dislexia institucional: fogo, fumaÇa e cinzas em...
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UNIVERSIDADE DE BRASLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL
DISLEXIA INSTITUCIONAL: FOGO, FUMAA E CINZAS EM RORAIMA
AFONSO FARIAS DE SOUSA JNIOR
Orientadora: Prof. Dra. Maria das Graas Rua
TESE DE DOUTORADO
Braslia, Maro de 2006
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UNIVERSIDADE DE BRASLIA CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTVEL
DISLEXIA INSTITUCIONAL: FOGO, FUMAA E CINZAS EM RORAIMA
Afonso Farias de Sousa Jnior
Tese de Doutorado submetida ao Centro de Desenvolvimento Sustentvel da Universidade de Braslia, como parte dos requisitos necessrios para a obteno do Grau de Doutor em Desenvolvimento Sustentvel, rea de concentrao em Poltica e Gesto Ambiental. Aprovada por: ______________________________
Maria das Graas Rua, Doutora (UnB)
______________________________
Othon H. Leonardos, Doutor (UnB)
_____________________________
Magda E. S. Faria Werhmann, Doutora (UnB)
___________________________
Bartholomeu Trres Trcolli, Doutor (UnB)
_________________________
Nbia Abrantes Gomes, Doutora (UFRR)
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Braslia-DF, 17 de maro de 2006. SOUSA JNIOR, Afonso Farias Dislexia Ambiental: a miopia gerencial do compartilhamento de aes de preveno, controle de queimadas e combate aos incndios florestais em Roraima, 219 p., 297 mm. (UnB-CDS, Doutor, Poltica e Gesto Ambiental, 2006) Tese de Doutorado Universidade de Braslia. Centro de Desenvolvimento Sustentvel. 1. Gesto Compartilhada 2. Brigadas Municipais 3. Queimadas 4. Incndios Florestais 5. Interinstitucional 6. Uso do Fogo I UnB - CDS II Ttulo (srie) concedida UnB permisso para reproduzir cpias desta tese e emprestar ou vender cpias somente para propsitos acadmicos e cientficos. O autor reserva outros direitos de publicao e nenhuma parte desta tese pode ser reproduzida sem a autorizao expressa do autor. ___________________________
Afonso Farias de Sousa Jnior
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Dedico este estudo a: a) todos os mestres que moldaram o meu intelecto e educaram-me. Professores maravilhosos, idealistas e dignos da denominao; b) vida, sem ela todas as possibilidades seriam inteis; e c) Mnica, ao Andrew e ao David, partes integrantes da minha razo e do meu esprito, do meu ser e estar.
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G a i a
A pedra canta, a planta fala O rio v
O vento sente, a chuva chora O raio l
O peixe sonha, a rosa dana Tudo o mesmo ser
Gaia, Gaia, tudo esta vivo Tudo respira,
Eu e voc A nuvem sabe, a lua entende o sol nascer
O fogo escreve, a estrela dorme O povo cr
O cu esquece, a onda lembra Tudo o mesmo ser
Gaia, Gaia, tudo esta vivo, Tudo respira, eu e voc
Nilson Chaves/Eliaquim Rufino, poeta de Roraima.
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AGRADECIMENTOS
Sou grato aos professores do Centro de Desenvolvimento Sustentvel (CDS),
profissionais admirveis e insistentes na labuta sobre a insero da transversalidade das questes
ambientais nos setores governamentais, no terceiro setor e nas mentes vidas por esse encontro
de utopias, realidades, reflexes e muita dvida. A inquietao dos docentes e discentes sobre o
tema desenvolvimento sustentvel coopera e contribui para a constante busca, metafsica e/ou
tangvel, das argumentaes e construes do saber acadmico do Centro. Mirades de debates
estruturaram, consolidaram e, por fim, forjaram a minha formao doutoral. O meu
reconhecimento aos bravos e sbios docentes.
Pelas interminveis horas despendidas em estudo, na pesquisa e na elaborao da tese,
agradeo a compreenso dos meus filhos e da minha esposa, que souberam me entender nos
momentos mais delicados, mais nervosos e complicados durante o tempo em que permaneci
desenvolvendo a minha pesquisa no CDS. Inmeros obstculos aconteceram, tanto de ordem
tcnico-profissional como acadmica, mal-entendidos e boas intenes reinaram. Os atropelos e
as vicissitudes somente puderam ser suportados pelo afeto, carinho e generosidade do David, do
Andrew meus filhos e da Mnica, minha esposa, que souberam silenciar quando preciso e
argumentar quando necessrio, mais ainda, pude perceber suas energias em mim, harmonizando
e acalmando o meu ser, lembrando o outro eu, o mesmo eu: ns.
Durante a minha pesquisa fiz vrias novas amizades, como o Perotto, o Joca, o Moiss, a
Lourdinha, o Ari, o Heloso, o Lzaro, a Laurinha, o Cssio, o Catneo, a Suely, a Giselle, o Joo
Raposo, a Tnia, a rica, a Lgia, o Marcelo, o Kleber e todos aqueles os quais entrevistei.
Agradeo de corao o tempo que se dispuseram a conversar comigo, e no foram poucos
minutos.
Aos bombeiros militares do DF Ten. Cel. Matos e Ten. Marcos e aqueles de Roraima,
Cel. Paulo Srgio, Ten. Cel. Kleber, Ten. Cidinei, que entenderam a importncia do estudo e no
mediram esforos para me ajudar, principalmente o Comandante do Corpo de Bombeiros de RR,
Cel. Paulo Srgio, demonstrando agigantado esprito altrusta e camaradagem, o que reflete na
imagem da sua instituio. Para os bombeiros militares macuxis o meu impagvel dbito de
gratido. Que sejam eternamente felizes e abenoados em suas misses.
Ao amigo Clidenor Leite (Seplan/RR), paracuxi (paraibano e macuxi), que desvendou os
aspectos socioantropolgicos e polticos do funcionamento das instituies pblicas em Roraima.
Homem obstinado, profissional competente e zeloso com as questes pblicas e ambientais,
conduziu-me ao mago dos conflitos ambientais do estado por intermdio da sua verbalizao
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pitoresca e narrativa detalhada. Um argumentador declarado, um homem transparente, um ser em
busca de um mundo melhor. Sem ele, tudo poderia ter sido mais difcil. Como retribuir a
confiana depositada em mim? Mil vezes agradeo pelo carinho, ateno e pelas inmeras horas
de conversao.
Ao quase companheiro de caserna professor Dr. Reinaldo Barbosa (Inpa), pela disposio
em mostrar e descrever causas e fatores impactantes das questes ambientais roraimenses. gil
no pensar, hbil no dizer e sutil no concluir, contribuiu sobremaneira, com seus artigos e na sua
fala, para a substncia deste trabalho. Obrigado por tudo, nobre cientista.
Ao professor Dr. Jaime de Agostinho (UFRR e Seplan), presena amigvel, descontrado
e profundo conhecedor dos problemas de meio ambiente de Roraima, agradeo pelos insights
despertados e alertas sobre a situao socioambiental e poltica do estado.
Aos Chefes de Brigadas Municipais de Roraima o meu mais profundo agradecimento.
Homens humildes, incansveis guerreiros e idealistas, mostraram e fizeram-me consolidar a idia
do saber tradicional. Abnegados e cumpridores das misses impossveis de combate aos
incndios florestais, deixaram claro a sua indelvel importncia no contexto da preveno e
combate ao fogo em Roraima. Um abrao forte e cordial para o Seu Pedro (65 anos - chefe da
brigada do Trairo), um exemplo de dignidade, paixo pelo que faz e identificao com a
natureza. Abraando Pedro, abrao e agradeo a todos os brigadistas do estado, guerreiros
meninos, fortes, fracos.
O meu muito obrigado ao Dr. Nilson e a Emilcy, ambos da Seplan, ao Jordo, da
Secretaria Estadual do ndio, a Jane, do Incra, ao Dr. Zedequias, Promotor Pblico do MPERR,
aos Gianluppis, Daniel (Femact) e Vicente (Embrapa), ao Haron e a Maristela Xaud (Embrapa),
a Jane, ao Juca e ao Robson, todos da Femact, a Dra. Marta, Promotora de Meio Ambiente do
MPDFT, ao Dr. Joo Batista, Promotor de Meio Ambiente do MPERN.
Especial agradecimento aos integrantes da Fetag/RR, da CPT/RR e do GTA (Braslia e
Boa Vista/RR), que apresentaram suas realidades e ampliaram a minha percepo e
conhecimento sobre o envolvimento das entidades representativas da sociedade civil nas
questes do fogo.
Aos integrantes do Iteraima, da Secretaria Estadual de Agricultura de RR, da Secretaria
Estadual de Sade de RR, meus agradecimentos pela solicitude e disponibilidade para responder
meus questionamentos, dvidas e esclarecer sobre questes pontuais do fogo dentro das suas
competncias institucionais.
As docentes Dra. Magda Wehrmann e Dra. Nbia Gomes, pela disponibilidade, pelas
correes, pelo profissionalismo, entusiasmo acadmico e precisa sintonia com a realidade.
Aos professores Dr. Bartho Trcolli e Dr. Othon Leonardos, pelos sinceros incentivos,
comentrios sempre pertinentes e agudo senso de humanidade e cincia.
Aos angustiados, sofridos e talentosos amigos e amigas de sala de aula, que
compartilharam sonhos, dvidas, discusses e at desentendimentos generalizados, sou muito
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grato por ter convivido com pliade plural e inteligente, agentes contribuintes do meu
aprimoramento intelectual e humano.
Ao Ten. Brigadeiro Marcus Herndl, que acreditou no seu subordinado e apostou no
desenvolvimento profissional e pessoal do jovem major, quando permitiu a minha liberao para
o mestrado, meu vo intermedirio para esta conquista.
Ao Brigadeiro Srgio Mingorance, que entendeu a importncia do estudo e enxergou o
desenvolvimento individual como parte integrante da manuteno do capital intelectual
institucional. Por sua viso privilegiada, estmulos e cooperao agradeo de corao pela
compreenso e ateno dispensadas.
Ao amigo Coronel Jairo Costa, leal companheiro e amigo das horas mais difceis, que,
mesmo sem vnculos diretos com esta tese, foi partcipe na concretude da prpria. Ao camarada
Jairo, a minha eterna lembrana de gratido.
Ao professor Dr. Roberto Aguiar, quando meu professor, pelas belssimas aulas (sobre
Direito e Vida) na faculdade de Direito da UnB, fonte de inspirao para as minhas utopias e
devaneios intelectuais. Suas colocaes influenciaram sobremaneira a minha estada no CDS.
Ao professor Dr. Cristvo Buarque, pelos ensinamentos utpicos e reais, isso mesmo,
um paradoxo, que estimularam o meu pensar e aliceraram as perspectivas da mudana e
conduta intelectuais.
A elegncia intelectual e profunda sapincia da minha orientadora, Dra. Maria das Graas
Rua, mulher paciente e extremamente sensvel, que, num misto de profissionalismo e
maternidade, soube entender e debelar a minha ansiedade, assim como construir as condies
necessrias para uma boa relao docente/discente. Agradeo pela confiana depositada, pela
generosidade e pelas precisas intervenes. Serei eternamente grato.
Especialssimo agradecimento ao Alexandre Perotto (Proarco), irmo de f e camarada,
que no mediu esforos para me ajudar nesta empreitada. Profissional arguto, inteligente e
observador, esclareceu-me, centenas de vezes, sobre as questes da gesto do fogo na Amaznia.
Aos meus pais, Maria (das letras e dos sonhos) e Afonso (o concreto), e ao Meu av
Chico Miguel (in memorian), que sempre depositaram infinita confiana em mim e,
inexoravelmente, forjaram o ser curioso, pesquisador e incansvel na busca de sonhos e
realizaes.
Finalizando, agradeo ao meu eu por ser e estar como passageiro da nave Terra,
experimentar sensaes virtuais e reais desta existncia e ter entendido que somente o bem
(praticado por mim para eu mesmo e de mim para com os outros seres) leva a felicidade. Por
tudo, por todos, obrigado Inteligncia Csmica, Divina e Maravilhosa.
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RESUMO
Esta tese versa sobre a gesto compartilhada do fogo, brigadas municipais e instituies envolvidas com o tema queimadas e incndios florestais. Seu objetivo principal analisar as dimenses Relacionamento (entre instituies afins), Poltico-legal (polticas pblicas e norma legal relacionadas com o tema) e Tcnico-administrativa (recursos materiais, humanos, oramentrios e financeiros disponibilizados pelas entidades envolvidas) e verificar por que os atores institucionais envolvidos com a preveno, controle de queimadas e combate aos incndios florestais (PCQIF) no conseguem desenvolver e manter uma gesto interinstitucional sustentvel para evitar as queimadas e os incndios florestais na regio. As hipteses do estudo apontam para: a ausncia de suporte financeiro, material, organizacional e educacional das brigadas municipais; as divergncias internas do Prevfogo com o Proarco e destes para com outros setores do Ibama; e a precria adeso interinstitucional s aes de PCQIF afetam negativamente o desempenho dessas aes em Roraima. Em termos metodolgicos, um estudo de caso com pesquisa de campo realizada em Roraima, mais precisamente em Boa Vista e outros seis municpios vizinhos, todos partcipes do Arco do Fogo do estado. A pesquisa foi realizada entre 2003 e 2005. Os resultados apurados indicam uma deficiente educao profissional dos envolvidos com a PCQIF na regio e no Ibama (Prevfogo, Proarco e Gerex/RR), o desinteresse dos dirigentes pblicos para com a efetiva aplicao das polticas pblicas relativas ao tema, realam a importncia das brigadas no contexto do combate aos incndios florestais e evidenciam o desconcerto interinstitucional vigente na gesto das aes estaduais de PCQIF. Adicionalmente, observou-se um hiato entre intenes polticas e governamentais expostas e aes planejadas, executadas e realizadas. O que sobressai a ausncia de iniciativas (organizacional e gerencial) dos organismos de Roraima para lidar com a questo. Apagar o fogo apenas o ltimo estgio de um processo que tem incio na maneira em que a agropecuria trabalhada. Na medida em que os dirigentes no estimulam uma agricultura familiar endereada aos Sistemas Agroflorestais (SAF) ou Agroecologia eles esto incrementando a potencialidade dos incndios a cada estiagem na regio. No imaginrio coletivo, desmatar e queimar vale mais do que deixar a floresta em p, pois pela derrubada, queimada e cultivo (do milho, do arroz, da banana ou da soja) que se consegue auferir ganhos financeiros. Por outro lado, muitos pensam que quanto mais fogo mais dinheiro, pois, pelo estado de calamidade apresentado, mais recursos financeiros, providos do Governo Federal, podem chegar para o estado. Como proposta, este estudo aponta recomendaes para serem efetuadas no cotidiano das instituies envolvidas e uma outra recomendao estratgica, baseada na estrutura e funcionamento de uma Secretaria de Proteo Socioambiental (Sepas), onde as polticas de defesa civil e de meio ambiente seriam trabalhadas conjuntamente. Nesse modelo as brigadas municipais e os Conselhos Comunitrios de Proteo Socioambiental tm papel chave, pois, no primeiro momento, as demandas (metas e valores oramentrios) locais so elaboradas por eles e, no segundo momento, so apreciadas pelo Comit Gestor do Fogo. Eles ainda esto engajados no acompanhamento, controle e avaliao das Aes de PCQIF desenvolvidas pelo Centro Integrado de Proteo Socioambiental (Cinpas).
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ABSTRACT
This thesis discusses shared fire management, municipal fire brigades and institutions involved in intentional burning of forests and forest fires. The main aim is to analyze the relational dimensions (between similar institutions), political-legal dimensions (public policies and legal norms related to the topic) and technical-administrative dimensions (physical, human, budgetary and financial resources made available by the involved entities) and to verify why the institutional agents involved with prevention, control of burning and the combat of forest fires (PCQIF) are unable to develop and maintain sustainable inter-institutional management in order to avoid the intentional burning of forest areas as well as forest fires in the Roraima state.The hypotheses of the study point to: the lack of financial, physical, organizational and educational support due to municipal fire brigades; the internal divergences of Prevfogo with Proarco and between these and other sectors of Ibama; and to the precarious institutional addition of the actions of PCQIF which negatively affect the accomplishment of these actions in Roraima. In terms of methodology, this is a case study with field research carried out in Roraima, more specifically in Boa Vista and in six other neighboring municipalities, all of which are participants of the states Arco do Fogo. The research was done between 2003 and 2005. The results indicate inadequate professional qualification of those involved with PCQIF in the region and of Ibama (Prevfogo, Proarco and Gerex/RR), as well as, to the disinterest of public authorities to effectively apply public policy related to the topic. The results also highlight the importance of the municipals fire brigades in the context of combating forest fires and show the current inter-institutional chaos of the states actions through PCQIF. In addition, one can observe an abyss between political and governmental intentions which are shown and the actions which are planned, executed and accomplished. What is predominant is the lack of initiative (organizational and managerial) on the part of the organs in Roraima to take the lead in the question. Fire suppression is only the last stage of a process which must begin in a way in which the local and family farming in is included. As long as the leaders do not encourage family agriculture which is partnered with the Agro-Forest Systems (SAF) or with Agro-ecology, they are increasing the potential for fires in each dry spell. In the mind of the majority of people, deforestation and intentional burning is worth more than leaving the forest standing, since it is through cutting down the trees, burning them and planting corn, rice, bananas or soy beans that one is able to have financial gain. Another aspect of this is that many believe that the more fire there is, the more money they will have, since there are more financial resources coming from the federal government to the state, when a state of emergency is declared. As was proposed, this study presents recommendations to be implemented in the day-to-day routine of the institutions involved. There is also a strategic recommendation based on the structure and operation of a Secretariat of Socio-environmental Protection (Sepas), where the policies of civil defense and those of the environment would be worked on together. In this model the municipal fire brigades and the community councils of socio-environmental protection would have a key role. In the first phase the local demands (goals and budgetary amounts) would be elaborated by the brigades and councils, while in the second phase, these items would be considered by the Fire Management Committee. The brigades and councils would be involved in the follow-up, control and the evaluation of the actions of the PCQIF which would be developed by the Integrated Center of Social and Environmental Protection (Cinpas).
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RESUMEN
Esta tesis trata sobre la gestin compartida del fuego, brigadas municipales e instituciones involucradas con el tema de quemas e incendios forestales. Su objetivo principal es analizar las dimensiones Relacionamento (entre instituciones afines), Poltico-legal (Polticas pblicas y norma legal relacionadas con el tema) y Tcnico-administrativa (Recursos materiales, humanos, presupuestarios y financieros disponibles por las entidades involucradas) y verificar por qu los actores institucionales involucrados con la prevencin, control de quemas y combate a los incendios forestales (PCQIF), no consiguen desarrollar y mantener una gestin interinstitucional sustentable para evitar las quemas y los incendios forestales en la regin. Las hiptesis de estudio apuntan para: la falta de apoyo financiero, material, organizacional y educacional de las brigadas municipales; las divergencias internas del Prevfogo con el Proarco y de stos con los otros sectores del Ibama; y la precaria adhesin interinstitucional a las acciones de PCQIF afectan negativamente el desempeo de esas acciones en Roraima. En trminos metodolgicos, es un estudio de caso con investigacin de campo realizada en Roraima, mas precisamente en Boa Vista y otros seis municipios vecinos, todos participes del Arco de Fuego del Estado. La investigacin fue realizada entre 2003 y 2005. Los resultados obtenidos indican una deficiente educacin profesional de los involucrados con la PCQIF en la regin y en el Ibama (Prevfogo, Proarco y Gerex/RR), el desinters de los dirigentes pblicos para con la efectiva aplicacin de las polticas pblicas relativas al tema, realzan la importancia de las brigadas en el contexto del combate a los incendios forestales y evidencian el desconcierto interinstitucional vigente en las gestin de las acciones estatales de PCQIF. Adicionalmente se observ una pausa entre intenciones polticas y gubernamentales expuestas y acciones planificadas, ejecutadas y realizadas. Lo que sobresale es la ausencia de iniciativas (Organizacional y gerencial) de los organismos de Roraima para trabajar con la cuestin. Apagar el fuego es apenas el ltimo paso de un proceso que tiene inicio en la manera en que la agropecuaria es realizada. En la medida en que los dirigentes no estimulen la agricultura familiar, encaminada a los Sistemas Agroforestales (SAF) o a la Agro-ecologa, ellos estn incrementando la potencialidad de los incendios a cada sequa en la regin. En lo imaginario colectivo, desforestar y quemar vale ms que dejar la forestacin en pie, debido a que es por el derribo, quema y cultivo (de maz, de arroz, de banana o de soja) que se consigue obtener ganancias financieras. Por otro lado, muchos piensan que cuanto ms fuego ms dinero, debido a que, por el estado de calamidad presentado, ms recursos financieros, suministrados por el Gobierno Federal, pueden llegar para el Estado. Como propuesta, este estudio apunta recomendaciones a ser efectuadas en lo cotidiano en las instituciones involucradas y por otra parte, una recomendacin estratgica, basada en la estructura y funcionamiento de una Secretara de Proteccin Socio-ambiental (Sepas), donde las polticas de defensa civil y de medio ambiente seran realizadas conjuntamente. En ese modelo, las brigadas municipales y los Consejos Comunitarios de Proteccin Socio-ambiental tienen un papel importante, pues, en un primer momento, las demandas (Metas y valores presupuestarios) locales son elaborados por ellos y en segundo lugar, son apreciadas por el Comit Gestor del Fuego. Ellos an estn comprometidos en el acompaamiento, control y valuacin de las Acciones de PCQIF desarrolladas por el Centro Integrado de Proteccin Socio-ambiental (Cinpas)
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SUMRIO
LISTA DE TABELAS LISTA DE FIGURAS LISTA DE QUADROS LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS INTRODUO 1 I. 1 ASPECTOS DO PROBLEMA 1 I.1.1 Conduzindo ao bice 1 I.1.2 Contextualizando o bice 4 I.1.3 O problema 8 I.2 OBJETIVOS 15 I.3 HIPTESES 16 I.4 DELIMITAO DO ESTUDO 16 I.5 JUSTIFICATIVA 17 I.6 O MTODO 18 I.6.1 Tipo de pesquisa 19 I.6.2 Universo e amostra 20 I.6.3 Coleta de dados 21 I.6.4 Tratamento dos dados 24 1 EXTERNALIDADES SOCIOAMBIENTAIS E ECONMICAS DO FOGO
25
1.1 A CRISE DO MODELO DE DESENVOLVIMENTO 25 1.1.1 Brasil: o desenvolvimento inicial 29 1.1.2 O desenvolvimento na Amaznia 31 1.1.3 Um equvoco de desenvolvimento 33 1.2 IMPACTOS SOCIOAMBIENTAIS E ECONMICOS DO FOGO 35 1.2.1 Queimadas para desmatamento 36 1.2.2 Incndios florestais rasteiros 36 1.2.3 As queimadas e os incndios em reas desmatadas 38 1.2.4 Prejuzos econmicos para os proprietrios rurais 39 1.2.5 Custos e prejuzos do fogo para a sociedade 40 1.3 COMENTRIOS FINAIS 42 2 FOGO: UM CONTRAPONTO DE PERCEPO 44 2.1 FOGO: PROBLEMA OU SOLUO. A PERCEPO DOS AGRICULTORES FAMILIARES DO SUDESTE DO PAR
44
2.2 USO DO FOGO POR AGRICULTORES FAMILIARES EM RORAIMA: CONFLITOS E INTERVENES SOCIOAMBIENTAIS
48
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2.3 FOGO EM RORAIMA: QUESTES E ATUAO GOVERNAMENTAL 52 2.3.1 Breve histrico e localizao 52 2.3.2 Atuao governamental e gesto do fogo em Roraima 55 2.3.3 Os Incndios de 1998 e 2003 56 2.3.4 A soja e seus impactos ambientais 61 2.3.5 Agronegcio: dicotomia de percepo 64 2.4 COMENTRIOS FINAIS 67 3 DA TAREFA AO COMPARTILHAMENTO DE AES 69 3.1 CONSCINCIA E INTEGRAO DE AES 70 3.2 GESTO ECOLGICA E DESENVOLVIMENTO ORGANIZACIONAL 80 3.3 ESTUDOS INTRA E INTERORGANIZACIONAIS 88 3.4 ESTRUTURA ORGANIZACIONALL DAS AES DE PREVENOO E COMBATE AOS INCNDIOS FLORESTAIS NO IBAMA.
97
3.4.1 Ibama: criao e estrutura 97 3.4.2 Prevfogo: criao e atuao 100 3.4.3 Proarco: criao e atuao 102 3.5 GESTO COMPARTILHADA: COMPROMISSO, INTERDISCIPLINARIDADE E CONTRIBUIO EFETIVA
102
4 RORAIMA: FOGO, FUMAA E CINZAS NA GESTO COMPARTILHADA
111
4.1 DAS ENTREVISTAS COM OS CHEFES DE BRIGADAS MUNICIPAIS 111 4.2 DAS ENTREVISTAS INTRA-ORGANIZACIONAIS 123 4.3 DAS ENTREVISTAS INTERINSTITUCIONAIS 137
CONCLUSO 157 RECOMENDAES 166 R.1 RECOMENDAES ESPECFICAS PARA O COTIDIANO INSTITUCIONAL 166 R.2 RECOMENDAES ESTRATGICAS 172 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 180 APNDICES 189 ANEXOS 208
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LISTA DE TABELAS Tabela I.1 Causas de Incndios Florestais na Europa (1978), na Alemanha (RFA
mdia de 1972 a 1978) e na Espanha 1979
9
Tabela I.2 Frequncia de Incndios Florestais em pases europeus
9
Tabela I.3 Incndios Florestais nos Eua e Canad
9
Tabela I.4 Mdias de reas Queimadas, decenal, em Pases Europeus (1980-2004)
10
Tabela I.5 Mdias de Incndios Florestais, decenal, em Pases Europeus (1980-2004)
10
Tabela I.6 Graus e atributos utilizados nos roteiros de entrevistas, nas discusses e resultados da tese
24
Tabela 1.1 rea desmatada, por ano, da Amaznia em quilmetros quadrados nos ltimos dez anos
42
Tabela 2.1 Brigadas Municipais e Bases Avanadas do CBMil existentes em RR
55
Tabela 2.2 rea atingida pelo fogo em Roraima em 1998, por tipo de vegetao
57
Tabela 4.1 Grau de satisfao do Prevfogo e do Proarco com outros setores/diretorias
124
Tabela 4.2 Graus de desempenho e razo de existir do Prevfogo e do Proarco
125
Tabela 4.3 Efeito da instrumentalizao legal ambiental nas atividades do Prevfogo e proarco em RR
127
Tabela 4.4 Influncia do Prevfogo e do Proarco na agenda, formulao e discusso das polticas pblicas de PCQIF no Ibama
127
Tabela 4.5 Grau de impacto negativo da poltica interna nas aes do Prevfogo e do Proarco
128
Tabela 4.6 Grau de desenvolvimento dos componentes (monitoramento, preveno e combate) do Proarco, em dezembro de 2004
132
Tabela 4.7 Classificao da gesto organizacional da Dipro
134
Tabela 4.8 Classificao da gesto organizacional das Coordenaes do Prevfogo e do Proarco
134
Tabela 4.9 Competncia para realizar as misses de PCQIF fora das reas de UC
135
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Tabela 4.10 Grau de Importncia das Brigadas Municipais nas aes de PCQIF
140
Tabela 4.11 Desempenho e razo de existir do Prevfogo e do Proarco
141
Tabela 4.12 Grau de cooperao das instituies para as aes de PCQIF em RR
142
Tabela 4.13 Grau de importncia da misso do Proarco e do Prevfogo
143
Tabela 4.14 Grau de influncia das instituies de RR na agenda, discusso e formulao de polticas pblicas de PCQIF
146
Tabela 4.15 Grau de impacto negativo da poltica interna institucional nas aes de PCQIF
147
Tabela 4.16 Empenho da cpula institucional para resoluo de problemas de PCQIF
148
Tabela 4.17 Grau de importncia das aes de PCQIF em cada instituio
150
Tabela 4.18 Causas de Incndios Florestais em RR
151
Tabela 4.19 Processo decisrio adotado pelas instituies de Roraima
154
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LISTA DE FIGURAS
Figura I.1 Brasil: Evoluo das Populaes Rural e Urbana - 1940-1995
5
Figura I.2 Brasil: Migraes Internas/1960-1970
7
Figura I.3 Brasil: Migraes Internas/1970-1990
7
Figura I.4 Percentual de focos de queimada na Amaznia
8
Figura I.5 Percentual de reas queimadas/pases do sul da Europa/2004
10
Figura I.6 Percentual de incndios florestais em pases do sul da Europa/2004
10
Figura I.7 Arco do Desflorestamento configurao dentro da Amaznia Legal
14
Figura 1.1 Desmatamento na Amaznia 1988/2002
41
Figura 1.2 Grfico demonstrativo da rea desmatada na Amaznia desde 1994 at 2004
42
Figura 2.1 Amaznia Legal e Mapa Poltico de Roraima
54
Figura 2.2 rea de cultivo da soja em RR
61
Figura 2.3 Expanso da soja em RR
63
Figura 3.1 nfases da Administrao ao Longo do Sculo XX
69
Figura 3.2 Relaes da empresa a partir da dcada de 1980
70
Figura 3.3 Organizao como um Sistema Aberto
76
Figura 3.4 Enfoque sistmico e ambiente organizacional
77
Figura 3.5 Feedback - necessidades e satisfaes
78
Figura 3.6 Processos de Interao
96
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LISTA DE QUADROS
Quadro 3.1 Diferenas entre as concepes atomsticas e holsticas
74
Quadro 4.1 Participao das Brigadas em eventos locais
113
Quadro 4.2 Considerao das argumentaes dos brigadistas e da cultura local pelos coordenadores de eventos de PCQIF
114
Quadro 4.3 Critrios de admisso de candidatos a brigadista pelas brigadas municipais
116
Quadro 4.4 Grau de preparao dos brigadistas aps o curso bsico inicial de PCQIF
118
Quadro 4.5 rgos responsveis pelas tarefas/atividades durante as operaes de combate aos incndios florestais
119
Quadro 4.6 Participao dos Brigadistas na elaborao do calendrio de queima controlada
120
Quadro 4.7 Melhor parceiro das brigadas municipais
120
Quadro 4.8 Pior parceiro das brigadas municipais
121
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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS ABM Associao das Brigadas Municipais
AL Amaznia Legal
ATPF Autorizaes de Transporte para Produto(s) Florestal(ais)
AUFPA Alternativas ao Uso do Fogo na Produo Agrcola
CBMil Corpo(s) de Bombeiro(s) Militar(es)
CBrig Chefe(s) de Brigada(s) Municipal(ais)
CCIR Certificado de Cadastro de Imvel Rural (expedido pelo Incra)
CCPY Comisso Pr-Yanomami (originalmente Comisso pela Criao do Parque
Yanomami)
Cemam Centro de Monitoramento Ambiental
CGFis Coordenao Geral de Fiscalizao
Cinpas Centro Integrado de Proteo Ambiental e Social
Copsa Conselhos Comunitrios de Proteo Socioambiental
CSR Centro de Sensoriamento Remoto
Def. Civil Defesa Civil
DF Distrito Federal
Dicof Diviso de Operaes e Fiscalizao GEREX/RR
Difap Diretoria de Fauna e Recursos Pesqueiros
Diget Diretoria de Gesto Estratgica/Ibama - Bsb
Diliq Diretoria de Licenciamento e Qualidade Ambiental/Ibama Bsb
Dipro Diretoria de Proteo Ambiental/Ibama Bsb
Diraf Diretoria de Administrao e Finanas/Ibama Bsb
Direc Diretoria de Ecossistemas/Ibama Bsb
Ditec Diviso Tcnica GEREX/RR
-
Femact Fundao Estadual do Meio Ambiente, Cincia e Tecnologia RR
Fetag Federao dos Trabalhadores na Agricultura (RR)
FFAA Foras Armadas
Gavesp Grupo de Aviao Especial. Organizao a ser criada, em gestao na Presidncia da Repblica, para atender a proteo ambiental e social
Gerex Gerencia Executiva do IBAMA nos estados brasileiros
GQC Grupo(s) de Queima Controlada
GTA Grupo de Trabalho Amaznico
Ibama Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renovveis
IF Incndio(s) Florestal(ais)
Incra Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria
Inpa Instituto de Pesquisas da Amaznia
Iteraima Instituto de Terras e Colonizao de Roraima
MD Ministrio da Defesa
MDA Ministrio do Desenvolvimento Agrrio
MI Ministrio da Integrao Nacional
MMA Ministrio do Meio Ambiente
NOA Ncleo de Operaes Areas, subordinado DIPRO/Ibama Bsb
ONG Organizao(es) No Governamental(ais)
PCQIF Preveno, Controle de Queimadas e Combate aos Incndios Florestais
Prevfogo Sistema Nacional de Preveno e Combate aos Incndios Florestais. Hoje, Centro Nacional de Preveno e Combate aos Incndios Florestais
Proarco Programa de Preveno, Controle de Queimadas e Incndios Florestais na Amaznia Legal
SEAAB Secretaria de Estado de Agricultura e Abastecimento (RR)
Sepas Secrataria de Proteo Ambiental e Social
Seplan/RR Secretaria de Planejamento do Estado de Roraima
TI Terra(s) Indgena(s)
UC Unidade(s) de Conservao
-
INTRODUO
I.1 ASPECTOS DO PROBLEMA
I.1.1 Conduzindo ao bice
Protagonista e vtima, o homem exerceu e exerce forte influncia sobre os ecossistemas
terrestres, com o desenvolvimento de tecnologias que rapidamente consomem o ambiente em
que vive, produzem acelerada degradao ambiental e geram entropia ecolgica na meganave
Terra.
Durante a Segunda Revoluo Industrial, a mentalidade era a de simplesmente
desenvolver tecnologias para apropriar e transformar recursos naturais. poca, a idia de
infinitude dos recursos naturais estava amalgamada s estruturas socioeconmicas reinantes.
Hoje, a realidade impe, cada vez mais, o entendimento de que esses recursos esto
extremamente escassos e as tecnologias criadas geraram efeitos bem alm do esperado, como
afirma Sagan (1998, p. 81):
A nossa tecnologia tem se tornado to poderosa que no s consciente, mas tambm
inadvertidamente estamos nos tornando um perigo para ns mesmos. A cincia e a
tecnologia tm salvo bilhes de vidas, melhorado o bem estar de muitas mais, ligado o
planeta numa unio lentamente anastomosante e ao mesmo tempo tm mudado o
mundo de tal forma que muitas pessoas j no se sentem em casa na Terra. Criamos uma
gama de novos males: difceis de ver, difceis de entender, problemas que no podem ser
resolvidos imediatamente e que, sem dvida, no podero ser solucionados sem
desafiarmos aqueles que detm o poder.
Strong (1993, p. 7), prefaciando o livro Estratgias de Transio para o Sculo XXI, de Ignacy Sachs, assinala que:
Perdemos a inocncia. Hoje sabemos que nossa civilizao e at mesmo a vida em nosso
planeta estaro condenadas, a menos que nos voltemos para o nico caminho vivel,
tanto para os ricos quanto para os pobres. Para isso, preciso que o Norte diminua seu
consumo de recursos e o Sul escape da pobreza. O desenvolvimento e o meio ambiente
esto indissoluvelmente vinculados e devem ser tratados mediante a mudana do
contedo, das modalidades e das utilizaes do crescimento. Trs critrios fundamentais
devem ser obedecidos simultaneamente: equidade social; prudncia ecolgica e
eficincia econmica.
-
2
O cotidiano revela e afirma que a ferramenta mais poderosa em utilizao pelo homem
o sistema capitalista de livre mercado. Atualmente, a economia clssica no tem rival e as suas
leis, de to difundidas, parecem naturais.
Parece claro que a continuidade desse modelo (onde se ignora, parcial ou totalmente, os
efeitos colaterais - negativos - relevantes, mais conhecidos como externalidades) reserva
surpresas reais e desagradveis, pois no existem manobras artificiais para mascarar os eventos
propiciados pela natureza, enquanto na economia explica-se muita coisa com o termo fatores
externos.
Parece salutar uma mudana de mentalidade dos empresrios, dos governantes e da
sociedade. Eliminar a artificialidade do modelo vigente e direcion-lo naturalidade parece ser
o mais vivel e sensato para o momento. Algumas organizaes j vislumbram essa
possibilidade e tentam desenvolver ferramentas que as diferenciem e as coloquem em evidncia
perante a concorrncia. Comeam a surgir, freqentemente, novas palavras no dia-a-dia das
empresas: desenvolvimento sustentvel, instrumentos econmicos (princpio poluidor/pagador),
selo verde, ciclo de vida do produto, gesto ambiental, auditoria ambiental, certificao
ambiental, ISO 14000 etc. Esses instrumentos podem reformar o status quo vigente e alavancar a
sociedade para uma nova dimenso socioambiental, alm de reverter o atual quadro de
formulao dos indicadores econmicos. Cavalcanti (1996, p.319) alega que:
No pode haver dvida de que, em qualquer poca, em qualquer lugar, os problemas da
organizao econmica devem manter uma relao profunda e determinante com a
dimenso ambiental e depender de sua judiciosa utilizao para que possam ser
solucionados sustentavelmente. Proferir tal afirmao no envolve originalidade alguma, at porque ela uma verdade evidente por si mesma. O condicionamento ecolgico,
afinal de contas, atravs da base fsica de matria e energia de que o mundo feito,
regula tudo o que o homem faz e pode fazer. O meio ambiente, e tambm a sociedade, so
entidades naturais, no sentido de que independem do propsito humano, o primeiro tendo
uma existncia autnoma que precede ao aparecimento da Segunda. Assim, o sistema
econmico que uma ferramenta da sociedade, no passa de um subsistema aberto do
ecossistema, precisando dele vitalmente como fonte supridora de recursos e como espao
onde faz o lanamento dos dejetos resultantes das atividades produtiva e de consumo.
Est assim irremediavelmente vinculado aos princpios e leis de funcionamento da
ecosfera, princpios e leis esses que, como mostram as cincias da natureza, no admitem
exceo.
Partindo-se de uma anlise econmica do meio ambiente, percebe-se que a economia
relaciona-se com a natureza de duas formas: por um lado, a economia usufrui dos insumos
naturais para utiliz-los, na maioria das vezes, como matria-prima; por outro, despeja na
natureza os dejetos desse processo. Como resultado, a economia encontra uma natureza
perturbada pelo conjunto de efeitos gerados pela m utilizao do meio ambiente.
A garantia do sucesso de reequilbrio ambiental passa pelas Polticas Pblicas voltadas
para a proteo direta do meio ambiente como tambm daquelas que operem diretamente no
-
3
mercado. Essa poltica faz com que sejam internalizados os custos ambientais, isto , o poluidor
paga pelos danos que causou natureza. O princpio poluidor/pagador vem garantir essa dvida.
Para isso, adota-se o sistema de cotas. Os fundos so destinados ao financiamento, em longo
prazo, da recuperao e reconstruo dos processos ambientais dentro da prpria empresa ou ao
desenvolvimento e recuperao do meio ambiente. O pagamento, necessariamente, no prev a
reparao do dano.
O Planejamento Estratgico das empresas, outro ponto importante nas mdias e grandes
organizaes, poderia inserir programas ambientais plausveis para modificar o atual sistema de
gesto. Esses programas seriam constantemente controlados pelas auditorias ambientais. O
conjunto de objetivos e normas que regulam a circulao da unidade empresarial com o conjunto
da economia, sociedade e Estado tem o propsito de orientar o planejamento dos programas e os
sistemas de gesto ambiental. A ecologia, como base para o planejamento, a estrutura dessa
nova ordem econmica. A terra poderia ser vista como um ser sensvel (viso Gaia do mundo) e
nossas obrigaes como seres humanos no so apenas para conosco, mas com a vida como um
todo. A Terra a estrutura maior que envolve planejamento e tecnologias ecolgicas. Segundo
John Todd, um dia os sistemas sociais e polticos espelharo as grandes obras da natureza e as
atuais divises de direita e esquerda, conservadores, expansionistas, estado-nao, transformar-
se-o em uma organizao e nica categoria GAIA sistmica e de mbito mundial (TODD, 2000,
p. 124).
Uma nova formulao de prioridades, que impulsionem o desenvolvimento sem
deteriorao dos espaos naturais, e encontrar, urgente, novos parmetros sistmicos que
alcancem e preservem o socioambiental e o econmico saudvel. Mais ainda, como efeito,
remeter o ser humano ao to almejado progresso com qualidade de vida. Buarque (1994, p.253),
quando discorre sobre o Novo Enfoque aos Velhos Problemas, relata que a revoluo das
prioridades:
... tenta fazer uma revoluo conceitual, considerando diferentemente os problemas
nacionais: subordinar os temas economicistas desemprego, dvidas, inflao etc. aos
problemas das prioridades definidas eticamente alimentao, democracia, conservao
da natureza etc. Isto no quer dizer que os problemas tradicionais da economia no
existam, mas eles so problemas-meio, entraves realizao dos problemas-fins, as
prioridades.
A prioridade a vida (vida natural, isto , com qualidade) em toda a sua plenitude e
forma. Hidrosfera, litosfera, atmosfera e biosfera, que se traduzem como ecosfera, tm ntimas
relaes. Degrad-las, destru-las ou elimin-las sem a direta contrapartida dos prejuzos
causados s vidas terrenas, perigoso para todas as formas de vida.
-
4
I.1.2 Contextualizando o bice
O sculo XX foi um perodo de profundas e rpidas mudanas no sistema social e
ambiental do planeta. Os fenmenos e estruturas, que se desenvolveram durante a Revoluo
Industrial na segunda metade do sculo XIX, continuaram a sua evoluo durante os cem anos
seguintes. O homem, principalmente aps o advento do liberalismo, vive de transformaes
externas (do ambiente) com o intuito de acumular riquezas e obter poder, em todas as suas
acepes.
Desde a queda do absolutismo que os liberais (e agora os neoliberais) tentam e utilizam
discursos para demonstrar que o pretendido tornar as relaes produtivas e sociais aceitveis,
mas o que se observa so desgastes e desequilbrios socioambientais construdos pela ganncia
(imediata) de resultados econmicos (destruindo aleatoriamente os recursos de que tanto se vale
a economia) e pela ausncia de conscientizao, dos donos do poder, sobre os estgios de
evoluo do indivduo, pessoa, cidado o que mantm o mundo em uma eterna tenso social.
Essa forma de governar foi gerando distores ao longo do tempo e permitiu a criao de
hiatos socioeconmicos, educacionais e de sade. Segundo o Relatrio do Desenvolvimento
Humano de 2004 - do Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), o Brasil
ocupa o 72 lugar entre os 177 pases analisados pela ONU quanto ao IDH (ndice de
Desenvolvimento Humano). O ndice mede a qualidade de vida dos pases, a partir de
indicadores de educao (alfabetizao e taxa de matrcula), sade (esperana de vida ao nascer)
e renda (PIB per capita).
Segundo o Boletim Brasil, do Centro de Estudos Brasileiros Ortega y Gasset, o Brasil
um dos pases mais desiguais do planeta e no tem melhorado essa condio nos ltimos 20
anos. Pesquisa realizada com o coeficiente de Gini (comparao) mostrou que, entre 1977 e
1999, o Pas estabilizou-se em torno de 0,60.
O coeficiente de Gini, que mede a desigualdade de renda, coloca o Brasil em
desvantagem perante os pases da Amrica Latina. Isso porque os 20% mais pobres ficam com
apenas 2,5% da renda, enquanto os 20% mais ricos detm 63,4% da renda.
No Brasil, os economistas Ricardo Paes de Barros e Rosane Mendona (apud KUNTZ,
1997, p.1), quando estudaram O Impacto do Crescimento Econmico e de Redues do Grau de
Desigualdade sobre a Pobreza (estudo solicitado pelo Ipea), afirmaram que o crescimento do
bolo s servir para reduzir a pobreza muito lentamente se ao mesmo tempo no se combater a
desigualdade na distribuio das fatias. Se a desigualdade brasileira se equiparasse da
Venezuela, isso reduziria a porcentagem de pobres tanto quanto se o produto per capita
crescesse ao ritmo de 7,1% ao ano por uma dcada. Seria preciso, portanto, mais que dobrar o
bolo para obter o mesmo resultado. Quanto maior a desigualdade, e a do Brasil uma das
-
5
36,245,1
75,581,25
63,854,9
24,518,75
56,0
67,0
79,0
44,0
33,0
21,0
0102030405060708090
1940 1950 1960 1970 1980 1991 1995 2000
maiores do mundo, tanto maior a expanso econmica necessria para diminuir a populao
abaixo da linha da pobreza.
Concentrando renda e acumulando riquezas, os ricos foram ampliando as suas
propriedades e expulsando os minifundirios do campo. Foi nos idos de 1964 que o problema
agravou-se, nesse ano foi concebido o Estatuto do Trabalhador Rural (ETR), que ditava o
seguinte: jornada de trabalho de oito horas, salrio mnimo, frias acumuladas, repouso semanal
remunerado etc. Os proprietrios rurais no quiseram (ou no puderam) arcar com os encargos
sociais decorrentes do ETR, demitiram os seus empregados e passaram a tirar vantagens da nova
situao: institucionalizaram o trabalhador temporrio (sem direitos e sem perspectivas). Isso fez
com que muitas pessoas abandonassem o campo e fossem para as cidades em busca de melhores
condies de vida, pois nessa poca comeava a se tornar realidade o sonho da industrializao
brasileira. As cidades comearam a inchar. Disso resultou o nascimento da periferia dos grandes
centros urbanos e o consequente fenmeno da conurbao (ADAS e ADAS, 1998, p.382, 518-
20).
A figura abaixo apresenta a evoluo das populaes rural e urbana no Brasil, no perodo
de 1940 a 1995. Nessa figura notria a disparidade entre as populaes rural e urbana. Vale
salientar que entre 1960 e 1970 aconteceram as menores variaes entre essas duas populaes.
Mas de 1940 at 1995, a populao rural s decresceu. Em 1995, ela representava 21 % da
populao brasileira. Hoje, segundo os nmeros do censo 2000 (IBGE), representa menos de 20 %.
Para Rattner (1999, p.134), as crises e os conflitos (tnicos, econmicos, religiosos)
motivam as pessoas a deixarem as suas terras nativas e procurarem melhores condies de
sobrevivncia. A falta de capacidade do governo em atender as expectativas da sociedade em
Fig. I.1: BRASIL: Evoluo das Populaes Rural e Urbana - 1940-1995 Fonte: IBGE, Anurio Estatstico do Brasil, 1992, p.207; PNAD 1995, p.6. IBGE, Censo Demogrfico 2000.
Pop. Urbana %
Pop. Rural %
-
6
termos de incremento de qualidade de vida, faz com que as pessoas se tornem irrequietas,
ansiosas, frustradas ou revoltadas diante da ausncia de perspectiva reinante. Isso estimula as
pessoas a migrarem das suas terras e as guiam na direo de novas plagas na inteno de
sobreviver condignamente. Provavelmente, esses fatores supraditos tenham contribudo para o
povoamento intenso do Arco do Desflorestamento (Figuras 1.3 e 1.5).
Esses movimentos causam desequilbrio social nas cidades invadidas e constituem
agravantes e conseqncias da crise relativa escassez crescente de recursos naturais e
degradao progressiva do meio ambiente.
Outro fator que se deve considerar a concentrao da propriedade da terra, um grave
problema brasileiro, ela em nada contribui para o desenvolvimento social, econmico e poltico
do Pas. Esse bice, aos poucos, vai fazendo com que as insatisfaes se agigantem e os
movimentos pr-reforma agrria se intensifiquem, gerando conflitos de consequncias nefastas,
tanto para o Governo Federal quanto para a populao desamparada. Os conflitos representam a
resistncia contra a vigncia de um modelo de desenvolvimento agropecurio arcaico e
excludente.
De 1978 a 1994, segundo o levantamento do Instituto Nacional de Coloniza e Reforma
Agrria (Incra) e do Movimento dos Trabalhadores Rurais e Sem Terra (MST), de 1994
(RATTNER, 1999, p.397), a Regio Norte foi a que mais assentou famlias (54.217 famlias) e a
que mais rea doou (3.911.205 ha). O Nordeste vem em segundo lugar 1965.835 famlias
assentadas em 40.600 ha.
Essas polticas geraram novos movimentos migratrios pelo pas. O contingente sulino
passou a buscar a Regio Centro-Oeste e Norte (norte do Mato Grosso, norte de Gois e leste de
Rondnia, Figuras 1.2 e 1.3) para poder obter o seu quinho terra e poder produzir. As terras
eram baratas, s vezes, nem dono tinham; portanto, no tinham preo, praticava-se um uti
possidetis1 interno, e comeou-se a desmatar para plantar e criar pastagens voltadas criao do
gado. Nada mais lgico, pois era essa a cultura imposta pelos governantes e pelos produtores de
sucesso existentes, imitava-se o modelo vigente. Aliar a produo s benesses da floresta era
assunto no questionado. O pretendido era produzir com a cultura e conhecimento existente.
Desmatar era necessrio e compulsrio. Governos, local e nacional, e populao no se
permitiam olhar a floresta como recurso econmico que poderia desenvolver, no mdio prazo,
melhor qualidade de vida e renda para todos. O aspecto econmico imediatista e a ganncia de
exploradores da regio implantaram parmetros de produo no adequados quelas plagas.
Resultado: agresso e contnua degradao do meio ambiente.
1 Uti possidetis - Expresso latina que significa como possuir agora, dizer-se na condio em que a se encontra
naturalmente, para exprimir a idia que a coisa deve ser mantida na situao em que se encontra. Frmula diplomtica que estabelece o direito de um pas a um Territrio. Direito esse fundado na ocupao efetiva e prolongada, independente de qualquer ttulo.
-
7
Fig. I.2: Brasil: Migraes Internas/1960-1970. Fonte: OLIVEIRA, Ariovaldo U. Integrar para no entregar: polticas pblicas e amaznia. 2 ed. Campinas: Papirus, 1991, p.76.
Aliado a tudo isso, a seca no Nordeste fazia com que milhares de indivduos
abandonassem as suas razes e fossem tentar a vida noutras localidades. Muitos nordestinos
saram de suas cidades e rumaram para o Sudeste do pas (Fig. 1.2 e 1.3). L no morreriam de
sede, nem de fome. Conseguiriam um emprego, sobreviveriam. Com o passar do tempo, a
proliferao da misria nos grandes centros fez com que essa migrao se voltasse para a Regio
Norte.
Fig. I.3: Brasil: Migraes Internas/1970-1990. Fonte: SCHAEFER, Jos Renato. Apud Oliveira, Ariovaldo
U. Amaznia: monoplio, expropriao e conflitos. Campinas: Papirus, 1991, p.92.
-
8
Cabe observar que levas de trabalhadores nordestinos j tinham buscado a Amaznia
para trabalhar nos seringais e/ou trabalhar em servios diversos na Regio do Meio Norte
(Maranho). A seca nessa rea era praticamente inexistente, nela predomina uma vegetao de
transio (incio da floresta equatorial).
Nos ltimos 40 anos, a ao humana vem se tornando um grande bice ao meio ambiente
na Amaznia meridional em virtude da exploso demogrfica que vem sofrendo as cidades nela
contida, Figuras 1.2 e 1.3, sobre as imigraes internas no Brasil, no perodo de 1960 a1990.
As principais aes do homem no Arco do Desflorestamento (termo que ser explicado
na seco seguinte) so: desmatamento, queimadas e incndios florestais. No prximo tpico,
abordar-se- o problema do fogo nessa regio, bem como as aes governamentais para impedir
o alastramento das queimadas e incndios florestais no Arco do Desflorestamento.
I.1.3 O problema
A Organizao das Naes Unidas para a Agricultura e a Alimentao (FAO) vem
alertando os governos mundiais para a problemtica dos incndios florestais. Eles vm crescendo
muito rapidamente, principalmente nos ltimos 40 anos.
A FAO aponta que a diminuio da cobertura vegetal, nos pases em desenvolvimento,
est intimamente ligada escassez de terra aproveitvel e ao crescimento demogrfico (FAO,
1975, p. 26-7). Alega ainda que, nos pases desenvolvidos, os fogos em florestas tm aumentado
com a dinmica do turismo (nacional e internacional) nas zonas de matas. grande a
possibilidade de fogo devido prpria natureza das matas. Muitas vezes, a chama inicial de um
incndio resultante de um descuido qualquer de alguma ao humana; outras vezes pode ter
motivao intencional (Figura 1.4 e Tabela 1.1).
Fig. I.4 Percentual de focos de queimada na Amaznia
Fonte: IPAM/2000
-
9
Tabela I.1 Causas de Incndios Florestais na Europa (1978), na Alemanha (RFA mdia de 1972 a 1978) e na Espanha 1979.
Causas Europa - % Alemanha - % Espanha - %
Desconhecidas 46 32 41
Incendirios 28 12 42
Negligncia 20 39 13
Raios 1 1 3
Outras 5 16 1
Fonte: Goldammer (1982, p. 11)
Em 1970, na Espanha e sul da Frana, os incndios devastaram em torno de 160 mil
hectares de mata e mataram 21 pessoas. A Califrnia (EUA) tambm experimentou esse ano
como um dos piores em termos de incndios florestais. Possuidora de clima mediterrneo, em
poucas semanas de outono californiano arderam mais de 240 mil hectares, 722 casas foram
queimadas e perdidas 16 vidas humanas.
Mesmo com todo o aparato e experincia voltados preveno e ao combate aos
incndios florestais, a Europa, os EUA e o Canad sofreram incremento de incidncia desses. As
Tabelas 1.2 a 1.5 e as Figuras 1.5 e 1.6 explicitam alguns dados.
Tabela I.2 Frequncia de Incndios Florestais em pases europeus
Pas rea
Florestal
Perodo rea Queimada -
ha
% em relao
rea total
Perdas
US $1.000
Frana 16.600 1970-79 46.701 0,34 100.796
Grcia 8.460 1970-79 19.972 0,24 60
Itlia 7.993 1970-79 44.000 0,55 16.288
Espanha 14.092 1970-79 175.631 1,25 350.156
Polnia 8.551 1970-79 2.054 0,02 1.500
Fonte: Goldammer (1982, p.7), adaptado pelo autor.
Tabela I.3 Incndios Florestais nos Eua e Canad
Pas Ano Nmero de Focos de
Incndios
rea Queimada (ha)
Estados Unidos 1997-1998 24.817 28.455 198.390 241.236
Canad 1997-1998 1.313 3.148 9.478 580.120
Fonte: National Interagency Fire Center , Idaho-EUA, apud Ibama/Proarco, 1998.
-
10
Portugal41%
Itlia12%Grcia
3%
Espanha40% Frana
4%
Espanha39%
Frana4%
Portugal37%
Itlia17%
Grcia3%
Tabela I.4: Mdias de reas Queimadas, a cada dez anos, em Pases Europeus (1980-2004)
Portugal Espanha Frana Itlia Grcia Total
Mdia (1980-1989) 74.486 244.788 39.157 148.485 52.417 559.331
Mdia (1990-1999) 102.203 161.323 22.695 108.890 44.108 439.219
Mdia (2000-2004) 189.532 129.106 32.078 76.764 36.610 464.090
Mdia (1980-2004) 108.582 188.265 31.156 118.303 45.932 492.238
TOTAL 2.714.547 4.706.633 778.900 2.957.572 1.148.298 12.305.950 Fonte: European Comission/2005
Tabela I.5: Mdias Incndios Florestais, a cada dez anos, em Pases Europeus (1980-2004) Portugal Espanha Frana Itlia Grcia Total
Mdia (1980-1989) 6.778 9.514 4.910 11.571 1.264 34.036
Mdia (1990-1999) 22.250 18.151 5.537 11.352 1.748 59.039
Mdia (2000-2004) 26.059 20.779 4.207 7.696 1.891 60.633
Mdia (1980-2004) 16.823 15.222 5.020 10.709 1.583 49.357
TOTAL 420.573 380.551 125.503 267.718 39.570 1.233.912
Fonte: European Comission/2005
Fig I.5 : Percentual de reas queimadas/pases do sul da Europa/2004. Fonte: Forest Fires in Europe 2004/European Communities 2005.
Fig. I.6: Percentual de incndios florestais/pases do sul da Europa/2004. Fonte: Forest Fires in Europe 2004/European Communities 2005.
-
11
Nos EUA, o aumento de focos de incndios entre 1997 e 1998 foi de aproximadamente
16% e, no Canad, foi de mais de 6.000%. O maior incndio florestal localizou-se na regio de
Alberta, onde foram queimadas mais de 50 mil hectares de mata.
A Indonsia, no Sudeste Asitico, tambm foi vtima de uma forte incidncia de
incndios florestais em 1997. Kalimatan (Bornu), Sumatra e Irian Java foram as regies mais
afetadas. Na realidade, mais de 1,7 milho de hectares representam a totalidade da rea
envolvida nesse tipo de desastre, com aproximadamente 100 mil hectares queimados.
Os cientistas afirmam que um dos grandes (seno o principal) causadores de incndios
florestais o fenmeno denominado EL NIO (nome dado pelos pescadores peruanos significa
o menino em espanhol). Ele caracteriza-se por um aquecimento anormal das guas do Pacfico
Tropical Centro-Leste (entre 1997 e 1998, as guas do Pacfico equatorial elevaram-se 4 C
acima do normal) e geraram mudanas, em grande escala, nas condies climticas de vrias
regies do planeta. As secas da ndia, do Nordeste do Brasil, da Austrlia, da Indonsia e da
frica provm dele, assim como as enchentes no Peru, Equador, Meio Oeste dos EUA e Sul e
Sudeste do Brasil. Em outras reas ainda ocorrem elevaes de temperatura superiores s mdias
histricas e excesso de frio e neve. Todos esses desequilbrios so produzidos pelo El Nio,
fenmeno que embute elevada quantidade de energia em seus processos (Ibama, 1998, p. 9 -11)
Efeitos opostos ao El Nio so produzidos pela La Nia, isto , pesquisadores
estadunidenses e europeus alegam que os ventos alsios aumentam e levam as guas quentes
superficiais para a sia (causando chuvas) e ocasionando fortes chuvas no Norte e Nordeste do
Brasil e estiagem no Sul (GRISI, 2000, p. 52).
Pesquisadores apresentam o El Nio como cclico (porm sem perodo regular), que
reaparece no intervalo de dois a sete anos, e que data de pelo menos 6 mil anos atrs (SILVA et
al, 1999, p. 91 e Ibama/Proarco, 1998, p.9).
No Brasil, vrias regies tm sentido os seus efeitos, mais precisamente desde 1997. Ele
afetou a regio Sul e Sudeste da seguinte forma: altas temperaturas durante os meses de janeiro;
e chuvas excessivas no Sul (outubro e novembro). Quanto Amaznia, a partir da segunda
metade de 1997 comeou a produzir estiagem em diversos locais, gerando efeitos sinrgicos
diversos (na atmosfera, no clima, na temperatura, na vegetao e na ao humana etc) e
contribuindo decisivamente para a incidncia de incndios florestais no estado de Roraima, no
qual os ndices pluviomtricos (de abril a setembro) ficaram abaixo do normal e a seca iniciou-
se, em julho, antes do habitual - outubro/maro.
Os habitantes de Roraima fazem queimadas nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro
para preparar as roas. No incio do ms de maro, com a ausncia das chuvas, as queimadas se
alastraram dos cerrados para as reas de vegetao de transio, tambm chamada de floresta de
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contato. Da em diante, gerou-se o incndio que se tornou o maior do Brasil. Segundo Barbosa
(1998, passim) e publicaes do Ministrio das Relaes Exteriores (MRE) sobre os Desafios
Brasileiros na rea Ambiental, o grande incndio de Roraima (1998), na avaliao dos sistemas
naturais e agroecossistemas alterados pelo fogo em Roraima, queimou aproximadamente 3,2%
da rea de floresta do estado, em torno de 7.000 km2. O fogo queimou uma faixa de
aproximadamente 400 km, que se estendeu do norte ao sudeste de Roraima. Os hospitais locais
relataram aumentos significativos de problemas respiratrios, causados pela fumaa em
suspenso. Os aeroportos foram fechados para pouso e decolagem durante vrios dias, tambm
pelo mesmo motivo. Poos e crregos secaram e, quando as chuvas voltaram, foram poludos
pela enxurrada de sedimentos da terra queimada. O incndio s terminou quando as chuvas
comearam a cair no final de maro de 1998.
No combate ao incndio foram envolvidos o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renovveis (Ibama), brigadas municipais locais, as Foras Armadas (FFAA),
a Defesa Civil, diversos Corpos de Bombeiro Militares, a Fora Tarefa, e as Foras Areas da
Argentina e da Venezuela. Essa atuao evidenciou a total descoordenao relativa s aes
integradas de combate aos incndios florestais. Segundo o Ibama (Processo de Prorrogao do
Proarco, setembro de 2001), como resultado dessa operao, o tesouro nacional destinou 28
milhes de reais em fundos de assistncia para a reconstruo das reas afetadas.
As florestas virgens da Amaznia funcionam como barreiras midas ao longo da
paisagem, prevenindo a expanso do fogo iniciado, acidental ou intencionalmente, em pastagens
e campos agrcolas. Se as florestas perderem essa funo protetora, grandes reas amaznicas
estaro sujeitas a queimadas peridicas. Isso poder trazer impactos negativos para a
biodiversidade e resultar na reduo da biomassa estocada na floresta e na quantidade de gua
liberada pela vegetao para a atmosfera, necessrias para manter os ciclos da gua e de chuvas.
O incndio florestal causa danos, s vezes, inestimveis. Ele pode danificar as estruturas
de um povoamento, bem como destrui-lo totalmente. Segundo Goldammer (1982, p. 11) , os
danos provocados por incndios florestais so:
- Danos econmicos para a indstria florestal e madeireira;
- Danificao do stio: por meio da destruio da vegetao e da camada de hmus, que
podem gerar eroso e depauperao do solo;
- Diminuio do potencial de regenerao pela queima das rvores matrizes, do sistema
radicular e da rebrotao;
- Danificao e enfraquecimento de povoamentos que ficam susceptveis s pragas,
como insetos e fungos;
- Prejuzo paisagem, s plantas e aos animais; e
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- Danificao de outros ramos econmicos e ameaa aos seres humanos.
Nepstad et al. (2001, p.2), discorrem sobre a incapacidade do Brasil em lidar com os
incndios florestais na regio amaznica:
Os incndios florestais produzem respostas de emergncia, mesmo que sejam uma
caracterstica crnica da Amaznia rural. No Brasil, avies e tropas dos Corpos de
Bombeiro Militares so despachados para as florestas ardentes medida que so
reportados pela mdia. Em 1998, os incndios florestais penetraram sobre as Terras
Indgenas Yanomami, em Roraima, e o governo respondeu com tropas de Bombeiros
Militares e helicpteros, com pouco efeito sobre as chamas (Barbosa e Fearnside, 2000).
Mais tarde no mesmo ano, fogos ameaaram os ndios localizados no alto do rio Xingu, e
as tropas foram novamente acionadas. Enquanto isso, centenas de outros incndios
florestais de menor importncia aconteceram pela Amaznia, sem a devida capacidade
de resposta das foras de emergncia do Brasil.
Em virtude do exposto, percebeu-se a necessidade de se criar um programa para
combater, de forma coordenada, incndios florestais de grandes propores na Amaznia Legal.
Assim, o Decreto n. 2.662, de 8 de julho de 1998, criou uma Fora Tarefa, um Ncleo
Estratgico e instituiu o Programa de Preveno e Controle de Queimadas e Incndios Florestais
na Amaznia Legal (Proarco). Cabe salientar que j existia o Prevfogo, antigo Sistema Nacional
de Preveno e Combate aos Incndios Florestais, hoje intitulado Centro Nacional de preveno
e Combate aos Incndios Florestais.
Em 30 de setembro de 1999, o Governo Brasileiro e o Banco Mundial assinaram o
Acordo de Emprstimo n. 4389BR, no valor total de US$ 20 milhes (US$ 15 milhes do BIRD
mais US$ 5 milhes de contrapartida), com validade at 31 de dezembro de 2001. Ele objetivava
implementar o Proarco, fato acontecido somente em fevereiro de 2000, quando da efetividade do
programa, conforme artigo VI, do Acordo de Emprstimo citado. Na realidade, a greve de
diversos setores do governo federal a poca fizeram com que o primeiro repasse financeiro s
acontecesse em junho de 2000, portanto nove meses aps a assinatura do Acordo, reduzindo o
tempo til de execuo contratual, que passou a ser apenas 13 meses.
O Proarco tem como objetivo prevenir e combater a ocorrncia de queimadas e incndios
florestais, em larga escala, na Amaznia Legal (AL), especialmente no Arco do
Desflorestamento. Ele possui como componentes estruturantes o monitoramento e avaliao de
riscos de incndios florestais, a preveno e combate aos incndios florestais e o gerenciamento
do projeto, Abrangendo vrios estados da AL: Acre, Amazonas, Maranho, Mato Grosso, Par,
Rondnia, Roraima, Amap e Tocantins. O Arco do Desflorestamento compreende o Nordeste do
Par, o Sudoeste do Maranho, Noroeste do Tocantins, Norte do Mato Grosso, Oeste de Rondnia,
Sul do Amazonas e o Leste do Acre. Tem aproximadamente 3 mil km de extenso, variando at 600
km de largura, perfazendo um total de 1,7 milho de km2 (Figura 1.7).
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Fig. I.7: Arco do Desflorestamento configurao dentro da Amaznia Legal. Fonte: Ibama/Inpe
O Proarco foi iniciado em 1998, mas com efetiva operao a partir de 2000, quando
aconteceu o primeiro repasse financeiro internacional para o Ibama. No que se refere parte do
Acordo de Emprstimo com o BIRD, ele foi prorrogado duas vezes. Em 2005, o Programa ainda
funcionou, mas sem montantes internacionais, pois o acordo de emprstimo foi encerrado em
dezembro de 2004.
Frente aos desencontros reinantes sobre o tema em questo, o Brasil precisa ainda
enfrentar:
- as constantes ameaas de incndios florestais na Amaznia;
- a interrupo na transmisso de energia eltrica na regio;
- a intensificao da alterao da cobertura vegetal;
- a desconfiana dos governos e entidades internacionais quanto competncia de
atuao dos rgos nacionais com relao ao combate a incndios florestais e
proteo do meio ambiente na Amaznia;
- a necessidade de gerar habilidades e competncias (iniciais e continuadas) nos
profissionais que atuam diretamente no controle de queimadas, monitoramento,
preveno e percia em incndios florestais, alm do manejo do fogo;
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- a fragilidade do envolvimento da sociedade frente s aes de preveno,
monitoramento e combate aos incndios florestais;
- a fragilidade de coordenao entre os diversos rgos envolvidos; e
- os prejuzos decorrentes do fechamento de aeroportos e rodovias em funo dos
incndios florestais.
Frente ao exposto e diante das mudanas climticas, que envolvem todo o planeta, a
ocupao desordenada de reas na regio mais meridional da Amaznia, a baixa eficincia e
eficcia na preveno, combate e controle do fogo na regio e da ausncia de fato de
Polticas Pblicas integradas no intuito de facilitar a atuao conjunta e combinada para eliminar
ou minorar os incndios florestais na Amaznia Legal, aponta-se um problema de pesquisa para
esse estudo: Quais as relaes entre as dimenses Relacionamento, Poltico-legal e Tcnico-
administrativas e as Gestes Intra-organizacional e Interinstitucional das aes de preveno e
combate aos incndios florestais em Roraima?
I.2 OBJETIVOS
O objetivo geral deste estudo analisar as relaes entre as dimenses Relacionamento,
Poltico-legal e Tcnico-administrativas e as gestes intra-organizacional e interinstitucional
das aes de preveno e combate aos incndios florestais em RR e, a partir dessa anlise,
propor um modelo de gesto compartilhada dessas aes para o estado de Roraima.
Quanto aos objetivos operacionais, tm-se:
- identificar e analisar as Polticas Pblicas direcionadas ao tema;
- levantar as reais necessidades da existncia do Prevfogo/Proarco e de seus
desdobramentos;
- identificar e estudar as dificuldades dos diversos rgos que trabalham com o
assunto;
- levantar os bices institucionais e profissionais (Ibama) que dificultam o
cumprimento da misso organizacional;
- analisar como os rgos envolvidos desenvolvem os trabalhos junto a outros rgos
(federais, estaduais e municipais) e s comunidades;
- identificar as tcnicas e equipamentos, bem como os meios areos, utilizados para a
preveno e supresso dos incndios florestais;
- analisar a capacitao dos recursos humanos envolvidos na preveno e combate aos
incndios florestais; e
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I.3 HIPTESES
A Teoria dos Sistemas e a Teoria da Contingncia impelem pensar as instituies como
entidades abertas e susceptveis de pronta resposta aos novos elementos (sociais, tecnolgicos,
ambientais, polticos, institucionais, econmicos, culturais), bem como apresentar rpida
capacidade de adaptao s mudanas e que todos se envolvam com a misso institucional. No
caso do Ibama, da Defesa Civil, das FFAA, da Embrapa e dos Bombeiros Militares, por serem
entidades da Administrao Direta, portanto integrantes do Poder Executivo e envolvidas com o
combate aos incndios florestais, j no podem mais se limitar s atribuies estritas das normas
especficas de cada rgo. Elas habitam uma dimenso mais abrangente, pois possuem uma
cultura informal que lhes d vida, integram-se (ou no) com as comunidades onde se localizam;
atendem (ou no) a misso para qual foram constitudas; referem-se (ou no) aos apelos, desejos
e anseios da sociedade; coordenam-se (ou no) entre si para poderem obter resultados (aqueles
previamente delineados e que se apresentam como fatos geradores de suas existncias) e
justificar os motivos pelos quais foram criadas e se devem ainda manter-se como instituies
(organizaes) que promovem aes que impactam positiva e diretamente nas
pretenses/necessidades da sociedade.
Fazer o sistema funcionar harmonicamente e empregar meios direcionados ao
cumprimento do objetivo maior, faz com que esse se desenvolva com eficincia e eficcia, pois
em tese todos os ingredientes do sistema (inputs, withinputs, throughtputs, outputs, outcomes e
feedback) devem possuir a mesma essncia de microestruturas e estar voltados para o
cumprimento da misso maior comum a todos.
Pelo exposto, as hipteses deste estudo esto assim delineadas: a) a percepo da
importncia das brigadas municipais e o reduzido suporte (financeiro, educacional, material e
organizacional) dos rgos pblicos e b) as divergncias internas do Ibama (entre o Prevfogo e o
Proarco, e destes com outros setores) somadas c) a precria adeso interinstitucional s aes de
preveno, controle de queimadas e combate aos incndios florestais (PCQIF) afetam
negativamente o desempenho dessas aes em Roraima.
I.4 DELIMITAO DO ESTUDO
Sem a pretenso de esgotar o assunto, longe de abordar com perfeio o tema e sabedor
que diversos fatores podem influenciar para a gerao de eficincia e eficcia sistmica, foram
abordadas trs dimenses neste estudo: Relacionamento, Poltico-legal e Tcnico-
administrativa. A dimenso Relacionamento objetivou entender como as entidades (setores,
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diretorias e rgos) se relacionam entre elas e, no caso interinstitucional, com as comunidades
locais; a dimenso Poltico-legal analisou como a norma legal e as Polticas Pblicas
relacionadas com o tema impactam na gesto de PCQIF; e a dimenso Tcnico-administrativa
averiguou como os recursos (humanos, materiais, tecnolgicos, instalao e equipamentos,
veculos areos e terrestres) so utilizados na preveno e combate aos incndios florestais.
Essas dimenses foram inseridas nos trs ambientes pesquisados: Brigadas Municipais
(com os Chefes de Brigadas localizadas no Arco do Fogo de RR), Intra-Organizacional (no
mbito do Ibama, sede/Braslia e Roraima) e Interinstitucional (entre os organismos envolvidos
com a gesto do fogo em RR)
I.5 JUSTIFICATIVA
O entendimento de que os recursos naturais so finitos, o conhecimento em maior
profundidade da biodiversidade amaznica e as presses internacionais referentes preservao
das florestas tropicais tem causado efeito na Amaznia Legal (AL), embora em ritmo lento, mas
acontecendo.
Hoje, diversos programas e projetos tm foco na AL. Tem-se o Programa Piloto para a
Proteo das Florestas Tropicais no Brasil (PPG7), o Sistema de Proteo da Amaznia/Sistema
de Vigilncia da Amaznia (Sipam/Sivam), o Calha Norte, o Projeto de Auxlio Financeiro aos
Municpios da Faixa de Fronteiras (PAFMFF), o Zoneamento Ecolgico-Econmico (ZEE) da
regio. Todos preocupados em ocupar e/ou desenvolver sustentavelmente a Amaznia. O
Proarco mais um deles.
Envolvendo quantia vultosa (US$ 20,000.000.00) e atuando em conjunto com vrias
entidades federais (Ministrio da Integrao Nacional - Defesa Civil; Ministrio da Defesa -
Aeronutica e Exrcito; Ministrio da Agricultura Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuria Embrapa; Ministrio da Justia Polcia Federal), estaduais (rgos estaduais de
meio ambiente - Oemas, Bombeiros Militares); municipais (prefeituras); e comunitrias (comits
e brigadas), o programa possuidor de interfaces complexas de funcionamento. Vrias esferas
do poder pblico inter-relacionam-se e entram em jogo os tradicionais problemas da esfera
pblica: morosidade nas aes, burocracia (aspecto pejorativo), gastos excessivos, falta de
coordenao entre os setores, ausncia de avaliao e controle tcnico-financeiro, deficincia de
pessoal, emprego inadequado de meios e recursos, divergncias polticas entre esferas pblicas e
divergncias intra-organizacionais e interinstitucionais.
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Os governos, de qualquer esfera, no podem (e no devem) gerar despesas sem o devido
comprometimento com a sociedade, pois eles no so plenipotencirios do poder. O Estado no
tem finalidade nele prprio. Ele, o governo, e a administrao pblica fazem-se presentes para
atender s necessidades, os anseios e s pretenses da sociedade. Esta, sim, deve conduzir os
desgnios de um povo e estar preparada para discutir com conhecimento e profundidade os
problemas locais, regionais e nacionais. dentro desse diapaso que se busca entender como
esto funcionando as aes de PCQIF para onde caminham.
As organizaes podem e devem buscar uma gesto compartilhada2 pelo aprimoramento
das aes de PCQIF institucionais e comunitrias e o seu comprometimento socioambiental, de
modo que as diversas partes integrantes no percam substncia com discrepncias poltico-
institucionais e/ou distores (legais, organizacionais, administrativas, interinstitucionais e
pessoais) no emprego de meios para o atingimento da misso. No so as instituies que se
beneficiam, a sociedade que se apropria dos benefcios das atividades pblicas e com elas deve
cooperar, formal ou informalmente. Atingir eficincia (otimizao dos recursos utilizados para
obteno de resultados) e eficcia (alcanar os objetivos - institucionais e da sociedade -
socioeconmicos previamente delineados) o desejvel.
A importncia deste estudo reside na carncia de trabalhos cientficos direcionados ao
tema na regio estudada, nas sugestes que podero advir da anlise crtica dos resultados
encontrados, na contribuio para o alcance de unidade de esforos e coordenao no Ibama,
assim como na estrutura e funcionamento dos organismos estaduais, e, acessoriamente, para a
melhoria do sistema.
I.6 O MTODO
A cincia tem como objetivo fundamental a proximidade veracidade dos fatos, e para
que um conhecimento seja considerado cientfico torna-se necessrio determinar o mtodo que
possibilitou chegar a esse conhecimento. Em ltima anlise, o mtodo cientfico um conjunto
2 Gesto Compartilhada - so aes sistmicas e continuadas de planejamento, execuo, controle e avaliaes desenvolvidas em empreendimento nico por um conjunto de organizaes parceiras (que direta ou indiretamente se relacionem com a misso do empreendimento) onde todas contribuem com recursos humanos, oramentrios/financeiros ou materiais (no mnimo com dois tipos de recursos), assim como, por intermdio de Comit Gestor, so elencadas as atribuies (organizacionais) e as responsabilidades (dos gerentes/coordenadores) de cada membro do empreendimento. Ela subentende o envolvimento das esferas pblicas, entidades representativas da sociedade civil (associaes, ong, sindicatos etc.) e da iniciativa privada, bem como uma gesto centrada em deliberaes do Comit Gestor, composto por representantes internos do empreendimento e das organizaes parceiras integrantes. O coordenador do Comit Gestor escolhido periodicamente por intermdio de eleio direta. Os eleitores so os profissionais vinculados e registrados no empreendimento. Os integrantes da funo controle/avaliao no devem participar de outras atividades de gesto do empreendimento.
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19
de procedimentos intelectuais e tcnicos adotados para se atingir o conhecimento (GIL, 1991, p.
29).
Foram objetos deste estudo as literaturas sobre incndios florestais direcionados
preveno e ao combate a queimadas e incndios florestais; gesto interdisciplinar na
administrao pblica; gesto integrada intra e interinstitucional; educao ambiental; e aspectos
socioeconmicos do meio ambiente. Toda a estrutura do trabalho est calcada nos ditames do
Desenvolvimento Sustentvel, principalmente naqueles critrios de sustentabilidade afirmados
por Sachs (2000, p. 85-8): social, cultural, ecolgico, ambiental, territorial, econmico e poltico
(aspectos nacionais e internacionais). Acrescenta-se ainda a esses critrios a institucionalizao.
Este estudo ainda fundamentou-se nas documentaes (Diretrizes, Memorandos, Leis,
Decretos, Portarias e Instrues Normativas e Orientaes especficas) existentes nos rgos
diretamente envolvidos (Ibama, Defesa Civil, Embrapa, Femact, Incra, Corpo de Bombeiros
Militares) com o problema.
O referencial terico baseou-se em livros, teses, dissertaes e monografias sobre o tema
em questo. Foram pesquisados ainda artigos, trabalhos tcnicos, revistas e jornais que relatavam
sobre o assunto, assim como a Internet.
I.6.1 Tipo de pesquisa
Pela precariedade de literatura especfica, sistematizada e ordenada, voltada questo
abordada e no intuito de buscar soluo para o problema concreto, foi procedida uma pesquisa
exploratria no Ibama e na Defesa Civil. Foram realizadas observaes diretas nas instituies
afins localizadas em Roraima com o intuito de efetuar dilogos informais e entender a percepo
dos envolvidos com o problema. Essas averiguaes voltaram-se ao entendimento e ao
funcionamento do sistema: quem eram os responsveis, como trabalhavam, do que dispunham,
como interagiam, o que prejudicava as aes, quais eram as causas do problema, quando e
porque agiam.
O mtodo adotado como base cientfica neste trabalho foi a pesquisa qualitativa e
caracteriza-se como um estudo de caso. A pesquisa qualitativa trabalha com um universo de
percepes, significados, aspiraes, crenas, valores e atitudes, o que corresponde a um espao
mais profundo das relaes, dos processos e dos fenmenos que no podem ser reduzidos
operacionalizao de variveis (DESLANDES, 1994, p. 22).
Segundo essa perspectiva, os fenmenos e as relaes sociais podem ser melhor
compreendidas no contexto em que ocorrem, e do qual fazem parte, possibilitando uma anlise
integrada. O estudo de caso permite essa vivncia da realidade a partir da delimitao de um
objeto de estudo, e busca solues por meio das relaes entre a teoria e a prtica.
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Como alega Yin (2005, p.32-33), o estudo de caso uma investigao emprica que
investiga um fenmeno contemporneo dentro do contexto da vida real, especialmente quando os
limites entre o fenmeno e o contexto no esto claramente definidos. Ele baseia-se em vrias
fontes de evidncias, com os dados precisando convergir em formato de tringulo, e, como outro
resultado, beneficia-se do desenvolvimento prvio de proposies tericas para conduzir a coleta
e a anlise de dados.
Este tipo de estudo promove incremento de conhecimento no pesquisador e tem como
produto final um problema mais esclarecido, passvel de investigao mediante processos mais
sistematizados.
A pesquisa iniciou-se em meados de 2003 e prolongou-se at outubro de 2005. As
entrevistas formais foram realizadas entre maio e setembro de 2005.
I.6.2 Universo e amostra
O estudo direcionou-se rea territorial abrangida pelo Arco do Desflorestamento, mais
especificamente o estado de Roraima, lcus que deu origem criao do Proarco.
Institucionalmente, foram entrevistados profissionais de doze rgos, trs localizados em
Braslia (BSB) e nove em Roraima: Ibama/MMA (na sede/BsB e em Roraima), Secretaria de
Defesa Civil/MI, Fora-Tarefa de Braslia/Batalho Florestal do CBMil do DF, Fundao
Estadual de Meio Ambiente, Cincia e Tecnologia de Roraima (Femact), Incra/RR, Federao
dos Trabalhadores Rurais na Agricultura do Estado de Roraima (Fetag), Grupo de Trabalho
Amaznico (GTA), Secretaria de Agricultura de RR, Defesa Civil/CBMil de Roraima,
Embrapa/RR, Secretaria do ndio/RR, Seplan/RR, Inpa/RR e Instituto de Pesquisas da Amaznia
(Inpa). Os representantes dessas instituies, um de cada, foram escutados nas entrevistas
interinstitucionais, exceto o Ibama, que participou com quatro pessoas, e a Femact, com duas.
No Ibama sede, foram entrevistados quatro profissionais do Proarco, quatro profisionais
do Prevfogo, um da Coordenao Geral de Fiscalizao (CGFIS), um do Centro de
Sensoriamento Remoto (CSR), um da Diviso de Controle e Fiscalizao (Dicof) RR, um da
Diviso Tcnica (Ditec) RR, um da Gerex/RR e um de cada diretoria operacional da sede (Dipro,
Diref, Direc, Diget), totalizando 13 servidores. Quatro (um do Prevfogo, um do Proarco, um da
Dipro e um da Gerex/RR) deles foram ouvidos nas entrevistas interinstitucionais e os demais nas
intra-organizacionais.
Relativo aos brigadistas, das doze brigadas existentes em RR, foram escolhidos seis
Chefes (pessoas experientes no trato com a supresso de IF) de Brigadas localizadas no Arco do
Fogo de RR: Alto Alegre, Amajar (Vilarejo do Trairo), Mucaja, Cant, Caracara e Iracema.
A escolha dos entrevistados, no mbito das instituies, deu-se pelo domnio com a
questo, em termos poltico-estratgico, gerencial e operacional. No momento anterior ao incio
da pesquisa, a inteno era entrevistar uma gama maior de servidores, mas aos poucos, percebeu-
se que somente alguns profissionais sabiam informar sobre os fundamentos histricos, legais,
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21
institucionais, estratgicos, gerenciais e s um nmero mais reduzido de pessoas compreendiam
a contextualizao macro, causas e efeitos das aes de preveno e combate aos IF na
Amaznia Legal. Assim, foram escolhidos profissionais com experincia no assunto, bem como
outros que ocupavam cargos que trabalhavam diretamente ou indiretamente a questo da PCQIF.
I.6.3 Coleta de dados
Trs roteiros de entrevistas foram elaborados: o primeiro, voltado aos Chefes de Brigadas
do Arco do Fogo em RR, doravante chamado de roteiro das brigadas, abordou questes sobre a
criao, procedimentos, relaes e dificuldades de operao; o segundo, direcionado a analisar as
discrepncias (de relacionamento, de recursos, de percepo e de atuao interna) intra-
organizacionais do Ibama, no que diz respeito as aes de PCQIF; e o terceiro, endereado
problemtica (relacionamentos entre os rgos, coordenao e liderana das atividades, processo
decisrio conjunto/compartilhado, estilos de gesto, impactos da politica interna nas aes
conjuntas, envolvimento poltico-partidrio) das questes interinstitucionais, que buscou
entender as relaes e dificuldades entre as instituies envolvidas na preveno e combate ao
fogo em RR, assim como identificar o tipo de gesto empregado para as aes de PCQIF.
Os roteiros (APNDICE A) foram estruturados em trs dimenses: Relacionamento,
Poltico-Legal e Tcnico-Administrativa. O pesquisardor foi, na totalidade das entrevistas, o
entrevistador.
A seguir, detalhar-se- os roteiros das Brigadas, o Intra-Organizacional e o
Interinstitucional.
a) Para a entrevista com os Chefes de Brigada, o roteiro buscou identificar e
compreender as trs dimenses supraditas relativas a atuao dos brigadistas junto aos rgos
pblicos (federal, estadual e municipal).
Quanto dimenso Relacionamento, buscou-se conhecer com quem e em qual nvel se d
o relacionamento dos brigadistas com as instituies, bem como identificar os problemas de
relacionamento existentes. Alm disso, buscou-se saber sobre os eventos dos quais os brigadistas
participam regulamente e como se configura a relao instituio/brigadistas nos prprios.
Outros pontos observados foram: a existncia de envolvimento formal ou informal entre
os brigadistas dos municpios em questo e de atividades desenvolvidas pelos brigadistas com os
produtores locais.
A segunda dimenso, Poltico-Legal, destinou-se a entender como as brigadas esto
juridicamente constitudas e quem, legalmente, as suporta, em termos de recursos materiais,
financeiros e administrativos. Adicionalmente, intentou-se saber como as esferas pblicas
influenciaram na estruturao e funcionamento delas.
Relativo dimenso Tcnico-Administrativa, averiguou-se as brigadas em termos de:
Constituio, critrios de seleo e capacitao de pessoal, assim como formao de lideranas;
aquisio e manuteno de materiais e equipamentos; planejamento e avaliao das aes de
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22
PCQIF; existncia de equipamentos de comunicao (computadores, rdios, telefones, etc.);
conhecimentos acerca da inflamabilidade da vegetao e sobre focos de calor; suporte logstico
para as aes de PCQIF; participao em atividades oficiais realizadas pelas esferas pblicas;
dados e informaes referentes ao clima, temperatura, ao vento, vegetao, provenientes das
instituies federais, estaduais e municipais; remunerao; e parcerias.
b) A entrevista Intra-organizacional, reuniu treze integrantes do Ibama, dez de Braslia
(dois do Prevfogo, trs do Proarco, um da CGFis, um do CSR, um da Direc, um da Diref, um da
Diget) e trs de Roraima (um do Prevfogo, um da Ditec e um da Dicof). O roteiro buscou
entender e identificar as aes de PCQIF no mbito da instituio e segundo as dimenses
Relacionamento, Poltico-Legal e Tcnico-Administrativa.
Referente a dimenso Relacionamento, procurou-se conhecer como a instituio se
conduz em termos de:
- satisfao dos servidores com os outros setores e diretorias;
- participao dos setores e diretorias em empreendimentos conjuntos;
- relacionamento entre o Prevfogo e o Proarco, assim como destes com outros setores;
- receptividade das aes do Prevfogo e o Proarco noutros setores;
- percepo do desempenho do Prevfogo e do Proarco por outros setores.
Quanto dimenso Poltico-Legal, tencionou-se identificar e entender:
- a importncia da mis