Aos filhos que amam suas mães; às mães que amam seus filhos; aos jovens que se amam; à loucura do amor!
José Isidio da Silva
A CIDADE DAS ROSAS Esta é uma obra de ficção. Os personagens, nomes, lugares e acontecimentos
descritos são produtos da imaginação do autor.
Qualquer semelhança com nomes e acontecimentos reais é mera coincidência.
1ª Edição
São Paulo
2014
Digitação, diagramação e
montagem de capa: José Isidio
Obra concluída em: Aracaju, 23 de junho de 2009.
José Isidio
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QUANDO Larissa chegou foi direto à cozinha. Estava com
fome. Sorriu ao sentir o cheiro gostoso de comida. Começou a
destampar as panelas para ver o que Sólon tinha feito. O vapor
que subia trazia o odor agradável, fazendo suas glândulas
salivares trabalharem, enchendo a boca de água. Beliscou de
cada coisa um pouco. Tinha o costume de experimentar cada
prato, antes de colocar de vez e começar a comer. Fazia isso
principalmente quando estava com muita fome. Depois disso o
apetite diminuía, e comer não seria tão urgente.
Precisava tomar um banho antes de almoçar. Passou pela
porta do quarto do filho. Ele não estava. Em seu quarto, sentada
à beira da cama, tirou os sapatos. Os pés estavam doloridos.
Massageou-os. Necessitava de sapatos mais confortáveis. Mas
sapatos confortáveis são geralmente os mais deselegantes.
Por que era difícil combinar elegância com conforto? E
por que elegância era mais importante do que sentir-se bem?
-- Os clientes são exigentes! Vendedoras apresentáveis
fazem mais sucesso! – Dizia o dono da loja.
Larissa não via muita lógica nisso. Concordava que devia
estar bem vestida. Gostava de vestir-se bem, mas usar sapatos
de saltos altos num trabalho em que tinha que ficar o dia todo
em pé era um sacrifício sem sentido!
As pernas também doíam um pouco. Talvez estivesse
ficando velha. Não, ainda não era uma velha, apesar de não ser
mais jovem.
Tirou a roupa e enrolou uma toalha no corpo. Mesmo
estando sozinha em casa não gostava de sair nua do quarto para
o banheiro. O filho poderia chegar a qualquer momento e
surpreendê-la.
Depois do banho frio sentiu-se mais leve, mais
rejuvenescida. Vestiu uma roupa folgada, própria de vestir em
casa, embora não tivesse muito tempo para descansar. Logo
teria que voltar à loja para o expediente da tarde.
A Cidade das Rosas
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Quando acabou de almoçar deitou-se recostada em
almofadas, no sofá, para alguns minutos de descanso.
Aonde teria ido Sólon? Não era mais um garotinho. O seu
menino tinha crescido.
Sólon era filho único de Larissa, e não tinha que dividir o seu
afeto com ninguém, nem mesmo com um pai, porque não havia
pai. Ao nascer fora abandonado com a mãe. O rosto dela era o
único que via em casa; ao deitar para dormir, a voz de canção, o
beijo doce e suave; ao acordar, de manhã, na cozinha, à mesa,
no café da manhã, no almoço e jantar, ao sair e ao chegar;
brincando, estudando e nas tarefas da casa – era ele e a mãe, só.
Larissa era forte e saudável. Trabalhava e mantinha o
filho na escola, o único e verdadeiro amor de sua vida. Com 37
anos, parecia uma jovem de 20. Não se podia dizer que não
havia homens interessados nela, mas nunca quis nenhum depois
que se separou do marido. Era feliz na companhia do filho, e
não queria outra desilusão.
Até aos 16 anos, Sólon quase não saia de casa à procura
de outras companhias. Com 17, 18 anos, sua vida mudou um
pouco. Saía com mais frequência, e Larissa compreendia e
aceitava, somente recomendando que tomasse cuidado. Ele
nunca estendia suas saídas além das dez horas da noite. E isso
não tinha sido estabelecido pela mãe. Sabia que ela não dormia
enquanto ele não chegasse, e, por si mesmo, sentia a
responsabilidade de chegar cedo. Jamais causaria preocupação
ou angústia a ela.
O amor entre eles não era possessivo, nem de uma parte
nem de outra. Era o mais puro e verdadeiro amor entre mãe e
filho.
Os dois faziam com frequência longas caminhadas pelo
campo. Amavam a natureza, o ar puro, a liberdade.
Larissa sempre trazia consigo, quando voltava dessas
pequenas aventuras, um punhado de flores, que colhia com a
ajuda do filho. Mas sua flor preferida, que nunca encontrava
nem na cidade nem no campo, era a rosa.
José Isidio
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-- Gosto muito de rosas – dizia sempre que falava em
flores.
Morava com o filho no primeiro andar de uma casa.
Com todas as economias que conseguira juntar e algum
sacrifício, comprara aquela casa à dona Germana, viúva, que
morava embaixo. Era pequena, com poucos cômodos, e não
tinha jardim nem quintal. Por isso o preço não fora tão alto. A
única área externa era a escada, separada por duas paredes da
casa de baixo, até ao portãozinho de saída para a rua.
***
Serra Branca – uma cidade árida, sem atrativos, de construções
sóbrias e quase medievais. Os habitantes, fechados cada um na
sua atividade, pouco dados a gentilezas, mal humorados, e
sempre dispostos a olharem a vida alheia. Nada passava
despercebido a ninguém.
Tudo era motivo de comentários, de julgamentos, de
censuras – a moça que engravidou: “pouca vergonha”; a casada
que traia o marido: “sempre achei que essa sujeita não
prestava”; o dono da padaria que explora nos preços e diminui o
tamanho do pão: “ladrão”; e assim por diante.
Larissa não escapava aos olhares maliciosos e palavras
ditas entre dentes: “mãe solteira! Onde já viu criar filho sem
pai!”. – Para muitos, mulher largada do marido era mulher
solteira. Se tivesse filhos, não sendo viúva, era mãe solteira.
Os vizinhos dos lados e da frente não eram grandes
amigos, mas não negavam um favor, uma ajuda humanitária, se
fosse necessário. Consideravam uma obrigação ajudar uns aos
outros. Isso, porém, não significava que tinham que manter
relação de afeto. A dureza, a aspereza, era a característica de
quase todos. Fazer críticas era mais fácil do que falar palavras
amáveis. Quando sorriam não era por gentileza, mas por uma
intenção maliciosa, como se dissesse: “Eu bem te conheço! A
mim você não engana”.
***
A Cidade das Rosas
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Larissa trabalhava como vendedora em uma loja de tecidos.
Com o que ganhava sustentava o filho. Nas horas vagas pintava
paisagens em quadros, mas nunca se encorajava em expô-los à
venda.
-- Por que o seu filho não arranja um emprego? Já é um
homem! – Observava dona Germana.
-- É o que mais desejamos, dona Germana, mas ainda não
conseguimos – explicava Larissa com humildade.
A vizinha voltava a cara, fazendo um “tuch” com a
língua no céu da boca.
A vida de todo mundo era da conta de todo mundo – não
pensavam assim, mas agiam como se fosse assim.
Sólon entendia que já era tempo de estar ajudando nas
despesas da casa, mas não sabia como. Angustiava-se por ver a
mãe trabalhando e ele sem uma ocupação que trouxesse alguma
renda. E como a mãe tinha um emprego e ele não, não permitia
que ela fizesse qualquer coisa em casa, a não ser algum prato
especial que ele não sabia fazer. Limpava a casa, lavava pratos,
roupas e tudo o mais que fosse necessário. Na cozinha
esforçava-se no preparo de comida que agradasse à mãe.
Quando ela chegava do trabalho e sentava-se no sofá, exausta,
ele se ajoelhava diante dela, tirava o calçado, massageava os pés
cansados de andar o dia todo na loja. Punha a mesa, convidava-
a, e quando ela se aproximava, puxava a cadeira
cavalheirescamente para ela se sentar. E ele, se já havia comido,
sentava-se à frente dela, observando, a ver se a comida lhe
estava agradando. Ficava feliz quando ela dizia: Hum! Está uma
delícia!
Sólon abria um sorriso. E para ela era o sorriso mais
bonito. Um bálsamo para todas as suas dores e cansaço.
Quando, recostada no sofá, ali mesmo dormia, ele cobria-
a carinhosamente com uma manta. Depois saia para dar um giro
pelas ruas, encontrar amigos, e voltava quase sempre antes de
ela acordar. Se acontecesse acordar antes que ele chegasse, não
dormia mais; mas quando acordava e o encontrava em casa, não
saberia que havia saído, se ele não dissesse.
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-- Não precisa se preocupar tanto comigo – dizia o filho.
-- E por que você se preocupa comigo? – respondia a
mãe.
-- Porque você é minha mãe!
-- E você é o meu filho!
-- Sou homem e sei me cuidar!
-- Sou mulher e também sei me cuidar!
-- Você pode saber se cuidar, mas é mulher...
-- Não seja tolo! Pensa que a mulher é mais fraca do que
o homem?
-- E não é?
-- Não necessariamente!
-- Como não necessariamente?
-- Escute o que vou lhe dizer: Carreguei você nove meses
dentro de mim! Cuidava da casa, saia às ruas, trabalhava,
dormia; iniciava outro dia, e dia após dia com você no meu
ventre, crescendo e se tornando mais e mais pesado. Não havia
ninguém pra me ajudar; varrer, lavar, cozinhar; trabalhar para
ganhar o sustento; ia ao mercado, à feira... nove meses...
intermináveis meses. E depois que você nasceu apenas aliviou o
peso do meu corpo, e apesar da felicidade e alegria de ter você,
acrescentou-se a angústia e a preocupação de se estar
definitivamente só, exceto por você. Você nunca teve um pai.
Apenas um genitor, que, se esteve presente enquanto você não
nasceu, foi apenas para acrescentar mais tormento à minha vida.
E os anos que se seguiram, cuidando de você, enquanto criança
indefesa, velando o seu sono, atenta aos mínimos sinais de
mudança de seu humor, falta de apetite, temperatura de seu
corpinho; uma gripe, sarampo, tosse... Protegendo você.
Amando você. Me diga: isso não é ser forte? Não é ser mais
forte do que o homem que gerou você em mim? Que homem,
por forte que seja, carregará uma criança nove meses em seu
ventre?... Bem, o homem não foi feito pra isso, é claro... No
entanto, você pode ser tão forte quanto eu...
-- Não, minha mãezinha, eu não posso!
-- Não estou dizendo que você pode, ou vai carregar
alguém no ventre, como eu fiz com você. Quando, e se for
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necessário, você me carregará de uma forma diferente. Então
provará que é tão forte quanto eu. Mas, pelo menos por
enquanto, não precisa se preocupar comigo. Veja, não sou uma
mulher forte?
-- Sim, você é muito forte, e por isso eu te amo!
-- Me ama porque eu sou forte?
-- Não! Amo você porque é minha mãezinha!
-- E quando eu estiver bem fraca, tão fraca que não puder
mais andar?
-- Continuarei te amando! Mas você não vai ficar assim!
-- A menos que eu morra muito jovem...
-- Não vai morrer jovem!
-- Talvez não, e talvez sim! Um dia todos terão que
morrer... Ou então ficaremos tão velhos, tão velhos, que não
conseguiremos nos mover um passo.
-- Não quero que morra, nem que fique velha.
-- Deixará de me amar se eu ficar velha?
-- Jamais!
-- Nem que eu fique velha e feia?
-- Você pode envelhecer, mas nunca será feia!
-- A velhice é o antídoto da vaidade!
-- Então você não precisa desse antídoto!
***
Todas as casas tinham na frente uma área, em forma de quintal,
isoladas umas das outras, fechadas por varas, tábuas, pedras, ou
tijolos em algumas poucas, que poderiam servir de jardins, mas
eram usadas para guardar trastes que não cabiam dentro de casa.
Enfeiavam as ruas, fazendo com que as frentes das casas
parecessem os fundos.
Na parte de trás o quintal era maior, e quase todo mundo
utilizava para criar porcos, galinhas e outros bichos.
Larissa não tinha quintal nem jardim, porque morava
sobre a casa de dona Germana.
Apenas as ruas do centro tinham aparências mais
decentes, mas as construções eram de uma sobriedade sinistra.
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Raramente se via uma planta ornamental em toda a cidade de
Serra Branca. Nos canteiros das praças, quando não havia mato,
só tinha areia. Alguns animais apareciam e pastavam no meio
da rua. Num espaço maior, de terra fofa, crianças brincavam de
bola, contribuindo para empoeirar a cidade.
Ruas antigas, centenárias, com alguns prédios, casarões
abandonados, em cujas paredes subiam samambaias e musgos,
davam uma aparência medieval. Em várias ruas o calçamento
era também antigo, de pedra, que, pelo uso, se tornaram lisas,
escorregadias.
Os prédios públicos ocupavam a parte central da cidade,
e eram também antigos.
Do centro partia uma longa avenida, a principal de Serra
Branca.
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JERÔNIMO ferreiro tinha sua oficina na esquina da rua onde
Larissa morava. Exibia uma carranca tão feroz que amedrontava
todas as crianças, e afastava os adultos de tentarem qualquer
aproximação mais intima. Mas, ao contrário do que muitos
pensavam e julgavam, ele tinha um bom coração.
De longa distância ouvia-se o sonido do martelo na
bigorna, dando forma ao ferro incandescente recém-tirado da
forja – uma faca, um facão, uma foice, ferraduras, dobradiças,
ferramentas usadas nas roças; tudo o que se pudesse moldar no
ferro ele fazia.
Quando era criança tinha sido maltratado pela madrasta, e
o pai nunca lhe dava razão quando reclamava. Pelo contrário,
acreditava na esposa, que fazia queixas das más criações do
menino, levando-o a espancá-lo. Muitas vezes ficava o dia
quase todo trancado em um quarto escuro.
Com o passar do tempo foi se formando nele um espírito
amargo e arredio. Desconfiava de tudo e de todos. A falta de
sorrir criou traços duros na fisionomia. Nunca se casou. Via em
cada mulher que pudesse ser sua esposa, a esposa de seu pai.
Ninguém o cumprimentava. Só falavam com ele quando
tinham alguma coisa para ele fazer – encomenda de um facão,
uma foice, ou outra ferramenta qualquer. Ninguém, exceto
Larissa e Sólon. O rapaz era indiferente à carranca de Jerônimo.
Achava-a engraçada, e via naquele rosto duro, um quê de
ingenuidade e timidez.
-- Bom dia, seu Jerônimo – dizia quando passava.
-- Grunf! – Era a resposta.
Sólon não esperava que ele respondesse, nem se
importava com isso.
Jerônimo não correspondia à gentileza, porque não tinha
jeito para isso, mas sentia dentro de si uma satisfação muito
grande pela atenção recebida.
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***
Um dia o cachorro de dona Pedrina amanheceu morto na frente
da casa. Larissa foi a primeira que viu e avisou à vizinha.
-- Foi aquele disgraçado! – disse a dona do cão.
-- Quem?
-- Aquele monstro!
-- Que monstro? – Larissa não sabia de quem ela estava
falando.
-- Quem é o monstro aqui, a não ser o infiliz do ferreiro?
-- Seu Jerônimo?!
-- Ele mesmo, ora! “Seu Jerônimo” – desdenhou com o
beiço estirado – parece até que é um homem de bem!
Larissa Franziu a testa.
-- Por que acha que foi ele?
-- Quem mais poderia ser?
-- Não acho que foi ele! Por que ele faria isso?
-- Você não sabe de nada! Vá cuidar de sua vida! Se não
foi ele, quem foi? Teria sido seu filho? Hein?!... Hein?!...
-- Claro que não foi meu filho!
-- Ah, é? Não pode ter sido seu filho! Ele é bonzinho!
Quando passa nem fala comigo, mas fala com aquele infiliz!
Parece que são amigos!
-- Dona Pedrina, por que meu filho não falaria com a
senhora?
-- Não me chame de dona nem de senhora! Não sou
velha, sou? Acho que tenho a sua idade, ou talvez menos.
-- Está bem, Pedrina, mas me diga por que acha que meu
filho não fala com você?
-- Ah! Deixa pra lá! Besteira! Vou levar esse cachorro
morto e jogar na porta do disgraçado do ferreiro.
E saiu puxando o cachorro pela perna. Larissa ficou só
olhando, balançando a cabeça. Depois se virou e subiu para sua
casa.
Pedrina era uma morena troncuda, mas não chegava a ser
gorda, apenas muito robusta, com energia que transbordava.
Tinha 35 anos, e com uma filha, que agora tinha 17, cujo pai era
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desconhecido, se casara com um viúvo, de 58 anos. Com a
libido à flor da pele, não ficava satisfeita com o marido. Dava
com os olhos cobiçosos em cada homem vigoroso, ou jovem
que passasse por ela.
Quando estava se aproximando da oficina de Jerônimo,
que era também onde ele morava, este apareceu à porta,
carrancudo, usando um avental de couro na frente.
Pedrina deu um sorriso sem graça, olhando para ele, meio
sem jeito. Depois de alguns segundos, demonstrando não se
intimidar, colocou as mãos nos quadris, e perguntou:
-- Foi você que matou o meu cachorro?
Jerônimo não respondeu. Apenas olhava para ela, sério.
-- Sei que foi você, e vai ter que me pagar!... Mas eu não
quero dinheiro... Sabe o que eu quero, não é?
Ele continuava calado, encarando-a.
Pedrina começou a perder a segurança, e, sem dizer mais
nada, desviou-se procurando um terreno baldio, onde pudesse
jogar o cachorro morto.
Tinha raiva do ferreiro porque ele não lhe dava atenção,
como ela desejava. Era um homem ainda jovem, forte, de pele
escura, e não tinha mulher. Ela estava disposta a se entregar a
ele, se ele quisesse. Como ele não lhe dava bola, e fingia não
ouvir suas insinuações, injuriava-o.
-- Disgraçado! Infiliz! Traste ruim! – Vociferava,
sentindo-se frustrada.
Sólon perguntava à mãe o que tinha acontecido.
-- Por que estava discutindo com dona Pedrina?
-- Eu não estava discutindo com ela!
-- Mas parece que ela estava muito zangada com você!
-- Foi porque eu discordei dela! Alguém matou o
cachorro dela e ela disse que tinha sido seu Jerônimo...
-- Que seu Jerônimo! Ela é doida? Eu sei quem matou o
cachorro!
-- Você sabe? E quem foi?
-- Foi o Tico!
-- Tico de dona Lourdes? Aquele pestinha?
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-- E tem outro por aqui?
-- Você viu? Como foi isso?
-- Ontem, de noite, ele estava brincando de enforcar
bandido. Amarrou o cão pelo pescoço e pendurou na cerca! A
irmã dele, Luciene, viu tudo e não disse nada!
-- Essa também não é flor que se cheire! Mas que coisa!
E Pedrina botando culpa no pobre do seu Jerônimo! Se ela
souber que foi o filho de dona Lourdes vai ter confusão. As
duas não se dão muito bem!
-- É. Talvez sim, e talvez não, por causa de seu
Faustino... Ela deve ter tido uma boa razão pra por a culpa no
ferreiro!
-- Não estou entendendo nada do que você está
dizendo!... E por que ela me disse que você não fala com ela?
Acho que estou por fora de muitas coisas que acontecem por
aqui!
-- E está mesmo! – disse Sólon, com um sorriso
enigmático.
-- Que tal me contar tudo?
-- Não tenho nada pra contar, mãe! Não existe nada!
-- Sólon!
-- Está bem, se quer mesmo saber...
-- Quero, não porque me interesse pela vida alheia, mas
porque de uma certa forma você está envolvido!
-- Eu não estou envolvido em nada, se quer saber!
-- Então me explique por que não cumprimenta dona
Pedrina!
-- Mãe, você passa o dia quase todo fora, e não sabe o
que acontece aqui entre os vizinhos...
-- Estou ouvindo!
-- Essa Pedrina é uma sem vergonha!
-- Ôpa! Cuidado com a língua!
-- Não queria saber?
-- Continue!
-- Sabe por que dona Lourdes não gosta dela? Por que
desconfia que o marido e ela...