UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO
LUIZ CARLOS FREDERICK
ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA
DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES
SÃO PAULO
2012
LUIZ CARLOS FREDERICK
ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA
DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES
Dissertação apresentada ao Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID) sob a orientação da Prof. Dra. Ângela Maria Martins, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Educação.
SÃO PAULO
2012
LUIZ CARLOS FREDERICK
ANÁLISE DO PROGRAMA DE FORMAÇÃO CONTINUADA
DO MOVA/AVIB: A VOZ DE EDUCADORES POPULARES
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em
Educação da Universidade Cidade de São Paulo, como
requisito exigido para a obtenção do título de Mestre.
Área de Concentração: Data da defesa: Resultado: _______________________ BANCA EXAMINADORA:
Profª Dra. Ângela Maria Martins ____________________________________ Universidade Cidade de São Paulo
Profª Dra. Margaréte M.B. Rosito ____________________________________ Universidade Cidade de São Paulo Profª. Dra. Maria Isabel de Almeida __________________________________ Universidade São Paulo
DEDICATÓRIA
Especialmente a minha esposa e companheira Marlene por todo o apoio, solidariedade, suporte, paciência e, principalmente por ter me ajudado tanto nesta construção, ela também foi educadora de jovens e adultos em Sumaré/SP e continua sendo educadora popular no seu verdadeiro significado. Dedico igualmente à preciosa Ana Dandara, “filhota” querida, que com carinho e muitas perguntas é parte deste trabalho; ela por tantas vezes me acompanhou nas idas e vindas à UNICID.
Ao meu querido e saudoso pai, Ludovico que partiu para a eternidade no dia 09 de dezembro de 2011, véspera da comemoração dos Direitos Humanos, ao longo de dois anos ele não deixou de bancar com quase um quarto do valor total da mensalidade, tirando da sua aposentadoria de trabalhador. Ele teve pouca escola, mas ensinou a ler o mundo. Dedico com o mesmo carinho a minha querida mãe, Ester por toda a sua amorosidade, ela segue a pedagogia de Paulo Freire no exercício do diálogo e de uma educação emancipadora, ela é uma artesã na confecção da boniteza de seus tapetes de suas artes e da ternura.
Com carinho dedico aos meus irmãos, cunhados e sobrinhos: a Luci por ensinar a valorizar o conhecimento que vem dos pequenos, a Malvina por mostrar os caminhos da garra, a Mary por quebrar tabus e ser uma “ensinante” dialógica, a Estela, professora Universitária e historiadora que tanto tem ensinado com sua meiguice e sabedoria, obrigado por ter me ajudado na revisão desta dissertação, foram horas e horas de dedicação. Ao Mano por ter imprimido centenas e centenas de materiais, documentos e bibliografias... Sem este mutirão de esforços, seria tudo muito mais difícil.
Na pessoa do Cloiff, representando os cunhados, agradeço a força e o apoio incentivador. E representando os sobrinhos, sou grato a Luciane pelo incentivo e por socializar a sua prática pedagógica com os jovens e adultos, seus educandos em Canta Galo/PR.
Dedico muito especialmente ao mestre e pedagogo da libertação Paulo Freire, sem ele a nossa educação não teria a boniteza, a exuberância que brota de quem acredita na força histórica dos pobres. Dedico com a mesma força aos coordenadores e educadores (as) do MOVA da AVIB que muito nos ensinam com seu testemunho, a eles (as) a minha reverência pelo trabalho cotidiano e pelo profetismo carregado de esperança; e aos educandos a certeza de que a “verdadeira sabedoria vem dos considerados últimos da história”.
AGRADECIMENTOS
À professora Doutora Ângela Maria Martins pela orientação,
compreensão, paciência, dedicação e por tudo o que me ensinou neste percurso, mostrou o caminho da liberdade e da autonomia. Ás professoras Maria Isabel e Margaréte que fizeram parte da banca de qualificação e muito contribuíram para consolidar a pesquisa.
A todos os professores e professoras do Programa de Mestrado da UNICID por tudo o que representam; agradecimento especial também ao Professor Luiz Silva, professor de Estatística que tanto contribuiu, à Sheila, Cláudia e a todos da Universidade que sempre nos cercaram de profissionalismo, carinho e solidariedade. Aos colegas e amigos de curso, como a Lígia, Marco Antonio, Wesley, Rosana, Aírton, Roberto, Valéria, Rodrigo, Simone e todos (as) que no caminho nos ensinaram que a formação deve ser permanente e contínua.
Devo muito aos coordenadores, educadores e educadoras da AVIB. Este grupo é a razão desta pesquisa... Obrigado de coração a Lili, Laurita, Rogério e a cada um dos educadores por me ajudarem tanto, as entrevistas foram importantes... Mas, o testemunho, a coerência e a teimosia em construir um mundo sem analfabetos é um referencial grandioso. A minha gratidão a todos (as) da família AVIB, não é a toa que esta entidade é uma referência importante em Guaianases, Cidade Tiradentes e região. Agradeço a todos da AVIB na pessoa da Monici presidente da ONG por todo apoio. Gratidão também à Mônica e à Vânia que sempre foram solícitas, colocando à disposição relatórios, documentos e materiais que me ajudaram na elaboração do que se referia à organização e articulação da Entidade.
Ao querido amigo e irmão, Pe. Rafael Lopes Villasenor, missionário, profeta das CEBs, do MOVA e das pastorais sociais. Ele foi o grande incentivador para que entrasse na aventura do Mestrado em Educação, mostrou o caminho das pedras e ao fazer o seu mestrado foi provocativo: “você também precisa continuar estudando”! O Rafael me presenteou com um artigo/testemunho sobre a sua experiência como educador do MOVA/SP na favela Heliópolis, bem como no resgate do MOVA em Guaianases.
Ao Robert Cabanes, doutor e pesquisador da USP, da Faculdade de Paris, que estuda os problemas urbanos, de mobilidade social a mais de 10 anos; e tem sido um parceiro importante na pesquisa à partir das periferias. Ele leu parte desta dissertação e fez apontamentos importantes.
Ao amigo Anesino, o Adão dos Santos, poeta e educador do MOVA/SP, a Norma educadora do MOVA/SP e a todas as guerreiras desta causa libertária.
Aos compadres Manoel e Néia por todo incentivo e por ensinarem os caminhos da educação libertadora, junto aos seus alunos e seus filhos.
À família Moroni: Paulo, Modhu e Bárbara pelo testemunho de amizade e por mostrarem os caminhos do Bangladesh.
Aos amigos Arnaldo, Antonia e filhos pela valentia e coerência na çluta
do povo e ser inspiração que um mundo de paz e fraternal é possível.
Aos amigos da Associação de Leigos Xaverianos pela ousadia na construção de um caminho missionário que possibilita a construção do sonho de Conforti: fazer do mundo uma só família, baseada na paz, justiça e solidariedade. Dedico também a todos os xaverianos, irmãos dos pobres.
Aos companheiros Geraldo Estevo e Gentil, referências da luta pela terra e da educação popular em Hortolândia e região.
Á família Pilarski: Geraldo, Aieda e Christian, que vivem os ideais ameríndios com espírito missionário, profético e solidário em terras americanas.
O meu reconhecimento aos estudiosos e pesquisadores do MOVA/SP, são tantos que através da pesquisa fui conhecendo: as educadoras Kunrath e Abbonízio que representam a nova geração; e os consagrados: Pedro Pontual;, Moacir Gadotti, Vera Barreto, Romão, Maria José do Vale Ferreira entre outros.
A minha querida sogra, Dona Olésia, mulher de garra, alfabetizanda das letras e do mundo que muito me inspirou.
Ao companheiro sempre vereador Beto Custódio, educador por excelência, defensor da causa dos Direitos Humanos. Dedico também aos amigos parlamentares: Simão Pedro, Edinho Silva e Paulo Teixeira que fazem do parlamento um espaço de participação e de promoção da cidadania.
Aos mestres do povo: Alberto Panichella - missionário dos lascados, meu padrinho da luta: o camarada mais apaixonado pela causa do povo que conheço em todo planeta; Antônio Lopes – o profeta e educador dos educadores; ao Tonhão – educador sábio e que tem como ponto de partida, o chão da vida; o Renato parceiro do MOVA, assessorou os grupos da AVIB no governo Marta, como representante do NAE 11, também mestre e articulador das sextas socialistas; Renata – a profetiza da causa das mulheres; Cristina do Barro Branco – evangelizadora do ecumenismo e da política; a Irmã Cida – missionária do povo negro e dos pequenos.
E com igual reconhecimento dedico esta pesquisa aos companheiros
(as) que são educadores populares fazendo história com o povo onde vivem nos diversos segmentos sociais e em diferentes frentes à serviço da causa libertária: Cacá Lopes, Dorival, Nilma de Belo Horizonte, João Corso, José Martins, Edson Barbosa, Matteo Raschietti, Luiz Carlos Paixão, Emídio Alves, Ludimar Rafagnin, Pe. Edmilson Turozi de Oliveira, Feliciano Gabriel dos Santos, João Carlos Corso, Aldo Bonna, João Galvino, Marcelino Felix, Vilson Mileski, Marcelino de Hortolândia, Elaine Silva,
Antenor Barbosa, Maguila, Edson Magrão, Clodoaldo, Richard, Bruno, Tita Reis, Pedro Testi, Benê, Irmão Luís de Cascavel, Robson, Ivandir, Dorvino, Israel, Valdir, Japonês, Tomé, José Correia, Patrícia Simões, Donizete, Elzeli, Pe. José Carlos, Vanderlei, Grimaldo, Naídes, Alberto Rodrigues, Romilda, Pastor Abnildo, Toninho Mineiro, Afonso, Dona Rosa, Eliseu, Claudionor, Mário e Raimundo Bonfim do Heliópolis, Dona Lina, Índio, Ricardo, Dona Aurelina, Helder, João da Cruz, Pedro Monteiro, Irmã Clara, Padre Edmilson, Elifas, Atanácio, Demília, Patrícia Kelly, Júnior, Dona Lina, Domingos, Déia, Lúcia, Marcos Cunha, Pedro Bala, Elza, Zé Raimundo, Joana, Ednaldo, Dulcelene, Ricardo, Adalberto Vieira, Patrícia, Ireldo, Tatiane, Cleide e tantos (as) que exercem a educação popular com tanta maestria e solidariedade.
Aos companheiros educadores da EMEF Luiz Roberto Mega: Débora coordenadora, Sandro, Andréia Honorato, Aguiar, Hermes, Luciane, Wanderly, Benjamim, Edelson, Vilma, Valdenice, João Carlos, Selma, Simone, Fátima, Greicy, Roberto, Sandra, Roberta, Eliene, Áurea, Andreia, Débora, Angélica, Luciane diretora, Bete coordenadora, Cristiane, Uilian, Beth, Patrícia, Adriane, Maria de Fátima, Marinês, Edna, Benélia, Itaicy, e todos (as) que muito me incentivaram.
Aos companheiros educadores da E.E. Nancy de Oliveira Fidalgo: Geraldo Santana, Edilson, Neves, Samuel, Paulo, Mirian, Itamar, Silvani, Djalma e todo o grupo pelo apoio e consideração.
A eterna gratidão aos que hoje participam da morada eterna, mas continuam sendo memória viva na luta do povo: Seu José Monsueto, um dos educadores patriarcas do MOVA em Guaianases, Pe. Zé Pedro, Geraldo Peron, Pe. Emilio Paloschi, Nei Caetano, Honório Arce, Pe. Pedro Lamanna e tantos (as) que são referências na educação de jovens e adultos, na educação popular e na consciência cidadã!
“Paulo Freire foi sempre assim: um educador conectivo, um homem de diálogo, um criador com os outros. Por isso, por ele, uma frase tão conhecida foi primeiro praticada e depois, escrita: ‘ninguém educa ninguém, mas também ninguém se educa sozinho...’ por Carlos Rodrigues Brandão.
O educador, Brandão (2002), no prefácio de SOUZA, Inês (org). PAULO FREIRE, Vida e Obra, assim terminou sua apresentação: “Não resisto a me despedir sem trazer uma passagem de um escrito de Paulo Freire que há muitos anos(tantos assim?) incorporei a um livro que se chamou o educador: vida e morte. Paulo Freire escreveu isto:
Os profetas não são homens ou mulheres desarrumados, desengonçados, barbudos, cabeludos, sujos, metidos em roupas andrajosas e pegando cajados. Os profetas são aqueles ou aquelas que se molham de tal forma nas águas da sua cultura e da sua história, da cultura e da história do seu povo, dos dominados do seu povo, que conhecem o seu aqui e o seu agora, e, por isso, podem prever o amanhã que eles mais do que adivinham, realizam. Eu diria aos educadores e educadoras, ai daqueles e daquelas que pararem com a sua capacidade de sonhar, de inventar a sua coragem de denunciar e de anunciar. Ai daqueles que, em lugar de visitar de vez em quando o a manhã, o futuro, pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e com o agora, se atrelam a um passado de exploração e de rotina.
Resgate do testemunho do filho de Freire, Lutgartes, Costa, in: SOUZA,
Inês. PAULO FREIRE, vida e obra, 2002.
Não se pode negar a sua amorosidade pelos homens, pelo mundo, pela boniteza das mulheres, como costumava dizer, pela boniteza dos rios, pela boniteza da vida, pela boniteza de um dia um homem do povo saber ler e escrever. A educação, dizia ele, é um ato político, e sendo político implica em uma escolha: ou se é a favor dos opressores ou se é a favor dos oprimidos. O ato político também é amoroso, pois implica num gosto numa escolha num porque, p. 341.
RESUMO
Este estudo tem como propósito analisar o programa de formação continuada de educadores do MOVA/SP que atuam em Guaianases, zona leste de São Paulo. Discuto aspectos históricos e políticos do surgimento do MOVA/SP e, a partir deste contexto, analisa-se a estrutura e a dinâmica do programa de formação continuada de educadores populares que atuam na Organização Não Governamental (ONG) Associação dos Voluntários Integrados no Brasil (AVIB), com vistas a verificar o que pensam os educadores acerca desse processo formativo. Utilizou-se o método qualitativo. As principais fontes desta pesquisa são as referências bibliográficas que tratam da questão da alfabetização e do MOVA/SP, os documentos oficiais e entrevistas. Foram aplicados questionários a vinte e dois educadores da AVIB, visando coletar dados sobre a importância da formação continuada recebida para subsidiar sua prática. Apresentam-se concepções acerca da alfabetização como um processo político e pedagógico na visão de Paulo Freire, Álvaro Vieira Pinto e Enrique Dussel. Examinam-se também experiências de alguns movimentos que trabalharam a questão da alfabetização de jovens e adultos, com ênfase na criação do MOVA/SP, que tem sua gênese no final dos anos de 1980 e que vigora até os dias de hoje, quando se tornou uma política de governo. Problematiza-se sobre a formação continuada do MOVA/SP, seus pressupostos político-pedagógicos e suas características, para posteriormente compreender como esta formação ocorre entre os educadores da AVIB. Concluiu-se preliminarmente, que o programa da AVIB é um processo permanente de reflexão e mobilização dos sujeitos, nas situações sociais e formativas onde estão inseridos.
Palavras chave: MOVA/SP; formação de educadores populares; formação continuada; educação de jovens e adultos.
ABSTRACT
This study has as purpose to analyze the continued formation program educators MOVE/SP that act in Guaianases, East zone of São Paulo. Discuss historical and political aspects of the emergence of MOVE/SP and, from this context, analyzes the structure and dynamics of continuous training programme of popular educators who work in non-governmental organization (NGO) Association of Volunteers integrated into Brazil (AVIB), with views to verify what they think the educators of this formative process. Used the qualitative method. The main sources of this survey are the bibliographical references that deal with the issue of literacy and MOVE/SP, official documents and interviews. Questionnaires were applied to twenty-two educators of AVIB, aiming to collect data about the importance of continuing training received to subsidize its practice. Presents concepts about literacy as a political process and pedagogical in vision of Paulo Freire, Álvaro Vieira Pinto and Enrique Dussel. Also examined experiences of some movements that worked the issue of literacy of young people and adults, with an emphasis on creation of MOVE/SP, which has its genesis in the late 1980 and which exists to this day, when he became a Government policy. Problematize the continued training of MOVE/SP, their political-pedagogical assumptions and their characteristics, to further understand how this formation occurs between AVIB educators. Conceived, it was preliminarily found that the program of AVIB is a permanent process of reflection and mobilization of subject, in social situations and training where they are entered.
Keywords: MOVE/SP; training of educators; continuing training, youth and adult education.
LISTA DE SIGLAS
AEC – Associação de Educação Católica
AVIB – Associação dos Voluntários Integrados no Brasil
CEAT – Centro de Atendimento ao Trabalhador
CEBI – Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos
CEBs – Comunidades Eclesiais de Base
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CDHU – Companhia de Desenvolvimento de Habitacional e Urbano do Estado
de São Paulo
CENPEC – Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação
Comunitária
CEPIS – Centro de Educação popular do Instituto Sedes Sapientiae
CEU – Centro Educacional Unificado
CIEJA – Centro Integrado de Educação de Jovens e Adultos
CPC – Centros Populares de Cultura
DRE – Diretoria Regional de Ensino
EDA – Educação de Adultos
EJA – Educação de Jovens e Adultos
FUMCAD – fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
IPF – Instituto Paulo Freire
IPJ – Instituto Paulista da Juventude
ISEB – Instituto Superior de Estudos Brasileiros
LDB – Lei de Diretrizes e Bases
MCP – Movimento de Cultura Popular
MEB – Movimento de Educação de Base
MST – Movimento Sem Terra
MOVA/SP – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos de São Paulo
MOVA/Brasil – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos do Brasil
MOVA/Sudeste – Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos Sudeste
NAE – Núcleo de ação Educativa
NAF – Núcleo de Apoio à Família
NAMA – Núcleo Alternativo das Mulheres
PAF – Programa Ação Família
PC do B – Partido Comunista do Brasil
PMSP – Prefeitura Municipal de São Paulo
PT – Partido dos Trabalhadores
PUC/SP – Pontifícia Universidade Católica/São Paulo
ONGs – Organizações Não Governamentais
PNE – Plano Nacional de Educação
PROALFA – Programa de Alfabetização
SMADS – Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social
SME – Secretaria Municipal de Educação
SMPP – Secretaria Municipal de Participação e Parceria
SENAC – Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SESC – Serviço Social do Comércio
UNAS - União dos Núcleos e Associações do Heliópolis.
LISTA DE TABELAS
TABELA I – Local de funcionamento dos grupos de alfabetização...................83
TABELA II – Faixa etária dos educandos do MOVA/AVIB.............................. 84
TABELA III – Gênero dos educandos do MOVA............................................. 85
TABELA IV – Inserção no mercado de trabalho.............................................. 85
TABELA V a – Perfil dos educadores do MOVA/AVIB: a prevalência
de gênero........................................................................................................ 86
TABELA V b – Tempo que é educador do MOVA/AVIB.................................. 87
TABELA V c – Exercício de outra atividade na educação............................... 88
TABELA V d – Escolaridade dos educadores............................................... 89
TABELA VI – Aproximação dos educadores com o MOVA/AVIB.................... 90
TABELA VII – Envolvimento dos educadores com a AVIB............................. 91
TABELA VIII – Envolvimento dos educadores em fóruns da educação
Popular....................................................................................................... 92
TABEL IX – Outros meios utilizados na busca de formação.......................... 93
Sumário
INTRODUÇÃO............................................................................................. 16
CAPÍTULO I - ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM
PANORAMA NECESSÁRIO.......................................................................... 21
1.1. Concepções sobre o conceito de alfabetização................................... 21
1.2. A alfabetização e a educação de Jovens e Adultos na década de 1960:
algumas experiências............................................................................ 27
1.3. O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA/SP) no
cenário de alfabetização....................................................................... 34
1.4. A retomada do MOVA/SP como programa da Secretaria Municipal de
Educação da Prefeitura de São Paulo.................................................. 43
1.5. O MOVA/SP se expande em outras cidades e estados do Brasil........ 45
CAPÍTULO II – PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DO MOVA/SP:
PRESSUPOSTOS POLÍTICOS E PEDAGÓGICOS E SUA EXECUÇÃO..... 48
2.1. Análise do Projeto Político-Pedagógico do MOVA/SP.......................... 48
2.2. Caracterização do processo de formação de educadores populares:
contribuição de estudiosos da educação popular para o MOVA/SP............... 51
2.3. A formação do MOVA/SP...................................................................... 55
2.4. Caracterização do processo de formação oferecida pela Secretaria
Municipal de Educação................................................................................... 64
CAPÍTULO III – A AVIB E O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE
EDUCADORES.............................................................................................. 72
3.1. Caracterização do bairro de Guaianases/SP e da Associação dos
Voluntários Integrados no Brasil (AVIB)......................................................... 72
3.2. Análise do programa de formação de educadores do MOVA/SP da AVIB:
Estrutura e dinâmica....................................................................................... 79
3.3. O que pensam os educadores populares a respeito da formação
continuada proporcionada pela AVIB.............................................................. 82
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................... 113
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................. 118
ANEXO A: Decreto da Criação do MOVA/SP............................................... 125
ANEXO B: Carta de Princípios de Parceria do MOVA/SP........................... 127
ANEXO C: Carta aberta à população de SP em defesa do MOVA/SP....... 128
ANEXO D: Projeto Político Pedagógico do MOVA/SP............................... 129
ANEXO E: Questionário dirigido aos educadores da AVIB....................... 135
16
INTRODUÇÃO
Este estudo nasceu no contexto de minha atuação como professor de
escola pública e simpatizante do Movimento de Alfabetização de Jovens e
Adultos (MOVA/SP), que tive contato em 1991 e 1992 no seu início, quando
atuava como agente pastoral e social na Favela Heliópolis; e posteriormente
acompanhei as dificuldades do movimento, desta vez em Guaianases, bairro
da zona leste, quando Paulo Maluf desconstruiu as políticas públicas de
alfabetização na cidade de São Paulo, mas os grupos organizados resistiram e
continuaram fazendo acontecer a educação de jovens e adultos nos moldes do
MOVA/SP, mesmo sem o aporte municipal. Assim, a questão do MOVA/SP
tornou-se uma temática instigante e me desafiou a compreender como os
educadores que trabalham neste campo constroem suas práticas pedagógicas,
quando estão reunidos em processos de formação continuada.
Como aponta Martins (2000), discutir apenas aspectos documentais de
programas de governo, como no caso do MOVA/SP, pode implicar na
realização de análises parciais de dinâmicas pedagógicas quando educadores
atuam em seu cotidiano, pois exclui a voz destes atores. Neste sentido, a
intenção deste trabalho é ampliar o debate sobre questões de formação
continuada de educadores populares que trabalham com a alfabetização de
jovens e adultos.
Assim, pretende-se primeiramente, com base na análise da literatura e
de documentos oficiais, discutir aspectos históricos e políticos do surgimento
do MOVA no município de São Paulo, e, a partir deste contexto, analisar a
estrutura e a dinâmica do programa de formação continuada de educadores
populares que atuam na entidade Associação dos Voluntários Integrados no
Brasil (AVIB), com vistas a verificar o que pensam os educadores deste
processo formativo.
A pesquisa discute num primeiro momento, as características do
MOVA/SP, observando a trajetória histórica da política educacional mais
recente na elaboração de programas de educação de jovens e adultos e no
combate ao analfabetismo. Não foi possível realizar tal estudo sem recorrer ao
trabalho do educador Paulo Freire - uma das maiores referências bibliográficas
17
para a compreensão e realização dessa tarefa. Assim, é preciso considerar que
o MOVA/SP organizou-se a partir de experiências de educação popular que
aconteciam em diferentes bairros da cidade, nas quais as propostas de Paulo
Freire já eram debatidas e utilizadas. Quando implantado oficialmente, o
Movimento percorreu um longo caminho de consolidação até tornar-se uma
política de governo.
Neste sentido, o texto está estruturado em três capítulos. O primeiro
trata da alfabetização de jovens e adultos, apresentando três concepções
acerca da alfabetização, que se complementam, pois são educadores que
compreendem a alfabetização como um processo político e pedagógico: Paulo
Freire, Álvaro Vieira Pinto e o filósofo Enrique Dussel. O estudo se fundamenta,
ainda, em estudos realizados sobre o tema. Na seqüência, relata algumas
experiências de movimentos que trabalharam a questão da alfabetização de
jovens e adultos na década de 1960, tais como: o Movimento de Cultura
Popular de Recife; a “Campanha” Pé no Chão Também se Aprende a Ler da
cidade de Natal; o Movimento de Educação de Base; a experiência de Angicos
e a experiência de Paulo Freire com os trabalhadores camponeses do Chile,
enquanto esteve exilado, de 1964 a 1969.
Neste mesmo capítulo, descrevo o MOVA/SP, formulado e
implementado na cidade de São Paulo no final dos anos de 1980, que nasceu
das experiências de alfabetização desenvolvidas pelos Movimentos Populares,
sobretudo em parceria com a Administração Popular e Democrática instaurada
a partir de 1989, na tentativa de responder à necessidade de enfrentar a
situação de analfabetismo que caracteriza uma parcela significativa da
população de jovens e adultos da cidade de São Paulo. O MOVA/SP foi criado
pelo Decreto-lei 28.302, de 21 de novembro de 1989, assinado pela Prefeita
Luísa Erundina de Sousa (1989-1993).
Com as mudanças da gestão municipal e a não efetivação do MOVA/SP
como um programa de governo, houve muitas dificuldades, o que, porém, não
impediu a continuidade de suas ações, mesmo nos governos de Paulo Maluf e
Celso Pitta, entre os anos de 1993-2000. A retomada do MOVA/SP como
programa de governo, ocorreu em 2000, com a eleição de Marta Suplicy. No
ano seguinte, tornou-se política pública, tendo suas diretrizes definidas pela
Secretaria Municipal de Educação, construindo um Projeto Político Pedagógico
18
em parceria com Organizações Não Governamentais (ONGs). Apresento
também como o MOVA/SP foi sendo construído em outras cidades e estados
do Brasil por meio da Rede MOVA/Brasil, e sua articulação na região sudeste,
abrangendo São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo.
O segundo capítulo trata da formação continuada do MOVA/SP, seus
pressupostos políticos-pedagógicos e sua implementação, com base na
caracterização do processo de formação continuada de educadores populares,
como vem sendo oferecida pela Secretaria Municipal de Educação.
A formação de educadores populares é um dos eixos do MOVA/SP e por
consequência do MOVA/Brasil, considerando-se que todas as instâncias do
programa são espaços de apropriação e construção de conhecimento: a
mobilização que ocorre nas entidades para formalizar o convênio; os encontros
no interior das próprias organizações; a participação nos Fóruns Municipais e
Regionais do MOVA/SP; as reuniões pedagógicas e os encontros de formação
de educadores e coordenadores desenvolvidos pela Secretaria Municipal de
Educação.
O terceiro capítulo analisa o processo de formação continuada
promovido pelos educadores da AVIB, entidade que busca incorporar a
proposta de Paulo Freire, entendendo que a formação de educadores é um
processo fundamental na efetivação de práticas que possibilitem a
transformação social. Para Freire (1997, p. 43):
A formação enquanto ato de conhecimento, não apenas deve centrar-se no ensino de conteúdos, deve desafiar o educando a aventurar-se no exercício de não só falar da mudança do mundo, mas com ela realmente comprometer-se. Por isso, para mim um dos conteúdos essenciais e qualquer programa de formação é o que possibilita a discussão à natureza mutável da realidade natural como a história e vêem homens e mulheres como seres não apenas capazes de se adaptar ao mundo, mas, sobretudo de mudá-lo. Seres curiosos, atuantes, falantes, criadores.
O programa de formação continuada dos educadores do MOVA da
AVIB, propõe-se a levar em conta a realidade social, política e cultural de seus
educadores e educandos, dialogando com os diferentes desafios e
experiências vividas por estes protagonistas, contextualizada na visão de
educação popular, que apresenta exigências aos educadores, sobretudo no
campo da competência científica e da sensibilidade para trabalhar com a
realidade dos educandos.
19
Neste sentido, a educação popular é entendida no referido programa,
como um processo permanente de reflexão e mobilização dos objetivos dos
próprios sujeitos, nas situações sociais onde estão inseridos. A prática
educativa não se pode se prender à burocratização escolar, desde que seus
atores compreendam seu papel político e construam um processo permanente
de interação com os outros sujeitos que buscam, da mesma forma, apropriar-
se da construção do conhecimento no sentido das proposições de Paulo Freire.
O FOCO DO ESTUDO
Esta pesquisa tem como propósito compreender o que os educadores
do MOVA/SP pensam a respeito de seu processo de formação continuada
realizada pela AVIB, no Bairro de Guaianases em São Paulo, na tentativa de
verificar se estes educadores sentem-se preparados para enfrentar a Educação
de Jovens e Adultos em toda sua complexidade.
Nesta perspectiva, apresenta como objetivos: discutir aspectos históricos
e políticos de estruturação do MOVA no município de São Paulo, como
contexto mais geral no qual o programa de formação continuada vem sendo
implementado; caracterizar o Programa de formação continuada no que diz
respeito à sua Proposta político-pedagógica e sistemática de implementação;
buscar apreender a opinião de educadores populares sobre o processo de
formação continuada.
O foco do estudo estará centrado, portanto, na análise de ação
específica de uma ONG que, dentre outros trabalhos, atua com grupos de
alfabetização de jovens e adultos na periferia de São Paulo, especificamente
no bairro de Guaianases.
Tenho clareza, conforme as considerações de Luna (1995), que o
processo de pesquisa é dinâmico e o pesquisador deve estar atento à
realidade que estuda e ser sempre sensível às alterações que ela pode exigir.
Para Maia (2000), uma das principais características dos estudos qualitativos é
a flexibilidade apresentada ao pesquisador. Nesses termos, a pesquisa ocorreu
com a intenção de acrescentar possíveis novas perguntas e questionamentos
no decorrer do estudo (Martins, 2001), partindo da ideia que o conhecimento é
20
algo inacabado, uma construção contínua e, portanto, aberto a novos
elementos nesse processo.
As principais fontes do estudo foram as referências bibliográficas que
tratam da questão da alfabetização e do MOVA/SP, os documentos oficiais e
as entrevistas. Os Documentos Oficiais analisados são referentes ao
MOVA/Brasil e MOVA/SP, além de fontes coletadas junto à Secretaria
Municipal de Educação de São Paulo e à Prefeitura do Município de São Paulo.
Foram aplicados questionários a 22 educadores que atuam nos grupos de base
na AVIB e aos 03 coordenadores, com vistas a coletar dados sobre a
importância da formação continuada recebida para subsidiar sua prática. O
questionário apresentava os seguintes objetivos:
- Discutir a importância que os educadores atribuem ao momento
semanal de formação continuada.
- Analisar seu comprometimento com o processo formativo.
- Verificar o que esta formação tem contribuído para o trabalho efetivo
com os educandos do MOVA/SP nas bases onde atuam.
- Analisar como ocorre essa formação: quais referenciais teóricos são
priorizados e estudados; qual metodologia é adotada no processo formativo.
21
CAPÍTULO I
ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: UM PANORAMA
NECESSÁRIO.
1.1. Concepções sobre o conceito de alfabetização
Apresento três concepções acerca da alfabetização que se
complementam: a visão do professor Paulo Freire, do educador Álvaro Vieira
Pinto e do filósofo Enrique Dussel. Antes, convém elucidar que estes
educadores têm a compreensão que alfabetizar não é um processo neutro e
apolítico, ao contrário, a ação de alfabetizar apresenta implicações políticas
que contribuem para um caminho de transformação social, política, econômica
e cultural.
No Congresso Brasileiro de Alfabetização, de 14 a 16 de setembro de
1990, Ano Internacional da Alfabetização, educadores reunidos em São Paulo
apresentaram várias proposições a respeito da situação da alfabetização no
Brasil e das políticas públicas que deveriam ser implementadas, quando se
afirma que “as políticas de alfabetização precisam envolver ações permanentes
e sistemáticas relacionadas a programas de educação básica, de maneira a
garantir sua qualidade” (Gadotti, Romão, 2001, p.109).
O documento acima citado entende que o conceito de analfabetismo
carrega consigo preconceitos e incorreções, pois, usualmente, o analfabeto
tem sido colocado como uma pessoa desqualificada para o exercício da
cidadania, um mal a ser extirpado, sem que haja a compreensão que ele é um
sujeito de direitos. Para tanto, o analfabeto deve ser reconhecido como,
Cidadão participante da sociedade, produtor de cultura e que, por sua condição de classe, sexo, raça e portador de deficiência, tem sido privados do direito à aquisição dos códigos da leitura e da escrita e de conhecimentos que ampliam suas possibilidades de participação e transformação social. Deve-se superar o conceito restrito de que alfabetizado é o ‘indivíduo capaz de ler e escrever um bilhete simples’. Estar alfabetizado é integrar à vida de qualquer cidadão a condição de leitor, escritor e comunicador, bem como garantir o acesso a outros conhecimentos que ampliem sua inserção crítica e participativa na sociedade (Gadotti, Romão, 2001, p.109).
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Nesta compreensão, a alfabetização é concebida como um processo
educacional que vai além da leitura e da escrita, da superação e da ausência
de formação e de aquisição de conhecimento. É uma questão de política
pública, que exige dos governos um projeto estruturado para responder às
expectativas de uma educação de adultos que permita alcançar o exercício da
cidadania, garantindo assim, o cumprimento previsto na última Constituição
Federal de 1988, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB,
1996), e no Plano Nacional de Educação (PNE, 2001) que assegura a
educação pública e gratuita como um direito de todos.
Para Paulo Freire1 (1991), o analfabeto é aquele que vive nas periferias,
nas ocupações, favelas ou cortiços das grandes cidades. Vive geralmente de
subemprego, dedicando-se a profissões que não exigem habilitação específica
e tem consciência que precisa saber ler e escrever. Porém, isto não basta, pois
por si só não altera as condições de moradia e de vida, estas condições só se
alteram pelas lutas coletivas dos trabalhadores por mudanças estruturais da
sociedade.
Segundo Freire (1991, p. 118), a questão principal, na alfabetização,
Não é de natureza técnica. As questões principais na alfabetização são de natureza político-ideológico e científica a que se juntam aspectos técnicos necessários. O ponto de partida é a decisão, a vontade política de fazer, a arregimentação dos recursos e a formação rigorosa dos educadores e das educadoras.
Freire (1987) constata que o analfabetismo aparece numa visão ingênua
ou astuta como a manifestação da incapacidade do povo de sua pouca
inteligência, de sua preguiça. A partir desta visão, a alfabetização, “se rende ao
ato mecânico de depositar palavras, sílabas e letras nos alfabetizandos. Este
depósito é insuficiente para que os alfabetizandos comecem a afirmar-se, uma
vez que, em tal visão, se empresta à palavra um sentido mágico” (p. 15).
O autor observa que, geralmente os textos das cartilhas de alfabetização
nada têm a ver com a experiência dos alfabetizandos, pois estes adultos são
1 Paulo Freire, pernambucano, nasceu em Recife, em 19 de setembro de 1921 e falecido em 02 de maio de 1997, conhecido mundialmente como educador, pensador, filósofo e militante da educação; e uma referência importante na educação de jovens e adultos. O MOVA/SP foi criado em 1989 quando ele exerceu a função de Secretário Municipal de Educação na cidade de São Paulo, no Governo Luiza Erundina. Freire é autor de mais de 25 livros; foi professor nas Universidades de Harvard e Genebra, na Universidade Estadual de Campinas e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
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tratados de maneira paternalista, às vezes infantil, como passivos, receptores
das letras. Paulo Freire (1987, p.18), se contrapõe a esta visão deturpada e
apresenta uma concepção crítica, em que,
O analfabetismo nem é uma chaga, nem uma erva daninha a ser erradicada, nem tampouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas de uma realidade social injusta. Não é um problema estritamente linguístico, nem exclusivamente pedagógico, metodológico, mas político, como a alfabetização por meio da qual se pretende superá-lo proclamar sua neutralidade, ingênua ou astutamente, não afeta em nada a sua politicidade intrínseca.
Os alfabetizandos deverão lidar com outro aprendizado: o de escrever a
sua vida, ler a sua realidade, daí a importância de tomar a história nas mãos
para fazer e reescrever os acontecimentos importantes que marcaram a sua
existência. E acrescenta que
(...) a primeira experiência prática que a concepção crítica da alfabetização se impõe é que as palavras geradoras com as quais os alfabetizandos começam sua alfabetização como sujeitos do processo sejam buscadas em seu universo vocabular mínimo, que envolve sua temática significativa (Freire, 1987, p. 21).
A partir desta perspectiva, o analfabeto é colocado como aquele a quem
foi negado o direito de ler, ninguém é analfabeto por escolha, mas como
consequência das condições objetivas em que se encontra.
O processo de alfabetização, assim, deve ser visto como uma ação
cultural para a libertação, em que o educando assume um papel de sujeito em
relação ao educador. Entretanto, para que haja esse processo de alfabetização
e para que seja um ato de conhecimento, é necessário estabelecer uma
relação de diálogo autêntico em que os alfabetizandos “assumam desde o
começo mesmo da ação, o papel de sujeitos criadores, aprender a ler e
escrever já não são, pois memorizar sílabas, palavras ou frases, mas refletir
criticamente sobre o próprio processo de ler, e escrever e sobre o profundo
significado da linguagem” (Freire, 1987, p. 59).
Assim, aprender a ler e escrever envolve ação e reflexão. O significado
de dizer a palavra é carregado de profundidade, é o direito de expressar-se e
expressar o mundo, de criar e recriar. Pois o ato de conhecer para Freire, 1987,
p. 60,
Envolve um movimento dialético que vai da ação a reflexão sobre ela e desta a uma nova ação. Para o educando conhecer o que antes não conhecia, de se engajar num autêntico processo de abstração por meio do qual reflete sobre formas de orientação no mundo, em que se sobrepõem momentos de sua cotidianidade.
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O autor sublinha que o processo de alfabetização deve relacionar o ato
de transformar o mundo ao ato de pronunciá-lo. Ao referir-se ao diálogo
educador-educando, este não tem nada a ver, “de um lado com o monólogo do
educador ‘bancário’, de outro, com o silêncio espontaneísta de certo tipo de
educador liberal, o diálogo engaja ativamente a ambos os sujeitos do ato de
conhecer, educador-educando e educando-educador” (Freire, 1987, p. 61).
Da mesma forma, Álvaro Vieira Pinto2 (2001) aponta a necessidade de
superar a visão ingênua do analfabetismo, colocando-a apenas como objeto do
conhecimento. A sua visão de educação e, especificamente, de alfabetização
de adultos dialoga com Paulo Freire, pois, para o autor, não se pode limitar a
alfabetização como se tratasse de um processo de transmissão de uma técnica
para ensinar a ler e escrever. Trata-se de produzir uma mudança na
consciência do educando, mudança na qual o conhecimento de leitura é
apenas um dos aspectos. Assim, coloca-se como sujeito da alfabetização o
próprio analfabeto que constrói possibilidades de alcançar a sua transformação
pessoal e da realidade em que está inserido. Ainda, na visão do autor, Pinto,
2001, p. 99),
O primeiro passo para a constituição da autoconsciência crítica do trabalhador, da qual decorre necessariamente a aquisição da linguagem escrita, está em fazê-lo tornar-se observador consciente de sua realidade; destacar-se dele para refletir sobre ela, deixando de ser apenas participante inconsciente dela. Tecnicamente, esse resultado é alcançado mediante a apresentação ao educando adulto de imagens de seu próprio meio de vida, de seus costumes, suas crenças, práticas sociais, atitudes de seu grupo. Com isso, o alfabetizando se torna espectador e pode discutir sua realidade, o que significa abrir o caminho para o começo da reflexão crítica, do surgimento de sua autoconsciência.
É necessário, assim, partir da visão do analfabeto como ser humano e
não do analfabetismo, pois este é um conceito abstrato. Deve-se considerar
que o cidadão adulto analfabeto é sujeito de uma política pública perversa, que
não prioriza sua inserção social no mundo do conhecimento.
O analfabetismo, nesta compreensão, é visto como uma questão que
foge do problema individual, do interesse ou desinteresse em ler e escrever ou 2 Álvaro Vieira Pinto é um dos principais estudiosos brasileiros da educação de jovens e adultos. Nasceu em 1909 e faleceu em 1987; filósofo e educador destacado trabalhou temáticas importantes relacionadas à ciência, tecnologia, cultura, trabalho e educação. Foi um dos fundadores do Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB) que tem o seu surgimento no contexto da mobilização popular que buscava combater ao analfabetismo adulto. Dentre suas obras mais importantes, destacam-se: A Ideologia do Desenvolvimento Nacional, Consciência e Realidade Nacional e Sete Lições sobre Educação de Adultos.
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alfabetizar-se no sentido abrangente. Deve ser compreendido como uma
questão que exige uma postura ativa dos governos no sentido de possibilitar
um projeto de educação que considere o alfabetizando como sujeito de direitos
educacionais capaz de contribuir na superação da exclusão social em que
muitos estão submetidos.
Assim, a erradicação do analfabetismo não se realiza simplesmente com
campanhas de alfabetização, estas podem até ajudar, porém, o que poderá
fazer a diferença é a construção de políticas públicas que resgatem a pessoa
em situação de analfabetismo, possibilitando que esta assuma um papel de
protagonismo e autonomia na busca de superação deste problema que tem se
agravado com o passar dos anos. Constatamos que, em pleno século XXI,
ainda temos dados alarmantes que denunciam o pouco investimento na
educação de jovens e adultos, apresentando assim um grande desafio a ser
enfrentado.
Neste mesmo entendimento, Dussel3 (1977a) destaca que o latino-
americano deve ser identificado como indígena, como negro escravizado, como
mulher violentada, como criança empobrecida, como um “ser negado” ao longo
da história de colonização e dominação coordenada pela Coroa Espanhola e
Portuguesa. Neste viés o sujeito pode ser compreendido como aquele que é
excluído da alfabetização, em que se nega o direito à educação, à escola, a
alfabetizar-se numa concepção dialógica, onde o alfabetizando é também
sujeito do processo de formação e alfabetização.
Segundo Dussel, o ser negado é propriamente o ponto de partida da
filosofia da libertação, que busca refletir sobre o oprimido e o marginalizado
pelo sistema opressor do centro. Dussel (1977a, p. 62) enfatiza o significado da
relação face-a-face entre o pai e o filho, professor e aluno, em que há
necessidade de escutar o outro como exigência para que ocorra a verdadeira
educação que leva à libertação, quando afirma que,
Saber ouvir o discípulo é poder ser mestre, é saber inclinar-se diante do novo; é ter o próprio tema do discurso pedagógico. O autêntico
3 Trata-se de Enrique Dussel, nascido em Mendonza na Argentina em 1934. Tem uma longa história de luta pela libertação latino-americana, tendo sido inclusive vítima de um atentado à bomba do governo militar argentino, em 1975 exilou-se no México. É considerado um dos principais nomes da nova filosofia latino americana, chamada da libertação, que tem as suas origens na década de 80, praticamente no mesmo período em que emergiu a Teologia da Libertação. Este pensador tem trabalhado e cunhado categorias próprias, no sentido de resgatar a autonomia e o protagonismo da filosofia ameríndia.
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mestre primeiro ouvirá a palavra objetante, provocante, interpelante daquele que quer ser outro. Somente o que escuta com paciência, no amor de justiça é a esperança do outro como libertador, na fé de sua palavra, somente ele poderá ser mestre.
Contradizendo a educação dominadora, o autor afirma que a educação
libertadora se funda e vai se delineando na medida em que se ouve a palavra
do outro,
Ouvir a voz do outro como Outro significa uma abertura ética, um expor-se pelo outro que ultrapassa a mera abertura da totalidade ao outro, esta abertura é, silêncio, mas não silêncio interior à fala, e sim silêncio da própria fala, silêncio do mundo, aniquilamento e disponibilidade ao outro como outro. (Dussel, 1977a, p.63).
Registre-se que Paulo Freire (1983b, p. 39) pensa na mesma direção, ao
afirmar que o aluno, o discípulo, aquele que se coloca numa atitude de
alfabetização, deverá praticar atitudes de resgate do outro, numa postura de
seu reconhecimento. Ele destaca que todos têm direito à pronúncia da palavra
e esta pode levar à liberdade e à consciência, quando afirma:
Desta maneira, o educador já não é o que apenas educa, mas o que, enquanto educa, é educado, em diálogo com o educando que, ao ser educado, também educa. Ambos, assim, se tornam sujeitos do processo em que crescem juntos, e em que os ‘argumentos de autoridade’ já não valem. Em que para ser-se funcionalmente, autoridade, se necessita de estar sendo com as liberdades e não contra elas. Já agora ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: Os homens se educam em comunhão, mediatizadas pelo mundo.
Corroborando com esta proximidade entre Dussel e Freire, Pazello,
(2007, p. 18) afirma que o ouvir o outro, categoria cunhada por Dussel nada
mais é do que a dialogicidade de Freire, que apresenta a educação como
prática de dominação como a imperante no mundo hodierno. Para este autor,
Dussel vai nos apresentar o filicídio cometido pelo Pai-Estado que, ao mesmo tempo, reprime machistamente a mãe-cultura popular. Em sendo a mãe libertada, sê-lo-á o filho também e, por conseguinte, o pai, ou seja, a cultura popular e estado ligados para receberem anadia-leticamente o novo, o criador, a criança (podemos acrescentar, o jovem e adulto em que é negado a alfabetização).
Outra categoria cunhada por Dussel é a pedagógica que também
dialoga com Paulo Freire, pois esta pedagógica é vista “como parte da filosofia
que pensa a relação face-a-face do pai-filho, mestre-discípulo, médico,
psicólogo-doente, filósofo-não filósofo, político-cidadão” (Dussel, 1977b, p.
153).
27
É importante também discutir mesmo que brevemente a ética da
libertação em Dussel, que tem como ponto de partida a participação
comunitária na busca de novos consensos que se dão na relação dialógica
entre o educador e educando. Para Pazello (2007) a ética da libertação em
Dussel, “pauta-se pela validade anti-hegemônica da comunidade das vítimas”
(p. 9).
O conceito de “ser negado” de Dussel pode ser utilizado na análise das
pessoas que estão em processo de alfabetização. Aplicado numa perspectiva
dialógica, este conceito sugere que o alfabetizando deve ser ouvido, pois tem o
direito à pronúncia da palavra, na mesma direção apontada por Paulo Freire.
Assim, o outro negado de Dussel é neste contexto, o oprimido proclamado por
Freire, na Pedagogia do Oprimido. Desta maneira, a alfabetização se faz no
diálogo entre o alfabetizador e o alfabetizado e seus colegas de estudo,
mediados pela realidade em que vivem.
1.2. A alfabetização e a educação de Jovens e Adultos na década de 1960:
algumas experiências
Apresento algumas experiências que foram importantes no processo de
alfabetização de adultos na linha de educação popular: o Movimento de Cultura
Popular (MCP) de Recife; a “Campanha Pé no Chão Também se Aprende a
Ler de Natal"; O Movimento de Educação de Base (MEB); as 40 Horas de
Angicos e a experiência de Freire junto aos trabalhadores do Chile, quando
este esteve exilado.
O Movimento de Cultura Popular ocorreu na Prefeitura de Recife em
1960, quando Miguel Arraes assumiu a Prefeitura. Projetado com o objetivo de
combater o alto índice de analfabetismo da população, o movimento agregou
universitários, intelectuais de esquerda e artistas que, ao constituir-se em
entidade jurídica, assumiu uma identidade para além da alfabetização
funcional, promovendo ações com vistas à conscientização popular.
Este Movimento de Cultura, segundo Góes (1980), procurava sintetizar,
no mesmo espaço, o esforço do movimento popular com o do movimento de
cultura popular; modos de ação que transcendem a característica de mera
doação de bens culturais produzidos internamente pelo movimento e, a seguir,
28
oferecidos à comunidade como produtos acabados em relação aos quais só
cabe o ato de consumo. É importante destacar que Paulo Freire foi colaborador
do Movimento de cultura popular nos seus dois primeiros anos de
funcionamento.
Para Paiva (2003, p. 265) este movimento carregava dentro de si uma
característica marcada pela conscientização, valorização popular e politização,
pois
A valorização das formas de expressão cultural do homem do povo e estímulo ao desenvolvimento de sua capacidade de criação funcionava no MCP, como a própria condição de diálogo entre a intelectualidade e o povo: partia-se da arte para chegar à análise e à crítica da realidade social. A intelectualidade participante devia libertar-se de todo espírito assistencialista e filantrópico e, sem querer impor diálogo. Buscava-se assim, a autenticidade da cultura nacional, a valorização do homem brasileiro, a desalienação da nossa cultura; pretendia-se fazer arte com o povo, ampliar a discussão dos problemas nacionais, dinamizar a forma comunitária de vida através do incentivo às manifestações coletivas de arte.
Assim, este movimento tornou-se referência para outras cidades e
estados do país, destacando-se entre outras atividades, as praças de cultura,
que tinham uma infraestrutura interessante: parques infantis, bibliotecas,
apresentações teatrais, exposições de arte, apresentações de filmes, palestras
com assistência médica e jurídica, contudo, permanecia aproximadamente 20
dias apenas em cada local e surge, então, a necessidade da instalação de
núcleos de cultura popular que se fixassem nos bairros periféricos. Os Centros
Populares de Cultura e outros movimentos afins, iniciados na década de 1960,
tiveram como base a efervescência política e cultural vivida naquela época.
Entendia-se que esta educação de adultos deveria estar focada na formação
de pessoas que fossem protagonistas de sua cultura numa perspectiva
transformadora do seu meio social e da realidade.
Outra experiência interessante ligada à questão da alfabetização ocorreu
na Prefeitura de Natal em 1962, na segunda gestão de Djalma Maranhão. De
acordo com Abbonízzio (2007), quando se passou a atender à grande
demanda de analfabetos adultos, através da campanha que levou o nome “De
Pé no Chão também se Aprende a Ler”. Ocorria quando os estudantes
secundaristas voluntários iam até os bairros ou comunidades retiradas para
trabalhar a alfabetização. No ano seguinte, o projeto foi estendido ao ensino
29
profissionalizante, quando se lançou a campanha “De Pé no Chão Também se
Aprende uma Profissão”, que atendeu centenas de jovens e adultos.
Destaco também a importante atuação do MEB que foi criado em
convênio firmado entre a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e
o Governo Federal em 1961 para desenvolver atividades radiofônicas que
atenderiam as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste e logo foram estendidas
para áreas subdesenvolvidas das outras regiões do país. Para Wanderley
(1984), os objetivos da parceria entre a Igreja e o governo eram entre outros:
ampliar o contingente eleitoral (que era uma prática da política populista);
responder aos apelos da UNESCO para realização de campanhas de
alfabetização; restringir o poder político das oligarquias agrárias através de um
programa educacional destinado ao homem do campo. Neste caso, a parceria
com a Igreja Católica passa a ser uma boa opção para controlar
ideologicamente as massas rurais, as quais estavam sofrendo assédios de
grupos de esquerda, pois aquela seria capaz de dar uma educação
conveniente para esta estratégia.
Ainda, segundo Wanderley (1884, p. 46)
As atividades do MEB que se iniciam com uma finalidade basicamente alfabetizadora passa para uma educação de base compreendendo conscientização e politização, valorização da cultura popular, instrumentação de comunidades, organização do povo, animação popular. Transmitiam noções de saúde e estudava-se o trabalho agrícola em três aspectos: técnicas de trabalho agrícola, sistemas de relações no trabalho agrícola; organização da comunidade para a produção e o trabalho em cooperação.
Com o advento do regime militar, o programa passa por dificuldades
financeiras, onde houve o fechamento de várias escolas radiofônicas e o MEB
passou por um período de retração. A perda das características adquiridas no
período entre 1962-1964 e sua nova orientação permitiram a aceitação
novamente do apoio oficial. Na avaliação de Paiva (2003), a mudança de
orientação observou-se imediatamente no material didático, que passou a se
chamar “Mutirão” e não mais “Viver é lutar” que segundo os militares incitava à
luta armada.
Assim, os recursos recebidos após a reorientação até eram suficientes
para manter as escolas sobreviventes, porém, o MEB encerrou as atividades
compreendendo que não era possível reproduzir as ideologias dos militares.
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A experiência de Angicos é outra que merece destaque. Localizada na
região do agreste potiguar, realizou-se em 1963 com a utilização do método de
alfabetização criado por Paulo Freire. Tal experiência, segundo Abbonízio
(2007), foi realizada por estudantes em sua maioria ligados a Juventude
Universitária Católica (JUC), a partir da coleta das palavras geradoras
pesquisadas junto aos alfabetizandos. Além disso, outro tema importante era a
compreensão antropológica de cultura, através da visualização de imagens que
representavam cenas compostas por natureza e criações humanas. Com esta
reflexão, buscava-se compreender que o ser humano, ao modificar a natureza,
produzia cultura.
Segundo Beisiegel (1982), as 40 horas de Angicos, como ficou
conhecida essa experiência por se tratar literalmente de 40 horas de
alfabetização, teve o apoio do Presidente João Goulart que criou o Programa
Nacional da Alfabetização do Ministério da Educação e Cultura, nos termos do
Decreto 53.465 de 21 de janeiro de 1964, mediante o emprego do “método
Paulo Freire” 4. Alguns dias depois do decreto presidencial, Paulo Freire foi
designado para compor a Comissão Especial de Alfabetização, sob a
presidência do ministro da Educação Paulo de Tarso; posteriormente, Freire é
chamado a exercer as funções de coordenador do programa em todo o país.
Para Paiva (2003), no início de 1964, Freire e sua equipe preparavam-
se para verificar os índices de regressão da aprendizagem com o grupo de
Angicos e dava início à nova turma de alfabetização em Quintas, bairro de
Natal – Rio Grande do Norte. Devido à mudança de Governo, os níveis de
regressão não foram verificados e o trabalho em Quintas não se iniciou.
Conforme Galvão, Soares (2006, p.45), “a interrupção desse processo se deu
com o Golpe Militar de 31 de março de 1964, quando muitos desses
movimentos foram extintos, e seus participantes, perseguidos e exilados”.
Ao tratar “o método de alfabetização de adultos” sistematizado pelo
educador Paulo Freire, Beisiegel (2004) afirma que Freire tinha 15 anos de
4 “Método Paulo Freire” como ficou conhecido, passou a ser utilizado de diferentes maneiras por muitos dos que achavam que a alfabetização deveria ter como ponto de partida a leitura de mundo feita pelos adultos, assim a alfabetização era realizada a partir de palavras geradoras que surgiam de coletas e averiguações realizadas junto aos alfabetizandos.
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experiência acumulada no tocante à alfabetização de adultos tanto em áreas
rurais e áreas urbanas.
Na visão de Freire (1983a, p. 97), era necessário que houvesse em
nosso país:
Uma educação que possibilitasse ao homem a discussão corajosa de sua problemática, de sua inserção nesta problemática, que advertisse dos perigos de seu tempo, para que, consciente deles, ganhasse a força e a coragem de lutar, ao invés de ser levado e arrastado à perdição de seu próprio “eu”, submetido às prescrições alheias. Educação que o colocasse em diálogo constante com o outro, que o predispusesse a constantes revisões, a análise crítica de seus “achados”, a certa rebeldia, no sentido mais humano da expressão, que o identificasse com métodos e processos científicos.
Para explicitar como se caracterizava o método em questão, Freire
(2005, p. 47), afirmou:
Contradizendo os métodos de alfabetização puramente mecânicos, projetávamos levar a termo uma alfabetização direta, ligada realmente à democratização da cultura e que servisse de introdução; ou, melhor dizendo, uma experiência susceptível de tornar compatíveis sua existência de trabalhador e o material que lhe era oferecido para aprendizagem. (...) Pensávamos numa alfabetização que fosse ao mesmo tempo um ato de criação, capaz de gerar outros atos criadores; uma alfabetização na qual o homem, que não é passivo nem objeto, desenvolvesse a atividade e a vivacidade da invenção e da reinvenção, características dos estados de procura... Procurávamos uma metodologia que fosse um instrumento do educando, e não somente do educador, e que identificasse – como fazia notar acertadamente um sociólogo brasileiro – o conteúdo da aprendizagem com o mesmo de aprender.
Sobre a aplicabilidade desta prática educativa, o próprio Paulo Freire
divide o trabalho em cinco fases: a primeira fase diz respeito a um
levantamento das palavras utilizadas no cotidiano das pessoas que se
pretendia alfabetizar através de reuniões e encontros informais. Neste universo
vocabular, “não só se retêm as palavras mais carregadas de sentido existencial
e, por causa disto, as de maior conteúdo emocional, senão também as
expressões típicas do povo: formas de falar particulares, palavras ligadas à
experiência do grupo, especialmente à experiência profissional” (Freire, 2005,
p. 48).
A segunda fase se refere à seleção das palavras, chamadas de palavras
geradoras. A seleção obedece aos seguintes critérios: riqueza silábica,
dificuldades fonéticas e conteúdo prático da palavra, sendo que este último
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implica em procurar o maior compromisso possível da palavra numa realidade
de fato, social, cultural e política, pois para Freire (2005, p.50),
A melhor palavra geradora é aquela que reúne em si a porcentagem mais alta de critérios sintáticos (possibilidade ou riqueza fonética, grau de dificuldade fonética complexa, possibilidade de manipulação de conjuntos de signos, de sílabas, etc.), semânticos (maior ou menor intensidade de relação entre a palavra e o ser que designa). Poder de conscientização que a palavra tem potencialmente, ou conjunto de reações socioculturais que a palavra gera na pessoa que a utiliza.
Esta fase termina com a seleção das palavras geradoras, para ter um
universo linguístico mínimo e estas são escolhidas, conforme Freire (1987, p.
67),
Em função de seu conteúdo pragmático, enquanto signos linguísticos que correspondem a um entendimento comum numa área de uma cidade, numa região de um país. Em função de suas dificuldades fonéticas que devem ser propostas, gradualmente aos alfabetizandos. Escolhidas as 17 palavras geradoras, o passo seguinte será codificar 17 situações familiares aos alfabetizandos. Não será demasiado reafirmar que as palavras geradoras devem ser introduzidas nas codificações de suas dificuldades fonéticas.
Assim, se a palavra favela é uma palavra geradora, a codificação deve
representar aspectos da realidade favelada. A pedagogia que Paulo Freire
defende é concebida na prática como uma pedagogia marcada pela utopia e
esperança, porque, pretendendo estar a serviço da libertação das classes
oprimidas, se faz e se refaz na prática social, “denúncia e anúncio nesta
pedagogia não são palavras vazias, mas compromisso histórico... tomam corpo
quando as classes dominadas os assumem, assim como a teoria da ação
transformadora, se efetiva quando é igualmente assumida por aquelas classes”
(Freire, 1987, p. 70).
A terceira fase consiste na criação de situações típicas do cotidiano dos
sujeitos que estão sendo alfabetizados. São situações problemas e seu
desenrolar alimentava os debates que tendem a conduzir o grupo à
conscientização para que possa alfabetizar-se. São situações locais que
possibilitam uma análise de problemas nacionais e nelas vão sendo colocados
os vocábulos geradores que podem englobar a situação toda ou referir-se a um
dos elementos da situação apresentada.
Na quarta fase, os coordenadores de debates construíam suas fichas
indicadoras, que ajudam os coordenadores de debate no seu trabalho de
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sistematização. Tais fichas são simplesmente subsídios para os coordenadores
e não um relato rígido e fechado.
Na quinta fase, os coordenadores elaboravam fichas com as famílias
fonéticas das palavras geradoras e o material em forma de diapositivos ou
cartazes. A partir deste momento iniciava- se o efetivo trabalho de
alfabetização.
Freire (2005) aponta que a grande dificuldade estava na preparação dos
quadros dos coordenadores, não tanto pela questão técnica ou de
procedimentos, mas, sobretudo na capacidade do diálogo que deve existir
entre os educadores e educandos.
Descrevo também sucintamente a experiência de Paulo Freire vivenciada
no Chile. Conforme o relato de um educador chileno, Guilhermo Willianson
(1996), com a chegada de Paulo Freire naquele país em 1964 para viver como
exilado, uma vez que fora perseguido pelo regime militar, a educação chilena
foi enriquecida por sua crítica à educação tradicional, sendo corresponsável
pelos programas de alfabetização de jovens e adultos e pelo programa de
reforma agrária, uma vez que os camponeses eram envolvidos também no
processo de conscientização de seus direitos.
Freire permaneceu lá até 1969, convivendo e aprendendo com os
educadores daquele país. A sua estadia foi profícua, pois produzia escritos
naquele contexto. Para Willianson (1996, p.186), a obra Pedagogia do
Oprimido,
Implica um avanço em sua elaboração teórica e onde coexistem categorias de origem cristã, por exemplo, a ideia do diálogo e influências marxistas, a noção de classe social e a divisão em opressores e oprimidos. O próprio autor considera que sua obra resulta da radicalização de seu pensamento, produto de dois fatores principais: o distanciamento de seu país e de seus dominantes; a distância crítica de sua prática no Brasil, ao poder analisá-la do exterior; o distanciamento da direita como resultado de sua experiência na prisão; a prática chilena que o radicalizou sem transformá-lo num ‘aventureiro louco’, já que era uma sociedade altamente politizada.
As políticas chilenas implementadas para o setor agrário, a reforma
agrária, a organização dos camponeses e a própria alfabetização de adultos
criaram um espaço político, educativo e cultural muito propício, o que
possibilitou a efetivação do “método Paulo Freire” utilizado pelos camponeses
34
chilenos. De acordo com o autor, “nesse contexto, a proposta metodológica de
Freire, que havia começado a se praticar no Nordeste, pode ser experimentada
em outro contexto histórico e popular, de forma maciça e apoiando o processo
de transformação de uma estrutura agrária arcaica” (Willianson, 1996, p.186).
Para Freire (1987), a experiência do Chile trás à tona a experiência de
camponeses que participavam de problemas de alfabetização em áreas de luta
pela reforma agrária, que escreviam palavras com seus próprios instrumentos
no chão dos caminhos que os conduziam ao trabalho. Segundo o relato de um
camponês chileno, “antes da reforma agrária, meu amigo, disse ele, eu nem
sequer pensava, nem eu nem meus companheiros, porque não era possível,
vivíamos sob ordens. tínhamos apenas que obedecer a elas, não tínhamos
nada que dizer” (p. 73.) Assim, a alfabetização possibilitava uma estreita
vinculação às lutas por democratização no campo e outras lutas populares.
1.3. O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA/SP) no
cenário de alfabetização
As eleições municipais de 1988 apresentaram um novo quadro na maior
cidade do país, São Paulo, quando a assistente social Luiza Erundina, tendo o
advogado Luiz Eduardo Greenhalgh como vice, venceram a disputa pela
Prefeitura da cidade de São Paulo, tendo sido a primeira vez que o Partido dos
Trabalhadores assumia o governo da cidade.
A chegada de Erundina à Prefeitura do município de São Paulo tem sido
objeto de pesquisa de sociólogos, historiadores e outros estudiosos, que em
geral, classificam esta etapa como um acontecimento histórico importante, não
somente pela eleição em si, mas também pelo significado do seu governo.
Para Abbonízio (2007), desde o acontecimento do golpe militar de 1964,
com exceção de Mário Covas, todos os prefeitos nomeados pelo governo
estadual representavam setores conservadores. Com o retorno das eleições
diretas, a população da cidade de São Paulo elegeu Jânio Quadros em 1985,
aliás, o mesmo havia sido o primeiro prefeito eleito em 1953, durante o
intervalo democrático de 1945-1964. Na sucessão municipal de 1988, o
candidato que esteve à frente nas pesquisas de opinião era Paulo Maluf,
representante dos setores também conservadores, porém, nas semanas que
35
antecederam as eleições ocorreu uma virada na intenção do eleitorado, sendo
eleita Luiza Erundina de Souza. Oriunda das classes populares, nordestina,
assistente social e atuante nos movimentos sociais, havia trabalhado como
alfabetizadora de adultos e passou a representar a possibilidade de construção
de um governo popular, baseado na aliança do Partido dos Trabalhadores (PT)
com a classe trabalhadora, os movimentos sociais, os intelectuais de esquerda,
os sindicatos e os setores progressistas da Igreja Católica e das oriundas do
Protestantismo histórico.
A participação popular tornou-se a marca adotada na administração da
Prefeitura de São Paulo nos anos 1989-1992, conforme uma das diretrizes que
consta no documento da Prefeitura Municipal de São Paulo, do chamado
governo popular e democrático que tinha como meta, “estimular a criação de
canais democráticos institucionais, que possibilitem à população se
apropriarem efetivamente das informações, através de um processo educativo,
dirigido à produção de decisões sobre a totalidade das problemáticas da
cidade”(PMSP 1990,p.2). A gestão possibilitou a implantação de instrumentos
de participação popular, introduzindo novos atores no processo decisório,
respeitando a autonomia dos movimentos sociais e abrindo canais de
participação da população e fortalecendo a democratização das informações.
Neste cenário de fortalecimento das forças populares, de uma proposta
política que resgatava a participação da sociedade civil, e, sobretudo, com a
indicação do educador Paulo Freire para a Secretaria da Educação Municipal,
houve o início de um processo que culminou na criação do movimento de
alfabetização em parceria com os movimentos sociais, chamado de Movimento
de Alfabetização de Jovens e Adultos (MOVA/SP). Inicialmente, segundo
Gadotti (2001), sob a coordenação do também educador Pedro Pontual, em
estreita colaboração com os movimentos populares ligados à alfabetização de
adultos, criando-se assim o Fórum dos Movimentos Populares de Alfabetização
de Jovens e Adultos, como tratarei adiante.
A escolha de Paulo Freire como Secretário Municipal da Educação,
representou um marco importante, simbolicamente refletia o anseio de
mudanças que os educadores progressistas esperavam. Na compreensão de
Gadotti (1992), esta novidade correspondia às expectativas da militância
petista e dos aliados, respondendo positivamente à unanimidade de setores da
36
educação. Sua trajetória estava ligada não somente à valorização da educação
para todos, mas em particular à educação de jovens e adultos e à atuação da
sociedade civil na denominada educação emancipatória, imbuída na
construção de uma educação libertadora, visando a contribuir para a
transformação social.
A pesquisadora Abbonizio (2007) aponta que quando Luiza Erundina
assumiu a Prefeitura de São Paulo, em 1989, o atendimento voltado à
educação de jovens e adultos em fase de alfabetização ocorria no âmbito do
Programa Educação de Adultos (EDA), que estava vinculado à Secretaria do
Bem Estar Social. O processo de mudança da responsabilidade da questão da
alfabetização desta Secretaria para a Educação transcorreu a partir de muitos
debates, um momento importante deste diálogo ocorreu com a realização do I
Simpósio de Educação de Jovens e Adultos em 1º de abril de 1989, em que se
tirou um fórum permanente das entidades de alfabetização de adultos,
diferentemente do programa coordenado pela Secretaria do Bem Estar Social.
Assim, a Secretaria da Educação estreitou a relação com os movimentos
populares ligados a alfabetização de jovens e adultos, em que se observou que
existiam diversas experiências bem sucedidas neste campo, o que ajudou no
processo de construção do MOVA/SP.
Para exemplificar este processo de mudança estrutural que começou a
ser colocado em prática, damos voz ao próprio Freire (2001, p.80), quando
definiu o programa de formação permanente dos professores e educadores e o
programa de alfabetização de jovens e adultos como sua prioridade mais
importante:
O educador é o sujeito da sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la através da reflexão sobre o seu cotidiano; a formação do educador deve ser permanente e sistematizada, porque a prática se faz e refaz; a prática pedagógica requer a compreensão da própria gênese do conhecimento, ou seja, de como se dá o processo de conhecer... Esse programa de formação dos educadores teve como eixos básicos: a fisionomia da escola que se quer, enquanto horizonte da proposta pedagógica; necessidade de suprir elementos de formação básica aos educadores nas diferentes áreas do conhecimento humano; a apropriação pelos educadores dos avanços científicos do conhecimento humano que possam contribuir para a escola que se quer.
37
Em 19895, em regime de parceria entre a PMSP e os movimentos de
alfabetização, nascia o MOVA/SP. Ao tratar da criação do MOVA/SP como um
programa que resgatava a cidadania dos mais pobres e excluídos, Freire
(2005, p. 10) apontava:
Sim, nós criamos o MOVA, Movimento de Educação de Adultos de São Paulo. Mas, com uma diferença do que se fez em 63. Nós partimos do respeito absoluto aos movimentos populares. Então, nós fizemos convênios com os movimentos populares da periferia de São Paulo, mais de cento e cinquenta movimentos, assinamos convênio com cada uma dessas sociedades e repassamos as verbas para elas capacitarem seus educadores. Criamos um Conselho formado por eles e por nós, uma espécie de órgão pensador da política de educação. Nós trabalhamos seguindo muita gente, não necessariamente Paulo Freire, nem João, nem ninguém. A exigência é que fosse aplicada uma pedagogia progressista. O que importava era saber se o educador tinha uma cultura dialógica e aberta, respeitosa com o povo. No fundo, cada educador é um método. Não tem que estar bitolado.
Assim, o MOVA/SP origina-se a partir dos grupos populares que
desenvolviam trabalhos de alfabetização e, juntamente com outros setores -
Universidades e Igrejas criaram 2000 núcleos para atender 60.000 pessoas. Os
objetivos eram: reforçar e ampliar o trabalho dos grupos populares que já
trabalhavam com a questão, possibilitar aos educandos uma leitura crítica da
realidade, desenvolver a consciência política e reforçar o incentivo à
participação popular e à luta pelos direitos sociais do cidadão.
O educador Pontual (apud Macena 2009, p. 6) ajuda a compreender em
que contexto o MOVA/SP tem o seu surgimento, ao afirmar:
Quando Paulo Freire assumiu a Campanha Nacional de Alfabetização no Ministério da Educação no Governo João Goulart, ele afirmou que aquela experiência deveria ser conhecida, mas nunca ser levada como modelo, porque como o próprio Paulo Freire dizia as condições históricas de 64 para 89 eram outras, a época era de Ditadura Militar. Houve diversas mudanças; tivemos um início de um processo de democratização, alterações no plano econômico social, cultural. Já a conjuntura em que nós assumíamos o Governo da Cidade de São Paulo em 1.989 era outra e por isso, o MOVA tinha que ser pensado, com originalidade, tinha que ser pensado ‘inventivamente’ como gostava de dizer Paulo Freire, de acordo com a leitura da realidade daquele momento e das necessidades que justificavam a existência do MOVA.
Quando o MOVA/SP foi criado, havia uma estimativa de cerca de um
milhão de jovens e adultos sem escola e dois milhões e meio de jovens e
adultos com menos de quatro anos de estudo. O Documento “O que é o
5 Conferir ANEXO A, Decreto Municipal da criação do MOVA/SP.
38
MOVA/SP” (PMSP/SME (1989) apresenta o analfabetismo como fruto da
distribuição desigual de renda no país, pois, temos uma agenda de governo
não comprometida com as necessidades sociais e econômicas da população,
em seu sentido amplo, restringindo-se às questões formais da democracia
política.
Ao analisar o referido Documento, Abbonizio (2007) afirma que o
governo municipal assume a tarefa, naquele momento, de tornar-se promotor
de políticas públicas de caráter popular, com disposição para reparar um direito
historicamente negado de acesso à educação das populações excluídas,
situadas principalmente nas periferias da cidade,
Posiciona-se, portanto como uma administração que promoverá acesso aos bens materiais e aos bens culturais à população pobre, uma vez que esses bens só são acessíveis e desfrutáveis pela classe dominante. O pacto para o enfrentamento do analfabetismo na cidade de São Paulo realizado junto aos movimentos populares denota a opção política feita pela Secretaria. Não há menção, neste documento, à participação de universidades, tampouco de empresas. Aqueles que compartilharão junto à Prefeitura a tarefa de alfabetização dos adultos são os mesmos agentes confrontadores e pressionadores dos governos, ou seja, são aqueles que, ao mesmo tempo em que levantam a bandeira da eliminação do analfabetismo e da insuficiência de políticas públicas para esse setor, realizam trabalhos de alfabetização em suas comunidades (Abbonízio 2007, p, 44).
Para Torres, (2001) o surgimento do MOVA/SP é uma experiência
interessante, pois possibilitou a parceria entre movimentos sociais que lutaram
pela defesa da mulher, da moradia, da alfabetização de jovens e adultos em
conjunto com a Secretaria de Educação, apontando “a presença simbólica e
prática de Paulo Freire à frente de uma equipe na Secretaria da Educação”
(p.26).
Observa-se que a criação deste projeto de educação não tinha como
objetivo simplesmente o resgate de suprir as dificuldades da não alfabetização,
do ensinar a leitura e a escrita, mas eram outras questões de cunho social e
político que estavam colocadas naquela conjuntura. A educadora Kunrath
(2006) evidencia que a denominação de movimento de alfabetização, “traz em
si a noção de mobilização, engajamento dos grupos organizados da sociedade
civil, do constante movimento de participação dos grupos que desenvolvem
alfabetização de jovens e adultos” (p. 4).
39
Quando o MOVA/SP foi criado, a PMSP/SME (1989, pp.9-10) tinha este
objetivo geral:
Possibilitar ao educando jovem e adulto o processo construtivo de ampliação do próprio conhecimento através da intervenção sistemática do educador e a vivência com os colegas, numa relação dialógica. Sendo assim, na formulação dos princípios e diretrizes metodológicos não poderão faltar os subsídios da educação libertadora, do modelo construtivista-interacionista do conhecimento e dos modernos estudos sobre a linguagem.
A proposta do MOVA/SP foi pensada como uma grande parceria entre a
sociedade civil organizada e o poder público, o que implicava em objetivos
comuns e divisão de responsabilidades. Para favorecer o diálogo das entidades
conveniadas com o Poder Público, garantindo uma participação efetiva dos
envolvidos no processo de alfabetização foi criado o Fórum Geral dos
Movimentos de Alfabetização. Segundo Pontual (1996), a criação deste fórum
ocorreu no Simpósio de Educação de Jovens e Adultos, organizado pela
Secretaria Municipal de Educação em 01 de abril de 1989, quando se entendeu
a importância da instância do Fórum para representar os movimentos de
alfabetização de toda a cidade, como espaço de discussão de
encaminhamentos sobre a construção e o funcionamento do MOVA/SP. Para o
melhor funcionamento desta instância, decidiu-se pela necessidade de criar os
Fóruns Regionais e assim passaram a existir também os Fóruns
regionalizados: Região Sudeste, Região Sul, Região Norte, Região Leste 1 e
Leste 2, Região Centro e Região Oeste.
O Fórum MOVA era a arena onde Secretaria Municipal e Movimentos Populares construíam suas relações. O maior limite deste Fórum era a dificuldade na constituição de um espaço de negociação horizontal e ou de deliberação conjunta sobre todas as questões que envolviam a parceria. O processo lento de tomada de decisões contrariava a todos, secretaria e entidades conveniadas. Por parte da Secretaria, as questões administrativas corriam com pouca agilidade por conta do ordenamento jurídico e pouco permeável. Do lado dos movimentos populares, o processo amplo e demorado de consultas, que o próprio movimento exigia para a tomada de decisões, também tornava o processo moroso. Acrescenta-se a isso o fato de algumas entidades tomarem uma postura passiva em relação às determinações da secretaria (Pontual, 1996, p. 131).
No Fórum Geral dos Movimentos, aprovou-se a Carta de princípios do
MOVA/SP que aponta as diretrizes do programa, no que se refere à linha
40
político-pedagógica como na questão da parceria entre a municipalidade e os
movimentos de alfabetização6.
Esta parceria é enaltecida por outro educador, ao referir-se à questão,
Gadotti (2001), afirma que o MOVA/SP é um dos raros exemplos de parceria
entre a sociedade civil e o poder público, acrescentando que essa relação nem
sempre é harmoniosa, pois as tensões e conflitos fazem parte do processo e
torna-se uma condição necessária para um trabalho que é fruto de uma
construção. Ele assinala que o MOVA/SP não impôs uma única orientação
metodológica, pois o método Paulo Freire procurou, antes, garantir o pluralismo
com uma condição: não aceitar métodos pedagógicos anticientíficos e
filosóficos autoritários ou racistas. A concepção que prevaleceu no desenvolver
das experiências do MOVA/SP foi à concepção libertadora de educação.
Gadotti (2001) acentua que o que estava sendo feito não se confundia
com as campanhas de alfabetização, pois as experiências fracassadas de
muitas campanhas de alfabetização que aconteceram na América Latina e no
próprio Brasil levou a evitar o termo “campanha”, acrescentando assim a
palavra “continuidade” e “movimento em processo”, sendo construída, por isso
a ideia de fazer com que o MOVA/SP se tornasse uma política educacional e
não simplesmente um programa de um determinado governo que é sempre
passageiro.
Portanto, o MOVA/SP pode ser caracterizado como um referencial no
processo de alfabetização de jovens e adultos da cidade de São Paulo, pois ao
longo de décadas este movimento tem se consolidado nos diferentes bairros da
cidade, apresentando-se como um movimento que acontece nas bases
populares, é o que pode ser confirmado na compreensão de Ribeiro (2009),
quando acentua que com a Constituição Federal de 1988 e o fim da Fundação
Educar, o Ministério da Educação desobriga-se de atender o direito de ensino
fundamental de adultos, repassando tal responsabilidade aos municípios e aos
estados. Neste contexto, surgem diversas experiências voltadas à
alfabetização e sob a orientação dos próprios municípios em parceria com as
universidades, ONGS e os movimentos populares. Um destaque dessa
realidade é a experiência do MOVA/SP. Apresento a seguir, como este
6 Ver ANEXO B sobre a parceria entre o município e o MOVA/SP.
41
programa foi sendo assimilado até tornar-se posteriormente numa política de
governo municipal, dentro das tensões e dificuldades que fazem parte de sua
trajetória.
Segundo Pontual (1996), o MOVA/SP sofre um grande abalo com a não
continuidade do PT no governo da cidade de São Paulo. No ano de 1993, com
a eleição de Paulo Maluf e posteriormente Celso Pitta em 1997, a parceria da
Prefeitura com a sociedade civil foi extinta enquanto programa ligado à
Secretaria de Educação. Houve a substituição do MOVA/SP por outro projeto
de alfabetização, com novas parcerias, não mais com as ONGs, e sim, com os
empresários da construção civil, lançando mão de metodologias e concepções
pedagógicas diferentes das aplicadas até então. Tal ação municipal passou a
se chamar de Programa Municipal de Alfabetização de Jovens e Adultos,
(PROALFA). Ocorreu um verdadeiro desmonte e desconstrução do MOVA/SP.
Este novo programa municipal funcionou com apenas sete classes durante o
ano de 1994 e previa mais oito classes no ano seguinte, conforme Pontual
(1996), enquanto o MOVA ao longo deste mesmo período, garantiu pelo menos
200 núcleos funcionando, dos mil núcleos existentes durante o governo
Erundina.
O próprio movimento de alfabetização fez uma autocrítica quando
observava que durante o período em que a parceria com a Prefeitura estava
garantida, não se conseguiu estruturar de forma a garantir mecanismos
legislativos e jurídicos para que o MOVA tivesse sua continuidade e
principalmente a relação de parceria entre estado e sociedade.
O MOVA/SP passa por oito anos de árduos trabalhos para manter-se em
ação. Na avaliação de Kunrath (2006), neste período, buscaram-se alternativas
de financiamento e subsistência, porém, o número de classes e de educandos
diminuiu significativamente. As ONGs buscam dirigir a própria formação dos
educadores, o planejamento das atividades didáticas e a elaboração da
proposta político-pedagógico.
Algumas ONGs vinculam-se aos Institutos tais como o Instituto Brasileiro
de Estudo e Apoio Comunitário (IBEAC) e outras, com universidades
executoras do Programa de Alfabetização Solidária e o voluntariado. Conforme
o relato da coordenadora do Fórum Municipal do MOVA/SP, Iraci Ferreira Leite,
(apud Macena 2009): “Paulo Freire desejava que nos núcleos do MOVA fosse
42
desenvolvida uma pedagogia progressista baseada no diálogo. É com esse
espírito que continuamos no MOVA. Apesar do governo Maluf e Pitta terem
acabado com o programa, mas não com o nosso trabalho, que permaneceu
com ou sem ajuda financeira” (p.10).
Um dos espaços de formação para educadores e coordenadores de
jovens e adultos de 1994 a 2001 foi oferecido pela Associação Católica do
Brasil do Departamento de Educação Popular sendo que os encontros
aconteciam mensalmente com duração de 8 horas e era aberta a toda cidade.
Descrevo o relato de Villaseñor 7 sobre sua atuação como educador do
MOVA/SP durante a gestão de Erundina, e, em continuidade, como voluntário
no governo Paulo Maluf:
A minha experiência no MOVA como educador começou na comunidade de Heliópolis em julho de 1992 e foi até novembro de 1995 através da União dos Núcleos e Associações do Heliópolis (UNAS). Que no começo era conveniada com a Prefeitura do Município de São Paulo; convênio encerrado em dezembro de 1992, ao término do mandato da prefeita Luiza Erundina. Quando Paulo Maluf assumiu a prefeitura de São Paulo, um dos primeiros atos do governo foi acabar com as políticas públicas que combatiam a exclusão social, encerrando toda e qualquer iniciativa popular da administração anterior, entre elas estava o MOVA. Sem convênio com o governo foi tudo mais difícil, mas houve continuidade dos trabalhos de educação popular da maioria dos educadores, agora sendo realizado como voluntários da comunidade... as dificuldades com a falta de material pedagógico, infraestrutura, entre outros, aumentaram, mas a vontade política da comunidade e dos educadores de erradicar o analfabetismo e de construir uma sociedade mais justa e fraterna continuou firme. A minha experiência de voluntário durante três anos (1993-1995) na educação popular de Alfabetização de Jovens e Adultos no Heliópolis foi muito gratificante, porque muitas pessoas que entravam no programa sem saber ler e escrever, concluíram o ensino fundamental e alguns até fizeram uma qualificação profissional ou faculdade. Foi uma bonita experiência de troca de conhecimentos, os adultos aprendiam com a gente e nós aprendíamos com eles (2001, p.1).
Veremos mais adiante que a experiência do MOVA/SP inspirou a
construção de tantos outros movimentos de alfabetização que se constituiu nos
estados e municípios brasileiros, com características próprias, porém mantendo
a proposta político-pedagógica de educação popular emancipadora e
libertadora.
7 Rafael Lopes Villaseñor é padre da Congregação dos Missionários Xaverianos e atua na zona leste, periferia da Cidade Tiradentes. É mestre em Ciências da Religião pela PUC/SP e doutorando em Ciências Sociais também pela PUC/SP. Atuou como educador do MOVA/SP por vários anos no Heliópolis; e como animador e incentivador em Guaianases.
43
1.4. A Retomada do MOVA/SP como programa da Secretaria Municipal de
Educação da Prefeitura de São Paulo
Na gestão de 2001 – 2004, o PT volta à administração da capital
paulista, neste período, as ações de escolarização para jovens e adultos
compreenderam: os cursos de Educação de Jovens e Adultos – EJA para o
ensino regular e Suplência, o programa Centro Integrado de Educação de
Jovens e Adultos – CIEJA e a reconstrução do MOVA/SP, que ocorreu quando
representantes dos movimentos de alfabetização do Fórum do MOVA/SP,
procuraram a nova Secretaria de Educação da então Prefeita Marta Suplicy
para propor o resgate da parceira com os movimentos de alfabetização de
jovens e adultos, retomada em setembro de 2001.
Assim, segundo Kunrath (2006), a operacionalidade do programa ficou a
cargo das organizações conveniadas que organizam as classes de
alfabetização, seguem o termo de convênio, que determina um número mínimo
de 20 educandos matriculados e frequência mínima diária de 15 educandos. A
idade para frequentar uma sala do MOVA/SP é de 14 anos em diante. Definiu-
se também que as atividades aconteceriam quatro vezes por semana, ficando
as sextas-feiras para a formação pedagógica com os educadores e
coordenadores.
Os educadores são denominados de monitores oficialmente para que
não haja implicância jurídica, pois a remuneração não segue o piso da
categoria profissional, uma vez que a proposta era o repasse de R$ 600,00 por
sala, deste montante é tirado uma ajuda de custo ao alfabetizador. Tal
nomenclatura é utilizada em documentos, porém no cotidiano do MOVA/SP
utiliza-se a denominação educador.
Assim como na sua primeira versão oficial, na reconstrução do
programa, privilegiou-se os espaços de participação e autonomia do
movimento de alfabetização, bem como da própria Secretaria, quando se
reorganizou o Fórum Municipal do MOVA/SP e os Fóruns Regionais. Para
Kunrath (2006), o Fórum Municipal foi a instância de negociação e diálogo
permanente entre o movimento e a SME. As plenárias aconteciam com o
objetivo de articulação, planejamento, participação e avaliação das práticas e
experiências quanto ao cotidiano, às questões pedagógicas; e a formação dos
44
educadores e coordenadores, geralmente ocorria a cada três meses. Foram
também reeditados os Fóruns Regionais divididos em sete espaços de
discussão para possibilitar o diálogo com as Coordenadorias de Educação, que
representavam os interesses da Secretaria.
Os locais de funcionamento das salas e dos núcleos situam-se o mais
próximo possível da residência dos educandos, dos salões de Igrejas, quer
Católica ou Evangélica ou dos Centros Espíritas, garagens, sedes de ONGs ou
outros espaços. A maioria desses espaços está localizada nas periferias, nos
bairros, nas favelas, em comunidades onde as escolas não conseguem atender
os educandos.
Na avaliação de Abbonizio (2007), houve uma significativa ampliação
dos convênios e dos números de educandos atendidos: o ano de 2002 encerra-
se com 899 turmas de alfabetização funcionando, no ano seguinte passa-se a
1144 e em 2004 atinge-se 1170 turmas, com 24.609 educandos matriculados.
Com a mudança de gestão na cidade de São Paulo em 2005, quando
José Serra assumiu a Prefeitura da cidade de São Paulo, novamente o
MOVA/SP enfrenta dificuldades, porém manteve-se o programa e a parceria da
municipalidade com a sociedade civil, não com todo o estímulo anterior. Esta
continuidade tornou-se possível pela força e pressão do Fórum Municipal do
MOVA/SP e dos Fóruns Regionais organizados nas diferentes regiões da
cidade. Por conta das dificuldades enfrentadas pelo MOVA/SP, os movimentos
sociais ligados à questão da alfabetização e educação popular 8, segundo
relato de Abbonízio (2007, p. 80),
Organizaram um ato público pró-MOVA/SP em 29 de junho no primeiro ano de governo Serra em frente à Câmara dos Vereadores de São Paulo. No mesmo dia, alguns integrantes do Fórum Municipal foram recebidos por representantes da atual administração, que se comprometeram em não deixar nenhum aluno do MOVA/SP sem aula, mediante o remanejamento das salas já existentes e com poucos alunos ou pelo encaminhamento dos alunos desalojados para as escolas da rede pública municipal.
Graças ao acúmulo histórico do MOVA/SP que foi consolidando sua
atuação nas diferentes regiões da cidade de São Paulo, sua força mobilizadora
e de pressão popular, o governo municipal sancionou a lei 14058 de 11 de
8 Ver ANEXO C, sobre o Ato Pró Mova ocorrido em 29 de junho de 2005.
45
outubro de 2005, quando o MOVA/SP tornou-se um programa de alfabetização
permanente no município de São Paulo.
O educador Pontual, (apud Macena 2009), contribuiu neste resgate
histórico do nascimento e desenvolvimento do MOVA/SP e também apontou
alguns desafios considerados importantes na atual conjuntura. Ele afirma que a
sociedade passou por uma mudança significativa nestes últimos 20 anos,
destacando a realidade do mercado de trabalho, o desemprego, o surgimento
de novas formas de geração de trabalho e renda, o que exige associar os
programas de alfabetização e pós-alfabetização a um programa e qualificação
profissional para esta nova realidade. Ele acentua, também, as mudanças no
campo da tecnologia, da informação, da Internet e da difusão do conhecimento,
o que permite dialogar e pensar, por exemplo, na necessidade da inclusão
digital e do acesso às redes que criam múltiplas possibilidades de
conhecimento, e, sobretudo, na necessidade de associar este movimento a um
conjunto de ações e de programas culturais que permitam fazer do MOVA/SP
um espaço também de constituição e reconstituição permanente dos setores
populares.
1.5. O MOVA/SP se expande em outras cidades e estados do Brasil
MOVA/BRASIL
O MOVA se move em Brasília, Tentando encontrar o
caminho Para
existir, Enquanto possível, Mas, na verdade querendo, Nem ter existido, Porém, são tantos os desafios a cumprir, Desafio não só de letrar, Mas. Sim de permitir a leitura do mundo, Para que este letrado possa o mundo de fato mudar, Surgem sempre outros não saberes, Que existem ou exigirão outros MOVAs. E estes MOVAs dir-se-ão presentes, No ato, na luta de ensinar a construir, Um mundo onde não haja exclusão, Para que não seja necessário o MOVA, Ou outro MOVA haver, Só não precisaremos de MOVA, Quando não o letramento, Quando não o pão, Quando a cultura de um ser,
46
Não seja diferença a se ver, E não faça diferença nenhuma Quando o acesso à informática, Seja a necessidade de alguém, Só não precisaremos de MOVA, Quando a liberdade e a igualdade, De fato no mundo existir.
(Sandice, Anesino, 2009, p.226). Desde sua gênese o MOVA/SP teve grande repercussão tanto no
município de São Paulo, como em outras localidades do estado e em outros
estados. Sua proposta de fortalecimento dos movimentos populares e sua
contribuição no combate ao analfabetismo e na construção de uma sociedade
cidadã que possibilita aqueles aos quais é negado o direito à educação e à
leitura do mundo são consideradas marco na educação de jovens e adultos.
A experiência do MOVA/SP mobilizou movimentos que trabalhavam a
questão da alfabetização de adultos, educadores populares, grupos,
associações, organizações comunitárias nos mais diferentes estados
brasileiros, o que fez surgir o Projeto MOVA/Brasil.
Segundo Santos (2010), o Projeto MOVA/Brasil foi elaborado levando
em consideração os princípios do Movimento de Alfabetização de Jovens e
Adultos (MOVA/SP). A referência de Paulo Freire foi seguida e continua sendo
importante em muitas cidades e bairros do país, associando o governo local, as
organizações não governamentais e os movimentos sociais. Assim o MOVA/SP
foi inspirando organizações que acrescentavam o nome da cidade ou estado,
como por exemplo, MOVA/Porto Alegre, MOVA/RS ou identificando um
conjunto de municípios, como MOVA/ABC (região da Grande São Paulo). Ao
referir-se a um conjunto de estados, aplicou-se o nome MOVA/Brasil. A história
deste projeto ocorre,
Desde 2001, com o objetivo de fortalecer o trabalho de alfabetização e da
EJA, os educadores que participam dos programas de alfabetização e que
comungam dos mesmos objetivos vêm se organizando por meio da Rede
MOVA/Brasil. O Projeto MOVA/Brasil faz parte da coordenação dessa
rede, por meio de representantes das regiões Nordeste e Sudeste, e está
sempre presente nos Fóruns Sociais Mundiais, Fóruns Mundiais de
Educação e Fóruns sociais Brasileiros (Santos 2006, p.11).
O MOVA/Brasil como projeto nacional foi organizado em três fases e
está em curso uma quarta fase como descreve Santos (2006, p. 12):
1º Fase (agosto de 2003 a outubro de 2004): o projeto foi aplicado em cinco estados: Bahia, Ceará, rio Grande do Norte, Rio de Janeiro com
47
12.167 inscritos. A 2º Fase (novembro de 2004 a julho de 2005): envolveu seis Estados: Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Sergipe. Nessa fase foram inscritos 14.440 educandos. A 3ª fase (agosto de 2005 a agosto de 2006) aplicados nos seis estados da fase anterior: Bahia, Ceará, Rio Grande do Norte, rio de Janeiro, São Paulo e Sergipe, com 23.301 alunos inscritos. Em 2006 iniciou-se um novo convênio (4º Fase do projeto) cujos objetivos é a integração do Projeto MOVA/Brasil e fomento ao cooperativismo (Movimento Nacional dos Catadores de Resíduos Sólidos). Nessa fase, participam os seguintes Estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Sergipe, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba e Alagoas. As metas são: atender 25.000 alfabetizandos, com início em agosto de 2006 e com 1000 turmas distribuídas nos estados; realizar a formação inicial e continuada de 75 coordenadores (polos e locais) e 1000 alfabetizadores.
O MOVA/Brasil tem contado com diferentes parcerias governamentais
ou outras instituições que trabalham com a questão da alfabetização de jovens
e adultos, as principais são com a Petrobrás, com a Federação Única dos
Petroleiros e o Instituto Paulo Freire. Estas parcerias ocorrem em nível nacional
e são reproduzidas e ampliadas nos estados e municípios onde são
desenvolvidas as ações contando com a participação de entidades, governos
locais e sindicatos que ajudam na concretização dos objetivos traçados,
possibilitando a cessão do espaço físico, a composição dos coordenadores e
educadores e o custeio das atividades de formação e funcionamento dos
grupos de alfabetização.
48
CAPÍTULO II
PROPOSTA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DO MOVA/SP:
PRESSUPOSTOS POLÍTICOS E PEDAGÓGICOS E SUA
EXECUÇÃO.
2.1. Análise do Projeto Político-Pedagógico do MOVA/SP
Como ponto de partida deste tópico que tratará da formação continuada
de educadores do MOVA/SP, enfatizo a compreensão de Tardif (2002), quando
aborda que são muitos os momentos formativos que mobilizam os educadores,
tais como: os saberes que são adquiridos ao longo da vida em outros espaços
formativos como a experiência familiar, profissional, fruto da participação social,
religiosa, política e cultural.
Neste sentido, torna-se necessário valorizar os mais diversos momentos
de formação. Brandão (2003) acentua a necessidade da mobilização dos
educadores populares em buscar a formação permanente também nos outros
movimentos sociais que, do mesmo modo, cultivam a dimensão formadora e
transformadora.
Na Carta de Princípios de Parceria do MOVA/SP, conforme o Fórum
Municipal do MOVA/SP (1990, p.1-2), definiu-se a necessidade de uma
parceria efetiva entre a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo e o
Fórum dos Movimentos de Alfabetização, quando se afirmou que:
A linha político-pedagógica do MOVA/SP será objeto de elaboração conjunta pela Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, resguardando a estes últimos a liberdade de adequarem tais propostas em sua realidade específica. O mesmo se aplica à elaboração de material didático, pedagógico e metodológico. Liberdade para que os movimentos escolham seus monitores e supervisores, de tal modo que sejam preservados os princípios centrais do projeto político-pedagógico estabelecido em conjunto pelos movimentos e pela Secretaria Municipal de Educação. Eventuais casos que se chequem frontalmente com tais princípios serão objeto de parecer por parte da Secretaria Municipal de Educação quando dos cursos de capacitação, pareceres estes que serão encaminhados às entidades em questão para sua auto avaliação e decisão (...) assegura-se a autonomia aos movimentos quanto à realização de debates, programas de formação específicos e atividades paralelas. Parceria também na formação dos monitores:
49
os movimentos desejam participar ativamente, com o corpo e com a cabeça, na formação de seus monitores, e desejam, portanto que seja criado mecanismo de parceria com a SME para os trabalhos pedagógicos de formação dos monitores. Os movimentos desejam garantir os princípios da educação crítica, participativa e libertadora independentemente da atual administração, tendo em vista sua compreensão de que o MOVA-SP nasce na atual gestão, mas que deverá existir e crescer independentemente dela.
Conforme Santos (1996), na proposta de parceria entre a SME e os
movimentos sociais ligados à alfabetização deve haver clareza quanto ao
campo específico de ação de cada ator social, algumas vezes os dois campos
se complementam. Assim, cabia ao governo apoiar financeira e materialmente
os grupos populares, fomentar novos núcleos de alfabetização onde não
existiam e auxiliar na elaboração da orientação político-pedagógica,
possibilitando também a formação para os educadores envolvidos. Já ao
movimento compete pensar e realizar a ação alfabetizadora.
O referido autor entende que os movimentos sociais que já trabalhavam
à alfabetização de jovens e adultos exerciam uma prática educativa dentro das
características da educação libertadora, em que as palavras política e
pedagogia estavam associadas, tal união deixava clarividente que todo ato
pedagógico é também um ato político, sendo desnecessária a dissociação
entre educar e conscientizar, assim,
Numa relação dialógica definiram os diversos itens a serem aprofundados para explicitar a concepção de educação, a saber: que ser humano pretendia educar; que visão da Teoria do Conhecimento adotar; qual a função do educador; como o educando é visto nesse processo; e por fim, qual o conceito de alfabetização. Outra preocupação dos integrantes do MOVA/SP foi estabelecer as diretrizes sobre o processo metodológico de alfabetização. Nesse sentido, a preocupação dos parceiros era de concretizar da maneira mais clara possível uma metodologia que fosse coerente com os princípios adotados. Assim, refletiram e apontaram caminhos sobre os seguintes pontos: começar a alfabetização priorizando a produção de textos coletivos, explicitando os diferentes níveis de conhecimento da leitura e escrita apresentadas pelos alunos adultos respeitando as variedades linguísticas existentes. Foi a elaboração da metodologia concatenada com os princípios político-pedagógicos que propiciaram um novo fazer educativo construído pelos educadores das entidades e da SME na relação de parceria (Santos, 1996, p. 37-38).
Quanto à concepção metodológica que o Projeto político-pedagógico tem
explicitado desde a origem do MOVA/SP, apresenta-se como o seu ponto de
partida a prática concreta do educando, pois para Ferreira (1996) é a partir das
necessidades práticas que se motiva a busca do conhecimento teórico, o que
supõe a identificação dos fatos e situações significativas da realidade imediata.
50
Num segundo momento teoriza-se sobre a prática, indo para além das
aparências imediatas através da reflexão, do estudo, da discussão, do estudo
crítico, buscando conhecer melhor o tema problematizado e num terceiro passo
voltar à prática para transformá-la, apropriando-se de referenciais teóricos mais
elaborados e agindo de maneira mais eficaz. A mesma autora afirma que:
É fundamental ao educador, buscar o aprofundamento do próprio referencial teórico atual, fazendo a leitura do mundo e dos textos, como diz Paulo Freire: adicionando novas informações, com estudo, pesquisa bibliográfica e de campo, discussões, confrontando as teorias dos diversos autores, confrontando a nossa própria teoria com a teoria dos colegas e dos autores dos livros. Num processo ativo, construtivo, crítico e criativo vamos formando a nossa própria síntese, um novo referencial teórico integrado e coerente... portanto, a teorização não é um processo de imposição de ideias alheias ou do pensamento já elaborado por especialistas e cientistas renomados. Por outro lado, a teorização não é um processo meramente pessoal. É ao mesmo tempo pessoal e coletivo (Ferreira, 1996 p.53-54).
Passo a elucidar aspectos importantes do Projeto Político Pedagógico,9
que a Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, em parceria com os
movimentos de alfabetização e com o Fórum MOVA/SP construíram em 2001
na ocasião da retomada do MOVA/SP como um programa do governo
municipal, quando ocorreu a eleição da Prefeita Marta Suplicy. A PMSP/SME
(2001, p.1) declara suas ideias, afirmando seu compromisso:
A cidade de São Paulo convive hoje com um processo de empobrecimento crescente de seus habitantes, com o desemprego que se torna estrutural com índices de violência, com as sequelas da corrupção, o desrespeito aos direitos dos trabalhadores a um salário digno, à saúde, ao lazer. E, par agravar, enfrenta uma situação de escolaridade bastante deficiente e um alto índice de analfabetismo absoluto e funcional.
O projeto pedagógico afirma também a importância dos educadores
populares em chegar onde os jovens e adultos mais precisam, fortalecendo os
movimentos onde atuam e impetrar o mais próximo da população graças à
capilaridade desses núcleos. Estas considerações são fundamentais para o
poder municipal, pois a parceria com os trabalhadores populares de educação,
desde os tempos de Paulo Freire muito contribuem para que o MOVA/SP
aconteça.
9 Conferir ANEXO D na íntegra sobre o Projeto Político-pedagógico elaborado pela PMSP/SME em
2001.
51
O MOVA/SP definiu seus objetivos gerais com o propósito de colaborar
com o poder público na tarefa de diminuir o analfabetismo, e ser um programa
de participação popular, conforme a descrição do Projeto Político pedagógico:
Contribuir com o poder público na diminuição do analfabetismo no município de SP, em consonância com as diretrizes e eixos norteadores da política educacional de educação, a saber: qualidade social da educação, democratização da gestão e democratização do acesso e permanência; contribuir par o pleno desenvolvimento da pessoa humana; Diminuir o índice de analfabetismo na cidade de São Paulo; desenvolver a cidadania ativa como participação na vida social, econômica, política e cultural da sociedade; interpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos ou privados, atendendo a diferentes intenções e situações de comunicações (PMSP/SME, 2001, p. 4).
Ao descrever a metodologia a ser utilizada pelo MOVA/SP, a
PMSP/SME (2001, p. 39), afirma que esta será baseada na ação-reflexão,
numa articulação entre teoria e prática. Quanto aos conteúdos e à avaliação,
deve-se levar em consideração:
O conhecimento prévio dos educandos inclusive os valores éticos, manifestações artísticas, religiosas e as experiências já vividas; resgatar a autoestima dos educandos; respeitar o ritmo e os níveis dos educandos; abordar o conhecimento com totalidade articulada; a partir da visão do ser humano como sujeito histórico, resgatar a história de vida dos educandos e relacionando-as com as lutas sociais de seu tempo; estabelecer um processo avaliativo com base na ação-reflexão-ação.
Ao referir-se ao projeto político, Freire (2001, p. 45), defendia que este é
carregado de ideologia, pois,
Tem que ver com que conteúdos ensinar, a quem, a favor de que, de quem, contra que, contra que, contra quem, como ensinar. Tem que ver com quem decide sobre que conteúdos ensinar, que participação tem os estudantes, os pais, os professores, os movimentos populares na discussão em torno da organização dos conteúdos programáticos.
2.2. Caracterização do processo de formação de educadores populares:
contribuição de estudiosos da educação popular para o MOVA/SP
A educação popular é vivenciada desde os anos de 1960, conforme
apresentado no capítulo anterior, quando se abordou a importância do
Movimento de Cultura Popular de Recife, a Experiência de Angicos, o
Movimento de Educação de Base ligada a Igreja Católica, a Campanha Pé no
Chão Também se Aprende a Ler, os grupos de alfabetização de camponeses
que aplicavam o método Paulo Freire, o papel das Comunidades Eclesiais de
52
Base, a atuação da Teologia da Libertação, os grupos ecumênicos. E nas
últimas décadas, a forte presença dos movimentos sociais reivindicatórios que
tem contribuído para o fortalecimento desta vertente educacional, a educação
popular.
Esta prática de educação tem a sua origem nas ações desenvolvidas
pelos mais diferentes programas, campanhas e projetos populares ligados
principalmente às questões de alfabetização de jovens e adultos, tendo como
um dos seus objetivos a promoção da consciência e da cidadania.
Cabe ressaltar que o MOVA/SP desde o seu início, tem se caracterizado
como um programa que se identifica com a proposta de educação popular.
Apresento brevemente a concepção de educação popular segundo
alguns autores. De acordo com Freire, (apud Gadotti 2001, pp.16-17),
educadores e grupos populares, descobriram que
Educação popular é sobretudo o processo permanente de refletir a militância; refletir portanto, a sua capacidade de mobilizar em direção a objetivos próprios. A prática educativa, reconhecendo-se como prática política se recusa a deixar-se aprisionar na estreiteza burocrática de procedimentos escolarizantes. Lidando com o processo de conhecer, a prática educativa é tão interessada em possibilitar o ensino de conteúdos às pessoas quanto em sua conscientização... a educação popular pode ser socialmente percebida como facilitadora da compreensão científica que grupos e movimentos podem e devem ter acerca de suas experiências. Esta é uma das tarefas fundamentais da educação popular de corte progressista, a de inserir os grupos populares no movimento de superação do saber de senso comum pelo conhecimento mais crítico, mais além do “penso que é”, em torno do mundo e de si no mundo e com ele.
Outro autor que trabalha com propriedade a questão da educação
popular ao longo de décadas é o educador Carlos Rodrigues Brandão (1984)
concebe a educação popular como, “um processo sistemático de participação
na formação, fortalecimento e instrumentalização das práticas e dos
movimentos populares, com o objetivo de apoiar a passagem do saber popular
ao saber orgânico, ou seja, do saber da comunidade ao saber de classe da
comunidade”(p.131). Acrescenta, ainda, que podemos identificar o educador
popular como um articulador, um organizador, animador, um intelectual
orgânico no sentido gramsciano, superando a ingenuidade e o espontaneísmo.
Um teórico também importante nesta temática é o educador Luiz
Eduardo Wanderley (1985), quando distingue três orientações da educação
popular no Brasil: a educação popular com a orientação de integração,
53
entendendo que é papel do Estado sob a hegemonia das classes dominantes
popularizar a educação com o objetivo de incluir as pessoas no capitalismo
dependente; o segundo sentido é a orientação nacional-desenvolvimentista
visando à implantação de um capitalismo autônomo, nacional e popular, onde
se distribui os benefícios do progresso social e econômico sem um
questionamento do sistema; e a outra vertente de educação popular tem uma
orientação de libertação no estímulo das potencialidades do povo através da
conscientização, da capacitação e de ampla participação social.
Entendo que o MOVA/SP tem se identificado com esta última orientação,
conforme apontada por Wanderley (1985), na medida em que desde a sua
origem, visava contribuir para o desenvolvimento da consciência política dos
educandos e educadores envolvidos e para o pleno exercício dos direitos
sociais do cidadão, com o objetivo de incentivar a participação popular e o
fortalecimento dos movimentos sociais, atendendo, assim com o objetivo maior
de ajudar na leitura do mundo e da palavra, com vistas à transformação das
estruturas socioeconômicas e culturais.
Conforme sistematizou Di Giorge (1987), as principais características de
um processo educativo de educação popular são: valorização da cultura
popular, participação dos educandos na formulação dos objetivos e dos
métodos, afirmação do caráter político da educação, ênfase na metodologia,
proposta de partir sempre da realidade de vida dos participantes, ligação entre
a aprendizagem e a organização, entre reflexão e ação político-social das
camadas populares, dialogicidade, trabalho em grupo e incentivo a autoestima
e a desinibição, prioridade a organização de base.
Na citada obra, o autor enfatiza duas questões decorrentes tanto da
metodologia quanto da concepção que se tem do papel dos educadores,
1) O papel dos agentes que trabalham com a Educação Popular não deve ser o de elaborar uma teoria, ou fazer um conhecimento pronto para que os grupos populares possam resolver suas necessidades e problemas sociais, e sim o papel do agente é de incentivar e provocar esses grupos para a partir da discussão da sua realidade encontrar soluções e propor as ações necessárias. Trata-se de um mediador. 2) Não é papel dos agentes da Educação Popular levar os grupos populares a iniciarem a luta ou resistência frente às situações de opressão, pois de uma forma ou outra esses grupos resistem ou se opõe a essa dominação. Cabe então aos agentes contribuir para que esses grupos se dinamizem e encontrem outros meios de reivindicar, pressionar e conquistar melhorias para suas comunidades (Di Giorge, 1987, p.13).
54
Outra questão importante a ser observada é a verificação de como a
educação popular é construída, se de fato pode ser caracterizada como uma
educação do povo e libertadora. Para Kunrath (2006), o grande critério que
define a educação popular é o fato de ser feita pelas camadas populares e,
principalmente, junto com elas. Pois a educação pensada para as classes
populares e que não leve em conta a participação e o protagonismo popular,
pode tornar-se uma educação para a massificação, onde o povo não se
assume como sujeito do processo de educação a partir de sua vida, do seu
cotidiano e de sua cultura.
Para explicitar a importância da educação popular como uma educação
para a liberdade, a educadora e estudiosa do MOVA/SP, Janis Kunrath, cita a
compreensão que Luiz Eduardo Wanderley apresentou em um seminário
realizado pelo Instituto de Estudos Especiais da PUC/SP, quando este afirmou:
O que é educação para a liberdade? É uma educação Popular. Uma educação feita pelas classes populares, pelo povo. Um camponês quando ensina ao filho como plantar uma roça, está fazendo educação popular. Um operário quando ensina um companheiro ou um filho a trabalhar numa fábrica está fazendo educação de alto nível, porque há muito engenheiro que estuda anos a fio e não sabe mexer com máquinas. Um sindicato, que se reúne para discutir o salário, está fazendo educação. Um partido político, ao discutir os rumos políticos do país, está fazendo educação. Toda vez que o operário, o camponês se reúnem para discutir os seus problemas e descobrir soluções, para passar uma técnica para o companheiro etc., está fazendo educação, informando e formando. Há muitos modos de fazer educação. A vida cotidiana é a maior escola. Só que essa educação é desprezada porque nossa sociedade valoriza a educação da escola, da universidade, da pós-graduação. Só os eleitos que chegam lá têm o saber. Mas não é assim, o povo tem o saber popular... A educação feita para o povo ou junto com o povo é a educação que os agentes educacionais, religiosos ou leigos, oferecem ao povo, para ajudá-los na sua luta e na sua caminhada pela libertação. É aquilo que faz a maioria de nós, classe média, que não somos do povo, mas queremos ajudá-lo nessa libertação (Kunrath, 2006, p. 63-64).
Portanto, a educação popular é entendida como um processo
permanente de reflexão e de mobilização dos objetivos dos próprios sujeitos
nas situações sociais. A prática educativa não se prende à burocratização
escolar, mas desde que os atores compreendam seu papel político, agem de
forma mais consciente. Assim, o educador precisa, no seu processo de
formação, ter um bom preparo, pois na pedagogia freiriana o educador é
responsável por ajudar os grupos com que atua a superar o senso comum.
55
2.3. A formação do MOVA/SP
Observou-se anteriormente que o MOVA/SP se caracteriza como uma
educação de cunho popular, que visa alcançar as camadas mais
desfavorecidas de jovens e adultos, aqueles que não tiveram a oportunidade
de frequentar a escola formal e ocorre nos bairros e periferias da cidade de
São Paulo, com vistas à alfabetização e à leitura do mundo conforme a
proposta freiriana.
Antes de tratar a questão da formação dos educadores do MOVA/SP,
convém elucidar quem são estes educadores, como são apontados pelas
ONGs para o trabalho de alfabetização, quais os critérios que a Secretaria
Municipal de Educação prevê, e enfim, quais as exigências que são
necessárias para um educador-alfabetizador desenvolver com eficácia o
trabalho proposto.
Segundo Abbonízio (2007), os educadores do MOVA/SP são os
chamados monitores e os coordenadores pedagógicos. Os monitores são os
responsáveis pelo contato direto e imediato com os alfabetizandos, tendo a
tarefa do acompanhamento diário; devem possuir o Ensino Fundamental
completo ou experiência anterior comprovada em alfabetização de jovens e
adultos. Já os coordenadores pedagógicos são os responsáveis pelo
acompanhamento das atividades dos monitores ao longo da semana e pela
organização e condução da reunião pedagógica que ocorre às sextas-feiras;
exercem também o papel de formadores dos monitores e são o elo de ligação
do movimento local com a Diretoria Regional de Ensino (DRE) e as outras
instâncias da Secretaria de Educação; estes devem ter Ensino Médio ou
superior concluído, caso não tenham graduação, precisam comprovar
experiência anterior em educação de jovens e adultos.
Todavia, a questão da escolha de monitores sem escolaridade formal (o
antigo Magistério, ou o Ensino Médio ou até Pedagogia) tem provocado
inúmeros debates no âmbito educacional. O objetivo da pesquisa não é
aprofundar os prós e contras do perfil profissional destes educadores, mas
procurar compreender que estes educadores, estando inseridos no contexto da
comunidade onde acontece o MOVA/SP, possivelmente apresentam condições
de trazer a realidade local para o cotidiano da alfabetização, onde a linguagem
56
utilizada poderá estar em sintonia com os participantes da alfabetização,
aumentando assim os vínculos de confiança e interação.
É interessante apontar que a escolha dos educadores acontece no
interior da própria ONG conveniada e esta se responsabiliza pelo processo de
seleção, admissão e desligamento dos seus monitores. Estes devem seguir as
orientações apontadas pela SME e pela própria ONG que, juridicamente,
responde pelo vínculo, entendido como uma prestação de serviço comunitário.
Os educadores assumem responsabilidades importantes junto aos
educadores e tutelados pela ONG que desenvolve o trabalho educativo,
cabendo-lhes o comprometimento em colocar-se à disposição de segunda a
quinta feira com os educandos, e, às sextas-feiras, para a formação continuada
(algumas vezes, aos sábados, quando convidados a participar de momentos
formativos promovidos pela própria ONG, pela SME ou pelos Fóruns do
MOVA/SP). Também são incumbidos de motivar a participação dos
alfabetizandos, garantindo a participação de pelo menos doze participantes.
A remuneração é outro ponto discutível, os monitores recebem uma
ajuda de custo, cerca de um salário mínimo, o que pode ser interpretado como
um trabalho que exige destes educadores um espírito de voluntariado e de
militância política.
Recorro a Romão (2001, p. 63) para explicitar a importância da
concepção do educador que não nasce pronto e, portanto, deve colocar-se
num processo permanente de construção, de formação e de interação com os
seus pares, abrindo-se para novos desafios,
Entendemos que o ser educador não nasce ontologicamente com a pessoa nem depende de um despertar mágico ou de uma iluminação súbita da consciência para um compromisso até então ausente de um projeto de vida. A língua portuguesa não dá conta de exprimir com precisão o que de fato ocorre na realidade: em vez de ser, é sendo. Ninguém é educador, alguém se torna educador (ou deseducador) no decorrer da existência, no incessante processo de estruturação/desestruturação dos equilíbrios pessoais e coletivos provisórios, na teia das relações sociais, no fluxo permanente das interações entre teoria e práxis.
A formação de educadores populares é um dos eixos do MOVA/SP,
considerando-se que todas as instâncias do programa são espaços de
apropriação e construção de conhecimento: a mobilização que ocorre nas
entidades para formalizar o convênio; os encontros no interior das próprias
organizações; a participação nos Fóruns Municipais e Regionais do MOVA/SP;
57
as reuniões pedagógicas e os encontros de formação de educadores e
coordenadores desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Educação.
Quando Paulo Freire ocupou a Secretaria Municipal da Educação do
município de São Paulo, entre os anos de 1989 e 1990, ele dirigia-se aos
educadores do MOVA/SP utilizando diferentes formas de comunicação, dentre
elas os cadernos populares que a SME preparava e que se dirigia a todos os
educadores. Num destes cadernos de formação do MOVA/SP, Freire destacou
a importância da participação efetiva dos educadores que deveriam se
comprometer a participar do processo de formação permanente e de todo a
construção do movimento, quando afirmou:
Sabemos os educadores e educadoras que fazemos o MOVA/SP, da seriedade que um programa como este exige de quem dele participa, não importa o nível de sua responsabilidade. Sabemos da competência, sempre se provando, a ser posta a serviço do programa; sabemos também que um programa assim, demanda clareza política de todos nele engajados e vontade política de quem se acha ao nível de decisão (SME/PMSP, 1990, p.2).
Segundo Kunrath (2006), o MOVA/SP compreende a educação como
processo integral e contínuo, assim, a formação dos educadores deve ser
permanente, com vistas a estabelecer um compromisso com os educandos e a
sociedade, na busca de uma prática pedagógica que possibilite a criticidade, a
reflexão e a construção coletiva do processo pedagógico.
Num dos cadernos de formação proposto pela SME/PMSP (1990),
aponta-se que um dos caminhos para a formação do educador é o estudo em
profundidade das atividades cotidianas da alfabetização, que ocorre a partir de
atividades pensadas, planejadas e desenvolvidas de forma criteriosa e
pormenorizada levando em conta os aspectos cognitivos, afetivos e ideológicos
e o contexto que os educandos estão inseridos. Outro ponto destacado no
tocante à formação de educadores é a organização de uma infraestrutura em
pequenos grupos com uma coordenação pedagógica, num encontro semanal
para o estudo, socialização de experiências e a intervenção pedagógica do
coordenador, onde as práticas destes educadores são coletivamente
discutidas, tendo como referência os princípios políticos e metodológicos do
programa MOVA/SP.
58
É importante apresentar também o fundamento da concepção
metodológica de formação de educadores e educandos. Segundo o documento
PMSP/SME (1992, pp.7-8), entendia-se a formação como:
A possibilidade de articulação coerente entre o processo educativo e o processo político-organizativo do ponto de vista dialético, considerando que o processo educativo também é organizativo; a busca da integralidade dos processos formativos considerando a vida humana e social como uma totalidade articulada e em movimento: o político-afetivo e cultural, abordados numa perspectiva interdisciplinar; possibilitar a apropriação do conhecimento universal produzido, na perspectiva crítica de que o conhecimento é histórico e que está em construção, reconstruindo-o.
Neste contexto, o processo formativo dos educadores populares
segundo Santos (1996), abrangia a formação inicial, a formação complementar,
a formação geral e a supervisão.
A formação inicial era realizada aos fins de semana com uma carga
horária de 48 horas, tendo como objetivo a capacitação inicial de todos os
monitores que atuariam com os grupos de alfabetização, com o objetivo de
introduzi-los numa visão dialógico-construtivista. As principais temáticas eram:
prática e concepção de educação, teoria do conhecimento, metodologia,
planejamento e avaliação.
A formação complementar tinha por objetivo atender às necessidades
imediatas encontradas pelos educadores no exercício cotidiano da prática
educativa e buscava aprofundar as questões respectivas a esta mesma prática.
Realizaram-se oficinas sobre tema gerador, níveis linguísticos, prática do
ensino interdisciplinar de matemática, língua portuguesa, história, geografia e
artes. Tais oficinas e cursos contavam com a participação dos supervisores.
O outro componente do sistema de formação era a formação geral. Esta
tinha por objetivo auxiliar educadores, educandos e supervisores a manterem-
se atualizados e a discutirem sobre as transformações ocorridas em nível mais
amplo. A cada três meses realizavam-se análises de conjunturas, além de
debates e simpósios sobre as mais diferentes situações que ocorriam na
cidade, no país, na América Latina e no mundo. Estas atividades eram abertas
também para os educandos que tinham a possibilidade de compreender e
entender o que estava ocorrendo para além do contexto do MOVA/SP ou da
educação.
59
O último sistema de formação era a Supervisão. Os supervisores eram
apontados pelos educadores ou até sugeridos pelas ONGs. O trabalho destes
supervisores consistia no acompanhamento pedagógico dos educadores, eram
também o elo entre os grupos de base e a equipe do MOVA/SP. Estes
realizavam atividades de visitas e aproximação com os grupos. Reuniam-se às
sextas-feiras com os educadores e, quinzenalmente, com a equipe do
MOVA/SP. A cada dez grupos escolhia-se um supervisor para este
acompanhamento e assessoria quanto à formação pedagógica e permanente
dos educadores.
Dialogando com outros autores que tratam da formação de educadores
do MOVA/SP, percebe-se que há uma convergência na compreensão de que a
formação destes educadores deve ser permanente e continuada. Assim, os
educadores deverão fazer um processo que mobilize para a participação de
cursos, seminários, fóruns temáticos, congressos, estudo pessoal e coletivo,
pesquisa, troca de experiências e outras atividades de caráter formativo. Para
Barreto (2001), o educador ou o alfabetizador (termo utilizado pelo autor), tem
muitas perguntas antes de iniciar seu trabalho, o que não impede que haja uma
formação inicial, porém, outras questões emergirão na prática da alfabetização,
o que exigirá a garantia de um espaço para que estas perguntas sejam
apresentadas e debatidas. Assim, o processo não se esgota na formação
inicial, mas continua durante todo o processo, o que justifica a necessidade de
uma formação que seja contínua.
Ao tratar da importância da formação de educadores que concebem a
educação como um processo integral e contínuo além de permanente, o
Projeto Político Pedagógico do MOVA/SP, conforma PMSP/SP (2001, p. 4-6),
considera que:
A formação do educador de jovens e adultos pressupõe que ele se assuma enquanto sujeito da ação pedagógica. Isso implica agir sobre sua prática, decidindo coletivamente sobre a realidade de sua sala de aula e construindo um trabalho a partir dela, sempre tendo como referência a concepção de educação que anima esse processo. Assim, o seu procedimento será o de ação-reflexão e ação na articulação constante da prática e da teoria... o programa requer a garantia de um processo de formação permanente dos (as) educadores (as) de modo que se acompanhe a prática educativa dos núcleos de forma participativa, ativa e crítica.
Para Basualdo (1997), a formação de educadores do MOVA/SP
necessita ser um processo permanente de ação, onde se devem contemplar as
60
problemáticas do cotidiano da entidade e também voltar-se para atividades
práticas que permitam o desenvolvimento do senso histórico e coletivo para
fins de transformação social.
A partir de 2002, tem ocorrido em toda a cidade de São Paulo a Semana
de Alfabetização no mês de setembro em datas próximas ao Dia Internacional
da Alfabetização, 08 de setembro. Esta proposta contempla atividades para
envolver todos os participantes do MOVA/SP de forma regionalizada,
possibilitando o envolvimento dos educandos, educadores, supervisores das
entidades conveniadas e das Diretorias de Ensino. Um dos objetivos da
Semana de Alfabetização foi trazer a possibilidade da expressão cultural e
artística dos educandos do MOVA/SP, assim como discutir temas em debate
na cidade e no país.
As atividades diárias em alfabetização não podem ser uma acumulação
linear, de fragmentos isolados de informações, mas um conjunto sistemático e
sequencial de ações orientadas por pressupostos claramente delineados e
assumidas. Ao tratar da importância da metodologia que se aplica no
MOVA/SP, Ferreira (1996, p. 52), afirma que:
A alfabetização exige um referencial teórico; toda prática já implica uma teoria que a fundamenta e não há prática neutra, ela é sempre política, supõe sempre uma visão de mundo, de sociedade, de homem. Supõe então um projeto histórico, uma teoria do conhecimento, opção por uma concepção de educação e uma concepção metodológica. Portanto, a teorização não é um processo de imposição de ideias alheias ou do pensamento já elaborado por especialistas e cientistas renomeados. Por outro lado, a teorização não é um processo meramente pessoal. É ao mesmo tempo pessoal e coletivo. O mais importante então, é aprender a teorizar, apropriando-nos dos métodos e técnicas de conhecimento e colocando-nos numa atitude de questionamento constante sobre os fatos, fazendo nossas análises, deduções e generalizações, recriando o objeto conhecido, integrando-o num todo orgânico, atingindo níveis cada vez mais altos de síntese.
Assim, é possível afirmar que, efetivamente, a formação contínua ocupa
um espaço muito importante na prática do MOVA/SP, pois sem um processo
de formação contínua e permanente, os educadores, coordenadores
pedagógicos e as próprias ONGs que são os principais protagonistas,
apresentariam dificuldades em levar adiante este trabalho. Porém, há
necessidade de uma avaliação contínua sobre o trabalho dos envolvidos na
prática, de forma a identificar os acertos e desacertos no caminho da
alfabetização de jovens e adultos.
61
Apresento a seguir, sucintamente, a formação dos educadores a partir
da concepção do MOVA/Brasil, que também tem valorizado o espaço formativo
como importante na prática de seus educadores. Para Santos (2003), a
formação dos educadores ocorre em dois momentos distintos: a formação
inicial e a continuada. A primeira possibilita uma aproximação com os objetivos,
a estrutura de funcionamento, a metodologia utilizada e os instrumentos de
avaliação e acompanhamento do processo. O segundo momento destina-se à
formação continuada dos educadores, para que os mesmos possam refletir e
avaliar a prática pedagógica, numa dinâmica constante de ação-reflexão-ação,
assim, a formação continuada ocorre,
(...) por meio do acompanhamento do trabalho cotidiano, realizado pelo coordenador local na interlocução com os monitores, buscando a reflexão das suas intervenções junto aos educando. Tem como objetivo o relato do trabalho pedagógico, a análise do processo de aprendizagem e da dinâmica do grupo, a orientação para a organização do portfólio dos alunos, o acerto dos momentos de sua participação em sala de aula e de troca das suas impressões com os monitores, o planejamento e redirecionamento do plano de trabalho e da articulação com outros agentes para a intervenção na realidade local (Santos, 2003, p.31).
Outro aspecto importante da formação continuada de educadores do
MOVA/Brasil, acontece quando os coordenadores locais e educadores se
reúnem com os chamados coordenadores de polos para propiciar momentos
de troca de experiências formativas, estudos de temáticas abrangentes e de
interesse coletivo que possam responder às demandas específicas de cada
local. Nestes encontros, valoriza-se o registro e a sistematização da formação
recebida, onde são apontadas as dificuldades e os avanços enfrentados no
cotidiano das salas de alfabetização. Incentiva-se também a apropriação por
parte dos educadores de uma metodologia que leve em consideração os
saberes dos educandos na construção de novos conhecimentos. Outra tarefa
fundamental é a capacidade da pesquisa que deve ser uma constante na vida
e na prática dos educadores. Na visão de Santos (2003, p.31),
A capacidade de pesquisar, refletir sobre a atividade de ensinar e formular alternativas para o aperfeiçoamento do ensino é indispensável aos educadores. Trata-se de se estabelecer outra relação entre os sujeitos e o conhecimento que, por sua vez, redimensiona o papel dos educadores como mediadores da prática educativa.
62
Apresento uma síntese das propostas levantadas no 4º e no 6º
Encontro Nacional da rede MOVA/Brasil quanto à formação de educadores.
Representam uma amostra interessante da preocupação que tem mobilizado
educadores do país todo. No 4º Encontro, ocorrido em Campo Grande, Mato
Grosso do Sul, entre os dias 9 a 11 de junho de 2004, com o tema:
“MOVA/Brasil na Política de Educação de Jovens e Adultos”, quatro propostas
que demonstraram a preocupação com a questão, MOVA/Brasil, 2004, p.2):
- Solicitar ao MEC a publicação de cinco obras de Paulo Freire: Educação como prática de Liberdade, Pedagogia do oprimido, Pedagogia da Esperança, Pedagogia da Autonomia e Educação em mudança em papel jornal para subsidiar a formação dos educadores populares; - Estabelecer parceiros com universidades públicas para formação continuada e em nível superior, gratuita e de qualidade, garantindo a formação dos educadores populares ao longo da vida numa vertente libertadora, definindo critérios e envolvendo-os na elaboração das propostas de formação; - Garantir a formação superior aos educadores do MOVA; - Formação política do educador popular de forma que haja aceitação e entendimento da necessidade de mudança para uma perspectiva libertadora, o que demanda: compromisso, participação nos encontros, clareza do conceito de alfabetização, formação cidadã e articulação teoria-prática.
No 6º Encontro Nacional que aconteceu em Fortaleza, nos dias 15, 16 e
17 de junho de 2006 com a temática: “MOVA/Brasil, interface com as Políticas
Públicas de EJA”, algumas propostas no tocante à formação de educadores
foram retomadas e outras ampliadas nas oficinas e na plenária geral,
demonstrando a importância da discussão, foram enfatizados os seguintes
pontos:
- Oferecer formação universitária para o educador alfabetizador, recuperando a sua valorização diante dos outros educadores do Ensino Fundamental e da EJA; - Garantir a elevação da escolaridade dos educadores populares através de parcerias, PROUNI, convênios entre o poder público, movimento social e as escolas públicas em nível de formação superior de forma gratuita para o educador, buscando formação em nível de graduação dos educadores populares através de parcerias com Universidades, considerando sua prática profissional e um currículo fundamentado na concepção de educação popular (MOVA/Brasil, 2006, p 3.).
Estas propostas são resultados da discussão das oficinas, momento de
formação, interação e troca de experiências que ocorre durante o encontro. O
coletivo dos MOVAS presentes são distribuídos em grupos para a reflexão de
temas pertinentes, e estas ideias foram apontadas na oficina de formação de
63
educadores, sendo submetidas à discussão na plenária, em que resultaram
como propostas a serem aplicadas nas diversas realidades. A coordenação
nacional faz os devidos encaminhamentos.
O MOVA/Brasil se articula regionalmente. Relato, a seguir as
deliberações tiradas do 4º Encontro Regional do MOVA/Sudeste que se
realizou na cidade de Embu das Artes em 28 a 30 de agosto de 2009 e contou
com a participação de 11 cidades do estado de São Paulo como: Araraquara,
Mauá, Diadema, Embu das Artes, Guarulhos, Mauá, Osasco, Ribeirão Pires,
Santo André, São Bernardo e São Paulo e diversas cidades representando o
Estado do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Neste encontro, foram retomadas
várias discussões advindas como deliberações dos encontros nacionais e
adaptadas, ampliadas e mesmo acrescidas, referem-se às propostas quanto à
formação de educadores,
- Promover trocas de atividades nacionalmente baseadas nos três eixos: território (realidade local), mundo do trabalho e Projeto de Vida; - Criação de um curso de formação política para educadores populares com o objetivo de formar educadores críticos que desenvolvam atitudes transformadoras na educação; - Construir uma comissão de elaboração e encaminhamento para as Universidades Públicas de uma proposta de construção de curso universitário junto com os movimentos, voltado à educação popular; - Lutar pela criação de cursos de licenciatura com enfoque na EJA numa perspectiva da educação popular, que pense na formação cidadã, inclusiva e libertadora; - Provocar situação de reflexão para que os educadores da rede tenham uma visão crítica do sistema da educação brasileira (MOVA/Sudeste, 2009, p 1.).
Observa-se que as proposições resultantes dos encontros do
MOVA/Brasil nas mais diferentes instâncias tem sido encaminhadas para os
grupos de base e para as Coordenações que articulam o MOVA em cada
estado ou região. A questão da formação continuada tem sido objeto de
reflexão e avaliação constante, uma vez que existem iniciativas interessantes
que dão conta da realização deste desafio; outra questão que foi amplamente
objeto de discussão no último Encontro do MOVA/ Sudeste realizado em MG,
na Universidade Federal de Minas Gerais nos dias 05 a 07 de agosto de 2011,
foi à formação política. O Estado de São Paulo tem organizado encontros
semestrais em parceria com o Movimento Sem Terra (MST) em Guararema,
interior do estado, no sentido de possibilitar aos educadores populares a
64
discussão de questões da conjuntura nacional, educacional e de políticas
públicas.
2.4. Caracterização do processo de formação oferecida pela Secretaria
Municipal de Educação
No item anterior tratou-se da importância da formação continuada para
uma maior efetividade do trabalho de educação popular e alfabetizador que os
educadores desenvolvem. Neste tópico, analisarei a caracterização do
processo de formação que a SME apresenta para o conjunto dos grupos de
MOVA/SP, vinculados como programa educacional da referida secretaria.
Alguns aspectos já foram apresentados anteriormente, porém cabe-nos um
aprofundamento para uma melhor elucidação deste processo.
Vale ressaltar que a formação de educadores, assim como o próprio
MOVA/SP, passou por diferentes processos e concepções ao longo de mais de
duas décadas de existência. Abordarei como a SME tratou a formação de
educadores no surgimento do movimento: na gestão da então Prefeita Luísa
Erundina e na retomada do MOVA/SP no governo Marta Suplicy, bem como, a
atual dinâmica da formação que é empreendida. Cabe recordar que houve um
vácuo governamental de oito anos, entre as duas gestões citadas, quando os
governos de Paulo Maluf e Celso Pitta não deram seguimento ao MOVA/SP.
Portanto, não houve orientação da Secretaria Municipal de Educação. Naquele
período o MOVA/SP continuou existindo, mesmo sem uma vinculação
governamental, pois o Fórum do MOVA/SP tratou de conseguir parceria e
apoio de Universidades, Igrejas e Organismos Internacionais para dar conta da
continuidade da prática educativa, bem como da formação de educadores.
Num dos primeiros cadernos do MOVA/SP confeccionados pela
Secretaria Municipal de Educação, quando surgiu o movimento, define-se o
que é o MOVA/SP, seus objetivos e sua funcionalidade, onde se apresenta
também a necessidade da formação continuada como uma das tarefas da
Secretaria. O caderno MOVA/SP da PMSP/SME (1989, p.10), define que,
O MOVA/SP é, pois a ação conjunta de movimentos populares e da SME buscando-se a viabilização de projetos populares de alfabetização de jovens e adultos. Através do convênio, a SME se propõe a cumprir três tarefas: 1º apoiar financeira e materialmente os grupos populares:
65
2º criar novos núcleos de alfabetização nas áreas onde os movimentos populares ainda não assumem esta tarefa. 3º garantir a orientação político-pedagógica e a formação permanente dos educadores através de encontros sistematizados entre educadores dos movimentos populares e assessores pedagógicos da SME.
O mesmo material estabelece ainda, que, enquanto parceiros do
Programa, os educadores serão selecionados, principalmente pelo seu
compromisso político e pela sua disponibilidade para a capacitação
pedagógica.
Na Carta de Princípios de parceria do MOVA/SP (1990, p. 2), quanto à
formação dos monitores afirma-se que:
Dentro da linha político-pedagógico estabelecida em conjunto pela Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, assegura-se a autonomia aos movimentos quanto à realização de debates, programas de formação específicos e atividades paralelas. Parceria também na formação dos monitores: os movimentos desejam participar ativamente com o corpo e com a cabeça, na formação de seus monitores, e desejam, portanto, que seja criado mecanismo de parceria com a SME para os trabalhos pedagógicos de formação de monitores.
Pode-se afirmar, segundo Abbonízio (2007), que a formação dos
educadores do MOVA/SP era coordenada pela própria equipe técnica da
Secretaria de Educação, mantendo um programa específico de formação
destinado aos educadores e coordenadores que atuavam com o MOVA/SP. É
possível dizer que a formação oferecida naquele momento ocorria de forma
centralizada.
A título de ilustração apresentamos alguns materiais elaborados pela
Secretaria e que serviam de subsídio para a formação dos educadores.
Destacamos, entre outros, os seguintes títulos:
- O atendimento educacional de jovens e adultos trabalhadores no município de
São Paulo, elaborado em 1989;
- MOVA/SP (Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos da Cidade de
São Paulo), outubro de 1989;
- Aos que fazem a educação conosco em São Paulo, em 1989;
- Projeto do movimento de Alfabetização e pós-alfabetização. 1989;
- Construindo a educação pública e popular. Vols. 1990/1991/1992;
- Construindo a avaliação do MOVA/SP, 1992;
- Sobre o processo metodológico de alfabetização, 1991;
66
- Tema gerador e a construção do programa – uma nova relação entre currículo
e realidade, 1991.
A segunda experiência do MOVA/SP ocorreu no governo Marta Suplicy
(2001 -2004), uma vez que no intervalo de oito anos das gestões Paulo Maluf e
Celso Pitta respectivamente o MOVA/SP deixou de ter vínculo com a SME,
porém, dentro de uma dinâmica diferente, chamada de resistência, quando os
atores e protagonistas do referido movimento articularam parceria com
Universidades, Igrejas e outras Instituições, o que garantiu a sua continuidade.
Apresento como a SME organizou a formação de educadores.
Consultando o Projeto Político-Pedagógico no tocante à questão da formação,
afirma-se que: “o programa requer a garantia de um processo de formação
permanente dos educadores de modo que se acompanhe a prática educativa
dos núcleos de forma participativa, ativa e crítica” (PMSP/SME, 2001, p.6). E
no termo de convênio, (PMSP/SME 2002), está claro que as atividades de
planejamento pedagógico e formação permanente de coordenadores/monitores
serão desenvolvidas por no mínimo três horas semanais às sextas-feiras em
local a ser fixado pelo Núcleo de Apoio Educacional (NAE), ouvindo-se a ONG
conveniada.
Baseando-se em Kunrath (2006), observa-se que a retomada do
MOVA/SP em 2001, apresentou mudanças quanto às parcerias da Secretaria
com as entidades e no processo de formação de educadores, que passou a
acontecer não mais de forma centralizada pela SME, assumindo outra
dinâmica viabilizada pelos Núcleos de Educação e realizada por cinco
Instituições assessoras que foram contratadas para esta tarefa. São elas:
Ação Educativa; Associação das Escolas Católicas – AEC; Instituto Sedes Sapientiae; Instituto Paulo Freire e Vereda. Foi firmado convênio com as cinco instituições assessoras para desenvolver a formação com os educadores. As instituições já estavam acompanhando o processo de reconstrução do MOVA na cidade. Para facilitar a participação dos educadores na formação, cada instituição assessora, assumiu a formação em um conjunto de NAEs, geograficamente próximos. A formação foi feita nas Coordenadorias de Educação sendo que a organização do calendário era flexível e também foi contabilizada a formação desenvolvida pelas próprias entidades conveniadas. Esta formação buscou atender as necessidades dos educadores nas suas regiões. Por isso houve flexibilidade para pensar e organizar a proposta de formação (p.41).
Para Abboonízio (2007), as cinco ONGs contratadas pela SME
encarregadas de possibilitar a formação de educadores, possuíam uma história
67
ligada à educação de jovens e adultos e de assessorias a movimentos
populares e apresentavam como objetivo a formação pedagógica dos
educadores e coordenadores pedagógicos. Nestes encontros eram discutidos
entre outras temáticas: as várias concepções de educação, os princípios de
Paulo Freire de educação de adultos, os processos de aquisição da leitura e
escrita, alfabetização matemática, diagnóstico, avaliação e o projeto político-
pedagógico.
Além dos encontros entre os educadores, existiam iniciativas que
visavam integrar os educadores do MOVA/SP e os professores da Educação
de Jovens e Adultos (EJA), o que possibilitou a troca de experiências e
saberes, avaliado como interessante para os educadores concursados que
tiveram contato com educadores populares que atuavam no MOVA/SP. A
propósito, Campos (1998, pp. 14-15) traça um paralelo entre as peculiaridades
no trabalho docente realizado por professores do EJA e do MOVA/SP, onde
afirma:
De um lado temos os monitores do MOVA/SP com uma história marcada pelo engajamento nos Movimentos Populares e por isso tem um olhar diferente sobre a Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores, de outro lado temos os professores que compõem o quadro do Magistério da Secretaria Municipal de Educação e que, neste período, puderam fazer uma opção dentro do quadro do Magistério: a de trabalhar na Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores como professores da Secretaria da Educação.
Recorro a Kunrath (2006) para caracterizar as Instituições formadoras
que fizeram parceria com a municipalidade para atuar na formação dos
educadores do MOVA/SP: a Associação de Educação Católica (AEC), fundada
em 1945, tendo como objetivo a defesa da educação cristã à luz dos princípios
evangélicos que caracterizam uma sociedade justa e fraterna; O Concílio
Vaticano II (1962-1969); a Conferência de Medellín (1968) e os documentos da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). Este processo apontou
novas frentes de ação pastoral para as entidades que trabalhavam com a
educação. A AEC implementou diversos projetos e ações educativas voltadas
para a educação popular e subsidiou os movimentos sociais que trabalhavam a
questão da alfabetização. A referida instituição passou a atender as
Coordenadorias de Educação da zona sul (da Cidade Dutra até a Capela do
Socorro e Parelheiros), atingindo um universo de 210 educadores,
68
disponibilizando oito formadoras para o trabalho de formação continuada de
educadores.
O Instituto Sedes Sapientiae contribuiu na formação dos educadores do
MOVA/SP através do Centro de Formação de Educadores Cida Romero. O
Instituto iniciou suas atividades no período da ditadura militar e teve um papel
de destaque na introdução dos estudos psicológicos no Brasil. Uma das
coordenadoras, Madre Cristina Sodré Dória, atuou na luta de resistência contra
o autoritarismo, acolhendo ex-presos políticos e exilados que retornavam ao
país e formou grupos de educação popular. O que mais se destacou foi o
Centro de Educação Popular da Sedes Sapientie (CEPIS), que assessorava os
movimentos sociais das periferias, contribuindo no processo de consciência e
politização, na linha de educação popular. O Centro Cida Romano assessorou
os educadores na zona Oeste, parte da sul e da zona Norte, abrangendo:
Pirituba, Perus, Ipiranga, Jabaquara e Vila Mariana, Santana, Tucuruvi, Vila
Maria, Tremembé e Jaçanã respectivamente.
Outra instituição, o Vereda, foi fundada em 1982 com o objetivo de
assessorar e acompanhar os trabalhos comunitários na linha da educação
popular teve uma importante colaboração de Paulo Freire que foi um dos seus
idealizadores. O grupo Vereda atuava acompanhando e apoiando os encontros
formativos realizados pelas Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), pelo
Centro de Estudos Ecumênicos Bíblicos (CEBI) e pela Teologia da Libertação,
que são importantes no processo de consciência cidadã e participação popular.
A Entidade Vereda desenvolveu atividades formativas junto aos educadores do
MOVA/SP na Freguesia do Ó, Casa Verde, no Campo Limpo e M’ Boi Mirim.
Já o Instituto Paulo Freire é uma associação civil sem fins lucrativos,
criada em 1991, se constitui numa rede internacional que integra instituições,
grupos e pessoas em mais de 90 países, tendo como objetivo dar continuidade
e reinventar o legado do educador Paulo Freire. Segundo o site do Instituto10
este desenvolve projetos de consultoria, pesquisa, assessoria e possibilita
formação inicial e educação continuada sobre diversas temáticas, dentre elas,
educação de adultos, educação popular e cidadã. As ações fundamentam-se
10Instituto Paulo Freire. Disponível em: <http://www.paulofreire.org> Acesso em: 09 jun. 2011.
69
nos princípios do trabalho coletivo, utilizando metodologia essencialmente
dialógica e inclusiva que considera a questão da diversidade, de gênero e
étnica. Tem como missão a construção de uma cidadania planetária, educando
para a transformação social inspirada no legado freiriano que privilegia o
diálogo e a promoção da cultura da paz e de uma vida sustentável e
humanizadora. O Instituto Paulo Freire desenvolveu capacitação junto aos
educadores do MOVA/SP, mesmo não participando desde o início deste
processo de formação aos educadores, porém foram envolvidos pela larga
experiência de Moacir Gadotti, entre outros na primeira edição do MOVA/SP.
Escolhi um trecho do relato de uma das educadoras do referido instituto
que prestava assessoria aos educadores da região leste, abrangendo a Cidade
Tiradentes e Guaianases, que é o objeto de pesquisa, uma vez que analisarei
no próximo capítulo, a formação continuada que ocorre entre os formadores do
MOVA/SP pertencentes à Associação dos Voluntários Integrados no Brasil
(AVIB), com atuação privilegiada em Guaianases. A educadora Maria Alice dá
este depoimento:
Na primeira formação, o pessoal fez uma atividade quem era uma carta, escrevendo sobre o seu processo de alfabetização, a sua experiência em educação, para a gente conseguir um perfil. Quando recolhemos e começamos a ler, eu percebi assim: pessoas que não estavam alfabetizadas, estavam ali e não tinham compromisso com o MOVA, era uma questão de salário, ter algum trabalho, alguma renda, várias coisas, aí então nessa parte de alfabetização nós montamos curso específico em julho, algumas oficinas, e foi mais na Cidade Tiradentes e Guaianases, que foi onde percebi que o problema maior estava lá. Conversei com todas as coordenadorias sobre esse levantamento, mas o problema maior estava em Guaianases. Nós não tínhamos horas de formação, então remanejei as horas e fiz esse curso de oficina de leitura e escrita específicas para os monitores (apud Abbonízio, 2007, p.69).
Segundo o site da Ação Educativa11, organização fundada na década de
1990, com a missão de promover os direitos educativos da juventude, visando
à democracia participativa, a justiça social e o desenvolvimento sustentável no
Brasil, presta assessoria e formação a grupos nos bairros, escolas e
comunidades da periferia, colocando-se como formadora nos campos da
educação, da juventude, da cultura e da mobilização social. No campo da
educação atua junto às escolas e programas educacionais com intervenção
11
Ação Educativa. Disponível em:< http://www.acaoeducativa.org.br/portal/> Acesso em: 9 jun. 2011.
70
nas políticas públicas e dentre os seus programas, privilegia a educação de
jovens e adultos.
No decorrer do processo de formação dos educadores do MOVA/SP que
ocorreram com o apoio e a assessoria das cinco Instituições acima
caracterizadas em consonância com as Coordenadorias de Educação, foram
produzidos sob a supervisão da SME, oito cadernos de subsídios e apoio à
ação alfabetizadora. Conforme Abbonízio (2007), estes fazem parte da coleção
Círculos de Formação e foram colocados à disposição dos educadores em
2003:
1. Princípios Freirianos e o Sócio construtivismo;
2. Alfabetização: um desafio de milhões;
3. Mergulhados em números: a matemática na EJA;
4. Registro: Fazendo e Aprendendo;
5. Implicações Metodológicas da Prática Educativa;
6. Festa com arte: primeiro ano de reconstrução do MOVA/SP;
7. Saberes e Aprendizagens: um olhar sobre a avaliação;
8. Paulo Freire- Educação e Esperança.
Estes subsídios populares traziam textos voltados para os educadores e
algumas propostas de atividades para serem trabalhadas nas salas de
alfabetização. O objetivo maior era oferecer um suporte enquanto conteúdo e
metodologia visando contribuir na formação continuada dos educadores do
MOVA-SP.
Para Kunrath (2006), a existência do MOVA/SP se justifica pelo fato de
que se propõe atender os objetivos de alfabetizar jovens e adultos em São
Paulo; inseri-los no sistema escolar, possibilitando a continuidade da
escolarização e desenvolver a cidadania ativa como participação na sociedade
em vista de sua transformação social, política e cultural. Assim, pode-se dizer
que a formação dos educadores viabilizada pelas ONGs parceiras da
municipalidade estiveram em consonância com os objetivos do programa.
Ressalta-se a avaliação deste processo de formação continuada oferecida
pela SME através das entidades formadoras realizada pela educadora
Abbonízio (2007, p. 93) que estudou os dois momentos do MOVA/SP. Ela
afirma que:
71
Na reestruturação do programa em 2000, já não se vê nos documentos oficiais referências aos movimentos populares... A dimensão da alfabetização, como um ato intrínseco à conscientização política do alfabetizando, perde lugar para a alfabetização para a consolidação de um direito educacional. A formação dos educadores, realizada pelas ONGs de consultoria e assessoria fica focada nos aspectos pedagógicos da alfabetização, a ausência de articulação política entre as entidades e a heterogeneidade das entidades conveniadas faz com que o discurso da conscientização política se perca nos fóruns.
72
CAPÍTULO III
A AVIB E O PROCESSO DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE EDUCADORES
3.1. Contextualização: caracterização do bairro de Guaianases/SP e a
Associação dos Voluntários Integrados no Brasil (AVIB)
Faz-se necessário explicitar o porquê da escolha do bairro e dos atores
sociais em questão. Guaianases localiza-se no extremo da zona leste de São
Paulo e compreende os distritos do Lajeado e de Guaianases, cuja
subprefeitura leva o mesmo nome. Faz divisa ao norte com os distritos da Vila
Curuçá – São Miguel Paulista e Itaim Paulista, ao leste com Ferraz de
Vasconcelos e a oeste com José Bonifácio – Itaquera. Os 25 quilômetros, que
distanciam o bairro do centro da cidade, podem ser percorridos de trem ou de
ônibus.
Por estar muito próximo a São Miguel Paulista, um dos primeiros bairros
da capital, Guaianases nasceu da retaliação das grandes sesmarias e grandes
fazendas nos séculos XVII e XVIII, até chegar às chácaras no início do século
XX. Quando desmembradas do território de São Miguel, uma parte tornou-se
Guaianases e a outra foi chamada de Lajeado. De 1930 a 1939 vieram para
São Paulo 435.864 nordestinos, sendo que grande parte se estabeleceu em
São Miguel, Itaquera, Guaianases e Lajeado. Tendo em vista seu
distanciamento do centro, estes bairros foram tornando-se esquecidos e
marginalizados da cidade, com poucos equipamentos sociais. Há uma
população de 268.508 habitantes, dos quais 103.996 moradores do distrito de
Guaianases e 164.512 pertencentes ao distrito do Lajeado,12 29,50% das
pessoas residentes nestes distritos vivem nos setores censitários 5 e 6
(vulnerabilidade alta e muito alta), colocando Guaianases como o oitavo lugar
com um dos piores índices em relação à alta vulnerabilidade social.13
12Disponível em Nossa São Paulo, <htpp///nossasaopaulo.org.br/observatório/regiões> Acesso em: 15 ago. 2011. 13Disponível em: Índice paulista de Vulnerabilidade Social, <htpp///w.w.w. seade. gov.br>. Acesso em: 16 ago. 2011.
73
A noção de vulnerabilidade social, neste caso especificamente crianças
e adolescentes, famílias ou comunidades, é entendida como uma combinação
de fatores que produz uma deterioração da qualidade de vida em consequência
da exposição de riscos. A vulnerabilidade de um indivíduo, família ou grupos
sociais refere-se à maior ou menor capacidade de controlar as forças que
afetam seu bem-estar, ou seja, a posse ou controle de ativos que constituem
os recursos requeridos para o aproveitamento das oportunidades possibilitadas
pelo Estado, mercado ou sociedade.
Em outra pesquisa de 2003,14 Guaianases e Lajeado foram apontados
como duas das áreas mais vulneráveis da capital, ao lado de jardim Ângela,
Grajaú, Pedreira, Campo limpo, Jardim São Luiz e Jardim Helena. O
mapeamento levou em consideração o acesso ou a falta dele da população a
equipamentos públicos como unidades de saúde, escola, lazer e cultura.
Ainda para compreender a realidade social e econômica de Guaianases,
vale recorrer à outra estatística15 que aponta: 60,2% dos chefes de família
ganham no máximo três salários-mínimos; mais de 15% dos moradores vivem
em favelas; as taxas de analfabetismo são altas, bem maiores que a média da
cidade; as taxas de defasagem escolar também são altas. Nesta mesma
pesquisa apontou-se que o bairro se posiciona entre os distritos com maior
número de homicídios, superando 85 para cada grupo de 100 mil habitantes.
Guaianases tem uma história de 150 anos; é constituído por migrantes
de diferentes lugares da cidade e de outras regiões do país que se
concentraram num território de 17 quilômetros quadrados. Tal fenômeno
ocorreu, sobretudo na década de 80, com as ocupações urbanas organizadas
pelo Movimento Sem Terra da zona leste, com os grandes complexos
habitacionais e atualmente com os programas do governo estadual, o da
Companhia de Desenvolvimento de Habitação e Urbano do Estado de São
Paulo (CDHU) e os condomínios populares. É considerado um bairro
dormitório, pois não possui indústrias de grande porte, o comércio é local, de
pequeno porte e a população se desloca para outras regiões de São Paulo ou
14 Tal estudo é resultado da pesquisa do Centro de Estudos da Metrópole (CEM), coordenado pela Universidade de São Paulo sobre bairros vulneráveis em São Paulo, disponível em: <htpp///w.w.w. centrodemetropole.org. br>. Acesso em: 17 ago. 2011. 15 É uma pesquisa que apresenta dados do bairro, segundo a Fundação Seade, do ano 2000, disponível em: <htpp///w.w.w. seade.org. br>. Acesso em: 17 ago. 2011.
74
para cidades vizinhas, como, Guarulhos, Osasco, Santo André, São Bernardo,
para trabalhar.
Também na década de 1980 nota-se uma efervescência dos
movimentos reivindicatórios e sociais que se organizam para conquistar a
moradia, saneamento básico, luz, pavimentação de rua, creche, áreas de lazer,
espaços de cultura, hospitais, postos de saúde e educação. Com as ocupações
massivas, crescem também significativamente as organizações populares,
ancoradas pelos setores progressistas da Igreja Católica através das
Comunidades Eclesiais de Base e das Pastorais Sociais. Com o crescimento
do Partido dos Trabalhadores e de um núcleo do partido Comunista do Brasil
(PCdoB), inúmeras ONGs são formadas no bairro.
Neste contexto, a Associação dos Voluntários Integrados no Brasil
(AVIB) surgiu em 1985, e foi idealizada pelo religioso italiano, Padre Jorge
Gagliani, comprometido com a defesa dos direitos das Crianças e
Adolescentes. Encontro um retrato desta história na literatura de cordel de
Cacá Lopes (2010, pp. 4-5):
No dia 03 de dezembro A data da fundação, Documentos assinados Após uma reunião. Registrados em um dos Cartórios da região. Dezenove nove cinco (1995) A AVIB foi criada, Distrito do Lajeado A semente foi plantada Com diversas parcerias Com o tempo foi ampliada. Pe. Jorge, um apaixonado Pela causa da criança, Defendia o adolescente Com muita perseverança Conviveu com a miséria Mas viu brotar esperança. Por ser Lajeado, um bairro De São Paulo, tão carente, Onde impera a violência Miséria sempre presente, O poder público demora A chegar pra essa gente...
75
A ONG é uma organização da sociedade civil sem fins lucrativos,
democrática e pluralista que congrega projetos, movimentos e grupos que
lutam contra as formas de discriminação, de desigualdades e violação de
direitos. Visa à construção e manutenção de modos de vida sustentáveis, bem
como do pleno exercício da democracia. A AVIB define como sua missão:
democratizar o acesso às políticas públicas através dos serviços sociais de
qualidade, fortalecendo a autonomia, a mobilização social e a garantia de
direitos (LOPES, 2010).
A sede da Associação localiza-se no distrito do Lajeado,16 tido como um
dos mais complexos distritos dentre os 96 que compõe a cidade de São Paulo,
nos indicadores de violência, desemprego, nível de escolaridade, entre outros.
Vale ressaltar que a ausência ou insuficiência de recursos sociais nesta região
e a elevada demanda que se apresenta no distrito comprometem o
desenvolvimento social e psicológico da população - crianças, adolescentes e
famílias inteiras acabam se caracterizando em condições de altíssima
vulnerabilidade pessoal e social, conforme já explicitado. A ONG também atua
nos distritos de Guaianases, Cidade Tiradentes e São Miguel Paulista.
A AVIB desenvolveu e desenvolve ações17 que fortalecem o exercício de
proteção social e de solidariedade à população em geral, descritas abaixo:
a) “Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes” –
(ABRIGO). Foi o primeiro projeto desenvolvido pela Instituição; atendeu
diretamente, num período de 14 anos, 280 crianças e adolescentes de ambos
os sexos, na faixa etária compreendida entre zero a dezessete anos e onze
meses que se encontravam sem proteção integral e em situação de
vulnerabilidade pessoal e social, órfãs e vitimadas sexualmente. E em média
atenderam-se 1050 usuários indiretos (familiares) pelo mesmo período. A partir
de 2002 é celebrado o convênio com a Secretaria Municipal de
Desenvolvimento Social (SMADS), ampliando e qualificando o atendimento aos
usuários até o ano de 2010.
16 Rua Francisco Gil de Araújo, 135- Jardim Lourdes; site: <Htpp://www.avibbrasil.org.br> email: [email protected] 17 Esta descrição dos projetos da AVIB encontra-se no Plano de Trabalho do Programa Ação Família dirigida à Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, encaminhado em 2011.
76
b) “Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos” (MOVA/SP).
Segundo projeto desenvolvido pela ONG tem o objetivo de promover ações
educativas para contribuir com o processo de diminuição do analfabetismo e
proporcionar instrumentos para o pleno desenvolvimento humano, por meio de
um trabalho de alfabetização que valorize o lugar social dos educandos,
ajudando-os na leitura do mundo e das letras, conforme o ideário de Paulo
Freire. Esta atividade é realizada desde o final da década de 1990, com
voluntários do bairro, militantes dos movimentos sociais e das comunidades
católicas. A partir de 2001 iniciou-se a parceria com a SME.
c) “Núcleo de Apoio à Família” (NAF). Teve seu surgimento na garagem
das casas de muitos voluntários da Pastoral da Criança que se organizavam
pastoralmente ligados a Paróquia Sagrada Família, Diocese de São Miguel
Paulista, com o objetivo de minimizar o nível de desnutrição, bem como
promover o combate à violência doméstica e da infância. Atendia-se a mais de
50 crianças ao mês em situação de vulnerabilidade social e econômica, com
alimentação saudável, orientação sócio educativa e noções básicas de saúde.
Constituiu-se até hoje em um espaço de referência à família, à criança e ao
adolescente do bairro, no intuito de fortalecê-los com atividades
complementares que contribuam efetivamente com a garantia de direitos. O
seu início ocorreu há mais de duas décadas, e em 2006, a Associação passa a
oferecer condições para a celebração de convênios públicos com este espaço,
desenvolvendo projetos como:
d) “Agente Jovem”. Compreendido como a conjugação da Bolsa Agente
Jovem e da ação socioeducativa, promoveu atividades continuadas que
proporcionaram ao jovem, entre 15 e 17 anos, experiências práticas e o
desenvolvimento do protagonismo juvenil, fortalecendo os vínculos familiares e
comunitários e possibilitando a compreensão sobre o mundo contemporâneo
com especial ênfase à educação e ao trabalho.
e) “Tesoura Mágica”. Projeto financiado pelo programa Criança
Esperança foi um importante projeto de capacitação profissional na área
estética que atendeu 35 jovens com idade de 16 a 20 anos, proporcionando
vivências em ambientes de trabalho correspondente no final do curso.
f) “Programa Ação Família – Viver em Comunidade”. Em 2006 a AVIB
celebrou o convênio com a SMADS e suas respectivas coordenadorias o
77
Programa Ação Família – Viver em Comunidade. Seu objetivo é a promoção do
fortalecimento, da emancipação e da inclusão social das famílias em situação
de risco e vulnerabilidade pessoal. Pactua o trabalho socioeducativo a
promoção do acesso aos serviços públicos, priorizando ações que visam ao
fortalecimento da família como agente transformador da sua comunidade. O
serviço presta atendimento para 1200 famílias/mês.
g) “Núcleo de Defesa e Convivência da Mulher Viviane dos Santos”.
Instituído com o propósito de combater, prevenir e enfrentar a violência
doméstica contra as mulheres. Foi implantado em 2004, a partir dos dados da
pesquisa realizada pelo Movimento de Mulheres Abra os Olhos Companheira.18
Atualmente localizado no distrito de Guaianases, o Núcleo de Defesa e
Convivência da Mulher Viviane dos Santos é estrutura fundamental de
prevenção e enfrentamento da violência contra a mulher. Promove a ruptura da
situação de violência e a construção da cidadania, por meio de ações globais e
regionais de atendimento interdisciplinar à mulher em situação de violência.
Articula os serviços governamentais e não governamentais integrantes da rede
de atendimento. Elabora estudos preliminares, encaminha e acompanha o
atendimento na rede de serviços, oferecem-se orientações gerais que
identifiquem a situação de violência contra a mulher, com vistas à denúncia;
bem como realiza acompanhamento psicológico, social e jurídico à mulher em
situação de violência: sexual, física, moral, patrimonial e psicológica
(esporádica ou de repetição) ocorrida no contexto de nenhuma relação
(cometida por desconhecidos), de relações de afeto e de confiança e/ou de
trabalho. Diante da desigualdade na divisão sexual do trabalho, oferece
serviços de natureza ocupacional e participa, além de outras iniciativas, do
Programa Roda da Cidadania da SMADS, uma cooperativa, denominada
Núcleo Alternativo das Mulheres (NAMA). O serviço chega a atender cerca de
300 mulheres ao mês.
h) “Programa: Jovens Urbanos”. Iniciativa da Fundação Itaú Social com
organização técnica do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura
e Ação Comunitária (CENPEC). Oferece para jovens de 16 a 21 anos das
periferias um programa-rede que articula questões da vida na cidade, a
18 Este movimento entrevistou 800 mulheres no distrito do Lajeado, onde se constatou um alto índice de violência sofrida pelas mulheres pesquisadas.
78
escolaridade, a cultura e a tecnologia por meio de pesquisa, exploração,
experimentação, circulação e produção. As ações de formação dos jovens
abrem possibilidades de trânsito nos territórios urbanos, expandem as relações
e lançam novas perspectivas para as condições de vida da juventude. Os
jovens recebem assessoria para colocar em prática seus projetos de
intervenção na cidade. Atualmente este programa está em sua 6ª edição,
sendo a 4ª no Distrito do Lajeado com a participação da AVIB atendendo
diretamente a 60 jovens.
i) “Centro para a Juventude”. Situado no Jardim Fanganiello, bairro do
distrito Lajeado. A ação tem por objetivo atender jovens, de 15 a 18 anos e
onze meses que residam próximo ao equipamento, em situação de
vulnerabilidade social e econômica, por meio de orientação socioeducativa e
fortalecimento de lideranças comunitárias. A metodologia desenvolvida com os
jovens contempla os capitais: humano, social e produtivo, na perspectiva
promocional e de direitos. Constitui-se também em um espaço de referência à
família, no intuito de fortalecê-la por meio de um leque de atividades que
colaborem em seu desenvolvimento pessoal e social. Também são abordadas
questões relacionadas ao mundo do trabalho e opções de geração de renda.
j) “Núcleo Espaço do Saber I – Lajeado”. O projeto é idealizado para
fortalecer políticas públicas para crianças e adolescentes com a missão de
contribuir na erradicação do nível de violência infantil no distrito, em uma
parceria com a Secretaria Municipal de Participação e Parceria (SMPP),
através do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
(FUMCAD). Atende no contra turno escolar, oferecendo atividades culturais,
recreativas, pedagógicas e reforço escolar, atendendo 43 crianças de 6 a 11
anos e 11 meses em seus diversos aspectos para o desenvolvimento integral
das crianças e adolescentes.
k) “Núcleo Espaço do Saber II – Cidade Tiradentes”. É desenvolvido por
um grupo de voluntários desde junho de 2010 com o objetivo de contribuir no
combate à questão da violência contra as crianças e adolescentes e contribuir
no exercício da cidadania. O projeto atende cerca de 30 crianças de 7 a 11
anos e 11 meses em período de contra turno escolar.
Considerando os princípios de parceria, a Associação pactua suas
relações com organizações, instituições, esferas governamentais e ainda
79
mantém apoio de importantes parceiros como: Prefeitura Municipal de São
Paulo, através das Secretarias da Assistência e Desenvolvimento Social,
Educação, Cultura, Participação e Parceria; Governo do Estado de São Paulo,
através da Secretaria de Emprego e Relações do Trabalho e a Secretaria
Estadual de Assistência e Desenvolvimento Social; Associazione Amice Del
Brasile da Província de Macerata, Itália; Associação A Mulher e o Hip Hop;
Banco do Brasil; Itaú Social; Centro de Atendimento ao Trabalhador (CEAT);
Católicas pelo Direito de Decidir; Ericsson Telecomunicações; Instituto Polis;
Marcha Mundial das Mulheres; Pastoral da Criança; Serviço Social do
Comércio (SESC) e MESA BRASIL; Serviço Nacional de Aprendizagem
Comercial (SENAC); Universidade Cruzeiro do Sul; Universidade Camilo
Castelo Branco; Pontifícia Universidade Católica/SP; Espaço Cultural Professor
Paulo Freire; Instituto Paulista de Juventude (IPJ); Projeto Esperança; Paróquia
São Francisco de Assis e Paróquia Sagrado Coração de Jesus.
3.2. Análise do programa de formação de educadores do MOVA/SP da
AVIB: estrutura e dinâmica
O MOVA De manhã me levantei e comecei a pensar
Que poderia fazer para o MOVA, Que é um grande projeto
Para a vida melhorar.
Em Guaianases tem MOVA Que ajuda escrever e ler, alfabetizar,
A todos que na idade Não puderam estudar.
Ó senhores e educadores que criaram este projeto
A minha homenagem para o grande educador Hoje com alegria, quero lhes agradecer
A mulher ou homem que lutou por este movimento Dando oportunidade para todos aprender.
MOVA é um grande projeto,
Que nos dá cidadania Esperança de um país mais justo
E viva o grande educador Paulo Freire.
Hoje posso lhes dize Já sei ler e escrever veja o exemplo de vida
L u z i n e t e = Luzinete Este é o meu nome
80
Viva o MOVA Da grande cidade de São Paulo
Projeto que não deve acabar Parabéns educadores e educadoras.19
O MOVA/SP é um dos principais programas da AVIB e tem uma história
de mais de doze anos em Guaianases. Promove ações educativas para
contribuir com o processo de combate ao analfabetismo em Guaianases,20
proporcionando elementos para o pleno desenvolvimento humano em
consonância com o pensamento de Paulo Freire.
Villaseñor (2011, p. 01) resgata a importância do trabalho de educadores
populares que atuavam na alfabetização de jovens e adultos de forma
voluntária, pois conforme relatado no primeiro capítulo, o MOVA/SP deixou de
ser uma política municipal durante os oito anos da gestão Maluf-Pitta, o que
exigiu dos grupos que trabalhavam a educação popular uma dedicação
totalmente voluntária:
Ao chegar e conhecer a realidade social do bairro de Guaianases tive a surpresa de encontrar alguns educadores, que apesar das dificuldades continuavam como voluntários dando aulas de alfabetização para jovens e adultos nos salões das Igrejas Católicas e em algumas associações de moradores. Tudo era feito de maneira precária e isolada, mas sem perder a ação pedagógica de Paulo Freire. A educação se desenvolvia com base na leitura da realidade do educando, a partir da qual se identificavam as situações significativas da realidade em que estava inserido.
Estes educadores, apoiados pela Paróquia Sagrada Família,21
organizaram em março de 1999 um grupo chamado de educação popular, que
19 Esta poesia foi composta por uma educanda do MOVA/SP da AVIB, Luzinete Francisca da Cruz e faz parte do Caderno: AVIB. 10 anos, poesia MOVA, 2005, Guaianases/SP. 20 Em Guaianases a taxa de analfabetismo é 7,7%, enquanto a média da cidade é de 4,88% das taxas de defasagem escolar, dados da Fundação SEADE, 2010, disponível em: <htpp///w.w.w.seade.org. br>. Acesso em: 22 ago. 2011. 21 A referida Paróquia, até o ano 2002, respondia por todo o Distrito do Lajeado, ou seja, atuava em um universo de quase 160 mil habitantes, acompanhando pastoralmente mais de 20 comunidades nos diferentes bairros. A Paróquia desenvolvia também trabalhos sociais por intermédio de duas Entidades: a Joílson de Jesus que existia desde o início dos anos 90, atendendo crianças e adolescentes, com destaque para as chamadas Casas dos Meninos, importantes para o desenvolvimento de centenas de adolescentes; a AVIB teve início atendendo crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social e posteriormente alargou a sua atuação com jovens, famílias empobrecidas, na defesa dos direitos humanos, da mulher vítima da violência e o trabalho com a educação popular, grupos de MOVA.
81
atuava como MOVA/SP, cujo objetivo era socializar as experiências de
alfabetização de jovens e adultos, possibilitar uma maior articulação entre estes
educadores voluntários e desenvolver atividades de formação, conforme
descrito no depoimento de Villaseñor (2011, pp. 1-2):
Às sextas-feiras, houve formação pedagógica na Chácara Paroquial da Sagrada Família, com vários educadores voluntários, procurando trocar experiências e buscando parcerias com entidades da área da educação. O resultado foi positivo e participativo, realizado em conjunto com o saber da comunidade como matéria prima para a educação. Houve um salto na qualidade nos núcleos de alfabetização e educação popular do bairro de Guaianases. Em 2000, foi decisiva a participação e integração dos educadores no Fórum do MOVA/SP e do Fórum MOVA Leste, constituído como instância máxima do Movimento de alfabetização; considerado o espaço de formação, de planejamento, de decisão político-pedagógica sobre os rumos do MOVA/SP em seu diálogo com as bases do MOVA que acontecia em diferentes lugares da cidade.
Com a eleição de Marta Suplicy em 2000, o MOVA/SP foi retomado
como programa ligado à Secretaria Municipal de Educação conforme descrito
no primeiro capítulo. Neste contexto, a AVIB, que já desenvolvia trabalhos de
alfabetização de jovens e adultos, conseguiu o convênio em 2001, o que
possibilitou uma consolidação no trabalho desenvolvido. Atualmente a AVIB
atende 22 núcleos educativos, com uma média de 300 Educandos, 22
Educadores e 03 Coordenadores.
A formação continuada destes educadores ocorre de diferentes formas:
participação em seminários e oficinas promovidos pela Secretaria Municipal de
Educação através da Supervisão da Diretoria Regional de Ensino, atividades
formativas feitas pelos Fóruns do MOVA/SP e pelo Fórum da Leste. Outro
momento importante de formação tem sido as Semanas de Alfabetização. Em
Guaianases, em 2010, as atividades ocorreram de 13 a 17 de setembro no
Centro Educacional Jambeiro (CEU), com a participação de 04 ONGs
conveniadas com o MOVA/SP, dentre elas, a AVIB. A participação dos
educandos e educadores considerada significativa e no decorrer da semana
ocorreram diversas atividades pedagógicas, culturais e sociais. Contou-se com
sarau poético, apresentação de trava-línguas, de coral, de danças, de oficinas
culturais, teatros de fantoches, depoimentos de educandos e educadores sobre
82
as práticas pedagógicas e as conquistas na compreensão da leitura das letras
e do mundo (PMSP/SME, 2010).
Entretanto, um ponto a ser examinado com mais atenção diz respeito à
formação continuada colocada às sextas-feiras, quando os educadores se
reúnem para estudo de temáticas importantes, trocas de experiências
pedagógicas, planejamento e cronograma de ações e compreensão do Projeto
Político Pedagógico a partir da realidade em que os grupos de base estão
situados, pois segundo Freire “uma destas exigências tem que ver com a
compreensão crítica dos educadores do que vem ocorrendo na cotidianidade
do meio popular. Não é possível a educadores e educadoras pensar apenas os
procedimentos didáticos e os conteúdos a serem ensinados aos grupos
populares” (PMSP/SME, 2003, p. 27).
No termo de convênio do MOVA/SP, afirma-se na sub cláusula primeira:
“As atividades de planejamento e formação permanente de coordenadores,
monitores serão desenvolvidas por no mínimo três horas semanais às sextas-
feiras em local a ser fixado pelo NAE, ouvindo-se a conveniada” (PMSP/SME,
2002).
Nestes encontros de formação organizados pela própria Entidade
Conveniada, os coordenadores têm a tarefa de planejar e articular esse
momento tendo como enfoque principal as questões de organização interna
mais específica, resolução de dúvidas e discussão sobre as demandas
específicas dos educadores.
3.3. O que pensam os educadores populares a respeito da formação
continuada proporcionada pela AVIB
O universo pesquisado, por meio de questionários,22 alcançou a
totalidade dos profissionais envolvidos no trabalho de alfabetização ligados à
ONG AVIB: 22 educadores e 03 coordenadores, destes 22 são mulheres e
somente 03 homens, ou seja, 82,5% são educadoras, o que caracteriza o
grupo como majoritariamente feminino.
22 Conferir questionários utilizados junto aos educadores da AVIB que se encontra no ANEXO E.
83
Passo a utilizar algumas tabelas que ajudarão a elucidar a realidade dos
grupos do MOVA/AVIB, bem como a voz dos educadores populares.
TABELA I – LOCAL DE FUNCIONAMENTO DOS GRUPOS DE ALFABETIZAÇÃO
Onde funcionam os grupos do MOVA Frequência %
Espaço cedido pela Igreja Católica 9 40,5
Espaço das igrejas Evangélicas 1 4,5
Espaço cedido pelo Centro Espírita 1 4,5
Espaço cedido por ONGs 7 32,5
Utilização de garagens das residências 4 18,0
Total 22 100,0
O autor.
De acordo com a tabela I, 40,5% dos locais se encontram em salões das
comunidades católicas, 4,5% em Igreja evangélica e também 4,5% em Centro
Espírita. Num segundo plano, se observa que outros espaços são cedidos
pelas ONGs, parceiras no trabalho de alfabetização, como a Entidade Paulo
Freire, Espaço Cultural Carlos Marighela, Projeto Criança Feliz, a Associação
de Moradores da Vila 1º de Outubro e, na sede da própria AVIB, totalizando
32,5%. Há ainda a utilização das garagens residenciais dos educadores, que
somam 18,% dos espaços pesquisados.
Quanto à caracterização dos espaços onde funcionam os grupos do
MOVA/SP coordenados pela AVIB, observa-se o estreito vínculo da referida
organização com a Igreja Católica, pois, pelo próprio histórico apresentado no
terceiro capítulo, é notório que o MOVA em Guaianases se desenvolveu nas
comunidades católicas, contando com o apoio dos padres e das religiosas que
atuavam na Paróquia Sagrada Família – Lajeado, onde a maioria dos grupos
funciona, conforme o depoimento apresentado por Villaseñor (2011, p. 01),
quando resgatou a história do MOVA em Guaianases:
Os educadores que atuavam com a alfabetização de jovens e adultos eram militantes dos movimentos sociais e das comunidades, atuavam de forma voluntária, geralmente eram
84
ligados as pastorais sociais, alguns trabalhavam como professores da rede e também se dedicavam à formação de jovens e adultos de maneira totalmente espontânea. Estes grupos aconteciam motivados pelo idealismo e porque contavam com o apoio da igreja, das comunidades e dos padres. Os encontros aconteciam nos salões das Igrejas Católicas e em algumas associações de moradores. Tudo era feito de maneira precária e isolada, mas sem perder a ação pedagógica de Paulo Freire.
Os dados sobre o local utilizado para a realização do MOVA/SP
demonstram que a educação popular tem acontecido em espaços
comunitários, ligados às Igrejas ou Associações que compreendem o papel
desta tipologia de educação não formal para a sociedade. Um facilitador,
observado também em outros estudos sobre a mesma temática, diz respeito à
proximidade dessas salas com o local de moradia dos educandos ao procurar o
MOVA/SP, como observado em Kunrath (2006, p. 28):
Os locais de funcionamento das salas/turmas situam-se o mais próximo possível da residência dos educandos, sendo em salões de igrejas, garagens, salões comunitários, sedes de organizações sociais, entre outros. A maior parte das salas/turmas está na periferia da cidade, nos bairros e nas favelas, nos becos e nas vielas. Elas estão localizadas, em sua maioria em comunidades onde as escolas da rede pública não conseguem atender os educandos e em suas áreas periféricas de grande exclusão social da cidade.
A tabela a seguir aponta a faixa etária dos educandos que frequentam
as salas do MOVA, formada por 50% de adultos acima de 40 anos, 31,8 % na
faixa entre 29 a 39 anos e outros 18,2%, entre 18 a 28 anos de idade.
TABELA II – FAIXA ETÁRIA DOS EDUCANDOS DO MOVA/SP
Prevalência de idade dos educandos Frequência %
De 18 a 28 anos 4 18,2
De 29 a 39 anos 7 31,8
Acima de 40 anos 11 50,0
Total 22 100,0
O autor.
As pessoas, que procuram uma sala de MOVA, identificam-se com a educação informal e, muitas vezes, são convidadas diretamente por um
85
educador, um vizinho ou amigo que tenha passado pela experiência de alfabetização. É o que se pode confirmar no testemunho da educanda Maria Vanda dos Santos, segundo Macena (2009, p.11), na ocasião da comemoração dos 20 anos da existência do MOVA/SP:
Sou moradora da zona leste, estudante do MOVA há dois anos. É muito gratificante para nós que temos dificuldades para ler e escrever ter esta oportunidade. Hoje eu escrevo e leio. Eu tenho uma vizinha que ria muito da minha iniciativa de começar a estudar por causa da minha idade, mas eu sempre falei bem do Movimento de Alfabetização. Hoje ela também estuda no MOVA.
TABELA III – GÊNERO DOS EDUCANDOS DO MOVA
Quem participa do MOVA/SP Frequência %
A maioria é mulher 18 81,8
A maioria é homem 4 18,2
Total 22 100,0
O autor.
Quanto à prevalência de gênero dos educandos, é preponderante o
gênero feminino 81,8%; 18,2% de homens participam das salas do MOVA,
conforme demonstrado na tabela acima.
TABELA IV – INSERÇÃO NO MERCADO DE TRABALHO
Perfil dos educandos Frequência %
Sem trabalho 5 22,7
Sem trabalho, mas procurando 3 13,6
Trabalhando informalmente 9 40,9
Aposentado 3 13,6
Outra situação 2 9,1
Total 22 100,0
O autor.
86
Quanto à questão profissional, conforme a Tabela IV, o perfil dos
educandos é formado por trabalhadores ligados à informalidade, 40,9%, além
de um número significativo de pessoas sem trabalho ou que estão buscando
uma colocação, 36,3%. Os demais dados apontam que somente 19,7% são
aposentados ou estão numa outra situação. Segue a tabela sobre o perfil
destes sujeitos em alfabetização nas salas do MOVA/AVIB. Tais dados
apontam a vulnerabilidade social discutida no início deste capítulo, conforme os
indicadores sociais da Fundação SEADE23 que reforçam a tese sobre a
situação de carência de políticas públicas em Guaianases.
Agora passo a discutir o perfil dos educadores do MOVA/AVIB. As
tabelas apresentadas são identificadas pelas letras a, b, c, d que tratam da
prevalência de gênero, tempo que é educador, exercício de outra atividade na
educação e escolaridade para ajudar na caracterização destes sujeitos
atuantes nos grupos de alfabetização da Instituição em questão.
TABELA V a – PERFIL DOS EDUCADORES DO MOVA/AVIB: A PREVALÊNCIA DE GÊNERO
Gênero
Frequência %
Mulheres
20 90
Homens
02 10
Total
22 100,0
O autor
A tabela V Perfil dos educadores do MOVA/AVIB, letra a, diz respeito à
prevalência de gênero, dado que a quase totalidade dos educadores, 90% é
mulher. Lanço mão de outra pesquisa elaborada pela SME/PMSP (1992, s/ p.)
que apresenta indicativos sugerindo uma alta superioridade da atuação das 23
Ainda para compreender a realidade social e econômica de Guaianases, vale recorrer a outras estatísticas: 60,2% dos chefes de família ganham no máximo três salários mínimos, mais de 15% dos moradores vivem em favelas, as taxas de analfabetismo são altas, bem maiores que a média da cidade e as taxas de defasagem escolar também são altas. Nesta mesma pesquisa, apontou-se que Guaianases está entre os distritos com maior número de homicídios, superando 85 para cada grupo de 100 mil habitantes. Disponível em: <www. Seade.org.br>. Acesso em: 20 set. 2011.
87
mulheres como educadoras: “a maioria dos alfabetizadores eram mulheres cuja
única atividade remunerada era a participação no programa do MOVA/SP. Do
conjunto, 60% nunca haviam desenvolvido atividades educativas
anteriormente”.
Estudando outras experiências de grupos de MOVA, constatam-se
aproximações ainda mais significativas, como em Costa (2008, p. 65), que
analisa o MOVA de Guarulhos, grande São Paulo, quando o número de
educadoras é marcadamente superior:
Destacamos que no período de realização desta pesquisa, 92% dos alfabetizadores do MOVA/Guarulhos eram mulheres. Nos demais anos também pudemos observar essa característica do movimento: a maioria esmagadora dos sujeitos que dele participam como educadores populares são mulheres. Dentre os educadores a proporção é menor, conforme exposto.
A presença significativa de mulheres como educadoras do MOVA/AVIB
reforça a constatação de que são muito ativas nas CEBs, nos movimentos
sociais e nas lutas populares. Destaca-se, assim, seu importante papel nos
últimos tempos na promoção da igualdade, nas discussões de gênero e mesmo
na educação, na política, no sindicato e em outros setores profissionais, o que
tem contribuído para o resgate de sua importância na sociedade.
TABELA V b - TEMPO QUE É EDUCADOR DO MOVA/AVIB
Há quanto tempo é educador
Frequência %
Menos de 02 anos
04 18,0
De 03 a 04 anos
01 4,5
Acima de 5 anos
17 77,5
Total
22 100,0
O autor.
Conforme a tabela acima, dos 22 entrevistados, 17 deles estão acima de
05 anos no programa; dado extremamente significativo, pois a experiência
acumulada ao longo deste período possivelmente contribui para uma maior
interação com os educandos, uma vez que um processo em longo prazo facilita
88
a interação e o ensino-aprendizagem. Outra questão é a construção de um
caminho de formação permanente feito por estes sujeitos.
Segundo Barreto, (2006) o trabalho de formação continuada demanda
tempo e continuidade. É difícil encontrar um formador de educadores populares
que considere possível uma autonomia razoável para o educador em menos de
um ano: “os trabalhos de formação que mais nos deixaram felizes em participar
de tal realização aconteceram em períodos superiores a dois anos de
encontros constantes e regulares” (BARRETO, 2006, p. 100).
TABELA V c - EXERCÍCIO DE OUTRA ATIVIDADE NA EDUCAÇÃO
Tem outra atividade na área de educação
Frequência %
Professor do Estado ou da PMSP
01 4,5
Trabalha em outra ONG
04 18,0
Tem alguma atividade em comunidade
17 77,5
Total
22 100,0
O autor.
Quanto a outros trabalhos ou atividades exercidas pelos educadores da
AVIB, a tabela V c aponta-nos que um percentual significativo de educadores,
quase 80%, desempenha atividades em comunidade, na maioria nas
Comunidades Eclesiais de Base. É interessante observar que 18% destes
educadores têm uma atuação em outra organização não governamental, o que
evidencia um comprometimento social e comunitário; uma das educadoras atua
como professora estadual na alfabetização de crianças.
Com base nas entrevistas realizadas, é possível considerar que o
conjunto de educadores da AVIB é formado por sujeitos comprometidos de
uma maneira ou de outra com as questões comunitárias e sociais; poucos são
militantes das causas sociais, políticas, de gênero ou de outras lutas por
igualdade.
89
Por um lado, a questão da militância na política e nos movimentos
sociais não está presente no perfil destes sujeitos, como no contexto da
primeira edição do MOVA/SP, quando criado por Paulo Freire, na
Administração Erundina. Naquela oportunidade, prevalecia o perfil militante
social e político dos educadores. Por outro lado, o perfil dos educadores atuais
coincide com uma atuação comunitária e social; a remuneração não significa o
fator preponderante até porque os educadores trabalham praticamente como
voluntários, uma vez que recebem uma ajuda de custo de um salário-mínimo.
TABELA V d - ESCOLARIDADE DOS EDUCADORES
Grau de escolaridade
Frequência %
Ensino Médio
15 60
Curso Superior incompleto
07 40
Total
22 100,0
O autor.
A escolaridade dos educadores do MOVA/AVIB é outra questão
importante a ser considerada, conforme a Tabela V d, observa-se que 60% dos
educadores têm somente o Ensino Médio, outros 40% estão cursando o Ensino
Superior, todos matriculados em Pedagogia.
Dados de PMSP/SME (1992,s/ p.) apontam que o grau de escolarização
dos educadores do MOVA/SP ainda apresenta dados em que uma alta
porcentagem tem o Ensino Fundamental ou no máximo o Médio, conforme o
indicado a seguir: “13,9% possuem o Ensino Fundamental completo, 11,9% o
incompleto, 13,5% o Médio, 20,3% o Médio sem concluir, 22,1% possuem o
Magistério concluído ou não, 3,1% não declararam e 16% possuíam o nível
Superior completo ou incompleto”.
Para Kunrath (2006, p. 104), a questão da elevação de escolaridade dos
educadores do MOVA/SP é um problema muito presente:
Um dos desafios é que há muito tempo é uma reivindicação dos educadores populares, qual seja, a criação de mecanismos de elevação da escolaridade e profissionalização desses educadores. A maioria dos educadores que, ao ingressar em um programa de alfabetização não tinham concluído o ensino
90
Médio, atualmente já o concluiu. Porém, a dificuldade é muito maior quando se pensa em um curso de nível superior, dado o quadro da educação superior que não dispõe de vagas nas Universidades públicas e ainda há a barreira dos processos seletivos, já conhecida por todos. Já o ingresso em Instituições privadas de ensino superior, tem a barreira financeira.
A elevação da escolaridade dos educadores do MOVA tem sido um
debate presente nos Fóruns do MOVA/SP, bem como nos Encontros Regionais
e Nacionais do MOVA/Brasil, numa perspectiva de valorização profissional dos
educadores. Para exemplificar essa preocupação, retomo uma das
deliberações tiradas no 6º Encontro Nacional de 2006: defender a necessidade
da formação universitária para o educador alfabetizador, a fim de recuperar a
sua valorização diante dos outros educadores e da EJA, bem como as
parceiras e convênios com as Universidades Públicas e Particulares.
O Boletim da Ação Educativa (2004, p. 9) analisa os limites relativos ao
incentivo à formação de educadores populares: “uma das tarefas pendentes da
educação de jovens e adultos é a formação inicial e continuada dos
educadores, pois são ainda tímidas as ações das universidades e
administrações públicas voltadas à preparação desses profissionais”. Assim, a
questão da escolaridade destes educadores merece uma atenção maior das
Instituições formadoras, bem como o incentivo das esferas governamentais no
sentido de subsidiar e apoiar a inserção dos educadores no mundo acadêmico.
Com a análise da parte II do questionário aplicado aos educadores do
MOVA da AVIB procurou-se identificar como ocorre o processo de formação no
interior da ONG. Para tanto continuarei utilizando algumas tabelas.
TABELA VI – APROXIMAÇÃO DOS EDUCADORES COM O MOVA/AVIB
Como ocorreu a aproximação Frequência %
Convidado por um educador 10 44,0
Convidado por um coordenador 5 24,0
Indicado pela ONG 1 4,0
Outro meio 6 28,0
Total 22 100,0
O autor.
91
A aproximação dos educadores com o MOVA da AVIB ocorreu
principalmente por convite direto de outro educador totalizando 44%. Para
24%, o convite foi feito pela coordenação do projeto e, para 28% dos
educadores, a aproximação se deu por outro meio – como o incentivo do
próprio padre que acompanhava a comunidade, das irmãs ou dos
coordenadores das comunidades, o que denota uma profunda ligação e
sintonia do MOVA/AVIB com a caminhada das comunidades católicas.
TABELA VII – ENVOLVIMENTO DOS EDUCADORES COM A AVIB
Como os educadores se envolvem Frequência %
Participa das assembleias 8 36,0
Participa das assembleias formativas 8 36,0
Participa das atividades formativas ou culturais 4 18,0
Restringe-se à formação do MOVA 1 0,5
Tem envolvimento com outros projetos da AVIB 1 0,5
Total 22 100,0
O autor.
No que se refere às formas de participação na ONG, a tabela VII indica
que 36% dos educadores afirmam participar das assembleias, outros 36%
participam das atividades formativas, 18% se envolvem nas atividades festivas
ou culturais da entidade. E O,5%, ou seja, uma só pessoa participa apenas das
obrigações do MOVA se restringindo às atividades pertinentes à alfabetização.
Também O,5%, um educador apenas tem uma participação mais efetiva no
conjunto da entidade, militando em outros projetos da ONG, como na defesa da
causa da criança e adolescente, no trabalho com os jovens no apoio à luta das
mulheres vítimas da violência doméstica e outras atividades. Tal quadro
caracteriza o grau de inserção destes educadores no comprometimento com os
projetos da ONG.
92
TABELA VIII – ENVOLVIMENTO DOS EDUCADORES EM FÓRUNS DA
EDUCAÇÃO POPULAR
Como os educadores se envolvem com outros grupos do MOVA
Frequência %
Tem contato com outros
Educadores do MOVA
14 64,0
Participa do Fórum da Zona Leste 08 36,0
Total 22 100,0
O autor.
Quanto ao grau de envolvimento com outros grupos de MOVA da região,
possível nas formações promovidas pela DRE, a tabela VIII indica que 64% dos
educadores têm contato ou intercâmbio com outros grupos do MOVA para
além da AVIB, sobretudo nas semanas de alfabetização, outros 36% participam
de reuniões no Fórum da Zona Leste.
O citado envolvimento com outros educadores que também trabalham
com o MOVA/SP é uma oportunidade de interação e de diálogo muito
importante para o exercício da capacitação pessoal e do grupo, conforme Pinto
(2001, p. 113):
A capacitação crescente do educador se faz, assim, por duas vias: a via externa, representada por cursos de aperfeiçoamento, seminários, leitura de periódicos especializados, etc.; e a via interior, que é a indagação à qual cada educador se submete relativa ao cumprimento de seu papel social. Uma forma em que se pratica com grande eficiência esta análise é o debate coletivo, a crítica recíproca, a permuta de pontos de vista, para que os educadores conheçam as opiniões de seus colegas sobre os problemas comuns, as sugestões que outros fazem e se aproveitam das conclusões destes debates.
É significativo o percentual apontado pelos educadores que participam
das atividades formativas e culturais, pois reforça a importância da formação
como uma atitude contínua, segundo Freire (1991, p. 32):
(...) ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro horas da tarde. Ninguém nasce educador. A gente se
93
faz educador, a gente se forma como educador permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática.
Ficou evidente que os educadores em questão têm assumido
compromissos para além das atividades do MOVA, o que os caracteriza como
um grupo comprometido com o social e o comunitário. Porém, este quadro nem
sempre se confirma nas dissertações e nos relatos do MOVA/SP que
atualmente têm deixado de lado a identificação com a luta social, conforme
observado em Kunrath (2006, p. 91):
Dentre os elementos que se podem destacar como possíveis motivadores do esvaziamento na participação mais sócio-política dos educadores, coordenadores e entidades como um todo, está o fato de muitas instituições que participam do MOVA, o fazem pela possibilidade de receber recursos financeiros do município, esta pode ser uma forma de manter projetos funcionando na instituição.
TABELA IX – OUTROS MEIOS UTILIZADOS NA BUSCA DE FORMAÇÃO
Como os educadores buscam a
formação
Frequência %
Leitura de livros
11 49,5
Cursos de capacitação
07 32,5
Seminários ou outros eventos
04 18,0
Total 22 100,0
O autor.
Outra questão analisada pelos educadores em questão é como as
pessoas buscam a formação continuada utilizando outros meios. Apontou-se
que a maioria (49,5%) busca a formação na leitura de livros, enquanto outros
(32,5%) buscam cursos de capacitação e (18%) participam de seminários ou
eventos, conforme a tabela IX, pois o ideário freiriano possibilita esta busca,
conforme Freire (1983b, p. 83):
Para o educador dialógico, problematizador, o conteúdo programático da educação não é uma doação ou uma
94
imposição, um conjunto de informes a ser depositado nos educandos, mas, a devolução organizada, sistematizada e acrescentada ao povo daqueles elementos que este lhe entregou de forma desestruturada.
Esta busca pessoal nos remete à experiência de Freire (1994, p. 120),
quando relata a sua trajetória:
O pensar sobre minha própria prática e a prática dos outros me conduzia, por ter sido um pensador crítico, profundamente curioso, a leituras teóricas que eram pela iluminação da prática em análise, explicando ou confirmando o acerto ou o erro cometido nela.
Observa-se, com base nas respostas dos educadores, que a formação
continuada é buscada individualmente por meio de leituras sobre temáticas que
ajudam no desenvolvimento nas salas do MOVA, mas, é significativo o que é
apontado pela minoria dos educadores, quando entendem que a formação
continuada também é buscada em cursos de capacitação, numa relação
dialógica e de troca de experiência com outros educadores.
Para Ferreira (1996), é muito importante que o educador busque o
aprofundamento do próprio referencial teórico atual, ‘fazendo a leitura do
mundo e dos textos’, como diz Paulo Freire, para poder acrescentar novas
informações, discussões, pesquisa de outros autores que trabalham a temática
da alfabetização de jovens e adultos, e confrontar as teorias e as práticas de
educação popular com o que é vivenciado e estudado por colegas e outros
educadores.
Ainda segundo Ferreira (1996, p. 57), cabe ao educador aprimorar a sua
competência técnica que passa pela apropriação da capacidade de estudar e
planejar ações pedagógicas a fim de contribuir no desenvolvimento dos
educandos:
A competência técnica do educador passa pela apropriação da capacidade de dirigir o pedagógico, como sujeito da construção do projeto pedagógico com seus educandos: passa pela apropriação da capacidade de planejar, selecionar atividades significativas, interessantes e variadas, teoricamente fundamentadas para atingir objetivos claramente especificados, proporcionando o conhecimento do educando através de estratégias de intervenção pedagógica. Passa pela apropriação da capacidade de observar as reações significativas, afetivas, culturais e ideológicas do educando durante o desenvolvimento
95
das atividades pedagógicas; registrar as ocorrências significativas e continuamente avaliar os avanços do educando, avaliar o processo pedagógico e avaliar-se.
Passo a analisar o perfil dos coordenadores pedagógicos. Eles são
importantes para que o MOVA aconteça na base, favorecem o elo entre os
educadores e a Secretaria da Educação através da supervisão das Diretorias
Regionais de Ensino, bem como, acompanham o trabalho dos educadores,
visitando as classes e sendo os articuladores da formação continuada que
ocorre às sextas-feiras.
A pesquisadora Kunrath (2006, p. 25) afirma sobre o papel do
coordenador:
Para coordenar localmente o MOVA, o critério mínimo é que o coordenador tenha concluído o ensino médio ou superior, ou comprove experiência de no mínimo dois anos de trabalho com alfabetização de jovens e adultos. Cabe à organização ter coordenadores pedagógicos e administrativos conforme a necessidade, sendo que a cada grupo de sete salas é orientado que se tenha um coordenador pedagógico.
Quanto à prevalência de gênero, dos 03 coordenadores, 02 são
mulheres. Prevalece assim a reflexão feita quando se tratava da predominância
das mulheres no trabalho com educação popular e concretamente no MOVA, a
partir da experiência da AVIB.
Quanto à escolaridade dos coordenadores da AVIB, observa-se que os
03 protagonistas têm formação superior; as coordenadoras no campo das
Ciências Humanas, formadas em Pedagogia e Ciências da Religião e o
coordenador tem formação em matemática, o que enriquece o trabalho dos
grupos do MOVA. Devido à formação acadêmica, os coordenadores estão
teoricamente com maiores condições de contribuir na formação do conjunto
dos seus educadores.
No que se refere às atividades desenvolvidas por estes coordenadores,
registra-se que um deles atua na educação e os demais desenvolvem
trabalhos comunitários e pastorais. Uma das coordenadoras exerceu o
mandato de Conselheira Tutelar e a outra é religiosa, missionária de uma
Congregação que atua na região.
96
O tempo de atuação como coordenadores do MOVA/AVIB é outro
aspecto analisado; os 03 estão engajados na AVIB e neste trabalho com o
MOVA há mais de cinco anos, o que os credencia na função que exercem. E
por atuarem no campo formativo, os coordenadores seguem a metodologia de
formação proposta para o conjunto dos educadores do MOVA, quando são
incumbidos de possibilitar a formação continuada. Para Ferreira (1996, p. 65):
Organizar uma infraestrutura de formação dos educadores em pequenos grupos com uma coordenação pedagógica, num encontro semanal, produtivo, de socialização das experiências entre os educadores e de intervenção pedagógica do coordenador, onde a prática do educador-alfabetizador é coletivamente discutida, tendo como referência, os princípios políticos e metodológicos da proposta pedagógica do projeto de alfabetização.
Os coordenadores seguem a metodologia de formação, para a qual há
um processo em construção, o educador não é ‘tábula rasa’, assim como os
educandos não o são, como afirma categoricamente Freire (1991, p. 100):
“ninguém nasce educador, a gente vai se fazendo... eu estava sempre fazendo
perguntas e não apenas a meus pais a mim também e me dava ao gosto de ir
mais além das respostas, elaborando a partir delas novas perguntas, agradava-
me arriscar”.
A metodologia adotada é aquela que rejeita o planejamento pronto, que
impede o educador de construir coletivamente a prática pedagógica
mediatizada pelo mundo, conforme Ferreira (1996, p.64):
Rejeitamos aquela prática tradicional de entregar ao educador um planejamento pronto do que deve ser feito. Entregar ao educador um pacote, embrulhado e amarrado, de aulas a serem dadas, com os conteúdos prontos e exercícios a serem preenchidos, mecanicamente, pelos educandos, é desrespeitar o educando, é "embrulhar" o próprio educador. É encher o educador de invólucros externos, destituindo-o da potencialidade intrínseca de pensar, desapropriando-o de seu próprio saber. Negamos, enfaticamente, o modelo técnico-burocrático, autoritário de Educação.
Passo agora a analisar as questões abertas feitas aos educadores. São
quatro perguntas que permitiram aos entrevistados discorrer livremente sobre
aspectos considerados importantes no processo de formação continuada. As
respostas foram agrupadas em 04 eixos:
97
1º) Semana de Alfabetização;
2º) Pontos fortes nos encontros formativos de sexta-feira;
3٥) Pontos fortes nos encontros formativos de sexta-feira;
4º) Propostas para melhorar a formação continuada às sextas-feiras.
Os 22 educadores da AVIB avaliaram o que entenderam como
significativo em relação à proposta desta Semana. É importante acentuar que
as ideias foram agrupadas em 11 temas recorrentes analisados brevemente.
1º EIXO: ANÁLISE DA SEMANA DE ALFABETIZAÇÃO Opinião dos
Destaques observados pelos educadores: educadores
Participação e integração dos educandos 12
Utilização de oficinas como: “contação” de história, pintura e artesanato: 09
Integração com outros educadores de ONGs afins: 05
Relatos de práticas pedagógicas: 04
Depoimentos dos educandos sobre o processo de alfabetização: 03
Apresentações culturais: 03
Apresentação teatral da AVIB, poema de Drummond de Andrade: 03
Palestra: 02
Organização da Semana de Alfabetização: 01
Sessão cinema: 01
Festa de encerramento, forró envolvendo educadores e educandos: 01
Este eixo de análise diz respeito ao que mais chamou a atenção dos
referidos educadores na Semana de Alfabetização, que se realiza desde 2002
conforme exposto no segundo capítulo, sempre no mês de setembro, próximo
ao dia Internacional de Alfabetização. Analisar-se-á a 9º Semana - em
Guaianases, de 13/09/10 a17/09/10, no CEU Jambeiro (Centro Educacional
Unificado) - com participação das Entidades que desenvolvem o MOVA/SP em
Guaianases e Cidade Tiradentes, a saber: Associação dos Voluntários
98
Integrados no Brasil, Conselho Comunitário da Vila Solange, Central de
Associação e Sociedade Popular e Núcleo Recreativo Mundo Encantado.
Para resgatar a proposta da Semana de Alfabetização, cito Kunrath
(2006) que discorre dobre a proposta desta atividade: o objetivo da Semana de
Alfabetização contemplava ações pedagógicas para envolver todos os
participantes do MOVA/SP sendo que havia abertura solene em nível municipal
e nos dias seguintes aconteciam atividades regionalizadas, que envolviam
educadores, educandos, coordenadores, supervisores das coordenadorias e
representantes das entidades conveniadas. Uma das principais tarefas era a
integração dos educadores e das diversas organizações por meio de oficinas
pedagógicas, palestras, debates sobre temáticas ligadas à educação,
exposições de trabalhos desenvolvidos nos núcleos, depoimentos de
educandos sobre a experiência de alfabetização, relato de prática,
apresentações culturais.
A maioria dos educadores citou a importância atribuída à participação e
integração dos educandos, pois todas as entidades que atuam com o
MOVA/SP na região estavam presentes, o que permitiu aos educadores e
alfabetizandos se integrarem para realizar as atividades conjuntamente.
O segundo ponto mais citado (por 09 educadores) disse respeito à
utilização das oficinas coordenadas e articuladas pelas ONGs presentes,
conforme PMSP/SME (2010, p. 15): “pintura de rosto, artesanato com palitos,
leitura e ‘contação’ de histórias, confecção de instrumentos utilizados na
capoeira, artesanato casinha de Abelha, artesanato ‘vagonite’ com fita e sem
fita em pano de prato e artesanato com peças de gesso”. A prática das oficinas
tem sido uma constante também na formação dos educadores do MOVA tanto
nos encontros de sexta-feira, bem como na formação oferecida pelas Diretorias
Regionais de Ensino em cada região. Discutirei na última questão aberta que
os educadores apresentam sugestões, propostas de aprimoramento e melhoria
com destaque para as oficinas que são constantemente reivindicadas para
justamente dinamizar e dar mais criatividade às ações pedagógicas e
formativas.
Outro ponto citado por 05 educadores trata da integração com outros
educadores de ONGs, pois a Semana de Alfabetização proporciona a interação
e troca de experiências entre os educadores; 04 educadores valorizam os
99
relatos de práticas pedagógicas dos colegas que podem ajudar como
intercâmbio de experiências. Na ocasião apresentaram-se relatos de práticas
pedagógicas por meio de amostras, fotos, artes plásticas, teatros e
depoimentos.
Ainda segundo os temas recorrentes, 03 educadores apreciaram os
depoimentos dos educandos sobre o processo de alfabetização; cada entidade
deu voz aos jovens e adultos que brevemente apresentaram com emotividade
a trajetória pessoal de superação, leitura das letras e leitura do mundo. Esta
modalidade tem se tornado comum nos eventos, congressos e atividades
maiores, conforme o relato de Santos (2006, p. 41), quando relatou o 1º
Congresso de Alfabetizandos da cidade de São Paulo em 1990:
Esse evento procurou privilegiar a manifestação dos educandos que, em vários momentos, fizeram uso da palavra e apresentaram sua identidade cultural, discutindo os problemas em torno da alfabetização de adultos. Nele foi apreciado um texto base elaborado previamente a partir de uma pesquisa que procurou captar as expectativas e perspectivas dos educandos.
Outros 03 educadores destacaram as apresentações culturais e o teatro
“Trem café com pão” de Carlos Drummond de Andrade que contou com a
participação dos próprios educadores da AVIB. Conforme citado anteriormente,
as manifestações culturais e artísticas constituem um dos objetivos primordiais
da Semana de Alfabetização, favorecendo a integração e interação dos grupos
do MOVA/SP, onde todos se sentem parte de um coletivo maior.
A palestra sobre andrologia e alfabetização de Jovens e Adultos,
proferida pela Doutora Rosângela Figueiredo, professora da UNICAMP, foi
lembrada por 02 educadores como momento formativo importante. A
conferencista referendou Romão (2001, p. 75), quando afirmou:
Ambos, educador e educando, trabalharão o tempo todo: o primeiro como provocador, incentivador, sistematizador e avaliador; o segundo como provocado, descobridor, co-sistmatizador e co-avaliador/avaliado. E a avaliação não buscará a classificação das diferenças hierarquizadas, mas o diagnóstico de situações e desempenhos carentes de reforço, de novas provocações indutoras da correção e da retomada de rumos e estratégias.
100
Os outros pontos, como organização da Semana, sessão cinema e a
festa de encerramento foram também lembrados pelos educadores.
O eixo de análise seguinte retrata um dos pontos centrais da pesquisa,
quando sistematizo a opinião dos educadores sobre os pontos fortes nos
encontros formativos de sexta-feira, também agrupados por temas recorrentes.
2º EIXO: ANÁLISE DE PONTOS FORTES NOS ENCONTROS FORMATIVOS
DE SEXTA-FEIRA
Destaques observados nos encontros formativos: Opinião dos educadores
Projetos desenvolvidos pelo conjunto de educadores 14
Troca de experiências entre os educadores 10
Debates e reflexões realizados 07
Participação dos educadores nas atividades de formação 07
Integração do grupo de educadores 05
Formação oferecida pela DRE 02
Planejamento de ações 02
Respeito às diferenças 01
Gestos de amizade e afetividade 01
Boa relação entre educadores e coordenadores 01
Atividades festivas entre educadores e educandos 01
Pontualidade dos encontros 01
A relação educador-educando 01
Reflexão sobre teoria e prática 01
Oficina de Informática 01
Contribuição com novas estratégias de alfabetização 01
101
O principal destaque nos encontros de sexta-feira observados por 14
educadores, diz respeito aos projetos desenvolvidos pelo conjunto de
educadores ao longo do ano de 2010. Estes projetos foram pensados,
planejados e articulados pelos coordenadores em sintonia com os educadores.
Seguiu-se a seguinte metodologia: os 22 núcleos foram divididos em três
blocos temáticos; os educadores e os educandos estudaram a Constituição
Federal, a questão da mulher hoje, focando a violência doméstica e a Lei Maria
da Penha e os Direitos dos Povos Indígenas. Num primeiro momento, o
conjunto dos educadores participou coletivamente de oficinas temáticas e
palestras com assessoria de educadores da rede e formadores populares para
posteriormente estudar, aprofundar e desenvolver atividades nos respectivos
blocos. E numa sexta-feira no Espaço Paulo Freire, onde ocorrem as reuniões
formativas dos educadores, a grande plenária formativa reuniu todos os 22
núcleos do MOVA/AVIB, para a socialização das pesquisas e reflexões feitas
nas bases, através de teatros, encenações, músicas, poesias, exposições
culturais e artísticas.
O segundo ponto forte apresentado por 10 educadores diz respeito à
troca de experiências entre os educadores, o que tem sido uma prática comum
na formação continuada. Esse intercâmbio é apontado como extremamente
importante no processo de formação inicial, complementar e continuada nos
grupos do MOVA/SP. Vera Barreto in Kunrath (2006, p. 82) descreve como
esta troca de experiências tem marcado os momentos formativos:
A gente discutia um pouco o que eles traziam, experiências que já tiveram e ia montando essa pasta com coisas possíveis, mas a intenção da gente era também provocar isso com os educadores: traga o que você trabalhou. Por conta do tempo e também da dificuldade que você encontra nas pessoas trazerem um relato de fato do que elas fazem, chegaram vários que era muito mais uma coisa copiada de um livro, mas que revela que a pessoa achou aquilo muito bom, o que já era um indicador, mas eram poucas vezes que você sentia que esse educador pensou e achou que era legal, montou e fez.
Os debates e reflexões realizados e a participação dos educadores nas
atividades de formação foram lembrados por 07 educadores, o que confirma a
relevância das reflexões e discussões sobre os mais diversos assuntos
102
pedagógicos e educacionais. Esta necessidade é apontada por Basualdo
(1997, p. 57):
A formação é um processo permanente de ação, devendo estar sempre inserida nas necessidades do cotidiano da entidade e voltada essencialmente para a melhor qualificação prática da ação. Isso não significa que ela deve ser imediatista e utilitarista, reduzindo-se ao atendimento de emergência: é um processo permanente e sistemático que deve ter um horizonte, um sentido histórico e coletivo e, fundamentalmente, um desejo compartilhado na transformação social.
A participação dos educadores neste processo formativo é uma
necessidade e corresponde a uma exigência desde o surgimento do MOVA/SP,
quando se definiu que os educadores estão em processo de formação
permanentemente, com obrigação de participar nos encontros formativos às
sextas-feiras, bem como quando convidados ou convocados pela Secretaria
Municipal de Educação, através das DRES. No Projeto político Pedagógico do
MOVA/SP, PMSP/SME (2001, p. 06), está muito clara a importância da
formação dos educadores: “o desenvolvimento do programa requer a garantia
de um processo de formação permanente dos/as educadores/as de modo a
que acompanhem a prática educativa dos núcleos de forma participativa, ativa
e crítica”. O mesmo documento enfatiza a necessidade de estabelecer um
processo avaliativo, dialógico e continuado nestes encontros formativos.
Outro ponto avaliado por 05 educadores destacou a integração do grupo
de educadores como elemento positivo no processo formativo. Esta avaliação é
corroborada por Ferreira (1996, p. 63), ao enfatizar o significado da interação e
integração entre os educadores em processo de formação:
No MOVA/SP, o educador-alfabetizador não está sozinho nesta tarefa. Apostamos no movimento coletivo de reflexão da prática, nos encontros de formação permanente do educador em pequenos grupos, no processo construtivo do pensar e do fazer pedagógico. Um caminho para a formação coletiva do educador é o estudo em profundidade das atividades cotidianas da alfabetização: a atividade planejada e desenvolvida pelo educador sendo discutida, dissecada, analisada pormenorizadamente. Que objetivos se pretendia, que resultados foram, de fato, atingidos? Como o alfabetizador se colocou nesta situação de conhecimento - cognitiva, afetiva e ideologicamente? A partir daí é possível seqüenciar novo
103
tema, organizando novas atividades, sempre tendo em vista o planejamento global da alfabetização.
Esta integração entre os educadores em questão, bem como entre
coordenadores e educadores e estes com os seus educandos, é uma
característica buscada com insistência no cotidiano do MOVA/AVIB e nos
encontros formativos.
A formação oferecida pela DRE Guaianases foi citada por 02 educadores
- ocorre esporadicamente atualmente, percebe-se um significativo aumento
principalmente a partir de 2011. Fazendo um comparativo, baseando-se na
literatura do MOVA/SP, principalmente em Kunrath (2006), Abbonizio (2007),
constata-se que nos governos Erundina e Marta Suplicy a SME possibilitava
muito mais formação aos educadores e suas organizações.
Também citada por 02 educadores a questão do planejamento das ações
é um aspecto a ser considerado. Como apresentado anteriormente, os projetos
organizados no coletivo dos educadores têm sido assertivos, uma vez que
estes são planejados e posteriormente avaliados pelo conjunto dos
educadores, o que garante a participação e responsabilização do grupo como
um todo.
Os demais pontos destacados foram indicados uma única vez pelos
educadores, o que não diminui a sua relevância. Destacou-se o respeito às
diferenças; gestos de amizade e afetividade; boa relação entre educadores e
educandos; atividades festivas e recreativas, pontualidade nos encontros; a
relação educador-educando; reflexão sobre teoria e prática; oficina de
informática; contribuição com novas estratégias de alfabetização.
Teço alguns comentários especificamente sobre duas avaliações feitas
pelos educadores: a questão dos gestos afetivos entre o grupo e as atividades
festivas. Os gestos de amizade e afetivos e a dimensão festiva envolvendo os
educandos são a meu ver uma característica marcante do grupo. Esse tipo de
relação foi constatado por intermédio dos contatos como pesquisador, das
vezes que assisti aos encontros formativos, à apresentação dos projetos e
participação nas festas juninas, nas confraternizações e em outros momentos
coletivos.
A importância da manifestação dos gestos de amizade, solidariedade e
de afetividade é enaltecido por Freire (2000, p. 161):
104
É digno de nota, a capacidade que tem a experiência pedagógica para despertar, estimular e desenvolver em nós o gosto de querer bem e o gosto da alegria sem a qual a prática educativa perde o sentido... é preciso, por outro, reinsistir em que não se pense que a prática educativa vivida com afetividade e alegria, prescinda da formação científica séria e da clareza política dos educadores ou educadoras.
A dimensão de festa, de fraternidade é igualmente significativa nos
grupos do MOVA/AVIB, onde há inúmeras atividades lúdicas, recreativas,
festivas, envolvendo a coletividade dos educadores, educandos e mesmo
familiares que participam da alegria e da socialização de “fraternura”.
Tradicionalmente ocorrem duas festividades maiores; a realização das festas
juninas, com quadrilha, forró e muita diversão e o encerramento das atividades
no final do ano. É a alegria, o colorido, o belo, a festa, a dança, a música, a
poesia, a literatura de cordel e outras manifestações artísticas e culturais que
são constitutivas do grupo em questão.
3º EIXO: ANÁLISE DE PONTOS FRACOS NOS ENCONTROS FORMATIVOS DAS SEXTAS-FEIRAS
Destaques observados pelos educadores da AVIB: Opinião dos educadores
Repetição de conteúdo 05
Falta de interesse de alguns educadores 05
Falta de pontualidade 04
Excesso de cobrança dos educadores 01
Falta de materiais pedagógicos 01
Poucas dinâmicas nos encontros 01
A DRE nem sempre respeita o calendário de formação da ONG
01
Os pontos fracos nos encontros formativos de sexta-feira são as
limitações percebidas pelos educadores. Tentarei interpretar os pontos
destacados. Os dois primeiros itens apontados igualmente por 05 educadores
105
tratam da repetição de conteúdo e da falta de interesse de alguns educadores.
Cabe, assim, aos coordenadores um momento avaliativo profundo do conteúdo
programático, o que precisa ser acrescentado, alterado, se é o caso de investir
mais em oficinas temáticas - opção que aparece com frequência nas sugestões
classificadas na próxima tabela - ou mesmo a utilização de mais dinâmicas,
conforme também anotado por um dos educadores. Enfim, tudo concorre para
uma avaliação do próprio planejamento de ações e da metodologia
empreendida. A reflexão em Freire (2001, p. 80) pode ajudar a compreender
esta situação:
O educador é o sujeito de sua prática, cumprindo a ele criá-la e recriá-la. A formação do educador deve instrumentalizá-lo para que crie e recrie a sua prática por meio da reflexão sobre o seu cotidiano. A formação do educador deve ser constante e, sistematizada, porque a prática se faz e se refaz. O programa de formação de educadores terá como um dos eixos básicos: a necessidade de suprir elementos de formação básica aos educadores nas diferentes áreas do conhecimento humano.
Quanto à falta de interesse de alguns educadores, seria necessária uma
pesquisa participativa, um acompanhamento do pesquisador de forma mais
sistemática e acurada para uma compreensão das causas deste desinteresse.
Poderão contribuir na reanimação dos educadores: a busca de novas formas
de motivar a participação, reuniões participativas, dinâmicas de grupos,
trabalhos em oficinas, envolvimento de todos, socialização das experiências
apontando os êxitos, fracassos e dificuldades em classe, estudo de novas
bibliografias, utilização das mídias modernas, presença de assessoria externa
tanto de educadores populares de outros grupos de MOVA, do Fórum do
MOVA/SP ou de outros Institutos, bem como a simples mudança de ambiente,
para sair do espaço corriqueiro de formação.
Outros 04 educadores apontaram a falta de pontualidade como um dos
problemas nos encontros de formação continuada. Pelos relatos, os encontros
têm uma duração mínima de três horas, tendo início às 19 horas no mesmo
espaço e esporadicamente em locais indicados pela DRE, o que pode ser um
grande facilitador. Para Barreto (2006, p. 101), a formação continuada exige
espaço e horário que sejam bem definidos: “é preciso garantir um lugar certo
para o grupo se reunir além da existência do material básico para qualquer
106
atividade educativa. Esses aspectos somados à observância de um calendário
para a formação dão credibilidade ao processo”.
O atraso, a não pontualidade, é um problema a ser superado em
qualquer grupo humano. É compreensível algum atraso uma vez ou outra até
por conta do caos urbano, sistemas públicos de transporte ineficientes, ou
mesmo a dupla jornada de trabalho que impede a pessoa de chegar no horário
combinado, mas, quando constante o atraso pode se tornar um desrespeito
aos que chegam na hora definida coletivamente.
Os outros 04 pontos, não menos importantes, foram objeto de avaliação
uma única vez. Apontou-se o excesso de cobrança dos educadores, a falta de
materiais pedagógicos, poucas dinâmicas nos encontros e a DRE que nem
sempre respeita o calendário de formação da ONG.
No que se refere ao excesso de cobrança dos educadores e à tensão
provocada pela DRE quanto ao calendário, são questões com uma maior
complexidade, que exigem aprofundamento. Quanto à falta de materiais
pedagógicos e à falta de dinâmicas nos encontros, é preciso uma reflexão,
aliás, já explicitada em outros momentos desta pesquisa. Pois, como
observado em Ribeiro (1996, p. 81), há necessidade de uma opção pela
multiplicidade de materiais didáticos nas classes populares, como também nos
momentos formativos dos educadores:
A escola não tem desenvolvido a articulação das múltiplas formas de linguagem. Tem priorizado a linguagem verbal e escrita em detrimento da fala e da leitura e não tem trabalhado as outras formas de linguagem: a música, o teatro, a fotografia, figuras, objetos de escultura, pintura, desenho, filme, slide. Como podemos ler uma foto, um slide, uma pintura? Como expressar o pensamento, os sentimentos através de desenhos, recorte-colagem, dramatização, poesia e canto? Optamos pela multiplicidade destes materiais didáticos como ponto de partida para a expressividade oral e escrita e como codificações que possibilitam a leitura do mundo, através das decodificações que os alfabetizandos fazem.
A citação acima ajuda a colocar adequadamente a importância da
utilização de materiais pedagógicos de múltiplas formas, para em certa medida
poder contribuir na dinamização dos encontros, tornando-os cada vez mais
participativos e significativos.
107
O último agrupamento de respostas trata das propostas para melhorar a
formação continuada com base nas entrevistas dos educadores da AVIB.
4º EIXO: ANÁLISE DE PROPOSTAS PARA MELHORAR A FORMAÇÃO CONTINUADA ÀS SEXTAS-FEIRAS
Destaques observados pelos educadores: Opinião dos educadores
Necessidade de mais momentos formativos 04
Oficinas temáticas 04
Oficinas de inclusão 03
Oficinas de artesanato 02
Incentivo da ONG para que os educadores façam Curso Superior
02
Curso de Libras 01
Oficina de Leitura 01
Utilização de mídias (DVD, filmes) 01
Cantinho de leitura em cada núcleo 01
Utilização de mais dinâmicas 01
Estudar a alfabetização de Jovens e Adultos 01
Maior inserção nos Movimentos Sociais 01
Fortalecimento do trabalho coletivo 01
Necessidade de mais informações 01
O primeiro aspecto apontado por 04 educadores destacou a
necessidade de possibilitar mais momentos formativos, ou seja, a formação é
um desafio a ser buscado constantemente. Kunrath (2006, p. 07) expressa a
necessidade da reflexão crítica:
Como apontamento de alternativas para contribuir na superação das dificuldades na formação dos educadores populares, é necessário possibilitar aos mesmos a apropriação de habilidades pedagógicas para que eles mesmos possam
108
conduzir o processo de ensino aprendizagem, bem como, ter condições de refletir criticamente sobre questões sociais, políticas e econômicas. Isso seria pelo menos, uma tentativa d garantir que o trabalho desenvolvido por esses agentes populares tenha condições de assegurar que os objetivos educacionais traçados pelos programas/projetos/movimentos sejam alcançados.
Como já abordado abundantemente neste trabalho sobre a formação
continuada dos educadores do MOVA/SP na realidade de Guaianases, a
formação adquire uma exigência indispensável para que o processo da
educação popular possa acontecer coerente e eficazmente. Resgato Dussel
(1977b, p. 133) que tão bem expressa esta necessidade quando afirma com
propriedade que o mestre, o educador, assim como o discípulo, entendido
como educando, são sujeitos do aprender, e não depositários do
conhecimento:
(...) o mestre e o discípulo sempre têm algo a aprender (desde o nascimento até a morte)... nenhum discípulo é puramente discípulo; nenhum mestre é puramente mestre, também o que o mestre aprende, aprende-o a partir da novidade do projeto do jovem. Todo mestre deve ensinar mais do que simplesmente já dado anteriormente; deve ensinar de maneira crítica o modo como isso foi alcançado; não transmite o tradicional, mas revive as condições que o tornaram possível como novo, como único, como criação.
Outra questão acentuada por vários educadores é a necessidade de se
investir na formação através de oficinas temáticas, oficinas de inclusão de
artesanato, oficina de leitura e libras, o que indica a carência de oficineiros
especialistas nas diversas áreas para ajudar a enfrentar os desafios
pedagógicos. O MOVA/SP tem valorizado a importância da utilização das
oficinas nos encontros formativos dos educadores, conforme enfatizado por
Santos (1996, p. 39):
Tentando superar as dificuldades surgidas em salas de aula, foram realizadas oficinas que discutiram a pratica do ensino interdisciplinar da Língua Portuguesa, de matemática, de Geografia, de História, entre outros... as oficinas realizadas contavam com a participação dos servidores, pois eles também sentiam as dificuldades vividas pelos monitores.
109
A questão da inclusão apresenta-se como um importante desafio a ser
discutido na educação formal e também na educação de jovens e adultos; e no
MOVA não tem sido diferente. Praticamente em todos os núcleos do
MOVA/AVIB há um educando com necessidade especial. Em um destes
núcleos, há uma especificidade interessante: metade dos educandos tem
alguma necessidade especial, exigindo assim ações pedagógicas
diversificadas. Segundo o relato da educadora que acompanha este grupo
específico, estes jovens e adultos passaram por várias escolas públicas, sendo
geralmente pouco notados, e no grupo do MOVA sentiram-se acolhidos e
respeitados no seu processo de alfabetização. Este exemplo ajuda a
compreender a necessidade de ter formação específica para lidar com
situações similares, o que justifica a importância das oficinas.
Outro aspecto explicitado por 02 educadores é a necessidade do
incentivo da AVIB para que os educadores façam Curso Superior. Tal
reivindicação tem sido apresentada nos Encontros Nacionais e Regionais do
MOVA/Brasil, conforme já relatado neste trabalho. O Governo Federal na
última década tem favorecido o incentivo à formação superior por meio do
PRO-UNI e de financiamentos educacionais. Mas, estas iniciativas não dão
conta de atender à realidade de tantos educadores que precisam da formação
superior. A AVIB dentro de suas possibilidades ajudou, concretamente com
uma bolsa de estudo, duas educadoras que cursaram Pedagogia.
A utilização de mídias modernas, proposta por um educador, é uma
discussão interessante, um desafio importante a ser alcançado; é uma
preocupação constante apontada nos relatórios dos últimos encontros
nacionais, estaduais, regionais e municipais do MOVA/Brasil e
consequentemente do MOVA/SP. Existem algumas tentativas de aproximação
com o mundo da informatização, das mídias digitais, mas ainda são iniciativas
tímidas e que precisam ser aprimoradas. Os educadores da AVIB têm
frequentado esporadicamente o laboratório de informática da DRE; são
incentivados a fazer parceria com os tele centros mais próximos dos locais de
alfabetização, mas encontram muitas dificuldades, uma vez que funcionam
somente até às 20 horas.
O cantinho de leitura em cada núcleo é outra preocupação indicada por
um dos educadores. Conforme visita aos núcleos, o que normalmente tem sido
110
uma prática comum é a iniciativa dos educadores em promover a socialização
de livros didáticos, histórias em quadrinhos, enciclopédias, jornais, romances e
outros materiais colocados à disposição da classe pelo educador ou até a
organização de uma pequena biblioteca que os próprios educandos ajudaram a
organizar. Sem dúvida, esta reivindicação da criação de um cantinho de leitura
é muito importante, pois estimula o gosto pela leitura e o incentivo a iniciação
de sujeitos leitores.
A utilização de mais dinâmicas é uma sugestão importante para reforçar
a necessidade de aprimorar uma metodologia mais envolvente em
conformidade com um dos objetivos específicos do MOVA/SP, segundo
PMSP/SME (2001, p. 03), quando afirma que cabe aos educadores “alfabetizar
a partir de uma metodologia dialógica e conscientizadora, inspirada na
pedagogia libertadora”. Tal metodologia sugere envolvimento, participação,
dialogicidade, criatividade e dinâmica.
Estudar a alfabetização de jovens e adultos é outra proposta suscitada
por um educador. Ler, estudar e discutir em grupo ou coletivamente os escritos
de Paulo Freire, Álvaro Pinto e de outros educadores, pode ser um
encaminhamento oportuno para o cronograma de formação. Outra
possibilidade interessante com base nesta provocação poderia ser a formação
de grupos de estudo, que programassem momentos formativos para além dos
encontros de sexta-feira. A alfabetização de jovens e adultos é um assunto que
requer estudo e aprofundamento, Freire (1987, p. 111) aponta este desafio:
Para ser um ato de conhecimento, o processo de alfabetização de adultos deve, de um lado, necessariamente envolver as massas populares num esforço de mobilização e de organização em que elas se apropriem, como sujeitos, ao lado dos educadores, do próprio processo. De outro, deve engajá-los na problematização permanente de sal realidade ou de sua prática nesta.
Outro destaque sugerido por um dos educadores é a necessidade de
maior inserção nos Movimentos Sociais. O diálogo, interação e parceria com
outros movimentos de alfabetização, com um trabalho na educação popular,
deve ser uma constante; bem como a inserção nos movimentos locais atuantes
na reivindicação de questões sociais, conselhos populares de educação,
saúde, transporte e outros, permite que os educadores sintam-se partícipes
111
dos problemas coletivos e assim possam despertar esta consciência nos seus
alfabetizadores. Este caminho de militância é incentivado por Arroyo (2001, p.
275):
Os educadores para Paulo Freire foram os movimentos sociais. O que fazer então para que o projeto popular seja educativo? Troca de experiências (mostrar o que já se faz o que já somos, as nossas lutas); temos importantes sujeitos coletivos educativos (os movimentos sociais), temos que explorar suas potencialidades, torná-los cada vez mais pedagógicos.
O fortalecimento do trabalho coletivo é lembrado por um educador. Esta
é uma tarefa imprescindível no processo de formação continuada do MOVA,
pois sem a participação de todos os envolvidos, o trabalho fica comprometido.
É o que afirma Ferreira (1996. p. 63) ao tratar desta questão: “(...) apostamos
no movimento coletivo de reflexão da prática, nos encontros de formação
permanente do educador... no processo construtivo do pensar e do fazer
pedagógico”.
E, por fim, um educador observou a necessidade de mais informações
nos encontros de formação às sextas-feiras. É importante observar, conforme
apontado por Ribeiro (1996, p. 82), que existe uma variedade de materiais,
documentos, escritos que podem contribuir tanto para o processo de formação
dos educadores, como no cotidiano, onde acontece a alfabetização de jovens e
adultos:
No mundo letrado de hoje, há uma enorme variedade de material escrito: os mais diferentes tipos de veículos de leitura (documentos pessoais, indumentárias com que nos vestimos, jornais, revistas, boletins, cartões, livros de literatura, livros científicos, livros didáticos) e há os diferentes tipos de conteúdos impressos (logotipos, logomarcas, anúncios de propaganda, rótulos, avisos, placas, bilhetes, cartas informais, comunicados formais, notícias, contos, bulas de remédios, provérbios, quadrinhas, parlendas, adivinhações, slogans, piadas, crônicas, poesias, cartuns, quadrinhos, gráficos estatísticos, ditados populares escritos nas carrocerias dos caminhões, receitas culinárias, frases escritas nas paredes das ruas, romances, textos informativos, literatura de cordel). São muitos os tipos de leitura que a vida social oferece ao usufruto.
112
Portanto, o desafio colocado para o grupo de coordenadores e
educadores diz respeito ao exercício contínuo de momentos formativos,
conforme insistência no decorrer deste trabalho; e o exercício de socialização
de informações, o que está acontecendo no bairro, na cidade, no país e no
mundo e como fazer a leitura destas realidades para que o processo formativo
seja contínuo e permanente.
113
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente dissertação busca compreender o que pensam os
educadores do MOVA da AVIB a respeito da formação continuada focalizando
os encontros que ocorrem às sextas-feiras no interior da própria ONG.
Faz-se necessário apontar algumas inquietações e desafios quanto à
formação destes educadores populares. A partir das entrevistas, observou-se
que existem muitas lacunas neste processo formativo, porque muitas vezes
esta formação mesmo sendo planejada e sistematizada pelo conjunto dos
educadores, pode trazer um esgotamento, apresentado como repetitivo na
opinião de vários educadores, o que exige uma avaliação do próprio
planejamento de ações e metodologia empreendida, conforme discutido no
terceiro capítulo, a partir da visão de Freire (2001) ao afirmar que o educador é
o sujeito e o protagonista de sua prática, cabendo a ele e ao grupo a
capacidade de criar e recriá-la através da reflexão sobre o cotidiano,
considerando a realidade de seus educandos, o contexto social onde está
inserida, a leitura que fazem do mundo, superando o senso comum em vista de
uma educação popular que contribua para a consciência cidadã dos
envolvidos.
Desta forma, cabe aos educadores, segundo ressaltado no Projeto
Político Pedagógico do MOVA/SP (ANEXO D), a capacidade de se assumir
enquanto sujeito de sua prática pedagógica, agindo sobre sua prática,
decidindo coletivamente sobre a realidade do grupo de alfabetização e do
processo formativo em curso, o que exige um movimento contínuo e
permanente, em vista de uma educação que seja participativa, ativa e crítica.
Outro limite tem sido a própria precariedade dos planejamentos de
formação, certa improvisação, aliado à falta de recursos financeiros e técnicos,
pois a Secretaria Municipal de Educação – por meio das Diretorias Regionais
de Ensino - não tem investido adequadamente neste processo, delegando às
Entidades Conveniadas esta tarefa.
Muitas vezes, a formação destes educadores carece de um processo
mais organizado e estruturado que dê conta de permitir uma continuidade. O
educador Santos, (1996), abordado no segundo capítulo, corrobora para esta
114
compreensão, ao enfatizar que o processo formativo dos educadores do
MOVA/SP deve abranger a formação inicial, complementar e geral ou contínua.
A primeira atende o objetivo de capacitar inicialmente os educadores numa
visão dialógico-construtivista, desenvolvendo pressupostos educacionais
ligados a prática e concepção de educação, metodologia participativa,
planejamento e avaliação das práticas educativas; a complementar atende às
necessidades imediatas no exercício cotidiano, através de oficinas sobre o
tema gerador, prática do ensino interdisciplinar de matemática, língua
portuguesa, geografia, artes, história, o que não significa o oferecimento de
“receitas didáticas e pedagógicas” a serem aplicadas nas classes do MOVA,
mesmo considerando que muitos educadores necessitam de auxílio prático
para elaborar ou ter parâmetros de atividades que podem contribuir para o
melhor desempenho. O outro componente fundamental é a chamada formação
geral ou contínua, que possibilita aos educadores a atualização de temáticas
pertinentes ligadas à educação e outros assuntos correlacionados.
Neste sentido, vale resgatar a importância dada aos debates e análises
de conjuntura, nos primeiros anos do MOVA/SP, que aconteciam a cada três
meses e eram organizados pela Secretaria Municipal de Educação em sintonia
com o Fórum MOVA/SP para discutir as mais diferentes situações que
ocorriam na cidade, no país, na América Latina e no mundo. Eram atividades
abertas também para os educandos que tinham a possibilidade de
compreender questões para além do MOVA e da própria educação.
Ao longo da pesquisa, em especial no terceiro capítulo, procurei mostrar
como os educadores do MOVA ligados a AVIB se posicionam diante do desafio
da formação, como a compreendem e como a praticam. É notório o esforço do
grupo em questão para desempenhar atividades formativas que envolvem tanto
os educadores, como os educandos. Um destaque interessante observado
neste processo é a importância dada aos projetos desenvolvidos pelo conjunto
de educadores e coordenadores, lembrados por 14 destes atores, bem como a
troca de experiências, a integração e a interação entre os pares apontada
como relevante. Esta prática é referendada por Pinto (2001), quando acentua
que,
Uma forma em que se pratica com grande eficiência é o debate coletivo, a crítica recíproca, a permuta de pontos de vista, para
115
que os educadores conheçam as opiniões de seus colegas sobre os problemas comuns, as sugestões que outros fazem e se aproveitam das conclusões dos debates, p. 113.
A realização das Semanas de Alfabetização que acontecem desde 2002
(já discutidos no terceiro capítulo), é um momento significativo desta interação
e integração, parte integrante do MOVA, uma vez que possibilita o diálogo das
diversas organizações que atuam na alfabetização de jovens e adultos e de
seus educadores; outro destaque acentuado neste mesmo capítulo diz respeito
à importância que estes educadores dão aos projetos articulados em conjunto
e sintonia também com os educandos, quando se apresentam em grandes
plenárias o resultado das atividades desenvolvidas, socializando as reflexões e
estudos sobre temas relevantes, através da exposição de cartazes, pequenos
documentários, vídeos, fotografias, slides, testemunhos, teatros, músicas e
poesias entre outros.
Há também que valorizar a busca pessoal e coletiva em vista da
formação superior, em que se constatou que 40% destes educadores estão
cursando Pedagogia, conforme evidenciado no perfil dos educadores da AVIB,
o que valoriza sobremaneira o esforço destes em buscar a elevação de sua
escolaridade, que tem sido uma reivindicação constante do MOVA/SP e do
MOVA/Brasil em todas as instâncias, para que o educador popular que atua na
alfabetização seja valorizado diante de outros alfabetizadores de jovens e
adultos da EJA bem como de outras experiências.
A rotatividade de educadores em que quase 20% destes estão há
menos de 02 anos no trabalho com o MOVA/AVIB é outra dificuldade a ser
enfrentada, pois alguns educadores não conseguem permanecer no programa
conforme gostariam, uma vez que a remuneração é baixa, cerca de um salário
mínimo.
Outra questão a ser considerada é a precariedade dos espaços onde
ocorre a alfabetização do MOVA. Os núcleos encontram-se próximo dos
educandos que é um grande facilitador, por outro lado, tais espaços muitas
vezes carecem de condições mais favoráveis: melhor iluminação, carteiras
mais confortáveis, espaço físico melhor organizado entre outras coisas. O que
se pode questionar é porque a Secretaria Municipal de Educação através das
Diretorias Regionais de Ensino não dispõe de uma verba complementar para a
116
manutenção destes espaços comunitários, bem como porque não dispõe de
recursos para aquisição de bens duráveis que poderiam ser usados em vista
da melhoria dos equipamentos e também para a aquisição de livros, jornais e
materiais didáticos.
Para refletir sobre esta questão recorro a Paulo Freire quando aborda a
estética como uma espécie de bem espiritual, que ele chama de “boniteza”,
que resulta da capacidade como educador e educando de transformar o senso
comum em uma visão crítica, que pode mudar a realidade. Freire (1997, p.
50), na obra Pedagogia da Autonomia, fala da importância da boniteza das
escolas e da importância formadora dos espaços ao afirmar que:
É incrível que não imaginemos a significação do ‘discurso’ formador que faz uma escola respeitada em seu espaço. A eloquência do discurso ‘pronunciado’ na e pela limpeza do chão, da boniteza das salas, da higiene dos sanitários, nas flores que adornam. Há uma pedagogicidade indiscutível na materialidade do espaço.
O mesmo Freire, (1991, p. 22) ao falar deste termo, destaca que tratar
de “boniteza de lugar, requer outra boniteza, a do ensino competente, a da
alegria de aprender, da imaginação criadora tendo liberdade de exercitar-se a
da aventura de criar”. Assim, a questão da boniteza dos espaços em que se
realizam os grupos de alfabetização, aliada à boniteza da prática educativa,
mobiliza o processo de educação popular implementado pelos educadores do
MOVA/SP.
Ao analisar a voz dos educadores é possível estruturar algumas
indicações a respeito da necessidade do redimensionamento do processo
formativo ofertado pela AVIB, tais como: a utilização de uma metodologia mais
participativa, ampliando as dinâmicas de grupos, as oficinas temáticas e
promovendo maior aproximação com o mundo da informatização. É possível
verificar também a necessidade de favorecer momentos formativos para além
daqueles realizados semanalmente, tais como a participação em cursos de
formação organizados pelo Fórum MOVA/SP, pela própria Secretaria de
Educação, ou mesmo de iniciativas dos próprios educadores, ao propor grupos
de estudo e de pesquisa em busca de refletir, discutir e dialogar com outros
educadores populares e mesmo da rede municipal.
117
A educação de jovens e adultos tem sido um capítulo importante da
educação brasileira, assim, a presente pesquisa constitui uma contribuição na
tentativa de compreender a relevância da formação de educadores populares,
defendendo-se a ideia de que esta questão deve estar contemplada nas
agendas governamentais e nos movimentos da sociedade civil organizada.
118
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125
ANEXO A
DECRETO DA CRIAÇÃO DO MOVA/SP
GABINETE DO PREFEITO DECRETO
Institui o Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos
da Cidade de São Paulo junto à Secretaria Municipal de
Educação e de outras providências.
LUIZA ERUNDINA DE SOUZA, Prefeita do Município de São Paulo, usando
das atribuições que lhe são conferidas por lei, e CONSIDERANDO o disposto
no artigo 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que prevê a
eliminação do analfabetismo nos 10 primeiros anos da promulgação da
Constituição Federal de 1988;
CONSIDERANDO a existência no Brasil, segundo cálculos da UNESCO, de
mais de 20 milhões de jovens e adultos sem instrução e mais de 15 milhões de
semialfabetizados;
CONSIDERANDO que na Região Metropolitana da Grande São Paulo existe
um milhão de jovens e adultos sem escola e dois milhões e meio de jovens e
adultos com menos de 04 anos de estudo;
CONSIDERANDO que a educação de jovens e adultos constitui uma das
grandes prioridades da Secretaria Municipal de Educação, na atual gestão;
CONSIDERANDO que o ano de 1990 foi aclamado pela UNESCO como o "Ano
Internacional da Alfabetização";
DECRETA:
Art. 1º - Fica instituído junto à Secretaria Municipal de Educação o Movimento
de Alfabetização de Jovens e Adultos da Cidade de São Paulo –MOVA/SP.
Art. 2º - A Secretaria Municipal de Educação fica autorizada a firmar convênios
e acordos com entidades assistenciais, sociedades e associações
126
regularmente constituídas, nos termos do disposto no artigo 3º da Lei n° 7.693,
de 06 de janeiro de 1972.
Parágrafo único - Poderão ser concedidos auxílios e subvenções a entidades
conveniadas, no valor a ser fixado no termo próprio, por classe de
alfabetização de adultos a ser criada.
Art. 3º - A Secretaria Municipal de Educação, juntamente com as entidades
conveniadas manterá permanente "FÓRUM dos Movimentos Populares de
Alfabetização de Adultos da Cidade de São Paulo", que estabelecerá as
diretrizes e princípios gerais do Movimento ora criado.
Art. 4º - As despesas com a execução deste decreto correrão por conta da
dotação orçamentária do código 16.30.08.42.1872.480.3132, da Coordenadoria
dos Núcleos de Ação Educativa - CONAE, do orçamento do exercício de 1990.
Art. 5º - Este decreto entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário.
PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 21 de
Novembro de 1989, 436° da fundação de São Paulo. Decreto nº 28.302.
LUIZA ERUNDINA DE SOUZA, Prefeita
HÉLIO PEREIRA BICUDO, Secretário dos Negócios Jurídicos.
AMIR ANTONIO KHAIR, Secretário de Finanças.
PAULO REGLUS NEVES FREIRE, Secretário Municipal de Educação.
LADISLAW DOWBOR, Secretário dos Negócios Extraordinários
Publicados.
na Secretaria do Governo Municipal, em 21 de Novembro de 1989.
JOSÉ EDUARDO MARTINS CARDOZO, Secretário do Governo
Municipal.
127
ANEXO B
Carta de Princípios de Parceria do MOVA/SP
Proposta aprovada pelo FÓRUM MUNICIPAL em 03 de setembro de 1990.
1. Parceria efetiva entre a Secretaria Municipal de Educação e o Fórum dos
Movimentos de Alfabetização na Composição do MOVA/SP.
2. A linha político-pedagógica do MOVA/SP será objeto de elaboração conjunta
pela Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, resguardando a
estes últimos a liberdade de adequarem tais propostas em sua realidade
específica. O mesmo se aplica à elaboração de material didático, pedagógico e
metodológico.
3. Liberdade para que os movimentos escolham seus monitores e
supervisores, de tal modo que sejam preservados os princípios centrais do
projeto político-pedagógico estabelecido em conjunto pelos movimentos e pela
Secretaria Municipal de Educação. Eventuais casos que se chequem
frontalmente com tais princípios serão objeto de parecer por parte da
Secretaria Municipal de Educação quando dos cursos de capacitação,
pareceres estes que serão encaminhados às entidades em questão para sua
auto avaliação e decisão final.
4. Dentro da linha político-pedagógico estabelecida em conjunto pela
Secretaria Municipal de Educação e pelos movimentos, assegura-se a
autonomia aos movimentos quanto à realização de debates, programas de
formação específicos e atividades paralelas.
5. Parceria também na formação dos monitores: os movimentos desejam
participar ativamente, com o corpo e com a cabeça, na formação de seus
monitores, e desejam, portanto, que seja criado mecanismo de parceria com a
S.M.E. para os trabalhos pedagógicos de formação dos monitores.
6. Os movimentos desejam garantir os princípios da educação crítica,
participativa e libertadora independentemente da atual administração, tendo em
vista sua compreensão de que o MOVA/SP nasce na atual gestão, mas que
deverá existir e crescer independentemente dela.
7. Há o desejo de ampliação e generalização do trabalho de educação, e para
isto, entendem os movimentos ser fundamental o intercâmbio entre os
movimentos de alfabetização e entre os demais movimentos populares.
128
ANEXO C
CARTA ABERTA À POPULAÇÃO DE SÃO PAULO EM DEFESA DA
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS – MOVA/SP
Em nosso país há anos sofremos com a ausência de políticas públicas
para educação de jovens e adultos pouco escolarizados, que representam as
camadas mais pobres da população. Essas pessoas, sem condições de
estudar e trabalhar, são obrigadas a escolher entre a sobrevivência e o estudo,
ficando desprovidas do direito à educação garantida pela Constituição Federal
de 1988.
O Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos MOVA/SP tem
dentre seus objetivos, contribuir para a superação do analfabetismo na cidade
de São Paulo. Baseia-se nos princípios da educação libertadora de Paulo
Freire e atende regiões não contempladas pelas escolas da rede pública.
Infelizmente o programa MOVA/SP vem sofrendo com o fechamento de
salas pela atual administração. Os critérios utilizados são meramente técnico-
administrativos, uma vez que salas são fechadas conforme o número de alunos
(inferior a 15), sem levar em conta a realidade da periferia e o dia-a-dia do
aluno adulto trabalhador. Além disso, essa Administração tem se negado ao
diálogo com a coordenação do Fórum MOVA, rompendo com a possibilidade
de participação da sociedade civil organizada, princípio básico da democracia.
Nossos alunos são, em sua maioria, migrantes que procuram nesta
cidade melhores condições de vida. São trabalhadores, empregados e
desempregados, moradores de favelas e vilas, mulheres e homens das mais
variadas idades. Geralmente voltam à escola por terem muita vontade de
aprender a ler e escrever, contudo, mesmo que fatores como: a volta do
trabalho, o trânsito, a falta de alimentação dificultem o acesso aos núcleos de
alfabetização, a permanência é determinada pelo compromisso e força de
vontade. Para superar essas dificuldades os educadores preparam aulas com
conteúdos adequados à realidade das comunidades atendidas
Esse movimento não pode parar! Sem as salas do MOVA mais de
20 mil alunos ficarão desprovidos do direito à educação! Coletivo
organizador Coletivo organizador do ato pró-MOVA/SP - Junho de 200
129
ANEXO D –
PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO DO MOVA/SP- 2001
INTRODUÇÃO
Ao se propor a reativação do MOVA/SP, cuja experiência foi realizada
no período de 1989 a 1992, faz-se necessário, em primeiro lugar, destacar sua
validade no atual momento histórico que a cidade, o estado e o país estão
vivendo. Nos últimos dez anos ocorreram mudanças importantes que devem
ser consideradas ao se pensar um novo projeto MOVA, exigindo, inclusive, a
necessidade de se definir o que significa hoje formar pessoas jovens e adultas.
Na última década, ocorreram inúmeras e significativas transformações
econômicas, sociais, políticas e culturais, intimamente ligadas ao processo
técnico-científico dando a muitos a ilusão de que estamos vivendo num mundo
sem fronteiras, numa verdadeira aldeia global. Entretanto, estudos econômicos
e sociais tem demonstrado que o acesso às benesses da modernidade fica
restrito aos grandes bancos e às empresas transnacionais, a alguns Estados
hegemônicos e às grandes organizações internacionais. Eles revelam ainda,
que tem se acentuado a desigualdade na distribuição de renda e há um
processo indisfarçável de exclusão social. Nesse quadro, a predominância das
políticas neoliberais não aponta horizontes de muita esperança para a
população cuja maioria está mergulhada nas mais adversas condições de vida,
principalmente nos países ditos periféricos, como o Brasil.
A cidade de São Paulo convive hoje com um processo de
empobrecimento crescente de seus habitantes, com o desemprego que se
torna estrutural, com índices alarmantes de violência, com as sequelas da
corrupção, o desrespeito aos direitos do trabalho, a um salário digno, a saúde,
ao lazer. E, para agravar enfrentam uma situação de escolaridade bastante
deficiente e um alto índice de analfabetismo absoluto e funcional.
No que dizia respeito aos analfabetos, a dívida é grande e é de todos os
segmentos sociais. Segundo os dados do PNAD, de 1995 a população de 15
anos ou mais, no estado de São Paulo passou a ser 1.854.822, o que
representa uma diminuição de 16,56% em relação aos números do estado em
1991. Apesar da diminuição da taxa, houve um aumento absoluto de
analfabetos em São Paulo, e, na capital do Estado, estima-se que existam 400
130
mil pessoas considerando-se o analfabetismo absoluto e funcional. Portanto, os
números do analfabetismo continuam alarmantes e exigem uma resposta
incisiva não só do estado, mas também da sociedade civil, de acordo com o
que estabelece o artigo 205 da Constituição Federal de 1988. Cabe ao setor
público estatal fundamentalmente e de forma complementar a sociedade civil,
realizar esforços prá valer os direitos destas pessoas à educação.
Em função dos fatores acima analisados, constatamos a atualidade
coma preocupação dos jovens e adultos e, mais do que isso, a urgência de
pensar estratégias para superar o analfabetismo jovem e adulto no município
de São Paulo. Ao lado das ações do poder municipal do ensino público regular,
será imprescindível o resgate do movimento de alfabetização de jovens e
adultos – MOVA/SP para ampliar o atendimento daqueles “que não tiveram
acesso ou continuidade de estudos do Ensino Fundamental ou Médio da idade
própria” (Artigo 37 da LDB 9394/96) e isso será feito considerando “as
características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho”
(1º do Artigo. 37 de LDB 9394/96).
Aproveitar a experiência dos educadores populares, fortalecerem o
movimento onde atuam e chegar mais próximo da população graças à
capilaridade desses núcleos são algumas considerações que fundamentam o
interesse da atual Administração Municipal pela parceria com os trabalhos
populares de educação existentes em nossa cidade, muitos deles desde a
gestão de Paulo Freire, e outros ainda anteriores aquele momento.
Iniciativas como esta responde ao apelo da V Conferência
Internacional de Educação de Adultos (CONFITEA V), organizada pela
UNESCO e realizada em Hamburgo, em julho de 1997, que em seu artigo 3º
diz o seguinte:
“por educação de adultos entende-se o conjunto de processos de aprendizagens formais e não formais, graças aos quais as pessoas cujo entorno social consideram adultos, desenvolvem suas capacidades, enriquecem seus conhecimentos e melhoram suas competências técnicas ou profissionais ou as reorientam, a fim de atender suas próprias necessidades e as da sociedade. A educação de adultos compreende a educação formal e permanente, a educação não formal, e toda gama de oportunidade de educação informal e ocasional existentes em uma sociedade educativa e multicultural, na qual se reconheçam os enfoques teóricos e os baseados na realidade”.
131
2. Justificativa
Entende-se por projeto político-pedagógico um roteiro de ações para
alcançar metas comuns com base numa visão de mundo e numa concepção
educacional. O MOVA/SP baseado nas ideias de Paulo Freire, entende a
educação como um processo através do qual as pessoas tornam-se cada vez
mais plenas e, portanto, mais capazes de agir no mundo de forma crítica,
transformando-o em direção a uma sociedade mais justa, igualitária, solidária e
democrática.
A educação de jovens e adultos no MOVA/SP se caracterizará pelo
compromisso com um ensino de qualidade que, valendo-se das experiências
da educação popular, buscará responder às necessidades de conhecimentos
dos participantes do programa.
O compromisso com a qualidade se revelará, entre outras coisas,
através da garantia da formação inicial e continuada dos/as de jovens e adultos
que estarão trabalhando com a população, conforme os objetivos e princípios
subjacentes ao programa.
3. Princípio políticos pedagógicos subjacentes ao programa
MOVA/SP
O direito à educação deve ser assegurado a todas as pessoas pelo
poder público e, em casos especiais, de comprovada urgência, deve a
sociedade civil apoiar e complementar os esforços para a garantia desse direito
(art. 205 da Constituição Federal de 1988).
O MOVA construirá seu currículo a partir de temas nascidos das
questões vivenciadas pelas comunidades onde se inserem os núcleos. Contará
com educadores/as que partilhem a mesma realidade e têm dela uma visão
mais complexa que a de seus educandos.
- O reconhecimento de que o ser humano está em constante
transformação.
- Busca do aprimoramento das relações democráticas entre
educadores/as e educandos/das e entre os próprios educandos/as.
- O conhecimento é entendido como construção interacionista e
multidirecional, resultante da relação entre o sujeito e a realidade.
132
- O respeito à diversidade cultural bem como ao ritmo e níveis de
aprendizagem dos/as educandos/as.
3. Objetivos gerais
Contribuir com o poder público na diminuição do analfabetismo no
município de São Paulo, em consonância com as diretrizes e eixos norteadores
da política educacional de SME/SP, a saber: Qualidade Social da Educação,
Democratização da Gestão e Democratização do acesso e permanência.
- Contribuir para o pleno desenvolvimento da pessoa humana.
- Diminuir o índice de analfabetismo na cidade de São Paulo.
- Desenvolver a cidadania ativa como participação na vida social,
econômica, política e cultural da sociedade.
- Interpretar e usufruir das produções culturais, em contextos públicos e
privados, atendendo a diferentes interações e situações de comunicação.
5. Objetivos Específicos
- Ampliar e instrumentalizar o trabalho dos grupos populares que já
desenvolvem ou venham desenvolver projetos de Educação de Jovens e
Adultos na cidade.
- Desenvolver e adotar regimes de parceria entre Instituições da
sociedade civil e SME, reguladas por convênios, para o desenvolvimento da
formação objetivada, respeitando-se a autonomia dos parceiros.
- Estimular e intensificar a integração de todos os sujeitos envolvidos
direta ou indiretamente no processo de alfabetização e educação de jovens e
adultos.
- Alfabetizar a partir de uma metodologia dialógica e conscientizadora,
inspirada na pedagogia libertadora.
- Desenvolver uma prática pedagógica através da qual os/as
alfabetizandos/as se apropriem da leitura, escrita, cálculo e Ciências Humanas,
assim como o desenvolvimento da sensibilidade, criatividade e outras
linguagens.
- Refletir sobre elementos da prática educativa que possibilitem o
desenvolvimento da consciência crítica e auxiliem na formação de uma nova
ética nas relações dos seres humanos entre si e com a natureza.
133
- Estimular reflexões sobre questões de gênero e etnia para a superação
de preconceitos e a melhoria das relações familiares e sociais.
- Possibilitar aos educandos/as e educadores/as do MOVA a utilização da
informática como forma de prepará-los e inseri-los nas exigências tecnológicas
do mundo atual.
6. Metodologia –
A formação do educador de jovens e adultos pressupõe que ele se
assuma enquanto sujeito da ação pedagógica. Isso implica agir e refletir sobre
sua prática, decidindo coletivamente sobre a realidade de sua sala de aula e
construindo um trabalho a partir dela, sempre tendo como referência a
concepção de educação que anima esse processo. Assim, o seu procedimento
será o de ação-reflexão e ação na articulação constante da prática e da teoria.
A concepção metodológica do Programa MOVA/SP fundamenta-se nos
seguintes princípios educativos.
- A busca de integridade dos processos formativos, considerando a vida
humana e social como uma totalidade e em movimento: o econômico, o social,
o político, o afetivo, abordado numa perspectiva inter e trans-disciplinar.
- Possibilitar a apropriação do conhecimento universal produzido, na
perspectiva crítica de que esse conhecimento é histórico e que está em
constante construção.
Para isso, o trabalho do MOVA/SP deverá:
- Partir dos conhecimentos já construídos pelos educandos no tocante ao
trabalho, aos valores éticos, às manifestações artísticas e religiosas, às
experiências vividas, e também à escrita e à matemática.
- Resgatar a autoestima dos/as educandos/as, valorizando suas
experiências afetivas e culturais, suas crenças e opiniões, sua modalidade
linguística, criando situações em que sejam estimulados a relatar, com
liberdade, essas experiências e opiniões e garantindo um ambiente de respeito
às diferenças.
- Respeitar o ritmo e os níveis de aprendizagem dos/das educandos/as,
aproveitando as possibilidades decorrentes dessas diferenças e enfatizando a
solidariedade e a cooperação entre os/as e entre estes/as e os/as
monitores/as.
134
- Abordar o conhecimento como uma totalidade articulada.
- A partir da visão do ser humano como sujeito histórico, resgatar a
história de vida dos educandos relacionando-as às lutas sociais de seu tempo e
também propiciando momentos de estudo e reflexão sobre a história do país e
das sociedades humanas.
- Estabelecer um processo avaliativo dialógico e continuado, construindo
uma práxis pedagógica com base no movimento permanente de ação-reflexão-
ação sobre o trabalho realizado.
- Os instrumentos metodológicos consoantes com a prática que se quer
buscar no MOVA são os seguintes:
- Avaliação e planejamento
- Observação e registro
- Análise e sistematização das práticas
O desenvolvimento do programa requer a garantia de um processo de
formação permanente dos/as educadores/as de modo a que acompanha a
prática educativa dos núcleos de forma participativa, ativa e crítica.
135
ANEXO E
QUESTIONÁRIO DIRIGIDO AOS EDUCADORES DO MOVA/AVIB:
FORMULÁRIO DE PESQUISA -
PARTE I – CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DE TRABALHO E DOS
EDUCANDOS.
1. 1. Onde funciona o seu grupo de alfabetização?
( ) Espaço cedido pela Igreja
Qual? ( ) Católica ( ) Evangélica
( ) Espaço cedido por outra Entidade
Qual?
( ) Garagem de alguma casa
( ) Outro espaço
1. 2. Qual a faixa etária dos educandos?
( ) de 18 a 28 anos
( ) de 29 a 39 anos
( ) acima de 40 anos
1. 3. Qual a prevalência de gênero?
( ) a maioria é mulher ( ) a maioria é homem
1. 4. Qual o perfil dos educandos?
( ) sem trabalho
( ) sem trabalho e procurando trabalho
( ) trabalhando informalmente
( ) licenciado do trabalho
( ) aposentado ( ) outra situação
PARTE II – SOBRE A ATUAÇÃO NO MOVA E ATIVIDADES DE FORMAÇÃO
2.1. Como ocorreu a sua aproximação com o MOVA da AVIB?
( ) foi convidado por outro educador
( ) foi convidado por um dos coordenadores
( ) indicado por outra ONG
136
Qual?
2.2. Qual o seu grau de pertencimento a AVIB?
Observação: Pode-se assinalar mais de uma alternativa
( ) participa das assembleias
( ) participa das atividades formativas
( ) participa das atividades festivas ou culturais
( ) a sua participação se restringe à atividades promovidas pelo MOVA.
( ) tem envolvimento com outros projetos da AVIB
Quais?
2.3. Qual o seu grau de envolvimento com outros grupos do MOVA para além
da AVIB? Observação: pode-se assinalar mais de uma alternativa
( ) tem contato ou intercâmbio com outros educadores do MOVA nas
semanas de alfabetização que ocorrem nas Subprefeituras
( ) participa de reuniões ou atividades do Fórum da Zona Leste
( ) Outras atividades ou parcerias.
Quais?
2.4. Qual a sua avaliação da última Semana de Alfabetização de setembro de
2010?
( ) muito boa
( ) boa
( ) regular
2.5. O que mais lhe chamou a atenção na Semana de Alfabetização?
Comente:
2.6. Por meio de quais canais de comunicação chegam a você as orientações
pedagógicas? Observação: Pode-se assinalar mais de uma alternativa
( ) Correspondências da Secretaria Municipal de Educação,
( ) Correspondência da Diretoria Regional de Ensino de Guaianases
( ) Correspondência da Diretoria Regional de Ensino de São Miguel
( ) Da Coordenação do MOVA
( ) Orientações presenciais oferecidas pela Supervisão da DRE
137
.2.7. Como são definidos os conteúdos estudados nas reuniões de sextas-
feiras? Observação: Pode-se assinalar mais de uma alternativa
( ) Pela Diretoria regional de Ensino
( ) Pelo Fórum do MOVA/ Leste 2,
( ) Pela coordenação do MOVA/AVIB
( ) Pela coordenação do MOVA em conjunto com os educadores.
2.8. Cite 03 pontos fortes e 03 pontos fracos da formação continuada que
ocorre todas às sextas-feiras:
•
•
•
•
•
•
2.9.. Você busca a formação pedagógica em outros meios? Observação: Pode-
se ter mais de uma alternativa
( ) leitura de livros
( ) cursos de capacitação
( ) seminários ou outros eventos
SUGESTÕES PARA APRIMORAMENTO
PARTE III – DADOS PESSOAIS:
3.1. Nome
3.2. Escolaridade:
( ) Ensino Médio
( ) Superior completo
Curso?
Instituição?
( ) Superior incompleto
138
Curso?
Instituição?
( ) Pós graduação ou especialização
Curso?
Instituição?
3.3. Exerce outra atividade ligada à questão da educação?
( ) professor (a) do Estado de SP ou da Prefeitura
( ) trabalha em outra Organização Não governamental
( ) tem alguma atividade em comunidade, Igreja, Pastoral, Ministério etc.
3.4. Há quanto tempo é educador (a) do MOVA pela AVIB?
( ) Menos de 02 anos,
( ) de 03 a 04 anos,
( ) acima de 05 anos.