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Caiu na rede é...Literatura: perspectivas para criação da arte literária nas mídias
sociais e seus reflexos pedagógicos-comunicacionais
Por Tércio de Abreu Paparoto
Resumo
Este trabalho apresenta uma reflexão crítica sobre o desdobramento dos fenômenos de comunicação nas redes sociais, tendo como fulcro a utilização delas no papel de instrumentos estimuladores, formadores e divulgadores de textos de natureza literária e, consequentemente, de mecanismos possibilitadores de práticas pedagógicas que ampliem o gosto pela leitura e pela produção textual.
Palavras-Chave: Mídias Sociais - Literatura- Criação Literária - Pedagogia-Leitura-Produção de textos
Introdução
A dinamicidade que caracteriza hoje o universo digital convida, mesmo os menos
afeiçoados, a disporem-se diante de uma tela – seja esta de um costumeiro desktop, de um
notebook, de um netbook, de um tablet ou mesmo de um celular com bons recursos -, para a
realização de tarefas diárias as mais diversas, de menor ou maior complexidade.
São factíveis os avanços detectados no campo da tecnologia da informação (TI).
Com eles, nenhum campo do conhecimento fica isolado, tudo parece abordado e
estruturado pelas redes, sobretudo as chamadas “redes sociais”, de tal maneira a
justificarem sempre uma análise mais profunda desse fenômeno na esteira da produção
do conhecimento humano.
É bem verdade que dificilmente a máquina conseguirá traduzir toda a
complexidade humana, mesmo superá-la, ainda que as cores da ficção científica assim
queiram emoldurar. Entretanto, os desejos do homem contemporâneo, certamente (e
justamente) edificados sobre o conjunto de suas complexidades e idiossincrasias, ao longo
de décadas, vêm tornando-se realidade. Quando se fala em tecnologia, fala-se, também,
em possibilidade e, esta, sem dúvida, é a porta para o fazer, o criar, o “ser”. Diante das
redes, os internautas contam com uma possibilidade gigantesca de projeção de suas ideias
e criações e conhecer todo esse processo fenomenológico, bem como seus reflexos em
nosso cotidiano, é de relevância incontestável.
O olhar acadêmico focado em tais questões assume aqui um compromisso: o de
ser a interface possibilitadora entre a curiosidade investigativa e a aplicabilidade dos
resultados encontrados. Está-se a falar aqui de uma necessidade contemporânea, que se
configura nas mais diversas plataformas tecnológicas e, consequentemente, nas mais
novas gerações.
Não obstante a esse fenômeno, inserir-se em uma rede social nos dias de hoje
significa estar conectado não só com pessoas com as quais se tem algum tipo de afinidade,
mas, sobretudo, significa “mostrar-se” para um mundo virtual, mundo este que aprecia,
cada vez mais, iniciativas de boa-fé, criativas e solidárias, mas que denuncia aquelas
outras totalmente opostas, que expõem uma imagem inadequada, inoportuna e, às vezes,
até mesmo criminosa de uma pessoa.
Redes como Facebook - do qual trataremos um pouco mais a seguir-, Orkut,
Twitter – que também merecerão observações adiante, LinkedIn, entre outras similares,
trazem perspectivas de utilização interessante, abrindo espaços importantes para o bom
uso - com responsabilidade e flexibilidade. São espaços onde o processo de comunicação
desenrola-se com dinamicidade, permitindo que se registre – pela imagem e,
principalmente, pela escrita – uma interface de comportamentos, impressões, opiniões etc.
Num horizonte que se amplia a cada instante, apresentando possibilidades cada
vez mais reais e eficientes de interatividade, “conectar-se” com o mundo tornou-se algo
obrigatório: ou se está linkado ou se vê oportunidades de ordens diversas, principalmente
as profissionais e sociais, sumirem como oásis no deserto diante de lúdicas retinas.
“Aparecer” no e para o cenário digital tornou-se prática fundamental, uma vez
que, por ele, as “treliças” da Web se encontram, “visitando-se”, conhecendo-se,
mostrando-se e, sobretudo, estabelecendo possibilidades de divulgação de novas formas
de produção artística. Por meio dessas ferramentas tecnológicas contribui-se com o
alastramento da criação, com o apego à manifestação cultural e, ainda, permite-se que
sirvam de reflexão nos meios escolares, como veículos estimuladores do processo de
leitura e de escrita, em um país que apresenta índices muito aquém do satisfatório no que
diz respeito ao aprendizado de nosso idioma.
É por tais razões que se diminuíram as distâncias entre aqueles com certo dote
literário e vontade de inclusão e as mídias sociais, pois passaram a se expor mais devido
ao universo de possibilidades virtuais que se abriram no horizonte digital. E, na outra
ponta dessa interessante conexão, está a escola. Ainda que redes sociais promovam
discussões pedagógicas as mais ardentes, o fato é que elas chegaram, são realidade
inconteste e, certamente, podem possibilitar o desenvolvimento linguístico de nossos
alunos, inclusive por meio das produções literárias dos próprios estudantes como a
muitos outros autores desconhecidos, mas que militam nas suas criações virtuais.
Ainda sobre o grau de polemicidade que habita as reflexões de natureza
pedagógica acerca da relação aprendizado-redes sociais, é importante observar que, em
nosso título, usamos a palavra “perspectiva”, pois longe está de não considerarmos, com
bastante parcimônia, o modo prudente como devem se relacionar essas plataformas
tecnológicas com os mecanismos de aprendizagem. Alguns estudos já foram
desenvolvidos para refletirem sobre essa questão e, em medida certa, serão aqui
abordados. Uma das primeiras observações que podem já de antemão clarear as intenções
a serem aqui expostas, sai das palavras de Andrea Ramal, especialista em novas
tecnologias, em participação na publicação especializada na área digital Revistapontocom,
em julho de 2011, que pondera o seguinte:
As redes sociais potencializam as atividades que se realizam em grupo, pois por meio delas os alunos podem se relacionar com outras pessoas. Pode haver produção coletiva de conhecimento, numa espécie de rede cooperativa de aprendizagem. Acredito que as redes sociais vão ajudar a fazer da sala de aula um ambiente mais interativo e dialógico, pois o modelo unidirecional da comunicação, no qual o professor fala e o aluno ouve, será substituído pelo modelo das redes em que todos os sujeitos têm vez e voz. (Ramal, 2011, p. 1)
Válido seria dizer que se tem a internet –hoje- como mais um instrumento
didático de suma importância. Entretanto, ela não se pretende a “dona da verdade” ou
“modelo geral” para todos os ramos do conhecimento. Ela não é um instrumento
“pronto”, fechado, ao contrário de muitas das formas como se utiliza a rede. Ela é uma
espécie de “condução” para uma interessante viagem ao conhecimento. Portanto, deve-se
entender as redes sociais como instrumento que permite o desenvolvimento das pessoas e
o seu limite deve terminar quando a utilização dela fere os princípios da conduta ética.
Ora, a criação literária, sabe-se, não se encerra em si mesma, não se resume tão-
somente em momentos de inspiração para se entendê-la como de qualidade, não se trata
unicamente de emanação ebúrnea da alma, mas também ela é merecedora de um tanto de
elementos teóricos que possam avaliá-la, tornando-a mais interessante, tão mais próxima
das e presente nas razões da existência humana. Não se trata de afirmar aqui que as
mídias sociais têm o “poder” de qualificar aquilo que é “bom” ou “ruim”. Mas em muitas
delas, sobretudo nalgumas comunidades específicas e em diversos blogs, o próprio
conjunto de participantes estimula uma produção que seja entendida como de valor. Em
outras palavras, quer-se dizer que as redes sociais não aceitam “qualquer texto”, mas
aqueles que realmente possam trazer algo significativo, tanto no aspecto temático quanto
no estrutural, daí haver implícito certo valor teórico em tais criações. Dessa preocupação
com uma coerência com o que transita na rede, aproxima-se a natureza pedagógica das
escolas, uma vez que, com tais produções, poderá existir um caminho (ou muitos) para o
estímulo à leitura e à produção escrita. Sobre essa questão de se entender a criação
literária respeitando certos critérios, Roberto Acízelo de Souza, professor da Universidade
Estadual do Rio de Janeiro, afirma que
[...] uma teoria, construída em função de qualquer campo de observação que se ofereça ao homem – quer esse campo se situe na natureza, quer se situe na cultura – implicará sempre criar problema(s) onde o senso comum não vê obscuridades cujo esclarecimento justifique o empenho da razão analítica. Quem se banha ou mata a sede numa fonte limita-se a servir-se dessa coisa cristalina que é a água, não se coloca o problema da sua composição química ou de seu estado físico [...] Desse modo, não é privilégio da literatura a faculdade de subtrair-se ao reino do óbvio por intervenção de uma teoria. (Souza: 2011, p.9)
É bem verdade que o papel de nossas escolas no que tange ao processo de leitura
e de escrita tem sido o mais ácido que se possa imaginar. Realidades as mais diversas,
calcadas sobre aspectos sociais, culturais e familiares, são alguns dos pilares dessa dura
questão. Parece-nos, em princípio, que processos pedagógicos entendidos como
“tradicionalistas” - como aqueles em que o professor é o agente produtor de tudo e seus
alunos apenas expectadores, “consumidores passivos” de um conhecimento vindo “de
cima”-, são modelos para além de esgotados e principais causadores de desestímulo para
o ato de aprender. Todavia, quando se aproxima a ideia de criação da de aprendizagem,
resultados são melhorados, porque atinge-se um denominador comum que é o prazer, a
vontade e a consequente valorização da autoestima. Portanto, criar é um degrau muito
próximo de aprender, e vice-versa, como o que se pretende aqui discutir sobre essa relação
criação literária – redes sociais – aprendizagem.
Criação literária nas redes sociais
1. Um panorama das manifestações literárias nas redes: as comunidades de
escritores “digitais”
1.1. Breve panorama histórico
Aqui se pretende apresentar, de maneira muito ampla, o percurso histórico
das principais redes sociais no mundo.
Confirmado o papel importante da internet no cotidiano das pessoas, o
fenômeno das chamadas “redes sociais” se instalou como uma forma de propiciar –
inicialmente – o compartilhamento de arquivos entre amigos e internautas com gostos
afins. Essa realidade tomaria rumo a partir da década de 1990, com a idealização da Web,
por Tim Berners-Lee. Entretanto, as primeiras maneiras de relacionamento eram os e-
mails, os principais responsáveis pelas trocas de informações.
Contudo, o dinamismo e a diversidade de informação multiplicam-se de modo a
acompanhar a velocidade das ideias veiculadas, havendo, portanto, a necessidade de
ampliação de plataformas mais abrangentes, flexíveis e atraentes de comunicação.
Em 1997 surge um dos primeiros provedores de internet – a AOL Instant
Messenger, que, por meio do AOL Messenger, contribuiu para as primeiras mensagens
instantâneas, embora o acesso fosse limitado aos seus assinantes.
Ainda nesse ano, surge a primeira rede social que permitiria a criação de um
“perfil” do usuário, bem como a publicação e a lista de contatos. Trata-se do Sixdegrees.
Com ele, o conceito de visualização de perfis por terceiros tornou-se uma realidade. Dali
seria um passo para muitas outras.
De 1997 a 2002 surgiriam muitas redes sociais. Com tais características e com
forte poder de “aglutinação” de usuários, aparece o Friendster que tinha a peculiaridade
de criar mecanismos para incentivar relacionamentos entre pessoas com as mesmas
afinidades.
As “redes” só faziam crescer. Muitas delas usavam as mesmas fórmulas que
consagravam outras e, a partir delas, aperfeiçoavam-nas para atrair mais e mais usuários.
Desse modo, surge o My Space, em 2003, a partir dos princípios do Friendster, mas
flexibilizando sua utilização, como abrindo espaço para o registro de músicas favoritas,
fotos e blogs, tudo personalizado pelo usuário.
No ano seguinte vem à luz o Linked In, Web 2.0. Tornou-se importante porque
caracterizou um outro formato, uma outra ideia para as redes sociais, isto é, de simples
plataforma de relacionamento para a de relacionamentos de motivo marcadamente
profissional.
No mesmo ano, o engenheiro e funcionário do Google, Orkut Büyükkokten,
daria seu primeiro nome a uma das redes mais populares do mundo, tendo o público
norte-americano como alvo principal.
E, finalmente, os estudantes da Universidade de Harvard, Mark Zuckerber,
Dustin Moskovitz, Eduardo Saverin e Cris Hugues, fundam o Facebook que, inicialmente,
deveria funcionar somente no âmbito da própria universidade americana. Deveria.
Atravessou os muros da Academia e tomou, de forma deslumbrante, o mundo todo.
Em 2006, cria-se o Twitter. Concebida como uma “rede veloz”, foi vista como
uma das mais revolucionárias por apresentar um limite de 140 caracteres para publicação
de conteúdo. Sem dúvida, essa rede despertaria a curiosidade dos profissionais da
palavra escrita – literatos, jornalistas etc.-, pelo desafio de dizer o máximo com menos,
bem como o de profissionais da educação, sobretudo no que diz respeito à produção
textual, mais especificamente o poder de síntese.
1.2. As comunidades e blogs de escritores nas redes sociais: quem são,
como produzem, o que pensam
Com o estabelecimento das redes sociais a ideia de compartilhamento de
informação configura-se para além de uma tênue vontade, uma lépida vaidade. O
aparecimento delas veio acompanhado de possibilidades bastante flexíveis, como a
postagem de vários pensamentos e gostos como músicas, fotos e até mesmos blogs,
refletindo um dinamismo da diversidade dos conteúdos do mundo moderno.
Na esteira dessa reflexão, muitos usuários, com gostos e talentos afins, talentos
estes encobertos muitas vezes pelas injustas exigências de grandes mecanismos
empresariais, veem, nessas redes, a possibilidade de projeção de seus trabalhos,
fortalecidos pela organização de comunidades com propósitos, em sua maioria, bem
claros. É fato que a publicação de trabalhos, por meio impresso, passa por dois obstáculos:
o primeiro, o da aceitação do trabalho do escritor que, mesmo oferecendo qualidade,
distancia-se das intenções de mercado do editor e da editora; e, o segundo, é o fator preço
que, sem dúvida, está além das possibilidades do cidadão comum, isto é, o total
financiamento do produto artístico fica a cargo do próprio autor. Somado a isso, surge um
conjunto de indagações sintetizadas em como substituir a ideia de se publicar em livro as
criações artísticas pela ideia de vê-las nas redes. André de Jesus Neves, da Universidade
do Estado da Bahia – UNEB, em interessante artigo sobre a produção literária na rede,
indaga:
Nota-se, nesse sentido, que, com o surgimento da internet, a literatura mais uma vez é posta em xeque, quanto ao seu lugar, autoria e valor. Que literatura se inventa nesse contexto volátil, fluido, hipertextual, dinâmico e desterritorializado? Qual é a importância do autor/escritor no contexto da cibercultura? Que novas criações estão surgindo nesse novo espaço?” (Neves: 2010, p.3)
Às perguntas edificadas acima pelo pesquisador seguem-se algumas reflexões
que julgamos aqui importantes. No que diz respeito à concepção pública que a internet
traz em seu escopo, onde estaria o “espaço autoral” da criação literária? E mais: não sendo
o produto desta criação exatamente um livro, algo “concreto”, “palpável”, com teor
“documental”, não se configuraria aí uma impressão de algo “solto” pela rede, portanto
suscetível em sua integridade?
Embora todo o tipo de criação que se utilize da Web para se fazer conhecida
esbarre em problemas jurídico-autorais –pela própria natureza pública que contorna a
silhueta da internet e, ressalte-se, não seria esse tema algo a ser desenvolvido por este
artigo propriamente-, muitos autores-internautas fazem da rede suas “editoras”,
organizando-se (ou não) em comunidades e escrevendo blogs. A Dra. Eliane Yachou
Abrão, atuando há três décadas em Direito à Propriedade Imaterial, em artigo veiculado
no “Portal São Francisco”, traz mais luz ao contraste criação artística X propriedade
intelectual na rede. Diz ela:
[...] o grande problema principalmente em relação a textos que a Internet traz é o relativo à autenticidade da obra, literária ou científica, em virtude da facilidade de adulterá-la pelos meios técnicos colocados à disposição do operador de qualquer computador. Essa violação aos direitos morais do autor podem vir a ser combinados com danos morais puros porque a alteração poderá vir a atingir o autor, como pessoa, em sua honra subjetiva [...]Textos literários longos ainda não preocupam seus autores e titulares com relação ao uso através da web, porque não interessam aos velozes internautas, ao contrário dos textos enxutos, das crônicas, das poesias, dos artigos jornalísticos. Mas todos, sem exceção, só podem ser veiculados com a autorização de seus autores. (Abrão: 2010, 1)
Mesmo sob essa problemática relação “proteção autoral” X rede, como já
exposto anteriormente, surgem muitas manifestações com características literárias nas
redes sociais, organizadas em comunidades ou mesmo individualmente. De todo o modo,
é indiscutível o papel da Web como responsável por criar a possibilidade de surgimento
de talentos. E algumas editoras, como a Matrix, deu um passo importante nesse sentido ao
transformar sites, como a Mothern1, em livros, e o aparecimento da Blog de Papel2, cuja
função é trazer textos e ilustrações de autores, os mais diversos, que se unem para criar
blogs de divulgação literária.
1 http://mothern.blogspot.com.br
2 http://blogdepapel.zip.net/
E, nessa esteira, estreitaram-se as relações entre os conteúdos –sítios sobre
livros, leitura, literatura em geral-, e as respectivas produções – em especial aquelas
organizadas em redes como Twitter e Facebook, por exemplo-, com o objetivo maior de dar
visibilidade aos novos autores e suas ideias. Por meio dessa relação cite-se a rede “Skoob-
- Beta”3, criada em 2008, que se tornou conhecida pela divulgação boca a boca. Oferece um
serviço de informação que se baseia na apresentação de grupos de debates e ferramentas
como o “paginômetro” – que calcula o número de páginas lidas pelo usuário, entre outras
atrações. Há também “O livreiro – Beta”4, lançada em 2009 durante a FLIP, a Feira
Literária de Paraty, trazendo muito conteúdo literário, debates e troca de experiências
literárias em geral. Finalmente, nessa linha, há o “TrocandoLivros”5 – escreve-se junto
mesmo. Embora exista a ideia de socializar a troca de exemplares, o fato interessante é a
divulgação de trabalhos totalmente produzidos na Web, cujos autores não foram ainda
divulgados.
Embora não se trate necessariamente de “criação” literária, há comunidades nas
redes que se predispõem a “discutir” a criação: trata-se da Comunidade “Escritores –
Teoria Literária”. Assim como esta, há a comunidade “Discutindo Literatura” que, além
dos textos já consagrados, auxilia os novatos a entenderem melhor a metodologia do fazer
literário.
Na linha da criação, há a comunidade “Oficina Editora”16 que, além de
disponibilizar os chamados e-books gratuitamente, é, sem dúvida, uma usina de estímulos
aos novos autores que vêm, no conjunto bibliográfico, um apoio para seus escritos. Por
falar em escritos, há o “Espaço da escrita”7, de origem portuguesa, que promove a
aproximação das manifestações literárias em língua portuguesa, bem como abre espaço
para a troca de impressões e pensamentos sobre leituras. Já no Facebook o número de
comunidades só faz crescer. Muitos grupos que no Orkut se instalaram passaram também
a aportar no Facebook. Das milhares que ali se encontram, cite-se a “Benfazeja –
Comunidade Literária”8 que, como as outras, tem o mister de divulgar concursos
literários, a criação de poesias, contos, crônicas, entrevistas, conversas e até filmes afins.
3 http://www.skoob.com.br
4 http://www.superdownloads.com.br
5 http://www.trocandolivros.com.br
6 www.oficinaeditora.com.br
7 www.espacodaescrita.blogspot.com
8 3
www.facebook.com/benfazeja
Enfim, há um universo na rede que se abre para o mundo da criação literária que
este artigo apenas intenta em mencioná-lo, pois são numerosas e exigiria um trabalho
mais longo. Entretanto, é valioso reforçar que, além dessa criação, todos esses grupos têm
a preocupação de também estudar o texto literário, praticando a ideia de responsabilidade
daquilo que se publica. Em síntese: não se trata somente de “postar” um texto, mas
entendê-lo melhor antes de torná-lo público.
1.3. Facebook: uma “Pena Eletrônica” para a escrita literária
Pode-se aqui afirmar de saída que o Facebook é, sem dúvida, uma espécie de
“estante” literária para a criação. E por quê? Porque, por meio dessa ferramenta
tecnológica, encontra-se uma infinidade de manifestações configuradas em comunidades
correlacionadas às questões literárias em geral, passando por interesses por livros
clássicos até as produções mais originais de várias partes do mundo, carregadas de
aspectos culturais peculiares.
Não é sem razão que as chamadas “mídias sociais” tornaram-se um acessório
fundamental para o processo de comunicação da humanidade. Elas apareceram,
moldaram-se ao gosto dos usuários, abriram-lhes as portas as mais diversas para a
interatividade, de modo que passaram a ser hábito fundamental no cotidiano das pessoas.
2
Parece exagerado dizer que muitos se “enxergam” mais nelas do que em seus
próprios espelhos, uma vez que fazem de seus perfis a ponte direta para o mundo, numa
espécie de afirmação de personalidade. E uma das facetas dessa afirmação é o
envolvimento (por que não “engajamento”?) com outros tantos pares, organizando-se em
comunidades e, a partir delas, interagindo com o poder de criação.
O Facebook, sem dúvida, encorpou-se nessa fenomenologia e, por hora, é a maior
sensação, posto que cresceu de forma exorbitante o número de usuários nos últimos anos
em nosso país, hoje ficando em segundo lugar, só perdendo para os Estados Unidos.
Surgida em meados dos anos 2000, essa ferramenta vem apresentando-se como “acessório
comunicacional” importante do cotidiano das pessoas, levando-as a serem “vistas” das
mais diversas formas. É no Facebook que a página “Estante Virtual”, muito presente nesse
contexto, toma fôlego e, em seus blogs, encontram-se muitas informações sobre o processo
de criação literária.
[...] Mas não é apenas nas redes sociais especializadas no assunto que a literatura é tema das interações. As redes tradicionais de relacionamento também já contam com espaços reservados aos amantes de livros. [...] No Facebook, a rede
social que mais cresce no país, páginas como a da Estante Virtual são usadas pelos leitores para partilharem suas experiências de leitores (Estante Virtual: 2012, p.1)
Ou seja, o processo que integra o interesse por troca de experiências no que
concerne à leitura também agrega o interesse pela produção literária, apresentando não só
autores consagrados como também novos escritores.
Essas mídias assumiram um papel fundamental para a diversidade do processo
comunicacional, principalmente no que diz respeito àquelas de cariz educacional e
artístico. São um verdadeiro “laboratório” da comunicação, permitindo o experimento da
linguagem, abrindo –mais e mais- as portas para a riqueza que brota de nosso idioma.
“Ler”, portanto, passa, agora, por uma nova etapa, que é a virtual. “Escrever”,
então, estende-se para além da caneta. Há um bom tempo esses processos deixaram a
pecha de “ato solitário”, pois compartilham-se as experiências e constrói-se informação,
com o ímpeto de se “apresentar” pelas palavras a ousadia da criação. E, da troca de
experiências por essas redes, as ideias multiplicam-se e se tornam acessíveis a qualquer
usuário, num círculo virtuoso e incentivador. Em outras palavras, as famosas “gavetas”
que hibernavam tantas e tantas ideias por muitas vezes criativas e importantes, agora
veem a possibilidade de vislumbrarem uma realidade, realidade esta que atenua a
“timidez” do processo que caracteriza a criação, numa espécie de solidariedade literária. É
aí que aparecem as comunidades, que só fazem multiplicar-se.
Percebendo o poder da troca das redes sociais, muitos escritores também já se aventuram nas plataformas que viraram ponto de encontro de leitores, autores consagrados e novos escritores, que trocam entre si sugestões de leitura e organizam até mesmo encontros para debater literatura. [...] Atuar nas redes sociais pode ser um verdadeiro laboratório literário. Nelas, escritores podem se reinventar, tentar temáticas e estilos diferentes do que estão acostumados.(Idem, ibidem)
Por isso, a necessidade de se conectar através do impulso criador/criativo levou
os internautas a entenderem que têm em mãos um poderoso instrumento de ação: as
redes sociais. Para além do texto escrito, elas tornaram-se um “ponto de encontro” do
pensamento da criação, no qual prevalecem as trocas de impressões acerca daquilo que é
produzido com valor literário, mas sobretudo com o intuito de se atribuir qualidade às
composições artísticas.
1. As criações literárias como perspectivas pedagógicas
1.1. As plataformas tecnológicas e os projetos pedagógicos
Tem-se a consciência, aqui, de que a expressão “plataformas tecnológicas”
apresenta um significado mais amplo e diverso. Quer-se, entretanto, fazer uso dessa
expressão no sentido das redes sociais como promotoras do estímulo à leitura e à
produção textual, por meio de experiências em diferentes níveis escolares.
Aline Lisboa e Eloy Vieira, dois importantes pensadores da Educação, em artigo
intitulado “O uso das redes sociais como método alternativo de ensino aos jovens”,
publicado no portal “midiassociais.net”, apresentam uma reflexão ponderada e bastante
didática sobre a aproximação desses espaços como fontes de estímulo para o aprendizado,
principalmente aqueles que privilegiam a informação, portanto a leitura, e a escrita.
Numa visão geral, dizem que
[...] o uso das novas tecnologias associadas ao ambiente formal de ensino é uma realidade que pode ser reiterado por centros de estudos específicos sobre a área, como é o caso do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC), que vem demonstrando como o uso das redes sociais no ambiente escolar pode colaborar para o processo do ensino-aprendizagem. A ampla disseminação entre as novas gerações do uso das novas tecnologias e, mais especificamente, das redes sociais na internet pode ser de grande valia para educação. O trabalho em rede pressupõe colaboração, cooperação, valores que só enriquecem o processo de aprendizado. (LISBOA & VIEIRA: 2010, p.1)
Portanto, partindo-se dos princípios acima apresentados como o da
colaboração/cooperação, as redes sociais que acolhem o impulso criativo com
possibilidade de abertura para reflexão sobre essas mesmas criações e conteúdo já
consagrado, só têm a acrescentar aos professores, uma vez que, eles, investigando e
inventariando todos os grupos presentes na rede que permitem um diálogo com o
processo pedagógico a partir de seus acervos, têm em mãos instrumentos que certamente
atraem os alunos, pois não estão distantes de sua realidade.
Nessa “ponte” que vai das redes sociais aos projetos sociais, muitas iniciativas
têm se consagrado. Um dos primeiros projetos fez do Orkut uma das ferramentas mais
populares, pois, antes da chegada do Facebook, agregava o maior número de brasileiros,
sobretudo os mais jovens. Ainda bastante usado, possui um grande número de
comunidades, com troca intensa de informações. No que diz respeito às comunidades
literárias, muito dos espaços criativos –e criadores- servem como suporte para incentivo
ao processo de leitura e de produção literária.
Outro projeto interessante é o Ning, tido como um communnity building “a favor
da educação”, como se apresenta. Ainda um pouco mais restrito do grande público,
conhecido por ser um community builder, sua importância repousa na ideia de se criar uma
rede social própria. Isso possibilita determinados grupos educacionais personalizarem
suas produções como fóruns, blogs, chats, vídeos, imagens, áudios, entre outros. Portanto,
é o “link” entre os processos de criação – o literário, de um lado, e o da construção da
“rede pedagógica”, de outro.
Mas, talvez um dos mais desafiadores seja o Twitter. Por permitir a disseminação
da informação de forma rápida e eficiente, também possibilita o “armazenamento” do
conhecimento. Com a presença dos chamados hashtags – o símbolo # - o usuário pode
“etiquetar” determinados assuntos, abrindo espaço para as consultas de determinados
temas e assuntos. Mas, o grande trunfo – ou desafio- do Twitter são os registros escritos
em 140 caracteres. Há comunidades, bem como escritores desvinculados delas, que criam
seus textos nesse exíguo espaço, uma forma interessante de ensinar os alunos como
pensar a escrita de forma sintética e objetiva.
1.2. Perspectivas pedagógicas: redes sociais e sala de aula
Chega-se ao cabo desta parte ponderando-se que não só o interesse pela
Literatura e pela produção literária assim como pelo uso de novas ferramentas
tecnológicas como “ponte” entre as redes sociais e a escola estão cada vez mais nas pautas
de discussão.
É cada vez mais necessário que as instituições de ensino se entreguem de todo
para o que se passa nas redes sociais, filtrando seus conteúdos e abrindo as portas para
aqueles cujo teor é o da criação de qualidade. É imprescindível que as escolas enxerguem
nessas redes instrumentos valiosos e auxiliares para o aprendizado. Por elas, estimulam-
se os discentes, fazendo-os interagirem com várias ferramentas, num processo de
aprendizagem coletiva.
Não se tenha dúvida de que se fala também aqui, ainda que de forma célere, da
questão da inclusão digital, que vem na esteira de toda esta reflexão. O CENPEC – Centro
de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária, é um desses projetos
que incentiva o uso de redes sociais nas escolas, assim como o “Tonomundo”, cuja ação
denominada “Minha Terra”, que pertence ao programa EducaRede, iniciativa da
Fundação Telefónica, permite a formação de equipes de professores e alunos que
interagem na criação de reportagens sobre a comunidade local a partir de registros
linguísticos os mais diversos, propiciando o conhecimento de diversos gêneros textuais,
entre eles o literário.
Uma coisa é incontestável: nada é limite, nos dias que correm, entre as redes
sociais, o conhecimento e a aprendizagem. Com iniciativas como as vistas acima, que
aproximam alunos do que vai pela rede, o processo de criação literária, presente em
muitas comunidades, é, para além das vaidades pessoais, um instrumento inegável para
se incluir os jovens no gosto pela leitura, bem como o de torná-los potenciais escritores
que possam enxergar, no sonho de suas palavras, o mundo que lhes muito pertence.
2. “Twittando” literatura: um quanto de microconto nas mídias sociais
2.1. quantos caracteres se conta algo?
Não é de hoje que ferramentas tecnológicas como o Twitter emolduram o
moderno cenário do cotidiano como mais uma das diversas faces possibilitadoras da
criação.
Muitas das denominadas “mídias sociais” extrapolaram determinados valores de
usos, permitindo que muito dos seus visitantes estabelecessem relações para além da
forma de uma simples página que se estrutura, comumente, em perfil pessoal,
acompanhada de um punhado de mensagens e/ou imagens (neste caso, fotos e vídeos).
Com a chegada do Twitter, o conceito de escrita nas redes mudou muito. Sabe-se
que, apesar do exíguo espaço que essa ferramenta oferece – o dos desafiadores 140
caracteres – muito se tem pensado, no que diz respeito à criação -, sobre as diversas
possibilidades de produção artística nesses limites.
E, com os novos horizontes para se estabelecer o processo de criação, surgiram
também possibilidades novas no campo pedagógico. Educadores, professores e
coordenadores pedagógicos viram na ferramenta um instrumento mágico para estimular
o aprendizado de nosso idioma bem como o de articular esse aprendizado por meio de
processos criativos, que não só atraiam os estudantes, mas que dê a eles a oportunidade
de exercitarem as habilidades linguísticas.
Além dessa construção de um novo perfil pedagógico para o aprendizado da
Língua Portuguesa, pela via da produção textual que associa as bases curriculares com os
caminhos da criatividade, é importante frisar o papel fundamental que o Twitter vem
exercendo nos segmentos interessados em Literatura- e de qualidade – diga-se. Grupos de
interesse comum, assim como autores-produtores solitários, hospedam-se nessa
plataforma entendendo-a como uma nova tendência do processo de comunicação,
instigados pelo desafio da síntese da ideia.
Como se verá adiante, muitas experiências escolares, muitos concursos literários,
festivais e eventos que façam uso da produção textual, já são uma realidade via Twitter,
como é o caso da acadêmica Daniele Freitas, que foi finalista do evento “TOC 140 – Poesia
no Twitter”, evento este que integrou a Festa Literária de Pernambuco em 2011, para citar
um entre vários exemplos.
Para que se possa melhor organizar a leitura das informações a seguir,
ressaltemos a necessidade de se apresentar, ainda que de forma breve, um panorama
histórico dessa tão dinâmica mídia, bem como algumas de suas características mais
comuns. Em seguida, apresentar-se-á uma reflexão bastante ampla sobre a natureza do
gênero literário conhecido como “conto” e como ele pode se “hospedar” (e ser
compreendido) numa realidade tão exígua que configura o espaço da postagem do
Twitter. Sequenciaremos com as produções criadoras e criativas nas teclas de escritores
“solitários” ou organizados em comunidades afins e, por último, os interessantes reflexos
pedagógicos que essas manifestações têm gerado.
2.2. Twitter: caracterização e revolução midiática
Embora “entrando para o clube” das mídias sociais, o Twitter não pode ser
considerado como mais uma ferramenta que surgiu no mundo virtual. Já completando
cinco anos de história, ela surge com uma pergunta logo em sua primeira página: What’s
happening, isto é, há de início um processo de interatividade (e instantaneidade) com o
usuário, perguntando-lhe o que ele está fazendo exatamente naquele momento. Mais: sua
resposta tem que ser estruturada no famoso (reduzido) espaço de 140 caracteres.
Entretanto, enganam-se os que pensam que o Twitter tem somente a finalidade
de registrar o que se passa com seu usuário “para que outros fiquem sabendo”. Seria
muita ingenuidade, para não dizer limitação, pensar que uma ferramenta como esta viria
à luz só com a finalidade de se moldar a um “diário instantâneo” por meio do qual são
registrados tão-somente acontecimentos dispersos e sem profundidade. Ele surgiu com a
ideia de ser um blog – ou melhor -, um microblog, pelo qual se apresenta uma quantidade
inimaginável de textos configurados em vários gêneros. Bilhetes, recados, registros de
ordem diversa, máximas, ditados populares, citações, pensamentos vários, textos de
natureza poética e, sobretudo, contos – sim, contos! (ou microcontos)-, são realidade no
ínfimo espaço desafiador do pensamento. O interessante é que este microblog – por meio
de suas várias utilidades – permite que seus usuários “sigam” outras “fontes” de
informação e, em contrapartida, sejam também “seguidos”, ou seja, trata-se de uma nova
forma de “compartilhamento fiel” às novidades que transitam de forma instantânea pela
rede. Com as novas tecnologias, essa nova realidade de “compartilhamento” torna-se
ainda mais stand-by com a presença dos smartphones, soando como uma espécie de ode ao
real-time das atualizações que essa mídia permite.
O Twitter veio à luz em 2006, criado por Jack Dorsey, Evan Willians e Biz Stone,
após estes dois últimos saírem da gigante Google. A ideia inicial era a de que fosse uma
espécie de veículo de troca de status. Inicialmente denominado de “Status”, a ferramenta
nasceria com a intenção de troca de mensagens rápidas e instantâneas, como os sms dos
telefones celulares, sendo o usuário avisado por uma espécie de twich – um sinal vibrante.
Embora esta palavra inglesa já se assemelhasse ao nome atual do microblog, ainda não
agradaria seus idealizadores.
Entretanto, a palavra não agradou, pois não mostrava exatamente o que era
o serviço. Ao buscar nomes parecidos no dicionário, Dorsey e os outros encontraram a
palavra twitter, que em inglês tem dois significados: “uma pequena explosão de
informações inconsequentes” e “pios de pássaros”. Ambos combinavam perfeitamente
com o conceito. (TECNOMUNDO: 2012, p.1)
Em 2007, essa ferramenta toma forma final. E sua consagração viria com o evento
South by Southwest (SXSW), evento este que reúne novos talentos no campo da imagem e
som. Nele, fora colocada uma tela de 60 polegadas no centro do evento que acompanhava
as mensagens trocadas por meio da nova revelação – o Twitter. O interessante é que todos
se comunicassem em tempo real por meio de mensagens curtas.
A ideia fortificou-se e a realidade das mensagens curtas, sucintas, agradou o
gosto dos milhares de novos usuários. O que poderia parecer algo “incômodo” pela
estrutura restrita para o registro de mensagem, tornou-se uma paixão. Paixão pela
funcionalidade, paixão pela instantaneidade, paixão pela simultaneidade, paixão pelo
desafio. Sim, desafio para uma nova feição do processo comunicacional. É importante
ressaltar que seus criadores conseguiram manter a fidelidade às concepções iniciais – a de
troca de mensagens curtas, como os SMS’s -, proporcionando uma maior agilidade e
rapidez no compartilhamento de informação.
2.3. O “conto”: um gênero feito para as mídias sociais?
Não se pretende neste trabalho tomá-lo, em sua maior parte, para uma reflexão
mais profunda sobre gêneros literários, sobretudo no que diz respeito à complexidade
inerente ao conto. Tampouco se quer aqui pousar nas searas acadêmicas concernentes às
áreas das Letras. De todo o modo, entende-se prudente e reto esmiuçar, ainda que de
maneira breve, um pouco da reflexão que se faz sobre a “forma” literária denominada
“conto”. O intento deste texto é pensar como se processam os mecanismos
comunicacionais utilizando-se as mídias sociais. A criação/criatividade literária, sem
dúvida, é pauta nessa discussão e, por isso, faz-se necessário tanger conceitos que se
somam ao fulcro deste estudo.
Anteriormente se disse aqui que o dinamismo que alinhava o processo
comunicacional no Twitter é entendido como um grande desafio. Pensado como
ferramenta para contatos imediatos, essa mídia agregou outras possibilidades de
interação/integração, permitindo uso mais abrangente, coincidentemente aquele de
caráter criativo, como a “escrita” de valor para além da significação imediata, objetiva,
isto é, uma escrita com multissiginificação.
Se escrever no Twitter já é uma forma desafiadora de se expressar, imagine-se
construir um texto entendido como “conto”, de natureza nada simples, sob as fronteiras
dessa plataforma midiática. Como pensar em formas comunicacionais dessa natureza,
“podando” ao extremo elementos compreendidos como singulares para a nitidez dos
contornos literários entendidos como...conto?
Para aproximarmos um pouco o leitor leigo das reflexões que se tem sobre o
gênero em questão, apresentar-se-ão aqui dois pensamentos que podem nos dar uma
ideia do que pode caracterizar um conto. Um deles, de forma mais didática e abrangente,
tenta “imediatizar” sua compreensão. Já outro, de modo pouco mais maduro, reporta-se
numa ponderação mais zelosa.
Didaticamente, o conto parece ser um gênero mais “simples” porque se pauta
por um único conflito, uma única trama, ao contrário de outras formas literárias, como o
romance, que pode trazer uma “malha” de elementos conflitantes em seu enredo. É como
se alimentasse por meio de uma única “célula dramática”. A questão temporal da
narrativa não leva muito em conta referentes passados ou do futuro, e sim o pulsar do
presente, do momento. O espaço do fio narrativo dá-se como um funil, é único, como que
proporcionando um movimentar das ideias nos limites do seu “turbilhão”, portanto é
mais restrito. Pela natureza dessa dinâmica, tenta-se levar ao leitor numa única impressão
sobre o desenrolar dos fatos. Em resumo muito imediato – diga-se-, ele traz, em sua
estrutura, os seguintes elementos: uma ação, um lugar, um tempo, um “tom”, que é o
efeito dramático que o produtor do texto traz a partir de suas habilidades linguísticas. De
forma breve, apresentemos tão-somente um recorte para exemplificação. Para tanto,
citamos o conto de Mário de Andrade, cujo título é “O poço”. Nele, encontramos um
parâmetro para solidificar as informações anteriores e, principalmente, nosso tema. Trata-
se de um fazendeiro – Joaquim Prestes – dono de poder político e de índole autoritária,
que decide construir um pomposo pesqueiro em suas terras. Manda erguer, também, uma
grande e elegante casa e, quando tudo está pronto, intenta abrir um poço.
Para a empreitada, reúne seis de seus vários empregados que, devido a
época – era julho e estava muito frio-, não gostam da ideia, com medo de contraírem
maleita. E tal tarefa não era em nada exemplo de salubridade. Pois bem. O fio narrativo
gira em torno do momento em que o patrão, numa de suas intervenções ditatoriais,
resolve observar o serviço e, descuidado, deixa cair no buraco do poço a caneta tinteiro,
que repousava em um dos bolsos de sua camisa. Em tempo: o conto tem sua “coluna
cervical” na relação ditatorial do patrão-mandão com seus subordinados, obrigando-os a
pegar o objeto– de todo o modo e sem condições mínimas de segurança e de saúde, já que
se tratava de lugar úmido, escuro e frio-, estúpida e insistentemente.
O grande desafio do escritor é passar uma impressão de “universalidade” de
significações/simbologias a partir de uma única situação, conforme exposto
anteriormente, isto é, uma ação: a busca da caneta no poço; um lugar: o buraco do futuro
poço; um tempo: momento presente, a referencialidade do mês de julho e um tom: as
significações que emanam da ação principal, tais como a relação ideológico-dialética
indireta entre patrão/empregado, o significado de “poço”, como metáfora da condição
humana por causa da busca de um objeto (que, diga-se, ele possuía em grande
quantidade), a evolução da linguagem no desfiar da narrativa etc. Vejamos um trecho do
interessante texto de Mário de Andrade:
Ali pelas onze horas da manhã o velho Joaquim Prestes chegou no pesqueiro. Embora fizesse força em se mostrar amável por causa da visita convidada para a pescaria, vinha mal-humorado daquelas cinco léguas cabritando na estrada péssima. Alias o fazendeiro era de pouco riso mesmo, já endurecido pelos setenta e cinco anos que o mumificavam naquele esqueleto agudo e taciturno [...] Essa é boa!... Eu é que não posso ficar sem minha caneta-tinteiro! Agora vocês hão de ter paciência, mas ficar sem minha caneta é que eu não posso! têm que descer lá dentro buscar! Chame os outros, Albino! E depressa! que com o barro revolvido como está, a caneta vai afundando!! (ANDRADE: p. 40-55)
Pelo trecho, posiciona-se o leitor num único espaço – pesqueiro/poço-, e, como
um “epicentro”, deriva-se, por um fio tensor, uma conjugação de personagens e ações que
edificarão a trama central, no caso a busca insana por uma caneta e, por ela, a construção
habilidosa do leitor que poderá alinhavar ilações diversas por meio de ícones que o
escritor cria.
Contudo, alguns pensadores da criação literária alertam para a necessidade de se
ponderar sobre a essência do(s) significado(s) de conto. José J. Veiga, no site
www.diaadiadaeducacao.pr.gov.br, afirma que uma definição do gênero conto ainda não
foi encontrada e que isso não afeta a qualidade de sua produção. Diz ele que
[...] a definição definitiva do que seja conto ainda não foi encontrada – e parece-me que jamais será. Mas terá importância essa falta de uma definição abrangente? Acho que não tem nenhuma - porque conto é uma criação de mil
faces e mais algumas: portanto, é mesmo indefinível, e assim deve continuar. Essa diversidade incapturável é justamente o que faz do conto um desafio a quem escreve ficção. Por isso é que o conto, quero dizer, o bom conto, está sempre sendo reinventado e constantemente exasperado a quem tenta defini-lo. (VEIGA: 2002)
Vale ressaltar nesse pensamento de J. Veiga o valor de “desafio” – termo por aqui
bastante respeitado- que tem a produção escrita que se pretende do gênero conto. Alfredo
Bosi, em suas belíssimas intervenções sobre o fazer/pensar literário, contribui com esse
cuidado no trato da conceituação de gêneros. Diz o professor Bosi:
O conto cumpre a seu modo o destino da ficção contemporânea. Posto entre as exigências da narração realista, os apelos da fantasia e as seduções do jogo verbal, ele tem assumido formas de surpreendente variedade. Ora é quase-documento folclórico, ora quase-crônica da vida urbana, ora quase-drama do cotidiano burguês, ora quase-poema do imaginário às voltas, ora, enfim, grafia brilhante e preciosa voltada às festas da linguagem. (BOSI: 2006, p. 39)
Ainda no vão dos pensamentos de Bosi, O conto brasileiro contemporâneo,
reforça o poderio que tem tal gênero em condensar numa pequena extensão a
complexidade que tem o caminhar ficcional típico de outros tão “maiores” gêneros, como
a novela e o romance, por exemplo.
[...] já desnorteou mais de um teórico da literatura ansioso por encaixar a forma- no interior de um quadro fixo de gênero. Na verdade, se comparada à novela e ao romance, a narrativa curta condensa e potencia no seu espaço todas as possibilidades da ficção.(BOSI: 2002, p. 34)
Outra grande (e histórica) referência das letras de língua portuguesa é Afrânio
Coutinho que nos empresta suas palavras, retiradas de sua Enciclopédia da Literatura
Brasileira, para encerrarmos este item. Diz Coutinho que “o contista oferece uma amostra
através de um episódio, um flagrante, ou um instantâneo, um momento singular e
representativo” (COUTINHO: 1985, p.58)
Portanto, com a proliferação das mídias sociais na rede, ofertando possibilidades
as mais variadas para se estabelecer conexões diversas de comunicação, deflagram-se
inúmeras formas de registro – notadamente o verbal -, que, instigado por um universo
criador, coloca como senha o desafio da criação literária em curto espaço físico. Quem o
enfrentará?
2.4. 140 caracteres: entre a síntese e a sugestão
A grande questão que aqui nos vem é: há possibilidade de se conjugar a
complexidade da natureza de um conto com a “raquítica” soma de 140 caracteres? Como
falar em “conto” numa mídia como o Twitter? Mais: como falar em “microconto” se o
conto já é, por si só, uma “estrutura reduzida”?
Tais indagações, somadas, chegam a um resultado final: o desafio. Embora aqui
presente algumas vezes, a expressão (“microconto”), com sua instigante significação,
propiciou o aparecimento de “tuitteiros” que, por meio de concursos e outros eventos,
como o da Academia Brasileira de Letras, em 2010, puseram todo o poder criativo para
funcionar.
Mas por que a palavra “microconto”? Poderia se falar, então, em algo ainda
menor, como “nanocontos”? Assim como já refletimos acima sobre a dificuldade de se
definir o gênero conto, com essas outras terminologias não poderia ser diferente. Mini,
micro ou nano são prefixos que podem muito bem gerar algumas discussões. Assim, já se
falou em 50 caracteres para os nanocontos, até 150 para os microcontos e uma página para
os minicontos. Mas é de bom senso não se entender o gênero – levando-se em conta
sobretudo os padrões oferecidos pelas mídias sociais -, sob um parâmetro que leva em
consideração o número de caracteres. Fiquemos com Mário de Andrade que afirmava que
“conto será sempre aquilo que seu autor batizou de conto”. É mais fácil, pois.
Apesar de nosso eixo temático versar sobre a produção literária em algumas
plataformas como o Twitter, muito antes do aparecimento da internet já se falava na
possibilidade de se escrever algo tão sucinto como os microcontos. Há registro de fábulas
chinesas curtíssimas consideradas como microcontos. Um pouco mais adiante, em 1959, o
guatemalteco Augusto Monterroso produziria um dos primeiros textos literários de nossa
era considerado como microconto, e que, curiosamente, possui uma única frase: “Cuando
despertó, el dinosaurio todavía estaba allí” (quando acordou, o dinossauro ainda estava
lá). Há outros registros de autores que se aventuraram na escrita sucinta, tais como Franz
Kafka e Ernest Hemingway, entre outros.
O curitibano Dalton Trevisan foi, sem dúvida, o marco inicial deste (possível)
gênero. Em 1994, viria à luz, pela Editora Record, seu livro Ah, é?, que traria em suas
páginas uma espécie de “revolução pela concisão”. Por exemplo: “Só de vê-la — ó doçura
do quindim se derretendo sem morder — o arrepio lancinante no céu da boca.” (texto 4, p.
13). Ou este outro exemplo, respeitando a ortografia original:
Domingo inteiro em pijama, coça o umbigo. Diverte-se com os pequenos anúncios. Em sossego na poltrona, entende as borbulhas do gelo no copo de bebida. Uma velhice tranqüila, regando suas malvas à janela, em manga de camisa. Única dúvida: ganhará o concurso de palavras cruzadas? (TREVISAN: 1994, p.13-14)
Muitas outras iniciativas que alvejavam essa questão dos textos curtíssimos se
tornariam realidade, como em 2004, com a organização de Marcelino Freire. Os cem
menores contos brasileiros do século, publicado pela Ateliê Editorial, reuniria um número de
autores brasileiros para criarem textos com até 50 caracteres. Portanto, a produção de
textos concisos já instigava muitos “aventureiros das letras” muito antes do surgimento
das também instigantes mídias.
De todo o modo, não se deve fugir das questões apresentadas acima. O que levar
em conta, basicamente, para se entender uma postagem no Twitter como microconto? O
elemento-chave aqui é a sugestão, isto é, o dizer implícito no curto fio tensor da narrativa.
A concisão (concentração) máxima de significações em pouquíssimas palavras – como nos
exemplos citados-, permite entender o texto como uma ferramenta poderosa de
simbologias. Não se trata de afirmar tão-somente que pela “ausência” de uma composição
mais longa tem-se o significado. Não. Mas justamente a beleza da ideia encontra-se na
conjugação ausência/concisão desta estrutura verbal escrita que, diga-se, é o grande cerne
do microconto, não só pelas poucas palavras, mas na condução delas por meio da
inteligência do uso dos sinais gráficos, como a sutil marcação do ritmo pela pontuação,
por exemplo.
E, consoante a isso, deve se ressaltar o maior dos aspectos que vai além da
escolha “cirúrgica” das palavras: o valor narrativo que elas têm que proporcionar, pois
não haverá conto, tampouco microconto, se não houver narratividade. É preciso que haja
uma história, é preciso contar uma história. E é aí que a maestria do texto –pela nuvem
inebriante da sugestão- tem que casar o imediato do texto com o alcance imaginativo do
leitor.
2.5. Os “seguidores da sugestão”
Nessa perspectiva, amealhou-se um número considerável desses “escritores da
concisão” e, a partir deles, uma rede de seguidores que entenderam a ideia como algo
muito interessante. E, nesse ímpeto de se aventurar em um gênero literário com certos
tons de complexidade – como o conto -, muitos autores e organizadores dessas produções
multiplicam-se a cada dia.
Alguns perfis destacam-se nos cento e quarenta caracteres como o
@Literaturaemfoco (grupo de análise de textos literários, inclusive no Twitter), @semruido
(do Coletivo sem Ruído), @microcontos (perfil organizado por Carlos Seabra),
@marcelinofreire (organizado por Marcelino Freire), @tfmorales (organizado de Tiago
Moralles), entre outros.
Com o avanço das diversidades comunicacionais que povoam a atual realidade,
consoante às possibilidades de interação oferecidas por elas, não se poderia aqui deixar de
realçar o valioso papel que ferramentas como o Twitter desempenham em determinados
processos pedagógicos que envolvam a língua/linguagem de nossos estudantes. Pela
própria natureza variada dos fenômenos que configuram hoje os processos
comunicacionais, é latente a necessidade que professores têm em transformar a
conjugação leitura-produção textual à luz do universo de gêneros textuais inseridos na
complexa estrutura da língua portuguesa. Nesse sentido, trabalhar metodologias didático-
pedagógicas que apresentem as variantes textuais – leia-se “gêneros”- aos nossos alunos,
com suas características peculiares é, sem dúvida, um objetivo maior para os dias atuais.
O domínio do idioma, então, não deve ser entendido como algo sempre raro e, por
conseguinte, distante. Pedagogicamente falando, compreende-se que tal desafio é a
conjugação harmoniosa de habilidades e competências que, sem dúvida, só fazem
melhorar com a colaboração da internet e, em especial, de redes sociais como o Twitter,
que propõe uma peculiar dinâmica à produção escrita.
É fato que, inicialmente, não se pensava possível o registro de textos com o lastro
dos contos nem mesmo próximo da ideia deles. A natureza complexa da composição que
pontua essa forma literária não se caracterizaria numa plataforma virtual com o perfil do
Twitter, que reserva espaço ínfimo para textos que se pretendem maiores e mais amplos.
Entretanto, o gosto pelo desafio, acompanhado pelo instigante desejo de repousar em tão
pequeno território as poucas palavras que muito significam, fazem dessa ferramenta
social, sem dúvida, um dos grandes fenômenos comunicacionais de nosso tempo, a um só
momento comprometido com os ventos mais agradáveis da criação pela língua
conjugando-a a possibilidades diversas de atuação pedagógica pelas salas de aula
brasileiras.
3. Redes sociais, Literatura e Escola: uma revolução cultural
O link entre as redes sociais e a escola já não parece mais algo distante. Ou
incoerente. Ou prejudicial, como se aventava antes. Ferramentas tecnológicas, como essas
ferramentas, hoje não mais são pontuadas como objetos de utilização limitada, como
meros instrumentos de exibição de perfis, com textos esparsos entremeados a fotos que
delineiam cenas pessoais. A preocupação com o aparecimento dessas mídias e, sobretudo,
a influência da natureza que as configura – a de trocadores de perfis e de mensagens -,
sem dúvida despertaria a atenção de muitos estudiosos, sejam eles no campo das artes e,
principalmente, no da educação.
Pensar em uma “cultura digital” nos dias que correm não se tornou apenas uma
obrigação, mas sobretudo uma necessidade – e grande. Sabe-se, hoje, que há grandes
desafios a serem enfrentados no campo pedagógico em nível nacional, principalmente no
que diz respeito às bases do conhecimento (português e matemática) dos estudantes,
notadamente os do ensino fundamental das escolas públicas espalhadas pelo país. Não se
pode mais alicerçar as ações pedagógicas – hoje -, a partir da ideia de como “melhorar a
educação”, mas, sim, de como “transformá-la”. Muitos profissionais desse setor –
professores, coordenadores pedagógicos, diretores -, há não muito tempo, demonstravam
certa insegurança no trato da questão da cultura digital em sala de aula. Quando se
apresentou uma nova concepção educacional às famílias, de pronto houve uma simpatia à
ideia, pois tudo que inclui tecnologia, alimenta uma noção (clara e imediata) de avanço e
progresso. Entretanto, a resistência ao uso de determinadas ferramentas na estrutura
“cervical” do programa de ensino nas escolas seria rija por grande parte do corpo docente
dessas escolas que, em primeira instância, entendia a presença da tecnologia bem-vinda,
mas de forma superficial e, de certo modo, sob certa desconfiança.
Alunos das escolas públicas e seus familiares estão confiantes e esperançosos. Mas e seus professores? Serão os principais atores, sua responsabilidade pesa. Eles têm receio! Pesquisas no hemisfério norte apontam sua recusa em participar dessa revolução cultural. Vamos tentar oferecer-lhes solidariedade, compreensão e apoio? Todas as tecnologias têm tido uso tradicional em educação, tanto na cultura oral, em que os mais idosos transmitiam aos mais novos, como no surgimento da escrita e também na revolução da imprensa, em que o texto impresso passou a armazenar e permitir amplo acesso aos conhecimentos das gerações anteriores, até as novas mídias de ilustrações, fotos e filmes, telefone e televisão (SEABRA: 2010, p.4)
Com a evolução das plataformas tecnológicas, logo a absorção delas pela
realidade das pessoas se transformaria em fato inconteste. Seja no mundo corporativo, nas
engrenagens das indústrias, no dinamismo do mundo publicitário e, claro, no uso pessoal,
as mídias tornaram-se parte da existência humana, exigindo uma revisão do papel que o
indivíduo exerce perante a sociedade. Se os rumos do mundo tecnológico analógico
“estenderam” os “braços” do homem em suas necessidades mecânicas, principalmente na
indústria, hoje, as chamadas “tecnologias digitais” aparecem como uma “extensão” do
poder cognitivo do ser humano. E isso, na realidade de nossos estudantes, é algo
entendido, apesar de algumas primeiras resistências, como fator primordial em suas
formações.
Embora com certa crítica à questão do “conteudismo” que compõe grande parte
de nossa estrutura curricular – crítica esta com certa procedência, mas que não comporta
aqui uma abordagem mais escorreita -, consolida-se uma sociedade balizada pelo
conhecimento, isto é, uma “geração do conhecimento”, entendido, principalmente pelo
mundo corporativo, como algo fundamental. Apesar de apresentar anteriormente um
“senão” crítico a respeito da questão do conteudismo em nossa estrutura curricular, muito
já se discute a reformulação dele, a partir de ações pedagógicas que permitam uma
reconstrução crítica que possibilite aos jovens estudantes habituarem-se com a articulação
mais criativa (e criadora) das (e a partir das) informações. Este “dueto”
criação/criatividade é, sem dúvida, elemento resultado da forma como são vistas (e
trabalhadas) as noções de habilidades e competências pelo corpo docente nas escolas
brasileiras. Estreita-se, portanto, a distância entre o intento educacional e as perspectivas
criadoras da arte literária, cujo valor não se limita só a essa produção criativa, mas ao
estímulo à leitura e – importante -, à produção textual escrita. Hoje, muitas instituições de
ensino superior, como a Universidade Estadual de Campinas, a Unicamp, exige, em seu
vestibular, uma produção textual a partir do conhecimento que o aluno adquiriu, ao longo
do ensino médio, sobre gêneros textuais. Em uma das escolas onde este autor atuou, o
COC Sapiens, em Osasco, o trabalho vinculando projetos de leitura com aqueles de
produção textual utilizando-se as redes sociais como grandes estimuladores é uma
realidade cotidiana. A melhora na percepção da tarefa a se desenvolver, a sensibilidade
para a detecção de elementos que caracterizam os mais diversos gêneros textuais, o senso
de organização das ideias a serem escritas, o raciocínio lógico-argumentativo, a percepção
do valor ético na escrita, dentre outros fatores, são pontos positivos colhidos por
exaustivas pesquisas e discussões pedagógicas que procuram entender esta cultura que se
alinhava cada nas malhas no dinamismo em nosso cotidiano. Carlos Seabra nos auxilia
nesta questão afirmando que
as tecnologias analógicas serviram como próteses: expandiram os poderes mecânicos e sensoriais do ser humano, sua percepção e memória. Mas as tecnologias digitais servem para expandir seus poderes cognitivos. Elas podem ser usadas para empoderar percepções e memórias, mas também para libertar seu pensamento no uso e na construção da criatividade, do virtual, na ampliação e no desenvolvimento do juízo lógico e da consciência. Podem ser próteses cognitivas. Os estudos e as pesquisas que temos realizado nos últimos 20 anos sobre a interação das crianças e dos jovens com as tecnologias digitais nos permitem comprovar que uma nova inteligência está se desenvolvendo nas novas gerações que crescem incluídas na cultura digital (SEABRA: 2010, p. 4-5).
É importante frisar que a maioria dos estudantes atualmente domina alguma
forma de tecnologia, de seu contato íntimo com a tela de seus celulares às telas dos
computadores pessoais, das chamadas lan-houses e/ou os equipamentos das próprias
instituições de ensino, bem como dos tablets. Some-se a esse contato irreversível com as
tecnologias a multiplicação das redes sociais que só fazem aumentar o potencial de
interação o que, para o âmbito educacional é, sem dúvida, um horizonte a ser desbravado,
porque amplia as alternativas de aprendizado. O Facebook e o Twitter, por exemplo, são
hoje interessantes instrumentos de condução do pensamento pela palavra escrita, e que,
apesar de muitas vezes apropriarem-se de certa variedade de escrita, isto é, sob a forma
de determinados códigos linguísticos típicos dos dinamismos naturais das línguas,
cumprem, por vezes, a silhueta de grandes convites à criação e à criatividade, como
caminho certo à valorização da produção intelectual e, consequentemente, da autoestima.
Não se esqueça da importância do YouTube como instrumento que muito bem permite
casar a chamada linguagem verbal com a não-verbal, união esta que traz, para a rede,
muitas vezes, a produção poética visual de diversos autores que se aventuram na
conjunção dessas duas formas da linguagem e, mais positivamente, abre o diálogo que
emerge do dinamismo de muitas propostas pedagógicas, como saraus literários, oficinas
de arte literária, oficinas para pequenas produções visuais – como documentários, enfim,
tudo que comporte o sabor mavioso daquilo que se apresenta pela língua e pelas diversas
formas de leitura.
Contudo, se se defende aqui o valor das redes sociais como veículos condutores
de uma revolução para o aprendizado, dando tonicidade às habilidades e competências
que hoje permeiam o grande debate pedagógico em nossas escolas, bem como o de
sólidos degraus para estimular a criação literária e à leitura, deve-se antes pensar na
formação/capacitação dos profissionais que gerenciam tais atividades pedagógicas, isto
servindo também para aqueles que coordenam páginas e comunidades nas redes para a
divulgação da arte pela escrita. No primeiro caso, o da ação pedagógica efetiva, acredita-
se aqui que se faz necessária uma maior compreensão desses fenômenos – as redes sociais
e suas possibilidades de uso-, entendendo que, para isso, deve-se estimular seus atores a
um melhor preparo, de modo a tornar funcional e razoável a aplicação dessas plataformas
tecnológicas em sala de aula. O professor de pós-graduação em Tecnologias da
Inteligência e Design Digital da PUC-SP João Mattar, em entrevista concedida ao portal do
Instituto Ayrton Senna diz que
[...] como no caso do uso de outras tecnologias, ferramentas, interfaces e plataformas em educação, o professor precisa ser bem formado. Portanto, a dica principal não seria para o professor, mas para as instituições de ensino - elas precisam estabelecer programas de formação continuada de professores, aliás não apenas para o uso de tecnologias em educação (SENNA: 2012)
Noutros termos, é fundamental afastar aquelas primeiras concepções sobre o uso
“íntimo”, “individual”, “solitário” das referidas tecnologias midiáticas, passando a
compreendê-las sobre parâmetros mais amplos e coletivos, proporcionando mais reflexões
que permitam pensar as ações para além de meros e açodados treinamentos, atingindo
esferas mais largas de discussão que realmente reflitam a melhor utilidade dessas
ferramentas no âmbito escolar, integrando seus principais atores – instituições e
professores-, para que entendam com mais clareza o potencial que delas possam usufruir.
Quanto ao uso das redes sociais para os afeiçoados à produção literária, não se
pode aqui furtar a atenção que se deve ter àqueles que gerenciam tais espaços como
organizadores dos mais diversos fóruns de reflexão e discussão sobre leitura e escrita de
textos literários. Nesse caso, diferentemente da formalidade que se exige junto ao fazer
pedagógico, como preparo e formação das instituições escolares e de seus professores, é
fundamental que se adote uma melhor conscientização acerca da utilização responsável
dessas plataformas como objetos que propiciem a criação/criatividade, condição esta
primordial para a adesão e expansão delas e do reflexo social gerado pela estruturação e
filosofia de cada grupo de escritores e de interessados em geral pela leitura e pela
produção de textos literários.
Por fim, ressalte-se a importância que têm esses grupos espalhados pelas
redes – muitos já citados anteriormente -, e, principalmente, sua responsabilidade perante
a sociedade, pois devem ser entendidas como corresponsáveis no processo de
conhecimento ao divulgarem obras literárias referenciais, que sirvam não só para o
simples (porém importante) desfrute de leitores, mas principalmente como colaboradoras
no âmbito da divulgação do gosto pela leitura, como efeito pedagógico prático, bem como
canal direto para o aparecimento de novos talentos pela produção escrita, configurada
pela diversidade de gêneros que compõem o universo maravilhoso que é o nosso idioma.