Vera Rejane do Nascimento Gregório
ESTUDO DA HANSENÍASE EM UMA UNIDADE DE
SAÚDE DO RECIFE.
Dissertação apresentada como requisito parcial
para a obtenção do grau de Mestre em Saúde
Pública pelo Núcleo de Estudos em Saúde
Coletiva – NESC / CPqAM / FIOCRUZ / MS,
sob orientação da Profª. Dra. Constança Clara
Gayoso Simões Barbosa e da Profª. Dra. Maria
de Fátima Pessoa Militão de Albuquerque.
Recife 1999
MINISTÉRIO DA SAÚDE
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
CENTRO DE PESQUISAS AGGEU MAGALHÃES
DEPARTAMENTO DE ESTUDOS EM SAÚDE COLETIVA -NESC
ESTUDO DA HANSENÍASE EM UMA UNIDADE DE
SAÚDE DO RECIFE.
Autora : Vera Rejane do Nascimento Gregório Orientadores : Dra. Constança Simões Barbosa
Dra. M. de Fátima P. M. de Albuquerque
Recife 1999
iii
RESUMO
Amplamente conhecida como “Lepra”, a hanseníase é considerada das mais antigas
doenças do mundo sendo considerada uma doença contagiosa, mutilante e incurável. Estes
aspectos moldam o imaginário popular fazendo com que as pessoas tenham mais temor aos
doentes do que propriamente à doença. Embora não represente uma causa básica de óbitos,
é uma doença de longa duração que pode provocar lesões viscerais graves e possui alto
potencial incapacitante. Os dados epidemiológicos podem responder sobre a atuação dos
serviços na atenção ao Hanseniano, no entanto, esta atuação poderia ser refinada com a
utilização de metodologia qualitativa que apreendesse a representação dos usuários sobre a
doença. Os objetivos do presente estudo foram: conhecer a evolução da doença e o perfil
epidemiológico dos doentes do CISAM no período de 1987-1997 e resgatar a representação
da doença nos indivíduos em tratamento. O estudo epidemiológico, realizado com dados
secundários, associou variáveis dependentes e independentes e os recursos do método
qualitativo foram utilizados para resgatar o conhecimento dos pacientes sobre a doença. Os
resultados mostram o crescimento percentual dos casos novos resultante tanto da expansão
da endemia quanto da otimização operacional do Programa no CISAM e são apresentados
por sexo, faixa etária, procedência, forma clínica. Alguns indicadores operacionais do
programa (classificação operacional, grau de incapacidade, baciloscopia e modo de
entrada) também foram avaliados. O estudo qualitativo mostrou que a condição de estar
doente é, por “pré-conceito“, marcada por toda sorte de constrangimentos e sanções nas
relações sociais o que acarreta problemas de ordem psicossocial nos indivíduos afetados. O
doente tende a ocultar sua doença, criando mecanismos de não enfrentamento. O
iv
imaginário popular em relação à etiologia da doença e ao processo terapêutico aponta para
o desconhecimento/não aceitação da doença o que acarreta instabilidade emocional que
gera crises, tensões e conflitos nas relações familiares ou sociais e que se reflete, em última
instância, na adesão aos serviços de saúde.
v
SUMÁRIO
RELAÇÃO DE ABREVIATURAS E SIGLAS UTILIZADAS ........ ........................... vi
RELAÇÃO DE QUADROS, TABELAS, GRÁFICOS E ANEXO...... .......................vii
I - INTRODUÇÃO............................................................................................................. 2
1.1 Aspectos históricos da hanseníase e seu Programa de Controle no Brasil. .. 2
1.2 As manifestações clínicas da hanseníase, seu diagnóstico e tratamento. .... 15
1.3 A epidemiologia e controle da hanseníase...................................................... 27
1.4 Aspectos sócio culturais da hanseníase. ......................................................... 31
1.5 Justificativa..................................................................................................... 39
II OBJETIVOS .............................................................................................................. 41
2.1 Objetivo Geral:.............................................................................................. 41
2.2 Objetivos Específicos ..................................................................................... 41
III METODOLOGIA................................................................................................... 44
3.1 Unidade do Estudo: O CISAM .................................................................... 44
3.2 Material e Métodos ........................................................................................ 46
IV RESULTADOS........................................................................................................ 55
4.1 O Ambulatório de Dermatologia Sanitária do CISAM - Pesquisa
Documental. ............................................................................................................ 55
4.2 Resultados do Estudo Epidemiológico: ......................................................... 57
4.3-Resultados do Estudo Antropológico:............................................................ 76
V DISCUSSÃO . ......................................................................................................... 98
VI REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS . ............................................................ 115
VII ANEXOS . ........................................................................................................... 124
vi
RELAÇÃO DE ABREVIATURAS E SIGLAS UTILIZADAS
AIDS – Acquired immunodeficiency syndrome - Síndrome da imunodeficiência adquirida
BCG – Bacilo de Calmette-Guérin
CISAM – Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros
CNDS – Coordenação Nacional de Dermatologia Sanitária
D.C. – Depois de Cristo
DIEVS – Diretoria de Epidemiológia e Vigilância à Saúde
DNDS – Divisão Nacional de Dermatologia Sanitária
EOSTQ – Em observação sem tratamento quimioterápico
MB - Multibacilar
MDT - Multidrogaterapia
OMS – Organização Mundial de Saúde
ONG – Organização Não Governamental
OPAS – Organização Pan-americana de Saúde
PB - Paucibacilar
PEL – Plan of Elimination of the leprosy –Plano de Eliminação da hanseníase
PEM – Plano de Emergência Nacional
PQT - Poliquimioterapia
ROM – Rifampicina, Ofloxacin e Minociclina
SINAN – Sistema de Informações de Agravos de Notificação
SNPES – Secretaria Nacional de Programas Especiais
SS-PCR – Secretaria de Saúde- Prefeitura da Cidade do Recife
UF – Unidade Federativa
UPE – Universidade de Pernambuco
vii
RELAÇÃO DE QUADROS, TABELAS, GRÁFICOS E ANEXO
QUADRO :
Quadro 1 : Características dos doentes entrevistados no CISAM-1998
TABELAS :
Tabela 1 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo o ano de notificação,
CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 2 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo sexo,
CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 3 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo grupo etário,
CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 4 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo município de
residência, CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 5 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo modo de detecção,
CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 6 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e modo
de detecção. CISAM –1987 a 1997.
Tabela 7 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com a forma clínica,
CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 8 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e forma
clínica, CISAM – 1987 a 1997.
viii
Tabela 9 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com a classificação
operacional em paucibacilar ou multibacilar, CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 10 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o resultado da
baciloscopia, CISAM –1987 a 1997.
Tabela 11 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e
resultado da baciloscopia. CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 12 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com a avaliação de
incapacidade, CISAM – 1987 a 1997.
Tabela 13 : Sinais e sintomas referidos pelos entrevistados na percepção da doença,
CISAM- 98
Tabela 14 : Freqüência dos relatos sobre etiologia da hanseníase entre os
entrevistados no CISAM - 1998.
GRÁFICOS :
Gráfico 1 : Percentual dos casos novos de hanseníase segundo o ano de notificação,
CISAM – 1987 a 1997.
Gráfico 2 : Percentual dos casos novos de hanseníase segundo sexo e grupo etário,
CISAM – 1987 a 1997.
Gráfico 3 : Percentual dos casos novos de hanseníase segundo município de
residência, CISAM – 1987 a 1997.
Gráfico 4 : Percentual de casos novos de hanseníase de acordo com a forma clínica,
cisam – 1987 a 1997.
ix
Gráfico 5 : Percentual de casos novos de hanseníase de acordo com a classificação
operacional em paucibacilar ou multibacilar, CISAM – 1987 a 1997.
Gráfico 6 : Percentual de casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e grau de
incapacidade, CISAM –1987 a 1997.
ANEXOS :
Anexo 1 : Ficha de cadastro do entrevistado ( dados do prontuário/sinan )
Anexos 2 : Identificação dos participantes das entrevistas no CISAM
2
I - INTRODUÇÃO
1.1 Aspectos históricos da hanseníase e seu Programa de Controle no Brasil.
Desde a antigüidade a hanseníase tem sido considerada uma doença contagiosa, mutilante e
incurável. Esses aspectos levaram a uma intensa reação da comunidade, fazendo com que
as pessoas acometidas pela doença sejam mais temidas do que a própria doença (OMS,
1995).
Amplamente conhecida como “Lepra”, a hanseníase encontra-se entre as mais antigas
doenças mundiais, tendo como berço aparente a China e a Índia. As citações mais
remotas são da época da dinastia Chou (600 A.C), com relatos sobre os discípulos de
Confúcio, que haviam contraído a doença. Em um livro compilado (500 A.C), encontra-se
3
o termo “li- feng” para designar paralisia grave e descrever um estado semelhante a atual
forma Virchoviana da doença ( Opromolla, 1981 ).
A hanseníase também era confundida inicialmente com diversas outras enfermidades da
pele ou deformidades. Os gregos conheciam a doença, sendo chamada de elefantíase por
Aratues e Galeno, por identificarem semelhança da pele do animal com a pele do doente. O
termo lepra foi usado por Hipócrates, mas suas descrições indicam doença de pele com
lesões escamosas (os eczemas crônicos) sem haver, porém, menção às manifestações
neurológicas da hanseníase (Brasil, 1989).
Várias terminologias foram utilizadas para descrevê-la. O termo “Lepra”, em grego,
significa “que descama”, e foi inicialmente usado para descrever a casca interna das
árvores. No latim, a palavra “lepre” tem a grafia “liber” e como a casca da árvore era
usada para escrever, líber veio dar origem, posteriormente, à palavra livro. Segundo a
Bíblia o “Tsaraath” em hebraico, traduzido como lepra, designava afecções “impuras” e
que acometiam tanto pessoas, objetos e casas. Estando relacionadas às “maldições” ou
“impurezas do homem” faziam-se necessários rituais de purificação (Opromolla, 1981).
O termo lepra também designava condição de miséria, pobreza, doenças que supurassem
ou que representassem contágio ou repugnância aos olhos (Jopling & Mc Dougall, 1991).
Alguns colocavam na mesma categoria : líquen, psoríase, escabiose, impetigos e
hanseníase, como se cada um desses agravos representasse um grau mais alto da doença.
Os médicos antigos não possuíam conhecimentos sobre a etiologia das doenças cutâneas,
4
sendo assim, seu diagnóstico era feito de modo empírico. A Lei de Strasbourg, por
exemplo, no final de século XV, exigia que 04 pessoas fossem designadas para este
diagnóstico: um médico, um cirurgião e 02 barbeiros. Nos exames de urina e do sangue do
suspeito “leproso” usava-se uma amostra do sangue em um recipiente com sal, se esse
decompusesse, o doente era são, senão, era leproso. Usava-se também a mistura de sangue
com gotas de vinagre e havendo formação de bolhas tratava-se de um “sangue leproso”.
Os primeiros doentes eram isolados da população geral, proibidos de cruzar os muros das
cidades de dia, saindo a noite em busca dos alimentos ou roupas deixadas na rua pelos
familiares. Tinham que usar sinetas ao pescoço para avisar sua chegada, e eram banidos
pelos soldados se fossem vistos na cidade durante o dia (Opromolla, 1981).
Durante a Idade Média (583 DC), o Concílio da Igreja Católica realizado em Lyon
estabeleceu regras para a profilaxia da doença. Consistiam em isolar o doente da
população sadia, incluíam um ofício religioso em intenção do doente semelhante ao ofício
dos mortos, após o qual o “leproso” era excluído da comunidade, passando a residir em
locais reservados para esse fim. Eram ainda obrigados a usar roupas características que os
identificava como doente e fazer soar a sineta ou matraca para avisar os sadios da sua
aproximação. Foi criada, no século XII, a primeira ordem religiosa dedicada a prestar
cuidados aos doentes de hanseníase e também os primeiros leprosários na Europa. A
magnitude da doença na Europa pode ser constatada pela existência de 19.000 leprosários
no século XIII naquele continente (Brasil, 1989).
O declínio da endemia na Europa, a partir do século XVII, também foi observado a partir
das desativações dos asilos, que prosseguiu ao longo do século XVIII e a primeira metade
5
do século XIX. Admite-se que esse declínio teve como causa principal a melhoria das
condições sócio-econômicas dos povos europeus ao longo das Idades Moderna e
Contemporânea. Com as conquistas espanholas e portuguesas e as importações de
escravos africanos introduzia-se a doença no Mundo Novo. Durante este período de
colonização a América Latina tornou-se gradativamente uma nova área endêmica mundial,
persistindo também focos endêmicos na Ásia e na África (Brasil, 1989).
No Brasil segundo Maurano (1994) os portugueses seriam os responsáveis pelo primeiro
foco de infecção decorrente das migrações colonizadoras, principalmente no Rio de
Janeiro, Bahia e Recife, no fim do século XVI e início do século XVII.
Relatos que a doença veio para o Brasil com o comércio escravo causam divergências. Para
alguns não seria possível, para o escravo doente, passar pela rigorosa triagem a que era
submetido e afastado dos outros ao primeiro sinal de doença. Outra hipótese se fundamenta
no longo período de incubação da doença, ou seja, os negros vinham nesse estágio e os
primeiros sinais da doença passavam desapercebidos em virtude da sua coloração de pele
(Opromolla, 1981).
Segundo Andrade (1996) os primeiros casos notificados no Brasil foram no ano de 1600,
na cidade do Rio de Janeiro. Em 1698 o então Governador e Capitão Geral do Rio de
Janeiro, Artur de Sá e Meneses, solicitou ao Rei autorização para instalar um hospital para
os “lázaros”, termo de origem hebraica usado para nomear os que estavam “atacados de
lepra” ou “cobertos de chagas”, usado em referência ao personagem bíblico “Lázaro”,
designação a qual eram conhecidos os hansenianos (Micaellis,1999; Bíblia, 1973).
6
No ano de 1741, surge o primeiro regulamento para combater a lepra no Brasil, redigido
por dois médicos da corte. Segundo Souza Araújo (1946), a lepra foi considerada como
doença contagiosa e como medida de controle se estabeleceu o isolamento dos doentes em
asilos especiais, segundo o sexo e as condições sociais. A segregação dos filhos era uma
das recomendações. Nesses asilos os doentes deveriam receber tratamento e dietas de
acordo com cada caso (Andrade, 1996).
No período colonial, após este regulamento, e por decisão das autoridades sanitárias, surge
a construção de hospitais para lázaros no Rio de Janeiro (1714), São Paulo (1799) e na
Bahia (1784). O primeiro hospital asilo foi construído no Maranhão em 1833 na cidade de
São Luís (Andrade, 1996).
O lo Congresso Internacional de Lepra ocorreu em 1897 na cidade de Berlim e as
principais recomendações ainda foram o isolamento compulsório, a notificação obrigatória
dos casos e a vigilância dos contatos. Essas recomendações foram adotadas pelo Brasil até
o início do século XX (Diniz, 1966), o que significa que as medidas de controle ficaram,
por cerca de 170 anos, baseadas no regulamento de 1741 (Andrade, 1996).
O período entre 1912 e 1920 constituí uma fase intermediária da história da hanseníase no
Brasil com o reconhecimento do problema pelas autoridades sanitárias, destacando-se:
Emílio Ribas, Oswaldo Cruz e Alfredo da Matta, com denúncias acerca do descaso no
combate a endemia e tomada de medidas isoladas em suas áreas de atuação (Brasil, 1989).
7
Em 1920, com a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública por Carlos Chagas,
surge a primeira atividade sanitária de luta contra a “lepra”, com a criação da “Inspetoria de
Profilaxia da Lepra e Doenças Venéreas”. As ações de controle de então priorizavam a
construção de leprosários em todos os Estados endêmicos, o censo e o tratamento pelo óleo
de hydonocarpus, ou óleo de Chaulmoogra, que foi largamente utilizado no tratamento da
hanseníase ao lado de outras terapias arsenicais e azul de metileno, mas que nunca tiveram
eficácia terapêutica comprovada (Brasil, 1989; Sant’ana et alii,1998).
O Estado desempenhava uma ação saneadora através do isolamento compulsório dos
doentes nos hospitais-colônia, esta medida tinha como suporte a idéia que o confinamento
de doentes com doenças transmissíveis traria necessariamente a erradicação da doença o
que levou a recomendação da institucionalização do cuidado aos doentes pelo Congresso
Federal. As seguintes medidas foram implementadas pela lei:
• notificação compulsória e levantamento do censo de leprosos.
• fundação de asilos-colônias, nos quais seriam confinados os leprosos pobres;
• isolamento domiciliar do doente com vigilância médica e aplicação dos recursos de
higiene para o caso;
• vigilância sanitária dos comunicantes e suspeitos de lepra;
• isolamento dos filhos recém-nascidos de pais leprosos em orfanatos específicos e
isolamento dos filhos expostos ao risco em locais específicos para cuidar das
crianças chamados de preventorios;
• proibição da importação de casos de lepra do estrangeiro
• notificação de mudança de residência de leprosos e sua família
8
• proibição ao doente de lepra de exercer profissões ou atividades que pudessem ser
perigosas à coletividade ou que o colocassem em contato direto com outras pessoas
sadias;
• era proibido ao doente freqüentar igrejas, teatros e casas de divertimentos, lugares
públicos ou viajar em veículos sem o prévio consentimento da autoridade sanitária
competente (Maurano,1994; Albuquerque,1987;Queiroz & Puntel,1997).
As medidas utilizadas no controle da hanseníase só contribuíam para que os doentes
negassem a doença até o surgimento das deformidades, e em última instância as
autoridades sanitárias acabavam por espalhar medo e discriminação em relação aos doentes
(Albuquerque,1987; Andrade,1996).
O fim da antiga Inspetoria de Lepra e Doenças Venéreas ocorre em 1934, criando-se, então,
a “Inspetoria dos Centros de Saúde”, com a função de fornecer técnicas aos profissionais
dos dispensários. Esta instância permitiu a multiplicação dos dispensários, estruturando o
sistema de atuação até hoje existente. Em 1935 foi feito um plano de ação mais
abrangente, elaborado com a intenção de dar assistência aos familiares dos doentes através
da criação de ligas de caridade (OMS, 1995).
O “Serviço Nacional de Lepra” foi criado em 1941, procedendo à coleta e a organização
de dados que forneceram informações mais atualizadas da realidade da doença no país.
Nesse primeiro momento de acordo com o modelo de intervenção de Saúde Pública
vigente, as ações eram voltadas para o âmbito bacteriológico, movidas pelo objetivo de
proteger a sociedade do contágio (Oliveira, 1991).
9
O isolamento dos doentes só contribuiu para provocar sérios problemas sociais, e não
demostrava ser eficaz no controle da doença ou na diminuição no número de casos da
endemia, além de ser bastante dispendioso para o Estado manter um doente em asilos-
colônias.
Com o advento da sulfona em 1943 e os novos conhecimentos científicos acerca de formas
não contagiosas da doença, decidiu-se pelo tratamento ambulatorial, através dos
dispensários de lepra e pela implantação de um modelo de Vigilância Epidemiologia
(Oliveira,1991; Andrade,1996).
Surge, então, em 1956 uma radical modificação dos métodos profiláticos até então em uso
e aparece a figura do leprólogo. O país foi estratificado em cinco áreas, subordinadas a
“Campanha de Luta Contra a Lepra” compostas por grupos de trabalho como: leprólogos,
médicos não especialistas e guardas sanitários.
Buscava-se a cura da hanseníase através do conjunto de medidas:
• descentralização do atendimento com cobertura populacional;
• a estratificação do país, segundo critérios epidemiológicos e operacionais;
• a identificação e exclusão dos registros dos óbitos, ausentes e curados;
• educação sanitária.
Na década de sessenta destacamos importantes mudanças na atenção ao doente. Surge com
base na curabilidade da terapêutica com Dapsona a não obrigatoriedade da internação
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compulsória do doente contagiante. Neste período em São Paulo surge a proposta do Dr
Rotemberg da substituição do termo lepra por hanseníase, nome proposto em homenagem
ao Cientista Norueguês Dr Gerard Amauer Hansen, descobridor do Mycobacterium leprae.
A propaganda e educação sanitária recebem maior ênfase para a diminuição do
preconceito e descobrimento de casos. São elaboradas normas técnicas e a publicação do
Guia de Controle da hanseníase pela necessidade de padronização a nível nacional das
técnicas e procedimentos utilizados no controle da doença ( Oliveira, 1991; Brasil, 1994;
Andrade,1996; Lana,1997).
As mudanças mais importantes observadas na década de setenta são as relacionadas com
as medidas de diminuição do estigma da doença. O termo hanseníase é adotado pela
Nomenclatura de Dermatologia Brasileira e pelo Governo Federal em substituição
definitiva a palavra lepra e seus derivados. Inicia-se uma preocupação dos técnicos
envolvidos no Programa para a diminuição das seqüelas nos casos diagnosticados, é criado
em 1978 o Manual de Prevenção de Incapacidades juntamente com uma maior divulgação
do Guia de Controle da Hanseníase. O antigo “Serviço Nacional de Lepra”, é substituído
pela Divisão Nacional de Dermatologia Sanitária(DNDS) ( Oliveira, 1991; Brasil, 1994).
Destacamos na década de oitenta que as principais mudanças ocorrem em relação a
terapêutica. Começam a surgir os primeiros casos de sulfono resistência em países
Africanos, modificando todo o panorama mundial em relação ao tratamento da doença a
proposta de redução do tempo de tratamento e inclusão de novos medicamentos no
combate a doença e a utilização de esquemas padronizados pela OMS, surge a
poliquimioterapia em 1986 no Brasil, com implantação gradual em todo território
11
Nacional. O programa conta com a ajuda de recursos não governamentais de países
estrangeiros para a implantação do novo esquema e treinamento de pessoal. São criados os
primeiros “Centros Nacionais de Referência”, unidades responsáveis pelo tratamento de
doentes e principalmente nas capacitações dos técnicos envolvidos no programa e produção
de novas pesquisas sobre hanseníase. No final da década a preocupação está voltada para a
eliminação da endemia como problema de saúde pública, com a elaboração do Plano de
Emergência Nacional (PEM), onde o país é dividido em regiões de acordo com a
incidência e prevalência da doença e a distribuição dos recursos é feita de acordo com as
áreas consideradas prioritárias tendo-se como critérios, os coeficientes de morbidade (
Oliveira,1991; Oliveira,1996; Andrade,1996; Penna,1994).
Em 1990 a Divisão Nacional de Dermatologia Sanitária (DNDS) passa a Coordenação
Nacional de Dermatologia Sanitária (CNDS). A poliquimioterapia passa a ser o esquema
oficial de tratamento em todo território Nacional. Destacamos a intenção de eliminar a
hanseníase, como problema de saúde pública, a principal atividade desta década. O Brasil,
juntamente com outros estados membros da OMS em Assembléia Mundial, assumiram o
compromisso de até o ano 2000 reduzirem a prevalência da doença para menos de 1 caso
por 10.000 hab. No ano de 1997 surge a proposta da OMS/OPAS de tratamento com dose
única, o ROM (Rifampicina, Ofloxacin e Minociclina) para doentes paucibacilares com
lesão de hanseníase única e Poliquimioterapia padrão (PQT) para multibacilar em 12
meses. Estes esquemas foram implantados em unidades pilotos ainda com protocolo de
pesquisa, não sendo considerado esquema oficial padrão de tratamento (
Oliveira,1991;Vilaça,1991; Talhari,1994; Oliveira,1996; Andrade,1996; Ministério da
Saúde, 1997; OMS,1999).
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De uma maneira sucinta podemos assim descrever as prioridades e principais estratégias
que nortearam o Programa de Controle da hanseníase desde a década de cinqüenta até a
atual data :
1959 • Sancionada lei no: 3.542 de 11/2/59, que instituí a “Campanha Nacional de
Controle da Lepra –OMS”
1960 • Final da internação compulsória para as formas contagiantes
• Publicação do Guia de Controle de Lepra - OMS.
• Elaboração de normas técnicas.
• Vigilância Epidemiológica dos casos de hanseníase
• Normas técnicas especiais para o “Combate à Lepra” no país. 1961
• O termo hanseníase é introduzido no Estado de São Paulo pelo Dr.Rotberg.
1970 • Adotado o nome hanseníase pela Nomenclatura de Dermatologia Brasileira
• Criação da Divisão Nacional de Dermatologia Sanitária (DNDS), substituindo ao
“Serviço Nacional de Lepra”.
• Adoção pelo Governo Federal do termo hanseníase.
1976 • Instruções para execução das normas de controle da hanseníase, portaria
ministerial n0 165 de 14/5/76.
• “Estadualização” das atividades de controle do programa
1978
• O programa assume o nome de “Programa Integrado de Controle da Hanseníase”.
• Divulgação do “Guia de Controle de Hanseníase” e do Manual de Prevenção e
Tratamento de Incapacidades Físicas”.
13
1984 •••• Nova publicação do “Guia de Controle de Hanseníase” e “Manual de Prevenção e
Tratamento de Incapacidades Físicas”.
• Formação dos “Centros de Prevenção de Incapacidades Físicas”.
1985 • 1a Avaliação Nacional dos Programas de Controle da hanseníase.
• Criação do comitê técnico-social para assessorar as UF na reformulação da
política assistencial dos Hospitais–asilos-colônia.
• Canalização dos recursos financeiros de agências não governamentais estrangeiras.
1986 • Diretrizes propostas para o qüinqüênio 1986-1990.
• Implantação gradual do novo regime terapêutico a Multidrogaterapia (MDT) em
todo o país.
• Diretrizes MDT-OMS.
1987 • Monitorização da implantação de MDT nas áreas pilotos.
1988 • Campanha de Divulgação Nacional do Programa de Controle da hanseníase
• Criação dos Centros Nacionais de Referência.
1989 • Elaboração do Plano de Emergência Nacional (PEM).
1990 • A Divisão Nacional de Dermatologia Sanitária (D.N.D.S.) altera a denominação
para Coordenação Nacional Dermatologia Sanitária (CNDS).
• Investimento no treinamento e capacitação dos técnicos, tanto ao nível operacional
como gerencial do programa .
• Implantação do Plano de Emergência Nacional (PEM) ao nível regional
1991 • A implantação dos esquemas MDT-OMS em todas as unidades federais como
única opção de tratamento.
• Normas técnicas MDT-OMS.
14
• Criação da Fundação Nacional de Saúde, assumindo as atividades da Secretaria
Nacional de Programas Especiais (SNPES) – a Pneumologia e Dermatologia
Sanitária ( decreto n0 100, de 16/4/91).
• Assembléia Mundial de Saúde e Estados membros da OMS, declararam sua
intenção de eliminar a hanseníase como problema de saúde pública até o ano 2000
1992 • Programa de treinamento para todos os níveis de atuação
• Projeto de Supervisão direta: MDT-OMS doses fixas.
1993 • Guia de Controle da hanseníase.
1994 • Plano Nacional, regional e estadual de eliminação da hanseníase (PEL).
1997 • Campanha de Divulgação da hanseníase 1997-1999.
• Reunião do “Expert Committee” - OMS, recomenda esquemas de curta duração:
ROM (Rifampicina, Ofloxacin e Minociclina) dose única para lesão única, e
Poliquimioterapia (PQT) para multibacilar em 12 meses. Implantação em unidades
pilotos com protocolo de pesquisa.
(Oliveira, 1991,Vilaça,1991; Brasil,1994; Talhari,1994;Penna,1994;Andrade,1996; Ministério
da Saúde, 1997).
15
1 .2 As manifestações clínicas da hanseníase, seu diagnóstico e tratamento.
A hanseníase é uma doença crônica, granulomatosa, infecciosa em alguns casos,
proveniente da infecção causada pelo Mycobacterium leprae, que afeta principalmente os
nervos periféricos, pele e algumas vísceras (Brasil, 1989).
O Mycobacterium leprae é um bacilo álcool-ácido resistente típico, pode ser observado
isoladamente ou em globias em esfregaços cutâneos ou mucosas de pessoas infectadas. Foi
identificado pela primeira vez em 1873 pelo Dr. Gerhard Amauer Hansen, e até hoje o seu
cultivo em meios artificiais não foi possível. O tempo de multiplicação é prolongado,
podendo durar entre 12 e 14 dias, o que imprime à hanseníase características de evolução
crônica e lenta. Um passo importante no estudo de sua história natural são os recentes
modelos de investigação em animais (Brennan, 1981; Lombardi, & GilSuarez,1997).
A infecção foi detectada ocasionalmente de forma natural em tatus (Dasytus novencintus) ,
na Lousiana (EUA), e também em algumas espécies de macacos africanos (Dercocebus
torquatus atys e Pan troglodytes), ainda há relatos de bactérias semelhantes ao M. leprae
encontradas como saprófitas no solo e na vegetação de alguns lugares do mundo, não sendo
considerados como responsáveis na transmissão da doença, em seres humanos (Brasil,
1994; Lombardi & Gil Suarez,1997).
O homem doente, portador das formas virchoviana e dimorfa sem tratamento, é
considerado o único reservatório natural na transmissão inter–humana. Quanto à
16
transmissão da doença, a principal porta de entrada e saída do bacilo são as vias aéreas
superiores, existindo também a possibilidade da transmissão via cutânea, quando existem
lesões ulceradas ou traumáticas na pele (Ministério da Saúde, 1985; Brasil, 1994).
Jopling & McDougall (1991), defendem três possíveis rotas no modo de transmissão: a
pele, vias aéreas e o tubo gastrointestinal através de alimentos contaminados por bacilos
transportados por moscas, ou pelo leite materno, referindo que ainda é desconhecido o
risco de infecção por esta via. Talhari & Neves (1997), citam como fontes de bacilos os
hansenomas ulcerados, o leite materno, a urina e as fezes, sendo discutível a possibilidade
de insetos como vetores de bacilos.
A contaminação via infecção transplacentária é referida como um evento raro, a
contaminação in útero parece ser possível nas mães portadoras de formas intensamente
bacilíferas, nas quais o bacilo foi isolado na placenta e no sangue umbilical, com a
detecção de anticorpos anti-M.leprae do tipo IgM nos recém–nascidos (Flageul, 1997).
A presença viável do M. leprae em fómites durante vários dias (até 45 dias), favorece a
hipótese da possibilidade de infecção por via indireta. Também é cogitada a probabilidade
da existência “do portador são” ocasionando infecções. Não existem relatos precisos que
mensurem a influência destes fatores na transmissão da hanseníase (Lombardi &
GilSuarez,1997).
O período de incubação da doença é um dos mais longos que se conhece na patologia
humana, variando de dois a sete anos. Há referências de períodos mais curtos (sete meses)
e mais longos (dez anos), sendo difícil a identificação, a partir dos relatos dos doentes, dos
17
primeiros sinais e sintomas da doença assim como relacioná-los com a possível fonte de
infecção (OPAS/ OMS,1983; Ministério da Saúde, 1985; Brasil, 1994).
A hanseníase não poupa raça, idade ou sexo. Em áreas endêmicas a infectividade bacilar é
alta mas sua patogenicidade é baixa. A infecção pelo M. leprae é muito mais freqüente do
que o número de casos clínicos conhecidos, testes sorológicos confirmam isto. Foi
comprovado que mesmo em populações de nível endêmico mais elevado, somente 10% das
pessoas são suscetíveis à doença (Ministério da Saúde, 1985; OPAS/OMS,1983).
A disseminação da hanseníase, em determinada comunidade, está relacionada à proporção
de pessoas suscetíveis na população e sua oportunidade de contato com o bacilo. Os riscos
de adoecimento são maiores em contatos familiares de doentes bacilíferos (Brasil, 1989;
Lombardi & Gil Suarez, 1997; OPAS/OMS,1983).
Vários estudos demonstram o componente imunológico do adoecer, onde muitos são
contaminados e oferecem resistência ao M. leprae não desenvolvendo doença. Esta
condição pode ser afetada em função da relação agente/meio/hospedeiro, ocorrendo o
adoecimento em parcelas crescentes de indivíduos imunologicamente resistentes ao bacilo
de Hansen (Brasil, 1989).
Uma dificuldade para o diagnóstico da hanseníase provêm da multiplicidade de sinais da
doença. A hanseníase é classificada por diversos autores que utilizam critérios distintos
para o agrupamento das formas clínicas e suas manifestações, surgindo a necessidade de
uma padronização a nível mundial para melhor compreensão da endemia e de seus
18
indicadores. Destacamos que após o “VI Congresso Internacional de Leprologia em
Madrid” em 1953, a nomenclatura proposta por pesquisadores sul-americanos, classifica a
hanseníase em 4 formas clínicas distintas: forma indeterminada, tuberculoide, dimorfa e
virchoviana. Esta nomenclatura é conhecida como a Classificação de Madrid (Balina,1975;
OPAS,1983; Brasil,1994).
A classificação de Ridley e Jopling, proposta em 1962, foi originalmente desenvolvida
para fins de pesquisa. Baseia-se no espectro imunológico dos doentes e utiliza a mesma
denominação de Madrid, acrescentando uma subdivisão da forma dimorfa. Esta é
denominada como “borderline” e, de acordo com sua aproximação das formas polares da
doença em “borderline tuberculoide”, “borderline borderline” e “borderline lepromatosa”
(O.M.S., 1989; Jopling & McDougall, 1991).
No Brasil rotineiramente os estudos utilizam a classificação de Madrid, porém para fins
operacionais a recomendação da OMS adotada pelo Ministério da Saúde do Brasil é que
os doentes sejam agrupados em dois grupos:
- Paucibacilares (PB) – São classificados como paucibacilares os doentes que apresentam
resposta imunológica competente. Produz-se uma forma localizada e não contagiosa da
doença ou, segundo a nomenclatura de Madrid, são os classificados como forma
indeterminada e tuberculoide sempre com baciloscopia negativa.
- Multibacilares (MB)- São classificados como multibacilares os doentes que apresentam
competência imunológica deficiente ou ausente para o M. leprae, desenvolvem uma forma
19
generalizada e contagiosa da doença, segundo a nomenclatura de Madrid, são as formas
Virchoviana, Dimorfa e as formas clínicas não classificadas. Apresentam baciloscopia
positiva (Brasil, 1994).
Para o diagnóstico da doença são necessários uma anamnese e exame físico cuidadoso. Na
anamnese deve ser explorado principalmente a sintomatologia neurológica, duração,
localização e evolução dos sinais ou sintomas e história epidemiológica. O exame clínico
deve ser realizado em área com boa iluminação onde será feito o exame dermato-
neurológico. No exame dermatológico devem ser investigados sinais da doença como:
manchas, nódulos, infiltrações, placas, alopécia localizada, ulcerações, calosidades etc. A
hanseníase é principalmente uma doença dos nervos periféricos e nas lesões ou áreas
suspeitas deve ser feito o exame neurológico com pesquisa das sensibilidades térmica,
dolorosa e tátil. É recomendado a palpação dos troncos nervosos periféricos mais
acometidos pela doença, quais sejam: ulnar ou cubital, radial, mediano, fibular e tibial
posterior. Devemos também verificar a integridade anatômica e motora das mãos, pés e
face (Kelly,1978; Brasil, 1994; Lehman,1997; Oliveira,1997).
O diagnóstico clínico através do exame dermato-neurológico é soberano. Os meios que
podem auxiliar o diagnóstico são: baciloscopia, histopatologia, prova da histamina, prova
da pilocarpina e reação de Mitsuda (Brasil, 1994; OMS,1995; Talhari & Neves,1997).
A baciloscopia, quando disponível, deve ser realizada em todas as pessoas com suspeita
clínica de hanseníase, lembrando que nas formas não transmissíveis ou paucibacilares da
doença não são evidenciados os bacilos nas lesões ou nos sítios padronizados de coleta, ou
20
seja, nos lóbulos auriculares, cotovelos e lesão. Portanto, baciloscopia negativa não excluí
o diagnostico (Brasil,1994; OMS,1995; Talhari & Neves,1997).
A pesquisa bacteriológica positiva confirmará o caso suspeito, geralmente formas
virchoviana ou dimorfas, sendo os doentes classificados como multibacilares ou
bacilíferos, os quais devem ter prioridade nos programas de controle da endemia
(Albuquerque,1987;Brasil,1994; Andrade et al.,1996a; OMS, 1995 ).
O exame baciloscópico é recomendado na ocasião do diagnóstico, não havendo mais a
necessidade de repeti-lo no seguimento do caso ou na avaliação da alta por cura no atual
tratamento poliquimioterapico com doses fixas (Brasil, 1994; OMS, 1995; OMS,1997).
Segundo a classificação de Madrid, a hanseníase apresenta-se nas seguintes formas
clínicas:
Forma Indeterminada
Os sinais e sintomas da doença, na fase inicial, podem passar despercebidos pelos
doentes, devido à ausência de dor, prurido ou desconforto, que o impossibilite de exercer
suas atividades habituais ou de conviver socialmente (Brasil,1994; OMS ,1995).
A forma indeterminada, também denominada forma inicial, incipiente ou incaracterística é
a fase de começo da hanseníase, caracteriza-se pelo aparecimento de uma ou várias
manchas, mais claras que a pele normal (mancha hipocrômicas). São lesões planas, sem
21
relevo, com bordas na maioria das vezes imprecisas. A hanseníase indeterminada também
pode se apresentar sem lesão cutânea, somente com alteração da sensibilidade no local. As
manchas podem localizar-se em qualquer lugar, e como ainda não há expessamento
nervoso as deformações nunca estão presentes. A evolução da fase inicial é em média de 1
a 5 anos. A evolução natural, desta forma clínica sem tratamento é permanecer estacionária
ou evoluir para as formas tuberculóide, virchoviana, dimorfa ou espontaneamente para a
cura (Bryceso & Pfaltzgraff,1990; Talhari,1994; Brasil,1994; Talhari & Neves,1997).
A forma indeterminada é a fase ideal para o tratamento pois a quantidade de bacilos é
reduzida e o doente não oferece riscos de contágio, podendo continuar desenvolvendo
normalmente as suas atividades, sem qualquer restrição. Quanto mais precoce o
diagnóstico, melhor será o prognóstico do doente de não adquirir seqüelas e facilitar sua
reintegração social. O diagnóstico nesta fase da doença é um indicador de eficácia das
medidas de controle da endemia. Para fins de tratamento e das atividades do Programa de
Controle da hanseníase, é classificada como paucibacilar (PB) independente do teste de
Mitsuda (Brasil, 1994;OMS,1995;Lehman,1997; ).
Forma Tuberculóide
Esta forma clínica da doença caracteriza-se por lesões eritemato-hipocrômicas,
eritematosas, eritemato-escamosas, com bordas discretamente elevadas ou com
microtubérculos. Surge a partir da forma indeterminada não tratada e nos doentes que
tenham boa resistência. Na hanseníase tuberculóide, o centro da lesão pode estar
aparentemente poupado mostrando evolução centrífuga do processo. As placas variam de
22
forma, tamanho e número, mas não há tendência à disseminação, podendo ocorrer cura
espontânea (Brasil, 1994; Talhari & Neves, 1997).
Troncos nervosos podem ser envolvidos, e em geral, esse comprometimento é intenso,
podendo haver necrose caseosa do nervo ("pseudo-abcesso de nervo") e incapacidades. As
manifestações neurais podem ocorrer isoladamente sem a presença de lesões cutâneas, e
essas formas clínicas são denominadas "formas neuríticas puras". Algumas vezes podem
ocorrer o acometimento de filetes nervosos superficiais surgindo o comprometimento da
sensibilidade e lesões cutâneas hiperceratósicas, úlceras e em alguns casos deformidades
(Brasil, 1994; Talhari & Neves,1997).
Na forma tuberculóide verifica-se alterações nas sensibilidades térmica e dolorosa, e nas
lesões mais antigas altera-se também a sensibilidade tátil. Há queda de pêlos e a sudorese
está diminuída ou ausente (hipohidrose ou anidrose). A quantidade de bacilos é pequena,
portanto não há riscos de contágio. Operacionalmente é classificada como paucibacilar
(Brasil,1994; Talhari & Neves,1997).
Forma Dimorfa
Os indivíduos portadores desta forma clínica apresentam caracteristicamente lesões
eritematosas, eritemato-violáceas, ferruginosas, infiltradas, edematosas, brilhantes,
escamosas com contornos internos bem definidos e externos mal definidos (lesões
foveolares e pré-foveolares), centro deprimido, aparentemente poupado, hipocrômico ou
com coloração de pele normal. Seu caráter estável faz-se assemelhar com lesões bem
23
delimitadas da forma tuberculóide e com as lesões disseminadas da forma virchoviana. O
comprometimento neurológico troncular é freqüente, bem como os episódios reacionais,
proporcionando um risco elevado de adquirir incapacidades. Operacionalmente esta forma
é classificada como multibacilar, apresentando geralmente resultados positivos no exame
de baciloscopia (Brasil,1994; Talhari & Neves,1997).
A forma dimorfa surge a partir da forma indeterminada não tratada e nos doentes que
possuam resistência imunológica instável ao M. leprae. Os indivíduos portadores da forma
dimorfa possuem uma resistência imunológica ao M. leprae menor do que a observada nos
portadores das formas paucibacilares, e resistência imunológica superior aos portadores da
forma virchoviana (Brasil,1994; OMS,1995;Talhari & Neves, 1997).
Forma Virchoviana
Na hanseníase virchoviana não há resistência à disseminação bacilar. Apresenta infiltrações
difusas com numerosas lesões eritematosas, eritemato-acastanhadas, infiltradas, brilhantes,
coalescentes, mal definidas e de distribuição simétrica. Há infiltração difusa da face,
principalmente em pavilhões auriculares, malares e superciliares com formação de
tubérculos e nódulos, ocasionando a perda definitiva dos pêlos nos cílios e supercílios
(madarose) que dão um aspecto peculiar, a chamada “facies leonina”. Nesta forma a
hanseníase adquire um caráter sistêmico com manifestações viscerais importantes,
especialmente nos estados reacionais, atingindo principalmente os olhos, testículos e rins
(Brasil, 1994,OMS,1995).
24
A mucosa nasal é particularmente comprometida e o indivíduo apresenta infiltração ao
nível do septo cartilaginoso e às vezes a presença de hansenomas e a mucosa congesta
dificultam a respiração do doente. Pode haver inclusive perfuração do septo com a
deformidade conseqüente. Há lesões ao nível da mucosa bucal e o palato mole, o palato
duro, língua e gengivas podem apresentar lesões. A infiltração também pode se estender à
laringe e o doente pode apresentar rouquidão e dispnéia nos casos avançados. O
comprometimento neural na hanseníase virchoviana é nos casos iniciais discreto, mas à
medida que a doença vai se agravando esse comprometimento progressivo se acentua. Os
nervos comprometidos são os mesmos que são comprometidos na hanseníase tuberculóide.
Pode haver lesão do nervo cubital, mediano, ciático poplíteo esterno e tibial posterior,
principalmente. Operacionalmente esta forma é classificada como MB apresentando
resultados positivos no exame de baciloscopia com a presença de inúmeros bacilos e
globias (Brasil,1994;Talhari & Neves, 1997; Diogénes et alli,1997).
A evolução crônica da endemia pode ser interrompida por fenômenos agudos que merecem
uma atenção imediata para prevenir possíveis complicações e as incapacidades da doença,
são os chamados episódios reacionais, ou simplesmente, reações hansenicas. Podem ser
classificados de acordo com a resposta imunológica do doente em: tipo I e tipo II
(Brasil,1994; Opromola et alli,1997).
Os episódios reacionais do tipo I são reações mediadas por células (imunidade celular),
constituindo-se um exemplo de reação tipo de Coombs e Gell e ocorrem nas formas
tuberculóides e dimorfas. As reações de tipo II são mediada por anticorpos( imunidade
25
humoral), incidindo em doentes virchovianos e alguns dimorfos próximo ao pólo
virchoviano (Brasil, 1994;OMS,1995).
O tratamento padronizados pela OMS é a poliquimioterapia (PQT), feito em regime
ambulatorial. O doente deverá ser classificado, para a indicação dos esquemas terapêuticos,
em paucibacilares e multibacilares, utilizando os métodos de diagnósticos disponíveis na
sua unidade.
Paucibacilares(PB) :
• Rifampicina (RFM)- 600mg uma vez por mês, supervisionados;
• Dapsona(DDS)-100 mg uma vez ao dia , auto-administrado;
Duração do tratamento - 6 doses supervisionadas em um tempo máximo de 9 meses, fora
disto, será considerado tratado irregularmente (Brasil,1994; Andrade et al.,1996a;
Oliveira,1997; OMS,1997).
Multibacilares(MB) :
• Rifampicina (RFM) - 600mg uma vez por mês, supervisionados;
• Clofazimina (CFZ) - 300mg uma vez por mês, supervisionados;
• Dapsona (DDS) -100 mg uma vez ao dia , auto-administrado;
• Duração do tratamento - 24 doses supervisionadas em um tempo máximo de
36 meses, fora disto será considerado tratado irregularmente
(Brasil,1994;Andrade et al.,1996a; Oliveira,1997; OMS,1997).
26
Em 1997 a OMS recomendou 12 doses fixas para doentes com índice bacilar menor ou
igual a 3, e o esquema ROM (Rifampicina 600 mg/dia mais Ofloxacin 400 mg/dia mais
Minociclina 100 mg/dia) em dose única, para doentes com uma só lesão de Hanseníase.
Estes esquemas estão em fase de experimentação e ainda não são oficiais, devem ser
iniciados somente em unidades de referência para o tratamento da doença que tenham
fácil acesso a laboratórios e boas condições de registro (Sant’ana, et alii,1998;
OMS,1997).
Os efeitos colaterais mais referidos são os gastrointestinais e a hiperpigmentação
provocada pela clofazimina (Brasil, 1994;OMS,1997)
A terapêutica incluí o acompanhamento e avaliação das incapacidades físicas através de
técnicas simples. É feita a avaliação dos principais troncos nervosos periféricos quanto à
sua sensibilidade (térmica, dolorosa e tátil) e perda de função, sendo atribuído um grau de
acordo com a situação encontrada em relação a sensibilidade protetora e incapacidade :
• Grau 0 - quando não existe incapacidade instalada, e a sensibilidade protetora está
normal sem anestesias;
• Grau I - quando existe áreas com perda da sensibilidade protetora, mas sem
incapacidades instaladas, feridas ou calosidades;
• Grau II - perda da sensibilidade protetora, mais alterações da dinâmica muscular,
úlceras, garras móveis, deformidades etc...
• Grau III - além dos outros níveis, deformidades fixas da estrutura anatômica, perda
de função do membro atingido, cegueira, seqüelas permanentes.
27
Após o diagnóstico das incapacidades são dadas orientações para o auto cuidado e
prevenção de seqüelas que são extremamente estigmatizantes no caso da hanseníase (Kelly,
1978;Brasil, 1994;Lehman,1997;Oliveira,1997).
1 .3 A epidemiologia e controle da hanseníase
Um caso de hanseníase é definido como: “uma pessoa apresentando sinais clínicos da
doença com ou sem confirmação bacteriológica do diagnóstico, e requerendo
quimioterapia” (Brasil,1994;OMS,1988).
A hanseníase é uma doença de notificação compulsória em todo território nacional
(portaria No 341, de 27/08/1976, do Ministério da Saúde). Em decorrência dessa prioridade
tornou-se obrigatória a investigação epidemiológica dos casos de hanseníase (Lei No.
6.259 de 30/10/1975; Ministério da Saúde, 1985).
A vigilância epidemiológica é feita através da verificação de notificações, busca ativa,
exame de coletividade e de contatos intradomiciliares. O exame de coletividade está
indicado nas áreas onde a prevalência for igual ou superior a 10 casos por 1000 habitantes
(Brasil, 1994; Penna,1994).
Conceitua-se como contato, toda pessoa que tem ou teve convivência íntima e prolongada
com o doente de hanseníase. Para fins operacionais, no entanto, a vigilância poderá ser
limitada às pessoas que residem com os doentes. Os contatos serão submetidos a exame
28
dermato-neurológico e se nem uma anormalidade for constatada no exame serão vacinados
com duas doses de BCG. Conta-se a cicatriz vacinal, se houver, como a 1a dose da vacina,
obedecendo um intervalo mínimo de 6 meses entre as doses. Não há necessidade prévia da
realização da prova tuberculínica. Os contatos sadios serão liberados após orientações
sobre sinais e sintomas da doença, reforçando conceitos de cura e importância do
tratamento (Brasil, 1994; OMS,1995).
São objetivos do Programa de Controle da hanseníase: reduzir a morbidade, expressa pela
incidência e prevalência da doença e os danos causados que são expressos pela gravidade
das incapacidades físicas e psicossociais encontradas (Brasil, 1994; OMS,1995).
Para avaliação das ações de controle no programa da hanseníase são utilizados indicadores
epimemiológicos e operacionais, construídos a partir de informações a respeito dos casos
notificados.
Os indicadores epidemiológicos medem os diferentes aspectos da magnitude e
transcendência da doença e os mais utilizados são: percentuais de casos detectados no ano
e sua distribuição por sexo, idade, forma clínica, grau de incapacidade, baciloscopia;
coeficiente de detecção anual de casos novos bruto e específicos por idade, sexo e formas
clínicas e seus percentuais; coeficiente de detecção anual de casos novos em menores de 15
anos, percentagem de multibacilares entre os casos novos (determinam a tendência secular
da endemia), coeficiente anual de prevalência (medir a magnitude da doença), percentagem
de casos novos com deformidades instaladas (estima a eficácia para detecção precoce dos
casos) etc. (Costa & Patrus,1992; Brasil,1994; OMS,1995; Andrade et al., 1996b).
29
Os indicadores operacionais mensuram o trabalho realizado, seja em função da qualidade
ou da quantidade. Os mais utilizados são: percentagem de casos novos cujo grau de
incapacidade foi avaliado no ano (medir a qualidade do atendimento do serviço),
percentagem de casos novos por grau de incapacidade, percentagem de casos em registro
ativo não atendidos no ano ( abandono / medir a capacidade dos serviços em assistir aos
casos de hanseníase) etc. (Brasil, 1994; Andrade et al.,1996b).
A hanseníase é uma das endemias mais preocupantes quanto à prevalência no quadro de
saúde no nosso país. O Brasil encontra-se em segundo lugar mundial, perdendo em número
de casos para a Índia e ocupando o primeiro lugar nas Américas com 85% dos casos do
continente (OMS, 1995; Brasil,1998).
O nosso país apresenta características ambientais e ocupacionais humanas bem diversas e
vive um momento de transição epidemiológica onde as “doenças do atraso” convivem com
aquelas da “modernidade”. Diante deste quadro, a hanseníase apresenta distribuição
desigual da prevalência que varia de 19,4 / 10.000 hab. no Estado do Mato Grosso à 0,5 /
10.000 hab. no Rio Grande do Sul, sendo a atual prevalência, para o país como um todo de
5,5 /10.000 hab ( I.E.S.U.S,1997; Brasil,1998; MS,1999).
Ressaltamos ainda que estes dados não são representativos da realidade da endemia,
pois muitos deles estão subnotificados possivelmente devido a carência de serviços de
diagnóstico e tratamento, ausência do profissional qualificado nas ações de controle do
programa, desestruturação do atuais serviços de referência ou ainda, pelo grande
30
desconhecimento da população dos sinais e sintomas da doença e de sua magnitude.
Em Pernambuco, a realidade não é diferente do restante do país. No ano de 1996 o Estado
apresentou um coeficiente de detecção de 3,5 por 10.000 hab. por ano, uma prevalência de
12,3 casos por 10.000 hab ocupando o segundo lugar na região Nordeste em termos de
prevalência (SSE-PE ,1997; Brasil,1998).
Dados do Programa de Controle da hanseníase em Pernambuco informam que a cobertura
do programa é de 38% da população do Estado, apresenta um percentual de cura menor
que 60%, taxa de abandono de 28% e a presença de algum tipo de deformidade instalada
em 7% dos casos novos. Estes indicadores são sugestivos de uma endemia encoberta,
assim como o aumento de formas tuberculóides em relação as formas multibacilares e o
franco desenvolvimento do número de casos na faixa etária menor de 15 anos. Estes
resultados foram encontrados anteriormente por Albuquerque (1987) no estudo da
hanseníase no Município do Recife no período de 1960-1985 que constatou um
crescimento considerável da endemia, expresso pelo aumento do seu coeficiente de
detecção da forma tuberculóide associado ao elevado percentual de menores de 14 anos
acometidos pela doença. Ainda, no mesmo estudo verificou-se a implementação das ações
de controle da endemia no município de Recife durante o período investigado (SSE-PE,
1996; Albuquerque & Morais,1989).
O conhecimento da situação endêmica é um dos objetivos do plano de eliminação da
hanseníase. A nível nacional os objetivos prioritários do Plano de Emergência são :
detectar todos os casos novos esperados; tratar com Poliquimioterapia (PQT ) todos os
31
casos; aplicar BCG em contatos intradomiciliares e conhecer a real prevalência da
hanseníase (OPAS,1998; OMS, 1995).
Os componentes essenciais da estratégia de eliminação são : expandir os serviços de PQT
para todas as unidades de saúde, assegurar tratamento adequado a todos os doentes (novos
ou antigos), encorajar a regularidade do tratamento prevenindo o abandono, promover os
conhecimentos sobre hanseníase na comunidade de modo que indivíduos suspeitos de
terem a doença procurem voluntariamente os serviços para diagnóstico e tratamento,
estabelecer metas e cronogramas para as atividades e esforçar-se para que sejam atingidas,
manter registros adequados de todas as atividades e monitorar os programas visando a
eliminação da doença (OMS ,1995).
1 .4 Aspectos sócio culturais da hanseníase.
Desde as civilizações antigas, o homem tenta definir e explicar as doenças. Anteriormente
atribuía-se causalidade à ausência ou supressão de algum princípio vital, a presenças
estranhas e nocivas, como matéria impura, demônios ou animais perversos. Hoje a
compreensão de morbidade abrange desde substâncias tóxicas, micróbios e parasitas até
forças autodestrutivas e comportamentos insalubres. Ainda é corrente a concepção
simplista de que todas as doenças poderiam ser conhecidas através do microscópio e
tratadas com soros, vacinas ou medicamentos (Berlinguer, 1984).
32
Estudos demonstram a importância de fatores ambientais, sócioeconomicos e culturais na
manutenção da saúde de uma comunidade e na identificação das doenças. A
autoidentificação do indivíduo como doente vai depender de vários fatores: a experiência
pessoal de cada um, as informações que circulam dentro da sociedade em que vive, a
imagem e significados individuais da saúde e da doença, podendo constituir-se, muitas
vezes, em uma nova auto-imagem. Um ramo da antropologia, a Antropologia Médica,
contribui para o estudo de como as pessoas, nas diferentes culturas e grupos sociais,
explicam as causas das doenças, os tipos de tratamento, e a quem recorrem quando
adoecem (Brasil,1988; Épinay,1988; Helman,1994; Guareschi & Jovchelovitch et al,1995;
Queiroz & Puntel,1997).
A hanseníase, sendo um problema médico e de Saúde Pública, é bem explorada pela clínica
e epidemiologia. Entretanto, persistem distorções no imaginário popular, inclusive entre
profissionais de saúde que lidam com a doença. Devido às manifestações inestéticas nos
casos mais avançados da doença, durante séculos os doentes ou os supostamente afetados
pela hanseníase foram vítimas de procedimentos desumanos como: o isolamento,
segregação, uso de roupas ou utensílios que os destacavam dos outros. Estas condutas
provocavam reações psicológicas, sociais e econômicas no doente e familiares e também
na comunidade, que reagia com temor e rejeição em relação a doença e ao doente,
desencadeando assim o processo de estigmatização dos mesmos (Bechelli,1986;
GonzalezdelCerro,1989; Queiroz & Puntel,1997 ).
O termo “estigma” foi criado pelos Gregos, para identificarem sinais corporais feitos com
cortes ou fogo, com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou
33
mau sobre o status moral de quem o apresentava. Geralmente o estigma avisava que o
portador era um escravo, um criminoso ou traidor, uma pessoa que deveria ser evitada,
especialmente em locais públicos. Na Era Cristã, o termo estigma foi usado para referir
sinais de “Graça Divina”. Mais recentemente o termo foi usado em referência a um atributo
profundamente depreciativo de um indivíduo ou de uma comunidade (Goffman,1963).
Diversas doenças e seqüelas têm sido objetos de estigmatização social, como as doenças
mentais, a epilepsia, o câncer, a tuberculose, deformidades e deficiências físicas, doenças
dermatológicas, doenças transmissíveis em geral e principalmente a Síndrome de
Imunodeficiência Adquirida (AIDS). O estigma sofrido pelos doentes ou portadores do
vírus da AIDS, segundo alguns autores é comparado ao estigma sofrido pelos antigos
doentes de “lepra”. No que se refere a hanseníase, o estigma associa-se a ignorância da
população sobre os conceitos atuais de cura, transmissibilidade e terapêutica (Sotang,1984;
Bechelli,1986; Volinn,1989; Claro,1993).
A estigmatização e rejeição afetam o Programa de Controle da Hanseníase pois retardam a
procura ao médico pelo receio do diagnóstico e das medidas profiláticas (Bechelli,1986).
Os dados epidemiológicos podem responder sobre a atuação dos serviços na atenção ao
hanseniano quanto à sua eficácia e/ou efetividade. No entanto, esta atuação poderia ser
refinada com a utilização de metodologia qualitativa para coleta de dados referentes as
informações que o doente e seus familiares possuem sobre a doença. A partir deste
conhecimento, os profissionais de saúde poderiam redimensionar sua lógica de intervenção
quanto às práticas de educação em saúde, valorizando questões como a importância do
34
diagnóstico precoce, “verdades” e “mentiras” sobre a doença, causas do abandono ao
serviço, e outras (Claro,1993; Queiroz & Puntel,1997; Sant’anna et al.,1998 ).
No Brasil, os trabalhos sobre estudos sócio culturais e representação da hanseníase, na área
de ciências sociais e psicologia social, são raros. Neste sentido, os poucos trabalhos
disponíveis sobre o tema referem-se a contextos subdesenvolvidos e são bastante restritos,
a maioria oriundos de países com alta prevalência da doença, como Ásia, África, e em
menor número as Américas (Queiroz & Puntel,1997; Claro,1993).
Destacamos o estudo de Kandiah et alii (1978) na Malásia, onde os autores investigaram
os conceitos e atitudes do público em relação a hanseníase através da aplicação de 347
questionários. Concluíram que os chineses eram mais preconceituosos que os não chineses,
e ainda, que entre a população mais idosa o preconceito era maior do que na população
mais jovem.
Chen (1988) demonstrou a contribuição dos estudos sócios culturais na descoberta de
casos e tratamento precoce, em um estudo em Sarawak, na Malásia, coletando diversas
opiniões sobre preconceito e graus de conhecimento sobre hanseníase entre vários grupos
étnicos. A partir destes conhecimentos elaborou um pacote didático em saúde, relativo à
prevenção da doença, adequando a linguagem conforme às necessidades das populações
estudadas.
35
A pesquisa realizada nas Filipinas por Valência (1988), sugere que estudos mais intensivos
sobre os aspectos sociais da hanseníase resultariam em melhores programas de controle em
áreas onde a doença é endêmica.
Sobre o estigma da doença, o trabalho de Paz et alii (1990), investiga as percepções a
respeito da doença, entrevistando doentes e sadios para compreender a questão do estigma.
Concluíram que a falta de conhecimento das características clínicas da doença era a causa
predominante da estigmatização.
Gonzalez del Cerro (1989), em um trabalho multidisciplinar na Argentina estuda o estigma
do doente de hanseníase e suas conotações psicológicas e sociais, baseando-se no livro de
Goffman, "Estigma". Parte da análise geral do estigma até uma forma mais particular, na
hanseníase, identificando quatro componentes para a análise: físico, psíquico, moral e
social. Encontra, como resultados, que o doente cumpre com as normas de identidade
impostas pela sociedade e é rejeitado, formando grupos fechados. Refere ainda que o
“estigma é contagioso”.
Monteiro (1987) ao estudar a história da hanseníase no Estado de São Paulo, verificou a
repetição de medidas discriminatórias, desde os tempos coloniais até o nosso século,
prevalecendo atitudes de estigmatização. Observou a continuidade na adoção de medidas
de segregação, que variam no tempo, mas não na intensidade. Conclui identificando a
necessidade de se repensar o fenômeno do aumento do índice de incidência da hanseníase
em São Paulo, mesmo com advento das sulfonas, apontando para a necessidade de uma
melhor análise histórica e social da doença que extrapola o campo estritamente biológico.
36
Romero-Salazar et al. (1995), estuda a representação social da hanseníase no doente em
tratamento, o confronto entre o discurso médico e a fala da comunidade em torno da
doença. Destaca os componentes da representação: noções, crenças, atitudes e condutas. O
estudo foi realizado com os doentes matriculados no Serviço de Dermatologia Sanitária de
Maracaibo (Venezuela). A pesquisa discute o pouco conhecimento dos doentes em torno de
sua enfermidade, a existência de crenças e atitudes inadequadas para o controle da doença,
o predomínio na dimensão cognitiva da representação de noções e crenças em relação ao
papel da sorte ou do destino, da promiscuidade sexual e da herança na transmissão. A
tendência da participação do doente na reprodução de um estereótipo desqualificado e o
ocultamento, junto do exagerado medo da rejeição.
Feliciano & Kovacs (1996), em uma pesquisa mais ampla utilizando recursos da
antropologia e da epidemiologia, entrevistaram 183 doentes de hanseníase, com idade entre
20-70 anos, residentes no Recife, explorando de forma sistemática a influência da
percepção e a avaliação desenvolvidas por estes no processo do manejo da doença.
Concluíram pela existência de “preocupante invisibilidade da hanseníase”, identificada
entre os profissionais de saúde, os doentes e os membros das suas redes de apoio, que não
consideravam a hanseníase como problema, associada à visão estigmatizante que ainda
persiste. Apontam para a existência de importantes obstáculos que precisam ser superados
como pretende a garantia da eliminação da doença através dos conhecimentos e das novas
possibilidades concretas de intervenção favorecendo os pontos de acesso entre a prática e
técnica viabilizados através da discussão dos significados e conseqüências atribuídos à
hanseníase.
37
Bechelli (1986) faz uma retrospectiva histórica da hanseníase em relação as manifestações
clínicas, evolução dos conhecimentos e tratamento, e sua repercussão no universo
psicológico, social e econômico do doente, familiares e a comunidade envolvida. Conclui
que a ampliação de conhecimentos e progresso no tratamento determinaram, em pouco
menos de meio século, enfoque mais humano do problema e melhora considerável dos
métodos de controle, com benefício enorme para doentes e familiares e pronunciada
redução do impacto psicológico, social e econômico da moléstia.
Claro (1993) estuda as concepções, representações e atitudes em relação à hanseníase
numa população de doentes ambulatoriais com esse diagnóstico. A metodologia utilizada
foi de natureza qualitativa, baseando-se em entrevistas não-estruturadas. Os resultados
mostram a pequena importância atribuída pela maioria dos entrevistados aos sinais e
sintomas iniciais da doença e a não identificação dos mesmos com o agravo, antes da busca
de um serviço de saúde. Isto, muitas vezes, adiava esta procura por períodos prolongados.
Foi freqüente a dúvida sobre contagiosidade e curabilidade da doença. O termo “lepra”
freqüentemente evocava imagens estereotipadas da doença em fases avançadas e
ocasionava um impacto emocional altamente negativo, gerando reações pessoais de auto-
estigmatização ou auto-depreciação.
Fassin (1990), no Senegal, estuda a percepção social da hanseníase utilizando a
metodologia qualitativa, entrevistando médicos, curandeiros tradicionais e doentes. O
estudo além de fornecer dados antropológicos, contribuiu para interpretar os problemas
38
encontrados no Senegal, adaptando as atividades de controle aos contextos sócios culturais
de cada comunidade.
Entre os estudos sobre a representação da hanseníase no Brasil, temos o de Queiroz &
Puntel (1997) realizado em um serviço de saúde de referência para o tratamento de
hanseníase em Campinas-SP, utilizando a metodologia qualitativa para a coleta dos dados,
entrevistando profissionais de saúde do serviço, doentes e familiares. O estudo abrange
ainda uma revisão histórica sobre a reforma do sistema de saúde e as dificuldades na
descentralização do Programa de Controle da Hanseníase. Os autores concluíram que a
instabilidade da situação sócio econômica do país afeta o estado emocional dos doentes
contribuindo de forma negativa no curso da doença e na adesão ao tratamento. Por outro
lado, o desconhecimento em relação aos sinais precoce da doença por parte dos
profissionais de saúde proporciona uma alta proporção de diagnósticos equivocados
enquanto que a grande desinformação relatada pelos doentes em relação a sua doença
dificulta o tratamento. Em relação as intervenções do Programa de Controle da Hanseníase,
a política de saúde atual interfere nas ações planejadas com falta de pessoal especializado
no atendimento ao doente, alta rotatividade da mão de obra e a não prioridade do programa
em relação as epidemias e outras endemias locais.
LESSA (1986), focalizou seu estudo sobre o confronto entre o conhecimento científico,
empírico e teológico, os aspectos educativos do controle da hanseníase através dos tempos,
apresentando recomendações para integrar “Educação em Saúde” a “Programas de
Controle da Hanseníase”.
39
Tentamos apresentar neste capítulo introdutório alguns dos progressos na investigação e
terapêutica da hanseníase, mas, apesar disso, a doença ainda paga um alto preço social,
sendo essencial a pesquisa, em todos os seus aspectos, tendo em vista o seu controle
(Lechat,1988).
1.5 Justificativa
No presente estudo partimos de uma compreensão mais ampla na abordagem deste
problema de saúde pública. Utilizando os indicadores epidemiológicos e operacionais do
Programa de Controle da Hanseníase podemos delimitar um perfil da clientela de doentes
que chegam até a unidade de estudo, mas sentimos a necessidade de investigar a doença
pela percepção do doente e seus familiares por ser a hanseníase uma doença marcada pelo
estigma e preconceitos. Além disto, as medidas utilizadas para o seu controle, no passado,
muito contribuíram para perpetuar o medo e a discriminação.
O local escolhido para o estudo é o CISAM, um centro de treinamento na capacitação e
reciclagem nas ações de Controle do Programa de Hanseníase para os profissionais da rede
Estadual e Municipal de Pernambuco. No ano de 1997 contribuiu com quase 25% dos
diagnósticos do Estado e 36% dos casos diagnosticados no Municipio do Recife (SINAN/
DIEVS/ SS-PCR,1997).
Pretendemos conhecer o perfil epidemiológico e antropológico do doente de hanseníase
desta unidade de tratamento, analisando, mediante os indicadores epidemiológicos e
40
operacionais do Programa de Controle da Hanseníase em relação as ações desenvolvidas
pelo serviço e ainda, conhecer a representação social da hanseníase entre os doentes do
CISAM, para compreender o quanto o preconceito e a discriminação dificultam seu acesso
ao tratamento, possibilitando um redirecionamento das ações desenvolvidas pela unidade
de tratamento otimizando a assistência ao hanseniano.
41
II Objetivos
2.1 Objetivo Geral:
Conhecer o perfil epidemiológico e sócio cultural dos doentes portadores de hanseníase
diagnosticados e acompanhados em um serviço de saúde no Recife.
2.2 Objetivos Específicos
• Analisar o comportamento dos indicadores epidemiológicos e operacionais
construídos a partir dos casos novos diagnosticados no período de 1987-1997 no
CISAM.
42
• Descrever o perfil epidemiológico dos casos de hanseníase atendidos no CISAM,
segundo as variáveis: número de casos, sexo, idade, forma clínica, baciloscopia,
grau de incapacidade, grau de instrução e município de residência.
• Conhecer a representação da doença nos doentes portadores de hanseníase
matriculados e em tratamento no CISAM.
• Avaliar, a partir deste conhecimento, a adequação do conteúdo informativo
repassado pelo programa aos doentes de hanseníase do CISAM.
44
III METODOLOGIA
3.1 Unidade do Estudo: O CISAM
O Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros - CISAM, é uma unidade de ensino da
Universidade de Pernambuco- UPE, localizado no 20 Distrito de Saúde do Recife. É
composto pelo Centro de Saúde Amaury de Medeiros, pela Maternidade Prof. Monteiro de
Moraes e pelo Posto de Saúde no Alto do Pascoal
O CISAM oferece atendimento especializado em diversas áreas, o que justifica a
crescente demanda da sua clientela, que extrapola a dos bairros programáticos, sendo
composta principalmente do Recife e Região Metropolitana, além dos diversos
municípios do interior de Pernambuco. Destaca-se como centro de referência no
atendimento ao parto e puerpério de alto risco, assistência ao aborto previsto em Lei,
45
exames na área ginecológica e obstétrica, assistência ao climatério, esterilidade e
fertilidade, patologia clínica, tuberculose e hanseníase.
Possui como atividades docentes: Mestrado em Toco-ginecologia, Programa de Residência
Médica, práticas de estágios curriculares das Faculdades de Medicina, Enfermagem e
Odontologia, além de diversos cursos de capacitação para o pessoal da rede estadual e
municipal de saúde.
No Centro de Saúde do CISAM, funciona diariamente, no turno da manhã, o Ambulatório
de Dermatologia Sanitária.
O Ambulatório de Dermatologia Sanitária do CISAM
A equipe do Ambulatório de Dermatologia Sanitária do CISAM atualmente é composta por
05 médicas, 02 enfermeiras, 01 fisioterapeuta, 01 assistente social e 01 psicóloga que são
comuns aos serviços de hanseníase e de tuberculose. A equipe técnica/auxiliar é composta
por 01 técnico de laboratório, 05 auxiliares de enfermagem e 01 agente administrativo,
exclusivos do programa de hanseníase.
Com o intuito de contextualizar o presente trabalho na trajetória da saúde publica de
Pernambuco, tentou-se resgatar, dentro do possível, a memória do ambulatório de
Dermatologia do CISAM, através de pesquisa documental e entrevistas. Para a coleta de
informações da pesquisa documental foram levantados os dados pertinentes em livros de
registros antigos (1926 a 1987). Para a realização das entrevistas elegeu-se como
46
informante, o Sr. L.B.F., funcionário do setor , com 38 anos de atuação e compromisso
com os programas. O compilado dos dados secundários levantados e do conteúdo das
entrevistas, permitiu a reconstrução de alguns fatos históricos sobre o CISAM e a evolução
da terapêutica da hanseníase que serão apresentados no capítulo Resultados.
3.2 Material e Métodos
Para o estudo do perfil epidemiológico e sócio cultural dos doentes de hanseníase do
CISAM foram utilizados os recursos do método epidemiológico quantitativo, e do método
qualitativo, de cunho antropológico, para resgatar o conhecimento dos doentes sobre a
doença.
3.2.1 - Estudo Epidemiológico
3.2.1.1. Desenho do estudo
Para delinear o perfil epidemiologico dos casos de hanseníase diagnosticados no CISAM,
durante o período compreendido entre 1987 a 1997 realizou-se um estudo do tipo
descritivo a partir de dados secundários levantados na Diretoria de Epidemiologia e
Vigilância à Saúde (DIEVS) da Cidade do Recife.
Este tipo de estudo epidemiológico tem como objetivo descrever as características
demográficas e clínicas dos casos de hanseníase, em termos quantitativos (Pereira,1995).
47
3.2.1.2. Fonte de dados :
O banco de dados pesquisado contém informações das antigas fichas de notificação e do
atual sistema, o “Sistema de Informações de Agravos de Notificação” ou SINAN. É
composto de casos novos de hanseníase notificados em Pernambuco desde 1979 até o ano
de 1997, perfazendo um total de 25.967 registros. Para o presente estudo foi criado um
novo banco de dados contendo apenas as notificações ocorridas no CISAM no período de
1987 a 1997, que representou 4.242 registros dos 11 anos estudados.
3.2.1.3. População do estudo
Para o presente estudo consideramos somente os 4.242 casos novos de hanseníase
diagnosticados no CISAM e notificados a SES/PE durante o período de 1987 a 1997, de
residentes ou não no município do Recife.
3.2.1.4. Critérios de inclusão e exclusão
Para o estudo incluímos somente os casos novos de hanseníase diagnosticados no CISAM
no período de 1987 a 1997. Outras entradas, como recidiva ou transferência de unidade,
não foram analisadas.
48
3.2.1.5. Definição e categorização das variáveis do estudo:
Variável dependente
Caso novo de hanseníase diagnosticado no CISAM no período de 1987 a 1997,
residente ou não no município do Recife.
Variáveis independentes:
• Sexo: masculino e feminino
• Idade: categorizadas em grupos etários, utilizando a divisão adotada pelo Ministério
da Saúde e OMS, ou seja, de 0 a 14 anos e maior de 14 anos (Brasil, 1994 ; OMS,
1995).
• Grau de instrução: analfabeto, 10 grau, 20 grau e 30 grau
• Município de residência: Recife, Olinda e outros municípios de Pernambuco
• Modo de detecção categorizadas em:
• Encaminhamento - é quando o doente foi referido ao serviço para confirmação
diagnostica por outras unidades de saúde, outras instituições, consultórios médicos,
colaboradores voluntários, outros doentes, etc.
• Demanda espontânea - são os casos de apresentação voluntária à unidade sanitária
por queixa dermato-neurológica.
49
• Exame de coletividade- são os descobertos em áreas hiperendêmicas, a partir do
exame de pessoas pertencentes a grupos organizados da comunidade como: escolas,
fábricas, recrutas militares, empresas, etc.
• Exame de contatos – são os casos descobertos a partir do exame dermato-
neurológico realizado nos contatos intradomiciliares do caso índice.
• Outros modos - quando é detectado por outro método de detecção não incluído nos
anteriores, como por exemplo através da propaganda, folders, etc ( Brasil,1994)
• Forma clínica categorizadas em: indeterminada (I), turberculoide (T), dimorfa (D),
virchoviana(V) e não classificada (NC). Para estratificação das formas clínicas, foi
adotado o método de classificação de Madrid (Brasil,1994; Oliveira,1997;
OMS,1997).
• Classificação operacional: categorizadas em paucibacilar e multibacilar. O
agrupamento operacional das formas clínicas está de acordo com os critérios do
Programa de Controle da Hanseníase (Brasil,1994; Oliveira,1997; OMS,1997).
• Baciloscopia: positiva e negativa
• Grau de incapacidades categorizadas em: grau 0, grau I, grau II grau III e não
avaliados segundo os critérios do Programa de Controle da Hanseníase
(Brasil,1994; Oliveira,1997; OMS,1997).
50
3.2.1.6. Coleta e processamento dos dados
Além do Epinfo (versão 6) e Tabwin , utilizamos programas da Microsoft ,como o
ACCESS, para a análise e checagem de algumas variáveis, e o Word (versão 7) para a
confecção das tabelas e gráficos.
3.2.1.7. Análise dos Dados
Para a compor o perfil da clientela dos matriculados no Programa de Controle da
Hanseníase no CISAM, analisamos a distribuição de freqüência simples e percentual dos
casos novos de hanseníase ano a ano e sua características segundo as variáveis descritas na
metodologia.
Quando possível, os resultados eram apoiados em indicadores epidemiológicos e
operacionais: proporção de casos diagnosticado da forma T em relação aos casos D e V,
proporção dos casos novos que fizeram exame de baciloscopia e proporção dos casos
novos com resultado positivo da baciloscopia.
Para avaliar a amplitude das atividades de controle da hanseníase no CISAM, utilizamos o
indicador operacional “modo de detecção” e “percentagem de casos com deformidades
entre os casos novos”.
51
3.2.2 - Estudo Antropológico
Um estudo de representação social foi realizado com doentes de hanseníase matriculados
no ambulatório de dermatologia sanitária do Centro Integrado de Saúde Amaury de
Medeiros – CISAM.
Os informantes foram selecionados entre os doentes da rotina do serviço. Um dos
profissionais do ambulatório, que fazia a triagem dos doentes para os diversos profissionais
do setor, convidava para participar da pesquisa os doentes que atendiam aos seguintes
critérios: idade entre 15 e 75 anos e que estivessem da 3a dose de medicamentos em
diante.
A amostragem relativa ao número de participantes foi definida pelo próprio método:
“quando as informações coletadas começarem a ser repetitivas, pode-se considerar que o
imaginário do coletivo está representado” (Minayo , 1996).
Como representação social entendemos o conjunto de significados socialmente
compartilhados sobre determinado assunto. Trata-se de um conjunto de conceitos pêlos
quais os grupos sociais atribuem o sentido as coisas. Segundo Boltanski (1989). O doente
descontextualiza a informação médica e seleciona conteúdos significativos em termos de
categorias saúde/doença, do censo comum.
52
Entre os 30 doentes encaminhados, foram entrevistados 27, de um total de 800 doentes em
registro ativo no serviço. Antes da entrevista as pessoas eram novamente convidadas a
participar da pesquisa, quando explicávamos os objetivos da mesma e garantíamos o
anonimato das resposta. Das pessoas encaminhadas, 3 se recusaram a participar da
entrevista, justificando motivos como: afazeres domésticos, consultas com outros
profissionais etc. Todos os que recusaram a participar da pesquisa eram do sexo feminino.
Para a coleta de informações, sobre o conhecimento da doença, foram elaboradas
entrevistas semi - estruturadas utilizando-se de um micro gravador como instrumento para
o registro das mesmas. Antes de ligar o gravador fez-se necessário um diálogo inicial, com
conversas informais, para permitir a descontração do participante. Foram realizadas, em
média, 2 entrevistas por dia com duração aproximada de 40 minutos cada .
O roteiro para a condução das entrevistas contemplou os seguintes eixos temáticos:
• Percepções sobre a hanseníase (etiologia, transmissão, sinais e sintomas,
terapêutica e cura)
• Preconceito e aceitação da doença (impacto social, aparência, relações familiares)
3.2.1.1. Análise dos Dados
Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra. Para que não houvesse perda
na passagem do conteúdo para a forma escrita, mantivemos a linguagem o mais fiel
possível à maneira como os entrevistados se expressaram, mantendo inclusive, o tom
coloquial, os erros gramaticais e de concordância.
53
O material transcrito foi analisado logo após o término do trabalho de campo. Utilizamos a
categorização temática para a análise dos dados (Minayo,1996).
Os temas mais freqüentes nos relatos foram selecionados e agrupados de acordo com suas
características principais, construindo assim “Unidades Temáticas”. Foram escolhidas as
falas mais representativas dos temas selecionados e distribuídas nas unidades de análise
preenchendo os “Blocos Temáticos”, que foram assim analisados e interpretados com o
máximo de informação sobre o tema (Barbosa,1996).
55
IV RESULTADOS
4.1 O Ambulatório de Dermatologia Sanitária do CISAM - Pesquisa Documental.
Em 1950 foi inaugurado, no atual prédio do CISAM, o Ambulatório de Pneumologia
Sanitária, onde posteriormente, o programa de atendimento ao hanseniano foi instalado.
Este atendimento era realizado em outra Unidade do Estado e funcionou em diversos locais
antes de ser transferido para o CISAM. Inicialmente foi destinado ao Programa um
pequeno espaço do ambulatório de Pneumologia (02 salas), onde eram realizados os
atendimentos, entrega de medicação e arquivamento das fichas. Os prontuários eram
unicamente para o setor de hanseníase. Outra dependência ficou reservada para o
consultório médico e realização dos testes complementares ao diagnóstico como a reação
de Mitsuda, pilocarpina etc... A equipe era composta de 01 visitadora sanitária (comum aos
ambulatórios), uma atendente de enfermagem e um leprólogo.
56
Somente em 1986 o programa ampliou suas instalações físicas absorvendo gradativamente
a área destinada à Pneumologia. Ficando metade da área física dos ambulatórios para cada
unidade de atendimento. Estas modificações foram decorrentes da implementação, a nível
nacional, do programa de controle da endemia, que, juntamente com organizações
internacionais favoreceram a implantação de ações de controle antes não desenvolvidas.
Data também desta época a formação de uma equipe de trabalho multidisciplinar com a
perspectiva de um novo tratamento, a Poliquimioterapia (PQT). Posteriormente vieram
incorporar a equipe um profissional de Fisioterapia, um Assistente Social e um Enfermeiro,
além do aproveitamento e reciclagem do pessoal de nível administrativo do programa de
tuberculose que se encontrava em disponibilidade no momento em virtude da diminuição
de atividades no controle da tuberculose.
O novo esquema terapêutico, a poliquimioterapia, reduzia o tratamento das formas
transmissíveis de 10 para somente 2 anos, acrescidos de mais dois anos de vigilância
epidemiológica, o chamado EOSTQ (em observação sem tratamento quimioterápico). O
tratamento das formas não transmissíveis foi reduzido de 5 anos para 6 meses e igual
tempo de EOSTQ. Para a implementação deste novo esquema terapêutico, o arquivo do
setor deveria estar organizado.
Assim, em 1986, os funcionários do programa com o apoio de um técnico pago por uma
ONG Holandesa, iniciaram o cadastramento e registro de todos os prontuários existentes
no setor. Até então, as fichas eram arquivadas por ordem alfabética, não existiam números
de registro nos prontuários e muitos tinham datas anteriores à fundação do serviço no
57
CISAM. O primeiro registro data de 1926, observando-se que nesta época ainda se
realizava a internação obrigatória das formas transmissíveis da doença. O registro seguinte
ocorreu em 1930, com dois casos encaminhados para o Hospital Padre Manuel Venâncio,
em Paulista (conhecido como Hospital da Mirueira ). Até 1940 a média de registros era de
dois a três casos ao ano, crescendo gradativamente ano a ano, década a década, até o início
dos anos oitenta quando chega, em 1986, a mais de 100 casos novos notificados.
4.2 Resultados do Estudo Epidemiológico:
Tabela 1 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo o ano de notificação,
CISAM – 1987 a 1997.
Ano de notificação Casos novos de Hanseníase
n %
1987 121 2,9
1988 201 4,7
1989 211 5,0
1990 188 4,4
1991 348 8,2
1992 363 8,6
1993 423 10,0
1994 450 10,6
1995 658 15,5
1996 608 14,3
1997 671 15,8
Total 4242 100
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PC
58
Gráfico 1 : Percentual dos casos novos de hanseníase segundo o ano de notificação,
CISAM – 1987 a 1997.
Considerando-se o período do estudo de 1987 a 1997 como um todo, temos 4.242 casos
diagnosticados no CISAM. Observa-se que ao longo dos 11 anos da pesquisa houve um
crescimento contínuo no número de casos de hanseníase diagnosticados no CISAM.
Verifica-se que no início da série em 1987 foram diagnosticados 121 casos novos de
hanseníase (2,9%), e em 1997 foram 671 casos diagnosticados (15,8%) do total de casos
notificados no período. O número de casos novos diagnosticados quase que duplicou do
ano de 1987 para o ano de 1988 e do ano de 1990 para 1991 (tabela 1 e gráfico 1).
Em relação ao sexo, verifica-se que do total de 4242 casos novos registrados no período do
estudo, 1.939 são do sexo masculino (45,7%) e 2.303 do sexo feminino (53,2% ).
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997
Ano
%
59
Tabela 2 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo sexo,
CISAM – 1987 a 1997.
Sexo
Ano Masculino Feminino Total
n % n % de Casos
1987 57 52,9 64 47,1 121
1988 99 50,7 102 49,3 201
1989 105 50,2 106 49,8 211
1990 98 47,9 90 52,1 188
1991 174 50,0 174 50,0 348
1992 178 50,9 185 49,1 363
1993 192 54,6 231 45,4 423
1994 182 59,6 268 40,4 450
1995 281 57,3 377 42,7 658
1996 259 57,4 349 42,6 608
1997 314 53,2 357 46,8 671
Total 1939 53,2 2303 45,7 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR
Analisando o percentual de casos novos, a cada ano, por sexo, verifica-se um predomínio
do sexo feminino em todos os anos com exceção do ano de 1990, quando foi diagnosticado
mais homens (52,1%) que mulheres (47,9%) e do ano de 1991 quando houve distribuição
igualitária de casos entre os sexos ( tabela 2).
60
Tabela 3 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo grupo etário,
CISAM – 1987 a 1997.
Grupo etário
Ano 0 a 14 anos Maior de 14 anos Total n % n % de casos
1987 33 27,3 88 72,7 121
1988 35 17,7 166 82,6 201
1989 14 7,6 197 93,4 211
1990 45 23,9 143 76,1 188
1991 71 20,4 277 79,6 348
1992 74 20,4 289 79,6 363
1993 76 17,9 347 82,1 423
1994 84 18,7 366 81,3 450
1995 111 16,9 547 83,1 658
1996 117 19,3 491 80,7 608
1997 101 15,1 570 84,9 671
Total 761 17,9 3481 82,1 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR
Considerando-se o período de estudo como um todo, verifica-se a ocorrência de 761 casos
novos detectados na faixa etária de 0 a 14 anos, o que representa um percentual de 17,9%.
Observa-se uma grande oscilação da freqüência dos casos neste grupo de idade ao longo do
período estudado, verifica-se que o maior valor percentual ocorreu no 10 ano da série
(27,3%) e o menor em 1989(7,6%).
Durante o período do estudo foram diagnosticados 3.481 casos novos da faixa etária maior
de 14 anos, o que significa um percentual de 82,1%, o maior percentual de casos em
61
indivíduos nesta faixa etária ocorreu em 1989 (93,4%) e o menor em 1987 (72,7%)
(tabela 3).
Gráfico 2 : Percentual dos casos novos de hanseníase segundo sexo e grupo etário,
CISAM – 1987 a 1997.
χ2 = 20,34; g.l. = 1; p = 0,0000...
Considerando todos os casos do estudo e sua distribuição por faixa etária em relação ao
sexo, verifica-se que a maior concentração de casos na faixa etária de 0 a 14 anos pertence
ao sexo masculino (20,8%), enquanto na faixa etária maior de 14 anos o sexo feminino
prevalece (84,5%) (gráfico 2).
Analisando-se a distribuição dos casos segundo a variável grau de instrução, verifica-se
que dos 4 242 casos 2 575 (60,7%) doentes não tem informação sobre o grau de
instrução, impossibilitando assim uma análise consistente da distribuição de casos segundo
esta variável.
20,815,5
79,284,5
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
%
0 a 14 anos > 14 anos
Grupo etário
Masculino
Feminino
62
Tabela 4 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo município de
residência, CISAM – 1987 a 1997.
Município de residência Ano Recife Olinda Outros Total
n % n % n % de casos
1987 118 97,5 1 0,8 2 1,7 121
1988 185 92,0 8 4,0 8 4,0 201
1989 167 79,1 37 17,5 7 3,4 211
1990 168 89,4 17 9,0 3 1,6 188
1991 213 61,2 111 31,9 24 6,9 348
1992 231 63,6 88 24,3 44 12,1 363
1993 294 69,5 104 24,6 25 5,9 423
1994 294 65,3 122 27,1 34 7,6 450
1995 396 60,2 168 25,5 94 14,3 658
1996 352 57,9 171 28,1 85 14,0 608
1997 395 58,9 169 25,2 107 15,9 671
Total 2813 66,3 996 23,5 433 10,2 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR
Na análise referente ao município de residência, observa-se na tabela 5 que 2813 (66,3%)
doentes diagnosticados e acompanhados no CISAM são residentes no Recife, 996 (23,5%)
são residentes em Olinda e 433 (10,2%) residentes em outros municípios de Pernambuco.
63
Gráfico 3 : Percentual dos casos novos de hanseníase segundo município de
residência, CISAM – 1987 a 1997.
Ressalta-se que no início da série estudada a maioria dos casos diagnosticados no CISAM
eram residentes no Recife observa-se que a partir de 1991 crescem os percentuais de casos
residentes em outros municípios. Verifica-se que a partir de 1991 os indivíduos residentes
no município de Olinda passou a constituir um importante percentual da demanda do
CISAM, algo em torno de 25% ao longo dos anos (gráfico 3).
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997
Ano
%
Recife
Olinda
Outros
64
Tabela 5 : Distribuição dos casos novos de hanseníase segundo modo de detecção,
CISAM – 1987 a 1997.
MODO DE DETECÇÃO*
Ano Total
informado
Encaminhamento Demanda
espontânea
Exame
coletividade
Exame
Contato
Outros Total
de casos
n % n % n % n % n %
1987 35 1 0,8 26 21,5 - - 5 4,1 3 2,5 121
1988 59 - - 49 24,4 - - 6 3,0 4 2,0 201
1989 60 - - 53 25,1 - - 7 3,3 - - 211
1990 42 2 1,0 37 19,7 - - 3 1,6 - - 188
1991 191 - - 177 50,9 1 0,3 13 3,7 - - 348
1992 181 - - 164 45,1 3 0,8 7 2,0 7 2,0 363
1993 229 3 0,7 215 50,8 4 0,9 2 0,5 5 1,2 423
1994 221 1 0,2 212 47,1 - - 7 1,6 1 0,2 450
1995 654 405 61,6 103 15,7 1 0,2 121 18,4 24 3,6 658
1996 608 464 76,3 42 6,9 - - 90 14,8 8 1,3 608
1997 650 495 73,3 43 6,4 - - 97 14,5 15 2,2 671
Total 2930 1371 32,3 1121 26,4 9 0,21 358 8,4 67 1,6 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR *1.312 casos sem informação do modo de detecção.
Considerando o período estudado como um todo, observa-se que quanto ao modo de
detecção dos casos (tabela 9) 1371 casos (32,3%) chegaram ao CISAM por
encaminhamento, 1121 casos (26,4%) por demanda espontânea, 9 casos (0,21%) por
exame de coletividade, 358 casos (8,4%) por exame de contato e 67 casos (1,6%) por
outros modos. Em 1312 casos (30,9%) as informações não foram declaradas ou
preenchidas. Ao longo dos anos estudados verifica-se que o percentual de casos sem esta
informação só passou a diminuir a parti de 1995 (tabela 5).
65
Observa-se que de 1987 a 1994 o modo de detecção por encaminhamento correspondia a
menos de 2% dos casos, passando de 0,2% em 1994 para 61,6% em 1995, mantendo-se
em crescimento no restante do período.
A descoberta de casos por demanda espontânea consiste até 1994 no principal modo de
detecção dos casos novos (47,1%), diminuindo progressivamente até atingir em 1997,
6,4% dos casos. Foi importante entre 1991 e 1994 quando atingiu um percentual em torno
de 50%.
O exame de coletividade como modo de detecção nunca ultrapassou a 1% dos
diagnósticos.
O exame de contatos ou de comunicantes, como forma de detecção, apresentou um
crescimento significativo a partir de 1995, passando de uma média de 3,1% de 1987 até
1994, para uma média de 15,9% nos últimos três anos (95/96/97).
Como “outros modos” de detecção estão incluídos as campanhas de divulgação na TV,
rádio , jornal ou outro recurso de divulgação que ajudem na detecção dos casos. Sua
contribuição foi discreta, havendo períodos sem nenhuma referência a este meio de
detecção como nos anos de 1989 a 1991. Em 1995 observa-se o maior percentual
registrado nos 11 anos de estudo que corresponde a 24 doentes diagnosticados, ou 3,6% do
total.
66
Tabela 6 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e modo
de detecção. CISAM –1987 a 1997.
Modo de detecção Sexo
Masculino Feminino Total
n % n % n %
Encaminhamento 609 31,4 762 33,1 1371 32,3
Demanda espontânea 506 26,1 615 26,7 1121 26,5
Exame de coletividade 5 0,3 4 0,2 9 0,21
Exame de contato 157 8,1 201 8,7 358 8,4
Outros modos 38 1,9 29 1,3 67 1,6
Não informado 625 32,2 692 30,0 1316 31,0
Total 1939 100 2303 100 4242 100
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR χ2 = 6,80; g.l. = 5; p = 0,23566
Observa-se que ao estratificar por sexo os resultados da distribuição dos casos por modo de
detecção, verifica-se que os percentuais encontrados na distribuição de ambos os sexos
foram relativamente iguais aos percentuais gerais estudados para a variável “modo de
detecção (tabela 6). Em 1316 casos (30%) o modo de detecção não foi informado.
67
Tabela 7 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com a forma clínica,
CISAM – 1987 a 1997.
Forma Clinica
Ano I T D V NC Total
n % n % n % n % n % de casos
1987 34 28,1 45 37,2 8 6,6 34 28,1 - - 121
1988 64 31,8 63 31,4 46 22,9 28 13,9 - - 201
1989 48 22,7 82 38,9 53 25,1 28 13,3 - - 211
1990 31 16,5 65 34,6 66 35,1 25 13,3 1 0,5 188
1991 29 8,3 96 27,6 165 47,4 43 12,4 15 4,3 348
1992 49 13,5 125 34,4 137 37,8 52 14,3 - - 363
1993 51 12,1 151 35,7 165 39,0 56 13,2 - - 423
1994 30 6,7 223 49,6 128 28,4 69 15,3 - - 450
1995 70 10,7 366 55,6 141 21,4 81 12,3 - - 658
1996 56 9,2 330 54,3 157 25,8 65 10,7 - - 608
1997 52 7,8 374 55,7 156 23,2 89 13,3 - - 671
Total 514 12,1 1920 45,3 1222 28,8 570 13,4 16 0,4 4242
fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR
Os 4242 casos novos de hanseníase diagnosticados durante o período de estudo estão
assim distribuídos por formas clínicas: 1920 são da forma tuberculoide (45,3%), 1222
pertencem a forma dimorfa (28,8%), 570 da forma virchowiana (13,4%), 514 são da forma
indeterminada (12,1%) e 16 casos sem classificação clínica ( 0,4%) (tabela 7).
68
Gráfico 4 : Percentual de casos novos de hanseníase de acordo com a forma clínica,
cisam – 1987 a 1997.
Observa-se que de 1987 a 1993 o percentual de casos da forma tuberculoide situou-se
entre 27,6 e 38,9% dos casos. A partir de 1994 verifica-se um aumento de freqüência desta
forma clínica de hanseníase que representa cerca de 55% de todo os casos. Em 1997,
último ano da série 55,7% dos casos foram da forma tuberculoide (tabela 7).
Em relação a forma dimorfa seu percentual apresentava uma tendência de crescimento
durante os cinco primeiros anos da série após o que voltou a decrescer estabilizando-se em
pouco mais de 20% dos casos (gráfico 4).
Os casos da forma virchoviana, com exceção do ano de 1987 quando atingiu 28,1% do
total dos casos, vêm mantendo um percentual estável de diagnósticos em relação as outras
formas clínicas, oscilando entre 10,7 a 15,3% dos casos ao longo do período (gráfico 4).
0
10
20
30
40
50
60
70
1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997
Ano
%
I
T
D
V
NC
69
A forma clínica indeterminada apresentou uma redução gradual ao longo dos 11 anos
estudados. Atingiu o seu maior percentual entre as formas diagnosticadas, 31,8% em 1988
e em 1994 apresentou a menor freqüência em relação ao total dos casos (gráfico 4).
Tabela 8 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e forma
clínica, CISAM – 1987 a 1997.
Sexo
Forma clínica Masculino Feminino Total
n % n % n %
Indeterminada 203 10,5 311 13,5 514 12,2
Tuberculoide 677 34,9 1243 54,0 1920 45,3
Dimorfa 635 32,7 587 25,5 1222 28,8
Virchowiana 417 21,5 153 6,6 570 13,4
Não classificada 7 0,4 9 0,4 16 0,4
Total 1939 100 2303 100 4242 100
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR χ2 = 284,82; g.l. = 4; p = 0,0000...
Considerando todos os casos detectados no período do estudo e analisando a freqüência das
formas clínicas de hanseníase por sexo, verifica-se que houve um predomínio de casos das
formas paucibacilares entre as mulheres são: 311 casos da forma indeterminada (13,5%) e
1243 casos da forma tuberculoide (54,0%). Nas formas multibacilares o predomínio é do
sexo masculino apresentando 417 casos na forma virchoviana (21,5%) e na forma dimorfa
635 casos (32,7%) (tabela 8).
70
Tabela 9 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com a classificação
operacional em paucibacilar ou multibacilar, CISAM – 1987 a 1997.
Classificação Operacional
Ano Paucibacilar (I+T) Multibacilar (D+V+NC) Total
n % n % de Casos
1987 79 65,3 42 34,7 121
1988 127 63,2 74 36,8 201
1989 130 61,6 81 38,4 211
1990 96 51,1 92 48,9 188
1991 125 35,9 223 64,1 348
1992 174 47,9 189 52,1 363
1993 202 47,8 221 52,2 423
1994 253 56,2 197 43,8 450
1995 436 66,3 222 33,7 658
1996 386 63,5 222 36,5 608
1997 426 63,5 245 36,5 671
Total 2434 57,4 1808 42,6 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR
Quando os casos são agrupados de acordo com a classificação operacional em paucibacilar
e multibacilar, verifica-se que: 2.434 casos são paucibacilares (57%) e 1808 são
multibacilares (42,6%). Observamos que o grupo paucibacilar supera o grupo multibacilar
em termos percentuais na maioria dos anos do estudo. Somente no período de 1991 a 1993,
seus percentuais são ultrapassados pelos percentuais de casos multibacilares. Após o ano
1994 a freqüência dos casos paucibacilares torna a crescer atingindo maior percentual em
1995 (66,3%) (tabela 9).
71
Gráfico 5 : Percentual de casos novos de hanseníase de acordo com a classificação
operacional em paucibacilar ou multibacilar, CISAM – 1987 a 1997.
0
10
20
30
40
50
60
70
%
1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997
Ano
Paucibacilar
Multibacilar
72
Tabela 10 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o resultado da
baciloscopia, CISAM –1987 a 1997.
Total Baciloscopia
Ano informado Positiva Negativa Total
n % n % n % de casos
1987 96 79,4 96 79,4 12 9,9 121
1988 196 97,5 196 97,5 31 15,4 201
1989 176 83,4 176 83,4 28 13,3 211
1990 99 52,7 99 52,7 10 5,4 188
1991 116 33,3 116 33,3 34 9,8 348
1992 280 77,1 280 77,1 40 11,0 363
1993 249 58,9 249 58,9 27 6,4 423
1994 235 52,2 235 52,2 44 9,8 450
1995 607 92,3 607 92,3 190 28,9 658
1996 583 95,9 583 95,9 188 30,9 608
1997 622 92,7 622 92,7 191 28,5 671
Total 3259 76,8 3259 76,8 795 18,7 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR * 983 casos não realizaram baciloscopia para classificação e diagnóstico.
Em relação ao exame de baciloscopia observa-se que do universo de 4242 casos,
3259 casos realizaram baciloscopia para diagnóstico (76,8%), destes 795 (18,7%)
apresentaram resultado positivo, 2464 (58,1%) apresentaram resultados negativos e 983
(23,2%) casos não realizaram baciloscopia.
Ressaltamos que nos três últimos anos da série (1995/96/97) mas de 90% dos casos
contaram com o exame de baciloscopia para diagnostico e classificação da forma clínica
(tabela 10).
73
Tabela 11 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e
resultado da baciloscopia. CISAM – 1987 a 1997.
Sexo
Baciloscopia Masculino Feminino Total*
n % n % n %
Positiva 521 35,1 274 15,5 795 24,4
Negativa 964 64,9 1500 84,5 2464 75,6
Total 1485 100,0 1774 100,0 3259 100,0
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR *983 casos não realizaram exame de baciloscopia para diagnostico (23,0%). χ2 = 169,04; g.l. = 1; p = 0,0000...
O resultado do exame de baciloscopia quando pareado com a freqüência percentual entre
os sexos, ressalta a maior positividade dos exames entre o sexo masculino com 521(35,1%)
casos. No sexo feminino verifica-se 1.500 (84,5%) casos com o resultados de exames
negativos ( tabela 11).
74
Tabela 12 : Distribuição dos casos novos de hanseníase de acordo com a avaliação de
incapacidade, CISAM – 1987 a 1997.
GRAU DE INCAPACIDADE Total
Ano O I II III avaliado Total
n % n % n % n % N % de casos
1987 2 1,7 1 0,8 - - - - 3 2,5 121
1988 46 22,9 7 3,5 10 4,9 1 0,5 64 31,8 201
1989 67 31,9 11 5,2 14 6,6 2 0,9 94 44,5 211
1990 93 49,5 12 6,4 7 3,7 1 0,5 113 60,1 188
1991 187 53,7 16 4,6 5 1,5 1 0,3 209 60,1 348
1992 270 74,4 8 2,2 7 1,9 - - 285 78,5 363
1993 340 80,4 28 6,6 28 6,6 2 0,5 398 94,1 423
1994 403 89,6 24 5,3 19 4,2 1 0,2 447 99,3 450
1995 620 94,2 19 2,9 13 2,0 5 0,9 657 100 658
1996 571 94,0 13 2,1 13 2,1 2 0,3 599 98,5 608
1997 620 92,4 24 3,6 16 2,4 2 0,3 662 98,7 671
Total 3219 75,9 163 3,8 132 3,1 17 0,4 3531 83,2 4242
Fonte: SINAN/ DIEVS/ SS-PCR
Com referência ao grau de incapacidades na ocasião do diagnóstico, verifica-se que 3.531
doentes foram avaliados (83,2%). Destes, 3219 apresentavam “grau 0” (75,9%), 163
grau I (3,8%), 132 grau II (3,1%) e 17 grau III ( 0,4%). Observa-se que ao longo da série
estudada houve um aumento gradual da freqüência de avaliação de incapacidades para os
casos novos diagnosticados. A partir de 1993 mais de 90% dos casos foram avaliados a
cada ano ( tabela 12).
75
Gráfico 6 : Percentual de casos novos de hanseníase de acordo com o sexo e grau de
incapacidade, CISAM –1987 a 1997.
χ2 = 53,78; g.l. = 3; p = 0,0000...
Analisando-se a distribuição do grau de incapacidade com referencia a todos os casos
detectados no período do estudo em relação ao sexo, verifica-se que dos 1934 casos
avaliados no sexo feminino, 1824 (94,3%) tinham grau 0 de incapacidade, 58 (3,0%) casos
com grau I de incapacidade e menos de 3% com incapacidade instalada (grau II e III) . No
sexo masculino dos 1597 casos avaliados 1395 (87,4%) apresentavam grau 0 de
incapacidade, 105 (6,6%) casos com grau I de incapacidade e 97 (6%) casos com
incapacidade instalada (grau II e III) (gráfico 6).
0
10
20
30
40
50
60
70
80
90
%
Grau 0 Grau I Grau II Grau III
Grau de incapacidade
Masculino
Feminino
76
4.3-Resultados do Estudo Antropológico:
4.3.1- Características gerais da população estudada
Observamos que nas entrevistas com os 27 informantes, os homens, mais que as mulheres,
se ofereciam espontaneamente para participar das entrevistas (sexo masculino 66,7%, sexo
feminino 33,3%).
No quadro 1 vemos que a maioria dos doentes tinha idade entre 15 e 35 anos (63%),
constituindo uma população jovem e plena em atividades laborativas. Quanto ao local de
residência, em Recife encontramos a maior concentração dos pacientes (59,3%), mas
também uma fatia significativa de moradores em diversos outros Municípios (40,7%).
Paras as variáveis sócio-economicas Renda e Grau de Instrução, somente 3,7% não eram
alfabetizados e 48,2% dos entrevistados referiram ter o 10 grau incompleto, a maioria
portanto tinha algum grau de escolaridade. A renda familiar foi avaliada pelo referencial do
salário mínimo, e entre os que recebiam de 1 a menos de 3 salários mínimos foi onde
ocorreu a maior concentração de doentes (63%).
Quanto a situação clínica dos entrevistados, encontramos uma maior participação entre os
que apresentavam formas transmissíveis da doença (dimorfa 48,2%, virchowiana 40,7%),
consequentemente os resultados dos exames de baciloscopia positivo foram altos (70,4%).
77
Quadro 1 : Características dos doentes entrevistados no CISAM-1998
Características dos Entrevistados
Freqüência
Sexo N0 % Masculino 18 66,7 Feminino 9 33,3
Faixa Etária N0 % 15 ⇐ 35 17 63,0 35⇐ 55 3 11,1 55⇐ 75 7 25,9
Município de Residência N0 % Recife 16 59,3 Outros 11 40,7
Grau de Instrução N0 % Não alfabetizado 1 3,7
Alfabetizado 3 11,1 10 grau incompleto 13 48,2 10 grau completo 1 3,7
20 grau incompleto 2 7,4 20 grau completo 5 18,5
30 grau incompleto - - 30 grau completo 2 7,4
Renda N0 % - de 1 salário 3 11,1
1 ⇐ 3 salários 17 63,0 3 ⇐ 6 salários 2 7,4 6 ⇐ 10 salários 3 11,1 + de 10 salários 2 7,4 Forma clínica N0 % Indeterminada 1 3,7 Tuberculoide 2 7,4
Dimorfa 13 48,2 Virchowiana 11 40,7
Exame de Baciloscopia N0 % Positivo 19 70,4 Negativo 7 25,9
Não realizado 1 3,7 Grau de Incapacidade N0 %
Grau 0 17 63,0 Grau I 6 22,2 Grau II 4 14,8 Grau III - -
Não Avaliado - -
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Em relação as incapacidades, muitos apresentavam “grau zero” de incapacidade avaliada,
quer dizer, sem seqüelas ou deformidades aparentes, o restante da amostra ficou distribuída
em “grau I” (22,2%) e “grau II”(14,8%).
4.3.2 – Representações sobre a doença:
A percepção de estar doente/sinais e sintomas.
Quando solicitado aos entrevistados para que falassem de como haviam percebido a
doença geralmente respondiam que a identificação inicial dos sinais e sintomas foi feita por
ele próprio.
Assim sendo, a maioria dos sinais, sintomas e do “estar doente” citados pelos
entrevistados não foram associados pelo doente à hanseníase. Um doente referiu a
descoberta da doença após observar um folder informativo da hanseníase, contendo fotos
das lesões, afixados na parede da maternidade e farmácia da sua localidade. Outro informa
ter visto a propaganda na televisão mas achava sua dormência seqüela de antigo
traumatismo na perna .
“...Eu percebi uns caroços que saiu aqui..... e vi um papel na parede....Na maternidade e
na farmácia, ai eu passei lá e vi..... um amigo meu disse que eu tava com o mesmo
problema dele, ai eu fui atrás do serviço aqui em Recife, fui ao Oswaldo Cruz, peguei uma
ficha e fiz o exame....... Eu fiz um exame ai acusou essa doença......”(E.J.S, 32anos, sexo
masculino).
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“..apareceu nas televisões a propaganda né? O fogo...aquela parecendo com uma
impigem ....depois eu nunca me dei conta disso não, só dei conta depois das perna
dormente.....que eu com 10 anos levei um corte .....numa barra de ferro numa cadeira
enferrujada.......encima da veia, eu pensava que .....aí foi quando com 12, 13 anos eu fui
ficando dormente....... eu nunca procurei um médico...” ( A .J. N., 21 anos, sexo
masculino)
“Eu tava e não sabia.....porque eu não me toquei...eu vi o povo assim falar e eu nem ligava
,aqui o povo chama “hansemia”, lá no meu interior o povo chama a lepra...... Oxe! eu fui
lá na policlínica, na emergência e me deram uma pomada lá, lavei com sabão amarelo,
pensando que tinha sido cocô de cachorro, nada..... Poxa!” (M.J.N., 32 anos, sexo
feminino)
Na sua grande maioria os principais sinais percebidos pelos doentes foi a “dormência e
manchas no corpo”, outros referiram ainda a “bolhas, caroços e manchas”, um pequeno
número relatou ter sentido “dor nos nervos” e outros não lembravam de como surgiu a
doença, ou não quiseram responder, um único doente citou o “inchaço dos dedos” como
sinal (tabela13).
Apesar de “dormência e manchas no corpo” serem sinais caraterísticos da hanseníase e
estarem presente na maioria dos relatos, bem poucos associaram estes sinais a doença. A
maioria (74%) dos entrevistados justificava os sinais e sintomas a trabalho demais ou a
excessos.
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“.... primeiro eu senti sintomas pelo pé, eu não senti o pé...aí pensei.. sei lá... eu pensei que
fosse alguma coisa porque eu ando muito tempo calcada......porque um formigamento no
pé.... ai eu peguei fui no Oswaldo Cruz......”(M.A.B., 25 anos, sexo feminino)
“......eu passei praticamente um ano sentindo essa, essa... dormênciazinha só no dedo, era
só o dedo, como sou escrivão, eu não atinei pró detalhe, isso ai é uma coisa que eu vou
procurar logo um médico, eu não atinei!”(E.G.S., 38 anos , sexo masculino).
Outros associam os sinais à de outra doença, utilizando a automedicação, só procurando
o profissional de saúde quando, após várias tentativas, não conseguem solucionar o
problema :
“.......fiquei assim ....todo encalombado, todo encaroçado, mas eu não sabia, pensei que
fosse febre reumática, ai tomei Voltarem, aliviou, normalizou tudo, fiquei em repouso, os
pé inchou, fui botado pra fora...aí foi quando fui trabalhar em Campo Grande, aí foi
quando isso saiu, apareceu tudo novamente, aí ......eu vim”( A . J .N., 21 anos, sexo
masculino).
“....Realmente eu não sabia, apareceu as manchas, achava que era impinge, até comecei a
colocar aquele iodo, como a turma fala, limão, queimar pólvora, até isso eu fiz, mas
realmente não saiu, ai eu fui pro dermatologista, ai foi quando ele fez a biópsia, né.
E realmente foi detectado”(M.R.B., 29 anos, sexo masculino).
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Tabela 13 : Sinais e sintomas referidos pelos entrevistados na percepção da doença,
CISAM- 98
Sinais/sintomas n %
Mancha e dormência 17 63,0
Caroços/bolhas/manchas 5 18,5
Dor 2 7,4
Não lembra/Não sabe 2 7,4
Edema 1 3,7
Total 27 100,0
A busca pelo serviço medico:
Como geralmente os sinais inicias não são associados a doença, a procura pelo medico ou
serviço de saúde ocorre apos tentativas de solucionar o problema domesticamente, ou
quando existe alguma possibilidade de ser uma doença transmissivel
A descoberta da doença em alguns doentes foi feito pela sua genitora, e que na maioria das
vezes são as mães as responsáveis pela iniciativa de procurar ou não ajuda medica, como
nos relatos abaixo:
“...Foi em 96 ou 95, é que mãe foi dar um beliscão em mim e não doeu. Estava dormente
Foi 95 para 96, ai mainha me levou para um médico de pele, ai ela disse que poderia ser
hanseníase, ai eu vim pra cá, pra fazer o tratamento..” (B.L.C., 16 anos, sexo masculino)
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“.......Foi quando eu disse assim a mainha : “mainha tá dormente aqui”, ela disse: “O
menina tu estais doida e menina!”’.... Porque ela tava já por causa do meu tio,né. Aí ela
não ligou, aí eu também nem liguei...
“’Aí eu dizia : manhinha eu quero ir pro médico.... aí eu fui pro posto “’(C.D.S., 17 anos,
sexo feminino)
“.....É por causa da imprudência da gente, quer dizer teve um tempo que eu levei um corte,
eu não senti nada..... Ai minha mãe ficou muito preocupada, é hanseníase, é hanseníase!....
Agente ficou com preconceito, eu e meu pai, sem querer acreditar: É não, é não!.... Mas,
sendo que a mancha não progrediu não, ficou do mesmo tamanho....” (J. F. C., 21 anos,
sexo masculino)
O tempo médio da descoberta dos primeiros sinais até a procura pelo serviço de saúde,foi
de cerca de 2 anos. Nos relatos abaixo, vemos que a descoberta se deu na adolescência:
“Acho que eu tinha uns 14 anos...... minha mãe dizia: vá!.... apareceu umas manchas eu ....
eu me queimava e não sentia.... Ai apareceu uma mancha bem grande no solado dos
meus pés......ai minha mãe me encaminhou pra cá, e comecei o tratamento...’’ (A.A.N., 24
anos, sexo feminino)
“....Faz tempo isso, fazia..... eu tinha uns 13 anos, eu era meio morto..... eu beliscava muito
e não sentia nada, eu virava pra minha mãe pra levar ao médico e ela dizia: Não, é
besteira!.. E ai eu não cuidei não...” (J.A.S.,21 anos, sexo masculino)
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Motivos da escolha pelo CISAM
Como os motivos para a escolha do CISAM para seu tratamento muitos alegaram que
chegaram a unidade através de encaminhamentos médicos ou das informações de doentes
em tratamento, outros que preferiram o serviço pela resolutividade e qualidade do
atendimento como nos exemplos abaixo:
“...Ai ele me encaminhou pro posto X, só que não gostei do atendimento do posto X, ai fui
para outro, só que lá não tinha mais o tratamento, fui pra triagem e o dermatologista disse
que: Não só tinha o posto X, tinha próximo onde eu moro na Encruzilhada...”(M.M.A.S.,32
anos sexo feminino).
“...Lá só dá remédio! Lá não descobre se a pessoa tem, lá tem esse remédio, lá no posto
tem. Mas não faz esse teste da orelha, não faz. Por isso mesmo que eu vim logo pra cá, eu
já tinha vindo com a minha mãe pra cá uma vez, que eu sabia que aqui tratava. Eu mesmo
que pedi o encaminhamento pra cá...”(M.M.A.S., 24 anos sexo feminino).
Quando questionamos ao doente se ele tinha conhecimento de tratamento para hanseníase
no município de sua residência, obtivemos as respostas :
“....Eu sei, lá tem muita gente , aqui não tem problema, hoje mesmo o vereador lá me deu o
dinheiro da passagem R$ 10,00 sai de lá de 7...”(E.J.S.,32 anos, sexo masculino).
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“.....Eu prefiro vir pra cá. Eu prefiro aqui que o posto de lá. Porque marca a ficha hoje,
pra tal dia. Morre e lá não atende. E aqui é bom, qualquer hora que chegar, na hora
certinha, ou de 11 hora, de 11 e meio o pessoal atende, aqui é bom. Se chegar socorre.
Não fica parado morrendo. E cá não tem que chegar as quatro hora da manhã. Ai não
dá...”(A.M.S., 21 anos, sexo feminino).
Conhecimento sobre a hanseníase / lepra.
Quando solicitamos aos entrevistados que falassem sobre o que sabiam de sua doença,
geralmente falavam da “lepra”, das deformidades e mutilações. As observações neste
sentido foram freqüentes e muito carregadas de desesperança e medo:
“......O que eu sei, é que vai caindo os pedaços aos pouco, a pessoa fica fraco, não pega
muito peso........não posso pegar peso nesse braço aqui porque cansa logo,...... manchas,
aquelas bolas ,aparecendo verruga, tem também, e vai....... dor nos ossos.....”(J.A.S 21
anos, sexo masculino).
“.....lhe confesso que eu não sei de nada. Seio um pouco, sei que fica aleijado, deixa o cara
deformado....”(I.R.V., 30 anos, sexo masculino).
“ Se não cuidar vai aleijando a pessoa, foi o que aconteceu comigo....” (A .A .N., 24 anos
sexo feminino)
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“Cai orelha, né! Cai unha! Eu vejo o povo falar né. Que teve uma palestra aqui, o
chefe(enfermeiro) disse, que isso não faz medo a ninguém não, não faz medo... mas só que
ninguém que saber disso não!”(M.J.N., 32 anos, sexo feminino).
“Essa doença é terrível! Essa doença é triste, ela muda a cor das pessoas, cresce as
orelhas, cresce o pé, cai o pé, se a pessoa não cuidar na vida, fica aleijado, fica troncho,
cega de um olho.. é horrível essa doença ....”(M.L.C.F., 65 anos sexo feminino).
Mesmo entre os doentes com grau de instrução superior, que descrevera bem a etiologia e
até o nome do cientista que descobriu a doença, encontramos relatos sobre aleijões e perda
de partes do corpo:
“É um bacilo, conhecido por bacilo de Hansen, que foi a pessoa que descobriu..... que tem
vários estágios........ você pode ficar aleijado, perder parte do corpo, mas é um doença que
tem cura e é fácil de identificar, tem várias manchas. Branca, escura, tem aquela que
parece uma impinge e tem a forma tuberculóide assim....”( M.M.A S., 32 anos , sexo
feminino, pedagoga/professora)
Uma minoria comparou as realidades da hanseníase e da antiga lepra:
“...Eu sei que é uma doença antiga, que antigamente chamava-se lepra né,....... Mas de lá
pra cá apareceu modernismo .....as coisas melhorou mas então, há mais possibilidade de
cura se a pessoas se conscientizar-se que tem que ser feito...”(N.R.S., 69 anos, sexo
masculino)
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“Eu sei que o preconceito antigamente desde o tempo da bíblia, era uma coisa violenta,
aquele isolamento todo, e hoje mudou da água pro vinho né,!?.... Hoje o tratamento
inclusive é feito em casa, eu já li muito a respeito....”(R .A .V.,56 anos, sexo masculino)
“..... quando disseram bem assim : o nome dela agora é hanseníase, mas antes,
antigamente era lepra. Não é isso!? Aí quando eu disse assim: Lepra!!! Ai eu cheguei
falei pro meu pai, meu pai fez , é nada!..... Aí eu falei pra minha mãe e ela não acreditou,
porque tudo isso vai para o isolamento, como ela tava certa que ..... tinha que vim pro
isolamento..... ai eu disse: mas minha senhora, a senhora quer saber mais que a
doutora!..” (A. J. N.,21 anos, sexo masculino)
Transmissão/Agente Etiológico
Os doentes entrevistados tinham conhecimento sobre a contagiosidade da doença mas não
demostraram segurança quanto ao modo de transmissão o que gerava medo e insegurança
ao lidar com familiares e amigos. Muitos mencionaram o contato físico com o doente ou
suas secreções (fala, saliva, suor) como principal fonte de transmissão. :
“Pega né?! ...se não pegasse, eu não taria com isso.... Eu não sei nem por onde ela
começa........... Me deitar na cama de ninguém eu gosto. Eu gosto de ficar em pé. Eu sei
que transmite muita coisa por causa disso. Na fala, no falar...Tudo meu é separado, minha
roupa.......”(A.M.S., 21 anos , sexo feminino).
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“Mas eu tenho uma idéia mais ou menos, eu procuro evitar ao máximo o contágio,
principalmente com crianças, eu tenho dois netos que são muito pegados comigo.... eu
brinco tudo, mas tenho procurado evitar, porque, não é bom arriscar né,.... o que eu
puder fazer para ficar mais um pouco afastado...... eu acho mais conveniente,
principalmente com a criança que a defesa é mínima, muito frágil!” (R.A .V., 56 anos ,
sexo masculino)
O ambiente também foi citado como facilitador da transmissão e duas categorias distintas,
“ambientes fechados” e “ambientes de lazer”, foram citados como ambientes de risco:
“..A transmissão é feita pelo ar, se tá conversando num ambiente assim fechado e tal e
tem alguém doente, que tá e não sabe, transmite a doença pra pessoa...” (M.A.B., 25
anos, sexo masculino)
“Num sei...... sei não..... certamente porque eu andava bebendo, e por lá tinha muita gente
com mancha e eu achava que era besteira” (S.F.S., 25 anos, sexo masculino)
“.....eu não posso dizer que foi ela que botou essa doença em mim.... Ai eu tô incriminando
uma pessoa, não é isso?!....então é isso mesmo...porque sempre gostei de bar, gostei de
umas gafieiras....tá entendendo!” (J.O.S., 37 anos , sexo masculino)
“É o seguinte: Isso a pessoa quando pega é em qualquer lugar. Numa escola, num ônibus
cheio, sei lá. Eu acho que é por aí...... É você vai pra um jogo, você vai pra um cinema
e..... E que anda pelo mundo né........ É o seguinte: bem, que fique só em mim que não
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passe mais pra ninguém, que dizer o bom senso diz isso não é.....”(E.P.A., 50 anos, sexo
masculino).
Alguns associaram a transmissão da doença à manipulação do lixo, roupa suja e esgoto:
“.....Foi onde eu trabalhava, no lixo eu pegava muito material de maternidade, eu acho
que foi dali.....”(E.J.S, 32anos, sexo masculino).
“... Eu acho que é mais esgoto. Pisando no esgoto o cara que trabalha como é que se diz....
sem proteção...”(J.S.F., 25 anos, sexo masculino).
“...Tenho pra mim assim....que foi dentro da vala, os canteiro que tinha muita água suja
através do calo seco que eu tinha no tornozelo, não pude mais trabalhar de bota, eu metia
o pé na água suja, eu tenho pra min que foi por causa disso né ?” (A. J. N.,21 anos, sexo
masculino).
Um único entrevistado afirmou não haver contagiosidade:
“.....Não, não, isso não pega não! Pode pegar minha feiura (risos), pega não....” (J.F.A.,
60 anos, sexo masculino).
Apesar de terem recebido, anteriormente, informações sobre a sua doença, tanto na
ocasião do diagnóstico como através de palestras na sala de espera, alguns entrevistados
relataram dificuldade de compreensão do que foi explicado:
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“Sobre a transmissão apenas me dissero que parte por “bolha da saliva”.......eu também
tenho visto muito pouco referente a isso aí.... que as palestra que eu tenho visto até agora
são pouquíssima, e além do mais são bem resumidas né,... não dá nem pra gente sentir.....
os doentes as vezes é que fala alguma coisa,..... ”(N.R.S., 69 anos , sexo masculino)
“Ela explicou, mas eu não entendi nada. ......Ela tava falando mas eu não entendi nada do
que ela tava me futucando ali (o exame dermatoneurológico) ........... Explicou, explicou
mas eu não entendi o mísero de um raio.... Num sei não..... Certamente porque eu andava
bebendo, e por lá tinha muita gente com mancha e eu achava que era besteira.....”(S.F.S,
25 anos, sexo masculino).
A maioria dos informantes, quando questionados sobre o agente causador da doença,
emitiam as respostas mais diversas possíveis. Só 2 entrevistados responderam ser o bacilo
de Hansen o responsável pela doença. Outros referiram micróbios, vírus e bactérias como
agentes causais e a maioria atribuiu a outros fatores de ordem metafísica como “castigo de
Deus”, fatores ambientais como “ lixo/ poluição/ esgoto” e ainda fatores relacionados as
atividades laboriais como “lavar roupa suja” (tabela 14).
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Tabela 14 : Freqüência dos relatos sobre etiologia da hanseníase entre os
entrevistados no CISAM - 1998.
Causa n %
Bacilo de Hansen 2 7,4
Vírus/bactéria/micróbio 6 22,2
Castigo de Deus/Nascença 2 7,4
Lixo/Poluição/esgoto/sujeira 4 15,0
Não sabe 13 48,0
Total 27 100
Tratamento/ Efeitos colaterais/ Cura
Nos depoimentos sobre a terapêutica os remédios são citados pelo aspecto ou coloração dos
mesmos, como ‘o vermelho” o “branco”, e a quantidade diária, “2 ao dia”, “4 de uma só
vez”. Mesmo entre os doentes com maior grau de instrução o nome dos remédios não foi
referido. A obrigatoriedade da dosagem diária e o longo tempo de tratamento surgiu como
problema em diversos relatos:
“.....porque há muito tempo eu venho tomado remédio, mas também eu não ligava pra
nada , só queria tomar o remédio pra melhorar... e até agora nada! ......Quando ela trouxe
tomei 4 daqueles grandes, foi 2 marrom, 1 vermelho e 1 branquinho, aí ontem eu tomei
esse preto de noite e antes do jantar...”(J.O.S., 37 anos , sexo masculino)
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“Tratamento, uma parte é boa, outra é ruim....... Parte boa é que a gente fica melhor.... A
parte ruim é que demora muito tempo até o meu entendimento.... Jogar bola, fica difícil
pra correr porque sua muito, e a gente não pode beber....”(M.M.L., 18 anos , sexo
masculino)
“...Justamente pela quantidade de comprimido que é grande....... de comprimido, aquela
complicação!......... Eu comecei a me equivocar, no lugar de tomar um eu tomava o
outro....... ai na hora de tomar eu esquecia.....passava da hora....”(J.F.C., 21 anos, sexo
masculino)
Foi mencionada, como coadjuvante do tratamento, a adoção de dietas restritivas de
alimentos considerados “carregados” como crustáceos, carne de porco etc...A necessidade
de abstenção de bebidas alcóolicas também é bem relatada. O repouso e uso moderado do
“banho de sol” também foram citados como parte da terapêutica.
Um dos entrevistados comparou o tratamento atual com os realizados antigamente :
“....aquele isolamento todo e hoje mudou da água pro vinho né,!? Hoje o tratamento
inclusive é feito em casa, eu já li muito a respeito, aqui no Recife mesmo tem, quer dizer no
estado tem a Mirueira né, que é o leprosário, aonde todos os doentes eram recolhidos ali
como se fossem um bicho doente mesmo, sem solução, mas hoje eu acredito que evoluiu
muito a mentalidade e o tratamento tá muito mais perfeito né....”(R.A.V., 56 anos, sexo
masculino).
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O efeito colateral, atribuído à medicação, mais citado foi a cor do doente pois isto facilita
sua identificação pela comunidade e modifica a sua auto-imagem. Este efeito foi colocado
como algo difícil de enfrentar, principalmente para aqueles que sentem a necessidade de
esconder sua condição de doente:
“......Só vivem perguntando porque eu tô assim!... Ah! Por que eu tô com anemia....eu tô
tomando muito suco de beterraba, porque se eu disser ...eles vão estranhar né....”(M.J.N.
32 anos , sexo feminino)
“Eu escureci bastante. Um pouquinho, eu já era escuro, moreninho, mas eu fiquei mais
escuro. .................fica manchado na blusa, na camisa.... Pela pigmentação que o
comprimido saltava na pele..... Até mesmo para escurecer, para cobrir aquelas manchas,
tive que aceitar né. tenho....... sempre dizem, rapaz tu tais é queimado, tem ido à praia.
Confirmo.....”(M.R.B., 29 anos , sexo masculino)
A representação sobre o impacto e a cura da doença é influenciada pela história
estigmatizante sobre os atributos imputados aos leprosos :
“... eu sei lá ! a gente escuta muito zum, zum, zum que vai ficar bom, outros diz que não
fica... esse negócio no sangue depois que a coisa tá em evolução não melhora...” (M.J.N.,
32 anos, sexo feminino)
A cura pode, em alguns casos, estar fora dos limites de esforços do doente e associada à
condições macro-políticas, externas ao domínio do senso comum:
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“... mesmo que as pessoas façam os exames e dê tudo certinho, aquela pessoa tem alta,
mas com o tempo ela volta... isso é só uma questão de tempo mas se houvesse interesse se
chegava a uma cura total... existem interesses, como falam, máfia. Se você acaba com isso
vai ficar muita gente desempregada...” (E.P.A., 50 anos, sexo masculino )
Em outros casos a inexistência da cura é um fato inexorável e, como tal, atribuído a atos
banais:
“...sobre cura, eu acho difícil.! Que ainda não acharam cura para isto. Vejo gente que teve
alta e voltou porque comeu lagosta. Tá certo. Não tem cura, no começo pode recolher...”
(A.J.N. , 21 anos ,sexo masculino)
Mudanças de vida após o diagnostico/ Presença de incapacidades
Quando perguntamos sobre a atual condição do doente e se mudou algo na sua rotina de
vida além de ter que vir ao serviço pegar a medicação, obtivemos as mais diversas
respostas. Além da limitação física, existem limitações sociais como o medo da descoberta
da doença por outras pessoas:
“...A minha vida mudou muito, muitas coisas! Mudou o emprego, eu não posso mais
trabalhar .........porque eu não tenha leitura, não tenho como fazer. Eu trabalhei quase 20
anos só no serviço pesado. Agora eu não tenho como fazer.... ’’(J.O.S., 37anos,sexo
masculino)
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“Mudou! Sabe porque? Eu só vivo do jeito que estou aqui, de mangas compridas e de
calça compridas direto....... em casa e tudo. Porque minhas pernas todinha tem mancha, as
duas todinhas....... Não, eu me sinto péssima fisicamente também, e psicologicamente......
Porque o meu corpo mudou, eu era bem magrinha, e nem me olho no espelho, eu tenho
raiva de mim. É porque a pessoas era de um jeito e derrepente fica de outro né? Pra se
acostumar da trabalho” (M.M.A.S., 24 anos, sexo feminino).
“Mudou pra mal........ mudou pra mal.....Mudou a própria vida. Visita da família que não
tem......essas coisas..... já não tinha(......)Eu me sinto arrasado, eu me sinto
arrasado!...”(J.M.T., 70 anos, sexo masculino)
Nos depoimentos de alguns doentes com incapacidades instaladas o sentimento de dor
fisica e emocional está muito presente:
“.... antes eu andava muito, trabalhava, eu sinto falta do trabalho, dos meus amigos, hoje
em dia eu não posso, só em casa, a única coisa que eu posso fazer é limpar com a enxada
quando o mato tá grande......
........me sinto mau, uma dormença nos pés e uma dor........ agora mesmo das 3 da
madrugada pra cá é um sacrifício..... pé inchado....... tornozelo......” (A. J. N., 21 anos,
sexo masculino)
“.....não posso andar como eu andava antigamente, é que eu ando e embaixo (mostra o pé)
fica saindo sangue, antigamente era salmoura, agora parou, sabe?!
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......tá cicatrizando, mas quando eu ando muito ou quando eu vou fazer curativo ai a
mancha de sangue danada.....” (S.F.S., 25 anos, sexo masculino).
Um doente lamenta ter abandonado o tratamento e de só ter acreditado na doença após a
instalação da deformidade:
“.......porque eu queria ficar brincando com as minhas colegas, eu não pensava direito, eu
não tinha o pensamento voltado para me curar, pra mim não ia ser tão grave, ai eu parei o
tratamento, porque eu não quis tomar remédio...... atrofiou, antes disso eu não aceitava....
se não cuidar vai aleijando a pessoa, foi o que aconteceu comigo....” (A. A. N., 24 anos,
sexo feminino).
Outro não responsabiliza a hanseníase pelo ferimento do pé e lastima as limitações atuais:
“......não sei, não sei, sei que tenho esse problema aqui do pé, faz muito tempo, não posso
usar.... calçar sapato....se eu andar de sandália eu pioro.....
.........eles fica falando, eu não vou comprar picolé ele é doente , mas tem outros, que diz:
que nada é só se tratar, é só esse pé....” (J. O. S., 37 anos, sexo masculino).
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Preconceito
O preconceito e o não poder trabalhar representaram impedimentos sociais fortes para os
doentes e englobam rejeição no trabalho, em casa, na escola e tentativas de ocultar a
doença. É uma questão que preocupa a maioria dos entrevistados seja por experiência de
discriminações vividas, seja pelas restrições auto imputadas. A maioria dos informantes,
quando solicitados a falar sobre o preconceito, representa o impacto da doença sobre suas
vidas com revolta ou medo :
“...um amigo meu, que não suspeita que estou com hanseníase, um dia a gente tava
conversando e ele disse: se eu um dia pegasse hanseníase ou AIDS eu dava um tiro na
cabeça. Por aí você sente o grau de rejeição. A gente, depois que sabe da doença,
entende... (J.F.C., 21 anos, sexo masculino)
“....quando eu vou comer o pessoal diz: sai daí, você é doente, pega na gente....é para não
passar para os outros, é que tem criança aqui...” (J.O.S., 39 anos, sexo masculino)
Às vezes o desconhecimento ou não aceitação da doença acarreta uma instabilidade
emocional que gera crises, tensões e conflitos nas relações familiares e sociais:
“...o preconceito que eu sei, é por eu ser todo deformado, eu não era assim não ! Pra falar
a verdade, já pensei em me suicidar debaixo de um carro desses pra morrer logo, pra
parar de sofrer e acabar logo com isso....” (I.R.V., 30 anos, sexo masculino)
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“...eu tenho uns bisnetos que as vezes vão pra minha cama, aí eu digo: não quero ninguém
na minha cama !! A minha neta diz: oxente vó, a senhora mesmo tem preconceito... depois
que fiquei doente tudo meu é separado...”(R.M.S., 67 anos, sexo feminino)
98
V DISCUSSÃO
A presente investigação teve como população de estudo, indivíduos portadores de
hanseníase, diagnosticados e acompanhados no ambulatório do CISAM, composta por
residentes no município do Recife, Olinda e outras cidades do Estado, que procuraram o
serviço em anos diferentes. Isto significa que a população estudada engloba grupos sociais
de distintas procedências.
A estratégia metodológica adotada aliando o estudo quantitativo e qualitativo nos permitiu
abordar o conjunto de casos de hanseníase articulando as suas características
epidemiológicas com a representação que os doentes tem sobre a doença e /ou sobre o
serviço.
99
Os resultados encontrados na nossa unidade de estudo em relação ao número crescente de
casos novos a partir do ano de 1987, justifica-se em parte pelo crescimento da endemia em
algumas regiões do país, tais como o Sudeste e Nordeste onde se concentram o maior
número absoluto de doentes novos e antigos. Por outro lado a descoberta de novos casos
deve-se também a intensificação das atividades do Programa de Controle da Hanseníase.
No período de estudo foram implementados os treinamentos e capacitação de pessoal,
aumento da cobertura do Programa de Controle, descentralização das ações, divulgação
dos sinais e sintomas da doença pelos meios de comunicação melhorando as condições de
atendimento e diagnóstico (Albuquerque, 1987;Talhari & Neves, 1997; Ministério da
Saúde,1997).
Na pesquisa documental realizada no CISAM, observamos que o crescimento no número
de casos diagnosticados ocorreu a partir de meados da década de oitenta, coincidindo com
a formação de uma equipe multidisciplinar de trabalho, treinamentos e capacitações em
serviço para a perspectiva de um novo tratamento, a Poliquimioterapia.
Em relação à distribuição de casos novos de hanseníase por sexo, verificamos que houve
uma maior freqüência do sexo feminino nos onze anos estudados. Os relatos mais
freqüentes na literatura são que os homens são mais acometidos pela doença que as
mulheres (Rao, 1972; Fine, 1982; Irgens,1980).
Albuquerque (1987) analisando a tendência da endemia hansenica no municipio do Recife
de 1960 a 1985 encontrou diferença na distribuição de freqüência entre os sexos,
prevalecendo o feminino. Porém, quando a distribuição por sexo foi analisada com base
em coeficientes de detecção de casos, verificou que a média destes coeficientes para os 26
100
anos de estudos foi maior entre os homens que entre as mulheres. A autora enfatiza assim,
a importância do conhecimento da metodologia utilizada nos diversos trabalhos, para que
permita a comparação dos resultados.
Outros autores justificam que o maior número de casos encontrados no sexo masculino
podem estar relacionados com a maior movimentação e oportunidade de contatos dos
homens e o fato do exame clínico em mulheres ser menos cuidadoso. Consideram, ainda,
que nos locais onde estas diferenças de tratamento ou de ritmo de vida são iguais não existe
diferença nas taxas de detecções de casos por sexo. Atualmente reconhece-se que o risco de
exposição seria o fator responsável pelas diferenças encontradas, sendo necessário sempre
que possível uma análise da constituição demográfica e da organização social da população
do estudo (Albuquerque,1989; Andrade et alli, 1996b; Lombardi, & Gil Suarez,1997).
Observamos que no estudo qualitativo com os 27 informantes, os homens, mais que as
mulheres, se ofereciam espontaneamente para participar das entrevistas sendo também os
informantes mais fluentes e críticos. As mulheres alegaram falta de tempo, com desculpas
de ocupação com afazeres domésticos.
Nas entrevistas realizadas pudemos identificar que culturalmente o sexo feminino é
preparado para o papel de cuidar, tratar e medicar a família, suportando com mais
facilidade que os homens as adversidades relacionadas com doenças. É da mulher a tarefa
de conduzir ao serviço de saúde os seus familiares, estando portanto mais informada e
disponível ao diagnóstico. Os homens geralmente são levados pelas mulheres aos serviços
de saúde e são mais temerosos em relação a enfermidade, invalidez ou morte, têm menos
101
contato com os serviços de saúde pelo fato de assumirem a participação econômica mais
representativa na família.
Quando analisamos a distribuição dos casos de hanseníase por sexo e faixa etária,
observamos que o sexo masculino apresentou um percentual maior de casos do que o sexo
feminino na faixa etária de 0 a 14 anos, diferente do encontrado nas faixas etárias maiores
de 15 anos, onde houve predomínio do sexo feminino. Este achado indica maior exposição
ao risco de adoecimento nos homens nesta faixa etária, e nas entrevistas, foi relacionado a
diversidade de atividades inerentes ao sexo. Os meninos ficariam mais expostos ao
ambiente nas atividades externas, laborativas ou de recreação, enquanto as meninas
comumente dividem tarefas domésticas. Um outro fator mencionado foi quanto à
exposição da pele no sexo masculino que facilitaria a descoberta precoce das lesões pela
família.
A presença da doença em menores de 15 anos é utilizada como indicador do nível de
transmissão, quanto mais precoce e intensa a transmissão, maior será o número de crianças
doentes. Em áreas com altos níveis de endemicidade existe um risco maior de adquirir a
infecção em idades precoces e quando este risco diminui, constata-se um deslocamento de
faixa etária dos infectados para grupos mais velhos (Andrade et alli, 1996; Lombardi &
Gil Suarez,1997).
No CISAM o comportamento da endemia em relação a faixa etária menor de 15 anos
demonstra uma oscilação de valores anuais, mas apresenta em relação ao ano de 1987, um
102
decréscimo anual com uma média de 17,9% dos diagnósticos nesta faixa etária, apontando
para uma diminuição do risco de adoecimento pela população menor de 15 anos.
No estudo qualitativo, em relação a descoberta de casos em menores de 15 anos,
encontramos nos relatos sobre “a busca pelo serviço de saúde”, a importância do papel da
“mãe” na identificação precoce das doenças. Sua influência é determinante no que diz
respeito ao acesso ao serviço de saúde pois a sua informação sobre o que é importante ou
não, é que vai determinar o encaminhamento do menor. Nos depoimentos dos doentes os
primeiros sinais da doença foram percebidos entre 13 e 14 anos mas a procura ao médico
só ocorreu 6 a 8 anos mais tarde por desvalorização da informação por parte das genitoras.
Esse achado reveste-se de importância para o planejamento de campanhas educativas sobre
a hanseníase que devem ter as “mães” como alvo, isto é capacitando-as a identificarem
lesões suspeitas em seus filhos.
Em relação ao município de residência do caso novo, observamos que inicialmente quase
todos os pacientes do CISAM eram residentes no Recife (97,5% em 1987), estes
percentuais decresceram gradativamente em relação aos dos outros municípios,
especialmente Olinda, que chegou a apresentar 31,9% dos doentes matriculados no
ambulatório em 1991.
No período deste estudo, de 1987 a 1997, o Programa de Controle da Hanseníase em
Olinda estava implantado e funcionando em duas unidades de saúde no município. Mesmo
assim, os percentuais de casos diagnosticados no CISAM para residentes em Olinda foi de
23,5% do total de casos.
103
O fato do CISAM ter se destacado como centro de treinamento em hanseníase para
diversos profissionais de unidades de saúde do Recife, Região Metropolitana e diversos
municípios do interior do Estado de Pernambuco, deve ter contribuído não apenas para
aumentar a eficácia do diagnóstico, mas também para estabelecer o seu papel de Centro de
Referência para profissionais que trabalham em unidades de saúde de outros municípios
porem encaminham o individuo suspeito para ser avaliado no CISAM. Possivelmente este
papel de “Centro de Referência” deve ter influênciado para o aumento do modo de
detecção por encaminhamento (32,3% casos). Nas falas dos informantes identificamos
outros pontos como facilidade de acesso ao CISAM propiciado pelo anel viário e maior
resolutividade no atendimento ao doente de hanseníase pelo serviço. Outro aspecto que
deve ser levado em consideração foi a declaração que do tratamento à distancia livra-os da
estigmatização no contexto social em que vivem.
Nos relatos encontramos, ainda, que a maioria dos doentes preferira o atendimento em
unidades em que possam resolver todos os seus problemas de saúde e onde não precisem se
deslocar para realização de exames complementares como por exemplo a baciloscopia.
Sentem-se mais seguros em unidades que possuam outras clínicas, atendimento médico
diário, curativo etc. Possivelmente todos esses fatores devem ter contribuído para o
aumento de casos de hanseníase diagnosticados residentes em outros municípios.
Quando questionados sobre o motivo de ter escolhido o CISAM para o diagnóstico, os
entrevistados informaram que foram encaminhados por profissionais de saúde para
esclarecimento das suas suspeitas ou às dos seus familiares. Muitos chegam ao
104
Ambulatório de Dermatologia Sanitária do CISAM sem saberem da suspeita diagnóstica
do médico e trazem encaminhamentos por escrito, com as siglas “MH”. Só após a palestra
e o atendimento no ambulatório, é que tomam conhecimento do provável diagnóstico de
hanseníase.
Em relação ao modo de detecção dos 4.242 casos do estudo, a maioria foi encaminhada ao
serviço (32,3%), seguida pela demanda espontânea (26,4%), exame de contato (8,4%),
outros modos (1,6%) e exame de coletividade (0,21%). Em 31,0% do total dos casos o
modo de detecção, não foi informado e o número de informações não preenchidas foi
decrescendo anualmente a partir de 1991. Houve um aumento do percentual de
informações preenchidas em quase 50% no ano de 1994. Possivelmente decorrente da
melhoria do serviço e do sistema de informação através dos treinamentos e valorização do
preenchimento completo da ficha de notificação.
O aumento dos percentuais do modo de detecção por encaminhamento, ao longo dos anos
no estudo aponta também para um maior conhecimento dos profissionais no diagnóstico da
doença. A demanda espontânea apresentou uma diminuição percentual nos últimos cinco
anos. Em 1993 os casos detectados por demanda espontânea eram de 50,8% e no ano de
1997 o percentual deste modo detecção passou para 6,4%. Estes dados sugerem um maior
desconhecimento da população acerca dos sinais e sintomas da hanseníase.
Observamos ainda que a partir do ano de 1995 o percentual de detecção por exame de
contato aumentou tendo uma maior participação no total dos diagnósticos. No ano de 1994,
1,6% dos casos foram detectados por exame de contato passando, no ano de 1995, para
105
18,4% do total de casos detectados. Este fato sugere uma melhora na qualidade do
atendimento do doente de hanseníase e sua família.
Analisando globalmente o conteúdo das entrevistas percebemos que o conhecimento dos
doentes sobre a doença é uma construção culturalmente e socialmente elaboradas. O
indivíduo se apropria de conteúdos compartilhados nas conversas do cotidiano, nas
informações da mídia e nos contatos com os profissionais de saúde. A parti dai, organiza a
informação de acordo com os seus interesses e necessidades pessoais.
De uma maneira geral, doença só é percebida como tal quando há uma incapacitação do
desempenho social, especialmente a capacidade de trabalhar (Queiroz, 1993). Os
entrevistados apesar de identificarem inicialmente os sinais e sintomas da doença fazem
pouca associação com a hanseníase, mesmo na presença dos sintomas mais caraterísticos
para a medicina oficial como a “dormência e manchas”. Os relatos indicam que,
inicialmente, sinais e sintomas são confundidos com excessos trabalho ou indicação de
outra doença, utilizam inicialmente a automedicação só procurando o profissional de
saúde quando, após várias tentativas, não conseguem solucionar o problema.
Quanto ao conhecimento sobre os modos de contágio da hanseníase, muitos informaram
que não suspeitavam estar doentes e não sabiam como e nem onde contraíram a doença.
Este desconhecimento dificulta o diagnóstico precoce da doença. Apesar de alguns doentes
terem assistido a propaganda sobre a doença na televisão não associaram aquela
informação com os sinais que apresentavam. Um único doente identificou a sua forma
clínica pelo cartaz que mostrava as principais lesões da doença.
106
Quanto as formas clínicas, a forma tuberculóide foi a mais freqüentemente encontrada
entre os casos novos descobertos no CISAM no período de 1987 a 1997. Seguiram-se, por
ordem de freqüência, as formas dimorfa, virchowiana e indeterminada.
A ocorrência de 45,3 % da forma tuberculóide em relação aos casos virchoviano, dimorfo e
indeterminado é um indicador determinante de tendência, quanto mais alta a endemia,
maior esta proporção apontando para o acometimento de indivíduos imunologicamente
competentes. O predomínio de casos na forma tuberculóide está relacionado ao nível de
endemicidade da hanseníase e o que dificulta a análise deste indicador é a dificuldade de
padronização das classificações clínicas da hanseníase, apesar das normatizações existentes
no Programa de Controle da Hanseníase (Andrade et alli, 1996; SSE-PE, 1996)
O aumento do número de casos observados na forma dimorfa, principalmente no período
de 1990 a 1993, pode ser atribuído ao aumento geral de casos detectados da doença ou a
mudança dos métodos e critérios de classificação. Observamos que neste mesmo período
ocorreu um acréscimo no percentual de “exames de baciloscopia não realizados”. O valor
encontrado em 1989 é praticamente triplicado no ano de 1990, e em 1991 o maior
percentual de exames não realizados (66,7%) coincide com a maior elevação de
diagnósticos da forma dimorfa. Estes fatores corroboram a idéia da classificação ter se
baseado unicamente em critérios clínicos quando havia dúvidas no diagnóstico. Nestas
situações a recomendação, para que não ocorram falhas no tratamento por erro de
classificação, é que o doente deve ser classificado como multibacilar (Brasil, 1994;
O.M.S., 1995;O.M.S., 1997).
107
Na forma virchoviana, o percentual de casos diagnosticados no ano de 1988 sofreu uma
redução de 50% em relação a 1987, havendo um acréscimo simultâneo na forma dimorfa.
Consideramos que não foi a diminuição nos diagnósticos desta forma clínica, mas as
mudanças nos critérios de classificação das mesmas que alteraram este percentual. Nos
outros anos, o estudo apresentou poucas alterações nos percentuais de detecção variando
em média de 13%.
O aumento dos coeficientes de detecção da forma indeterminada significa uma melhoria
nas ações de busca e controle da doença sendo um indicador bastante utilizado para medir
a precocidade da detecção dos casos com menores riscos de seqüelas (Brasil, 1994 ;
Andrade et alli, 1996). A dificuldade do diagnóstico nas formas oligo/assintomáticas pelos
profissionais e a pouca associação dos sinais iniciais da doença pelos doentes contribuem
no diagnóstico tardio da hanseníase (Jopling, & McDougall, 1991; Munhoz-Jr, 1997).
No CISAM, encontramos uma redução no percentual de casos da forma indeterminada
significando uma diminuição da frequência de diagnóstico na fase inicial da doença.
Observa-se, após 1989 verificou-se uma diminuição do percentual de diagnósticos nas
formas iniciais indicando a possibilidade de que a alteração dos critérios de classificação
das formas clínicas, após o novo tratamento, tenha influênciado na mudança destes
percentuais. Em conseqüência do aumento da demanda na unidade, talvez tenham surgido
dificuldades na execução de atividades no controle e busca de doentes. A análise do modo
de detecção dos casos demonstra que apesar de um número de informações não
preenchidas, o total de diagnósticos por exame de contato e exame de coletividade não
108
chega a 10%, sendo a grande maioria dos doentes absorvidos pelo serviço seja por
demanda espontânea ou encaminhamento de outros profissionais.
No imaginário popular a doença ainda está muito ligada ao nome “lepra” “leproso” e os
sinais reconhecidos pela população são as deformidades e perdas de membros. O doente
de hanseníase atribui à lepra severo grau de morbidade não reconhecendo os sinais inicias
codificados pelo saber médico oficial como expressão de enfermidade.
Houve predomínio das formas iniciais e tuberculóide no sexo feminino e das formas
dimorfas e virchowiana no sexo masculino. É sugerido, por alguns autores, a interferência
de fatores hormonais ou de natureza genética na suscetibilidade da doença entre os sexos
(Newell,1966; Beiguelman et alli,1968).
Com a implantação da poliquimioterapia em todo território nacional a Coordenação
Nacional de Dermatologia Sanitária (CNDS) elaborou um guia contendo as normas
técnicas e procedimentos para a utilização desses esquemas e a classificação dos doentes,
valorizando os critérios clínicos e bacteriológico na alocação do caso no grupo paucibacilar
ou multibacilar e na determinação da forma clínica (Brasil, 1994 ;O.M.S., 1995; Andrade
et al., 1996).
Em termos percentuais as formas paucibacilares se apresentaram em maior número que as
formas multibacilares. Analisando ano a ano, no período de 1991 a 1993 ocorreu um maior
número de casos multibacilares, provavelmente influenciado pelos fatores anteriormente
discutidos em relação a classificação das formas clínicas.
109
A tendência natural da hanseníase é que se mantenha em números constantes de doentes. O
aumento na detecção de casos de hanseníase pode ocorrer quando existe o recrudecimento
da endemia ou por maior procura de casos quando há melhoria nas ações de controle do
programa, ocasionando um aumento inicial das formas paucibacilares em decorrência do
seu período de incubação ser menor que as formas multibacilares. Em comunidades onde a
hanseníase está diminuindo, a percentagem de formas multibacilares está aumentando e
como o período de incubação das formas multibacilares é mais longo, aumenta também a
idade em que as pessoas se infectam (Lombardi & Gil Suarez,1997)
O exame de baciloscopia ajuda na elucidação do caso clínico e classificação nos grupos
paucibacilares ou multibacilares. Idealmente, todos os pacientes devem fazer o exame
baciloscópio antes de iniciar a poliquimioterapia com o objetivo de evitar que os doentes
sejam tratados de forma inadequada (Brasil,1994; O.M. S,1995).
No CISAM, em relação ao exame de baciloscopia, encontramos que 23,2% dos pacientes
não realizaram baciloscopia para diagnóstico. Observando ano a ano os resultados dos
exames podemos constatar a alteração na dinâmica de toda a classificação das formas
clínicas no período de 1990 a 1994 e principalmente no ano de 1991 onde o percentual de
exames não realizados chegou a 66,7% do total.
A OMS recomenda que na ausência do exame de baciloscopia no serviço ou a falta de
confiança nos seus resultados, a classificação com vistas ao tratamento, deve se basear no
número de lesões de pele e nos nervos comprometidos para agrupar os doentes em
110
multibacilar ou paucibacilar. Na dúvida diagnóstica o doente será tratado como
multibacilar (Brasil,1994; O.M.S,1995). Consideramos que esta conduta possa justificar o
aumento de casos multibacilares neste mesmo período no ambulatório do CISAM.
O saber do senso comum não incorpora a concepção de agente etiológico e transmissão da
doença do modelo médico vigente. A maioria dos entrevistados (48%) não sabia o que
provocava a sua doença embora estivessem em tratamento e tivessem participado das
palestras na sala de espera. Outros doentes associaram a doença a causas metafísicas como
castigo e maldições. Mesmo entre os doentes que atribuíram causalidade à presença de
vírus, bactéria ou germe, não demostraram segurança quanto ao modo de transmissão o que
gerava medo e insegurança ao lidar com familiares e amigos.
O indicador operacional “Percentagem de casos novos detectados cujo o grau de
incapacidade foi avaliado no ano” é utilizado para mensurar a qualidade de atendimento
do serviço, cujos os parâmetros são: precário (menor que 75%), regular ( de 75% até menor
de 90%) e bom ( maior ou igual a 90%) (Brasil,1994; O.M. S,1995). Na avaliação de
incapacidades ano a ano, o período entre 1987 a 1992 foi considerado precário, com
valores em crescimento. No ano de 1992 passa ao critério regular e de 1993 a 1997 mantêm
conceito bom. No geral, nos onze anos do estudo o conceito foi regular.
A explicação para a evolução destes critérios pode estar na estruturação da equipe e
treinamento dos profissionais responsáveis pela avaliação das incapacidades, pois ao longo
dos onze anos os percentuais de “não avaliados” foram decrescendo.
111
A presença de incapacidade no momento do diagnóstico pode indicar diagnóstico tardio da
doença e conseqüente controle ineficaz, já que as incapacidades só se desenvolvem mais
tardiamente (Costa & Patrus,1992; Roquete et al., 1997).
Utilizamos como critério para medir a eficácia das atividades na detecção precoce dos
casos, o indicador epidemiológico “Percentagem de casos com deformidades entre os casos
novos detectados no ano”, com parâmetros: alto (maior ou igual a 20%), médio ( de 10 a
20%) e baixo ( menor que 10%). Ressaltamos que, para “deformidade instalada’’ só foram
considerados os pacientes que apresentaram dano ou deformidade visível ou seja grau II/III
(Brasil,1994; O.M.S,1995).
A soma dos percentuais dos graus II e III no total de casos do estudo não ultrapassou os
10%, sendo considerado um bom indicador para a precocidade na detecção dos casos e
ações de controle são eficazes.
Na literatura, uma alta frequencia de casos detectados com grau de incapacidade igual a 0,
é atribuído ao diagnóstico precoce da doença, tratamento quimioterápico específico e
acompanhamento adequado para prevenir a instalação de incapacidade. Há também a
suposição de falha na avaliação da incapacidade (Roquete et alii, 1997)
Entre os doentes entrevistados e com incapacidade o sentimento que prevalece é de
impotência frente a uma doença com “aspectos misteriosos” ou ainda não codificados pelo
grupo e que pode modificar toda sua estrutura de vida. Além da limitação física, existem
sansões sociais impostas pelo preconceito ante a descoberta da doença. As seqüelas deixam
112
marcas físicas e psicológicas profundas, modulando e perpetuando o estigma e o doente,
mesmo após alta clínica, permanecerá identificado como um doente de hanseníase.
A representação sobre o prognóstico da doença através do tratamento é expressada de
forma otimista embora tenhamos que considerar, como viés, o fato de que todos os
pacientes entrevistados eram vinculados ao serviço. Por outro lado, percebemos que o
doente, por não haver se apropriado do saber médico oficial sobre a hanseníase, apresenta
uma construção cultural mistificada sobre a doença, onde medo e preconceito se mesclam à
deformidades e degenerações físicas. O temor à doença aliado à expectativa do sofrimento
com a discriminação, é uma constante no imaginário popular e se constitui num entrave à
procura do cuidado médico que, em geral, só é efetivado quando o doente chega ao limite
dos seus temores e entende que algo de “muito grave” está acontecendo com seu corpo .
Os entrevistados, embora otimistas em relação ao prognóstico da doença não compreendem
o tratamento, o que gera, uma condição de impotência pessoal no sentido de reverter a
situação. O diagnóstico médico provoca um forte impacto, desequilibra emocionalmente o
doente e geralmente é o ponto de partida para procedimentos auto estigmatizantes. Quanto
às perspectivas de cura, os doentes afirmaram que devem seguir à risca o tratamento,
mesmo sem entender a sua “utilidade”. Transtornos como a pigmentação da pele e o mal
estar provocado pelo coquetel medicamentoso são frequentementes citados e aceitos sem
maiores questionamentos como mais um elemento do imaginário popular da doença,
apontando para uma visão conformista e de submissão ao poder da medicina.
113
As mudanças de vida, após o diagnóstico, incluem limitações sociais de toda ordem, como
perda e dificuldade de encontrar trabalho, isolamento familiar e distúrbios psicológicos. O
doente, segregado pela sociedade e pela família, vê rompido bruscamente, seus vínculos
sociais e afetivos, e esta experiência negativa e subjetiva do adoecer não é contemplada, em
nenhum momento, pelos serviços.
Consideramos que os serviços de saúde deveriam estar atentos a estes fatores, orientando,
esclarecendo e apoiando o paciente se realmente almejam maior efetividade nas suas ações.
O hanseniano deveria ser abordado, pelos profissionais de saúde, por meio de uma conduta
ética e humana onde lhes fosse permitido extravasar suas emoções e preocupações. As
crises familiares, os rompimentos afetivos, as modificações das relações de trabalho e as
mudanças no desempenho produtivo do indivíduo, são gerados pela instabilidade
emocional que a doença provoca. Os serviços deveriam promover ações de educação para a
saúde direcionadas também à família dos pacientes, investindo na prevenção da doença,
otimizando seu controle e, em última instância, proporcionando uma melhoria na qualidade
de vida do portador de hanseníase.
115
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124
ANEXO I
FICHA DE CADASTRO DO ENTREVISTADO ( dados do prontuário/SINAN )
1-IDENTIFICAÇÃO :
N 0 de ordem na pesquisa: ____________ Matricula: _______________________
Nome:___________________________________________________________
Endereço:________________________________________________________
Bairro:______________________Município_____________Distrito:_________
Idade: ___anos ; Sexo: ∼ masculino, ∼ feminino.
Profissão: ________________________ Renda:___________________
Grau de instrução: ∼ Não alfabetizado; ∼ 10 Grau ( ∼ completo, ∼ incompleto)
∼ Alfabetizado; ∼ 20 Grau ( ∼ completo, ∼ incompleto)
∼ Não se aplica ∼ 30 Grau ( ∼ completo, ∼ incompleto)
Tipo de Consulta:
∼ 10 consulta ∼ Tratamento de seqüelas. ∼ Outros
∼ Alta ∼ Subseqüente / Número de doses: _____
Modo de Detecção: ∼ Encaminhamento ∼ Exame de Contato
∼ Demanda espontânea ∼ Outro modo/___________________
∼ Exame de coletividade
Forma clinica:
∼ Indeterminada ∼ Dimorfa ∼ Não Classificada
∼ Tuberculoide ∼ Virchowiana
Classificação Operacional :
∼ Paucibacilar ∼ Multibacilar ∼ Não Classificada
Grau de Incapacidade no diagnóstico:
125
∼ Grau 0 ∼ Grau II ∼ Grau I ∼ Grau III ∼Não avaliado
Baciloscopia: ; : ∼ Positiva, ∼ Negativa , ∼ Não realizado
Índice Baciloscopio_________
2 0 Parte – ROTEIRO DE ENTREVISTA:
1- Percepção da Doença:
• Como foi que percebeu que estava doente e quando foi?
2- Conhecimento da doença:
• O que sabe sobre Hanseníase ( causa, transmissão, tratamento e cura)
3- Preconceito e Aceitação
• As pessoas de sua convivência sabem de sua doença?
• Você sofre, ou sofreu algum tipo de preconceito por estar doente de Hanseníase?
(Como enfrenta , ou enfrentou as situações de preconceito).
4 - Fale de sua vida após o diagnóstico de Hanseníase:
• Mudou alguma coisa?, Existe um “antes de ficar doente”, fale sobre isto, (Se
afirmativo, quais foram as mudanças?)
• Como você se sente?
126
Anexos2: Identificação dos participantes das entrevistas no CISAM
N0 na pesquisa
Registro
Nome
Sexo
Idade
Forma Clínica
Grau de
Incapacidade 01 9327 NRS M 69 V I
02 8562 JAS M 21 D 0
03 8939 IRV M 30 V I
04 9329 SMC F 56 D 0
05 9413 BLC M 16 T 0
06 8903 MMAS F 32 D 0
07 8962 SFS M 25 V II
08 8630 MJN F 32 D 0
09 3593 EPA M 50 V 0
10 3593 MML M 18 I 0
11 2077 AAN F 24 D II
12 4419 CDS F 17 D 0
13 9193 JFC M 21 V 0
14 9003 EJS M 32 V 0
15 8263 AMS F 21 V 0
16 8822 JSF M 25 D 0
17 9448 MAB M 25 D I
18 8037 JOS M 37 D II
19 8717 AJN M 21 V II
20 9188 EGS M 38 T I
21 9244 JFA M 60 V I
22 4533 MLCF F 65 D I
23 9389 RMS F 67 D 0
24 8340 MRB M 29 V 0
25 9400 RAV M 56 V 0
26 9116 MMAS F 24 D 0
27 8347 JMT M 70 D 0