demanda por diferentes fontes energéticas no rio grande do...

17
Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do Sul, 1985-2009 Submissão para: a. Desenvolvimento Econômico Gustavo Inácio de Moraes - Professor Doutor do PPGE / PUCRS. Patrícia Nasi Sandes Mestranda em Economia no PPGE/PUCRS Resumo: O presente artigo avalia a evolução da demanda energética no estado do Rio Grande do Sul, no período compreendido entre 1985 e 2009. Nesse período o estado viveu uma transformação produtiva relevante e, em paralelo, a preocupação quanto às externalidades ambientais na oferta energética ganharam destaque. Através da utilização de uma metodologia de regressões aparentemente não correlacionadas - SUR, foi possível estabelecer um comportamento para as elasticidades preço e renda no Rio Grande do Sul para cinco fontes energéticas: lenha, óleo diesel, gasolina, eletricidade industrial e eletricidade residencial. Palavras-Chave: Demanda, Energia, Rio Grande do Sul Abstract: This paper evaluates energy´s demand path in Rio Grande do Sul between 1985 and 2009. In this period, region changes your production structure and, in the same time, environmental concerns about bad externalities of energy supply growths and spreads. Through to an econometric methodology, SUR (seemingly unrestricted regressions), was possible established a behavior for both price-elasticity and income- elasticity in five energy secondary sources: wood, diesel oil, gasoline, industrial electricity and residential electricity. Key-Words: Demand, Energy, Rio Grande do Sul

Upload: buithu

Post on 13-Dec-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do Sul,

1985-2009

Submissão para: a. Desenvolvimento Econômico

Gustavo Inácio de Moraes - Professor Doutor do PPGE / PUCRS.

Patrícia Nasi Sandes – Mestranda em Economia no PPGE/PUCRS

Resumo: O presente artigo avalia a evolução da demanda energética no estado do Rio

Grande do Sul, no período compreendido entre 1985 e 2009. Nesse período o estado

viveu uma transformação produtiva relevante e, em paralelo, a preocupação quanto às

externalidades ambientais na oferta energética ganharam destaque. Através da utilização

de uma metodologia de regressões aparentemente não correlacionadas - SUR, foi

possível estabelecer um comportamento para as elasticidades preço e renda no Rio

Grande do Sul para cinco fontes energéticas: lenha, óleo diesel, gasolina, eletricidade

industrial e eletricidade residencial.

Palavras-Chave: Demanda, Energia, Rio Grande do Sul

Abstract: This paper evaluates energy´s demand path in Rio Grande do Sul between

1985 and 2009. In this period, region changes your production structure and, in the

same time, environmental concerns about bad externalities of energy supply growths

and spreads. Through to an econometric methodology, SUR (seemingly unrestricted

regressions), was possible established a behavior for both price-elasticity and income-

elasticity in five energy secondary sources: wood, diesel oil, gasoline, industrial

electricity and residential electricity.

Key-Words: Demand, Energy, Rio Grande do Sul

Page 2: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

1. Introdução

O problema do abastecimento energético tem importantes consequências no

desenvolvimento econômico e social de uma região. Tem sido tema recorrente de

discussões e dificuldades a política energética de países ao redor do mundo, sendo

os casos mais notórios a opção por um abastecimento nuclear ou ainda a instalação

de usinas ou estoques de emergência para situações de debilidade.

Sabe-se desde a crise de energia vivenciada nos anos setenta que, no entanto, a

demanda possui um papel relevante na determinação da ocorrência de crises e o seu

comportamento pode ser, em grande medida, induzido por variações de preços e por

padrões tecnológicos disponíveis à sociedade de maneira viável economicamente.

Pois, um problema de especial interesse para economias emergentes e com grande

necessidade, ainda, de resgate social é poder planejar como a evolução da demanda

de energia pode afetar as escolhas de política econômica e a definição do perfil de

oferta energética em anos e décadas à frente.

O presente artigo pretende examinar a evolução do consumo energético no Rio

Grande do Sul e seu objetivo central é determinar a intensidade da elasticidade-

renda para as fontes energéticas mais importantes do estado. Nesse sentido, o artigo

pretende utilizar-se de técnicas econométricas para a determinação da elasticidade-

renda no estado e compará-la também com a perspectiva de crescimento econômico

do estado em anos vindouros.

Para tanto, o artigo foi dividido em três seções após essa introdução. Na segunda

seção discute-se o padrão de oferta e demanda energética do Rio Grande do Sul nas

últimas décadas e os relaciona com as variações das atividades econômicas e

mudança de padrões sociais no estado. A terceira seção apresenta, utilizando-se de

técnicas econométricas, as diferentes elasticidades-renda e elasticidades-preço

obtidas na demanda energética da região. Uma última seção se dedica a comentários

finais.

Page 3: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

2. Estrutura da demanda energética no Rio Grande do Sul

A publicação do Balanço Energético do Rio Grande do Sul, pela CEEE, com dados

para oferta primária e secundária, além da demanda setorial informa-nos sobre a

dinâmica energética no estado desde 1979 até 2009. Nesse período, transformações

importantes na sociedade e economia gaúchas tomaram corpo.

Em especial, a participação da economia estadual no PIB brasileiro manteve-se ao

redor de 7%, caracterizando um ritmo de crescimento semelhante ao brasileiro no

período. Todavia, em anos recentes essa evolução demonstrou-se desfavorável ao

estado, ainda que em proporções pequenas.

No período também se assistiu a consolidação do polo industrial na macrorregião da

Serra gaúcha. Os municípios ali localizados internalizaram um método de produção,

uma vocação para determinados segmentos industriais, caracterizando um

movimento de interiorização da produção industrial, antes localizada, sobretudo na

região metropolitana. Outro aspecto relevante é que os municípios da região

destacaram-se, em uma comparação nacional, como locais nos quais há qualidade de

vida e possibilidades de lazer e turismo.

Importante também foi o movimento migratório da zona rural para as cidades, fruto

de uma maior produtividade na agricultura, mas também consequência de crises

provocadas pelo clima que impediram a viabilidade e a manutenção de alguns

empreendimentos rurais.

Este processo, por um lado gerou desconcentração industrial, poderia contribuir para

um gasto energético maior na medida em que a população se torne mais distribuída.

Por outro lado, a migração rural-urbana ao estimular a concentração populacional

tornou possível uma maior eficiência energética já que o espaço de circulação de

mercadorias, serviços e interesses restringe-se.

Nesse período, não menos importante, assiste-se a emergência de demandas

ambientais crescentes, caracterizadas por uma agenda crítica à opção nuclear que os

países desenvolvidos tomam após a crise do petróleo. Em 1973, a participação do

petróleo e seus derivados é de 45%, ao passo que no ano 2000 situava-se em 35%. A

maior parte da participação em queda do petróleo foi absorvida pela energia nuclear,

Page 4: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

que se em 1973 possuía irrisórios 0,8% da oferta mundial de energia, em 2000 terá

6,8% de participação. O gás, por sua similaridade com o petróleo, também se

destaca ao absorver 16,2% da oferta mundial de energia em 1973 e 21,1% em 2000

(Balanço Energético do Brasil, 2002). Tais opções refletem a percepção errônea

sobre a segurança da energia nuclear e a suposta ausência de resíduos desta, além da

inviabilidade técnica de se modificar o aparato produtivo, caracterizado pela

substituição do petróleo pelo gás.

A relação entre o desenvolvimento sustentável e a energia foi contemplada em

Nosso Futuro Comum, que dedicou um capítulo para o tema. Os grandes problemas

ambientais têm íntima relação com o uso energético, daí a preocupação da Comissão

Brundtland em inserir a temática dentro do relatório, com o objetivo de sensibilizar

as autoridades nacionais para a questão1. O quadro 1, inserido na sequencia, mostra

a relação entre os principais problemas ambientais e a origem desses problemas,

acrescentando os grupos sociais mais prejudicados por esses problemas :

Quadro 1 – Principais Problemas Ambientais (continua)

Problema Ambiental Principal Fonte do

Problema

Principal grupo social

afetado

Poluição urbana do ar Energia (indústria e

transporte)

População Urbana

Poluição do ar em

ambientes fechados

Energia (cozinhar) Pobres na zona rural

Chuva Ácida Energia (queima de

combustível fóssil)

Todos

Diminuição da camada

de ozônio

Indústria Todos

1 O presidente do grupo temático de energia na comissão Brundtland foi Enrique Iglesias, hoje ocupando

o cargo de presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento.

Page 5: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

Quadro 1 – Principais Problemas Ambientais (conclusão)

Problema Ambiental Principal Fonte do

Problema

Principal grupo social

afetado

Aquecimento por efeito

estufa e mudança do

clima

Energia (queima de

combustível fóssil)

Todos

Disponibilidade e

qualidade da água doce

Aumento populacional,

agricultura

Todos

Degradação costeira e

marinha

Transporte e Energia Todos

Desmatamento e

Desertificação

Aumento populacional,

agricultura e energia

Pobres Rurais

Resíduos Tóxicos,

químicos e perigosos.

Indústria e Energia

Nuclear

Todos

Fonte: Retirado de Goldemberg (1998, p. 62)

Como é possível notar no quadro 1 a energia está presente como causa direta do

problema em sete dos nove problemas, e em mais um de forma indireta (camada de

ozônio). Também chama a atenção que os problemas ambientais, regra geral, não

distinguem classe social e poder aquisitivo.

Como lembra Schmidheiny - não está nas referências (1992, pp. 35-36) a

obtenção de um desenvolvimento sustentável energético tem três sustentáculos: um

permanente ganho de eficiência no uso do recurso energético, uma participação

maior de fontes na matriz energética que garantam um horizonte de sustentabilidade

e uso crescente das potencialidades locais aliada a uma nova política de preços e

concessão de subsídios, com preocupação marcantemente de longo prazo, nos países

em desenvolvimento. Esses três pilares devem ser planejados conjuntamente,

Page 6: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

embora a eficiência energética possa apresentar retornos rápidos, mitigando

problemas mais emergenciais e permitindo que seja possível continuar as ações em

relação aos outros objetivos.

Mas os efeitos macroeconômicos também se manifestaram desde então. A este

propósito, Williamson (1989) cita seis efeitos do choque do petróleo sobre a

economia mundial: taxas de inflação pressionadas, propensão mundial a poupar em

elevação com a transferência de renda aos países da OPEP, desequilíbrios dos

balanços de pagamentos, esses mesmos países contrataram profissionais e

mercadorias em larga escala, modificações nas técnicas de produção e padrões de

consumo e por fim, uma diminuição na taxa de crescimento do produto potencial da

economia mundial.

No caso brasileiro, as indefinições da política econômica, consequência da

desorganização do mercado mundial após o segundo choque de petróleo,

produziram oscilações e os problemas da inflação e da dívida externa dominaram a

determinação das políticas econômicas. Em especial, as variações do produto

apresentaram oscilações significativas, ao sabor vulneráveis com os planos

econômicos anti-inflacionários malsucedidos.

Pelos fatores já citados anteriormente - aumento do consumo, restrição de recursos

ou até inviabilidade tecnológica - é que se faz necessário uma avaliação sócio

econômica de projetos que viabilizem o aproveitamento de recursos locais para

geração de energia.

Estes estudos devem levar em consideração principalmente os polos industriais, que

são tradicionalmente os maiores consumidores por setor (Balanço Energético 2010).

Dentro desta observação temos os dados econômicos nacionais e locais para avaliar

o potencial de mercado e a viabilidade do investimento. Em conhecimento das

fontes de energia renováveis (biomassa, biocombustível, energia eólica,

hidroeletricidade, hidrogênio, energia maremotriz, energia solar) e não renováveis

(carvão, gás natural, energia nuclear e petróleo) tem-se um ponto de partida para a

avaliação do polo mercadológico e ambiental de cada estado.

Page 7: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

3. Materiais, Métodos e Resultados

Nesta seção pretende-se construir um exercício econométrico que aponte as

tendências para a demanda das diferentes fontes energéticas em relação a preço e

produto econômico. Normalmente, os estudos dedicam-se a fontes específicas sem

considerá-las em conjunto ou optam por uma metodologia de séries de tempo para

efetuar a avaliação.

Resultados para a energia elétrica em anos recentes podem ser encontrados em

Andrade e Lobão (1997), Schimidt e Lima (2004), considerando o Brasil, e Mattos et

alii (2005) para a energia elétrica industrial em Minas Gerais. Em ambos os casos

optou-se por uma metodologia de vetores auto regressivos (VAR). Resultados para a

elasticidade cruzada entre gasolina e álcool podem ser encontrados em Alves e Bueno

(2002), sendo que neste caso aplicou-se a metodologia ARCH/GARCH para o alcance

dos resultados.

Irffi et alli (2009) estudam a demanda por eletricidade no Nordeste, subdivididas em

classes de consumo para o período 1970 e 2003. Comprovam em especial que a

metodologia utilizada, um mínimo quadrados ordinários dinâmicos com mudança de

regime fornece previsões adequadas para os períodos subseqüentes, especialmente entre

2004 e 2006, comparados aos trabalhos citados anteriormente. De todo modo, quanto

mais particularizada a avaliação (neste caso em classes de consumo) e quanto menor o

período de previsão (neste caso 3 períodos), maior a eficiência da previsão.

Castro e Montini (2010) também tentam antecipar a demanda por eletricidade

considerando a presença de variáveis exógenas e a presença de um processo auto-

regressivo. As variáveis exógenas escolhidas foram renda média real, inflação de bens

de consumo duráveis e a tarifa média residencial para energia elétrica.

Outra linha de estudiosos dedica-se a construir cenários de demanda energética

baseados na evolução sócio-econômica particular à região. Bajay (2004) resume essas

metodologias, sobretudo preocupado com a antecipação e possibilidade de ampliar os

sistemas energéticos. Mesmo no uso dessas metodologias será necessário avaliar a

trajetória das elasticidades, o que nos obriga a uma avaliação econométrica preliminar.

Neste estudo, porém, consideraremos que a demanda de uma fonte energética pode

estar influenciada pela demanda de outra fonte energética, não apenas porque

Page 8: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

eventualmente são fontes substitutas ou complementares entre si, mas principalmente

porque a decisão dos agentes em alocar despesas em uma fonte pode comprometer as

despesas com outras fontes. Assim uma metodologia que possa considerar essa decisão

de maneira integrada pode ser a mais recomendada, daí nossa opção por um método

econométrico.

As informações referentes ao consumo energético estão disponibilizadas em bases

anuais no Balanço Energético do Rio Grande do Sul, produzido pela CEEE. A demanda

por lenha, óleo diesel, gasolina e eletricidades residencial e industrial foram escolhidas

com base no consumo total, sendo esses produtos os principais grupos a serem

consumidos na estrutura energética do estado.

Os dados relativos à atividade econômica, mais especificamente a evolução do

produto interno bruto, e evolução da população foram obtidos na base de dados da

Fundação de Economia e Estatística – FEE – RS. Finalmente, os dados relativos ao

preço das fontes energéticas foram obtidos juntos ao Balanço Energético Nacional,

tabela 7.9. Para tanto, foram considerados os preços médios em dólares americanos por

unidade física, apurados pela EPE – Empresa de Planejamento Energético. Como

observação final, aponta-se o fato de que esses preços são pesquisados em bases

nacionais, limitando o alcance dos mesmos para o caso específico no Rio Grande do

Sul.

Para considerar o problema da forma como foi colocado, a utilização do S.U.R

(regressões aparentemente não correlacionadas) aponta para a metodologia mais

adequada. O S.U.R., originalmente concebido por Zellner (1962) considera que quando

os resíduos de uma equação estão correlacionados com os resíduos de outra equação,

estima-se melhor os parâmetros de cada uma das equações se considerada a estimativa

conjunta desses parâmetros.

Portanto, a estimação das funções de sensibilidade a demanda energética, neste

trabalho, segue a tradicional metodologia empregada na literatura, via SUR (Seemingly

Unrelated Regressions), método proposto por Zellner (1962). A razão principal para sua

utilização decorre do fato que as equações que representam a demanda energética entre

cada uma das fontes possuem um comportamento empírico relacionado entre si, com

dependência entre si. Não suficiente, as equações apresentam algumas das variáveis

independentes em comum. Desse modo, o erro das equações está, provavelmente,

Page 9: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

correlacionado contemporaneamente, justificando o uso do procedimento, uma vez que

as decisões sobre a utilização de uma fonte energética afetam as decisões sobre o uso de

outra fonte energética. Conforme, ZELLNER (1962) os parâmetros do modelo são

estimados melhor conjuntamente precisamente nesses casos. O teste de Breusch-Pagan

é utilizado para comprovar a relação de dependência entre os resíduos das diferentes

equações do sistema.

O modelo SUR pressupõe, segundo GREENE (2000), que os erros são

homocedásticos e possuem média igual a zero e, ainda, que a covariância entre os erros

das equações, ao longo do tempo, seja idêntica a zero. Contudo, existe correlação

contemporânea entre os erros das diferentes equações, tendo como conseqüência a

inviabilização da estimação via MQO. Ressalte-se que a utilização de mínimos

quadrados generalizados ou estimadores de máxima verossimilhança corrige a violação

destes pressupostos. Porém, há duas situações nas quais estimar o modelo SUR via

MQO ou MQG resulta idêntico: ou quando todas as correlações contemporâneas são

idênticas a zero ou quando as variáveis exógenas são as mesmas para cada uma das

equações do sistema. A seguir os pressupostos são detalhados para as especificações do

modelo que será utilizado:

cov(εIt , εJt ) = E (εIt , εJt ) = σIJ I, J = 1,2,3,4,5; (1)

E(εIt ) = 0 para i = 1,2,3, 4 ,5; t = 1985, 1986, 1987, ..., 2009; (2)

Var (εIt ) = E (εIt )2 = σII = σI

2 para todo t = 1985,1986, ...,2009 e I = 1, 2, 3,4, 5; (3)

cov(εIt , εJs ) = cov(εIt , εJs ) = 0 para todo T ≠ S e I, J = 1, 2, 3, ..., 7; (4)

Portanto, o sistema de equações que se quer estimar é composto por cinco equações:

* log (Demanda em T.E.P. Lenha)t =

= αi + β log (preço Lenha)t + γ log (PIB)t + εit (5)

* log (Demanda em T.E.P. Gasolina)t =

= αi + β log (preço Gasolina)t + γ log (PIB)t + εit (6)

Page 10: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

* log (Demanda em T.E.P. Óleo Diesel)t =

= αi + β log (preço Óleo Diesel)t + γ log (PIB)t + + εit (7)

* log (Demanda em T.E.P. Eletricidade Industrial)t =

= αi + β log (preço Eletricidade Industrial)t + γ log (PIB)t + εit (8)

* log (Demanda em T.E.P. Eletricidade Residencial)t =

= αi + β log (preço Eletricidade Residencial)t + ф log (População)t + εit (9)

Na qual:

t = 1985, 1986, 1987, 1988, (... ), 2009;

α = constante;

β = coeficiente do preço da fonte energética;

γi= coeficientes do PIB com relação à fonte i;

ф = coeficiente da população;

€it = termo de erro.

O símbolo “log” representa a transformação logarítmica presente nos dados.

Desse modo, a partir dessa transformação, busca-se obter a elasticidade de cada uma das

variáveis dependentes com relação às variáveis independentes.

Embora as séries possuam raiz unitária, como é muitas vezes característico em

séries de tempo, foi possível estimá-las mesmo sob a presença de raiz unitária pois o

teste de co-integração em painel de Pedroni (1997, 1999) validou a relação para esse

conjunto de variáveis escolhidas, conforme resultados da tabela 1. Das sete estatísticas

produzidas pelo teste, quatro comprovam a relação a 1% e cinco a 10%. Desse modo,

assume-se que

Page 11: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

Tabela 1 – Teste de co-integração em painel de Pedroni

Alternative hypothesis: common AR coefs. (within-dimension)

Weighted

Statistic Prob. Statistic Prob.

Panel v-Statistic -0.720062 0.7643 -2.091088 0.9817

Panel rho-Statistic -0.273040 0.3924 -1.276558 0.1009

Panel PP-Statistic -2.692448 0.0035 -4.614637 0.0000

Panel ADF-Statistic -3.784395 0.0001 -4.774351 0.0000

Alternative hypothesis: individual AR coefs. (between-dimension)

Statistic Prob.

Group rho-Statistic -0.005195 0.4979

Group PP-Statistic -4.245440 0.0000

Group ADF-Statistic -4.087150 0.0000

Fonte: Resultados do Modelo

Tabela 2 – Resultados da matriz de correlação de resíduos

Equação Lenha Óleo

Diesel

Gasolina Eletricidade

Industrial

Eletricidade

Residencial

Lenha 1

Óleo Diesel 0,3320 1

Gasolina 0,4598 0,6863 1

Eletricidade

Industrial

0,4112 0,8296 0,7875 1

Eletricidade

Residencial

0,5776 0,1348 0,5028 0,1175 1

R2 = 0,0742; λ

2 = 35,0; P-value = 0,000

Breusch-Pagan teste de independência dos resíduos; H0: Não correlação entre os

resíduos

N = 25

λ2 = 1.765,32; P-value = 0,000

Page 12: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

FONTE: Resultados do modelo

A estimação dos parâmetros realizada, de fato, comprova-se melhor se

construída através do SUR. A tabela 2, com os resultados da correlação entre os

resíduos demonstra o argumento, sobretudo através da estatística lambda do teste de

Breusch-Pagan. Neste a hipótese nula, de não correlação entre os resíduos foi rejeitada.

Dessa forma, as equações propostas têm erros correlacionados. Chama atenção,

adicionalmente, a forte correlação dos resíduos entre a eletricidade industrial e óleo

diesel, mas também entre a eletricidade industrial e a gasolina. Outras fortes correlações

são indicadas pelas equações do óleo diesel e da gasolina, além da eletricidade

residencial e lenha. Essas correlações são justificadas em função do uso final para cada

uma das demandas, indicando possíveis processos de complementariedade e

substituição entre as fontes.

Tabela 3 – Resultados da estimação em SUR

Equação obs Param. RMSE R2

Chi2

P

Lenha 25 2 0,0314798 0,3961 29,18 0,000

Óleo Diesel 25 2 0,0360100 0,7538 102,75 0,000

Gasolina 25 2 0,0919664 0,5085 32,27 0,000

Eletricidade

Industrial

25 2 0,0534339 0,7894 98,62 0,000

Eletricidade

Residencial

25 2 0,0373167 0,9195 400,87 0,000

FONTE: Resultados do modelo

Na tabela 3, indicam-se o coeficiente de ajustamento e a significância de cada uma das

equações em separado. Note que exceção feita à lenha, e talvez mesmo nesse caso, os

graus de ajustamento foram expressivos.

Page 13: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

Tabela 4 – Resultado para o sistema de equações simultâneas

Tabela 4.1 – Resultados para a Estimação da Demanda de Lenha

Variável Coeficiente P-value

α (Constante) 1,4079 0,124

β* Preço da Lenha -0,0605 0,127

γ * PIB 0,6163 0,000

Tabela 4.2 – Resultados para a Estimação da Demanda de Óleo Diesel

Variável Coeficiente P-value

α (Constante) -10,1631 0,000

β* Preço do óleo diesel -0,2286 0,000

γ * PIB 2,1475 0,000

Tabela 4.3 – Resultados para a Estimação da Demanda de Gasolina

Variável Coeficiente P-value

α (Constante) -11,3863 0,004

β* Preço da gasolina -0,0516 0,616

γ * PIB 2,2072 0,000

Tabela 4.4 – Resultados para a Estimação da Demanda de Eletricidade Industrial

Variável Coeficiente P-value

α (Constante) -16,9985 0,000

β* Preço da elet. industrial -0,1146 0,046

γ * PIB 2,5170 0,000

Tabela 4.5 – Resultados para a Estimação da Demanda de Eletricidade Residencial

Variável Coeficiente P-value

α (Constante) -22,3743 0,000

β* Preço da elet. residencial 0,0169 0,769

ф * População 3,5718 0,000

Fonte: Dados da Pesquisa

Page 14: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

Finalmente, os diferentes parâmetros obtidos para cada uma das equações podem ser

constatados nas tabelas de 4.1 a 4.5. Curioso notar que para as variáveis preços,

apenas o óleo diesel e a eletricidade industrial apresentam significância e

determinam o comportamento esperado. Assim, um aumento de 10% no preço do

óleo diesel, indica uma redução do consumo deste em 2,2%. Para a eletricidade

industrial, um aumento do preço em 10% provoca uma redução de 1,1%. Essas

inelasticidades comprovam o caráter de bem essencial para a energia. Novamente,

alerta-se para o fato de que trabalhamos com preços nacionais e não regionais, o que

seria ideal.

Para o nível de atividade, contudo, os resultados são distintos. Para o óleo diesel,

para a gasolina e para a eletricidade industrial a demanda demonstra-se elástica à

variação do PIB, numa intensidade superior a 2. De modo análogo, a eletricidade

residencial demonstra-se elástica à variação da população, numa intensidade

superior a 3. Esses resultados apontam para um efeito-renda expressivo na economia

gaúcha para as fontes energéticas principais. O que também, possivelmente, sugere

que esforços no sentido de se incrementar a eficiência energética sejam necessários.

Quanto a eletricidade residencial, embora a população tenha perspectiva de se

estabilizar no Rio Grande do Sul, adianta-se que a estabilização do consumo

energético dependerá da melhoria dos conversores, também com finalidade de

melhorar a eficiência energética. De qualquer forma, percebe-se o risco da ausência

desses esforços.

Somente para a lenha o nível de atividade demonstra-se inelástico. Esse resultado é

parte justificado, pela substituição desta por outras tecnologias que proporcionam

maior conforto. Mas também há que se considerar o efeito da própria renda nesta

opção de substituição.

4. Comentários Finais

O planejamento energético de uma economia sofisticada como a do Rio Grande do

Sul requer antecipação e o recolhimento de informações sistemáticas sobre a

evolução dos indicadores conjunturais e estruturais sócios econômicos.

Page 15: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

O presente artigo buscou, através de uma metodologia de estimação em painel,

inferir as elasticidades-preço e elasticidades-renda da demanda pelas fontes

energéticas principais: lenha, óleo diesel, gasolina, eletricidade residencial e

eletricidade industrial. O método SUR provou-se adequado, pois se demonstra que

os erros das especificações estão correlacionados entre si, o que era esperado, já que

as decisões pelo uso dessas fontes estão interligados na decisão de firmas e

consumidores.

Os resultados obtidos apontam para uma elasticidade-renda expressiva, no período

compreendido entre 1985 e 2009, para o óleo diesel, a gasolina e a eletricidade

industrial. Também foi expressiva a elasticidade para a eletricidade residencial com

relação à população. No caso da lenha, os resultados apontam para uma

inelasticidade-renda.

Com relação as elasticidades-preço os resultados apontam para valores baixos e

pouco significativos. Somente no caso do óleo diesel e eletricidade industrial, duas

fontes tradicionalmente relacionadas a grandes consumidores obteve-se

significância.

Trabalhos futuros, reconhecendo a interligação das demandas, podem avançar no

sentido de se averiguar a elasticidade cruzada entre as fontes, bem como relações

quadráticas presentes no comportamento da demanda. Ao mesmo tempo, a oferta de

novas fontes como a eólica, a solar e o biodiesel podem ser incorporados à análise.

Referências

ALVES, Denisard C.; BUENO, Rodrigo L.S. Short-Run, long-run and cross

elasticities of gasoline demand in Brazil. Energy Economics, v. 25, p. 191-199,

2003.

Andrade, T. & Lobão, W. (1997). Elasticidade-renda e preço da demanda

residencial de energia elétrica no Brasil. Texto para discussão n. 489, Rio de

Janeiro, IPEA.

BAJAY, Sérgio Valdir, Planejamento da expansão de sistemas energéticos:

tipos de modelos, suas vantagens relativas e a atual competência para

Page 16: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

desenvolvê-los no Brasil. Relatório do Projeto BRA/01/039 - Apoio à

Reestruturação do Setor Energético, Contrato 2003/000971, Programa das

Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), Brasília, 2004.

CASTRO, João B.; MONTINI, Alessandra A. Previsão de Consumo Residencial

de Energia Elétrica no Brasil: Aplicação do Modelo ARX. Future Studies

Research Journal, São Paulo, v. 2, n. 2, pp. 03 - 16, Jul./dez. 2010.

CEEE – Companhia Energética. Balanço Energético do Rio Grande do Sul.

Porto Alegre: CEEE, Vários Anos.

COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E

DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro: Editora da

Fundação Getúlio Vargas, 1991.

FEE – Fundação de Economia e Estatística. FEE Dados. Disponível em:

http://www.fee.rs.gov.br/feedados/consulta/listar_variaveis.asp.

GOLDEMBERG, José. Energia, Meio Ambiente & Desenvolvimento. São

Paulo: Edusp, 1998.

GREENE, W. H. Econometric Analysis. 3a ed. New Jersey: Prentice-Hall,

2000.

IRFFI, Guilherme; CASTELAR, Ivan; SIQUEIRA, Marcelo L.; LINHARES,

Fabrício C. Previsão de demanda de energia elétrica para classes de consumo na

região Nordeste, usando OLS dinâmico e mudança de regime. Economia

Aplicada, v.13, n. 1, p. 69-98, 2009

MATTOS, L.B.; REIS, B.S.; LIMA, J.E.; LÍRIO, V.S. Demanda Industrial de

Energia Elétrica em Minas Gerais, 1970-2002. Revista de Economia e

Agronegócio, v.3, n.1, p. 97-120, 2003.

MME – Ministério das Minas e Energia. Balanço Energético Nacional.

Brasília: MME, Vários Anos.

PEDRONI, Peter. Critical Values for Co-integration tests in heterogenous panels

with multiple regressors. Oxford Bulletin of Economics and Statistics, special

edition, p. 653-670, 1999.

PEDRONI, Peter. Panel cointegration: asymptotic and finite sample properties

of pooled time series tests with an application to the PPP hypothesis.

Econometric Theory, p. 597-625, 2004

SCHMIDHEINY, Stephan. Changing Course: A Global Business Perspective

on Development and the Environment. Cambridge : The MIT Press, 1992

Page 17: Demanda por diferentes fontes energéticas no Rio Grande do ...cdn.fee.tche.br/eeg/6/mesa12/Demanda_por_diferentes_fontes... · Poluição urbana do ar Energia (indústria e transporte)

SCHMIDT, Cristiane Alkmin Junqueira; LIMA, Marcos A. M. A demanda por

energia elétrica no Brasil. Revista Brasileira de Economia, jan./mar. 2004,

vol.58, no.1, p.68-98

ZELLNER A. An Efficient Method of Estimating Seemingly Unrelated

Regression Equations and Tests of Aggregation Bias. Journal of the American

Statistical Association, v. 57, p. 500-509, 1962.

WILLIAMSON, John. Economia Aberta e a Economia Mundial – Um Texto

de Economia Mundial. Rio de Janeiro : Ed. Campus, 1989.