METODOLOGIA DE CARACTERIZAÇÃO DO MODELO DE VISCOSIDADE DE
MATERIAIS PARA SIMULAÇÃO VIRTUAL DE COMPONENTES PLÁSTICOS
Renan Melhado Mazza1, Cleber Pagliosa
1 e Fabio Caires
1
1Grupo Smarttech
E-mails: [email protected], [email protected],
RESUMO
A pressão exercida pelas montadoras sobre os fornecedores para reduzir prazos e custos dos
desenvolvimentos criou a necessidade de aumentar o uso de programas CAE como ferramenta
auxiliar no desenvolvimento. Um dos principais gargalos nesses estudos são a confiabilidade
e a disponibilidade das informações da matéria-prima. Muitas vezes essas informações não
são encontradas e quando estão disponíveis são antigas e/ ou não representam a condição
atual, por exemplo, adição de material reciclado. Esse estudo avalia uma possível alternativa
para caracterização dos coeficientes da equação WLF para análise de injeção de materiais
poliméricos. A metodologia consiste em obter os coeficientes do modelo de viscosidade,
utilizando a curva de pressão obtida na máquina injetora para diferentes cenários e, à partir de
um estudo estatístico dos resultados obtidos em diversas simulações de injeção. Os principais
ganhos com o uso dessa metodologia em comparação com a caracterização em laboratório são
a utilização de dados do processo fabril, considerando fatores antes não avaliados como, mão
de obra, ambiente e máquina injetora. Desta forma, a metodologia proposta possibilita obter
dados robustos minimizando a dependência dos dados de materiais.
INTRODUÇÃO
Com o aumento da competitividade global e incentivos do governo para empresas que
buscarem o aumento na eficiência energética de veículos automotores, como o programa
Inova-Auto [1], aumenta a busca por redução de peso e custo no desenvolvimento de novos
projetos. Diminuição do peso em novos projetos resulta em maior utilização de material
plástico no desenvolvimento de novos veículos, principalmente na conversão de peças
metálicas para plásticas, ou na otimização do peso das peças que já são fabricadas com esse
tipo de material.
Entre os processos de fabricação de peças plásticas o mais utilizado é o processo de
moldagem por injeção. A predominância na utilização desse processo se dá pela alta
repetibilidade e produtividade, em virtude dos tempos necessários para moldagem serem
relativamente baixos [2]. Esse cenário tem ampliado a utilização de simulação numérica de
injeção, além de haver um aumento na expectativa de qualidade e correlação dos resultados
com o processo real.
Entre as principais variáveis que afetam o processo e consequentemente a qualidade das
informações obtidas na simulação estão as propriedades materiais [3,4], cuja complexidade de
caracterização dificulta a obtenção das informações, além disso, nem sempre o material a ser
utilizado está disponível no banco de dados do programa comercial utilizado [5]. Outro ponto
Blucher Engineering ProceedingsAgosto de 2014, Número 2, Volume 1
é que quando essa informação está acessível nem sempre é atualizada, o que causa um erro no
resultado obtido da simulação.
O objetivo desse trabalho é avaliar a viabilidade de uma metodologia para se obter as
propriedades materiais para simulação do processo de injeção de plástico, através das
seguintes fontes:
Materiais similares que estejam disponíveis no banco de dados;
Automação do processo de simulação;
Dados possíveis de serem obtidos no chão de fábrica;
Métodos de otimização e delineamento de experimentos.
Neste estudo, a análise de injeção foi realizada utilizando o programa Autodesk
Simulation Moldflow Insight 2014 e, a automação e estudo dos experimentos foi realizada
utilizado o programa Isight.
1. METODOLOGIA
A partir de um caso real foi realizado o processo inverso para se obter as características do
material para o processo de injeção. A figura 1 apresenta as peças selecionadas para o estudo:
Figure 1. Peças utilizadas no estudo, “retrovisor” e “lateral de banco”
Ambas as peças utilizam a mesma matéria-prima, Moplen HP400M da empresa Basell
Polyolefins Europe, esta já está caracterizada e disponível no banco de dados do programa. A
viscosidade do material é descrita pelo gráfico de viscosidade em função da taxa de
cisalhamento para diferentes temperaturas conforme a figura 2.
Figure 2. Gráfico de viscosidade do material Moplen HP400M
Esse gráfico de viscosidade pode ser obtido via ensaio em laboratório utilizando reômetro
acoplado a uma de máquina de injeção, conforme norma ISO 11443:2005 ou ASTM D38535-
08. A partir desse ensaio são obtidos alguns coeficientes que serão utilizados pelo algoritmo
do programa para calcular o escoamento do material, ver figura 3.
Figure 3. Coeficientes do modelo de viscosidade CROSS-WLF do material Moplen HP400M
Uma vez que em um caso real essa informação será desconhecida, utilizou-se neste estudo
as propriedades estimadas do material. Então um processo numérico de calibração destas
propriedades deverá resultar em valores que posteriormente serão comparados aos
coeficientes obtidos experimentalmente.
Figure 4. Coeficientes do modelo de viscosidade CROSS-WLF do material inicial do estudo.
Para definir os objetivos da calibração, utilizou-se os gráficos de pressão de injeção que
podem ser obtidos em alguns modelos de máquina injetora.
Figure 5. Gráfico de pressão do processo de injeção da peça “retrovisor”
Figure 6. Gráfico de pressão do processo de injeção da peça “lateral de banco”
1.1. Criação do fluxo automatizado de simulação
Para realização da calibração foram executadas diversas simulações de injeção utilizando
o programa comercial Autodesk Simulation Moldflow Insight 2014 (ASMI). Para a realização
dessas análises de maneira automatizada, foi gerado um executável que altera o modelo do
ASMI (*.sdy), submete ao cálculo da solução e extrai os resultados, entre eles o gráfico de
pressão que será comparado com o gráfico de referência.
Para gerenciar este processo de simulação foi utilizado o programa comercial Simulia
Isight 5.8. Com ele foi possível criar um fluxo com todas as etapas de análise e comparação
das curvas de resposta.
Figure 7. Tela do programa Isight – workflow do processo de calibração de modelo.
O fluxo é separado em componentes, o primeiro componente é o “mold_material”, nesse
componente são alteradas as propriedades do material que irá alimentar os fluxos de análise
das duas peças. Os fluxos de análise são iguais e compostos por um primeiro componente
“Moldflow” que executa o programa ASMI e exporta o gráfico de pressão. Após, são
utilizados dois componentes de leitura de arquivo de texto: o primeiro lê o gráfico de pressão
a partir do resultado da análise e o segundo componente carrega o gráfico de pressão utilizado
como referência. Por fim os gráficos são comparados utilizando dois critérios no componente
“Data Matching”. Os dois critérios utilizados foram fator de correlação entre os dois gráficos
e a soma do quadrado da diferença das áreas dos gráficos.
Figure 8. Tela do programa Isight – workflow do processo de simulação de injeção.
Após a obtenção dos critérios para ambas as análises tem um componente “calculator” que
calcula a média aritmética dos critérios.
1.2. DOE
Para definir os experimentos a serem realizados e estudar os dados obtidos foi utilizado o
método de delineamento de experimentos “Optimal Latin Hypercube”. O objetivo desse
método é distribuir de maneira aleatória os pontos de experimentos garantindo uma distância
uniforme entre os pontos estudados.
Figure 9. Exemplo da distribuição de experimentos no método “Optimal Latin Hypercube”.
Foram utilizados 100 experimentos sendo que os coeficientes alterados e os níveis
utilizados foram realizados de acordo com a figura 10:
Figure 10. Tabela de parâmetros utilizados.
O coeficiente “D3” não foi alterado porque para todos os poliproprilenos encontrados no
banco de dados do programa ASMI esse coeficiente é igual à 0.
2. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foi possível identificar que os fatores de maior influência em relação aos critérios de
comparação foram os parâmetros n e D2, sendo que a influência do parâmetro D2 não é
linear, conforme se observa no gráfico de Pareto e nos gráficos de efeito principal.
Figure 11. Gráfico de Pareto a partir dos resultados obtidos no DOE.
Figure 12. Gráfico de principal interação dos parâmetros n e D2.
Outro ponto é que a influência dos parametros varia conforme os critérios utilizados.
Desse modo, quando avaliado o critério de correlação não há grande interação entre os
parametros n e D2. Por outro lado, quando se avalia a soma do quadrado da diferença, n e D2
apresentam uma grande interação de efeitos, como pode ser visto no gráfico da figura 13.
Figure 13. Gráfico de interação entre os parâmetros n e D2.
O programa Isight gera uma tabela com os resultados de todos os experimentos e destaca
aquele que apresenta melhores resultados em função dos critérios definidos. Desse modo,
obtemos o material a ser utilizado no programa ASMI.
Figure 14. Tabela de resultados dos experimentos
Um arquivo *.UDB foi gerado contendo as propriedades materiais obtidas neste processo
de calibração e os resultados da simulação foram comparados com os resultados obtidos de
simulação com propriedades obtidas em laboratório pelas técnicas convencionais.
Figure 15. Resumo das informações e coeficientes do material obtido
Comparando os resultados de preenchimento, o material gerado a partir dos dados obtidos
no processo de calibração forneceu resultados bastante próximos para os dois estudos, sendo
que o material proposto apresenta uma fluidez um pouco maior que o material obtido via
laboratório.
Figure 16. Gráfico de preenchimento da peça Lateral de Banco do programa ASMI
Figure 17. Gráfico de preenchimento da peça Retrovisor do programa ASMI
A distribuição de pressão também se mostrou bastante próxima, sendo em torno de 10%
de diferença e distribuição similar ao longo do preenchimento [6].
Figure 18. Gráfico de pressão no momento da comutação da peça Lateral de Banco do
programa ASMI
Figure 19. Gráfico de pressão no momento da comutação da peça Retrovisor do programa
ASMI
Fazendo a comparação na curva de pressão pode-se avaliar que as curvas têm a mesma
tendência. Para a peça lateral de banco, apenas o valor máximo de pressão divergiu em 8%, ao
passo que, para o caso da peça retrovisor a curva apresenta a mesma tendência, porém com
valores menores.
Figure 20. Gráfico de pressão durante o preenchimento do material original (Moplen
HP400M) e do material obtido via calibração do modelo da peça Retrovisor
Figure 21. Gráfico de pressão durante o preenchimento do original (Moplen HP400M) e do
material obtido via calibração do modelo da peça Lateral do Banco
Comparando as curvas de viscosidade encontradas, pode-se notar que os valores
encontrados não foram suficientes para descrever o comportamento da viscosidade para
diferentes temperaturas. Isto pode ter ocorrido em virtude dos experimentos avaliados não
possibilitarem uma calibração do modelo para diferentes temperaturas e sim um único
processo para cada geometria.
Figure 21. Gráfico de viscosidade do material original (Moplen HP400M) com o Material
obtido na calibração do modelo.
3. CONCLUSÃO
A metodologia estudada nesse trabalho mostrou-se válida para obter os coeficientes de
viscosidade a partir da curva de pressão obtidos para duas geometrias distintas. Desde modo,
apresenta-se como uma alternativa de menor custo e mais acessível para caracterização de
material para simulação do processo de injeção. Outro ponto positivo da metodologia é a
possibilidade de estudar os impactos das características do material no processo de injeção.
Como próximo passo, deverá ser avaliada a possibilidade de realizar estudos com
diferentes processos para a mesma geometria, a fim de representar os impactos da variação de
temperatura nas curvas de viscosidade, aproximando o resultado obtido do ideal além de
estender a pesquisa à calibração de outros coeficientes, como à curva de PVT e aos dados de
contração.
REFERÊNCIAS
[1] OLIVON, Beatriz; O que o Inova-Auto quer das empresas. Disponível em
http://exame.abril.com.br/economia/noticias/o-que-o-inovar-auto-quer-das-empresas?page=2
Acesso em: 21/03/2014.
[2] FRANCISCO, Anderson da Silva. Otimização do ciclo pelo processo de moldagem por
injeção convencional. 74 páginas, Monografia (Graduação). Faculdade de Tecnologia da
Zona Leste.
[3] SHOEMAKER, Jay; Moldflow Design Guide: a Resource for Plastic Engineers.
Framingham, MA: Hanser Publications, 2006.
[4] KAMAL, Musa R.; ISAYEV, Avraam; LIU, Shih-Jung; Injection Molding:Technology
and Fundamentals. Munich: Hanser Publishers, 2009
[5] KENNEDY, Peter Kenneth; Practical and Scientific Aspects of Injection Molding
Simulation. 143 páginas, Dissertação (Doutorado). Technische Universiteit Eindhoven
[6] Autodesk Knowledge Network; Autodesk Simulation Moldflow Insight 2015 - Help,
Disponível em http://help.autodesk.com/view/MFIA/2014/ENU/?guid=GUID-5F3A6D60-
7140-4389-B35C-C03DE61B2041 Acesso em: 08/05/2014.