O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE
2009
Versão Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE
VOLU
ME I
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LINGUAGEM, DISCURSO E SENTIDO: O Cinema na Formação do Leitor
Roseli Aparecida Juliani Moreira1
Ismara Eliane Vidal de Souza Tasso2
Resumo:
Este artigo tem como objetivo demonstrar o funcionamento do discursivo cinematográfico na prática pedagógica de leitura escolar, propondo uma reflexão acerca da utilização do cinema em sala de aula, não apenas como manifestação artística e cultural, mas como um recurso paradidático que auxilia na formação do leitor. Pensando em contribuir com o aprofundamento da questão, propomos um trabalho diferenciado, aos professores de todas as áreas do conhecimento, buscando compreender os efeitos de sentido em cada um dos filmes analisados a partir de suas condições de produção – a representação do sujeito, a identidade e a memória – analisando o “dito e o não dito”, passando pela leitura semiótica e os estudos culturais, orientados, ainda pelo referencial teórico da Análise do Discurso de vertente francesa.
Palavras-chave: Discurso imagético; formação do leitor; cinema.
1 Professora da Rede Estadual de Ensino do Município de Cianorte, licenciada em Letras (Português/Inglês)
pela Fundação Faculdade de Educação Ciências e Letras de Paranavaí (1989). Especialista em Língua Portuguesa – Descrição e Ensino pela Fundação Faculdade de Educação Ciências e Letras de Paranavaí (1992). Professora PDE (2009). 2 Professora da Graduação e Pós-graduação em Letras na Universidade Estadual de Maringá, na área de
concentração de Estudos Linguísticos e na linha de pesquisa Estudos do Texto e do Discurso. Graduada em Letras pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Jandaia do Sul (1975), mestrado em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1997) e doutorado em Linguística e Língua Portuguesa pela Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara (2003). Suas pesquisas compreendem os temas: identidade, discurso, mídia, iconografia, sujeito marginalizado, imagem fixa e em movimento, políticas públicas de inclusão social, política linguística indigenista.
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1 Introdução
A formação de leitor limitou-se, durante muito tempo de magistério, em
oferecer aos alunos textos variados de leitura, que eram levados para a sala dentro
de caixas decoradas e nessas aulas, os alunos liam, na maioria das vezes, faziam
uma leitura silenciosa e, em outras, uma leitura em voz alta em que era realizada de
parágrafo em parágrafo. Nesse tipo de leitura, a preocupação girava em torno da
entonação da voz e do respeito à pontuação. Em seguida, o aluno tinha que
responder às questões propostas que consistiam em vocabulário, levantamento de
informações básicas do texto e, posteriormente, exercícios de gramática.
Nesse sentido, a leitura proposta na/pela escola, estava centrada
meramente na decodificação das palavras ou na identificação básica de informações
pontuais do texto. Segundo afirma KLEIMAN (1995, p.37), “a decodificação se
constitui num processo muito diferente da leitura. É certo, ainda, considerar que o
conhecimento sobre a correspondência entre som e letra é necessário para a leitura.
O leitor eficiente não decodifica, ele percebe as palavras globalmente e adivinha
muitas outras, guiado pelo seu conhecimento prévio e por suas hipóteses de leitura”.
Ainda assim, continuamos, por alguns anos, realizando a aula de leitura que
consistia na leitura de um livro literário, de acordo com a faixa etária da classe.
Esses livros faziam parte do acervo escolar.
No entanto, as inquietações que deram origem a esse trabalho dizem
respeito a uma reflexão sobre a própria prática pedagógica. Essa reflexão tornou-se
relevante, pois nesse período ingressamos no PDE, Programa de Desenvolvimento
Educacional, integrado às atividades da formação continuada em Educação do
Estado do Paraná, que é uma política pública que estabelece o diálogo entre os
professores da Educação Superior e os da Educação Básica, através de atividades
teórico-práticas orientadas, tendo como resultado a produção de conhecimento e
mudanças qualitativas na prática escolar da Escola Pública Paranaense.
Nesse momento, o foco da nossa pesquisa foi redimensionado para o
processo de mudança da prática com leitura, visto que no processo de leitura,
também é preciso considerar as linguagens não verbais. Esse enfoque vai ao
encontro da fala apresentada nas Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa da
Rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná (2009). Conforme este
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documento, ler é familiarizar-se com diferentes textos produzidos em diversas
esferas sociais - jornalística, artística, judiciária, científica, didático-pedagógica,
cotidiana, midiática, literária, publicitária, bem como, a leitura de imagens, fotos,
cartazes, propagandas, imagens digitais e virtuais, figuras que povoam com
intensidade crescente nosso universo cotidiano, propiciando o desenvolvimento de
uma atitude crítica que leva o aluno a perceber o sujeito presente nos textos e,
ainda, tomar uma atitude responsiva diante deles. Sob esse ponto de vista, o
professor precisa atuar como mediador, provocando os alunos a realizarem leituras
significativas. Assim, o professor oferece condições para que o aluno atribua
sentidos a sua leitura, visando a um sujeito crítico e atuante nas práticas de
letramento da sociedade. MARTINS (2007, p. 34) nos auxilia com suas
observações:
Criar condições de leitura não implica apenas alfabetizar ou propiciar acesso aos livros. Trata-se, antes, dialogar com o leitor sobre sua leitura, isto é sobre o sentido que ele dá, repito, a algo escrito, um quadro, uma paisagem, a sons, imagens, coisas, ideias, situações reais ou imaginárias. (MARTINS, 2007).
Com a crescente expansão dos meios de comunicação de massa e uma
indústria cultural cada vez mais forte, o processo de aprendizagem torna-se, a cada
dia, menos restrito à escola e passa a envolver uma variedade de circunstâncias e
contextos. É necessário que os professores lancem um olhar sobre suas práticas
escolares que vão se estabelecendo no dia-a-dia e descubram o que muitas vezes
está (in) visibilizado no cotidiano escolar, não sendo percebido por nós, docente, no
exercício de nossas ações.
Dessa forma, é fundamental que o professor - e não só o de Língua
Portuguesa – aproprie-se de seu papel na formação de leitores. Precisa também ter
na leitura fonte de aprimoramento e fruição, de forma que seu discurso não seja
vazio. Para isso, o docente deve ousar fazer diferente, mexer com a imaginação dos
alunos, criar estratégias de motivação, passando rapidamente pelas concepções
clássicas ou mais usuais, focando as possíveis mudanças trazidas pelas novas
tecnologias e inovando sua prática pedagógica.
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Dentro desse contexto, pensamos em contribuir com o aprofundamento da
questão, a partir de uma renovação das práticas pedagógicas dos professores Rede
Pública de Ensino do Estado do Paraná, trazendo orientações e sugestões de
propostas pedagógicas sobre a utilização do cinema em sala de aula.
Ao iniciarmos os nossos estudos, a primeira ação foi propor como
Implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica na Escola, momento em que
o professor PDE aplica na escola de origem o seu projeto de pesquisa, sempre
contando com o acompanhamento dos professores orientadores da Instituição de
Ensino Superior, no nosso caso a UEM, um Curso de Extensão intitulado
“Linguagem, Discurso e Sentido: o cinema na Formação do Leitor”, do qual
participaram professores da Rede Estadual de Ensino de todas as áreas do
conhecimento, pois na linha discursiva, leitura é produção de sentidos. A linguagem
é considerada trabalho e o seu uso é um ato social que envolve leitor e autor a partir
de contextos históricos sociais determinados. Como o cinema constitui uma das
linguagens mais importantes do mundo moderno, é relevante considerá-lo no
ambiente escolar, envolvendo todas as disciplinas.
Antes do início do curso de Implementação Pedagógica, tivemos que montar
o material didático, a segunda produção escrita do professor PDE. Optamos por
fazer um OAC (Objeto de Aprendizagem Colaborativa) direcionado a professores,
portanto levado a conhecimento dos cursistas do nosso grupo de estudos. Cabe
destacar que não desejamos, com esse Curso de Extensão, dar receitas prontas
sobre o uso do cinema em sala de aula, mas apenas levantar algumas reflexões,
que nos foram adquiridas através de leituras e pesquisas sobre esse importante
recurso midiático.
Quando o efetivamos, o curso foi planejado da seguinte maneira: 20 horas
de forma presencial, ou seja, quatro sábados das 8 às 12 horas, e 12 horas de forma
não presencial, totalizando 32 horas/aulas de curso. Esclarecemos que o momento
não presencial do curso foi utilizado para leituras e uma pesquisa de campo que os
cursistas realizaram a qual será revelada ao longo desse artigo.
Durante o curso, exibimos o filme que seria o nosso objeto de pesquisa3 – O
contador de histórias - do diretor Luiz Villaça, Warner Bross, Brasil, 2009. O filme foi
analisado dentro dos domínios histórico-discursivos em que nos situamos,
3 A definição do objeto de estudo se deu conjuntamente com a professora orientadora da pesquisa.
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destacando o sujeito marginalizado, representado por Roberto Carlos Ramos,
menino de rua, que é internado por sua mãe em uma instituição para menores
carentes em Belo Horizonte, analisando – o através da identidade e da memória
discursiva. Falamos sobre “O Cinema no século” e “Como usar o cinema na sala de
aula”, bem como a exibição de outros filmes.
Dentro desse contexto, consideramos que a produção fílmica pode abarcar
todas as disciplinas, desde os aspectos composicionais – dos linguísticos aos
estéticos – aos das funções que exerce no campo educacional, social, cultural e
político. A sociedade demanda desenvolver a habilidade dessa modalidade de
leitura, por isso, a escola tem, em função dessa emergência, um papel fundamental
na constituição de sujeitos leitores proficientes. O cinema, seja como recurso
didático-pedagógico, seja como um meio de comunicação, objetiva e subjetiva os
sujeitos; constrói identidades e representações e, sobretudo, propicia a socialização
dos indivíduos.
2 Sobre as Teorias
2.1 Análise do Discurso
Na teoria da Análise do Discurso, doravante AD, o discurso não pertence ao
indivíduo, pois é uma prática social e deve ser analisado no contexto histórico –
social correspondente a sua produção. Com relação ao texto, a AD, entende-o como
uma materialidade simbólica, própria e significativa, não levando em consideração
somente o texto analisado para compreender e identificar os significados presentes
nele. Em outras palavras, não trata da língua e muito menos da gramática, embora
tenha interesse por ambas. Michel Foucault definiu discurso como um conjunto de
enunciados que podem pertencer a campos diferentes, mas que obedecem, apesar
de tudo, a regras de funcionamentos comuns (REVEL, 2002, p. 37). Ele acrescenta,
ainda, que o discurso pode ser elemento de manutenção como de exclusão do
indivíduo, pois são poucos os privilegiados com acesso ao entendimento dos
variados discursos. Portanto todo discurso, pensamento, fala, todo conhecimento de
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uma época é organizado por um grupo pequeno de ideias fundamentais, o
enunciado.
O enunciado é uma espécie de síntese do pensamento intelectual e como o
discurso, muda com o tempo. O exemplo abaixo é bem ilustrativo de como
funcionam o discurso e seus enunciados – o trecho é parte de uma entrevista da
autora do livro Televisão e Educação: Fruir e Pensar a TV (2001), de FISHER:
Talvez fosse melhor dizer: na mídia circulam diferentes discursos que, de alguma forma, subjetivam as pessoas, os indivíduos, os grupos sociais. E subjetivar quer dizer: produzir um tipo de sujeito, um ou vários tipos de relação dos sujeitos consigo mesmos. Meu fundamento teórico aqui está fortemente baseado em Michel Foucault e seus conceitos de poder, saber e sujeito. Tudo isso tem a ver com relações de poder e com estratégias de resistência. Por exemplo: a mídia tem insistido em “educar” os adolescentes, em dizer a eles o que fazer com seus corpos, com sua sexualidade, com sua vida política, e assim por diante. Há um imperativo, para as meninas, de que seus corpos sejam belos, sarados, de que seus cabelos sejam lisos, de que elas sempre estejam prontas a satisfazer o desejo do homem. [...] Portanto, não é só a mídia que produz esses discursos; eles circulam por diferentes lugares, e os meios de comunicação os transformam a seu jeito, produzindo outras enunciações, nas novelas, nos reality shows, etc. Um programa como Big Brother, por exemplo, tem forte apelo entre os mais jovens, e sua palavra de ordem, em termos de vida pública e de convivência, é: “vamos detonar o outro”!
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Assim, cabe ressaltar que certos enunciados nos remetem, imediatamente, a
certas formações discursivas as quais correspondem ao momento em que
relacionamos os diferentes sentidos que se pode ter de uma determinada palavra
com o sujeito que a usa em seu dizer. A definição de formação discursiva foi
concebida por FOUCAULT (1969) e depois utilizada por PECHÊUX (1975), para
determinar o posicionamento ideológico de um discurso, ou seja, quando falamos
em discurso publicitário, econômico, político, feminista, psiquiátrico, médico,
pedagógico e outros, é porque aprendemos a reconhecer em cada um deles o
conjunto de enunciados que são próprios da formação discursiva de cada uma
4 (disponível em http://www.consciencia.net/2004/mes/05/rosafisher.html – último acesso em 04/02/2011).
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destas áreas. Os falantes destas áreas se reconhecem dentro de seus discursos. No
entanto, embora sendo sujeitos de uma mesma formação discursiva, os agentes do
discurso podem não conceber os mesmos conhecimentos, isto porque, é a partir da
posição que se ocupa que se determina a forma do dizer. (BRANDÃO, 2002, p.90) é
mais específica, ainda, ao afirmar que:
Formação ideológica é a constituída por um conjunto complexo de atitudes e representações que não são nem individuais, nem universais, mas dizem respeito mais ou menos diretamente, às posições de classe em conflito umas com as outras. Cada formação ideológica pode compreende várias formações discursivas interligadas. Que é objeto de descaso social e político. (BRANDÃO, 2002, p. 90)
Em síntese, os discursos são interpelados por formações ideológicas como
elemento capaz de intervir como uma força em confronto com outras forças na
conjuntura ideológica de uma formação social em determinado momento.
2.2 Cinema: uma ferramenta educativa
A palavra cinema é a forma reduzida de cinematógrafo, que é composta de
duas palavras de origem grega: cinemato (movimento) e grafo (escrever, registrar).
O cinema foi criado pelos irmãos Lumière, na França, em 1895, para
designar o aparelho que eles tinham inventado. Esse aparelho era capaz de
reproduzir o movimento por meio de uma sequência de fotografias, projetando as
cenas numa tela. Mais tarde, essa palavra passou a ser usada também para
designar o local onde eram feitas as projeções. De 1895 até hoje, o cinema evoluiu
bastante. Atualmente, os cineastas têm à sua disposição uma incrível variedade de
recursos técnicos que lhes permitem gravar filmes de grande impacto visual.
É importante destacar que, embora essa mídia tenha se desenvolvido e
aprimorado e possibilite a exibição em outros ambientes além da sala própria para
esse fim, o cinema não foi projetado como uma ferramenta pedagógica, por isso, a
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utilização dessa modalidade midiática requer adequações de acordo com os fins aos
quais se destina, dentre eles o educacional. Nem tampouco deve servir apenas ao
entretenimento, para controle da indisciplina, para mera ilustração de um conteúdo,
sem contribuições para o conteúdo programático e matéria de conhecimento.
NAPOLITANO (2009, p.11) alerta para o fato de que o trabalho com cinema
na sala de aula é uma maneira de ajudar a escola a reencontrar a cultura ao mesmo
tempo cotidiana e elevada, pois o cinema é o campo, no qual a estética, o lazer, a
ideologia e os valores sociais mais amplos são sintetizados numa mesma obra de
arte. Sendo assim, observamos que escola necessita trilhar diversos caminhos e
linguagens para investir na formação de leitores, um deles, é a incorporação do
cinema na sala de aula, destacando-o como expressão artística, cultural, e política.
Assim, como forma de lazer, de comunicação, de informação, mas, sobretudo, como
uma maneira de aprender e de apreender o saber-poder circunscrito à instância
discursiva.
2.3 A Contribuição da Semiótica
Segundo JOLY (2001, p. 29) a semiótica, uma disciplina recente nas
ciências humana, é a área que busca relação entre o código e a mensagem e entre
signo e discurso. O signo só será considerado signo se o mesmo expressar uma
ideia e se provocar na mente daquele que o perceber uma atitude interpretativa.
Charles Sanders Peirce (1839 – 1914), um dos grandes precursores do estudo dos
signos, divide o signo em objeto, representamen e interpretante. O primeiro termo é
aquilo que é referido pelo signo, já o representamen é aquilo que funciona como
signo e o último termo é o efeito do signo. De acordo com Santaella (1990, p. 13):
O signo é uma coisa que representa uma outra coisa: seu objeto. Ele só pode funcionar como signo se carregar esse poder de representar, substituir uma outra coisa diferente dele. Ora, o signo não é o objeto. Ele apenas está no lugar do objeto. Portanto, ele só pode representar esse objeto de um certo modo e numa certa capacidade. Por exemplo: a palavra casa, a pintura de uma casa, o desenho de uma casa, a fotografia de uma casa, o
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esboço de uma casa, um filme de uma casa, a planta baixa de uma casa, a maquete de uma casa, ou mesmo o seu olhar para uma casa, são todos signos do objeto casa. Não são a própria casa, nem a ideia geral que temos de casa. Substituem-na, apenas, cada um deles de um certo modo que depende da natureza do próprio signo. A natureza de uma fotografia não é a mesma de uma planta baixa. (SANTAELLA, 1990, p.13).
Como podemos notar, a semiótica se preocupa com a construção de
sentidos dos textos verbais e não verbais. A partir deste fato, uma série de
discussões pode ser realizada quanto aos mecanismos presentes no funcionamento
da imagem cinematográfica como signo. A preocupação deste trabalho é, além de
elucidar a questão anterior, aprimorar cultural e intelectualmente a comunidade
escolar, voltando o nosso olhar sobre a educação e a formação do leitor através do
discurso cinematográfico.
3 Desenvolvimento
Ao definirmos o nosso objeto de pesquisa demos início à elaboração do
projeto. No primeiro momento, tivemos que realizar diversas leituras sobre o
referencial teórico para que pudéssemos dirigir para a escrita, propriamente dita, do
projeto. É necessário acrescentarmos que nesse período o professor PDE se
encontra com o afastamento de 100% das suas atividades de sala de aula, mas
possui um calendário extenso com aulas teóricas presenciais, cursos, palestras e
treinamento para o desenvolvimento do GTR (Grupo de Trabalho em Rede), em que
o professor PDE é tutor e deverá estar preparado para desenvolver junto com os
cursistas a temática do seu objeto de estudo.
Foram realizados oito encontros com a professora orientadora na UEM para
a construção do projeto, encontros mensais com o GEDUEM – Grupo de Estudos
em Análise do Discurso da UEM –, além da participação no Colóquio Internacional
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de Análise do Discurso, realizado na Universidade Federal de São Carlos – SP, a
convite da orientadora.
Após várias discussões, optou-se aplicar como Implementação do Projeto
um curso de extensão para os professores da Rede Estadual de Ensino, aos
sábados, intitulado “Linguagem, Discurso e Sentido: o cinema na formação do leitor”.
O primeiro passo para a organização desse grupo foi uma ampla divulgação, pois
pretendíamos atingir o máximo de professores que um curso de extensão comporta,
máximo 15 cursistas. Para nossa surpresa, conseguimos catorze.
Para o primeiro encontro, preparamos um questionário (apêndice A) sobre o
uso do cinema na sala de aula, com oito questões abertas e fechadas. Foram
distribuídas trinta e duas cópias aos cursistas e aplicado aos professores das
diversas áreas do conhecimento da Rede Pública de Ensino.
Nos encontros tivemos o retorno de apenas vinte e três questionários
respondidos, pois alguns cursistas alegaram que não tiveram tempo para realizá-los.
As questões respondidas pelos vinte e três professores e que nortearam o nosso
estudo foram: Há quanto tempo exerce o magistério? Já utilizou filmes em sala de
aula? Qual a metodologia utilizada? Você opta por filmes nacionais ou estrangeiros?
Você trabalha com curtas-metragens na sala de aula? Para se trabalhar com filmes
em sala de aula, o professor precisa... Quais são as suas dificuldades para trabalhar
com filmes? Qual o procedimento que você adota para trabalhar com filmes?
Do total dos questionários respondidos, obtivemos os seguintes resultados:
08 professores exercem a profissão há mais de 20 anos, 05 profissionais estão no
magistério há 15 anos, 05 professores há 10 anos e 5 lecionam há menos de 07
anos.
Em relação à segunda questão, 20 professores responderam que já
utilizaram filmes em sala de aula, 02 responderam que não utilizaram, mas pretende
um dia e apenas 01 respondeu não ter utilizado.
Na terceira questão quanto à metodologia utilizada pelos entrevistados, a
maioria respondeu que relaciona o filme ao conteúdo abordado pela disciplina e
outros acrescentaram, ainda que a linguagem audiovisual é um recurso que
possibilita à análise, o debate e a reflexão sobre diversos olhares como o social, o
histórico, político, ambiental, científico, etc.
Quanto à opção entre filmes nacionais ou estrangeiros, a maioria dos
entrevistados responderam que utilizam tantos filmes nacionais quanto filmes
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estrangeiros, apenas 04 educadores deixaram visível a opção por filmes nacionais.
Com relação à utilização de curtas-metragens na sala de aula, os professores foram
unânimes ao responderem que trabalham muito com esse gênero, pois um longa-
metragem chega a durar aproximadamente 115 min, ultrapassando a hora/aula,
deixando o filme fragmentado ou causando sérios transtornos nas escolas com
mudanças de horário ou atrapalhando a aula de um colega.
Com relação às últimas questões, observamos certa apreensão, porque
alguns alegam que não tem certeza de que utilizam a metodologia adequada, pois
não foram capacitados para o uso do cinema na sala de aula, e, além disso, essa
prática exige um planejamento do professor e esse, às vezes, não tem tempo para
prepará-lo.
Apesar de termos um número pequeno de entrevistados, o retorno desse
questionário, direcionou todo o nosso trabalho, pois a partir daí, tivemos o
conhecimento de todas as angústias quanto ao uso do cinema em sala de aula e
tentamos nos próximos encontros, oferecer a nossa parcela de contribuição e ou
alternativas aos professores da Rede Pública Estadual, sobre a utilização dessa
prática pedagógica inovadora.
Os próximos encontros, por sua vez, foram pensados e organizados com
várias possibilidades metodológicas para trabalhar o filme, pois apesar de
valorizado, o cinema não é visto ainda como um material didático pedagógico.
Alguns alunos o veem apenas como diversão e entretenimento e na sala de aula,
como “enrolação” para “matar aula”, também alguns professores fazem mau uso do
filme tratando-o como recurso de segunda ordem, ou seja, apenas como ilustração,
não valorizando-o como fonte de pesquisa na ação pedagógica.
Assim, exibimos aos cursistas, o filme “O contador de histórias”, como
dissemos anteriormente, o nosso objeto de pesquisa, a fim de esclarecermos que o
filme em sala de aula é muito mais do que uma ilustração de conteúdo ou para
destacar questões éticas e valores humanistas. O filme não pode assumir um papel
secundário. Pretendemos discutir aqui que a película pode ser muito produtiva em
sala de aula e que depende, exclusivamente, da abordagem e do direcionamento do
professor.
Considerando que o discurso de um texto cinematográfico produz efeitos de
sentidos diversos e exerce a função de linguagem ativa, é importante que o sujeito
leitor desenvolva possibilidades de entendimento dos elementos visuais como
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operadores do discurso. Destacamos, ainda, que não trataremos, nesse momento,
sobre a linguagem cinematográfica como, os tipos de plano, as tomadas, os
movimentos da câmera, ângulos de filmagens e outros elementos do texto que
chamamos de linguagem cinematográfica, pois nos prenderemos à análise das
imagens que não estão visíveis, mas apenas sugeridas, observando as diferentes
interpretações do texto cinematográfico em estudo. A partir da exibição do filme,
mapeamos as possibilidades educativas presentes na obra.
Ampliando as possibilidades do uso da Análise do Discurso, podemos
começar a refletir, a forma de construir uma relação teórico-metodológica de uma
obra cinematográfica. Conforme afirma ORLANDI (1999, p. 15) Análise do Discurso
não trata especificamente da língua nem da gramática, mas do discurso, que pode
ser entendido como um movimento, uma “prática de linguagem: com o estudo do
discurso observa-se o homem falando”, as diferentes maneiras de significar,
aparatos ideológicos, intencionalidades.
O filme “O contador de histórias” é baseado na vida do mineiro Roberto
Carlos Ramos. Conta a história de como o afeto pode transformar a realidade.
Caçula entre dez irmãos, Roberto desde cedo demonstra um talento especial para
contar histórias, transformando, com a narrativa, suas próprias experiências de
frustração em fábulas cativantes. Aos seis anos, o menino cheio de imaginação é
deixado pela mãe em uma entidade assistencial recém-criada pelo governo – a
FEBEM (Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor) – A mãe acredita estar, assim,
garantindo um futuro melhor para seu filho. Aos treze anos, após mais de cem fugas,
ele é classificado como “irrecuperável”, nas palavras da diretora da entidade.
Contudo, para a pedagoga francesa Margherit Duvas, que veio ao Brasil para o
desenvolvimento de uma pesquisa, cujo objetivo era conhecer a FEBEM e levar
ideias da instituição para o seu país, Roberto representa um desafio. Determinada a
fazer do menino o objeto de seu estudo, tenta aproximar-se dele. O garoto em
princípio reluta, mas, depois de uma experiência traumática, procura abrigo na casa
de Margherit. O que surge entre os dois é uma relação de amizade e ternura, que
porá em xeque a descrença de Roberto em seu futuro e desafiará Margherit a
manter suas convicções. Apesar dos problemas que enfrentaram, Roberto vai para
França com Margherit, estuda até o Ensino Médio, retorna a Belo Horizonte, procura
sua mãe, faz o curso de Pedagogia. Hoje é conhecido como um dos dez melhores
contadores de histórias do mundo e ministra palestras para professores. É
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importante ressaltar que toda a narração do filme é realizada pelo próprio Roberto
Carlos.
A realidade da instituição retratada no filme é baseada em táticas e
dispositivos punitivos, medidas socioeducativas, que apenas insere o menor em um
local fechado, com horários rígidos e normas que ele deve seguir desde o momento
da sua chegada. A FEBEM servia de instrumento político e de propaganda da
ditadura militar. Desde sua criação em 1970, a instituição apresenta muitas falhas.
As professoras, psicólogas, assistentes sociais eram aquelas que já estavam
cansadas ou com algum problema de saúde e que não davam conta de trabalharem
nas escolas, os bedéis eram policiais que também não tinham uma boa atuação nas
ruas, ou por serem muitos rígidos ou muitos permissivos, já que o período, como
mencionamos, era o da Ditadura Militar. O objetivo da instituição era “acolher” um
filho de cada família, que na época passava por grandes necessidades
socioeconômicas, e dar educação. Nessas condições, o seu papel, até então, não
era o de “recolher” o jovem infrator como atualmente acontece. Para isso,
ironicamente, um comercial de TV apregoava que os jovens internos poderiam sair
dali doutores: (cap. I X - 38:46 min.):
“Para que as crianças tenham futuro, elas precisam de cinco coisas: o F da fé, o E da educação, o B dos bons modos, o E de esperança, e o M da moral”. A mãe de Roberto Carlos Ramos, uma lavadeira com dez filhos para criar, acreditou na propaganda da ditadura e resolveu levar o garoto, o mais novo dentre os irmãos, para uma unidade da FEBEM, em Belo Horizonte. Portanto muito diferente do que se promovia pela propaganda na TV. Roberto, aos poucos, perde a esperança de um futuro digno.
A noção de sujeito em Análise do Discurso é concebida desde suas
primeiras formulações por uma distinção essencial entre indivíduo e sujeito. Para
entendermos essa definição, devemos considerar que sujeito do discurso não se
refere à de indivíduos compreendidos como seres que tem uma existência particular
no mundo, afirmamos que o sujeito discursivo deve ser considerado como um ser
social, apreendido em um espaço coletivo, inserido em uma conjuntura sócio
histórico, cuja voz é constituída por um conjunto de vozes sociais por isso, uma
posição ocupada no discurso. Segundo ( FOUCAULT, 2004, p.107):“ O sujeito não
se reduz a uma entidade empírica, nem a uma entidade psicológica. É, antes de
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tudo, caracterizado como uma posição. O sujeito de um enunciado é uma função
vazia podendo ser exercida por indivíduos, até certo ponto, indiferentes.”
Nesse momento, conduzimos a discussão para a análise das condições de
vida, dentro dos domínios histórico-discursivos, da identidade do sujeito menino de
rua, representado, aqui, por Roberto Carlos Ramos.
Em um país que se furta a priorização de implementação de políticas sociais
dirigidas aos setores mais desfavorecidos, a questão dos meninos de rua é
transformada em um problema social em que esses sujeitos, vivendo à margem da
sociedade, são identificados como objeto de descaso social e político. Há que se
destacarem alguns critérios em relação à identidade do menino de rua, tais como: a
aparência – na maioria das vezes, é pobre, suas vestimentas são precárias e não
possui o mínimo hábito de higiene. Assim
A exclusão consolida-se a partir de condições nas quais um sujeito, que se encontra fora dos parâmetros e das normas que regem as relações socioculturais, políticas e econômicas, busca um espaço, um reconhecimento social, uma identidade, entre outras formas de relações existentes entre sujeitos e instituições. Além desses vínculos, o processo de exclusão pode ser estabelecido pela ordem simbólica, configurada por rupturas no imaginário, do valor imaginário do trabalho, da ascensão social, do vestuário, da alimentação etc. (TASSO, 2006, p.140).
A narrativa do adolescente Roberto evidencia como sua identidade está
sendo construída. Observar seus discursos sobre sua própria vida permite-nos tecer
considerações a respeito do que está incluído ou excluído no conceito por ele
formado, bem como, de sua identidade. Para isso, destacamos a cena do filme
exibida aos 50h55min, que mostra a diretora da FEBEM dizendo para Roberto que
ele mudaria de turma:
Diretora: “Bom, Roberto, você já fez sete anos, então vai ter que mudar pra outra turma, é a turma dos meninos maiores, quem tem de sete a catorze anos tem que ficar lá. À tarde o bedel vai passar e levar você e os outros meninos para lá”. Roberto: “Eu queria ficar aqui”. Diretora: “É, mas não dá mais, Roberto. Mas vai ser bom, lá tem muitas coisas pra fazer, tem outros meninos, tá bom”?
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Ao chegar à instituição, Roberto percebeu que teria que se comportar como
os “maiores” para não se sentir excluído. De acordo com SILVA (2000, p. 82), “a
afirmação da identidade e da diferença implicam, sempre, as operações de incluir e
excluir”. Significa dizer segundo o autor, “o que somos” e o “que não somos”.
Na medida em que, no grupo, ele se socializa e reafirma sua identidade e
onde ela é reconhecida e aceita, é no grupo, também, que se individualiza,
identificando - se com uns e diferenciando-se dos outros, a partir de critérios
bastante contraditórios que vão desde a coragem e o sentido de afetividade até atos
de maior violência. WOODWARD (2000, p. 14-15) afirma que as identidades são
fabricadas por meio da marcação da diferença. Essa marcação da diferença ocorre
tanto por meio de sistemas simbólicos de representação quanto por meio de formas
de exclusão social. A identidade, pois, não é o oposto da diferença: a identidade
depende da diferença. Isso fica claro na cena
em que Roberto, após uma das fugas da FEBEM, é encontrado por Margherit, no
centro da cidade, na praça, tomando banho no chafariz, com seus amigos, isso nos
revela que a identidade do menino de rua se constitui no conflito.
A linguagem humana tem se propagado sob várias formas e várias
estruturas e novos meios de multiplicação desta linguagem têm sido criado. Para
Pierce, “a semiótica tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis,
ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer
fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido” (apud
SANTAELLA, 1990, p.13). O discurso cinematográfico caracteriza-se como um texto
constituído de diferentes linguagens: o som, a imagem e as mensagens.
Seguindo neste entendimento, achamos interessante fazer análise semiótica
da cena descrita anteriormente, a qual se refere à propaganda da TV sobre a
FEBEM. Para isso, usaremos as três modalidades possíveis de apreensão de todo e
qualquer fenômeno de produção e significação de sentido apontadas por Pierce,
(apud JOLY, 2008), apresentadas a seguir:
Primeiridade – É a primeira apreensão das coisas, incerta, indeterminada.
Na cena, ao ouvir a propaganda da FEBEM, a mãe de Roberto, como não conhecia
a instituição, deduziu que era o melhor, foi a primeira apreensão que teve da
entidade.
16
Secundidade – É a constatação do primeiro fato, o confronto com a
realidade. Na verdade, no filme, quem pode experimentar esse conflito foi o
personagem Roberto, que descobriu a verdadeira realidade da instituição. Isso
também é mostrado através de uma cena em que Roberto relata a Margherit como
era a FEBEM e diz: “Não sei por que fugíamos de lá, se tínhamos comida de
primeira” - no filme mostra uma péssima refeição – “medidas socioeducativas” –
cena em que o bedel bate no seu rosto –” aula de natação” – o bedel “enfia” a sua
cabeça em um tanque de água –” e quarto privativo” - momento em que o menor é
levado para a solitária.
Terceiridade - É quando o primeiro momento se relaciona com o segundo,
ou seja, é a reflexão. A partir da imaginação, do conhecimento representamos e
interpretamos o mundo. No filme, podemos destacar o personagem Roberto, que
após inúmeras fugas, encontra a pedagoga francesa e a partir desse momento,
reconstrói a sua vida, deixando de ser um menino tido como “irrecuperável” para se
tornar um cidadão, destacando-se como um exemplo de superação de vida.
Segundo Pierce, um signo é “algo que está no lugar de uma coisa para
alguém, em alguma relação ou alguma qualidade” (apud JOLY, 2008, p.33)
Consideramos a imagem cinematográfica como um signo, portanto demonstraremos
a interpretação semiótica de quatro cenas do filme, segundo a triangulação proposta
pelo semioticista Pierce, conforme quadro a seguir:
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Objeto
- Referente –
Cenas do filme
Representamento
- Significante -
Significado
- Interpretante -
Roberto e Margherit vão
ao estádio de futebol e o
menor tem medo de ser
revistado pelos policiais
porque é negro, menor de
rua, sente-se, portanto
excluído.
Policiais
Expressão facial
Atitude de Margherit
Memória – FEBEM
Pavor, medo,
sentimento de exclusão.
Elevação da autoestima
de Roberto.
Roberto fica furioso, e
inunda toda a casa de
Margherit. Ele fez isso
porque pensou que
Margherit fosse voltar
para a França e não fosse
levá-lo.
Ódio
Castigo
Representado pela
mistura de sentimento,
rancor, tristeza profunda.
Neste caso, o castigo
está relacionado com as
punições da FEBEM,
mas foi representado
através de um abraço
forte.
Camelô, contador de
histórias na praça,
vendedor de canetas.
Esperteza
Solidariedade
Representada pela
imagem de um homem
lutando pela sua
sobrevivência.
Sentimento concreto
explícito na figura de
Margherit.
Roberto e sua mãe em
uma das poucas vezes
que ela foi a FEBEM.
Rejeição
Frieza de sentimento
Autoafirmação
Demonstrando carência
afetiva.
Representado pela
figura da mãe e seu
discurso.
Asseveração,
reconhecimento perante
o seu grupo.
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É importante destacar que analisamos, no Curso de Extensão, o artigo
intitulado “Igualdade, Solidariedade e Cidadania na Prática discursiva da Mídia
Televisiva” produzido por Tasso (2006), o qual faz a análise do vídeo de uma
campanha publicitária “Sou Brasileiro e não desisto nunca”, veiculada a partir do
final do primeiro semestre de 2004, que tem como protagonista Roberto Carlos
Ramos, o personagem real do filme objeto de estudo desse artigo. A autora optou
por analisar todas as cenas dessa produção videográfica, “demonstrando como os
elementos verbos-visuais se articulam com os sonoros, produzindo efeitos de
sentidos singulares para cada uma das partes que compõem a propaganda” e “de
como a mídia se apropria de discursos já cristalizados relativos a políticas públicas e
que fazem parte do imaginário coletivo” (TASSO, 2006, p.149).
Reconhecemos que a discussão acerca do artigo mencionado acima
esclareceu-nos muitas indagações sobre análise da linguagem não verbal, e sobre o
filme, pontuando, claramente, que hoje Roberto Carlos Ramos, formado em
Pedagogia, é considerado um dos melhores contadores de histórias do mundo.
Depois de formado, voltou à FEBEM, mas como professor. E já adotou mais de vinte
meninos de rua, muitos de início “irrecuperáveis” como ele, foi.
Passamos, então, juntamente com o grupo de professores, a uma reflexão
de SILVA (2007, p.52) “cinema é arte, é diversão, é indústria e, desde o final do
século passado, vem encantando pessoas de todas as idades. Se mergulhar no
universo do cinema é poder viver uma grande emoção, por que não aprender
também? Será que o cinema é apenas diversão sem nenhum valor educativo?” Se a
nossa proposta era a de inovar a prática pedagógica, inserindo a linguagem
cinematográfica no meio educacional como um material didático-pedagógico
contemporâneo, nos encontros seguintes discutimos sobre como usar o cinema na
sala de aula, afirmamos que o uso de filmes como fonte de pesquisa é a capacidade
real de impulsionar os estudantes, tornando-os críticos para interpretar, analisar e
compreender os argumentos e as histórias contadas.
Dessa forma, entendemos que o cinema é uma ferramenta de apoio que tem
a capacidade de envolver várias disciplinas e conteúdos num mesmo momento.
Recorremos a NAPOLITANO (2006, p.12) “a utilização do cinema na escola pode
ser inserida, em linhas gerais, num grande campo de atuação pedagógica”.
Ao abrir espaços para questões relativas à pesquisa a partir do discurso
cinematográfico, ou seja, o cinema não visto apenas como um instrumento ligado à
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ética e aos valores humanísticos, mas também um instrumento fundamental para a
formação do aluno leitor, vale destacar que, em sua maioria, os professores
consideram os textos verbais “para ler”, enquanto, os visuais e audiovisuais como,
por exemplo, o cinema, a fotografia e a pintura “para ver”. E, como pouco se
questiona isso na escola, pouco se discute ou aprimora na sua prática pedagógica,
favorecendo a não exploração das possibilidades (também restritas) oferecidas em
livros didáticos, tampouco, com relação à formação de professores, como também
para professores em formação continuada. Razão de a escola explorar
minimamente a legibilidade dessa imagem, reservando-se à disciplina de História a
utilização dessa modalidade, confirmada pela reflexão de um professor dessa
disciplina: “O chamado filme histórico é um desses recursos, por compor um dos
gêneros mais consagrados na história do cinema mundial”. Para DUARTE (2002,
p.75), “tanto a leitura de obras literárias, filosóficas e de outras, quanto a de filmes é
uma prática social importante no contexto da formação cultural e educacional”.
Diante disso, o presente artigo alerta que o cinema constitui uma prática
social importante, atua na formação geral das pessoas, além de possuir um valor
imprescindível como ferramenta de apoio fundamental na sala de aula.
4 Conclusão
Neste artigo, defendemos o uso do cinema em sala de aula, pois a imagem
em movimento surge como uma das tecnologias que mais influenciam o
pensamento e a formação do indivíduo, permitindo ao espectador vivenciar a
trajetória do outro, além de desenvolver um saber crítico e consciente, tornando-os
sujeitos analíticos e construtores do conhecimento.
Para contribuir com a Formação Continuada dos professores da Rede
Estadual de Ensino, oferecemos como Proposta de Intervenção Pedagógica, um
curso de extensão: “Linguagem, Discurso e Sentido: o cinema na Formação do
Leitor”, o qual teve como finalidade mostrar aos professores que o cinema tem uma
linguagem própria e que pode ser objeto de estudo, de forma a contribuir no/sobre o
processo escolar, enriquecendo a nossa prática pedagógica através do olhar
cinematográfico.
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Fomentar o interesse nos professores a usar a sétima arte em sala de aula
foi o nosso principal objetivo e para isso fez-se necessário a seleção criteriosa do
filme e de todo o material escolhido que foi trabalhado aos sábados ao longo de
quatro meses como recurso pedagógico, enriquecendo também a nossa prática
pedagógica com a utilização de filmes para uma aprendizagem significativa.
É imprescindível mencionar também, que a escolha do filme “O contador de
histórias”, foi de extrema relevância, pois sua projeção fez com que o grupo de
professores se emocionasse, identificando-se com os personagens ou mesmo com
a própria realidade dos problemas sociais presentes na obra, como, menor de rua,
violência, desigualdade social, enfim, a película é um momento mágico, lúdico e ao
mesmo tempo de reflexão e construção do conhecimento.
Enfim, se queremos formar um leitor que conheça a diversidade de textos
que circulam no mundo, que construa novos significados a partir do contexto, a
experiência com cinema na sala de aula pode ser válida, porque possibilita a análise
e a reflexão, propicia elementos para pensar, amplia o olhar sobre si, sobre o outro e
sobre o mundo. Afinal, como diz Arnaldo Antunes: “O seu olhar, o seu olhar,
melhora, melhora o meu”.
5 Referências
DUARTE, Rosália. (2002) Cinema & educação. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2002.
FISCHER, R.M.B. Televisão e Educação: Fruir e pensar a TV. Autêntica, 2001. In http://www.consciencia.net/2004/mes/05/rosafisher. - (último acesso em 04/02/2011)
JOLY, Martine. Introdução à análise da imagem. Trad. Mariana Appenzeller. 4ª ed. Campinas: Parirus, 2001.
KLEIMAN, Ângela Texto e leitor. 4ª ed. Campinas: Pontes, 1995.
MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. 19 ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.
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NAPOLITANO, Marcos. Como usar o cinema na sala de aula. 2º ed.. São Paulo: Contexto, 2005.
ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos/ Campinas, SP: Pontes, 1999.
PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da Rede Pública de Educação Básica do Estado do Paraná. Curitiba: SEED, 2009.
REVEL, Judith. Michel Foucault: Conceitos Essenciais; tradução Maria do Rosário Gregolin, Nilton Milanez, Carlos Piovesani. São Carlos, Clara luz, 2005.
SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. São Paulo: Brasiliense, 9ª edição, 1990.
SILVA, Roseli P. Cinema e Educação. São Paulo: Cortez, 2007.
SILVA, Tomaz Tadeu da (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2000.
TASSO, Ismara Eliane Vidal de Souza. Linguagem não verbal e produção de sentidos no cotidiano escolar in Concepções de linguagem e o ensino de língua portuguesa. Maringá, 2005.
___________________. Mídia televisiva e políticas públicas de inclusão na Pós-Modernidade: Igualdade, Solidariedade e Cidadania in Estudos do texto e do discurso: mapeando conceitos e métodos. Maringá, 2006.
WOODWARD, Kathryn. 2000. “Identidade e diferença: uma introdução teórica e conceitual”. In: Identidade e diferença: A perspectiva dos Estudos Culturais. Org. Tomaz Tadeu da Silva. Petrópolis: Vozes.
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APÊNDICE A
1- Nome____________________________________________________________
a - Sexo: ( )M ( )F b - Tempo que leciona: _________________________________________________ c - Disciplinas:________________________________________________________ d - Nome da escola onde você trabalha:____________________________________ e - Nível: ( ) Fundamental ( ) Médio 2 - Já utilizou filmes em sala de aulas? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não, mas pretende um dia ( ) Não e nem pretende. 3 - Você trabalha com filmes hollywoodianos em sala de aula? ( ) Sim. Qual é a metodologia adequada? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ ( ) Não. Por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 4- Você trabalha com filmes nacionais na sala de aula? ( ) Sim. Qual é a metodologia adequada? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ ( ) Não. Por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 5- Você trabalha com curta-metragem na sala de aula? ( ) Sim. Qual é a metodologia adequada? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ ( ) Não. Por quê? ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 6- Para se trabalhar com filmes em sala de aula, o professor precisa ______________________________________________________________________________________________________________________________________ 7 - Caso já tenha trabalhado com filmes em sua aula, encontrou alguma dificuldade? Quais?______________________________________________________________ ___________________________________________________________________ 8 - Qual o procedimento que você adota para trabalhar com filmes? Descrever. ______________________________________________________________________________________________________________________________________