Jornal da Ciência: Política científica na pauta da imprensa brasileira1
Yuji Gushiken
2
A SBPC, desde sua criação, tornou-se conhecida através de seus eventos científicos que,
ao longo do regime militar, se dava a condição de fórum de discussões dos problemas nacionais.
A entidade existe no imaginário da modernidade brasileira a partir do momento que passou a
Resumo O artigo relata, em estudo de caso, a criação e circulação do Jornal da Ciência Hoje (atual Jornal da Ciência) no âmbito do Projeto Ciência Hoje, conjunto de mídias desenvolvido pela SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) como experimento de divulgação da ciência nacional. Nesse conjunto, o JCH foi criado com o objetivo de colocar em pauta um tema inédito como especialidade na imprensa brasileira: a política científica no âmbito dos governos federal, estaduais e municipais. A política científica constituiu-se como demanda específica da comunidade de pesquisadores no país em meio aos temas de política geral. Analisa-se o desenvolvimento do pensamento editorial do Jornal da Ciência Hoje, com foco na década de 1990. A experimentação midiática do JCH sugere uma convergência metodológica: estudo de jornalismo na perspectiva teórica das relações públicas e da comunicação organizacional. Palavras-chave: mídia impressa; comunicação; Jornal da Ciência; SBPC; política científica.
SBPC A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), fundada em 1948, define-se
como uma entidade civil sem fins lucrativos, cor política ou religiosa, voltada principalmente
para o desenvolvimento científico e tecnológico do Brasil. A sede nacional fica na cidade de São
Paulo, reconhecidamente o maior centro urbano produtor de ciência e tecnologia do país. Há
também secretarias regionais que representam a SBPC em praticamente todos os estados da
federação. As mais significativas sociedades científicas – cerca de 80 ao todo – são filiadas à
SBPC, que tem mais de 2 mil sócios, entre pesquisadores, professores, estudantes e “amigos da
ciência”.
1 Artigo apresentado no VII Congresso Nacional de História da Mídia, realizado pela Rede Alfredo de Carvalho para o Resgate da Memória da Imprensa e a Construção da História da Mídia no Brasil (Rede Alcar), GT de História da Mídia Impressa, de 19 a 21 de agosto de 2009, na Universidade de Fortaleza (Unifor), em Fortaleza, Ceará, Brasil. 2 Professor adjunto do Departamento de Comunicação Social e do Mestrado em Estudos de Cultura Contemporânea da Universidade Federal de Mato Grosso (ECCO-UFMT). Líder do Núcleo de Estudos do Contemporâneo (NEC-UFMT), em Cuiabá, Mato Grosso, Brasil.
promover seus conhecidos eventos anuais – as Reuniões Anuais e as Reuniões Especiais – com
inúmeros simpósios, mesas-redondas, conferências, cursos, encontros e comunicações cientificas.
Durante as reuniões, são realizadas também duas exposições importantes. A SBPC
Jovem, programação destinada a atrair a juventude para áreas da ciência e da cultura, contém
uma programação variada com exposições, conferências, cursos e projeção de filmes. A
Expociência é uma amostra de ciência e tecnologia que reúne expositores de projetos e
realizações em C&T vinculados a empresas, universidades e institutos de pesquisa.
A SBPC é responsável por um conjunto de mídias dirigidas para divulgação de ciência e
tecnologia produzidas no Brasil. A entidade produz sua história na organização do ambiente
científico no Brasil através de práticas de comunicação, considerando as reuniões anuais e
regionais e os projetos midiáticos como o modo de visibilidade dos temas que busca colocar em
pauta. Mas não se trata de uma sociedade apenas de cientistas. Há sócios que a ela se filiam
porque acreditam na atividade científica.
Embora a sede esteja em São Paulo, o conjunto de mídias – incluindo o então Jornal da
Ciência Hoje, que posteriormente passou à denominação de Jornal da Ciência – é produzido
majoritariamente no Rio de Janeiro, cidade que reúne também significativa parcela da
comunidade científica no país, sendo o segundo pólo produtor de C&T em território nacional. No
início, o jornal vinculava-se ao Projeto Ciência Hoje, do qual se desvinculou e passou, no
organograma da SBPC, a ficar ligado diretamente à presidência da entidade.
Jornal da Ciência Hoje
O Jornal da Ciência Hoje, criado em 1985 como “Informe Ciência Hoje”, circulou no
formato de boletim até 1989. Em outra denominação, era uma newsletter no sentido estrito da
palavra. O informe era impresso em papel-ofício duplo e empregava uma tipologia que hoje seria
aproximadamente corpo 10, típica de máquina de escrever elétrica, com hastes homogêneas
(mesma largura em todas as partes) e sem serifas (detalhes nas extremidades das letras). A
periodicidade era semanal. Apesar da diagramação e da paginação padronizadas, o emprego de
cores, ainda que sempre monocromático, era variado. Marrom, cinza e até verde escuro, nas
tarjas e na tipologia, foram cores utilizadas em exemplares daquela década.
No dia 6 de abril de 1990, o que era um boletim – assim ele era identificado – começou a
circular em formato de jornal. O mesmo formato, o mesmo tipo de papel (bíblia), a mesma
diagramação, a mesma paginação e a mesma tipologia utilizada nas edições que ainda hoje
circulam. Porém, era mais modesto com suas oito páginas. O primeiro número do que viria a ser
o Jornal da Ciência Hoje equivalia ao 203º número do antigo boletim.
O editorial na primeira página do primeiro número do jornal indicava bons resultados
colhidos com o antigo boletim informativo, o que levou à concepção de um projeto mais
ambicioso, com todas as vantagens e responsabilidades que a mudança acarretava. O próprio
editorial anunciava, num editorial de 1990, que “não será surpresa se em breve ele passar a ser
conhecido como o jornal do cientista brasileiro”.3
O Jornal da Ciência Hoje tem características que o identificam como veículo. Além do
formato de newslleter e do papel-bíblia, é um jornal enfaticamente de texto. As únicas formas
visuais se resumem a raríssimos gráficos e às charges – estas freqüentes na primeira página e nas
páginas internas, com a marca do cartunista Mariano que ligou boa parte de seu trabalho
humorístico ao imaginário da C&T através do Jornal da Ciência Hoje. Suas características
gráficas têm como referencial mais imediato o jornal francês Le Monde. Assim, o Jornal da
No segundo semestre de 1995, ao ultrapassar
sua 330º edição, o Jornal da Ciência Hoje já havia se desenvolvido editorialmente, passando a ser
impresso em suas doze páginas, ainda hoje vigentes nas edições quinzenais. Firmou o papel-
bíblia e o emprego de tinta marrom como suas características visuais marcantes, o que lhe
conferia um ar não de jornal antigo, mas de um jornal clássico, buscando, conforme o imaginário
do ambiente científico, um aspecto de sóbrio característico da prática de pesquisa.
O Jornal da Ciência Hoje – JCH como se difundia a marca na comunidade científica, sob
responsabilidade da SBPC – foi concebido como o primeiro, e possivelmente ainda hoje único,
jornal especializado em política científica do país, tendo como público-alvo a comunidade
cientifica brasileira. A tiragem de 15 mil exemplares, na década de 1990, já era distribuída
através dos correios pelo sistema de mala-direta: peso ideal na leveza do papel-bíblia para envio
aos leitores – associados da SBPC e assinantes. Entre as prioridades do jornal, além da política
científica brasileira, estavam eventos de interesse do público-alvo e acontecimentos na área de
ciência e tecnologia. O JCH, ao desenvolver este pensamento editorial, consolidou-se como um
dos quatro projetos em mídia impressa da SBPC – os outros eram as revistas Ciência e Cultura,
Ciência Hoje e Ciência Hoje das Crianças.
3 Editorial. Jornal da Ciência Hoje. Rio de Janeiro, ano 5, no 203, 6 out. 1990.
Ciência buscou ancorar-se visualmente no paradigma de um periódico europeu, enquanto no
Brasil a tradição jornalística tem seus modelos bem mais próximos da imprensa norte-americana.
Ao aproveitar a linguagem visual de um jornal consagrado para o seu próprio projeto
editorial, adiantou-se assim uma das etapas especificas que seria a do projeto gráfico. E um
projeto gráfico que agrade aos leitores e os fidelize não é algo corriqueiro de se narrar no mundo
editorial, seja como mídia de massa ou dirigida. O tempo cuidou de demonstrar que tratou-se de
uma iniciativa bem-sucedida. Já na década de 1990, o Jornal da Ciência Hoje circulava de forma
mais ampliada na comunidade cientifica brasileira, institucionalizando-se como periódico
relevante na proposição de uma pauta específica sobre política científica entre seu publico leitor e
consolidando-se como o mais importante e influente jornal deste segmento no país.
Mix de mídia
O Jornal da Ciência Hoje foi concebido como um dos quatro projetos editoriais em mídia
impressa da SBPC. Os outros três eram as revistas Ciência Hoje, Ciência Hoje das Crianças e
Ciência e Cultura. O JCH foi criado como uma newsletter. Além das mídias impressas havia os
projetos de mídia eletrônica: o Bulletim Board System (BBS), um banco de dados eletrônico que
funcionava 24 horas, o Ciência Hoje Eletrônico, jornal disponível na antiga rede Bitnet, acessado
por um endereço eletrônico, e posteriormente foram criados o Ciência Hoje Web, homepage
acessada pela rede Internet, e o JC e-mail. E havia também, na diversificação dos projetos
editoriais, as versões multimídia das revistas impressas, vendidas em disquete.
Nesse mix de mídia, a tendência seria o sistema buscar um nível de auto-suficiência em
propaganda institucional, ou seja, em fazer referência a seus próprios produtos, em forma de rede.
O JCH tinha hipoteticamente do ponto de vista político, nesse conjunto de mídias, a função de
dar suporte aos outros projetos editoriais da SBPC. O apoio seria não necessariamente através de
propaganda dos outros veículos, mas através de matérias indiciais, no modelo do “jornalismo que
é quase propaganda”.
As edições das revistas, principalmente, eram constantemente noticiadas nas páginas do
JCH, que procurava reforçar a circulação e o consumo das outras publicações da entidade. No
“mix de mídia” do Projeto Ciência Hoje, o JCH foi concebido editorialmente com uma finalidade
específica: colocar em pauta o tema da política científica, projeto desenvolvido pelo jornalista e
pesquisador de direito espacial José Monserrat Filho, com apoio de outros cientistas ligados à
SBPC. As demais mídias do núcleo Ciência Hoje tinham outro foco: a divulgação científica,
projeto considerado pioneiro no Brasil quando se trata da divulgação dos resultados de pesquisa
para um público mais amplo no país.
Uma vez consolidada a idéia de divulgação da ciência nacional, projeto que influenciou
posteriormente a criação de outros produtos editoriais na imprensa brasileira, tratava-se, no caso
do Jornal da Ciência Hoje, desenvolver de modo mais preciso as discussões sobre os bastidores
políticos nos quais se delineavam o a atualidade e o futuro, sempre marcados por incertezas, da
prática científica no país.
Na década de 1980, o Brasil ainda buscava instituir, em boa parte de seu território,
o ensino universitário de graduação, considerando que a rede das instituições federais de ensino
superior (Ifes) foi criada principalmente nas capitais enfaticamente a partir da década de 1970.
Com a graduação ainda emergente, o sistema de pesquisa e ensino de pós-graduação era
considerado igualmente ou até mais incipiente, em muitas áreas do conhecimento, para os
padrões internacionais. A exceção era feita a algumas áreas tradicionais, invariavelmente das
chamadas ciências duras, que passaram a desempenhar um papel relevante na instalação de uma
cultura científica no país a partir do momento em que o país começava a receber de volta, com a
abertura política, parte da massa crítica exilada no exterior durante o regime militar.
A função do JCH não se resumia a apoiar outros projetos editoriais da SBPC. Mas esta
era com certeza uma função das mais proeminentes, que deveria consolidar-se como uma
tendência no desenvolvimento mútuo dos projetos. Embora tivesse o projeto gráfico de menor
custo, o JCH tinha uma das redações com maior número de jornalistas entre os veículos do
Projeto Ciência Hoje. Cada veículo da entidade foi criado com sua especificidade no conjunto de
mídias da SBPC: públicos, metas, objetivos. A especificidade do JCH tem sido, desde sua criação
como boletim, a cobertura da política científica.
Política científica não deveria ser confundida com divulgação cientifica. Divulgação de
resultados de pesquisa já era papel bem definido da revista Ciência Hoje, que historicamente
marcou-se por dar visibilidade a um então nascente principio de produção de ciência e tecnologia
em território nacional. Numa perspectiva de comunicação organizacional, o mix de mídia é
funcional. Nesse sistema midiático, cada mídia da SBPC tem seu próprio projeto editorial. O
apoio mútuo entre as publicações hipoteticamente deveria ser um ponto em comum entre todos os
projetos – seja através do jornalismo de serviço, seja através da propaganda.
Se o mix atinge em geral públicos com interesse comum, ou seja, informações sobre
ciência, seria pertinente, na perspectiva da comunicação organizacional, a SBPC aproveitar a
disponibilidade de um conjunto de mídias para divulgá-las de forma auto-referencial em cada
uma delas. Com esse esforço conjunto, haveria uma forma de comunicação integrada (KUNSH,
1986), atuando em benefício dos objetivos da sociedade científica.
O conjunto de mídia exerce a importante função de sustentar todos e cada projeto
editorial. Funciona assim entre as grandes empresas de comunicação, que indicam outros
veículos do grupo no próprio conjunto de mídias. O modelo de gestão poderia ser empregado
também em organizações que funcionam em outros patamares financeiros, como é o caso da
SBPC. Além da economia com propaganda, a utilização do mix de mídia para essa finalidade
equivale a sustentar e retroalimentar o próprio sistema, na medida em que o esforço de
comunicação atinja o público de forma integrada.
Jornalismo de serviço
Jornalismo de serviço, como desenvolvimento do campo jornalístico, sugere um
pensamento editorial marcado pela idéia de que a informação pautada tenha uma relevância na
agenda do leitor. Em outras palavras, que a informação publicada tenha a capacidade não apenas
de entrar na agenda cotidiana do leitor, mas que tenha relevância o suficiente para subsidiá-lo em
tomada de decisões num futuro próximo ou distante. Trata-se de informação que deve servir
como um roteiro sobre opções oferecidas a respeito de um setor social qualquer, que vai da arte
ao esporte, do lazer à ciência. Enfim, jornalismo de serviço não necessariamente narra o que
aconteceu, mas informa de antemão o que vai acontecer, para que o leitor, conforme suas
demandas pessoais e profissionais, possa participar diretamente do evento anunciado.
Se agenda-setting se refere à capacidade que a mídia tem de agendar a pauta cotidiana do
leitor, o jornalismo de serviço, atento a esta possibilidade, assume um papel de agenda que
permite ao leitor obter informações o suficiente para tomar decisões sobre o que consumir.
Traduzindo, a idéia de serviço é sugerir ao leitor distintas possibilidades de produtos ou serviços
oferecidos num determinado setor social praticamente ao modo de um guia ou roteiro de opções,
considerando que cada informação publicada passa pelo crivo da edição e hipoteticamente
implica na legitimação social do que é noticiado no espectro do jornalismo de serviço.
No caso do Jornal da Ciência Hoje, os serviços historicamente têm sido um norteador da
pauta na seção “Vai Acontecer”, que ocupa duas colunas na última página, mas também no corpo
de textos mais extensos. Como mídia da SBPC, tem o objetivo fundamental de divulgar ciência e
tecnologia e os interesses do setor. Com essa postura editorial, tem buscado cumprir sua função
de dar apoio a eventos, congressos, cursos, enfim, tipos de eventos mais utilizados no âmbito do
mundo científico.
Pelo lado das instituições de ensino e pesquisa, o JCH consolida, aos poucos, sua
condição de veículo parceiro para se atingir um crescente público de cientistas e candidatos a
cientistas cursando os níveis da graduação4
Há uma certa concepção de que newsletters não são exatamente jornais, porque em geral
são impressos em formatos menores e em geral referem-se enfaticamente aos temas de interesse
das organizações que as produzem. No imaginário social, e até mesmo no ambiente jornalístico,
considera-se jornal o material impresso no tamanho standard (29,7 cm de largura x 52 cm de
e da pós-graduação stricto sensu no país e no
exterior. Interesse mútuo pode definir as relações do JCH e do crescente sistema científico em
instalação no país. O JCH amadurecia, nessa relação, seu papel de prestador de serviço à
comunidade científica prestando informações sobre congressos, lançamento de livros, concursos
para docentes, chamada de editais das agências fomentadoras de projetos de C&T.
Apesar de ser uma proposta, o modelo do jornalismo de serviço tem sido também – no
caso do JCH – uma condição de funcionamento, considerando o orçamento limitado para
produção jornalística. Apesar de contar com equipe numericamente razoável (em 1995 havia três
redatores, um diagramador e o diretor do jornal na sede do Rio de Janeiro e mais cinco
colaboradores do Projeto Ciência Hoje em São Paulo, Belo Horizonte e Brasília), não havia
estrutura financeira e material para cobertura sistemática de eventos e outros acontecimentos. A
mudança de linguagem da narrativa para a indicial é uma proposta não apenas pela demanda por
um guia de serviços, mas também pela ausência de uma estrutura que teria custo elevado.
Formato: Newsletter
4 O desenvolvimento de uma massa crítica para pesquisa no país tem incentivado de modo mais intensivo, nos últimos anos, a formação de cientistas já no nível da graduação, através, entre outros dispositivos, dos processos de iniciação científica, incluindo oferta de bolsas, e exigência de monografias de conclusão de curso.
altura) ou, no mínimo, tablóide (29 cm de largura x 40 cm de altura) – formatos que consagraram
o jornal como veículo de comunicação de massa. A newsletter – comumente definida como
“boletim de novidades” – é resultado de uma nova concepção que se chama “comunicação
dirigida”, tecnologia desenvolvida conceitualmente no campo das relações públicas, e
historicamente tem vinculado sua imagem a esse campo específico da comunicação social.
Por ser um veículo de comunicação dirigida, presume-se que o público seja especifico e
tem, portanto, interesse em assuntos determinados por essa especificidade. Neste caso, o que leva
à concepção de um novo veículo é a demanda por novos canais de comunicação que coloquem
distintos temas em circulação. Fora do formato standard, modelo mais conhecido na imprensa
brasileira, outros formatos classificam-se como “alternativo”. Mas, no campo da comunicação
organizacional, a newsletter passou a ser institucionalizado nas organizações contemporâneas.
Na medida em que o consumo de massa se fragmenta em múltiplos segmentos, abrem-se
espaços para novos nichos e demandas sociais que vão sendo ocupados por distintos grupos
sociais denominados de “públicos”. É nesses espaços que o pensamento editorial requer atenção
para o que as tais demandas exigem. Newsletters e suas tecnologias agregadas – comunicação
dirigida, mala-direta, definição de públicos etc. – apresentam-se como uma das boas respostas a
essas demandas do mundo contemporâneo por informações especializadas. A experiência da
newsletter na comunicação organizacional permite que outros pontos de vista sejam adotados
para se entender melhor a funcionalidade e a eficiência desse veículo.
Um jornal que nasceu como uma newsletter tem todas as características de house-organ
ou, traduzindo, jornal de empresa. Tem sido esse o tom do JCH desde seus primeiros passos
como Informe Ciência Hoje, transformando-se em Jornal da Ciência Hoje até seu formato atual
como Jornal da Ciência. Ele utiliza uma técnica que a área de relações públicas conhece muito
bem: a comunicação dirigida, proposta que existe em função de um público pré-estabelecido. No
caso, o público formado por cientistas, pesquisadores e professores universitários, além de
políticos e profissionais de imprensa. No entanto, o pensamento editorial que historicamente tem
marcado a trajetória do JCH é instituir um jornal de política científica, e não um house organ que
apenas divulga fatos e acontecimentos da organização SBPC.
Apesar de pertencer ao chamado “público formador de opinião”, o público-alvo mostra-se
heterogêneo em suas atividades profissionais. Para pesquisadores, o JCH tem o caráter de
prestador de serviços. Para os congressistas em Brasília, subsídios para lobby. Para a imprensa,
material que possa ser utilizado como suporte em futuras reportagens jornalísticas. Não raro,
informações divulgadas em primeira mão pelo JCH são reprocessadas em outros jornais da
imprensa industrial.
Na comunicação organizacional, conforme historicamente se desenvolveu em países
como os EUA, newsletter não são consideradas mídias secundárias, que apenas reproduzem
informações da mídia de massa. Pelo contrário, são mídias segmentadas que investem na
especialidade temática à qual se dedicam. Tornam-se, assim, referência para a imprensa
industrial, chegando até mesmo a pautar as edições dos grandes jornais. No caso do JCH, o
formato newsletter incide também nesse exercício do poder, ou seja, o de interferir, guiar e
orientar possíveis pautas para jornalistas de outros veículos, fazendo da SBPC uma referência
institucional nos temas sobre ciência e tecnologia no Brasil.
Público-alvo
Na década de 1990, o governo brasileiro, através do Ministério da Educação e do
Ministério da Ciência e Tecnologia, concedia inúmeras bolsas de doutorado a brasileiros no
exterior, como política de formação de recursos humanos nas diversas áreas do conhecimento.
Através de convênio com os dois ministérios, o JCH era enviado aos bolsistas da Capes e do
CNPq no exterior. Tratava-se, já naquela década, não apenas da formação de novos
pesquisadores que, retornando ao Brasil, ingressariam na carreira científica nas universidades e
institutos de pesquisa. Esses doutorandos participavam, na condição de novos leitores do jornal,
da instituição da política científica como tema relevante no imaginário midiático e na pauta
política nacional.
Esta nova relação com as agências de fomento no percurso do JCH implicou na ampliação
de seu público-alvo. Mais que cientistas já formados e em atividade nas universidades e institutos
de pesquisa, futuros cientistas e tecnólogos em formação passaram a ter contato ainda durante sua
formação com os temas da política científica no país, considerando que eles próprios obtiveram
bolsas de estudos com base na existência de uma política científica do qual eram beneficiários
diretos. Era exatamente o pesquisador brasileiro no exterior, em fase de doutoramento ou fazendo
estágio de pós-doutorado, que se anunciava como ampliação do público-alvo do Jornal da
Ciência Hoje.
A consolidação desse público flutuante como público-alvo, que recebia a assinatura do
jornal com apoio da Capes e do CNPq, mostrava-se com base nas cartas oriundas do exterior, que
eram maioria nas correspondências endereçadas à redação. As cartas chegavam à redação via
Correios, rede Bitnet e fax, quando a internet ainda se iniciava como ferramenta de comunicação.
Em sua maioria, as cartas eram de pós-graduandos no exterior agradecendo o envio gratuito do
JCH. Havia também instituições de todo o país e do exterior enviando releases e material de
divulgação para que seus projetos – eventos, livros, concursos etc. – fossem veiculados nas
páginas do jornal. Esse feedback indicava que, como mídia de comunicação dirigida, o JCH
conseguia seu reconhecimento como veículo produzido para a comunidade cientifica.
É necessário lembrar um detalhe: partes dessas correspondências que chegavam à redação
via rede Bitnet era possível com as relações institucionais da SBPC com o Laboratório Nacional
de Computação Científica (LNCC), cujo prédio na Praia Vermelha, Zona Sul do Rio de Janeiro,
fica ao lado da sede do jornal, instalado no campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ).
Com o desenvolvimento da Internet, boa parte das correspondências passou a ser enviada
pelo endereço eletrônico. O volume crescente de correspondências que chegavam todos os dias à
redação era o indicador social da boa aceitação do projeto do jornal junto não apenas à
comunidade de pesquisadores, mas também junto aos novos pesquisadores em formação no país
e no exterior, além de profissionais cujos trabalhos se vinculam direta ou indiretamente ao tema
da política científica: professores universitários, políticos, editoras de livros, instituições de
ensino e pesquisa, entre outras.
O feedback de leitores anunciava a transformação do público do jornal. O público-alvo,
até então constituído de pesquisadores já formados, passou a ser redimensionado na medida em
que o país formava uma nova geração de cientistas através do fomento de bolsas de doutorado no
Brasil e no exterior. Nessa perspectiva, o JCH tornava-se uma ferramenta de comunicação
organizacional da SBPC para produzir um público de mestres e doutores mais conscientes sobre a
relevância da política científica e tecnológica como elementos redefinidores não apenas do
campo profissional da docência e da pesquisa, mas dos caminhos do próprio país na busca de seu
processo de modernização.
Clipping
Outra característica de comunicação organizacional do JCH é o clipping. Em função de
sua disponibilidade financeira e estrutura de recursos humanos, a redação sempre teve
dificuldades para cobrir a maioria dos eventos no campo científico e tecnológico. A abrangência
do noticiário do jornal era resultado do rastreamento de jornais considerados formadores de
opinião (Folha de S. Paulo, O Estado de S. Paulo, O Globo, Jornal do Brasil e Gazeta Mercantil),
além de house organs de universidades, institutos de pesquisa e periódicos internacionais como
Nature, La Recherche e New Scientist. As fontes, quando eticamente necessário, eram
evidentemente citadas.
Este aspecto tinha dois lados pesando no posicionamento editorial do jornal. O primeiro é
que, profissionalmente, essa coleta de dados não agradava aos próprios jornalistas, que viam um
serviço menor nessa tarefa. O segundo é que, apesar disso, o rastreamento feito tendia a agradar
aos leitores, na medida em que percebiam no jornal o esforço de estar conectado ao que acontece
em ciência e tecnologia no país e no mundo. Se for essa a percepção, o jornal contribui para o
conforto do leitor mais interessado em ciência e tecnologia, que não precisa comprar ou recorrer
a todos os periódicos citados para estar informado sobre o assunto.
Trata-se, neste caso, de evidenciar as relações de troca de informações no sistema
midiático, porque mesmo a grande imprensa faz rastreamento parecido, e não raro usando o JCH
como fonte ou referência para temas de política científica. Embora não goze de simpatia dos
jornalistas como tarefa a ser realizada, a virtude do clipping é que ele resume o material de
interesse de um determinado público, poupando tempo, cada vez mais escasso, de leitores.
A abrangência do JCH, em seu papel na cobertura e registro dos temas científicos e
educacionais, lhe rendeu uma vaga entre os periódicos catalogados, por exemplo, no Programa de
Estudos e Documentação: Educação e Sociedade, da Faculdade de Educação da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (Proedes-UFRJ). “O JCH tem caráter interdisciplinar, fundamental
para a compreensão do trabalho de produção científica, além de ser distribuído no exterior”.5
JCH vira documento de pesquisa. Jornal da Ciência Hoje. Rio de Janeiro, p. 12, no 328, 8 set. 1995.
Em
função dessa particularidade, ele se torna também fonte de consulta para pesquisadores em
diversas áreas do conhecimento, o que justifica o fato de ser arquivado em bibliotecas e centros
de pesquisa. Na condição de índice, consolida-se como referência para interessados em saber
como a ciência, a tecnologia e a educação são tratadas pela imprensa no Brasil. Aqui se desdobra
mais uma função para o JCH, que vai sendo legitimado como veículo relevante em sua
singularidade no jornalismo brasileiro.
A marcação visual não é o único ponto forte do papel-bíblia utilizado pelo JCH. A
gramatura
Circulação
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Como o jornal fecha a cada duas terças-feiras, a gráfica, entregava os exemplares na
quinta-feira seguinte. Os exemplares eram enviados na sexta-feira aos leitores, que
provavelmente os recebiam no sábado ou na segunda-feira – no caso dos endereços nacionais. Na
impossibilidade de se formar parceria com distribuidores mais velozes, os Correios tornaram-se a
alternativa mais adequada para a disponibilidade de gastos da SBPC com o jornal. Mas o sistema
do papel – ele é bem fino – resulta em baixo peso nas doze costumeiras páginas ou
mesmo nas dezesseis quando há um encarte. Cada exemplar pode ser enviado pelo sistema de
mala-direta sem ultrapassar o peso máximo para uma carta simples de 20 gramas. Em outubro de
1995, quando o sistema de mala-direta se consolidava como ferramenta de marketing do JCH, o
custo de uma carta até esse peso é de R$ 0,15 centavos para cartas nacionais. O valor do selo de
R$ 0,15 era para pessoas físicas. Para pessoas jurídicas, o selo de R$ 0,12 equivalia ao
pagamento de R$ 0,23, isto é, pessoas jurídicas eram beneficiadas com essa decisão dos Correios.
O tamanho ofício do jornal também ajudava: em duas dobras ele cabia dentro de um envelope
comum, sem extrapolar o espaço disponível e o peso permitido.
Em 1995, o setor de publicidade, que cuidava da remessa dos exemplares, optou pela
carta simples. Ainda que parte dos exemplares fosse enviada com a tira característica do
impresso, um acordo com os Correios fazia com que os exemplares fossem enviados como carta
simples. A vantagem da mudança é que o jornal chegaria mais rápido ao seu destino. Para
endereços nacionais, o prazo médio de chegada, segundo os correios, era de três dias.
Dependendo da distância e do sistema de linhas aéreas que serve a algumas regiões do país,
poderia chegar até no dia seguinte ao da postagem.
6 Gramatura é a característica da espessura do papel. É a medida obtida da relação gramas/metro quadrado da folha de papel. O papel-bíblia é muito fino e de baixa gramatura, em geral é branco, opaco e resistente, permanente e durável. A gramatura do papel-bíblia é de 35g/m2 a 50g/m2. Disponível em www.negociosgraficos.com.br. Acessado em 27 jul 20009.
de mala-direta, que começou a ser praticado nos EUA com sucesso, também tem demonstrado ser
eficiente no Brasil. Como já dizia o pesquisador de relações públicas Teobaldo de Andrade: “É
inegável que a direct mail da experiência americana seja dos mais preciosos veículos de
comunicação dirigida, desde que seja utilizado no momento certo e de maneira certa. Caso
contrário será um autêntico fracasso, acarretando despesas e trabalho improfícuos” (ANDRADE,
1983).
Francisco Mesquita Neto, diretor-superintendente do jornal O Estado de S. Paulo,
chamava a atenção em um seminário sobre jornalismo para esse aspecto da remessa do produto.
Ainda que ele estivesse se referindo à chamada grande imprensa e à complexidade de seu
produto, é válida a atenção para as mídias segmentadas: “A tecnologia na paginação, redação e
publicidade já está disseminada; a de impressão é conhecida, mas a complexidade que está
surgindo na remessa e na distribuição, eu diria que será o grande desafio dos próximos cinco
anos”.7
Eram raras as correspondências que chegavam à redação do JCH reclamando da demora
na entrega do jornal, o que indica que a escolha do papel e a opção pelo sistema foram corretas.
Ainda que hipoteticamente a escolha do papel não tenha sido feita pensando neste aspecto da
mala-direta, é visível que as escolhas demonstraram ser bem-sucedidas ao resolver um dos
problemas mais insistentes no jornalismo impresso, ainda hoje, que é o da distribuição.
A equipe de redação do JCH
Relações com os leitores 8
Outro fato comum era a visita ou contato por telefone de cientistas em busca de divulgar
erratas não publicadas em jornais de grande circulação. Essa busca, em geral, ocorria depois de
tem demonstrado afinidade com a perspectiva de relações
públicas na percepção de demandas emergentes da comunidade científica brasileira. Em geral,
contatos telefônicos e visitas de leitores, invariavelmente cientistas, eram recebidos com atenção
e presteza. Não raro leitores solicitavam cópia de matéria publicada ou dica de como contatar
pessoas e instituições citadas nas páginas do jornal. Esse “serviço” de apoio ao leitor, que
oficialmente não se configurava como encargo nem dos funcionários nem dos colaboradores
fixos, fazia parte da rotina dos jornalistas, dispostos a atender às necessidades dos leitores.
7 Sem espaço para o jogo de empurra-empurra. Jornal da ANJ. Brasília, p. 9, no 91, mai. 1995. 8 Com base na equipe de redação que produzia o jornal entre 1994 e 1995.
entrevistas concedidas à imprensa que resultaram em informações distorcidas ou insuficientes
que comprometiam a credibilidade dos cientistas. Quando os jornais não assumiam os erros
cometidos por seus jornalistas e apontados pelos cientistas, os pesquisadores costumavam
recorrer ao JCH para que a errata circulasse pelo menos entre a comunidade científica, em defesa
da imagem pessoal e profissional.
Não era exatamente função do JCH publicar erratas da imprensa industrial de massa. Mas,
de acordo com essa “cultura de relações públicas” que pairava sobre a redação do JCH, era
comum que os membros da equipe procedessem à correção negada pelos outros jornais. Essa
sempre foi uma forma de se manter boas relações com leitores, em especial com cientistas, que
precisam constantemente gerenciar crises ou desfazer más impressões causadas por uma
reportagem da qual foram protagonistas.
Esse aspecto levanta uma questão importante: a ciência e a tecnologia cada vez mais
ganham espaço na imprensa. Tornava-se evidente, com a repetição de vários casos, que as
relações entre imprensa e comunidade científica eram crescentes pelo interesse despertado hoje
em dia pelo mundo da C&T. Mas as relações precisavam ser amadurecidas. A impressão, a partir
do JCH, é a de que a comunidade científica ainda desconhece ou minimiza a importância dessa
relação. Esta tem sido mais uma função emergente que historicamente configura o JCH como
instrumento de criação e manutenção de relações entre cientistas e entre cientistas e sociedade.
Atendimento ao leitor é hoje uma função política, conceito próprio da área de relações
públicas. Em geral, essa função política é difícil de se construir num imaginário projeto de RP.
Mas é evidente que a operacionalização dessa política – uma vez informalmente estabelecida –
torna-se um aspecto relevante a ser notado. Apesar dessa predisposição para o atendimento ao
leitor, nem sempre a redação acertava na forma mais correta em como atendê-lo. O problema que
se apresenta, portanto, é como sistematizar e oficializar uma política que vem dando certo de
forma não sistemática e não oficial.
No caso do JCH, parece razoável afirmar que era preferível uma cultura organizacional
informal que dava certo do que uma sistematização forçada que se tornasse alvo de relutâncias e
resistências internas. Era preciso saber o momento de evitar disfunções no sistema, antes que o
bom relacionamento com o leitor comprometesse a produção jornalística e as boas relações
internas. O mais visível dessa situação é que instruções são mais aceitas no ambiente
organizacional quando partem de uma autoridade – legal e legítima – diante do pessoal, sob pena
de que o discurso proferido seja alvo mais de controvérsias do que de entrosamento. Trata-se de
perceber que o desenvolvimento do próprio projeto implica na complexidade do “gerenciamento
de crise” ou “relações como o público interno”, temas que não fazem parte da grade curricular do
ensino de jornalismo.
Quando se trata de estudar e compreender sociologicamente as demandas da recepção, a
própria imprensa de massa já estava adotando na década de 1990 políticas voltadas para o
chamado “foco no cliente”, ou no caso jornalístico, foco no leitor. Um workshop realizado pela
Associação Nacional dos Jornais (ANJ) em maio de 1995 debatia o tema “Técnicas de
Gerenciamento de Redações”. Cita-se o caso do jornal O Globo que havia implantado um painel
dos leitores e criado uma central de atendimento. Com o painel, um grupo de profissionais fazia
consultas telefônicas aos leitores do jornal e os questionava sobre a edição do dia. Com a central,
abriu-se a possibilidade de contato dos leitores com a redação, para reclamações e sugestões de
pautas. O tom dado pelo workshop, segundo o Jornal da ANJ, foi “a mudança de mentalidade nas
redações”.9 Partindo de uma entidade patronal, é significativo que um evento discutindo temas
organizacionais possam sugerir novas concepções de prática do jornalismo no Brasil.
Lições da imprensa industrial, caso de O Globo, e da imprensa dirigida, caso do JCH: a
idéia de que fazer jornalismo é fazer somente reportagem, redigir e editar – que responde
basicamente pela dimensão técnica do ensino de graduação – vai sendo redimensionada para um
espectro mais amplo já produzido conceitualmente nos estudos em comunicação organizacional.
O jornalismo, hoje em sua complexidade conceitual, requer uma visão mais ampla do campo em
questão. E é principalmente nas relações públicas e no marketing que se vem encontrando
subsídios para a prática desse jornalismo emergente.
9 Contato direto com o leitor. Jornal da ANJ. Brasília, p. 10, no. 91, mai. 1995.
Propaganda em newsletter
Uma das singularidades do Jornal da Ciência Hoje é que ele é uma newsletter que veicula
propaganda, feito conseguido por poucos veículos com essa proposta editorial. A lista de
anunciantes era significativa na década de 1990. Um relatório referente a julho de 1994 a julho de
1995 indicava que o jornal havia publicado 64 anúncios de tamanhos variados – de 1/6 de página
a anúncios de páginas inteiras – com um faturamento global de R$ 23.740,00 naquele período.
Para saber por que instituições procuram o JCH para veiculação de propaganda, é preciso
verificar o público que ele atinge. A tiragem do jornal tem variado entre 13.700 a 15.000
exemplares, assim distribuídos:
■ Sócios da SBPC: 4.121
■ Conselheiros da SBPC: 50
■ Secretarias Regionais da SBPC e sucursais de Ciência Hoje: 1.175
■ Jornalistas: 100
■ Conselho dos Reitores das Universidades Brasileiras: 104
■ Congresso Nacional: 533 deputados e 81 senadores
■ Bolsistas no exterior: 2.340 do CNPq e 1.346 da Capes, total de 3.686
■ Assinantes: 1.200
O relatório de julho de 1994 a julho de 1995 indica que 29 organizações serviram-se do
JCH para veicular seus produtos e serviços. Entre elas havia universidades (18 anunciantes),
centros de pesquisas (3), órgãos de fomento à pesquisa (2), centro de documentação (1), editora
universitária (1), programa de apoio à pesquisa (1), livraria (1), sociedade científica (1) e
ministério da União (1). O maior número de anunciantes na lista eram universidades públicas e
privadas, mas registra também um anunciante multifacetado que começa a dar evidência de seus
■ Distribuição gratuita, quantidade variada, em congressos e simpósios, além de remessas
promocionais para tornar o jornal mais conhecido e conquistar novos assinantes.
Como se percebe, pouco mais de um terço da tiragem (cerca de 35%) apenas é vendida.
Nesse percentual se incluem as vendas por assinatura e os exemplares enviados aos sócios da
SBPC, que pagam anuidades. Mas a parte distribuída gratuitamente não deixa de ser uma
distribuição dirigida. O importante é que o jornal ganha estatuto próprio. Se o JCH, desde sua
origem, tinha a ambição de ser mais que um house organ, mas constituir como um jornal de
política científica, começou a dar sinais de seu amadurecimento. Ele já chegou a um ponto de
desempenho no mercado editorial que passou a ser, ele mesmo, objeto de preocupação do ponto
de vista de marketing. Percebe-se que o jornal poderia ser fonte de captação de recursos e tornar-
se um projeto auto-sustentável no conjunto de mídias da SBPC.
serviços.10 Um levantamento de 19 edições publicadas de janeiro a outubro de 1995 indica que o
JCH veiculou um total de 60 peças de propaganda, que foram assim distribuídas pelo serviço ou
produto que anunciavam:
■ Cursos de pós-graduação: 30 peças
■ Concurso para contratação de docentes ou pesquisadores: 13 peças
■ Livros, revistas ou newslleters: 6 peças
■ Serviços profissionais: 2 peças
■ Anúncios de cursos que não de pós-graduação: 1 peça.
■ Propaganda institucional: 8 peças11
É visível que boa parte desses anúncios sobre cursos de pós-graduação foram feitos a
partir do segundo semestre. Exatamente 20 dos anúncios, num total de 30, foram feitos nos meses
de julho, agosto, setembro e outubro – ou seja, em menos de um semestre. O que pode explicar
essa concentração de anúncios no segundo semestre é o fato de que as seleções para cursos de
Em 1995, a Capes, órgão do Ministério da Educação, avaliou o desempenho da pós-
graduação no Brasil. O desempenho era referente ao biênio 1992-1994. Foram avaliados 1.760
cursos de pós-graduação (mestrado e doutorado) de 96 instituições públicas e privadas. Nesse
período, 29 instituições anunciaram nas páginas do JCH de janeiro a outubro de 1995. A
evidência é a de que coordenadores de programas de pós-graduação têm investido na divulgação
de seus cursos, embora não seja comum os programas de pós-graduação, principalmente os
vinculados a instituições públicas, disporem, no Brasil, de recursos o suficiente para investir em
propaganda e marketing.
10 A lista de anunciantes naquele período incluiu universidades públicas e privadas (PUC-Rio, UEL, Uenf, Uerj, UFF, UFBA, UFMA, Ufop, UFRGS, Furg, UFRJ, UFSC, Universidade de Vassouras, UnB, Unijuí, Unisinos, Univali, USP), sociedade científica (Sobrapar), institutos e centros de pesquisa (Inpe, Iuperj e Museu Paraense Emilio Goeldi), agências de fomento à pesquisa (CNPq e Faperj), associação de cooperação técnico-científica (Cendotec), editora (EdUnB), ministério federal (Ministério da Saúde), programas governamentais (PADCT) e livraria (Livraria Leonardo da Vinci). 11 Das peças publicadas de janeiro a outubro de 1995, cinco eram da própria SBPC, anunciando outros de seus produtos. Os anúncios de produtos da Ciência Hoje/SBPC foram considerados, neste caso, propaganda institucional da própria entidade.
mestrado e doutorado ocorrem uma vez por ano. Em geral, evidencia-se que os cursos começam
no primeiro semestre, sendo que os concursos precisam ser realizados no segundo semestre. O
primeiro semestre, quando editais estão sendo elaborados, é a época indicada para a manutenção
desses contatos.
O segundo tipo de anúncio mais veiculado é o de concursos para professores ou
pesquisadores. Em geral, as instituições procuram professores pós-graduados. O JCH mostra-se
um veiculo adequado para esse tipo de anúncio, já que é dirigido a alunos de pós-graduação no
exterior (2.340 bolsistas do CNPq e 1.346 da Capes, em 1995). Trata-se do aluno na fase mais
alta da titulação acadêmica e que invariavelmente está em busca de espaço em uma instituição de
ensino superior. O jornal também é dirigido a pesquisadores em qualificação no Brasil e a outros
já com carreira consolidada. Anunciar no JCH equivale a dirigir corretamente a informação.
A crescente comunidade científica no Brasil pode ser verificada pelo aumento de
publicações, registros de patentes, número de grupos de pesquisa em atividade, programas de
pós-graduação stricto sensu instalados em praticamente todas as regiões, maior inserção de
brasileiros no circuito internacional de pesquisa nas mais diversas áreas do conhecimento. A
transformação numérica pode ser avaliada também qualitativamente, na medida em que traduz,
em certa medida, o processo de modernização por que passa o país.
Considerações finais
Esse processo passa necessariamente pela organização da comunidade científica
brasileira, através da SBPC, em sua luta histórica para que distintos governos federais dotassem o
país de uma política voltada para a formação de recursos humanos em ciência e tecnologia. O
Jornal da Ciência Hoje, produto editorial esboçado e desenvolvido no âmbito da SBPC, insere-se
nessa trajetória nacional fazendo circular informações relevantes sobre as condições políticas do
fazer ciência. Historicamente, reinventou o jornalismo brasileiro ao propor para a pauta nacional
distintas abordagens sobre a política científica como questão fundamental na idéia de
desenvolvimento nacional, numa década em que a própria idéia de Estado-nação dava sinais de
sua crise como produção do século XX.
Numa dimensão nacional, mas inserindo-se numa perspectiva internacional e
cosmopolita, a ciência brasileira amadureceu prescrevendo a si mesma a necessidade de fomentar
não apenas a idéia de divulgação científica, mas a idéia de que antes era preciso reforçar uma
idéia de política científica. Esse amadurecimento tornou-se possível não apenas com a
resisttência durante o regime militar e após a abertura política, mas também com a possibilidade
de experimentação editorial no interior da própria SBPC com a criação do Projeto Ciência Hoje,
do qual o Jornal da Ciência Hoje é um dos projetos resultantes. Fomentar um público disposto e
apto a discutir política científica tornou-se uma demanda da própria comunidade científica não
apenas para sua sobrevivência socioeconômica e política, mas também para sua própria
reprodução.
O JCH participa desse momento histórico a partir do momento em que reflete essa
demanda por uma política específica voltada para C&T, mas simultaneamente estimula e
contribui para amadurecer esse novo público específico formado por cientistas e tecnólogos, de
modo que este público amplie sua capacidade de interferir na formação da opinião pública
nacional sobre a relevância e implicação das atividades científicas e tecnológicas na sociedade.
Porém, mais que fomentar os debates sobre política científica no país, o próprio JCH
precisou fomentar suas próprias questões como pensamento editorial em desenvolvimento,
primeiramente dentro do Projeto Ciência Hoje e depois vinculando-se diretamente à diretoria
nacional da SBPC. A história do JCH, neste estudo de caso, evidencia a virtualidade dos
conceitos oriundos de subáreas como relações públicas, marketing e propaganda no
desenvolvimento do pensamento editorial contemporâneo.
Trata-se de uma história discreta, da qual toma conhecimento basicamente seu público
leitor formado por professores universitários, cientistas e estudantes de pós-graduação, que de
uma forma ou outra toma contato com as discussões sobre política científica propostas pelo JCH.
Essa discrição evidencia não a voz baixa da comunicação que não é massiva, mas a afirmação
existencial de um pensamento editorial que aposta nas virtualidades do que no campo das
relações públicas e da comunicação organizacional é denominado de comunicação dirigida ou
segmentada. Convém enfatizar que o projeto editorial do Jornal da Ciência Hoje não foi
concebido explicitamente como projeto de relações públicas, mas é analisado aqui nesta
perspectiva, o que são duas coisas distintas, embora a consolidação do jornal no âmbito da SBPC
necessariamente o coloque no campo da comunicação organizacional.
Evidentemente, um artigo deixa lacunas que um estudo de caso não necessariamente dá
conta de preencher. A história do tempo presente, marcada pelo trânsito intenso das informações
e das transformações sociais que incluem as transformações da mídia, demanda uma auto-
reflexividade na prática de pesquisa que inclui anotar o seguinte: entre os muitos dados apontados
num texto há com certeza muitos outros que permanecem discretos para um dia serem capturados
por outro discurso, talvez um outro trabalho de pesquisa, para deixar marcas de linguagem que
renovem sempre as memórias da imprensa brasileira, da qual invariavelmente somos
participantes, como leitores, ouvintes, telespectadores ou seus produtores direta ou indiretamente.
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