design e artesanato: o sentido do fazer manual...
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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE
DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU
SÃO PAULO, SETEMBRO /2012
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE
DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO MESTRADO EM DESIGN
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU
SÃO PAULO, SETEMBRO /2012
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE
DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE DISSERTAÇÃO DE MESTRADO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design. Orientadora Profa. Dra. Márcia Merlo
São Paulo, setembro/2012
UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI SAVANA LEÃO FACHONE
DESIGN E ARTESANATO: O SENTIDO DO FAZER MANUAL NA CONTEMPORANEIDADE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Design – Mestrado, da Universidade Anhembi Morumbi, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Design. Examinador externo Paulo Roberto Monteiro de Araújo, Doutor, Universidade Presbiteriana Mackenzie Examinadora Interna Gisela Belluzzo de Campos, Doutora, Universidade Anhembi Morumbi Orientadora e presidente da banca Márcia Merlo, Doutora, Universidade Anhembi Morumbi
São Paulo, setembro/2012
Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial do trabalho sem autorização do autor.
SAVANA LEÃO FACHONE
Mestranda em Design pela Universidade Anhembi Morumbi. Especialista em Artes Visuais pelo SENAC e graduada em Design de
Moda pela UNIC. Atua como pesquisadora em design e artesanato em Cuiabá – MT ([email protected])
F127d Fachone, Savana Leão
Design e artesanato: o sentido do fazer manual na
contemporaneidade / Savana Leão Fachone. – 2012.
113f. : il.
Orientador: Profa. Dra. Márcia Merlo.
Dissertação (Mestrado em Design) – Universidade
Anhembi Morumbi, São Paulo, 2012.
Bibliografia: f.103-113.
1.Design. 2. Artesanato. 3. Convergência. 4.Fazer manual. 5.
Contemporaneidade. I. Título.
CDD 741.6
DEDICATÓRIA
Ao meu marido, Flávio, por viabilizar a oportunidade de estudo e crescimento intelectual e por acompanhar tudo de perto, sempre dando apoio incondicional; Aos meus filhos, William e Júlia, pela torcida e força nos momentos difíceis, compreendendo os períodos de minha ausência; À minha mãe, Graça, pelos sábios conselhos e por ser minha inspiração diária;
Aos meus irmãos, Sidney, Deivy e Manoela, pela simples existência; À minha sogra, Ivone, por estar sempre por perto na minha ausência; À dona Eliete e dona Tereza, por dedicar parte da vida a cuidar do meu lar.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todos aqueles que contribuíram para a realização deste trabalho, em particular: Aos grandes e eternos amigos que fiz no mestrado em especial, a Juliana Zanettini, Luci Sifuentes, Luisa Simão, Natalie Rodrigues, e Viviane de Moraes; Aos queridos professores do mestrado, Profa. Dra. Gisela Belluzo, Profa. Dra. Cristiane Mesquita, Profa. Dra. Kathia Castilho; À Dra. Ana Cristina C. Gonçalves, pelo apoio incondicional nos tempos difíceis; À minha orientadora, Prof. Dra. Marcia Merlo, pela paciência e dedicação; Ao artesão Osmar, pela simplicidade e entusiasmo; À Antonia, pela simpatia e cuidado
RESUMO Esta dissertação traz a análise de experiências que vinculam práticas de trabalho e vivências cotidianas, tendo por objeto de estudo o sentido do fazer artesanal na contemporaneidade. Para isso, dois distintos contextos de produção são abordados: o primeiro é o de um artesão ceramista pertencente à cidade de Cuiabá, Mato Grosso. O segundo diz respeito ao trabalho de um designer ceramista com ateliê na cidade de Nova Friburgo, Rio de Janeiro. O estudo traça um paralelo entre artesão e o designer, sinalizando os pontos convergência entre os campos do design e do artesanato, identificando relações híbridas (CANCLINI, 2008), no intuito de articular as informações oriundas de seus processos de produção e verificar questões relacionadas ao desenvolvimento de seus artefatos no processo de fabricação artesanal, a fim de conhecer e entender o sentido do fazer manual nos dias atuais.
Palavras-chave: 1.Design. 2. Artesanato. 3. Convergência. 4.Fazer manual. 5. Contemporaneidade
ABSTRACT This paper provides an analysis of experiences that link work practices and daily experiences, with the object of study is the sense of craftsmanship in contemporary times. for this, two different production contexts are discussed: the first is that of an artisan potter belonging to the city of Cuiabá, Mato Grosso. The second concerns the work of a designer with a studio potter in the city of Nova Friburgo, Rio de Janeiro. The study draws a parallel between artisan and designer, signaling the convergence points between the fields of design and craft, identifying relationships hybrid (Canclini, 2008) in order to articulate the information from their production processes and verify development issues of its artifacts and the steps taken during the process of manufacturing handcrafted in order to know and understand the meaning of craftsmanship today. Keywords: 1.Design. 2. Craft. 3. Convergence. 4. Craftsmanship. 5. Contemporaneidade.
(...) Não se deve tirar a conclusão de que minhas opiniões inspiram-se em nostalgia de uma época que não pode mais voltar. Pelo contrário, minhas opiniões sobre o trabalho estão dominadas pela nostalgia de uma época que ainda não existe.
Harry Braverman, Trabalho e Capital Monopolista: A degradação do trabalho no século 20, 1987
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................. 13
Capítulo 1 – Design, Sentido do Trabalho e Contemporaneidade
1.1 Para pensar o trabalho.............................................................................................................. 1.2 Algumas considerações sobre a história do trabalho...............................................................
1.2.1 O design, o trabalho e o movimento Art and Crafts............................................... 1.3 O sentido do trabalho humano: algumas transformações........................................
1.3.1 A dimensão subjetiva do trabalho na contemporaneidade....................................
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19 22 28 30 33
Capítulo 2 – Design e Artesanato: Domínios do Fazer Humano
2.1 Design, artesanato e cultura material......................................................................................... 2.2 Design e artesanato: aproximações e distanciamentos.............................................................. 2.3 Perspectivas do artesanato na sociedade contemporânea........................................................
Capítulo 3 – Design e Artesanato: O Fazer Manual na Contemporaneidade
3.1 Contexto cerâmico matogrossense: suas mudanças e ressignificações.................................... 3.1.1 O fazer cerâmico artesanal de Osmar Virgílio da Silva.......................................... 3.1.1.1 Primeiro encontro.................................................................................................. 3.1.1.2 Segundo encontro..................................................................................................
3.2 Percurso criativo do designer ceramista Gilberto Paim................................................................ 3.3 O fazer artesanal: uma questão de resistência?............................................................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................................................................
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................................
37
37 42 52
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61 68 71 82 89 97
100 103
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Quadro de Charles Pearce, 1896. Detalhe do trabalho 23 Figura 2: Trabalho humano 31 Figura 3: Os filtros do artista cuiabano Sebastião Silva 62 Figura 4: Cerâmica cuiabana 64 Figura 5: Índio Bororo em traje ritualístico 64 Figura 6: Santo São Gonçalo 64 Figura 7: Cerâmica São Gonçalo Beira Rio 66 Figura 8: Artesãs de São Gonçalo Beira Rio 66 Figura 9: Osmar e Mestre Vitalino 70 Figura 10: Fachada da casa do artesão Osmar 71 Figura 11: Fachada lateral direita da casa 72 Figura 12: Jogo de chá feito por Osmar 72 Figura 13: Sala da casa do artesão Osmar 73 Figura 14: Sala da casa do artesão Osmar 73 Figura 15: Oficina no fundo da casa do artesão 74 Figura 16: O artesão trabalhando a argila no torno 75 Figura 17: O artesão e suas tarefas domésticas 76 Figura 18: Mulher do artesão Osmar 76 Figura 19: Artesão Osmar no seu ofício 78 Figura 20: As mãos do artesão Osmar 79 Figura 21: Forno construído por Osmar 80 Figura 22: “Barro Vivo” Loja da família 81 Figura 23: Endereço da casa de Osmar 82 Figura 24: Osmar na frente da sua casa 83 Figura 25: “Milheiro de argila” 85 Figura 26: Explicando o novo processo 85 Figura 27: Quebrando o tijolo de argila não queimado 85 Figura 28: Mostrando o ponto da argila para o torno 86 Figura 29: Levantando a argila no torno 86 Figura 30: Modelando a argila no torno 87 Figura 31: Peças secando ao ar livre 87
Figura 32: Na fase da queima no forno que ele mesmo construiu
87
Figura 33: Osmar, sua filha caçula e seu violão 87 Figura 34: Gilberto Paim 90 Figura 35: Uma imagem da amostra em Heidelberg, na Alemanha.
91
Figura 36: Peças da coleção “A quatro mãos” 92 Figura 37: Interior do ateliê de Gilberto e Elizabeth, em Nova Friburgo
92
Figura 38: Gilberto e Elizabeth analisando as fotos da coleção 93 Figura 39: Gilberto amassando a argila branca de porcelana 93 Figura 40: Piões de porcelana, Gilberto Paim, 2006 94 Figura 41: Gilberto desenhando o objeto cerâmico 95 Figura 42: Esboço da peça de Paim 95 Figura 43: Umidificando a argila 95 Figura 44: Na modelagem da argila 95 Figura 45: Levantando a argila no torno 96 Figura 46: Medindo a circunferência 96 Figura 47: Usando uma de suas ferramentas 96 Figura 48: Encaixando a base da peça 96 Figura 49: Objetos de cerâmicas espalhados pela casa de Paim 96
13
INTRODUÇÃO
Esta dissertação traz a análise de experiências que vinculam
práticas de trabalho e vivências cotidianas, tendo por objeto de
estudo o sentido do fazer artesanal como forma de resistência na
contemporaneidade. Para isso, serão abordados dois contextos
distintos de produção: o primeiro é o de um artesão residente em
Cuiabá, Mato Grosso. O segundo diz respeito ao trabalho de um
designer ceramista, conhecido internacionalmente, que reside na
cidade de Nova Friburgo, Rio de Janeiro.
O estudo traça um paralelo entre artesão e designer,
sinalizando os pontos de convergência na questão do fazer
manual e os possíveis pontos de divergência entre os campos do
design e do artesanato. Identifica, também, relações híbridas
(CANCLINI, 2008), no intuito de articular as informações oriundas
do processo de produção de suas peças cerâmicas1, a fim de
conhecer e entender o sentido do fazer manual nos dias atuais.
Ao mesmo tempo, observa os saberes e fazeres que
integram o conjunto de habilidades para criação de artefatos
cerâmicos, gerando oportunidades de ocupação e renda para
alguns trabalhadores e modo de vida para outros. Analisa,
também, as condições nas quais ocorre a assimilação desse saber
por designers e outros profissionais, referenciando
favoravelmente sua própria criatividade e sua produtividade.
A pesquisa foi limitada a estas duas situações devido à
necessidade de compreender a produção cerâmica artesanal
contemporânea a partir dos contextos local e global,
considerando similitudes nos modos de produção e com histórias
marcadas pelo fazer artesanal, que, em ambos os casos, revelam-
se como fundamental “modelador” da pesquisa.
1 Quando falamos em cerâmica, o fazemos de forma concisa e a relacionamos
a objetos utilitários e artísticos, feitos artesanalmente.
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No estudo do processo de produção da cerâmica artesanal
desenvolvida por Osmar Virgílio da Silva, artesão matogrossense,
esta pesquisa objetiva compreender como se dão as interações
entre sujeito artesão e artefato construído, e os passos
percorridos durante o processo de fabricação artesanal, a fim de
conhecer e entender sua concepção nos dias atuais.
Acreditamos que a atividade criativa do artesão e do
designer ceramista seguem metodologia projetual semelhante,
mas o caráter empírico do primeiro gera, por vezes,
discriminação.
Decerto que nenhuma escolha é aleatória e todas elas têm
sua razão de ser. O esclarecimento dos motivos que provocaram
a opção pelo tema provavelmente pode contribuir para um maior
conhecimento da trajetória desta pesquisadora, pois eles derivam
das experiências com artesãos durante a minha formação
acadêmica, além das escolhas profissionais que levaram minha
pesquisa na área de design para a discussão da relação com o
artesanato. Desde a graduação em Design de Moda, na
Universidade de Cuiabá, minha experiência tem sido trabalhar
com artesãos, mais especificamente com famílias artesãs.
No início, tive a oportunidade de me relacionar com
indivíduos e grupos que ainda trabalhavam e viviam sob lógicas
sociais e culturais diversas da cultura homogeneizante. Foi
quando percebi a relação entre homem e trabalho num universo
ideológico que envolvia os processos de produção manual.
A dinâmica utilizada nos trabalhos que desenvolvíamos
consistia em oficinas de artesanato organizadas pela instituição
de ensino e pelo poder público da cidade, numa parceria que
buscava a autossuficiência dos artesãos e das comunidades
artesanais locais através da comercialização de produtos. Esse
tipo de oficina funcionava como catalisador de ideias, pois não
havia regra ou forma única de realizar as atividades – o objetivo
era despertar o sentimento de cidadania, estimular a
conscientização ecológica e proporcionar alternativas para
geração de renda. Além da capacitação dos artesãos, as
atividades tinham o intuito de despertar a criatividade para
confecção de peças originais, viáveis e de baixo custo. Neste
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sentido, pensava-se a reconfiguração do produto pelo design a
fim de facilitar a sua inserção no mercado, além de dar corpo ao
papel social dos futuros designers.
Essa experiência despertou meu olhar analítico sobre o
artesanato como importante recurso de desenvolvimento, em
razão do impacto econômico que produz em determinadas
regiões do país, pela demanda do mercado, a geração de
ocupação e renda e o aproveitamento equilibrado dos recursos
naturais. Ademais, a atividade ajuda a preservar as tradições
locais e a fortalecer o sentimento de pertencimento.
Portanto, esta investigação representa o desdobramento de
questões em torno do fazer artesanal como forma de resistência,
motivada por reflexões acerca do sentido deste trabalho nos
tempos atuais.
A realização de um trabalho que seja útil para a sociedade
ajuda a viabilizar desenvolvimento, valorização, reconhecimento
e, consequentemente, autorealização. Por outro lado, um
trabalho em choque com valores pessoais tem mais dificuldade
de obter reconhecimento – por muitos ou por muito tempo. É
mais costumeiramente improdutivo, rotineiro ou pouco
desafiador. A cerâmica é, sem dúvida, um tema relevante, como o
são todos aqueles que resultem numa obra e que envolvam um
criador.
O estímulo à promoção de atividades econômicas baseadas
no fazer manual ou em manufatura similar tem permitido a
inclusão produtiva de segmentos populacionais menos
favorecidos, particularmente aqueles retidos no conhecimento
informal – aprendido em relacionamentos primários e
intergeracionais –, e o ensino formal, da lógica da educação para
o mundo do trabalho (MARINHO, 2007).
A motivação também está na crença de que, com incentivo
e valorização, é possível inserir a produção artesanal no sistema
produtivo, fortalecendo o desenvolvimento local com valor
agregado a partir da associação dessa produção ao contexto
sociocultural. Favorece, por conseguinte, a aceitação do
artesanato no mundo contemporâneo como mercadoria
diferenciada e de produção não massificada.
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Assim, esta pesquisa orientou-se para a compreensão do
fazer manual na contemporaneidade como processo de
atribuição de significados, pautando a prática cerâmica do
artesão matogrossense Osmar Virgílio da Silva e do ceramista
carioca Gilberto Paim, assim como questões pertinentes à vida e
ao processo produtivo de ambos. Acreditamos que investigação
sobre o sentido do trabalho manual leva a indagar se ainda há
espaço na vida contemporânea para esse tipo de atividade e
quais as garantias de sua permanência.
Caminhos de Pesquisa
Na investigação empírica, feita no contexto do artesão
Osmar, adotou-se a abordagem qualitativa, que permite maior
aprofundamento. Esse caminho possibilitou registrar a história de
vida da família sob a forma de estudo de caso. Assim, buscou-se
estabelecer uma relação entre o que foi apresentado pelo artesão
e o que foi pesquisado em relação ao designer ceramista e os
contextos sociais em que se inserem, conseguindo reconstruir
experiências das trajetórias profissionais vinculadas à própria
história social.
Talvez a parte mais significativa deste projeto tenha sido a
coleta de depoimentos, que foram pontuados por sentimentos e
confissões a respeito do trabalho e da vida, com detalhes acerca
das tradições, crenças, manifestações culturais e práticas de
trabalho.
Ao analisar o processo de construção de artefatos e seu
significado para os atores sociais envolvidos, revelou-se como
essas pessoas constroem e transformam suas histórias, suas
relações sociais e o sistema de representação que as orienta por
diferentes planos da vida social.
Alguns dilemas surgiram, centrados nas dificuldades
teóricas e práticas que geralmente aparecem em torno das
metodologias e das interpretações do cotidiano enfrentadas por
pesquisadores que vivenciam a realidade da pesquisa de campo.
Os resultados dessa iniciativa foram organizados em três
capítulos:
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O primeiro capítulo aborda o mundo do trabalho até a
contemporaneidade, observando a reestruturação produtiva e
cultural facultada pelo processo de industrialização acelerado
durante o afloramento da idade moderna, além de discutir a
divisão do trabalho e o aparecimento da figura do designer.
No segundo capítulo, é destacado o referencial teórico
central para o desenvolvimento da pesquisa sobre Design e
Cultura Material. Ali, é debatido o conceito de design que vem a
constituir um referencial teórico para estruturar a pesquisa
proposta.
No terceiro capítulo, dois contextos são analisados: de um
lado, o de Osmar Virgílio da Silva, seu cotidiano, o espaço da
produção e o sentido que o artesão dá ao seu trabalho,
juntamente com o contexto sociocultural cuiabano; de outro
lado, a experiência de Gilberto Paim e as maneiras de construir
seus artefatos na possibilidade de verificar como se dão as trocas
culturais entre ambos.
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CAPÍTULO 1
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CAPÍTULO 1
DESIGN, SENTIDO DO TRABALHO E CONTEMPORANEIDADE
Os novos métodos de trabalho estão indissoluvelmente ligados a um determinado modo de viver, de pensar e sentir a vida; não é possível obter êxito num campo sem obter resultados tangíveis no outro. Antônio Gramsci, Maquiavel, a política e o Estado Moderno (1976).
1.1 Para pensar o Trabalho
O retorno a Karl Marx no bojo desta dissertação é
necessário para refletir acerca das questões concernentes ao
trabalho. Ainda mais quando se compreende o fazer artesanal
como uma prática laboriosa. Assim, encaramos que um dos
objetos de análise daquele teórico do século 19 continua regendo
o cotidiano contemporâneo, na esfera do trabalho humano na
sociedade capitalista. Suas ideias, cuja abordagem contribuiu para
desvendar a lógica dos processos sociais da época, também
denunciavam as contradições básicas desse sistema (BERMAN,
1998).
Em que pesem as mudanças e os problemas que afetam a
humanidade neste início do século 21, o pensamento do autor
alemão voltou à ordem do dia. Entretanto, esse retorno só fará
sentido se reconhecermos nessas mudanças novas pistas para a
análise dos desafios impostos pela contemporaneidade.
Têm sido cada vez mais frequentes as pesquisas
relacionadas às novas direções dos estudos de Marx, cujas
determinações estruturais têm recebido considerável atenção no
mundo acadêmico, embora ainda sejam objeto de intensas
disputas teóricas, segundo Alvaro Bianchi (2007), professor do
Departamento de Ciência Política do Instituto de Filosofia e Ciências
Humanas da UNICAMP (IFCH) e diretor do Centro de Estudos Marxistas
(CEMARX).
O presente estudo traz à tona a valorização do sentido do
trabalho humano – discussão relevante em dias atuais.
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Diversos estudiosos da área têm dedicado anos de pesquisa
e nos auxiliam com suas contribuições, como: Albornoz (1986-
2004), Astrada (1968), Braverman (1981-1987), Huberman,
(1976). Um dos aspectos que chama atenção é a existência de um
ponto comum entre esses autores: em suas análises, todos eles
tomam como referência a concepção de trabalho em Marx – uns
para questionar, outros para fundamentar suas posições.
A contribuição de Max não se restringe à análise das
relações de trabalho na sociedade capitalista, agregando
conceitos como: concreto e abstrato, morto e vivo, embora deixe
transparecer uma teoria antropológica do trabalho em vários de
seus textos (ALBORNOZ, 1986).
Max (2002) criticou o modelo de exploração do capitalismo,
que vê a força de trabalho apenas como mercadoria. Destacou
que só o trabalho gerava riqueza, e quem a produzia não tinha
direitos, portanto, a história do homem consolidou-se na dos
interesses opostos, subjacentes a toda relação social. A alta
centralidade das atividades laborais na vida das pessoas, como
autoconstrução do ser humano, surge nesta concepção histórica.
O trabalho foi, na realidade, o personagem central na teoria
marxista, não apenas com a emancipação da classe trabalhadora,
mas com a libertação do homem em relação ao trabalho
alienante e explorador. Essas referências oportunizam o
entendimento entre homens, o sentido e o valor do trabalho.
Na análise de Marx, encontramos o modo de produção
capitalista e suas relações de produção e de circulação ou, em
outras palavras, “a lei econômica do movimento da sociedade
moderna” (MARX, 2002, p. 18). Aqui, o teórico considera o
trabalho em sua significação mais ampla, como possibilidade de
transformação da realidade natural e social. Para ele, os homens
produzem seus meios de vida e estabelecem relações sociais
baseadas nas condições materiais de sua existência. O estudo de
qualquer sociedade pressupõe essas relações sociais como ponto
de partida. Para ele, o trabalho é um processo ontológico:
Trabalho é um processo de que participam o homem e a natureza, processo em que o ser humano, com sua própria ação, impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza. Defronta-se com a natureza como
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uma de suas forças. [...] atuando ainda sobre a natureza externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza (MARX, 2002, p. 211).
Segundo Hobsbawn (1985) a base da teoria de Marx sobre o
desenvolvimento social e econômico é a análise do homem como
animal social que, ao realizar o trabalho, cria e reproduz sua
existência no cotidiano. Assim, percebe-se que a categoria acolhe
uma definição de homem como sendo aquele que, para ser,
necessita produzir os seus próprios meios de subsistência
material e simbólica.
Nesta análise, é premente levar em conta os efeitos do
desenvolvimento tecnológico mundial, considerando que o
processo de adaptação das técnicas de produção material para a
forma capitalista se deu sobre uma cultura de produção
artesanal. Os traços fundamentais desse ajustamento definiram e
caracterizaram o Design e, principalmente, sua importância e
responsabilidade dentro do contexto socioeconômico e na
interação entre homem e trabalho. As mudanças estruturais que
ocorreram e os fatos geradores daquele cenário, além das
interações sociais e culturais que marcaram sua eclosão, são
sentidas e analisadas até os nossos dias.
Nos limites desta pesquisa, optou-se por traçar um
panorama a partir da Revolução Industrial, onde o trabalho foi
substituído por um modelo que se aproximasse da lógica de
expansão do sistema capitalista, momento em que sociedade e
comunidade se organizavam e se transformavam
constantemente.
Com essa perspectiva, de um lado representando um dos
enclaves econômicos do mundo atual, e de outro, estabelecendo
diferentes padrões para a constituição de alianças produtivas nos
territórios, há que se entender melhor o trabalho humano e suas
formas de institucionalização.
Aceitando o desafio de refletir sobre essas questões, a
análise começou pela revisão dos conceitos básicos de trabalho, a
fim de embasar a reflexão proposta neste capítulo introdutório.
22
1.2 Algumas considerações sobre a história do trabalho
A história do trabalho acompanha a história da própria
humanidade, adquirindo diferentes significados conforme a
cultura, os valores, a visão e o espírito de cada época. Segundo
Martins (1994), desde as primeiras sociedades humanas até os
dias atuais, o trabalho assumiria os seguintes significados.
Embora, não acreditamos que tenha sido dessa forma, tão
categórica, colocamos na forma de tabela para melhor
visualização:
Na pré-história Uma atividade lúdica
Na Antiguidade Maldição divina
Nos primórdios do
Cristianismo
Forma de expiação do pecado
original; meio de compaixão
No Cristianismo da Idade
Média
Remédio para as tentações
Com a Reforma Luterana Direito e dever ou um meio para a
salvação
Na Revolução Industrial Expressão da criatividade humana
No início do século 20 A maior obsessão
Nos dias correntes Atividade em questionamento
No porvir Resgate de seu sentido original
Tabela 1: Na tabela, a época e o significado dado ao trabalho. Fonte: acervo pessoal
Na reflexão de Carlos Astrada (1968), a ascendência
etimológica da palavra “trabalho” em português, trabajar em
espanhol, como a do travailler francês e do travagliare italiano, é
o vocábulo latino tripaliare, do substantivo tripalium – aparelho
de tortura formado por três paus onde eram amarrados os
condenados, gladiadores e escravos romanos. O trabalho tinha
conotação negativa e sua definição original influenciou alguns
idiomas de acordo com o contexto histórico e social.
23
O sentido do trabalho estava relacionado aos valores
religiosos da época, era visto como uma ocupação para livrar o
indivíduo das possíveis tentações. Não propiciava satisfação aos
trabalhadores, era realizado para atender aos objetivos da Igreja.
Era considerado uma punição para o pecado e, a partir dele, era
possível a purificação do corpo e alma (ALBORNOZ, 1986).
Figura 1: Quadro de Charles Sprague Pearce, 1896. Detalhe do trabalho. Fonte: www.apropucc.org.br. Acesso: 20/05/2012
O significado de sofrimento e de punição relacionado ao
termo trabalho perpassou a história da civilização e, por muito
tempo, a palavra exprimiu uma experiência dolorosa de
padecimento, cativeiro, castigo, punição. Esta concepção atingia
o estatuto jurídico e político dos trabalhadores (BUENO, 1988).
A valorização positiva do trabalho emergiu na Europa, dada
à capacidade de produção e a concepção de vida e sociedade
vivenciadas na época. As organizações produtivas conhecidas na
sociedade eram as corporações de ofício, que regulavam o
trabalho artesanal. Essas corporações garantiam a atividade aos
trabalhadores, inibindo a concorrência e controlando a qualidade
dos produtos. Elas conseguiam assegurar o crescimento da vida
urbana por meio do desenvolvimento comercial para a
emancipação das cidades incipientes (CARDOSO, 2008).
Essa atividade se caracterizava pela espontaneidade, na
medida em que os artesãos eram livres para organizar seu
trabalho e tinham controle sobre todo o processo produtivo. Os
artesãos “eram donos do espaço físico da produção, das
matérias-primas, dos meios de produção e, por último, podemos
dizer que eram senhores da totalidade do processo de trabalho”
(FORTY, 2007, pp. 67-68). Não havia separação entre saber e
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fazer, entre concepção e execução. Além de se reconhecer no
produto do seu trabalho, o artesão tinha acesso a ele.
Nas relações de produção, as corporações eram regidas por
uma hierarquia piramidal. O topo era ocupado pelo mestre
artesão, também proprietário das ferramentas, da matéria-prima
e dos produtos finais. A base era preenchida pelos aprendizes,
que, em troca de seu trabalho, recebiam do mestre moradia,
alimentação e vestuário (MACHADO, 2007).
Mestres e aprendizes exerciam seus ofícios em todas as
fases – da matéria-prima ao produto final. Dentro dessa
estrutura, não se realizava apenas uma atividade laboral;
desenvolviam-se habilidades que proporcionavam satisfação
pessoal (ALBORNOZ, 2004).
Com o passar do tempo, a introdução de novas tecnologias
aplicadas à produção e o aparecimento de ideologias ligadas ao
progresso individual e social, o conceito de trabalho alterou-se. A
ideia de tortura, maldição, castigo, deu lugar ao trabalho como
fonte de realização, como meio de dignificação do indivíduo.
Estabeleceram-se também mudanças significativas na estrutura
da sociedade, entre as quais a revolução agrícola e o surgimento
das cidades (CARDOSO, 2008).
Com o aparecimento dos grandes centros, uma mudança
importante ocorreu a partir da crescente migração do homem do
campo para a cidade, atraído pela imagem de dinamismo da vida
urbana e a possibilidade de ascensão social. Antes envolvidos
exclusivamente com os processos de produção agropecuária, os
recém-chegados passaram a se ocupar especialmente do
comércio e da indústria. Esse movimento se ampliou até a
transformação do sistema de produção na sociedade industrial,
em que o homem era essencialmente produtor (HUBERMAN,
1986).
Nesse âmbito, o trabalho fora incorporado à ideologia
burguesa como categoria universal e fundadora de toda a vida
social, como atividade natural de produção e troca de valores de
uso, necessária à reprodução material da vida em sociedade
(BAUMAN, 2001).
25
Entretanto, o marco das mudanças para os modelos de
organização do trabalho e as atividades humanas como os
conhecemos hoje foi a Revolução Industrial, na Inglaterra do
século 18, com mecanização dos meios de produção, oposição ao
modo artesanal – exclusivo, até então –, entre inúmeras
transformações agudas e definitivas. Este período de revolução
faz parte de um rol de mudanças ainda maior, conhecido como
Modernidade2, que transformou valores, rompendo com os
costumes tradicionais.
Essas mudanças dependeram muito menos de novas
máquinas do que se costuma imaginar. Antes de tudo, deveram-
se à organização do trabalho, à produção e à distribuição, ou seja,
mudanças de ordem social, muito mais do que tecnológica
(CARDOSO, 2008).
2 Segundo Berman (1986), a Modernidade compreende um tempo histórico
que pode ser dividido em três fases: a primeira vai do século 16 ao 18 e é marcada pelo período de transição; as pessoas iniciam a experiência com a vida moderna. A segunda fase, do final do século 18 ao início do 19, aflora os sentidos revolucionários nas pessoas, provocando mudanças nos meios sociais, pessoais e políticos. A grande mudança de valores, segundo o autor, acontece na terceira fase, e é marcada pela expansão da modernização no século 20.
A consciência comum em relação às técnicas do processo
produtivo diminuía, enquanto crescia a sua especialização. A
indústria buscava maior produtividade para atender à sociedade.
Dividir3 o trabalho e particularizar determinadas áreas do
processo de produção foi uma forma de aperfeiçoar o resultado
final (HUBERMAN, 1986).
A divisão do trabalho instituída nos processos de fabricação
industrial superava o modo de produção artesanal. Não só o
trabalho foi dividido, mas a vida também. Segundo Forty (2007):
A maior parte da produção e do comércio era realizada nas residências dos artesãos, comerciantes ou profissionais envolvidos, e compreendia-se a casa como um lugar que incorporava o trabalho às atividades habituais de
3 A expressão “divisão social do trabalho” é vista em estudos de diferentes
áreas do conhecimento humano, como economia, sociologia, antropologia, história etc. Porém, é empregado nesta dissertação no sentido utilizado por Marx (2002) para indicar o modo como o trabalho foi distribuído nas estruturas socioeconômicas, no que tange a formação da força de trabalho. Essa divisão se dá entre quem concede e quem executa o trabalho, isto é, entre os donos dos meios de produção e os donos da força de trabalho. Para Marx, essa divisão sempre existiu, é inerente ao trabalho humano e diz respeito às tarefas econômicas, políticas e culturais.
26
morar, comer, dormir e assim por diante (pp. 137-138).
A antiga relação individual do artesão com sua ferramenta
de trabalho ofuscou-se e os trabalhadores inseridos nas relações
de produção passaram a atuar frente às máquinas, divididos
hierarquicamente e organizados em unidades de produção. A
industrialização fragmentou o trabalho, dividindo-o em tarefas e
em responsabilidades. Isso possibilitou aos comerciantes exercer
o controle sobre o ritmo, o tempo e o volume da produção.
Braverman faz uma interessante atualização da análise de Marx:
Cada uma das fases do processo de trabalho é separada, tanto quanto possível, do conhecimento especializado e da formação, e reduzido a uma simples operação. Enquanto isso, as relativamente poucas pessoas que tiveram acesso ao conhecimento especializado e à formação, são libertadas, na medida do possível, das obrigações relacionadas com as operações simples. Deste modo, todo o processo de trabalho se enquadra numa estrutura que nos seus extremos polariza aqueles cujo tempo é infinitamente valioso, e aqueles cujo tempo quase nada vale. Inclusivamente, poder-se-ia designar isto como
a lei geral da divisão capitalista do trabalho. Esta não é a única força que atua sobre a organização do trabalho, mas é certamente a mais poderosa e a mais abrangente. Os seus resultados, mais ou menos conseguidos em todo o tipo de indústria e de ocupação, dão um forte testemunho da sua validade. Ela molda não apenas o trabalho, mas também as populações, pois a longo prazo leva à criação de uma força de trabalho massificada e desqualificada que é a característica principal das populações em países capitalistas desenvolvidos (BRAVERMAN, 1987, pp. 82-83).
O trabalho se separava do resultado, num processo
apontado, por Marx, como alienação (HUBERMAN, 1986). O que
caracterizava a alienação não era a divisão do trabalho em si, mas
a redução das tarefas produtivas em parcelas sem significado ou
sem relação com o produto final do trabalho. Vale lembrar que
este mesmo autor considerava o capitalismo um moderno
modelo de produção no que diz respeito à ampliação das forças
produtivas, mas, ao mesmo tempo, pobre porque que se apoiava
na exploração do trabalhador (BRAVERMAN, 1981).
27
O trabalho industrial impunha uma cultura própria, de
economia de gestos, de produzir mais no menor tempo possível,
de acumulação de bens (CARDOSO, 2008). Uma cultura que ia
contra a cultura do campo, onde o trabalho, ainda que longo e
cansativo, respeitava os ritmos naturais 4.
A expectativa que se tinha com a fragmentação era de que
as tarefas, quando reduzidas no tamanho e na complexidade,
dentro de um processo, proporcionavam melhor desempenho
quanto à quantidade produzida. Este aspecto diz respeito à
eficiência que se conseguia em termos de volume no final da
produção dos artefatos. O trabalhador deveria adequar-se aos
novos tempos. A quantidade e qualidade do trabalho produzido
não dependiam diretamente da capacidade do operário. Pela
primeira vez, o processo produtivo saía das mãos do artesão e
passava a ser de domínio das máquinas, ou seja:
4 O ritmo natural do tempo conhecido e vivido no campo era voltado para a
colheita e se resumia em dia e noite, ou ainda em estações do ano. A distribuição do tempo, no decorrer do dia, acontecia de maneira natural. Até mesmo os limites do corpo e da necessidade natural do trabalho, era o que determinava o inicio e o fim das tarefas (CAMARGO, 1986).
Com a sociedade industrial o trabalho torna-se público, isto é, sai da esfera doméstica. A vida passa a ser enquadrada pela obrigação/rotina da fábrica e ao escritório. Intensifica-se o trabalho humano, racionaliza-se, maximizam-se as tarefas pela especialização. Eficácia e rendimento máximo passam a ser as coordenadas fundamentais da sociedade produtiva (SEARA, 2003, p. 11).
O desenvolvimento prático do trabalho se acentuava no
sistema capitalista. O trabalho começava a perder seu caráter
humanizador e se transformava em um instrumento de
sobrevivência (ARRUDA, 2001), alterando valores substanciais
concernentes ao trabalho e seu significado.
Desse modo, a partir da análise de Forty (2007), que afirma
que a história do design também é a história das sociedades, as
explicações sobre suas mudanças devem apoiar-se, também, na
compreensão de como o design afetou os processos das
economias modernas e é afetado por eles 5.
5 Um episódio histórico importante sobre a divisão do trabalho humano e o
papel do designer foi o estabelecimento da Cerâmica Wedgwood, fundada na
28
1.2.1 O design, o trabalho e o movimento Arts and Crafts
Com o conjunto de mudanças que se seguiram, as grandes
fábricas, aos poucos, foram tomando o lugar de pequenas
oficinas artesanais. Isso eliminava a necessidade de empregar
trabalhadores com alto grau de capacidade técnica. Era
necessário apenas um “designer” 6, escolhido por suas
habilidades (CARDOSO, 2008).
É complexo falar de surgimento histórico para uma
atividade como o design, pois se trata de concepção de produtos
que satisfaçam as necessidades humanas. Entretanto,
observamos que a divisão do trabalho é considerada um dos
fatores de reconhecimento da prática projetual como atividade
Inglaterra em 1759 por Josiah Wedgwood. Por mais de dois séculos, a empresa estabeleceu um padrão em todo o mundo para as louças finas e cerâmicas decorativas (FORTY, 2007). 6 O termo designer é colocado entre aspas, por que na época não havia esta
denominação, sendo que a transformação dessa figura separado da experiência produtiva e habilitado a gerar projetos, fez parte de um longo processo histórico que teve seu início na organização das primeiras escolas de design no século 19 (CARDOSO, 2008).
dentro do processo produtivo. O historiador Forty (2007, p. 50)
expõe que:
Quando a manufatura foi dividida em processos realizados por diferentes trabalhadores, foi necessário adicionar mais um estágio, o da preparação de instruções para os vários operários: na verdade, um estágio de design.
Cardoso (2008) fala que os primeiros designers eram
aqueles trabalhadores promovidos por questão de habilidade,
que passariam para uma posição de controle e concepção em
relação às outras etapas da divisão:
Não era raro encontrar nas fábricas de cerâmica, os modeladores, responsáveis pela etapa de configuração de peças que seriam produzidas, que tinham o controle sobre os aspectos mais decisivos do processo produtivo. Eles recebiam mais que o artesão comum, entretanto, essa despesa era vista como vantagem, visto que o emprego de um profissional qualificado para elaborar o projeto era garantia de maior aceitação comercial das peças (CARDOSO, 2008, p. 31).
29
Assim, um dos aspectos mais interessantes da transição da
cultura artesanal para a cultura industrial foi o crescente uso de
projetos para uma produção em série. Mas, de acordo com
Margolin (2004, p. 43), "desde a Revolução Industrial, o
paradigma de design dominante tem sido o de desenhar para o
mercado”, para atender uma necessidade imediata por
profissionais capazes de adequar os desejos do consumidor e os
objetos anteriormente manufaturados aos novos processos
industriais de fabricação.
O que confirma o que Heskett (1998) diz sobre o poder
humano de controlar e dar forma ao seu ambiente a partir da
indústria mecanizada, alterando quantitativa e qualitativamente a
vida humana. E ainda, sobre o design ter surgido da tradição
artesanal, mas ter se desenvolvido de tal forma que se tornou
cada vez mais distante de sua origem. Durante seu
desenvolvimento, foi levado à atividade puramente artística, o
que "fez com que parecesse fútil e relegou-o à condição de mero
apêndice cultural" (FORTY, 2007, p.12).
Entretanto, à medida que esse sistema se desenvolvia, o
trabalho do designer passava a ser respeitado e influenciava o
desenvolvimento de inúmeros artefatos para a sociedade que
crescia aceleradamente. Esse profissional adquiria grande
importância para o mundo capitalista, trazendo implicações
significativas à cultura e à vida em sociedade (CARDOSO, 2008).
Porém, se o desenvolvimento tecnológico tornou possível a
passagem gradativa do trabalho manual para o trabalho
mecanizado; avanço nos índices de produtividade; redução de
custos e aumento dos lucros; a qualidade na criação e execução
dos produtos diminuiu, tornando apropriadas as ideias e
pensamentos do movimento conhecido como Arts and Crafts 7
(Artes e Ofícios).
Esse movimento surgiu na Inglaterra, na segunda metade
do século 19, com diversas organizações e oficinas voltadas para a
7 A herança do movimento pode ser aferida até hoje em todo o mundo, pela
propagação de estúdios de cerâmica, tecelagem, joalheria e outros, e pela organização de diversas escolas de artes e ofícios. In: Enciclopédia Itaú Cultural Artes Visuais. www.itaucultural.org.br. Acesso: Acesso: 25/03/2011.
30
produção de artefatos de vários tipos em linha artesanal ou
semiartesanal.
Os protagonistas John Ruskin e William Morris, além de
buscarem uma relação igualitária entre os trabalhadores
envolvidos na produção, objetivavam a integração entre projeto e
execução; a união entre o saber e o fazer; manutenção de
padrões elevados em termos de qualidade de materiais;
revalorização das artes e dos ofícios; renascimento do artista
artesão, acreditando ser possível um mundo cunhado pelas mãos
humanas por meio do trabalho, preservado no seu sentido maior
(BARATA, 2008), em contraposição à massificação industrial.
Ruskin pode ser considerado um dos pioneiros,
influenciando pensadores e projetistas com suas ideias e
conceitos, ampliando consideravelmente seus argumentos
durante todo o século 20. Ele se posicionava contra a divisão do
trabalho e a “mecanização” do ser humano, por acreditar que os
frutos da produção em série não justificavam a perda do “espírito
humano” (PINHEIRO, 2008).
1.3 O sentido do trabalho humano: algumas transformações
Pensar sobre o trabalho, hoje, é assumir uma postura
teórica sobre a sociedade atual. Todavia, acreditamos que as
mudanças expressivas por que passam as sociedades capitalistas,
desde as últimas décadas do século 20, não se ajustam à ideia de
ruptura com a sociedade dita moderna, do século passado. Assim,
podemos pensar em transformações e continuidades, pois, como
afirma Harvey (2000), “[...] há mais continuidade do que
diferença [...]” (p. 111) nos movimentos históricos em curso.
No início deste capítulo, foram apontadas as
transformações pelas quais passou e passa o mundo do trabalho,
que tem sido objeto de análise de diversas áreas do
conhecimento, como filosofia, psicologia, sociologia, antropologia
e outras. Considerando as transformações contemporâneas,
vários autores, como Antunes (1999), Morin (2001) e Tolfo (2005)
vêm investigando as implicações dessas mudanças e os sentidos e
significados atribuídos ao trabalho hoje.
31
Acreditamos, assim como Wanderley Codo (1999), que uma
vida cheia de sentido em todas as esferas do ser social somente
poderá efetivar-se por meio da destruição das barreiras
existentes entre tempo de trabalho e tempo de não trabalho.
Uma vida cheia de sentido fora do trabalho supõe uma vida
dotada de sentido dentro do trabalho. Quanto mais criativo e
completo for o trabalho, mais o homem cria-se a si mesmo.
Figura 2: Trabalho humano. Fonte: www.donizetimarcolino.blogspot.com.br. Acesso: 20/05/2012
De acordo com Morin (2001), há três circunstâncias
importantes pessoais em relação ao trabalho:
O sentido que uma pessoa encontra na função exercida;
O sentimento de responsabilidade em relação aos
resultados obtidos;
O conhecimento de seu desempenho no trabalho.
Muitos estudos sobre sentidos e significados do trabalho
vêm sendo realizados. Dentre as atuais pesquisas sobre o
assunto, destacam-se as de Hackman e Oldham (1976, apud
MORIN, 2001), que consideram um trabalho carregado de sentido
aquele se torna importante, útil e legítimo para quem o realiza.
Em relação às circunstâncias, os autores apresentam os seguintes
atributos ou dimensões principais do trabalho:
A identificação com o trabalho, ou seja, atividade não
alienante, na qual o trabalhador consiga identificar todo o
processo, desde sua concepção até sua finalização;
A multiplicidade de tarefas, trabalhos variados que
possibilitem o uso de várias competências humanas;
Autonomia, ou seja, o grau em que o trabalho permite
liberdade individual, independência, poder de decisão
32
para planejá-lo e determinar os procedimentos para sua
execução;
A significação do trabalho, ou seja, o cumprimento do
trabalho com impacto positivo na vida de outras pessoas
seja no contexto do próprio ambiente ou na sociedade.
Assim, acreditamos que para pensar o sentido do trabalho,
além de levantarmos questões sobre a sociedade e sua
organização, sobre o funcionamento da economia, das relações
laborais e de mercado, e questionar o modelo econômico
dominante, implica ainda discutir esses atributos.
No Brasil, muitos estudos sobre sentidos e significados do
trabalho também vêm sendo concretizados com base nas
investigações desenvolvidas pelo Meaning of Work – MOW
(TOLFO et al., 2005) – um grupo internacional de pesquisadores
que investiga a década de 1970 e o sentido e centralidade do
trabalho em diversos países.
Esses pesquisadores estabeleceram, a partir de estudos
empíricos, as seguintes dimensões: centralidade do trabalho
(importância atribuída a ele em determinado momento da vida
da pessoa), normas sociais sobre o trabalho (derivadas de valores
morais relacionados ao trabalho) e resultados valorizados do
trabalho (dimensão relacionada a motivações que levam a
trabalhar) (BLANCH, 2003; TOLFO & PICCININI, 2007).
Além da diversidade de pontos de vista teóricos, os estudos
empíricos nesse campo optam por usar ora a expressão sentidos,
ora significados do trabalho, às vezes como sinônimos, às vezes
como conceitos diferentes. Para tanto, aqui serão tomadas como
ponto de partida as seguintes concepções: os significados são
como construções elaboradas coletivamente em determinado
contexto histórico, econômico e social concreto. Já os sentidos
são uma produção pessoal decorrente da apreensão individual
dos significados coletivos nas experiências cotidianas. É
importante ressaltar as transformações pelas quais passam os
sentidos e os significados, uma vez que são construídos em uma
relação dialética com a realidade. Considerando essa relação, a
análise dos sentidos produzidos pelos sujeitos deve sempre
33
considerar seu vínculo com os significados produzidos
coletivamente e vice-versa. (TOLFO et al., 2005).
Apesar das diferenças, as duas abordagens compartilham a
compreensão sobre a indissociabilidade entre sujeito e realidade,
sendo os sentidos ou significados produzidos pelos sujeitos a
partir de suas experiências concretas.
Do mesmo modo, também é importante considerar a
articulação entre os processos identitários e de construção de
sentidos pelos sujeitos em seu cotidiano de trabalho. A seguir,
apresentamos uma breve discussão teórica sobre processos
identitários e suas relações com o trabalho contemporâneo,
como forma de subsidiar teoricamente as investigações
analisadas neste capítulo.
1.3.1 A dimensão subjetiva do trabalho na contemporaneidade
Consideramos importante assinalar que o contexto
produtivo contemporâneo vem passando por transformações
significativas, afetando tanto as relações concretas, como as
formas de ser dos sujeitos. Tais transformações apontam para a
necessidade de buscar estratégias de investigação capazes de
apreender as complexas relações entre as dimensões subjetivas e
objetivas do trabalho contemporâneo.
Neste tópico, procuramos abordar, brevemente, aspectos
relacionados ao trabalho e sua dimensão subjetiva, como forma
de obter um melhor embasamento teórico acerca das
especificidades desta atividade, requisito indispensável para uma
análise do problema de pesquisa e para o alcance dos objetivos
deste estudo.
O estudo de questões relativas à dimensão subjetiva dos
trabalhadores constitui-se em um importante campo de
investigação para as diversas disciplinas que analisam o homem
em suas relações de trabalho. Entre as categorias teóricas para o
estudo da dimensão subjetiva nesse campo está a identidade.
A categoria identidade tem sido objeto de análise de
diferentes estudiosos das ciências humanas, mas, desde as
34
últimas décadas do século 20, sua capacidade explicativa para os
fenômenos humanos vem sendo fortemente questionada. Tal
debate emerge no quadro das diversas crises que abalaram os
países capitalistas ocidentais (COUTINHO, 2009).
De acordo com Sennett (2007), a noção de identidade no
trabalho permeia a ideia de que, no capitalismo contemporâneo,
essa atividade reduz, em parte, as possibilidades de pessoas
desenvolverem experiências e construírem uma narrativa
coerente para suas vidas. Este modo de produção desgasta o
caráter do trabalhador, “[...], sobretudo aquelas qualidades de
caráter que ligam os seres humanos uns aos outros, e dão a cada
um deles um senso de identidade sustentável" (2001, p.27).
Em sua concepção, sob a lógica capitalista atual, este
mesmo autor questiona a natureza do trabalho, seus modos de
organização e, principalmente, as relações interpessoais que os
trabalhadores estabelecem no contexto laboral.
Como pode um ser humano desenvolver uma narrativa de identidade e história de vida numa sociedade composta de episódios e fragmentos? As condições da nova economia
alimentam, ao contrário, a experiência com a deriva no tempo, de lugar em lugar, de emprego em emprego (SENNETT, 2001, p. 27).
Neste sentido, compartilhamos do questionamento
formulado por Sennet (2001) e reconhecemos que as formas
atuais de relações do homem com o trabalho diminuem as
oportunidades de vínculos interpessoais com seu fazer e,
consequentemente, reduzem as possibilidades de identificação
com os outros e com o sua atividade laborativa.
É importante pontuar que o trabalho deve participar da
sociedade como um elemento de equilíbrio e de desenvolvimento
para o indivíduo e lhe assegurar a inserção nos diferentes grupos
existentes na sociedade. Quando o trabalho alcança esses
objetivos, o trabalhador experimenta a conhecida satisfação e sua
atividade passa a fazer sentido (ANTUNES, 1999).
A análise dessas experiências de pesquisa permitiu tecer
algumas considerações sobre as trajetórias identitárias de dois
sujeitos, analisados no capítulo 3 desta dissertação, enquanto
35
estratégia de investigação capaz de ressignificar o modo de
produção, a condição humana e as configurações do trabalho
manual contemporâneo.
36
CAPÍTULO 2
37
CAPÍTULO 2
DESIGN E ARTESANATO: DOMÍNIOS DO FAZER HUMANO
Artefatos, tal como palavras, são produtos da atividade motora humana, [...]. A forma resultante de qualquer artefato é a combinação de unidades estruturais – atributos – que produzem um objeto com uma função específica na cultura que o engendrou.
Berta Ribeiro, A linguagem Simbólica da Cultura Material (1986).
2.1 Design, artesanato e cultura material
Sabemos que a formação cultural de uma sociedade se dá
por meio da produção de seus bens e valores, “e que, através das
coordenadas de tempo e espaço, caracterizam as identidades de
seus membros” (CIPINIUK; PORTINARI; BOMFIM, 2008, p.61). O
artefato, por nascer dos saberes, dos costumes e das técnicas
acumuladas por gerações, é fruto desse processo, e se
desenvolve a partir do modo como o indivíduo absorve os
acontecimentos à sua volta. A cultura, especializada nos objetos
produzidos por essas expressões, é chamada de cultura material.
Partimos do pressuposto de que o design é um dos campos
fundamentais na representação desse mundo material.
Acreditamos que sua tarefa se realiza por meio do diálogo e
compreensão da trama cultural (BOMFIM, 1999). O artesanato se
apresenta como um dos principais delineadores do imaginário
desta mesma sociedade. Assim, o presente estudo propõe a
reflexão sobre o reencontro entre o projetar e o fazer, quando a
cisão entre as áreas torna-se cada vez mais insignificante, pelo
domínio do fazer humano.
A cultura envolve tanto as relações materiais como
imateriais de um grupo – corresponde ao intercâmbio entre o
homem e o conjunto que abrange sua existência, desde a
construção do seu espaço até a relação com os artefatos do
cotidiano. Essa afinidade se estabelece ao longo do tempo e não
é estática; acompanha as modificações da sociedade de forma
dinâmica e se transforma de acordo com as interações sociais.
38
A partir de Malinowski (1970), compreende-se que cada
cultura consiste em um todo coerente, um sistema equilibrado e
funcional, formado por elementos interdependentes e
harmonizados entre si, utilizados pelas pessoas como um meio de
atender suas necessidades. É um sistema simbólico, característica
fundamental de atribuir significados e sentidos à vida de forma
ordenada, coerente e estruturada Além do conjunto completo
dos instrumentos e bens de consumo, consiste nos códigos dos
grupos, nas ideias e costumes, quer seja de uma cultura
primitiva8, quer seja de uma cultura complexa. Sua existência se
dá pela interação, na qual atuam os indivíduos (MALINOWSKI,
1976).
Contudo, é importante ressaltar que este campo deve
examinar não o objeto material tomado em si mesmo, mas sim as
suas apropriações sociais, as técnicas envolvidas na sua
manipulação, a sua importância econômica e a sua necessidade
social e cultural.
8 O uso da expressão “cultura primitiva” segue a denominação de Malinowski
(1976), e não é o que referencia a visão de cultura desenvolvida nesta dissertação, a partir de Geertz (1973).
Segundo Cardoso (1998, p. 20), o termo Cultura Material
originou-se no século 19, no estudo de artefatos de povos
‘primitivos’. Hoje em dia, esse conceito ampliou-se para uma
“maneira de melhor entender os artefatos que produzimos e
consumimos, bem como a maneira em que estes se encaixam em
sistemas simbólicos e ideológicos mais amplos”. Até porque, os
objetos traduzem comportamentos, visões de mundo, valores
estéticos e estágios tecnológicos que possibilitam uma leitura da
cultura em que estão inseridos (SANTOS, 2004).
O conceito de cultura, como observamos, é dinâmico e
acolhe muitas leituras, conforme apontam os autores (LARAIA,
1986; ARANTES, 1990; SANTOS, 1997). Entretanto, não se
pretende, nesta pesquisa, enveredar pelas inúmeras
considerações dos antropólogos, historiadores e estudiosos no
assunto, embora sejam essenciais. Entre tantas definições
conceituais existentes, adotamos a de Geertz, que se dedica a
desenvolver uma Fenomenologia da Cultura. Tal método seria
utilizado para analisar e descrever sua estrutura significativa do
estudo da percepção dos indivíduos nela presentes. Para tanto, o
39
autor indica que o essencial é anotar e interpretar o discurso
social.
Geertz (1973, p. 15) diz: “acreditando, como Max Weber,
que o homem é um animal amarrado a teias de significados que
ele mesmo teceu, assume a cultura como sendo essas teias e sua
análise; portanto, não como uma ciência experimental em busca
de leis, mas como uma ciência interpretativa, à procura do
significado.” Motivado pela clássica sociologia de Weber, para
quem o homem só é capaz de viver em um mundo dotado de
sentido, o autor entende a cultura como sendo a produção desse
sentido, o conjunto de significados que ele constrói em suas
interações cotidianas e que constitui a base organizada
socialmente.
Na opinião do antropólogo Néstor Canclini (1983, p. 29), o termo cultura é:
Produção de fenômenos que contribuem, mediante a representação ou reelaboração simbólica das estruturas materiais, para a compreensão, reprodução ou transformação do sistema social, ou seja, a cultura diz respeito a todas as práticas e instituições dedicadas à
administração, renovação e reestruturação do sentido.
Canclini combate as conceituações de apego idealista e
afirma que, na sua tentativa de conceituar a cultura, não aposta
na identificação do cultural com o ideal, nem do material com o
social, nem sequer pondera a análise desses campos
separadamente. Para ele, a cultura está ligada ao processo de
desenvolvimento das sociedades humanas e acompanha o avanço
dos indivíduos e grupos sociais, expressando sua linguagem, seus
valores, sua identidade e por fim, seus artefatos. Nesse sentido,
assim como Canclini, acreditamos que “certos objetos e práticas
merecem ser especialmente valorizados porque representam
descobertas para o saber, inovações formais e sensíveis, ou
acontecimentos fundadores da história de um povo” (CANCLINI,
2003, p. 200).
Por interagir com múltiplas formas de representações
culturais, o artesanato se apresenta como um objeto oportuno de
estudo da cultura material, assim como o design, que fornece
40
inúmeras possibilidades de pesquisa, principalmente relacionado
a fatores socioeconômicos e culturais.
Para o historiador Rafael Cardoso (1998, pp. 17-19), “a
natureza essencial do trabalho do design não reside nem nos seus
processos e nem nos seus produtos, mas em uma conjunção
muito particular de ambos; mais precisamente, na maneira em
que os processos do design incidem sobre seus produtos,
investindo-os de significados alheios à sua natureza intrínseca”. E
continua, “do ponto de vista antropológico, o design é uma entre
diversas atividades projetuais, tais como as artes, o artesanato, a
arquitetura, a engenharia e outras que visam à objetivação no seu
sentido estrito, ou seja, dar existência concreta e autônoma a
ideias subjetivas”. O autor ainda defende o uso da palavra
artefato como resultado desse processo, pois o termo “[...] se
refere especificamente aos objetos produzidos pelo trabalho
humano, em contraposição aos objetos naturais ou acidentais”.
Na produção dos artefatos, uma série de fatores interfere,
desde os recursos naturais disponíveis para utilização como
matérias-primas; o desenvolvimento de técnicas adequadas; as
atividades envolvidas na exploração do ambiente e na adaptação
ecológica; a utilidade e finalidade prática dos objetos e
instrumentos desenvolvidos, até elementos de ordem simbólica,
ligados a concepções religiosas, estéticas e filosóficas do grupo.
Estes muitos fatores, ingredientes da fabricação, se articulam em
torno de conhecimentos precisos, compartilhados pelos membros
de cada grupo e adquiridos ao longo de muitas gerações que os
precederam.
Esses objetos explicam comportamentos, visões de mundo,
valores estéticos e a tecnologia empregada que permite uma
leitura da cultura em que estão inseridos. Bomfim (1995), ao
discorrer sobre o assunto, afirma que independente das funções
imediatas às quais se presta, ele é capaz de portar informações a
respeito do desenvolvimento de uma sociedade, como o
momento social, político e econômico. Elencamos alguns tipos de
mensagens impressas nos artefatos, segundo Bomfim (1995, pp.
88-89):
Sua própria composição (material, cor, textura, processo de
fabricação, tecnologia);
41
Funções práticas (para que é usado);
Modos de uso (intuídos por meio do aprendizado e da
memorização de estereótipos);
Valores estéticos (intuídos sensorialmente e interpretados
conforme juízo de gosto ou da norma vigente);
Signos de uma cultura visual instituída (uma figura
arredondada dá ares menos agressivos do que outra com
ângulos agudos);
Significados ideológicos (ideais políticos e religiosos).
Por tudo isto, é importante a compreensão do estudo da
cultura material de um determinado grupo social, posto que, por
meio dele, podem-se fazer ligações com as condições de sua
fabricação, ou seja, com os recursos naturais e materiais
utilizados, com a organização do trabalho, com o aprendizado e o
aprimoramento das técnicas, com os conhecimentos sobre os
meios e processos da transmissão deste saber dentro do grupo
onde é produzido.
O conhecimento de um artefato requer, em suma, que o
consideremos em seu contexto mais amplo e em sua qualidade
de sistema, analisando as dimensões e as significações que nele
estão materializadas, revelando aspectos relacionados com a
tecnologia, a história do grupo, dentre outros.
Na verdade, é por meio de uma variedade de artefatos,
como nos mostra Ribeiro (1986), que os grupos humanos
assimilam o seu meio, utilizando-se dele e imprimindo nele sua
marca. Do mesmo modo, como o artefato é carregado das marcas
deixadas pela cultura daqueles que o fabricaram e as trocas
culturais entre os povos são uma constante na história da
humanidade, caberia, também, pesquisar os efeitos dessas
relações nas disposições à mudança ou na inovação em sua
produção.
Seguindo este entendimento e percebendo a importância
da produção artefactual (RIBEIRO, 1989), passamos para as
aproximações e os possíveis distanciamentos dos domínios do
fazer humano: o design e o artesanato.
42
2.2 Design e artesanato: aproximações e distanciamentos
Antes de embarcar na questão proposta, é importante
esclarecer que partimos do princípio de que pensar as
aproximações é mais enriquecedor que medir as distâncias
(BARBOSA, 2003). Então, apresentamos uma possibilidade de
interpretação para o tema: entender o artesanato como uma
forma de design.
Observamos que, na contemporaneidade, as fronteiras
entre as áreas do conhecimento humano se diluíram, mais ainda
aquelas em que, por natureza, tem múltiplos aspectos, como no
design e no artesanato (BORGES, 2011).
Diversos autores (BARDI, 1980; CANCLINI, 1983; CARDOSO,
2008; CARNIATTO, 2008; DIAS, 2007; FRANÇA, 2005;
MAGALHÃES, 1977; MARINHO, 1999; MARTINS, 1975)
discorreram sobre a prática e a técnica do artesanato. Aqui,
pensamos nele em conexão com o design, independente da
apropriação dos modos de fazer ou da finalidade produtiva,
acreditando ser mais interessante a análise da subjetivação dos
significados e sua materialização em objetos.
O artesanato de modo geral tanto pode ser entendido como
um modo de produção e de trabalho como uma forma de
manifestação cultural. Como um modo de produção, este
processo manual, na realidade é o trabalho do artesão, que para
sua realização “(...) põe em movimento as forças naturais
pertencentes a sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão,
a fim de apropriar-se da matéria natural numa forma útil para sua
própria vida” (MARX, 1983, p. 149). Neste caso, grande parte do
desenvolvimento do ser humano está associada a sua capacidade
física e mental de transformação de seu entorno.
No artesanato, podemos perceber características de outras
atividades cuja habilidade manual é fator decisivo para a
produção de artefatos como, por exemplo, a arte popular,
trabalhos manuais e outras manifestações culturais. Estabelecer
diferenças entre os campos citados acima tem sido uma
preocupação constante para profissionais que atuam nesses
programas, e também no meio acadêmico.
43
Esse conflito pode parecer, a princípio, irrelevante, mas sua
solução é essencial para uma atuação eficiente de programas de
apoio, desenvolvidos por instituições públicas e privadas9.
A necessidade de tais definições e conceitos visa orientar as
ações que podem ser realizadas por estas instituições. Porém,
como falamos anteriormente, pensar neste assunto de modo
homogêneo, pré-estabelecido e determinado, é no mínimo, ter
uma visão ingênua do sistema cultural vigente. Isso porque
conceituar a atividade artesanal, em qualquer período histórico
ou para qualquer finalidade, será sempre uma tarefa complexa.
No Seminário Internacional “Design Sem Fronteiras”,
realizado em Bogotá em 1996, do qual participou o Conselho
Mundial de Artesanato – WCC10, integrou a equipe técnica um
dos promotores do design e do artesanato no país, na época,
Eduardo Barroso Neto. No evento, ele propôs que artesanato
9 Um exemplo bem conhecido no Brasil é o Artesanato Solidário/ARTESOL, que
foi concebido em 1998 como um programa social, e a partir de 2002, tornou-se uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público). 10
Sigla em inglês do Conselho Mundial de Artesanato.
seria “toda atividade que produz objetos e artefatos realizados
manualmente, ou com a utilização de meios tradicionais ou
rudimentares, com habilidade, destreza, apuro técnico, engenho
e arte” (SEBRAE, 2004, p. 1-2).
Nesse sentido, o autor aponta que existem diferenças entre
atividades manuais e artesanato. Uma delas é que a primeira,
geralmente, é uma ocupação secundária, com o objetivo principal
de complementar a renda familiar, enquanto a segunda é a
atividade principal de quem o produz.
É interessante apresentar a definição de artesanato
adotada pela UNESCO/CCI em 1997:
Produtos artesanais são aqueles confeccionados por artesãos, seja totalmente a mão, com o uso de ferramentas ou até mesmo por meios mecânicos, desde que a contribuição direta manual do artesão permaneça como o componente mais substancial do produto acabado. Essas peças são produzidas sem restrição em termos de quantidade e com o uso de matérias primas de recursos sustentáveis. A natureza especial dos produtos artesanais deriva de suas características distintas, que podem ser utilitárias, estéticas, artísticas,
44
criativas, de caráter cultural e simbólicas e significativas do ponto de vista social 11.
O Sistema SEBRAE adota, segundo o Termo de Referência12,
alguns conceitos para melhor atuação dos seus programas de
apoio. As categorias são definidas de acordo com o processo de
produção, origem, uso e destino. O interesse não é fazer uma
extensa avaliação do uso de cada um desses conceitos, mas de tê-
los em mente, segundo a perspectiva explicitada pelos autores
referidos, para ajudar a compreender a dinâmica da temática
artesanal:
11 Definição adotada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a
Ciência e a Cultura no International Symposium on crafts and International Markets, Manila, Filipinas, outubro de 1997. 12
Este Termo de Referência, além de delinear em breve panorama conceitual da atividade, apresenta também um olhar sobre as tendências nacionais e internacionais de incentivo aos empresários na utilização do Design como uma ferramenta que possibilita a inclusão de micro e pequenas empresas, quanto ao ciclo de vida de produtos e serviços a elas relacionados. Entendemos que o universo do Design interage fortemente com o universo dos negócios e que ambos desenvolvem a partir da volatilidade do mundo contemporâneo frente às oportunidades de negócios, às mudanças comportamentais da humanidade. Assim, ressaltamos a importância dos questionamentos a respeito dos conceitos.
Arte popular: compreendida aqui como um conjunto de
atividades poéticas, musicais, plásticas e expressivas que
mostra o costume e o modo de vida de um grupo de
determinado lugar;
Artesanato: refere-se a toda atividade produtiva que
resulte em objetos e artefatos acabados, feitos
manualmente ou com a utilização de meios tradicionais ou
rudimentares, com habilidade, destreza, qualidade e
criatividade;
Trabalhos manuais: exigem destreza e habilidade, mas
empregam moldes e padrões predefinidos. Não são
resultantes de processo criativo efetivo. É muitas vezes,
uma ocupação secundária que utiliza o tempo disponível
das tarefas domésticas ou um passatempo;
Produtos típicos: são, em geral, produtos alimentícios
processados segundo métodos tradicionais, em pequena
escala, muitas vezes em família ou por um determinado
grupo;
Industrianato: refere-se aos produtos semi-industriais e
industriais em grande escala, com utilização de moldes e
45
formas, máquinas e equipamentos de reprodução, com
pessoas envolvidas e conhecedoras apenas de partes do
processo;
Artesanato indígena: diz respeito aos objetos produzidos
no seio de uma comunidade indígena, por seus próprios
integrantes. É, em sua maioria, resultante de uma
produção coletiva, incorporada ao cotidiano da vida tribal,
que prescinde da figura do artista ou do autor;
Artesanato tradicional: concebido aqui como um conjunto
de artefatos mais expressivos da cultura de um
determinado grupo, representativo de suas tradições,
porém incorporados à sua vida cotidiana. Sua produção é,
em geral, de origem familiar ou de pequenos grupos
vizinhos, o que possibilita e favorece a transferência de
conhecimentos sobre técnicas, processos e desenhos
originais. Sua importância e seu valor cultural decorrem
do fato de acompanhar histórias transmitidas de geração
em geração;
Artesanato de referência cultural: refere-se aos produtos
cuja característica é a incorporação de elementos culturais
tradicionais da região onde são produzidos. São, em geral,
resultantes de uma intervenção planejada de artistas e
designers, em parceria com os artesãos, com o objetivo de
diversificar os produtos, porém preservando seus traços
culturais mais representativos;
Artesanato conceitual: diz respeito aos objetos
produzidos a partir de um projeto deliberado de
afirmação de um estilo de vida ou afinidade cultural. A
inovação é o elemento principal que distingue este
artesanato das demais categorias. Por detrás desses
produtos, existe sempre uma proposta, muitas vezes
explicitada por meio dos sistemas de promoção utilizados,
sobretudo aqueles ligados ao movimento ecológico
(SEBRAE, 2004, p. 15).
Ao incorporar conceitos de definição tão duvidosa, o
artesanato traz em si uma herança de questionamentos. Na
verdade, essa abrangência, talvez incida em um dos maiores
obstáculos enfrentados pelos programas de fomento, por gerar
dúvidas a respeito do trabalho do artesão e do produto gerado
por ele.
46
De acordo com Saul Martins (1971), essa confusão ocorre
porque o uso da expressão artesanato é recente e, muitas vezes,
empresta o seu significado a atividades análogas, como já
mencionamos. Jorge Chiti (2003), por sua vez, diz que a intenção
de restringir a obra e a prática artesanal, que muitas vezes
discordam entre si ou se entrelaçam, vem da antropologia, do
folclore, da etnografia e da economia. O autor, depois de um
extenso estudo comparativo entre os diferentes tipos de
artesanatos, concluiu que eles têm em comum os seguintes
atributos:
Manualidade: as mãos podem até mesmo utilizar
ferramentas ou meio mecânicos, desde que a sua atuação
táctil seja imprescindível para o acabamento da peça.
Funcionalidade: objeto de uso prático no cotidiano,
inclusive, associado a religiosidade, decoração dentre
outras abordagens no campo simbólico;
Seriação: repetitividade das peças;
Intenção estética: o fator estético é intrínseco à prática
artesanal, embora não se deva igualar ao caráter
expressivo, emocional e cognitivo da obra de arte;
Acessibilidade e tangibilidade: as peças artesanais devem
ser acessíveis a ponto de facilitar a sua utilização e o seu
transporte manual;
Durabilidade: o autor insere esse aspecto para afirmar
que produtos comestíveis não podem ser considerados
artesanato;
Tipicidade: o artesanato se singulariza por estar
intimamente envolvido no universo de valores e
tradições;
Tridimensionalidade: a obra artesanal costuma ser
volumétrica (CHITI, 2003, p. 22).
A partir destas características, Chiti (2003) define o
artesanato como uma produção uniformizada desenvolvida em
ambiente doméstico ou não, que alia a capacidade criativa à
operacionalidade manual ou semimanual e que responde a uma
47
finalidade de uso prático e estético oferecido em mercados
reduzidos.
Já Baudrillard insere o artesanato na categoria de objetos
que respondem ao propósito do testemunho, da lembrança, ou
seja, das qualidades de ordem tradicional e simbólica apesar de
pertencerem à modernidade. “A fascinação pelo objeto artesanal
vem do fato de este ter passado pela mão de alguém cujo
trabalho ainda se acha nele inscrito: é a fascinação por aquilo que
foi criado [...]” (BAUDRILLARD, 2004, p.85).
Mas, para Canclini (1983), compreender a produção
artesanal requer observância, principalmente, da prática que a
origina em seu processo de criação, porque, dependendo da
realidade social de quem a constrói, tal atividade ganha sentidos
diferentes. Assim também entendemos.
O artesanato foi, durante muito tempo, negligenciado como
campo de atuação do design e, segundo Aloísio Magalhães13, só
13 Foi um dos que não impunham fronteiras rígidas entre o design e o
artesanato. Disponível em: www.mamam.art.br. Acesso em: 22/05/2010.
passaria a ser considerado quando o próprio designer atuasse
como um artesão (BRAGA, 2002) – papel esse importante na
história e na própria geração da tecnologia e do design, e que,
segundo o mesmo autor, o artesão seria qualificado como
produtor de um pré-design.14
O pressuposto de que a atividade artesanal e a projetual
são incompatíveis ainda está arraigado em nossa cultura. Tais
atividades parecem pertencer a mundos distintos, porque se o
design é conceitual, generalista, voltado para a inovação, e a
produção é seriada e uniforme; o artesanato é manual,
especializado, sobrevivente, e resistente de outros tempos,
voltado para a produção em pequena escala com suas variações e
irregularidades (PAIM, 2009).
Sabemos que, na atividade artesanal, também não pode
faltar projeto dirigido à produção em pequena escala, ao mesmo
14 A Bauhaus, uma das mais importantes escolas de design do mundo, por
exemplo, agregava ao ensino do design, o artesanato, por meio de oficinas. Sua vida foi curta, mas o suficiente para revolucionar o pensamento do século 20, no campo da arte, do design, da indústria e da economia. A finalidade do estudo era o conhecimento de todos os processos de produção, da matéria prima e principalmente das técnicas artesanais (BRAGA, 2002).
48
tempo elaborado e diversificado, para criação de novos produtos
na constante renovação de seu ofício. Uma atividade significativa
do fazer artesanal que, infelizmente, não costuma ser
considerada.
O design com a finalidade de conceber novos objetos e
sistemas (CARDOSO, 2008) pode ser definido como o processo de
formulação e justificação de uma proposta de ação capaz de levar
à realização de um produto que atenda a uma necessidade
humana, assim como o artesanato. Ambos utilizam métodos e
técnicas que influenciam a criatividade e a produtividade.
Contudo, a designer Heloísa Crocco (2000) chama nossa
atenção para o fato de que o artesão é um conhecedor nato dos
recursos materiais empregados nos artefatos e das tradições de
sua comunidade, destacando-se pela informalidade e o
empirismo no trabalho. Enquanto isso, os designers caracterizam-
se pela formação voltada para a lógica do mercado, tida como
fator fundamental para o desenvolvimento do produto industrial.
Verbo derivado do latim designare, o termo design abrange
significados de designar e de desenhar. “Trata-se de uma
atividade que gera projetos no sentido objetivo de planos,
esboços ou modelos”. Alguns autores optam por incluir na
discussão as diferenças entre arte, design e artesanato devido a
certa conotação que este adquiriu na pós-industrialização e o
status de mercadoria que possa ter alcançado. Essa ligação do
artesanato a produtos de mercado ocorreu, sobretudo, da divisão
que houve entre artista, artesão e trabalhador fabril nos tempos
da industrialização, já citado no capítulo anterior, onde o “artesão
passou a significar o trabalhador manual que desempenhava um
trabalho com instrumentos rudimentares” (QUEIROZ, 2004, p.15).
O design busca hoje encontrar suas singularidades,
renovando-se esteticamente e trazendo elementos da cultura do
país através de suas relações com as artes populares, de forma
que os produtos gerados por essas relações nos mostrem quem
somos e de que maneira podemos ter reconhecimento global por
meio de nossas produções locais.
49
Dorfles (1991) alega que a diferenciação entre design e
artesanato é fundamental e que há uma clara diferença entre
ambos. No entanto, esta visão não é tão aceita. Design, arte e
artesanato têm muito em comum, e hoje quando, o design já
atingiu certa maturidade, muitos designers começam a perceber
antigas relações com o fazer artesanal (CARDOSO, 2008). Neste
sentido, o artesanato se aproxima do design, do mesmo modo
que o artesão, diante de mudanças no seu mercado, tende a
adequar seu produto. Ou seja, diante das oportunidades, das
mudanças políticas e comerciais, o artesão também precisa
direcionar seu processo criativo. Assim como o designer.
É perfeitamente possível identificar semelhanças
indissociáveis entre as atividades do design e do artesanato.
Ambas surgem de uma necessidade social e mantêm forte vínculo
com o mercado. Tanto uma como a outra exercem papéis
essenciais à cultura material15, ainda que guardem diferenças
15 De acordo com Coelho (1997), a cultura, hoje é pensada mediante duas
vertentes. Uma idealista quando ela é analisada de acordo com a diversidade de comportamentos e atos sociais. Outra materialista, analisada de maneira ampla por meio da inserção de todas as construções de conhecimento. No
relacionadas à maneira como concebem os artefatos. Se o
primeiro pensa e constrói o objeto com as mãos, ou até mesmo
utilizando ferramentas e participando de todas as etapas da
produção, o segundo realiza um trabalho interdisciplinar no
desenvolvimento de produtos, em que as informações sobre o
processo de produção, tecnologias, materiais, distribuição,
somam-se nas especificações projetuais, que resultam, na maioria
das vezes, na produção por meio mecânico e seriado (DIAS,
2007).
Atualmente, diante de mudanças no mercado, o artesanato
se aproxima do design e tende a alterar seu produto de forma a
adequá-lo. Ou seja, o artesão, assim como o designer, direciona
seu processo criativo e utiliza o design, principalmente por meio
de programas de apoio ao artesanato, como forma de agregação
de valor cultural. Este artesanato que se apropria do design é
chamado por alguns autores de artesanato de referência cultural
ou artesanato contemporâneo (CARNIATTO, 2008).
entanto, conforme Canclini (1983), as duas vertentes não se encontram separadas, o que fortalece a ideia de retomarmos o debate acerca da cultura material nesta dissertação.
50
Rafael Cardoso, em artigo publicado em 1998, fala da
inserção do design no mundo material e fetichizado, no qual nota
a aproximação da arte com o artesanato. No entanto, coloca um
distanciamento na forma de produção:
O ato de projetar tem na sua essência um componente básico de criação, de artifício, que não difere substancialmente daquele mesmo elemento factício (no sentido de feitura) que está por trás do artesanato, da arte e até da magia [...]. O que distingue o design de grande parte do artesanato, da arte e – presumo eu – da magia, é que no design o fato material que se pretende gerar não é feito pelo mesmo indivíduo que deu início ao processo ao conceber a ideia [...]. Quero sugerir, portanto, que a atividade do design caracteriza-se mais como um exercício de processos mentais (artifício/engenho) do que de processos manuais (artes aplicadas ou plásticas, propriamente ditas) [...] (CARDOSO, 1998, p.30).
Para Bonsiepe (2011) o design perdeu a sua substância no
momento em que passou a cuidar das superficialidades,
colocando-se a serviço da beleza cosmética e de lucros fáceis do
mercado.
O trabalho artesanal surge no plano do fazer, no conhecer
técnicas e executar com as mãos o que é mais representativo no
cotidiano do artesão. Esse fazer manual e a liberdade para criar
artefatos são competências que foram, aos poucos, arrancadas
do homem moderno, com o advento da sociedade industrial.
Perante a máquina, a limitação do fazer humano foi recebida
positivamente, como resistência aos modos de produção
artesanal em que o tempo e a mão decidem as etapas do
processo.
O objeto artesanal “é definido por uma dupla condição:
primeiro, o fato de que seu processo de produção é, em essência,
manual. São as mãos que executam basicamente todo o trabalho.
Segundo: a liberdade do artesão para definir o ritmo da
produção, a matéria-prima e a tecnologia que irá empregar, a
forma que pretende dar ao objeto, o produto de sua criação, de
seu saber, de sua cultura” (LIMA, 2005, p. 2).
Essa questão do “saber fazer” e seus vários aspectos surge,
principalmente, nas comunidades, com os protagonistas desta
cultura material, a partir de um processo sucessivo de passagem
51
e transmissão de valores materializados no artefato. Mas existem
contextos de práticas artesanais que representam quase a mesma
lógica produtivo-industrial. Por isso, a ideia de definir o artesão
como detentor de saberes tradicionais enraizados ou perdidos
num passado distante oculta suas relações com a sociedade atual,
sua forma de ver, interpretar e sobreviver no mundo
(CARNIATTO, 2008), assim como definir o designer como
possuidor de conhecimentos específicos e capacitado para
gerenciar a produção esconde suas afinidades com o fazer
artesanal.
A relação do artesão com o artefato é estabelecida
essencialmente pelas mãos. A mão é o instrumento que edifica,
modifica, aumenta ou diminui, incorpora sensações e emoções,
revela costumes, tradições, de modo que possamos observar
elementos tradutores da cultura local, a capacidade criativa e
diversas técnicas manuais que passam de geração em geração.
Lima (2005) se refere ao artesanato como:
Produtos do fazer humano em que o emprego de equipamentos e máquinas, quando e se ocorre, é subsidiário à vontade de seu criador
que, para fazê-lo, utiliza basicamente as mãos. Nesse sentido, diríamos que o objeto artesanal é definido por uma dupla condição: primeiro, o fato de que seu processo de produção é em essência manual. São as mãos que executam basicamente todo o trabalho. Segundo: a liberdade do artesão para definir o ritmo da produção, a matéria-prima e a tecnologia que irá empregar a forma que pretende dar ao objeto, produto de sua criação, de seu saber, de sua cultura (p. 13-14).
Para o artesão ou designer que lida com a matéria argila,
por exemplo, como veremos no capítulo 3, as experiências com o
processo de execução da peça são tão importantes quanto o
resultado. A significação está na transformação da massa
cerâmica, nas marcas do fazer e do processar gestos
transformadores deixados na matéria como intervenção de um
criador que agiu sobre o objeto. Isso está tanto para o artesão
como para o designer indistintamente.
52
2.3 Perspectivas do artesanato na sociedade contemporânea
O Brasil é um país onde boa parte da população possui
habilidades manuais, herdadas de culturas, como etnias
indígenas, africanas, afrodescendentes, afro-brasileiras e outros
imigrantes que vieram compor o povo brasileiro em sua
pluralidade cultural. Somando isto, a nossa riqueza e diversidade
de matérias primas, aliadas às necessidades de sobrevivência e à
criatividade na confecção de artefatos resultaram em um fazer
artesanal que se mostrou importante caminho para grupos
excluídos16, na busca por trabalho e renda (MINISTÉRIO DO
TRABALHO E EMPREGO).
Entretanto, os números das atividades artesanais
catalogadas são escassos e imprecisos. Cabe ressaltar aqui a
iniciativa do Programa do Artesanato Brasileiro (PAB) do
16 Em termos de Brasil, a temática torna-se ainda mais relevante, dada a
diversidade de condições de nossa população e da urgência em pensarmos soluções que deem conta de promover a cidadania. Programas de apoio ao artesanato e a geração de renda, tem tido, nos últimos anos, uma grande dimensão quer no campo da investigação quer no campo da aplicação, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego. Disponível em: www.mte.gov.br. Acesso em: 16/10/2011.
Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC),
lançado em 2004, que está promovendo, já há algum tempo, o
cadastramento dos artesãos brasileiros. "[...] o artesanato
brasileiro é um segmento da economia cujo crescimento possui
alto potencial de geração de trabalho e renda, de maneira
descentralizada" (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio, 2004, p. 25).
O documento do Ministério da Cultura intitulado “Economia
da Cultura – um setor estratégico para o país”, escrito por Paula
Porta, afirma que a atividade cultural mais presente nos
municípios brasileiros é o artesanato, com 64,3% (KELLER, 2011).
De acordo com essa fonte de dados, o envolvimento da
cadeia produtiva, englobando o manejo da matéria-prima, a
produção, a divulgação e a comercialização do produto artesanal,
tanto no mercado interno quanto no internacional, demanda
ações governamentais, pois além dos benefícios da ocupação e
renda, também a preservação da cultura é um elemento
relevante.
53
Sem questionar, neste momento, a efetividade desses
programas de incentivo e modelos de organização produtiva
contemporânea, instalados no Brasil com maior força na última
década do século 20, este movimento tenta romper com a
predominância de métodos de trabalho, formas de gestão e de
relacionamentos, implantados a partir da Revolução Industrial
(MARINHO, 2006). Assim, pode-se vislumbrar uma possibilidade
de emancipação econômica, capaz de conjugar aspectos sociais,
econômicos, culturais e históricos.
Nessa perspectiva, um número cada vez maior de
programas específicos,17 de promoção dessa diversidade
artesanal, é criado, no Brasil, com objetivo de gerar
oportunidades, ocupação de mão de obra e geração de renda,
além de ser uma opção estratégica para reduzir a pressão social
causada pelo desemprego. Os programas objetivam tornar a
17 Um exemplo é o Programa SEBRAE de Artesanato que busca fomentar
o artesanato de forma geral e integrada por meio de projetos que capacitam artistas empreendedores e fomentam este mercado em cada estado do país. As ações promovidas enfatizam a identidade cultural das comunidades e suas habilidades, os resultados promovem melhoria da qualidade de vida e amplia a geração de renda na região. Disponível em: www.sebrae.com.br. Acesso em 16/10/2011.
produção artesanal uma das molas propulsoras da economia local
e preparar o artesão para o mercado competitivo.
No Estado de Mato Grosso, atualmente, cinco mil
profissionais estão cadastrados no Programa de Artesanato Mato-
grossense, como também no Sistema de Informações Cadastrais
dos Artesãos do Brasil (SICAB), do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC). O
programa, de responsabilidade da Secretaria de Estado de
Indústria, Comércio Minas e Energia (SICME) desde 2005,
desenvolve ações em todo o Estado por meio de assistência e
cooperação técnica, cadastramento de entidades não
governamentais, como associações e cooperativas,
cadastramento do artesão para emissão da Carteira de
Identidade do Artesão, capacitação, participação e divulgação em
feiras e eventos, regionais e nacionais 18, como é o caso do
artesão Osmar, estudado no capítulo 3.
18 Secretaria de Estado de Indústria, Comércio Minas e Energia. Disponível em:
www.sicme.mt.gov.br/. Acesso em16/10/2011.
54
O contexto atual, alicerçado na racionalidade econômica,
autoriza-se pensar na economia de forma multidimensional,
principalmente quando ressurgem com vigor os debates acerca
das alternativas de produção – nas quais estão incluídas algumas
experiências que renascem com força em todas as partes do
mundo, em especial nos países em desenvolvimento onde casos
bem sucedidos são tomados como exemplo a ser disseminados,
como respostas aos impactos exercidos pela globalização
competitiva e excludente e seus desdobramentos (MARINHO,
2006).
Algumas experiências, coordenadas pelo Estado de Mato
Grosso, têm sido bem-sucedidas por serem capazes de promover
a articulação da cadeia e dos seus agentes, de criar espaços
comuns de capacitação e comercialização de produtos e de
oferecer aos artesãos associados economia de escopo e de
escala. Uma experiência em espaços culturais deve ser destacada:
A Casa do Artesão19.
19 Funcionou como estabelecimento de ensino desde sua inauguração até o
ano de 1975, quando em 15 de maio do mesmo ano, passou a abrigar a Casa
Essas organizações, independente de sua magnitude,
desempenham papel importante para as comunidades locais, em
especial aquelas menos desenvolvidas e cuja população
apresenta menor poder aquisitivo. Trabalhar de forma
compartilhada acaba por proporcionar a pequenos produtores
artesãos maior chance de sobrevivência.
Diante dessa realidade, a valorização do artesanato trouxe à
tona a discussão de como o design, outro importante domínio do
fazer humano, poderia intervir para promover o resgate do
artesanato, abrindo novos mercados, sem quebrar o vinculo do
artesão com sua cultura. O papel do design nesse sentido é o de
redescobrir o fazer artesanal, orientar, identificar diferenciais,
planejar decisões e práticas que de fato possam contribuir para a
produção e comercialização dos produtos artesanais
nos mercados nacionais e internacionais (FRANÇA, 2005).
do Artesão. Em 15 de novembro de 1983, foi tombado pela Fundação Cultural de Mato Grosso, passando a fazer parte do Patrimônio Histórico e Artístico Estadual. Disponível em: www.cultura.mt.gov.br. Acesso em: 10/10/2011.
55
A utilização do design como ferramenta para a criação de
produtos artesanais com características próprias tem sido uma
das principais ações dos programas junto às comunidades
artesanais, por meio da contratação de consultores para atuar
junto a esses grupos de artesãos, com vistas a uma produção que
combine com a abordagem iconográfica e comprometida, e com
resgate da cultura regional, compondo uma coleção de acordo
com tendências e demandas de mercado.
Além desse caráter mercadológico, a contribuição do design
para o artesanato pode ser a de melhorar o produto, no sentido
de buscar novos desenhos, pesquisar novos materiais e, também,
gerar projetos que tragam soluções e inovações, ou mesmo
correções de falhas, em conjunto com o artesão, no processo de
criação e fabricação de artefatos.
As estratégias de desenvolvimento devem ser atualizadas
para lidar com as mudanças culturais, econômicas, sociais e
tecnológicas de grande alcance que estão transformando
rapidamente o nosso mundo.
Percebemos o design em constante renovação, mais ou
menos livre e mais expressivo, dentro deste novo cenário
mundial, uma vez que começa a ter como referência maior a
riqueza e a expressividade de suas manifestações culturais. A
experiência brasileira é interpretada como um laboratório
multicultural que antecipa localmente os efeitos da globalização
mundial. Este fato parece identificar o Brasil como tendo grandes
possibilidades de respostas junto às novas questões e aos novos
desafios do mundo globalizado, no âmbito do design e do
artesanato (DE MORAES, 2001).
É fato a importância do artesanato como meio de preservar
a cultura e as diferenças que caracterizam povos de todo o
mundo, e que estes são exatamente os aspectos que mais lhe
agregam valor. Contudo, acreditamos que seja mais importante
encontrar as características do artesanato de acordo com cada
região, identificar suas vantagens competitivas, sua unicidade,
seus processos e dinâmicas culturais, as redes de valor criadas e o
valor agregado de seus produtos, ainda que, em diferentes ritmos
e mudanças, tantas vezes conflitantes, apontem o contrário. O
poder reconhecido pela economia, principalmente do Brasil, para
56
movimentar e afetar a vida social e política tem sido central para
a consolidação de sua importância na sociedade.
Entender as relações e os caminhos encontrados pelo
design contemporâneo é uma forma de compreender
possibilidades, além daquelas inicialmente conhecidas. Questões
culturais e sociais estão cada vez mais presentes nestes contatos
e o design no Brasil está repleto de novas e boas possibilidades de
crescimento.
Infelizmente, ainda surgem enunciados que consagram os
produtos industriais da nossa época, enquanto os objetos de fora
desse campo são considerados produtos de baixa importância, ou
valor. Paradoxalmente, também se realizam estudos apontando
para o crescimento dessa produção informal. Tal crescimento não
é insignificante e hoje, equivale ao da produção industrial
(CIPINIUK, 2006). Os processos de globalização e as inovações
tecnológicas que o sustentam oferecem novas oportunidades.
Porém, parece aumentar os riscos de dominação, desigualdade e
exclusão.
A indústria moderna está presa a estruturas rígidas de
produção e concentra-se em uma produção massificada que
mecaniza todos os processos, apagando os vestígios do trabalho
humano. Em contrapartida, o artesão tem a liberdade de dar
qualidade e beleza aos produtos que confecciona de forma mais
artística, independente de uma tecnologia industrial – ao
contrário, dispondo muito mais de sua habilidade manual e
criativa.
Acerca da função do artesão na sociedade contemporânea,
D’Ávila (1983) propõe uma discussão a “desindustrialização” de
alguns setores industriais para abrir oportunidades de emprego
na área artesanal. Segundo o autor, alguns produtos como
sapatos, roupas, alimentos, móveis etc. podem ser produzidos de
maneira artesanal, o que diminuiria a importação de insumos,
bens de produção e energia. Nesse sentido, o artesanato deve ser
estimulado de maneira estratégica, em paralelo a outros sistemas
de produção.
Nos países em desenvolvimento, como o Brasil, a produção
informal, além de atender ao consumo local, promove a
57
manifestação da cultura. O artesanato significa, neste caso, uma
solução socioeconômica e educacional. Sendo as faculdades
mentais e as habilidades manuais inerentes ao homem e sendo o
artesanato diretamente ligado à sua natureza criativa, o
artesanato não “desaparecerá com o desenvolvimento enquanto
o homem tiver cérebro e mão” (D’ÁVILA, 1983, p. 169).
Embora essa perspectiva seja limitada para a compreensão
da complexidade do artesanato e do design contemporâneo,
especialmente em sua relação com as novas tecnologias, ela
contribui para a superação da ideia de oposição existente em
ambas as atividades, herança deixada pela sociedade moderna, e
que passa a existir como um movimento de resistência (PAIM,
2009).
58
CAPÍTULO 3
59
CAPÍTULO 3
DESIGN E RESISTÊNCIA: O FAZER ARTESANAL NA CONTEMPORANEIDADE
Diferentemente da máquina caracterizada pelo poder ilimitado e produção infinita, a mão humana é limitada em tamanho, força, habilidade, resistência e velocidade. Estes limites não apenas estabelecem a escala dos objetos artesanais, mas por serem limites partilhados por todos os humanos, artesãos ou não, nos oferecem um sentido de como nos relacionar com outras coisas no mundo, artificiais ou naturais. A mão fornece uma medida básica universal do que constitui o humano em termos de escala, proporção, forma e material; ela oferece um padrão para avaliar a qualidade e diferenciar a abundância do excesso. Assim, os artesanatos são um importante corretivo ou contrapeso à mentalidade institucional atualmente cada vez mais modelada pelo racionalismo mecânico-técnico-científico, que tanto contribui para o desencantamento do mundo e das coisas que estão nele; por desencanto entendo a eliminação da mágica e mesmo da maravilha do mundo pela contabilização de todas as ações e experiências em termos empíricos e racionais.
Howard Risatti, A Teoria do Artesanato (2007)
Neste último capítulo, apresentamos uma análise do fazer
artesanal na contemporaneidade, partindo do exame de dois
contextos distintos. Iniciaremos com a análise empírica a partir do
estudo de caso do artesão mato-grossense, Osmar Virgílio da
Silva. O estudo foi pautado na fala do artesão e também no olhar
do observador – a pesquisadora. Entre os procedimentos
adotados, destacam-se o levantamento bibliográfico e o registro
fotográfico. A teoria que sustenta a pesquisa provém dos estudos
culturais, por oferecer mais flexibilidade para tratar das relações
entre culturas (CANCLINI, 2008).
Na segunda parte, passamos à análise do trabalho de
Gilberto Paim, ceramista e pesquisador conhecido
internacionalmente, com trabalhos expostos desde 1980 e ateliê
na cidade de Nova Friburgo, RJ. Aqui, o estudo se baseia tanto em
obras e textos publicados pelo pesquisador (que se dedica ao
estudo do design e do artesanato), como, em vídeos sobre seus
trabalhos, em sites especializados e conversas via correio
eletrônico entre ele e a pesquisadora.
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O estudo traça um paralelo entre o artesão e o designer
ceramista, sinalizando os pontos de convergência entre os
campos do design e do artesanato, no intuito de articular as
informações a partir de seus processos de produção e verificar
questões relacionadas ao desenvolvimento de suas peças
cerâmicas. Acredita-se que o fazer manual do artesão segue uma
metodologia projetual semelhante à do designer, mas por ter um
caráter empírico é, por vezes, discriminado.
A pesquisa limitou-se a estas duas situações a fim de
compreender a produção cerâmica artesanal contemporânea em
dois contextos: um local e um global, embora com similitudes nos
modos de produção e com histórias marcadas pelo fazer
artesanal, que se revelam como fundamental “modelador” da
pesquisa.
Partimos da perspectiva teórica que percebe o trabalho
artesanal como parte da vida econômica contemporânea
(SANTOS & RODRIGUEZ, 2002). As nossas questões de pesquisa se
colocam dentro de diversas problemáticas, seja do artesanato na
sociedade contemporânea e suas relações com Estado e
mercado; seja da economia da cultura capitalista. Este ponto de
vista orienta nossa investigação e nos dá elementos para pensar o
enraizamento e o sentido do fazer artesanal.
Trata-se de conexões preliminares entre fatos observados
em uma experiência de campo e no levantamento documental e
bibliográfico. Questões sobre o sentido do fazer artesanal na
contemporaneidade. Aqui, o trabalho artesanal é compreendido
como forma de resistência.
Entretanto, para compreender essa produção artesanal de
maneira ampla, há que conhecer o entorno social onde está
inserida ou onde foi produzida. Segundo Canclini, é necessário
observar os contextos e “situá-los na lógica atual das relações
sociais” (2008, p. 212). Atendendo sua sugestão, percebemos a
forma como a atividade da cerâmica artesanal se reestrutura na
atualidade e no espaço em que se insere, nas dimensões social,
cultural e econômica, analisadas no percurso criativo do artesão
Osmar e do ceramista Paim.
O estudo do cotidiano (CERTEAU, 1996) também é
importante instrumento de pesquisa, trazendo à discussão a
61
concepção dos movimentos de resistência de alguns grupos
tradicionalmente constituídos ante as forças hegemônicas de
reprodução e de controle social da ordem capitalista dominante.
Vale lembrar que a história do artesanato confunde-se com
a história do homem (CHITI, 2003), pois a necessidade de produzir
bens de uso rotineiro e ornamentos são expressão da capacidade
criativa e do trabalho. Porém, no formato como é pensado,
produzido e consumido hoje, se assume como ferramenta
importante para o estudo da (re)formulação das relações
econômicas, políticas e sociais no setor.
3.1 Contexto cerâmico matogrossense: suas mudanças e ressignificações
Antes de mergulharmos nas pesquisas sobre o contexto
cerâmico matogrossense e suas mudanças, vale mencionar o
porquê da escolha. Tendo passado grande parte da minha vida
em Cuiabá, capital de Mato Grosso, convivi com artesãos, ouvi
suas histórias e suas experiências. Daí surgiu a ideia de estudar o
artesanato cerâmico enraizado neste contexto como trabalho e
criação, uma vez que a cerâmica justifica seu valor como veículo e
base material para a cultura e o conhecimento em toda época e
lugar (FRADE, 1999).
Consultando pesquisadores da região como, por exemplo,
ANDRADE, 2000; ARRUDA, 1989; JANUÁRIO, 1997; PALMA, 1986;
TOREZAN, 2000, percebe-se que a maioria dedicou-se ao estudo
da comunidade São Gonçalo Beira Rio, conhecida pela fabricação
da cerâmica artesanal. Então, essa pesquisa foi direcionada a
ceramistas artesãos de fora dali. E assim, somaram-se
inquietações antigas a respeito desse saber fazer à proximidade
do processo produtivo, delineando-se o objeto desse estudo.
Cuiabá, capital de Mato Grosso, é conhecida como "cidade
verde" por causa da grande arborização e está cercada por três
grandes ecossistemas: a Amazônia, o Cerrado e o Pantanal. Além
de estar próxima à Chapada dos Guimarães, é considerada a
porta de entrada da Floresta Amazônica.
A cidade se conurba com o município de Várzea Grande.
Segundo o censo de 2010, a população é de 556.298 habitantes,
enquanto a população da conurbação ultrapassa os 800 mil. Já o
62
colar metropolitano chega a um milhão de habitantes20,
formando uma pequena metrópole no centro da América do Sul.
Figura 3: As obras – os filtros – do artista cuiabano Sebastião Silva. Fonte: www.rmtonline.globo.com/noticias. Acesso: 28 de março de 2011
Cuiabá tem um histórico cultural marginalizado, distante do
panorama global, e por isso bem característico. A cultura africana
e indígena são as mais fortes influências, presentes em todas as
manifestações artísticas. A população apresenta peculiaridades
que acabam por conferir à região uma grande diversidade
20 Dados do censo 2010, publicados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística. Disponível em: www.censo2010.ibge.gov.br. Acesso em: março de 2011.
sociocultural, revelada nos modos e fazeres distintos da arte
local.
As manifestações artísticas são patrimônios incontestáveis
do local, cujas riquezas da fauna e flora ainda guiam o
imaginário21 popular. Frutas típicas da região saem dos quintais e
são vistas nas pinturas dos artistas cuiabanos. Os peixes,
capivaras, tuiuiús e onças pintadas refletem a beleza e
diversidade da região.
A economia, hoje, se baseia na agroindústria, com um
distrito industrial de infraestrutura recente. Cultivam-se lavouras
de subsistência e hortifrutigranjeiros. A presença das indústrias
frigoríficas, de laticínios e derivados e o crescente mercado do
21 O conceito de imaginário é amplo e não pretendemos apresentar um exaustivo estudo sobre o assunto. O que buscamos é fazer uma leitura que nos ajude a pensar Imaginário Popular. O conceito formulado por Gaston Bachelard (1884-1962) é utilizado nesta análise para pensar a cerâmica. Contudo, tomaremos como base a linha de pensamento do antropólogo Gilbert Durand (2004), que possui traços de natureza coletiva à medida que incorpora dimensões da vida social e da cultura e, também as reflexões sobre o imaginário do sociólogo Edgar Morin (1970).
63
turismo tem forte potencial de desenvolvimento, em função da
capacidade empreendedora local22.
A diversidade regional também se revela nas manifestações
culturais, com traços da cultura indígena e negra, em formato
folclórico e artesanal.
Segundo Lima (1975), o artesanato em Mato Grosso é
consequência da mistura de culturas ameríndias e européias, com
ênfase na cultura ibérica, guardando semelhanças e refletindo a
influência dos antepassados com características e aspectos
culturais típicos. Entretanto, um dos mais expressivos indicadores
desta diversidade encontra-se na cerâmica artesanal, favorecido
pela abundante disponibilidade de matéria prima na região.
Registros históricos comprovam que, em escavações nos
sítios arqueológicos, foram encontrados objetos cerâmicos de
22 Dados do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento Urbano de Cuiabá.
Disponíveis em: www.cuiaba.mt.gov.br. Acesso em: março de 2011.
sociedades antigas23, semelhantes às peças produzidas em São
Gonçalo Beira Rio. Algumas características presentes na
fabricação dessas cerâmicas, como a estética, estilo e
acabamento, são as mesmas utilizadas na cerâmica
matogrossense (SYMANSKI, 2010).
A história urbana de Mato Grosso teve início em 1719. Seu
povoamento é decorrente da descoberta do ouro na região pelas
primeiras expedições de bandeirantes, que visavam capturar
índios24 para escravizá-los.
23 Os registros demonstram que indivíduos de diferentes regiões da África
utilizaram a cerâmica como veículo de expressão de identidades diversificadas. Através desse material, eles reproduziram memórias e representações de sua terra natal, reapropriando-se simbolicamente desses espaços (SYMANSKI, 2010). 24 Os Indígenas Bororo ou Coxiponé têm complexa organização social, rica cultura material e elaborada vida cerimonial. Tal sociedade localiza-se no estado de Mato Grosso, com população estimada em 914 indivíduos (BYINGTON 2006)
64
Figura 4: Cerâmica cuiabana. Fonte: www.rotasedestinosdeviagem.blogspot.com.br
Acesso em: 06 de março de 2011
Figura 5:Índio Bororo em traje ritualístico. Fonte:www.flickr.com/photos/rodrigo_ono
Acesso: 28 de março de 2011
Segundo relatos de moradores da comunidade, um dos
primeiros ocupantes da área encontrou uma imagem de santo25
dentro do rio, que deu origem ao nome Arraial de São Gonçalo
Beira Rio, hoje bairro São Gonçalo Beira Rio (ROMANCINI, 2007).
Figura 6: Santo São Gonçalo. Fonte: www.benditosanto.blogspot.com.br Acesso em: 6 de março de 2011
25 São Gonçalo é um santo português de 1187. O culto foi permitido pelo papa
Júlio III, em 1551. Sua missão era zelar pela virtuosidade das mulheres e organizar danças nos dias de sábado até se casarem. A homenagem ao santo é feita, na região, como pagamento de promessa (MAGALHÃES, 1995).
65
Nas proximidades do povoado, foi construída, em 1914, a
Usina de São Gonçalo, para produção de açúcar e álcool – grande
responsável pelo crescimento do pequeno núcleo populacional.
Porém, a atividade não durou muito. Com o declínio da produção,
na década de 1930, a grande quantidade de argila acumulada às
margens do rio fez do artesanato de cerâmica o meio de vida de
grande parte da comunidade (ROMANCINI, 2007).
O crescimento industrial delineou outra realidade para o
artesanato, trazendo queda considerável no valor utilitário dos
artefatos de barro. Nas primeiras décadas do século 20, essa
atividade artesanal passou a sofrer grande influência dos
aspectos econômicos mundiais e das novas práticas de consumo.
Na década de 1970, a produção da cerâmica artesanal viveu um
dos períodos mais críticos (ROMANCINI, 2007). Nos anos de 1980,
o Brasil percebeu a necessidade da valorização dos aspectos
culturais do país, promovendo programas de qualificação
profissional e de melhoria da comercialização do produto
artesanal, além de um calendário nacional de eventos do setor. O
Programa do Artesanato Brasileiro foi criado nos anos 1990 no
âmbito do Ministério da Ação Social. Em 1995, o Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior assumiu sua
gestão. Atualmente, está sob a coordenação do Departamento de
Micro, Pequenas e Médias Empresas da Secretaria do
Desenvolvimento da Produção26.
A criação do Museu de Arte e Cultura Popular de Mato
Grosso, em 1974, visava, especialmente, valorizar a cerâmica
produzida em São Gonçalo Beira Rio27.
Com a abertura do mercado turístico na região e tendo que
atender a demanda local e externa, a produção precisava crescer
para enquadrar-se às exigências do novo mercado. Porém, o
tempo da produção artesanal, a escassez da argila, a falta de
organização dos artesãos e a busca por segurança no trabalho
26 O PAB cria ações que contribuem para o desenvolvimento e o
aproveitamento das vocações regionais e a geração de trabalho e renda. Disponível em: www.mdic.gov.br. Acesso em: 19/03/11. 27
No MACAP existem exposições periódicas das cerâmicas da comunidade São Gonçalo Beira Rio. Disponível em: www.rmtonline.globo.com. Acesso em: 19/03/11.
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assalariado ameaçavam a atividade cerâmica. Diante da nova
realidade econômica, social e cultural, os artesãos precisaram
repensar o processo de produção e, principalmente, a
comercialização dos produtos.
Figura 7: Cerâmica São Gonçalo Beira Rio. Fonte: www.mtonline.globo.com Acesso: 28 de março de 2011
Com as transformações na relação produção, circulação, e
consumo de peças cerâmicas, assim como as mudanças da
construção do seu valor simbólico, eles se viram forçados a
participar de associações que “garantiam” a sobrevivência e
manutenção de suas atividades28. Nessa perspectiva, o artesão,
antes anônimo e isolado em uma pequena localidade, passava a
interagir com “as indústrias culturais, o turismo, as relações
econômicas e políticas, o mercado nacional e transacional de
bens simbólicos” (CANCLINI, 2008, p. 245).
Figura 8: Artesãs de São Gonçalo Beira Rio. Fonte: www.turismorural.blogspot.com.br
Acesso em: 06 de março de 2011
28 É o caso das Cooperativas e Associações de Artesanato. A Associação dos
Artistas Plásticos e Artesãos do Vale do Araguaia – Valearte – de Barra do Garças, fica a 500 km de Cuiabá, Mato Grosso.
67
Nesse sentido, o modo do fazer cerâmico de São Gonçalo se
mantém, hoje, como herança, passada de mãe para filha, o que
evidencia a importância do papel desempenhado pelas mulheres.
O grupo doméstico é a estrutura fundamental tanto por ser a
unidade econômica de produção como por estabelecer a unidade
política. Além de contribuir para aumentar a renda familiar, essa
atividade estimula o convívio social entre os vizinhos,
fortalecendo os laços de solidariedade e reforçando o sentimento
de pertencimento. A divisão do trabalho é simples, uma vez que
tem como único critério o gênero. Entretanto, há casos de
presença masculina na produção – eles preparam o barro, ajudam
a dar acabamento, enformam e queimam as peças (PALMA,
1986).
Porém, em função dos “novos tempos”, os herdeiros deste
“saber fazer” rejeitam sua herança. Na maioria dos grupos, o
papel do produtor é exercido pelo mesmo indivíduo por mais de
uma geração (ROMANCINI, 2007).
Assim como Ricardo Gomes (2011), acreditamos que a
riqueza do artesanato brasileiro deriva da multiplicidade do fazer
artesanal. Esse fazer é diverso e rico, tanto pelas matérias primas
que emprega quanto pelas técnicas de produção, e também
devido às realidades vividas por aqueles que o produzem.
Considerando a importância de compreender como a
prática da cerâmica artesanal ocorre dentro deste cenário
contemporâneo, sujeito a constantes transformações sociais,
culturais e econômicas, segue-se a apresentação do primeiro
contexto, o do artesão Osmar, tomado para o estudo de caso. Sua
importância reside no fato de ser depositário de um passado que
traz à tona vestígios tradicionais desse saber fazer, além de
promover um debate em torno de questões relacionadas à
existência contemporânea da atividade. Com isso, estabeleci
algumas conexões, articulando a teoria aos seus depoimentos.
Essa pesquisa de campo, guiada pela curiosidade e intuição,
busca também provocar reflexões acerca das interferências e
apropriações verificadas no diálogo de alguns saberes que
confluem na contemporaneidade: design, arte e artesanato. Até
porque como assinala Sylvia P. Alegre (1985):
68
Toda discussão sobre fronteiras entre ‘arte’ e ‘artesanato’, entre‘artista’ e ‘artesão’, a partir do discurso dominante, carece de sentido dentro da perspectiva do indivíduo que exerce essa atividade, pois ele raramente separa a instância do trabalho manual ou mecânico (‘artesanal’) do trabalho intelectual e confere a ambos igual dignidade (p. 10).
Estas e outras questões me guiaram de um contexto micro,
de caráter local, para um macro, até porque as identidades
regionais, locais, colocam-se para o design como uma valiosa
fonte de matéria prima (RODRIGUES, 2005).
3.1.1 O fazer artesanal de Osmar Virgílio da Silva
A origem29 do fazer cerâmico está intimamente ligada ao
costume indígena e, provavelmente, africano, de fabricar
29 É importante mencionar que ao se colocar origem, não há nenhum intuito
purista na análise, pois não acreditamos nessa experiência. O que se quer dizer aqui é como foi contada a história e como este saber foi transmitido por gerações passadas.
cerâmicas utilitárias e decorativas para armazenar, cozinhar,
servir alimentos e para ornamentação. O próprio artesão Osmar,
frequentemente, se reportava à raiz negra e indígena quando se
referia ao seu fazer.
No campo científico, a cerâmica está ligada à mineralogia, à
arqueologia e às ciências antropológicas e tem diretas conexões
com a arte. Mas, se na arte, os quatro elementos solicitam o
devaneio do artista, no ofício, liga-se às forças físicas do artesão
que age sobre a matéria argila e dá forma ao objeto cerâmico
artesanal (BACHELARD 1991).
A produção de artefatos a partir de argilas consiste na
fusão de terras e rochas que, quando amassadas, tratadas com
água e colocadas em alta temperatura, secam, endurecem e se
transformam em cerâmica. Algumas peças são acromáticas;
69
outras têm coloração obtida com o uso do próprio barro em
estado líquido ou com pigmentos vegetais 30 para acabamento.
Na cultura da cerâmica, os significados na história de vida
dos artesãos e seu valor simbólico se caracterizam pelas práticas
sociais de trabalho e pela elaboração sociocultural que se trava
na própria comunidade, alimentando a significação e a práxis do
território.
Seu processo de confecção implica em profundo
conhecimento de tipos de argila e o modo correto de coleta e
armazenagem, além do domínio do processo de transformação
da matéria bruta, para dar forma ao objeto. Além de métodos de
trabalho e processo de produção, esses objetos revelam rituais de
vida, cuja natureza e significado procurei investigar.
Este subitem começa pela revelação de aspectos biográficos
desse artesão, suas escolhas pessoais e a trajetória profissional
30 Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimento,
Louças, Sanitárias e congêneres – ANFACER. Disponível em: www.anfacer.org.br. Acesso em: 19/03/11.
que o conduziram para a cerâmica artesanal, gerando o único
meio de subsistência de sua família. O motivo da escolha dele
como principal informante do estudo se deu a partir do
levantamento de dados sobre a cerâmica artesanal na região.
Quase todas as indicações convergiam para a comunidade
ribeirinha tradicional, São Gonçalo Beira Rio. Mas algumas nos
conduziram ao artesão Osmar.
Osmar Virgílio da Silva é artesão mato-grossense, tem 42
anos de idade, 22 de arte cerâmica. É casado com Lise e tem 3
filhos: a mais velha com 19, o do meio com 10 e a caçula com 2
anos de idade. Nasceu em Poxoréu, interior de Mato Grosso, mas
mora na capital, Cuiabá, há quase 20 anos. Seus pais são naturais
da cidade de Caruaru, Pernambuco.
Osmar não se insere no estatuto do artesão, razão mais
motivadora da investigação. Ele não tem tradição familiar no
artesanato; mantém-se na atividade há quase 22 anos; expõe
seus artefatos em feiras locais, geralmente como autor artesão,
representando sua empresa “Barro Vivo”; fez dezenas de cursos
técnicos na área; resvala no campo do Design quando ministra
70
oficinas para outros artesãos profissionais; tem inserções
midiáticas, já tendo concedido diversas entrevistas a jornais,
revistas e programas de televisão locais – eis algumas
características desse profissional que foge ao estereótipo de
artesão tradicional, mas nem está fora do artesanato e nem do
design.
Figura 9: Osmar e sua peça cerâmica. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011 e
Mestre Vitalino. Fonte: www.onordeste.com. Acesso: 16 de junho de 2011
É considerado o maior produtor individual de cerâmica
artesanal da região, e não participa da comunidade tradicional
local, nem de associações e cooperativas. Trabalha sozinho na
produção, com a ajuda dos filhos na pintura de pequenas peças e
da mulher na venda dos objetos cerâmicos, no espaço que aluga
no centro da cidade. Batizou seu empreendimento de “Barro
Vivo” (Figura: 23), em referência aos quatro elementos da
natureza: terra, água, ar e fogo.
Embora enraizado em uma cultura local, a memória do
artesão Osmar, ganha força no desenvolvimento das peças
cerâmicas, dando lugar ao cruzamento de várias referências
culturais. No seu trabalho, faz questão de buscar referências nas
culturas mato-grossense e nordestina. Seu “sonho”31 é seguir os
passos de Mestre Vitalino32, artesão nordestino que retratava seu
cotidiano em esculturas de barro.
Dito isto, cabe refletir sobre o processo criativo e produtivo
de peças cerâmicas artesanais do artesão Osmar, que esta
pesquisadora pode acompanhar em visitas a sua casa que, não
31 O trabalho do “sonhador que modela” é analisado por Bachelard (1948)
como decorrente do movimento entre vontade (força contra a matéria) e imaginação (imagens da intimidade).
32 Vitalino Pereira dos Santos. Parte de sua obra pode ser contemplada
no Museu do Louvre em Paris. No Brasil, o maior acervo está em Recife, Caruaru, onde ele morreu em 1963. Disponível em: www.itaucultural.org.br. Acesso em: 19/06/11.
71
por acaso, é também sua oficina, e a sua empresa “Barro Vivo”,
entre novembro de 2010 e junho de 2011.
3.1.1.1 Primeiro encontro
Nosso primeiro encontro foi em novembro de 2010, porém,
devido à quantidade de peças que teria de produzir,
encomendadas para as comemorações de final de ano, não
poderia dar a atenção merecida aos trabalhos de campo. Mesmo
assim, pedi para acompanhá-lo no seu dia a dia. Osmar se
mostrou atencioso e pronto a contribuir com a pesquisa.
A câmera nos levou ao cotidiano do artesão, mostrando
imagens de sua casa e de sua oficina cerâmica. Osmar me contava
como o barro chegou às suas mãos e como descobriu, por acaso,
o que queria fazer pelo resto da vida. Pude observar o movimento
da oficina e a rotina da família.
Quem chega à sua casa tem a atenção voltada para a
profusão de objetos cerâmicos em todos os cantos, que atestam
o valor da atividade no dia a dia da família, compreendida e
representada, principalmente, a partir deste ofício como
sentimento de pertencimento ao lugar, rico em “construções
identitárias e projeções simbólicas” 33.
Figura 10: Fachada da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal.
Novembro de 2010
33 Expressão utilizada por Carvalho (2008) para indicar a construção da
identidade social que se processa no âmbito das projeções simbólicas articuladas pelas práticas do cotidiano, com exaltação das diferenças culturais dos grupos, apesar da força totalizante dos interesses econômicos decorrentes da globalização.
72
Todo seu saber artesanal, suas experiências com o barro,
suas técnicas, são empregados na produção de artefatos que ao
mesmo tempo são mediadores de relações sociais e serão
submetidos ao mercado.
Figura 11: Fachada lateral direita da casa. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
Em seus trabalhos com carrancas, máscaras e figuras
humanas, observamos a inspiração em grafismos indígenas e
referências africanas. O artesão dedica-se, também, à pesquisa de
referências regionais para seus objetos em argila, como utensílios
domésticos e de decoração e nos ornamentos em potes,
moringas, vasos e filtros.
No entanto, a atividade nem sempre é desenvolvida ao
longo de todo o ano, estando sujeita a períodos sazonais, em
razão da disponibilidade de matéria-prima e também da
demanda.
Figura 12: Jogo de chá feito por Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
Quando não há encomendas, Osmar cria novas peças, faz
misturas com novos produtos, executa novos tratamentos na
argila. Além disso, trabalha com reaproveitamento de materiais,
como a fachada da casa feita com refugo de pastilhas e azulejos
73
recolhidos de uma casa em reforma. Ele comenta que existem
materiais e ferramentas em sua oficina que foram retirados de
caçambas de entulho, recriadas e reaproveitadas.
O trabalho se orienta para a produção de objetos de uso
mais comum, seja em função utilitária, decorativa ou religiosa,
mas também existem objetos singulares, influenciados pelo
ambiente em que vive e pelo modo de vida da área cultural a que
pertence.
Figura 13: Sala da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
Na estante improvisada na sala da casa, ficam expostos os
artefatos cerâmicos produzidos e não comercializados,
misturados a objetos industrializados, como um constante
processo de hibridização cultural que nasce da velha tensão entre
tradicional e moderno (CANCLINI, 2008).
Para Osmar, falar de sua peça é quase como falar dele
mesmo. Podemos percebê-lo por meio dos seus objetos,
confirmando o que diz Albornoz (2004, p.63): “a produção do
objeto pelo homem é ao mesmo tempo um processo de
autoprodução (...)”.
Figura 14: Sala da casa do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011
74
Ele se sente herdeiro de uma tradição34 que lhe dá
existência, mantendo-a por meio de repetições de modelos,
fazendo com que os artefatos persistam no fluxo do tempo. É por
meio dessas repetições, com variações imperceptíveis, que seu
trabalho se torna parte da tradição local.
Figura 15: Oficina no fundo da casa do artesão. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
34 Entende-se tradição um conjunto de sistemas simbólicos que são passados
de geração a geração e que tem um caráter repetitivo. É considerada dinâmica
e não estática, uma orientação para o passado e uma maneira de organizar o
futuro. Coordena à ação que organiza temporal e espacialmente as relações
dentro da comunidade (GIDDENS, 1997).
Na oficina erguida no quintal da casa, como se fosse sua
extensão, observamos a produção de algumas peças cerâmicas.
Encontramos ali, na manufatura dos objetos do artesão, uma
mistura de técnicas reminiscentes e outras tecnologias, como o
torno elétrico.
O seu dia se organiza em torno desse fazer, uma vez que o
processo de produção é demorado e se estende ao longo de dias.
Consiste em extrair a argila de jazidas próximas à sua casa;
estocar em sacos úmidos para o equilíbrio do material orgânico;
compactar e dividir em bolas de argilas; modelar em torno
elétrico; secar à temperatura ambiente; e posteriormente
queimar em fornos intermitentes a uma temperatura de mais ou
menos 700ºC.
Os elementos naturais com que o artesão lida diariamente,
como terra, água, ar e fogo em seus diversos estados, são
complexos, mas Osmar parece dominá-los. Acreditamos, assim
como Bachelard (1991), que as realidades materiais oferecidas
pela natureza são convites para exercer nossas forças. O autor
afirma que:
75
(...) A realidade material nos instrui. De tanto manejar matérias muito diversas e bem individualizadas, podemos adquirir tipos de flexibilidade e de decisão. Não só nos tornamos destros na feitura das formas, mas também nos tornamos materialmente hábeis ao agir no ponto de equilíbrio de nossa força e da resistência da matéria (p.21).
Figura 16: O artesão trabalhando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal.
Novembro de 2010
No processo de construção do artefato cerâmico, as
atividades são muitas e necessitam não só de força física, mas de
força técnica. Enquanto ele produzia, conversávamos sobre seu
ofício e eu observava seu ritual.
As técnicas e habilidades artesanais são aprendidas de
diversas formas, sendo frequente o aprendizado pelo
compartilhamento de experiências entre artesãos: o artesão que
assume o papel de mestre domina e repassa técnicas tradicionais
ou modernas a interessados. Também há casos de ensinamento
por consultores ou instrutores. Os contatos são sempre diretos,
estabelecendo um caráter de pessoalidade na relação ensino-
aprendizagem. As fontes mais reconhecidas de referência para o
trabalho do artesão são a matéria-prima existente na localidade,
a arte e a simulação da sua realidade cotidiana e social.
As técnicas da olaria, ele aprendeu com dois mestres, por
meio da troca e soma de conhecimentos, que se mantém viva
como um saber intimamente ligado à sua história. Ele menciona
um mestre nordestino e outro matogrossense que criaram, a
partir do ofício, uma verdadeira escola, passando suas técnicas
76
artesanais aos filhos e aprendizes, se deixando observar durante a
construção do artefato. Osmar compartilha dessa prática. Além
de transmitir os ensinamentos para os filhos, procura ensinar
artesãos iniciantes.
Figura 17: O artesão e suas tarefas domésticas. Fonte: Acervo pessoal.
Novembro de 2010
Entretanto, os trabalhos na oficina se misturam com os
afazeres da casa e algumas tarefas domésticas acabam sob sua
responsabilidade. Tentando superar as condicionantes, era visível
o esforço de Osmar em organizar o tempo, com ânimo de tocar
tudo ao mesmo tempo. Enquanto a mulher tomava conta das
vendas de suas peças cerâmicas no centro da cidade e a filha mais
velha seguia sua vida em um trabalho fora de casa, encarava com
naturalidade e se mostrava bem disposto ao serviço. Contudo, a
importância deste fazer na vida do artesão parecia subverter a
ordem natural das coisas.
Figura 18: Mulher do artesão Osmar, Lise. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011
O fazer artesanal, assim compreendido, por um lado
carrega em si um acúmulo de conhecimentos de ordem técnica e
material, necessários à sua concretização. Por outro, está
77
firmemente enraizado em um universo dos símbolos que
mobilizam o artesão na busca de significados (CRUZ, 2010).
Observando Osmar sentado em volta do torno35, observei
seu saber cerâmico ao moldar a argila, ao explicar cada fase do
processo, na obtenção do material, na sua preparação, na
modelagem, no processo de secagem, na queima, onde se atinge
a transformação da argila em cerâmica. Sobretudo, as falas
corporais, quando seu corpo debruça sobre seu ofício,
multiplicando possibilidades para que sua história persista no
tempo.
O espaço da produção das peças era bastante úmido, pois
durante todo o processo de beneficiamento e modelagem, água
era adicionada à argila. Ele usava uma lona como avental para
cobrir suas pernas e proteger as roupas da água que se soltava do
torno em movimento. Mas o barro estava impregnado em todo o
espaço.
35 É um equipamento movido por tração humana ou eletricidade. Em estrutura
de madeira com dois discos. Provavelmente uma das primeiras tecnologias desenvolvidas para a produção em grande escala (TORTORI, 2008).
Ao modelar o barro, suas ferramentas, anotações de
clientes, o aparelho de som e tudo a sua volta ganhava “cor de
barro”, alimentando a significação do cotidiano e a práxis de sua
atividade. Ele parecia gostar desse cenário e dizia que o que mais
o atraia era a possibilidade de trabalhar com as próprias mãos os
quatro elementos: água, terra, ar e fogo.
Sua fala era comovente e parecia querer provar sua paixão
pela cerâmica:
Osmar disse que trabalhou em uma olaria antes de se
decidir pelo artesanato. Lá, aprendeu o processo de produção da
cerâmica industrial. Disse que se sentia explorado e não tinha
prazer em trabalhar. O gesto repetido do fazer cerâmico, do
cumprir as fases no tratamento da argila, da tecnologia do torno,
das ferramentas improvisadas, na intenção de dar forma ao
informe, define um território que tem como primeira
característica uma “resistência” imediata e constante. No fazer
Eu tinha outra profissão, mas larguei tudo só pra fazer cerâmica... Disse que vou fazer cerâmica independente de qualquer coisa. Se não vender, eu vou fazer e quebrar...
78
artesanal de Osmar, a matéria dura, resistente e sem forma
tornava-se plástica, flexível e criativa, assim como em Bachelard
(1991). A partir do seu encontro com a água, um novo corpo se
forma e surgem novas possibilidades de interação.
O movimento de trabalho de Osmar contra a matéria
argila era intenso e apaixonado, parecia desafiar a força numa
atitude dinâmica e transformadora. Mas para o artesão, a
cerâmica é, antes de tudo, trabalho – tão complexo que
compreende um conhecimento amplo, que vai desde a matéria
prima até as questões de mercado. Este último, segundo ele,
ainda se apresenta como um grande desafio.
O gesto repetido do fazer cerâmico, do cumprir as fases no
tratamento da argila, da tecnologia do torno, das ferramentas
improvisadas, na intenção de dar forma ao informe, define um
território que tem como primeira característica uma “resistência”
imediata e constante. No fazer artesanal de Osmar, a matéria
dura, resistente e sem forma tornava-se plástica, flexível e
criativa, assim como em Bachelard (1991). A partir do seu
encontro com a água, um novo corpo se forma e surgem novas
possibilidades de interação.
Figura 19: Artesão Osmar no seu ofício. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2011
79
Figura 20: As mãos do artesão Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
A mão do artesão foi descrita como uma importante
ferramenta, assim como em Bachelard (1991), para a realização
do seu trabalho. Calejada, com os dedos ressecados, unhas sujas
de barro, apresentava-se como configuração estética
manufatureira e um envolvimento físico integral, ou seja, de
corpo e espírito, na transformação da argila e “feitura” 36 do
objeto cerâmico.
36 Utilizamos o termo feitura empregado por Bachelard (1991), para
relacionarmos ao termo utilizado como tema deste capítulo – O fazer manual.
Para esse mesmo autor, a transformação acontece também
dentro do indivíduo, pois a matéria é oportunidade de realização
pessoal. E continua: “o artista do barro pratica sua arte sobre
uma matéria amorfa, submete essa matéria a certas restrições:
ele a despedaça e a modela, impondo-lhe limites” (p.53).
Depois de moldado e cortado na base até a forma de um
pequeno pote, a peça era colocada em uma bancada de madeira
improvisada, para “descanso” e secagem à sombra, dando corpo
a uma peça resistente. Segundo Osmar, o número de peças
deformadas e rachadas na fase da queima é menor nas
torneadas, pela ausência de arestas e vértices. Assim, formas
cônicas, cilíndricas, esféricas e ovais são recorrentes no universo
de uma boa produção cerâmica com o uso do torno (SILVA, 2008).
Neste primeiro encontro, não acompanhamos a fase da
queima, pois o forno, criado pelo próprio Osmar, estava ocupado:
...Tô queimando uma fornada... Tá aceso desde ontem e eu tô aqui cuidando...
80
Figura 21: Forno construído por Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
Na fase da queima, as peças são “enfornadas”, isto é,
arrumadas dentro do forno e cobertas com cacos de cerâmicas
que ele reaproveita para conservar o calor. Quando submetidas
ao fogo em altas temperaturas, as peças adquirem a “resistência”
de mármore.
Mesmo com dificuldades comuns de uma atividade
considerada subalterna, com as limitações típicas de uma
produção artesanal, Osmar categorizou seu trabalho como um
“fazer divino”, reunindo nele atributos como resistência,
paciência, deleite, autonomia, liberdade. Ao definir assim seu
trabalho, o artesão coloca-o em um patamar no qual o deleitável
adquire qualidade de insurgência, funcionando como
possibilidade de resistência.
Minhas primeiras impressões a respeito do fazer artesanal
do “sonhador que modela”, parafraseando o filósofo francês
Gaston Bachelard (2001), ainda não se encontravam
amadurecidas, mas estavam arquivadas na memória, no caderno
de campo e, também, nas gravações do percurso da pesquisa,
para futuras consultas. Entretanto, ao ouvi-la, novamente,
percebi na fala do artesão, a tal autonomia de que ele tanto
falava:
...Eu produzo de tudo... Se eu chegar num lugar que tem barro, eu vô cavando buraco e dali eu já faço tijolo, daí tiro a segunda camada e já faço a telha e depois na terceira camada eu começo a fazer a cerâmica... Domino tudo da cerâmica.
81
Nessa definição polêmica, trabalho e modo de vida
parecem se alimentar de um processo particular, mesmo
participando da tão complexa relação – ser social e meio
ambiente, como se na essência criadora do modelar o barro,
fosse possível reinventar o sentido do trabalho na
contemporaneidade.
Figura 22: “Barro Vivo” Loja da família. Fonte: Acervo pessoal. Novembro de 2010
A atividade do artesão é um ofício, pois organiza e regula
seu cotidiano e lhe confere legitimidade social (PERELMUTTER,
2008). Sua oficina é regida por leis próprias e seu ritmo tem a ver
com as necessidades do seu contexto, mesmo que esteja inserido
num universo sociopolítico-econômico globalizado.
Embora o dia a dia do artesão não passe intacto às
influências do sistema capitalista vigente, a importância e o valor
que ele dá ao seu trabalho, têm a capacidade de externar a
riqueza do seu fazer artesanal e sua fração de contribuição social
na localidade. No entanto, trabalho como este pode ser
encontrado em diversas regiões do país ou do mundo, resistindo
aos apelos da massificação e produção em série, marcas da
sociedade industrial. Mas, em face das condições concretas
oferecidas pelo contexto no qual este trabalhador está inserido,
ele prova da essência criadora na arte e na vida.
Sua atividade artesanal não deixa de ter, em si, a
necessidade do comércio, assim como toda atividade análoga,
situação que, muitas vezes, permite a subalternidade social dos
artesãos trabalhadores frente ao lucro e ao acúmulo capitalista.
Porém, isso não dá mostras de que o artesão cede passivamente
sem qualquer resistência. Na realidade, ele integra o sistema
construindo sua inserção baseada em práticas sociais próprias de
82
valorização do seu trabalho, que se apoia em suas tradições, na
sua cultura e nos projetos de vida. Isto é uma forma de
resistência.
3.1.1.2 Segundo encontro
Nosso segundo encontro foi em junho de 2011. Osmar
mencionava importantes mudanças no seu processo produtivo.
Algumas eram visíveis já na entrada da casa. Parecia ter
conseguido realizar seu sonho de transformar a oficina, em um
lugar aberto ao público interessado em conhecer seu ofício.
Porém, a situação era paradoxal. Em uma das conversas, várias
dificuldades sobre o processo de produção da cerâmica vieram à
tona, dificuldades não mencionadas por ele no primeiro
encontro.
A preocupação era, especialmente, a respeito da extração
da matéria prima, que no início era feita nos barreiros próximos
de sua casa. No entanto, com o passar dos anos, o local se tornou
de difícil acesso pelo esgotamento dos depósitos naturais,
restando poucos pontos de retirada e um barro de má qualidade,
dizia Osmar. Hoje, a população que vive no entorno sofre as
consequências de um processo de urbanização acelerada e
excludente, que, entre outras coisas, aumentou os índices de
degradação e escassez do ecossistema local.
Figura 23: Endereço da casa de Osmar. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Sua prioridade não era mais o mencionado sonho e sim
desenvolver uma estratégia para assegurar a manutenção da sua
atividade. Isso implicava em adquirir argila garantindo matéria
prima suficiente para as necessidades da produção.
83
Osmar mencionou que adquiriu por um “bom preço”,
alguns meses antes da nossa segunda visita, argila proveniente de
uma olaria de cerâmica industrial da região, especializada na
fabricação de tijolos e telhas. Na verdade, consistia em um
“milheiro de argila”, ou seja, argila no formato de tijolos não
queimados. Ele mencionou que estava experimentando a ideia de
trabalhar com uma matéria prima já processada, mais
homogênea, limpa e preparada para modelagem, e não expôs
dificuldades de adaptação. Pelo contrário, em suas palavras,
tratava-se de “barro bom”, e passou a descrevê-lo:
Embora o artesão tivesse dificuldade de expressar todos os
seus motivos, a compra da matéria prima parecia, também, estar
ligada ao baixo preço final das peças e à grande concorrência na
tentativa de suprir necessidades básicas de sobrevivência. Assim,
na luta pela manutenção da atividade, o artesão buscou formas
alternativas de produção. O investimento feito foi a maneira
encontrada para dar continuidade ao ofício, sem que isso
acarretasse um “desvio do sentido” da atividade, ou seja, ele
ainda era produtor de cerâmica artesanal.
Figura 24: Osmar na frente da sua casa. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Era perceptível a melhora da situação econômica e social do
artesão, após a adequação no processo produtivo. A
...Ele é passado em vários maquinários... Tiram as impurezas que quebra a peça. É um barro super amassado e dá essa qualidade no trabalho. Se eu for fazer do barro in natura, com ele bruto, chegar e cavar lá no chão, peneirar, molhar, fazer as bolas dá muito trabalho, produz pouco.
84
disponibilidade da nova matéria prima ampliou os caminhos da
produção, viabilizando um aumento considerável e uma nova
linha de produtos dentro de padrões técnicos, o que possibilitou
sua inserção em alguns mercados antes inatingíveis. Segundo ele,
o prejuízo de peças quebradas, também diminuiu.
A manutenção do novo investimento é conseguida a partir
da venda de peças cerâmicas, em um processo constante,
impulsionado pelo aumento da produção e a necessidade de
recursos. Quando precisa investir, ele produz, vende, compra
matéria prima, produz novamente e comercializa, num ciclo
natural e necessário. Hoje, praticamente toda a argila utilizada na
produção advém de olarias industriais da região.
Entretanto, o trabalho do artesão ainda se faz de forma
individual, em sua oficina, no fundo da sua casa. Continua
obedecendo a um tempo que pode ser bastante extenso. Sua
jornada de trabalho está sujeita a muitas porosidades temporais.
Pode trabalhar por horas seguidas ou intercalar trabalho e
descanso, ou alternar com outras atividades, como tocar violão.
A questão do tempo parece ser uma característica
intrínseca dos objetos feitos à mão. Assim diz Sennett (2009):
A lentidão do tempo artesanal é fonte de satisfação: a prática se consolida, permitindo que o artesão se aposse da habilidade. A lentidão do tempo artesanal também permite o trabalho de reflexão e imaginação – o que não é facultado pela busca de trabalhos rápidos (p.328).
O tempo necessário para a realização da experiência
artesanal não pode ser medido pelo modelo tempo comum nas
organizações industriais. Heliana Marinho (2006) diz:
Há que se considerar que a produção de produtos artesanais, além de utilizar baixa tecnologia, surge de uma manifestação criativa, individual ou coletiva, estimulada por relações interpessoais. Tal processo produtivo sofre descontinuidade, pois é intercalado por outras atividades, realizadas simultaneamente, que trazem satisfação pessoal. O alto nível de envolvimento com o fazer, ou o executar o produto, talvez seja reflexo da linguagem simbólica e da materialização da experiência humana. Assim sendo, o tempo artesanal estabelece-se num cenário de conveniência e
85
de convivência, e não de segmentação e de seriação (p.130).
As imagens a seguir mostram, resumidamente, o novo
processo de produção:
Figura 25: “Milheiro de argila”. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Figura 26: Explicando o novo processo. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Figura 27: Quebrando o tijolo de argila não queimado. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
86
Figura 28: Mostrando o ponto da argila para o torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Figura 29: Levantando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Figura 30: Modelando a argila no torno. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Figura 31: Peças secando ao ar livre. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
87
Figura 32: Na fase da queima no forno que ele mesmo construiu. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Figura 33: Osmar, sua filha caçula e seu violão. Fonte: Acervo pessoal. Junho de 2011
Ao convidar Osmar para que falasse sobre o sentido do seu
trabalho, a expressão que mais ouvi foi autonomia e liberdade.
Entretanto, a maioria de suas descrições remetia a conceitos
amplos e interligados, por vezes confusos, mas as descrições de
vivências e experiências pessoais e profissionais possibilitaram
estabelecer algumas distinções.
Embora sua atividade possa ser percebida como regular ou
sistemática no sentido de sobrevivência profissional e não apenas
como um prazer vale indagar por quais critérios e valores Osmar
define seu trabalho como livre e autônomo. O fato de “trabalhar
por conta própria”, não sujeito a horário fixo ou rígido de
trabalho, em contraste com outras atividades que já exerceu,
talvez explique de certa forma. Além disso, ele diz ser “patrão
dele mesmo”, fator que para ele marca a diferença entre sua
atividade e a exercida por sua filha, que trabalha fora de casa.
Para o artesão, o trabalho que faz sentido, visto como
sendo capaz de satisfazê-lo e ser útil para a sociedade, aparece
como elemento fundamental em sua vida. Osmar sabe que o
sentido do ofício cerâmico está na intrínseca relação entre arte,
88
trabalho, existência e sobrevivência. Assim como, também, sabe
que seus valores e princípios são fundamentais à sua vida.
O valor a que me refiro, contido no trabalho, é elemento
de peso no domínio do seu ato produtivo. Todavia, tal
categorização não é algo que se limite ao mundo dos ceramistas,
visto que qualquer artesão a leva em sua arte, na condição de um
critério valioso, como revelado no estudo de Porto Alegre (1994):
A ética do trabalho, quando orientada pelo “espírito da arte”, envolve três aspectos particularmente importantes. Em primeiro lugar, o trabalho torna-se o centro de toda a vida do indivíduo [...] Em segundo lugar, o artista sente orgulho da profissão e da sua condição de autonomia. Finalmente, os diferentes valores convergem para uma síntese de relação com o trabalho e a obra produzida, que se expressa na reputação do mestre (p. 110).
E continua:
O aprendizado pode ser longo, a feitura do objeto pode requerer um domínio de técnicas e linguagem de materiais impossíveis de ser adquirido por meio de um conhecimento rápido
e superficial. No domínio progressivo da arte está embutida toda habilidade e toda a criatividade do artista. O reconhecimento desse difícil processo por parte dos outros se reveste por isso de fundamental importância para o artista, pois do que o valor de troca, mais do que valor de uso, o objeto encerra e contém um valor moral do trabalho realizado (Ibid., p. 112).
Acredito que a relação estabelecida entre o artesão e seu
trabalho é algo que permeia todos os aspectos de sua existência.
A escolha da atividade artesanal parece se impor como uma
espécie de missão que se une a um desejo de transformar o
cotidiano com sua própria mão. O trabalho artesanal pode
melhorar o relacionamento entre as pessoas, favorecendo a
reciprocidade e o fortalecimento dos elos socioculturais. A
comunicação é estimulada pelo espaço em que as atividades são
desenvolvidas, permitindo a aproximação e o aumento dos
vínculos afetivos.
Nesse sentido, o artesão é, portanto, um poeta que pensa
com as mãos. Se por um lado ele domina os conhecimentos
89
técnicos, por outro ele se entrega a devaneios e busca uma
experiência nova na antiga arte de trabalhar o barro, matéria que
ele conhece bem (BACHELARD, 1988).
Assim, é no fazer artesanal que o trabalho ainda parece
guardar conexões com seu sentido original, em que todos os
rituais que envolvem preparação e realização compreendem uma
síntese entre técnica, arte e vontade (BACHELARD, 1991),
explicado pelo artesão como um anseio maior que se apossa dele.
Quanto a isso, Octavio Paz comenta que “o objeto artesanal nos
entra logo pelos sentidos, vivendo em cumplicidade conosco”
(PAZ, 1991, p. 50).
Embora revele acreditar em virtudes humanas e declare ser
construtor de uma vida com sentido, mais gratificante e menos
sofredora, o artesão trabalha para obtenção do proveito
econômico para a sobrevivência. O que o diferencia dos outros
trabalhadores é o fato de atuar em relações sociais afetivas e
afirmar ter preocupações com a comunidade, o território e o
meio ambiente; buscando a sobrevivência e a inserção produtiva
mais solidária, mesmo que trabalhe só (HABERMAS, 1973).
Passamos agora à análise do trabalho do ceramista, Gilberto
Paim, no intuito de verificar, também, as diversas questões
relacionadas aos referenciais de sua pesquisa e ao
desenvolvimento de suas peças cerâmicas.
3.2 Percurso criativo do ceramista Gilberto Paim
O presente subcapítulo traz o percurso criativo do
ceramista Gilberto Paim, com o propósito de analisar o processo
de criação e produção de suas peças cerâmicas, que envolve
planejamento; esboço da peça (Figura); estudo dos estilos;
conceitos, formas, texturas, cores e grafismos; e segue na
confecção do artefato cerâmico de forma artesanal.
O objetivo é a possibilidade de considerá-lo inserido no
fazer artesanal contemporâneo, assim como se tentou inserir no
design o trabalho do artesão exposto anteriormente – dois
contextos distintos e distantes que se unem pelo interesse
comum nas possibilidades de criação e produção oferecidas pela
cerâmica. Esses contextos são analisados com a finalidade de
90
pensar as cisões estabelecidas entre o artesanato e o design,
formadas por um pensamento tradicional, com características
positivistas, acreditando que as fronteiras entre esses campos são
cada vez mais tênues (ANTUNES, 2009).
Nesse sentido, dei início a uma série de buscas que
revelaram tanto as singularidades de cada área quanto a
contaminação mútua. Assim, utilizamos alguns textos que
descrevem o trabalho do ceramista, por exemplo, o da jornalista
e professora de História do Design na Faculdade de Campinas –
FACAMP, Ethel Leon. Alguns textos do próprio Paim sobre a
temática também são analisados, visando instigar a reflexão
teórica e prática sobre essa relação. Reflexões pertinentes ao
contemporâneo complexo no qual estamos imersos.
Paim, além de ceramista, pesquisador e curador
independente, é doutor em Literatura Comparada pela UERJ (em
convênio com a École des Hautes Études en Sciences Sociales, de
Paris) e autor de: “A cerâmica e a Horla (1991)”, “Beleza sob
suspeita (2000)” e artigos publicados em periódicos
especializados nacionais e estrangeiros.
Figura 34: Gilberto Paim. Fonte: www.casacomdesign.com.br Acesso em: 20/11/11
Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro, a 150
km da capital, foi o lugar que Paim escolheu para morar e
trabalhar. Junto com sua esposa, Elizabeth Fonseca, transforma a
argila branca de porcelana – uma escolha do casal – em peças
91
cerâmicas, numa busca por equilíbrio e simplicidade. Juntos
produzem objetos cerâmicos desde 1980.
Figura 35: Uma imagem da amostra em Heidelberg, na Alemanha. Fonte: www.casacomdesign.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011
Já expuseram seus trabalhos em importantes mostras,
dentro e fora do Brasil 37.
Figura 36: Peças da coleção “A quatro mãos”. Disponível em: www.gilbertoeelizabeth.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011
37 Cerâmica Contemporânea, Paço das Artes, SP, 1983; Wilson & Gough, Londres, 1990; A Cerâmica e o Horla, individual no MAM RJ, 1991; A Nova Presença da Cerâmica, Paço Imperial, RJ, 1993; Artesãos do Brasil, Fundação Armando Álvares Penteado, SP, 2000; Cerâmica Brasileira, Construção de uma Linguagem, Centro Brasileiro Britânico, SP, 2000; Mestres da Cerâmica, Espaço Cultural dos Correios, RJ, 2001. No Rio de Janeiro e em São Paulo, suas peças são expostas regularmente nas lojas Interni. Desde o início de 2004, os dois ceramistas são representados pelas galerias Espasso de Nova York e Los Angeles. Já expuseram duas vezes na galeria Marianne Heller, em Heidelberg, considerada uma das melhores em cerâmica no mundo.
92
Seus artefatos parecem resgatar técnicas tradicionais,
caracterizados pela simplicidade das formas e exploração sensível
da superfície que aliado às novas tecnologias, parece combinar a
uma experiência urbana do ceramista, adaptando objetos às
necessidades dos dias atuais (LEON, 2007).
Figura 37: Interior do ateliê de Gilberto e Elizabeth, em Nova Friburgo. Fonte: www.casacomdesign.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011
No ateliê, Paim desenvolve pesquisas técnicas e estéticas,
ideias e experiências, que resultam nas mais variadas formas
cerâmicas.
O casal parece não pensar na produção a partir do
mercado, assim, percebemos certo controle na produção e na
gestão do tempo. Também parece não haver interesse na
produção seriada, o que, de certo modo, caminha no sentido do
ofício artesanal que os dois exercem. No entanto, preferem a
tecnologia de um forno elétrico no processo da queima das
peças, mas não dispensam as mãos no trabalho com a argila.
Figura 38: Gilberto e Elizabeth analisando as fotos da coleção. Fonte: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011
Sua atividade cotidiana parece partilhar de um universo em
que o trabalho garante a reprodução material, mas também
93
satisfaz o espírito, assim como para o artesão Osmar. Parece ser
pensada e praticada como no passado, transmitindo as
experiências para as gerações futuras, de acordo com o universo
paciente e meticuloso da atividade manual da cerâmica. A
imagem38 abaixo transmite essa atmosfera.
Figura 39: Gilberto amassando a argila branca de porcelana. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Suas referências parecem conceber a cultura material de
forma mais livre. Seus objetos combinam aspectos artesanais e
38 Imagem retirada do vídeo de Nina Paim, intitulado: Gilberto Paim & Elizabeth Fonseca – Julho de 2011. Disponível em: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011.
industriais e parecem demonstrar “a luta contra a tirania do
monótono” 39, num modo singular de projetar, modelar e
produzir.
Figura 40: Piões de porcelana, Gilberto Paim, 2006. Foto: Rômulo Fialdini Fonte: www.vitruvius.com.br. Acesso em: 10 de novembro de 2011
39 Título do texto da Jornalista Ethel Leon, especializada em Design, docente em História do Design e História do Design Brasileiro na Faculdade de Campinas – FACAMP. É autora do livro Design Brasileiro Quem Fez, Quem Faz, Memória do Design Brasileiro, 2005, Editora SENAC-SP.
94
A cerâmica de Paim parece ter mais afinidade com o
artesanato do que com o a concepção de design conhecida
atualmente. Segundo Leon (2007), ele vivem numa espécie de
ponto de contato entre os dois mundos. O do fazer manual que
segue teimosamente frente ao mundo industrializado. Repetindo
velhas formas de confecção da peça, numa espécie de reverência
aos mestres da cerâmica, independente de serem mãos de um
artesão ou de um designer.
Todos esses elementos certamente emolduraram a
produção material que conhecemos hoje. E o trabalho ou o fazer
que professa este caminho apresenta-se como um “reduto da
poesia” – o resultado são “poemas físicos”, cada vez mais
necessários na contemporaneidade. Os objetos de Paim nos
fazem reencontrar esse sentido tão distante, e ao mesmo tempo
tão próximo de nosso cotidiano (LEON, 2007).
Seguem algumas imagens do processo produtivo do fazer
artesanal de Paim:
Figura 41: Gilberto desenhando o objeto cerâmico. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Figura 42: Esboço da peça de Paim. Fonte: www.vimeo.com. Acesso em: 07 de outubro de 2011
95
Figura 43: Umidificando a argila. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Figura 44: Na modelagem da argila. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Figura 45: Levantando a argila no torno. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Figura 46: Medindo a circunferência. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
96
Figura 47: Usando uma de suas ferramentas. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Figura 48: Encaixando a base da peça. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Figura 49: Objetos de cerâmica espalhados pela casa de Paim. Fonte: www.vimeo.com Acesso em: 07 de outubro de 2011
Paim (2009) diz que embora os produtos industriais sejam
dominantes, os objetos artesanais continuam presentes e muitos
deles são feitos por artesãos contemporâneos, com formação
universitária em design ou não. Porém, esses artesanatos
modernos40 são percebidos com dificuldade no Brasil – razão para
nos debruçarmos sobre o tema cuja discussão parece distante,
mas surge comumente.
40 Expressão utilizada por Paim ao se referir ao artesanato contemporâneo.
97
3.3 O fazer manual: uma questão de resistência?
Ao contrário dos países em que o design e a arte se
desenvolveram a partir da memória artesanal, como Itália, Japão
e países escandinavos, essas atividades seguem caminhos
opostos no Brasil (BORGES, 2011). Na maioria das vezes, a arte
está em condição de superioridade, seguida pelo design e por
último o artesanato – renegado, ligado a tradições e desprovido
de criatividade.
Numa perspectiva histórica, como vimos no primeiro
capítulo desta dissertação, o desenvolvimento de produtos até a
era da industrialização era caracterizado pelo fazer artesanal.
Hoje, esses exemplos de produção, são alternativos e surgem
como formas de estimular o surgimento de estruturas não
convencionais de participação econômica, que fomentam a
adesão de grupos e elementos ainda não absorvidos pelas
correntes dominantes na geração de ocupação e renda
(MARINHO, 2006).
O fazer cerâmico artesanal dos casos analisados não se
caracteriza apenas pela fixação de uns poucos traços de
identificação entre eles. Motivados pelo acesso e pelo uso, tanto
dos métodos projetuais quanto das disponibilidades técnicas e
materiais, o artesão Osmar Virgílio e o ceramista Gilberto Paim
não apenas incorporaram ao seu trabalho as referências
artesanais como também, a partir dessas referências, recriaram
um modo particular de vida e trabalho. A engenhosidade
presente em suas atividades conjuga domínio de técnicas,
conhecimento da matéria prima, projeto e acima de tudo,
resignação. Isso é um ato de resistência?
A resistência, conforme interpretação de Coelho (1997) está
nos meios utilizados por comunidades na preservação das suas
tradições e identidade. Ela ocorre no embate simbólico com a
cultura dominante. No caso, a luta seria contra os aspectos que
caracterizam o trabalho e suas relações e as formas de produção
no mundo atual.
O trabalho e os sentidos que a ele são atribuídos na
sociedade contemporânea fazem jus a uma importante reflexão.
98
Ele continua como elemento central na vida da maioria dos
indivíduos, mas na dimensão social, adquire maior amplitude, por
parecer um elemento que deve contribuir para o
desenvolvimento não só de um grupo, mas da coletividade
(ANTUNES, 1999).
O trabalho é uma experiência social de resistência. Assim,
Cattani (1996) considera:
(...) as facetas essenciais do processo de socialização da construção identitária, das formas de dominação e de resistência; enfim, da dinâmica contraditória da economia de mercado, têm sua origem nas situações laborais e nas relações sociais estruturadas na atividade produtiva (p.39).
Desse modo, o fazer artesanal tem encontrado meios para
resistir ao achatamento da sociedade capitalista. Para alguns
artesãos e designers, isso se torna visível não só em seus
produtos, mas também em seu estilo de vida e trabalho, e em
suas relações sociais e de sobrevivência.
Maria Imbrizi (2005) ressalta:
[...] não só em função das condições oferecidas no espaço de trabalho, mas fundamentalmente porque o processo de formação percorrido pelo indivíduo nas várias esferas da socialização está tomado por valores vinculados à racionalidade do equivalente: o homem é formado para igualar-se aos outros; os espaços oferecidos para a participação e discussão de ideias são falsos. [...] Perde-se, então, a oportunidade desses espaços como possibilidades de avanço das relações entre os homens, que sob a ótica da tecnologia, tendem a ser calculados e mensurados segundo critérios de utilidade e lucro (p. 23).
Os dois casos representam os valores dos produtores com
suas próprias visões de mundo, influenciados pelo ambiente e
modo de vida próprio da área cultural a que pertencem. O fazer
artesanal se apresenta, por meio de realizações, como um ritual,
onde vida e trabalho se misturam e se organizam. Isto é, a vida
aparece na riqueza do ato produtivo e o trabalho incorpora um
modo de ser, estar e sentir o mundo (RAMALHO, 2010).
99
A questão aqui defendida é a de que o fazer manual não
representa mera estratégia de sobrevivência de grupos marginais
ao sistema. São esquemas de produção que transcenderam e se
mantêm vivos, paralelos ao processo de industrialização.
Matturana (2001) fala em forma de “emulação” ou de
“resiliência”41 frente ao modelo de produção econômica
dominante no mundo contemporâneo, surgindo como opção
amadurecida para o desenvolvimento local e territorial.
Entretanto, percebe-se que essas peculiaridades conquistadas
com o trabalho artesanal só são possíveis quando o artesão ou o
designer consegue ligar-se à fantasia de realizar um trabalho que
tenha expressão forte o bastante, como um ato de resistência,
41 Em ecologia, este conceito aplica-se à capacidade de um ecossistema
retornar a seu estado de equilíbrio dinâmico após sofrer alteração ou agressão. A resiliência "é a medida da capacidade de um ecossistema absorver tensões ambientais sem mudar seu estado ecológico, perceptivelmente, para um estado diferente" (Zedler & Cooper, 1980). O termo, apesar de guardar uma discussão a respeito de sua definição, vem sendo consensualmente utilizado como a capacidade humana para enfrentar, vencer e ser fortalecido ou transformado por experiências de adversidade. Disponível em: www.redeambiente.org.br. Acesso em: 12 de maio de 2012.
frente à técnica e à lógica da produtividade, para não submeter-
se ao ritmo da máquina.
100
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do sistema econômico vigente, deparamos com uma
sociedade sobrepujada pelo capital, na qual prevalece, em boa
medida, um pensamento que estimula os trabalhadores a
deixarem de ver o trabalho como uma parte prazerosa da vida,
encarando-o somente como meio de sobrevivência e acumulação
de riquezas.
Por outro lado, contrapondo as imposições do mundo do
trabalho, observamos a possibilidade de realização humana pelo
fazer (trabalho) artesanal, como forma de resistência a esse
sistema, recorrendo a processos de criação/produção de
artefatos e refletindo no modo de vida e trabalho objetivados
neste fazer.
Nesse sentido, a presente investigação percorreu trajetórias
articuladas no campo teórico e empírico sobre o sentido do
trabalho artesanal na contemporaneidade. A sistematização do
referencial teórico e a consulta a autores fundamentados nessa
perspectiva foi empreendida com a finalidade de subsidiar a
análise do processo de investigação.
Por isso, dois diferentes contextos de produção de cerâmica
artesanal foram abordados: o primeiro, do artesão Osmar, que
mora em Cuiabá, Mato Grosso e o segundo, do ceramista Paim,
de Nova Friburgo, Rio de Janeiro.
Como parte do método de investigação, foi realizado
levantamento das condições da produção e do fazer artesanal,
em visitas aos locais de produção e venda dos produtos
artesanais.
O resgate das atividades artesanais apresenta uma
estrutura bem-sucedida, que renova processos laborais do
passado e contribui para infinitas possibilidades de ser e estar no
mundo, sobretudo quando tece sua análise sobre o fazer
artesanal como forma de resistência. Por isso, é importante que
esses grupos produtivos se destaquem, na contemporaneidade,
quando crenças e valores são (re)discutidos, para romperem com
as certezas que vigoraram na sociedade.
101
O modo de produção artesanal compõe uma estrutura
econômica muito particular dentro do sistema que impera na
sociedade atual, funcionando como um dispositivo social
diferenciado e essencial para a vida humana.
Nessa perspectiva, há que perceber melhor qual o lugar da
produção artesanal e qual o papel do design na
contemporaneidade, pois é importante pontuar que o trabalho
artesanal participa do processo de pertencimento de
determinado grupo social e também mantém os saberes e fazeres
locais, fortalecendo elos culturais e sociais.
O design não existe se não houver a criação e a tecnologia.
Evidentemente estas questões são permeadas pela ação
projetual. Uma das implicações da criação é a produção de algo,
um objeto, seja ele material ou imaterial. Esse objeto só toma
corpo, é materializado, torna-se realidade por meio da produção.
A produção só se realiza por meio do fazer (trabalho) e da
tecnologia.
Neste sentido, cabe a nós designers conhecer e levantar
discussões culturais locais. Pois hoje, as condições de produção
da cultura industrial e seus referenciais mercadológicos são
isolados do conhecimento dos processos da cultura artesanal.
Desse modo, é na análise dos aspectos que caracterizam
as relações e as formas de produção que encontramos meios de
denunciar como as possibilidades de diferenciação do indivíduo
vêm sendo logradas pela racionalidade tecnológica, o que aponta
para a linha de pensamento de Certeau (1994) que entende que o
homem não é sujeito passivo à ordem dominante e resiste a ela,
reinventando o seu cotidiano à sua maneira e segundo seus fins.
Assim, a reflexão sobre fazeres que guardam alguma
forma de resistência às imposições sociais de dominação,
como o artesanato, em especial o artesanato cerâmico, em
contraposição às tendências que os tornam cada vez mais
estreitos e subvertidos aos valores da indústria – a
produtividade e o lucro –, constitui-se como um importante
momento do conhecimento e da intervenção do campo do
design.
No entanto, talvez o que se deva ainda considerar como
possível resistência no fazer artesanal seja o fato de que os
102
artesãos insistem nesse ofício, mesmo sofrendo os efeitos de
expropriação e desumanização do mundo do trabalho, em
concorrência direta com produtos industriais. Ou melhor,
resistem nessa forma de trabalho, que ao menos mantém
vestígios de humanidade.
103
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