Batuque da vida
Associação Carnavalesca Bloco Afro OlodumSalvador, Bahia
Juan Carlos dos Santos19anos
Desde pequeno, Juan Carlos Santos adorava acompanhar o pai nasrodas de samba aos fins de semana. Eram apresentações amadoras,mas muito divertidas. Juan tocava pandeiro, para deleite dos adultos.Na segunda-feira, o pai voltava ao trabalho, como ascensorista, e arotina de Juan seguia longe da cena musical até que, numa tarde pré-carnavalesca, em 1999, ele ouviu uma batida diferente vinda de umadas ladeiras do Pelourinho. Curioso, seguiu o som e parou diante deum dos tantos sobrados que formam o conjunto arquitetônico con-siderado Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO. O ensaiodo Olodum hipnotizou o garoto. Três anos depois, ele realizou o sonhoque o acompanhou desde aquela descoberta: ser parte daquele grupo.
Hoje, aos 19 anos, oito de Olodum, Juan atua como monitor – chegaa liderar até 100 meninos durante os ensaios do “bandão”, em que osalunos da escola se reúnem para tocar. “Aprendi a ler partituras e a medesenvolver no palco, superando minha timidez. Afeiçoei-me a váriosinstrumentos e aprendi também a lidar com a sociedade: como ajudar,como me comunicar, como reivindicar”, diz. Nos últimos meses, Juanrealiza um sonho. Passa suas horas livres em um estúdio de gravação,preparando o primeiro DVD do grupo de pagode Beat Beleza, em queatua como percussionista e compositor.
Sob os cuidados dos mesmos produtores de bandas consagradas daBahia, o Beat Beleza nutre a expectativa de explodir no próximo carnaval,percorrendo o caminho de tantas outras bandas baianas. Mesmo queisso não ocorra, Juan, que cursa o 2º ano do Ensino Médio, já tem opçõessuficientes para se considerar um jovem de sucesso – ainda não sabese será músico ou se estudará administração. Apareceu diversas vezesna televisão, mostrando como se bate num surdo de marcação. Viajoupara se apresentar em algumas capitais brasileiras e tocou no Japão.
“Eu sempre digo para os meninos que eles não precisam ser músicos,mas cidadãos”, ensina Antônio Carlos Sousa Santana, o Pacote, 45 anos,professor de percussão da escola, ele mesmo um menino criado nas ruasdo Pelourinho, onde catou papelão, foi flanelinha e vendeu amendoim.
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Quando criança, Pacote morou no sobrado onde hoje funcionaa escola, que era um cortiço e, antes disso, havia abrigado umbordel. “A gente busca despertar neles uma consciência crítica. Oimportante é que eles entendam seus deveres, seus compro-missos, suas histórias, sua ética, e sejam cidadãos”, concordaCristina Colacio, coordenadora da escola.
Pelourinho
“O Pelourinho era um bairro totalmente esquecido pelo poderpúblico. Foi o barulho desses tambores que chamou a atenção.Quando o Olodum surgiu, em 1980, o objetivo era dar aos negrose pobres uma opção de brincar no Carnaval, porque naquela épocasó a elite participava”, explica Cristina. “O Olodum surgiu para fazera gente se divertir e virou essa força”, admira-se ainda hoje Pacote.
Com a revitalização da área e o reconhecimento do público emrelação à contribuição do Olodum ao carnaval da Bahia, o grupoganhou o mundo. Com sua formação clássica de dezenove inte-grantes, frequentou os palcos e clipes de Paul Simon, MichaelJackson, Jimmy Cliff e Ziggy Marley, entre outros. A batida dosamba-reggae também foi incorporada por diversos artistasbrasileiros, fazendo ecoar ainda mais os tambores pintados comas cores do pan-africanismo (verde, amarelo, preto e vermelho),ideologia que advoga a união da África. As cores estão presentesna maioria das bandeiras dos países daquele continente. A corverde simboliza a mata; a amarela, o ouro; a preta, a pela negra, ea vermelha, o sangue derramado pelos escravos.
Em 1985, o Olodum criou sua escola, com o projeto Rufar dosTambores. Desde então, 15.700 crianças e jovens foram atendidas.Atualmente, 360 têm aulas de dança afro, coral, informáticabásica e avançada, de produção cultural e formação de liderança.
Suvenir
O Olodum virou suvenir de Salvador – sua marca é pirateada àluz do dia e oferecida aos turistas por ambulantes. Grupo e pro-jeto social caminham em paralelo. O Bando de Teatro Olodum, deonde saiu o ator Lázaro Ramos, já ganhou vida própria. Outrosdiversos projetos, como o AfroReggae, do Rio de Janeiro, e o Meni-nos do Morumbi, de São Paulo, replicam Brasil afora a metodologiapioneira de trabalhar com crianças e jovens por meio da música.
Em 2009, o Criança Esperança apoiou uma série de workshopsque apresentaram novos ritmos aos alunos. Profissionais deCuba e da África foram a Salvador ensinar rumba e toques docandomblé. Mais recentemente, introduziram-se na escolaaspectos da dança dos orixás para cultivar elementos da culturaafro-brasileira, misturados à dança moderna.
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Em 2010, o Olodum, que, em iorubá, quer dizer “Senhor Supremo”, completou 30 anos. Nesse ritmo aceleradodos tambores que descem e sobem as ladeiras do Pelô, tem mostrado que, brincando o carnaval e batucando, épossível mudar a cara da cidade e aumentar a autoestima de uma população há muito tempo marginalizada.
O Olodum foi criado como um bloco de Carnaval e ajudou a revitalizar o bairro do Pelourinho, em Salvador. Tocou comPaul Simon, Jimmy Cliff e Ziggy Marley.
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O Ministério da Educação adotou comoprograma nacional o Escola Aberta, baseadono Abrindo Espaços, desenhado pelo UNESCOno ano 2000 e, até então, implantado em cincoestados do país – Pernambuco, Rio de Ja-neiro, Bahia, São Paulo e Rio Grande do Sul.
O programa, que se baseia na abertura dasescolas públicas nos fins de semana, ofere-cendo atividades de esporte, cultura e lazer,chegou a abrir só nesse primeiro ano dez milcolégios para atender 2,6 milhões de jovens,majoritariamente em São Paulo. Hoje o pro-grama está implantado nos 26 estados e noDistrito Federal.
No mesmo ano, governadores de 11 es-tados assinaram o pacto nacional Um Mundopara a Criança e o Adolescente do Semiárido,comprometendo-se publicamente a melhorara qualidade de vida da população daquela re-gião. As taxas de mortalidade infantil eramduas vezes maiores do que a média nacional.
O trabalho infantil também foi um assun-to em voga, com a celebração dos dez anos deluta pela sua erradicação. Para marcar a data,o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicaçãodo Trabalho Infantil realizou, junto com os 26fóruns estaduais, a Caravana Nacional pelaErradicação do Trabalho Infantil. Crianças eadolescentes que já haviam sido trabalha-dores fizeram propostas para erradicar oproblema, escolheram um representante decada estado e organizaram uma espécie demaratona. Os escolhidos tinham a missão deobter a assinatura do seu governador em ummanifesto que correu todo o Brasil. O trabalhoterminou em Brasília, com adesão do presi-dente Luiz Inácio Lula da Silva.
A partir dessa mobilização, as autoridadescomprometeram-se a pôr em prática políticas
2004
MEC abre escolas nos fins de semana;
país celebra dez anos de luta
contra o trabalho infantil
Depois de 18 anos em parceria com o UNICEF, Criança Esperança amplia seu foco
para a juventude e inicia parceria com a UNESCO
para a eliminação do trabalho infantil. Nomesmo ano, também foi instituído pela Co-missão Nacional de Erradicação do TrabalhoInfantil o Plano Nacional de Prevenção eErradicação do Trabalho Infantil e Proteçãoao Trabalhador Adolescente com o intuito depromover estudos e investigações sobre todasas formas desse tipo de ocupação.
Em abril, o Rio de Janeiro sediou a CúpulaMundial de Mídia para Crianças e Adolescen-tes, o maior fórum mundial de produtores epesquisadores na área de mídia e infância.
Enquanto isso, a Aids seguia e deixava umrastro de incerteza sobre os rumos da doença.Milhares de crianças morriam na África, pra-ticamente sem assistência médica. Em outu-bro, foi criado o grupo Brasil+7, reunindoBrasil, Bolívia, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Ni-carágua, Paraguai, São Tomé e Príncipe eTimor Leste, para unir esforços e tentar ame-nizar o problema. A iniciativa foi lançada pelogoverno brasileiro, em parceria com agênciasinternacionais.
Realizou-se, também, por parte do Movi-mento Nacional pela Cidadania e Solidarie-dade, a I Semana Nacional da Cidadania eSolidariedade. O evento teve como objetivoconscientizar e mobilizar a sociedade civil eos governos para alcançar, até 2015, os OitoObjetivos de Desenvolvimento do Milênio(ODMs), lançados pela Organização das Na-ções Unidas (ONU), no ano 2000.
Transição
O ano de 2004 foi de transição para o
Criança Esperança: teve início a parceria com
a UNESCO ao final de 18 anos com o UNICEF.
Ambas as instituições são membros do sis-
tema da Organização das Nações Unidas
(ONU). Criado originalmente para ser um
porta-voz das crianças excluídas, o Programa
ampliou gradativamente seu escopo de
atuação e incorporou também adolescentes
e jovens em situação de risco. A educação e a
cultura, que fazem parte do mandato da
UNESCO, passaram, então, a ser ferramentas
essenciais para operar as intervenções neces-
sárias. A partir da transição, o Criança Espe-
rança foi cada vez mais interiorizado pelo
país. Hoje está presente em 26 estados e no
Distrito Federal.
Ainda em 2004, foi realizado pela UNESCO
o I Seminário de Gestão dos Espaços Criança
Esperança, reunindo as equipes da Organiza-
ção, da TV Globo e das ONGs que coordenam
localmente os espaços. O evento teve como ob-
jetivo qualificar o trabalho desenvolvido nes-
tes centros de referência. Em Pernambuco, o
Centro de Cultura Luiz Freire assumiu a gestão
local do Espaço Criança Esperança de Olinda.
Em São Paulo, a coordenação é do Instituto
Sou da Paz; no Rio de Janeiro, é do Instituto
Viva Rio e, em Belo Horizonte, da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais.
Também em 2004, foi criada a Associação
de Empreendedores Amigos da UNESCO, que
reúne empresários brasileiros de destaque que
dão suporte a ações da Organização em favor
da educação, da ciência e da cultura.No mesmo ano, o especial Criança Espe-
rança teve dois dias de show no Ginásio doIbirapuera, em São Paulo. O programa exibiudados da violência letal que envolve jovens de15 a 24 anos, revelados durante quatro anosconsecutivos pelo Mapa da Violência, lançadopela UNESCO.
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“Quando a TV Globo propôs que a UNESCO aceitasse coordenar o programa Criança Esperança, aUNESCO já investia enfaticamente na defesa dos direitos da infância e da adolescência por meio doestímulo à educação de qualidade para todos, da realização de diagnósticos sobre violência na juventude,da articulação de forças para o enfrentamento da pedofilia via internet, entre outras ações e atividadesque mobilizavam tanto esse organismo das Nações Unidas quanto seus parceiros no Governo, nainiciativa privada e na sociedade civil. Naquela época, a UNESCO aceitou o honroso desafio e, passadosseis anos, estou certo de que valeu a pena. A parceria entre TV Globo e UNESCO representa o somatóriode forças indispensáveis para o êxito de uma iniciativa como o Criança Esperança. De um lado, o poderde penetração de uma emissora de TV líder de audiência. De outro, a credibilidade e a competênciatécnica de um organismo internacional comprometido com os direitos humanos.”
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Jorge WertheinRepresentante da UNESCO no Brasil de 1996 a 2005
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