UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO MUSEU DE ARQUEOLOGIA E ETNOLOGIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUEOLOGIA
MEMÓRIA DO FUTURO: REGISTROS ARQUEOLÓGICOS EM TEMPO REAL
Davi Chermann
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arqueologia do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Arqueologia.
Orientadora: Profa. Dra. Margarida Davina Andreatta
Linha de Pesquisa: História da Arqueologia e Perspectivas Teóricas
Contemporâneas
São Paulo Fevereiro, 2008
CHERMANN, Davi Memória do futuro: registros arqueológicos em tempo real /
Davi Chermann. - - São Paulo: USP, MAE, 2008. vii, 125f. : il. ; 31cm. Orientador: Margarida Davina Andreatta Tese (doutorado) – Universidade de São Paulo, Museu de
Arqueologia e Etnologia, Programa de Pós-Graduação em Arqueologia, 2008.
1. Arqueologia 2. Banco de Informações 3. Linguagem Digital
Dedico este trabalho a minha mãe e ao meu pai.
AGRADECIMENTOS
Especialmente à Dra. Margarida e a equipe do Núcleo de Arqueologia – a Vivian (revisão do texto e referências) e a Nair;
Área de Pesquisa e Pós-Graduação – a Ana Zahira, a Silmara e o Mário;
Núcleo de Computação – o Serginho, o Roberto e o José Urbano;
Aos Profs. – Miranda, Marisa, Helena e Paulo
A Secretaria Acadêmica do MAE – a Vanusa e a Regina
Ao meu grande amigo Benny...
À minha esposa e filhass(s)!!!!
CHERMANN, Davi. Memória do Futuro: registros arqueológicos em tempo real. 2008. 150f. Tese (Doutorado em Arqueologia) - Museu de Arqueologia e Etnologia, Universidade de São Paulo, 2008.
RESUMO
Memória do Futuro trata do registro arqueológico sob a perspectiva digital, com o objetivo de caracterizar algumas possibilidades que essa interação oferece, principalmente quanto a uma possível mudança de paradigma na pesquisa arqueológica. Na perspectiva digital, a Arqueologia além de estudar o passado humano, teria condições de estudar também a relação entre espaço e tempo humano, o que permitiria a análise do presente e do futuro. A perspectiva digital é potencialmente um recurso metodológico importante para a ampliação do campo de atuação da Arqueologia, permitindo a inclusão de novos objetos de estudo, constituídos no ambiente virtual. Um Banco de Informações Arqueológicas - em tempo real sobre o Centro Histórico da Cidade de São Paulo, utilizando como modelo o Pátio do Colégio, é apresentado como uma simulação sobre o registro arqueológico no ambiente digital. A principal consideração final desse trabalho é a constatação de que o registro arqueológico – em tempo real é um recurso metodológico importante para a ampliação do campo de pesquisa da Arqueologia à medida que permite construir a memória do futuro.
Palavras-chave: Registros arqueológicos digitais. Banco de dados. Redes Interativas. Banco de Informações. Tempo Real.
ABSTRACT
Memory of the Future presents the archaeological record from the digital perspective. The aim is characterize some possibilities that interaction provides, especially on a possible change of archaeological´s paradigm research. The digital view added to Archaeology the possibility to study the relationship between space and human time, which allow the analysis of the present and the future. The digital is potentially an important methodological resource for the expansion of the Archaeology`s field, allowing the inclusion of new objects of study, made in the virtual environment. A Databank of Archaeological Information - in real time, on the Historic Center of the City of Sao Paulo, using as a model the Patio of the College, is presented as a simulation on the archaeological record in the digital environment. The main consideration of this work is that the archaeological record - in real time is a methodological resource important for the expansion of the Archaeological research, allowing the memory of the future. Key words: Digital Archaeological Record. Database. Interactive Networks. Infobase. Real Time.
S U M ÁR I O
Introdução ............................................................................................................ 8
P AR T E I
TEMPO PASSADO 1.1 Feromônios ..................................................................................... 13
1.2 Processos de Formação dos Registros Arqueológicos ................... 35
P AR T E I I
PASSADO PRESENTE
2.1 Ambiente Natural ............................................................................ 50
2.1.1 Registro Arqueológico .................................................................... 50
2.1.2 Registro Genético ........................................................................... 51
2.1.3 Registro da Terra............................................................................. 54
2.2 Ambiente Cultural ........................................................................... 56
2.3 Ambiente Virtual ............................................................................. 63
P AR T E I I I
FUTURO PRESENTE
3.1 Civilização da Informação ............................................................... 69
P AR T E I V
PRESENTE FUTURO
4.1 Instrumento para Estudo-Verificação ............................................. 74
4.1.1 Histórico ......................................................................................... 75
4.1.2 Projeto – Arqueologia Histórica ...................................................... 84
4.1.3 Banco de Dados - Arquivo Eletrônico ............................................. 91
4.1.4 Banco de Dados Coletivos – CHSP
4.1.5 Modelo Digital ................................................................................. 101
P AR T E V
MEMÓRIA DO FUTURO
5.1 Projeto: Banco de Informações Coletivas Compartilhadas ............. 103
5.1.1 Simulações ..................................................................................... 105
5.1.2 Sítio Virtual ..................................................................................... 106
Considerações finais ........................................................................................... 108
Referências ......................................................................................................... 109
9
INTRODUÇÃO
Memória do Futuro trata do registro arqueológico sob a perspectiva digital, com o
objetivo de caracterizar algumas possibilidades que essa interação oferece,
principalmente quanto a uma possível mudança de paradigma na pesquisa
arqueológica. Na perspectiva digital, a Arqueologia além de estudar o passado humano,
teria condições de estudar também a relação entre espaço e tempo humano, o que
permitiria a análise do presente e do futuro.
Esse novo paradigma é possível a partir do momento que a perspectiva digital
apresenta um novo ambiente a ser estudado pela Arqueologia, o virtual - com novas
questões que demandam soluções distintas das praticadas anteriormente. O que não
significa o simples descarte das teorias já consagradas mas, ao contrário disso, o
acréscimo de novas teorias e a possibilidade que todas possam, no ambiente virtual,
coexistir e permitir contribuições de diferentes pesquisadores.
Nessa transição, entre as teorias arqueológicas, não haveria apenas releituras
dos referencias existentes e nem processos cumulativos de informação, pois, de acordo
com Kuhn, a transição implicaria na:
reconstrução da área de estudos a partir de novos princípios, reconstrução que altera algumas das generalizações teóricas mais elementares do paradigma, bem como muito de seus métodos e aplicações (KUHN, 1970. p.116).
Dessa forma, pode-se dizer que a perspectiva digital é potencialmente um
recurso metodológico importante para a ampliação do campo de atuação da
Arqueologia, permitindo a inclusão de novos objetos de estudo, constituídos no
ambiente virtual.
A perspectiva digital interfere na própria concepção do objeto de estudo da
Arqueologia, à medida que modifica a natureza e o manuseio de seus objetos originais.
Para ilustrar essa afirmação, basta citar o registro arqueológico da terra (LEROI-
GOURHAN, 1987), que permite uma única leitura no texto original, enquanto que o em
papel permite várias leituras no original e ainda viabiliza a sua reprodução em diversas
cópias e versões.
10
Por outro lado, para além da terra e do papel, o digital permite leituras em
tempos distintos e, o que é o mais importante, a construção coletiva do objeto
analisado. Nesse sentido, a reprodução do digital não é apenas a informação em si,
mas o conjunto de ações que engendraram o processo de construção daquele objeto.
Outro aspecto a ser destacado é que cada leitura digital é única, pois singulariza o
material analisado face à história do leitor e é sempre a última versão daquele
momento, pois a próxima já terá modificações a partir de outras inclusões de
informações.
Para demonstrar o impacto do digital na concepção do objeto de estudo da
Arqueologia, o texto proposto foi organizado a partir de cinco partes, que contribuem
individualmente com informações sobre o tema, mas que também suas interações
fundamentam os pressupostos dessa mudança no campo de atuação e de estudo da
Arqueologia.
Considerando que a ênfase desse trabalho é o potencial do digital na construção
e reconstrução de objetos para a análise, assim como que a dimensão do texto escrito
limita as possibilidades desse potencial., am alguma situações o texto escrito tenta
reproduzir o ambiente virtual.
Em Tempo Passado, a Arqueologia é apresentada como uma ciência do
presente e do futuro, a partir da linguagem digital que viabiliza a construção de um
acervo cultural que ultrapassa a barreira do tempo e do espaço.
Os ambientes natural e cultural da Arqueologia são tratados em Passado
Presente, enfatizando a importância do registro arqueológico para a constituição da
Arqueologia como ciência, assim como as suas transformações.
Em Futuro Presente, discute-se o ambiente virtual e suas possibilidades de
inovação para o registro arqueológico.
Os bancos de dados coletivos são discutidos em Presente Futuro, viabilizando a
discussão de um Banco de Informações Arqueológicas e a concepção sobre tempo
real.
Memória do Futuro apresenta uma simulação de um Banco de Informações
Arqueológicas - em tempo real sobre o Centro Histórico da Cidade de São Paulo,
utilizando como modelo o Pátio do Colégio.
11
A principal consideração final desse trabalho é a constatação de que o registro
arqueológico – em tempo real é um recurso metodológico importante para a ampliação
do campo de pesquisa da Arqueologia à medida que permite construir a memória do
futuro.
12
P A R T E I
TEMPO PASSADO
13
i BuddyZoo
Qual será o futuro do nosso passado? (MOBERG, 1986)
1.1. Feromônios
Como os hormônios, os feromônios são mensageiros químicos, mas em vez
de transportarem informação dentro de um indivíduo, transportam as informações
entre indivíduos da mesma espécie. Este é o conceito proposto aqui, partilhar as
informações e “marcar” as trilhas.
A construção de um Banco de Informações de Construção Coletiva com
inserção, edição, análise e comparação das representações (informações) dos
registros arqueológicos, em tempo real – segundo um grande número de critérios
constantemente reavaliados e contextualizados, possibilita inúmeras novas
possibilidades de pesquisa e interpretações arqueológicas.
� Bloch: A Ciência dos homens no tempo
� Le Goff: Memória coletiva
� Bordieu: O passado tende a perpetuar-se no futuro
� Wittgenstein: O Mundo é tudo quanto acontece
� Lévy: Inteligência coletiva
� Freitas: A Heterotopologia
� Rosnay: Memória implícita
� Casalegno: Memória cotidiana
� Baudrillard: Memória social
� Morin: Memória poética
14
Estaremos discutindo, não os registros arqueológicos e suas interpretações
mas sim, as informações referentes a esses registros e interpretações.
As possibilidades de acesso e armazenagem das informações, surgidas com
as novas tecnologias interativas – das telecomunicações e da informática,
revolucionaram a análise arqueológica tanto quanto a datação por radiocarbono.
Podemos, agora, estabelecer correlações em grandes quantidades de informações e
dados, num montante que, no passado, somente arqueólogos excepcionais
poderiam tentar analisar (TRIGGER, 2004. p.17).
Optamos, aqui, inicialmente por uma compilação dos conceitos utilizados
nesta construção: trechos de livros, teses, entrevistas e textos de arqueólogos,
historiadores, filósofos e pesquisadores. São textos cujas idéias defendidas darão
apoio à nossa interpretação, com a autoridade de estudiosos com peso indiscutível
em suas respectivas áreas de atuação.
March Bloch e o jogo entre a importância do presente para a compreensão do
passado e vice-versa. A História, como a ciência dos homens no tempo. Le Goff
conceituando a memória coletiva e as revoluções documental e tecnológica dos
bancos de dados. A lenta mudança das mentalidades e a lentidão da história.
Do sociólogo Pierre Bordieu selecionamos o conceito do habitus na produção
da história e as práticas no passado, presente e futuro. Wittgenstein precursor da
teoria da informação e do mundo de tudo quanto acontece. Pierre Lévy e a
inteligência coletiva e o espaço do saber mobilizados em tempo real.
Marcos Freitas e a produção, transmissão e o acúmulo de novas informações.
A analogia com o método arqueológico de Foucault e a análise comparativa na
simultaneidade em que (as informações) se apresentam.
O pesquisador Federico Casalegno com seu projeto Memória Viva e o livro
Memória Cotidiana e as entrevistas de: Jöel de Rosnay e as memórias implícita e
explícita; as redes marcadas e os caminhos da memória. Baudrillard e a memória no
presente, passado e futuro e a circulação viva das informações; e Edgar Morin
explorando a poesia e um futuro possível comprometido com o passado e com o
presente.
15
� BLOCH:
Marc Bloch, em Apologia da História1 (2001), iniciou a noção de “história como
problema”. Para ele, a história não seria mais entendida como uma ciência do
passado – em suas palavras “passado não é objeto de ciência”. Ao contrário, seria
no jogo entre a importância do presente para a compreensão do passado e vice-
versa que a partida era, de fato, jogada. Nessa formulação pretensamente simples
estava exposto o “método regressivo”: temas do presente condicionam e delimitam o
retorno possível ao passado – tudo parte do presente e retorna ao presente, em
suas interligações com o passado 2. Como a história não era a ciência do passado,
também não poderia ser definida como uma “ciência do homem”. A história seria a
“ciência dos homens”, ou melhor “a ciência dos homens no tempo” 3. Nenhum objeto
tem movimento na sociedade humana exceto pela significação que os homens lhe
atribuem, e são as questões que condicionam os objetos e não o oposto.
Uma espécie de fundador da “antropologia histórica”, Bloch selecionava
eventos marcados pelo seu contexto. No fenômeno selecionado pretendia ter
encontrado “representações coletivas”4, conceito retirado da sociologia de Durkheim,
que mostrava o manejo complexo entre modelos individuais e sociais. Como dizia o
sociólogo: “A lógica da sociedade não é igual à soma dos indivíduos” 5.
Passado e presente (...) O que é, com efeito, o presente? No infinito da duração, um ponto minúsculo e que foge incessantemente; um instante que mal nasce morre. Nas palavras banais e profundas de Goethe: não existe presente, apenas um devir. ...Uma pretensa ciência do presente se metamorfosearia a cada momento de seu ser, em ciência do passado. ... Já sei: será denunciada como sofismo. Na linguagem corrente, “presente” quer dizer passado recente. (BLOCH, 2001)
1 A Segunda Guerra Mundial freou o desenvolvimento deste debate e Marc Bloch morreu, deixando uma obra incompleta sobre a Teoria da História, que futuramente foi editada com o titulo de Apologia da história, ou ofício de historiador (2001). 2 NA: Temas do presente podem condicionar o retorno ao passado – e os temas do futuro também poderão, condicionar o presente? Poderíamos criar interligações com o futuro? 3 NA: Também a Arqueologia atuaria não mais apenas como estudo científico do passado humano – seu ambiente natural e cultural, mas sim o estudo científico do espaço-tempo humano, presente, passado e futuro. 4 As representações coletivas são, segundo Durkheim, (...) o produto de uma imensa cooperação que se estende não apenas no espaço mas no tempo também; para fazê-las, uma multiplicidade de espíritos associaram-se, misturaram e combinaram suas idéias e sentimentos; longas séries de gerações acumularam nelas sua experiência e sabedoria. Uma intelectualidade muito particular, infinitamente mais rica e mais complexa do que a do indivíduo. ... O modelo social é, então, uma complexa modelação ou ainda, uma construção permanente, onde os colaboradores são não só os indivíduos das mais variadas origens, mas também os indivíduos dos mais variados períodos históricos imagináveis, a ponto de virmos a ser hoje, o resultado social da construção feita por nossos ancestrais. 5 Aqui podemos, por analogia, pensar nos bancos de dados de construção coletiva – em construção permanente, e, na memória implícita e explicita de Rosnay (apud CASALEGNO, 2006. p.42).
16
� LE GOFF:
Jacques Le Goff, em História e Memória6, afirma que a memória coletiva e a
sua forma científica, a história, aplicam-se a dois tipos de materiais: os documentos
– escolha do historiador, e os monumentos – herança do passado.
De fato, o que sobrevive não é o conjunto daquilo que existiu no passado, mas uma escolha efetuada quer pelas forças que operam no desenvolvimento temporal do mundo e da humanidade, quer pelos que se dedicam à ciência do passado e do tempo que passa, os historiadores.
Cita, por um lado, Bloch, na Apologie pour L’histoire ou metier d”historien
[1941-1942]:
Seria uma grande ilusão imaginar que a cada problema histórico corresponde um tipo único de documento, especializado para esse uso... Que historiador das religiões se contentaria em consultar os tratados de teologia ou as recolhas de hinos? Ele sabe bem que sobre as crenças e as sensibilidades mortas, as imagens pintadas ou esculpidas nas paredes dos santuários, a disposição e o mobiliário das tumbas, têm pelo menos tanto para lhe dizer quanto muitos escritos (BLOCH apud LE GOFF, 1992).
E por outro lado, Saraman, que desenvolve a afirmação citada:
Não há história sem documentos, com esta precisão: Há que tomar a palavra ‘documento’ no sentido mais amplo, documento escrito, ilustrado, transmitido pelo som, a imagem, ou de qualquer outra maneira.
Le Goff entende que este alargamento do conteúdo do termo documento foi
apenas uma etapa para a explosão que se produz a partir dos anos 60 e que levou a
uma verdadeira revolução documental. A partir de então, para ele, o interesse da
memória coletiva e da história já não é apenas sobre os grandes homens, os
grandes acontecimentos mas sim por todos os homens, suscitando uma nova
hierarquia mais ou menos implícita dos documentos:
O registro paroquial, em que são assinalados, por paróquia, os nascimentos, os matrimônios e as mortes, marca a entrada na história das “massas dormentes” e inaugura a era da documentação de massa (LE GOFF, 1992).
6 LE GOFF, Jacques. História e Memória; tradução Bernardo Leitão. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1992.
17
Para Le Goff, esta dilatação da memória histórica teria, certamente, ficado no
estado de intenção, se quase ao mesmo tempo não se tivesse produzido uma
revolução tecnológica, a do computador. Da confluência das duas revoluções nasce
a “história quantitativa”, que põe novamente em causa a noção de documento e o
seu tratamento. Desejada pelos historiadores da economia, obrigados a tomar como
documentos de base séries de cifras ou de dados numéricos, introduzida depois na
Arqueologia e na história da cultura, a história quantitativa altera o estatuto do
documento.
O documento, o dado já não existem por si próprios, ma em relação com a série que os precede e os segue, é o seu valor relativo que se torna objetivo e não sua relação com uma inapreensível substância real” (FURET, 1974, p. 47-48).
Para ele, a intervenção do computador comporta uma nova periodização na
memória histórica: produz-se, a partir de então, um corte fundamental no momento
em que se podem constituir séries:
A revolução documental tende também a promover uma nova unidade de informação: em lugar do fato que conduz ao acontecimento e a uma história linear, a uma memória descontínua. (...) A memória coletiva valoriza-se, institui-se em patrimônio cultural. O novo documento é armazenado e manejado nos bancos de dados. Ele exige uma nova erudição que balbucia ainda e que deve responder simultaneamente às exigências do computador e à crítica da sua sempre crescente influência sobre a memória coletiva (LE GOFF, 1992).
Le Goff, conclui dizendo que nenhum documento é inócuo e sim o resultado
de uma montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, da sociedade
que o produziram, mas também das épocas sucessivas durante as quais continuou a
viver, talvez esquecido, durante as quais continuou a ser manipulado, ainda que pelo
silêncio.
18
O documento é monumento. Resulta do esforço das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si próprias. No limite, não existe um documento-verdade. Todo o
documento é mentira. Cabe ao historiador não fazer o papel de ingênuo. ...qualquer documento é, ao mesmo tempo, verdadeiro – incluindo, e talvez sobretudo, os falsos – e falso, porque um monumento é em primeiro lugar uma roupagem, uma aparência enganadora, uma montagem. É preciso começar por desmontar, demolir esta montagem, desestruturar esta construção e analisar as condições de produção dos documentos-monumentos (LE GOFF,1992). 7
(*)8
Em outro texto, História das mentalidades, história da lentidão na história em
sua obra, As mentalidades: uma história ambígua, Le Goff (1972), trata da história
das mentalidades, onde afirma que ela não se define somente pelo contato com as
outras ciências humanas e pela emergência de um domínio repelido pela história
tradicional. É, sim, resultante da dinâmica própria da pesquisa histórica atual e situa-
se na interseção “do individual e do coletivo, do longo tempo e do quotidiano, do
inconsciente e do intencional; do estrutural e do conjuntural, do marginal e do geral”.
Le Goff cita que a história das mentalidades trata do quotidiano e do automático.
Afirma ainda, que “a história das mentalidades é para a história das idéias o que a
história da cultura material é para a história econômica”.
7 NA: Banco de Informações de Construção Coletiva – possibilidade de produção coletiva de documentos-
monumentos. Montagens coletivas. 8 NA: Resumos, trechos, interpretações, inserções, destaques e grifos nossos. Fonte: LE GOFF, Jacques.
História e Memória; tradução Bernardo Leitão. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1992.
Ilustração 1 – Fotomontagem [DC]
19
ii Venus de Lespugue
Ainda segundo o autor, a história das mentalidades obriga o historiador a
valorizar alguns fenômenos como as heranças, as perdas, as rupturas e a tradição e
as dificuldades de adaptação às mudanças e a rapidez com que evoluem os setores
da história.
Os homens servem-se das máquinas que inventam conservando as mentalidades anteriores a essas máquinas. Os automobilistas têm um vocabulário de cavaleiros; os operários das fábricas do século XIX, a mentalidade dos camponeses, seus pais e avós. A mentalidade é aquilo que muda mais lentamente (LE GOFF,1976. p.72).9
� BORDIEU:
Para o sociólogo francês Pierre Bourdieu, em Outline of a theory of pratice
(1977), o habitus10, como produto da história, produz práticas, individuais e coletivas.
Produz portanto, história de acordo com os princípios geradores engendrados pela
história; assegura a presença ativa das experiências
passadas que, depositadas em cada organismo sob a forma
de princípios de percepção, pensamento e ação, tendem,
seguramente mais que todas as regras formais e normas
explícitas, a garantir a conformidade das práticas e sua
constância através do tempo. “Dessa forma, o passado
sobrevive na atualidade e tende a perpetuar-se no futuro 11,
atualizando-se nas práticas estruturadas segundo seus
princípios”. Em outras palavras, diz Bordieu, se pensamos a
sociedade moderna a partir das mudanças nas práticas, é
necessário entender que estas não podem ser deduzidas
das condições presentes que parecem tê-las suscitado, nem,
por outro lado, das condições passadas que produziram o
habitus, princípio duradouro de sua produção. As
explicações surgirão ao se relacionar dois estados do
9 NA: Percebe-se que com a máquina computador ocorreu e vem ocorrendo o mesmo. O pessoal da informática
tem a mentalidade dos contadores, estatísticos, etc. 10
habitus: conceito desenvolvido pelo sociólogo francês Pierre Bourdieu. Relaciona-se a capacidade de uma determinada estrutura social ser incorporada pelos agentes por meio de disposições para sentir, pensar e agir. 11
“Diferente do que ocorreu na origem de nossa espécie, ou por ocasião do neolítico (primeira grande mutação antropológica – surgimento da agricultura, escrita e a cidade), podemos agora pensar coletivamente a nossa história e influenciá-la.[grifo nosso] (LÉVY, 2000).
20
Pintura Rupestre de Monfragüe Cáceres
social, as condições em que se constituiu o habitus e as condições nas quais se
manifesta.
� WITTGENSTEIN
O Tractatus lógico-philosophicus12 de Wittgenstein contém as premissas
filosóficas da grande metamorfose cultural que se acordou chamar – a
informatização da sociedade (LÉVY, 1998 p.96).
Somente quando Wittgenstein declara “o mundo é tudo quanto acontece”; “o
mundo é o conjunto dos fatos, não das coisas” é que a teoria da informação passa a
ter um caráter universal.
O mundo de “tudo quanto acontece”, o mundo dos acontecimentos, é o da teoria da informação, pois esta tem relação não com a natureza dos símbolos, mas sim com a sua ocorrência. Uma ciência articulada pela teoria da informação pressupõe a existência de universo de acontecimentos descritíveis e traduzíveis. Um acontecimento, um estado de coisas, uma ocorrência, um fato, uma decisão podem ser medidos, porém não têm dimensão, podem ser observados, transmitidos, pertencem a uma definição operacional, porém são imateriais. A atribuição da imaterialidade à informação, embora não absolutamente incorreta, arrisca no entanto levar ao erro ao acreditar-se que o outro da matéria á a idéia. ... uma ciência que analisa seus objetos sob o ponto de vista da informação aprende o mundo como “tudo quanto acontece” (LÉVY, 1998 p.97)
� LÉVY:
Para o filósofo Pierre Lévy, em A inteligência coletiva: por uma antropologia
do ciberespaço (2000), o processo de surgimento e evolução do gênero humano,
não terminou, mas vem se acelerando de maneira brutal. A transformação contínua
e rápida das paisagens científica, técnica, ambiental, econômica, social, mental,
12
WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus lógico-philosophicus. (trad. Francesa), Paris: Gallimard, 1961.
21
Rootzmap - Mapping the Internet
espiritual. Não se trata de passar de uma cultura a outra, mas sim de uma
humanidade a outra; outra humanidade que não apenas permanece obscura,
indeterminada, mas que até mesmo nos recusamos a interrogar, que ainda não
aceitamos examinar.
“Diferente do que ocorreu na origem de nossa espécie, ou por ocasião do
neolítico (primeira grande mutação antropológica – surgimento da agricultura, escrita
e a cidade), podemos agora
pensar coletivamente a nossa
história e influenciá-la”. (LÉVY,
2000 p.15). Não é mais o tempo
da história, tendo como referência
a escrita, a cidade, o passado,
mas de um espaço móvel,
paradoxal, que nos vem
igualmente do futuro (idem, 2000
p.15-16).
Espaços Antropológicos
Lévy define espaço
antropológico como um sistema de
proximidade (espaço) próprio do
mundo humano (antropológico) e,
portanto, dependente de técnicas,
de significações, da linguagem, da
cultura, das convenções, das
representações e das emoções
humanas (ibidem, 2000 p.22)
Para ele são quatro os espaços antropológicos estruturantes:
>A Terra – primeiro espaço de significação aberto à nossa espécie. A relação
com o cosmo constitui o ponto central do primeiro espaço, pois o contato com a
“natureza” é bastante estreito. Os modos de conhecimento específicos são os mitos
e os ritos.
Santa Cruz - Cueva Manos
22
>O Território – inventado a partir do neolítico, com a agricultura, a cidade, o
Estado e a escrita. As riquezas não provêm da colheita e da caça, mas da posse e
da exploração dos campos. O centro da existência não é mais a participação no
cosmo, mas o vínculo com uma entidade territorial (propriedade, “endereço”).
>O Espaço Mercantil – começa a esboçar-se no século XVI, com a
inauguração de um mercado mundial por ocasião da conquista da América pelos
europeus. O princípio organizador do novo espaço é o fluxo: fluxo de energias, de
matérias-primas, mercadorias, capitais, mão-de-obra, informações. A riqueza não
provém do domínio das fronteiras, mas do controle dos fluxos anteriores, mas
supera-os em velocidade. É o novo motor da evolução.
>O Espaço do Saber – ainda incompleto surge um novo espaço
antropológico, o da inteligência e do saber coletivos. O papel da informática e das
técnicas de comunicação com base
digital não seria “substituir o homem”,
nem aproximar-se de uma hipotética
“inteligência artificial”, mas promover
a construção de coletivos inteligentes,
nos quais as potencialidades sociais e
cognitivas de cada um poderão
desenvolver-se e ampliar-se de
maneira recíproca (LÉVY, 2000 p.25).
A Inteligência Coletiva
É uma inteligência distribuída por toda parte, incessantemente valorizada,
coordenada e mobilizada em tempo real. Ninguém sabe tudo, todos sabem alguma
coisa, todo o saber está na humanidade (idem, 2000 p.28-29).
Nada é fixo, o que não significa que se trate de desordem ou de absoluto
relativismo, pois os atos são coordenados e avaliados em tempo real, segundo um
grande número de critérios constantemente reavaliados e contextualizados.
Cueva El Castillo
23
Tecnologias “Molares” X Tecnologias “Moleculares”
As tecnologias “molares” consideram as coisas no atacado, em massa, às
cegas, de maneira antrópica. As tecnologias “moleculares” abordam de maneira bem
precisa os objetos e os processos que elas controlam. Afastam-se da massificação.
Ultra-rápidas, bastante precisas, agindo na escala das microestruturas de seus
objetos, da fusão fria à supracondutividade, das nanotecnologias à engenharia
genética, as técnicas “moleculares” reduzem os desperdícios e as rejeições ao
mínimo. (LÉVY, 2000 p.48)
Vida
A seleção natural pode ser considerada uma tecnologia que a vida aplica a si
mesma. A natureza forma e conserva espécies sem objetivo predefinido, sem razão
para tanto. Comparada à escala de uma existência humana, sua ação é de uma
lentidão infinita.
A seleção artificial representa a segunda tecnologia biológica. Ela inova
finalizando e acelerando a formação de espécies. É no momento da grande
revolução neolítica que os homens começam a selecionar deliberadamente e a
domesticar plantas e animais, a criar novas espécies: trigo, cevada, arroz, milho,
cães, carneiros, bois, galinhas, etc. A seleção artificial controla as características dos
seres vivos apenas de maneira bastante indireta, quase estática. Lenta e pouco
precisa, é uma tecnologia “molar”.
A biologia molecular proporciona técnicas de controle da vida na escala da
escrita fundamental (genes) que governa as formas e funções dos organismos.
Torna-se possível fazer surgir uma nova espécie em poucos dias. A criação de uma
espécie ou de uma raça depende de uma temporalidade geológica (a seleção
natural conta em termos de milhares de anos), em seguida histórica (a seleção
artificial conta em termos de gerações) e atinge hoje o tempo real, o imediato. As
biotecnologias são “moleculares” não só pela escala em que operam, mas também
por seu espírito, pois prometem uma modelização operacional do ser vivo e de suas
produções. (idem, 2000 p.48-49)
24
Matéria
As técnicas para domínio da matéria podem ser classificadas em três grandes
categorias: mecânicas, quentes e frias. Segundo dados atuais da arqueologia pré-
histórica, as tecnologias mecânicas foram as primeiras a surgir. As iscas, as pedras
bifaciais, os machados, as pontas e lascas de sílex que precederam o domínio do
fogo em centenas de milhares de
anos.
Pesquisadores
contemporâneos vislumbram a
perspectiva de nanocaptores,
nanocomputadores e nanorrobôs
em escala molecular, que
rechearão de inteligência
partilhada os materiais do futuro,
conferindo-lhes capacidade de
produção e reprodução autônoma,
de reação programada às
modificações de seu ambiente
(LÉVY, 2000 p.49-51).
Informação
A informática é uma técnica
molecular, pois não se contenta
em reproduzir e difundir as
mensagens, ela permite sobretudo
engendrá-las, modificá-las à
vontade, conferir-lhes capacidade
de reação de grande sutileza,
graças a um controle total de sua microestrutura. O digital autoriza a fabricação de
mensagens, sua modificação e mesmo sua interação com elas, átomo de
informação por átomo de informação, bit por bit. (idem, 2000 p.53).
Information Flocking Boids
The whole Internet – You are here
25
As bases de dados, sistemas especialistas, tabuladores, hiperdocumentos,
simulações interativas e outros mundos virtuais são potenciais de textos, de
imagens, de sons ou mesmo de qualidades táteis que situações específicas
atualizam de mil maneiras.
Editado em cd-rom, um hiperdocumento, mesmo que conserve algumas das características “interativas” próprias do digital, oferece menos plasticidade, dinamismo, sensibilidade à evolução do contexto que um hiperdocumento enriquecido e estruturado em tempo real por uma comunidade de autores e leitores em rede. (LÉVY, 2000 p.54)
Coletivos Humanos
A abertura do ciberespaço permite conceber formas de organização
econômica e social centradas na inteligência coletiva e na valorização do humano
em sua variedade.
Os cidadãos poderiam participar de uma administração sociotécnica de um novo tipo, permitindo as grandes coletividades comunicar-se entre si em tempo real. ... Já um dispositivo de democracia direta em tempo real, no ciberespaço, permitiria a cada um contribuir de maneira contínua para a elaboração e o aperfeiçoamento dos problemas comuns, para a abertura de novas questões, para a formulação de
argumentos, para enunciar e adotar posições independentes umas das outras sobre grande variedade de temas. (idem, 2000 p.64-65)
(*)
13
13
NA: Resumo, trechos, interpretações, inserções e grifos nossos. Fonte: LÉVY, Pierre. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. Trad. Luiz P Rouanet. S. Paulo: Edições Loyola, 2000.
Ilustração 8 - The Hyperbolic Blogosphere
26
� FREITAS:
Em A Heterotopologia: um contraponto ao historicismo, Marcos Freitas14 inicia
seu texto com uma citação de Wlad Godzich e Nicholas Spadaccini:
(...) O homem possui a capacidade de armazenar experiências adquiridas. E de transmiti-las. Isto é: o homem é ente histórico. Em outros termos: o homem produz, armazena e transmite informações novas. Aumenta a soma das informações disponíveis. História é isto. (...) A história ocidental pode ser vista enquanto jogo comunicativo que vai aplicando tais métodos de comunicação como estratégias. O propósito dessas estratégias todas é o de produzir e acumular informações novas.[grifos, DC]
Para Freitas, a História sempre exerceu na cultura ocidental um certo número
de funções maiores: memória, mito, transmissão, veículo da tradição, consciência
crítica do presente, decifração do destino da humanidade, antecipação do futuro.
Concebia-se uma grande história plana, uniforme em cada um de seus pontos, que
teria arrastado num mesmo fluir.
Cita Flusser quando este
afirma que vivemos em um período
no qual a História encontra-se em
crise, pois os elementos que
tradicionalmente formulavam a
História estão defasados em relação
aos novos sistemas de informação
global.
Flusser afirma: Se admitirmos que a linearidade é a estrutura da história, os media se apresentam como comunicação pós-histórica. São caixas pretas que têm a história por input, e a pós-história por output. São programados para transcodarem história em pós-história, eventos em programas. (...) Destarte os mass media estão se tornando fontes preferenciais das informações disponíveis. São eles os que codificam o nosso mundo. Vivemos em clima pós-histórico.(FLUSSER apud FREITAS. [grifo, DC]
Freitas cita vários estudiosos da literatura, como Edward Said (Estados
Unidos), Françoise Lionnet (Canadá) e Franco Moretti (Itália) que propuseram que
14
Marcos Freitas no final nos informa que, este texto, trata-se apenas de um esboço do capítulo introdutório de sua tese, portanto, um trabalho inconcluso e, que este capítulo precisa ser ampliado e desenvolvido, pois ele é a justificativa central para a maior parte da pesquisa que aparecerá nos capítulos seguintes. Disponível em http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum/orientando24.htm
Ambiente Virtual
27
as análises e pesquisas das humanidades deixassem de usar uma perspectiva,
excessivamente histórica e passassem a adotar uma que fosse mais geográfica ou
espacial. Essa proposta de mudança de perspectiva foi decisivamente influenciada
pelas idéias do pensador francês Michel Foucault (1926 – 1984).
O autor questiona então, qual seria a descrição sistemática baseada em
aspectos espaciais, sugerida por Foucault, Said, Soja e Moretti? Esta descrição é
prefigurada por Foucault no texto Outros Espaços, de 1967 onde ele ressalta que as
análises sociais precisam focalizar primordialmente as relações humanas em
espaços diferenciados. Esses espaços diferenciados têm uma significação especial
para Foucault e são denominados por ele de heterotopias.
Em outro trecho, mais adiante, em seu texto, Freitas diz que é interessante
observar que Françoise Lionnet usa o termo ‘trabalho arqueológico’15 para abordar o
estudo comparativo das diferentes literaturas em uma perspectiva transnacional.
A análise arqueológica individualiza e descreve formações discursivas, isto é, deve compará-las, opô-las umas às outras na simultaneidade em que se apresentam, distinguí-las das que não tem calendário, relacioná-las no que podem ter de específico com as práticas não discursivas que as envolvem e lhes servem de elemento geral. (...) A arqueologia: uma análise comparativa que não se destina a reduzir a diversidade dos discursos nem a delinear a unidade que deve totalizá-los, mas sim a repartir sua
diversidade em figuras diferentes. A comparação arqueológica não tem um efeito unificador, mas multiplicador (FOUCAULT apud FREITAS 1969 p.180).
15
Obviamente, a autora do ensaio refere-se ao método arqueológico que foi desenvolvido por Foucault no livro A Arqueologia do Saber (originalmente escrito em 1969) e que o pensador francês aplicou no campo de estudos da história, objetivando uma reformulação metodológica dessa disciplina. A possibilidade de aplicar o método arqueológico em estudos comparativos é coerente com a teoria foucaultiana, pois o próprio Foucault se refere à análise arqueológica, em seu livro, como um método comparativo.
Ilustração 10 – Fotomontagem [DC]
28
mvblogs 09may07
� ROSNAY:
Joël de Rosnay, definido por Federico Casalegno em, Memória Cotidiana:
comunidades e comunicação na era das redes (2006), como um “tecnólogo
humanista”, se interessa pela complexidade, pela economia e pelas aplicações da
teoria sistêmica; pesquisa também as relações entre a biologia e as tecnologias.
Extraímos de sua entrevista à Casalegno, intitulada: Memória em rede e
intercriatividade (2006. p.35-51) o que segue:
Rosnay fala, inicialmente, da mudança fundamental introduzida pelas
comunidades virtuais, apoiadas nas redes interativas, onde elas não apenas
veiculam e permitem a partilha dos mesmos tipos de valor, mas também permitem a
ligação concreta entre as pessoas, via uma comunicação tangível. Surge assim uma
nova natureza na comunidade virtual – sua realidade! Ela permanece virtual pela
partilha de valores imateriais, mas se
torna real pela instantaneidade da
comunicação no tempo e espaço.
Fica evidente que o retorno da
informação, em tempo real, permite
formas de ação coletiva coordenadas
e cooperativas que eram antes
impossíveis.
Rosnay sustenta que o fato de
utilizar as funcionalidades
complexas, outras além do gesto, da
palavra, da escrita, tais como o
movimento no espaço ou do
engajamento em procedimentos
complexos, cria novas dimensões
para o exercício da inteligência e da intuição no plano cerebral.
Ao ser questionado sobre qual poderia ser o papel da memória em uma
comunidade, levando em conta os novos meios de armazenamento de informações,
Rosnay salientou que existem vários tipos de memórias. Mas na relação entre
memória, comunidades e redes, existe a memória implícita e a memória explícita. A
memória explícita refere-se às informações estocadas e acessadas em bancos de
29
Ant Track – trilhas de formigas
dados. Porém, a que mais interessa nesse raciocínio é a que ele chama de memória
implícita:
que é aquela que a pessoa não constrói realmente via rede e que se ‘autoconstrói’, como é o caso de um link, por exemplo. Crio um link entre duas páginas da rede, e ao fazê-lo, crio um link implícito de memória, um link que cria um contato entre dois neurônios, uma via de acesso. (...) Trata-se de uma memória referencial, implícita, ecossistêmica de certo tipo (revela do que se poderia chamar de um ecossistema informacional) – e isso eu acho apaixonante (ROSNAY apud CASALEGNO, 2006).
Nessa memória, cita os exemplos das abelhas e das formigas, que não têm
uma memória baseada no tecido neural do cérebro, mas uma memória implantada
em seu comportamento, extremamente programada e muito ‘robótica’, mas que
pode atingir uma dimensão suplementar, graças à memória coletiva inscrita no
ambiente.
As abelhas com sua capacidade de ler as polaridades luminosas, pela
posição do sol, se localizam no espaço graças a sua capacidade ocular de
decodificação do ambiente. Essa bússola solar permite que ela se lembre onde as
coisas estão em relação ao sol (as árvores, as sombras, etc.) tornando o ambiente
uma memória que serve a toda a comunidade. Outra ferramenta, utilizada pelas
abelhas, é seu relógio
interno, que permite controlar
a distância que já voou. O
relógio interno também
permite que ela determine
quantas vezes o sol se
movimenta durante sua
jornada. Quando a abelha
volta para a colméia ela pode
informar exatamente onde
está a comida em relação à
posição atual do sol.
Outro exemplo, citado por Rosnay, é o das formigas que emitem gotas de
feromônios para encontrar uma fonte de nutrição, recolhê-la e retornar ao
formigueiro. Quando elas depositam esses feromônios, elas marcam o território e
seu ambiente. Essas redes marcadas pelas formigas poderão ser reencontradas de
geração em geração. Mesmo após sua morte, seus caminhos permanecerão. Isso,
30
segundo Rosnay, pode ilustrar o enraizamento do pensamento humano e sua
memória.
Rosnay segue dizendo que pensa que o mesmo exemplo serve para a
Internet, onde há uma memória explícita – as bases de dados, com sua capacidade
de estocar e dar acesso às informações e uma memória implícita, formada pelos
caminhos, atalhos, links... Cita sua página pessoal com o nome de ‘a encruzilhada
do futuro’, onde há um grande número de links que enviam para outros sites, o que
para ele, é uma forma de memória coletiva e que pensa que é dessa maneira que se
tece a memória na net.
Penso mesmo que, quanto mais ela se torne densa, mais haverá memória implícita e explícita estocadas, haverá mais ‘neurônios’ interconectados uns com os outros na rede (falo por meio de metáforas), e mais emergirá essa nova dimensão, que não é um suplemento da memória, mas uma informação muito mais maleável, mais flexível, submissa. Esse fenômeno de partilha dos vários cérebros poderia ser verdadeiramente considerado como um pensamento coletivo emergente, que vai transbordar a rede e se materializar em nossa vida real. Sob qual forma? Não sei, teremos de ver! (ROSNAY apud CASALEGNO, 2006).
A resposta, para ele, parece estar na memória. Uma memória dinâmica, e não
estática, em que se vai estocar todo o patrimônio. Uma memória viva que evolui
conforme o ritmo.
“Uma forma de memória ativa, que se cria e se recria sem cessar, que constitui um estoque em permanente confronto com a realidade, é reavaliado e permite não só que se acrescentem conhecimentos aos que já se têm, mas também nos permite saber como gerenciar o que se sabe” (ROSNAY apud CASALEGNO, 2006).
� CASALEGNO:
O pesquisador das “ciber-socialidades em rede”, Federico Casalegno, em
Memória cotidiana: comunidades e comunicação na era das redes (2006) promove
diálogos com especialistas em comunicação, sociólogos, críticos culturais e
designers. O projeto – Memória viva (Living Memory http://www.memoire-vivant.org),
que deu origem ao livro, desenvolvido junto ao CeaQ – Centro de estudos sobre o
atual e o cotidiano (Sorbonne, Paris V), foi desenvolvido com o objetivo de explorar
os novos paradigmas de comunicação, surgidos com as novas tecnologias
interativas. A criação de um protótipo em um ambiente comunicativo, onde os
31
membros de uma comunidade pudessem criar e compartilhar sua memória coletiva.
(CASALEGNO, 2006. p.7)
A novidade da abordagem da Memória viva reside no fato de nós não pensarmos em projetar um sistema de comunicação unicamente com o objetivo de favorecer o acúmulo de uma memória histórica e formal de uma dada comunidade. O desafio do projeto é o de criar um ambiente comunicativo capaz de permitir aos integrantes de uma comunidade local e territorializada partilhar as informações concernentes à sua vida cotidiana (CASALEGNO, 2006. p.7).
O ambiente projetado
pretende acompanhar toda a
dinâmica existente em uma
comunidade local, sem subverter
os ritmos e as formas sociais
preexistentes.
Casalegno, em seu texto, Uma abordagem ecológica da memória em rede
(2006, p.19-34), aborda o fenômeno das noções de memória, de comunicação e de
continuidade. O desenvolvimento atual dos sistemas de comunicação promovem
uma redefinição desses termos e de suas combinações.
As possibilidades de acesso e armazenagem das informações, surgidas com
as novas tecnologias interativas – das telecomunicações e da informática, modificam
nossa relação com o saber e a memória.
Pensando, portanto, no jogo sutil entre tecnologias de comunicação e memória, entre saber e informação, entre redes e sociedades, propomos uma abordagem que poderia se definir como uma ‘visão ecológica da memória on-line’ (CASALEGNO, 2006. p.20).
Email Map - ZOOM
32
O sistema além de tornar acessível a memória vivida e interpretada pelos
seres humanos, procura separar a memória cotidiana e informal da histórica e
formal.
A memória coletiva toma forma quando toda a coletividade pode acessá-la e nutrí-la, porque são os indivíduos que participam de sua criação, e não as instituições oficiais (CASALEGNO, 2006, p.21).
Casalegno
reafirma que não
existe uma exclusão
recíproca entre os
espaços real e o
cibernético e sim,
uma superposição
desses ambientes e
concorda com
Gianni Vattimo em
sua consideração
sobre como as
realidades urbanas
e a virtualidade
informática se
superpõem e se concretizam mutuamente. Chama de e-topia essa nova
configuração resultante da superposição dos espaços físicos – lugares reais e,
ambientes virtuais – representações na rede.
São os integrantes da comunidade local que enviam informações, nutrem a memória coletiva e a conservam viva, comunicam os conteúdos que eles julgam pertinentes para eles e seu ambiente social. Assim estamos diante (se assim podemos dizer...) de uma nova cena ‘virtu-real’, que permite aos atores sociais interpretar as memórias sociais, de exteriorizar e de interiorizar as memórias, ao mesmo tempo individuais e coletivas, vivas e sedimentadas. Aflora, portanto, um novo tecido conectivo, instalado na cidade pós-moderna; à imagem de cada um de nós, quando adorna sua casa com objetos e lembrancinhas, os membros de uma comunidade em rede podem nutrir seus espaços sociais de interação ao participar da constituição de sua memória coletiva (idem, 2006. p.29).
World of Music SDP high dimensional data
33
� BAUDRILLARD:
Considerado, por Casalegno, como um “pensador radical e da radicalidade”
Jean Baudrillard, vive no rasto de todos que tentaram transfigurar as tecnologias do
olhar. “E o real não é mais do que uma construção provisória” (ibidem, 2006, p.119).
Para Baudrillard, o problema que continua sempre atual é o lugar da memória.
“A memória, na combinação de tempo presente, passado e futuro, ou a memória no
seu tempo tradicional e histórico, é constantemente posta em questão no real, em
que tudo se esgota na circulação imediata nas redes”. (BAUDRILLARD apud
CASALEGNO, 2006. p.124)
Considera que as informações estocadas e disponíveis na web são um pouco
como trabalho morto que apenas, nos deixam mais seguros. Mas que o mais
importante é o fluxo, a “circulação viva das informações”:
Informações podem ser estocadas em um computador ou na Web, mas depois é preciso ter a idéia de ir buscá-las, é preciso saber como buscar essas informações. Nesse sentido, a disponibilidade das informações perde sentido frente ao fato de que é preciso ter novos modelos de seleção e de acesso às informações (idem, 2006. p.127).
Questionado sobre, se não se deveria então, destacar a grande diferença
entre a memória viva e a memória fossilizada, Baudrillard responde dizendo que,
com efeito, elas não estão no mesmo plano e que há uma diferença radical entre as
duas memórias.
Quando se estava na mesma temporalidade histórica, tinha-se a memória. Estava-se em uma situação de continuidade e com isso havia a possibilidade de empreender um trabalho de luto, de resolver problemas. Mas agora, nós passamos para o tempo real, e um corte como esse não permite mais situar as coisas no passado, no tempo histórico, e, logo, de ajustá-lo na memória (ibidem, 2006. p.128).
34
� MORIN:
Para Edgar Morin (apud CASALEGNO, 2006, p.131-145) o desafio maior da
ciência é coabitar com a memória que, a seu ver, é modelada pelo mito, pelo sonho,
pela poesia e, ao mesmo tempo, ampliar a memória racional da história da
humanidade.
Em sua obra Meus demônios (Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997), Morin
diz que:
nós temos necessidade de nos projetarmos em um futuro possível, ainda que improvável hoje, e que nós deveríamos poder viver sem sacrificar o presente para o futuro, nem abandonar o passado. Nós temos necessidade de conservar uma herança cultural, uma fidelidade às nossas raízes. Tratar-se-ia de uma outra maneira de conquistar, quer dizer, de viver de maneira não somente utilitária e funcional, mas também de maneira poética (MORIN apud CASALEGNO, 2006. p.134).
Morin chama a atenção para uma visão antropológica das relações entre o
real e o imaginário, afirmando que a humanidade sempre confere um aspecto de
realidade às produções imaginárias – mitos, deuses, fantasmas, espíritos. Conclui
que o fato de existir imaginário no real é um fato antropológico histórico.
(...) a novidade com a realidade virtual é que nós podemos ter percepções sensoriais, o que não era possível com o cinema. Mesmo no cinema em relevo e em três dimensões, não temos a sensação de tocar. ... Neste momento, a relação com tudo o que é imaginário se torna muito mais ativa em relação a todas as outras experiências do passado. E então eu me digo: até onde se pode ir? Por exemplo, em que medida se tem a necessidade da presença real? (MORIN apud CASALEGNO, 2006. p.135-136)
Morin gosta de dizer que “nós estamos sempre sendo confrontados ao
problema da natureza e da realidade de nosso mundo conhecível” (idem 2006,
p.135-136)
i AOL Instant Messenger analysis. fonte:http://www.buddyzoo.com/ ii Venus de Lespugue. Fonte:http://www.arthistory.sbc.edu/imageswomen/images/lespugueoblique.jpg
35
1.2 Processos de formação do registro arqueológico
O processo de formação do registro arqueológico envolve diferentes fatores
naturais e culturais. Os processos naturais de formação do registro arqueológico são
acontecimentos e processos pós-deposicionais originários do ambiente natural que
atuam sobre os artefatos e depósitos arqueológicos. Os processos culturais estão
relacionados com o comportamento humano – produção, uso e descarte dos itens
materiais. Intervenções culturais, processos de reocupação bem como a descoberta
e as análises, pelos arqueólogos, dos restos materiais, em suma, tudo que diz
respeito ao ambiente cultural.
Os processos de formação ficam responsáveis pela configuração,
modificação e destruição dos padrões de deposição dos materiais encontrados no
mesmo. A interpretação do registro arqueológico dependerá da compreensão
desses processos – naturais e culturais - que afetam a sua formação.
Dois arqueólogos contemporâneos com inúmeros estudos sobre a formação
do registro arqueológico e as diferentes possibilidades interpretativas: Schiffer16, que
é adepto de um contexto sistêmico – dinâmico, com controle rígido das atividades e
dos dados [informações], no processo de formação do registro arqueológico e
Binford17, que afirma que “a Arqueologia é a ciência do registro arqueológico” e se
preocupa mais com o contexto arqueológico – estático, trabalha com amostragens.
Para ele:
O desafio que a arqueologia oferece é, pois, literalmente, o de traduzir observações contemporâneas de coisas materiais estáticas em afirmações sobre a dinâmica dos modos de vida do passado e sobre as condições que permitiram a sobrevivência dessas coisas até o presente (BINFORD apud SILVA, 2000).
Para Schiffer, o aspecto cultural dos processos responsáveis pela formação
do registro arqueológico é considerado como um ramo da teoria arqueológica em
desenvolvimento. Um modelo corrente mostrado é aquele que vê a ‘história de vida’
ou os processos do contexto sistêmico de qualquer elemento material. Os processos
básicos deste modelo são: obtenção, manufatura, uso, manutenção e descarte. Os
refugos classificam o estado de um elemento no contexto arqueológico (SCHIFFER,
16
SCHIFFER, M.B. The study of formation processe. In: Formation Processes of the Archaeologycal Record. p.263-304. 1987 17
BINFORD, L. R. Data, Relativism and Archaeological Science – Man, New Series, Vol. 22, No. 3 (Sep., 1987), p. 391-404)
36
1972). Ou, em suma, nas suas próprias palavras: tentar apreender “o contexto
sistêmico das coisas descobertas no contexto arqueológico” (SCHIFFER, 1987. p.4
apud SILVA, 2000).18
[O que nos cabe aqui, além de entendermos os processos de formação do
registro arqueológico é, iniciarmos uma discussão sobre como esses registros são
“registrados” nos ambientes naturais, culturais e, como serão, ou como já estão
sendo “registrados” no ambiente virtual, nosso objeto de estudo neste trabalho. Os
registros, inscritos nos bancos de dados, advindos da digitalização das informações
analógicas (papel, iconografia, relatos orais, vídeos, etc.) passam a ter uma
dinâmica diferente com as novas e inúmeras possibilidades de se estocar toda a
informação disponível de forma ativa e não mais estática. Esses registros digitais
permitem, não só cruzamentos, simulações e criação de modelos, que podem ser
constantemente avaliados e interpretados, em confronto com a realidade, como
também possibilitam a inclusão de novos conhecimentos oriundos dessas
simulações e cruzamentos ou até mesmo daqueles que emergirão desse processo
de pensamento coletivo].
Na Arqueologia Pré-Histórica
PROUS19
As sociedades sem escrita do passado são o objeto de estudo da Pré-
História. Enquanto os historiadores estudam preferencialmente os textos e
documentos, os pré-historiadores pesquisam os vestígios materiais. Utilizam, para
tanto, informações da Arqueologia, com métodos e técnicas próprias que permitem a
localização, análise e interpretação dos registros materiais das atividades humanas
nos ambientes natural e cultural.
18
NA: Fonte - Disciplina FLQ5022 – A Formação do Registro Arqueológico. Programa e anotações de aula. Profa. Fabíola Andrea Silva. MAE/USP 2004. 19
NA: Resumos, fragmentos, trechos e interpretações com destaques, [inserções] e grifos nossos. Fonte: PROUS, André. Arqueologia, Pré-História e História (p.27-30). In: Pré-História da Terra Brasilis. Org.: Maria Cristina Tenório. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1999.
37
Estudando freqüentemente sociedades dependentes dos ritmos naturais, os
arqueólogos procuram inserí-las em seu contexto ambiental, dando grande
importância à interação entre a natureza e a cultura.
No final do século XIX, reuniram-se as primeiras coleções arqueológicas
([registros] de cerâmicas amazônicas, pedras de sambaquis) e foram realizados os
primeiros trabalhos de escavações. Os estudiosos procuravam explicar as
realizações artísticas achadas nos sítios por supostas migrações de povos da
Antigüidade. Praticada, sobretudo pelos museus – Paulista, Goeldi e Nacional, a
Arqueologia Pré-Histórica parecia essencialmente aplicar as idéias européias e
procurar confirmar a inferioridade tecnológica dos antigos habitantes do Brasil. Cabe
aqui destacar, as análises ambientais feitas por R. Krone e as experimentações de
H. von Ilhering.
Em 1949/1950, B. Meggers e C. Evans realizaram os primeiros trabalhos
sistemáticos no Pará, buscando caracterizar as culturas amazônicas. Concluíram,
então, que o ambiente não permitiria o desenvolvimento de civilizações elaboradas o
que levaria a interpretação de que a cultura Marajoara seria fruto de uma migração
de populações andinas.
Em 1954-1956, J. Emperaire e A. Laming estudaram os sambaquis do Paraná
e de São Paulo, onde introduziram as técnicas de escavação com estratigrafia
natural e conseguiram as primeiras radiodatações para o Brasil.
A Universidade Federal do Paraná teve papel relevante promovendo
cursos de formação para escavação e análise de material lítico e para prospecção e
análise de material cerâmico.
A Universidade de São Paulo e o Museu Nacional, preferiram uma
abordagem paleoetnográfica no estudo detalhado de sítios-tipo e dos seus vestígios
e uma visão da década de 60 representada por A. Leroi-Gourhan. Em 1971, um
programa de pesquisa na região de Lagoa Santa, estudou as mudanças ambientais
no Brasil central desde o Pleistoceno e as adaptações do homem a estes eventos.
Nas décadas de 70 e 80, a maioria dos arqueólogos foi se enquadrando nas –
chamadas no Brasil – “escola francesa” e “escola americana”, com objetivos,
métodos e habilidades diferentes. Essa dicotomia, de maneira negativa, atrasou a
entrada da “Arqueologia Processual” ou “New Archaeology”, que pretendia, a partir
de um rigor maior nos objetivos e métodos, levar a Arqueologia à condição de uma
38
ciência preditiva, capaz de enunciar leis sobre o comportamento humano e testar
rigorosamente as hipóteses e modelos propostos.
Atualmente, as abordagens do chamado “pós-processualismo”, permitem o
aproveitamento de todas as tendências anteriores e valorizam as perspectivas
históricas e as particularizações em busca de leis permanentes.
A partir da década de 80 o campo de trabalho focou-se mais na arqueologia
de contrato e, em pesquisas preventivas em regiões a serem desfiguradas por
grandes obras.
FUNARI & NOELLI 20
Na Europa, o estudo dos seus antepassados já existia pela leitura dos autores
gregos e romanos. No século XIX, além destes textos, iniciam-se os estudos dos
vestígios materiais [registros].
Foi no século XIX que surgiu o conceito de História como uma ciência voltada para o estudo do passado a partir dos documentos escritos. Definindo que a História se faz com documentos escritos, convencionou-se que a invenção da escrita seria o início da História (FUNARI, NOELLI, 2002).
Com isso, como a escrita começou a ser usada em diferentes regiões e
momentos, a História teria início na Mesopotâmia e no Egito há 5 mil anos e há 3 mil
na Grécia.
A História, contudo, não é tampouco uma descrição do passado tal qual
aconteceu, é uma interpretação e, por isso, tanto mais será importante conhecer as
controvérsias historiográficas sobre o período histórico tratado. Os dados materiais
[registros], analisados pela Arqueologia, podem tanto confirmar, como complementar
e mesmo contradizer as informações das fontes históricas.
O Evolucionismo, surgido com as teorias de Charles Darwin para explicar as
transformações da vida, é aplicado ao estudo arqueológico, em especial o estudo
das mudanças nas espécies de primatas e às plantas e animais. Com a aceitação
20
NA: Resumos, fragmentos, trechos e interpretações com destaques, [inserções] e grifos nossos. Fonte: FUNARI, Pedro Paulo Abreu; NOELLI, Francisco Silva. Pré-história do Brasil. São Paulo: Contexto, 2002. (Repensando a História).
39
das teorias de Darwin, começou-se a aceitar a idéia de que haveria registros muito
mais antigos relacionados ao homem. Em 1865, surgiam os termos Paleolítico
(Idade da Pedra Antiga) e Neolítico (Idade da Pedra Recente). Assim, o estudo da
Pré-História, fica definido como todo o imenso período anterior à escrita (FUNARI,
NOELLI, 2002 p.13).
Para explorarmos a Pré-História temos que pesquisar inicialmente quais são
as nossas fontes de informação e quais as evidências disponíveis, pois são esses
vestígios materiais [registros] que nos permitem acesso ao passado.
Os vestígios materiais associados aos homens são estudados pela Arqueologia, uma ciência voltada, precisamente, ao estudo do mundo material ligado à vida em sociedade, Por meio de prospecções e escavações arqueológicas, recuperam-se vestígios que podem nos informar sobre os mais variados aspectos da vida no passado. (idem, 2002)[Grifos, DC]
Os restos materiais podem ser artefatos feitos de pedra (líticos) – ferramentas
usadas para as mais diferentes tarefas e que, podem nos informar sobre as
atividades humanas e a tecnologia disponível. Estão entre os mais importantes
vestígios pré-históricos por acompanharem os homens e por se preservarem muito
bem.
Outra, das principais fontes de informação sobre o passado pré-histórico são
os artefatos feitos de barro cozido – a cerâmica – ainda que muito mais recente que
a pedra – máximo de 12 ou 13 mil anos. A cerâmica preserva-se bem, mas quebra-
se com facilidade. Pode nos informar sobre como as pessoas estocavam produtos
ou como se alimentavam, ou ainda fragmentos de estatuetas ou tabuletas com
vários tipos de escrita. Em alguns casos, a forma e a decoração dos artefatos,
podem nos dar indicações a respeito da simbologia e dos valores sociais adotados.
A cerâmica foi utilizada na confecção de enfeites como as tangas de barro de Marajó
e também de brinquedos como as bonecas de Carajás e de objetos rituais usados
entre os Asurinis do Xingu. (ibidem, 2002 p.81)
As pinturas rupestres, feitas normalmente em cavernas ou outras pedras, são
as mais conhecidas e estudadas evidências materiais da Pré-História. Uma fonte
inigualável de informação, representando humanos e animais em atividades, gestos
e ritos, podem nos dizer muito sobre o passado pré-histórico. Outros artefatos feitos
pelo homem com ossos de animais, madeira ou outros materiais perecíveis, são
40
menos freqüentes por não se preservarem facilmente. O conjunto dessas
informações produzidas pelo homem é considerado a sua “cultura material”
(FUNARI, NOELLI, 2002 p.19-20).
O homem pré-histórico não conhecia a escrita, pelo menos não como a
concebemos. Entretanto deixaram de muitas maneiras suas marcas de expressão
artística. A arte rupestre não tem o sentido contemporâneo de arte, mas da arte
como obra do engenho humano. Muitas dessas imagens preservam a recordação de
atividades sociais, de humanos, em ações individuais ou coletivas. A interpretação
dessas imagens, de povos sem escrita, exige o levantamento do conjunto – o mais
amplo possível, possibilitando a formação de um corpus ou coleção, com todos os
elementos contextuais que puderem ser adicionados. (idem, 2002 p.99)
Na Arqueologia Histórica
A arqueologia histórica tem em conta, primeiro que tudo, os aspectos materiais das civilizações e neles fundamenta a própria definição de cultura e a sua evolução. As fontes de que se servem os arqueólogos para abordar as sociedades do passado são fontes materiais; por conseqüência, nas reconstituições que propõem, os aspectos materiais das civilizações são naturalmente os que prevalecem (PESEZ, 1990) 21.
ORSER
Um dos aspectos da Arqueologia Histórica diz respeito ao seu uso como
fornecedora de informações sobre a aparência física de sítios históricos, a fim de
que sejam restaurados e/ou reconstruídos. Grande parte desta arqueologia é
praticada em sítios de “significação nacional”. (ORSER, 2000. p.121)
A “Arqueologia de Restauração”, assim denominada pelo pioneiro J.C.
Harrington, procura analisar toda informação e toda a seqüência arqueológica de um
sítio específico. Em projetos de restauração, os arqueólogos coletam e estudam
todos os materiais encontrados produzindo catálogos descritivos dos artefatos e das
estruturas escavadas.
21
PESEZ, Jean-Marie. História da cultura material. In: LE GOFF, Jacques. A história nova. São Paulo: Martins Fontes, 1990. p.177-213
41
Um problema relacionado à arqueologia histórica envolve o uso que será dado aos materiais arqueológicos por parte dos reconstrutores. Uns poucos arqueólogos, em geral arqueólogos críticos, têm recentemente começado a analisar as maneiras pelas quais o passado pode ser usado no presente. Em nenhuma parte esta questão é mais importante do que na arqueologia de restauração (ORSER, 2000. p.124).
A Arqueologia Histórica, embora recente, é instigante tendo em vista que os
sítios arqueológicos estudados foram habitados por nossos antepassados imediatos.
Ainda que estes ancestrais possam ter deixado inúmeros registros sobre o seu modo
de vida, ainda não os conhecemos o suficiente; assim, conforme o historiador Daniel
J. Boostin escreveu em seu livro A história escondida, ‘sabemos mais sobre alguns
aspectos da vida quotidiana na Antiga Babilônia em 3000 a.C. do que sobre o
quotidiano em partes da Europa e da América, há cem anos’. (ORSER, 2000 p.128)
FUNARI22
Embora alguns pesquisadores tenham limitado o seu objeto de estudo "aos
restos materiais de uma atividade exercida pelos homens do passado" (como o
arqueólogo francês Jean Claude Gardin), a Arqueologia tem, nos últimos anos,
alargado seu campo de ação para o estudo da cultura material de QUALQUER
ÉPOCA, passada ou presente [e, porque não futura, DC]. A Arqueologia Industrial
estuda construções e objetos ligados à indústria, no passado e no presente. A
arqueologia histórica é outro exemplo de estudo do passado recente e do próprio
presente, pela arqueologia contemporânea (FUNARI, 2003 p. 13).
As pesquisas arqueológicas não se restringem apenas aos "artefatos" ou,
"restos fossilizados da ação humana" (conforme definição do arqueólogo australiano
V. Gordon Childe). Também são objetos de estudo o "ecofato" - vestígios do meio
ambiente e, o "biofato" relacionados aos restos de animais associados aos seres
humanos. [e, atualmente possivelmente o infofato ou digifato] (idem, 2003.p.14)
Desse ponto de vista, podemos considerar que a arqueologia estuda,
diretamente, A totalidade material apropriada pelas sociedades humanas, como
parte de uma cultura total material e imaterial, sem limitações de caráter cronológico
(ibidem, 2003 p. 15).
22
NA: Resumos, fragmentos, trechos e interpretações com destaques, [inserções] e grifos nossos. Fonte: FUNARI, Pedro Paulo Abreu. Arqueologia. São Paulo: Contexto, 2003:13-18).
42
Persiste ainda a idéia de que os arqueólogos resgatam objetos e tratam
dados e informações brutas, que serão posteriormente processadas e interpretadas
por outras ciências, como a História e a Pré-história.
A especificidade da arqueologia consiste em tratar, particularmente, da cultura
material, das coisas, de tudo que, em termos materiais, se refere à vida humana, no
passado e no presente [e no futuro, DC]
BEZERRA DE MENESES
A cultura material no estudo das sociedades antigas23
Caracterizada pelo uso de aspectos da vida material, mais precisamente, da
informação arqueológica de maneira puramente instrumental, o papel da
documentação física seria o de controle e, nos casos mais felizes, complementação
da documentação textual. Para datações ou para a confirmação ou negação do que
nos chegou verbalizado, ou apenas o uso “didático” das informações sobre o
universo material. Como ilustrações daquilo que o texto já estabeleceu. Permitiriam
“vivenciar” situações, experiências e outras realidades que os textos nos restituem
de maneira apenas verbal (MENESES, 1983. p.104-105).
As coisas materiais constituiriam uma parcela apenas dos fenômenos
históricos. Fenômenos fundamentais do universo social não se expressariam
materialmente, de maneira imediata, nem sempre têm contrapartida na realidade
material. Os objetos não são idéias, diz-se, embora possam “expressá-las” ou
“refletí-las”(idem, 1983. p. 106).
Além de parcial, a documentação material seria aleatória, pois chega até nós
após triagens sucessivas e sem controle. O chamado “depósito arqueológico” (sítio
arqueológico) seria o produto de inúmeros filtros culturais (restos das coisas
materiais – resultado de certos padrões de rejeito) e naturais (fatores biológicos,
clima, ação de animais e outros organismos, processos geomorfológicos, etc.).
A alegação de que existiria um fosso intransponível ou, pelo menos,
considerável entre o sítio arqueológico e o sistema cultural, que o produziu. Em
23
BEZERRA DE MENESES, Ulpiano T. A cultura material no estudo das sociedades antigas. Revista de História/USP, São Paulo, n. 115 jul/dez 1983.
43
contrapartida, tem-se o sítio como entidade sociológica, como campo de atividades e
relações. Via de regra o que constitui a essência de um sítio arqueológico, é o lixo,
isto é a presença do que foi excluído do ciclo vivo da atividade cultural. Esta
exclusão é que transforma objetos em documentos (aos olhos de um "observador",
apenas como suporte físico de informação) (MENESES, 1983. p.107).
Por outro lado, é preciso não confundir a natureza física do suporte de informação com a natureza física de um fenômeno. (...)Também nos textos, como na documentação material, se procede por inferência (dedução, indução, conclusão) e abstração. (...) os artefatos - parcela relevante da cultura material - se fornecem informação quanto a sua própria materialidade (matéria-prima e seu processamento, tecnologia, morfologia e funções, etc.) fornecem também, em grau sempre considerável, informação de natureza relacional. Isto é, além dos demais níveis, sua carga de significação refere-se sempre, em última instância, às formas de organização da sociedade que os produziu e consumiu (idem, 1983 p. 107).
O argumento de que a cultura material chega até nós desfigurada por
sucessivas e diversificadas triagens igualmente se mantém com dificuldade.
Também os textos passam por triagens comparáveis e às vezes mesmo mais
radicais.
É questão absolutamente irrelevante saber se se dispõe da "totalidade" da documentação (...) o conhecimento científico não cuida de universos íntegros, mas trabalha por amostragem e abstração. O que importa então, é se temos elementos suficientes para compor, instaurar, definir um sistema documental, que é produzido pela operação de conhecimento do historiador. Ele não existe em estado "natural": as coisas físicas não são documentos, são isto sim, fenômenos da natureza e é a operação do historiador que cria o campo documental (ibidem, 1983. p.109).
Questionamos o argumento de que há solução de continuidade, com
conseqüências irreparáveis, entre objeto e documento. É necessária a
desdocumentalização, que recupera as diversas trajetórias do artefato. Parte-se do
estágio final, o rejeito, para o inicial, da aquisição da matéria prima, passando-se
pelo consumo, circulação, produção. Esta perspectiva requer que se dê à produção
e ao consumo igual peso dado produto. Consegue-se desfetichizar o artefato. Por
esse ângulo, o problema da classificação dos artefatos não pode mais supor
categorias universais (como Lineu propôs para os organismos vivos).
44
O pensamento cartesiano não é o único modo de pensamento racional, o pensamento racional não é o único modo de pensamento: existe um ‘pensamento plástico’, como existe um pensamento matemático. O pensamento plástico, aquele que se organiza segundo formas visuais e cria o que Francastel denomina campo figurativo (ou realidade figurativa), não é uma transposição gráfica, pictórica, escultórica, de uma realidade verbal, mas é um domínio próprio. ‘Diga-o com flores’ é uma sugestão enganosa, nesta área, em que as palavras e as coisas devem guardar sua especificidade. A natureza mesma da documentação material previne o investigador do risco de considerá-la reflexo, correspondência, em nível físico, de fenômenos de outra matriz (MENESES, 1983. p.111).
Para analisarmos a cultura material, precisamos situá-la como suporte
material, físico, imediatamente concreto, da produção e reprodução da vida social. O
homem intervém, modela, dá forma a elementos do meio físico, segundo propósitos
e normas culturais. O conceito pode tanto abranger artefatos, estruturas,
modificações da paisagem, como coisas animadas e, também, o próprio corpo
(deformações, mutilações, sinalações), implantes (órgãos e chips), clonagens,
transgenias, etc., ou, ainda, os seus arranjos espaciais (um desfile militar, uma
cerimônia litúrgica) (idem, 1983. p. 112).
Os artefatos - principal contingente da cultura material, têm que ser
considerados sob duplo aspecto: como produtos (resultado de certas formas
específicas de organização dos homens em sociedade) e como vetores de relações
sociais (canalizam e dão condições).
... a Arqueologia não precisa mais ser definida como a disciplina que se ocupa dos artefatos, das coisas materiais e seu contexto (isto é, das manufaturas e das relações espaciais nas quais elas se apresentam), mas poderia ser recebida no convívio das demais ciências sociais. ... a Arqueologia estuda os sistemas sócio-culturais, sua estrutura, seu funcionamento e seu comportamento ao longo do tempo [futuro?], sua mudança. A particularidade está em que, para essas operações, ela conta exclusiva ou preponderantemente com informação derivada dos restos materiais [e do futuro?] – a cultura material. Não hesito, pois, em considerar a Arqueologia como História da cultura material (ibidem, 1983. p. 113).
(NA)
24
24
NA: Resumos, fragmentos, trechos e interpretações com destaques, [inserções] e grifos nossos. Fonte: BEZERRA DE MENESES, Ulpiano T. A cultura material no estudo das sociedades antigas. Revista de História/USP, São Paulo, n. 115 jul/dez 1983 p.103-117.
45
CUSTÓDIO
Arqueologia Industrial25
A Arqueologia Industrial, como fenômeno cultural, surge no pós-guerra na
Inglaterra – epicentro da revolução industrial. A II Guerra Mundial veio não só
destruir grande parte das unidades fabris e equipamentos industriais, como implicou
posteriormente na aceleração da história e do ritmo tecnológico.
A constante modificação dos ritmos econômicos, sociais e tecnológicos não
se processava apenas na fábrica; estendia-se ao mundo urbano, aos equipamentos
coletivos e à própria vida quotidiana. Não é por acaso que as primeiras medidas de
defesa do patrimônio cultural nasceram no século XIX, numa época em que a
indústria se instalava na cidade.
Metodologia da Arqueologia Industrial: “Em primeiro lugar ao lado da estratigrafia vertical que poderá ser utilizada pelo arqueólogo industrial surge com um vigor muito próprio uma nova estratigrafia inscrita no próprio patrimônio industrial sedimentado na paisagem. O arqueólogo industrial é assim um novo tipo de arqueólogo. Percorre o patrimônio construído e com o auxílio de novas técnicas propõe-se “escavar” na paisagem que está perante si viva e aberta aos seus olhos. É pois na presença de uma estratigrafia de cota positiva situada à superfície que urge começar a aplicação das teorias de prospecção”. (CUSTÓDIO, 1984)
Para Custódio o método que permite, pois, agarrar essa estratigrafia visível e
conhecer as bases da estrutura da unidade fabril é o “método regressivo”. Definido e
posto em prática pelo grande historiador da Escola dos Annales – March Bloch.
Recomenda-se à iconografia, à cartografia (cartas, plantas) aos desenhos das obras
(alçados, pormenores, fachadas), à fotografia, à documentação de arquivo, ao
inquérito sociológico retrospectivo e utilizando um procedimento multidisciplinar, é
possível estudar os testemunhos das sociedades industriais de um modo global,
25
CUSTÓDIO, Jorge. Arqueologia Industrial: objetivo e método. In: A Central Tejo e a Arqueologia Industrial. Uma viagem aos confins da eletricidade por medição de um museu. Lisboa: Centro Nacional de Cultura, 1984.
46
definindo as suas características, natureza das edificações e as etapas industriais
respectivas.26
Pesquisas Arqueológicas
� BINFORD :
The Archaeology of place27
(...) se os arqueólogos pretendem entender a organização dos sistemas culturais do passado eles devem entender as relações organizacionais entre lugares, que são diferentemente utilizados, durante as atividades do passado. Este ponto é ilustrado pelas observações feitas entre o Nunamiut Eskimo. Com este background fica demonstrado que as duas sistemáticas arqueológicas usuais – ‘montagem’ versus ‘tipo’, não são apropriados para o estudo de lugares. Neste último caso, não é possível analisar lugares, assim como, não se pode ver lugares com ‘conteúdos’ diferentes como parte de um sistema que era único anteriormente. Conclui-se que as sistemáticas arqueológicas atuais são totalmente inapropriadas para estudar sistemas do passado de adaptação e suas modificações evolucionárias (BINFORD, 1983.p.357-378).
Do ponto de vista de um sistema vivo (living system), uma ocupação pode ser
definida como o uso ininterrupto de um lugar por participantes em um sistema
cultural. A conseqüência material de uma ocupação representa um documento que
diz respeito a um aspecto organizacional ou a uma fase da operação do sistema
cultural em estudo. A associação entre coisas diferentes ‘competindo’ em um
sistema durante uma ocupação pode informar sobre a organização das atividades
humanas ocorridas no sítio. Em estudos anteriores eu vi a maneira como várias
atividades condicionam a estrutura interna de um sítio (Binford1978a) e tentei
investigar como um sistema completo parece quando visto da perspectiva de uma
classe de itens (ossos), depositados durante ocupações conhecidas (Binford1978 b).
Em ambos estudos, eu estava considerando o registro arqueológico de um sistema
vivo pela perspectiva de suas ocupações conhecidas. Neste estudo eu assumo uma
perspectiva mais realista, considerando um sistema vivo pela perspectiva dos sítios.
26
NA: Procurando ampliar o campo de atuação da Arqueologia Histórica poderemos, utilizando ferramentas e técnicas de tecnologia da informação, estudar ou, em uma analogia com a metodologia proposta por Custódio, não apenas “escavar” o patrimônio cultural “construído” como também o ambiente ou o mundo “virtual”: a>Escavar na paisagem (espaço) e no tempo (presente, passado e futuro); b>Estratigrafia da cota positiva e da data positiva (tempo à frente); c>Preservar o futuro (patrimônio natural, cultural e virtual/digital). 27
BINFORD, L. R. The Archaeology of place.In: L.R. Binford. Working at Archaeology. New York: Academic Press, 1983 p.357-378.
47
Os arqueólogos devem começar suas análises pelos restos materiais dos
sítios arqueológicos. Sítios arqueológicos produzem montagens. Montagens são
conjuntos de artefatos com itens e características encontradas em associações
aglomeradas (normalmente definidos estratigraficamente) em sítios arqueológicos.
O grau que esses aglomerados podem ser tratados como resultado das
ocupações ou, de materiais derivados, sobrevivem do uso ininterrupto de um lugar
único, por participantes, em um sistema cultural. Os arqueólogos ‘vêm’ o passado
segmentado pela perspectiva de posições fixas no espaço. O efeito inesperado dos
eventos que parecem mover lugares fixos estabelece o caráter dos vestígios
arqueológicos no sítio. Para entender o passado nós devemos entender os lugares.
Binford se interessa por sítios – os lugares na topografia onde o homem pode
fazer periodicamente uma pausa e realizar atividades. O padrão de assentamento
tanto no contexto intra-sítio como no inter-sítios é uma propriedade característica do
registro arqueológico. A precisão, com a qual, estamos aptos a dar sentido ao
registro, depende de nosso entendimento dos processos que atuaram no passado
para trazê-lo ao padrão observado. Posto de outra forma, nossa precisão depende
de nossa habilidade de inferir corretamente motivos para os efeitos observados.
De fato, os humanos podem depositar suas estratégias adaptativas em uma
paisagem, uma tática que pode gerar diversidade para o registro arqueológico
enquanto promove estabilidade dentro do sistema em curso.(NA)28
Escavação Arqueológica
A escavação é a principal forma, tanto na prática como na reflexão
metodológica e teórica, de produção de nova documentação arqueológica. Os
métodos de campo foram se modificando junto com as correntes do pensamento
arqueológico. Na fase filosófico-cultural, final do século XIX e início do século XX, a
Arqueologia utilizava métodos que contribuíam com o pensamento evolucionista, ou
seja, que pudessem determinar a cronologia histórica: estratigrafia, datação relativa,
tipologia de artefatos, etc. A estratigrafia vertical consistia na identificação da
sucessão histórica de estratos de solo(FUNARI, 2003. p. 68).
28
Tradução livre, interpretações, [inserções], DESTAQUES e grifos nossos. Fonte: BINFORD, L. R. The Archaeology of place.In: L.R. Binford. Working at Archaeology. New York: Academic Press, 1983 p.357-378.
48
Na primeira metade do século XX, em sua fase histórico-cultural, surge a
utilização de métodos empíricos de coleta, comparações etnográficas, preocupando-
se com tipologia e estratigrafia, tentando mostrar diferenças e semelhanças.
A partir da década de 1950, destaca-se o método de escavação etnográfica
de Leroi-Gourhan, que considerava os sítios arqueológicos como arquivos
destruídos por escavações. Leroi-Gourhan considerava também, a necessidade de
escavações em amplas áreas por níveis naturais. Escavava toda uma aldeia, mesmo
que com área muito extensa, escavando estrato por estrato, por uma superfície
muito grande (decapagem) com vistas a conhecer o funcionamento da aldeia. Ao
registrar as seqüências estratigráficas, os pavimentos ocupacionais, suas estruturas
internas, poderia se ter uma visão tridimensional do contexto da estrutura
arqueológica (FUNARI, 2003 p. 77).
A Arqueologia passava a ser uma "disciplina recuperadora de fatos". A estratificação representava, no nível do sítio arqueológico, a história, ou melhor, o avanço diacrônico da humanidade. Tal concepção implicava uma avaliação do passado que procurava não tanto saber o que aconteceu, como aquilo que aconteceu e perpetuou-se como importante. (idem, 2003. p. 73)
49
P A R T E I I
PASSADO PRESENTE
50
2.1 Ambiente Natural
2.1.1 Registros Arqueológicos
Meio Ambiente Físico 29
Os registros arqueológicos, no ambiente natural, resultantes dos processos
naturais de formação e os registros das mudanças na natureza:
A Geoarqueologia ajuda a compreender como a paisagem se transformou no
tempo, como as comunidades humanas do passado exploraram e modificaram os
seus espaços, como se formaram os depósitos arqueológicos e quais são as
informações que podemos obter das análises estratigráficas e, em última análise, de
que forma os grupos humanos interagiram com o meio ambiente em que viveram.
A investigação geoarqueológica atua em diferentes escalas ao mesmo tempo:
a) macro-escala — análise do contexto de um ou mais sítios na escala
regional e análise do território; análise das modificações do ambiente no decurso do
tempo, etc.
b) meso-escala — estudo do contexto de um sítio à escala local, por exemplo,
sua posição topográfica, sua localização geomorfológica, etc.
c)micro-escala — estudo do sítio e dos seus componentes considerados no
terreno e no laboratório, a organização espacial intra-sítio, da estratigrafia, até
chegar a escalas microscópicas.
A Geoarqueologia, ocupa-se assim, da reconstituição da matriz espaço-
temporal que constitui o ambiente natural (e o cultural), de qualquer evidência
arqueológica - do artefato individual aos superartefatos (estruturas, sítios, cidades,
etc.).
As atividades da Geoarqueologia de:
1) cronologia e estratigrafia – reconstituir sucessões estratigráficas ao nível do
sítio, do local ou da região, localizar no tempo acontecimentos, estabelecer
seqüências cronológicas, etc.;
29
ANGELUCCI, Diego E. Geoarqueologia. Disponível em <http://www.ipa.min-cultura.pt/pubs/TA/folder/29/05.pdf. Acesso em 01 jan. 2008.
51
2) estudos paleoambientais – abordagens que visam a reconstituição do
ambiente físico, suas modificações no tempo e das relações com as oscilações
climáticas;
3) inter-relações entre humanos e ambiente – estudar o sistema de ocupação
e compreender as relações entre povoamento e ambiente físico, assim como a
utilização dos recursos naturais ou os efeitos do impacto antrópico sobre o território;
4) formação do registro arqueológico – estudos que se centram nos
processos de formação dos sítios arqueológicos e dos seus componentes, nas
interferências entre processos antrópicos e não antrópicos, nas modificações dos
elementos arqueológicos, na conservação dos artefatos, etc.
Na terminologia de Michael Schiffer, os processos de formação aplicados ao
registro arqueológico são como transformas culturais (c-) e naturais(n-). As
transformas c- são “leis que relacionam variáveis de um sistema cultural em
existência a variáveis que descrevem a deposição ou não deposição cultural de seus
elementos.” As transformas n- são leis relacionadas a processos não-culturais de
modificação e deterioração, por exemplo, “o pólen é preservado em solo ácido, mas
ossos são destruídos” (SCHIFFER, 1972).
2.1.2 Registro genético
A palavra “evolução” tem, quase sempre, seu significado associado às
transformações progressivas de um sistema, no decorrer do tempo. Quando
biólogos usam a palavra, eles geralmente têm em mente a formação de longo-prazo
de organismos vivos ou instituições pelo meio-ambiente. Espécies biológicas,
indivíduos, sociedades ou suas instituições são, na verdade, moldadas pelo
ambiente como resultado das respostas adaptativas produzidas em resposta aos
estímulos recebidos. Em outras palavras, evolução sempre implica em aprendizado
pela experiência. Este aprendizado pode realizar-se pelo armazenamento da
informação genética, nos cromossomos, pelo acúmulo de conhecimento e de
habilidades no organismo, ou por transmissão de costumes (práticas) e sabedoria
(sensatez) em instituições ou pela sociedade como um todo (DUBOS, 1968 p.63-64).
Os processos essenciais para sobrevivência e reprodução, via de regra, são
protegidos contra distúrbios genéticos e ambientais, ou seja, não são diretamente
52
afetados pelo ambiente. Dois olhos, um coração, a habilidade de manter a
temperatura corporal estável, o instinto de mamar na infância, o instinto sexual, a
capacidade de pensar simbolicamente e aprender uma linguagem simbólica, são
todas características que se desenvolvem em quase todos os seres humanos,
independentemente do ambiente que eles vivem. Seu desenvolvimento é codificado
na constituição genética de modo que seja minimamente afetado por fatores
externos (DUBOS, 1968 p.65).
Os ambientes nos quais os pré-humanos viveram durante o Paleolítico,
naturalmente condicionaram as atividades nas quais se engajaram, e isso, deve ter
contribuído para a determinação da carga genética que distingue a humanidade.
Similarmente, os hábitos introduzidos pela civilização moderna estão agora agindo
como forças seletivas e conduzindo a evolução humana para novas formas de
adaptação ao ambiente humano tecnicizado. (idem, 1968 p.70).
O fato é que a cultura, faz tanto parte do ambiente, como a radiação solar, a
temperatura, a chuva ou a altitude. Todos os organismos vivos conservam
evidências estruturais e funcionais do seu passado evolucionário. Entretanto as
condições sob as quais eles nasceram e cresceram, suas respostas aos estímulos,
são sempre afetadas pelas experiências do passado, que estão incorporadas em
sua constituição genética (ibidem, 1968 p.70).
Nas terras altas do leste da África, onde grande parte dos fósseis de homens
primitivos foram encontrados e onde, provavelmente, o homo sapiens surgiu como
uma espécie distinta, o clima é moderado e propicia uma ambiente físico muito
similar àqueles que a maioria dos humanos geralmente consideram ideais para a
saúde, conforto e para as atividades. Essa preferência por um clima temperado
garantiu que certas adaptações ocorressem naturalmente, entre as várias sub-raças
humanas sob a influência das condições locais em assentamentos, por longos
períodos (DUBOS, 1968 p.71).
Na vida humana muitos processos psicológicos estão ligados ainda a eventos
cósmicos. O homem moderno gaba-se de poder controlar seu ambiente externo e
ser independente dele. Mesmo quando escolhe modos de vida sem muitas
mudanças em um ambiente aparentemente uniforme, todas as funções do seu corpo
continuam a flutuar de acordo com certos ritmos ligados aos movimentos da Terra,
da Lua e do Sol. O homem moderno e seu ambiente protegido continuam sob a
53
influência das forças cósmicas do mesmo modo como era quando ele vivia nu em
contato direto com a natureza (DUBOS, 1968 p.73-74).
Por outro lado, o homem evolui como um animal social e não consegue
desenvolver nem funções normais, nem duradouras, exceto em associação com
outros seres humanos.
Nos animais, incluindo os primatas superiores, muito do comportamento é
instintivo e intelectualmente neutro. Raramente, ou quase nunca, estão relacionados
ou orientados em direção a um futuro distante que os animais tentam prever e
provocar intencionalmente. Em contraste, a resposta do homem, à maioria dos
estímulos do ambiente, são profundamente afetadas por antecipações sobre o
futuro, mesmo que essas antecipações sejam baseadas em medo, conhecimento
factual, desejo de conquista ou mera interpretação ilusória, de fatos que desejaria
que fossem realidade. (idem, 1968 p.104)
Um dos mais evidentes aspectos da vida humana é a tendência a transcender
necessidades biológicas simples. O homem tende a converter processos comuns da
sua existência em ações, representações e aspirações, sem necessidade biológica e
que podem, até mesmo, ser prejudiciais à vida. Além do mais, ele tende a simbolizar
tudo que acontece com ele e então reagir aos símbolos como se eles fossem
estímulos externos reais.
As reações humanas são tão profundamente afetadas ou influenciadas pelo
passado pessoal (individual) que elas são comumente imprevisíveis e, por tanto,
parecem completamente irracionais. Devido a mecanismos complexos todas as
percepções e apreensões da mente são traduzidas em processos orgânicos. O
corpo responde não apenas aos estímulos, propriamente ditos, mas também a todos
o símbolos associados com as memórias do passado, experiências do presente e,
as antecipações do futuro (ibidem, 1968 p.105).
A idéia de que o homem pode moldar o futuro por meio de decisões
concernentes ao seu ambiente foi claramente expressada por Winston Churchill, em
1943. Churchill resumiu o conceito da interação entre o homem e o ambiente: ‘nós
moldamos nossos edifícios, e posteriormente nossos edifícios nos moldam’.
Enquanto o ambiente, certamente, afeta o modo como o homem sente e age, mais
ainda, ele condiciona o tipo de pessoa que seus descendentes serão, porque todos
os fatores ambientais têm seus mais profundos e duradouros efeitos quando afetam
os organismos jovens durante os estágios iniciais de seu desenvolvimento. As
54
pessoas adquirem suas características (nacionais) porque são condicionadas
(moldadas) durante o início da sua vida por seus edifícios, sistemas educacionais e
modos de vida. “Esta moldagem não precisa ser apenas para a preservação do
passado. Ela pode ser orientada em direção ao futuro”. (DUBOS, 1968 p.171-172)
(NA) 30
2.1.3 Registros da terra
O princípio das escavações pré-históricas é comparado, por Leroi-Gourhan
(1987), como a leitura de um manuscrito antigo. Ambos devem ser manuseados ou
“lidos” lentamente, página a página para serem entendidos. Leroi-Gourhan compara
com uma “página de terra”, cada camada aberta e, que é preciso, gravar tudo (nos
diferentes formatos) que ela contém, antes da retirada de qualquer objeto achado.
Os “arquivos” (croquis, anotações, fotos, etc.) devem permitir estudos posteriores
após a coleta e classificação das peças.
O que diferencia, essencialmente, o manuscrito da página de terra, para ele, é
que o manuscrito pode ser relido inúmeras vezes.
A terra, porém, é um livro cujas páginas são destruídas à medida que se passam; só pode ser lido uma vez no texto original; quando uma camada de terra é retirada, tudo o que não foi transcrito está irremediavelmente perdido (LEROI-GOURHAN, 1987. p. 22).
Depois de recolhidas e classificadas, as peças, ou amostras, serão objeto de
estudos das diversas ciências correlatas como a Geologia, Geomorfologia,
Paleontologia, Física, Química, Biologia, etc., característica da condição de
multidisciplinaridade da Arqueologia.
Antes de virar a página de terra ou quando se decidir descobrir a camada que
está por baixo, já se “terá feito todo o possível para salvar o texto desta primeira
página dos arquivos” Mesmo se explorando e escavando parte do sítio, procura-se
conservar o máximo possível como ‘testemunho’ para que no futuro, provavelmente
com maiores recursos científicos, os pré-historiadores possam retomar as
interpretações (idem, 1987 p. 26).
30 DUBOS, René. So human an animal. New York:Charles Scribner’s Sons, 1968
55
A leitura do texto
O conjunto das informações sobre as peças e as variáveis envolvidas
identificadas (ferramentas, plantas, clima, etc.), sem nenhuma referencia escrita
sobre a localização das diferentes massas de documentos no tempo faz com que
esses “arquivos” pré-históricos, só possam ser lidos:
coordenando os documentos de cada época, comparando as épocas entre si e confrontando todos estes factos parcelares com factos equivalentes no mundo actual (LEROI-GOURHAN, 1987. p. 27).
56
2.2 Ambiente Cultural
Uma das bases conceituais reside na convicção que as comunidades
humanas atuaram e atuam através de processos que são legíveis e interpretáveis.
Em outras palavras, que os humanos deixam, do ponto de vista dos processos e das
dinâmicas com que agem, “assinaturas” no ambiente que, oportunamente lidas,
permitam realizar uma reconstituição comportamental e cultural das comunidades
humanas do passado.
O meio ambiente, os recursos naturais, a diversidade cultural e o patrimônio
como direito dos povos para preservação de suas identidades. Para Paulo Duarte -
“acima de tudo, preservação para a informação” e para Funari – “informação, criação
de consciência, ação no mundo, transformação, eis as metas da preservação”.
(FUNARI 1992/3 p.18-19)31
Analisaremos aqui, o ambiente cultural, e os conceitos de cidade, como
patrimônio cultural, a cidade como artefato, a cidade-sítio e a cidade como
superartefato. A cidade, aqui abordada, como um imenso laboratório permanente
para estudo das criações humanas, seu passado, presente e futuro.
Inserimos aqui, o nosso instrumento para estudo-verificação, que se utiliza do
recorte do Centro Histórico de São Paulo (CHSP):
O Centro de São Paulo “existe”, segundo os mais recentes estudos, há cerca
de 4,5 bilhões de anos.32 Pelo menos a sua “ancoragem” geográfica ou o seu
espaço físico (provavelmente muito modificado) está lá desde então. E, ainda,
segundo os mesmos estudos deverá continuar existindo por mais 4 ou 5 bilhões de
anos.
Já sabemos como surgiu o universo, mas ainda não temos certeza de como
ele irá terminar. Mas entre esse princípio e o frio (a Terra já passou, pelo menos, por
três grandes períodos glaciais), a humanidade surgiu, com sua história e sua cultura
diversificada e fascinante.
31 Memória Histórica e Cultura Material – Revista Brasileira de História. 32 Hoje, sabemos que a Terra tem em torno de 4,5 bilhões de anos. O Big Bang teria ocorrido há 15 bilhões de anos atrás; as Galáxias teriam se formado há 13 bilhões de anos; as Primeiras estrelas teriam surgido há 10 bilhões de anos; o Sol teria se formado há 5 bilhões de anos; e a Terra há 4,5 bilhões de anos.
57
Em termos históricos e culturais, o Centro Histórico de São Paulo “existe”, também,
segundo os mais recentes estudos, há mais de 450 anos. Assim como podemos
supor (ou afirmar) que o espaço físico do Centro existirá por mais 4 ou 5 bilhões de
anos talvez, possamos afirmar (ou supor) que ele existirá, também, em termos
culturais.
O que pretendemos aqui enfatizar é que o Centro Histórico de São Paulo,
assim como outros centros, históricos ou não, e também a grande maioria das
cidades existentes hoje, “existiram” no passado, “existem” no presente e “existirão”
no futuro.
Lei da Conservação das Massas Em um sistema fechado, Lavoisier verificou que a massa, durante uma transformação química, permanece constante. Através de seus trabalhos pôde enunciar uma lei que ficou conhecida como Lei da Conservação das Massas ou Lei de Lavoisier:(séc.18) "Numa reação química que ocorre em sistema fechado, a massa total antes da reação é igual à massa total após a reação". ou, filosoficamente falando, "Na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma".
Ou seja, filosoficamente falando, podemos dizer que TUDO sempre esteve
aqui e, aqui estará. Salvo, pequenas (na escala do planeta) exceções – meteoritos,
naves espaciais, restos de satélites, NADA entra ou sai da Terra. Vivemos em um
sistema fechado. Por outro lado, TUDO se transforma; e, o objetivo da Arqueologia é
justamente estudar essas transformações – naturais e as culturais, no espaço e no
tempo.
O que pretendemos nesse trabalho é propor uma maior atuação da
arqueologia histórica tanto no espaço, como no tempo. No espaço, além dos
ambientes naturais e culturais, a arqueologia também deverá atuar no ambiente
virtual. Todas as transformações sociais da cultura digital, os registros digitais, o
ciberespaço, o Pós-Humano, etc. No tempo, a arqueologia histórica estenderá seus
domínios – do passado e do presente, para também atuar no estudo, simulação,
projeção e preservação do futuro.
58
A cidade como patrimônio cultural
A cidade é uma construção no espaço. Construída em ocasiões diferentes,
por e para pessoas diferentes, a cidade pode ser vista sob as mais diversas
condições possíveis no decorrer do tempo. A cidade não é apenas um objeto
percebido, mas também o produto de inúmeras construções, em um processo
permanente onde não há um resultado final, mas uma contínua sucessão de fases.
O homem primitivo, forçado a aperfeiçoar sua imagem ambiental para adaptar
sua percepção à paisagem, podia fazer pequenas alterações em seu ambiente por
meio de sinais ou marcas em árvores para uma melhor identificação/localização,
mas as modificações substanciais ficavam restritas às moradias ou aos espaços
religiosos.
Para os antropólogos, o meio ambiente é parte integrante das culturas
primitivas; as pessoas trabalham, criam e interagem em harmonia com a sua
paisagem. Na maioria das vezes, sentem-se completamente identificados com ela;
ela representa a continuidade e a estabilidade num mundo incerto.
Em “Arqueologia da Arquitetura” (ZARANKIN, 2002), coloca que as estruturas
arquitetônicas são pensadas, desenhadas e construídas pelo homem, o que as
transforma em produtos culturais carregados de sentido e intenção. Por que não
usar então a Arquitetura para estudar o mundo social?
Para ZarankiN a Arquitetura como forma de construção física da paisagem
cultural é um dispositivo eficaz para tal fim. O autor utiliza uma abordagem
desenvolvida em um novo campo de estudo na Arqueologia, centrado na análise da
arquitetura a partir de uma perspectiva arqueológica, como alternativa para
abordagem do sistema social.
Compreende as construções como elementos ativos que interagem de forma
dinâmica com o homem e no debate de processos históricos vinculados à formação
do mundo moderno.
A “Arqueologia da Arquitetura” como uma corrente de pesquisa que abarca
todos aqueles trabalhos direcionados ao estudo da arquitetura de um ponto de vista
arqueológico – é centrado na análise de sua materialidade (STEADMAN apud
ZARANKIN, 2002).
59
A cidade como artefato
Zarankin cita o estudo da “cidade como artefato” (SCHLERETH apud
ZARANKIN, 2002), que tem como objeto o lócus urbano com dimensões e
significados próprios, destacando, entre outros estudos que também abordam a
relação entre mudança social e arquitetura, o pioneiro no estudo da construção da
paisagem – Amos Rapoport, que mistura informação vinda de diferentes fontes num
verdadeiro enfoque multidisciplinar; tendo como principal objeto das suas pesquisas
a interação entre o meio ambiente e a construção humana de seu espaço.
A análise do ambiente construído:
(...) permite que questões sociais possam ser abordadas a partir de estruturas arquitetônicas e referem-se à descoberta, por parte dos arqueólogos, de que elas podem ser “lidas”
33 da mesma forma que os
estratos arqueológicos do solo” (ORSER, 1992. p.36-37).
Para a compreensão das categorias de análise utilizadas para a leitura da
cidade - sua configuração urbana e arqueológica, contextualizadas no tempo e no
lugar, será fundamental a geração de um banco de dados capaz de compilar, cruzar,
interpretar e gerenciar, também um grande volume de informações:
a>Estudo comparativo das diferentes leituras da “cidade” objetivando a
criação de um referencial adequado à realidade da paisagem brasileira.
b>Proposição de um modelo digital capaz de simular o surgimento, o
desenvolvimento e a evolução projetada da Cidade de São Paulo.
c>Criação de um banco de dados digital coletivo e em rede, com informações:
cadastrais, históricas, pictóricas – levantamentos, mapeamentos, desenhos, pinturas
e imagens da configuração da cidade; suas relações com as redes de informação e
comunicação; as transformações e a evolução da Cidade de São Paulo: colonial (ou
mercantil), industrial e informacional.
33 NA: Segundo Castells (1999), uma das teorias que melhor se aplica na “leitura” de uma cidade está subjacente na obra de Kevin Lynch, nas imagens da cidade (LYNCH, 1997) que se utiliza das formas do ambiente construído como signos representativos dos valores dominantes da sociedade”.
60
A cidade-sítio
Beatriz Valladão Thiesen, em sua dissertação de mestrado: “As Paisagens da
Cidade: arqueologia da área central da Porto Alegre do século XIX” (PUCRS, 1999),
descreve as pesquisas de Arqueologia Histórica desenvolvidas pelo Museu Joaquim
José Felizardo destacando o “Programa de Arqueologia Urbana do Município de
Porto Alegre”34. Esse projeto, elaborado em 1997, aborda a cidade como um sítio
arqueológico utilizando o conceito de “cidade-sítio” – desenvolvido por Cressey e
Stephens35 - que permite estabelecer inter-relações das diversas unidades
presentes na cidade vista como um todo.
Para Thiesen, no entanto, o conceito de cidade-sítio, em si, não dá conta do
problema de pensar o sítio-arqueológico-cidade como objeto a ser compreendido –
“a cidade, por si só, não tem poder de criar ou gerar mudanças sociais e culturais”.
Toma então a cidade, como algo a ser compreendido sob uma perspectiva histórica,
vendo-a como parte de uma sociedade mais ampla, observando as influências que
diferentes cidades, situadas em determinado tempo e determinado local, podem
exercer sobre a sociedade ali estabelecida.
Assim, penso que fazer Arqueologia Urbana, no sentido estrito da expressão, não é fazer arqueologia na cidade, mas fazer arqueologia da cidade. Considero que se não estivermos vendo a cidade como um sítio cujas diversas partes estão inter-relacionadas, se não considerarmos que ela está inserida em uma totalidade maior, situada em um contexto histórico e espacial específico, e que pode influenciar de diferentes maneiras os fenômenos sociais e culturais que ocorrem aí, então estamos fazendo arqueologia na cidade e não da cidade. A opção por este tipo de abordagem relaciona-se diretamente à possibilidade de realizar uma nova leitura do fenômeno urbano, ou seja, olhar a cidade pelo viés arqueológico (THIESEN,1999).
34
Este Programa tem a coordenação de Fernanda Tocchetto e a colaboração de Luiz Cláudio Symanski e Shirley M. dos Santos. Pretende “integrar as diversas pesquisas sobre patrimônio arqueológico e histórico visando a compreensão dos processos de apropriação dos espaços, modos de vida e relações dos diferentes grupos humanos que ocuparam este território assim como a valorização e divulgação destes testemunhos” . 35
CRESSEY, Pamela J. & STEPHENS, John F. The city-site. Approach to urban archaeology. IN: DICKENS, Roy S. (ed.) Archaeology of Urban America. The search for Pattern and Process. New York/London, Academic Press, 1982. pp.41-61
61
Thiesen busca, então, fundamento na citação de Tânia Andrade Lima quanto
às diferenças entre a pesquisa arqueológica histórica e a pré-histórica:
A maior complexidade cultural, as tecnologias avançadas e um menor espaço de tempo decorrido faz com que o arqueólogo histórico atue mais sobre o terreno, já que os vestígios são eminentemente estruturas verticais, construções e outros tipos de depósitos não encobertos, podendo em muitos casos dispensar a escavação. Daí a necessidade do desenvolvimento de abordagens específicas para sítios históricos, já que, em muitos casos, as meticulosas técnicas utilizadas por pré-historiadores podem ser totalmente ineficientes (LIMA, 1989).
Neste caso, em termos de técnica de campo, a prospecção não é mais uma
etapa do trabalho a ser realizada em função da escavação. Aqui, esta prática é o
próprio trabalho de campo e utiliza a observação dos vestígios de superfície, através
de caminhadas, em associação ao uso de mapas, plantas, fotografias, com o
objetivo de obter, de forma mais ampla possível, as informações sobre o objeto, o
sítio, prescindindo das escavações.
Thiesen esclarece que, a própria Carta Internacional para a Gestão do
Patrimônio Arqueológico – ICOMOS, recomenda, em seu capítulo 4º (In: SAB, 1996
p.43), que se obtenha o maior conhecimento possível dos sítios, sua extensão e
natureza (KERN, 1996 apud THIESEN. P.1999).
Thiesen realizou, em seu trabalho, uma tradução dos diversos critérios
existentes neste documento, que ressalta a importância dos “inventários do
patrimônio arqueológico, existente ou em potencial, [que] são instrumentos de
trabalho essenciais para que se possam elaborar as diversas estratégias de
proteção, nos inúmeros sítios arqueológicos” (Idem:29). Além disto, a Carta
aprovada em Lausanne, em seu artigo 5º (IN: SAB, op. cit. p.43), é clara: técnicas
não destrutivas devem prevalecer, sempre que possível, sobre as destrutivas.
A cidade como superartefato
A paisagem, aqui, não tem o sentido da geografia física. Aqui a paisagem é,
acima de tudo, uma paisagem social e ela pode – e deve – ser considerada como
uma fonte importantíssima para compreender a vida dos porto-alegrenses do
passado.
62
Considera a paisagem nos termos da Arqueologia, aplicando-lhe os métodos
da cultura material, implica em pensar a relação entre sujeito que faz e objeto que é
feito. Neste sentido, a paisagem tem sido tratada como artefato por muitos
arqueólogos. Mark Leone (1996), por exemplo, em seu trabalho em William Paca
Garden, Annapolis, Maryland, mostrou como ela pode ser construída para legitimar
uma hierarquia social (THIESEN, 1999).
(...) Se história e pré-história são em parte o que nós arqueólogos criamos por vivermos e trabalharmos nesse mundo, as relações entre nosso trabalho, o passado, e a ideologia do individualismo precisa ser examinada. A abordagem crítica que utilizamos para essas análises toma como axioma central que todo conhecimento de outro tempo é produzido dentro de um contexto histórico e é um artefato desse contexto; entretanto, conhecimento é um produto da sociedade, como são aqueles que o criaram e sustentaram (HORKHEMEIER apud THIESEN, 1999).
Assim como na área central de Porto Alegre, no Centro Histórico de São
Paulo, e na grande maioria das áreas centrais das grandes cidades, as escavações
são praticamente impossíveis de se realizarem, salvo em intervenções pontuais.
Na área do Centro Histórico de São Paulo, foram realizadas apenas três escavações
significativas nos últimos anos:
As pesquisas arqueológicas realizadas no Solar da Marquesa de Santos,
Beco do Pinto e Casa N. 1 todas realizadas pelo “Programa de Arqueologia
Histórica do Município de São Paulo”, resultante da colaboração entre o Museu
Paulista da Universidade de São Paulo e Departamento do Patrimônio Histórico de
São Paulo. Esse Programa, coordenado pela Profª Drª Margarida Davina Andreatta,
teve como finalidade subsidiar algumas obras de restauração de edifícios
considerados como patrimônio histórico de São Paulo.
63
2.3 Ambiente Virtual
A evolução científica tornou possível a criação de uma "nova natureza" - a natureza tecnológica que, ao se espacializar em redes e sistemas, interfere na criação do espaço tradicionalmente real para o espaço virtual. Na primeira natureza, o homem dela participa, como um animal, sem interferir em seus processos de criação e transformação. Na segunda natureza o homem se apropria dos elementos naturais para criar os elementos para manutenção da sua vida, trabalho, abrigo, lazer, etc. Na terceira natureza, a tecnologia cria uma dimensão paralela extrapolando os limites do tempo e do espaço. O mundo dos próximos anos é o da informação e da linguagem (LÉVY, 2000).
A utilização de ambientes virtuais nas pesquisas arqueológicas é uma
aplicação que interessa muito aos arqueólogos com problemas de complexidade e o
crescente (e constante) acréscimo de dados e informações. A possibilidade de
produção de modelos, na sua maioria volumetrias de estruturas tridimensionais,
podem ser visualizados usando superfícies 3D na tela do computador.
Sabemos que a máquina (sozinha) não planeja, e não decide, o melhor (ou o
pior), o cálculo que ela produz, entretanto, prossegue continuamente em uma série
de aproximações, em tempo real, permitindo que o nosso conhecimento do futuro
possa ser simulado, utilizando um número cada vez maior de variáveis, e conjuntos
de dados maiores e mais complexos.
Estes dados, descrevem os modelos 3D em um ambiente virtual que permite,
prontamente, explorar e perceber estas estruturas complexas, de dados e
informações, em uma navegação com total interação.
Cada vez mais importante, no que diz respeito à conservação, preservação e
interpretação do imenso legado histórico, do passado, a aplicação dos ambientes
virtuais nas simulações, permite-nos concluir que estes constituem, também, uma
forma privilegiada de divulgação dos aspectos culturais, uma vez que os usuários
podem interagir com o mundo virtual, produzir diferentes modelos de conhecimento
e prospecções no futuro.
Além disso, à medida que novos dados e informações vão sendo
disponibilizados, o modelo virtual pode ser atualizado, entre arqueólogos
pesquisadores, em trabalho cooperativo e compartilhado, em rede e, em tempo real.
64
A utilização da tecnologia dos ambientes virtuais se torna, extremamente
importante para o arqueólogo em uma escavação arqueológica – uma vez que ela é
sempre destrutiva, e conforme já citado anteriormente, nas palavras de Leroi-
Gourhan, possibilita apenas uma leitura no original.
Espaço Virtual
Nos dizeres de Paul Virilio, em A Máquina de Visão (2002)36, com o
desenvolvimento da informática “o espaço passou a ser aquilo que impede que tudo
aconteça no mesmo lugar ao mesmo tempo, e o conceito tradicional de lugar perde
o sentido” Os bancos de dados e a realidade virtual substituem o contato face-a-face
e superam o real e palpável na medida em que, através deles, o acesso a
informações sobre o representante é ilimitado e instantâneo.
A tecnologia e a informação estão na base de todas as formas de utilização e
funcionamento do espaço, é a “cientificização e tecnicização da paisagem, ou
melhor, a informacionalização do espaço”. O espaço não será extinguido de nossas
paisagens, como anunciado por Virilio, mas certamente já está sofrendo profundas
transformações em sua qualidade e natureza (VIRILIO, 2002. p.68)
É aqui que, a partir de então, se dá a ‘estratégia da dissuasão’, estratégia dos disfarces, das contramedidas eletrônicas e de outros tipos. A verdade não mais mascarada, mas abolida, é a da imagem real, a imagem do espaço real do objeto, da máquina observada que dá lugar a uma imagem televisada ‘ao vivo’ ou, mais exatamente, em tempo real. Aos três tempos - passado, presente e futuro - da ação decisiva, substituem-se sub-repticiamente dois tempos, o tempo real e o tempo diferenciado. O futuro tendo desaparecido, por um lado, na programação dos computadores e, por outro, no falseamento deste tempo pretensamente ‘real’ que a uma só vez contém uma parte do presente e uma parte do futuro imediato (VIRILIO, 2002. p.95-96).
36 VIRILIO, PAUL. A Máquina de Visão. São Paulo: José Olimpio, 2002
65
Ciberespaço
Em Virtual Futures (1998), os editores Joan Broadhurst Dixon e Eric J.
Cassidy exploram a idéia de que o futuro se baseia na habilidade em articular as
conseqüências de um mundo imensamente sintético e virtual. Os artigos “anunciam”
a morte do humanismo e a ascensão do pragmatismo pós-humano. O pós-humano
aqui descrito sob uma perspectiva crítica que antecipa o próximo passo na evolução:
a integração de humanos e máquinas, vida orgânica e tecnologia.
“Onde está localizado o corpo humano no ciberespaço”? (CASSIDY, 1998).
Será ele um espaço com potencial para gerar uma “revolução molecular” ou o corpo
é o limite a ser transgredido, um sistema orgânico que migra à outros domínios da
“história epidêmica”, criando uma ciberótica se não sintética, uma segunda pele
capaz de funcionar como um site para explorar o futuro (idem, 1998).
Imaginando o ciberespaço como o espaço do nosso futuro virtual com a
promessa de uma forma totalmente nova de gestão da comunicação. Assim como,
de maneira análoga, a invenção do antigo alfabeto hebreu com a idéia de que
podíamos transcrever não mais as figuras das coisas mas o som da própria
linguagem, deu início à uma tecnologia cibernética que se difundiu tão rapidamente
e foi tão potente que só teve que ser inventada uma única vez no século XV AC.
(PORUSH apud CASSIDY 1998. p.50).
Porush descreve o método “paronomasic” (de parônimo – palavras que têm
som semelhantes), criado pelo filósofo Jacques Derrida:
1) permute e recombine as letras da palavra;2) ressuscite suas raízes escondidas e 3) associe a palavra com sua família (raízes partilhadas), você cria então, um espaço para interpretação, associação e combinação, pegue então a palavra e a reconstrua; faça trocadilhos. E no ambíguo território semântico, aberto por este irrelevante, aleatório, trivial e irracional jogo, a proliferação de novas palavras, signos e contexto semântico você descobre relações escondidas, correspondências inconcebíveis e revelações.[grifos DC]
66
Exemplos de utilização de Ambientes Virtuais na Arqueologia
1) A REAL TIME 3D STRATIGRAPHIC VISUAL SIMULATION SYSTEM FOR ARCHAEOLOGICAL ANALYSIS AND HYPOTHESIS TESTING D. Green1, J.Cosmas1, T.Itagaki1, M.Waelkens2, R.Degeest2 E. Grabczewski1
Este trabalho apresenta um sistema de simulação 3D visual das camadas
estratigráficas para análises arqueológicas e testes de hipóteses.
Visualização – camadas e os artefatos mostrados na ferramenta estratigráfica
Representação – modelo 3D das camadas
67
2) Reconstructing Leonardo’s Ideal City From Handwritten Codexes To WebtalkII: A 3D Collaborative Virtual Environment System Thimoty Barbieri HOC HyperMedia Open Center Politecnico di Milano, Italy [email protected] Paolo Paolini HOC HyperMedia Open Center Politecnico di Milano, Italy [email protected]
Este ambiente virtual (3D Networked Virtual) pode acolher vários usuários
conectados simultaneamente em um mesmo ambiente e, representá-los como
avatares, na posição de cada usuário no tempo e no espaço.
Trabalha com Ambientes Colaborativos Virtuais:
Simulação – Modelo 3D dos ambientes com as figuras dos avatares
68
P A R T E I I I
FUTURO PRESENTE
69
3.1 Civilização da Informação
Assim como a escrita, a informática oferece modelos descritivos de uma
realidade já presente. Ao redefinir a maioria das atividades cognitivas, o
conhecimento e a própria cultura, a informática modifica nossa apreensão do mundo,
instituindo uma nova era antropológica, assim como a escrita inicia a história. Do
mesmo modo que a escrita, a informática recorta as coisas de acordo com lógicas
próprias, organiza a memória social,
simula o futuro. Com uma, antes
impensável, aceleração na
manipulação dos dados estocados e
informações dinâmicas, em tempo
real, transforma nosso campo de
experiência e permite o acesso a
resultados anteriormente
inatingíveis (LÉVY, 1998. p. 35).
Assim como o alimento era a
riqueza (armazenada) do período
Neolítico e a riqueza (armazenada)
da era industrial era (ou, ainda é) a
reserva de energia solar, depositada
na natureza em forma de reservatórios de carvão, petróleo e gás natural, a
informação (em forma de conhecimento) começa a ser a nova forma de riqueza
armazenada, na transição (ou fim) da era industrial. Na era do computador, o acesso
a e o controle sobre aos dados extraídos do passado (a experiência acumulada)
permitirá, ao homem, efetivamente programar o futuro da sociedade.
A civilização atual, dessa nova era da informação, converte os dados
analógicos, estocados do passado – relatos orais, escritos, impressos, imagens
(fixas ou em movimento), em diversos formatos e mídias, em um único formato – o
digital. Permite assim, graças às informações codificadas e armazenadas em um
único meio e ao controle total de sua microestrutura, cruzamentos, modificações,
atualizações, simulações e interações. Atualmente, já podemos admitir que, a
informática já vem trabalhando mais a partir dos fluxos ininterruptos de informações
mvblogs24oct06_2
70
e de dados coletados por sensores do que propriamente com o estoque histórico de
dados (idem, 1998 p. 37).
Nosso tempo prefere, talvez, por pura questão de acessibilidade, os modelos
aos objetos, as representações e/ou as informações dos objetos e sobre os objetos.
O modelo digital é transformável por essência e, em metamorfose constante, não
opera na maioria das vezes por intervenção direta e sim pela recombinação de
dados (ibidem, 1998 p. 47).
A informatização e a prática da simulação por computador é quase sempre
uma tentativa para ampliar o campo do possível, não dedutível anteriormente, às
custas do virtual. Um dos primeiros efeitos do uso da simulação digital, ao estudar o
comportamento do modelo antes de comparar os resultados com o fenômeno nas
suas reais dimensões é conferir um caráter experimental à disciplina.
Seria extremamente importante podermos ter uma idéia, por exemplo, da
imagem que os homens do Paleolítico faziam do universo. A arte pré-histórica nos
mostra uma organização e uma seleção de figuras desconcertantes que, até pouco
tempo, via-se nela uma arte essencialmente mágica, mas parece tratar-se de uma
construção mitológica ordenada de forma linear e repetida (LEROI-GOURHAN, 1965
p.136). A documentação da arte de pintar e esculpir, é abundante e precisa,
permitindo estabelecer a mais longa trajetória evolutiva conhecida – do ano 30 000
a.C até cerca de 8000 a.C. Fato marcante é que as marcas rítmicas são anteriores
às figuras explícitas, mas integram-se em um contexto único, tornado mais explícito
pelos símbolos visuais.
Não são caçadores inspirados, traçando formas aleatórias de deusas e
animais em um momento qualquer. A arte abstrata produzida “é antes o
desenvolvimento extremamente lento (mais de 10 mil anos) dos esforços de
tradução manual de um conteúdo verbal já dominado”. “É por ter qualquer coisa para
exprimir que o Paleolítico elabora as suas associações de símbolos”.(ibidem, 1965
p.188).
71
Dez mil anos mais tarde, em Lascaux, e quinze mil anos depois na Sicília, os mesmos elementos, dificilmente
reconhecíveis devido ao seu realismo e habilidade, continuarão a estar presentes, apresentando as mesmas relações que poderiam estabelecer-se entre certos grafitos paleocristãos, os mosaicos de Ravena e os frescos de uma basílica do século XX. (idem, 1965 p.188).
Desde as pinturas rupestres até o aparecimento da imprensa, as imagens
produzidas pelos homens eram as marcas de gestos. Com as técnicas de gravura e
reprodução, apenas a imagem original tem essa condição.
Num outro domínio, a expressão figurativa define-se por comparação com o
mundo real, ou ao menos como este é sentido e, pode, independentemente do meio,
‘ater-se’ ao real. A evolução do realismo na arte paleolítica mostra que a figuração
está sujeita a um processo de amadurecimento que busca uma aproximação cada
vez maior à reprodução fisicamente exata. Com as inovações técnicas, os ganhos
de precisão parecem corresponder, salvo em obras-primas, a um esfriar das
impressões transmitidas (LEROI-GOURHAN, 1965 p.196).
Tal como virá a suceder nas culturas ulteriores, são, pois, as imposições técnicas que acabem por determinar a geometrização da decoração. Elas originam uma evolução comparável à da escrita, isto é, a perda progressiva do tema figurado e a formação de uma série de signos. A geometrização surge pois, como um aspecto da extrema esquematização. (LEROI-GOURHAN, 1965 p.199).
Na simulação digital fica evidente que o gesto do artista deu lugar a atividades
abstratas de análise e programação. A imagem digital, por sua vez, é resultado de
um cálculo, de um programa e, em última análise é um arquivo de dados, ou melhor,
LASCAUX.CABALLO CHINO
72
um banco de dados. “Na arte do computador, o ‘gesto’ não é senão uma das
modalidades do processamento em tempo real” (LÉVY, 1998 p. 42).
A prática da simulação impõe a necessidade de explicitar e justificar a escolha
de variáveis, bem como formular uma descrição quantitativa exata das supostas
relações de causa e efeito. A possibilidade de construir modelos, formular hipóteses
e poder testá-las, aproxima fortemente, principalmente para os objetivos deste
estudo, a Arqueologia, das ciências exatas, ao menos no plano metodológico das
pesquisas.
A informática, ao dar acesso à simulação de modelos digitais e a formalização
rigorosa dos procedimentos da pesquisa, pode conferir um inédito caráter de rigor e
precisão às ciências humanas seria, portanto, mais do que um instrumento científico,
seria capaz de fazer a disciplina passar ao estatuto de ciência exata.
73
P A R T E I V
PRESENTE FUTURO
74
4.1 Instrumento para Estudo-Verificação
O sistema projetado pretende acompanhar toda dinâmica de um sítio
arqueológico histórico urbano. As possibilidades de acesso e armazenamento dos
dados e das informações, surgidas com as novas tecnologias das telecomunicações
e da informática, promovem uma nova unidade de informação. Os registros agora
armazenados em bancos de dados conduzem a uma memória descontínua e não
linear valorizando a memória coletiva e, operando conjuntamente com as
informações dinâmicas do tempo real, permitem a produção de novas informações.
Os ambientes virtuais, agora uma “realidade”, graças as redes interativas,
permitem ligações entre pesquisadores e o compartilhamento de valores materiais e
imateriais, em tempo real (on-line), o que permite além das ações coletivas, antes
impossíveis (nesse nível e nessa velocidade), uma nova forma de conhecimento que
se autoconstrói.
(...) uma memória ativa, que se cria e recria sem cessar, que constitui um estoque em permanente confronto com a realidade, é reavaliado e permite não só que se acrescentem conhecimentos aos que já se têm, mas também nos permite saber como gerenciar o que se sabe (ROSNAY, 2006. p.45).
Para este estudo, construímos inicialmente um banco de dados procurando
resgatar e compilar em um mesmo meio (o digital), todos os dados disponíveis nos
mais diversos formatos: relatos orais, textos, relatórios de pesquisas, fotos, croquis,
mapas, desenhos, imagens, etc. Provenientes, também, de diversas fontes: estudos,
pesquisas, teses, dissertações, monografias e até de banco de dados eletrônicos
como o de Sistema de Gerenciamento de Patrimônio Arqueológico do IPHAN.
Do histórico dos assentamentos, das incontáveis implantações e usos e
ocupações do sítio (CHERMANN, 2007) as pesquisas arqueológicas realizadas
(ANDREATTA,1980;1991), de um possível retrato do sítio atualmente e das
necessidades de estabelecimento de limites físicos, culturais e, para este estudo
limites ou possibilidades virtuais.
A construção de um modelo digital, do Sítio Arqueológico do conjunto do Pátio
do Colégio e do seu entorno imediato o Centro Histórico de São Paulo, e uma
simulação possível (novas escavações) utilizada como exemplo (idem, 2007) das
possibilidades de manipulação e cruzamento dos dados com as informações do
tempo real.
75
O Centro Histórico da Cidade de São Paulo (CHSP)
Sítio do Pátio do Colégio
37
4.1.1 Histórico
No dia 25 de Janeiro de 1554 um grupo de 12 jesuítas, dos quais fazia parte
José de Anchieta, comandados por Manoel de Paiva e a mandado de Manoel da
Nóbrega, celebraram uma missa oficializando a fundação da cidade de São Paulo. A
cerimônia ocorreu num altar improvisado em uma cabana de madeira, construída
pelo cacique Tibiriçá, de 14 passos de comprimento por 10 passos de largura, junto
à encosta do Tamanduateí, no atual Pátio do Colégio.
A colonização do local tinha ordens religiosas e jesuítas que tinham como
tarefa perpetuar uma visão cristã e pregar uma ideologia entre os nativos da região.
Houve resistência da cultura indígena, ao mesmo tempo em que os bandeirantes
paulistas, interessados em aprisionar os índios, entravam em conflito com os
catequizadores.
O colégio, erguido em uma encosta, foi uma decisão estratégica e funcionava
como uma fortificação: os jesuítas pensavam em se proteger tanto dos bandeirantes
quanto dos próprios índios. Essa humilde cabana de pau-a-pique, cujas paredes
eram feitas com uma armação de paus e cipós preenchida de barro socado,
desprovida do mínimo conforto, abrigava também um seminário e uma escola.
Esta colina triangular é quase plana, com altitudes variando de 750 a 760 metros, mas cercada por um forte desnível, de cerca de 30 metros em relação aos cursos d´água que a delimitam - de um lado, estava o Tamanduateí e, de outro, o Ribeirão Anhangabaú. É uma acrópole que abrigou a cidade em seus três primeiros séculos de existência (TOLEDO, 2004. p.9).
Dentro dessa colina três ruas configuravam o chamado Triângulo: A Rua
Direita de Santo Antonio (atual Direita), a Rua do Rosário (15 de Novembro) e a Rua
37 Ilustração – Fotomontagem (CHERMANN, 2007)
76
Direita de São Bento (atual São Bento). As Ruas "Direitas" (de São Bento e de Santo
Antonio) eram planas, retas e se cruzavam em ângulo reto, fato único na cidade,
razão por que este ponto era conhecido como "quatro cantos". (TOLEDO, 2004 p. 9)
Todas as principais funções da Imperial Cidade de São Paulo se
concentravam em um triangulo maior formado pelos conventos de São Francisco,
São Bento e Carmo.
O colégio foi construído em uma escarpa que permitia acesso praticamente
por apenas um lado. Assim, o edifício era também uma fortaleza. A melhor
descrição, talvez, seja a carta que Morgado de Mateus fez em carta ao marques de
Pombal, então conde de Oeiras, em 1766:
Está edificada a cidade de São Paulo, no meio de uma grande campina, em um sítio elevado, que a descobre toda em roda. O seu terreno é brando e tem a ruas planas, largas e direitas, e algumas bem compridas, porém não são calçadas, todas as paredes do edifício são de terra; os portais e alisares de pau, por ser muito rara a pedra, mas não deixa de ter conventos e bons templos, e altas torres da mesma matéria com bastante segurança e duração (TOLEDO, 2004 p.11).
Em 1556, o padre Afonso Brás, precursor da arquitetura brasileira, foi o
responsável pela ampliação da construção original, que recebeu oito cubículos para
servir de residência aos jesuítas. Uma disputa entre colonos e religiosos culminou
com a expulsão dos jesuítas no ano de 1640, cujo regresso só aconteceu 13 anos
depois.
Em 1653, foi construído um anexo ao colégio, onde foram instalados os
primeiros cursos de filosofia, teologia, artes, biblioteca e capela, ocupando uma área
de 1.502,52 metros quadrados. Para essa construção, foi utilizada a técnica de taipa
de pilão, em que as paredes são feitas de barro, comprimidos em forma de madeira.
Houve mais uma ampliação em 1745, e o Colégio foi incorporado ao edifício
principal em uma ala perpendicular na lateral direita. Os jesuítas foram expulsos
novamente, por decreto do Marquês de Pombal em 1759, com repercussão mundial
que resulta na supressão da Companhia de Jesus, que só será recobrada no ano de
1954.
O governo então, se apropria dos bens da Companhia de Jesus e o antigo
casarão colonial é completamente descaracterizado por profundas reformas até se
transformar no Palácio dos Governadores no período entre 1765 e 1908. Foi nessa
época também, em 1896, que a igreja perdeu seu precioso patrimônio como
conseqüência de um desmoronamento de causas desconhecidas.
77
Em 1932, o então Palácio do Governo é transformado na Secretaria da
Educação o que de certa forma, dá ao edifício uma função mais próxima de sua
vocação original. Este acabou por ser demolido em 1953, permanecendo
remanescentes a Cripta, parte de uma parede em taipa de pilão e o antigo torreão;
autenticas relíquias da cidade.
Na comemoração do IV centenário da cidade, em 1954, a Companhia de
Jesus recebe de volta as instalações. Iniciou-se então, uma campanha para construir
e restaurar mais uma vez o importante símbolo para a cidade – uma edificação que
remetesse as antigas construções do sítio jesuítico inicial da cidade.
Foi então concluída a construção do colégio e a torre da igreja, então réplicas
da terceira construção no local da fundação. As obras da primeira etapa foram
custeadas pela generosa contribuição do povo paulistano e em 1975 foram iniciadas
as obras da construção da igreja anexada a torre, finalizadas em 1979.
Auxiliado por historiadores e jesuítas, o arquiteto Paulo Gomes Cardim
assumiu o projeto de reconstrução e elegeu a partir da iconografia existente, uma
configuração a ser reproduzida, porém, há controvérsias quanto à escolha
apreendida.
Aparentemente foi reproduzida de maneira pouco criteriosa a cobertura da
Igreja e a posição atual dos edifícios não correspondem rigorosamente a das antigas
construções, resultado da intenção de preservar a antiga fundação encontrada no
processo de construção. O Colégio e a Torre da igreja foram concluídos em 1971.
Atualmente, quem visita o complexo Pátio do Colégio encontra o Museu
Padre Anchieta, a Capela Beato José de Anchieta, onde estão guardados o Fêmur
de José de Anchieta e seu manto, a Cripta Tibiriçá, e uma Biblioteca temática
constituída por obras gerais, raras e especiais sobre a história da cidade de São
Paulo.
Escola, seminário, Palácio do Governo, Secretaria de Estado e museu. Por
todas essas transformações passou o sítio onde se originou a cidade de São Paulo.
Caracterizado por suas reformas, destruições, e reconstruções, o Pátio do Colégio,
hoje, se identifica com as etapas reveladoras de um processo pelo qual passou e
passa a cidade de São Paulo.
Em 1974, o arquiteto Jorge Wilheim foi contratado pela Emurb para "dar um
jeito naquele local abandonado". Ele redesenhou a paginação do piso, reconstituiu e
liberou os taludes e seu plantio com espécies nativas, preservou a parede-
78
testemunho de taipa, implantou algumas luminárias antigas a gás e um cruzeiro
comemorativo e simbólico. Wilheim tomou como partido respeitar ao máximo o local
da fundação da cidade:
(...) além de ser uma réplica discutível de um original pouco documentado, está destruindo precisamente aos poucos, restos autênticos desses mesmos originais e desfigurando outro bem cultural autentico – o sítio urbano. A igreja recriada foi a terceira erguida no local e nada tem a ver com a fundação da cidade. A inicial desapareceu. Da segunda, construída quando ainda existia a original, e, portanto, fora de seu limite, restou um muro de taipa. E da terceira de pedra e barro, construída no século XVII, restaram os alicerces (WILHEIM, 1974).
O atual edifício do Pátio do Colégio é rodeado por um significativo conjunto
arquitetônico: o Solar da Marquesa - um raro exemplar de residência urbana do
século XVIII -, O Beco do Pinto - uma passagem que ligava a antiga Rua do Carmo à
várzea do rio Tamanduateí, e a Casa nº. 1.
Logo ao lado do Pátio, situa-se o imóvel conhecido como Casa nº. 1, por
situar-se à antiga Rua do Carmo nº. 1 - atual Rua Roberto Simonsen nº. 136-B. É
um sobrado de três andares construído onde existiu até o ano de 1870, uma casa de
taipa-de-pilão, no estilo bandeirista. Seu primeiro proprietário, segundo registros de
1689, foi Francisco Dias.
Em 1855, foi instalado o colégio "Ateneu Paulistano" e a nova construção
aproveitou, provavelmente, a antiga estrutura das fundações em taipa-de-pilão.
Sobre ela ergueram-se novas paredes em alvenaria de tijolos. Outros materiais
utilizados em sua construção como o pinho-de-riga nas esquadrias, e a telha tipo
francesa na cobertura, tornaram-se comuns nas construções paulistanas desse
período.
Em 1890, funcionou como sede da Estação Central de Urbanos e da
Sociedade de Imigração. Quatro anos mais tarde, o imóvel foi adquirido pelo
Governo do Estado e passou a abrigar escritórios da Cia. de Gás até o ano de 1910.
Em seguida, durante quatorze anos, a Casa foi propriedade da Polícia tendo
passado ao longo desse tempo, por várias reformas e reparos de urgência.
Entre 1971 e 1974, já sob administração municipal, o imóvel foi utilizado por
instituições culturais e, em 1976, foi elaborado pelos técnicos do Departamento do
Patrimônio Histórico (DPH), um projeto de restauro.
79
Com a conclusão das obras de restauro, a Casa foi inaugurada em julho de
1980, abrigando a sede do DPH e, posteriormente, o Gabinete da Secretaria
Municipal de Cultura. Interditado para obras de emergência em 1985, que foram
realizadas somente a partir de 1988. O prédio foi ocupado em 1990 pela Divisão do
Arquivo Histórico Municipal, que ali permaneceu durante dez anos.
Parte integrante do acervo de casas históricas sob responsabilidade do DPH,
da Secretaria Municipal de Cultura, a Casa nº1 constitui um belo exemplo de "chalé
urbano", sendo hoje testemunha remanescente das habitações do século XIX e da
constante expansão urbana.
Entre a Casa n.1 e o Solar da Marquesa, e conhecido como Beco do Colégio
na São Paulo colonial, o Beco do Pinto era uma passagem que ligava a antiga Rua
do Carmo à várzea do rio Tamanduateí.
Em 1834, a Marquesa de Santos, ao comprar o Solar de um dos herdeiros do
Brigadeiro Pinto, conseguiu da Câmara o fechamento da passagem. Reduzido a
depósito de lixo após a abertura da ladeira do Carmo em 1912 (atual Avenida
Rangel Pestana) o beco ficou fechado por várias décadas. Aberto em 1992, o local
tornou-se também parte do circuito cultural da cidade, oferecendo atividades
diferenciadas como shows, exposições e feiras diversas.
O Solar da Marquesa foi originado da junção de duas casas de taipa-de-pilão
localizadas na antiga Rua do Carmo. Não há dados precisos sobre a data de
construção do imóvel, no entanto documentos indicam a existência de casas entre
1739 e 1751. Sua mais célebre proprietária foi Maria Domitila de Castro Canto e
Melo, a Marquesa de Santos, que morou no imóvel de 1834 a 1867, período em que
o espaço ficou conhecido como Palacete do Carmo.
Adquirido em 1909 pela The São Paulo Gaz Company, o espaço sofreu
algumas modificações para adaptar-se a nova função. Paredes e janelas foram
demolidas e as portas transformadas em vitrines. Um pátio na lateral direita do lote
foi aberto e anexos foram construídos. Incorporado ao patrimônio municipal em
1975, o espaço passou a funcionar como sede da Secretaria Municipal de Cultura.
Após a reabertura, em 1992, o imóvel passa a abrigar a Divisão de
Iconografia e Museus do Departamento do Patrimônio Histórico Municipal, assim
como exposições e eventos culturais. Atualmente, está vazio, apenas com uma
pequena exposição provisória.
80
A "cidade de taipa"
A complexidade da cidade de São Paulo devido as suas intensas e
constantes modificações exige trabalhos de documentação arqueológica de
descobrimento, estudo e conservação deste patrimônio, buscando uma coexistência
entre a cidade antiga – a "cidade de taipa", a presente e a futura.
No caso do Pátio do Colégio, os testemunhos remanescentes são: a parede
de taipa de pilão que, segundo as cartas do Padre José de Anchieta, foi edificada
com o suor de um jesuíta, o Padre Afonso Brás, e dos índios catecúmenos, e as
fundações da igreja do século XVII, a terceira concluída em 1671.
Essa fundação, ora seriamente danificada, é de limonita – pedra obtida no
lago da Foca (hoje Praça da Liberdade), e apresenta do ponto de vista técnico, uma
singularidade: feita de pedra assentada com barro, o que representa a conjunção de
duas técnicas.
Em 1585, o então provincial da Companhia de Jesus, Padre José de
Anchieta, em descrição às casas missionárias instaladas nas diferentes capitanias,
ao se referir ao Colégio de Piratininga, cita com precisão a localização de "um poço
de boa água".
Baseado na leitura das informações de Anchieta foi idealizado, em 2003, um
projeto de prospecção arqueológica no sítio mais antigo da cidade. O trabalho de
campo realizado em 2004 pela arqueóloga Marizilda Couto Campos, em busca dos
vestígios do poço de Anchieta, apoiou-se no levantamento geofísico realizado
através de radar, uma metodologia de alta resolução.
O levantamento foi executado em toda área externa. A antena do radar
utilizada foi a de 250 MHz, blindada, apropriada para prospecções arqueológicas e
capaz de identificar estruturas (paredes, buracos, poços etc.) e objetos descartados
no decorrer da utilização do local.
A partir da interpretação dos dados obtidos, foram localizados sinais
indicativos que poderiam estar relacionados com o poço, como também outros
elementos correspondentes à antiga estrutura do antigo colégio. Os vestígios foram
então mapeados, permitindo à equipe propor sondagens que permitirão recuperar os
objetos e estruturas atualmente soterradas.
Um projeto de escavação amplo e sistemático no subsolo do Pátio permitirá
resgatar informações para uma compreensão maior da história de São Paulo e das
81
diversas etapas de seu desenvolvimento, sobretudo em seu aspecto físico e
material.
Usos e Ocupações
Tombado pelo Departamento do Patrimônio Histórico em setembro de 1988, o
Pátio do Colégio, atualmente, conta com o Museu Padre Anchieta, a Capela Beato
José de Anchieta - onde estão guardados o Fêmur de José de Anchieta e seu
manto; a Cripta Tibiriçá, e uma Biblioteca temática constituída por obras gerais, raras
e especiais sobre a história da cidade de São Paulo.
No pavimento térreo, uma pequena sala com imagens fotográficas históricas
e uma maquete da cidade de São Paulo no século XVI, logo ao lado, tem o Café do
Pátio – um café-restaurante. As mesas ficam na parte de fora, e, por estarem ao
lado da parede de taipa-de-pilão, acabam ofuscando a importância desta.
A parte posterior desse conjunto está ocupada pelo estacionamento da
Associação Comercial, impedindo o uso do espaço público que lá se encontra. Este,
por sua vez, cercado por grades de proteção, bloqueia a circulação por toda a praça.
Ainda no pavimento térreo, existe uma pequena oficina de artesanato e uma
pequena loja de lembranças com motivos indígenas. No centro encontra-se uma
"praça" onde, há dois anos, foram construídas algumas coberturas de estrutura
metálica com acrílico, para abrigar festas de casamento e comemorações de
empresas, e outros tipos de eventos podendo acomodar até 400 convidados.
O projeto de Jorge Wilheim de 1974, já mencionado anteriormente, visava
evidenciar a parede histórica. Porém, com a implantação desta cobertura, tendo de
um lado as mesas do Café e de outro, carros estacionados, esta relíquia de taipa-de-
pilão acaba ficando totalmente escondida.
No primeiro pavimento fica o Museu Anchieta. Em seu acervo, estão a pia
batismal que pertenceu à primeira igreja construída pelos jesuítas em Piratininga e
onze telas dos séculos XVII, XVIII e XX, todas restauradas. Além disso, cerca de 600
objetos como telas, esculturas e algumas réplicas integram as coleções, hoje
expostas.
Na Cripta Tibiriçá estão evidentes os alicerces de pedra ferruginosa
remanescentes da igreja seiscentista que foram encontrados durante a construção
82
da nova igreja de 1971. Esse espaço abriga exposições relacionadas ao Pátio do
Colégio e à história da cidade de São Paulo.
A biblioteca temática se encontra no subsolo da Cripta, e seu arquivo possui
livros, documentos, mapas, periódicos, etc.; todos referentes à história de São Paulo
e do Pátio.
A igreja, concebida em 1974, celebra missas diariamente ao meio dia e
também casamentos. Tendo sido anexada posteriormente ao conjunto, fez com que
a relação do Pátio com a Rua Anchieta ficasse mal resolvida, pois deixou muito
pouco espaço entre a calçada lateral do Pátio e a rua.
Bens Tombados – Leis deTombamento
Os imóveis que fazem parte deste conjunto arquitetônico, citados
anteriormente foram tombados visando preservar, através da aplicação de legislação
específica, seu valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor
afetivo para a população.
No caso da cidade de São Paulo, o Tombamento é regido pelas Leis nº
10.032 de 27 de dezembro de 1985 e nº 10.236 de 16 de dezembro de 1986. O
órgão responsável pela preservação dos bens culturais paulistanos no âmbito
municipal é o CONPRESP (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio
Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo) que tem por atribuição
deliberar sobre os pedidos de tombamentos de bens culturais38.
Também o DPH (Departamento do Patrimônio Histórico) tem essa atribuição
na medida em que, além de ser o órgão técnico de apoio do CONPRESP, mantém
sob sua responsabilidade a salvaguarda de diversos acervos, como edifícios,
documentos, fotografias, mobiliário, obras de arte, etc.
Os três órgãos do governo voltados à proteção de bens culturais são: o
CONPRESP como pelo CONDEPHAAT (Conselho de Defesa do Patrimônio
Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo), ou pelo
IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), que são os três órgãos
do governo voltados à proteção de bens culturais. Um edifício pode ser tombado por
essas três esferas do governo.
38 Informações obtidas no site www.dph.com
83
O município reconhece decisões de tombamento efetuadas pelo Estado
(CONDEPHAAT) e pelo Governo Federal (IPHAN); e o Estado (CONDEPHAAT)
reconhece aquelas tomadas pelo Governo Federal (IPHAN). O tombamento, como
qualquer outra lei, estabelece limites aos direitos individuais, com o objetivo de
resguardar e garantir direitos e interesses comuns do conjunto da sociedade. A
definição de critérios para intervenções físicas em bens culturais tombados, objetiva
assegurar sua integridade, considerando-se o interesse da coletividade.
De acordo com as leis de tombamento, um imóvel tombado ou em processo
de tombamento pode ser reformado, porém deverá ser previamente analisado pelo
DPH e CONPRESP. A aprovação depende do nível de preservação do bem e está
sempre vinculada à obrigatoriedade de serem preservadas as características
construtivas que justificaram seu tombamento. O DPH fornece, gratuitamente,
assessoria aos interessados em restaurar ou conservar edificações tombadas.
A mudança de uso também pode ser aprovada, porém, deve ser levada em
consideração, a adequação entre a preservação das características do edifício e as
adaptações necessárias ao novo uso.
84
4.1.2 Projeto – Arqueologia Histórica
Arqueóloga Responsável – Margarida Davina Andreatta
Documentação Fotográfica – Michel Robert Alves de Lima
CASA N. 1 DO PÁTEO DO COLÉGIO
Rua Roberto Simonsen, 136 –B
SP, Julho de 1980
PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO
PAULO
Prefeito Reynaldo Emydio de Barros
SECRETARIA MUNICIPAL DE CULTURA
Secretário Mário Chamie
DEPARTAMENTO DO PATRIMÔNIO
HISTÓRICO
Diretor Murilo Marx
MUSEU PAULISTA DA UNIVERSIDADE DE
SÃO PAULO
Diretor Setembrino Petri
De acordo com o programa de colaboração firmado entre o Departamento do
Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura e o Museu Paulista da
Universidade de São Paulo, foram realizadas pesquisas arqueológicas na cidade de
São Paulo nos locais: Casa do Tatuapé e Casa N.1 - Pátio do Colégio (Sé).
Este trabalho contou com a colaboração dos técnicos da Divisão de
Preservação e da Divisão de Iconografia e Museus, além de pós-graduandos da
USP, a fim de interpretar a ocupação espacial, através das evidências deixadas
pelos habitantes no decorrer do período histórico dos séculos XVIII e XIX.
As evidências arqueológicas encontradas nas pesquisas constam de: lítico,
cerâmica; vidro, osso, couro, metal, semente, tijolo, raiz, valvas de molusco, inseto e
carvão vegetal.
Sítio Arqueológico Histórico Pátio do Colégio – SP
85
Casa N. 1 - Pátio do Colégio
O interesse inicial da pesquisa no quintal da Casa N. 1 do Pátio do Colégio foi
a realização de uma prospecção, a fim de verificar a possível presença de material
arqueológico.
A prospecção constou da execução de uma trincheira nas seguintes
dimensões:
> largura – 2 m
> comprimento – 8 m
> profundidade – 2,50 m
No corte estratigráfico da trincheira foram evidenciadas através da escavação,
níveis horizontais sucessivos com abundantes evidências arqueológicas,
apresentadas por lítico, fragmentos de louça, cerâmica, vidro, marfim, metal, tijolos,
telhas e carvão vegetal.
Os resultados obtidos nesta prospecção sugerem a continuidade das
pesquisas no quintal da Casa N.1 do Pátio do Colégio, para uma possível
reconstituição do ambiente que traria maiores subsídios ao estudo do processo do
desenvolvimento histórico de São Paulo.
Expomos, a seguir, a continuidade das pesquisas realizadas:
Pesquisas Arqueológicas
O foco dinâmico e científico pode ser obtido na associação dos testemunhos
arqueológicos, históricos (a escrita e a oral) e os arquitetônicos. A
interdisciplinaridade proporciona a atuação em conjunto com outras ciências, na
troca e na complementação de informações – além dos dados teóricos e
metodológicos – que auxiliam o arqueólogo nas diferentes etapas de pesquisa.
A aplicabilidade de métodos e técnicas utilizados por Marc Bloch (apud
CUSTÓDIO, 1984), Leroi-Gourhan (1987), Andreatta (1981) e Orser (1992) permite
“a leitura estratigráfica inscrita no próprio patrimônio industrial sedimentado na
superfície e os resgates dos espaços e dos testemunhos”, que se referem “a
qualquer atividade humana, que possam ou não serem removidas do sítio
arqueológico” (SANTOS, 1995).
86
Figura 1 – Pesquisa Arqueológica Solar da Marquesa
Acervo Museu Paulista -USP
Sítios Arqueológicos
As pesquisas arqueológicas realizadas no Solar da Marquesa de Santos, Beco do
Pinto e Casa N. 1 foram realizadas conforme o “Programa de Arqueologia Histórica
do Município de São Paulo”, resultante da colaboração entre o Museu Paulista da
Universidade de São Paulo e Departamento do Patrimônio Historio de São Paulo.
Esse programa, coordenado pela Profª Drª Margarida Davina Andreatta, teve como
finalidade subsidiar algumas obras de
restauração de edifícios considerados como
patrimônio histórico de São Paulo.
Solar da Marquesa de Santos
Considerado como um dos últimos
exemplares de arquitetura residencial
urbana do século XVIII existente em São
Paulo, o Solar da Marquesa de Santos foi
pesquisado em duas etapas. A primeira, em
1986, época da elaboração do Projeto de
Restauro e Conservação e, em 1991, época de execução da obra (Figura 1).
A pesquisa arqueológica, acrescida de informações históricas e
arquitetônicas, forneceu dados para subsidiar a caracterização, restauro e
preservação do imóvel.
O Solar situa-se na atual Rua Roberto Simonsen, nº 136 B (antiga Rua do
Carmo nº 3). Ao longo dos anos o imóvel passou por uma série de modificações de
caráter estrutural e, também por vários proprietários.
A sucessão de proprietários, conforme registros em documentação, se deu a
partir de 1712 com André Álvares de Castro.
Em 1834, a propriedade foi adquirida pela Marquesa de Santos e tornou-se
importante referência na vida da aristocracia paulistana no século XIX.
Após o falecimento da Marquesa de Santos, ocorrido em 1867, o imóvel
passou a abrigar o Palácio Episcopal da Mitra Paulistana e,depois de uma década
de ocupação, foi alvo de reforma. Acredita-se que a feição neoclássica do edifício
vem dessa época.
87
A partir de 1909 a São Paulo Gaz Co. Ltd. comprou o imóvel e adaptou-o para
atender as necessidades de uma loja e de dependências administrativas ao nível
térreo e como morada do gerente no pavimento superior. Foram inúmeras as
alterações realizadas pela Companhia de Gás no período em que ocupou o edifício.
Buscando recuperar a feição colonial do edifício foi realizada por volta de
1965 uma nova intervenção, porém, sem rigor nos critérios adotados.
Contudo, em 1971, o imóvel foi reconhecido oficialmente como patrimônio
histórico pelo ato de tombamento determinado pelo CONDEPHAAT, conforme
processo nº 07.852/69.
Casa N.1
A Casa N.1 é remanescente das
manifestações ecléticas na cidade de São Paulo, a
partir do último quartel do século XIX, e documenta
o modo de habitar das classes abastadas paulistas.
Dentro dessa tendência, tem-se o aparecimento do
chalé, um tipo de edificação apropriado para
residências suburbanas, que foi adotado na
atmosfera romântica européia do início do século
XIX..
Essas construções começaram a surgir em
São Paulo durante a inflação ocasionada pela Guerra do Paraguai e também pela
falência do Banco Mauá, cuja moratória tinha sido obtida em 1875. Essa crise
financeira teria estimulado o paulistano a empregar seu dinheiro na aquisição de
terrenos e na construção de edifícios ao invés de guardar o dinheiro em bancos.
O edifício foi levantado na Rua do Carmo (atual Roberto Simonsen) na
esquina do Beco do Colégio ou do Pinto, onde havia anteriormente uma velha casa
de taipa de pilão que abrigou algumas figuras paulistanas (como os padre Ramalho
e o padre Moura) e o colégio Ateneu Paulista. Em seu lugar, ergueu-se o sobrado
sobre as fundações de pedra, com suas paredes autoportantes constituídas de
alvenaria de tijolos (Figura 2).
O major Benedito construiu o imóvel para sua residência, mas abandonou-o,
por razões desconhecidas, oito anos mais tarde.
Figura 2 Casa N.1 Acervo Museu Paulista -USP
88
Figura 3 Beco do Pinto anos 50
Acervo Museu Paulista -USP
Em 1890, o imóvel abrigou a Estação Central de Urbanos e a Sociedade de
Imigração. A partir de 1894, foi adquirido pelo governo do estado e passou a abrigar,
até 1970, vários órgãos ligados à polícia. A partir de 1988 a Casa N.1 testemunha
uma fase crucial da história da cidade de São Paulo, caracterizada pela expansão
física e reconstrução intensas, etapa inicial do processo que levou a pequena cidade
ao patamar de megalópole.
O Departamento do Patrimônio Histórico (DPH) foi incumbido da restauração
da Casa N.1. As obras foram realizadas no período de 1988 a 1990.
Beco do Pinto
O Beco do Pinto ou do Colégio
localiza-se entre a Casa N.1 e o Solar da
Marquesa de Santos, na Rua Roberto
Simonsen 136A – Sé. A dimensão da área
corresponde a 3,80 de largura e 28 m de
comprimento (Figura 3).
O beco foi utilizado durante muitos
anos como área de refugo. A antiga calçada
em tijolos, construída no século XIX, havia
sido aterrada e revestida com asfalto.
As interferências adotadas nas pesquisas de campo seguiram a técnica
etnográfica aplicada por Andreatta no período de 1981 a 1995, nos diferentes
contextos de sítios históricos brasileiros. As escavações etnográficas estão
relacionadas às atividades humanas cotidianas, assim são realizadas em unidades
de habitação, em áreas de passagem, em cozinhas, em áreas de refugo (lixão), em
áreas de circulação, indícios de acesso, enfim nas áreas que apresentam atividades
humanas diversas. Em conformidade com essa técnica, buscou-se evidenciar os
vestígios culturais no interior e no exterior das áreas edificadas (Figura 4) (SOUZA,
1997).
89
Figura 3 BP_calçada junto à parede C1
Acervo Museu Paulista USP
Pesquisas arqueológicas
Após os estudos das fontes documentais e iconográficas e da análise
arquitetônica e estilística dos elementos do Solar da Marquesa de Santos e da Casa
N.1, foram adotados os seguintes procedimentos em campo:
> abertura de trincheiras (Figura 5);
> numeração e divisão dos
cômodos em setores, afim de
sistematizar os trabalhos;
> cortes para a realização dos
perfis estratigráficos;
> decapagens em níveis naturais,
procedimento que permitiu observar
Figura 4 BP – vista geral área pesquisada Acervo Museu Paulista - USP
Figura 5 C 1_Trincheira 1 e muro de arrimo Acervo Museu Paulista - USP
90
detalhadamente cada uma das fases do edifício e direcionou a compreensão e inter-
relacionamento das estruturas evidenciadas (Figura 6);
> associação dos dados arqueológicos com a prospecção arquitetônica que
possibilitou a evidenciação de pontos comuns entre a Arqueologia e a Arquitetura,
tais como: soleiras e vãos originais, estruturas divisórias internas originais,
profundidade e técnica construtiva das fundações do edifício, pisos originais,
seqüência de pisos e evidências de escada.
Durante as escavações evidenciou-se material arqueológico, testemunhos
das atividades ocorridas na área, representados por cerâmica histórica, porcelana,
faiança, grés, louça vidrada, vidros, metais, moedas, ossos, amostras de material
construtivo utilizado no
imóvel (taipa de pilão, tijolo,
telha e argamassa)
No Beco do Pinto os
procedimentos adotados
foram:
> divisão da área em setores
com a utilização do alfabeto
(de A à P) ;
> quadriculamento dos
setores de 2 em 2m ;
> limpeza da superfície com
a retirada dos paralelepípedos;
> execução de cortes e perfis estratigráficos;
Com a execução das trincheiras e cortes foi possível evidenciar a antiga
calçada de tijolos que havia sido aterrada por conta das obras de saneamento do
século XX.
Figura 6 – SM decapagem do piso (cômodo central) e equipe Acervo Museu Paulista USP
91
O sítio atualmente
4.1.3 Banco de Dados - Arquivo eletrônico
Informações coletadas na homepage do IPHAN 39
Todos os sítios arqueológicos são definidos e protegidos pela Lei nº 3.924/61, sendo
considerados bens patrimoniais da União. O tombamento de bens arqueológicos é
feito excepcionalmente, por interesse científico ou ambiental.
São considerados sítios arqueológicos as jazidas de qualquer natureza, origem ou
finalidade, que representem testemunhos da cultura dos paleoameríndios; os sítios
nos quais se encontram vestígios positivos de ocupação pelos paleomeríndios; os
sítios identificados como cemitérios, sepulturas ou locais de pouso prolongado ou de
aldeamento "estações" e "cerâmios; e as inscrições rupestres ou locais e outros
vestígios de atividade de paleoameríndios.
Atualmente, cerca de 10 mil sítios arqueológicos já foram identificados pelo Iphan.
São tombados: Sambaqui do Pindaí, em São Luis-MA; Parque Nacional da Serra da
Capivara, em São Raimundo Nonato-PI; Inscrições Pré-Históricas do Rio Ingá, em
Ingá-PB; Sambaqui da Barra do Rio Itapitangui, em Cananéia-SP; Lapa da Cerca
Grande, em Matozinhos-MG; Quilombo do Ambrosio: remanescentes, em Ibiá-MG; e
Ilha do Campeche, em Florianópolis-SC.
Na pesquisa é possível consultar as informações sobre os sítios arqueológicos
brasileiros cadastrados no Sistema de Gerenciamento de Sítios Arqueológicos do
Iphan.
IPHAN - Sistema de Gerenciamento de Patrimônio Arqueológico
Sítios Arqueológicos Históricos
Responsável pelo registro: Margarida Davina Andreatta
Registros encontrados: 5 SP - São Paulo
Beco do Pinto
39 http://portal.iphan.gov.br/portal/montaPesquisaPatrimonioCultural.do?tipo=SitiosArqueologicos
92
SP - São Paulo
Casa do Tatuapé
SP - São Paulo Casa nº 1 - Pátio do Colégio
SP - São Paulo
Morrinhos
SP - São Paulo
Sítio Mirim
SP - São Paulo
Casa nº 1 - Pátio do Colégio
Município - UF São Paulo - SP
Descrição sumária Sítio histórico - quintal da casa nº 1. Pátio do Colégio - séc. XIX. Taipa de pilão e alvenaria de tijolos.
Comprimento 14 m
Largura 11 m
Altura Máxima 0 m
Àrea 630 m2
Medição Instrumento;
Escala 1:50.000
Unidade Geomorfologica Planalto
Compartimento Topográfico Topo
Altitude 700
Água Próxima Rio Tamanduateí
Distância 120
Rio Tamanduateí
Bacia Tietê
Vegetação gramíneas e árvores de pequeno porte
Uso atual da terra meio urbano;
93
Propriedade da terra terra pública;
Tombamento municipal;
Categoria Multicomponencial
Histórico
Tipo Histórico
Forma quadrangular
Tipo de Solo areno-argiloso
Contexto Deposição em profundidade ,em superficie
Exposição céu aberto
Estruturas vestígios de edificação; canais tipo trincheiras,valeta;
Artefatos lítico polido; cerâmico;
Outros Vestígios Orgânicos Molusco, osso
Acervo MP/USP - DPH/SMC
Número Catalogo C1.PC.01...
Filiação Cultural
Datação Relativa século XVIII
Grau de integridade entre 25 e 75%
Outros fatores antrópicos Público em geral (visitantes)
Possibilidades Destruição Em restauro pela Divisão de Preservação.
Relevância do sítio média
Atividades desenvolvidas no local Registro; Coleta de superfície; Corte estratigráfico;
Nome do Responsável Margarida Davina Andreatta (pesquisadora; v.obs.)
Nome Projeto Programa de Arqueologia Histórica no Município de São Paulo
Nome Instituição Museu Paulista/USP e Departamento de Patrimônio Histórico da Sec. Municipal de Cultura
Endereço Instituição Parque da Independência s/n - Ipiranga
94
UF da Instituição SP
CEP da Instituição 04299-970
E-Mail da Instituição [email protected]
Telefone/Fax da Instituição (011) 215-4588
Bibliografia1 Relatórios junto ao DPH e Museu Paulista - USP.
Responsável Preenchimento Maria Lúcia Franco Pardi
Data Preenchimento 01/10/1997
Localização Dados 9ª CR
SP - São Paulo
Beco do Pinto
Município - UF São Paulo - SP
Descrição sumária Sítio histórico - Beco do Pinto, com evidências arqueológicas do séc. XVIII e XIX.
Comprimento 28 m
Largura 3.8 m
Altura Máxima 2 m
Àrea 106.4 m2
Medição Instrumento;
Escala 1:50.000
Unidade Geomorfologica Planalto
Compartimento Topográfico Topo
Altitude 700
Água Próxima Rua Tamanduateí
95
Distância 120
Rio Tamanduateí
Bacia Tietê
Vegetação sem vegetação/calçadão
Uso atual da terra meio urbano; via publica;
Propriedade da terra terra pública;
Tombamento municipal;
Categoria Unicomponencial
Histórico
Tipo Caminho, estrada
Forma Retangular
Tipo de Solo areno-argiloso
Contexto Deposição em profundidade ,em superficie
Exposição céu aberto
Estruturas vestígios de edificação;
Artefatos lítico polido; cerâmico;
Outros Vestígios Orgânicos Osso, concha, couro
Acervo MP/USP - DPH/SMC
Número Catalogo B.P..01...
Arte Rupestre Ausente;
Filiação Cultural
Datação Absoluta Século XIX
Datação Relativa Século XVIII
Grau de integridade entre 25 e 75%
Fatores Destruição >Construção de moradias;
Relevância do sítio média
Atividades desenvolvidas no local Registro; Coleta de superfície; Corte estratigráfico;
Nome do Responsável Margarida Davina Andreatta (pesquisadora; v.obs.)
96
Nome Projeto Programa de Arqueologia Histórica no Município de São Paulo
Nome Instituição Museu Paulista/USP e Departamento de Patrimônio Histórico da Sec. Municipal de Cultura
Endereço Instituição Parque da Independência s/n - Ipiranga
UF da Instituição SP
CEP da Instituição 04299-970
E-Mail da Instituição [email protected]
Telefone/Fax da Instituição (011) 215-4588
Bibliografia1 Relatórios junto ao DPH e Museu Paulista - USP.
Responsável Preenchimento Maria Lúcia Franco Pardi
Data Preenchimento 01/10/1997
Localização Dados 9ª CR
Atualizações Regina Galante Pinheiro, 05/04/99.
97
4.1.4 Banco de Dados Coletivos
CENTRO HISTÓRICO DE SÃO PAULO
Banco de Dados Coletivos
Log in: senha:
h i p e r T E X T O S
Página Principal i m a g e n s
Índice
Categorias História Editar Versões
Relações
Atualizações
Fóruns
registro
pesquisar
Lay-out do Banco de Dados a ser desenvolvido coletivamente, inicialmente por
pessoas ligadas ao Projeto.
Posteriormente estará disponível para o meio acadêmico.
O objetivo é implantá-lo como ferramenta de gestão pública – projeto piloto no centro
histórico de são Paulo.40
40 Proposta apresentada no exame de qualificação.
98
Villa de S.Paulo, 9 legoas de
barra, de João Teixeira Albernaz
Fotomontagem
[DC]
Maquete da Cidade de São Paulo
Acervo Museu Anchieta
Maquete de São Paulo em 1841
Acervo Museu Paulista -USP
Limites
A necessidade da instituição de um limite e/ou de um desenho para o CHSP,
diferente de outros centros históricos, Salvador por exemplo com um traçado dos
limites tombados por diferentes orgãos e instituições (Governo Estadual, UNESCO),
o CHSP não possui um limite estabelecido. Com as informações e dados disponíveis
atualmente, propusemos alguns limites possíveis:
Delimitação Física
> Geográfica: cota 750/760 m – Acrópole (1554) 41
> Triângulo pequeno – Ruas: XV de Novembro, Direita e São Bento42
> Triângulo grande - 1841 – maquete Museu Paulista – descrição/desenho43
> Triângulo 3 vértices –
Igrejas de São Bento/ São Francisco/Carmo
41 REIS FILHO, Nestor Goulart São Paulo: Vila, Cidade, Metrópole.São Paulo:Via das Artes, 2004. 42 Inserção do Pateo do Collegio no contexto da cidade. Disponível em: www.pateodocollegio.com.br/ 43 Maquete em gesso confeccionada por Henrique Bakkenist entre 1919 – 1922. Encomendada por Afonso d’Escragnolle Taunay, como parte das comemorações do Centenário da Independência.
99
Delimitação Cultural
Sítio histórico:
> Vila (1554 – 1600)
> Cidade (1841 – maquete Museu Paulista – 12.000 hab.)
> Metrópole (1889 – 1960)
> Megalópole
Política/Administrativa:
> Distrito/Paróquia/Bairro/...
> Região Metropolitana (1960 – 2004)
Edifícios - valores:
> histórico
> arqueológico
> arquitetônico
.> Estudo comparativo das diferentes leituras da “cidade” objetivando a criação de
um referencial adequado à realidade da paisagem brasileira.
.> Proposição de um modelo digital capaz de simular o surgimento, o
desenvolvimento e a evolução projetada da Cidade de São Paulo.
.> Criação de um banco de dados digital com informações: cadastrais, históricas,
pictóricas – levantamentos, mapeamentos, desenhos, pinturas e imagens da
configuração da cidade; suas relações com as redes de informação e comunicação;
as transformações e a evolução da Cidade de São Paulo.
100
Sítio Virtual - projeção
Projeto de uma possível escavação arqueológica na sobreposição das áreas edificadas em diferentes momentos no passado (CHERMANN, 2007)
Delimitação Virtual
Sítio virtual: projeção das escavações futuras
(propostas)
> Megalópole (2008 - >>>>)
> Redes/Nós:
> Infraestrutura de Telecomunicações
(fibra ótica/cabos/satélites/celular)
101
Fotomontagem [DC]
Projeto Virtual - simulação Pátio do Colégio
(CHERMANN, 2007)
4.1.5 Modelo Digital
Dados e informações a serem consideradas e levantadas:
Espaço Físico (“natural” /alterado)
> Geologia/Geomorfologia (solo/relêvo)
> Bacia(s) Hidrográfica(s)
> Cobertura Vegetal
> Flora e Fauna
> Clima (temperatura/pressão)
> Ventos (predominantes/atípicos)
> Poluição
> Descartes (lixo)
Espaço Físico (“cultural”/construído)
> Sistema Viário (quadras/lotes/vias – autos/pedestres/ciclovias)
> Parques e Praças – Espaços Livres
> Edificações (patrimônio)
> Uso do Solo
> Cadeia Sucessória (imóveis)
> Monumentos
> Redes (elétrica/telefonia/água/esgoto)
>Transportes
(trem/automóvel/ônibus/metrô/avião/helicóptero)
Espaço Virtual
> Redes (telefonia móvel/internet/intranet)
> Sinais (rádio/TV/satélite)
> Bolsas (valores/futuro/mercadorias – informações econômicas)
> Sites (web1.0/2.0/3.0/”blogosfera”/..)
102
P A R T E V
MEMÓRIA DO FUTURO
103
5.1 Projeto: Banco de Informações Coletivas Compartilhadas - CHSP
Objetivo:
Capacitar acesso, edição e compartilhamento das informações, em tempo
real. Discutir as possibilidades de uso da Informática para aplicação na Arqueologia
com o objetivo de criar, desenvolver e gerenciar de forma coletiva e compartilhada,
bancos de dados digitais, registros e informações sobre sítios arqueológicos. O lay-
out do site, inicialmente alimentado por pessoas ligadas ao projeto, contém dados e
informações: históricas, físicas, geográficas, pictóricas, levantamentos,
mapeamentos, desenhos, pinturas e imagens da configuração da cidade; suas
relações com as redes de informação e comunicação; os estudos das
transformações e a evolução do Sítio Histórico do Conjunto do Pátio do Colégio e
seu entorno imediato o Centro Histórico da Cidade de São Paulo (CHSP). O banco
de dados disponível em um site próprio possibilita a visualização e/ou edição, em
tempo real, a todos os participantes com acesso por usuário e senha. Com
navegação simples, abre em uma página principal com índice por categorias,
relações e termos de referência dos registros. Possui mecanismo de busca/pesquisa
e edição wiki para as atualizações e inclusões de textos, hipertextos e hiperlinks, e a
ferramenta fórum para as discussões dos temas. O objetivo dentro de nosso projeto
de pesquisa é implantá-lo como ferramenta de gestão pública, onde os indivíduos e
grupos poderão participar das decisões que serão avaliadas em tempo real pelo
próprio coletivo, de acordo com múltiplos critérios.
Componentes:
. > Web site otimizado com informações respondendo as diferentes necessidades
dos usuários;
. > Banco de Dados com acesso via Web por categorias: áreas, sítio, edificações,
unidades, peças, etc.;
. > Banco de Informações: fotos, vídeos, filmes, ilustrações, desenhos, currículos
(internos – no próprio banco de dados e/ou externos –flickr/youtube/googlemaps/...);
.> Links externos: monitoramento em tempo real (imagem satélite, clima, câmeras..)
104
Estaremos considerando para este estudo, as seguintes definições e
significados para as palavras e expressões:
>Banco de Dados: O termo banco de dados foi criado inicialmente pela comunidade
de computação, para indicar coleções organizadas de dados armazenados em
computadores digitais, porém o termo é atualmente usado para indicar tanto bancos
de dados digitais como bancos de dados disponíveis em outro formato.
Aceitando uma abordagem mais técnica, um banco de dados é uma coleção
de registros salvos em um computador em um modo sistemático, de forma que um
programa de computador possa consultá-lo para responder questões.
>Informação : é o resultado do processamento, manipulação e organização de
dados de tal forma que represente um acréscimo ao conhecimento da pessoa que a
recebe. Do latin – informare – dar forma, formar uma idéia.
Portanto, para diferenciarmos, para fins deste estudo estamos adotando o
termo banco de dados para registros armazenados fossilizados ou não dinâmicos e,
banco de informações para os dados dinâmicos e moldáveis disponíveis nas redes
interativas.
Ao expormos, os objetivos e componentes do projeto, pretendemos mostrar
os caminhos e as possibilidades de interação entre os dados e as informações. A
maior dificuldade reside em verbalizar, no suporte papel, dados e informações
digitais e dinâmicas armazenadas ou disponíveis em outro tipo de suporte – o digital.
Selecionamos algumas imagens, capturadas da tela (print screen) e coladas
(paste), apenas para procurar ilustrar o que iremos mostrar, posteriormente, na
apresentação do projeto com os recursos da informática, em tempo real.
105
5.1.1 Simulações
A linguagem de descrição de mundos em 3D possui uma série de vantagens.
O que pretendemos mostrar aqui e que podemos construir o modelo de estudo que
queremos visualizar, em um programa CAD. Como são construções para estudos,
desenhamos apenas as volumetrias das principais áreas e edificações e, em
detalhes, os espaços dos edifícios ou monumentos, principais – objetos do estudo.
Modelo Digital Aramado Modelo Digital Sólido
A partir desta fase, podemos utilizar o Banco de Informações para armazenar,
gerenciar e visualizar todos os registros do sítio histórico, permitindo acessos e
interações on-line. Os registros existentes, freqüentemente acumulados, são
digitados ou digitalizados de arquivos de Bancos de Dados analógicos – textos,
fotos, mapas, vídeos, etc.
Enquanto edifícios são relativamente lentos na mudança e na decadência, os
modelos análogos de computador permanecem válidos, a longo prazo, mas ainda
assim, os seus contextos, as definições e fundamentos estão abertos a mudança
rápida. Potencialmente eficaz, a gravação das mudanças é altamente intensiva,
justificando a exploração de captura automática de dados, normalmente por satélite
no macro, controle remoto e câmeras de vídeo no micro.
106
5.1.2 Sítio Virtual
Ilustrações mostrando (da esquerda para direita) imagens de satélite, delimitação
física/cultural/virtual do CHSP, câmeras on-line instaladas no sítio arqueológico
histórico e uma vista do modelo 3D inserido na imagem de satélite.
Mapas e Aerofotografias Digitais
107
Ilustrações com os tipos de mapas e imagens de satélite disponíveis na Internet.
108
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A simulação sobre a construção coletiva de um Banco de Informações, indica
uma das inúmeras possibilidades que o ambiente virtual oferece na condição de
recurso metodológico. Parece que a principal delas é a possibilidade de construção,
reconstrução e autoconstrução de novos objetos de estudo, com a participação de
diversos pesquisadores.
Dessa forma, constata-se que o registro arqueológico – em tempo real é um
recurso metodológico importante para a ampliação do campo de pesquisa da
Arqueologia à medida que permite construir a memória do futuro.
109
REFERÊNCIAS ANDREATTA, Margarida Davina. Arqueologia Histórica no Município de São Paulo. Revista do Museu Paulista. São Paulo, 1981. (Nova Série). ______. Arqueologia Histórica – cidade de São Paulo. In: Revista do Centro de Estudos e Pesquisas Arqueológicas. Paraná: CEPA, vol. 5, 1986. ______.; et al. Programa de Arqueológica Histórica no Município de São Paulo – Intervenção Arqueológica na Casa da Marquesa de Santos de 1986 a 1991 – Sé – São Paulo. São Paulo: DPHC, 1991. Relatório Técnico. ______. Pesquisa Arqueológica Histórica no Sub-solo do Museu Paulista. In: VIII REUNIÃO CIENTÍFICA DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA BRASILEIRA. 11 a 15 de set. de 1995, Porto Alegre. Programa e Resumos. Porto Alegre, RS: PUC, 1995. ______. Memória da Arqueologia Histórica. In: Relatório Anual do Museu Paulista da USP. São Paulo: MP, 2007. Relatório Técnico. ANGELO, Cláudio. Novo sistema de análise inclui corte de árvores na Amazônia, invisível ao satélite, no cálculo total da destruição. Madeira duplica devastação, afirma estudo. Folha de S. Paulo, São Paulo, sexta-feira, 21 de outubro de 2005. Ambiente. ANGELUCCI, Diego E. Geoarqueologia. Disponível em <http://ipa.min-cultura.pt/pubs/TA/folder/29/05.pdf>. Acesso em 05 jan. 2008. ARRAIS, Daniela. Weblog, 10, se consolida e ultrapassa o diário pessoal. Folha de S. Paulo, São Paulo, [s.d.]. ______. Creative Commons faz cinco anos Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 05 de dezembro de 2007. Informática. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: Informação e documentação – Referências – Elaboração. Rio de Janeiro, 2002. ASSUNÇÃO, Paulo de. São Paulo imperial: a cidade em transformação. São Paulo: Arké, 2004.
110
BARBUY, Heloisa Maria Silveira. A Cidade-Exposição: comércio e cosmopolitismo em São Paulo, 1860-1914 (estudo da história urbana e cultura material). 2001. Tese (Doutorado em Arquitetura) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. BARRETO, Juliano. Criação coletiva - Ciberartistas e agitadores culturais usam a filosofia do software livre para a geração e a distribuição de obras produzidas a várias mãos, de diversos pontos do planeta. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 18 de abril de 2007. Informática. ______. Distribuição aberta incentiva artistas. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 18 de abril de 2007. Informática. ______. Liberdade é o coração da produção colaborativa - Formatos abertos facilitam circulação de conteúdo on-line. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 18 de abril de 2007. Informática. BARROS , Mariana. Sites sociais misturam um pouco de tudo. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 04 de abril de 2007. Informática. ______. Evento nos EUA discute os rumos dos mundos virtuais. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 04 de abril de 2007. Informática. ______. Novela une personagem e usuário. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 04 de abril de 2007. Informática. ______. Editores baseados na internet são opção. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 27 de junho de 2007. Informática. BEZERRA DE MENESES, Ulpiano T. A cultura material no estudo das sociedades antigas. Revista de História/USP. São Paulo, n. 115 jul/dez 1983. BINFORD, L. R. The Archaeology of place. In: BINFORD, L. R. Working at Archaeology. New York: Academic Press, 1983. BINFORD, L. R. Em busca do passado. Lisboa: Europa/América, 1991. BLOCH, Marc L. Apologia da história, ou, o ofício do historiador. Tradução de André Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.
111
BORDIEU, Pierre. Outline of a theory of pratice. Cambridge: Cambridge University Press, 1977. BOYER, M. Cristine. Cybercities: visual perception in the age of eletronic communication. New York: Princeton Architectural Press, 1996. CALLIGARIS, Contardo. O futuro da humanidade. Folha de S. Paulo, São Paulo, quinta-feira, 08 de fevereiro de 2007. Ilustrada. CAMPOS, Eudes. Nos caminhos da Luz, antigos palacetes da elite paulistana. In: Anais do Museu Paulista – História e Cultura Material. São Paulo: IMESP, n.1, vol. 13, jan.-jun., 2005. (Nova Série). CAMPOS, Maryzilda C. Arqueologia Histórica: Casa da Marquesa de Santos, casa de n. 3 da antiga Rua do Carmo – São Paulo. 1986. Monografia (Trabalho de conclusão de disciplina em Arquitetura) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1986. ______; JULIANI, Lúcia de Jesus C. O. Solar da Marquesa de Santos - Arqueologia Histórica. In: VIII REUNIÃO CIENTÍFICA DA SOCIEDADE DE ARQUEOLOGIA BRASILEIRA. 11 a 15 de set. de 1995, Porto Alegre. Programa e Resumos. Porto Alegre, RS: PUC, 1995. CANÔNICO, Marco Aurélio. Livros para celular viram hit no Japão. Folha de São Paulo, São Paulo, sábado, 13 de outubro de 2007. Informática. CASALEGNO, Federico. Memória Cotidiana: comunidades e comunicação na era das redes. Tradução de Adriana Amaral, Francisco Rüdiger e Sandra Montardo. Porto Alegre: Sulina, 2006. CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. Tradução de Roneide Venâncio Majer. A era da informação: economia, sociedade e cultura. v.1. São Paulo: Paz e Terra, 1999. ______. A Galáxia da Internet: Reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Tradução de Maria Luiza X. A Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.
112
CHERMANN, Davi. Jogos de Linguagem: recortes analógicos e digitais. 1998. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1998. ______. Formação do registro Arqueológico. Disciplina de Pós-graduação, 1º semestre de 2003. Museu de Arqueologia e Etnologia da USP. Nota de Aula. Manuscrito. CHERMANN, Julie. Museu de Arqueologia “Pateo do Collegio”. 2007. Monografia. (Trabalho de Final de Graduação em Arquitetura e Urbanismo) - Faculdade de Artes Plásticas, Fundação Armando Álvares Penteado, São Paulo, 2007. COHN, Gabriel. Fragmentos do futuro. Folha de S.Paulo. [s.d.]. COSTA, Rogério da. INTERNET. Folha de S.Paulo, São Paulo, domingo, 01 de julho de 2007. Mais. CUSTÓDIO, Jorge. Arqueologia Industrial: objetivo e método. In: A Central Tejo e a Arqueologia Industrial. Uma viagem aos confins da eletricidade por medição de um museu. Lisboa: Centro Nacional de Cultura, 1984. DIXON, Joan Broadhurst; CASSID, Eric J. Virtual Futures: Cyberotics, Technology and Post-Human Pragmatism. London: Routledge, 1998. DUBOS, René. So human an animal. New York: Charles Scribner’s Sons, 1968. ELLIN, Nan. Postmodern urbanism: revised edition. New York: Princeton Architectural Press, 1999. EINAUDI Enciclopédia. Homo-Domesticação/Cultura Material. Portugal: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, Edição Portuguesa, volume 16, 1989, FARIA E SILVA, Luis Octavio de. Pátio do Colégio, o centro tradicional paulistano. 2001. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, 2001. FRUG, Gerald E. City making: building communities without building walls. Princeton; New Jersey: Princeton University Press, 1999.
113
FURET, F. Le quantitatif en histoire. LE GOFF, J.; NORA, P. (org.). In: Faire de l’histoire. Paris: Gallimard, 1974. FUNARI, Pedro Paulo Abreu; NOELLI, Francisco Silva. Pré-história do Brasil. São Paulo: Contexto, 2002. (Repensando a História). ______. Arqueologia. São Paulo: Contexto, 2003. GERODETTI, João Emílio. Lembranças de São Paulo: a capital paulista nos cartões postais. [São Paulo], [s.n.: s.d.]. GLEISER, Marcelo. Arqueologia planetária. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 05 de março de 2006. Ciência. ______. O filósofo do amor: Como o grego Empédocles via a força que torna a matéria coesa. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 10 de junho de 2007. Ciência. ______. Testando a relatividade. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 16 de dezembro de 2007. Ciência. ______. Celebrando a vida. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 06 de janeiro de 2008. Ciência. GONÇALVES, Luiz Roberto Mendes (Tradução). A indústria farmacêutica já oferece auto-estima engarrafada, como Zoloft e Prozac. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 22 de junho de 2003. Mais. GULLAR, Ferreira. Um bicho que se inventa. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 01 de janeiro de 2006. Ilustrada. HALL, Peter. Cities of tomorrow. UK: Blackwell Publishers, 1996. HARAWAY, Donna J. Modest_Witness@Second_Millennium. FemaleMan©_Meets_OncoMouse™. New York, London: Routledge, 1997. HODDER, Ian. Interpretación en Arqueología. Corrientes actuais. Barcelona: Crítica, 1994.
114
IANNI, Octavio. A cidade hiper-real. Folha de S. Paulo, São Paulo, 19 de agosto de 2001. Mais, p. 18-19. KAKU, Michio. Hiperespaço: uma odisséia científica através de universos paralelos, empenamentos do tempo e a décima dimensão. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. KEHL, Luis Augusto Bicalho. Paupércula Domo - a casa de Piratininga: mitos e ritos fundacionais. 2002. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo, 2002. KIMURA, Emerson. Internet oferece cemitérios virtuais. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 31 de outubro de 2007. Informática. KLEIN, Richard G.; EDGAR, Blake. The dawn of human culture. New York: Wiley, 2002. KOOLHAAS, Rem. The Generic City. In: Connected Cities: Processes of Art in the Urban Network. Ostfildern, Germany: Hatje Cantz Verlag, 1999. KUHN, Thomas S. A Estrutura das Revoluções Científicas. 4ª ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1996. (Debates – Ciência). LAGE, Amarílis. Solar da Marquesa abrigará Museu da Cidade. Folha de S. Paulo, São Paulo, 19 de novembro de 2005. Cotidiano, p.C1 . LEFEBVRE, Henri. The production of space (extracts). In: LEACH, Neil (edited by). Rethinking architecture: a reader in cultural theory. London: Routledge, 1997, p.139-146. LE GOFF, Jacques. Os caminhos da história antes da escrita. In: História: novos problemas. Tradução de Theo Santiago. Rio de Janeiro: F. Alves Editora, 3v, 1974. _______. As mentalidades: uma história ambígua. In: História: Novos Objetos. LE GOFF, Jacques; NORA, Pierre (direção); Tradução de Terezinha Marinho. Rio de Janeiro: F. Alves, 1976. ______. História e memória. Tradução de Bernardo Leitão. Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 1992.
115
LEITE, Marcelo. Re-evolução sexual. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 05 de março de 2006. Ciência. ______. 6.500.000.000. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 05 de março de 2006. Ciência. LEITE , Paula. O melhor e o pior da web 2.0. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 22 de agosto de 2007. Informática. ______. Digg aposta na inteligência coletiva. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 22 de agosto de 2007. Informática. ______. Wikipédia e YouTube são os mais lembrados. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 22 de agosto de 2007. Informática. LEMOS, Carlos A. C. Arquitetura brasileira. São Paulo: Melhoramentos: Ed. da Universidade de São Paulo, 1979. ______. Transformações do espaço habitacional ocorridas na arquitetura brasileira do século XIX. Anais do Museu Paulista – História e Cultura Material. São Paulo: IMESP, n.1, 1993. (Nova Série). LEONE, Mark. Interpreting ideology in historical archaeology: using the rules of perspective in the William Paca Garden in Annapolis, Maryland. In: Ideology, Power and Prehistory. TILLEY, Cristopher; MILLER, Daniel (edited by). Cambridge: Cambridge University Press, 1988. Reprinted In: Readings in Historical Archaeology. LEROI-GOURHAN, André. O gesto e a palavra: memória e ritmos. Lisboa: Edições 70, 1965. ______. Os caçadores da pré-história. Tradução de Joaquim I. Coelho da Rosa. Lisboa: Edições 70, 1987. LERUP, Lars. After the city. Cambridge: MIT Press, 2000. LÉVY, Pierre. As Tecnologias da Inteligência. São Paulo: Editora 34, 1993.
116
______. A máquina universo: criação, cognição e cultura informática. Tradução de Bruno Charles Magne. Porto Alegre: ArtMed, 1998. ______. A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço. Tradução de Luiz Paulo Rouanet. São Paulo: Edições Loyola, 2000. ______. A conexão planetária: o mercado, o ciberespaço, a consciência. Tradução de Maria Lúcia Homem e Ronaldo Enther. São Paulo: Ed. 34, 2001. LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 1997. LIPOVETSKY, Gilles. A condição pós-moderna. Tradução de Ricardo Corrêa Barbosa. 7ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002. ______. Les temps Hypermodernes. Paris: Grasset, 2004. LOPES, Reinaldo José. Humanidade causa nova onda de extinção. Folha de S. Paulo, São Paulo, 21 de março de 2006. Ciência. MACHADO, Cassiano Elek. ‘SP, 450 anos’ deixa ‘arranha céu’ de livro. Folha de S. Paulo, São Paulo, 25 de janeiro de 2005. Ilustrada, p. E3. MARINS, Paulo César Garcez. Através da rótula: sociedade e arquitetura no Brasil, séculos XVII a XX. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, 2001. MARKOFF, John; SCHWARTZ, John. Tecnologias atuais já permitem vigilância. Folha de S. Paulo, São Paulo, 22 de janeiro de 2003. Informática, p. F3. MARTINS, Ives Gandra da Silva. História de São Paulo. São Paulo: LTr, 2003. MARX, Murilo. Cidade brasileira. São Paulo: Melhoramentos: Ed. da Universidade de São Paulo, 1980. MASCARO, Cristiano. Leitores poderão votar nas "Sete Maravilhas". Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 01 de julho de 2007. Mais.
117
MATIAS, Alexandre. Consciente coletivo. Folha de S. Paulo. [s.d.]. MITCHELL, Amy. Leitores terão conexão direta, afirma autora Folha de S. Paulo, Paulo, domingo, 08 de abril de 2007. Dinheiro. MOBERG, Carl-Axel. Introdução à Arqueologia. Tradução de Maria Raquel Henriques da Silva. Lisboa: Edições 70, 1986. MOSTEIRO DE SÃO BENTO (São Paulo, SP). Livro do tombo do Mosteiro de São Bento da cidade de São Paulo. São Paulo, O Mosteiro, 1977. NOVIDADES já integram dia-a-dia das redações. Folha de S. Paulo, São Paulo, Domingo, 08 de abril de 2007. Dinheiro. ORSER JR., Charles E. Introducción a la Arqueología Histórica. Tradução de Andrés Zarankin. Buenos Aires: AINA, 2000. PADILLA, Ivan. Clube das esquinas. Folha de S. Paulo. 24 de abril de 2004. Ilustrada. p.E14. PEREIRA, Camila. Internet - Minha vida como pingüim. Veja, São Paulo, 17 de outubro, 2007. PERES, Marcos Flamínio. O caos organizador. Folha de S. Paulo. 14 de março de 2004. Mais, p.5-7. PERPÉTUO, Irineu Franco. A trama da rede. Folha de S. Paulo. 22 de fevereiro de 2005. Sinapse. p.12-16. POMPEU DE TOLEDO, Roberto. Contar o tempo é uma grande ilusão, como sabemos, mas – e se não contássemos?. Veja, São Paulo, 9 de janeiro, 2008. PORTA, Paula (org). História da Cidade de São Paulo: a cidade colonial. São Paulo: Paz e Terra, v1, 2004. PORUSH, David. Telepathy: Alphabetic Consciousness and the Age of Cyborg Illiteracy. In: Virtual Futures: Cyberotics, Technology and Post-Human Pragmatism. London: Routledge, 1998. p. 45-64.
118
PRIGOGINE, Ilya. O fim das certezas: tempo, caos e as leis da natureza. Tradução de Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Editora da UNESP, 1996. PROMESSAS. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 04 de abril de 2007. Informática. PROUS, André. Arqueologia Brasileira. Brasília: UFB, 1992. ______. Arqueologia, Pré-História e História. In: Pré-História da Terra Brasilis. TENÓRIO, Maria Cristina (org.). Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1999. RENFREW, Colin; BAHN, Paul. Arqueología. Teoria, Métodos y Prática. Madrid: Ed. Akal, 1993. REIS, Nestor Goulart. São Paulo: vila, cidade, metrópole. São Paulo: Restarque/Via das Artes, 2004. ROSNAY, Melanie D. de. Creative Commons: open content licenses to govern creative works. Disponível em http://www.upgrade-cepis.org/issues/2006/3/up7-3Dulong.pdf. Acesso em 20 dez. 2007. RYDLEWSKI, Carlos. Livros - Um desafio global. Veja, São Paulo, Edição 1929, 2 de novembro de 2005. RYKWERT, Joseph. The seduction of place: the history and future of the city. New York: Vintage Books, 2002. SÁ, Nelson de. A morte da Google. Folha de S. Paulo, São Paulo, quinta-feira, 25 de janeiro de 2007. Brasil. ______. “STARTUPS”. Folha de S. Paulo, São Paulo, quinta-feira, 26 de março de 2007. Brasil. SANTAELLA, Lúcia. Culturas e artes do pós-humano: da cultura das mídias à cibercultura. São Paulo: Paulus, 2003. ______. Navegar no ciberespaço: o perfil cognitivo do leitor imersivo. São Paulo: Paulus, 2004.
119
SANTOS, Shirley M. Reconhecendo os engenhos da Freguesia de Santo Antônio de Cabo: uma leitura interpretativa da cultura material remanescente do final do século XVI e início do século XVII. 1995. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Universidade Federal de Pernambuco, 1995. SANTOS, Jair Ferreira dos. Breve, o pós-humano: ensaios contemporâneos. 2ª ed. Paraná: Francisco Alves Editora, 2002. SÃO PAULO. Prefeitura da cidade de São Paulo. Reconstruir o centro: reconstruir a cidade e a cidadania. São Paulo: Imprensa Oficial, 2001. SÃO PAULO. Prefeitura da cidade de São Paulo. Minhas cartas: por José de Anchieta. [S.l: s.d.]. SÃO PAULO. Secretaria Municipal de Cultura. Instituto Florestan Fernandes. Expedição São Paulo 450 anos: uma viagem por dentro da metrópole. São Paulo, 2004. SCHIFFER, M. B. Archaeologycal context and systemic context. In: American Antiquity, 37 (2), 1972, p. 156-165. ______. The structure of archaeological theory. In: American Antiquity, 53 (3), 1988, p. 461-485. SCULLY, Vincent. A cidade tornou-se o templo do século 20. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 2 de janeiro de 2000. Caderno 2/Cultura, p. D7. SEM disco rígido. Folha de S. Paulo, São Paulo, Quarta-feira, 27 de junho de 2007. Informática. SILVA, Fabíola Andréa. Produção e uso da cultura material e a formação do registro arqueológico: o exemplo da cerâmica dos Asurini do Xingu. In: Revista do CEPA. Santa Cruz do Sul, vol. 24, n. 32, p. 59-110, jul. /dez. 2000. SOLÉ, Robert. Gilles Lipovetsky e Jean Serroy rebatem a idéia de individualismo extremo ligada às novas mídias. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 23 de dezembro de 2007. Mais.
120
STRECKER, Marcos. Web 2.0 não é inovação, diz Pierre Lévy. Folha de S. Paulo, São Paulo, terça-feira, 14 de agosto de 2007. Informática. SZMRECSÁNYI, Tamás (org.). História econômica da cidade de São Paulo. São Paulo: Globo, 2004. THIESEN, Beatriz Valladão. As Paisagens da Cidade: arqueologia da área central da Porto Alegre do século XIX. 1999. Dissertação (Mestrado em História) – Faculdade de História, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, setembro de 1999. TOFFLER, Alvin. O choque do futuro. Tradução de Eduardo Francisco Alves. 5ª ed., Rio de Janeiro: Record, 1994. TOLEDO, Roberto Pompeu de. A capital da solidão da solidão: uma história de São Paulo das origens a 1900. Rio de Janeiro: Objetiva, 2003. TOLEDO, Benedito Lima de. São Paulo: três cidades em um século. 3ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Cosac & Naify, Duas Cidades, 2004. TREVISAN, Cláudia. Empresa usa criação coletiva para inovar. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 24 de junho de 2007. Dinheiro. TRIGGER, Bruce G. História do Pensamento Arqueológico. Tradução de Ordep Trindade Serra. São Paulo: Odysseus Editora, 2004. VATTIMO, Gianni. The end of modernity, the end of the project? . In: LEACH, Neil (edited by). Rethinking architecture: a reader in cultural theory. London: Routledge, 1997, p. 148-160. ______. Space, knowledge and power (interview conducted with Paul Rabinow). In: LEACH, Neil (edited by). Rethinking architecture: a reader in cultural theory. London: Routledge, 1997, p. 367-379. VEJA. O jogo da invenção. Revista semanal. São Paulo: Editora Abril, 9 de Janeiro, 2008 VEJA a diversidade dos sites de busca. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 10 de janeiro de 2007. Informática.
121
VENTURI, Robert et al. Learning from Las Vegas: the forgotten symbolism of architectural form. Cambridge MA.: MIT Press, [s.d.]. VILLAS BOAS, Gustavo. Second Life tem arte particular. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 13 de junho de 2007. Informática. VIRILIO, Paul. The overexposed city. In: LEACH, Neil (edited by). Rethinking architecture: a reader in cultural theory. London: Routledge, 1997, p. 381-390. ______. A bomba informática. Tradução de Luciano Vieira Machado. São Paulo: Estação Liberdade, 1999. WEB 2.0 SUMMIT: Site inteligente reconhece os interesses dos usuários. Folha de S. Paulo, São Paulo, quarta-feira, 24 de outubro de 2007. Informática . YURI, Débora. Os www babies: Quando eles nasceram, a internet já existia; para a geração que começa a chegar à idade adulta, a tecnologia é uma extensão do próprio cérebro. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 05 de fevereiro de 2006. Cotidiano. ZARANKIN, A. Os guardiões do capital: Arqueologia da Arquitetura dos Bancos de Buenos Aires. 2002. Projeto de Pós-doutorado submetido a FAPESP, Unicamp, 2002. ______. Paredes que domesticam: arqueologia da arquitetura escolar capitalista. Campinas: Unicamp, 2002. ZIZEK, Slavoj. A falha da BIO-ÉTICA. Folha de S. Paulo, São Paulo, domingo, 22 de junho de 2003. Mais. ZUKIN, Sharon. The cultures of cities. London, UK: Blackwell Publishers, 1995. WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus lógico-philosophicus. Paris: Gallimarad, 1961.
122
BOOKMARKS (SITES VISITADOS/CONSULTADOS)
http://www.3dcafe.com/
http://www.geocities.com/CapeCanaveral/2971/awasps.html
http://arqueo-blog.blogspot.com/
http://66.102.7.104/search?q=cache:Q7kdWIL9PUYJ:www.vitruvius.com.br/arquitextos/arq000/esp301.asp+fabio+duarte&hl=pt-BR
http://scii.nl/
http://atlasambiental.prefeitura.sp.gov.br/
http://almanaque.folha.uol.com.br/bd/450anos/mapa/mapa2.htm
http://consorcio.bn.br/cartografia/
http://www.canalciencia.ibict.br/pesquisas/pesquisa.php?ref_pesquisa=6
http://pt.wikipedia.org/wiki/Conserva£o_da_massa
http://www.fcsh.unl.pt/deps/historia/Candidato_arq.htm
http://b2evolution.net/downloads/index.html
http://www.ellipsis.com/evolutionary/evolutionary.html
http://www.itaucultural.org.br/AplicExternas/enciclopedia_IC/index.cfm?fuseaction=obra&cd_verbete=670&cd_obra=61236
http://fisicanet.terra.com.br/
http://scholar.google.com.br/schhp?hl=pt-BR
http://efisica.if.usp.br/mecanica/curioso/cap03/cap3framebaixo.php
http://www.ipcc.ch/index.html
http://www.ipa.min-cultura.pt/
http://www.nature.com/nature/index.html
http://www.archiplanet.org/wiki/Main_Page
http://www.mediawiki.org/wiki/MediaWiki/pt
http://www.casthalia.com.br/casthalialinks/netartartistas.htm
http://www.dhi.uem.br/publicacoesdhi/dialogos/volume01/vol6_atg6.htm
http://www.qubit.org/
http://www.nature.com/nature/journal/v438/n7068/full/438554a.html
123
http://www.nature.com/nature/journal/v438/n7068/full/438550a.html
http://www.sp360.com.br/index.html
http://www.talkorigins.org/faqs/tierra.html
http://www.fl.uc.pt/
http://www.unl.pt/webpage/home.htm
http://www.tech.oru.se/cad/varkon/index.htm
http://www.virtualhelsinki.fi/index.php?lg=english
http://www.gnu.org/licenses/license-list.pt.html
http://web.media.mit.edu/~federico/living-memory/
http://www.comune.bologna.it/girabologna/
http://www.i3net.org/
http://picasso.tamu.edu/picasso/WorksIndex?Year=1928
http://www.tamandare.g12.br/ciber/
http://www.aveiro-digital.pt/default.asp
http://www2.crb.ucp.pt/Biblioteca/BibliotecaDigital/Historia/Hist_Arte.htm
http://www.artcyclopedia.com/
http://en.wikipedia.org/wiki/Comparison_of_free_software_hosting_facilities
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/
http://www.folha.uol.com.br/
http://vejaonline.abril.uol.com.br/notitia/servlet/newstorm.ns.presentation.NavigationServlet?publicationCode=1
http://www.naya.org.ar/congreso/ponencia3-13.htm
http://portal.iphan.gov.br/portal/montarPaginaInicial.do
http://www.sabeventos.com.br/
http://www.wired.com/culture/geekipedia/magazine/geekipedia/abrams
http://www.itaucultural.org.br/arqueologia/
http://66.102.1.104/scholar?hl=pt-BR&lr=lang_pt&q=cache:tOHqHUi_7K4J:https://repositorium.sdum.uminho.pt/retrieve/124/tesepb_vers_final.pdf+inform¡tica+arqueologia
http://www.avph.cjb.net/
124
http://carapaudigital.blogs.com/carapau_digital/2005/12/cidades_digitai.html
http://www.catalhoyuk.com/
http://www.coverpop.com/
http://www2.brazcubas.br/davi/
http://del.icio.us/
http://www.digg.com/
http://www.online_filtered-archaeology.com/DigitalVinca.htm
http://www.ebah.com.br/
http://www.flickr.com/
http://www.geotimes.org/dec05/feature_paleontology.html
http://www.linturi.fi/HelsinkiArena2000/
http://www.archaeologyinfo.com/species.htm
http://icommons.org/
http://www.lowpoly.com/progress/
http://www.mae.usp.br/
http://en.citizendium.org/wiki/Main_Page
http://www.ning.com/
http://zoho.com/
http://www.pipl.com/
http://www.caralperu.gob.pe/equipo_human.htm
http://www.natasha.cc/primo.htm
http://reddit.com/
http://www.sabeventos.com.br/
http://paleodb.org/cgi-bin/bridge.pl
http://www.iamas.ac.jp/interaction/i97/artist_artcom.html
http://www.virtualhelsinki.net/english/help/arenanet.html
http://br.youtube.com/
http://okapi.berkeley.edu/res/sites/pool/about.html
125
http://www.virtualhelsinki.fi/
http://www.culture.gouv.fr/culture/arcnat/chauvet/fr/
http://www.comune.bologna.it/index.php
http://www.i3net.org/
http://totoexpress.com/
http://pbwiki.com/
http://stikipad.com/tour/changes.shtml
http://maps.google.com/maps
http://www.wayfaring.com/
http://www.dailymotion.com/
http://www.metacafe.com/
http://www.netvibes.com/
http://www.pageflakes.com/
http://csiweb2.cite-sciences.fr/derosnay/english/link.html
http://www.co-link.org/
http://www.fxdesignstudio.com/crengpub.htm
http://books.google.com/books?hl=pt-BR&lr=&id=c19GrhVBV90C&oi=fnd&pg=PA14&dq=boyer,+christine+the+city+of+collective+memory&ots=GSfDhUQDR1&sig=aqBa7uNDVZYplfFubF0Td-e_AD4
http://acg.media.mit.edu/people/fry/anemone/movie/
http://labs.live.com/photosynth/unsupportedos.html
http://www.artcom.de/
http://www.museumsinsel-berlin.de/index.php?lang=en&page=1_1
http://www.uni-tuebingen.de/troia/vr/vr0101_en.html
http://www./redir.php?http://www.e-gallery.com.br/cp/
http://www.chrisharrison.net/index.html
http://www.mvblogs.org/visuals/visual_08.php
http://www.flickr.com/photos/krazydad/sets/140323/
http://www.visualcomplexity.com/vc/
http://www.thewhalehunt.org/