i
Maria Isabel Tavares Candeias da Silva
Passo a Passo,
no Interior do Projecto Um estudo sobre a Inteligncia da Escola
Tese de Doutoramento
em Estudos da Criana
Trabalho realizado sob orientao do
Professor Doutor Cndido Varela de Freitas
Fevereiro, 2007
ii
DECLARAO Nome: Maria Isabel Tavares Candeias da Silva Endereo electrnico: [email protected] Telefone: 965141026 Nmero do Bilhete de Identidade: 7428931 Ttulo da Tese: Passo a passo no interior do Projecto, Um estudo sobre a Inteligncia da Esco-la Orientador: Professor Doutor Cndido Varela de Freitas Ano de concluso: 2007 Ramo de Conhecimento do Doutoramento: Estudos da Criana Nos exemplares das teses de doutoramento ou de mestrado ou de outros traba-lhos entregues para prestao de provas pblicas nas universidades ou outros estabelecimentos de ensino, e dos quais obrigatoriamente enviado um exemplar para depsito legal na Biblioteca Nacional e, pelo menos outro para a biblioteca da universidade respectiva, deve constar uma das seguintes declaraes: DE ACORDO COM A LEGISLAO EM VIGOR, NO PERMITIDA A REPRO-DUO DE QUALQUER PARTE DESTA TESE/TRABALHO Universidade do Minho, __ de Fevereiro de 2007 Assinatura: ________________________________________________
mailto:[email protected]
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Agradecimentos
Esta foi a pgina mais difcil de escrever.
No porque me seja difcil identificar quem deve ser aqui refe-
rido mas porque o espao no muito para o fazer. So tantas as pes-
soas que prepararam e acompanharam este projecto, que esperaram a
sua concretizao, que usaram de extrema pacincia e que tambm
se impacientaram, que acarinharam e criticaram, que adiaram outros
projectos porque este, egoistamente, engoliu o meu tempo e o tempo
da famlia e dos amigos. Engoliu tempo, energia, a capacidade de
pensar e de viver outras experincias.
Apesar de uma tese de doutoramento ser um trabalho assinado
por uma pessoa, ela envolve um conjunto de tarefas de acompanha-
mento, desafio e aconchego que so realizadas por outras pessoas: a
famlia, o orientador, os colegas de trabalho, os alunos da escola, os
conselheiros para o processo e para o tema de investigao. De algu-
ma maneira todos usaram e construram conhecimento sobre o tema
da tese e sobre as ferramentas que apoiaram a sua elaborao. As
tarefas das pessoas desta equipa foram imensas e variadas e nem
sempre serviram para facilitar o caminho. Muitas vezes foi pela sua
aco que surgiram os problemas que enriqueceram o estudo. Tam-
bm foi pela aco dessas pessoas ou pelas suas ideias e sugestes que
muitos dos problemas se clarificaram.
As pessoas que me acompanharam, passo a passo, foram essen-
ciais na construo do conhecimento que aqui apresento.
A todos agradeo.
Por muitos que sejam os agradecimentos sero sempre insufi-
cientes.
iv
v
Passo a Passo no Interior do Projecto
Um estudo sobre a Inteligncia da Escola
Resumo
Este trabalho de investigao pretende identificar a relao
que se estabelece entre trs valncias da Escola: a sua Intelign-
cia, a Aprendizagem que realiza e a Mudana que implementa
como resposta s exigncias do desenvolvimento dos seus alunos.
Pretende ainda compreender como o Projecto da Escola se susten-
ta nessa trilogia.
Pretende-se compreender quais as exigncias que so feitas
aos Professores enquanto profissionais responsveis pelas dinmi-
cas de construo curricular e de gesto organizacional num tempo
em que a escola se confronta com a necessidade de responder aos
desafios da inovao atravs da construo de um projecto colec-
tivo que implica a mudana de concepes e de prticas a nvel
individual e a nvel dos grupos.
Atravs de uma metodologia com caractersticas etnogrficas
a escola observada e interpretada nos seus esforos para encon-
trar lgicas de pensamento e aco para a construo, desenvol-
vimento e avaliao de um projecto com vrios nveis de concep-
o. So identificadas as dimenses da Inteligncia da Escola, de
que forma se manifestam e influenciam a aprendizagem e as ten-
dncias de mudana que da resultam.
vi
vii
Step by Step inside the Project
A study on the school intelligence
Abstract
The goal of this research is to identify the relationship among
three different School purposes: the Intelligence of school, the
Learning which it carries out, and the Change which it promotes as
a response to the demands of student development. The study also
tries to understand how the School Project is sustained in this tril-
ogy.
In a time when schools face the need to respond to the chal-
lenges of innovation through the construction of a collective pro-
ject, which implies individual and groups changes in their concepts
and practices, the study seeks to understand what are the striving
demands teachers are confronted with as professionals who are
responsible for the organizational management and the dynamic
construction of the curriculum.
Using a methodology with ethnographic characteristics, this
research sets out to analyse and interpret the schools efforts to
encounter the logics of thinking and the action involved in the con-
struction, development and evaluation of projects at different lev-
els.
This research identifies the dimensions of the School's Intelli-
gence, as well as how they are revealed and how they influence
the learning process and the tendencies of change within the
school itself.
viii
ix
ndice
Pgina
Introduo 4
A complexidade como realidade 4
A inevitabilidade da mudana 5
Uma histria sem princpio nem fim 7
Algumas questes de partida 8
Uma escola que aprende uma escola inteligente 10
Uma esfera de incerteza 12
Gesto Flexvel do Currculo e Reorganizao Curricular como espaos
de mudana
15
I Parte Uma investigao no interior da escola 21
1. Passo Identificao das condies contextuais geradoras do problema 21
1.1 A Escola Global 21
1.2 A Escola da Torre 25
2. Passo Problemas de investigao 37
2.1 Questes orientadoras 37
2.2 Objectivos do estudo 41
2.3 Contexto de investigao o Retrato de uma Escola 45
3. Passo Um modelo de investigao 61
Introduo 61
3.1 Escolha de uma metodologia de investigao 62
3.2 Justificao de um quadro metodolgico 67
3.3 A escola como contexto de investigao 73
3.4 Critrios de validade 75
3.5 O investigador professor 79
3.6 Um estudo com caractersticas etnogrficas 82
3.7 As fontes utilizadas 85
3.8 Os problemas identificados na escola 87
3.9 Questes de natureza tica 91
x
Pgina
II Parte A Inteligncia da Escola 95
4. Passo A escola que aprende 95
4.1 Implicaes da aprendizagem da escola 95
5. Passo A Inteligncia Humana 99
Introduo 99
5.1 A dificuldade em encontrar consensos 103
5.2 Esboando os limites do conceito de inteligncia 112
5.3 O conceito de inteligncia 121
5.3.1 A teoria trirquica de Sternberg 121
5.3.2 A Teoria das Inteligncias Mltiplas 125
5.4 Um quadro terico para a Inteligncia Humana 141
6. Passo A Inteligncia da escola 148
Introduo 148
6.1 A escola como organizao inteligente 156
6.2 Domnios da aprendizagem da escola inteligente 165
6.3 Inteligncia Colectiva 178
6.4 Inteligncias mltiplas na escola 186
6.5 Um quadro terico para a Inteligncia da Escola
199
III Parte A Escola Portuguesa de hoje 204
7. Passo A exigncia da mudana 204
7.1 O pensamento complexo da escola do sculo XXI 204
7.2 Uma escola bsica para todos 209
7.2.1 - A dificuldade de encontrar um sentido 209
7.2.2 - A procura da coerncia 210
8. Passo Construindo as condies para a mudana 214
8.1 Uma rpida viso do passado 214
IV Parte Construindo o Projecto da Escola, passo a passo 234
9 Passo A mudana da escola como projecto 234
Introduo 234
9.1 A opo pela Gesto Flexvel do Currculo 238
9.2 Experimentando a mudana 250
xi
Pgina
10. Passo A construo do projecto 263
10.1 O grupo de acompanhamento do Projecto Curricular da Escola 263
10.2 Do grupo de acompanhamento para os grupos pedaggicos 274
10.3 A necessidade de um Projecto Curricular de Escola 276
10.4 A opinio da escola 279
10.5 Um esboo do Projecto Curricular da Escola 287
10.6 A aprovao do projecto 292
10.7 A apropriao do projecto 294
10.8 A reformulao do projecto 298
11. Passo Momentos do projecto curricular da escola 305
11.1 O ncleo orientador do projecto 305
11.2 Usando um quadro questionador para a construo do projecto 315
11.3 Prioridades curriculares 338
11.4 Metas curriculares e definio de estratgias 344
11.5 Um projecto em que todos tm de participar 357
11.6 Algumas peas do puzzle 369
11.6.1 Dependncias 369
11.6.2 Plano de Actividades e Regulamento Interno 375
11.7 Avaliao 388
11.7.1 O professor avaliador das aprendizagens e de projectos 392
11.7.2 Avaliando o projecto 430
11.8 reas Curriculares No Disciplinares 491
11.9 reas Curriculares Disciplinares 510
V Parte Construindo o Projecto Curricular de Turma, passo a passo 522
12. Passo Uma turma com projecto 522
Introduo 522
12.1 Uma proposta inovadora 530
12.2 Que conhecimento para a construo do projecto curricular 546
12.3 O primeiro encontro do conselho de turma 562
12.4 O projecto Quem somos ns? o diagnstico 581
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12.5 O Projecto Curricular de Turma 594
12.5.1 Momentos da construo 594
12.5.2 O projecto Uma Histria de Natal 603
12.5.3 O projecto Animais Fantsticos 615
12.5.4 O projecto Uma visita corte do Rei D. Dinis 620
12.5.5 O projecto Afinal o que estudar em casa? 623
12.6 A Avaliao 627
12.7 Do projecto curricular da escola ao projecto curricular de turma 650
ltimo Passo Concluses 656
Referncias 718
xiii
ndice de Figuras Pgina
Figura 1 Foras que influenciam a tomada de decises curriculares 6
Figura 2 Representao dos vrios espaos da aco do professor que lhe permi-te contribuir para o desenvolvimento e manifestao da Inteligncia da Escola
35
Figura 3 Inteligncia, Aprendizagem e Mudana Quadro representando as pro-blemticas que estruturam este estudo.
41
Figura 4 O Projecto de Escola como resultado da trade Inteligncia, Aprendiza-gem e Mudana.
43
Figura 5 O Projecto de Escola potenciador do desenvolvimento profissional, do desenvolvimento organizacional e do desenvolvimento do currculo, existindo uma interdependncia estreita entre eles, crescendo ou estagnando em conjunto
44
Figura 6 Esquema globalizador da investigao, mostrando a dinmica e a inter-dependncia entre o desenvolvimento das dimenses escolares e a Inte-ligncia, a Aprendizagem gerada e a Mudana implicada pela constru-o de um Projecto de Escola
44
Figura 7 Representao das foras que influenciam a construo do projecto no quadro de inovao exigido na Reorganizao Curricular: um vrtice ocupado pelo currculo, outro pelas orientaes que permitem o desen-volvimento contextualizado desse currculo e o terceiro vrtice pelas regras, as leis que tm de ser cumpridas, qualquer que seja a perspec-tiva educacional defendida pela escola
46
Figura 8 Diagrama representando o tempo de imerso do investigador na Escola da Torre
85
Figura 9 A relao intrnseca entre a Teoria Trirquica de Sternberg e a Teoria das Inteligncias Mltiplas, a primeira referindo-se ao processamento dos mecanismos cognitivos da inteligncia e a segundo caracterizando a multiplicidade dos domnios da inteligncia
143
Figura 10 Viso integradora do quadro terico da inteligncia e do desenho curri-cular do ensino bsico portugus
146
Figura 11 Modelo integrado de inovao, segundo Alonso (2005) 173
Figura 12 Domnios do saber da Escola Inteligente 176
Figura 13 Caractersticas de uma escola eficaz 187
Figura 14 Esquema representativo da Inteligncia Colectiva Escolar 200
Figura 15 A pirmide conflitual que se estabelece entre a Escola, a Famlia e a Sociedade, quando se discute a responsabilidade social da educao escolar
220
Figura 16 Identificao das fragilidades da vida da escola e das propostas de mudana inseridas no projecto de Gesto Flexvel do Currculo
240
xiv
Pgina
Figura 17 Actividades desenvolvidas pelos professores ao longo do primeiro ano da experincia da Gesto Flexvel do Currculo tendo em vista a cons-truo de Projectos Curriculares de Turma
251
Figura 18 Preparao da mudana atravs de ciclos de reflexo-aco-avaliao envolvendo trs dimenses da escola
253
Figura 19 Desenvolvimento do conceito de Projecto Educativo 301
Figura 20 Fontes do projecto de escola 310
Figura 21 As questes do Projecto Curricular 317
Figura 22 Ncleos de desenvolvimento curricular decididos pela escola e que orientam a construo dos projectos das turmas.
340
Figura 23 As metas decididas pela escola e os movimentos que organizam a sua concretizao
343
Figura 24 As responsabilidades e parcerias encontradas para o desenvolvimento do projecto da escola
350
Figura 25 Os ncleos de construo curricular existentes no projecto da Escola da Torre
364
Figura 26 Nveis de desenvolvimento do indicador O aluno capaz de cumprir o tempo das tarefas
412
Figura 27 Percentagem de insucesso por ano de escolaridade (referida ao nmero de alunos retidos) no ano lectivo correspondente aos relatrios apre-sentados
444
Figura 28 No estudo acompanhado as actividades resultaram da deciso de 452
Figura 29 Na rea de projecto as actividades resultaram da deciso de 453
Figura 30 O estudo acompanhado desenvolveu actividades tendo em vista a aprendizagem de
454
Figura 31 Nos processos de avaliao do estudo acompanhado participaram acti-vamente
455
Figura 32 Tratamento grfico das respostas dadas primeira questo 463
Figura 33 Grficos correspondentes avaliao que os directores de turma faziam da participao do conselho de turma na construo do projecto curri-cular
468
Figura 34 Pressupostos a ter em conta na proposta para a construo de um Pro-jecto Curricular.
526
Figura 35 Representao da Turma como um grupo que se desenvolve ao construir conhecimento que permite resolver os problemas que surgem na gesto do currculo e na compreenso do mundo
529
xv
Pgina
Figura 36 Representao da Escola como um grupo de Turmas que se influenciam, que partilham conhecimento, que constroem conhecimento colaborati-vamente, que perseguem metas globais comuns.
530
Figura 37 Os vrios nveis em que se faz a construo do Projecto Curricular. 549
Figura 38 Esquema conceptual para a construo dos projectos curriculares 559
Figura 39 Uma interpretao do Currculo Nacional 561
Figura 40 Esquema apresentado aos alunos e que mostrava as linhas essenciais da metodologia de trabalho a seguir nas aulas
572
Figura 41 Os Princpios definidos para a construo do projecto curricular. 579
Figura 42 Projecto Quem somos ns? (1. parte) contribuies das reas curri-culares para o desenvolvimento do projecto
585
Figura 43 Esquema definidor de prioridades curriculares 593
Figura 44 Fases de construo de um projecto curricular 602
Figura 45 Organizador utilizado pelos professores para a seleco de competn-cias especficas
607
Figura 46 Organizao das actividades em funo do desenvolvimento das Compe-tncias Gerais e dos domnios da transversalidade nas reas do estudo acompanhado e da formao cvica.
609
Figura 47 Projecto Uma histria de Natal contribuio das reas curriculares para o desenvolvimento do projecto
610
Figura 48 Projecto Animais Fantsticos contribuio das reas curriculares 619
Figura 49 Projecto Uma visita corte do Rei D. Dinis contribuio das reas curriculares
621
Figura 50 Projecto Uma visita ao oceanrio 622
Figura 51 As questes da avaliao segundo Alonso (2005) 631
Figura 52 Percurso seguido pelos alunos para se tornarem mais autnomos nos processos de estudo pessoal
634
Figura 53 Contribuio do estudo acompanhado 639
Figura 54 Contribuio da rea de projecto 640
Figura 55 Avaliao intermdia individual 642
Figura 56 Dados referentes aos processos de aprendizagem da turma Y 647
Figura 57 A motivao sentida pelos alunos em cada rea disciplina 648
Figura 58 Organizao dos grupos pedaggicos da escola como apoio construo dos projectos curriculares de turma
653
xvi
ndice de Quadros Pgina
Quadro 1 Factores condicionantes dos processos de aprendizagem identificados pela Escola da Torre e registados no documento que apresenta o Pro-jecto Educativo para o trinio 1999/2002
50
Quadro 2 Taxas de transio do ano lectivo 1998/99 51
Quadro 3 Problemas identificados pela Escola da Torre e estratgias implementa-das para a sua resoluo
54
Quadro 4 Estratgias propostas para possibilitar a concretizao dos objectivos 55
Quadro 5 Caractersticas dos Estudos Etnogrficos identificadas na presente investigao
66
Quadro 6 Apresentao sucinta de algumas Janelas de Oportunidade e indicao de alguns dos estmulos que podero levar a uma aprendizagem mais efectiva
106
Quadro 7 Actividades capazes de estimular o pensamento inteligente. 125
Quadro 8 As oito inteligncias identificadas na Teoria das Inteligncias Mltiplas de Gardner
129
Quadro 9
Recursos de ensino de acordo com a Teoria das Inteligncias Mltiplas identificados por Armstrong (1994) e Campell (1997)
140
141
Quadro 10 Onze caractersticas encontradas nas escolas eficazes 184
Quadro 11 Inteligncias Mltiplas na Escola 202
203
Quadro 12 Identificao dos constrangimentos a enfrentar para a mudana da escola e as condies capazes de apoiar essa mudana
242
Quadro 13 Alguns aspectos que mostram a mudana de prticas e, obviamente, de concepes, por que os professores tm de passar ao participarem no projecto de Gesto Flexvel do Currculo.
246
Quadro 14 Potencialidades e constrangimentos do primeiro ano da Gesto Flexvel do Currculo na Escola da Torre a opinio de professores, alunos e pais.
257
Quadro 15 Mapeamento da Inovao na Escola da Torre 304
Quadro 16 Os nmeros que representam as pessoas do Agrupamento da Torre 321
Quadro 17 Recursos curriculares do Agrupamento da Escola da Torre 322
Quadro 18 Constrangimentos identificados no agrupamento da Escola da Torre ao nvel das aprendizagens
326
Quadro 19 Constrangimentos identificados no agrupamento da Escola da Torre ao nvel das competncias sociais.
330
xvii
Pgina
Quadro 20 Potencialidades identificadas no agrupamento da Escola da Torre. 335
Quadro 21 Os subprojectos da escola de apoio ao desenvolvimento do currculo 352
Quadro 22 Responsabilidades de cada grupo pedaggico da escola na construo do projecto colectivo
356
Quadro 23 Passos da construo do Projecto de Escola, mostrando o envolvimento de todos os professores, pais e encarregados de educao e funcion-rios da escola
367
368
Quadro 24 Plano de Actividades da Escola da Torre 386
Quadro 25 Plano de Actividades da Escola da Torre 387
Quadro 26 Indicadores de apoio ao desenvolvimento das Competncias Gerais (as cinco primeiras competncias gerais)
407
Quadro 27 Indicadores de apoio ao desenvolvimento das Competncias Gerais (as ltimas cinco competncias gerais)
408
Quadro 28 Um dos cenrios possveis do desenvolvimento de uma das competn-cias do currculo nacional
413
Quadro 29 Critrios Gerais de Avaliao 423
Quadro 30 Estratgias sugeridas pelos conselhos de turma para a resoluo dos problemas detectados
433
Quadro 31 Relatrio intermdio do Grupo de Trabalho do Sucesso 434
Quadro 32 Ponto de situao do projecto Bem-estar 435
Quadro 33 Extracto do relatrio final de ano lectivo de um departamento curricu-lar
437
Quadro 34 Extracto do relatrio final de ano lectivo do Centro de Aprendizagem 438
Quadro 35 Extracto do relatrio final de ano lectivo da Sala de Estudo 439
Quadro 36 Extracto do relatrio do projecto Biblioteca 439
Quadro 37 Extracto do relatrio do grupo de investigao Multiculturalidade 440
Quadro 38 Extracto do relatrio do projecto Radical 441
Quadro 39 Extracto do relatrio do projecto Clube da Floresta 441
Quadro 40 Extracto do relatrio do projecto Oficina da Sade 442
Quadro 41 Extracto do relatrio do projecto Grupo de Teatro 442
xviii
Pgina
Quadro 42 Extracto do relatrio do projecto Sucesso 443
Quadro 43 Extracto referente ao coordenador da Gesto Flexvel do Currculo na Escola da Torre
445
Quadro 44 Extracto do relatrio da coordenao do estudo acompanhado do 7. ano de escolaridade
446
Quadro 45 Levantamento dos dados de um relatrio da direco de turma 447
Quadro 46 Informao constante no guio para a realizao de dois encontros de reflexo.
448
Quadro 47 Participao dos professores no questionrio sobre reas curriculares no disciplinares
451
Quadro 48 Os resultados observados pelos professores no estudo acompanhado 456
Quadro 49 As qualidades encontradas pelos professores no estudo acompanhado 456
Quadro 50 As caractersticas dos alunos que so promotoras das dificuldades senti-das pelos professores no desenvolvimento da rea
457
Quadro 51 As caractersticas do estudo acompanhado que so promotoras das difi-culdades sentidas pelos professores no desenvolvimento da rea
458
Quadro 52 Sugestes de aces para melhorar o desenvolvimento do estudo acom-panhado
459
Quadro 53 Observaes feitas pelos professores sobre a rea do estudo acompa-nhado.
459
Quadro 54 Apresentao dos resultados referentes 2. questo 464
Quadro 55 Apresentao dos resultados referentes 3. questo 465
Quadro 56 Extracto do relatrio do grupo de acompanhamento do PCE mostrando o mbito da sua mediao
483
484
Quadro 57 Avaliao do Projecto da Escola da Torre 487-
-490
Quadro 58 Relao entre Competncias Gerais e as Competncias Especficas da rea das Cincias da Natureza
513
514
Quadro 59 Aprendizagens em Cincias ao longo do Ensino Bsico 515
Quadro 60 Articulao vertical das aprendizagens em Cincias no Ensino Bsico 516
517
Quadro 61 Critrios de Avaliao rea das Cincias Naturais 518
xix
Pgina
Quadro 62 Indicadores Gerais de Desempenho em Cincias Naturais 519-
-521
Quadro 63 Horrio das Turmas das reas orientadas pelo Ncleo de Exclusividade 543
Quadro 64 Registo dirio do aluno sobre o trabalho realizado 584
Quadro 65 Construo do Projecto Curricular de Turma Definio de prioridades Turma Y
591
592
Quadro 66 Ponto de situao do desenvolvimento do projecto da turma 614
Quadro 67 A recolha de dados relativa aos aspectos a avaliar em estudo acompa-nhado.
633
Quadro 68 A opinio dos alunos da turma sobre as aprendizagens realizadas em cada rea curricular
637
638
Quadro 69 O esforo de aprendizagem dos alunos da turma Y 643
Quadro 70 Fichas de registo das aprendizagens referentes ao aluno Antnio, da turma Y
644
Quadro 71 Extracto de uma ficha de registo do desenvolvimento de competncias referente a um dos alunos da turma Y
645
1
2
Na lngua chinesa, dois smbolos representam
a palavra aprender. O primeiro significa estu-
dar e composto de duas partes: um smbolo que
significa acumular conhecimento colocado
sobre outro que representa uma criana parada em
uma porta, reflectindo, protegida e apoiada.
O segundo smbolo significa praticar cons-
tantemente e mostra um pssaro desenvolvendo a
capacidade de sair do ninho, experimentando. O
smbolo de cima representa o voo, e o de baixo, a
juventude.
Senge, 2005
Este um trabalho sobre a aprendizagem que a escola
realiza para desenvolver a sua inteligncia: estudando, reflec-
tindo, experimentando, praticando e actualizando-se de acor-
do com as exigncias dos contextos.
3
4
Introduo
A complexidade como realidade
As escolas sempre se caracterizaram por serem organizaes complexas
graas multiplicidade de perspectivas, actos e relaes que se estabelecem
entre as pessoas que esto envolvidas nos processos de aprendizagem. Os
estudos que se tm efectuado sobre a escola tm permitido uma maior cons-
cincia dessa complexidade, dando sentido s preocupaes que todos expres-
sam, os alunos e os seus representantes, os professores, e outros elementos
da comunidade educativa, embora as diversas vozes se coloquem, muitas
vezes, em vertentes diferentes do campo de discusso.
A complexidade percebida com mais acuidade pelos professores, res-
ponsveis que so pela mediao dos processos de aprendizagem, gerindo o
conhecimento profissional e as orientaes curriculares nacionais tendo em
conta as caractersticas da comunidade educativa, equacionando os percursos
de ensino que se estabelecem perante os percursos de aprendizagem de cada
aluno. Quando a escola organiza os alunos por turmas e as turmas se organi-
zam por anos que, por sua vez, se coleccionam em ciclos e, estes, em unida-
des de ensino1 e quando a perspectiva educacional defendida formalmente no
pas (cf. Currculo Nacional, 2001), implica a viso de cada aluno como sendo
o centro do processo educativo, ento fcil perceber que a complexidade
a malha que d consistncia s interaces e aos acontecimentos em face da
intencionalidade da escola e da gesto da ambiguidade e da incerteza (Morin,
1991). Da nasce a necessidade de dissecar as variveis para compreender as
aces e os seus efeitos, para seleccionar os elementos da ordem e da certe-
za, e construir conhecimento til para agir em face de novas interaces, de
novos acontecimentos. recorrendo ainda a Morin (1997) que se pode afirmar
que a ambiguidade e a incerteza s primeira vista podem ser consideradas
como insuficincias ou lacunas na comunicao ecossistmica. Numa anlise
mais cuidada so j encaradas como factores de complexidade, de requinte e
de subtileza.
1 Unidades de ensino podem-se referir-se a ciclos de escolaridade como o caso da Educao de Infncia, do Ensino Bsico, do Ensino Secundrio e do Ensino Superior, ou a outros progra-mas organizados de ensino-aprendizagem.
5
A inevitabilidade da mudana
Em cada ano lectivo as condies da escola mudam. Mudam as pessoas
e mudam as orientaes curriculares. No apenas a entrada e a sada dos
alunos, face a perodos de incio, fim ou transio do percurso educativo, no
s a enorme mobilidade permitida e exigida aos professores mas , tambm,
o conjunto de leis, decretos, despachos, portarias ou simples informaes
que, momento a momento, assolam as escolas, exigindo mudanas. Por vezes
so pequenas alteraes legislativas que condicionam a organizao ou tor-
nam mais relevante um ou outro aspecto curricular. Outras vezes, so verda-
deiras reformas, implicando grandes transformaes que afectam o sistema
educativo a nvel da organizao, da formao dos intervenientes e das con-
cepes sobre ensinar e aprender, alterando-se os princpios pedaggicos e os
papis de professores e alunos e, por isso, alterando-se o currculo. Essas
reformas, qualquer que seja o nome por que vo ser conhecidas, implicam
processos complexos de inovao que, de alguma forma, afectam as prticas
educativas. Os professores tero de conhecer o que h de novo, interpret-lo
luz das suas convices, dar-lhe significado em face das condies do con-
texto em que desenvolve a sua profisso e tomar decises que passam por
manter ou alterar as rotinas. Tudo isto implica a construo de um conheci-
mento profissional permanente atravs de atitudes reflexivas e investigativas,
capaz de introduzir transformaes na escola a tempo de se cumprirem
aprendizagens com periodicidade estrita como a que ditada pelo planea-
mento organizacional nacional, condicionado por perodos e anos lectivos.
Este estudo passa-se nesse tempo de exigncia de inovao e sobre o
trabalho de recolha e gesto de dados, de tomada de decises, de construo
de conhecimento em face da necessidade de exercer a profisso de professor
numa escola que, continuamente, est a mudar e em que cada um apenas
um rendilhado numa vasta teia que constitui o seu projecto educativo. um
trabalho sobre o pensamento e a aco do professor gerindo as foras que se
estabelecem entre o espao individual, os espaos dos grupos a que pertence
e o espao criado pelas orientaes curriculares nacionais (figura 1, na pgina
seguinte), foras que exigem a mudana, numa Escola Inteligente.
Apesar do valor atribudo aos trs eixos que definem esta descrio o
6
espao, o tempo e as pessoas envolvidas uma histria que se entende livre
do valor de cada um desses eixos porque corresponde ao esforo de com-
preenso e organizao do saber-fazer de um grupo de profissionais, desafia-
dos pela vontade de lutar contra a frustrao e apoiados por um projecto de
inovao. Ora, esses estmulos repetiram-se ou podero vir a repetir-se em
qualquer outro espao, tempo, envolvendo outras pessoas e apesar de produ-
zirem histrias diferentes, todas elas sero resultado da Inteligncia dessa
escola.
Aco Inteligente
Figura 1 Foras que influenciam a tomada de decises curriculares, quer no espao dos variados grupos pedaggicos existentes nas escolas, quer no espao da responsabilidade de cada professor, individualmente.
O trabalho que me propus desenvolver construiu-se em torno da neces-
sidade de conhecer a escola, uma escola especfica, e de perceber de que
forma os papis dos vrios intervenientes no processo educativo compem a
coerncia necessria ao desenvolvimento de um currculo que serve de modo
individual, a cada um dos alunos, atendendo s suas caractersticas e, de
modo plural, ao grupo de alunos que frequenta essa escola.
Foi minha preocupao compreender o meu papel como professora e
construir o conhecimento que me permitisse uma aco conciliadora das
vrias responsabilidades profissionais, tentando compreender e gerir a com-
plexidade, fazendo a ponte entre o meu campo profissional particular, indivi-
7
dual, e o campo do colectivo, no caso dos grupos pedaggicos a que fui per-
tencendo e das relaes com os alunos e com os vrios parceiros influentes
nos processos de aprendizagem.
Este trabalho corresponde a um tempo de vida da escola caracterizado
por um misto de entusiasmo, de esperana e de receio, de desconforto, de
intranquilidade. Foi um tempo de conflito. Conflito individual, em que as pes-
soas estavam permanentemente procura de um caminho por entre as suas
prticas e as suas convices e as exigncias de mudana que iam aparecen-
do, ora vindas do Ministrio da Educao, ora produzidas pela prpria escola.
Um tempo de insegurana porque se vivia permanentemente na dvida, ques-
tionando a validade dos percursos escolhidos, misturando certezas e hesita-
es, o que resultava, na realidade, de um andar para a frente e para atrs,
no se percebendo se havia realmente caminho ganho quando a principal
referncia, mais do que o conhecimento construdo pelos professores e a sua
satisfao em lidar com as prticas experimentadas, era a aprendizagem rea-
lizada pelos alunos.
Uma histria sem princpio nem fim
Este trabalho espelha essa insegurana, a desordem temporal das deci-
ses, a dificuldade em compreender se as opes fizeram os efeitos esperados
e quais as causas dos insucessos ou dos sucessos. Por isso, no uma narrativa
sujeita a princpio, meio e fim. Eu cheguei escola num momento em que a
histria j tinha comeado, j tinha ganho velocidade, conquistado protago-
nistas e pblico. A minha primeira tarefa foi perceber o que j tinha aconte-
cido, interpretar os sinais e integrar-me na histria, procurando entender qual
era o meu papel, que valor teria na rede multidimensional da vida escolar,
que espao se abriria para a minha participao, quer a nvel das ideias, quer
das aces. Esse trabalho de recolha de dados e interpretao regula toda a
histria. Depois, saio de mansinho, porque tudo continua sem a minha
influncia. Da a histria no ter fim. um contnuo em que s se conta uma
parte, aquela em que participei e, mesma essa, influenciada pelas foras que
moldaram as observaes e as interpretaes que fui fazendo s ou em parce-
ria com os elementos dos grupos de trabalho em que me integrei e com as
8
pessoas que consultei. Se pensarmos nos acontecimentos que ocorreram na
escola no tempo em que decorreu este estudo, a narrativa que agora introdu-
zo representar uma pequena parte e no deixar de estar enfeitada com as
minhas convices, por muitos esforos que tenha feito para tentar no alte-
rar a viso dos outros.
Das coisas que aconteceram algumas sero continuadas, melhoradas,
outras sero esquecidas, apagadas, eliminadas. A proporo entre as que se
mantero e as que iro desaparecer irrelevante. O resultado depende ape-
nas do que a escola validou como sendo til de ser continuado, em face das
inmeras, e muitas vezes, contraditrias foras que se sentem no seu interior.
o que a escola precisa que acontea. Para o bem ou para o mal. De acordo
com o que as pessoas pensam e querem, como so capazes de entender o
papel da escola e o seu prprio papel, nessa escola.
Algumas questes de partida
Sem dvida que este trabalho retrata um tempo de mudana na escola.
A necessidade de mudana2 surge na encruzilhada de duas vontades, a do
governo central e a da escola. Surge um tempo de privilgio em que as duas
vontades tm o mesmo sentido e se unem na conquista dessa mudana. Esse
tempo breve e acompanha a experincia da Gesto Flexvel do Currculo. O
afastamento inicia-se com a Reorganizao Curricular, obrigando a uma gene-
ralizao das experincias inerentes Gesto Flexvel do Currculo em todas
as escolas, estivessem ou no preparadas para esse movimento, estivessem ou
no convencidas dos seus bons efeitos.
A inovao implicada nestes movimentos centrou-se na centralidade da
escola como construtora do seu projecto em vez de continuar a obedecer a
um desenho imutvel oferecido pelo rgo de gesto curricular nacional. O
poder de construir o currculo levou a que a escola tivesse que mudar, no s
as suas rotinas, como, tambm, o pensamento pedaggico que as suportava. E
foi assim que comearam os processos de mudana. Repare-se que a inovao,
pelo seu carcter abrangente e tendo como sentido nico a melhoria da esco-
2 [U]m dos muitos conceitos abusivamente esvaziados na nossa linguagem corrente que a partir sobretudo da dcada de 90 do sculo passado fez mexer as lgicas dos sistemas educa-tivos em todo o mundo (Roldo, 2005, p. 5).
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la, envolve muitas decises que, tornadas aco, compem essa mudana.
A questo perceber se a mudana mantm esse sentido de melhoria e
se concretiza a inovao pretendida. Interessa, tambm, perceber se houve
realmente mudana relativamente s situaes que foram valorizadas terica
ou legislativamente ou apenas se cirandou em torno da compreenso da exi-
gncia de mudana, isto , se a maior parte do esforo feito pelos professores
e outros parceiros, no ficou por uma reflexo sobre o como fazer a escola
mudar e no se ter chegado verdadeiramente mudana prevista. Projec-
tou-se a mudana, discutiram-se concepes, pediram-se opinies e a partici-
pao activa de todos, desenharam-se inmeras aces inovadoras, atribu-
ram-se papis, funes, trajes, responsabilidades e, depois, houve mudana?
Quando se chega aco individual, dentro ou fora da sala de aula, quando se
promove o desenvolvimento do currculo, o que que acontece? Onde est o
professor? Comodamente sentado no centro do processo educativo, rodeado
ordeiramente pelos seus alunos silenciosos? Ou colocado de forma difusa, ora
aqui, ora acol, observando, orientando, mediando, provocando, espicaando,
encorajando, criticando, sugerindo caminhos, num clima de trabalho cont-
nuo, interessante e produtivo? O que que os alunos aprenderam, num e nou-
tro caso?
E a escola? De que forma se organiza para ser verdadeiramente respon-
svel pela criao das condies que facilitam a aprendizagem dos seus alu-
nos? De que forma percebe se as decises que toma com carcter colectivo,
se os processos grupais que desenvolve instigam, viabilizam, desafiam, clarifi-
cam, tendo em vista a obteno dos resultados previstos? E o que faz em fun-
o dessa reflexo?
Quando se questiona o lugar do professor e do aluno no processo educa-
tivo pensa-se no apenas na relao directa em espao de aula, mas tambm
na forma como se organiza o trabalho da escola, os grupos pedaggicos, as
relaes com os parceiros da comunidade. Quem est no centro da escola? A
quem serve a organizao pedaggica da escola? Essa organizao compat-
vel com a mudana que se pretende? Como refere Senge, [a]ssim como
outras instituies da era industrial nos dias de hoje, as instituies educacio-
nais esto aprisionadas em extraordinrias correntes cruzadas de mudanas
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(2005, p.31). Saber a escola viver entre as correntes? Ter espao e tempo
para a inovao?
A reflexo e a experincia em torno dos aspectos focados tm de gerar
algum efeito porque mesmo os corpos elsticos quando forados a mudarem
no voltam depois exactamente s posies e formatos iniciais. Face aos in-
meros esforos desenvolvidos pelas polticas educativas do Ministrio da Edu-
cao e da Escola, de alguma maneira se enriqueceram as prticas pela clari-
ficao dos seus efeitos em funo dos resultados. A Escola encarada como
sistema vivo, possuindo a capacidade de se criar a si mesma, crescendo e evo-
luindo constantemente, formando novas relaes de acordo como os seus
objectivos e com os estmulos do meio envolvente (Senge, 2005), ter cons-
trudo respostas inteligentes a cada um dos esforos desenvolvidos. A questo
se esse enriquecimento se deu na direco pretendida pelos impulsionado-
res do projecto de mudana educativa.
Uma Escola que Aprende uma Escola Inteligente
Este trabalho pretende analisar a dinmica escolar em mudana, com-
preender as contribuies individuais e colectivas, construindo conhecimento
sobre a natureza e a especificidade da referida mudana, identificando a sua
relao com os processos de aprendizagem, isto , os efeitos na aquisio e
desenvolvimento das competncias do aluno, de acordo com um quadro
nacional e contextualizado. O que pretendo, realmente, perceber se a esco-
la onde se desenvolveu este trabalho uma Escola Inteligente. Como refere
Carneiro, referindo-se escola,
[u]ma organizao inteligente por contraste com uma organizao estpida aquela que tem um comportamento biolgico (e no meca-nicista): evolui constantemente por aprendizagem, por adaptao e ino-vao [] , ento, aquela que constri margens de liberdade para reali-zar tudo que necessrio sua constante renovao: planos, projectos, programas de actividades em conformidade com as suas metas, avaliao e inflexes de percurso. (2004, pp. 153 -155).
A escola manifestou-se como uma Escola Inteligente, enquanto decor-
reu esta investigao? Terei participado, como profissional e investigadora, na
construo e na manifestao dessa inteligncia? essa inteligncia da esco-
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la, uma Inteligncia Colectiva3? O encorajamento da mudana, ou o seu impe-
dimento, foi resultado da manifestao de uma inteligncia observada segun-
do uma perspectiva holstica, isto , em que a Inteligncia da Escola tem de
ser mais complexa, mais brilhante do que a soma da inteligncia de todos os
seus elementos? Ou a mudana um imperativo intemporal e sem um territ-
rio bem definido, que acontece porque a escola reage s motivaes indivi-
duais internas, e que dura tanto quanto dura esse estmulo? Ser que a Inteli-
gncia da Escola , realmente, uma Inteligncia Colectiva?
As caractersticas de uma Escola Inteligente esto profundamente rela-
cionadas com a aprendizagem reflexiva, isto , a construo de conhecimento
atravs de processos em que os professores, os alunos, os seus pais e outros
parceiros claramente identificados, reflectem e agem sobre os acontecimen-
tos, as informaes, os resultados das aces e o porqu desses resultados,
para que o conhecimento sobre a organizao escolar e os processos de
aprender e ensinar, no seja apenas retido, mas tambm compreendido e uti-
lizado ou transferido para novas situaes, numa perspectiva de aproximao
ao ideal.
Colocando a aprendizagem reflexiva no centro de todos os processos da
escola, ento, esta converte-se numa comunidade aprendente, em desenvol-
vimento, dinmica, inteligente, capaz de, em qualquer momento, transformar
as prticas educativas e organizacionais, como forma de conseguir melhores
resultados. A viso da escola como uma unidade complexa, viva e inteligente
e como comunidade aprendente a resposta a um mesmo quadro conceptual.
Uma Escola que Aprende uma Escola Inteligente. Basta pensar que a Inteli-
gncia da Escola se manifesta no espao da identificao e da resoluo de
problemas (no mbito do conhecimento cientfico actualizado, do pensamento
e do comportamento das pessoas da escola, da pedagogia e do currculo) e o
3 Mais tarde debaterei o conceito de Inteligncia da Escola e a sua relao com a Inteligncia Colectiva. Para j, numa definio simples poder-se- entender Inteligncia Colectiva Esco-lar, como o conjunto de competncias construdas por um grupo, neste caso, a comunidade educativa, que lhe permite identificar os problemas que afectam o desenvolvimento desse grupo e resolv-los a partir de aces partilhadas e integradas. A Inteligncia da Escola mani-festa-se, na generalidade, na colaborao e no compromisso construdo entre todos os ele-mentos da escola para alcanar metas que fazem sentido para cada um. A Inteligncia Escolar no implica que todos tenham de pensar da mesma maneira e, dessa forma, tenham de agir da mesma maneira, mas que todos colaborem para um fim comum.
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encontrar dos caminhos para a sua resoluo, constitui um corpo de conheci-
mentos disponvel para ser utilizado, adequado, modificado em novas situa-
es. Este corpo de conhecimentos torna-se uma bagagem resultante da
aprendizagem da prpria escola, podendo ser preservado no sentido de mobi-
lizao futura. So referidas aqui as competncias que as pessoas desenvol-
vem enquanto comunidade escolar, enquanto grupo com finalidades comuns,
como a criao de condies para que os alunos aprendam de acordo com as
suas necessidades e os quadros definidos a nvel nacional.
Apesar da lgica presente na viso da Escola Inteligente e por isso
Aprendente, as questes colocam-se nos processos que levam a uma conscin-
cia colectiva dessa aprendizagem e do que fazer com ela, da comunicao e
partilha de experincias, na reflexo conjunta sobre os problemas. As ques-
tes aqui centram-se na abrangncia dessa aprendizagem. Quais as condies
para que a escola se veja como uma comunidade aprendente? E quais so as
consequncias de a escola se constituir como uma comunidade aprendente?
Uma esfera de incerteza
As preocupaes enunciadas com as melhores condies para aprender
passam pela intranquilidade com que se encaram os efeitos da educao. No
incio do sculo XXI, a escola bsica portuguesa, seguindo a tendncia de mui-
tos pases, vive a premncia de uma mudana profunda, determinada pela
incoerncia entre o sucesso que certifica e os seus efeitos sociais. Todos os
discursos do a mudana como urgente, no s para salvar a imagem da esco-
la, mas tambm para, acreditando nos seus efeitos, colaborar na construo
de uma sociedade mais apta ao sucesso e felicidade porque imprescindvel
que a escola corresponda aos propsitos que o indivduo e a sociedade espe-
ram dela, em face da responsabilidade social que a educao aufere.
A escola vista como responsvel pela orientao dos processos que
permitem s pessoas aprender a escolher os melhores caminhos de vida e,
para isso, segundo Pires, essencial que desenvolva
a formao de capacidades para o exerccio de uma cidadania proficien-te, em trs vertentes dominantes: interventor no governo da polis, pro-vedor da sua sustentao econmica e cooperador na coeso social que ao grupo e a cada um interessa ... a inteno de conferir todo o potencial
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para cada um vir a procurar ser feliz, conseguir resistir s adversidades que so prprias da condio humana e a aprender a conviver s e frater-nalmente com os outros, aceitando-os e sendo aceite, num esprito de justia e de tolerncia. (1996, p. 23)
Em face da complexidade apresentada pela populao escolar, quer
quanto s aprendizagens que realizou e de que est convicto entrada da
escola, quer quanto s suas pretenses pelos efeitos da escola no seu futuro,
as tarefas dos educadores parecem imensas, diversas e difceis.
Apesar de todas as intervenes de polticos e educadores, mostrando
que a escola bsica portuguesa do final do sculo passado, dificilmente cons-
titui a resposta ao sucesso necessrio, h uma opinio unnime de que a
mudana da escola est a ser feita de forma excessivamente lenta, identifi-
cando-se muitos dos factores que entravam essa mudana, uns relacionados
com o apoio poltico dos rgos de deciso central, outros com as dificuldades
sentidas pela escola para construrem, desenvolverem e avaliarem os seus
projectos utilizando os recursos que esto disponveis.
Muito se tem escrito sobre a dificuldade que as pessoas tm, nas esco-
las, em gerir os processos de mudana e de inovao. Fullan (2003) refere que
complexidade significa mudana, mas significa sobretudo uma mudana no
linear e imprevisvel, que ocorre rapidamente e a nossa cultura parece
especializar-se em inovao desenfreada. (p. 7)
Mudar, para o professor, significa tomar decises, muitas vezes com
prazos estreitos, sem tempo para poder reflectir e preparar a aco. Se, con-
forme refere Fullan, usando as palavras de Steinberg, [a] verdadeira essncia
da inteligncia deve estar na capacidade de saber quando se deve pensar e
agir rapidamente e quando se deve pensar e agir devagar, pode-se imaginar
a insegurana dos professores ao sentirem que no podiam dominar o tempo
enquanto tomavam decises sobre uma srie de comportamentos profissionais
a ter dentro e fora da sala de aula, dentro e fora dos grupos pedaggicos, com
os alunos, com os colegas de trabalho, com auxiliares de aco educativa,
com encarregados de educao. Esto em causa um sem nmero de decises
sobre um sem nmero de assuntos, formas inovadoras de se ser profissional,
que arrastam consigo a quebra dolorosa dos hbitos, alguns deles sentidos
como sendo fceis e de sucesso.
14
Mudar entrar numa esfera de incerteza.
A mudana no passa apenas pelos professores, embora possam ser
considerados os principais impulsores. A maneira como todos os elementos da
comunidade educativa esto na escola e a representam o espelho dos pro-
cessos de trabalho para a continuidade ou para a mudana. Os movimentos
organizacionais, pedaggicos, relacionais, em torno do desenvolvimento de
um currculo contextualizado, so responsabilidade de toda a comunidade
educativa e espelham o sucesso da escola. atravs desses movimentos que a
escola espera resolver os seus problemas, superar os obstculos, aproximar-se
do idealizado. Assim, possvel relacionar a facilidade que a escola mostra
em introduzir processos inovadores em favor do xito real dos alunos com a
ideia de se estar perante uma organizao inteligente. Inteligncia e mudana
parecem estar associadas. Mas estaro? Em que situaes que a escola mos-
tra vontade de mudar? E se no mudar? Manter procedimentos habituais ser
sinal de uma organizao pouco inteligente? A escola que no muda em face
das obrigaes que lhe so impostas, insurgindo-se e argumentando em funo
de escolhas conscientes e epistemologicamente fundamentadas, no uma
escola inteligente?
Naturalmente que estas questes s podero ser abordadas com pro-
fundidade depois de discutido o conceito de inteligncia, quer na perspectiva
do Homem, quer das organizaes.
Numa comunidade educativa, os processos de deciso esto principal-
mente nas mos dos professores, os especialistas em educao. Estes dividem
entre si a autoridade que lhes permite decidir sobre os vrios aspectos da ges-
to da escola, desde a orientao de mtodos que se relacionam com o mode-
lo de organizao e a concretizao do projecto escolhido para a escola, at
ao desenvolvimento de um projecto particular de ensino. Cada professor um
elo na cadeia da organizao escolar, interferindo em cada uma das decises,
atravs de um conjunto complexo de comportamentos, que vo desde a for-
mulao viva de opinies, at ao silncio. Como refere Fullan, a mudana
educacional depende do que os professores pensam e fazem e to simples
e to complexo quanto isso (1991). Se o projecto educativo da escola se cons-
tri a partir de decises, o seu desenvolvimento baseia-se nos comportamen-
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tos e a sua exequibilidade e sucesso dependem do equilbrio, por vezes muito
frgil, entre as decises e os comportamentos.
Gesto Flexvel do Currculo e Reorganizao Curricular, como espaos de
mudana
Sustentando-se nos resultados de uma consulta feita s escolas portu-
guesas, o poder central, decidiu legislar as linhas mestras da mudana, dese-
nhando uma reorganizao curricular do ensino bsico, expressa no Decre-
to-Lei n.6/2001, de 18 de Janeiro, centrada na ideia de que cada escola deve
construir, ela prpria, as respostas aos seus problemas e expectativas, desen-
volvendo um projecto curricular capaz de fazer a relao entre o que a escola
e o que a comunidade educativa pretende que ela venha a ser, numa pers-
pectiva de exequibilidade.
Esta reorganizao curricular defende uma descentralizao da deciso
curricular, desafiando as escolas e os professores para a construo de projec-
tos curriculares contextualizados, especficos, isto , o desenho de propostas
para percursos de aprendizagem concordantes com a identidade de cada alu-
no, as caractersticas pessoais de pensamento e de aco individual. Entre os
mltiplos espaos disciplinares oferecido um espao no disciplinar, como
aglutinador de intenes pedaggicas. Este espao educativo aberto permite
no s a construo de caminhos prprios, reflectidos, experimentados, onde
se desenvolvem as competncias transversais que sero o suporte da autono-
mia de cada aluno, mas tambm a construo de uma viso transdisciplinar da
aprendizagem, a descoberta da sabedoria no espartilhada pelos muros cria-
dos por um modelo de ensino feito por gavetas4 onde se guardam os saberes
de cada disciplina.
A viso da escola como uma organizao capaz de construir, desenvol-
ver e avaliar projectos curriculares concordantes com as necessidades educa-
tivas de uma comunidade aprendente, podendo gerir espaos de liberdade
interdisciplinar, implica, sem dvida, que a escola, enquanto verso tradicio-
4 A metfora da gaveta mais interessante que a metfora da prateleira porque os conheci-mentos disciplinares quando guardados em gavetas ficam escondidos, armazenados, indispo-nveis. S podem ser utilizados quando se abre a gaveta. Na prateleira eles esto disposio de quem procura, tal como os livros nas estantes de uma biblioteca.
16
nal, se obrigue mudana, encontrando, inteligentemente, caminhos concor-
dantes com as suas opes e os seus recursos.
A complexidade que se apresenta aos professores quando tm de pro-
jectar processos de ensino para uma mirade de crianas ou de jovens diferen-
tes, poder agora ser simplificada pelo apoio conseguido no espao curricular
no disciplinar. Mas, a orientao desse espao obriga, s por si, a atitudes de
mudana: no possui programas, apenas orientaes educativas sobre os prin-
cpios que o devem reger e os efeitos que deve provocar, e o seu desenvolvi-
mento obriga cooperao estreita entre todos os elementos que nele inter-
ferem.
Temos ento uma escola que deve mudar e onde os professores consti-
tuem o corpo gerador da mudana. Como refere Hargreaves,
[o] envolvimento dos docentes nos processos de mudana educativa vital para o seu sucesso, especialmente se a mudana complexa e se se espera que afecte muitos locais durante longos perodos de tempo. Se desejarmos que esse envolvimento seja significativo e produtivo, ento ele deve representar mais do que a simples aquisio de novos conheci-mentos sobre contedos curriculares ou de novas tcnicas de ensino. (1998, p. 12)
A Gesto Flexvel do Currculo pretendeu esse envolvimento dos profes-
sores na construo de um conhecimento que lhes permitisse repensar as suas
prticas e os seus papis dentro da escola. A Reorganizao Curricular trouxe
a publicao de um Currculo Nacional orientado para o desenvolvimento de
competncias, o que no compatvel com espaos nicos de repeties sin-
cronizadas de contedos. A abordagem conceptual enunciada nos documentos
formais da Reorganizao Curricular clarifica a noo de competncia adopta-
da como uma noo ampla, que integra conhecimentos, capacidades e atitu-
des e que pode ser entendida como saber em aco ou em uso (DEB, 2001,
p.9), o que significa que ser competente saber no s mobilizar conheci-
mentos mas tambm combin-los, transferi-los e reconstru-los em funo do
uso criativo em situaes singulares e complexas (Alonso, 2001; LeBoterf,
2005, Perrenoud, 2001; Roldo, 2003; Tardif, 1999). Esta perspectiva curricu-
lar inclui uma viso da transversalidade do conhecimento: qualquer compe-
tncia essencial influencia cada uma das reas curriculares definidas no curr-
culo, quer atravs da sua leitura geral, quer atravs de uma leitura especfi-
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ca, o que leva a que o acesso ao conhecimento s possa ser feito recorrendo
construo de projectos, ao trabalho colaborativo entre professor e alunos.
Nesta perspectiva, no pode continuar a ser defendida uma cultura profissio-
nal solitria pois a coerncia e o equilbrio exigido conseguem-se pelo desen-
volvimento dos projectos curriculares adequados a pblicos to diversos,
como so os que frequentam hoje a escola bsica portuguesa.
Os projectos escolares, como no podia deixar de ser, implicam a
dimenso do currculo e este expandiu o seu conceito para muito alm dos
contedos programticos. A expanso do conceito de currculo e a sua trans-
formao num projecto adaptado a cada turma dilata tambm o papel do pro-
fessor para alm da sua rea cientfica de leccionao, no lhe retirando a
especificidade dos contedos e dos mtodos, mas exigindo-lhe a cooperao
com os outros intervenientes nos processos de ensino, de forma que estes
ganhem em coerncia e integrao. de no esquecer que, voltando a citar
Hargreaves,
[o]s professores no so apenas aprendizes tcnicos: so tambm apren-dizes sociais. O reconhecimento que os docentes so aprendizes sociais desloca a nossa ateno, no apenas para a capacidade de mudar, mas tambm para os seus desejos de mudana (e, com efeito, de estabilida-de). (1998, p. 12)
Assim, surge o quadro de referncia do sistema educativo portugus
actual: a converso de cada escola numa organizao que reflecte sobre si
prpria e desenvolve um projecto tendo como meta o sucesso5 de um grupo
de alunos especficos, os seus alunos. A escola, como organizao viva, que
reflecte, investiga, adequa as referncias nacionais aos contextos em que se
insere, manifesta a sua inteligncia atravs de opes organizacionais e peda-
5 Ao longo deste trabalho refiro-me muitas vezes ao sucesso. Sucesso um dos termos mais difceis de definir porque pode ser observado por olhares muito diferentes desde os que, genericamente, o entendem atravs dos resultados dos exames nacionais aos que o relacio-nam com a distncia entre o ponto de partida e o ponto de chegada, em termos de aprendi-zagens realizadas por cada aluno ou mesmo utilidade dessas aprendizagens. Perrenoud (2003, p.1) identifica dois nveis de sucesso educativo, um associado ao desempenho dos alu-nos (tm sucesso aqueles que satisfazem as normas de excelncia escolar e progridem nos cursos) e outro relativo eficcia das escolas (tm sucesso as escolas que atingem os seus objectivos). Neste trabalho o sucesso observado na perspectiva do aluno e da instituio, porque um e outro so interdependentes. A esta viso da construo colectiva do sucesso juntam-se os sentimentos de satisfao, de segurana e de confiana no futuro sentidos pelos estudantes, pelas suas famlias, pelos professores, pela escola, globalmente.
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ggicas que podem, ou no, promover a mudana. Como refere Leite,
[u]ma escola curricularmente inteligente desenvolve processos de auto-anlise das experincias de ensino, desenvolve um dilogo horizontal e vertical entre professores, estimula o confronto de opinies e incentiva e valoriza o envolvimento de toda a equipa em processos de investigao sobre as prticas, processos esses indutores de inovao. (2002, p. 18) Qualquer uma das opes decididas pela escola est relacionada com o
pensamento e a aco do professor, o seu papel e o seu comportamento den-
tro da escola, em cada um dos grupos pedaggicos em que intervm. o pen-
samento e a aco do professor, como resultante de um sistema de foras
interpessoais, que precisam a inteligncia escolar. Sendo assim, quais as
dimenses dessa inteligncia? Como se manifesta cada uma dessas dimenses?
Como se interpreta a mudana face inteligncia da escola?
Foram apresentadas as foras que geriram este trabalho e as grandes
questes que se mantiveram ao longo da sua realizao: a necessidade de
compreender que papel est reservado ao professor e a outros intervenien-
tes no processo educativo dentro de uma escola que se reconhece como
complexa, mutvel, insegura, e que precisa de construir projectos curricula-
res com diferentes graus de abrangncia para apoiar o desenvolvimento das
competncias dos seus alunos de acordo com uma viso prescritiva nacional,
estruturada nas necessidades e nas caractersticas de cada um.
Este o trabalho que me proponho apresentar, passo a passo em direc-
o compreenso da forma como se manifesta a Inteligncia da Escola.
Na primeira parte, sero dados trs passos, os que permitem apresentar
e justificar um desenho de investigao, comeando por reconhecer as condi-
es que so geradoras do problema e, a partir da, identificar as questes
orientadoras do estudo e escolher o modelo de investigao que melhor se
adeqe s caractersticas do problema e do investigador.
A segunda parte constituda por mais trs passos, os que permitem
recolher e construir conhecimento esclarecedor sobre a Inteligncia Humana e
a Inteligncia da Escola, analisando as teorias mais recentes e mais adequadas
ao estudo da organizao dos processos de ensinar e de aprender na escola.
atravs do caminho percorrido nestes trs passos que se constroem e apresen-
tam os quadros tericos sobre a Inteligncia que iro modelar a observao e
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a interpretao dos dados investigativos.
A terceira parte deste trabalho reporta-se identificao e anlise de
informao capaz de esboar as caractersticas do contexto no momento em
que se desenvolve o estudo emprico. So mais dois passos na definio e na
clarificao do caminho de investigao.
Por fim, a quarta e quinta partes, referem-se aos passos que se do no
interior dos projectos da escola e da turma, identificando-se nveis de deci-
so, desenvolvimento e avaliao, definindo-se papis e responsabilidades,
compreendendo-se as dimenses da aprendizagem que a escola tem como ins-
tituio, a relao entre a aprendizagem e a mudana e, por fim, observando
e interpretando as vrias manifestaes da inteligncia da escola.
O ltimo passo constitui as concluses deste trabalho, em que os dados
so utilizados para compreender a escola enquanto organizao colectiva que
aprende e que utiliza essa aprendizagem para mudar em funo das suas
metas, do sucesso que perspectivou para si, baseando-se na demanda do
sucesso colectivo e do sucesso individual das pessoas que nela trabalham, par-
ticularmente no sucesso dos alunos, do qual esto dependentes todos os
outros nveis ou dimenses de realizao.
20
Uma viagem de mil milhas comea com um simples passo
Lao-Tzu, 1400 a.C. (data aproximada)
21
I Parte Uma investigao no interior da escola
1. PASSO
Identificao das condies contextuais geradoras do problema
1.1 A Escola Global
Vive-se a necessidade de as escolas responderem de forma clara aos
desafios da contemporaneidade. Para tal, em Portugal, abriram-se campos de
deciso curricular que cada escola poder utilizar de acordo com as caracte-
rsticas do seu contexto e as finalidades que quiser definir. Esses campos
foram criados por um movimento de reforma iniciada pela Gesto Flexvel do
Currculo sustentada numa reflexo participada que abrangeu todas as escolas
portuguesas. Parece, no entanto, que as escolas ainda esto sob o efeito
anestsico de muitos anos de independncia disciplinar, de progra-
mas-padro, de toques de campainha marcando o incio e o fim das tarefas
disciplinares, de uma obedincia curricular padronizada, de uma viso estti-
ca e simplista do conhecimento.
[A] era industrial teve as suas razes na fascinao de Kepler, Descartes, Newton e outros cientistas do sculo XVII com o relgio como modelo para o cosmos Para estes cientistas, tornou-se natural conceber o mundo como algo feito de componentes discretos, que se encaixam como as par-tes de uma mquina. Isto levou implicao ilusria de que, um dia, o universo poderia ser completamente compreendido. O comportamento de tomos, concebidos como minsculas bolas de bilhar que vo e vm, poderia ser previsto, assim como o comportamento de objectos mais complexos montados a partir deles. (Senge, 2005, p.29)
Este pensamento motivou a organizao dos exrcitos prussianos do
sculo XVIII, e a partir destes, todos os outros exrcitos apostaram o seu
sucesso instituindo a padronizao, a uniformidade e o treino por repetio. O
mesmo aconteceu, no sculo XIX, quando os industriais construram as suas
organizaes como mquinas, criando e valorizando as linhas de montagem.
A escola pode ser o exemplo mais completo na sociedade moderna de uma
instituio que foi totalmente modelada pela linha de montagem. (Senge,
p.29)
22
Se a metfora da linha de montagem ainda servir para representar a
escola, pode-se colocar a viabilidade da construo e desenvolvimento de um
projecto na perspectiva da Gesto Flexvel do Currculo e da Reorganizao
Curricular, enquanto os velhos hbitos se mantm, enquanto o corpo docente
apreende a utilidade da mudana que lhe anunciada e, logo depois, regula-
mentada? O prprio projecto educativo criar por si s a necessidade das
estruturas organizacionais mudarem em funo dos resultados que se querem
alcanar?
Poder a escola ter um projecto para desfazer a metfora?
Como que uma escola sente a necessidade de mudar? De que forma o
projecto educativo um instrumento da mudana? De que forma a escola se
organiza em torno da necessidade de construir e desenvolver coerente e inte-
gradamente o seu projecto? Como que as pessoas da escola reagem aos seus
novos papis? Como se posicionam nas vrias fases de construo, desenvol-
vimento e avaliao dos projectos curriculares? Como se posicionam face aos
novos papis que tm de assumir, nomeadamente na orientao das reas no
disciplinares? E por fim, como decorrem os processos e quais os resultados que
se vo obtendo medida que o ano escolar avana? Como que a escola
resolve os problemas que surgem, momento a momento?
Estes so alguns problemas cruciais identificados dentro da escola que
precisam de ser estudados, clarificados, respondidos pelas pessoas que consti-
tuem a escola, mesmo que apoiados por outros investigadores, outros estudio-
sos. Essa uma tarefa que cabe, primordialmente aos que vivem os proble-
mas, que os sentem como alavancas ou como barreiras. Gardner define Inteli-
gncia como a habilidade de resolver problemas (1993). Assim, os problemas
ao serem clarificados e respondidos pelas pessoas que constituem a escola
definem uma Inteligncia Escolar: a capacidade que a prpria escola tem de
resolver as suas dificuldades e constrangimentos, encontrando percursos de
mudana.
Sem dvida que a escola, cada vez mais, se confronta com inmeros
problemas que no se resolvem pela aplicao de tcnicas universais. As pes-
soas que constituem a escola, individualmente ou nos seus grupos de relao,
imprimem estilos de reflexo e de actuao que lhes so prprios e que estru-
23
turam a construo de uma singularidade educativa. A resoluo dos proble-
mas far-se- pela aplicao de complexas habilidades individuais e de grupo,
habilidades essas que definiro, tal como na teoria de Gardner (1993), uma
multiplicidade de dimenses para a inteligncia da escola. Mas tambm pela
manifestao da inteligncia que a escola aprende e, consequentemente, vive
a necessidade de mudar, evoluir, em face dos desafios criados pelas solues
encontradas. A aprendizagem induz a mudana, porque, tal como refere
Duart, [a] escola, como organizao, tambm possui a capacidade de apren-
der. S que, tal como tantas outras organizaes, necessrio que tenha von-
tade de aplicar, de desfrutar da aprendizagem. (1999, p. 44)
Desta forma, o estudo que pretendo desenvolver tem como finalidade
obter dados que permitam compreender a Inteligncia da Escola, pela manei-
ra como os professores reagem necessidade de aprenderem novas configura-
es profissionais, como so capazes de reflectir a necessidade de introduzir
mudanas na sua prtica e depois, como decidem agir. Para tal, a observao
recair sobre dois cenrios:
A construo, o desenvolvimento e a avaliao do Projecto Curricu-
lar de Escola, de acordo com as orientaes da Reorganizao Curri-
cular, cenrio amplo em que toda a comunidade educativa se inse-
re, pela forma como o aceita e nele participa.
A construo, desenvolvimento e avaliao dos projectos curricula-
res de turma e ao papel assumido pelas reas curriculares.
Com o objectivo de melhor entender as manifestaes das vrias
dimenses da Inteligncia, os cenrios referidos sero observados segundo as
perspectivas geradas pela dualidade que se estabelece entre o formal e o
real, isto , o espao de concordncia (ou de discordncia) criado entre o
argumento e a aco, observado nas diferenas que se estabelecem entre as
decises formalizadas em documentos considerados como linhas de fora das
intenes educativas e as prprias aces educativas em contexto pedaggico.
Aqui, tem-se em conta a ideia expressa por Gore e Dunlap e referida por
Guerra: Quando a teoria exposta e a teoria em uso no coincidem, h pouca
oportunidade de aprender, porque aquilo que se faz no pode ser discutido e
o que se discute no tem nada a ver com o que se faz. (2000, p.29)
24
Entende-se que a coerncia encontrada entre a filosofia defendida para
a aco educativa e a prpria aco educativa, ser espelho da Inteligncia
da Escola, ser resultado da verdadeira vontade que os professores sentem em
promover a mudana ou manter a tradio. Hargreaves sustenta-o, quando
refere que [s]e conseguirmos compreender os desejos de mudana e de con-
servao dos professores, bem como as condies que fortalecem ou enfra-
quecem tais desejos, obteremos discernimentos valiosos ... relativos manei-
ra como a mudana se pode realizar mais eficazmente. (1999, p. 12)
Assim, a observao dos cenrios indicados anteriormente ser utilizada
para compreender em que medida a escola, pela mo dos professores que
nela trabalham, capaz de aprender a resolver as contingncias educativas
que surgem em cada momento, nomeadamente as que se configuram to
complexas como so as criadas pelas reformas educativas.
No geral, as principais questes que pretendo analisar so:
Quais as caractersticas da escola que lhe permite mudar em funo
dos desafios que vo sendo propostos ou exigidos?
Como se organiza a escola para a construo e desenvolvimento de
um projecto educativo prprio?
Como reagem os professores necessidade formal de participao
nos processos de construo e de desenvolvimento do projecto edu-
cativo?
Como a escola avalia os processos e os resultados do desenvolvimen-
to desse projecto educativo?
Como a escola reage em face aos resultados da avaliao?
Quais os efeitos que o projecto educativo tem na vida da escola,
que alteraes introduziu aps um binio de aplicao?
Como os professores reagem orientao das reas no disciplina-
res, sem programas definidos?
Como sentida a participao dessas reas no desenvolvimento do
Projecto Curricular de Turma?
Quais os resultados da avaliao dos processos de aco educativa
ao longo do ano e na transio de ano lectivo?
25
A resposta s questes enunciadas servir de ponto de partida para:
Sustentar a caracterizao da Inteligncia de uma escola,
Identificar as vrias dimenses dessa Inteligncia e
Perceber as suas manifestaes na vida escolar, na sua capacida-
de para se aperfeioar, aproximando-se das metas definidas.
Daqui decorrer a identificao das foras potenciadoras e limitativas
da aco interna da escola, tida como uma organizao viva, inteligente, que
aprende.
1.2 A Escola da Torre
Muito se tem escrito sobre a escola. Muitas investigaes se tm desen-
volvido em torno dos problemas que a escola parece sentir. Muitos desses
estudos partem de pessoas que no pertencem escola, ou pelo menos no
pertencem escola que investigam. Envolvem-se como observadores exter-
nos, tentam compreender o que se passa, seguem atentamente os comporta-
mentos e os seus efeitos, fazem questionrios, tiram fotografias com vrios
tipos de filtros mas no esto verdadeiramente dentro da escola. Consti-
tuem-se como observadores, umas vezes tentando no influenciar o ambiente,
outras vezes interferindo atravs de uma participao planeada, exigente
quanto sensibilidade, ateno e pacincia envolvidas e requerendo ainda
uma grande tolerncia pela ambiguidade (Matos, 2003). Apesar de todo o cui-
dado posto na construo das condies que revestem de rigor a observao
participante, os investigadores, quando entram no ambiente de investigao
como convidados e no como elementos de natural pertena, no podem
libertar-se da sua imagem de estranhos ao processo e, por isso, correm o risco
de se depararem com mscaras, em vez de atitudes genunas.
Foi para diminuir a possibilidade de recolher e interpretar dados mas-
carados que optei por estudar o trabalho de dentro da prpria escola, como
professora, fazendo parte integrante da comunidade educativa. E, assim,
valorizando o papel do investigador, tive em conta o facto de que a observa-
o participante, qualquer que seja o grau de participao, implica tambm a
observao do investigador (Matos, 2005). Tornei-me assim investigadora e
26
investigada, numa duplicidade de papis e responsabilidades, numa espiral
introspectiva (Kemmis & McTaggart, 1988) de ciclos ininterruptos de planifi-
cao-aco-reflexo.
Esta situao tornou-se ideal porque me permitiu encontrar directa-
mente, na primeira linha, a resposta s minhas preocupaes:
Ao entrar numa escola, como professora, qual o papel que me exigi-
do? Como fazer parte da escola, como colaborar na realizao das suas metas,
como desenvolver o conhecimento de acordo com as condies exigidas pelo
contexto?
Para compreender o que a escola exige dos seus professores, fui inves-
tigadora porque me muni das situaes problemticas e dos apetrechos meto-
dolgicos para desenvolver o estudo e, simultaneamente, ao agir na escola,
dia a dia, momento a momento, confirmando interpretaes, fui investigada.
O meu papel de investigadora expandiu-se quando fiz parte de grupos de tra-
balho, ao observar a sua discusso e actuao e, assim, compreender as
aces dos outros, na construo ou na manifestao de uma Inteligncia
Colectiva. O conhecimento adquirido enquanto investigadora foi-me muito
til enquanto elemento desses mesmos grupos. Foi-me possvel assumir a par-
ticipao na construo da realidade colectiva e da realidade individual pr-
pria, produzindo sentidos e sendo, simultaneamente, objecto de investigao
(Cadima et al. 1995). Mas tambm o processo de investigao se tornou mais
complexo quando os grupos alguns grupos se constituram como unidades
de planificao-aco-reflexo para compreenderem e construrem conheci-
mento que lhes permitisse a tomada de decises sobre o percurso da escola,
das turmas, dos alunos e, naturalmente, da actuao dos professores e dos
seus processos de ensino.
Outra das condies que pretendi para este estudo foi a preservao do
ambiente da escola, no introduzindo, de forma consciente, factores que fos-
sem estranhos ao trabalho, que provocassem reaces de desconfiana ou
estranheza, que levassem construo de comportamentos de defesa, de fic-
o, que, de alguma forma, influenciassem as observaes. Esta deciso
tomada como investigadora, no impediu de, no meu papel de professora da
escola e no decorrer do meu trabalho, apresentar, aos grupos pedaggicos em
27
que estava inserida, algumas propostas com caractersticas inovadoras, que
foram aceites, alteradas, melhoradas e postas em prtica. Outras, claro, no
foram to bem recebidas e acabaram por desaparecer.
Foi minha inteno colocar a investigao ao servio do desenvolvimen-
to dos professores, dos alunos e da escola, partilhando a discusso dos dados e
a construo das interpretaes.
As escolhas que fiz relativamente ao meu papel nesta investigao e s
condies em que ela se iria desenvolver implicaram que observasse a minha
prpria aco enquanto elemento de grupos responsveis por diversificadas
vertentes da dinmica escolar. Assim, no me foi possvel afastar o meu pas-
sado, neutralizar os princpios profissionais que me guiaram e entrar neste
trabalho anulando compromissos ideolgicos sobre a forma de viver a profis-
so. Quando os dois papis se ajustam (o de investigadora e o de investigada)
numa pessoa nica que pretende construir conhecimento que lhe permita
conhecer e agir no contexto escolar, mais se entende a necessidade de valori-
zar o que j se sabe e o que j se viveu.
Por isso a escolha do contexto de investigao foi mais um passo dado
com naturalidade, valorizando alicerces construdos dezoito anos antes do
tempo em que foi feito o desenho deste trabalho, quando conheci intrinseca-
mente a escola que contribuiu como contexto investigativo.
Nessa altura, essa escola ocupava um velho edifcio, em jeito de pal-
cio, com uma torre6, escadas sinuosas e corredores escuros e sussurrantes.
Estava rodeado por jardins, rvores de fruto, hortas pedaggicas. Toda a
construo tinha um no sei qu de magia que alimentou a minha primeira
estadia naquela escola. No foram apenas as histrias sobre as lendas antigas
de amores e desencontros que se viveram entre aquelas paredes e que se con-
tavam e recontavam aos novos professores, mas tambm um certo sentido de
aventura criado, primeiramente por estar a dar os primeiros passos no ensino
e, depois, pelas inmeras actividades que se desenvolviam na escola, um cui-
dado com os alunos, uma alegria conquistada na profisso. Estive l cinco
anos, como professora do 2. ciclo e assumi vrios papis: fiz o estgio profis-
sional nas disciplinas de Cincias Naturais e Matemtica, fui delegada de gru-
6 Por isso, neste estudo, a escola denominada Escola da Torre.
28
po, directora de turma, supervisora de estgios. Desta forma, pouco a pouco,
integrei-me na dinmica da escola, comecei a conhecer as pessoas, os profes-
sores, os auxiliares de educao e, naturalmente, os alunos. Comecei a estar
mais vontade e a ter uma voz.
Reconheci, nessa altura, alguns dos poderes da escola:
Um grupo de professores sempre prontos para experimentar novas
ideias, muito preocupados com a qualidade da aco educativa e com
a igualdade de acesso e de sucesso dos alunos. Esse grupo tinha cons-
trudo entre si uma relao profissional muito forte, j amizade, uma
relao estruturada em concepes partilhadas, em valores comuns.
Era muito caloroso e cuidado na forma como recebia os novos alunos e
os novos professores e, essa foi uma das razes porque me senti to
bem naquele ambiente de trabalho.
Um outro grupo de professores era, de forma implcita, responsvel
pela manuteno da alegria e da animao: planeava festas, encon-
tros, passeios, actividades que enchiam o ano lectivo. Muitas das
aces tinham um pendor cultural e, na maior parte das vezes, envol-
viam simultaneamente alunos e professores.
Existia um outro grupo que exercia o poder formal e que constitua o
conselho directivo7. Organizava a escola em funo da legislao,
adequava as propostas e as aces e geria conflitos. Talvez por andar
to ocupada a compreender qual era o meu papel naquela escola no
estive muito atenta aos conflitos. Os que me chamaram a ateno
prendiam-se com a obrigao legislativa, a necessidade de cumprir um
sem nmero de leis, o que era amplamente discutido nos conselhos
pedaggicos. Por um lado, o presidente do conselho executivo clama-
va pelo cumprimento das directivas e, por outro lado, uma srie de
professores propunha novas vias e apresentava outras interpretaes.
Eram reunies longas e confusas. Outra vertente do conflito relacio-
nava-se com a indisciplina e, a, o presidente tinha um papel chave.
Resolvia a maior parte dos problemas com rapidez e eficcia, atravs
de conversas curtas dentro do seu gabinete. Os professores podiam
7 Actualmente tambm conhecido por conselho executivo ou comisso executiva.
29
sempre contar com ele.
Claro que existiam professores que no pertenciam a nenhum destes
trs grupos, uns que no tinham ainda encontrado o seu papel dentro da esco-
la, outros que faziam parte do grupo flutuante que esto na escola um ano e
esto noutra, no ano seguinte. Eu identificava-me com o primeiro grupo mas
ainda no me sentia completamente -vontade para lhe pertencer de forma
assumida, inscrita. Sobrevoava os trs grupos mantendo maior admirao jun-
to dos professores que, no meu entender, mais se aproximavam das minhas
concepes do que ser professor.
Quando penso nas coisas menos fceis que aconteceram durante a
minha primeira estadia na Escola da Torre, as ideias esto sempre associadas
vontade e ao esforo para se ser melhor, para se conseguir mais, decepo
de no se ter ido to longe quanto se planeou. Como se pode perceber era
uma escola viva, animada, dinmica, satisfeita. Uma escola onde gostei de
ensinar e onde aprendi muito.
Depois afastei-me. Optei por ir trabalhar para muito longe de Portugal.
Mas fiquei presa escola, com a ideia que quando regressasse continuaria ali
a ser professora.
De uma forma espordica, fui mantendo o contacto.
O plano de afastamento de Portugal era para durar apenas trs anos,
mas passaram-se treze. Aconteceram muitas coisas na sociedade portuguesa
e, obviamente, na educao. Vivi a Reforma de 1987 numa escola portuguesa
a dezoito mil quilmetros de distncia de Portugal. Isolada, sem dvida, mas
bastante informada e com amplas condies de discusso e inovao pedag-
gica.
Treze anos depois, voltei a Portugal e mesma escola.
Claro que encontrei uma escola diferente, quer na dimenso fsica quer
na dimenso humana: acrescentou-se uma nova ala, que considerei nova por-
que se tinha construdo na minha ausncia, e que funcionava como a verda-
deira escola. A parte mais antiga, a que tinha a torre, apresentava-se muito
degradada e, em cada ano lectivo, esperava-se que fosse fechada. No entan-
to, tal no aconteceu no perodo em que decorreu esta histria, tendo sido
sempre necessrio ocupar salas do edifcio velho para se conseguir fazer a
30
distribuio dos espaos de acordo com as necessidades implicadas pelo
nmero de alunos que a frequentavam.
A escola tinha sido transformada, na minha ausncia, de uma escola de
2. ciclo com cerca de quinhentos alunos, numa escola EB2,3 com mais de mil
e quinhentos, tendo enriquecido o seu quadro docente com muitos professores
do ensino secundrio8.
Como se pode perceber a escola que eu deixei no foi a que reencon-
trei. Demorei algum tempo a perceber as diferenas. No primeiro ano traba-
lhei de acordo com a escola que eu pensava conhecer. Procurei instintivamen-
te as vertentes que me tinham entusiasmado, procurei estreitar as relaes
profissionais com os colegas que tinha eleito como referncias, senti-me segu-
ra sobre uma rede de recordaes que eu ficcionava como sendo reais.
As primeiras situaes a tornarem-se claras tiveram a ver com os alu-
nos. Eles estavam diferentes: mais irreverentes, mais curiosos, sabendo mais
das pessoas e da vida portuguesa do que eu9.
Foi uma profunda insegurana profissional que me fez deci-
dir por este trabalho. Que escola esta? Como que a histria des-ta escola influencia o seu presente e o seu futuro? Onde esto as foras que gerem a escola? Quem so os alunos? O que quer esta escola? Quais as suas finalidades? E as metas? Que professora vou ser aqui? Que fazer com o que j sei? O que tenho de aprender? Estas questes foram as percursoras do desenho da investigao. Outros factores permitiram especificar a intencionalidade deste trabalho.
Regressei escola no exacto momento em que se iniciava o ano lectivo.
Entregaram-me um horrio e comecei a participar nas reunies de preparao
das aulas. Reencontrei muitos colegas que me introduziram nos novos esque-
mas de trabalho que, segundo me parecia, no eram muito diferentes dos de
antigamente: reunies do conselho de disciplina ou de grupo disciplinar, de
directores de turma, conselhos de turma, informaes sobre os livros de pon-
to, a assiduidade dos alunos, o regulamento interno, enfim, esses rituais de
8 A escola, durante este estudo, converteu-se na sede de um agrupamento vertical de escolas, com aproximadamente dois mil alunos e cento e setenta professores. 9 Com a inteno facilitar a compreenso de certas afirmaes ou descries, acrescentarei, por vezes, observaes e interpretaes pessoais. A necessidade de distinguir os dois discur-sos, um mais geral e outro mais pessoal, decorreu da relao que se criou entre a duplicidade de papis, o de investigador e o de investigado. Para distinguir esse discurso utilizarei peque-nos textos destacados, em itlico, como exemplo o que se segue a esta nota.
31
iniciao de ano. O meu horrio fazia-me professora de Cincias da Natureza
em seis turmas do 6. ano de escolaridade e ainda Directora de Turma de uma
delas. Foi um princpio em grande! Assustei-me com a ideia de organizar o
ensino em seis turmas. No me lembrava de alguma vez ter tido tantas turmas
ao mesmo tempo!
Ainda em Setembro desse ano, o presidente do conselho executivo, que
j me conhecia da minha primeira fase da escola e que fazia parte do meu
grupo de heris pedaggicos, convidou-me para assistir a uma reunio para
preparao do 5. ano de escolaridade. Achei estranho, j que s leccionava o
6., mas porque no? A escola est sempre to recheada de novidades! Foi
assim que soube que a escola se tinha oferecido para participar no processo
da Gesto Flexvel do Currculo e que no ano lectivo anterior tinham prepara-
do o terreno para que tudo comeasse. Os professores do 5. ano tinham-se
oferecido voluntariamente para participar na experincia e por isso, quem o
no tinha feito, era professor do 6.. Eu no soube de nada, no me manifes-
tei e ganhei um horrio de 6. ano.
Esse primeiro contacto com a Gesto Flexvel do Currculo tomou a
forma de um encontro formal com os professores da Universidade do Minho
que iriam acompanhar o trabalho da escola. Reconheci o brilho que criado
quando se enco