais para o desenvolvimento do tema
(microbiota, probióticos, prebióticos, transtornos de comportamento e mentais);
estudos préclínicos em modelos animais e clínicos relacionando alguns desses
transtornos com a microbiota intestinal, e considerações sobre a evolução desse
eixo de pesquisa.
4.1. Microbiota intestinal e a relação com a saúde humana
O trato gastrointestinal dos mamíferos possui um grande e diverso
número de microrganismos, conhecidos como microbiota. Esta possui relação
simbiótica com o hospedeiro, com interações ainda não bem estabelecidas, mas,
5
observase a influencia de células imunes e epiteliais, de forma que alterações
em sua composição podem levar a efeitos diretos na saúde humana (Sanchez
et al., 2017).
O primeiro passo para entender a relação simbiótica entre a microbiota e
o hospedeiro é definir qual a composição de uma microbiota saudável, e as
alterações relacionadas a doenças. Entretanto, a complexidade da microbiota e
a variação entre indivíduos dificulta a definição de um padrão para o que seria a
composição ideal, mas pesquisadores (Lozupone et al., 2012) tem mostrado que
a perturbação dessa relação simbiótica pode ser associada ao desenvolvimento
de doenças.
Com múltiplas vias de sinalização relacionadas ao sistema
gastrointestinal, existe um crescente interesse em associar a microbiota com a
saúde humana. O sistema nervoso entérico, por exemplo, comunica mudanças
sutis do sistema gastrointestinal ao cérebro através do nervo vago (Furness et
al., 1999). Pesquisadores tem se referido a essa via de sinalização como eixo
cérebrointestino e seus componentes tem sido alvo de estudos devido à sua
importância inclusive na digestão e saciedade (Westfall et al., 2017; Konturek et
al., 2004).
Muitas doenças como obesidade, diabetes e inflamações estão
relacionadas a alterações da composição da microbiota, e estudos recentes tem
mostrado um potencial papel no eixo cérebrointestino em desordens
neuropsiquiátricas como depressão e ansiedade. Os possíveis mecanismos que
podem causar impactos à saúde através de alterações da microbiota incluem a
ativação do eixo hipotálamohipofisárioadrenal (HHA) e alterações na atividade
de neurotransmissores e sistema imune. A elucidação da interação do intestino
e cérebro pode auxiliar no melhor entendimento da relação entre o sistema
gastrointestinal e as doenças do sistema nervoso central (Rieder et al., 2017).
A busca da recuperação ou manutenção da saúde humana tem
direcionado a alterações na rotina diária e, neste TCC, foram destacadas as
relacionadas à mudança no hábito alimentar adicionandose pré e probióticos
no cotidiano.
6
4.2. Probióticos, prebióticos e simbióticos
Os probióticos são microrganismos vivos capazes de melhorar o equilíbrio
microbiano intestinal produzindo efeitos benéficos à saúde do indivíduo (Brasil,
2002). Os microrganismos vivos, quando consumidos em quantidade adequada
devem atuar no intestino do individuo, após passagem pelo sistema digestório,
garantindo efeitos benéficos e sem riscos ao hospedeiro. Também devem
manter suas características como microrganismos e permanecer estáveis
durante o seu período de modulação e durante a sua permanência na matriz à
qual foi incorporada (Butel, 2014).
Os gêneros de bactérias mais utilizados no mercado mundial são
Lactobacillus e Bifidobacterium, mas outros gêneros podem ser empregados,
como Enterococcus, Streptococcus, Leuconostoc, entre outros (Butel, 2014).
Lactobacillus e Bifidobacterium são os microrganismos mais bem estudados
quanto à eficácia e segurança, além de características necessárias para
caracterizálos como probióticos, resistência a condições de processamento, a
acidez gástrica e sais biliares, lisozima, capacidade de aderência à mucosa e os
carboidratos usados como fonte de carbono, como por exemplo, galactose,
lactose, frutose e glucose (Butel, 2014).
Os probióticos chegaram ao mercado em alimentos convencionais, mas
com o seu consumo na forma de suplementos exigiu uma definição mais clara.
Assim, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) definiuos na
Resolução de Diretoria Colegiada RDC 02/2002 e divulgou, recentemente
(Brasil, 2017) algumas linhagens de microrganismos com as alegações e
condições de uso (quadro 1), considerando a identificação da linhagem do
microrganismo, estudos de eficácia e segurança em humanos.
7
Quadro 1. Linhagens de microrganismos com as alegações e condições de uso
(Brasil, 2017).
Microrganismo Alegação de uso Condição de
uso/público
Bacillus coagulans
GBI30
Contribui com a saúde
gastrointestinal
1 x 108 UFC/dia
Público: crianças maiores
de 3 anos, adolescentes e
adultos
Bifidobacterium lactis
HN019
Pode contribuir com a saúde
gastrointestinal
1 x 109 UFC/dia
Público: crianças maiores
de 3 anos, adolescentes e
adultos
Lactobacillus reuteri
DSM 17938
Pode contribuir para a
melhora do desconforto
intestinal de bebês
1 x 108 UFC/dia
Público: lactentes
menores de 6 meses
UFC= Unidade Formadora de Colonia.
Os probióticos também podem ser incorporados em formas farmacêuticas
e segundo a RDC 323/2003 nesse caso podem ser denominados como:
• Medicamento Probiótico (Medicamento que contém microrganismos vivos
ou inativados para prevenir ou tratar doenças humanas por interação com a
microbiota ou com o epitélio intestinal ou com as células imunes associadas ou
por outro mecanismo de ação), que por sua vez podem ser classificados como:
• Produto Probiótico Novo (Medicamento Probiótico que contém
microrganismos não registrados no Brasil) e,
• Produto Probiótico (Medicamento Probiótico que contém microrganismos
já registrados no Brasil). A mesma resolução estabelece que:
‘apenas os medicamentos probióticos registrados na
ANVISA, fabricados ou importados por empresas
autorizadas em nível federal e licenciados pelo
governo dos estados para fabricar ou importar,
podem ser comercializados, distribuídos e utilizados
no país’ (Brasil, 2003).
8
A definição de prebióticos não é tão simples quanto à de probióticos. O
conceito de prebióticos começou a ser utilizado há cerca de 20 anos, e a
comunidade científica tem discutido qual seria sua melhor definição (Roberfroid
et al., 2010). Na literatura de modo geral, os prebióticos são considerados
compostos não digeríveis pelo ser humano, mas que, através de sua
metabolização por bactérias intestinais, modulam a composição e/ou a atividade
da microbiota, conferindo um efeito fisiológico ao hospedeiro (Valcheca,
Dieleman, 2016). Segundo a Organização Mundial de Gastroenterologia (2017),
os prebióticos são:
‘ingredientes seletivamente fermentados que permitem
mudanças específicas na composição e/ou atividade
da microbiota gastrointestinal, conferindo assim
benefícios à saúde do hospedeiro’.
Os prebióticos mais conhecidos são a oligofrutose, a inulina, os
galactooligossacarídeos, a lactulose e os oligossacarídeos do leite materno. As
oligofrutoses podem ser encontradas, por exemplo, em sementes e raízes de
alguns vegetais como chicória, alcachofra, cevada, grãos de soja, tremoço, entre
outros. À fermentação de oligossacarídeos no cólon temse relacionado o
aumento do número de bifidobactérias, aumento da absorção de cálcio e do peso
fecal, redução do tempo de trânsito gastrointestinal, além de provável efeito
hipolipemiante (Hutkins et al., 2016).
O aumento de bifidobactérias colônicas é considerado benéfico para a
saúde humana graças à produção de compostos que inibem os patógenos
potenciais, reduzindo os níveis sanguíneos de amônio e produzindo vitaminas e
enzimas digestivas (Roberfroid et al., 2010).
Há, também, os oligossacarídeos sintéticos obtidos através da
polimerização direta de alguns dissacarídeos da parede celular de leveduras ou
fermentação de polissacarídeos. A lactulose, por exemplo, um dissacarídeo
sintético, é empregado no tratamento da constipação. Prebióticos,
essencialmente, são compostos encontrados em alimentos que estimulam o
crescimento ou a atividade de certos microrganismos benéficos ao nosso
organismo (Valcheca, Dieleman, 2016).
9
Outro termo empregado na area, mas não constante na legislação
brasileira é ‘simbiótico’, que segundo a Organização Mundial de
Gastroenterologia (WGO) referese a:
‘produtos que contêm misturas apropriadas de
probióticos e prebióticos que conferem benefícios à
saúde’ (WGO, 2017).
Nessa área, as indústrias de alimentos e farmacêuticas destacamse no
desenvolvimento de produtos, alcançando nos últimos anos, cerca de 70% dos
depósitos de patentes incluindo prebióticos, probióticos e simbióticos (Santos et
al., 2014).
Na ANVISA, estão registrados prebióticos na área de alimentos, produtos
contendo inulina e frutooligossacarídeos (FOS) na forma de pó, de sachê ou
produto para consumo direto. Quanto aos probióticos isolados encontramse
registros como alimento, com alegação de efeito benéfico no equilíbrio da flora
intestinal, bem como medicamento biológico
4.3. Comportamento social, transtornos mentais e comportamentais
O comportamento social tem papel fundamental na sobrevivência e
prosperidade de um indivíduo e da espécie. Transtornos mentais e
comportamentais, como a depressão, desordens de ansiedade, esquizofrenia,
transtornos de personalidade, entre outros, resultam em alterações no
comportamento (Parashar, Udayabanu, 2016).
Apesar de ainda não haver um conhecimento aprofundado, a composição
da microbiota humana apresenta papel importante no sistema imune,
funcionamento do cérebro e no comportamento do ser humano. Com a
modulação de sua composição podese fazer descobertas que inovem a
abordagem dos transtornos mentais e comportamentais.
Considerando que a Classificação Estatística Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados à Saúde (CID) mantém linguagem comum para o
registro e monitoramento de doenças, por profissionais em nível mundial, esta
foi utilizada na definição dos principais transtornos mentais e comportamentais
relacionados à microbiota intestinal.
10
Sob o tópico transtornos mentais, de comportamento e de
desenvolvimento neurológico, incluemse síndromes caracterizadas por
distúrbios na cognição, regulação emocional ou comportamento de um indivíduo.
Esses distúrbios muitas vezes associamse a sofrimento e/ou prejuízos
pessoais, familiares, sociais, ocupacionais entre outros (OMS, 2017).
A atual importância do tema ‘transtornos mentais e comportamentais’
pode ser observada considerandose a incidência da depressão e ansiedade em
nível mundial, onde se estima que mais de 300 milhões de pessoas são afetadas.
No Brasil, 5,8% da população sofre de depressão, o que representa aumento de
18,4% nos últimos dez anos e, em relação à ansiedade em 9,3% da população
brasileira detectase este transtorno, que acomete em sua maioria as mulheres.
Esse número é alarmante, uma vez que é a maior incidência desses transtornos
na América Latina (Campos, 2018; OPAS/OMS, 2018).
O projeto Microbioma Humano desenvolvido por pesquisadores
estrangeiros e norteamericanos sob a iniciativa de institutos de saúde dos
Estados Unidos da América do Norte (20082013) teve como propósito,
compreender a relação microbiomasaúde/doença humana. O termo
‘microbioma’, difere de ‘microbiota’ utilizado ao longo do TCC, pois se refere ao
conjunto de microrganismos e genes que ocorrem em diferentes partes do corpo.
Os resultados desse amplo projeto estão em publicação, mas no período
proposto, grande parte dos artigos restringiu a atividade da microbiota na
saúde/doença.
Assim, a seguir estão compilados estudos em animais de laboratório
(quadro 2) e clínicos (quadro 3) avaliando a relação da microbiota intestinal com
transtornos mentais e comportamentais, no período de 20112018.
O quadro 2 mostra os estudos em animais de laboratório, procurando a
relação entre probióticos e transtornos como ansiedade, depressão, estresse,
memória e comportamento.
11
Quadro 2. Estudos préclínicos avaliando a influência de probióticos em transtornos mentais e comportamentais. Período de 20112018.
Estudo (SNC) Animal Probiótico Resultado Referência
Ansiedade e depressão
Camundongos L rhamnosus JB1 Ansiedade ↓ Depressão ↓
Bravo et al, 2011
Ansiedade Ratos B. longum + L. helveticus Ansiedade ↓ Messaoudi et al, 2011
TOC Camundongos machos
Lactobacillus rhamnosus TOC ↓ Kantak et al, 2014
Ansiedade Ratos Lactobacillus helveticus Ansiedade ↓ Capacidade cognitiva↑
Luo et al, 2014
Ansiedade e depressão
Camundongos B. longum e B. breve Ansiedade ↓ Depressão ↓
Savignac et al, 2014
Ansiedade Memória não espacial
Camundongos Lactobacillus rhamnosus + L. helveticus
Ansiedade ↓ Memória não espacial ↑
Smith et al, 2014
Estresse, depressão e ansiedade
Ratos Lactobacillus helveticus NS8 Ansiedade ↓ Depressão ↓ Memória não espacial ↑
Liang et al, 2015
Ansiedade, estressee depressão
Camundongos Lactobacillus plantarum Capacidade motora ↑ Ansiedade ↓ Depressão↓
Liu et al, 2016
Depressão Ratos Mistura de bactérias (Bifidobacterium bifidum, B. lactis, Lactobacillus
acidophilus, L. brevis, L.
casei, L. salivarius, L.lactis)
Depressão ↓, independentemente da dieta
Abildgaard et al.,2017
Ansiedade Ratos Lactobacillus rhamnosus Ansiedade ↓ Felice et al, 2017
Memória e comportamento
Ratos machos Lactobacillus acidophilus, L. acidophilus, Bifidobacterium
bifidume B. lactis
Memória de curto e longo prazo ↑
O’Hagan et al, 2017
Abreviaturas: B.= Bifidobacterium; L.= Lactobacillus; SNC = sistema nervoso central;
TOC = Transtorno obsessivo compulsivo
O quadro 3 apresenta estudos publicados entre 2011 a 2018, com reduzido número de voluntários, na maior parte das vezes saudáveis, mas avaliando a relação da microbiota com transtornos mentais e de comportamento.
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Quadro 3.Estudos clínicos avaliando a influência de probióticos em transtornos mentais e comportamentais. Período 20112018.
Participantes Probiótico Dose/duração Resultado Referência ANSIEDADE
140 estudantes L. casei 109 8 semanas
() Takada et al, 2016
46 pacientes com artrite reumatóide
L. casei 108 8 semanas
() VaghefMehrabany et al, 2014
72 fumantes (homens)
L. casei 4 × 1010 3 semanas
() Reale et al, 2012
GHQ, DASS, HPA
70 petroquímicos Iogurte PBT Cápsulas PBT
107 103 1010 6 semanas
↑ GHQ, ↑ DASS () HPA
Mohammadi et al, 2015
LEIDSr BDI BAI
40voluntários sadios
B. bifidum, B. lactis,
L. acidophilus ,
L. brevis,
L. casei, L. salivarius,
Lactococcus
lactis
5 × 109 4 semanas
↑ LEIDSr () BDI () BAI
Steenbergen et al, 2015
HSCL, HADS, PSS, CCL
25 pacientes saudáveis
L. helveticus B. longum
3 × 109 4 semanas
Melhora da depressão nos grupos que receberam probioticos
Messaoudi et al, 2011
Emoções e sensações
36 mulheres sadias (1853 anos)
Iogurte com B. animalis,
Streptococcus termophillus, L.
bulgaricus,
Lactococcus
lactis
109 1010 2 x/dia 4 semanas
Alterou a atividade de regiões do cérebro que controlam as emoções
Tillish et al., 2013
Abreviaturas: B.= Bifidobacterium; L.= Lactobacillus; GHQ = Questionário de saúde geral; DASS = Escala de depressão, ansiedade e estresse; HPA = eixo hipotalâmicopituárioadrenal; LEIDSr = Índice de sensibilidade de depressão de Leiden – revisado; BDI = Inventário de depressão de Beck; BAI = Inventário de ansiedade de Beck; HSCL90 = checklist de sintomas de Hopkins; HADS = Escala de depressão e ansiedade hospitalar; PSS = Escala de estresse percebido; checklist de Coping; () = Resultado negativo; ↑ = Aumento da ação ou na escala.
13
A seguir, analisamse os estudos sobre os principais transtornos de
comportamento e mentais ensaiados em animais de laboratório e/ou em
humanos (quadros 2 e 3), utilizandose os termos descritos na Classificação
Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde,
conhecida como CID-10.
4.3.1 Estresse
Segundo a CID 10(2017), a definição desta categoria baseiase nos
sintomas, na evolução e na existência de causas que podem ser uma ocorrência
estressante desencadeando reação de estresse agudo, ou uma alteração
marcante na vida do individuo, com conseqüências desagradáveis e duradouras,
que levam a transtornos de adaptação.
Os estresses psicossociais, considerados pouco graves, podem
desencadear diversos transtornos classificados em outro subitem do manual
CID, ou influenciar o quadro clínico, mas nem sempre é possível atribuir a sua
etiologia, pois devese levar em consideração a vulnerabilidade, muitas vezes
de cada indivíduo. Assim, os transtornos reunidos nesse item, são conseqüência
de estresse agudo ou de trauma persistente, e que alteram o convívio social.
Como subcategorias encontramse ainda: reação aguda ao estresse; estado de
estresse póstraumático; transtornos de adaptação; outras reações ao estresse
grave; reação não especificada a um estresse grave.
O estresse é parte inerente do dia a dia dos indivíduos, e qualquer
perturbação em sua resposta pode ter implicações na saúde e no
comportamento do ser humano. E, pesquisadores tem mostrado que tanto o
estresse crônico quanto o agudo, podem levar a alterações comportamentais,
como mudanças na dieta e atividade física (Schneiderman, Ironson, Siegel,
2005).
O estresse também pode causar alterações na microbiota, levando à
alteração e redução de diversas espécies de microrganismos. (Bailey, et al,
2011)
Dentre os estudos préclínicos (quadro 2), os que avaliaram o estresse
verificaram a sua relação com probióticos, mas encontraram dificuldade em
14
utilizar marcadores. Como marcadores de estresse foram utilizados diversos
comportamentos dos animais, como memória, capacidade motora e cognitiva.
Foi possível observar um relativo sucesso no uso de probióticos em
roedores para tratamento de estresse, uma vez que eles mostraram melhora em
suas memórias de curto e longo prazo, e em suas capacidades motoras e
cognitivas, após tratamento nos estudos de Liang e colaboradores (2015), Liu e
colocaboradores (2016) e de O’Hagan e colaboradores (2017). Verificouse
também que a associação de 2 probióticos (Lactobacillus rhamnosus + L.
helveticus) preveniu a disfunção da memória espacial induzida por estresse
agudo (Gareau, Wine, Rodrigues et al, 2011). Este resultado é concordante com
Chapman e colaboradores (2011), que verificaram que em 75% dos estudos,
incluindo os préclínicos e clínicos, o consumo de misturas de probióticos
sugeriram maior eficácia do que o consumo de cepas isoladas. Os probioticos
mais utilizados nesses estudos foram os dos gêneros Bifidobacterium e
Lactobacillus. Entretanto, o resultado supostamente positivo com as misturas de
microrganismos deve ser melhor estudado para avaliar se ocorrem interações
sinérgicas ou devese à maior dose de probióticos (Chapman et al, 2011).
Comparandose os resultados obtidos nos estudos em animais, podese
observar que há sucesso em reduzir os sintomas relacionados ao estresse.
Entretanto, não foram encontrados estudos em seres humanos que avaliem
especificamente a reação ao estresse, o que dificulta a avaliação da sua
aplicação clínica.
4.3.2 Depressão
Depressão, ou episódios depressivos segundo a CID, são dividos em três
diferentes graus, leve, grave e moderado. Durante os episódios depressivos o
paciente apresenta alterações em seu comportamento usual, como no humor,
energia e disposição. Incluise a dificuldade em sentir prazer, perda da
capacidade de concentração, perda de motivação e de autoestima, entre outros
sintomas comportamentais.
Dependendo do número de sintomas e sua intensidade podese
determinar os graus de um episódio depressivo. Além dos 3 graus citados acima,
os episódios depressivos podem ser subdividos em episódios depressivos leves,
15
episódios depressivos moderados, episódios depressivos graves sem sintomas
psicóticos, episódios depressivos graves com sintomas psicóticos, outros
episódios depressivos e episódios depressivos não especificados. Quandos os
episódios se tornam recorrentes eles são classificados como transtornos
depressivos recorrentes (OMS, 2017).
A depressão é uma das desordens mais debilitantes que causam grande
impacto na qualidade de vida dos pacientes (Moussavi et al., 2007). Geralmente
ocorre juntamente com outros transtornos como a ansiedade, o que agrava o
quadro da doença (Hirschfeld, 2001).
Dentre as alterações mais observadas em pacientes depressivos
destacase a desregulação do eixo hipotalâmicohipofisário adrenal, com
aumento de citocinas próinflamatórias no plasma, e ambos podem ser
regulados pela microbiota intestinal (Felice, Siobhain, O'Mahony, 2017).
Os estudos referentes ao uso de probióticos em animais de laboratório
para o tratamento de depressão no quadro 2 mostraram que a administração de
microrganismos dos gêneros Bifidobacterium e Lactobacillus foram capazes de
reduzir os sintomas da doença (Abildgaard et al, 2017; Liu et al, 2016; Liang et
al, 2015; Savignac et al, 2014; Bravo et al., 2011).
E é interessante observar que o estudo realizado por Abildgaard e
colaboradores (2017) utilizou uma mistura de Lactobacillu sem vez de uma única
cepa, o que mostra que mesmo que um probiótico não tenha efeito por si só,
uma possível combinação com outros probióticos possa ter algum efeito
sinérgico.
Foram encontrados poucos estudos em humanos que avaliaram os
efeitos dos probióticos em relação à depressão, entretanto o estudo realizado
por Messaoudi e colaboradores (2011) demonstrou uma melhora no quadro
depressivo após administração de L. helveticus e B. longum, o que apoia os
estudos realizados em animais. Estes trabalhos reforçam estudos, em animais e
em humanos, anteriores (Chapman et al., 2011) que indicavam que o consumo
de misturas de probióticos traz maior eficácia do que o de cepas isoladas.
4.3.3 Ansiedade
Os transtornos de ansiedade, classificados como transtornos fóbico
16
ansiosos (F40) pelo CID são um grupo de transtornos em que determinadas
situações desencadeiam ansiedade no paciente e frequentemente estão
associadas a depressão (OMS, 2017). Essas situações, apesar de não
apresentarem nenhum perigo real, geramente são evitadas e encaradas com
temor, e são geralmente acompanhadas de sintomas como palpitações,
sudorese, dificuldade de respirar, tremores, e outros sintomas físicos associados
à excitação autonômica.
Diversos transtornos estão reunidos sob o item F40 como transtornos
fóbicoansiosos e denominados agorafobia, fobias sociais, fobias específicas
isoladas, outros transtornos fóbicoansiosos e transtornos ansiosos não
especificados.
Quando a crise ansiosa não é causada por exposição a uma situação
específica, ela é classificada como outros transtornos ansiosos (F41), e podem
ser acompanhados por manifestações depressivas e obsessivas. Os outros
transtornos ansiosos possuem como subcategorias: transtorno de pânico
(ansiedade paroxística episódica), ansiedade generalizada, outros transtornos
ansiosos mistos, outros transtornos ansiosos especificados e transtorno ansioso
não especificado (OMS, 2017).
As desordens de ansiedade tendem a ter maior incidência em mulheres e
podem ocorrer por reação de estresse, ou situações como preocupação com a
incerteza do futuro ou de uma corrente de eventos (Huang et al, 2017). E, assim
como para os demais transtornos, os microrganismos mais utilizados como
probióticos foram os dos gêneros Bifidobacterium e Lactobacillus.
Foi possível observar sucesso na redução dos sintomas da ansiedade
com sua administração, em estudos em animais. Entretanto, apesar do sucesso
obtido nos resultados nesses estudos, encontramse dados contraditórios ao
avaliar os estudos em humanos (quadro 3). Podese observar que diversos
estudos em humanos (Takada et al, 2016; VaghefMehrabany et al, 2014; Reale
et al, 2012) não demonstraram melhora no quadro de ansiedade após a
administração de probióticos. Entretanto nesses estudos em humanos só foi
utilizada uma cepa de microrganismos, e não houve combinação de probióticos.
O estudo realizado por Messaoudi e colaboradores (2011) utilizou uma
combinação de L. helveticus e B. longum e apresentou uma melhora no quadro
17
de ansiedade dos pacientes, assim como nos estudos em animais, reforçando
os estudos realizados por Chapman e colaboradores (2011).
Uma dificuldade nos estudos é estabelecer as cepas de microrganismos
adequadas, sua dose e a sua influência na prevenção e/ou tratamento de TCM,
e que condições resultam em quais alterações na microbiota. Essa dificuldade
ocorre pois a composição da microbiota varia muito entre indivíduos o que
dificulta relacionar cada alteração com uma situação específica.
4.3.4. Outros transtornos estudados
Além dos estudos sobre depressão, ansiedade e estresse (quadros 2 e
3), foram encontrados outros ensaios préclínicos relacionando TMC e
probióticos (Wang et al., 2014), entretanto não em seres humanos.
Nemani e colaboradores (2015) estudaram a relação entre probióticos e
a esquizofrenia, mas não avaliaram seu uso para o tratamento, mas como um
meio de aliviar efeitos adversos dos medicamentos utilizados no tratamento da
esquizofrenia.
Também foram encontrados estudos que avaliam a relação entre a
microbiota e a doença de Parkinson (Hopfner, et al 2017) e o autismo (Felice,
O’Mahony, 2017) porém não foi estudada a relação com probióticos.
4.4 Mecanismo de ação dos probióticos
A disbiose tem sido relacionada à síndrome do intestino irritável, mas não
se tem definido se é a causa ou a consequência de processamento anormal da
comunicação microbiotacérebro (Westfall et al., 2017).
Dentre as funções mais estudadas, observouse um maior interesse nas
capacidades de memória e em transtornos psiquiátricos. Estudos em animais e
humanos tem sugerido potenciais mecanismos dos efeitos desses probióticos
(Figura 2).
18
Figura 2. Mecanismo dos efeitos dos probioticos no SNC. Probioticos afetam o eixo hipotalâmicoadrenal
pituário (HPA) alterando os níveis de corticosteroides (CORT) e de hormônios adrenocorticotrópicos
(ACTH). O sistema immune é influenciado por inflamações e produção de citocinas próinflamatórias,
afetando o SNC. A bioquímica do SNC pode ser afetada diretamente pelos probioticos, através dos níveis
do fator neurotrófico derivado do cérebro (BNDF). cFos, ácido γaminobutírico (GABA), 5hidroxitriptamina
(5HT) e dopamina (DA).O nervo vago e os nervos entéricos também estão relacionados ao eixo cérebro
intestino, e suas vias podem ser afetadas por probioticos. A composição da microbiota pode resultar na
alteração de alguns metabólitos, como ácidos graxos de cadeia curta e triptofano, e então melhorar funções
do SNC indiretamente. (Fonte: WANG et al., 2016).
Assim, apresentamse como prováveis mecanismos de atuação de
probióticos no SNC a alteração da composição da microbiota intestinal
aumentando sua diversidade e modulando sua composição, a alteração da
bioquímica do SNC diretamente alterando os níveis de GABA, serotonina e
dopamina, podendo influenciar no comportamento do paciente. Além disso, tanto
o nervo vago quanto os nervos entéricos estão relacionados ao eixo cérebro
intestino e podem ser afetados pelo uso de probióticos. O eixo HPA,
frequentemente estudado, regula emoção e comportamento. Sua resposta ao
estresse pode ser atenuada com o uso de probióticos, reduzindo os níveis de
corcosteróides. O sistema imune também pode ser influenciado pelo uso de
probióticos, que pode limitar a produção de citocinas próinflamatorias, que por
sua vez afetam o sistema nervoso e o endócrino (Wang et al, 2016).
19
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O uso concomitante e regular de probióticos e prebióticos (selecionados de
modo adequado), com o objetivo de aumentar o número e a atividade da
microbiota intestinal, visa dar condições para a flora ‘individualnormal’ se
restabelecer e promover a prevenção de doenças. Como todo novo campo de
pesquisa, os dados préclínicos e clínicos obtidos no periodo proposto sugerem
efeito promissor como auxiliar no tratamento de alguns transtornos mentais e
de comportamento (TCM), como estresse, ansiedade e depressão. Entretanto,
ainda existem poucos dados e muitos mecanismos a serem elucidados em
relação à microbiota intestinal, o cérebro e o eixo cérebrointestino para se
estabelecer condições adequadas como uma forma de tratamento
individualizado.
Os estudos in vitro e in vivo até agora não definiram o papel dos
microrganismos que compõem a microbiota intestinal a ponto de que se possa
estabelecer quais microrganismos geram quais alterações, visando
principalmente os efeitos no cérebro e no comportamento. Devese considerar
que esses TMC são multifatoriais, mas sugerese que haja alguma contribuição
do equilibrio da microbiota individual.
Com o avanço do conhecimento pode ser possível utilizar essa prática em
nosso favor, otimizando e personalizando o tratamento para cada paciente, e
facilitando a utilização de outras estratégias terapêuticas, como a alteração da
dieta do indivíduo como alternativas de tratamento.
O atual estágio de conhecimento da relação dos probióticos com
transtornos no SNC é inicial, e ainda serão necessários muitos testes pré
clínicos e estudos de seus mecanismos para determinar como os
microrganismos estão afetando o cérebro e o comportamento antes que os
tratamentos possam ser testados em pacientes, e posteriormente
disponibilizados ao público como forma de tratamento.
Ao determinar a relação causaefeito da microbiota e os TMC talvez seja
possível atender as necessidades de cada paciente, e até personalizar os
tratamentos, podendose prevenir a doença, ou tratar de maneira
complementar. Já foi observado em estudos recentes (Nemani et al, 2015) a
utilização de probióticos como forma de combater os efeitos adversos
20
causados pelos medicamentos utilizados no tratamento da doença de
Alzheimer. Podese futuramente supor que se possa observar a pré
disposição de cada indivíduo a desenvolver um determinado transtorno, com
base em sua microbiota, e consequentemente ajudar a obter uam forma de
tratamentocom base nesses microrganismos.
Novos estudos nessa área podem abrir um leque de infinitas possibilidades
e novas estratégias terapêuticas que podem beneficiar a toda população
mundial, apesar da atual falta de dados conclusivos sobre a relação
microbiotaTMC. A relação microbiomacérebro é um campo a ser explorado
com profundidade e que pode contribuir de forma relevante para a
manutenção da saúde humana, e principalmente para o tratamento e
prevenção de TMC sendo um campo de investimento que pode se tornar um
foco para a saúde humana. Nessa direção, as indústrias de alimentos e
farmacêuticas tem desenvolvido produtos e depositado patentes com pré,
probióticos e simbióticos nos últimos anos.
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