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1 Documento 1/1 1306/14 Sessão 04/12/2014 PLENÁRIO PRINCIPAL - CD AP C/ CONVIDADO 10:15 Sumário Debate sobre a crise no fornecimento de água no Brasil. DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL Versão para registro histórico Não passível de alteração COMISSÃO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVELEVENTO: Audiência PúblicaREUNIÃO Nº: 1306/14DATA: 04/12/2014LOCAL: Plenário 8 das ComissõesINÍCIO: 10h15minTÉRMINO: 12h07minPÁGINAS: 40 DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO MARUSSIA WHATELY - Especialista em Gestão de Recursos Hídricos e Meio Ambiente do Instituto Socioambiental - ISA e representante da Aliança pela Água. JOAQUIM GUEDES CORRÊA GONDIM FILHO - Superintendente Nacional de Águas da Agência Nacional de Águas - ANA. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Diretor de Proteção Ambiental do IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis. MARIA LUISA RIBEIRO - Coordenadora do Programa Rede das Águas da SOS Mata Atlântica. SUMÁRIO Debate sobre a crise no fornecimento de água no Brasil. OBSERVAÇÕES

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Documento 1/1

1306/14 Sessão 04/12/2014 PLENÁRIO PRINCIPAL - CD AP C/ CONVIDADO 10:15

Sumário

Debate sobre a crise no fornecimento de água no Brasil.

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

Versão para registro histórico

Não passível de alteração

COMISSÃO DE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVELEVENTO: Audiência PúblicaREUNIÃO Nº: 1306/14DATA: 04/12/2014LOCAL: Plenário 8 das ComissõesINÍCIO: 10h15minTÉRMINO: 12h07minPÁGINAS: 40

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO

MARUSSIA WHATELY - Especialista em Gestão de Recursos Hídricos e Meio Ambiente do Instituto Socioambiental - ISA e representante da Aliança pela Água. JOAQUIM GUEDES CORRÊA GONDIM FILHO - Superintendente Nacional de Águas da Agência Nacional de Águas - ANA. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Diretor de Proteção Ambiental do IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis. MARIA LUISA RIBEIRO - Coordenadora do Programa Rede das Águas da SOS Mata Atlântica.

SUMÁRIO

Debate sobre a crise no fornecimento de água no Brasil.

OBSERVAÇÕES

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Houve exibição de imagens.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Bom dia a todos. Declaro aberta a presente reunião de audiência pública da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, destinada a debater a crise de água no Brasil. O requerimento para realização deste evento é de minha autoria.

Comunico a todos que o evento será transmitido ao vivo pela Internet e poderá ser gravado pela TV Câmara para ser exibido posteriormente na grade de programação da emissora.

Convido a ocupar a Mesa o Sr. Joaquim Guedes Corrêa Gondim Filho, Superintendente de Usos Múltiplos e Eventos Críticos da Agência Nacional de Águas - ANA; a Sra. Marussia Whately, Especialista em Gestão de Recursos Hídricos e Meio Ambiente do Instituto Socioambiental - ISA; o Sr. Luciano Evaristo, Diretor de Proteção Ambiental do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (IBAMA) e a Sra. Maria Luísa Ribeiro, Coordenadora do Programa Rede das Águas da SOS Mata Atlântica.

Agradeço a presença de todos. Peço desculpas pelo atraso, mas, como todos devem saber, ontem a nossa sessão plenária acabou às 4h30min da manhã. Então, realmente nós fomos muito prejudicados por essa votação extensa ocorrida no dia de ontem.

Esta audiência pública é muito importante. Acredito que a Câmara dos Deputados, na próxima Legislatura, vai se debruçar sobre esse tema da crise no Brasil com muito mais ênfase, mas nós não poderíamos nos omitir neste momento em que vemos que a maior metrópole do País está sofrendo com a falta d'água. E sabemos que essa crise em São Paulo tem motivos variados. Um deles, talvez o principal, são as mudanças climáticas; outro, a maneira como nós temos tratado o bioma Mata Atlântica, no qual a água que serve às metrópoles de toda a Região Sudeste é produzida. E também acredito que faltou, vamos dizer assim, adaptabilidade a essas mudanças na gestão desses recursos hídricos. Dessa forma, é importante discutirmos o tema.

Estamos no fim desta Legislatura, da qual, no que diz respeito ao meio ambiente, não podemos nos orgulhar, porque houve retrocesso na votação do Código Florestal e os poucos avanços ali alcançados ainda não foram implementados, como o Cadastro Ambiental Rural.

O Deputado Penna é um dos poucos, entre os presentes, que aguentou a maratona de ontem no plenário.

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Não vamos nos alongar. Nós vamos ter tempo. Eu sei que a Sra. Marussia tem compromisso. Então, vamos começar logo a ouvir as opiniões dos especialistas.

Com a palavra a Sra. Marussia Whately, que disporá de 15 minutos para fazer sua exposição.

A SRA. MARUSSIA WHATELY - Bom dia a todos! Obrigada pelo convite, Deputado Sarney Filho.

A minha apresentação está dividida em três partes. Vou mostrar um pouco o que é essa Aliança pela Água, que está se formando em São Paulo. Vou falar um pouquinho da situação da água no Brasil e da situação específica de São Paulo.

(Segue-se exibição de imagens.)

A Aliança pela Água foi lançada em 29 de outubro - faz mais ou menos 1 mês -, e atualmente já reúne cerca de 40 organizações, pegando desde grandes organizações ambientalistas até movimentos de defesa de consumidores e movimentos da sociedade de São Paulo em geral.

A Aliança tem três princípios norteadores: a água não é mercadoria, mas um bem essencial à vida e um direito humano; todos os governos têm responsabilidade sobre a água e estão a serviço da população; e obrigatoriamente precisamos recuperar e recompor as fontes de água existentes.

Temos duas metas. A primeira é construir um plano de contingência que permita São Paulo enfrentar o próximo período de estiagem, que tem sido uma das grandes preocupações de quem está acompanhando a situação: como os sistemas produtores de água de São Paulo estarão em abril do ano que vem? E, a longo prazo, implantar um novo modelo de gestão, baseado mais na gestão da demanda do que na gestão da oferta, que garanta um futuro seguro sustentável para a água na Região Metropolitana, sem com isso afetar outras regiões, como a região de Paraíba do Sul, por exemplo. São prioridades: construir um plano de contingência; reduzir o consumo em diferentes escalas; e cuidar das fontes de água.

Em relação à situação da água no Brasil, temos feito uma avaliação de três fatores que nos fazem sair daquela situação dita confortável, num país que tem 12% da água doce do planeta, para um país que já tem regiões em situação de altíssimo estresse hídrico: gestão com foco na oferta em obras, sem cuidar das fontes de água, como, por exemplo, essa situação que estamos vendo agora em São Paulo, eventos climáticos extremos e um déficit de chuvas que vem se acumulando em várias regiões; e falta de transparência e participação, principalmente com o enfraquecimento muito do sistema de gestão de recursos

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hídricos, nos últimos anos.

Atualmente, no Brasil, a irrigação responde por 72% do consumo da água. O segundo maior uso é para abastecimento animal; depois vem o abastecimento urbano; e depois o industrial. Todos esses usos apresentaram crescimento, menos o abastecimento rural, ao longo do período 2006-2010. Esses dados são da Agência Nacional de Águas, no documento Conjuntura Nacional de Recursos Hídricos de 2003, que mostra que o Brasil, assim como vários outros países do mundo, vem aumentando o consumo, e essa é uma tendência que precisa ser cada vez mais considerada no planejamento e na gestão da água.

Atualmente nós temos três principais fontes de degradação da água no Brasil. E aqui, ao lado direito, nós temos o conjunto de dados que mostram um pouco por que cada vez menos dá para falar que temos uma situação confortável em relação à água.

Então, hoje, as três principais fontes de degradação da água são: os esgotos industriais e urbanos; agrotóxicos e fertilizantes; desmatamento e degradação da vegetação. Cada uma dessas três, e às vezes até as três juntas, como é o caso de várias regiões onde existe maior estresse hídrico.

Alguns dados da situação da água: 55% dos Municípios brasileiros, segundo o Atlas Brasil - Abastecimento Urbano de Água, podem sofrer um déficit de abastecimento em 2015, só considerando a falta de estrutura, sem considerar a estiagem deste ano, ou seja, isso pode ficar numa situação muito mais grave; metade dos brasileiros é atendida com coletas de esgoto, daí não é tratamento; 40% da água em área urbana já apresenta uma qualidade ruim ou péssima; e 58% dos lagos e reservatórios já apresentam algum grau de eutrofização, 23% deles em grau elevado, o que mostra que não é só o esgoto urbano, mas nós já estamos sentindo, em boa parte do Brasil, grande poluição por conta de agrotóxicos, fertilizantes, desmatamento e assoreamento.

E mais um alerta: parte significativa da rede hídrica nacional ainda não conta com uma rede sistemática de monitoramento. Por exemplo: boa parte da Amazônia não tem monitoramento sistemático de qualidade da água. Então esse cenário pode ser um pouquinho pior do que está sendo apresentado aqui.

Este é um mapa produzido pelo Instituto Socioambiental, fazendo um cruzamento, ou seja, pegando as bacias de classe 3 no Brasil, de balanço de vegetação, considerando que a vegetação tem um papel fundamental no ciclo de produção de água. Daí dá até para começar a entender o estresse de algumas regiões do Brasil em relação à baixíssima quantidade de vegetação.

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Temos aqui, por exemplo, a Bacia do Alto Tietê, que tem menos de 10% de vegetação. Apesar disso, os Deputados, em São Paulo, estão querendo votar um projeto de lei de regulamentação do Código Florestal que diminui mais ainda a proteção, diminui as APPs, etc. Isso é impressionante, se consideramos o tamanho da crise hídrica. A Hidrovia Tietê-Paraná está paralisada desde maio. Não sei nem se já retomou. A segunda maior hidrovia do País está paralisada.

Aqui começam a surgir, apesar da falta de informação e de participação, movimentos muito interessantes de conscientização. Esse aqui se chama Árvore, Ser Tecnológico, é uma galera que está fazendo umas ilustrações, explicando de forma bem clara para as pessoas o que está acontecendo. Isto está fazendo cada vez mais sentido o quanto o desmatamento tem a ver com a diminuição das chuvas.

Aqui é um mapa, que saiu na revista Superinteressante deste mês, mostrando o déficit de chuvas no Brasil. É um mapa de setembro de 2014, mostrando que, além das situações naturais das bacias hidrográficas, dos desmatamentos e da degradação, há a questão climática. Esse mapa mostra também que o fato de começar a desmatar e degradar essas fontes de água tornam essas fontes de água mais vulneráveis a esses eventos.

Aqui são alguns highlights sobre os extremos climáticos que ocorreram recentemente no Brasil. Temos, por exemplo, as cheias no Rio Madeira, com todos os impactos e prejuízos que ocorreram; estimativas de bilhões de reais de perdas para o agronegócio em relação à estiagem no Centro-Sul, no Sudeste, no Mato Grosso; Hidrovia Tietê-Paraná, o Estado de São Paulo numa situação bastante estressante, do ponto de vista hídrico; o Nordeste, no seu terceiro ano de estiagem, com centenas de Municípios em situação de racionamento.

Esse é um mapa da ANA, que mostra um pouco esse estresse hídrico, onde há as situações mais complicadas no Brasil, misturando tanto a quantidade de água disponível, a qualidade em boa parte do Brasil. Não é que o nosso problema de falta de água vai se dar pela quantidade, em boa parte do Brasil, o problema de água vai se dar pela qualidade, Então, aqui, já temos isso em algumas dessas regiões. A situação atual que nós estamos vivendo desse período de estiagem que vem assolando boa parte do Brasil, já mostra para essas regiões uma situação bastante crítica. E aí não são só os sistemas de abastecimento de São Paulo. Quando olhamos os dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico, vemos a baixa capacidade de armazenamento das represas do Sul, do Sudeste, do Nordeste. Mesmo os Rios Paraíba do Sul e Jaguari, agora objeto de transposição desse acordo entre Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, constituem um sistema que está com 4% da sua capacidade. E aqui é um reforço

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desse modelo da gestão da oferta.

Está todo mundo preocupado. Precisamos fazer mais obras, para trazer mais água, mas não necessariamente vai ter água onde vão ser feitas essas obras, seja pela perda de qualidade e de condições ambientais, por exemplo, do desmatamento, etc, seja pela capacidade de diminuição de renovação do ciclo de produção de água nessas bacias. Então, não necessariamente só trabalhar na gestão da oferta, buscando mais obra e ampliar a quantidade de água, vai dar certo.

Em relação a São Paulo, temos visto o que está acontecendo. Em relação à gestão, é possível, cada vez mais, afirmar que nós estamos vivendo uma gestão temerária da crise, uma gestão que vem retirando água além do que deveria dos mananciais, que vem apresentando como soluções para resolver a crise atual obras que não ficarão prontas em menos de 2 anos, e um total descuido com a grande maioria das fontes de água.

Guarapiranga e Billings são represas poluídas, há anos, por esgotos, com várias ações, financiamentos e recursos que não deram nenhum resultado até agora. No próprio Tietê e em Pinheiros, temos um problema sério de qualidade de água. Apesar disso, as ações que estão sendo colocadas estão priorizando buscar novas fontes e não cuidar das fontes existentes. Os eventos climáticos extremos são déficit de chuva, falta de transparência, e, na nossa avaliação, as eleições, que intensificaram a crise, uma vez que elas adiaram medidas que poderiam ter sido adotadas ao longo do ano.

Aqui é uma foto da barragem do Sistema Cantareira, em 2010 e em 2013. Em 2010, ocorreu um problema no sistema, que ficou completamente lotado de água e acabou sendo obrigatório soltar uma quantidade de água; a jusante acaba tendo um alagamento de boa parte dos Municípios a jusante na barragem.

Aqui, temos a situação calamitosa das Represas de Jaguari e de Jacareí, que são essas aqui. Elas fazem parte do Sistema Cantareira e produzem em torno de 60% da água do sistema.

Esse é um mapa do uso do solo, feito com base nos dados do ISA, SOS Mata Atlântica e do Ipê, que começa a ajudar a explicar um pouquinho melhor que não é só um período de seca que fez o Sistema Cantareira chegar à situação em que está.

Imaginem que esse é um sistema que abastece metade da Região Metropolitana de São Paulo, a região de Piracicaba e de Campinas, e tem menos da metade dele com vegetação. Olhem a situação das bacias que abastecem, as formadoras do Jaguari e Jacareí. Então, isso ajuda a explicar a baixa capacidade desse sistema de resistir a um período de estiagem. Isso ajuda a explicar também por que está

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ficando tão difícil, neste momento, o sistema começar a encher, apesar de já ter sido usado o volume morto e tal. E está em curso a proposta de votação de um projeto de lei que ajuda a diminuir mais ainda a perspectiva de recuperação desse sistema que seria uma medida urgente, porque a floresta não vai recuperar de um dia para o outro, já que áreas com recuperação de nascentes e projetos nesse sentido efetivamente ajudam no ciclo de produção de água.

Essa é a Represa de Guarapiranga. Hoje, menos de 40% da região ainda tem vegetação. É uma bacia hidrográfica muito menor. Toda essa parte em roxo já é ocupação. O Rodoanel passa aqui em cima. Há 20% de ocupação urbana, 35% de áreas desmatadas, pastagens, mineração, rodoanel... Então, temos uma série de coisas aqui em cima. Guarapiranga é uma represa extremamente poluída. Ela ainda tem como sua principal fonte de poluição o despejo de esgotos. Parte desse esgoto está sendo despejado nas áreas sem rede e parte está sendo despejada pelas próprias redes de coleta de esgoto.

Temos aqui a evolução do Sistema Cantareira nos últimos 10 anos. Esses dados estão disponíveis no site da SABESP e mostram que, de 2010 a 2014, o sistema vem conseguindo se recompor muito pouco. Em julho de 2014, acaba o volume útil do sistema. Já há autorização da Agência Nacional de Águas para usar o volume morto. Isso é algo que nunca foi feito. O volume das Represas de Jaguari e Jacareí está abaixo do volume de captação. Em 12 de julho, acaba o volume útil, começa-se essa primeira cota. Em 14 de novembro, acabou essa primeira cota. Ou seja, o nosso primeiro cheque especial já acabou. Agora, precisamos do segundo. E, aqui, só olhando nessa perspectiva histórica, vemos quanto tempo vai demorar para recompor o Cantareira. Se olharmos o ano de 2003, quando o sistema chegou a 1%, demorou mais ou menos 5 anos para chegar ao nível de 80%. Então, a gente pode estar falando de um longo período de estiagem.

Aqui é um cenário de quanto duraria a água que ainda está disponível nos reservatórios; é um cenário em relação ao que se tem. Se não chover, pode-se ter algo em torno de 100 dias de água, o que traz uma situação de alerta. E aí, vai acabar a água em São Paulo? Faz o que com as pessoas que moram lá?

A Zona Leste é a região abastecida pelo Alto Tietê, que é um sistema bem menor que o Sistema Cantareira. Realmente, já tivemos outubro e novembro sem chuva. E, se esse quadro continuar se configurando dessa forma, quem trabalha na área, com o Sistema Alto Tietê, não saberá o que fazer. O sistema abastece toda a Zona Leste de São Paulo; mais de 4 milhões e meio de pessoas dependem desse sistema.

Temos aqui um cenário feito pela Folha de S.Paulo mostrando as perspectivas de esgotamento. E as medidas para evitar esses esgotamentos têm sido: Vou aumentar o bônus, então, eu vou diminuir

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o preço da água, quando ela vale muito. Não temos multas, não temos ações significativas de redução de consumo de grandes consumidores. Provavelmente, a situação beira a uma crise muito intensa para 2015.

Aqui são as obras apresentadas numa audiência de CPI na Câmara de Vereadores de São Paulo, da qual participou a SABESP. As imagens ilustram que boa parte das obras previstas não ficará pronta nesse período de crise, ou seja, até abril de 2015, quando supostamente nós temos o nosso período chuvoso. Apesar de nesses 2 meses não ter chovido, não há nada muito significativo de aumento da oferta. Então, nós vamos ter que diminuir o consumo. E nisso não vem sendo apresentado nada significativo. E mais: alguns indicadores trazem um alerta muito grande para essa situação.

Em novembro, foi lançado um estudo pelo CPDEC com o Núcleo de Economia Industrial e Tecnologia da UNICAMP, que mostra que 95% das indústrias, empresas, hospitais e hotéis de São Paulo não têm um plano de contingência e que boa parte deles depende da água das concessionárias. E, aqueles que têm um plano de contingência, a saída deles é ligar para um caminhão-pipa.

Então, isso aqui traz algumas questões: se o pior cenário climático aconteceu, ou seja, se o verão deste ano for parecido com o verão do ano passado, a água dessas represas acabará no primeiro semestre, e não haverá alternativas. Estamos falando de um lugar que abastece 19 milhões de pessoas. Se as chuvas forem dentro da média - e há estimativas de que durariam mais tempo -, é possível que fique numa situação pior do que estava em março do ano passado. Isso quer dizer que, no mínimo, a mesma tensão, o mesmo estresse, o uso do volume morto e tudo que aconteceu este ano pode se repetir. Não sei como são os estudos de impacto ambiental do volume morto, mas eu não sei se está estimado no cenário: e se eu usar 2 anos seguidos, o que acontece?

As obras apresentadas não ficarão prontas antes do final de 2015 e não resolvem a crise em curto prazo. A população e os setores econômicos não estão preparados para uma eventual falta de água. E o que temos defendido é um plano de contingência urgente, que principalmente comece a tratar algumas questões.

Qual o nível seguro? O Sistema Cantareira tem de chegar a que porcentagem em abril de 2014? E a Represa de Guarapiranga? E o Alto Tietê? O que precisa ser feito para chegar até lá, se chover ou se não chover? Esses cenários precisam ser discutidos.

Outra questão, cuja discussão se faz urgente: qual a vazão outorgada para caminhão-pipa na Região Metropolitana de São Paulo? Se todas as indústrias e todas as pessoas também, provavelmente, tiverem como alternativa o caminhão-pipa, quem terá prioridade? O hospital, a

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escola, a indústria? Quanto deve ter de volume outorgado no Estado inteiro de caminhões-pipa? Imaginem a fila de caminhões-pipa chegando simultaneamente em São Paulo.

É preciso ser feito não só um plano de contingência da SABESP. E lembramos aqui da gestão compartilhada de recursos hídricos. Os Municípios têm a concessão dos serviços. O Governo do Estado é o maior acionista da SABESP. A ANA e o Ministério do Meio Ambiente são os coordenadores do Plano Nacional de Gestão de Recursos Hídricos. A ANA, junto com o DAEE, opera as outorgas. Essas são algumas questões provocativas que nos levam à reflexão.

Na hora em que vi os estudos dos setores, eu pensei: gente, se todo mundo começar a usar caminhão-pipa, vai ser quem pagar mais que vai ter direito?

Então, acho que há uma série de questões um pouco provocativas aqui, e eu encerro a minha fala com elas.

Obrigada. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Obrigado.

Quero aproveitar a oportunidade para esclarecer que nós convidamos, evidentemente, representantes do Governo de São Paulo.

O Secretário de Saneamento e Recursos Hídricos justificou a impossibilidade de comparecer a essa audiência. No entanto, não mandou nenhum representante.

E, de certa maneira, a nossa audiência fica um pouco prejudicada sem o contraditório. As causas são tão evidentes, mas, seguramente, nós vamos fazer outras reuniões. A discussão está apenas começando. Eu, pelo menos, que me reelegi, vou continuar nessa luta. Um compromisso meu para 2015 é começar o ano legislativo já fazendo audiências públicas, talvez um seminário, uma Comissão Geral da Câmara, alguma coisa a respeito desse problema, que é gravíssimo, gravíssimo!

Bem, ouviremos mais expositores, seguindo a ordem.

Concedo a palavra ao Sr. Joaquim Guedes Corrêa Gondim Filho, Superintendente de Usos Múltiplos e Eventos Críticos da Agência Nacional de Águas, que disporá de 15 minutos.

O SR. JOAQUIM GUEDES CORRÊA GONDIM FILHO - Bom dia a todos. Queria agradecer ao Deputado Sarney Filho o convite.

A Agência Nacional de Águas tem participado de todos os fóruns a que

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foi convidada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - É verdade.

O SR. JOAQUIM GUEDES CORRÊA GONDIM FILHO - É importante ressaltar isso, no sentido de garantir a discussão e a transparência de um assunto tão relevante, como a questão da crise da água no Brasil.

O primeiro ponto que gostaria de tratar é que, conforme previsto na legislação específica - a Lei das Águas, Lei nº 9.433, de 1997 -, a gestão dos recursos hídricos deve sempre proporcionar os usos múltiplos da água. Este é o tom principal da nossa legislação. Entretanto, a nossa legislação também estabelece que, em situações de escassez, o uso prioritário passa a ser o abastecimento humano e a dessedentação de animais. Isso é fundamental em nossa legislação. Então, em situação normal, todos os usos têm a mesma prioridade, mas em situação de escassez, passa a ter prioridade o abastecimento humano e a dessedentação de animais.

Todos sabemos da necessidade de encontrarmos o equilíbrio entre a oferta e a demanda. A oferta varia no tempo, mas em situações normais tende a decrescer, porque simplesmente aliada à questão de quantidade, ocorre perda de qualidade. Mesmo se o mundo não tivesse variabilidade, mudanças de clima - esse tipo de coisa que vem acontecendo -, teríamos um problema. Qual é o problema? Parte dos nossos rios vai perdendo a qualidade, de maneira que você fica impossibilitado de contar com aquela quantidade de água. E as cidades, cada dia mais, têm mais necessidades e procuram fontes de abastecimento mais distantes de sua localização. Na atual crise de São Paulo, ao analisar as fotos, vê-se as águas do Tietê, do Pinheiros e de outros rios passando e, efetivamente, não podendo ser utilizadas. Algo essencial é que a oferta é mantida em termos quantitativos, mas em termos de utilização é perdida uma parte dela, o que agrava o balanço.

Pelo lado da demanda, ocorre no dia a dia o crescimento das cidades e o crescimento das indústrias. Então, o balanço oferta e demanda é simplesmente negativo ao longo do tempo. Considera-se, então, demanda crescendo e oferta diminuindo.

Tradicionalmente, como as entidades que administram os sistemas de abastecimento tentam resolver o problema? Tentam resolvê-lo pelo aumento da oferta. Aumenta a demanda e as entidades ficam sempre procurando novas fontes de aumentar a oferta, mas isso tem limitações.

Modernamente, a grande questão que se coloca é que, antes mesmo de se procurar novas fontes e de aumentar a oferta, tem-se que atuar na gestão da demanda, no controle de perdas e em outras ações mais fáceis e mais baratas para resolver o problema das cidades.

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No lado da oferta, antes de construir as grandes obras de infraestrutura, você tem que preservar, também, as suas condições de oferta. Por exemplo: você tem que preservar as nascentes - e neste ano nós tivemos o caso simbólico da nascente do Rio São Francisco, que secou - fazendo a recomposição de matas ciliares e executando todas as ações que levem à garantia da mesma oferta.

Nessa linha de discussão, a Agência Nacional de Águas entende que é preciso ter, no âmbito do País, um Plano Nacional de Segurança Hídrica. No setor elétrico, que é talvez o nosso setor mais organizado em termos de planejamento futuro, pode-se saber o que tem de ser feito daqui a 5 anos, daqui a 10 anos. Então, o setor macro que controla os recursos hídricos, que envolvem todos esses usos, também tem que contar com esse planejamento.

De certa maneira, a Agência já começou a fazer isso com o Atlas Brasil - Abastecimento Urbano de Água, olhando a questão do abastecimento de água das cidades. E o fez indicando a todos os Municípios brasileiros como é que se daria a sequência de crise no seu abastecimento.

Agora, nós temos que ver as questões de forma mais ampla, incorporando outros elementos. O nosso País é continental. Isso significa que, a todo o momento, nós estamos enfrentando situações extremas em alguma parte do nosso território. Neste ano, tivemos as maiores cheias históricas registradas na região do Madeira. Ao mesmo tempo, nas Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste estamos passando pela maior seca. É importante falar que nós ainda estamos passando pela maior seca, que esta seca não acabou. A seca começa e tem um desenvolvimento, mas não sabemos quando vai terminar. Esse é o ponto principal.

A política da Agência e as suas recomendações às cidades que estão passando por problemas hídricos é a de que elas têm necessariamente que se adequar a essa situação. De que maneira? Primeiro, fazendo projeções realistas da oferta futura de água. O que isso significa? Se no seu planejamento de ações você considera que vai chover, na média, como em tal ano, e isso não se verifica, estará contando com uma água que não vai chegar. Isso agrava a crise, porque você pode começar a utilizar por conta de uma água que não vai chegar.

Em segundo lugar, nós advogamos que você tem que ter uma meta para o final do período chuvoso e adequar a sua demanda, para o atingimento dessa meta. Consideramos, de maneira geral, que a meta mínima seria a condição que o sistema estava, por exemplo, em 1º de maio de 2014. Por quê? Porque nós iríamos enfrentar a crise, mas nas condições e com todos os efeitos que já a enfrentamos.

A Agência tem participado de reuniões técnicas. Em São Paulo, por

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exemplo, a ANA detém a dominialidade de dois mananciais, o Jaguari e o Cachoeira. As intervenções e o uso de volume morto estão sendo feitos nos reservatórios de domínio do Estado, para o que não é preciso autorização da Agência. É importante frisar que os reservatórios foram construídos e estão em rios de domínio do Estado.

A Agência não se tem furtado a discutir e propor medidas para o equacionamento dessa demanda, mas é importante que se diga que outras regiões do Brasil também estão enfrentando situações críticas, como o Vale do Paraíba do Sul.

O Rio Paraíba do Sul é essencial para o abastecimento de 8,5 milhões de pessoas na região do Rio de Janeiro. Os reservatórios do Rio Paraíba do Sul também estão com nível muito baixo. Hoje estão com menos de 4%, ontem estavam com 3,8%.

Lá, a Agência vem fazendo a articulação com três Estados - Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro -, com participação ativa dos Comitês das Bacias do Paraíba do Sul e do Guandu. Lá, baixou-se a vazão mínima a ser mantida nos rios de 190 metros cúbicos por segundo para 160 metros cúbicos por segundo. A redução foi significativa, para equilibrar a oferta e a demanda. Tentou-se, já no primeiro momento, fazer isso. Está em desenvolvimento pela Agência, em comum acordo com os Estados, um plano de ações complementares, que visam adequar ainda mais a demanda à atual situação de oferta.

Temos outras regiões no País também em situação difícil. A Bacia do São Francisco tem como exemplo o seu primeiro reservatório, o reservatório de Três Marias, que está com um nível muito baixo de armazenamento. Só para se ter ideia de números, a vazão mínima até então praticada no reservatório de Três Marias era da ordem de 350 metros cúbicos por segundo. Hoje, para adequar a oferta à demanda, a vazão liberada é de 120 metros cúbicos por segundo. O mínimo caiu de 350 metros cúbicos para 120 metros cúbicos por segundo.

Também na região do São Francisco, a vazão mínima em Sobradinho, que antes era de 1.300 metros cúbicos por segundo, passou a ser de 1.100 metros cúbicos por segundo, de maneira a equilibrar este atual momento de escassez com a geração de energia e a questão dos usos múltiplos para abastecimento das cidades e de suas casas.

De maneira geral, o País precisa ter a consciência de que nós estamos enfrentando no Nordeste o terceiro ano consecutivo de seca. Há institutos de meteorologia que ainda preveem a possibilidade de termos o fenômeno El Niño, com baixa intensidade, mas ainda presente.

Dessa maneira, nós temos que nos acautelar, porque o abastecimento de água para o homem é diferente, por exemplo, do abastecimento

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para o setor de energia elétrica.

Ao olharmos para esta lâmpada, verificaremos que nenhum de nós sabe a origem da geração da energia que a alimenta, que pode vir de Itaipu, de Sobradinho ou de outra usina. Isso faz com que o sistema de abastecimento de água para o setor de energia tenha uma lógica diferente e uma proteção diferente. O sistema de abastecimento de água para consumo humano não tem essas possibilidades. A água disponível está no entorno daquele sistema e não há facilidade para a transferência de águas, como se faz com a transferência de energia por fios. Portanto, a água é olhada numa perspectiva diferente: tem que ser vista no longo prazo, porque a falta de água provoca efeitos na economia e na saúde pública, entre outros setores.

Assim, nesse elenco de coisas, colocamos como ponto fundamental a discussão do Plano Nacional de Segurança Hídrica, que está em elaboração pela Agência Nacional de Águas e pelo Ministério da Integração Nacional, no sentido de prover perspectivas bem claras sobre o que fazer, como fazer e em que tempo fazer. A Agência se dispõe a discutir o plano, quando aqui for chamada.

O plano já está contratado e já está em curso. Nós estamos visitando todos os Estados para a sua elaboração com visão múltipla e a seis mãos: as do Governo Federal, as do Estado e as da sociedade civil organizada, através de seus comitês.

Muito obrigado. (Palmas.)

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Passamos agora a palavra ao Sr. Luciano de Meneses Evaristo, Diretor de Proteção Ambiental do IBAMA, por 15 minutos.

O SR. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Bom dia a todos. Sr. Presidente, obrigado pelo convite. É um prazer para o IBAMA estar aqui, participando desta audiência pública, e uma grande oportunidade para colocar a Comissão de Meio Ambiente da Câmara a par das ações que estamos desenvolvendo no combate ao desmatamento.

Entendemos, Sr. Presidente, a importância do controle do desmatamento na questão da crise da água. O IBAMA tem plena consciência disso, e temos envidado todos os esforços no sentido de tentar melhorar a situação do desmatamento na Amazônia brasileira. A coisa não é simples, e nós vamos colocar aqui diversos argumentos em que a Comissão de Meio Ambiente da Câmara pode nos ajudar, pode ajudar o País a reverter esse quadro de desmatamento e mitigar a crise da água.

(Segue-se exibição de imagens.)

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Como os senhores bem sabem, o combate ao desmatamento levado a efeito pelo IBAMA está dentro do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal, que envolve 14 Ministérios e tem três eixos: regularização fundiária, que anda a passo de tartaruga; fomento a alternativas sustentáveis, que tem andado mais ou menos; e o grande eixo, comando e controle - monitoramento e fiscalização ambiental -, onde o IBAMA se situa e faz o combate direto no campo.

O DETER e o PRODES são os dois sistemas de monitoramento vigentes.

Ressalto, Sr. Presidente, que o Governo brasileiro possui o sistema de monitoramento de floresta tropical mais avançado de todo o planeta, conduzido pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.

O DETER utiliza um sistema satélite de baixa resolução (250 metros) e roda todo dia. Todos os dias em que roda, ele produz alertas de desmatamento para o IBAMA.

Muita gente fica confusa sobre o assunto, e hoje eu quero esclarecer a esta Comissão que o DETER não mede desmatamento. São emitidos alertas! O DETER olha ao longo de 250 metros e sinaliza: Há uma possível alteração da cobertura vegetal nesta coordenada geográfica. IBAMA, vá lá ver o que é. Isso é o DETER. Ele não tem nenhuma condição de medir desmatamento, não tem resolução suficiente e não consegue diferir o que é corte raso do que é degradação, do que é cicatriz de fogo. Portanto, ele não serve para medir o desmatamento.

Ao contrário do DETER, o PRODES tem periodicidade anual, e é o que foi divulgado recentemente. Através do uso de imagem de alta resolução do satélite Landsat 8, o INPE apura o desmatamento da Amazônia no período de agosto de um ano a julho do outro ano. Agora, nós tivemos o resultado dessa medição. Toda vez que falarem em desmatamento medido pelo DETER, na verdade é alerta de desmatamento. Toda vez que falarem em desmatamento medido pelo PRODES, é taxa de desmatamento efetivo.

Recebendo os dados do monitoramento, nós montamos um gráfico de concentração do desmatamento, o mapa de kernel, porque não temos a presunção, Sr. Presidente, de querer fiscalizar 5 milhões de quilômetros quadrados na Amazônia brasileira, o que nem o Exército americano conseguiria.

Então, nós temos as áreas quentes e as áreas mais frias. Nas áreas quentes, nós vamos colocar a fiscalização do IBAMA. Chegando lá, nós emitimos o Documento Indicativo para a Fiscalização e Controle do Desflorestamento para o fiscal. Ele recebe isso e vai para o campo, onde apenas confere os polígonos daquele desmatamento. Assim, ele

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vai ter um trabalho muito mais qualificado para fazer o auto de infração.

Após todo o planejamento e a definição das áreas quentes, o IBAMA faz o Plano Nacional Anual de Proteção Ambiental. Inclusive, amanhã estaremos abrindo a versão de 2015. Neste plano, todas as ações que nós vamos fazer no ano seguinte são planejadas, incluindo-se recursos humanos, orçamento, aeronaves, viaturas, enfim, o que será necessário para fazer o combate.

Eu ouvi alguns comentaristas da CBN falando que o IBAMA tem um bando de heróis que trabalha sem condições na Amazônia. Isso é uma inverdade, pois tudo começa com o planejamento.

Com esse trabalho que vimos fazendo na Amazônia brasileira, obtivemos a segunda taxa abaixo de 5 mil quilômetros quadrados de desmatamento, fechada de agosto do ano passado a julho deste ano: 4.848 quilômetros quadrados. É uma grande vitória em função dos esforços que a gente vem fazendo.

Trabalhamos também no sentido de alcançar a meta do Plano Nacional sobre Mudança do Clima, ou seja, a redução do desmatamento em 80% até 2020. Já estamos bem perto da marca, faltando 5% para completar a meta.

Temos aqui o gráfico de distribuição anual do PRODES, mostrando que nunca o desmatamento da Amazônia foi tão baixo. Vejam a queda aqui - houve um pequeno repique em 2013, mas voltou ao leito em 2014.

Desmatamento PRODES por Competência: aqui nós começamos a desafiar esta Comissão, Sr. Presidente.

A Lei Complementar nº 140 diz que, quem licencia, fiscaliza em prioridade 1. Então, nós temos aqui, por competência primária de fiscalização, o desmatamento medido no PRODES passado: 86% em terras de competência do Estado e 14%, da União.

O desmatamento em áreas de responsabilidade da União se deu: 11% em terras arrecadadas, 2% em unidades de conservação de uso sustentável, praticamente zero nas proteção integral e 1% em terras indígenas.

Aqui fizemos um recorte da região da BR-163 - que a gente chama de terra sem lei -, onde o desmatamento está na mão do crime organizado e não mais daquele que quer abrir uma área para colocar a sua cultura. O desmatamento detectado pelo DETER e pelo PRODES representou 20% de todas as detecções na Amazônia Legal brasileira e 63% de todas do Pará. Representou também 10% do detectado pelo PRODES em 2009; 3%, em 2010; 4%, em 2011; 7%, em 2012; 10%, em 2013 e

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20% agora, em 2014.

Isto aqui é o estilo de desmate do crime organizado. Eu ouvi um comentarista dizer que a fiscalização do IBAMA é rarefeita. O rarefeito está aqui! O diretor do IBAMA está lá, no campo, conferindo a nova técnica de desmatamento utilizada pelo crime organizado. É a chamada técnica multiponto. Eles colocam, na área que pretendem desmatar, 10, 20 acampamentos com 10 pessoas cada um: uma cozinha, outra faz a manutenção das motosserras e as abastece, e oito, com uma motosserra cada, desmatam 1 alqueire por dia, em dezenas de pontos espalhados.

O senhor sabe quando o DETER vai identificar esse desmatamento? Quando ele identificar será tarde!

Aqui as motosserras apreendidas e aqui outros acampamentos.

Nessa operação em que eu estive, em uma semana nós tiramos 11 acampamentos de dentro da floresta, com a parceria dos índios caiapós, que nos levaram a esses 11 acampamentos, visto que o DETER não estava enxergando coisíssima nenhuma, em abril deste ano. Destruímos os equipamentos graças à parceria com os índios para a localização dos desmatadores ilegais.

Aqui um exemplo do desmatamento multiponto, Excelência. São pequenos desmatamentos. Esta é uma imagem obtida por um Landsat de alta resolução. Esses pequenos desmatamentos têm todos menos de 25 hectares, que é o que o DETER enxerga. Então, na hora em que o DETER enxergar esses desmatamentos, eles estarão todos emendados e não haverá mais o que fazer.

Como combater essa nova técnica? Crime organizado se combate com polícia. Entramos numa linha de investigação junto com a Polícia Federal. Fizemos a representação criminal, de polígono por polígono, à Polícia Federal. A investigação prosseguiu, e desarticulamos a maior quadrilha de desmatadores de toda a Amazônia brasileira, de todos os tempos, na operação do dia 27 de agosto passado.

Este cidadão, Ezequiel Castanha, é o chefe da quadrilha e está foragido, mas nós estamos para prendê-lo a qualquer momento. Só a desarticulação dessa quadrilha representou uma queda de 65% no desmatamento do eixo da BR-163.

Além de fazer o trabalho em cima dessa quadrilha, nós fomos para dentro das terras indígenas acabar com a outra grande ameaça à água e ao patrimônio ambiental brasileiro, o garimpo, que está destruindo o oeste do Estado do Pará. A Comissão de Meio Ambiente da Câmara tem que se alertar para esse fato. A contaminação por mercúrio é uma destruição. Nós entramos com toda a força do Estado brasileiro e

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destruímos os equipamentos que estavam sendo utilizados na prática criminosa. Livramos a Terra Indígena Baú e toda a terra caiapó do centro da Terra do Meio, no Pará, da prática do garimpo ilegal.

Aqui a nossa equipe de operações especiais do IBAMA trabalhando dentro da área Gorotire, destruindo equipamentos de garimpo.

Aqui os resultados consolidados das nossas fiscalizações.

Eu ouvi um comentarista da Globo dizer que a fiscalização do IBAMA é rarefeita. Os rarefeitos fizeram 3.763 autos de infração no combate ao desmatamento da Amazônia, de agosto do ano passado a julho deste ano. Aplicamos 1 bilhão 987 milhões de reais em multas.

Quando a gente fala que foram feitos quase 4 mil autos de infração, Sr. Presidente, parece que eu fiquei mandando auto de infração pelos Correios. Não é! A gente tem que receber o polígono, pegar o indicativo que eu mostrei, programar uma operação, ir ao campo, enfrentar o desmatador, desarmá-lo, parar o desmatamento, apurar quem é o autor, fazer o auto de infração, embargar a área, colocar no site do IBAMA auto por auto. Então, uma fiscalização rarefeita nunca conseguiria fazer isso.

Nós embargamos 316 mil hectares de área. Parece pouca coisa, mas tem no site do IBAMA o registro sobre 316 mil hectares de terras, informando ao mercado que essas áreas não são vendíveis e não recebem crédito público. É um bloqueio muito forte para o combate ao desmatamento.

Foram colocados fora de circulação 196 tratores, 49 caminhões, 252 motosserras, 60 armas de fogo - ali não tem brinquedo, ali é tiro -, 10.587 metros cúbicos em madeira serrada e 22.443 metros cúbicos em tora. Isso dá mais de 30 mil metros cúbicos, o que equivale a 3 mil caminhões de madeira. Essa é a fiscalização rarefeita do IBAMA.

Vindo do Estado de V.Exa., quero colocar em primeira mão a esta Comissão a ação que nós fizemos anteontem, no Maranhão, onde a gente desarticulou uma grande quadrilha que estava praticando corrupção em favor do desmatamento.

A ação começou com um celular que nós apreendemos numa serraria. O IBAMA foi fazer uma operação, os madeireiros correram e esqueceram o celular, onde apareceu o nome do agente do IBAMA - Campos I - que manda a mensagem para o madeireiro: Destrava aí que vou fazer o possível por aqui. A chuva é forte vem de Brasília. - era a nossa equipe de Brasília, que vinha trabalhando - Muito vento., por causa do helicóptero usado, Excelência. Esse era o código que eles utilizavam. Combinando os preços das propinas, diziam: Mesmos tijolos da obra do natal p cada.

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Esta foi a Operação Ferro e Fogo feita no Maranhão pela Polícia Federal e pelo IBAMA, que resultou em 23 presos, entre os quais 15 servidores do IBAMA - que estão na Penitenciária de Pedrinhas, acusados de formação de quadrilha, corrupção passiva, concussão e prevaricação - e 2 ex-Secretários de Meio Ambiente do Estado.

Foi uma grande operação, puxada pelo órgão ambiental. V.Exa. vai perceber que o desmatamento no Maranhão vai cair em função dessa ação, igual à Operação Castanheira.

Aqui está o mapa do combate à corrupção que nós estamos fazendo esse ano. Nós temos, em Barra do Garças, quatorze servidores respondendo a processo disciplinar por corrupção, quatro em Goiânia, seis sendo investigados em Santarém, oito foram demitidos em Boa Vista e mais esses quinze, em São Luís do Maranhão, que serão devidamente processados.

O meu tempo se esgotou?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Está esgotado.

O SR. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Aqui é só para mostrar essa questão do Projeto DETER, a fim de esclarecermos a Comissão de Meio Ambiente da Câmara. O DETER não serve para medir desmatamento. Não serve porque depois que você o qualifica... Aqui é o DETER de agosto, setembro e outubro. Vê-se o corte raso. Isso aqui é cicatriz de fogo. Cicatriz de fogo não é desmatamento, degradação não é desmatamento. Só vira desmatamento se for convertida. Então, não serve. Aqui está demonstrado porque não serve. Olha aqui, Excelência: um polígono do DETER, colocamos a imagem do Landsat atrás. Aqui é desmatamento, aqui é floresta. Então, ele não serve para medir. Outra imagem: aqui é desmatamento, aqui é floresta. Não serve. Estão colocando floresta como desmatamento. E, assim por diante, vamos observando e dizendo o que não pode.

Se o senhor me der 2 minutos, vai ser importante demais, porque eu preciso que a Comissão me ajude nisso aqui.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Nós vamos fazer ainda uma audiência sobre desmatamento. Hoje é sobre água, mas eu quero que o senhor fale sucintamente, porque eu sei da relação que existe, tanto que falei sobre isso no começo. Senão perderemos o foco da nossa reunião. Vamos em frente!

O senhor sabe que sou fã do IBAMA. Fui Ministro do Meio Ambiente, fortaleci o órgão e acho que ele tem um papel importantíssimo. Inclusive fui contra a sua divisão quando da criação do Instituto Chico Mendes. Só um partido aqui foi contra essa divisão. Agora, o Instituto Chico Mendes está se consolidando, mas o IBAMA sofreu muito. E

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quem o criou foi o meu pai, quando era Presidente. Então, tenho grande relação com o IBAMA, gosto muito dele. Eu queria que o senhor não tirasse o foco da nossa reunião, que é água e Região Sudeste.

O SR. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Vou expor a coisa mais grave que eu tinha para falar e pedir o apoio da Comissão de Meio Ambiente da Câmara.

Isso aqui são créditos de autorização florestal lançados pelos Estados da Amazônia no sistema de controle Documento de Origem Florestal - DOF, do IBAMA.

Vejam só: Acre, 418 mil metros cúbicos de madeira no sistema; Amazonas, 792 mil; Rondônia, 3 milhões 653 mil metros cúbicos de madeira, com mais 1 milhão e 787 mil. Isso, convertido em floresta, dá 634 quilômetros de floresta no sistema. Somando tudo, dá 2.350 quilômetros quadrados de floresta em autorizações dentro dos sistemas estaduais. A União Federal não tem informação nenhuma. Nós, do IBAMA, não sabemos onde estão os planos de manejo, onde está o desmatamento legal, não temos informação nenhuma para ajudar a fazer o combate.

Aqui está a solução para o sistema: cumprir o art. 35 do Código Florestal. O IBAMA está disponibilizando agora o Sistema Nacional de Gestão Florestal e pede a interveniência da Comissão de Meio Ambiente da Câmara para que os Estados façam a sua adesão a ele. E que possamos ter as informações para todos os órgãos, a fim de toda a sociedade enxergar como está o desmatamento na Amazônia.

Finalizo e agradeço. Excelência, desculpando-me pelo excesso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Tudo bem.

Quero fazer um esclarecimento importante. No que diz respeito à competência dos Estados, é evidente que nós vivemos numa Federação. Eu não tenho dúvida - sou autor da lei complementar, que de certa forma, foi desfigurada - de que os Estados são os responsáveis. Os Estados não têm capacitação nem compromisso. Por isso, eu sempre alertei o Governo para o fato de que essa transição e esses convênios fossem muito bem estudados. Quem deu delegação aos Estados foi a União, foi o Ministério do Meio Ambiente, contra a minha opinião. Por quê? Porque era mais fácil passar o licenciamento para os Estados, tirando a responsabilidade, como hoje está aqui, mas a responsabilidade suplementar continua sendo da União. A União errou ao delegar aos Estados. Sabemos que na maioria desses Estados do Norte, que são os maiores desmatadores, a questão política está intimamente ligada à ilegalidade.

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Então, governadores eleitos - e não só agora, mas ao longo desses mandatos todos - têm compromissos com esse segmento, que vive da madeira ilícita, que vive da extração de minério. Sabemos disso.

Então, na hora em que você delega ao Estado que tem um Governador comprometido com isso, para que ele mesmo dê o licenciamento, é a mesma coisa de colocar a raposa para tomar conta do galinheiro. Não tenha dúvida!

Essa situação foi mal conduzida, muito mal conduzida. Eu, quando fui Ministro do Meio Ambiente, recebi pressões para fazer isso, mas me neguei. Fazia concessões pontuais. Para alguns Estados que sabíamos que tinham competência para isso, nós delegávamos, principalmente Estados do Sul e do Sudeste.

Era esse o esclarecimento. Vamos voltar ao nosso tema, porque eu estou assustado com o que tenho ouvido aqui. Acho que a crise hídrica pela qual estamos passando é a maior da história do País. Eu acho, Deputado Penna, Presidente do Partido Verde que aqui está, que nós temos que nos debruçar sobre o assunto. O Governo precisa ser instado a criar um comitê da crise hídrica imediatamente, porque a questão não se localiza só em São Paulo. Essa ideia surgiu nessa reunião agora. Vamo-nos debruçar sobre isso. Temos aqui na Câmara assessores e consultores que conhecem o assunto e também setores do Governo, setores do nosso partido. Então, nós vamos agora colocar foco na criação desse comitê, Caso contrário, não saberemos para onde caminhar. Imaginem 17 milhões de pessoas sem água! O que vai acontecer com o Brasil? Que loucura é essa? O Rio Paraíba do Sul também está passando por isso, o Semiárido enfrenta uma seca sem precedentes, o Rio São Francisco ainda com essa obra para fazer a transposição. Nós sempre perguntamos: transposição do quê?

Concedo a palavra à última expositora, Sra. Maria Luisa Ribeiro, Coordenadora do Programa Rede das Águas da SOS Mata Atlântica.

A SRA. MARIA LUISA RIBEIRO - Parabéns, Deputado Sarney Filho! Essa proposta é excelente. Espero que a gente possa ampliar a pauta para que a Comissão de Meio Ambiente faça também a defesa da reconstrução do Sistema Nacional de Recursos Hídricos. Houve um desmonte. E não foi só a falta de água, mas um desmonte efetivo da gestão da água no País.

Eu quero falar um pouco sobre isso porque a Marussia falou muito bem sobre a crise da água, mas sobre a crise do Sistema Nacional de Recursos Hídricos a gente não falou, sobre a perda de peso político, institucional, econômico e técnico do Sistema Nacional de Recursos Hídricos.

A ANA cumpre muito bem o seu papel de agência, bem como o

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Conselho Nacional de Recursos Hídricos e o CONAMA, mas hoje, Deputado, ninguém sabe quem é o Secretário Nacional de Recursos Hídricos, ninguém sabe quando foi a última vez em que o Brasil não passou vexame internacional. Nós ganhamos hoje o segundo lugar do Troféu Fóssil no Encontro do Clima. Era para o Brasil ser líder, protagonista de uma nova agenda. Nós somos signatários da Agenda 21. O Deputado fez muito bem os encontros regionais para a Rio+20, e nós, sociedade, tivemos que andar de marcha à ré nas ruas para mostrar os retrocessos que o Brasil vem implementando, principalmente com a mudança do Código Florestal. V.Exa., junto com o seu partido, foi um dos únicos a nos ajudar contra essa luta. Mas, vamos lá!

A água expressa, sem dúvida nenhuma, de forma muito intensa, os impactos do clima. Como disse muito bem o representante da ANA, ao mesmo tempo, no mesmo dia, na mesma hora, a gente tem as tragédias anunciadas de secas extremas ou de enchentes extremas. Se tivesse chovido no início de janeiro de 2014, se chover em janeiro de 2015 nas regiões serranas da Mata Atlântica, na Região Sudeste, nós vamos ter as tragédias no Rio de Janeiro de novo. Então, ou vivemos tragédias anunciadas por ocupação de encostas, colocando pessoas, vidas humanas em risco por ocupação de Áreas de Preservação Permanente, consideradas na legislação, agora consolidadas. Consolidadas para quê? Para não matar gente?

A SOS Mata Atlântica fez uma pesquisa de opinião, uma enquete, na verdade, junto com a revista Época, no site www.reclameaqui.com.br, para saber de que forma as pessoas percebiam esse problema da crise da água em São Paulo, quais eram as causas. Dezessete mil cento e onze pessoas responderam espontaneamente, marcando as opções. O desperdício vem como a primeira delas, com 73,78% das pessoas. O desmatamento da Mata Atlântica, mesmo antes dos nossos nobres doutores colocarem a questão do desmatamento, dos rios voadores, do desmatamento da Amazônia, é percebido na Região Sudeste, sim, como um dos agravantes para a diminuição de água. A SOS Mata Atlântica mostrou e mostra com o Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica que, pela quinta fez consecutiva, Minas Gerais foi o Estado recordista do desmatamento da Mata Atlântica na última década. Lá em Minas estão as nascentes das principais bacias hidrográficas que abastecem os grandes centros, como o Distrito Federal: o Rio Doce, o São Francisco, o Cantareira, o Paraíba do Sul, e assim por diante. Somente 63% das pessoas atribuíram à falta de chuvas. Quer dizer, apesar de a mídia fazer gráficos, infográficos e de toda a discussão da sociedade, há um olhar simplista muito perigoso de que foi a falta de chuvas.

Eu ouvi hoje, no avião da Gol, vindo para cá, num jornal que começa logo de manhã, no Bom Dia São Paulo, que na cidade de Campinas está tudo bem, porque choveu. Campinas não tem um reservatório de água, está disputando a água com o sistema Cantareira e capta água

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para 2 milhões de pessoas, fora todas as indústrias e as atividades econômicas pujantes que tem a fio d'água no Rio Atibaia. Quer dizer, não é nem planejar com oferta e demanda, é assumir risco total e disputar ainda essa água com a captação para abastecimento humano.

Agora eles ainda vão ingressar na Justiça, via Ministério Público, exigindo equidade de direitos no uso da água. Foi muito bem dito aqui, conforme a nossa legislação e reconhecido pela ONU, que o acesso à água em qualidade e quantidade é um direito humano. Então, entre irrigar cana para produzir um etanol sem competitividade, porque não tem selo verde, fora do Brasil, que tem embargo econômico, etc., e abastecer as pessoas, não deixar que animais morram de sede, não dá nem para discutir isso na Justiça. Espero que nenhum Ministro ou o Poder Judiciário aceite isso.

A má gestão do serviço público foi reconhecida como o principal fator da crise da água. Eu, que moro em Itu, fico até envergonhada com o título da cidade dos exageros, onde o caipira gosta de contar vantagem, dizendo que lá tudo é grande. Lá, a crise da água também tinha que ser a maior do Brasil. Foi terrível! As pessoas ficaram, de fevereiro até agora, com 100% de racionamento, sem água nas torneiras, vivendo uma realidade de abastecimento de caminhões-pipas vindos sabe-se lá de onde. Água sem nenhuma qualidade, sem nenhuma condição de uso, numa estância turística que, durante a Copa do Mundo, recebeu duas delegações. Duas seleções ficaram hospedadas em Itu. Campo de golfe, condomínios, cervejarias, todo mundo que tinha dinheiro não ficou sem água. Quem não tinha dinheiro e estava à mercê do serviço de abastecimento público ficou sem água.

Itu, Deputado, eu gostaria que servisse de exemplo para uma ampla revisão estratégica do nosso marco regulatório do saneamento, porque a crise da água na cidade se deu pelo sucateamento intencional de um serviço autônomo de água, que cabia ao Município, para a privatização dos serviços, sem que houvesse uma regulação da sociedade, uma agência reguladora forte e participativa, que desse transparência ao processo.

Preocupa-me muito, quando, na fogueira das vaidades da eleição, da briga ao terem eleito a SABESP com a grande má gestora, a grande vilã, a empresa problemática, responsável pela crise da água em São Paulo, que a tendência da opinião pública seja levar a uma privatização sem regulação adequada a regiões de extremo estresse. Em Campinas, gestores de serviços de água foram para a cadeia em anos anteriores.

No entanto, eu não estou aqui para ficar falando de problemas de caso de polícia - o IBAMA já falou muito bem, o Ministério Público está aí. Eu acho que até cabe a realização de alguma CPI em determinados casos, mas não neste momento. A hora agora é de um pacto. A gente

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vinha defendendo, desde a Constituição de 88, que a legislação de recursos hídricos passou a olhar o Brasil sob a ótica das bacias hidrográficas e não sob a ótica da divisão político-administrativa das regiões metropolitanas ou das cidades. A água não reconhece essa divisão político-administrativa. Ela reconhece o desenho das bacias hidrográficas.

Nós acreditávamos que, com a implementação do Sistema Nacional de Recursos Hídricos, conflitos como o do Rio Paraíba do Sul, em que o reservatório de Jaguari tinha 40% do volume de água, que foi retida para gerar energia para a Light com tecnologia obsoleta e para diluir esgotos no Rio Guandu, para garantir água para o Rio de Janeiro, de repente, caíram para 4%. Quem reteve essas águas nos reservatórios não foi o sistema de abastecimento humano, foi o sistema elétrico, que cometeu o mesmo erro da SABESP, em São Paulo, de que a Marussia falou.

O sistema elétrico, no ápice da crise de escassez hídrica, incentivou o consumo de energia, barateou o preço, elevou as nossas emissões de gases de efeito estufa usando as termelétricas de forma absurda e fez a gente pagar a conta daquele monte de eólica. Então, usou a mesma lógica.

Portanto, eu não posso concordar com a tese de que o setor elétrico está preparado e tem uma gestão integrada. Não! O setor elétrico é que levou ao afastamento da sociedade dos grandes rios do Brasil desde o início do século, em 1903, quando foi construída a primeira usina hidrelétrica no Tietê. Foi o setor elétrico que ditou a regra de uso das águas no Brasil. Basta ver que na bacia amazônica não temos comitê de bacia nas áreas úmidas. Não é preciso implementar sistema de gestão de recursos hídricos.

Eu peço, Deputado, veementemente que esta Casa e esta Comissão se empenhem nisso. O Brasil precisa colocar água numa agenda estratégica. Não pode haver bacia para quem vive em escassez hídrica e tem dinheiro. Tem que haver comitê de bacia, gestão por bacia hidrográfica e plano nacional de recursos hídricos no País inteiro.

Foi preciso que o Ministério Público Federal ingressasse na Justiça contra a Agência Nacional de Águas - eu acho que ele errou o foco, o alvo, mas tudo bem - porque a ANA deu outorgas sem ouvir planos de bacia. A bacia amazônica não tem plano de bacia. Aí ficaram os nossos índios, os líderes religiosos, todo mundo gritando em defesa de todos os rios, do Rio Xingu e de outros. Não há plano de bacia.

Isso aconteceu com o São Francisco também. Logo que o Comitê do São Francisco foi formado, nós tivemos o encontro do Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas. Nos quatro Estados, unidos, felizes com a sociedade, apostando em construir um plano de

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recuperação do São Francisco, nem se falava a palavra da moda - revitalização -, que foi incorporada, mas num plano de bacia do São Francisco, porque o rio já agonizava antes do projeto de transposição.

Quem conhece o Rio das Velhas e as cabeceiras do São Francisco sabia que essa tragédia anunciada já estava por acontecer. O projeto da transposição do São Francisco foi recusado pelo Comitê da Bacia do São Francisco logo no primeiro ano de sua instalação. É o rio de integração nacional. Foi preciso que um líder religioso fizesse greve de fome para que o mundo visse que o Brasil não respeitava a decisão do seus comitês de bacia. Foi aí, Deputado, que o sistema começou a se esvaziar.

Na sequência disso, foi esvaziando, como a gente viu, acabando a água do Cantareira, morrendo a nascente do São Francisco, dentro de um parque, inclusive. Em seguida, veio a machadada no Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Todos os leilões para aquele festival de PCHs em áreas de Mata Atlântica, em Minas, no Paraná, em Santa Catarina, foram concedidos à revelia dos planos de bacia desses Comitês, foram concedidos à revelia do Plano Nacional de Recursos Hídricos, porque os leilões são postos ao comércio e depois se lembra de consultar os Comitês de Bacia. Sabem por quê? Porque o Comitê de Bacia não é órgão licenciador. Então, faz-se o licenciamento ambiental da hidrelétrica naquele processo de licenciamento Frankenstein.

Qual é o resultado? Somando esse descaso, houve o esvaziamento do sistema de gestão de recursos hídricos, o esvaziamento do Conselho Nacional de Recursos Hídricos, com seu papel de articulador, de mediador de conflito, porque não é a ANA que tem que fazer isso. A ANA é a agência executiva, técnica por excelência, reguladora da outorga, mas não dos planos de bacia. Ela tem que olhar para o plano. Se não existe Comitê, não existe plano de bacia ou se sempre se repete o mesmo plano, como é que vai olhar? Então, ela tem que cumprir uma função técnica; há uma discrepância no sistema de recursos hídricos.

Para complementar, veio a mudança do Código Florestal. Está todo mundo dizendo que tem que haver PSA, o programa de conservador de água, o PRODES, o programa de compra de esgoto, uma série de esforços para recuperar a qualidade e quantidade da água, mas a gente diminui a recuperação das matas, das APPs, das nascentes, desprotege a floresta. Como é que vai haver água?

Cada hectare de Mata Atlântica poderia ser bem preservado, só contendo erosão. A Agência Nacional de Água alertava, em 2010, que nós temos prejuízos de mais de 2 bilhões de reais por ano só com sedimentação e assoreamento de rios e que precisaríamos - lá na Rio+20 a Ministra reafirmou isso naquelas plenárias sobre a água -

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investir 25 bilhões de reais para garantir o acesso à água até 2015. E 2015 está aí. No que foi investido? Quanto a gente investiu? O que a gente fez, em termos de recuperação de APP, em programa de conservador de água? O PSA ainda está parado nesta Casa. Temos aí os Relatores. Nesta Comissão, já fiz várias audiências públicas para discutir pagamento para os serviços ambientais, para compensar quem preserva. Um hectare bem preservado de Mata Atlântica produz 10 mil litros de água. Isso seria uma solução para o Cantareira.

Só que a Marussia mostrou muito bem a bacia do Cantareira. Essa é ela novamente. Nós temos 21,5% da vegetação nativa nessa bacia. Essa vegetação não está nas matas ciliares. Vocês podem ver os grandes reservatórios. Os reservatórios estão ocupados por chácaras de recreio, pequenos produtores de batata e especuladores imobiliários que arrendam fazendas improdutivas para o gado, esperando para construir loteamentos ali. Todos os Municípios estão decretando planos de expansão urbana e que é tudo área urbana.

Sabem para quanto cai a APP da bacia do Cantareira aqui? Para cinco metros. Cinco metros é uma árvore, é um pé de manacá ou de pitanga. Isso é insuficiente para fazer aquela função diária de Área de Preservação Permanente para produzir em cada hectare de propriedade 10 mil litros de água por ano.

Então, plantando um pé de laranja nos cinco metros que ficaram de APP nos formadores do Sistema Cantareira, Deputado, São Paulo vai ficar completamente sem água nos próximos 10 ou 5 anos. É impossível!

No Paraíba do Sul é a mesma coisa. O Paraíba do Sul tem 26,4% da sua cobertura florestal e é um rio assoreado. Ele só não é poluído por esgoto porque os Municípios da região de Cabeceira Paulista têm saneamento básico, mas 70% do volume do Paraíba do Sul é utilizado pela Light, no Rio de Janeiro, e para diluir esgoto no Rio Guandu. Então, nós usamos água limpa para diluir esgoto, para poder ter condições de captação, porque também não há saneamento básico na Bacia do Guandu. Não é só o Tietê que tem esse privilégio nefasto.

A macrometrópole paulista, que é essa imensa região formada por 173 Municípios, equivalente à Eslováquia, com uma população correspondente ao Canadá e um PIB próximo da Suíça, tem uma condição de saneamento que eu nem sei comparar com quem, porque não faz tratamento de água. Capta água limpa, usa e exporta poluição para a Baixada Santista ou para o interior do Estado.

Desde 1991 somos conhecedores desse problema. Foi aí que nasceu o primeiro Comitê de Bacias do País, que é o PCJ, justamente porque já sabíamos, em 1991, que, se São Paulo não fizesse uma lei de recursos hídricos e passasse a trabalhar por bacias hidrográficas, nós

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estaríamos numa situação hoje muito pior do que a que a gente vem enfrentando.

Então, não dá para dizer que não há planejamento. Porém, qual foi o problema? Mesmo tendo um sistema de gestão de recursos hídricos, cuja premissa é a gestão integrada, descentralizada e participativa, o saneamento ficou a cargo das cidades.

É isso o que a gente tem no olhar dos rios. Isso aqui é a Bacia do Guarapiranga, com a APP do Código Florestal anterior respeitada! É suficiente uma APP, numa região conurbada como esta, para garantir água de qualidade num manancial? É claro que não! Não foi à toa que Nova Iorque fez uma opção, há mais de 20 anos, de pagar a proprietários de terra para conservarem o solo, conservarem a floresta para ter água!

Agora, em Nova Iorque não há um zoom desses, de exclusão de saneamento, de exclusão hídrica total. Na cidade que tem o maior PIB da América do Sul, a gente não consegue passar uma rede de esgoto. É humanamente impossível, tecnicamente impossível. Não tem onde passar. O esgoto é o córrego, que enche. Setenta por cento das doenças de veiculação hídrica levam pessoas invisíveis a óbito na maior metrópole paulista.

Então, o nosso problema em São Paulo logicamente não é só de falta de água, de não sermos mais a Terra da Garoa por ilha de calor, desmatamento, etc., mas é de o saneamento estar numa caixinha e de haver o primo rico e o primo pobre do saneamento. O primo rico é o abastecimento de água, que dá lucro, renda, etc., e o primo pobre é o esgoto. Por muitas décadas não se investiu em tratamento de esgoto neste País. Havia pouco recurso. Poucos Estados, poucas companhias de saneamento têm capacidade de endividamento como a SABESP para contrair dinheiro internacional para fazer as obras necessárias de que a gente precisa.

Para concluir, tem que se chamar à responsabilidade os Municípios nesta gestão da bacia! Mesmo em áreas de manancial - eu volto a mostrar a Guarapiranga -, os planos diretores e as leis de zoneamento e de uso e ocupação dos solos dos Municípios consideraram Zonas Especiais de Interesse Social esse tipo de invasão, a da favela Nova Palestina.

Quer dizer, o déficit habitacional de um programa estruturado de habitação faz com que pessoas continuem invadindo áreas estratégicas de preservação de manancial consideradas ainda improdutivas. Quer dizer, a gente ainda olha para uma propriedade com mata, que ainda é chamada de mato, como uma propriedade improdutiva.

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Se uma pessoa que tem uma propriedade com mata e 15 nascentes mais um riacho for considerada um produtor de água ou um conservador de água, ela vai passar a ter status de representante em um Comitê de Bacia. Se ela simplesmente for um produtor rural que tem mata, vai ser considerada uma pessoa que tem uma propriedade improdutiva e não vai ser nem ouvida por nenhum sindicato, por nenhuma associação, por ninguém. Ela não vai participar dessa discussão do sistema de gestão. Então há um erro gritante aí!

Algumas pessoas dizem: Em São Paulo, vocês ficam se vangloriando, o SOS Mata Atlântica fala da despoluição do Tietê. Como é que está essa nossa realidade no Tietê? Nós começamos o Programa de Despoluição do Rio Tietê com o BID, após uma ampla campanha que os senhores conhecem, ao mesmo tempo em que começou a despoluição da Baía de Guanabara, da Baía de Todos os Santos e do Guaíba, no Rio Grande do Sul. Todos esses projetos foram financiados e assinados na mesma data, na Eco 92.

Começamos em 1993. Tínhamos 70% de esgoto coletado e só 16% tratado. Isso evoluiu em 2003, passada uma década e várias mudanças de governo. Vocês sabem a dificuldade que é manter um programa que começou num governo por sucessivos governos estaduais. Enfim, chegamos a 80%, com 49%, quase 50%, tratado. Vamos chegar a 2015, com uma população de 20 milhões, com 87% do esgoto coletado e 73% tratado, numa região, numa bacia que tem Municípios operados por serviços autônomos; Municípios operados por serviços mistos e Municípios operados pelo Estado.

A gente mostra que o problema aí não é só de quantidade, mas também de qualidade, como foi dito aqui. A gente faz esse monitoramento em várias bacias do bioma Mata Atlântica no País e tem um retrato da importância do Rio Tietê para toda a Bacia do Paraná, não só para o Estado de São Paulo. Hoje a gente tem o rio morto, porque é um rio sem oxigênio, indisponível para uso, a não ser para a navegação das barcaças do hidroanel metropolitano e geração de energia elétrica em 71 quilômetros. O resto dos 1.100 quilômetros do rio garante água para São Paulo. O Sistema Alto Tietê, que foi mostrado aqui, tem três pontos de captação de água - um em Mogi, um em Biritiba Mirim e outro em Salesópolis - que garantem água para São Paulo e todas as verduras e hortaliças que a gente consome nos grandes restaurantes da Capital paulista.

Então, não é verdade que o Tietê não é importante. Ele é importante. Porém, por regras operativas de barragens que geram energia elétrica... Não sei se os senhores me viram no Jornal Nacional, mas eu apareci comentando um episódio terrível de mortandade de, hoje, 70 toneladas. Quando eu saí no Jornal, eram 40 toneladas de peixes mortos no Tietê na cidade de Salto. E, lá em São Paulo, as pessoas - algumas das pessoas - dizem: Mas tem peixe no Tietê?! Tudo isso de

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peixe no Tietê?! Há tudo isso de peixe no Tietê. Em Porto Feliz, a menos de 40 quilômetros de onde todos esses peixes morreram, produtores, criadores de tilápia pegaram dinheiro do BNDES e se transformaram em piscicultores. Estavam investindo na hidrovia Tietê-Paraná, na produção desse pescado para todos os hipermercados. Quem vai fazer? Nem seguro-defeso eles têm, porque não são pescadores, são criadores, e o que matou os peixes foi um acidente climático. É muita irresponsabilidade, não é, Deputado?

Mas eu queria deixar isso para esta Comissão, quem sabe como uma contribuição para a gente vir discutindo numa agenda, em 2015, para que a água seja de fato estratégica. Primeiro, nós temos que conter o desmatamento. E não sei o que nós vamos fazer com esse Código Florestal que não permite floresta para a produção de água. Mas nós vamos ter que ter um plano B, quem sabe as bacias de stress hídrico, as bacias prioritárias. Podemos colocar nos planos de bacia, como fez o PCJ, pelo qual a APP tem que ser pelo menos a que era no Código Florestal anterior, que tinha rigor científico, sim.

Devemos implementar e fortalecer os Comitês de Bacia em todo o território nacional. Não pode haver uma sociedade que tenha um sistema de gestão e outra que não o tenha!

Devemos acabar com os rios de Classe 4. Isto é melhorar a nossa Resolução CONAMA nº 305, para que não tratemos rios como diluidores de esgoto. As mudanças do clima, como aconteceram no Rio Piracicaba, por exemplo... Quando começou a seca, em fevereiro, na Região Sudeste, foi o Rio Piracicaba que apresentou aquela mortandade de peixes terrível. O Piracicaba é um rio de Classe 3. Ele recebe esgotos tratados com uma baixa eficiência, e, com o volume de água que, na média, ele tinha, ia servindo para diminuir essa carga, e a vida vinha se recuperando nesse rio. Com a mudança do clima, não tem água para diminuir esse esgoto.

Então, nós temos que melhorar a eficiência das estações de tratamento de esgoto e ser mais rigorosos com a qualidade dos efluentes que lançamos. Com a compensação, com a cobrança pelo uso da água, não usando só o princípio do usuário pagador mas também o do poluidor pagador, ou do conservador, talvez a gente vá conseguir chegar a uma meta de gestão, de instrumento de gestão, fazendo com que todos os usuários paguem pelo uso da água, não só alguns, não só a indústria.

Vamos universalizar o saneamento e fortalecer a governança. Gostaria de tê-lo no Ministério do Meio Ambiente, mas isso não está no nosso poder. Quem sabe, se não for o Deputado, alguém que leve essa questão a sério e de forma estratégica para o Brasil.

Muito obrigada. (Palmas.)

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Obrigado, Maria Luiza. Parabéns!

Nós encerramos a fase das exposições. Acho que foi extremamente importante esta nossa audiência pública. Embora, como eu já disse, nós estejamos no fim desta Legislatura, é apenas o começo de uma nova ação. Daqui já saíram ideias, Deputado Júlio Delgado, que aqui está nos prestigiando... A crise é realmente muito grave, em todo o Brasil. Daqui já saíram ideias de se propor - e nós já estamos acionando nossos técnicos, nossos consultores, o pessoal da Câmara também está tomando conhecimento - a criação de um Comitê de Crise Hídrica, mais do que necessário, senão nós corremos sérios riscos de termos problemas jamais vistos.

Com um racionamento, por exemplo, um apagão de energia elétrica, você ainda pode viver, mas sem água, meu amigo, é muito difícil, não é? Não tem como! É preciso que se tomem medidas urgentes, é preciso também que o Governo do Estado de São Paulo assuma a sua parcela de responsabilidade com clareza, ele, que não mandou representante aqui para esta audiência pública porque seguramente não tem como explicar a maneira como tem conduzido esse problema ao longo dos anos.

Vamos abrir o diálogo para os membros da Mesa. O Deputado Júlio Delgado pediu a palavra. Vamos ouvi-lo e depois abrir a palavra, rapidamente, para aqueles que quiserem fazer algumas perguntas e alguns esclarecimentos.

O SR. DEPUTADO JÚLIO DELGADO - Sr. Presidente, eu vim aqui, primeiro, agradecer a V.Exa. A menos de 8 horas atrás, nesta madrugada, quando nós estávamos numa sessão longa do Congresso Nacional, eu fui conversar com V.Exa. a respeito de uma outra ação nossa aqui no Legislativo e V.Exa. me disse o seguinte: Amanhã estarei numa audiência pública sobre a crise de água no Brasil. Vá lá para a gente conversar um pouquinho. Eu quero agradecer a oportunidade de ter vindo e ter escutado o finalzinho da apresentação da Sra. Malu. Não tive a oportunidade de escutar o Luciano nem o Joaquim, mas escutar a Malu me confortou por falar dessa preocupação.

E eu estava aqui, enquanto a Malu estava fazendo a sua exposição, pegando algumas informações com o meu eterno colega Deputado Edson. Ele não está no mandato, mas não deixa de ser Deputado, pela sua atuação. Ele estava me dando algumas informações a respeito do assunto. Eu peguei o final, a conclusão da Malu.

Agradeço muito o convite, porque eu vinha por um motivo e acabei encontrando outro. Enquanto a Malu se manifestava, eu estava fazendo aqui um check-list das realidades das bacias. Eu vivo em

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Minas Gerais, sou de Juiz de Fora. Eu estava me lembrando do que a Malu disse. A última estação de tratamento de esgoto no rio que corta Juiz de Fora, o Rio Paraibuna, foi feita pelo meu pai enquanto Prefeito, em 2000. Agora, 14 anos depois, ela está desatualizada, como a Malu disse. Ela não consegue mais fazer a depuração do esgoto que entra. E o que acontece? Agora há uma ação da Prefeitura lá começando a fazer a segunda estação. Das oito estações previstas para o eixo de Juiz de Fora, há uma; sete estão por fazer. Quer dizer, em vez de recuperar, atualizar essa primeira, para dar sequência, anuncia-se uma segunda, uma terceira... A Malu estava falando e eu estava aqui vendo esse filme. Aí, eu comecei a imaginar a complexidade da questão.

Ela não quis dizer, por educação, por ser uma representante do setor, mas eu entendi que hoje a gente tem leitos de antigos rios em que não passa mais água, só passa esgoto, e, não tendo água para carregar o esgoto ou para tratar o esgoto, o leito está aberto para poder passar esgoto, o que traz preocupação. O comitê de crise, por exemplo, é fundamental. Independente de ter esgoto, a nascente não estava... Os nossos representantes aqui do IBAMA ou da ANA vão recordar que há 2 meses nós tivemos seca nas nascentes do Rio São Francisco. Não é preciso dizer o que ele representa para o Estado de Minas. Eu escutei em uma matéria esta semana que brotaram algumas gotas nas nascentes do São Francisco. Choveu; a chuva encharca o solo, volta a correr água no leito. Se a seca não comprometeu agora as nascentes e se vai voltar a correr um pouquinho de água fruto da chuva, daqui a 5 anos, elas vão secar de vez.

Esse foi o meu entendimento do final da fala da Malu, para me envolver completamente com essa causa de V.Exa., Sr. Presidente, da questão do comitê de crise. Tem que ser feito...

Não é uma questão pontual para a gente falar. A Malu exemplificou com a situação de São Paulo. Eu estou aqui lembrando os fatos de Minas. Se o Deputado Sarney Filho começar a falar da questão do Maranhão, ela não vai ser diferente. Se o Edson falar da questão da Bahia, ela também não vai ser diferente. É uma questão nacional, e isso se torna premente, por uma preocupação futura. Como V.Exa. disse, sem energia a gente vive, mas sem água não vive ninguém.

Outro dia, Deputado Sarney Filho, numa viagem pelo interior de Minas, eu estava conversando com um companheiro e disse a ele o seguinte. Todo mundo discute... Nós estamos envolvidos em crises econômicas, em crises de ordem ética e moral com relação à PETROBRAS e tudo, e as pessoas acham o valor das coisas. Eu não tenho dúvidas de que dentro de 10 anos o bem mais valioso vai ser a água. Que se prepare quem tem água, porque água vai valer mais do que ouro! Esta é a preocupação que temos que ter: a de preservação dos nossos mananciais.

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Parabéns a V.Exa., Sr. Presidente! E me envolva na sua causa. Quero contribuir pelo motivo deste convite e pelo motivo que me trouxe aqui: a preservação da água em nosso País.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Obrigado, Deputado Júlio Delgado. Na Legislatura que vem, pelo que a imprensa tem divulgado, nós vamos encontrar aqui um Congresso ainda mais reativo às questões socioambientais. Então, parcerias são muito importantes. Já temos aguentado aqui, com poucos Deputados e Deputadas, uma pressão muito grande do agronegócio, que conseguiu flexibilizar o Código Florestal e está querendo flexibilizar agora as áreas indígenas, as unidades de conservação, as áreas dos quilombolas. Então, ano que vem nós precisamos realmente juntar forças para podermos não somente ter uma agenda reativa, mas uma agenda proativa. Eu acho que isso é que é importante.

Eu vou abrir a palavra aos presentes que tenham alguma dúvida e queiram um esclarecimento dos nossos expositores. Aqueles que quiserem, por favor, levantem a mão. (Pausa.)

O senhor pode se identificar, porque é praxe, já que estamos gravando, e fazer a pergunta.

O SR. MAURICIO BORATTO VIANA - Boa tarde a todos! Eu sou Mauricio Boratto, Consultor da Casa na área de meio ambiente. Eu gostaria de levantar três questões aqui: a primeira, ao Dr. Luciano. Esta Casa conduziu uma CPI há 10 anos - inclusive, o Deputado Sarney Filho era o Relator -, e uma das conclusões dessa CPI foi a de que, no caso das multas... Quer dizer, havia muita aplicação de multas, mas menos de 2% dos valores aplicados eram arrecadados. Eu gostaria de saber, 10 anos depois daqueles 2 bilhões que o senhor falou que foram aplicados, qual o percentual deles que foi efetivamente arrecadado.

A outra questão diz respeito a alguns pontos que foram levantados aqui relativos a potenciais modificações da Lei das Águas. Eu gostaria de informar que esta Casa, através do seu Centro de Estudos e Debates Estratégicos, concluiu agora um estudo sobre esta questão: instrumentos de gestão das águas. Vai sair um volume já em janeiro, talvez até o final de janeiro, em que esse estudo está concentrado. Ao final desse estudo, há uma proposição, um projeto de lei, sugerindo algumas modificações na Lei das Águas e com uma indicação também para que o Conselho Nacional de Recursos Hídricos analise essas propostas.

Algumas delas dizem respeito a algumas coisas de que a Malu falou aqui, com relação à manifestação do Comitê de Bacias no que diz respeito a certas outorgas. A gente sabe que os comitês não fazem

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outorga, mas há uma previsão de que eles possam se manifestar, quando eles julgarem que aquela outorga é muito importante para a bacia, etc.

Com relação aos CBHs e aos planos, também já há um projeto de lei, de autoria do Deputado Arnaldo Jordy, que acabou de entrar aqui na Casa, dizendo respeito a isso, exatamente, para estender esses comitês e planos para todo o Brasil.

Com relação a acabar com os rios de Classe 4, também há uma proposta que não é exatamente de acabar com a Classe 4, mas que prevê que se vá aceitar cada vez menos essa função de diluição, porque a gente sabe da importância do recurso hídrico. O rio continuar sendo usado para diluir esgoto é uma coisa que não dá para entender. Cada vez mais a gente vai ter que ter menos essa função de diluição, para que os efluentes e esgotos já cheguem em condições melhores aos cursos d'água.

Então, seria basicamente isso. Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Muito bem.

Eu passo a palavra ao Diretor Luciano de Meneses Evaristo.

O SR. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Bom, eu não tenho esse dado do valor de multas arrecadadas aqui na mão, mas eu digo o seguinte: no ordenamento jurídico brasileiro, nós temos, por exemplo, dentro do IBAMA, duas instâncias de recursos para multa. Esgotadas as duas instâncias, o cidadão entra na Justiça e vai aí ad aeternum. Então, eu acho que a Câmara podia ajudar a encurtar isso aí, para a gente receber...

Nós melhoramos nosso sistema de monitoramento e o nosso conjunto probatório do auto de infração. A nossa arrecadação melhorou, mas está muito aquém, ainda, do que a sociedade espera. Agora, o principal instrumento que nós temos, hoje, para frear os desmatadores, é o embargo de área, porque ele leva o desmatador ao site de áreas embargadas do IBAMA, bloqueia a comercialização de seus produtos e o bloqueia para receber o crédito. Esse é, hoje, um dos principais instrumentos que a gente tem para segurar os desmatadores.

Quando eu tiver o dado correto, eu o encaminho para a Comissão.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Muito bem.

Alguém mais deseja se manifestar? (Pausa.)

Por favor.

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O SR. MARCIO SOUZA - Deputado, eu sou Vereador da cidade de Gravataí, no Rio Grande do Sul. Eu vim aqui, especificamente, para acompanhar essa audiência pública, porque lá, no Rio Grande do Sul, nós temos um problema. Embora tenha sido falado do projeto PISA, que vai tratar 92% do esgoto da cidade de Porto Alegre e vai melhorar a qualidade do Guaíba, nós temos dois rios entre os cinco mais poluídos do Brasil, que é o Rio dos Sinos, da Cidade de São Leopoldo, Novo Hamburgo, naquela região do Vale dos Sinos, e o Rio Gravataí, que é um rio cuja nascente também está em duas outras cidades, além da cidade de Gravataí. Eles são o terceiro e o quinto rios mais poluídos, e nós temos tido falta d'água na região.

O problema é que os investimentos dos Governos não se dão sobre a causa, eles estão tratando sobre a reservação de água, que é uma coisa que vai, em 4 ou 5 anos, inviabilizar o sustento de água daquela população de em torno de 4,5 milhões de pessoas na Região Metropolitana de Porto Alegre.

Então, na verdade, o que eu coloco aos senhores, sobretudo ao Governo Federal, é que nós não temos, ao que me parece, pelo menos que nós tenhamos informação, uma estratégia que nos tire da possibilidade de, em 3 ou 4 anos, enfrentarmos o mesmo problema que São Paulo está enfrentando. Se teremos uma condição de balneabilidade superior e qualificada no estuário do Guaíba, nas demais cidades da Região Metropolitana, que, em conjunto, são mais populosas do que Porto Alegre, nós não temos nenhuma estratégia. E, nesses últimos três verões, nós temos tido um terço dos dias, na cidade de Gravataí, com falta de água por incapacidade de tratamento e captação de água.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Obrigado, Vereador. Está feito aqui o registro. Tenho certeza de que os membros da Mesa, principalmente os nossos representantes da Agência Nacional de Águas... E vocês, depois, podem também ter uma conversa, trocar e-mails, para verem o que podem fazer para o Vereador, lá na sua atividade, que é importante para poder ajudar o Município nessa questão.

A palavra continua em aberto.

Não havendo mais quem queira se pronunciar, eu também abro a palavra para a Mesa.

O Luciano Evaristo quer dar as últimas palavras, só para se despedir, rapidamente.

O SR. LUCIANO DE MENESES EVARISTO - Gostaria de agradecer a oportunidade deste debate. Aprendi muito com os pesquisadores aqui.

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Quero dizer o seguinte: pareceu que a apresentação do IBAMA estava meio fora do contexto, mas não está. Não está! A situação é gravíssima! O Oceano Atlântico joga a chuva na floresta; a floresta sua; isso bate na Cordilheira dos Antes e vem chover aqui no centro-sul. Então, quem estiver apoiando desmatamento lá em cima estará apostando na seca do futuro.

O que a gente coloca como desafio para a Comissão de Meio Ambiente da Câmara é trazer os Estados à sua responsabilidade, para virem disponibilizar junto as informações e a gente poder fazer um combate organizado ao desmatamento ilegal e, ao mesmo tempo, trazer alternativas à Amazônia. Se você vai combater o desmatamento, tem que trazer alternativas sustentáveis para que o cidadão da Amazônia possa sobreviver.

Então, é um debate muito profundo, Deputado, e a gente espera poder participar de outras rodadas aqui na Câmara dos Deputados.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Muito bem. Não tenha dúvida!

Só um fato curioso: em 2000, eu era Ministro do Meio Ambiente e fui convidado para participar de uma audiência conjunta da Comissão de Meio Ambiente e da Comissão de Agricultura. Naquela época eu falei sobre a importância que tinha a Amazônia para as chuvas da Região Sudeste. Fui vaiado! Fui vaiado! Ninguém acreditava: Está louco! Esse menino é radical. O que a Amazônia tem a ver? Hoje a gente vê na televisão, toda hora, falarem sobre a umidade que vem da Amazônia. Hoje ninguém duvida mais. E ninguém diminui a sua importância, tanto é que, quando eu abri a reunião, eu falei sobre a importância do bioma como gerador da água e mantenedor da sua qualidade.

Então, não tenha dúvida. Por isso é que o IBAMA foi convidado para estar aqui. Ao combater o desmatamento, no fundo, nós estamos combatendo também a mudança do regime hídrico, que está aí.

Agora, uma coisa nós não podemos mais deixar de levar em conta: a adaptabilidade às mudanças que já aconteceram e que são irreversíveis. Essa é uma questão. Quando eu falo adaptabilidade, eu falo também em governança. Como é que, ao longo desses anos todos, essa coisa vem se degradando e os Governos não tomam as providências devidas? Não vamos falar Governos, mas os responsáveis, seja Governo Municipal, seja Estadual, seja Federal ou todos eles ou alguns deles em algumas situações.

Eu acho que nós estamos vivendo um momento muito crítico. A gente pode até não ter tido o apagão da eletricidade, como já disse, mas nós estamos caminhando para o apagão da água, que é muito mais grave,

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o apagão hídrico.

Dando sequência, o Joaquim Guedes tem a palavra para suas considerações finais.

O SR. JOAQUIM GUEDES CORRÊA GONDIM FILHO - A Agência Nacional de Águas agradece o convite formulado para participar deste evento. Ela coloca à disposição da Comissão os seus dados, as suas informações, quando necessárias. E ela tem também, Deputado, essa preocupação de que nós estamos vivendo uma grave crise. Um número que sempre é colocado é o de que esta é a maior crise em 84 anos. Sabe qual é a explicação por que é a maior crise dos 84 anos? É que nós temos dados sistematizados, medidos a partir da década de 30. Se nós os tivéssemos a partir da década anterior, seria outro número. É década de 30, por isso os 84 anos, porque é dessa época que nós temos dados efetivamente consolidados e sistematizados.

Então, nós temos uma situação, em algumas regiões do País, de dificuldade hídrica. A Agência a acompanha e, no seu site, presta todas as informações necessárias de que ela dispõe para a população, no intuito de trazer transparência às suas atividades.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Por último, tem a palavra a Maria Luiza.

A SRA. MARIA LUÍSA RIBEIRO - Eu quero agradecer, em nome da SOS Mata Atlântica, ao Deputado, à Comissão. Continuamos à disposição.

Aos colegas da ANA, do IBAMA, digo que, às vezes, como sociedade civil ou numa organização ambientalista, a gente fala com paixão, mas a gente reconhece a excelência técnica de todos os funcionários, das pessoas que atuam nesses órgãos de controle e de gestão.

O que a gente precisa é de um olhar com importância, com atenção política para essa questão estratégica da água. Essa crise, com certeza, não veio e já vai passar. Ela é só um alerta de que nós temos que mudar o comportamento, de que nós temos que rever nossas legislações, sendo mais rigorosos, e não mais flexíveis, como aconteceu nos últimos 2 anos.

Muito obrigada. Ficamos à disposição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Sarney Filho) - Obrigado.

Declaro encerrada a presente reunião.

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