Conhecimento em Destaque, Serra, ES, v. 03, n. 02, fev./jun. 2014. 1
A TRAJETÓRIA DA PRAGMÁTICA NOS ESTUDOS DA LINGUAGEM
Evandro Santana1
Maria de Fátima Mendes Dutra2
RESUMO Procura traçar os caminhos que levaram ao desenvolvimento da pragmática dentro dos estudos lingüísticos. Discorre sobre seu início, no final do século XIX, e sua presença nos estudos da linguagem, passando pelo modelo inferencial de Grice até a teoria da relevância, ressaltando a contribuição dessa disciplina para os estudos da linguagem, e também sua importância para os estudos da tradução. Palavras chave: Estudos linguísticos. 1 INTRODUÇÃO
A partir do século XX, após a publicação do Curso de Linguística Geral, é possível
afirmar que as pesquisas lingüísticas se dividem em dois pólos: o pólo formalista,
que tem a ideia da língua enquanto sistema e estrutura, entendida como um objeto
autônomo, independente das intenções de uso, e o pólo funcionalista, cujo enfoque
se dá numa perspectiva da língua em sua situação de uso. A pragmática situa-se
nesse segundo pólo.
1 Graduação em Licenciatura Plena em Língua Inglesa e Literaturas pela Universidade Federal do Espírito Santo (2004), graduação em Bacharelado em Música - Habilitação em Canto pela Faculdade de Música do Espírito Santo (2011) e mestrado em Lingüística pela Universidade Federal do Espírito Santo(2014). Atualmente é Professor do Centro de Ensino Superior FABRA. Tem experiência na área de Letras, com ênfase em Línguas Estrangeiras Modernas. Contato: [email protected] .
2 Mestranda em Ciências da Educação pela Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – ULHT. Especialista em Educação Infantil e Séries Iniciais pela Escola de Ensino Superior Alternativo. Especialista em Gestão Educacional pela Faculdade Saberes. Atualmente é coordenadora dos cursos de Pedagogia e Letras do Centro de Ensino Superior Fabra e docente no Centro Universitário Leonardo da Vinci. Contato: [email protected].
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É comum entender que a lingüística teve, na segunda metade do século XX, uma
“guinada pragmática”, pois surgem em alguns lingüistas interesse em relação aos
fenômenos mais diretamente ligados ao uso que os falantes fazem da língua.
A pragmática estuda os fatores que regem nossas escolhas lingüísticas na interação
social e os efeitos de nossas escolhas sobre as outras pessoas. Na teoria podemos
dizer o que quisermos, mas na prática seguimos um grande número de regras
sociais, que regem nossas escolhas (WEEDWOOD, 2005, p.144).
Este trabalho objetiva revisar os caminhos iniciais dessa disciplina, bem como
alguns de seus conceitos mais importantes, e discutir, sobretudo, sua importância
para os estudos da linguagem., e ainda ressaltar a sua importância dentro dos
estudos da tradução.
INÍCIO
A pragmática nasceu da filosofia da linguagem (PAVEAU; SARFATI, 2006). Sua
emergência e constituição são imputadas a uma situação de crise da filosofia no final
do século XIX, que levaram as diferentes correntes de pensamento efetuaram um
retorno radical à questão da linguagem.
Françoise Armengaud (2006, p.12) explica que, no século XX, o estudo dos signos e
da linguagem distribui-se da seguinte forma: a abordagem semântica e a abordagem
sintática. Aquela trata das relações dos signos, palavras e frases com as coisas e os
estados das coisas, é o estudo conjunto do sentido, da referência e da verdade. Esta
estuda as relações dos signos entre si, das palavras na frase ou das frases nas
sequências de frases; tenta-se formular regras de boa formação para expressões e
regras de transformação das expressões em outras expressões Como essas
abordagens não esgotam o problema do sentido, nem o da verdade, faz-se
necessária uma terceira abordagem: pragmática. Essa se ocupa da relação dos
signos com os falantes e das frases com seus usuários.
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Wittgenstein, filósofo alemão, rompe com a concepção tradicional de que a língua
tem a função de designar seres; para ele a língua cria os objetos, e o significado da
palavra está associado ao uso da língua, este socialmente regulado.
A pragmática lingüística nasceu, primeiramente, no campo da filosofia e por isso os
nomes mais importantes, nesta área, são o de três filósofos de língua inglesa: John
L. Austin, John Searle e H. P Grice (WEEDWOOD, 2005).
Seja autônoma (filosofia da linguagem ordinária) ou incorporada (pragmática
lingüística), a pragmática conserva uma identidade própria, e suas orientações
seguem um caminho diferente do que é tomado pelo Curso de Linguística Geral de
Saussure. O termo pragmática lingüística refere-se ao conjunto de teorias
elaboradas no quadro da lingüística a partir da integração dos conceitos e
perspectivas de trabalho da filosofia da linguagem ordinária (PAVEAU; SARFATI,
2006, p.217).
Os conceitos mais importantes da pragmática são aqueles até então ausentes da
filosofia da linguagem e da lingüística, “[...] deliberadamente negligenciados para
isolar outros aspectos que se deseja estudar primeiro.” (ARMENGAUD, 2006, p.12)
São eles (ARMENGAUD, 2006):
1 O conceito de ATO – a linguagem nãos erve apenas para representar o mundo,
mas que ela serve para realizar ações. Falar é agir. Em um sentido óbvio é agir
sobre outrem. Em um sentido menos aparente, mas absolutamente real: é
instaurar um sentido e é de todo modo, fazer “ato de fala”.
2 O conceito de CONTEXTO – a situação concreta em que atos de fala são
emitidos, o lugar, o tempo, a identidade dos falantes etc. tudo o que é necessário
para saber entender e avaliar o que é dito.
3 O conceito de DESEMPENHO – entende-se como a realização do ato em
contexto, seja atualizando a competência dos falantes, seja integrando o
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exercício lingüístico a uma noção mais compreensiva, como a da competência
comunicativa.
Os conceitos da pragmática podem ser exportados para várias direções: ela “[...] não
apenas “faz explodir o quadro das escolas lingüísticas tradicionais”, [...] como
intervém nas questões clássicas internas à filosofia [...]” (ARMENGAUD, 2006, p.14-
15)
Faz-se relevante retomar o conceito de contexto, pois é de grande importância para
a pragmática, uma vez que está e frequentemente definida como a ciência do
contexto (PAVEAU; SARFATI, 2006, p.217-218). A pragmática assinala três níveis de
estruturação do contexto:
- o contexto circunstancial, que corresponde ao ambiente físico imediato dos
protagonistas (espaço, tempo, natureza, texto e comunicação);
- o contexto situacional coincide com o ambiente cultural do discurso. Ele define os
critérios de validade (qual o tipo de expressão, considerada como “normal” em uma
cultura, mostra-se “anormal” em outra). Ela opera como uma matriz de gêneros em
função das práticas que determina;
- o contexto interacional, que caracteriza as formas do discurso e os sistemas de
signos que as acompanha (turnos de fala, gestos etc.).
- o contexto epistêmico (ou pressuposicional) recobre o conjunto das crenças e
valores comuns aos locutores, seja de maneira a priori (pré-construído), seja a
posteriori (construído).
TEORIA DOS ATOS DE FALA (AUSTIN – SEARLE)
A teoria dos atos de fala é de importância significativa para a pragmática, e o ponto
de partida da teoria clássica é a seguinte convicção: a unidade mínima da
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comunicação humana não é nem a frase nem qualquer outra expressão. É a
realização (performance) de alguns tipos de ato (ARMENGGAUD, 2006).
De acordo com John Austin, precursor dessa teoria, as línguas naturais se
organizam em torno de dois tipos de enunciados: os enunciados constativos (que
descrevem um estado de coisas) e os enunciados performativos (que permitem
realizar certo tipo de ação). Os enunciados constativos podem ser reconhecidos
como verdadeiros ou falsos, já os enunciados performativos, felizes ou infelizes.
Para Austin, dizer algo equivale a executar três atos simultâneos: o ato locutório,
centrado no nível fonético, sintático e de referência, corresponde ao conteúdo
linguístico usado; o ato ilocutório, associado ao modo de dizer algo e ao modo como
esse dizer é recebido em função da força que é proferido (esse considerado por
Austin como central); e o ato perlocutório, que corresponde à indicação dos efeitos
causados sobre o outro, servindo a outros fins, como influenciar o outro, persuadi-lo
a fazer algo etc.
O sucesso dos atos de fala supõe o respeito a certas condições: linguísticas (certas
fórmulas devem ser empregadas à execução de outras); sociológicas (os locutores
devem ser investidos de autoridade requerida pela situação); psicológicas (a
disposição de espírito dos locutores deve estar conforme ao tipo de compromisso
que eles assumem). Austin deu o nome de “teoria dos jogos” à formulação dessas
exigências teóricas (PAVEAU; SARFATI, 2006).
A teoria dos atos de fala proposta por Austin abre novos caminhos para a reflexão do
papel e das convenções e práticas sociais na constituição dos atos ilocucionários e
também para a questão que envolve o sujeito que a enuncia. Novos estudos são
realizados, ampliando e reformulando a teoria de Austin. É dentro dessa perspectiva
que se insere John Searle.
Na obra Speech Acts, Searle retoma questões importantes relacionadas à
tendências contemporâneas da filosofia da linguagem, com o propósito de construir
um ponto de vista linguístico para a teoria dos atos de fala. Ele adota o conceito de
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‘finalidade ilocutória’ para classificar os usos linguísticos. Para ele, falar uma língua é
fazer a adaptação de uma forma de comportamento regida por regras.
Para a classificação dos atos ilocutórios, Searle propõe a seguinte taxonomia
(ARMENGAUD, 2006):
1. Atos assertivos – consistem em comprometer o falante com a verdade da
proposição expressa, de que algo seja efetivamente o caso (ex.: gabar-se;
lamentar-se etc.)
2. Atos diretivos – consistem nas tentativas de conseguir que o ouvinte faça algo
(ex.: pedir, mandar, rezar etc.)
3. Atos comissivos – atos ilocucionários cujo ponto é comprometer o falante com
a realização de uma ação futura (ex.: prometer)
4. Atos expressivos – consistem em exprimir estado psicológico especificado na
condição de sinceridade acerca de um estado de coisas estabelecido no
conteúdo proposicional (ex.: agradecer, parabenizar, desculpar-se etc.)
5. Atos declarativos – a característica aqui é a de que a realização feita por um
de seus membros instaura a correspondência almejada entre o conteúdo
proposicional e a realidade. Se eu realizo como se deve o ato de declarar
guerra, por exemplo, então a guerra está mesmo declarada. Esses atos
requerem situações extralinguísticas para a sua atualização.
Para que um ato de fala seja eficaz, é necessário que seja proferido de modo
apropriado às circunstâncias, o que deu origem às chamadas condições de
felicidade (ou sucesso) ou infelicidade (fracasso) dos atos de fala.
Assim, para entender o sentido de um enunciado, é necessário recorrer, além do
contexto linguístico, ao contexto extralinguístico, considerando quem diz, para quem
diz e como diz. Trata-se de elementos que fazem parte do todo em que se inscreve o
enunciado e que reunidos estruturam o sentido (WILSON, 2009).
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MODELO INFERENCIAL DE GRICE
No prefácio de Relevância: comunicação e cognição, Deirdre Wilson explica a
relação da inferência nos estudos pragmáticos. A pragmática moderna tem seu início
com o filósofo Paul Grice, com as Lições em Homenagem a William James
(proferidas em Harvard em 1967). Essas esboçaram uma alternativa ao modelo
semiótico clássico da comunicação. Segundo esse modelo, a comunicação é
conseguida através da codificação e da descodificação de mensagens.
As Lições em Homenagem a William James de Grice apresentam uma alternativa ao
modelo semiótico por demonstrarem como a comunicação é, pelo menos em parte,
uma atividade inteligente, em que existe um exercício da razão e da imaginação. As
elocuções, de acordo com Grice, não são sinais, mas pedaços de evidências sobre
o significado do falante e a compreensão são conseguidas quando o ouvinte intere
esse significado a partir da evidência apresentada.
Tomando o modelo inferencial de Grice, a única coisa que o comunicador tem de
fazer para transmitir certo pensamento é conseguir que o receptor reconheça a sua
intenção em transmiti-lo. Em geral as intenções não são descodificadas, mas
inferidas. A comunicação inferencial é bem sucedida quando quem comunica
fornece alguma evidência sobre sua intenção de transmitir certo pensamento, e o
receptor infere essa intenção a partir da evidência fornecida. Grice viu a
compreensão inferencial como se fosse regida por um Princípio Cooperativo, e pelas
máximas de Qualidade, Quantidade, da Relação e de Modo. Quando uma máxima é
aparentemente violada, o ouvinte tem todo o direito de se dirigir para além do
significado linguisticamente codificado para preservar a suposição de que o Princípio
Cooperativo e as máximas foram obedecidos.
A questão mais preocupante para a pragmática de Grice tem a ver com o modo
como deverá ser definida a relevância. Grice deixou a máxima da Relação (“ser
relevante”) relativamente mal desenvolvida, e reconheceu a sua formulação dessa
máxima escondia uma séria de problemas. A teoria da relevância começou como
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uma tentativa de dar resposta a algumas destas questões levantadas pela
abordagem de Grice, mas acabou ficando com um aspecto muito diferente.
A TEORIA DA RELEVÂNCIA
A teoria da relevância, como explica o prefácio de Deirdre Wilson, inicia como uma
tentativa de responder a algumas questões levantadas pela abordagem de Grice,
mas ganhou um aspecto muito diferente. Ela se baseia numa definição de relevância
e em dois princípios gerais: o Princípio Cognitivo de que a cognição humana tende a
dirigir-se para a maximização da relevância; e o Princípio Comunicativo de que as
elocuções criam expectativas de relevância. A relevância é vista como uma
propriedade das entradas de dados para processos cognitivos. Aquilo que faz com
que uma entrada de dados valha a pena ser processada é explicado em termos das
noções de efeito cognitivo e de esforço de pensamento (SPERBER; WILSON, 2001,
p.10).
Quando uma entrada de dados é processada, ela poderá dar como resultado algum
efeito cognitivo por meio da modificação ou da reorganização das suposições. Em
igualdade de condições, quanto menor é o esforço de processamento requerido,
maior é a relevância.
Para exemplificar, Wilson propõe a seguinte situação: Pedro acorda adoentado e
procura um médico. Após examiná-lo, o médico pode dizer a ele qualquer uma das
seguintes declarações verdadeiras: (1) Está doente, ou (2) Está com gripe, ou (3)
Está com gripe ou 29 é a raiz quadrada de 843. Todas as elocuções seriam
relevantes para Pedro, mas (2) seria mais relevante do que (1) e (3) pois tem mais
efeitos cognitivos: permite a ele fazer a derivação de todas as consequências
derivadas de (1), e mais ainda. A declaração (2) é a mais relevante porque consegue
os maiores efeitos, através de um menor esforço de processamento.
Segue-se do Princípio Cognitivo da Relevância que a atenção humana e os seus
recursos de processamento estão dirigidos para as informações que parecem
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relevantes. Segue-se do Princípio Comunicativo da Relevância que uma pessoa
falante, pelo próprio ato de estar a dirigir-se a alguém, cria expectativa de relevância.
Uma elocução é otimamente relevante quando é bastante relevante para valer a
pena ser processada.
A teoria da relevância defende que a comunicação explícita não é simplesmente
uma questão de descodificação, mas que existe nela também um elemento de
inferência: por exemplo, no que se refere à desambiguação e à atribuição
referencial. O conceito comunicado pela utilização de uma palavra tem a
possibilidade de ir para além do seu significado literal codificado. Poderá ser um
estreitamento do significado literal ou um alargamento desse. Ambos os processos
parecem aplicar-se espontânea e automaticamente à medida que vão sendo
entendidas as elocuções (SPERBER; WILSON, 2001, p.14).
Como exemplo da noção de estreitamento, tomemos a palavra ave no seguinte
exemplo, dado por Wilson, com a palavra ‘ave’: No natal, a ave estava deliciosa. No
exemplo dado, a palavra ‘ave’ seria entendida como algo parecido com peru. Isso
acontece motivado, segundo a teoria da relevância, pela procura da relevância.
Quando o significado literal codificado não satisfaz a expectativa de relevância, o
ouvinte tem o direito de estreitar até o ponto em que é satisfeita essa expectativa.
Como exemplo da noção de alargamento, Wilson dá o seguinte exemplo, com a
palavra ‘chato’: O meu bairro é chato. Literalmente, chato significa uma superfície
perfeitamente plana. Não se aplica esse conceito a um bairro, pois esse significado
literal não atende a expectativa de relevância do ouvinte. Assim, o ouvinte tem o
direito de estender o significado até o ponto em que a expectativa é satisfeita. No
exemplo em questão, pode-se entender a palavra como ‘monótono’.
PRAGMÁTICA E TRADUÇÃO
Nos termos de Neusa Travaglia (2003), pensar o processo tradutório enquanto re-
textualização (re-enunciação) é possivelmente o que mais se aproxime do que
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realmente acontece na prática dos tradutores. Em relação ao texto, ele é visto, para
o tradutor, enquanto unidade, não como um conjunto de frases ou palavras
(TRAVAGLIA, 2003).
A razão de ser da atividade tradutória está na obtenção da equivalência, sendo esta
[...] “a própria razão de ser da atividade tradutória.” (TRAVAGLIA, 2003, p.34). E o
importante para o tradutor será a determinação dos pontos onde a equivalência
precisa incidir.
Nos modelos de orientação pragmática da tradução, concebe-se de forma geral que
o ato de tradução em si pode ser visto como uma tentativa de desempenhar os atos
de fala. Retomando os atos simultâneos que ocorrem quando um enunciado
acontece (ilocucionário, locucionário e perlocucionário), a compreensão desses atos
e da interpretação desses é de importância significativa para o tradutor. Ao se
entender que para obter determinado efeito de sentido, as realizações nas línguas
são diferentes, a equivalência de sentido desejado no texto traduzido é mais bem
conseguida.
Quanto à teoria da relevância, pode-se observar que a tradução precisar produzir
um enunciado que possa dar ao público do texto traduzido efeitos de sentido
equivalentes aos do texto-fonte, sem colocar para o leitor esforço de processamento
desnecessário. Quanto menor for o esforço de processamento, maior será a
relevância. Por exemplo, uma frase como Minha irmã monta bem. teria que ser
traduzida como My sister rides a horse very well. No enunciado que é produzido em
língua portuguesa, a menção ao cavalo é desnecessária porque, por questão de uso
e da convencionalidade do português, o animal é facilmente inferido. Já na língua
inglesa, essa menção é necessária, pois esse não seria inferido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A contribuição da pragmática é evidente, pois ao se considerar elementos como
contexto e os usuários, bem como observar a língua em seu uso, traz um avanço
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para a compreensão dos estudos da linguagem. Por estudar os fatores que regem
nossas escolhas linguísticas em situações de uso, ela trouxe contribuições para a
teoria da tradução e para o ensino de línguas. A partir da teoria da relevância, por
exemplo, podemos observar os efeitos cognitivos almejados no texto traduzido,
partindo da análise daqueles que são encontrados pelo texto fonte. No caso do
ensino de línguas, a relação entre os enunciados e as convenções em que eles são
utilizados. Os fatores pragmáticos influenciam nossas escolhas de construções
gramaticais e de vocabulário. Nas línguas, observam-se distinções de formalidade,
polidez e intimidade (como a escolha entre os pronomes tu e vous em francês
quanto à formalidade; também em algumas situações de polidez: se for perguntado
Aceita mais bolo, ao dizer o termo em inglês thank you, (obrigado) você responde
positivamente, ao passo que ao responder em francês merci (obrigado) você diz que
não quer mais bolo). Como se lê em Weedwood (2005, p.148), a pragmática é uma
corrente de estudo em pleno desenvolvimento, e parece não ter ainda fixado seus
cânones, “[...] o que indica que ela talvez seja o campo de estudos mais fértil da
linguística do século XXI.”.
REFERÊNCIAS
ARMENGAUD, Françoise. A pragmática. Tradução de Marco Marcionilo. 2ª ed. São
Paulo: Parábola Editorial, 2006.
PAVEAU, Marie-Anne; SARFATI, Georges-Élia. As grandes teorias da lingüística:
da gramática comparada à pragmática. Tradução de Maria do Rosário Gregolin,
Vanice Oliveira Sargentini e Cleudemar Alves Fernandes. São Carlos: Claraluz,
2006.
TRAVAGLIA, Neuza Gonçalves. Tradução retextualização: a tradução numa
perspectiva textual. Uberlândia: EDUFU, 2003.
WEEDWOOD, Barbara. História concisa da lingüística. Tradução de Marcos
Bagno. 4ªed. São Paulo: Parábola Editorial, 2005.