documento protegido pela lei de direito autoral · processo de aprendizagem na educaÇÃo infantil...
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU
AVM FACULDADE INTEGRADA
A CONTRIBUIÇÃO LÚDICA DA MUSICALIZAÇÃO PARA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL
POR DAYANE SILVA DOS SANTOS
ORIENTADOR: EDLA TROCOLI
RIO DE JANEIRO,
2014
DOCUMENTO PROTEGID
O PELA
LEI D
E DIR
EITO AUTORAL
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS GRADUAÇÃO LATO SENSU
AVM FACULDADE INTEGRADA
A CONTRIBUIÇÃO LÚDICA DA MUSICALIZAÇÃO PARA O PROCESSO DE APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Apresentação de monografia à AVM
Faculdade Integrada como requisito
parcial para obtenção do grau de
especialista em Educação Infantil e
Desenvolvimento.
Por: Dayane Silva dos Santos.
AGRADECIMENTOS
...A Deus por ter capacitado na construção
desse trabalho acadêmico. Aos meus pais por
todo apoio incondicional e compreensão nos
momentos de fraquezas e incertezas. A IAVM
por oportunizado um leque de aprendizados e,
por fim, a profº Edla Trocoli por ter me guiado
em todo o processo de orientação...
DEDICATÓRIA
...À Deus, minha mãe, meu pai, meu irmão e
cunhada e a todos os profissionais da educação
infantil de nosso país....
RESUMO
A música exerce influência na vida da criança desde sua tenra idade até mesmo
quando adentra na instituição escolar. Contudo, observa-se na escola o menosprezo da música
como eixo de conhecimento, sendo utilizada em momentos que mecanizam a criança e não
dão a liberdade para fluir sua imaginação e criatividade, limitando a integração desta com
outras áreas de conhecimento. A escola atual enfatiza somente as práticas tradicionais de
ensino em que se levam em conta somente o aprendizado das habilidades básicas em
detrimento dos conhecimentos artísticos e estéticos, desenvolvendo a criança pela metade.
Contudo urge em nosso tempo a necessidade de uma formação educativa que favoreça o
desenvolvimento integral da criança para que se tornem cidadãos reflexivos e críticos capazes
de viver em sociedade. Portanto, reconhecendo que a criança interage com a música de
forma lúdica sendo capaz de ampliar seu conhecimento de forma prazerosa, essa pesquisa tem
o objetivo de analisar a importância do papel da música e sua influência lúdica na rotina
escolar da educação infantil.
METODOLOGIA
O objeto de estudo desta pesquisa surge a partir do interesse pela área musical e a
necessidade de compreender a importância do papel que esta exerce na rotina das creches e
pré-escolas. Observa-se, para professores da educação infantil, a necessidade de aprofundar os
estudos nessa área haja vista as poucas bibliografias existentes.
Para alcançar o objetivo desse estudo utilizou-se a pesquisa documental, ao longo de 6
meses, por meio da análise dos seguintes livros: Música na educação infantil: Propostas para a
formação integral da criança da autora Teca Alencar de Brito, A criança pré-escolar. Como
pensa e como a escola pode ensiná-la de Howard Gardner, A música e a criança de Walter
Howard, Música e educação infantil de Ilari & Broocks (Org.) e o Referencial Curricular
Nacional para a Educação Infantil 1º e 3º volume.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 7
CAPÍTULO 1 - A INFLUÊNCIA DA MÚSICA EM CRIANÇAS DE 0 A 6 ANOS 9
CAPÍTULO 2 – A MÚSICA COMO PRÁTICA INOVADORA NO PROCESSO DO
ENSINO 19
CAPÍTULO 3 – OS DESAFIOS ENCONTRADOS PELO EDUCADOR PARA O
ENSINO MUSICAL 32
CONCLUSÃO 45
BIBLIOGRAFIA 47
ÍNDICE 49
7
INTRODUÇÃO
A música está presente em nosso cotidiano e, portanto, não há como não se
relacionar com ela. Conforme afirma Brito (2003, p. 53) “A música é linguagem cujo
conhecimento se constrói com base em vivências e reflexões (...)”.
A linguagem musical é capaz de transpor sensações, sentimentos e pensamentos,
por meio da relação entre os sons. No jogo entre som e silêncio a música consegue
integrar de forma lúdica os aspectos sensíveis, afetivos, estéticos, cognitivos e também
promover a interação e comunicação social, possibilitando o desenvolvimento de um
trabalho interdisciplinaridade.
Ela também está presente no cotidiano das creches e pré-escolas, mesmo que de
forma mecânica e rotinizada. Embora o seu uso esteja atrelado simplesmente às
apresentações de danças das turmas, ou para formação de hábitos e até mesmo nas
bandinhas rítmicas, inúmeros pensadores e concepções pedagógicas repensaram e
repuseram a música como eixo de conhecimento, sendo utilizada em sua amplitude.
Contudo, embora na teoria esse pensamento tenha eclodido, observa-se que na
prática cotidiana das escolas que a utilização da música como eixo de conhecimento
ainda está muito aquém do que deveria ser devido à falta de preparo do professor para
lidar com esse conhecimento, ou pela necessidade de um destaque dessa área na matriz
curricular, ou porque a ênfase da escola tem sido somente nas habilidades básicas e etc.
Sendo assim, reconhecendo que com a música a criança interage com o meio de
forma lúdica sendo capaz de ampliar seu conhecimento de forma prazerosa e diante
desse cenário educacional busco por meio dessa pesquisa compreender de que maneira a
musicalização na educação infantil pode contribuir para uma aprendizagem lúdica.
E para elucidar minha proposição objetivo analisar a importância do papel da
música e sua influência lúdica na rotina escolar da educação infantil. E, partindo desse
procuro investigar o papel lúdico da música na educação infantil, reconhecer a música
como ferramenta de transformação dos métodos de ensino e verificar quais são as
limitações e/ou dificuldades encontradas pelo educador para inserir a música no
cotidiano escolar.
A escolha do tema ocorreu tendo em vista a sua relevância para professores da
educação infantil de compreender o papel da música na rotina da educação infantil,
tendo em vista as suas vantagens lúdicas para proporcionar uma aprendizagem
8
significativa, principalmente porque há necessidade de aprofundar o tema visto que há
poucas bibliográficas no cenário educacional.
Para alcançar o objetivo desse estudo utilizamos como metodologia a pesquisa
documental por meio da análise dos seguintes livros Música na educação infantil:
Propostas para a formação integral da criança da autora Teca Alencar de Brito, A
criança pré-escolar. Como pensa e como a escola pode ensiná-la de Howard Gardner, A
música e a criança de Walter Howard, Música e educação infantil de Ilari & Broocks
(Org.) e o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil 1º e 3º volume.
Yin (2001) expõe que a análise documental pode utilizar inúmeros tipos de
documentos como, por exemplo, cartas, memorandos, documentos administrativos,
recorte de revistas e até mesmo artigos publicados na mídia. Essas fontes são usadas
para valorizar ou confirmar evidências vindas de outras fontes, fornecer detalhes
específicos que confirmem informações obtidas de outras fontes, checar a escrita e/ou
cargos mencionados na entrevista e servem para fazer inferências a partir de suas
análises.
Na primeira parte desse estudo busca-se entender as influências que a música
exerce na vida de crianças dos zero aos seis anos. Já na segunda parte desse estudo
buscamos possibilitar ao profissional da educação infantil uma gama de estratagemas
inovadores e criativos que contribuem para a transformação das práticas de ensino
tradicionais. E, por fim, na terceira parte desse estudo, busca-se entender as limitações
que o educador sofre em seu cotidiano para inserir a música na rotina da educação
infantil.
9
CAPÍTULO 1 – A INFLUÊNCIA DA MÚSICA EM CRIANÇAS DE 0 A 6 ANOS
Os Referenciais Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (RCNEI) é um
documento que objetiva orientar o trabalho educativo realizado em creches e pré-
escolas, de modo a contribuir para o desenvolvimento integral da criança.
Este documento oferece um guia de reflexão sobre os objetivos, conteúdos e
orientações didáticas para educadores e profissionais que atuam na educação infantil.
Reconhecendo a importância dessa etapa na vida da criança, o RCNEI
estabelece seis eixos de trabalho didáticos necessário para que a criança apreenda os
conhecimentos necessários para inserir-se na realidade social e cultural, se tornando
capazes de se desenvolver como cidadãos.
Dos seis eixos apresentados pelo documento, nortearemos esse trabalho no eixo
da música, que será o cerne dos nossos estudos.
A música está presente em nosso dia-a-dia sob a forma dos sons instrumentais,
das canções escutadas, na dança, por meios dos sons emitidos por animais ou até
mesmo pelos sons de buzinas emitidos por carros. Até quando nos deslocamos pelas
ruas nos deparamos com uma infinidades de sons que no tocante são música.
De acordo com Góes (2009, p. 2) a música “(...) tem acompanhado a história da
humanidade, ao longo dos tempos, exercendo as mais diversas funções. Está presente
em todas as regiões do globo, em todas as culturas, em todas as épocas (...)” o que a
torna uma linguagem universal que transcende as barreiras do tempo e do espaço.
A linguagem musical sempre esteve presente na história de vida do homem.
Somos influenciados por ela nos diferentes momentos de nossa vida como quando
ouvimos músicas em momentos de tristeza, ou quando a definimos por lembrar um ente
querido, ou quando a destacamos por nos remeter a infância, etc.
Isso porque a música é como uma linguagem em forma de sons, capaz de
expressar e comunicar sensações, sentimentos e pensamentos, por meio da relação entre
o som e o silêncio. (RCNEI, 1998, p. 45)
Muito além de ser apenas uma criação de formas sonoras com base em som e
silêncio, Brito (2003) conceitua a música como as expressões sonoras que refletem a
consciência, o modo de perceber, pensar e sentir de indivíduos, comunidades, culturas,
10
regiões em seu processo sócio-histórico. Em sua diversidade e riqueza, traduz a cultura
dos povos.
De fato a música está presente em nosso cotidiano por meio dos sons que nos
cercam, construídos pela escuta intencional transformadora, geradora de sentidos e
significados; são estabelecidos pela interação entre o mundo subjetivo e objetivo.
(CAGE, 1985 anpud BRITO, 2003, p. 27)
Assim como nos adultos, essas influências musicais também afetam a criança ao
longo do seu desenvolvimento. Howard (1984) constatou que desde o ventre da mãe a
música estabelece relação com o bebê. Os sons ouvidos pelas mães, durante a gravidez,
sensibilizam emoções que irão desenvolver nos bebês a capacidade de entrega à música.
O mesmo verificou, por meio de seus estudos, que as competências das crianças
se acentuam e enriquecem à medida que, ao longo da gravidez, a mãe transfere suas
ocupações e preocupações para o campo da imaginação, empurrando-as para um nível
cada vez mais elevado de desenvolvimento, afinando-as, diferenciando-as e as tornando
mais conscientes.
Essa relação intrínseca ocorre, pois
(...) não são as emoções que proporcionam as impressões do mundo exterior válidas para o desenvolvimento e, sobretudo, para o trabalho criador, mas bem ao contrário, as emoções que somos capazes de provocar espontaneamente em nós, sem causa ou estimulação exterior de alguma espécie. Pense-se simplesmente em tudo aquilo a que se dá o nome de alegria, atividade, vontade. Tudo isso significa sentimentos, quer dizer: movimentos de nossa alma. (Não se esqueça, a esse respeito, que os fundamentos da lógica são igualmente de natureza psíquica). A velha ideia do “domínio de si” não designa outra coisa senão a faculdade de fazer nascer em si, a todo momento, as emoções suscetíveis de dar asas à atividade vital. A atividade artística implica a faculdade de eliminar ou de transformar sentimentos nascidos em nós em consequência de impressões exteriores ou, se se quer, de sonhos despertados; eis uma verdade que resulta desnecessário salientar. (HOWARD, 1984, p. 49)
Isso significa que as emoções de ordem psíquica que a mãe sofre se transmite à
criança, pois “(...) é a força da emoção psíquica que determina o poder fecundante desta
ou, para nos exprimir com mais prudência, a qualidade de sua ação”. Logo um único
momento de emoção pode agir sobre a criança da maneira mais determinante.
(HOWARD, 1984, p. 52)
Percebe-se com isso que as influências musicais ocorrem de forma espontânea e
intuitiva, a partir do contato com a variedade de sons do cotidiano incluindo a presença
11
da música. É a partir do ouvir, dançar e cantar que os bebês interagem com o ambiente
sonoro que o rodeia.
Nos bebês, os sons emitidos pela mãe a partir de sua voz se constituem como
referência afetiva. A partir dos acalantos e cantigas de ninar que ouvem, eles tendem a
imitar e responder favorecendo o desenvolvimento afetivo e cognitivo, bem como a
criação de vínculos fortes com os adultos e a música.
Até mesmo a escuta de obras musicais é capaz de manter bebês atentos,
tranquilos ou agitados. Quer seja sob a forma de brinquedos sonoros ou proveniente do
próprio ambiente, a escuta de sons variados constitui fonte de observação e descobertas.
(RCNEI, 1998, p. 51)
Segundo o RCNEI (1998) do primeiro ao terceiro ano de vida as crianças
ampliam suas formas de se expressar musicalmente pelas conquistas vocais e corporais.
“A expressão da criança nessa fase é caracterizada pela ênfase nos aspectos intuitivo e
afetivo e pela exploração (sensório-motora) dos materiais sonoros. As crianças integram
a música às demais brincadeiras e jogos”. (RCNEI, 1998, p. 52)
Nessa fase buscam vivenciar a liberdade dos ritmos, sem atentar-se para as
entonações e tampouco as expressões melódicas. Buscam explorar os sons e suas
qualidades como altura, duração, intensidade e timbre. Demonstram interesse pelos
modos de produção e ação (sacudir e bater) dos sons.
Brito (2003) corrobora afirmando que os bebês não buscam afinação quando
emitem os sons vocais. Sua busca está centrada na exploração das qualidades desse
gesto, o que, à medida que exercita, descobre e amplia novas possibilidades para
desempenhar o exercício.
Lembrando que “(...) durante os primeiros meses de vida, o bebê explora grande
quantidade de sons vocais, preparando-se para o exercício da fala, sem limitar-se, ainda,
aos sons e fonemas presentes em sua língua natal, fato que passa a ocorrer a partir dos
oito meses”. (BRITO, 2003, p. 41)
De acordo com o RCNEI (1998) é somente quando alcançam aproximadamente
os três anos que se interessam pelos jogos com movimento. São jogos capazes de
integrar gestos, som e movimento e que contribuem, de forma lúdica, para o
desenvolvimento motor e rítmico.
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Nessa etapa também surge o interesse pelas canções. Inicialmente sem a
preocupação com afinação, esse controle ocorrerá aos poucos, mas com a memorização
de melodias,
A criança memoriza um repertório maior de canções e conta, consequentemente, com um “arquivo” de informações referentes a desenhos melódicos e rítmicos e o utiliza com frequência nas canções que inventa. Ela é uma boa improvisadora, “cantando histórias”, misturando idéias ou trechos dos materiais conhecidos, recriando, adaptando, etc. É comum que, brincando sozinha, invente longas canções. (RCNEI, 1998, p. 52)
Britto (2003) complementa expondo que nessa idade são capazes de
(...) acompanhar uma canção com movimentos regulares, seguindo o pulso, sem que isso seja um critério organizador para elas, que podem desviar-se e passar acompanhar a canção de forma não métrica, sem a consciência do que isso implica do ponto de vista musical. O que está em jogo, então, é sempre a questão da consciência. (BRITO, 2003, p. 41)
Segundo Góes (2009, p. 7) ao longo da história, esse ato de cantar transmitiu
histórias, lendas, culturas. E consolidou os vínculos afetivos de várias gerações, que se
deram as mãos, cantaram e dançaram juntas, falando a mesma linguagem.
Além de cantar, a criança demonstra o interesse, também em tocar instrumentos
musicais, buscando entender sua construção. (RCNEI, 1998, p. 53)
Em suma, nessa idade o contato com a expressão musical consiste em explorar
os sons qualitativamente (variando alturas, intensidade, etc...), exercitando gestos
necessários e adequados à realização musical, de determinado instrumento; sem haver a
preocupação com as estruturas sonoras conhecidas. Portanto, a criança cria sua própria
música, reproduzindo gestos, experimentando, criando. (BRITO, 2003, p. 42)
Observa-se ao longo de seu desenvolvimento que a criança se relaciona com a
musicalidade de forma natural. É brincando de fazer música que ela pesquisa materiais
sonoros, inventa e imita motivos melódicos e rítmicos, ouve com prazer a música de
outras culturas e, assim, descobre sentimentos. (Brito, 2003, p. 35)
Góes (2009, p. 7) afirma que “A música na educação mantém forte ligação com
o brincar. (...). Em todas as culturas as crianças brincam com a música através de jogos
e brincadeiras que são transmitidas de uma geração para outra. A criança aprende a
brincar desde as primeiras interações lúdicas entre mãe e bebê”.
A capacidade da música de integrar conhecimentos promove na vida da criança
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A integração entre os aspectos sensíveis, afetivos, estéticos e cognitivos, assim como a promoção de interação e comunicação social, conferem caráter significativo à linguagem musical. É um das formas importantes de expressão humana, o que por si só justifica sua presença no contexto da educação, de um modo geral, e na educação infantil, particularmente. (RCNEI, 1998, p. 45)
Brito (2003, p. 49) complementa afirmando que “A linguagem musical é um
excelente meio para o desenvolvimento da expressão, do equilíbrio, da auto-estima e
autoconhecimento, além de poderoso meio de integração social”.
A música também contribui para o desenvolvimento da identidade e autonomia.
“O fato de a criança, desde muito cedo, se comunicar por gestos, sons e mais tarde
representar determinado na brincadeira faz com que ela desenvolva sua imaginação”.
(GÓES, 2009, p. 4)
É considerada como “(...) prática social, pois nelas estão inseridas valores e
significados atribuídos aos indivíduos e a sociedade que a constrói e dela se ocupam”.
(GÓES, 2009, p. 3)
E “A música tem sua contribuição para o desenvolvimento cognitivo e motor
despertando a criatividade, pois a música por si só contribui para o pensamento
criativo”. (Góes, 2009, p. 3)
Em suma, a linguagem musical “(...) contribui para o desenvolvimento integral
da criança, desenvolvimento esse que ocorre simultaneamente ao processo de apreensão
de conhecimentos, em qualquer atividade didática pedagógica”. (GÓES, 2009, p.2)
Sobre essa constatação, inúmeros estudiosos tem buscado explorar essa área do
conhecimento, pois fazendo e brincando com música as crianças se desenvolvem não só
musicalmente, como também em outros aspectos.
De acordo com Góes (2009, p. 9) “(...) crianças que recebem estímulos musicais
adequados, aprendem a escrever mais facilmente, tem maior equilíbrio emocional, pois
se sabe que a música está inserida no cotidiano da criança desde o ventre materno”.
Pacheco (2013) diz que nos últimos anos, diversos estudiosos conduziram
pesquisas que, de alguma maneira, buscaram correlacionar a música e a consciência
fonológica. A motivação desses pesquisadores consiste na percepção auditiva cujo
ponto-chave está centrado nas duas áreas.
Conforme explicita, o desenvolvimento da consciência fonológica - entendida
como habilidade de análise da linguagem oral a partir de suas unidades sonoras - para os
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estudiosos da metalinguagem tem sido apontado como promotor do sucesso na
aquisição de leitura e escrita em crianças pequenas.
A estreita ligação entre essas áreas de estudo reside no fato de que
(...) como a percepção musical é construto de nosso envolvimento com a música, a consciência fonológica tão somente ocorre a partir da possibilidade perceptiva da linguagem oral. A percepção de similaridades, a segmentação e a manipulação sonora são algumas das habilidades que podem ser acessadas por meio da música e da análise da linguagem oral. (PACHECO, 2013, p. 73).
Para Góes (2009, p.2) a música inserida na prática cotidiana se torna uma
ferramenta auxiliadora no processo de aprendizagem da leitura e escrita, pois desperta o
interesse para os diversos assuntos estudados e desenvolve a coordenação motora a
partir do ritmo, que contribui para formação de conceitos, desenvolvimento da auto-
estima e na interação com o outro.
Ainda segundo a autora, “(...) quando a aprendizagem tem o envolvimento da
música ela se torna significativa para a criança (...)”, pois além do aspecto motivacional,
o trabalho com música oportuniza uma diversidade de novos conhecimentos,
contribuindo para o desenvolvimento peno da criança. (Góes, 2009, p. 2)
É inegável não considerarmos o poder agregador da linguagem musical. A
música promove a integração com outras áreas de conhecimentos. A partir dela a
criança é capaz de ampliar seu vocabulário, desenvolver sua criatividade e imaginação,
se socializar, desenvolver sua sensibilidade, evocar a memória cultural por meio de um
aprendizado prazeroso.
O aprendizado integrador por meio da música “(...) são atividades que
despertam, estimulam e desenvolvem o gosto pela atividade musical, além de atenderam
a necessidades de expressão que passam pela esfera afetiva, estética e cognitiva”.
(BRITO, 2003, p. 48)
Além do seu poder agregador, a música contribui para o aprendizado lúdico.
Segundo Luckesi (2005) o conceito de ludicidade está intimamente ligado ao vivenciar
de uma experiência plena. Isso significa dizer que
Enquanto estamos participando verdadeiramente de uma atividade lúdica, não há lugar, na nossa experiência, para qualquer outra coisa além dessa própria atividade. Não há divisão. Estamos inteiros, plenos, flexíveis, alegres, saudáveis. (LUCKESI, p. 2)
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Portanto, uma atividade lúdica é aquela que exige da criança uma entrega total,
simultaneamente, de corpo e mente. “Com isso, queremos dizer que, na vivência de uma
atividade lúdica, cada um de nós estamos plenos, inteiros nesse momento; nos
utilizamos da atenção plena (...)”. Elas próprias nos conduzem para esse estado de
consciência. (LUCKESI, 2005, p. 2).
Para o autor, esse vivenciar pleno está ligado a um fenômeno interno da criança,
que pode-se manifestar em seu exterior, é “ (...) como um estado interno do sujeito que
age e/ou vivencia situações lúdicas”. (LUCKESI, 2005, p. 3)
Diante da amplitude desse conceito Luckesi (2005) se baseia nos estudos de
Wilber para entender a relação da ludicidade com a dimensão humana. De acordo com
tais estudos o homem em sua completude apresenta quatro dimensões que são a
individual/interior, 2. individual/exterior, 3. coletiva/interior, 4. coletiva/exterior.
Sob tal aspecto “(...) o ser humano, em todas as suas experiências, realiza-se e
expressa-se em suas quatro dimensões, ainda que não possamos, ao mesmo tempo, estar
conscientes de todas elas”. (LUCKESI, 2005, p. 4)
A dimensão interior individual é a dimensão espiritual, estética, ou seja, a
dimensão do Eu, pois nela o ser humano vivencia uma experiência dentro de si. Já a
dimensão interior coletiva é a dimensão do Nós de nossa experiência , pois “ (...) é
aquela onde o ser humano vivencia sua experiência de comunidade, dos valores e
sentimentos de viver e conviver com o outro e com os outros, vivência da cultura e dos
valores comuns, que dirigem a vida”. (LUCKESI, 2005, p. 4)
A dimensão individual externa é o campo do Ele individual que “(...) expressa,
objetivamente, nossa experiência individual interna, através das manifestações do nosso
corpo, dos nossos sistemas fisiológicos (nervoso, circulatório, respiratório) e do nosso
comportamento psicossocial”. (LUCKESI, 2005, p. 5)
Enquanto a dimensão coletiva externa é o campo do Ele coletivo, no qual “(...)
se dá nas relações sistêmicas que constituem nossa vida, através das relações
interobjetivas. As múltiplas relações que agem e reagem entre si, constituindo sistemas
de elementos e variáveis que determinam dialeticamente nosso modo de ser e de viver”.
(LUCKESI, 2005, p. 5)
Portanto, Luckesi (2005, p. 5) constatou que
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(...) uma experiência integral do ser humano é aquela que o realiza em suas quatro dimensões --- que permitem a vivência da estética e da espiritualidade, assim como a experiência ética, ambas assentadas sobre a materialidade externa da constituição bio-psicológica, de um lado, e dos sistemas sociais e históricos de relações, de outro. (LUCKESI, 2005, p. 5)
Segundo o autor, isso significa que uma atividade lúdica, propriamente dita,
deve alcançar as quatro dimensões do ser humano, de modo que o indivíduo consiga
vivenciar a atividade em sua plenitude.
Sendo assim, o conceito de ludicidade defendido por Luckesi (2005, p. 6)
entende-se “(...) como um estado de consciência, onde se dá uma experiência em estado
de plenitude”, devendo ser compreendida como estado interno do sujeito, ou seja, diante
da vivência ou percepção interna deste.
A ludicidade também é interna quando o sujeito vivencia a experiência lúdica
em grupo. Claro que “(...) o grupo tem a força e a energia do grupo; ele se movimenta,
se sustenta, estimula, puxa a alegria, mas somente cada indivíduo, nesse conjunto vital e
vitalizado, poderá viver essa sensação de alegria, partilhada no grupo”; porém a
sensação de prazer é interna. (LUCKESI, 2005, p. 6)
Por vezes, o autor diz que uma atividade considerada lúdica pode não despertar a
experiência de plenitude para o sujeito que a vivencia. “(...) Objetivamente, podemos
descrevê-la como lúdica, mas não necessariamente, ela propiciará a todos, que a
vivenciarem um estado de plenitude de experiência”. (LUCKESI, 2005, p. 6)
Luckesi (2005, p.7) afirma que “(...) a atividade lúdica traz uma oportunidade de
experiência plena, importa estar atento para o “olhar” a partir do qual estamos
afirmando isso: a dimensão do eu, do interno”. E como ultrapassa os limites do ego, a
vivência lúdica propicia ao sujeito uma experiência de plenitude.
Para Góes (2009, p. 6) a música é considerada como uma atividade lúdica, pois
“Cada criança ao escutar uma melodia, interpreta-a de forma única e pessoal. É uma
leitura interna de algo que está vindo de fora. Além da forma de internalização,
inversamente, a música fornece, também subsídio para externalizar sentimentos”.
O desenvolvimento musical na vida de bebês, crianças e adolescentes pode
acontecer sob três aspectos:
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(i) na vida cotidiana, tendo em vista a exposição aos sons e às músicas das culturas que os circundam; (ii) a partir do aprendizado musical recebido em aulas específicas de música; e (iii) “tendo por base o aprimoramento de habilidade em atividades específicas da área de música (...) dentro da estética de um gênero ou cultura em particular” (ILARI, 2009 anpud PACHECO, 2013, p.73).
O envolvimento das crianças com a linguagem musical pode ocorrer em casa,
em aulas específicas de música e até mesmo na escola, que de forma prazerosa deve
promover ações que busquem integrar a música, voz e corpo.
O desenvolvimento dessas atividades deve como Howard (1984, p. 35) afirma
“(...) Desenvolver faculdades quer dizer unicamente revelá-las e não pode significar
outra coisa. (...) despertar o mais rápido e energicamente possível às possibilidades e as
faculdades adormecidas dentro de si”.
Para que a música possa se tornar um poderoso recurso educativo deve-se ter a
consciência de que
(...) educar é, portanto, despertar. Se adotarmos esse ponto de vista, compreenderemos que a ação de despertar nunca é empreendimento prematuro, sendo indispensável entregar-se sistematicamente a ela desde os primeiro anos de vida, a fim de que a criança, mais tarde, veja-a como uma tendência natural de seu ser e dela faça uma faculdade permanente. (HOWARD, 1984, p. 35)
De acordo com Almeida (2003, p. 71) a escola deve ter por finalidade promover
a socialização, desenvolver as habilidades físicas e intelectuais e,enfim formar o jovem
para “(...) viver em grupo, trocar ideias, saber ouvir e participar, descobrir coisas novas,
participar de jogos variados de forma ordenada, interiorizar regras de convívio em
grupo (...)” tudo de maneira envolvente, alegre e desafiadora.
Essa escola deve promover no aluno o prazer em frequentá-la e o desejo para
alcançar novos aprendizados, referentes à “(...) linguagem escrita, aos cálculos, as
lógicas intuitivas e concretas; e aguçar a curiosidade e formulação de conceitos”.
(ALMEIDA, 2003, p. 71)
Nesse sentido, “A linguagem musical deve estar presente no contexto educativo,
envolvendo atividades e situações desafiadoras e significativas que favoreçam a
exploração, a descoberta e a apropriação de conhecimento”. (GÓES, 2009, p. 5)
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Lembrando que “A música atrai e envolve as crianças, serve como motivação,
eleva a auto-estima, estimula diferentes áreas do cérebro, aumenta a sensibilidade, a
criatividade, à capacidade de concentração e fixação de dados. (GÓES, 2009, p. 9)
Segundo Góes (2009, p. 3) para que a instituição educativa possa formar
cidadãos mais conscientes de si e do mundo é preciso que seja desenvolvido a
racionalidade, bem como os aspectos emocionais e sensíveis. Nesse caso, “As
mudanças de paradigmas deverão sair dos discursos para a prática”.
No segundo capítulo será feito uma revisão das formas de educar levando-se em
consideração a música como ferramenta inovadora e prazerora para desenvolver
conhecimentos.
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CAPÍTULO 2 – A MÚSICA COMO PRÁTICA INOVADORA NO PROCESSO DO ENSINO
Vimos no capítulo anterior que a música influência diariamente a vida do ser
humano, desde bebê até a fase adulta. E é por meio do seu poder transformador e
libertador que a música é capaz de se integrar a outros conhecimentos contribuindo para
o desenvolvimento integral da criança.
Em seus estudos, Howard (1984, p. 90) observou que a influência musical no
desenvolvimento dos indivíduos contribui na “(...) vitalidade, na faculdade de percepção
em todos os domínios e uma intensificação da atenção frente a qualquer objeto”
corroborando com a assertiva acima ao afirmar que a “(...) atividade musical, (...),
exerce, em razão do valor genérico das faculdades que desperta, uma influência
imediata sobre a totalidade do comportamento na vida”.
Em tempos remotos, no entanto, a música na educação infantil esteve
simplesmente associada ora a dar suporte para formação de hábitos, sempre
acompanhados pelas crianças por gestos mecanizados e estereotipados, sendo apenas
um acessório das atividades; ora surgiam nas bandinhas rítmicas que por meio da
imitação e mecanização musical, abriam pouco espaço para atividades de criação
melódicas.
Inclusive Brito (2003, p. 173) ratifica dizendo que “quando, na educação
infantil, formavam-se conjuntos instrumentais com a bandinha rítmica, era comum que
os arranjos já estivessem determinados e que as crianças apenas reproduzissem o que
era indicado”.
Howard (1984, p. 85) contribui argumentando que “a aprendizagem puramente
mecânica de uma técnica será sempre um inimigo da música. É um atoleiro do qual a
maior parte das vítimas do sistema nunca encontra a saída”.
Mediante o avanço temporal, conforme afirma Britto (2003), constatamos que o
uso da música na educação infantil passou a atender propósitos diversos, segundo as
concepções pedagógicas que vigoraram (ou vigoram) em nosso país. Tais concepções
reposicionaram a música, que de acessório passou a se tornar agente principal das
atividades, sendo reconhecida como uma área de conhecimento.
20
Não obstante a isso, a música se torna uma importante ferramenta
transformadora e interdisciplinar que contribui para um ensino contextualizado com
vista ao desenvolvimento totalitário da criança, não somente para as competências
básicas, mas para as múltiplas esferas de sua vida.
É sob esse aspecto que iremos nos deter nesse capítulo. Considerando que a
música e as atividades promovidas a partir desta desencadeiam aprendizados na esfera
social, afetiva, estética e psicomotora; buscamos possibilitar ao profissional da educação
infantil uma gama de estratagemas inovadores e criativos, a partir do uso de atividades
musicais, que contribuem para a transformação das práticas de ensino tradicionais.
Segundo o RCNEI (1998, p. 48), o trabalho com a música fundamenta-se “de
modo a garantir à criança a possibilidade de vivenciar e refletir sobre questões musicais,
num exercício sensível e expressivo que também oferece condições para o
desenvolvimento de habilidades, de formulação de hipóteses e de elaboração de
conceitos”.
E ainda de acordo com o documento este trabalho deve compreender três áreas:
a produção, apreciação e reflexão. A produção com ênfase na experimentação, imitação
promovendo a interpretação, improvisação e composição; a apreciação com foco na
percepção dos sons e silêncios e nas estruturas e organizações musicais, desenvolvendo
a capacidade de observação, análise e reconhecimento; e, por fim a reflexão que se
relaciona com a organização, criação, produtos e produtores musicais.
Antes de elencarmos os tipos de atividades musicais que possibilitam o
desenvolvimento de um trabalho integrado a outras áreas de conhecimento e promovem
uma transformação nas formas de ensino é preciso levar em consideração dois fatores.
O primeiro fator diz respeito a reconhecer o conhecimento prévio das crianças,
bem como o contexto cultural e social em que estão inseridas e seus interesses e utilizá-
lo como ponto de partida.
Maffioletti (2013) destaca que trazer o conhecimento novo ao universo da
criança partindo do que esta sabe pode tornar as aprendizagens mais significativas. Isso
porque a criança pode transformar o conteúdo que deseja aprender em uma espécie de
jogo, por meio do qual pode aprender brincando.
Todo esse contato com o novo deve ser trabalhado como afirma o RCNEI (1998)
21
“(...) em situações lúdicas, fazendo parte do contexto global das atividades. Quando as crianças se encontram em um ambiente afetivo no qual o professor está atento a suas necessidades, falando, cantando e brincando com e para elas, adquirem a capacidade de atenção, tornando-se capazes de ouvir os sons do entorno”. (RCNEI, 1998, p. 67)
Britto (2003) complementa afirmando que
(...) importa, prioritariamente, a criança, o sujeito da experiência, e não a música, como muitas situações de ensino musical insistem em considerar. A educação musical não deve visar à formação de possíveis músicos do amanhã, mas sim à formação integral das crianças de hoje. (BRITO, p. 2003, p. 46)
Para isso é necessário que “(...) um trabalho pedagógico-musical deve se realizar
em contextos educativos que entendam a música como processo contínuo de
construção, que envolve perceber, sentir, experimentar, imitar, criar e refletir”. (BRITO,
2003, p. 46)
Pois deve-se “entender e respeitar como as crianças expressam musicalmente em
cada fase, para, a partir daí, fornecer os meios necessários (vivências, informações,
materiais) ao desenvolvimento de sua capacidade expressiva”. (RCNEI, 1998, p. 67)
O segundo fator relevante que não podemos desconsiderar é que quando se
busca promover atividades que envolvem a música faz-se necessário um ambiente que
promova o interesse e participação das crianças devendo ser,
Dotado de mobiliário que possa ser disposto e reorganizado em função das atividades a serem desenvolvidas. Em geral, as atividades de música requerem um espaço amplo, uma vez que estão intrinsicamente ligadas ao movimento. Para a atividade de construção de instrumentos, no entanto, será interessante contar com um espaço com mesas e cadeiras onde as crianças possam sentar-se e trabalhar com calma. (RCNEI, 1998, p. 71)
Mediante ao conhecimento desses dois fatores, concentraremos nossos estudos
em apontarmos alguns tipos de atividades musicais que possibilitam o desenvolvimento
de um trabalho interdisciplinar e contribuem para transformar o ensino tradicional em
contextualizado e significativo.
Entende-se como ensino tradicional, como afirma Gardner (1994, p. 106),
aqueles cuja educação é mimética, no qual “(...) o professor demonstra o desempenho
ou comportamento desejados e o estudante repete-os tão fielmente quanto possível. (...)
22
Em nossos termos, tais culturas valorizam desempenhos que são rotineiros, ritualizados
ou convencionais”.
Por meio de nossos estudos descobrimos que a atividade de construção de
instrumentos musicais aproxima a criança do universo musical e desperta sua
curiosidade e interesse, contribuindo para estimular a pesquisa, a imaginação, o
planejamento, a organização, a criatividade.
Enquanto constrõem o que era uma atividade de mera confecção abrange
aspectos relacionados à musica em suas dimensões prática, de apreciação e reflexão.
Esse processo envolve “(...) construir decifrando “mistérios”, minando técnicas,
aprendendo a planejar e executar, desenvolvendo e reconhecendo capacidade de criar,
reproduzir, produzir”. (BRITO, 2003, p. 69)
Esse ato como afirma Brito (2003) se torna mais rico e significativo quando
estabelece relações com a história e o papel desses instrumentos no decorrer do tempo.
Para tanto, é importante utilizar livros sobre o tema, instrumentos étnicos, regionais,
escutar gravações diversas e, se possível, entrar em contato com instrumentistas, com
artesão da comunidade.
Observa-se que essa atividade integra não somente os conhecimentos musicais,
como também a história e, ainda segundo a autora, também é capaz de dialogar com a
reciclagem de materiais que nos remete a conteúdos ligados à educação ambiental, às
relações entre natureza e sociedade, eixo presente no RCNEI. E,
Da mesma forma, refletindo sobre a transformação de materiais, sobre a evolução dos instrumentos musicais no tempo, sobre a coexistência de possibilidades diversas (instrumentos típicos de cada povo, cada lugar, cada época) que visam a um mesmo fim, ou seja, fazer música, refletimos também sobre a pluralidade cultural existente, desenvolvendo nas crianças atitudes de respeito e reconhecimento em relação à diversidade. (BRITTO, 2003, p. 71)
Para Brito (2003) as crianças refazem essa construção, à sua maneira, na busca
de meios para o exercício da expressão musical, ao mesmo tempo em que ultrapassam
esse caminho por meio da invenção de novas possibilidades. Enquanto agem nessa
atividade são capazes de experimentar, imaginar e testar hipóteses. Eles passam a
entender que materiais simples podem ser transformados em objetos sonoros.
Segundo os RCNEI (1998, p. 69) “a atividade de construção de instrumentos
contribui para o entendimento de questões elementares referentes à produção do som e
sua qualidades, estimula a pesquisa, a imaginação e a capacidade criativa”.
23
Outra atividade de ensino descoberta por sua prática inovadora, no qual Brito
(2003) destaca, é a utilização das canções durante a aula. Esse uso não é feito de forma
mecânica e monótona para organização dos sentidos ao longo da rotina escolar, mas
como gênero musical que funde a música e poesia. Segundo a autora esse ato promove o
vínculo afetivo e prazeroso que se estabelece de maneira forte e significativa.
Para a mesma, a voz merece lugar de destaque, pois é o primeiro instrumento do
ser humano.
Instrumento natural que é o meio de expressão e de comunicação desde o nascimento. O bebê chora pra comunicar desconforto, fome ou necessidade de ser levado ao colo, de ser acarinhado, ninado. Está atento para ouvir os sons vocais ao redor e responder a ele, à voz da mãe, do pai, ou de qualquer adulto responsável por seus cuidados. (BRITO, 2003, p. 87)
Brito (2003) expõe que quando a criança canta imita o que ouve e assim
desenvolve sua expressão musical e quando esse momento é feito coletivamente o que
requer a escuta de si e do outro, contribui para desenvolver o aspecto da personalidade,
como atenção, concentração, cooperação e espírito de coletividade.
O RCNEI (1998, p. 59) complementa dizendo que quando as crianças cantam
são capazes de imitar o que ouvem e, com isso, desenvolvem as condições necessárias
para elaborar um repertório de informações que lhes permitirá, em seguida, criar e se
comunicar por meio dessa linguagem. “O canto é capaz de integrar melodia, ritmo e –
frequentemente – harmonia, sendo excelente meio para o desenvolvimento da audição”.
Para que se torne enriquecedor Brito (2003) explica que a escolha do repertório
de canções deve contemplar a cultura popular, canções do cancioneiro infantil
tradicional, da música popular brasileira, da música regional, de outros povos e,
especialmente, a música da cultura infantil que são ricas em produtos musicais que
podemos e devemos trazer para o ambiente de trabalho das creches e pré-escolas.
Encontram-se inseridos nessas atividades musicais que envolvem as canções os
jogos e brinquedos musicais citados pelo RCNEI (1998) de grande valia para a fase da
educação infantil. Eles são perpassados por tradição oral e pertencem à cultura de nossa
sociedade, pois se constituem como fonte de vivências de nosso povo e
desenvolvimento expressivo musical genuíno.
O documento expõe que esses jogos e brincadeiras exprimem a infância de nossa
cultura. Envolvem desde o gesto, ao movimento, o canto, a dança e o faz-de-conta.
Esses jogos e brinquedos musicais incluem os acalantos (cantigas de ninar), as
24
parlendas (os brincos, as mnemônicas e as parlendas propriamente ditas), as rondas
(canções de roda), adivinhas, os contos, os romances; etc.
Brito (2003) conceitua as parlendas e os brincos como brincadeiras rítmico-
musicas com que os adultos entretêm e animam os bebês e as crianças. Enquanto as
parlendas são as brincadeiras rítmicas com rima e sem música; e, os brincos são,
geralmente, cantados (com poucos sons), envolvendo também o movimento corporal
(cavalinho, balanço, etc.). Junto com os acalantos, essas costumam ser as primeiras
canções que intuitivamente cantamos para os bebês e crianças menores.
Para o RCNEI (1998, p. 58) na educação infantil deve estar presente e se
constituir como conteúdos de trabalho “(...) as canções de ninar tradicionais, os
brinquedos cantados e rítmicos, as rodas e cirandas, os jogos com movimentos, as
brincadeiras com palmas e gestos sonoros corporais, assim como outras produções do
acervo cultural infantil”.
Lembrando que esse momento se torna único desde que seja realizado em um
“(...) ambiente de orientação e estímulo ao canto, a escuta e a interpretação”. (BRITO,
2003, p. 93)
E não se deve associar o cantar ao excesso de gestos marcados pelo professor,
pois fazem com que as crianças parem de cantar para realizar os movimentos,
contrapondo-se a tendência natural de integrar a expressão musical e corporal. (RCNEI,
1998, p. 59)
Novamente essa atividade amplia o universo musical e, principalmente, cultural
da criança, “(...) estabelecendo, desde a primeira infância, uma consciência efetiva com
relação aos valores próprios da nossa formação e identidade cultural”. (BRITO, 2003, p.
94)
Brito (2003) expõe que o ato de cantar deve extrapolar a reprodução de canções
infantis. Esse processo deve estimular desde a exploração dos sons vocais até mesmo a
invenção e improviso de canções.
Dentre as atividades que exploram as diversas possibilidades sonoras com a voz
estão o “imitar voz de animais, ruídos, e sons das vogais e das consoantes (com a
preocupação de enfatizar a formação labial), entoar movimentos sonoros (do grave para
o agudo, e vice-versa), pequenos desenhos melódicos, etc”. (BRITO, 2003, p. 89)
25
“Utilizando apenas sons vocais, é possível sonorizar histórias, contos de fadas,
livros com imagens de paisagem sonoras diversas e desenhos de animais”. (BRITO,
2003, p. 89)
Já nas atividades musicais de invenção e improviso, Brito (2003) expõe que as
crianças, a partir dos três anos ou quatro anos, costumam improvisar partindo de sua
imaginação, inventam letra e melodia constituindo-se em um exercício de criação e
assim cantam e contam histórias, casos, etc..
A autora destaca que quando essas atividades envolvem canções com nomes se
constituem em um exercício criativo, pois valoriza cada integrante do grupo e
estabelece um contato afetivo e efetivo entre todos, que se envolvem com o outro.
Ainda segundo a mesma, ao ajudar na criação da música, o grupo não se esquece
da canção que se torna um bem coletivo. Essa prática vai além das possibilidades
musicais, pois proporciona ao grupo à criação, elaboração de hipóteses, estimulando
dentre tantos o raciocínio, a imaginação e criatividade.
De acordo com o RCNEI (1998) outra dica para trabalhar as improvisações de
forma envolvente é utilizando as rimas. Estimulando as crianças a criar pequenas
canções fazendo rimas com nomes de frutas, cores, etc. e também assuntos e
acontecimentos vivenciados no dia-a-dia também podem ser temas para novas canções.
Novamente, destaco que essas atividades devem ocorrer em um ambiente
motivador e descontraído, livre de tensões exageradas, que podem comprometer a
qualidade da voz infantil.
Outra atividade de ensino criativa descoberta é a integração do momento de
contação de história com a música. Conforme afirma Brito (2003) as crianças
(...) ouvindo e, depois, criando histórias, elas estimulam sua capacidade inventiva, desenvolvem o contato e a vivência com a linguagem oral e ampliam recursos que incluem o vocabulário, as entonações expressivas, as articulações, enfim, a musicalidade própria da fala. (BRITTO, 2003, p. 161)
Sabe-se que “o faz-de-conta deve estar sempre presente, e fazer música é, de
uma maneira ou de outra, ouvir, inventar e contar história”. (BRITO, 2003, p. 161)
Essa relação entre o ato da história com a música, como afirma Brito (2003)
caracteriza-se por tornar as histórias que contamos às crianças mais expressivas e
sonoras, ainda que seja usando apenas a voz. Ouvindo histórias contadas
26
expressivamente, as crianças também desenvolvem essa atitude e o modo de se
expressar.
Segundo a autora é preciso que antes de serem narradas as crianças, as histórias
sejam analisadas pelo profissional da educação infantil, para poder valorizar e destacar
os momentos mais importantes.
Narrando a história com voz clara e limpa, valorizando cada parte por meio de mudanças de entonação: usando a voz em seu registro mais grave ou mais agudo, dependendo da situação, com maior ou menos intensidade, variando a velocidade da narrativa ou das palavras etc. Esses aspectos enriquecem a interpretação e chamam a atenção dos bebês e crianças para a diversidade sonora e expressiva, assim como para a riqueza de possibilidades de exploração da voz! (BRITO, 2003, p. 162)
Outra atividade interessante descoberta é a sonorização das histórias fazendo uso
de objetos e materiais sonoros, a partir da sonoplastia que “(...) é a técnica de
sonorização de uma história, peça teatral ou filme. A sonoplastia tenta aproximar-se dos
sons que pretende ilustrar com a maior precisão possível, usando, para tanto, materiais
variados”. (BRITO, 2003, p. 164)
Para o alcance desse efeito “(...) as crianças precisam organizar de forma
expressiva o material sonoro, trabalhando a percepção auditiva, a discriminação a
classificação de sons (altura, duração, intensidade e timbre)”. (RCNEI, 1998, p. 62)
Para contemplar o intuito dessa atividade Britto (2003) diz que pode-se utilizar
os instrumentos musicais para imitar o efeito sonoro real na história, tendo uma função
sonoplástica e, nesse sentido, a história pode servir como roteiro para o
desenvolvimento de um trabalho musical; ou pode-se utilizar uma história ou situação
para realizar uma improvisação ou composição musical.
De acordo com os RCNEI (1998) os livros de histórias que contém somente
imagens são interessantes e adequados para alcançar a finalidade da proposta dessa
atividade. Neste caso, após a definição dos materiais, as imagens do livro podem
funcionar como partitura musical e nortear a interpretação do trabalho.
Outra atividade descoberta que resgata a percepção e intuição e trabalha na
esfera estética e afetiva da criança é as reconhecidas como desenho do som. Não se trata
da leitura e a escrita musical convencional, mas busca-se o registro de um som (ou
grupo de sons) “(...) em situações significativas de interação e apropriação dos sons e de
construção de sentidos”. (BRITO, 2003, p. 178)
27
Brito (2003) explica que a criança de três anos quando ouve um impulso sonoro
curto realiza um movimento com seu corpo transpondo o som percebido para outra
linguagem, tornando concreto, de certa maneira, aquilo que ouviu.
Isso porque o gesto e o movimento corporal apresentam-se imbricados no
trabalho com a música. “A realização musical implica tanto em gesto como em
movimento, porque o som é, também, gesto e movimento vibratório, e o corpo traduz
em movimento os diferentes sons que percebe”. (RCNEI, 1998, p. 61)
De acordo Brito (2003, p. 178), de forma intuitiva e espontânea a criança quando
ouve diferentes tipos de sons, ela o traduz com seu corpo, o que é considerado pela
autora como uma primeira forma de registro. “Sem papel ou lápis, podemos registrar
corporalmente os sons que ouvimos, e, nesse caso, não só as mãos, mas todo o corpo
reage, expressando o que ‘deu vontade’”.
Para a mesma, esses gestos sonoros podem ser transformados em desenhos por
meio da atividade de desenhar o som. Esse processo envolve o registro intuitivo e
espontaneamente dos sons percebidos.
Conforme afirma é trazer para o gesto gráfico aquilo que a percepção auditiva
identificou. “Partindo do registro gráfico intuitivo, chega-se à criação de códigos de
notação que serão lidos para serem decodificados pelo grupo, num processo sequencial
que respeita níveis de percepção, cognição e consciência”. (BRITO, 2003, p. 178)
O desenho do som, segundo a mesma, é impressão subjetiva da criança. Está
relacionado com a sensação e percepção do gesto sonoro. Logo, a observação e a análise
desses registros revelam o modo como às crianças percebem e se relacionam com os
eventos sonoros.
Outra atividade transformadora de grande contribuição para o desenvolvimento
da percepção auditiva diz respeito à apreciação musical ou as chamadas atividades de
escuta musical.
Para Brito (2003) a ação de escutar envolve perceber e entender os sons por
meio do sentido da audição, detalhando e tomando consciência do fato sonoro. Mais do
que ser um processo puramente fisiológico, o ato de ouvir implica detalhar, tomar
consciência do fato sonoro.
A autora ao enumerar a importância do ato da escutar diz que estimula a
concentração e disponibilidade, contribui para o processo de formação de seres
28
humanos sensíveis e reflexivos, capazes de perceber, sentir, relacionar, pensar,
comunicar-se.
O entendimento de sua relevância implica em reconhecer que atividades desses
tipos devem ser diferenciar de simplesmente deixar uma música soando ao fundo
enquanto, por exemplo, cuidamos dos bebês ou enquanto as crianças realizam outras
atividades. “É importante valorizar a escuta musical, evitando deixar que a música, sem
critério algum, tome conta do espaço durante tempo todo”. (BRITO, 2003, p. 189)
O RCNEI (1998, p. 64) ratifica a afirmativa expondo que “A música, porém, não
deve funcionar como pano de fundo permanente para o desenvolvimento de outras
atividades, impedindo que o silêncio seja valorizado”.
Dessa forma o trabalho de apreciação musical exige que as obras musicais
escolhidas despertem na criança o desejo de ouvir e de se integrar, pois para elas o ouvir
envolve o movimentar-se. (RCNEI, 1998, p. 64)
Brito (2003, p. 189) complementa ao dizer que “(...) a escuta musical também
deve integrar-se a outras formas de expressão, como a dança, o movimento, o desenho,
a representação. É preciso, no entanto, não deixar de lado a questão específica da
escuta”.
Esse cuidado com a apreciação musical é relatado pelo RCNEI (1998, p. 60) ao
explicar que atividades deste tipo perdem o sentido e seu uso se torna incoerente quando
busca-se a simples discriminação auditiva dos sons em situações descontextualizadas e
em “exercícios com instruções, como, por exemplo, transforma-se em passarinhos ao
ouvir sons agudos e em elefante em resposta aos sons graves ilustram o uso inadequado
e sem sentido de conteúdos musicais”.
Ainda de acordo com o documento faz-se necessário à organização de um
repertório que, durante algum tempo, seja apresentado às crianças, a fim de que
estabeleçam relações com o que escutam. Esse repertório deve contar com obras de
música erudita, da música popular, do cancioneiro infantil, da música regional, etc.
E também devem envolver as músicas de outros países buscando com isso
promover o entendimento da expressão musical em sua totalidade: “(...) como
linguagem presente em todas as culturas, que traz consigo a marca de cada criador, cada
povo, cada época”. Essa compreensão prepara as crianças para compreender a música
como forma de expressão individual e coletiva e como maneira de interpretar o mundo.
(RCNEI, 1998, p. 65)
29
Essa atividade amplia-se da esfera musical, pois como afirma o RCNEI (1998)
pode para promover o enriquecimento e ampliação do conhecimento cultural a partir da
produção musical. O contato com uma obra musical pode gerar desde questionamentos
musicais, como instrumentos tocados, a informações relativas ao contexto histórico de
sua criação, a época, seu compositor, intérpretes, etc.
Ainda segundo o documento pode se aproveitar essas atividades para
oportunizado aos alunos a escuta de música sem textos, ou seja, as músicas unicamente
instrumentais ou as vocais reconhecidas sem texto definido. A partir destas “As crianças
podem perceber, sentir e ouvir, deixando-se guiar pela sensibilidade, pela imaginação e
pela sensação que a música lhes sugere e comunica”. (RCNEI, 1998, p. 65)
E, por fim, em nossas descobertas encontramos a atividade criativa de elaborar
um arranjo, que pode tanto desenvolver-se com base numa composição já existente
como também fazer arte da própria composição. Isso “(...) implica organizar o modo de
execução de uma obra musical”. (BRITO, 2003, p. 173)
Porém faz-se necessário que “(...) os educadores e educadoras se sintam capazes
de criar arranjos simples e adequados às possibilidades de realização musical das
crianças, pois só assim poderão inserir seus alunos nesse importante e gostoso processo
de criação”. (BRITO, 2003, p. 173)
Diante dos apontamentos elucidados, Maffioletti (2013) faz uma citação que
sintetiza os achados desnudados por meio desse capítulo
“O poder agregador das atividades musicais propicia às crianças um modo peculiar de se relacionarem; cantando, dançando e recitando versos, elas aprendem uma linguagem comum capaz de criar e manter seus laços de amizade. Compartilhando o mesmo tempo, por meio da música, as crianças aprendem o que é preciso saber para viverem em grupo”. (MAFFIOLETTI, 2013, p. 123)
Para Howard (1984, p. 85) o ensino da música bem apreendido pela criança é o
melhor meio de revelar suas emoções originais, autênticas, de um lado, e como
transformar, de outro lado, as emoções que nos assaltam do exterior.
Nada melhor do que a escola para proporcionar a criança esse aprendizado
interativo que conecta a música nas situações de ensino do cotidiano.
Segundo Maffioletti (2013, p. 123) a instituição escolar se torna um espaço
indispensável para ampliar as experiências infantis e contribuir para o desenvolvimento
30
integral da criança. “Nesse contexto, as práticas que priorizam as trocas sociais
emergem como uma necessidade vital de fortalecimento de laços afetivos e experiências
positivas na formação de suas identidades”.
Todavia, embora se tenha avançado, por vezes, ora por falta de profissionais
habilitados, ora ainda pela presença do ensino mimético, temos nos deparado no
cotidiano das instituições escolares de educação infantil com o uso da música apenas em
situações mecanizadas e estereotipadas na rotina (como outrora exposto), estando muito
aquém da sua utilização como ferramenta interdisciplinar e contextualizada no ensino.
Essa utilização superficial da música no contexto do ensino escolar dificulta a
criança de estabelecer elos internos de suas experiências e das novas aprendizagens não
alcançando, segundo afirma Maffioletti (2013) a aprendizagem para a compreensão.
O autor explica que na fase da educação infantil a criança se relaciona com um
conhecimento novo por meio da percepção ou pelas sensações cinestésicas. Isso porque
o estar próximo, tocar e sentir de maneira objetiva é a condição necessária para obter
compreensão sobre algum objeto ou acontecimento.
E, segundo o mesmo, o tipo de compreensão a ser alcançado pela criança
depende da relação que esta estabelece ao longo de suas experiências e complementa
dizendo que
“As ações concretas de tocar, ouvir, apalpar precisam ser interiorizadas, a fim de que imitem internamente o que foi objetivamente vivenciado pelo corpo. Uma vez interiorizadas, podemos então falar de processos de abstração, os quais representam as ações práticas e suas significações no plano de pensamento”. (MAFFIOLETTI, 2013, p. 138)
De acordo com o RCNEI (1998) isso significa que a integração música e ensino
devem ser trabalhados em situações expressiva e significativas para as crianças, tendo-
se o cuidado de colocar a criança no centro da atividade.
Nesse ponto atua o educador como responsável por conduzir o processo de
aprendizagem da criança, por meio de diferentes situações de ensino (como as citadas
nesse capítulo) que visem à integração da música nas outras áreas de conhecimento e o
seu aprendizado em totalidade, possibilitando a mesma alcançar a aprendizagem
significativa.
31
Os conteúdos “(...) pouco valem se não estiverem integradas a um contexto em
que o valor da música como forma de comunicação e representação do mundo se faça
presente”. (RCNEI, 1998, p. 77)
No último capítulo buscaremos compreender as limitações e dificuldades
encontradas pelos profissionais da educação infantil de integrar, por meio da
interdisciplinaridade, as atividades musicais na rotina escolar e possibilitar um ensino
integrador e inovador tanto da música, quanto das áreas “básicas” de conhecimento.
32
CAPÍTULO 3 – OS DESAFIOS ENCONTRADOS PELO EDUCADOR PARA O ENSINO MUSICAL
No capítulo anterior pontuamos algumas atividades capazes de integrar a música
a outras áreas de conhecimento de forma interdisciplinar e, ao mesmo tempo, prazerosa
tendo no educador o responsável por viabilizá-las.
Contudo, como outrora destacado, embora as concepções pedagógicas
contemporâneas tenham reposicionado a música como uma área de conhecimento, é
possível observar na prática a sua utilização ora como suporte para as atividades, ora
sendo trabalhada de forma mecânica e rotineira quando em atividades exclusivamente
musicais sendo trabalhada.
Sendo assim, buscaremos nesse capítulo entender quais são as limitações
encontradas pelos profissionais da educação infantil para inserir a música, como área de
conhecimento, na rotina escolar.
A escola é o espaço que transforma as crianças e jovens, preparando-os para se
tornar cidadãos completos e aptos a viver em sociedade. Dentre suas funções está a
possibilidade de promover a socialização por meio das relações interpessoais e de
proporcionar o contato com o conhecimento formal.
Gardner (1994) definiu a escola como uma instituição capaz de reunir um grupo
de pessoas jovens, geralmente pertencendo ao mesmo grupo social, com frequência
regular na companhia de um indivíduo capacitado mais velho (professor) com o
propósito de adquirir uma ou mais habilidades valorizadas pela comunidade.
Veja que a escola tem a função social de garantir a aprendizagem de
conhecimentos e habilidades, sendo o professor o canal condutor dos saberes na vida
das crianças e dos jovens.
Então, sendo a escola promotora de conhecimento é preciso que propicie ao
aluno sua formação em totalidade, no qual contemple o domínio da leitura e escrita, do
sistema numérico, das ciências, das artes e, inclusive da linguagem musical.
Logo, é dever da escola proporcionar uma formação integral para os alunos. E,
portanto, como profissionais da educação infantil não podemos desconsiderar os seis
eixos de trabalho segundo o qual o RCNEI (1998, p. 9) orientou para o trabalho nas
33
creches e pré-escolas “(...) Movimento, Música, Artes Visuais, Linguagem Oral e
Escrita, Natureza e Sociedade e Matemática”.
A escola é o espaço que pode aproximar as crianças do conhecimento musical de
forma prazerosa e integrada as outras áreas de conhecimento. Porém, muitas são as
dificuldades encontradas pelos educadores para viabilizar o trabalho interdisciplinar
com a música.
Nesse sentido, faremos uma revisão histórica da visão da escola antiga e
moderna e do tipo de educação de cada época, para compreendermos as causas dos
entraves encontrados pelos professores em prol de um ensino contextualizado colocando
a música integrada às outras áreas de conhecimento, alcançando ao que Gardner (1994)
denomina como aprendizagem para a compreensão.
As primeiras escolas, segundo Gardner (1994, p. 113), apresentavam um regime
rígido, no qual os alunos deveriam demonstrar obediência e submissão. O ensino
basicamente se baseava no treinamento e na memorização. “Eles copiavam letras,
números ou forma significacionais aparentadas retidas vezes até que tivessem adquirido
domínio sobre elas”.
Dentre os propósitos dessa escola estavam o domínio dos textos sagrados, pois
se pensava que neles estavam contidos os conhecimentos necessários para sobreviver na
comunidade e, por isso, formavam a base do currículo.
Nessa época, a escola era designada para “(...) facilitar a memorização de textos
importantes, principalmente religiosos e, como nestes escritos, em outra linguagem do
que a falada pela comunidade. Seu significado era muito pouco transparente para o
aluno iniciante”. (GARDNER, 1994, p. 113)
Além do saber da língua escrita, Gardner (1994) afirma que eram ensinados os
rudimentos do sistema aritmético e as notações muito empregadas na cultura, sendo
necessários para o comércio e para que outras atividades econômicas pudessem ser
executadas na sociedade e com outras comunidades.
Esses conhecimentos exigiam atenção e concentração para alcançar seu domínio,
que não eram simples de serem aprendidos somente pela observação. Desse modo, a
escola promovia o “Treinamento regular, memorização de rotina e repetição são
produzidos”. (GARDNER, 1994, p. 114)
Segundo Gardner (1994) a escola antiga era vista como o principal canal para a
transmissão dos valores morais e políticos. Os professores tinham o dever de modelar os
34
comportamentos tidos como adequados e assegurar que os alunos dominassem as regras
e regulamentos importantes dessa época. Os saberes prévios dos alunos eram
desconsiderados.
As escolas eram vistas como lugares para o treinamento de uma elite, não meramente em habilidades cognitivas requeridas, mas também em comportamentos prescritos e atitudes esperadas daqueles que assumiriam posições de liderança. O treinamento em práticas religiosas e a preparação específica para assumir uma posição na igreja dominante eram outros dos propósitos comuns da escolarização. Em um canal paralelo, uma avaliação do aspecto econômico e a preparação para assumir uma posição na igreja, também fazia parte do objetivo das escolas. (GARDNER, 1994, p. 115)
O que de fato havia na visão da escola antiga era o pensamento da educação
“mimética” no qual o professor é o único detentor do conhecimento devendo ser
seguido fielmente o que fora ensinado, de tal modo que “(...) qualquer desvio do modelo
é imediatamente questionado e rejeitado. Em nossos termos, tais culturas valorizam
desempenhos que são rotineiros, ritualizados ou convencionais”. (GARDNER, 1994, p.
106)
Nesse modelo de educação enfatizavam-se as habilidades básicas em detrimento
da criatividade, estando o conhecimento centrado apenas na “(...) necessidade de
dominar certas capacidade e instruções, tais como ler, escrever e contar e um corpo de
conhecimento factual sobre história, geografia e ciência”. (GARDNER, 1994, p. 107)
De acordo com Gardner (1994, p. 113) essa “(...) experiência escolar é marcada
por uma extrema dissociação dos eventos importantes ou produtos palpáveis da vida da
comunidade”; isto, porque muitos dos conhecimentos transmitidos não faziam parte do
cotidiano dos alunos e, portanto se tornavam aprendizados descartáveis, usados somente
para o progresso escolar.
Com o passar do tempo, a sociedade sofreu inúmeras transformações estruturais
até surgirem às escolas da idade moderna que de acordo com Gardner (1994) emergiram
a partir de um contexto de crescente acúmulo de conhecimento, proliferação de
disciplinas e o aumento da importância de ter uma população informada.
As escolas modernas “(...) tornaram-se o local lógico para a transmissão de saber
rapidamente crescente, bem como para o desenvolvimento de habilidades que
35
permitirão descobertas posteriores a serem feitas e compreensões mais profundas a
surgir”. (GARDNER, 1994, p. 116)
Para Gardner (1994) diante desse contexto de transformação, as escolas
modernas já não podiam se assemelhar mais as primitivas. As mensagens religiosas,
morais e políticas que além de dominar também sustentavam a escolarização primitiva,
logo passaram a diminuir gradativamente em importância.
Para atender as demandas sociais, consequentemente as turmas passaram a se
tornar maiores e, com isso, mais difíceis de controlar. Os professores passaram a ficar
“(...) sobrecarregadas com turmas grandes, regras e regulamentos onerosos, demandas
desordenadas por responsabilidade, e por estudantes que têm muitos problemas
pessoais”, ao invés de trabalhar com turmas pequenas. (GARDNER, 1994, p. 131)
Ainda de acordo com Gardner (1994) do mesmo modo que deveriam dar
assistência às crianças com dificuldades, os professores deveriam acompanhar os alunos
talentosos para que pudessem ser admitidos na universidade. O professor passou a ter o
dever de promover aos estudantes um aprendizado cooperativo, embora,
contraditoriamente, os alunos devessem ser avaliados individualmente a partir de testes.
O autor afirma que com o aumento das disciplinas e das cargas impostas à
escola, as formas de avaliação precisaram se tornar mais eficientes com os chamados
testes. Eles se tornaram o método avaliativo mais utilizado para determinar aquele aluno
capaz de receber as recompensas distribuídas pela sociedade.
Os testes tornaram-se de profunda importância para a escola da sociedade
moderna, pois por meio deles,
Os estudantes aprendem sobre princípios científicos ou terras distantes, sentados em suas cadeiras, lendo um livro ou escutando uma palestra; então, ao final de semana, do mês, do ano ou de suas carreiras escolares, os mesmos estudantes entram em uma sala e, sem ajuda de textos ou notas, respondem questões sobre a matéria que se supões que tenham dominado. (GARDNER, 1994, p. 118)
Conforme afirma Gardner (1994, p. 118) baseado nos modelos econômicos
vigentes, os testes assumiram uma enorme significância como padrão avaliativo do
progresso do aluno, mesmo sendo “empregada em uma situação em que ela própria é
descontextualizada”.
36
Certas vantagens econômicas e meritocráticas estão associadas à adoção de instrumentos padronizados e com cálculos regulares de ”horas-aula”, “horas-tarefa” e índices de promoção e evasão. Os tipos de instrumentos crescentemente favorecidos, muitas vezes, mostram-se distantes dos tipos de compreensão mais profunda que muitos educadores gostariam que os estudantes adquirissem. (GARDNER, 1994, p. 124)
Ainda de acordo com o autor, as transformações socioeconômicas trouxeram
além das mudanças na forma de avaliação o aumento de problemas burocráticos.
As demandas escolares e os regulamentos aumentaram e, com isso, passou-se a
esperar do professor uma postura “(...) de modo profissional, mas, ainda assim, todos
seus movimentos são escrutinados por vários órgãos e controle”; sendo cobrado quanto
à forma de transmitir o conhecimento aos estudantes até mesmo em turmas pequenas.
(GARDNER, 1994, p. 124)
Estando mal remunerado e o ensino escolar, primário e secundário, perdendo seu
prestígio, os profissionais se viram tentados “(...) por posições mais prestigiadas, ou
mais bem pagas, privando as escolas de um contingente que foi de valor enorme no
passado”. (GARDNER, 1994, p. 124)
Segundo Gardner (1994) em consequência passou a se exigir dos profissionais
apenas modestas habilidades intelectuais e pedagógicas, contrapondo-se a ideia que
havia em algumas sociedades, no qual os professores eram selecionados com grande
cuidado, sendo bem treinados por professores experientes até que lhes fossem outorgada
considerável autonomia e assim encorajados a permanecer em sala de aula.
A ideia de sucesso educacional dessa escola, ainda segundo o autor, não diferia
da escola primitiva. O êxito dos estudantes era alcançado quando fossem capazes de dar
as respostas ditas pelo professor como corretas impostas por meio de desempenhos
rotineiros e ritualizados, estabelecendo uma relação de acordo de respostas certas, sem a
intenção de formar indivíduos reflexivos aptos a alcançar compreensões genuínas e
elaborar suas próprias hipóteses.
Para o autor,
(...) naqueles casos onde a escolarização é pouco inspirada, onde os professores o são apenas no título, ou onde os graduados perseguem vocações não-relacionadas com o currículo da escola, pode-se questionar se os conhecimentos obtidos provar-se-ão de valor para os estudantes ou para a sociedade que os confiou a uma instituição chamada escola. (GARDNER, 1994, p. 121)
37
A partir da caracterização das escolas primitivas e modernas é possível
encontrar, em alguns aspectos, a realidade escolar dessas refletida atualmente em nossas
escolas.
Em nossos dias, conforme afirma Gardner (1994, p. 220) vemos nossas escolas
“(...) recebendo verbas mínimas e sendo solicitadas a preencher papéis (...)” e sendo
bombardeada por diferentes programas e abordagens educacionais que impõe
determinados valores e conteúdos que devem ser ministrados sem conhecer a realidade
local.
E ainda temos assistido a “(...) desintegração acelerada da vida familiar e a perda
de muitos suportes sociais na comunidade (...). Ao mesmo tempo, a comunidade vê a
escola como a instituição que mais provavelmente será capaz de compensar as suas
próprias lacunas (...)”. (GARDNER, 1994, p. 220)
Em oposição a essa visão da comunidade, tem surgido o aumento do
desinteresse das crianças pela escola, muitas das vezes motivado pela facilidade
encontrada por eles para obter acesso às informações, fazendo com que “Atividades que
podiam, alguma vez, ter engajado os jovens – ler em salas de aulas ou ouvir palestras de
professores sobre temas remotos – parecem desesperançosamente tépidas e
desmotivadoras para a maioria deles”. (GARDNER, 1994, p. 176).
E, de fato somos, diariamente, bombardeados pelas informações que aparecem
em diversos veículos informativos como na mídia, outdoors, rádio, televisão,
computadores. O que derruba a visão da escola como único local capaz de fornecer
conhecimento. Segundo Gardner (1994),
Por um lado, os jovens vivem em uma época de excitação sem paralelos, onde mesmo os menos privilegiados estão expostos, diariamente, a uma mídia e tecnologia atraentes, abrangendo desde videogames até a exploração do espaço, desde o transporte em alta velocidade até meios de comunicação diretos e imediatos. (GARDNER, 1994, p. 176)
Para o autor vê-se “(...) Qualquer que seja o significado que a escola pudesse,
alguma vez, ter tido para a maioria dos jovens em nossa sociedade, ela já não o tem para
a maioria deles”. (GARDNER, 1994, p. 175)
Diante dessas limitações citadas é preciso repensar na visão da escola e no tipo
de educação no qual queremos formar nossos alunos. Com o avanço tecnológico nossas
crianças puderam obter acesso a uma infinita gama de conhecimentos provenientes de
38
diversas fontes. E esse novo paradigma que surgia passou a exigir transformações
estruturais para lidar com essa nova realidade.
Em contrapartida, ao invés de se transformar, nossas escolas tem repetido o
mesmo modelo educacional de outrora. E, embora as novas concepções educacionais
tenham surgido para embasar a prática escolar, o que se observa no cotidiano é a
conservação de metodologias arraigadas no treinamento e repetições mecânicas e
rotineiras.
Prática essa que precisa ser repensada e transformada para que nossas crianças
se sintam motivadas e tenham prazer em aprender na escola.
É sobre esse aspecto que Gardner (1994, p.107) defende a chamada abordagem
transformadora, no qual o professor atua como mediador do conhecimento, devendo
encorajar os estudantes a elaborar suas próprias hipóteses e avançar na sua própria
compreensão. Desse modo, o “(...) professor serve como um técnico ou facilitador,
tentando evocar certas qualidades ou compreensões nos estudantes”.
Os adeptos do modelo transformador enfatizam a criatividade e
Aqueles mais simpáticos à posição de criatividade veem a educação como uma oportunidade para indivíduos inventarem conhecimento por si próprio e de modo pessoalmente significativo, para transformar o que foi encontrado no passado e, talvez, eventualmente, contribuir com novas ideias e conceitos para a sabedoria comum. Os que apoiam a posição de criatividade tendem a subestimar as habilidades básicas, na crença de que são desnecessárias, e que seriam atingidas de qualquer modo, ou que elas deveriam ser objeto de atenção apenas depois de uma ambientação da exploração criativa tenha sido estabelecida. (GARDNER, 1994, p. 107)
Embora haja muitas críticas sobre o modelo de educação progressista, Gardner
(1994) afirma que nela está contida alguns dos requisitos para a educação
transformadora.
Para Gardner (1994, p. 168) tais pensadores acreditavam que a criança era o
centro do processo educativo, ao invés das atividades. Como o foco era na criança, eles
buscavam desenvolver o potencial de cada criança com as atividades. E, por isso “(...)
apelaram por mais atenção para cada criança, bem com mais atividades grupais e
discussões cooperativas”.
De acordo com o autor, os progressistas enfatizavam as atividades práticas e
manuais no qual o aluno tinha liberdade de se organizar de forma democrática,
respeitando sempre o seu ritmo e, por isso “O agrupamento por graus, o rastreamento
39
dos estudantes e a divisão do dia, de acordo com matérias específicas, foram
desencorajadas”. (GARDNER, 1994, p. 168)
Como visa promover a plena compreensão das disciplinas formais, as crianças
são “(...) levadas a fazer observações cuidadosas, elaborar boas questões e executar
experiências relevantes; somente depois de seus interesses haviam brotado é que a
instrução disciplinar mais formal era introduzida”. (GARDNER, 1994, p. 168)
De acordo com o Gardner (1994) as escolas baseadas nesse pensamento
apresentavam organização administrativa que variava em sua forma, pois
contrapunham-se a rigidez curricular e dos horários-aula, ao sistema de recompensas,
punições e ao uso dos testes.
Bem próximo ao que Gardner (1994) denomina da educação para compreensão,
a educação progressista tem o foco nas atividades significativas, baseadas no método de
ensino por projetos, que executados em contextos adequados partiam das interações
cooperativas para que os alunos pudessem ser capaz de alcançar a plena compreensão.
O autor defende que esse modelo de educação oferece contribuições para a
construção de um ambiente educacional transformador.
Esta forma não apenas foi moldada em um pequeno espaço pluralista e democrático, mas a ênfase que coloca em atividades e projetos fertilmente estruturados, na iniciativa e “aposta” estudantil, em formas de aprendizagem construtivas e no envolvimento significativo com a escola e a comunidade mais ampla, todas apontam na direção de uma educação que busca e, talvez, produza compreensão. (Gardner, 1994, p. 173)
E, não podemos desconsiderar, segundo Gardner (1994), de que as crianças têm
diferentes potenciais intelectuais e, por isso, a forma como aprendem se diferem. Nesse
sentido o professor deve buscar incorporar em suas práticas os projetos significativos
que envolvam várias formas de atividades (grupal e individual), para promover a
aprendizagem.
Segundo o autor qualquer forma de educação que seja praticada de maneira
efetiva, é capaz de promover a educação para compreensão e formar indivíduos capazes
“(...) de aprender para fazer usos novos, diferentes e estratégias das fontes de
informação ao seu redor”. (GARDNER, 1994, p. 120)
É, por isso que “(...) se desejamos refazer a educação, é crucial criar ambientes
nos quais a formação de laços entre as formas de conhecimento é o princípio
40
governante” e que busquem a “Introdução de projetos significativos na sala de aula,
formas de interação cooperativa e pastas de processos, que documentem o progresso do
estudante (...)”. (GARDNER, 1994, p. 217)
De modo que o professor seja o responsável pelo “(...) cultivo sério de uma
atitude reflexiva” (GARDNER, 1994, p. 184) nos alunos e busque “(...) encoraja (...),
mas também reforça a inclinação para observar, tentar experiência em pequena escala,
registrar os resultados destas experiências e relacioná-las com a questão que as motivou
incialmente” (GARDNER, 1994, p. 178) nunca se esquecendo de reconhecer e respeitar
as concepções que trazidas pelos alunos.
Para Gardner (1994) alcançar a reforma educacional depende de quatro nós
diferentes “(...) avaliação, currículo educação dos professores e suporte comunitário”.
(GARDNER, 1994, p. 219)
Isso porque o autor afirma que uma avaliação só tem utilidade quando o
currículo for de qualidade. E os professores “(...) tornam-se excelentes líderes
indispensáveis do processo educacional”, quando eles acreditam no que estão ensinando
e sabem como avaliar o progresso de seu aluno. Sendo “Assim, a instrução e
desenvolvimento de professores torna-se intrínseca a qualquer reforma educacional”.
(GARDNER, 1994, p. 219)
E o envolvimento comunitário é necessário para que, segundo Gardner (1994, p.
220) os educadores possam compartilhar sua visão com a comunidade, e esta de igual
modo venha compartilhar seus desejos e sua visão com as práticas de sala de aula e
procedimentos de avaliação alternativos.
Após esse breve histórico em que pontuamos a visão da escola e o tipo de
educação alcançada ao longo dos anos e compreendermos que as falhas educacionais
atuais somente serão elucidadas se a escola de fato alcançar a reforma educacional,
buscaremos em nossos apontamentos entender como o professor pode em sua prática
assumir uma postura transformadora quanto à utilização da linguagem musical na
prática cotidiana.
Conforme já exposto, por anos o uso da música foi utilizado apenas para atingir
“(...) objetivos considerados adequados à instrução e à formação infantis”. (BRITO,
2003, p. 51)
Segundo o RCNEI (1998)
41
Tem sido, em muitos casos, suporte para atender a vários propósitos, como a formação de hábitos, atitudes e comportamentos: lavar as mãos antes do lanche, escovar os dentes, respeitar o farol, etc.; a realização de comemorações relativas ao calendário de eventos d ano letivo simbolizados pelo dia da árvore, dia do soldado, dia das mães, etc; a memorização de conteúdos relativos a números, letras do alfabeto, cores, etc., traduzidos em canções. Essas canções costumam ser acompanhadas por gestos corporais, imitados pelas crianças de forma mecânica e estereotipada. (RCNEI, 1998, p. 47)
E, embora a música seja um dos seis eixos didático do RCNEI, Britto (2003) diz
que embora a educação infantil tenha redimensionado conceitos, abordagens e modos de
atuação em decorrência da influência de teorias pedagógicas, o uso da linguagem
musical dentro do cotidiano escolar está andando de forma lenta rumo a transformação
conceitual.
E, por isso a autora afirma que “É comum detectar a existência de certa
defasagem entro trabalho realizado na área de música e aquela efetivação nas demais
áreas do conhecimento”. (BRITO, 2003, p. 51)
Essa defasagem existente reflete problemas “(...) que somam à ausência de
profissionais especializados a pouca (ou nenhuma) formação musical dos educadores
responsáveis pela educação infantil (...)”. (BRITO, 2003, p. 52)
Observa-se a que a falta de preparo dos profissionais configuram um dos
problemas para a utilização da linguagem musical como área de conhecimento. Essa
condição reflete o descuido da formação estética dos profissionais dessa área e a
necessidade de repensar na concepção de educação enraizada e ultrapassada.
Para muitos profissionais da educação infantil, a utilização da linguagem
musical se resumia a “ensinar a reproduzir e interpretar músicas, desconsiderando a
possibilidade de experimentar, improvisar, inventar como ferramenta pedagógica de
fundamental importância no processo de construção do conhecimento musical”
(BRITO, 2003, p. 52) e, portanto, era entendida “(...) como se fosse um produto pronto,
que se aprende a reproduzir, e não uma linguagem cujo conhecimento se constrói”.
(RCNEI, 1998, p. 47)
Esse erro comum cometido pelos professores impede a criança de obter sua
experiência musical que de acordo com Brito (2003, p. 38) “ocorre na interseção entre
42
indivíduo e música, na interação entre vivências, memórias, preferências, idiossincrasias
e padrões psicodinâmico resultantes das combinações sonoras”.
E a autora completa sua assertiva dizendo que,
(...) se a música tiver que estar na escola, que não seja subvertida em notas e sufocada em cronogramas; que não se corrompa à facilidade das teorias, claves e colcheias. Se a música tiver que estar na escola, que seja pelo seu potencial de converter experiências com sons em oportunidades de articulação expressiva e simbólica. (BRITTO, 2003, p. 38)
Para que a música possa estar presente no cotidiano da escola de maneira
transformadora é importante que sua utilização esteja explicito no currículo escolar, pois
“A matriz explicita conteúdos e habilidade esperados do aluno ao final de cada
segmento escolar, e que vão sendo construídos gradativamente”. (FRANÇA, 2013, p.
19)
De igual modo, “é imprescindível que as decisões pedagógicas se alinhem com o
percurso do desenvolvimento musical, otimizando-o com intervenções e ensino
adequadas e sensíveis”. (FRANÇA, 2013, p. 19)
Portanto ainda de acordo com o autor o educador que anseia por se tornar
criativo deve planejar suas aulas tendo em mente um rol de diferentes tipos de
atividades que contemple a área musical e outras áreas de conhecimento para contribuir
ao aluno com aulas mais motivadoras e interessantes. (MADALOZZO et. Al., 2013, p.
183)
Para se alcançar tal objetivo é preciso que esteja planejando suas aulas com
vistas a contemplar as necessidades locais. “Dessa forma, ainda que os novos métodos
tragam infinitas boas ideias, a estruturação de um planejamento, esse papel criativo, é
atribuição exclusiva do professor”. (MADALOZZO et. Al. ILARI, 2013, p. 187)
Além desta conduta, esse professor tem que constantemente demonstrar a “(...)
preocupação em engajar as crianças em atividades que capturem o seu interesse, para
então introduzir os conhecimentos novos” (MAFFIOLETTI, 2013, p. 131) e portanto,
ele deve considerar a criança como ponto de partida para o processo educativo, pois
entende-se que
43
Conhecer a criança e o seu modo de interpretar o mundo é essencial ao ato de ensinar. Nessa perspectiva, a tarefa de ensinar é, antes de tudo, compreender e acolher a criança e o seu contexto, envolvendo-se nele como condição para entender o seu significado. Na acepção mais simples e ao mesmo tempo mais profunda, compreender a criança é entender suas busca e intenções, para organizar as ações de ensinar considerando o contexto e as relações da criança com o saber musical. (MAFFIOLETTI, p. 131, ano???)
Devido a essa preocupação as atividades com jogos surgem como “(...) tentativa
de trabalhar, variada e renovada ao infinito”. (HOWARD, 1984, p. 61)
Durante essas atividades o professor precisa sempre ter o cuidado com sua
postura diante da turma, pois ele é a referência para as crianças e o responsável pelo seu
desenvolvimento.
Nas atividades de cantar deve evitar “(...) pedir que as crianças sempre cantem
“mais alto”, tirando-lhe a chance de perceber a diferença de cantar e gritar”, sempre
tendo o cuidado de adequar sua voz com as possibilidades vocais das crianças. (BRITO,
2003, p. 92)
Então deve ser cuidado em “(...) formar bons hábitos, tais como não gritar, não
forçar a voz, inteirar-se da região (ressitura) mais adequada para que as crianças cantem,
respirar tranquilamente, manter-se relaxada e com boa postura”. (BRITO, 2003, p. 89)
Conforme expõe o RCNEI (1998, p. 68) é desejável que o professor “(...) fale e
cante com os cuidados necessários à boa emissão do som, evitando gritar e colaborando
para desenvolver nas crianças atitudes semelhantes”.
De igual modo não se deve esquecer-se de propor atividades de tradições
culturais que envolvem jogos, brinquedos ou canções, pois isso “(...) proporcionar às
nossas crianças a possibilidade de viver sua própria cultura e modo de ser”. (BRITO,
2003, p. 111)
E esse professor inovador deve buscar sempre reavaliar sua prática, segundo
França (2013, p. 33) ““(...) Devemos manter constante vigilância, perguntando-nos
sempre: “o que há de desenvolvimento revelado nos movimentos, nos desenhos, nos
adjetivos expressos pelas crianças?”; “o que elas estão apresentando espontaneamente e
também de maneira assistida?”; “o que há de aprendizado brotando das experiências?””.
Isso torna possível conhecer o percurso de desenvolvimento dos alunos, pois
“Ouvindo o que as crianças têm a dizer, podemos preparar intervenções de ensino mais
direcionadas e efetivas”, o que torna possível individualizar as intervenções e atuar
44
diretamente nas dificuldades e facilidade de cada um. (FRANÇA et. Al. ILARI, 2013, p.
32)
E, conforme já exposto é importante que a família esteja integrada na escola,
pois “(...) além da participação ativa em sala de aula, eles são os responsáveis por
fazerem do ambiente familiar a extensão do ambiente escolar”. (MADALOZZO et. Al.,
ILARI, p. 186)
Dessa forma o processo de avaliação do professor criativo deve ser aquele que
dista dos antigos testes tradicionais, pois o transformador é aquele que “(...) considera a
qualidade do envolvimento nas atividades propostas, a postura para o fazer, a disposição
para pesquisar, para escutar atentamente, para improvisar, compor, construir
instrumentos”. (BRITO, 2003, p. 198)
De acordo com Brito (2003, p. 198) o processo avaliativo deve “(...) ser remetida
aos conteúdos propostos durante o período de trabalho, com o cuidado de comparar o
aluno com ele mesmo, ou seja, com seu processo de realização, considerando seu ponto
de partida e de chegada”.
Então devem estar presentes “(...) no contexto das atividades diárias normais e
aprendizagem (...)” devendo se tornar regular ao longo do processo educativo da
criança. (GARDNER, 1994, p. 178)
E, assim como afirma Brito (2003, p. 198) “Obviamente, todo processo de
trabalho bem orientado resulta em crescimento, aquisição de competências e
habilidades, ampliação do repertório, do universo cultural, etc.”.
45
CONCLUSÃO
Ao longo do estudo vimos que a música influencia a vida das crianças dos zero
aos 6 anos de idade nos mais diversos momentos. Muitas vezes se inicia dentro do
ventre materno e se estende até a fase adulta. Essa influencia que começa na vida
familiar desdobra-se até a escola.
Por meio desse estudo constatamos que a música exerce uma rica ação na vida
de nossas crianças, sendo capaz de desenvolvê-las na área cognitiva, psicomotora,
social, afetiva e emocional. Para alguns autores, quando estimuladas desde cedo, as
crianças que escutam música e interagem com a mesma apresentam mais facilidade para
desenvolver a escrita e leitura.
Mediante ao seu poder agregador e contextualizado, a linguagem musical se
torna uma ferramenta poderosa capaz de se relacionar com outras áreas de ensino e
possibilitar ao aluno o aprendizado de novos conteúdos de forma dinâmica e interativa. .
Contudo apesar de suas benesses, vivenciamos na prática educativa de nossas
creches e pré-escolas a utilização da música em momentos que mecanizam a criança e
não dão a liberdade para fluir sua imaginação e criatividade.
Divergindo aos inúmeros estudos e pesquisas da área que passam a destacar a
música como área de conhecimento, temos observado o seu uso de forma rotineira e
mecanizada, simplesmente, para a formação de hábitos e nas bandinhas rítmicas.
Esse uso limitado da música, por vezes, tem ocorrido em virtude da falta de
conhecimento do educador para lidar com essa área de conhecimento e saber utilizá-la
como ferramenta em sala de aula.
E, com isso, enfatizam-se somente as práticas tradicionais de ensino em que se
levam em conta somente o aprendizado das habilidades básicas em detrimento dos
conhecimentos artísticos e estéticos, desenvolvendo a criança pela metade.
Urge em nosso tempo a necessidade de uma formação educativa que favoreça o
desenvolvimento integral da criança para que se tornem cidadãos reflexivos e críticos
capazes de viver em sociedade.
E, para tal compreendemos a necessidade de um trabalho pedagógico que se abra
para a transformação de metodologias tradicionais. Diante dos novos contextos e
paradigmas sociais a escola precisa rever seus métodos de ensino, como forma de atrair
46
a nova clientela de aluno que tem adentrado a escola. Clientela essa que, diariamente, é
bombardeada com novas informações pela TV e computadores.
É preciso que haja uma adoção de métodos transformadores capazes de
promover a integração das diversas áreas de conhecimento a partir de atividades que
promovam o prazer nos alunos para o aprendizado. Isso faz-se necessário para
conquistar essa nova clientela e fazer com que se sintam estimuladas para aprender na
escola.
E, a música contribui para romper com essas práticas tradicionais devido ao seu
poder agregador, contextualizado e, ao mesmo tempo, lúdico. Enquanto brincam de
fazer e escutar música, a criança interage não só musicalmente, mais também com
outras áreas de conhecimento, sendo capaz de aprender novos conteúdos de forma
lúdica.
Essa atividade lúdica promove na criança uma experiência plena de estado de
espírito. Isso significa que a criança se empenha de corpo e mente, obtendo uma
sensação de prazer única e pessoal.
Enfim, apesar das inúmeras concepções pedagógicas que tem influenciado a
educação infantil ainda vemos a utilização da área musical somente para a formação de
hábitos ou, de forma mecânica, em bandinhas rítmicas; ora por falta de especialização
dos profissionais da educação infantil nessa área de conhecimento, ora por uma crença
de que o ensino da música se resume em dar algo pronto.
Portanto, esse estudo abre uma lacuna para as instituições de ensino formadoras
de professores. Como possibilidade de ampliar esse estudo, busca-se compreender a
necessidade de revisão do currículo das instituições de ensino formadoras de
professores, quer seja em nível médio ou superior, para que busquem integrar em suas
matrizes curriculares disciplinas cuja temática seja o uso da música na rotina escolar da
educação infantil.
47
BIBLIOGRAFIA
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11º ed., 2003.
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REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO INFANTIL.
Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:
Mec, 1998, 3º vol.
49
ÍNDICE ONOMÁSTICO
Almeida, Paulo Nunes de, 18
Brito, Teca Alencar de, 8, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 20, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30,
41, 42, 43, 44, 45,
França, Cecília Cavalieri, 43, 44, 45
Gardner, Howard, 22, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 45
Góes, Raquel Santos, 10, 13, 14, 15, 17, 18
Howard, Walter, 11, 18, 20, 30, 44
Luckesi, Cipriano, 15, 16, 17, 19,
Madalozzo, Vivian Agnolo & Tiago, 43, 45
Maffioletti, Leda de Albuquerque, 21, 30, 31, 43, 44
Pacheco, Caroline Brendel, 14, 15, 18
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil, 10, 12, 13, 14, 21, 22, 23, 24,
25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 42, 44
Yin, Robert K. Bookman , 9