A alternância da forma padrão do ditongo [ão] pela forma não padrão [on] no falar dos
jovens cacerenses
Simone Carvalho Mendes (UNEMAT/Fapemat)1
Jaqueline Dias da Silva (UNEMAT/Fapemat)2
Drª. Jocineide Macedo Karim (UNEMAT)3
Resumo: Propomos neste trabalho, apresentar uma pesquisa realizada com os jovens da cidade
de Cáceres-MT, esta pesquisa foi desenvolvida a partir da teoria Sociolinguística Variacionista,
uma área de estudo, cujo objetivo é o de descrever e sistematizar as variações linguísticas
existentes, e por compreender que a língua é heterogênea destacamos que a variação pode
ocorrer no uso da língua de diferentes maneiras, pois as variantes são escolhas do falante, na
hora do pronunciamento, desse modo, nosso objetivo é descrever os usos linguísticos no falar
dos jovens da referida comunidade, e por se tratar de uma cidade histórica com costumes e
tradições fortes, temos como objetivo analisar a frequência de uso da alternância do [ão] por
[on] no falar dos jovens cacerenses. A análise foi baseada nos estudos dos teóricos Willian
Labov (1972) e Fernando Tarallo (1997). A fala foi gravada, transcrita e analisada conforme
os fatores condicionadores extralinguísticos. Com a análise, podemos observar que as jovens
nativas tendem a utilizar com maior frequência a forma não padrão [on] do que os jovens do
sexo masculino, desse modo elas conservam a variante da região mantendo viva a variante
utilizada por seus antepassados.
Palavras- chave: Sociolinguística Variacionista, Comunidade, Cáceres-MT, Jovens, nativos.
Abstract: We propose in this work, to present a research fulfilled with the youths of the city
of Cáceres-MT, this research was developed from the Sociolinguistic Variationist, an area of
study, of which the aims in is to describe and systematize the existing linguistic variations, and
to understand that the language is heterogeneous we emphasize that the variation can occur in
the use of the language in different ways, since the variants are choices of the speaker, at the
time of the pronouncement, thus, our aim is to describe the linguistic uses in the speaking of
the young people of the referred community, and because it is a historical city with strong
customs and traditions, we have as objective to analyze the frequency of alternation use of [ão]
by [on] in the speaking of the cacerenses youths. The analysis was based on the studies of
theorists Willian Labov (1972) and Fernando Tarallo (1997). The speech was recorded,
transcribed and analyzed according to the extralinguistic conditioning factors. With the
analysis, we can observe that native girls tend to use the non-standard form more often than
boys, thus keeping the variant of the region keeping alive the variant used by their ancestors.
Keywords: Variationist sociolinguistic, Community, Cáceres-MT, Youths, natives.
1 Autora: Mestranda no curso de Pós Graduação em Linguística da Universidade do Estado de Mato Grosso
(UNEMAT), email: [email protected]. 2 Co-autora: Doutoranda no curso de Pós Graduação em Linguística da Universidade do Estado e Mato Grosso,
(UNEMAT), email: [email protected]. 3 Orientadora: Doutora em Linguística pela Universidade Estadual de Campinas (2012). Mestre em Linguística e
Língua Portuguesa pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2004). Atua como professora de
graduação no curso de Letras da Universidade do Estado de Mato Grosso. Tem experiência na área de Linguística,
com ênfase em Sociolinguística, email: [email protected].
Introdução
Esta pesquisa é o resultado de um estudo realizado com os jovens nativos da cidade
de Cáceres-MT, no qual tínhamos como objetivo descrever e analisar os usos linguísticos
recorrentes no falar dos mesmos, e compreendendo que “o objeto da Sociolinguística é o estudo
da língua falada, observada, descrita e analisada em seu contexto social” Alkmim (2011, p.31),
isto é, em situações reais de uso, propomos realizar nossa pesquisa com 12 jovens da referida
comunidade.
Para tanto, tomamos como ponto de partida o conceito de comunidade de fala, e
segundo Alkmim (idem, p.31) “uma comunidade de fala se caracteriza não pelo fato de se
constituir por pessoas que falam do mesmo modo, mas por indivíduos que se relacionam, por
meio de redes comunicativas diversas, e que orientam seu comportamento verbal por um
mesmo conjunto de regras”, sendo assim, ao estudar uma comunidade de fala, o pesquisador
irá se deparar com diferentes modos de falar, ou seja, ao adentrar uma comunidade o
pesquisador estará diante das diversidades linguísticas, sendo assim, procuramos observar no
falar dos jovens cacerenses as variantes regionais mais recorrentes, assim como também
analisamos as frequências de usos das mesmas.
O corpus desta pesquisa foi constituído a partir de entrevistas, realizadas na cidade de
Cáceres-MT, nos seguintes bairros: Cavalhada, Massa Barro, Vila Irene e Vila Mariana,
totalizando doze entrevistas. Levamos em consideração neste estudo os seguintes fatores
extralinguísticos a idade, o sexo e a escolaridade dos informantes, sendo estes distribuídos da
seguinte forma, 6 do sexo feminino e 6 do sexo masculino, com idades entre 15 e 25 anos,
todos escolarizados e nativos da comunidade.
Metodologia
Os procedimentos metodológicos adotados neste estudo, seguem os pressupostos
teóricos de Labov (1972) e Tarallo (1997). Deste modo, descrevemos neste tópico as etapas
percorridas na pesquisa para a constituição do corpus, a entrada na comunidade, a realização
das entrevistas e as transcrições, mostramos também os critérios utilizados para a seleção dos
informantes e o perfil sociocultural destes.
Tarallo (idem, p. 21) diz que “o pesquisador-sociolinguísta, como afirmamos, deve
coletar: 1. Situações naturais de comunicação linguística e 2. Grande quantidade de material,
de boa qualidade sonora”, seguindo este pressuposto, partimos para a coleta de dados, com um
celular4/gravador em mãos e um questionário, as entrevistas foram realizadas entre os dias 12
de Julho de 2014 á 10 de Agosto de 2014, onde entrevistamos 12 jovens da comunidade de
Cáceres-MT, estes com idades entre 15 e 25 anos, conforme a tabela abaixo:
Tabela 1: Os entrevistados. Fonte: Tabela elaborada pela autora.
Além de considerarmos os fatores extralinguísticos sexo e faixa etária, conforme
disposto na tabela 1, adotamos ainda, alguns critérios de seleção dos nossos informantes, são
eles:
a) Ter nascido na cidade de Cáceres-MT;
b) Ter pais nascidos na cidade de Cáceres-MT;
c) Não ter se ausentado da cidade de Cáceres-MT, nos últimos 05 anos;
d) Que os pais não tenham se ausentado da cidade de Cáceres-MT, nos últimos 05 anos.
Assim apresentamos na Tabela 2, o perfil sociocultural dos nossos informantes:
Tabela 2: Perfil sociocultural
Identificação5 Sexo Idade Escolaridade6 Atividade
RASA Feminino 25 anos E.M.C Dona de casa
GFA Feminino 20 anos E.M.C Autônoma
FNB Feminino 16 anos E.M.I Estudante
VALS Feminino 25 anos E.M.C Autônoma
LOS Feminino 25 anos 5ª série Doméstica
4 Decidimos utilizar o celular para gravar as entrevistas, com objetivo de amenizar o estranhamento que causaria
o uso de um gravador de voz, tendo em vista, que o público alvo de nossa pesquisa são os jovens, deste modo,
consideramos que o celular gravando lhes seria mais familiar. 5 Para manter em sigilo o nome dos informantes, substituímos os nomes dos entrevistados por códigos. 6 Na tabela 2, colocamos o nível de escolaridade em siglas: E. M. C= Ensino médio completo/ E. M. I= Ensino
médio incompleto.
Entrevistados da pesquisa Jovens entre 15 e 25 anos
Sexo masculino 6
Sexo feminino 6
Total 12
LPO Feminino 22 anos 5ª série Doméstica
JOS Masculino 19 anos 4ª série Autônomo
JSMS Masculino 25 anos E.M.C Autônomo
RS Masculino 22 anos E.M.C Autônomo
LSM Masculino 25 anos E.M.C Ajudante de
motorista
WTSO Masculino 20 anos 8ª série Estudante
EPO Masculino 20 anos 4ª série Autônomo
Fonte: Tabela elaborada pela autora.
Como podemos observar na tabela 2, os dados socioculturais dos informantes foram
diversificados, variando a idade, a escolaridade e a atividade desenvolvida pelos mesmos, deste
modo, observamos a seguinte fala de Tarallo (idem, p. 21), para o autor:
O pesquisador, ao selecionar seus informantes estará em contato com falantes
que variam segundo classe social, faixa etária, etnia e sexo [...] seja quem for
o informante, o pesquisador deverá tentar neutralizar a força exercida pela
presença do gravador e por sua própria presença como elemento estranho à
comunidade.
Ou seja, ao adentrar a comunidade o pesquisador estará em contato com pessoas que
variam e muito, e toda esta diversidade acaba por refletir nos dados obtidos, deste modo, o
pesquisador deverá amenizar sua presença enquanto elemento estranho na comunidade, bem
como a presença do gravador, por este motivo utilizamos o gravador do celular, com intuito de
atenuar o estranhamento que um gravador causaria, isso se fez necessário, tendo em vista, que
nosso objetivo com as entrevistas é a língua utilizada no cotidiano, ou seja, o vernáculo, e
quanto mais natural for a entrevista maior será a qualidade e a quantidade de dados para análise,
Tarallo (idem, p. 19), diz que, “a língua falada é o vernáculo: a enunciação e expressão de fatos
proposições ideias (o que) sem a preocupação de como enunciá-los. Trata-se, portanto, dos
momentos em que o mínimo de atenção é prestado á língua, ao como da enunciação”.
Buscando capturar dados naturais da fala, de boa qualidade e com dados confiáveis,
elaboramos um questionário7 com 23 perguntas, sendo que estas questões serviram para
homogeneizar os dados da fala, ou seja, todos os informantes responderam as mesmas
7 O roteiro de entrevista/questionário, foi elaborado de acordo com o questionário de Macedo-Karim (2012).
perguntas. Nosso questionário foi composto pelos seguintes temas: a cultura, o clima, as
danças, as lendas, as comidas, as bebidas e as músicas regionais de Cáceres-MT, decidimos
elencar tais temas em nosso questionário, com o propósito de mostrar que nossa pesquisa tinha
o objetivo de conhecer um pouco mais da comunidade cacerense, nos colocando assim, como
aprendiz, de maneira que não tocamos na palavra “língua” durante nossas entrevistas.
Conforme Tarallo (idem, p. 21):
Tal neutralização pode ser alcançada no momento em que o pesquisador se
decide a representar o papel de aprendiz-interessado na comunidade de
falantes e em seus problemas e peculiaridades. Seu objetivo central será,
portanto, aprender tudo sobre a comunidade e sobre os informantes que a
compõem. A palavra “língua” deverá ser evitada a qualquer preço, pois o
objetivo é que o informante não preste atenção a sua própria maneira de
falar.
Nossas entrevistas tiveram a duração aproximada de 15 á 30 minutos cada, e estas
foram passadas para o computador e transcritas uma á uma, sendo que para as transcrições das
entrevistas levamos aproximadamente de 3 á 4 horas, a transcrição dos dados requer do
pesquisador grande atenção, pois os dados coletados devem ser transcritos conforme a fala dos
entrevistados.
Conforme Paiva (2004, p. 135):
É necessário ressaltar que qualquer transcrição de dados linguísticos subjaz,
mesmo que não explicitada, uma teoria que norteia muitas das decisões a
serem tomadas durante o processo. De certa forma, podemos afirmar que a
transcrição pressupõe uma pré-análise dos dados, na medida em que nosso
posicionamento teórico preestabelece, muitas vezes, a própria unidade de
análise a ser considerada [...] E, além disso, é a orientação teórica do
pesquisador e os seus objetivos que modelam a transposição dos registros
orais para uma forma gráfica. Esse sistema de convenções se faz necessário
para garantir um mínimo de consistência no processo de transcrição dos dados
da fala.
Seguindo tais pensamentos, podemos compreender que o posicionamento teórico
adotado para a transcrição dos dados da fala é muito importante, tendo em vista que é a partir
deste que o pesquisador poderá conduzir suas análises. O levantamento linguístico do falar dos
jovens cacerenses foi feito através de entrevistas e de transcrições grafemática da fala, para
tanto tomamos como base teórica Marcuschi (1998) e Cintra (1992). Para mantermos a
fidelidade dos usos linguísticos na transcrição grafemática, procuramos manter a fala dos
entrevistados tal qual foi gravada, segundo Paiva (idem. p. 136):
A fidelidade aos dados orais deve ser o objetivo de toda transcrição.
Queremos registrar o que foi dito por um falante da forma como foi dito. Uma
transcrição não é e não pode ser uma edição da fala do entrevistado. Assim,
se um falante diz as menina bonita8 (ao invés de as meninas bonitas), tal
cadeia deve ser registrada exatamente da forma como foi pronunciada.
Partindo desta premissa, desenvolvemos nossas transcrições de maneira a respeitar o
falar de cada um, procurando manter a fidelidade dos dados obtidos por meio das gravações,
em suma, podemos dizer que as entrevistas ocorreram de forma tranquila, sem alterações, ou
seja, não ocorreram eventualidades que prejudicassem as mesmas, fomos muito bem
recebidos em todas as casas que passamos e nossos entrevistados se mostraram dispostos á
responder ao questionário de modo, que conseguimos os dados para as análises.
Análise dos dados
Neste tópico, apresentaremos os resultados obtidos com o levantamento dos dados,
para tanto tomamos como base teórica a Sociolinguística Variacionista, cujo objeto de estudo
é a “língua falada, observada, descrita e analisada em seu contexto social, isto é, em situações
reais de uso. Seu ponto de partida é a comunidade linguística, um conjunto de pessoas que
interagem verbalmente e que compartilham um conjunto de normas” (Alkmim, 2011, p.31).
Ainda no mesmo pensamento, Calvet (2002, p. 116) afirma que, Labov atendia a
comunidade linguística não como “um conjunto de falantes empregando as mesmas formas”,
mas como um grupo de falantes que compartilham conjuntos de normas sociais para com a
língua.
Partindo de tais definições de comunidade linguística, observamos que a comunidade
em estudo, ou seja, a comunidade de Cáceres-MT considerada uma das cidades mais antigas
do estado de Mato Grosso, é por si só uma grande fonte de material para pesquisas nas diversas
aéreas de conhecimento, em especial para nós enquanto linguistas, fato evidenciado em nossos
estudos por meio dos resultados obtidos. Dentre os usos linguísticos mais recorrentes, no falar
8 Grifos da autora.
dos jovens cacerenses podemos citar três, são elas: a) a variação na concordância nominal de
gênero; b) as realizações africadas e fricativas e c) a alternância do ditongo [ão] pelo [on],
sendo que a primeira forma [ão] é considerada a forma padrão e a segunda forma [on] como a
forma não padrão. Porém neste estudo, apresentaremos apenas a alternância do ditongo [ão]
pelo [on] no falar dos jovens cacerenses, apresentamos abaixo, recortes das entrevistas para
exemplificação:
(1 ) Já di siriri... no... grupu tradiçon aqui da cidadi. (EPOM20)
(2) Vôti eu num gostu de lambadon... di rasquiadu eu gostu um pouco. (GFAF20)
Como pode ser observado nos recortes acima, (1) e (2) é marcado pela alternância da
forma padrão do ditongo [ão] pela forma não padrão [on] no falar dos jovens cacerenses, ou
seja, ambos os recortes apresentam a variação em estudo, nas quais iremos analisar as
ocorrências dessas trocas no falar dos jovens informantes, de modo que selecionamos este
fenômeno, por ter sido o mais recorrente durante nossas entrevistas.
Deste modo, apresentamos a frequência de uso, em que ocorrem as alternâncias da
forma padrão do ditongo [ão] pela forma não padrão [on] no falar dos jovens da cidade de
Cáceres-MT. Tendo em vista, que estas ocorreram no falar dos jovens informantes, de ambos
os sexos, como pode ser observado em alguns trechos das entrevistas abaixo:
(3) Conheço muitas letra di lambadon [...] conheço todas lenda daqui... a mais
conhecida é a da serpente né... du minhocon da catedral [...] achu qui isso também é
cultura né... tradiçon. (LPOF22)
(4) Nóis gosta muito di lambadon i rasquiadu [...] as lenda eu conheçu a du
minhocon... da mula sem cabeça. (VALSF25)
(5) Já di siriri... nu grupu tradiçon aqui da cidadi [...] eu gostu di lambadon [...] aqui
qui eu cresci inton tem qui mi orgulha. (EPO20M)
(6) Di melhor a religion né... qui aqui tem muita [...] já dancei bastante lambadon nas
festa né. (WTSO20M)
Deste modo, apresentamos um dos estudos sobre a alternância do [ão] pelo [on]
realizado na cidade de Cáceres estado Mato Grosso, Silva (2000) estudou este fenômeno
linguístico no português falado na cidade de Cáceres-MT, de acordo com a referida
pesquisadora a realização desta variação na comunidade estaria relacionada a fatores
linguísticos e extralinguísticos. De acordo com os resultados da pesquisa os fatores sociais se
mostravam como os mais relevantes na alternância do [ão] pelo [on], apontando assim,
possíveis modificações que estavam ocorrendo no falar da comunidade na direção da troca da
variante não padrão [on] pela variante padrão [ão].
Com os resultados obtidos nesta pesquisa, concluímos que a variante [ão], na cidade
de Cáceres-MT, é mais comum na fala de pessoas mais jovens, enquanto a variante [on] é mais
comum na fala de pessoas mais velhas, independente da classe social ao qual está inserida,
deste modo a autora ressalta uma aparente mudança em curso, além disso, indícios levaram a
pesquisadora a sustentar a hipótese de que a variante não padrão [on] é uma variante arcaizante,
e que possivelmente é um traço fonético trazido pelos colonizadores vindos do Norte de
Portugal, no período da colonização.
Analisando as constatações de Silva (2000) concordamos, que o uso da forma não
padrão o ditongo [on] é a conservação de uma forma antiga da língua portuguesa, que pode ser
encontrada no norte de Portugal e que se manteve viva no falar dos moradores da cidade de
Cáceres-MT, e ao contrário do que se pensava a referida pesquisadora, nossos estudos
mostraram que a variante não padrão [on] ainda permanece no falar da comunidade de Cáceres-
MT, até os dias atuais, podendo ser encontrada inclusive no falar dos jovens cacerenses, como
pode ser observado nas análises á seguir.
• A frequência do uso da alternância da forma padrão [ão] e não padrão [on].
Neste tópico, apresentamos os resultados obtidos com a coleta de dados, conforme
disposto nas tabelas subsequentes, apresentaremos assim, as ocorrências do uso do fenômeno
em estudo. Conforme a proposta inicial, iremos analisar a frequência do uso linguístico o seja,
a alternância do ditongo [ão] forma padrão por [on] forma não padrão na fala dos jovens
informantes da cidade de Cáceres-MT.
Na tabela 3, apresentamos as ocorrências dos usos linguísticos por informante, tanto
da forma padrão [ão] quanto da não padrão [on], de maneira que nossos entrevistados possuem
o nível de escolaridade que variam de fundamental completo á nível médio incompleto, bem
como consideramos as seguintes faixas etárias de 15 a 25 anos, sendo que estes são 6
informantes do sexo feminino e 6 informantes do sexo masculino.
Tabela 3: Número de ocorrências da alternância da forma padrão [ão] e não padrão [on] por
informante.
Informante Ocorrência [ão] Ocorrência [on]
RASAF25 2 6
LOSF25 3 9
FNBF16 6 2
VALSF25 2 2
LPOF22 2 7
GFAF20 3 6
LSMM25 2 2
WTSOM20 1 4
EPOM20 1 6
RSM22 3 2
JSMSM25 1 3
JOSM19 1 3
TOTAL 27 52
Fonte: Tabela elaborada pela autora.
Observando as ocorrências na tabela 3 acima, podemos constatar que o uso da forma
não padrão [on] em final de palavras, resultou em cinquenta e duas (52) ocorrências na fala dos
jovens nativos da cidade de Cáceres-MT, número que consideramos razoável, tendo em vista
que estamos analisando o falar dos jovens nativos. Bem como, observamos que o resultado do
uso da forma padrão do ditongo [ão] na comunidade jovem, atingiu vinte e sete (27) ocorrências
no falar destes, é interessante pensar na preservação da variante não padrão [on], nesta
comunidade, haja vista, que este fenômeno linguístico é considerado como arcaico, porém
conforme os números acima permanecem no falar dos jovens desta comunidade. Na sequência
apresentaremos análises de outras variáveis.
• Variável sexo.
Neste tópico, iremos analisar a variável sexo, considerando que este é um fator
extralinguístico de análise importante para a determinação das ocorrências, tendo em vista que
pretendemos saber se existem diferenças entre o falar dos jovens do sexo masculino e do sexo
feminino da comunidade de Cáceres-MT.
Conforme Paiva (idem, p. 40):
O fato de as mulheres se revelarem lingüisticamente mais conservadoras ou
mais orientadas para variantes de prestígio em algumas comunidades de fala
pode ser, em grande parte, resultado de um processo diferenciado de
socialização de homens e mulheres e da dinâmica de mobilidade social que
caracteriza cada comunidade de fala. Tanto a preferência feminina pelas
formas lingüisticamente socialmente prestigiadas, tendência mais regular
em comunidades de fala ocidentais, como a predominância de variantes
socialmente estigmatizadas na fala feminina, como no já citado árabe,
refletem a rigidez da separação entre os papéis sociais atribuídos a homens
e mulheres, a maior ou menor amplitude das redes sociais de que eles
participam e as restrições de mobilidade social impostas à mulher.
Deste modo, podemos perceber nas palavras da pesquisadora que os usos
linguísticos podem variar conforme o sexo, tendo em vista, que em algumas sociedades as
mulheres tendem a optar pelo uso da língua mais prestigiada socialmente, enquanto em outras,
este fato pode ser observado no falar dos homens, isso por que os papéis sociais desempenhados
por homens e mulheres, ainda são diferenciados e acabam por influenciar nas formas
linguísticas, que estes utilizam em seu cotidiano.
Tabela 4: Ocorrências das formas padrão [ão] e não padrão [on] no falar das informantes do
sexo feminino
Informante do sexo
feminino
Ocorrência [ão] e % de uso Ocorrência [on] e % de uso
RASAF25 2 11,11 % 6 18,75 %
LOSF25 3 16,67 % 9 28,12 %
FNBF16 6 33,34 % 2 6,25 %
VALSF25 2 11,11 % 2 6,25 %
LPOF22 2 11,11 % 7 21,87 %
GFAF20 3 16,66 % 6 18,76 %
Total de ocorrências 18 32
Fonte: Tabela elaborada pela autora.
Conforme a Tabela 4, os resultados mostram que o uso da forma não padrão do ditongo
[on] totalizou (32) ocorrências no falar das mulheres, enquanto o uso da forma padrão [ão]
apresentou apenas (18) ocorrências na fala feminina. Comparando o total de ocorrências da
alternância [ão] por [on], observamos que a forma não-padrão [on] atingiu o maior número de
ocorrências na fala feminina.
As (32) ocorrências do uso da variável não padrão [on], no falar das jovens nativas da
comunidade de Cáceres-MT, apresentaram percentuais de uso que variaram de 6,25 %, 18,76
%, 21,87 % e 28,12%. Esses percentuais de uso não são numerosos, porém, indica que
aparentemente as jovens informantes nativas da cidade de Cáceres-MT, utilizam com maior
frequência a forma não padrão no seu falar. Na sequência, destacamos um fragmento do falar
feminino, contendo os usos linguísticos em estudo:
(7) Acho qui isso também é cultura... tradiçon né... é u qui nossus pai i avós dexaram
pra nós... inton eu achu qui nóis tem qui continua cum essa cultura tão assim... bunita
né... eu participu di todas... di Son Jom... Son Binidito... (LPOF22)
Tabela 5: ocorrências das formas padrão [ão] e não padrão [on] no falar dos
informantes do sexo masculino
Informantes do sexo
masculino
Ocorrências [ão] e % Ocorrências [on] e %
LSMM25 2 22,22 % 2 10 %
WTSOM20 1 11,11 % 4 20 %
EPOM20 1 11,11 % 6 30 %
RSM22 3 33,32 % 2 10 %
JSMSM25 1 11,11 % 3 15 %
JOSM19 1 11,11 % 3 15 %
TOTAL 9 20
Fonte: Tabela elaborada pela autora.
Na tabela 5, apresentamos os resultados obtidos com as entrevistas masculinas, os
usos linguísticos da forma não padrão [on] totalizou (20) ocorrências, variando o percentual de
uso no falar de cada informante que indica índices de 10 %, 15 %, 20 % e 30 % de uso.
Entretanto, a forma padrão [ão] apresentou apenas (9) ocorrências na fala masculina, indicando
índices de atuação que variam de 11,11%, 22,22 % a 33,32 %.
Comparando o total de ocorrências da alternância [ão] por [on] no falar masculino,
percebemos que a forma não padrão [on] atingiu o maior número de ocorrências no falar dos
mesmos. Apresentamos abaixo, recortes das entrevistas masculinas contendo a ocorrência em
estudo:
(8) Aqui em casa é tudu dia... só nu lambadon... (JOSM20)
Deste modo, podemos dizer que tanto as jovens do sexo feminino como os jovens do
sexo masculino, (lembrando que todos os informantes são escolarizados), utilizam as duas
formas linguísticas, alternando os usos linguísticos de padrão e não padrão, nossos informantes
não demonstraram preocupação na escolha de uma ou outra forma linguística. Observamos
também que a forma não padrão [on] constante em conversas diárias, nas falas dos informantes
de ambos os sexos.
Comparando os resultados das Tabelas 4 e 5, percebemos que em ambos os sexos,
predominaram o uso da variável não padrão [on], observamos ainda que as jovens nativas da
cidade de Cáceres-MT tendem a utilizar com maior frequência a forma não padrão do que os
jovens do sexo masculino, conservando a variante da região, e mantendo produtiva a variante
utilizada por seus ancestrais.
Conclusão
Apresentamos aqui os resultados de um estudo realizado na cidade de Cáceres-MT,
cuja pesquisa tinha como objetivo analisar a frequência do uso da alternância da forma padrão
[ão] e a não padrão [on] no falar dos jovens cacerenses sob a luz da teoria da Sociolinguística
Variacionista.
Uma das constatações feitas, no decorrer da pesquisa está relacionada ao fator
extralinguístico sexo, de modo que em ambos os sexos predominam o uso da variante não-
padrão [on], na fala feminina ocorreram (32) ocorrências do uso da variável com percentuais
de usos variando de 6,25 %, 18,76 %, 21,87 % e 28,12%, enquanto a fala masculina apresentou
(20) ocorrências, indicando índices de atuação que variam de 10 %, 15 %, 20 % e 30 %, dessa
forma, afirmamos que a variação permanece viva no falar dos jovens cacerenses, tendo
destaque principalmente na fala das mulheres.
De acordo, com os dados obtidos levantamos duas hipóteses, a primeira seria que a
herança cultural e linguística portuguesa e a caipira, permanecem em Cáceres-MT até os dias
atuais, dado o isolamento pela qual passou essa região durante muitos anos, o que serviu para
preservar a identidade linguística dos moradores dessa região, a outra hipótese seria a de que
os resultados desta pesquisa, para o fator sexo feminino ter apresentado um índice maior da
variante não padrão [on], se deve ao fato de que ao serem entrevistados os informantes do sexo
masculino, se sentiram mais intimidados por estarem sendo entrevistados por uma mulher,
enquanto as informantes do sexo feminino, foram mais espontâneas ao responder o
questionário e por ser uma mulher entrevistando, se sentiram mais á vontade diante da
pesquisadora.
Deste modo, concluímos com este estudo, que a relação dos fatores socioeconômicos
e culturais, apontam condições para a conservação de traços linguísticos da região, podemos
dizer assim, que a variação regional no falar dos jovens cacerenses é detectada em um alto
índice de ocorrência, mantendo viva a variante de seus antepassados.
REFERÊNCIAS
ALKMIM, Tânia Maria (2011). Sóciolinguistica. In: MUSSALIN F.& BENTES, A. C. (Orgs.).
Introdução á Linguística: domínios e fronteiras. 9. Ed. São Paulo: Cortez. p. 21-47.
AMARAL, Amadeu (1920). O dialeto caipira: gramática, vocabulário. 4ª. ed. São Paulo, SP;
Brasília, DF: HUCITEC: INL, 1982.
CALVET, Louis-Jean (2002). Sociolinguística: uma introdução crítica. (Tradução de Marcos
Marcionilo) São Paulo: Parábola.
LABOV, William. (1972). O quadro social da mudança linguística. IN: Padrões
sociolinguísticos. Tradução de Marcos Bagno, Maria Marta Pereira Scherre, Caroline R.
Cardoso. São Paulo, SP: Parábola, 2008. p. 301-373.
MACEDO-KARIM, Jocineide (2004). A Variação na concordância de gênero no falar da
comunidade de Cáceres-MT. Dissertação de Mestrado. Araraquara-SP: UNESP, Faculdade
de Ciências e Letras.
PAIVA, Maria da Conceição di. IN: Introdução á Sociolinguística o tratamento da
variação. MOLLICA, Maria Cecilia e BRAGA, Maria Luiza (orgs.). 2 ed. São Paulo,
Contexto, 2004.
PALMA, Maria Luíza Canavarros. (1980). Variação fonológica na fala de Mato Grosso: um
estudo sociolinguístico. Dissertação de Mestrado – Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro.
_____. (2005). O falar cuiabano em Mato Grosso – Estigma, Status e Atalhos. IN: Vozes
Cuiabanas: estudos linguísticos em Mato Grosso. Almeida, M. M. S. & Cox, M.I. P. (Ogs.).
Cuiabá, Cathedral Publicações. p. 139-165.
SILVA, Mariza Pereira. (2000). Um Estudo de Variação Dialetal: a alternância de [ãw] ~ [õ]
final no português falado na cidade de Cáceres-MT. Campinas-SP: IEL – UNICAMP.
TARALLO, Fernando. (1997). A pesquisa Sociolinguística. São Paulo: Ática.
TEIXEIRA, José Aparecido. (1938). O falar mineiro. IN: Separata da Revista do Arquivo
Municipal de São Paulo.