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CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA, ABASTECIMENTO E DESENVOLVIMENTO RURAL (Subcomissão Especial dos Conflitos Agrários no Brasil) EVENTO: Audiência Pública N°: 0586/09 DATA: 14/05/200 9 INÍCIO: 10h21min TÉRMINO: 12h49min DURAÇÃO: 02h28min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h28min PÁGINAS: 42 QUARTOS: 30 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO ILMAR GALVÃO – Ex- Ministro do Supremo Tribunal – STF. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO Ouvidor Agrário Nacional, do Ministério do Desenvolvimento Agrário. SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre conflitos agrários no País, especialmente no Estado do Pará. OBSERVAÇÕES Há falhas na gravação. Houve intervenções fora do microfone. Inaudíveis. A reunião não se encerra formalmente.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO DE AGRICULTURA, PECUÁRIA, ABASTECIMENTO E DESENVOLVIMENTO RURAL(Subcomissão Especial dos Conflitos Agrários no Bra sil)

EVENTO: Audiência Pública N°: 0586/09 DATA: 14/05/200 9INÍCIO: 10h21min TÉRMINO: 12h49min DURAÇÃO: 02h28minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h28min PÁGINAS: 42 QUARTOS: 30

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

ILMAR GALVÃO – Ex- Ministro do Supremo Tribunal – S TF.GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO – Ouvidor Agrário Nacio nal, do Ministério doDesenvolvimento Agrário.

SUMÁRIO: Esclarecimentos sobre conflitos agrários n o País, especialmente no Estado doPará.

OBSERVAÇÕES

Há falhas na gravação.Houve intervenções fora do microfone. Inaudíveis.A reunião não se encerra formalmente.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão de Agricultura, Pecuária, Abast. e D esenvolvimento RuralNúmero: 0586/09 Data: 14/05/2009

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Estão abertos os

trabalhos da reunião de audiência pública da Subcomissão Especial, cujo objetivo é

fazer a intermediação dos conflitos agrários no Brasil, da Comissão de Agricultura,

Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Câmara dos Deputados.

Foram convidados para esta reunião o Desembargador Gercino José da Silva

Filho, Ouvidor Agrário Nacional do Ministério do Desenvolvimento Agrário, e o Dr.

Ilmar Galvão, ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal. Eu os convido para que

tomem assento à Mesa.

Antes de mais nada, quero agradecer o Ministro Ilmar Galvão pela deferência

que faz à nossa Comissão. Sabemos do seu tempo exíguo, mas também sabemos

da importância que V.Exa. tem para todos aqueles que defendem o Estado de

Direito.

Gostaria de, em nome da Comissão, agradecer a sua presença, a sua

participação nos nossos trabalhos. V.Exa. sabe da dificuldade que estamos tendo

hoje para evitar conflitos, para tentar ter um Brasil dentro dos trilhos. Então, V.Exa. é

extremamente importante, V.Exa. é um ícone dentro do estudo do Direito, através de

suas publicações. Para nós é muito importante a sua participação.

Gostaria que V.Exa. já começasse a nos dar os seus conhecimentos, para

que possamos começar a nossa audiência.

O SR. MINISTRO ILMAR GALVÃO - Deputado Abelardo Lupion, que me

honrou (Falha na gravação.) um dos graves problemas que vivemos no momento.

Eu vou me limitar a fazer a minha exposição (Falha na gravação.) problema

jurídico da terra no Brasil. É um assunto do qual já cuido há muitos anos. Cuidei,

pela primeira vez, das ações de desapropriação para fins de reforma agrária no

Brasil possivelmente quando eu era Juiz Federal na Amazônia. Naquela

oportunidade, também possivelmente, pela primeira vez, julguei a ação

discriminatória proposta pela União, com o objetivo de identificar as terras devolutas

integrantes do patrimônio público federal que eventualmente tivessem sido objeto de

grilagem etc.

Isso já nos idos de 1970. De modo que já são quase 40 anos lidando com a

matéria. Como sabem os senhores, como Juiz Federal na Amazônia permaneci até

1985, quando fui promovido para o Tribunal Federal de Recursos. Depois, o Tribunal

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se transformou no STJ. E em 1991, fui guindado ao Supremo Tribunal Federal, onde

passei 12 anos e tive a oportunidade de julgar muitas ações de desapropriação

também em grau de recurso extraordinário.

De modo que fico muito à vontade, mas limitado à questão jurídica, Sr.

Presidente. Sabendo, embora, que seja hoje um problema político seriíssimo no

Brasil o problema da ocupação da terra.

A ocupação da terra foi o primeiro caminho para a aquisição da propriedade

rural no Brasil no início do século XIX. Aliás, era um tipo de aquisição da

propriedade que remontava ao Direito Romano, a chamada ocupação. Então, antes

mesmo da concessão das Sesmarias pelas autoridades do Império, já havia a

ocupação de vastas áreas que a lei de 1650 legitimou.

Como disse um grande jurista gaúcho, Cirne Lima, a terra devoluta é uma

terra vocacionada a ser privatizada, a passar para a mão do particular. Pelo menos

naquela época em que Cirne Lima disse isso, não tínhamos essa preocupação de

hoje. Ressalto que hoje há uma nova preocupação quanto a esses problemas de

meio ambiente, com as pressões externas sobre o Governo brasileiro.

Todo brasileiro sabe que os países que hoje fazem pressão em cima do

Governo brasileiro extinguiram as suas florestas, eliminaram completamente as suas

florestas e hoje querem preservar as florestas brasileiras. Não digo que eles estejam

errados, absolutamente. Eu não posso ficar na posição de achar que as florestas

brasileiras devem ser exterminadas pela mesma maneira como foram exterminadas

as florestas nos Estados Unidos, na Europa e em grande parte da África, onde ainda

restam, remanescem alguma coisa, mas não por um instinto de preservação, talvez

até pela impossibilidade, pela falta de acesso etc.

Então, como eu disse, a ocupação foi o primeiro meio de aquisição da

propriedade no Brasil. Sabemos que a Lei de 1650, no seu regulamento, previu um

meio de comprovação de ocupação, que era o chamado registro do vigário. Como o

Poder Judiciário era um Poder muito restrito na época, não tinha acesso a todas as

regiões do País, então a lei outorgou ao vigário, ao padre da paróquia o poder de

registrar os depoimentos, as declarações dos ocupantes das terras.

Essa lei resguardou as terras ocupadas pelos indígenas. Desde antes da

vinda da Família Real para o Brasil, em Portugal, o Marquês de Pombal já tinha

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expedido atos para preservar o direito dos indígenas sobre as terras por eles

ocupadas. A Lei de 1650, além de ratificar esses atos, ainda previu a criação de

reservas indígenas, o que é diferente. Até hoje, pelo que vejo e ouço até nos

julgamentos feitos pelos Tribunais, não se distingue reserva de área indígena. Áreas

indígenas são aquelas áreas que desde a origem dos tempos imemoriais estavam

ocupadas por índios. E reserva são áreas que o Governo, por conveniência, resolve

instalar uma reserva indígena, e aí nós sabemos que tem que haver a

desapropriação. Esse é o primeiro requisito. Mas não tem sido observado.

E agora mesmo vimos o que aconteceu em Roraima. Pessoas com 80 anos

dentro de uma área, nascidas e criadas ali, explorando um determinado espaço de

terra, de repente foram obrigadas a deixar tudo aquilo, em razão de uma

demarcação, de um ato administrativo. Quer dizer, quem tinha os seus direitos, por

um ato administrativo, foi obrigado a sair, quando o Governo tinha um instrumento

forte, que era a desapropriação. Na verdade, se houvesse interesse, aquelas áreas

que hoje estavam sendo exploradas na produção agrícola e integravam a área

indígena poderiam ter sido desapropriadas. Nada impedia, desde que justificado.

Como examinei bastante este caso de Roraima, posso dizer o seguinte: o

interesse de certos índios, o interesse das autoridades, de autarquias federais e da

própria Igreja Católica teve por objeto exatamente as áreas que estavam sendo

cultivadas há muitos anos. Era uma área de 1 milhão 740 mil hectares para pouco

mais de 19 mil índios. Um índio, inclusive crianças, para cada quilômetro quadrado.

O interesse, claro, era sobre as áreas que estavam sendo cultivadas. Ninguém tinha

interesse nas demais áreas que abrangem metade do norte do Estado de Roraima.

Mas como eu ia dizendo, essas terras devolutas, durante o Império,

passaram, com a Constituição de 1891, para os Estados — art. 62 da Constituição

de 1891: as terras devolutas passaram para os Estados.

Que terras devolutas eram essas? As terras descritas na Lei de 1650. As

terras que não tinham... A Lei de 1850 define como terras devolutas as que não se

acharem no domínio particular por qualquer título legítimo e as que não se acharem

aplicadas a algum uso público federal ou municipal.

Eu acredito, tenho certeza e sustento, que as terras que estavam, no Império,

ocupadas por índios e que continuaram ocupadas pelos índios — eram áreas

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indígenas, chamadas aldeamentos indígenas —, com a Constituição de 1891, se

esses aldeamentos ainda estavam ativos, essas áreas ficaram com a União. Não

eram consideradas terras devolutas, portanto ficaram com a União. Mas aquelas que

já estavam extintas, os aldeamentos extintos, esses eram terras devolutas e

passaram para os Estados. E aos Estados é que compete hoje disciplinar a

utilização, a destinação dessas terras que eram, no passado, no tempo do Império,

aldeamentos indígenas. E hoje não são mais, nem eram mais em 1891 quando foi

criada a Constituição.

Aliás, a Lei de 1850, em seu art. 2º, alínea “f”, diz assim no caput: “São áreas

devolutas as áreas dos extintos aldeamentos de índios”. Enquanto que aldeamento

de índio, terra, é de uso especial da União, não passaram para os Estados. Mas as

que já estavam extintas em 1891 eram terras devolutas e ficaram com os Estados.

Isso não tem sido entendido.

Depois que deixei o Supremo Tribunal Federal por implemento de idade,

passei a exercer a advocacia. E defendi em Rondônia um caso de terra que foi,

possivelmente — ninguém pode negar —, num passado remoto, aldeamento

indígena, mas que, em 1891, já não o era mais. Era aldeamento extinto. Portanto,

essas terras não eram mais da União e não eram mais da administração do INCRA,

a não ser na área de fronteira, de 150, que é outro problema. No entanto, não foi

assim reconhecido na primeira instância. Estamos na segunda instância, com uma

dificuldade de compreensão de um problema tão singelo. Se há prova de que há

ocupação dessas áreas desde 1880 — portanto, não havia índio —, a terra passou

para o Estado, com a Constituição de 1891.

Não tem como a União defender hoje a propriedade dessas terras que estão

fora da faixa de fronteira. Na faixa de fronteira, sim. Terra devoluta na faixa de

fronteira, nós todos sabemos, integra o patrimônio da União.

Então, como eu disse, as áreas dos extintos aldeamentos... Havia nas

Constituições brasileiras a compreensão errônea de que as terras ocupadas por

índios pertenciam a eles. Mas a Constituição de 1934 dizia que são dos índios as

terras... Mas não podem vendê-las. Quer dizer, havia uma restrição. Não podem

vendê-las. E a Constituição de 1946 colocou as coisas nos devidos lugares: tem

usufruto. O índio não tem a propriedade da terra. Ele tem o usufruto da terra.

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São vários os assuntos, e eu teria de me estender bastante. Como é uma

coisa atual a questão dos índios... Temos uma grande questão na Bahia. É a mesma

coisa também. Trata-se de um problema seriíssimo. Todo o sul da Bahia, hoje, está

reivindicado pela FUNAI como se fosse terra de índio, envolvendo vários Municípios,

sem a menor prova de que... Aí eu pergunto: o que são consideradas terras

indígenas pela Constituição de 1988? São as terras que em 5 de outubro de 1988

estavam ocupadas por índios.

Se em 1967 havia índios, mas eles abandonaram essas terras

definitivamente, em 1988 já não estavam lá, essas terras não são mais indígenas.

Não se pode querer eliminar a presença dos proprietários. A maioria deles com

títulos — isso no caso da Bahia — concedidos pelo Estado da Bahia. E hoje vários

Municípios estão sendo reivindicados para uma meia dúzia de índios. Aliás, na

época em que a Bahia pôs à disposição da FUNAI uma parte das terras, esta se

instalou ali e não chegou sequer a demarcá-las, porque não havia índios no local.

Esse é o problema.

Eu digo sempre que não gostaria de ser produtor rural no Brasil. Esse é um

tipo de atividade com a qual eu jamais poderia me envolver. O produtor rural, hoje,

tem esse problema com o índio, por exemplo. De repente, vem uma alegação de

que a área indígena tem de ser ampliada, de que ali é área indígena, porque

encontraram uma cerâmica. Um técnico faz um laudo dizendo que encontrou uma

cerâmica e que ali era um cemitério de índio. Era. No passado. A Constituição é

muito clara: tem de haver a presença de índio em outubro de 1988, em termos

permanentes. No passado, não. Se for assim, o Brasil todo é terra de índio, porque,

no passado, todas as nossas terras eram ocupadas por índios. Pelo menos é o que

se presume, embora se saiba que os índios viviam mais na área litorânea.

De um lado, temos a FUNAI; de outro, temos o INCRA. Interessante é que,

quando eu era juiz, sempre julguei muitas causas do INCRA. E o INCRA, com muito

critério, verificava a necessidade de desapropriação. A terra não era produtiva. Está

na Constituição que, não sendo produtiva, pode estar sujeita à desapropriação.

Embora a Constituição estabeleça imunidade para a terra produtiva, foi criada uma

lei exigindo não somente que ela seja produtiva, mas que seja explorada — que haja

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80% de exploração. Veio uma lei, 8 anos depois, alterando completamente a

Constituição.

Como disse, eu era um juiz que sempre via as causas do INCRA com muita

simpatia, porque, num país imenso como este, com tanta terra, não era justo que

ficassem os sem-terra eternamente sem esperança de obter uma parte de terra para

trabalhar. Até ao Supremo Tribunal Federal eu fui.

Sinto-me muito honrado de ter aqui comigo hoje o Dr. Gercino. Eu o conheci

ainda no Acre. É um homem que eu sempre elogio, um homem de muita coragem.

Ele foi Presidente do Tribunal de Justiça e enfrentou questões sérias no Acre — por

exemplo, de grupos de extermínio etc. O assunto era tão grave que uma vez, no

aeroporto, saltando em Rio Branco, um repórter me perguntou o que eu achava da

atuação dele. Eu fui elogiar a atuação dele e recebi depois uma ameaça de um

grupo. Recebi uma ameaça já aqui em Brasília. Uma pessoa — o chefe do grupo,

talvez — mandou me dizer que eu ia ver o que ia acontecer. Isso por causa de um

simples elogio que eu fiz. Imaginem a atuação dele. É respeitável a atuação do Dr.

Gercino. Mas ele deve saber que até ao Supremo Tribunal eu fui. Quando eu era

juiz, julguei causas envolvendo desapropriação sempre em favor do Poder Público,

porque considerava legítimo que o Poder Público estivesse empenhado na

distribuição de terras para quem não as tinha no País.

Vale ressaltar que os programas de reforma agrária, na verdade, não

alcançaram o resultado esperado, pelo menos no desenrolar desses últimos anos, e

geraram esse problema atual, que é outra questão que o produtor rural tem de

enfrentar. Além de a FUNAI enfrentar problemas de terra de índio — o Ministério

Público também —, agora temos a questão dos quilombolas.

A Constituição, fazendo justiça, estabeleceu que as terras que eram objeto de

quilombos — aqueles quilombos que nós estudamos no curso primário —, que não

estavam tituladas em favor de ninguém, fossem tituladas em prol desses habitantes,

desse núcleo. É uma propriedade interessante, uma propriedade coletiva. Não se

trata de propriedade de um afro-brasileiro, mas da coletividade. E foi regulada, de

maneira completamente absurda, por decreto. Como se cria direito por decreto? “Ah,

mas a desapropriação é por decreto.” Sim, declara-se de interesse social para fins

de reforma agrária. Faz-se a desapropriação. Nesse caso não, cria-se um direito por

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decreto. Que direito? Delimita-se essa área que era um quilombo antigo em favor

dos descendentes. Delimita-se por um órgão administrativo. E ainda que atinja a

propriedade privada, está envolvida no quilombo.

O INCRA tem ordem de legitimar depois de fazer a pesquisa. E se diz assim:

“Mas, se houver terra particular, pode o decreto prever a desapropriação.” Sim, mas

como se pode criar antes de desapropriar? Como se pode titular antes de

desapropriar? Esse é um problema também seriíssimo que está em discussão,

aguardando a decisão do Supremo Tribunal Federal.

Outra questão do IBAMA são as chamadas unidades de conservação. A

unidade de conservação, cuja finalidade é a preservação de paisagens e do meio

ambiente, etc., foi criada por decreto, abrangendo propriedades particulares antes

da desapropriação. Este é o resultado: há proprietários, como alguns exemplos de

Santa Catarina e do Paraná, cujas famílias são proprietárias há cerca de 300 anos

— alguns participaram inclusive da Guerra do Paraguai. Desde aquela época

aquelas famílias são proprietárias da terra, até por ocupação, se não fosse por outro

motivo.

Ocupação é uma matéria muito ampla. Faltou-me dizer que a ocupação foi

criada por um decreto-lei de 1946. Quando a ocupação pacífica tem 30 anos de

idade, adquire-se a propriedade particular dessas terras ocupadas, segundo o

decreto-lei. O Governo diz que depende de uma justificação. A lei é muito clara, o

decreto-lei é muito claro: incorporada ao domínio particular por ocupação. A

audiência de justificação é apenas para declarar, para formalizar o título. A pessoa

depende de um título. O próprio decreto-lei prevê essa justificação, para formalizar o

título.

Como eu disse, no Paraná, — no Pará nem se fala, porque o País hoje está

quase tomado pelas unidades de conservação, sem o menor respeito ao direito

individual —, no momento em que se escolhe uma área para criação da unidade de

preservação, o valor da propriedade privada cai a quase zero, é reduzido a zero.

Sou fazendeiro, sou proprietário, lá do oeste do Paraná e de Santa Catarina,

onde as famílias são proprietárias há 200 anos. É criada a unidade de conservação

em cima dessa propriedade. A própria lei diz que a propriedade privada tem de ser

desapropriada. Mas quando vai ser desapropriada? Nunca! No Rio Grande do Sul

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foram criadas unidades de conservação, acabaram com a propriedade privada e

nunca houve a desapropriação. Sei isso porque examinei esse assunto também.

Isso é um absurdo!

Sr. Presidente, a desapropriação é uma infelicidade para o indivíduo sobre o

qual recai a desapropriação. Geralmente acontece quando o homem está com 65

anos, daí para frente. Aquela propriedade vem dos seus ancestrais. Veio do avô,

passou para o pai, veio para ele e vai passar para os filhos. Vem, então, a

desapropriação. O Governo estabelece um quantum, a seu critério, e o indivíduo, o

proprietário, vai ter que se defender na Justiça para sustentar o preço justo que a

Constituição prevê. Depois de constituir advogado para isso, ele morre sem ver o

resultado da indenização. Ele não tem mais idade para iniciar uma nova atividade.

Fica privado daquela atividade, que já foi do seu avô, não tem condições de iniciar

uma nova atividade e não vê a indenização senão daqui a 10, 15, 20 anos. Temos

casos de indenização de 30 anos, com a ação rolando na Justiça.

Para completar, a Constituição foi emendada, no Ato das Disposições

Transitórias: se a ação foi proposta antes de 1998, data da emenda, esse

pagamento será feito em 10 vezes, em 10 anos. Nesse caso, nem os filhos verão a

indenização.

Estou examinando um caso do oeste do Paraná em que a desapropriação

ocorreu em 1974! Estou advogando um caso do espólio de um dos filhos do antigo

dono, que foi expropriado em 1974. Estão até hoje sem receber a indenização.

Estou estendendo-me demais. Cada assunto desses é matéria para se falar

por uma hora, e gosto de falar sobre esse assunto, sempre gostei. Isso não

acontece só agora, quando estou advogando. Esse é um problema seriíssimo.

Para terminar, vou falar sobre as invasões de terra que acontecem neste

País, de sul a norte, todos os dias, programadas, anunciadas com antecipação.

Invasão de quê? De terras devolutas? Não, invasão de propriedades produtivas.

É interessante que fui contra uma medida provisória que estabeleceu, ainda

no Governo anterior, que a propriedade invadida não podia ser desapropriada. Eu fui

contra, porque achei que era mais uma restrição à desapropriação que não estava

na Constituição. A Constituição estabelece todas as restrições da desapropriação: a

pequena e a minipropriedade, a propriedade produtiva e aquela que atende à justiça

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social. Essas são as restrições que estão na Constituição. Veio o Governo e criou

mais uma restrição: terra invadida não se pode desapropriar. Isso ocorreu no

Governo passado. Não sei se esse é o espírito que move o atual Governo — e

refiro-me à Administração, não estou fazendo crítica ao Governo do Presidente, que

muitas vezes nem tem conhecimento do que está acontecendo.

Faço um parêntese só para mencionar que recentemente, no mês de

fevereiro, os jornais noticiaram que o Presidente Lula tinha concedido 6 milhões de

hectares de terra em Roraima para o Estado, que havia transferido para o Estado 6

milhões de propriedade de terra. Eu estava no Rio de Janeiro, em férias, e fiquei

curioso. Quando voltei, fui examinar essa medida provisória. Ela não transfere nem

um palmo de terra, nem um hectare de terra para Roraima. A imprensa — e quem

sabe até o Presidente, porque me parece, pelas palavras que S.Exa. proferiu, estava

convencido de que agia daquela maneira — imaginou que se estava transferindo

para o Estado de Roraima 6 milhões de hectares de terras federais.

Na verdade, o que fez aquela medida provisória? Pegou uma lei, do Governo

anterior, que tinha transferido para Roraima os próprios federais, como prédios e

áreas da União, e restringiu. O Estado fora criado e tudo aquilo que era da União

passou para o Estado. O que a medida provisória fez foi restringir. Não concedeu

nem um hectare de terra. Restringiu porque mandou incluir na lei, além daquilo,

ainda as terras que tinham sido objeto de unidade de conservação e outras. Retirou

da concessão que tinha sido feita dos próprios federais as unidades de conservação,

etc. Como as coisas acontecem neste País! Por isso, digo que muitas vezes quem

está praticando o ato não sabe nem o que está acontecendo nessa hora, é induzido

a erros dessa natureza.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Quero fazer uma

sugestão a V.Exa. Nós temos assuntos específicos sobre os quais gostaríamos de

ouvir sua opinião. Ouviríamos agora o Dr. Gercino e depois, no momento das

perguntas, falaríamos mais especificamente sobre os temas, porque é muito

importante a opinião de V.Exa. para nós, na elaboração do relatório.

Concedo a palavra ao Desembargador Gercino José da Silva Filho, Ouvidor

Agrário Nacional, para sua exposição inicial.

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O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Deputado Abelardo Lupion,

Ministro Ilmar Galvão, senhoras e senhores, é um prazer atender ao convite para

prestar esclarecimentos no que se refere aos conflitos agrários no Brasil,

principalmente na qualidade de Ouvidor Agrário Nacional e Presidente da Comissão

Nacional de Combate à Violência no Campo, cargo que exerço há aproximadamente

10 anos.

Nas vezes anteriores em que estive na Câmara dos Deputados, apresentei,

em primeiro lugar, os problemas e depois as soluções. Hoje vou inverter: falarei em

primeiro lugar das medidas editadas pelos órgãos públicos para a diminuição de

conflitos agrários e violência no campo, depois falarei sobre os problemas

existentes.

A primeira medida sobre a qual vou falar, medida para diminuir a violência no

campo e os conflitos agrários, é o Plano Nacional de Combate à Violência no

Campo, criado pela Ouvidoria Agrária Nacional e por uma comissão especial

constituída pelos Ministros da Justiça, do Desenvolvimento Agrário, da Secretaria

Especial dos Direitos Humanos e do Ministério do Meio Ambiente, coordenada por

mim...

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Quinze ações, que objetivam

diminuir a violência no campo.

Dessas quinze ações, as principais são criação de varas agrárias federais e

estaduais, criação de promotorias agrárias federais e estaduais, criação de polícias

militares agrárias; e desarmamento no campo, nas fazendas, nos acampamentos e

nos assentamentos. Isto é uma coisa inequívoca: o armamento existe nos três

lugares: nas fazendas, nos acampamentos e nos assentamentos. O Governo

Federal e os Governos Estaduais têm feito algumas ações concretas, em que foram

encontradas grandes quantidades de armas nas fazendas, nos acampamentos dos

trabalhadores rurais sem terras e nos assentamentos. É uma existência real e

concreta, e, consequentemente, urge que a Polícia faça esse desarmamento.

Outra ação que consta do Plano Nacional de Combate à Violência no Campo

é a questão da fiscalização dos cartórios de registro de imóveis. O Ministro Ilmar

Galvão conhece muito bem isso e sabe que o descumprimento das regras de

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registros públicos constitui um fato que gera violência no campo, que gera conflito

agrário, porque muitas vezes o cartorário, principalmente o registrador, abre uma

matrícula de um imóvel e faz um registro imobiliário que não tem os requisitos

necessários exigidos pela lei. Isso acaba gerando conflito agrário, violência no

campo. Na Amazônia Legal, principalmente, é comum a existência de vários

registros imobiliários — dois, três, até quatro — sobre o mesmo imóvel. Isso significa

que o registrador não obedeceu às condições que a lei exige.

Eu me lembro, por exemplo, que no Governo anterior foi feito um plano de

combate à grilagem de terras públicas no Estado do Amazonas, em um determinado

município que tem uma área rural de 3 milhões de hectares. No cartório de registro

de imobiliário desse município havia registrados 9 milhões de hectares, ou seja, três

vezes mais do que a própria existência.

Não vou falar sobre todas as medidas do plano, para não ficar cansativa a

explanação.

A outra medida é a Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo.

Chamo atenção para esta distinção: o Plano Nacional de Combate à Violência no

Campo é o plano do Executivo Federal que traça as normas em abstrato para fazer

a prevenção dos conflitos agrários, para diminuir a violência no campo; e a

Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, que também é presidida por

mim, atua nos casos concretos, para resolver os casos concretos ocorridos e que

são levados ao conhecimento da Ouvidoria Agrária Nacional.

A outra medida existente é o Manual de Diretrizes Nacionais para a Execução

de Mandados Judicias de Manutenção e Reintegração de Posse Coletiva. É um

manual elaborado também pela Comissão Nacional de Combate à Violência no

Campo. Esse plano foi submetido a todos os Comandantes-Gerais das Polícias

Militares no dia 11 de abril de 2008 e foi aprovado por todos os Comandantes, com

algumas sugestões de mudança que fizeram e que nós acolhemos. Hoje, então,

existe um manual editado pela Ouvidoria Agrária Nacional e pela Comissão Nacional

de Combate à Violência no Campo e aprovado por todos os Comandantes-Gerais

das Polícias Militares.

A outra medida existente para diminuir os conflitos agrários e a violência no

campo é o recente Fórum Nacional para Monitoramento e Resolução dos Conflitos

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Fundiários Rurais e Urbanos, instituído pela Portaria nº 491, de 11 de março de

2009, pelo Ministro Gilmar Mendes, na condição de Presidente do Conselho

Nacional de Justiça.

Isso nos deixa muito felizes, porque agora nós passamos a ter parceiros que

não são apenas do Executivo Federal e do Executivo Estadual. O próprio Poder

Judiciário, por meio do Conselho Nacional de Justiça, baixou norma, e já houve, na

segunda-feira passada, o primeiro seminário para instalação do Fórum Nacional, do

qual participaram juízes de todas as unidades da Federação, inclusive juízes

federais.

As primeiras medidas do próprio Fórum Nacional foram no sentido de que há

necessidade realmente, para diminuir a violência no campo, diminuir os conflitos

agrários, de agilização da criação e instalação das varas agrárias federais, das varas

agrárias estaduais e das promotorias agrárias federais e estaduais também.

A outra medida é a própria recomendação do Ministro Gilmar Mendes —

também como Presidente do Conselho Nacional de Justiça — aos Tribunais para

priorizarem e monitorarem demandas jurídicas envolvendo conflitos fundiários. É a

Recomendação nº 22, de 4 de março de 2009. Isso é muito importante. Como o

Ministro Ilmar Galvão acabou de falar, as ações de desapropriação, por exemplo,

demoram anos e anos para a conclusão.

A Procuradoria-Geral do INCRA apresentou no Fórum Nacional uma relação

de aproximadamente duzentas ações de desapropriação que tramitam há vários

anos e que estão dependendo da prestação da tutela jurisdicional para chegarem à

conclusão. Isso é muito ruim. É ruim para o Executivo Federal, porque, quanto mais

demora a imissão do INCRA na posse desses imóveis, mais violência geral, mais

conflitos agrários provoca; E é muito ruim também para o proprietário que foi objeto

dessa ação de desapropriação, porque demora mais. Se já é demorada a efetivação

dessa indenização, que é feita por meio de títulos da dívida, ainda demora muito

mais. Portanto, essa agilização não só dos processos de desapropriação mas

também das ações de reintegração e de manutenção de posse é muito importante.

A outra medida é decorrente da própria Câmara dos Deputados, e é muito

bem-vinda. Eu estava dizendo para o Ministro Ilmar Galvão, antes de iniciarmos os

nossos depoimentos, que agora a Comissão Nacional de Combate à Violência no

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Campo e a Ouvidoria Agrária Nacional não estão sozinhas nessa tarefa de diminuir

a violência no campo, de diminuir os conflitos agrários, porque temos estas duas

parcerias: a do Conselho Nacional de Justiça e a da Câmara dos Deputados, por

meio da Subcomissão Especial com o objetivo de fazer a intermediação dos conflitos

agrários no Brasil. É muito importante essa parceria, essa iniciativa da Câmara dos

Deputados para diminuir a violência no campo.

Agora vamos apresentar os problemas existentes que evidentemente

provocam conflitos agrários e provocam violência no campo.

Em primeiro lugar, o relatório de ocupação de imóveis rurais de prédios

públicos, bloqueio de rodovias e assassinatos de trabalhadores rurais no campo.

No que se refere ao bloqueio de rodovias, nós temos um quadro que está

diminuindo. Por exemplo, em 2007 tivemos 91 bloqueios de rodovia, em 2008

tivemos 99 bloqueios e em 2009 tivemos até agora 6 bloqueios de rodovias em todo

o Brasil.

No que se refere à ocupação de prédios públicos, em 2007 tivemos 80

ocupações; em 2008, 68 ocupações; em 2009, até agora não tivemos esses

bloqueios. O total geral de bloqueios de rodovias a partir de 2001 foi 716 bloqueios.

Esse corte em 2001 ocorre porque antes não tínhamos esse levantamento.

Só passamos a fazer a partir de 2001.

No que se refere à ocupação de imóveis rurais, a partir de 2001 temos um

total de 1.868 ocupações de imóveis rurais. Em 2009 ocorreram 39 ocupações; em

2008 ocorreram 234 ocupações; em 2007 ocorreram 298 ocupações.

Depois vêm esses dados por região. Não vou lê-los, região por região.

Contudo, se alguém tiver interesse em saber como está a situação da sua região,

nós temos aqui os dados.

Em seguida, vem a questão dos homicídios na zona rural. A partir de 2001

também, temos um total geral de 574 homicídios ocorridos na zona rural. Desses

574, temos 144 decorrentes de conflitos agrários. Os senhores sabem muito bem

que nem tudo que ocorre na zona rural tem motivação agrária. Há crimes passionais

ocorridos na zona rural, há crimes decorrentes de ingestão de bebida alcóolica e de

várias outras questões.

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Em 2009, tivemos 15 homicídios ocorridos na zona rural, estando em

investigação 13 homicídios e havendo 2 homicídios já declarados não decorrentes

de conflitos agrários. E ainda não temos a confirmação daqueles que tiveram

motivação agrária.

Para que os senhores entendam bem essa questão, esclareço que a

Ouvidoria Agrária Nacional não tem um critério subjetivo para dizer o que é

decorrente ou não decorrente de conflitos agrários. Nós consideramos dados

objetivos. Se o homicídio ainda está na fase de polícia, consideramos o relatório do

delegado. Quando o delegado conclui o inquérito e remete-o para a Justiça, informa

se aquele homicídio foi decorrente ou não decorrente de conflito agrário. Esse é o

nosso critério para assim considerá-lo. Se já foi apreciado pelo Ministério Público,

nós consideramos a denúncia. Se já houve sentença, nós consideramos a sentença.

Por isso, temos um critério objetivo. Não passa pela parte subjetiva da Ouvidoria

Agrária essa questão.

Vou apresentar o relatório específico do Estado do Pará. No Estado do Pará,

no que se refere ao bloqueio de rodovias, em 2009 tivemos 1 boqueio; em 2008

ocorreram 7 bloqueios de rodovias; em 2007, oito bloqueio de rodovias.

No que se refere a ocupação de prédios públicos no Estado do Pará. Em

2009 não houve ocupação de prédios públicos, em 2008 tivemos 2 ocupações de

prédios públicos, em 2007, 8 ocupações de prédios públicos.

Ocupação de imóveis rurais no Estado do Pará. Aqui urge fazer uma

distinção: Os Estados da Amazônia Legal não têm uma grande incidência de

ocupação de imóveis rurais. Eles são mais violentos, ou seja, têm uma incidência de

homicídios maior, porém o número de ocupação de imóveis é muito grande na

região Nordeste, na região Sudeste e na Região Sul. Hoje o Estado que apresenta o

maior número de famílias acampadas aguardando assentamento é a Bahia, Estado

do Ministro Ilmar Galvão, que tem 30 mil famílias acampadas aguardando

assentamento. Em segundo lugar, o Estado de Pernambuco com aproximadamente

25 mil famílias acampadas.

No Estado do Pará, então, em 2009, 5 ocupações de imóveis rurais, fazendo

ressalva de que esses dados vão somente até o mês de fevereiro, não vem até a

data atual; em 2008, tivemos 16 ocupações e, em 2007, 13.

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Para os senhores terem uma idéia, vamos apresentar a localização dos

acampamentos dos trabalhadores rurais sem terra no Estado do Pará.

Principalmente nas regiões sul e sudeste ocorre a maior incidência de ocupação de

imóveis rurais no Estado do Pará.

Agora vamos apresentar a relação de assassinatos na zona rural no Estado

do Pará. No Estado do Pará, a partir de 2001 até o momento, tivemos 153

homicídios na zona rural. Desses 153, 47 decorrentes de conflitos agrários, 57 não

decorrentes e 49 em investigação. Em investigação é aquilo que eu falei aos

senhores: significa que ainda não houve uma definição da Justiça, seja da

delegacia, seja do Ministério Público, seja do Poder Judiciário. Também

apresentamos no mapa onde tem ocorrido o maior número de homicídios na zona

rural no Estado do Pará. Também, como os senhores podem observar, maior

incidência nas regiões sul e sudeste do Estado do Pará.

Em seguida, nós apresentamos a localização das varas agrárias no Estado do

Pará, que hoje tem 5 varas; aliás, vamos falar pelo número da região. Primeiro a

região agrária, Castanhal, que abrange 74 municípios, a segunda região agrária,

com sede em Santarém, com 18 municípios, a terceira região agrária, com sede em

Marabá, 23 municípios, a quarta região agrária, com sede em Altamira,12 municípios

e a quinta região agrária, com sede em Redenção, 23 municípios.

Aqui apresento os mandados judiciais de reintegração de posse de imóveis

rurais, cumpridos pela Polícia Militar no Estado do Pará, em 2007 e 2008. Aqui

também não é dado subjetivo da auditoria; é um dado com base no relatório

fornecido pela Secretaria de Segurança Pública do Estado do Pará, que aponta que

nos anos de 2007 e 2008, o Estado cumpriu 24 mandados judiciais de reintegração

de posse.

Mandados judiciais de reintegração de posse de imóveis rurais não cumpridos

pela Polícia Militar do Estado do Pará, em 2007 e 2008, também com base em

relatório da Secretaria. Então, de acordo com a informação da Secretaria de

Segurança Pública do Estado do Pará, nós temos um total geral de reintegração de

posse não cumprida, 58, distribuída da seguinte maneira: na região agrária de

Castanhal, 25 reintegrações de posse não cumpridas; na região agrária de Marabá,

21 reintegrações de posse não cumpridas; na região agrária de Redenção, 10;

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Santarém, 1 mandado de reintegração não cumprido; e Altamira, 1 mandado de

reintegração.

Mandados judiciais de reintegração de posse cumpridos durante o mandato

da Governadora Ana Júlia, também, repito, de acordo com a informação da

Secretaria de Segurança Pública do Estado do Pará. De acordo com essas

informações, a Polícia Militar cumpriu 115 mandados judiciais de reintegração de

posse rurais e urbanos. Aí, não se limita tão somente aos rurais. Em seguida, eu

faço sugestões respeitosas...

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Eles informaram, sim, quantos

urbanos e rurais existem, mas eu não passei para o meu relatório os 2.

Em seguida, faço sugestões da Ouvidoria Agrária Nacional e da Comissão

Nacional de Combate à Violência no Campo à Subcomissão Especial, com objetivo

de fazer a intermediação dos conflitos agrários no Brasil e para diminuir os conflitos

e a violência no campo. Na visão da Ouvidoria Agrária Nacional, acho que a

Subcomissão deve sugerir as seguintes medidas: que os tribunais de Justiça criem

varas agrárias especializadas; que as Procuradorias Gerais de Justiça criem

promotorias agrárias especializadas para apreciação de conflitos; que as Secretarias

de Segurança Pública devem criar delegacias agrárias também especializadas; que

as Polícias Militares criem as polícias militares agrárias, especializadas na resolução

dos conflitos. Da mesma forma, as Defensorias Públicas devem criar defensorias

públicas agrárias; da mesma forma os Tribunais Regionais Federais devem criar

varas agrárias especializadas para a resolução dos conflitos, porque hoje nós só

temos 5 Varas Agrárias Federais em todo o Brasil.

O INCRA deve agilizar os seus programas no sentido de melhorar a reforma

agrária, principalmente no que se refere à retomada de áreas públicas federais

rurais que se encontram na posse de grileiros, bem como acelerar os processos de

desapropriação de imóveis rurais improdutivos para assentamento de trabalhadores

rurais sem terras que demandam providências do Poder Público, para execução do

Programa de Reforma Agrária do Governo Federal.

A Subcomissão Especial, com o objetivo de fazer a implementação dos

conflitos agrários, deve exigir que os órgãos públicos cientifiquem os movimentos

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sociais rurais no sentido de que os mesmos devem fazer as suas mobilizações em

busca da implementação do programa de reforma agrária, de acordo com o Estado

Democrático de Direito, respeitando as propriedades produtivas que cumprem a

função social preconizada pela Constituição Federal, haja vista que, como o próprio

Ministro Ilmar Galvão falou, essas propriedades produtivas que cumprem a função

social são imunes à desapropriação; então, elas têm que ficar estanques, têm de

ficar separadas e não podem ser objeto de ocupação.

A especialização dos órgãos na prevenção e resolução dos conflitos agrários,

conforme descrito acima, é necessária porquanto propiciará: garantia do

cumprimento da função social da propriedade, consoante prevê o art. 186, inciso I,

II, III, IV da Constituição Federal; aplicação do direito agrário em substituição ao

direito civil; especialização dos magistrados, do Ministério Público, dos defensores,

dos delegados, da Polícia Militar nas questões agrárias; aproximação do Judiciário e

do Ministério Público do homem do campo; efetividade do direito agrário; solução

pacífica dos conflitos agrários, paz social no campo; diminuição da violência no

campo; e garantia da cidadania do homem do campo.

Sr. Presidente, com essas sugestões supramencionadas, espero ajudar a

Subcomissão Especial, com o objetivo de fazer a intermediação dos conflitos

agrários no Brasil, na prevenção e resolução dos conflitos agrários coletivos

envolvendo proprietários rurais e trabalhadores rurais sem terra que demandam

providências do Poder Público para execução do programa de reforma agrária,

diminuindo em consequência os conflitos agrários e a violência no campo.

Essa é a exposição que apresento respeitosamente a todos e entrego a

V.Exa. o nosso ofício contendo os dados que acabei de citar.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Muito obrigado, Dr.

Gercino.

Determino à assessoria que tire cópia desse relatório para os Parlamentares.

Eu gostaria de só fazer uma elucidação aos nossos convidados. Nós temos

uma maneira de fazer as nossas reuniões, em que o palestrante fala apenas 20

minutos. Em deferência aos ilustres expositores que poderão nos ajudar muito nesta

Comissão, estamos dispondo do tempo necessário para que os 2 possam se

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manifestar, porque dentro daquilo que estamos buscando eles são extremamente

importantes para que possamos chegar às soluções.

Eu quero convidar para usar da palavra o nosso primeiro debatedor,

Deputado Giovanni Queiroz.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Sr. Presidente, Dr. Gercino, Sr.

Ministro Ilmar Galvão, eu já tive oportunidade de estar com o senhor, sempre muito

atencioso e educado com todos nós. Pela primeira vez, estamos aqui na presença

do Sr. Ilmar Galvão, embora o conheça, na sua atuação no Poder Judiciário deste

País.

Estamos aqui para discutir a questão da segurança da intermediação dos

conflitos agrários. Eu sou membro desta Subcomissão e aqui me foi delegada a

função de Relator, pelo fato de que o Relator está ao mesmo tempo numa outra

Subcomissão também importante para está Casa.

Dr. Gercino, eu estive em Marabá, onde ouvi alguns depoimentos. Sou

Deputado Federal pelo Estado do Pará e também produtor rural. Os depoimentos

estão na seguinte linha: primeiro, as fazendas invadidas que esperam da Justiça a

iniciativa de desocupá-las ou reintegrá-las, mesmo em caso de reintegração, foram

retomadas imediatamente. O carinho com que essa polícia treinada está fazendo as

desapropriações é no sentido de deslocar. Avisam antes, escondem as armas, são

desapropriados, reintegrados e, em seguida, voltam com mais voracidade,

depedrando, aniquilando a propriedade.

Outro depoimento foi da Federação da Agricultura. Eu trouxe um documento

para passar ao senhor, mas acho que não será necessário; vou apenas citá-lo. Ele

mostra que, até 2007, só na região de Marabá, havia 473 projetos de assentamento.

Tínhamos lá, então, capacidade para assentamento de 90 mil famílias, em 4 milhões

e 497 mil hectares. Haviam sido assentadas 64 mil famílias, ou seja, havia

disponibilidade para mais 26 mil famílias serem assentadas. Se o INCRA cumprisse

sua obrigação de realmente manter em áreas de assentamento apenas clientes da

reforma agrária, tenho certeza — coloco meu mandato em jogo — de que isso

poderia ser aumentado para mais 20 mil famílias.

Ou seja, áreas desapropriadas foram ocupadas por pessoas que não eram

clientes da reforma agrária — ou, então, assentaram clientes da reforma agrária, e,

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posteriormente, as terras foram compradas por um fazendeiro vizinho, por um

comerciante ou por um farmacêutico.

Nesse sentido, parece-me que a questão das invasões hoje no sul do Estado

do Pará não se devem à deficiência de terras disponíveis para assentados, mas à

omissão do Estado no cumprimento da ordem judicial.

Também me parece que houve uma inversão da interpretação no que diz

respeito à propriedade, sendo que não se discute propriedade, mas, sim, posse.

Alguns juízes já estão procrastinando a liberação de liminar, pois querem ouvir do

INCRA se a terra é legítima, querem ouvir do IBAMA se está cumprindo... Enfim, não

se discute propriedade; discute-se posse. Estão procrastinando as liminares, o que

tem estimulado a invasão.

Então, temos o INCRA omisso — pelo menos foi o que ouvimos em Marabá.

Ouvimos depoimentos de gente do próprio INCRA que dizia que, na verdade, estava

sendo programada com a Polícia Federal uma ação para tirar das áreas de

assentamento quem não fosse cliente da reforma agrária.

Portanto, a discussão é hoje muito mais de ordem política. A luta lá é

ideológica. E assim foi recentemente o depoimento do MST na televisão, que disse

não iria deixar pedra sobre pedra, que não iria admitir nenhum latifúndio na

Amazônia. Isso foi dito no Jornal Nacional, para o Brasil inteiro.

Ouvimos, por exemplo, o Delegado Protógenes, protagonista daquelas

investigações, dizer que invadirem as terras de Daniel Dantas era uma obrigação,

estimulando descaradamente a invasão da propriedade. Vejam que não estou aqui

defendendo o Sr. Daniel Dantas, que não conheço. Estou defendendo o direito de

propriedade, porque, se invadirem a propriedade de Daniel Dantas, vão também

invadir as outras da região, região em que eu moro e na qual também sou produtor

rural. Estou defendendo o produtor rural.

Temos de ver a omissão do Estado ao não cumprir as ordens judiciais.

Quanto às ordens judiciais compradas, como as 12 ou 13 que o senhor aqui citou,

posso lhe dizer que tenho informações seguras de que 8 delas foram retomadas e

reinvadidas 2 dias depois — e, aí, a Polícia já não aparece mais. Mais do que isso:

roubo e matança de gado. Eu trouxe comigo, para deixar com o senhor, já como

contribuição desta Subcomissão, um CD com imagens de armas apreendidas.

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Mandei que se revelassem 12 fotos, com armas apreendidas e invasões, para que

se veja como têm sido feitas: só em 60 dias, mais de 300 reses foram abatidas, tal

como está aqui fotografado e documentado. Aqui temos um boi morrendo por tiro na

barriga; aqui temos o acampamento e aqui temos fotos dos carros. Notem que são

carros de luxo, carros novos, participando dos acampamentos. Com isso, vemos que

não se trata de coisa de sem-terra, mas de bandido mesmo, de profissional.

Os senhores sabem, como eu sei, afinal está disponibilizado na Internet, por

exemplo no site da Colômbia, que há mais de 600 documentos que vinculam o MST

à Colômbia — não sei por que, mas há. Motos, carros novos semi-novos,

caminhões, ônibus, enfim, é uma coisa bem organizada, e isso nos preocupa.

Por outro lado, houve, bem recentemente — a Polícia de Marabá deve ter

levado ao seu conhecimento —, um roubo de dinamites de uma empresa

fornecedora da Vale na região. Esse roubo foi detectado; é pessoal ligado ao MST.

A Polícia de Marabá tem essa informação. Há nos assentamentos Cabeceira e

Palmares I e II. A Polícia de lá também sabe onde isso está.

Pois bem, denúncias de Marabá: estão mobilizando pessoas do Maranhão,

inclusive em função das recentes enchentes havidas, dizendo-lhes que no Pará é

mais fácil, que vão para lá. Nós temos depoimento de um trabalhador em Xinguara

que disse que foi para lá atendendo ao chamado de um carro de som, que dizia que

aqueles que quisessem ganhar terra para trabalhar que fossem para o

acampamento, porque teriam cesta básica e terra imediatamente.

Ora, o que está acontecendo é que o INCRA está estimulando e financiando a

invasão. Antes de irem ao acampamento, Deputado Abelardo Lupion, já levam a

cesta básica e a lona preta. E, quando lá estão ocupando como invasores do ilícito,

também recebem cesta básica.

Uma informação que, faço a ressalva de que ainda vou confirmar, diz que

invasores de uma propriedade no Município de Bom Jesus do Tocantins, próximo a

Marabá — invasão de 1 anos apenas —, já estão recebendo financiamento do

Banco da Amazônia, financiamento do PRONAF, sem que a terra tenha sido

desapropriada e indenizada. Quer dizer, estão lá, com mandado de reintegração,

mas estão recebendo financiamento.

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Parece, então, que existe todo um esquema montado para facilitar a invasão.

Por isso digo que é uma invasão política e não invasão por falta de terra. Terra há,

segundo dados do INCRA. Tenho aqui documentos do INCRA e do Ministério do

Desenvolvimento Agrário sobre todo o Pará que mostram que há terra disponível

para assentar em torno 40 mil famílias, oficialmente. Extraoficialmente, se se fizer a

retirada de quem não é cliente da reforma agrária — esse, sim, tinha de ser punido

para valer — dar-se-ia oportunidade a quem realmente quer trabalhar.

E, aí, sou a favor da reforma agrária, e briguei muito para assentar gente na

minha região. Briguei e intermediei negociações com um grande proprietário de

áreas improdutivas que resistia, ajudei a assentar e quero continuar ajudando a

assentar gente, desde que gente que queira terra para trabalhar, que há muitos

especuladores no caminho dificultando as coisas.

Se queremos intermediar os conflitos... No Pará, os delegados dizem que não

podem intervir no roubo do gado porque a Governadora não deixa. Notem que sou

da base de apoio à Governadora — temos uma Secretaria no Governo do Estado —

e que aqui sou da base do Governo. Mas o que quero é a diminuição do conflito

agrário e justiça social na terra. Então, se não dissermos a nossos companheiros

que estão errados no procedimento... O INCRA não está errado? Não. O INCRA

merece ir para a cadeia. Na minha opinião, deveria ser aberto um processo-crime

contra o INCRA. Ele está estimulando, financiando invasões, além de ser cúmplice

por omissão, na medida em que, mesmo havendo terras disponíveis, não promove

assentamentos, ou permite que fique assentado quem não é cliente da reforma

agrária e, nesse caso, é cúmplice por omissão.

Portanto, Dr. Gercino, o senhor, que já está dentro do Ministério do

Desenvolvimento Agrário, ajudaria muito penalizando o INCRA por omissão, por

negligência, por conivência. Não sou advogado, não sei se isso é possível. Falo

apenas pela indignação de um Parlamentar que está vendo em sua região crescer

um clima de insegurança jurídica absoluta, e nos sentimos desprotegidos. Por isso,

esta conversa com o senhor. Esta Subcomissão foi criada com o objetivo de buscar

alternativas, ideias ou propostas que pudessem carrear no sentido...Eu sei, já

extrapolei, Presidente, mas só para concluir.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - V.Exa. cumpre o papel de

Relator agora e tem o tempo de que precisar.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Muito obrigado.

Por isso, Dr. Gercino, eu gostaria que viesse do senhor, além das propostas

— e eu acho que as coisas estão caminhando, são criadas as varas agrárias, o

Ministério Público Agrário Federal e Estadual; eu acho que tudo isso pode ajudar,

porque dá mais rapidez a julgamento de processo, de procedimentos que a reforma

agrária pode atender.

Eu até estou com os nomes das fazendas que foram evacuadas e invadidas

imediatamente. Trouxeram-me porque eu havia pedido e chegaram agora. Mas eu já

disse o que está ocorrendo na verdade.

Os delegados se negam às vezes a fazer boletins de ocorrência, alegando

que a Governadora está proibindo. Olha, Dr. Ilmar, eu estava dizendo, e eu propus,

Dr. Gercino, no sindicato de Redenção, e depois disse isso à Governadora, na casa

dela, na presença da bancada, que os produtores rurais, através de seus sindicatos,

deveriam se organizar no sentido de haver uma contribuição mensal, para ter um

dinheiro específico para contratar advogado, em tempo integral e com dedicação

exclusiva, para ter coragem de denunciar o delegado, o juiz que fica procrastinando

ações, denunciar o juiz que não pede intervenção, que não zela pelo cumprimento

da sua ordem judicial. Ele tem que ser denunciado à Corregedoria e depois ao

Conselho Nacional de Justiça. Tem que ter coragem para isso.

E mais do que isso, ter dinheiro para, quando uma propriedade for invadida,

no mesmo dia, já contactada uma empresa de segurança, legítima, toda organizada,

com pessoal inclusive no sentido de não matar ninguém, apenas assegurar, garantir

a propriedade; e tomar esse cuidado também para não haver morte de ninguém.

Mas, se o Estado não cumpre sua função, e cabe por direito e pela lei ao

proprietário o direito de defender sua propriedade, que o faça dessa forma. Então, já

havendo um dinheiro garantido para que, no caso de uma eventual invasão, no

mesmo dia retirá-los, porque assim diz a lei: dado o conhecimento, imediatamente

proteger a propriedade. E para evitar problemas maiores amanhã. Isso tem que ser

feito, porque a questão no sul do Pará, pelo menos, em particular, não é por falta de

terra — estou repetindo.

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Mas eu gostaria de ouvir do senhor o que mais poderíamos fazer no sentido

de que pudesse o INCRA, atuando, com certeza tirar quem realmente quer a terra

para trabalhar.

Com relação à posição ideológica de alguns que vão para o lado dos sem-

terra e que afirmam categoricamente que não querem ver tijolo sobre tijolo, no

sentido de não ver mais nenhum proprietário rural, com latifúndio, porque eles

entendem que é quem tem acima de 500 hectares. Essa é a filosofia do MST

atualmente na nossa região. Não é um embate pela terra. A questão é ideológica, e

se é ideológica cabe ao Governo intervir no sentido de evitar isso.

Aqui estão as armas usadas por eles, os carros, a forma de eles buscarem

mais pessoas, porque querem desarticular o direito de propriedade.

Eram essas as considerações. Dr. Ilmar, eu tenho certeza de que o senhor,

como Ministro, quando julgava a favor do Governo, era sempre no respeito à lei. Não

é verdade? Eu vi seus procedimentos, sempre defendendo que a reforma agrária

fosse algo, e é, necessário. Quando uma propriedade é improdutiva, que seja

retomada para distribuir a quem precisa da terra para trabalhar. Mas sempre no

respeito à lei, e sempre foi assim.

Dr. Gercino, o senhor, que é o nosso Ouvidor Agrário, tenho certeza de que o

senhor não o é para defender um lado só, mas para defender a sociedade naquilo

que lhe é de direito. É por isso que nós o respeitamos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Com a palavra o segundo

inscrito, Deputado Celso Maldaner.

O SR. DEPUTADO CELSO MALDANER - Quero parabenizar a Subcomissão

pela iniciativa. Eu não participo dela, apenas da Comissão da Agricultura, mas

agradeço pelos esclarecimentos que recebemos.

Eu quero perguntar sobre 3 casos específicos, só para citar o exemplo nosso

de Santa Catarina. Essa estrutura toda do Plano Nacional de Combate à Violência

no Campo, no meu entendimento, não tem competência para atuar nesses casos

específicos.

Estivemos nesta semana em audiência com o Ministro Tarso Genro, nos

Municípios de Cunha Porã e Saudades. Cento e setenta famílias de pequenos

agricultores compraram as terras de boa fé, que eram devolutas e foram passadas

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para o Estado, o qual passou para a Companhia Territorial Sul Brasil, que a

colonizou. São 170 pequenas famílias, cuja média dá 15 hectares. São pequenas.

Uma tem 10 vacas de leite, a outra tem 1 aviário, etc. É agricultura familiar.

Uma antropóloga, inclusive mãe da Desembargadora, disse que é área

indígena. Essas famílias compraram as terras em 1928. Há escritura datada daquele

ano. Há o cemitério onde o papai, a mamãe, o vovô foram enterrados. Aquilo não

tem valor para eles.

Saiu a Portaria da FUNAI, de nº 175, para fazer o levantamento das

benfeitorias. Eu entendo que é o último passo, para depois vender crédito e

desapropriar as benfeitorias.

Nós fomos ao Ministro implorar para que ele sustasse essa portaria. O

Ministro acha justo, mas diz que não pode fazê-lo. Só se o Ministério Público

permitisse. O Ministério Público é parcial nesse caso, ele defende só os índios. Por

isso que eu falei. Eu achei que o Ministério Público fosse imparcial. Inclusive, a

Desembargadora, em São Miguel do Oeste, defende o índio. Está na Constituição.

Então, o Ministério Público é a nossa dificuldade.

É uma injustiça muito grande que está sendo praticada nos Municípios de

Saudade e Cunha Porã, criando outro problema social, com 170 famílias. Nós fomos

pedir ao Ministro para suspender a portaria, para julgar o mérito. Eles estão brigando

na Justiça, isso vai parar no Supremo. O STF é quem decidirá se a área é indígena

ou dos pequenos agricultores, que a compraram em 1928. É uma questão

específica, um desespero nosso, que estamos na base do Governo.

Outro caso específico, em que parece que saiu a decisão ontem, sobre os

quilombolas, em Campos Novos e Abdon Batista. Há uma empresa em Maribo, que,

pelo amor de Deus, inviabilizará, fechará toda a plantação de pinus, de que se faz

celulose. Há concordância de poucas famílias, onde eles moram, o que dá uns 14 ou

15 hectares para cada família, mas estão reivindicando 20 mil hectares, o que

inviabiliza a empresa. É outro caso de desespero naquela região.

No terceiro caso, para dar o exemplo de cada um, é a Unidade de

Conservação Permanente, criada pelo Presidente da República. Dizem que ninguém

pode fazer nada a respeito, nem o Presidente mais. Só se o Congresso Nacional

mudasse a lei.

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Há o Sr. Alcides Tozzo, no Parque das Araucárias, em Passos Maia, com 12

mil hectares. Inclusive, pegou 1 milhão de araucárias que ele plantou e 9 milhões de

eucaliptos; duzentas e poucas famílias foram demitidas; fecharam as serrarias. E

sem indenização, sem nada. É uma tristeza. O homem chora e não sabe o que

fazer.

São casos específicos que, entendo, não entram na questão de conflitos

agrários. Essa é a insegurança jurídica grande que temos vivido em Santa Catarina.

É só isso. Muito obrigado, Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Com a palavra o

Deputado Waldemir Moka.

O SR. DEPUTADO WALDEMIR MOKA - Gostaria de saber do Dr. Gercino,

antes de falar, se a demarcação indígena não se insere na questão de conflito

agrário.

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - É inserida, sim, só que não está

dentro da minha atribuição. Nós não cuidamos das questões indígenas.

O SR. DEPUTADO WALDEMIR MOKA - Bom, o Deputado Giovanni Queiroz

já falou a respeito, mas há uma experiência em Mato Grosso do Sul. O senhor já

esteve lá. Houve o Governo do Zeca do PT por 8 anos e percebe-se nitidamente que

durante esse período era o retrato do Pará, porque ideologicamente há um

governador, e não estou querendo fazer juízo, e o PT durante a vida inteira

defendeu isso. Essa é ambiguidade do Governo. Eu me lembro da Deputada

Federal Ana Júlia Carepa aqui. É essa a questão: quando assume o Governo, não

tem autoridade para mandar. O Zeca, na época, afirmava mesmo que não era para

a Polícia Militar não devia ir lá e retirar. É uma postura. O Governador André

Puccinelli invadiu. Tem mandato judicial, a Polícia vai lá e retira com todo cuidado,

com preocupação para evitar ... Mas é uma questão de postura mesmo.

Quando se tem um governo ... Aí, é uma questão de postura ideológica. Acho

que não deve ser tratado desta forma. Aí começa ... Sai no outro dia, invade. Aí o

Poder Judiciário também começa a se sentir desautorizado, porque ele manda

cumprir, o Governo não cumpre, o Poder Judiciário diz que não adianta dar esse tipo

de decisão; o cara começa a se sentir desautorizado. Acho que o início desses

conflitos .... Por que hoje no Mato Grosso do Sul não temos ....? Reduziu

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enormemente esta questão, porque hoje há um Governador que não admite esse

tipo de ... Reage, manda retirar e não de forma truculenta, só olha. Claro que

embasado num mandato do Poder Judiciário. Mandou reintegrar a posse. Vamos

chegar num momento ... Começa-se a viver um clima de completa instabilidade

jurídica. Essa questão das demarcações ... Só vou citar para V.Exa. ... Levei... o

Ministro Tarso Genro tem esse documento ... temos uma região, em Miranda,

chamada região de Cachoeirinha, em que a FUNAI e os antropólogos que levantam

e julgam; é a coisa mais esquisita do mundo. Eles preparam a coisa e depois

decidem se é ou não. Quer dizer, é uma coisa ... Além do que a FUNAI é uma

fundação, é uma discussão se é privada ou pública. Enfim, a FUNAI foi criada para

defender o direito do índio. Quem é que defende o direito do produtor? Vou dar um

exemplo. Nessas terras, em Cachoeirinha, há uma propriedade de nome Fazenda

Vazante. Esse cidadão, Sr. Waldir, tem um documento ... o Ministro ficou me

olhando. Falei: Ministro, quero lhe mostrar um documento que data de 1905. O

documento mostra que essa propriedade era lindeira, fazia divisa com aldeia. Citava

as 2 aldeias, dava a dimensão das aldeias. Junto a isso, há a demarcação das

aldeias. Foram demarcadas por alguém, nada mais, nada menos do que o então

Major Cândido da Silva Rondon, engenheiro, que foi lá, demarcou as aldeias e essa

propriedade faz limite com essas aldeias. Se isso está demarcado desde 1905,

como é que essa propriedade pode ser colocada como terra de índio? Quer dizer,

essas coisas é que estão começando a ficar muito complicadas. É claro que o

proprietário que está lá, que tem este documento, não vai sair nem vai permitir mais

que antropólogos vão até lá fazer identificação. E aí é onde se instala a tensão. Por

quê? Com razão ... Pelo amor de Deus, tenho até documento de 1905, está aqui

minha propriedade, que faz limite com as aldeias. Como posso estar ocupando terra

de índio?

Acho que temos de em algum momento parar e analisar essas coisas todas,

porque senão vai ficar ... E está aqui. Não quem seja produtor rural, Parlamentar,

não tenha legitimidade, mas não sou. Sou médico e um simples professor, mas não

consigo entender aonde vai chegar isso e não tenho nenhum ranço ideológico; ao

contrário, tenho formação que vivi no movimento estudantil, não tem nada a ver, o

antigo MDB. Sou um dos fundadores do MDB do meu Estado. Não dá para

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admitirmos essa postura de querer, e tudo ... Essa história de quilombola é uma

aberração. Basta que alguém resolva lá que é, e acabou. Claro que há quilombola

que tem direito.

Eu digo sempre o seguinte, para encerrar, Dr. Gercino: se o Governo,

principalmente o Governo atual, do Presidente Lula, que respeitamos como um

grande Presidente, bem como o Partido dos Trabalhadores entendem — e eu

entendo da mesma forma — que a sociedade deve resgatar uma dívida histórica

com a população indígena, os afrodescendentes e negros — concordo com isso —,

esse resgate deve ser feito por toda a sociedade. Agora, o que não podem é querer

debitar esse resgate da população indígena e dos afrodescendentes por meio de um

único segmento, que é o produtor rural. Porque do jeito que está, no caso da

demarcação, de 1905, querem que seja expropriado o agricultor que tem 100 anos

lá, o qual já está na sua terceira geração, pagando-lhe tão somente as benfeitorias.

Não é justo isso.

Se querem fazer isso, vamos colocar dinheiro no orçamento, desapropriar,

mas pagar o valor das benfeitorias e o valor da terra. Aí, vamos fazer o resgate

social sem cometer uma injustiça com aqueles que, no caso do Mato Grosso do Sul,

foram para lá, e não são grileiros, são pioneiros, gente da melhor qualidade; homens

e mulheres que trabalharam a terra e que, inclusive, no caso do Mato Grosso do Sul,

fincaram a bandeira no limite da divisão territorial, isto é, guardaram este País.

Não consigo entender de outra forma. Não há por que ser contra; eu quero

também. Agora, é preciso ampliar? Vamos destinar o dinheiro e fazer isso com

justiça. Acho que aí iremos realmente....

A minha sugestão, Abelardo, é levarmos essa questão para o Orçamento.

Nesse caso, não cabe expropriação em demarcação de terra indígena. E, nesses

conflitos, deve haver uma postura dos governantes no sentido de que a reintegração

de posse tem que ser cumprida.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Deputado Lupion, queria uma

oportunidade para registrar ao microfone.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Pois não.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Passarei às mãos de V.Exa o

documento sobre a liberação de financiamento denunciada pela Polícia Federal de

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Marabá em 2008. Daqui a 2 dias, fará 1 ano a denúncia da liberação de uma área

invadida. Seis meses depois, começaram a liberar o financiamento. Do documento,

a que o senhor terá acesso, consta também o número de assentamentos e da

disponibilidade de áreas a serem assentadas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Gostaria até, Deputado

Giovanni Queiroz, com esses documentos, de que V.Exa pedisse à Assessoria

Jurídica da Comissão que entrasse com a denúncia de gestão temerária contra

quem liberou esse financiamento.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Perfeito.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Drs. Ilmar Galvão e

Gercino, quero agradecer aos 2, em nome da Comissão, a participação nesta

audiência e dizer que não sou o Presidente desta Comissão. O Presidente é o

Deputado Wandenkolk Gonçalves, que, infelizmente, em função de um

compromisso, pegou um avião de madrugada para resolver um problema sério de

saúde de um familiar; por isso, pediu-me que o representasse aqui, o que me dá

muita honra.

Ouvi atentamente, Ministro Ilmar Galvão S.Exa. falar de algo em que comecei

a pensar. V.Exa disse que não seria produtor rural no Brasil. Eu comecei a ver os

problemas que o produtor rural no Brasil tem, tudo feito por decreto — índios,

quilombolas, problemas ambientais, invasões, unidades de preservação,

obrigatoriedade de produzir por causa do nosso problema principal, o índice de

produtividade. Uma empresa pode fechar, nós não podemos. Nós temos que

produzir, senão perdemos o nosso instrumento de trabalho. Realmente é muito

difícil. O senhor tem toda a razão.

Eu gostaria de lhe fazer uma pergunta tão-somente — depois que eu fizer

perguntas ao Dr. Gercino —, para ser muito objetivo.

Nós sabemos que muitos desses movimentos ditos sociais, como o MST e a

Via Campesina, estão no site das FARC como seus braços no Brasil. Então, são

movimentos políticos — e não movimentos sociais —; são movimentos que pregam

a luta armada, são movimentos violentos, que usam a violência, como temos visto

até pela grande imprensa, que buscam desestabilizar o Estado de Direito. E, veja

bem, se escondem atrás do instrumento do anonimato. Nós não conseguimos

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processar o MST nem a Via Campesina, porque eles não existem: não têm CGC,

não têm CPF, não têm nada. Eles simplesmente não existem.

Eu gostaria de saber se existe alguma figura jurídica, algum tipo de ação que

podemos utilizar, porque nós temos dificuldade até em interdito proibitório. O senhor,

grande jurista, se hoje quiser estudar melhor também, poderia dar uma grande

contribuição à nossa Comissão, se sugerisse uma maneira de colocarmos para os

produtores rurais do Brasil inteiro como eles podem se defender do crime do

anonimato. Isso é um crime, o crime do anonimato.

O proprietário rural contrata segurança de uma empresa de segurança legal

— armas todas registradas — para se defender, porque o Estado não lhe dá a

defesa. E os marginais do MST e da Via Campesina entram na propriedade,

armados, como cansamos de ver, fazem sequestro pior que sequestro relâmpago,

matam os animais, destroem as propriedades, e nós não temos a quem processar.

Processar o Estado? Qual é a culpa do Estado além da omissão? Quer dizer, é o

cidadão quem vai pagar essa conta? Então, realmente, é uma coisa muito difícil.

Eu concordo com o Deputado Waldemir Moka quando disse que nós temos,

no Governo do Pará, uma pessoa ideologicamente comprometida. A Governadora

Ana Júlia não é só comprometida, mas também cúmplice. Nós estamos, inclusive,

buscando argumentos jurídicos para poder promover as ações necessárias, porque,

quando o Governo não dá guarida, não existe invasão.

Nós vimos aqui que o Pará tem sobra de terra. E dá-lhe fazer invasão! Então,

quando quer realmente tumultuar uma situação, a Governadora tumultua. Nós já

mandamos cartas, intimamos, fizemos e acontecemos. Esta Comissão fez de tudo

já. Agora, é óbvio que esta Comissão vai desaguar numa CPI — está na cara que

vai desaguar numa CPI — contra o MST, a Via Campesina, o INCRA e o Governo

do Pará, que estão deixando o Pará, um Estado modelo, dos mais viáveis do País,

com a maior população bovina do País — se não é a maior, é a segunda —, nessa

situação.

Então, eu gostaria que, se o senhor pudesse, depois que eu conversar com o

Dr. Gercino, nos passasse uma posição a esse respeito, bem objetivamente.

Dr. Gercino, o senhor é egresso de um Poder onde, sem ele, não existe

Estado de Direito. O mesmo papel que nós temos hoje perante a Câmara o senhor

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tem perante o Executivo. As nossas realidades são muito parecidas. Nós

precisamos da sua parceria. É muito importante a sua parceria.

Nós aqui, nesta Comissão, não queremos coibir, absolutamente, nenhuma

ação dentro da lei. Somos parceiros, inclusive, para fazer um relatório, a fim de que

possamos fazer a reforma agrária como deveria ser feita.

Nós queremos, efetivamente, que aquele cidadão que está assentado receba

o seu título de propriedade, o apoio das EMATERs, o seu financiamento, toda a

condição para que possa ter uma família produtiva, sustentar a família, colocar os

filhos na escola. Nada mais justo do que isso.

Esse é um trabalho com o qual todos nós somos compromissados. Não existe

nenhum Parlamentar na Casa que seja contra pegarmos uma área improdutiva e

transformá-la em produtiva e também uma pessoa que precise daquilo que tenha

experiência, vocação para aquela atividade, mas temos de dar condições.

O senhor sabe também, talvez mais do que eu, que a emancipação dos

nossos assentamentos no Brasil não existe. Por quê? Falta de apoio. Assenta-se,

deixa-se o cidadão largado à própria sorte, não se dão os instrumentos necessários,

às vezes se assenta num lugar ruim, às vezes não se dá a mínima condição de

financiamento, de nada, e o principal, que é a extensão rural. Sem extensão rural,

Dr. Gercino, nós sabemos que não vai acontecer nada.

Eu tenho uma propriedade rural no Paraná e sou vizinho de um Banco da

Terra, instrumento que nós aqui na Câmara criamos, em que uma comissão

municipal escolhia os vocacionados, ia lá, vendia a propriedade em 30 anos, para

que se pudesse pagar, e assentava as pessoas.

Eu gostaria que o senhor fosse lá ver o exemplo de um assentamento bem

feito, porque realmente as pessoas eram vocacionadas, a Prefeitura estava

compromissada, a EMATER teve que fazer o projeto e tem responsabilidade sobre o

assentamento. Então, vemos pessoas viáveis, em pequenas propriedades, de pouco

mais de 15 hectares, vivendo dentro da propriedade, com os filhos estudando.

Quando somos bem intencionados, fazemos as coisas. Agora, veja bem, tudo

o que nós vemos: armamento ilegal, manual de guerrilha, invasões, sequestros,

roubos. Eu soube agora que roubaram um trator de uma propriedade que estava

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levando as crianças para a escola. Tiraram as crianças de cima do trator e o

roubaram.

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Ah, não deixaram o

ônibus entrar na fazenda para pegar as crianças? O pessoal as levou então e,

levando-as, apreenderam o trator? Então, roubaram-no. Isso não é apreensão. Eles

não são autoridades policiais. Roubaram o trator.

É esse o País que queremos? É isso que nós, como representantes dos

Poderes... Aqui se tem a possibilidade de os 3 Poderes –– o Legislativo, o Executivo

e o Judiciário –– fazerem uma parceria. Nós estamos dispostos a isso. Agora, nós

não vamos conviver com ilícito. Vamos jogar muito pesado para que tudo isso

aconteça.

Dr. Gercino, o mais grave de tudo: o senhor sabe da luta que temos tido para

poder resolver os problemas da aftosa no Brasil, o que já se gastou nisso, o que

custou para o País pararmos de exportar, quando tivemos o problema da aftosa no

Mato Grosso do Sul.

Tenho visto a luta da bancada do Pará, principalmente o Deputado Giovanni

Queiroz e o Deputado Wandenkolk Gonçalves, para liberar o Estado do Pará,

conseguir fazer vacinação, a fim de deixar a área livre para exportar. São 12 anos de

luta diária. O que está acontecendo agora? Lá na Zona 1, que é livre de aftosa com

vacinação, estamos correndo o risco de sermos impedidos de exportar a carne. Com

isso, os frigoríficos vão fechar e haverá a falência do Estado, porque hoje a

economia do Pará é a pecuária.

Há um problema instalado. Os produtores que estão invadidos não podem

vacinar o gado, porque hoje o dono do Pará é o MST. Hoje, eles mandam e

desmandam no Pará. A Via Campesina e o MST dizem que, se podemos ir e vir, não

temos a possibilidade de fazer denúncia em nenhuma delegacia, porque são

proibidos os Delegados de aceitar denúncia — não podem fazer BO. Não se acha

um Delegado para fazer BO hoje. Vamos ficar sem fazer, nessas cento e poucas

fazendas invadidas — exceto com gado bovino e bubalino, nos quais não a faremos

— a vacinação. O que faremos? O senhor pode estar certo que no dia seguinte a

OIE veda a exportação do Estado do Pará. Acabou, não se exporta mais no Estado

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do Pará. A Organização Internacional de Epizootias (OIE) vai fazer isso

imediatamente. Por quê? Porque a não-vacinação é desrespeito às normas

internacionais da instituição, que vai proibir a exportação da carne do Estado do

Pará para a União Européia. E os frigoríficos imediatamente fecham, há o

desemprego e a quebra do Estado. Essa é responsabilidade do Executivo, que tem

de deixar que os proprietários tenham as suas propriedades limpas para poderem

manejar o seu gado.

Então, isso aí, Dr. Gercino, é uma coisa que gostaríamos de encarar como

uma missão. Vamos ter de fazê-lo. Se não o fizermos, o Executivo estará

cometendo um crime de lesa-pátria, porque infelizmente no dia seguinte as missões

da comunidade européia imediatamente pedirão às suas relatorias que declarem à

OIE que o Estado do Pará não vacinou todo o seu gado.

Dentro de toda essa história que estamos vendo, temos uma série de

perguntas. Como se trata da sua área, gostaria de encaminhar oficialmente ao

senhor, para que nos pudesse responder. Como são muitas, para se ter uma idéia,

são 23 questões. Vou-lhe encaminhar essas questões para que o senhor possa

fazer com que isso chegue às nossas mãos, para que possamos estabelecer o

relatório.

Concluindo, pediria então que o Ministro Ilmar Galvão já pudesse se

pronunciar, para encerrar a nossa sessão, e que depois o Dr. Gercino também se

pronuncie a respeito das indagações que foram feitas.

Tem a palavra o Dr. Ilmar Galvão.

O SR. MINISTRO ILMAR GALVÃO - A exposição feita pelo Deputado

Giovanni Queiroz, essa grave exposição sobre os fatos que acontecem

principalmente no Estado do Pará já é do conhecimento do País.

Acredito que o Dr. Gercino, Ouvidor Agrário Nacional, também tenha

conhecimento desses graves fatos. Não acredito que ele tenha tido, embora seja

munido da maior boa vontade, condição de resolver esses casos, muito menos de

até sugerir soluções que pudessem ser aceitas pelas pessoas envolvidas que têm

interesse político. Não é manifestamente interesse político.

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Aliás, eu deveria ter falado depois do Dr. Gercino, porque acabei me

estendendo bastante sobre outros aspectos do problema fundiário no Brasil, quando

devia me ater a esta questão das invasões.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - V.Exa. deu-nos uma aula

sobre o que não sabíamos. V.Exa. contribuiu demais, porque aprendi muita coisa

hoje.

O SR. MINISTRO ILMAR GALVÃO - Esse propósito de disseminar pelo País

várias agrárias — promotores agrários, etc. — é um projeto que envolve uma

despesa muito alta. Não acredito que seja possível.

Estamos atualmente com o Poder Judiciário completamente defasado no

Brasil.

Só para dar um exemplo, eu participei da instalação do STJ. Éramos 33

Ministros e tivemos no primeiro ano 17 mil recursos para julgar, que foi uma coisa

feita razoavelmente. Hoje o STJ recebe por ano 450 mil recursos, com os mesmos

33. Era um tribunal, que a exemplo do que acontece na Itália, na França, que

deveria ter hoje uns 200 Ministros, ou no mínimo 80, que foi o número de gabinetes

construídos, projetados. Aliás, eu era da comissão, e falei: “Vamos aumentar logo,

porque está na Constituição que é o mínimo de 33”. Mínimo quer dizer que já é uma

presunção de se poder aumentar até ... Então, fizemos 80 gabinetes. Nunca houve

possibilidade de ampliação do STJ, até por interesse dos próprios Ministros, alguns

alegam que seria uma maneira de vulgarizar.

O que quero dizer é que não acredito nessa disseminação de varas agrárias

por todo o País, onde há questões agrárias.

Antigamente havia muita grilagem no Brasil. Hoje não acredito mais. Os

cartórios hoje estão nas mãos de pessoas responsáveis, advogados... Não me

consta uma grilagem nos últimos 10, 15 anos. Antigamente havia muita grilagem na

Amazônia. Por quê? Porque a terra não valia nada. A pessoa precisava legalizar

perante o Banco da Amazônia para obter um financiamento. E, aí, engendrava uma

solução e, às vezes, muito justa, porque o decreto-lei de 1946 legitimava essa

iniciativa, porque dava direito de propriedade sobre as ocupações de mais de 30

anos — pacíficas.

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Fiscalizar cartório. O INCRA tem um grande instrumento para destruir tudo

isso, que é a chamada ação discriminatória. Não pode, manu militari, fazer isso. Não

pode, absolutamente. Estamos num Estado de Direito. Já disse uma vez ao Dr.

Gercino que ninguém pode ter seus direitos postergados sem o devido processo

legal. Há uma presunção de que, quem tem um registro, ele é legítimo. Não há como

dizer que esse registro é ilegítimo, a não ser o Poder Judiciário, uma sentença ...

Voltando às invasões — acabei não adentrando, porque entendi que já tinha

excedido no tempo, mas a invasão, no clima político atual do Brasil, é difícil de se

conter; a invasão já é tolerada pelas autoridades do poder administrativo e

começando a ser tolerada até pelo Poder Judiciário, que se vê sem condições de

dar sentença. Há 37 anos como Juiz e sempre entendi que um Juiz — o Gercino

também foi Juiz — não dá uma sentença para não ser cumprida. Juiz não sentencia

para que sua sentença não seja cumprida. Ora, eu sou Juiz, em Marabá, ou seja lá

onde for, sei que minha sentença para retirar as pessoas de uma invasão não vai

ser cumprida, eu não dou essa sentença e começo a tolerar.

Agora, com o clima atual, é difícil de conter isso, está organizado, é um

sistema. Pelo que li num livro recente de um jurista gaúcho, cujo nome me esqueço

agora, um professor da Faculdade de Filosofia no Rio Grande do Sul, o Prof. Denis,

julga-se que o sistema está organizado. O nosso Presidente acabou de expor que

está organizado, com cartilhas, com sistema de rádio, o INCRA dando apoio, dando

as barracas de lona para manter o indivíduo lá, distribuindo cesta básica, etc. Então,

hoje o clima está difícil.

Agora, no início disso, qual seria a solução? Ora, invadir propriedade é crime;

está no art. 202 do Código Penal. Qual seria a solução? Invadiu, autua-se, prende-

se. Então, se prendesse 1 ou 2 vezes, ele não mais invadiria propriedade. É claro

que há a reincidência criminal, mas é uma minoria, como sabemos. Mas isso era no

início. Como será agora? Quantas invasões no Pará! Foi mencionada aqui uma

quantidade imensa de invasões. Como se vai autuar criminalmente esse pessoal

todo hoje? É crime de invasão, art. 202, e é crime de quadrilha, porque são pessoas

que estão organizadas para invadir, para praticar o crime, quadrilha. E esse assunto

de matar o gado? Apropriação indébita, crime de dano, crime de apropriação

indébita. Se isso tivesse sido levado no início, não para as ações possessórias,

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ações civis, em que o Juiz não tem condição... como eu disse, sentença para não

ser cumprida. O Juiz dá a sentença. Eu sei de casos que foram citados aqui pelo

Deputado Giovanni Queiroz. É verdade. Eu sei disso tudo, entendeu? O Juiz deu, a

Polícia veio e tirou. No dia em que a Polícia se afastou, o pessoal voltou para dentro.

O que se pode fazer diante disso, dessas multidões? Só se o Governo... Vejam que

nem o assentamento resolve, porque lá em Marabá — acabamos de ouvir, eu não

sabia desse detalhe —, existem 473 projetos de assentamentos na região, nem

todos os lotes estão ocupados. Esse pessoal, se quisesse terra, teria terra. Não quer

terra. Invadiram, outro dia, a usina de Tucuruí, com o risco até de danificarem a

usina. Invadiram a Câmara dos Deputados, pelo menos o que ouvi, destruíram

inclusive computadores, etc., aqui, dentro da Câmara dos Deputados. Quem ouviu

dizer que houve inquérito? Quem ouviu dizer que houve um processo-crime

instaurado, a identificação?

Tem que haver uma prisão, mas quem vai realizar isso hoje com essas

multidões? Então, está aqui hoje o Dr. Gercino, com esse problema, que acho que é

um problema gravíssimo e com esses paliativos que são mencionados e, digamos

assim, sugeridos pelo Conselho Nacional de Justiça, que são coisas para o futuro. E

a situação atual, como se resolve? Qual é a dificuldade que há em se desapropriar

um imóvel improdutivo? Se não precisa nem de dinheiro, porque se deposita uma

quantia que o INCRA entende que é o justo, obtém-se a emissão de posse e já se

pode distribuir em lotes. A indenização do infeliz que foi desapropriado é que só vem

daqui a 20 anos, possivelmente para os filhos, quem sabe netos.

O problema é esse. Como vou pensar nisso? Só se houvesse uma atitude

enérgica do Governo: O Governo não tolerará mais invasão. Por que invasão? E

ainda tem há outra coisa. As invasões não são invasões de terras devolutas nem de

florestas nacionais, porque aí é do Governo Federal e eles não querem. A invasão é

de propriedades particulares, próximas a cidades; claro, porque ninguém vai querer

terra lá na Amazônia — na Amazônia e no Pará está certo porque é esse Estado

que acabou de ser definido aqui —, mas quem vai invadir terra no Acre? Para quê?

Só se for para criar tumulto, porque para ficar lá assentado não vai ficar. Só se

fossem sírios-libaneses, que são os estrangeiros que ocuparam este País na

Amazônia. Eu vivi lá muitos anos. Eles ocuparam até os limites das fronteiras. Eles

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foram e ficaram e permaneceram e hoje estão sendo desapropriados naquilo que

tinham.

De modo, Sr. Presidente, que eu vejo com muito pessimismo. Será que o

Supremo Tribunal Federal vai se encarregar, ele próprio, por um de seus Ministros,

de colocar esse pessoal para fora dessas invasões, como está fazendo com os

fazendeiros de Roraima? O próprio Supremo Tribunal Federal assumiu a gestão da

execução de retirar os fazendeiros sem indenização antes de serem indenizados,

porque a Constituição garante, está no § 6º do art. 231, ao possuidor de declarada

boa-fé pelo IBAMA. Eles tinham a posse de boa-fé declarada pelo IBAMA. São

postos para fora depois de instalar indústrias de arroz. Não é plantação de arroz, é

indústria de arroz, é plantar o arroz de maneira técnica, colher o arroz, industrializá-

lo, empacotá-lo e abastecer o mercado. Agora, Roraima vai ter arroz de Goiás

levado para lá, porque quem produz o arroz foi posto para fora na semana passada.

Eu pergunto: será que o Supremo Tribunal, julgando uma ação dessas... se o

Supremo se encarregasse disso, eu até acreditava que podia fazer valer a vontade

do Poder Judiciário. Se se encarregasse, como se encarregou de tirar os

fazendeiros de Roraima, de tirar esses invasores das terras, praticando ilícitos e,

depois, financiados pelo Governo. Basta saber disso, que estão financiados pelo

Governo para saber que é uma coisa impraticável nesse momento, principalmente

nesses meses que antecedem as eleições.

Não vejo como. Se me pedissem uma sugestão, qual é a medida? A medida é

essa. Em vez de ação de reintegração de posse, ação penal, inquérito por invasão,

inquérito por dano, quadrilha, apropriação indébita. Mas o Governo, outro dia,

mandou reunir o gado que estava numa área que o Governo diz que é federal —

mas para dizer que é federal tem que destruir o título judicialmente, por sentença, o

registro imobiliário dessa área —, ele arrecadou e até parece que leiloou o gado.

(Intervenção fora do microfone. Inaudível.)

O SR. MINISTRO ILMAR GALVÃO - Eu fui um Juiz que sempre julguei as

ações do INCRA, sempre julguei no STF e sustentei uma posição de que — não

adianta dizer os detalhes, porque ia tomar muito tempo —, a desapropriação tinha

que ser mantida. Sempre sustentei isso. E, no entanto, invasão, só quando a

propriedade estava invadida há 1 ano ou 2 é que eu dizia: agora não pode

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desapropriar por improdutiva porque uma propriedade invadida não é produtiva.

Depois que está invadida, como é que vai produzir? Quem é que vai para o banco

pegar dinheiro, assumir compromisso com o banco para investir numa propriedade

que está invadida? Quem? Eu dizia: essa aí não, essa que já está invadida, como

aconteceu no Paraná, essa não. Nessa desapropriação não acredito. Agora dizer

que invadiu e não desapropria. Invadiu, se for improdutiva, desapropria e distribui

para quem quer, porque ninguém quer. Como é que vai dizer que quer lote? A

experiência tem demonstrado que quem está nesse movimento não está interessado

realmente na terra, como eu ouvi aqui mais de uma vez.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - Obrigado, Ministro Ilmar

Galvão. Agora, para responder às nossas indagações, o Desembargador Gercino

com a palavra.

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Sr. Presidente, começando pelas

indagações do Deputado Giovanni Queiroz, a primeira refere-se à retomada de

terras públicas. Isso é uma verdade; existem realmente muitos lotes irregularmente

ocupados nos projetos de assentamento do INCRA no Brasil e principalmente no

Estado do Pará. Eu já fiz recomendações ao INCRA, mas, com base no que foi dito

aqui, vou reiterar as recomendações no sentido de agilizar esse procedimento de

retomada das áreas irregularmente ocupadas dentro dos projetos de assentamento

do INCRA. Sugiro mais uma vez, respeitosamente, que essa Subcomissão também

o faça, que recomende ao INCRA neste sentido. É muito importante, porque assim,

chegando lá uma recomendação da Câmara dos Deputados, o INCRA vai sentir a

necessidade de dotar as Superintendências Regionais do Pará, principalmente de

Marabá, onde existe mais esse problema de recursos humanos, mais recursos

financeiros para agilizar esse procedimento.

O problema da reocupação das áreas desocupadas. Essa é uma questão

complicada. Eu defendo a seguinte teoria, e isso tem funcionado na prática também:

não adianta cumprir os mandados de reintegração de posse sem a mediação. O que

ocorre é o seguinte: como os senhores disseram, a Polícia vai lá, retira o pessoal e

na medida em que a polícia vira as costas eles reocupam.

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Eu tenho defendido que uma vez proferida a liminar de reintegração de posse, que

se abra um processo de mediação coordenado pela Ouvidoria Agrária Nacional,

quando, nessa reunião, haverá a participação do INCRA, do proprietário, dos

coordenadores do movimento, da Polícia Militar, da Polícia Civil, de todos os órgãos

envolvidos. Aí, o INCRA vai demonstrar a esse trabalhador rural sem terra que

aquele imóvel não é passível de desapropriação. Esse imóvel é produtivo e não

pode ser desapropriado. Portanto, não adianta ser reocupado. Tem que haver esse

convencimento do trabalhador rural sem terra de que não adianta ocupar novamente

aquela área. A Polícia vai esclarecer a ele que, se reocupar, vai cometer algum tipo

de crime. A Ouvidoria Agrária Nacional vai entrar com os recursos materiais para

fazer essa desocupação.

Em alguns Estados, por exemplo, alguns juízes determinam que o proprietário

disponibilize os recursos materiais para fazer a desocupação. Contudo, havendo a

mediação, a Ouvidoria os disponibiliza. O que se disponibiliza? Os caminhões

necessários para fazer a mudança, as lonas para montagem de novo acampamento

— sei que os senhores são contra isso, mas, se não forem dadas essas condições,

vai haver a reocupação — e o fornecimento das cestas de alimentos também. Se

não forem dadas as cestas, diz-se: “Tá, aqui eu tinha uma roça. Eu vou para lá, não

vou ter nada que comer, eu vou reocupar!”

Além do mais, as cestas de alimentos constituem um programa do Ministério

do Desenvolvimento Social. Por uma simples questão de operacionalização, o

programa é coordenado pela Ouvidoria Agrária Nacional. O objetivo — os senhores

sabem disso melhor do que eu, o Presidente Lula tem dito isso constantemente — é

propiciar às pessoas pelo menos café, almoço e jantar. Independentemente de ser

ou não um preguiçoso, ou seja lá o que for, é um “barriga-vazia”.

No problema da reocupação — aproveito a presença do Dr. Rodrigo, se me

permitir —, entra a questão, por exemplo, dos imóveis da Empresa Agropecuária

Santa Bárbara.

Falo novamente, Dr. Rodrigo, aquilo que eu lhe disse naquela nossa reunião

em Marabá. Não adianta ao senhor aguardar que a Polícia Militar vá cumprir os

mandados judiciais de reintegração de posse. Ela vai cumpri-los de acordo com o

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plano estabelecido pela Secretaria de Segurança Pública, mas eles vão reocupar.

Eu já disse isso para o senhor. Eles me falam isso, estou repassando para o senhor.

A minha sugestão, mais uma vez, para resolver todos os casos do Grupo

Agropecuária Santa Bárbara, é que o senhor autorize o INCRA a fazer a vistoria,

para verificar se a área é produtiva e cumpre a função social, e haverá a garantia da

não reocupação desses imóveis. Isso nós asseguramos, pela Ouvidoria Agrária

Nacional. Se não forem produtivos e não cumprirem a função social, evidentemente

esses imóveis serão destinados ao Programa de Reforma Agrária, porque é um

comando emergente da Constituição Federal.

Portanto, mais uma vez sugiro, se o senhor quiser, que a Ouvidoria marque

uma reunião, inclusive com a participação da Subcomissão, para discutirmos o

cumprimento dos mandados de reintegração de posse de todos os imóveis do Grupo

Agropecuária Santa Bárbara, no Estado do Pará.

Quanto à matança de gado, esse fato é um absurdo, mas ocorre. Todas as

vezes que isso é trazido ao conhecimento da Ouvidoria Agrária, nós solicitamos

providências urgentes aos Delegados de Polícia Civil Agrários e cientificamos o

movimento social. O Dr. Rodrigo é sabedor disso, ele me trouxe ao conhecimento

denúncias de ilegalidades praticadas pelo MST, pela FETRAF, lá nas fazendas dos

Grupo Santa Bárbara. Eu cientifiquei todos os coordenadores dos movimentos

sociais dizendo que a Ouvidoria Agrária é favorável à mobilização do trabalhador

rural, desde que dentro da legalidade, e que aqueles que estiverem cometendo

ilegalidade, se seus nomes chegarem à Ouvidoria Agrária Nacional — e o Dr.

Rodrigo encarregou-se de fazer isso —, serão excluídos do Programa de Reforma

Agrária do Governo Federal, de acordo com o art. 2º, § 7º, da Lei nº 8.629/93. Então,

já cientifiquei o Coordenador do MST, da FETRAF e de um outro movimento lá, não

me lembro qual, nesse sentido. O senhor me comunicou e eu já os cientifiquei.

Quando terminar o inquérito, chegando para a Ouvidoria, vou remeter a

relação daquelas pessoas que cometeram ilegalidades, com a sugestão ao INCRA

de excluir esse pessoal do Programa de Reforma Agrária. E mandei cópia de todos

esses documentos para o Grupo Santa Bárbara, principalmente no que se refere a

essa história de matança de gado, que é um absurdo.

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Sobre as cestas de alimentos já falei. É um programa do Ministério do

Desenvolvimento Social que abrange os sem-terra, os índios, os quilombolas e toda

pessoa que esteja na condição de excluída da sociedade. Seja mau-caráter ou não,

se estiver passando fome, a intenção do programa é dar alimentação a ele.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Dr. Gercino, só para não perder o

momento, o senhor fala em dar cestas básicas para acampados, mas não para

invasores.

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Para invasores não.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Para invasores não! O nosso

caso é de invasores, os invasores estão recebendo.

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Perfeito.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ - Estão recebendo antes, para

invadir, e depois que invadem.

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Quanto à questão do PRONAF,

os senhores me entregaram o documento, que inclusive é do escritório de um amigo

meu, Antônio Garcia. Vou tomar providências. É claro que isso não pode ocorrer. Se

a pessoa está na situação de acampado, evidentemente não pode receber os

benefícios do PRONAF. Vou tomar providências no caso concreto que os senhores

me passaram.

Sobre a cientificação dos movimentos sociais, eu já falei. Aliás, eu faço isso

ordinariamente. Todo início de ano eu cientifico os coordenadores dos movimentos

sociais dizendo isto: mobilização pela reforma agrária tem que ser feita dentro da

legalidade, sob pena de ser excluído do Programa de Reforma Agrária.

A história de que os delegados não fazem nada, não o fazem os delegados

comuns, isso é verdade. Mas os delegados agrários fazem, e demonstro para os

senhores, na prática — vou voltar ao caso do Grupo Santa Bárbara —, que eles

fazem sim! Evidentemente, os delegados agrários, porque, se existe o delegado

agrário...

(Falha na gravação.)

... a atribuição é dele. Eu tenho aqui, por exemplo, o relatório atual da

Fazenda Espírito Santo no que se refere aos crimes ocorridos lá. Os Delegados

Agrários da Polícia Civil de Marabá e Redenção, os Delegados Alberoni e Luiz

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Galrão montaram escritório em Xinguara, onde estão colhendo depoimento das

pessoas envolvidas no conflito agrário na Fazenda Espírito Santo. “... no dia 18 de

abril de 2009, quando foram feridos sete trabalhadores rurais sem terra e um

vigilante, o que é muito importante, pois assim os responsáveis pelos delitos

praticados não ficarão impunes.” Eles montaram o escritório lá no local.

A segurança pública na área está sendo feita, também de acordo com as

informações prestadas por esses delegados. Inclusive houve deslocamento de

policiais da Força Nacional para o Estado do Pará para ajudar nessa...

(Falha na gravação.)

Houve uma reunião em Belém — infelizmente não pude participar dela —

para dar encaminhamento a essas questões da Fazenda Espírito Santo.

O cumprimento dos mandados judiciais de reintegração de posse, segundo a

Secretaria de Segurança Pública, será feito de acordo com uma tabela que ela fez.

Ela começou pela região de Castanhal e vai chegar à região de Marabá.

O conflito agrário dessa fazenda está sendo acompanhado pela Ouvidoria

Agrária Regional no local, que representa a Ouvidoria Agrária Nacional.

Já falei sobre a Força Nacional.

Existe essa história dos delegados. Existe inclusive uma ordem do Delegado-

Geral: delegado comum não atua na área agrária. Mas há também a ordem para os

delegados agrários atuarem imediatamente. E, se não houver, por favor,

comuniquem à Ouvidoria Agrária, que tomaremos as providências, como o Grupo

Santa Bárbara, aliás, está fazendo. O Dr. Leandro tem comunicado à Ouvidoria os

delitos, e tenho requisitado providências às autoridades competentes.

O Deputado Celso Maldaner falou sobre essas questões indígenas, mas

infelizmente sobre isso não vou dar sugestão, porque não é minha atribuição.

A questão dos quilombolas está no Supremo Tribunal Federal. O INCRA

parou a expedição. O Presidente da República não está assinando os decretos

declaratórios de interesse social para fim de assentamento quilombola enquanto não

houver a manifestação do Supremo. Se o Supremo disser que o decreto que

regulamenta as questões quilombolas é constitucional, então vai dar andamento. Se

o Supremo disser que não é, o INCRA vai então tomar as providências para fazer o

encaminhamento devidamente, de acordo com a lei.

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Essa foi a mesma preocupação do Deputado Waldemir Moka.

Dirijo-me ao Deputado Abelardo Lupion, no que se refere aos movimentos

sociais e FARC.

Deputado, já requisitei da Polícia Federal duas vezes informações a respeito.

Alguma pessoa reclamou na Ouvidoria Agrária que existe ligação entre movimentos

sociais rurais e FARC. Eu já requisitei duas vezes, e duas vezes a própria Polícia

Federal informou que não há essa ligação. Oficialmente, a Polícia Federal informou-

me que não existe essa ligação.

Essa questão da assistência técnica pela EMATER, que o senhor sugere,

acho fundamental. Acho que esse deve ser um dos encaminhamentos que deve sair

da Subcomissão, neste sentido: que a assistência técnica nos projetos de

assentamentos do INCRA seja feito pelas EMATERs. Isso é fundamental, porque

hoje a assistência é feita por empresa vinculada a determinado movimento social.

Para acabar com essa história de que essa empresa fica vinculada ideologicamente

ao movimento, é bom que seja feita mesmo pela EMATER. Sugiro, respeitosamente,

que os senhores façam orientação nesse sentido.

Por fim, no que se refere à manifestação do Ministro Ilmar Galvão quanto às

varas agrárias, no que se refere aos recursos financeiros, a Ouvidoria Agrária

Nacional tem recursos financeiros suficientes para ajudar os Tribunais, sejam os

Tribunais Federais, sejam os Tribunais de Justiça, na instalação e desenvolvimento

das varas agrárias.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Abelardo Lupion) - E quanto às vacinas?

O SR. GERCINO JOSÉ DA SILVA FILHO - Sim, quanto às vacinas, vou

assumir compromisso com os senhores.