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8/13/2019 Revista Banco de Ideias n 45 - Encarte
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O Papel do Governo Norte-Americano noGerenciamento da Crise Financeira
Diogo Ramos Coelho
Estudante da graduao de Relaes Internacionais da Universidade de Braslia (UnB).Vencedor do V prmio Donald Stewart Jr, em 2007.
Joo Csar da Fonseca Neto
Estudante da graduao em Relaes Internacionais da Universidade de Braslia (UnB). Atualmente,desenvolve pesquisa sobre As Restries Comerciais Europias ao Etanol Brasileiro.
1. Introduo
Economistas clssicos, como Adam Smith e David Ricardo, tratavam as
cincias econmicas como economia poltica. Economia seria, pois, uma
disciplina que s pode ser entendida quando ligada poltica, uma vez que a
riqueza de uma nao est fundada tanto no seu aspecto econmico quanto
poltico. Em grande parte, o desenvolvimento econmico depende dos incentivos
gerados por meio de instituies, os quais podem levar a maiores ou menores
investimentos e a uma maior ou menor produtividade.A crise financeira que assolou o globo uma crise tanto econmica quanto
poltica. O mundo, hoje, espera que o bilionrio plano de resgate elaborado
pelas autoridades monetrias nos Estados Unidos da Amrica (EUA) e da Unio
Europia (UE) possibilite uma vitria contra as bolhas especulativas. Espera-se,
principalmente, que os planos de ao elaborados pelos Estados possibilitem
dar novo vigor ao caos instaurado no sistema financeiro. Dessa forma,
questiona-se, sobretudo, se uma economia deve ser deixada sorte da livreiniciativa. No entanto, em que medida as aes adotadas pelo governo de
George W. Bush ajudam a entender os limites das intervenes do governo na
economia? E quais so os significados polticos da crise financeira em relao
ao papel do Estado na gesto da economia e regulao do sistema financeiro?
O presente texto visa responder a essas perguntas.
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2. A Crise Financeira
O aumento do crdito na economia dos EUA foi um dos fatores que
propiciou, nas ltimas dcadas, perodo de grande crescimento econmico. A
partir do fim da dcada de 1970, a criao de novos meios de financiamento
permitiu, por exemplo, que indivduos de baixa renda pudessem comprar a casa
prpria e que as famlias de classe mdia conseguissem bancar o ingresso de
seus filhos nas universidades. O aumento dos financiamentos um dos fatores
que ajuda a entender por que o PIB per capitados EUA saiu de U$ 7.500 em
1975 para U$ 44 mil em 2006.1
No entanto, os novos meios de financiamento,enquanto deram sustento ao crescimento da economia, tambm resultaram em
grandes dvidas para as famlias americanas. Nos ltimos anos, a expanso do
crdito barato aumentou ainda mais o endividamento dos americanos, o que
contribuiu para a atual crise do sistema financeiro.
O aumento contnuo do crdito nos EUA era estimulado pelas taxas de
juros historicamente baixas (em 2003, por exemplo, chegou a cair para 1% ao
ano) mantidas pelo FED (Federal Reserve Board, o banco central dos EUA),
pela estabilidade econmica e pela alta liquidez no mercado financeiro. O
alicerce dessa expanso do crdito, por outro lado, residia na idia de que o
preo dos imveis continuaria em crescimento. O mercado imobilirio dos EUA
vinha se valorizando continuamente ano aps ano. Do ponto de vista do agente
financeiro, a valorizao dos imveis tornava a oferta de crditos hipotecrios
um bom negcio: caso houvesse inadimplncia, o investidor recuperaria o
imvel, o qual poderia ser posto venda, possibilitando recuperar o dinheiro
investido. Do ponto de vista dos tomadores dos emprstimos, os juros baixos eas condies econmicas favorveis estimularam as pessoas que no tinham
casa prpria a fazer um financiamento ou a usar seu imvel como garantia para
a obteno de um novo emprstimo.
1http://data.un.org/Data.aspx?q=gdp+united+states&d=CDB&f=srID%3a29922%3bcrID%3a840. Acessoem: 3 de novembro de 2008.
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A expanso do financiamento imobilirio tambm levou concesso de
crditos de alto risco. Em outras palavras, houve um aumento dos chamados
crditos subprime. Prime o ttulo emitido por um devedor com vontade e
capacidade de pagar suas dvidas. Subprime o contrrio isto , so crditos
concedidos a clientes com dificuldade de comprovar sua renda ou at com
histrico de inadimplncia. Devido ao alto risco, oferecem, por outro lado,
maiores possibilidades de retorno ao agente financeiro. Apesar do risco de
inadimplncia, as altas taxas de juros cobradas e a garantia de se ter o imvel
caso o tomador do emprstimo no cumprisse com seu compromisso faziam
com que a concesso dessashipotecasfosse compensatria.Em busca de maiores rendimentos e garantias de retornos, ttulos primee
subprime foram negociados em um processo chamado securitizao.
Securitizao corresponde emisso de ttulos (do ingls securities, da o termo
securitization) de um fluxo de pagamentos que ainda ser recebido ou seja,
corresponde emisso de ttulos referentes expectativa de recebimento de
uma dvida.2 A instituio emissora desses ttulos antecipa os recursos que
foram emprestados vendendo suas dvidas a outras instituies e a
investidores, antes mesmo de essa primeira dvida ser paga, possibilitando a
concesso de novos crditos. Isso acaba se difundindo em uma cadeia de
venda de ttulos. O objetivo dessa prtica aumentar a quantidade de recursos
disponveis para novas transaes financeiras.
A atual crise financeira teve incio com uma queda nos preos dos imveis
nos EUA no incio de 2006. o chamado estouro da bolha imobiliria. A bolha
corresponde especulao no mercado de imveis, isto , as altas expectativas
de retornos estimulavam novos e crescentes investimentos no mercadoimobilirio. J o estouro da bolha significa o movimento contrrio, ou seja, a
grande oferta acaba por deixar um estoque de casas sem comprador e
aqueles que desejam vender j no conseguem faz-lo pelo preo anterior.
2http://www.frbsf.org/publications/economics/letter/2001/el2001-38.html. Acesso em 2 de novembro de2008.
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A queda no preo dos imveis significou a incapacidade de muitas famlias
quitarem suas dvidas. Em diversos casos, famlias possuam hipotecas em valor
igual ao valor inicial de suas casas. Quando o valor de mercado dos imveis
comeou a cair, o valor da casa ficou menor que o valor da dvida.
Conseqentemente, houve o aumento dos chamados foreclosures, isto , o
despejo de um comprador inadimplente. Desde o incio de 2008, 1,7 milho de
famlias americanas foram despejadas de suas casas.3
O mercado financeiro, dessa forma, sofreu forte impacto com o aumento
dos despejos e do no-pagamento das hipotecas.4 Muitas instituies
financeiras possuam ttulos que foram securitizados tendo como base o valordessas hipotecas (as chamadas mortgage-backed securities). A onda de
rentabilidade fcil comeou o seu processo de queda, de modo que os
investidores que possuam esses ttulos estavam querendo se desfazer deles,
mas no encontravam compradores dispostos a assumir esse imenso risco.
Quando as pessoas deixaram de pagar suas hipotecas e as possibilidades de
retorno diminuram, os bnus hipotecrios subprime desabaram. A queda no
valor desses ttulos resultou tambm na queda do valor das aes das prprias
instituies financeiras, j que muitas delas possuam pouca parte dos seus
recursos em reservas monetrias. Essas perdas no valor dos ttulos lastreados
em hipotecas, portanto, tm deixado as instituies financeiras com pouco
capital poucas aes comparadas dvida. Esse problema especialmente
grave porque todo mundo se endividou bastante durante os anos da bolha. Em
virtude de as instituies possurem pouco capital comparado grande dvida,
suas aes perdem valor e elas no esto capazes de prover o crdito que a
economia precisa. Menos crditos significam menos consumo, menos lucros e
3Revista VEJA. 1 de outubro, 2008, p. 83.4Em junho de 2007, com a falncia de dois hedge fundsmultimilionrios pertencentes ao quinto maiorbanco norte-americano de investimento, o Bear Stearns, as perdas foram de U$ 1,6 bilho. Alm disso, asaes do Bear Stearns desabaram, assim como as de vrios fundos de investimentos, bancos e seguradoras:mais de US$200 bilhes foram perdidos entre agosto e setembro do ano passado.
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quantidade de meios de pagamento disponveis na economia necessrios para
efetuar transaes comerciais e financeiras , acabaram por irradiar a crise para
dentro do sistema monetrio (bancos comerciais e Banco Central). Como os
bancos comerciais possuem pouca capacidade de transformar seus ttulos em
moeda j que esses ttulos perderam valor o governo americano se disps a
injetar esse crdito na economia, comprando tais ttulos podres.
O governo americano acredita que o custo do resgate inferior ao da
alternativa de no fazer nada. O plano envolveria a troca de US$ 700 bilhes de
ttulos pblicos por ttulos pertencentes aos bancos e s demais instituies
financeiras. Na hiptese de esses ttulos valerem zero (hiptese extrema, masque ajuda a simplificar o raciocnio), o custo do resgate seria exatamente de
US$ 700 bilhes. Por outro lado, a alternativa de no fazer nada implicaria uma
reduo adicional de US$ 700 bilhes no capital dos bancos. importante
ressaltar: as economias precisam de crditos para sobreviver. Os bancos
ofertam crditos como um mltiplo do seu patrimnio uma prtica conhecida
como alavancagem. Se um banco, por exemplo, possui um capital disponvel
de U$ 100 bilhes, parte desse dinheiro vai ser aplicado em investimentos,
ofertado por meio de crditos, emprstimos e assim por diante, multiplicando
esse valor inicial e elevando a liquidez. Dessa forma, caso o governo americano
optasse por no injetar o dinheiro do plano de resgate na economia, a reduo
dos crditos seria um mltiplo de US$ 700 bilhes. Supondo,
conservadoramente, uma alavancagem de dez vezes, fala-se de uma retrao
de crditos na ordem de US$ 7 trilhes, aproximadamente 50% do PIB
americano. No resta dvida de que essa retrao de crditos poderia dar
margem a uma depresso s comparvel do perodo de 1930-36.A rede de notcias CNBC6 detalhou os principais pontos do plano de
resgate do governo de George W. Bush:
1) A ajuda financeira ser efetuada em etapas, sendo os primeiros U$
250 bilhes j autorizados;
depresso uma forma grave de recesso.6http://www.cnbc.com/id/26940315. Acesso em 21 de outubro de 2008.
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2) A compra dos ativos financeiros ser determinada pelo secretrio
do Tesouro Henry Paulson, e poder incluir ttulos lastreados em
hipotecas residenciais ou comerciais;
3) Bancos estrangeiros no podero tomar parte do plano de resgate;
4) O governo federal deve obter parte das instituies s quais vier a
conceder ajuda, de modo a propiciar que os contribuintes possam
participar de eventuais lucros, caso as empresas se recuperem;
5) O governo federal pode instaurar procedimentos de despejos em
razo de hipotecas adquiridas sob o plano;
6) O Tesouro americano deve criar um projeto de estudo sobrepadres de accountabilitye transparncia do mercado financeiro e
um programa alternativo de seguros para os emprstimos
problemticos que seriam pagos pelas companhias participantes;
7) Se o governo angariar perdas por cinco anos, o Tesouro deve criar
um plano para cobrar impostos das instituies participantes no
plano para recuperar as perdas do contribuinte.
4. Da Economia Poltica
O sistema financeiro internacional , em sua maior parte, um sistema de
investimentos em ativos financeiros de empresas, governos, fundos privados e
pblicos. Essa dimenso econmica, pois, interage com uma dimenso poltica,
o sistema monetrio, que diz respeito ao conjunto de normas e regras que
determinam o grau de liberdade dos agentes para investir. Dessa forma, a
anlise poltica do sistema financeiro recair, principalmente, no conjunto denormas e regras que regulam as relaes entre agentes privados seja em um
determinado pas, seja no sistema internacional. Essas normas e regras so
formuladas e implementadas, principalmente, pelos Estados ou por um
conjunto de Estados, por meio de instituies ou regimes internacionais. O que
se procura entender como esse aparato institucional ir influenciar resultados
no s no sistema financeiro, mas na economia em geral.
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A economia poltica um campo de estudos que est pautado na anlise
de decises humanas. Em outras palavras, est fortemente associada ao
entendimento dos princpios da ao humana. Toda ao humana encarada
como resultado de uma escolha.7 A economia pautada pela interao de
milhes e milhes de pessoas que processam suas decises de modo a melhor
atingir determinados fins, como a compra, a venda, a produo e a distribuio
de um determinado bem ou servio em troca de renda. Nesse contexto, a
literatura assume a racionalidade dos agentes econmicos como uma premissa
analtica. Os indivduos so racionais e procuram orientar suas aes de modo a
melhor satisfazer seus objetivos e preferncias. Por outro lado, limitaescognitivas e a incapacidade dos indivduos em processar todas as informaes
disponveis, por exemplo, convergem no sentido de impedir uma racionalidade
perfeita. No entanto, o racionalismo significa, principalmente, que os indivduos
iro tentar atingir seus objetivos dentro de uma determinada circunstncia e
no que os indivduos so oniscientes.8
Uma discusso sobre a racionalidade, portanto, uma discusso sobre
como a ao humana ser orientada e quais meios, mtodos e mecanismos
sero usados para especificar e empreender determinado curso de ao. Nesse
sentido, espera-se que os indivduos procurem sempre maximizar seus
benefcios e diminuir seus prejuzos. Porm, ao fazer sua escolha o indivduo
decide no apenas entre os diversos bens materiais e servios sua disposio.
Todos os valores humanos so oferecidos. Os indivduos escolhem com base
em resultados tanto materiais quanto subjetivos, e levam em considerao
valores, gostos, preferncias, riscos, perspectivas, possibilidades e
oportunidades. Tudo ordenado numa escala e submetido a uma deciso: aescolha de uma opo em detrimento de outras. As decises dos indivduos
esto inseridas, portanto, em um contexto social, do qual fazem parte as
instituies. Dessa forma, o desempenho econmico de um pas, em grande
7MISES, Ludwig von.Ao humana: um tratado de economia, p. 23.8FRIEDEN, Jeffry. The Method of Analysis: Modern Political Economy, p. 38.
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medida, diz respeito tambm s regras e instituies que permitem/incentivam
os indivduos a serem mais produtivos.
Nesse sentido, cabe perguntar: como o aparato institucional ir influenciar
o desempenho econmico de uma sociedade? Segundo Robert Coase,
ganhador do prmio Nobel em economia em 1991, a existncia de mecanismos
de regulao se faz necessria para garantir possibilidades de comrcio e
investimentos.9 Afinal, relaes econmicas e financeiras so permeadas de
incertezas ou o que se denominou de custos de transao: custos associados
obteno de informaes, confiabilidade, transparncia e s garantias de
que os acordos sero cumpridos. Para reduzir esses custos, normas e regrasfornecidas por meio de instituies so necessrias. No entanto, esses
mecanismos de regulao podem tanto atuar no sentido de promover maior
crescimento econmico quanto no sentido de restringir a liberdade de ao dos
indivduos, inibindo a inovao e o risco e prejudicando o crescimento de suas
rendas. O desempenho econmico de uma nao maior quanto mais forem os
indivduos estimulados a produzir e trocar riqueza. Em outras palavras, maior
quanto maiores forem as capacidades produtivas de cada indivduo.
O governo, portanto, adquire um papel central no gerenciamento da
economia. Porm, Estados no agem. Estados no decidem. Quem decide so
os representantes dos governos. As decises dos gestores pblicos iro surtir,
pois, um impacto relevante nas interaes entre os demais indivduos da
sociedade. H, por conseguinte, uma forte tradio na cincia poltica de que os
interesses do homem pblico devem estar voltados para o interesse comum da
sociedade. Em contraste, encontramos a viso da economia de que os
indivduos esto voltados para a satisfao de seus interesses e buscamatender s conseqncias dessa hiptese. As pessoas compram produtos que,
dados seus preos, beneficiam a si mesmo e suas famlias. No entanto,
presume-se que quando algum se torna poltico ou servidor pblico essa
pessoa adquira uma viso mais ampla, que a leve a tomar decises que
priorizem o interesse comum, e no apenas privilegiem certo grupo ou ela
9COASE, Robert. The Institutional Structure of Production, p. 7.
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mesma. Os economistas aboliram essa viso dupla do comportamento humano
com a teoria da escolha pblica, a qual, em ltima instncia, transporta o
arcabouo analtico da teoria econmica para a poltica.
fato que a posse do poder poltico no transforma as pessoas em santos
altrustas ou em sbios visionrios. Os governantes no so neutros, poltica ou
economicamente. O governo composto por indivduos que possuem seus
prprios interesses, suas vises de mundo, esto sujeitos a presses e
captura pelo setor privado. As implicaes decorrentes desse ponto de vista do
comportamento do homem pblico exercem grande influncia sobre o modo
como se enxerga aquilo que o governo capaz de fazer. Primeiramente, passapelo reconhecimento de que governos eleitos (ou qualquer outro conjunto de
indivduos que tm, como qualquer pessoa, a motivao de satisfazer seus
interesses) no so capazes de representar perfeitamente as preferncias
individuais dos governados, ainda mais quando estes constituem um grupo
heterogneo.10 Segundo, mesmo que o governo tome decises que tenham o
intuito de melhorar o bem-estar geral de uma sociedade, no existem garantias
de que os resultados sero condizentes com os objetivos dos gestores pblicos.
Bons resultados no dependem da boa vontade dos polticos, mas de como os
indivduos iro reagir s polticas que sero implementadas.
Para entender a crise financeira atual, portanto, preciso levar em conta
que o comportamento humano est voltado para a satisfao de determinados
objetivos e preferncias. No sistema financeiro, isso significa que a procura por
melhores resultados ocorrer por meio da utilizao de recursos de terceiros
visando maiores retornos, em um ambiente de incertezas e riscos. No sistema
poltico, a procura por melhores resultados pessoais pode levar busca derendas, prestgios e poder. O importante notar que os resultados do jogo
poltico acabam por influenciar os resultados do jogo econmico e vice-versa.
Dessa forma, o conjunto de incentivos gerado pelas normas e regras acaba
por influenciar o processo de tomada de decises. Firmas, por exemplo, buscam
10TULLOK, Gordon; SELDON, Arthur; BRADY, Gordon L. Falhas do Governo: uma introduo teoriada escolha pblica, p. 33.
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maiores oportunidades de lucros. Mas essas firmas iro buscar lucros onde os
incentivos institucionais so tais que o risco menor. Em um sistema de livre
mercado, as firmas ganham seus lucros ao fornecer os bens que os
consumidores esto dispostos a pagar por um determinado preo. No entanto,
os mecanismos de regulao e at mesmo a retrica de poderosos atores
polticos podem mudar os incentivos procura por lucros. A regulao do
sistema financeiro, por exemplo, pode permitir uma queda dos padres de
anlise de crdito, permitindo que famlias tomem emprstimos alm de sua
capacidade. As agncias governamentais podem incentivar os bancos a tomar
riscos extras oferecendo garantias implcitas de que os bancos no sofrerograndes perdas caso esses negcios venham a falhar. Da mesma forma,
polticas governamentais podem orientar o interesse de alguns indivduos para
atividades que beneficiem determinadas corporaes em detrimento de outras.
5. A Dimenso Poltica da Crise Financeira
Para o cientista poltico George Friedman, existem trs vises principais
sobre a atual crise financeira.11A primeira delas coloca que no h uma soluo
nem por meio do mercado nem por meio do Estado. Uma soluo advinda por
meio do mercado iria inevitavelmente gerar uma depresso econmica. Por
outro lado, qualquer tentativa do Estado em se apropriar de recursos da
sociedade para resolver o problema do sistema financeiro levaria a um
prolongamento da crise, mesmo que fornecesse um alvio momentneo.
A segunda viso defende que a soluo para a crise financeira est na
mobilizao dos recursos pelo Estado. De acordo com essa viso, os mercadosfinanceiros foram os responsveis pelo problema, ao ofertar crditos em
excesso, uma medida incompatvel com a real expanso da economia. Cabe ao
governo, portanto, prover agora a liquidez necessria para evitar uma crise
sistmica seguida de depresso. Os adeptos dessa viso so, obviamente, os
11http://www.stratfor.com/weekly/20080930_political_nature_economic_crisis. Acesso em 21 de outubrode 2008.
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principais assessores do presidente George W. Bush, as autoridades monetrias
dos EUA, as principais lideranas do Congresso americano e as elites
financeiras.
A terceira viso coloca que a mobilizao de recursos pelo Estado para
salvar o sistema financeiro , na verdade, uma tentativa de salvar as instituies
financeiras, incluindo aquelas que causaram a atual crise. Os defensores dessa
viso se dividem em dois grupos: o primeiro argumenta que um plano para dar
maior liquidez ao sistema financeiro no deve beneficiar os maus investidores; j
o segundo grupo argumenta que os possveis ajustes podem ser obtidos sem
uma grande interveno do Estado na economia, mas sim com a limitadaimplementao de novas regulaes.
Essa terceira viso coloca em evidncia um importante aspecto poltico da
crise: as relaes privilegiadas do governo americano com os investidores e
instituies financeiras. O plano de resgate proposto pelo governo de George W.
Bush levanta o seguinte dilema: as instituies financeiras devem ser salvas ou
no? Est fortemente difundida a crena de que a crise financeira tem suas
origens no mau comportamento dos investidores. A busca por altos
rendimentos fez com que muito dinheiro fosse aplicado em transaes de alto
risco. Ao investir nessas transaes, os investidores tambm assumiam os
custos associados a esses negcios. Da mesma forma que os investidores
desfrutariam egoisticamente dos lucros provenientes dessas transaes, eles
deveriam arcar com as perdas. Um plano de resgate, como o plano proposto
pelo governo americano, forneceria incentivos errados quanto tomada de
riscos. Ao garantir o salvamento das instituies que agiram com imprudncia, o
governo tambm garantiria que ms prticas fossem repetidas no futuro. Osagentes econmicos saberiam que, ao ingressar em negcios de risco, caso
suas perdas sejam danosas economia como um todo, o governo estaria pronto
para salv-los. H, pois, a idia de que os investidores lutam, junto ao governo,
para socializar as perdas ao passo que sempre defenderam a privatizao dos
lucros.
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curto perodo, devido desconfiana inicial de grandes especuladores, gerando
o que se temia em primeiro lugar: desaquecimento ou recesso econmica. A
especulao pode ser autojustificvel e provocar danos graves economia real
e, por isso, uma maior regulao desse mercado no deve ser enxergada
meramente como uma restrio liberdade dos agentes econmicos de utilizar
da maneira mais eficiente os recursos que de dispem.
O economista australiano Hugh Stretton, no texto Inefficiencies of Global
Capital Markets, publicado em 1998, vai alm ao diferenciar o mercado
financeiro do de bens. Para o autor, a competio, por exemplo, que cumpre um
papel essencial no sentido de oferecer incentivos para o ganho de eficincia nomercado de bens, pode no funcionar da mesma forma no mercado financeiro.
Ele argumenta que se os bancos competem entre si diminuindo o spread
bancrio (a diferena entre os juros que os bancos cobram e os juros que os
bancos pagam a quem neles deposita seu dinheiro), a competio ,
logicamente, benfica. No entanto, num ambiente de pouca regulamentao, os
bancos podem competir por maiores parcelas do mercado optando por
operaes de emprstimo a tomadores de alto risco, com taxas de juros mais
elevadas, e que lhes possibilitem crescer mais rpido, sem ter que diminuir essa
diferena entre juros pagos e juros cobrados. Devido ao ambiente de alta
competio, at mesmo os bancos com perfil de risco mais conservador podem
ser levados a operaes de alto risco a fim de no perderem terreno para os
mais audaciosos.
O caso dos crditos subprimeseria um exemplo: os bancos se engajaram
em operaes financeiras com papis derivados de hipotecas fundados tanto na
alta rentabilidade dos negcios como em uma suposta segurana, atestadapelas seguradoras de crdito (aproximadamente 80% dos papis derivados de
hipotecas tinham a classificao AAA, a maior nota possvel, conferida por pelo
menos uma das trs grandes agncias de classificao de crditos Standard &
Poors, Moodys e Fitch Ratings)13, que conferiram credibilidade a esses ttulos
13Revista VEJA. 1 de outubro, 2008, p. 82.
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lastreados em financiamentos de hipotecas os quais, como atestado pelos
fatos, possuam alto risco de inadimplncia.
Por outro lado, o sistema financeiro est baseado na confiana dos
depositantes. Mesmo se um pequeno banco for falncia, todos os demais
podem vir a ser afetados pelo temor dos seus clientes e pelo aumento da
desconfiana entre os prprios bancos, que so fontes de financiamentos
correntes uns dos outros. Desse modo, para qualquer banco melhor aproveitar
o momento de alta rentabilidade de negcios de alto risco do que ficar de fora
dessa onda e pagar, eventualmente, pela aventura dos demais. Portanto, a
questo no se os bancos foram incapazes de avaliar corretamente os riscosdo mercado de papis subprime, mas sim que, mesmo sabendo desses riscos,
eles julgaram que seria melhor estar dentro desses negcios do que se auto-
exclurem por razes de prudncia.
Stretton, dessa forma, faz uma diferenciao entre dois tipos de regulao
financeira: prudente (prudential) e econmica (economic). A primeira tem por
objetivo principal assegurar que os bancos mantenham sua liquidez e solvncia
e no coloquem o sistema em risco ao se aventurar demais em prticas
especulativas. A segunda diz respeito regulao que o governo faz com o
intuito de influenciar os servios dos bancos para perseguir objetivos
econmicos especficos, como controle da inflao, favorecimento de setores
que considera estratgicos, equilbrio da balana de pagamentos, queda do
desemprego, etc. Com base nessa distino, um governo, por exemplo, ainda
que opte por uma menor interveno na economia, pode exercer uma regulao
puramente prudencial, com vistas a garantir a segurana do sistema, sem estar
incorrendo em contradio.O ponto que existe um problema de ao coletiva no setor bancrio e,
por isso, preciso que haja regras claras e capazes de impor limites a um
comportamento generalizado de preferncia a operaes de alto risco pelos
bancos a fim de que um colapso no venha a ocorrer. O problema dessas regras
que elas podem ser demasiadamente restritivas ao crdito, diminuindo a
capacidade de a economia de financiar seu crescimento. Ainda, cobrar dos
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governantes uma regulao que seja ao mesmo tempo eficiente e prudente
uma tarefa praticamente impossvel, uma vez que eles no contam com
informaes perfeitas sobre o presente ou tampouco sobre o futuro.
No caso da crise dos subprime, o FED tem sido acusado de ter falhado ao
no reconhecer que a concesso de crditos por grandes bancos e garantidos
pelas seguradoras estava atingindo nveis perigosos; que essas instituies no
tinham cobertura suficiente para o risco que assumiam; que o aumento na taxa
bsica de juros traria conseqncias drsticas para o mercado imobilirio; e que
uma expanso to rpida do setor provocaria eventualmente uma queda no
preo dos imveis, a garantia dos emprstimos.Vale ressaltar, contudo, que a nica forma de atestar com alto grau de
certeza se uma operao especulativa deve ser classificada como boa ou m
saber quais resultados sero obtidos no futuro um tipo de informao que
nenhum gestor pblico ou mesmo um investidor privado possui ex ante. Por
outro lado, isso no significa que no houvesse, no caso americano, indcios ou
tendncias a serem levadas em conta pelos tomadores de deciso ao permitir
que o mercado de subprime continuasse se expandindo da forma como se
expandiu. O que ocorre que as decises governamentais so escolhas
tomadas num ambiente complexo de incertezas e informaes imperfeitas, por
indivduos que possuem suas prprias vises de mundo e que sofrem presso
por parte de polticos e grupos de interesses. Depois de a crise ter acontecido,
fcil apontar as falhas do governo, mas preciso compreender que intervenes
governamentais no sentido de tentar impedir que a crise ocorresse poderiam,
por exemplo, ter causado outros problemas econmicos (como o
desaquecimento desnecessrio da economia, por meio de uma retrao docrdito) , problemas que, no momento da tomada da deciso, poderiam ser
politicamente mais sensveis.
Ainda, considerando que as decises dos agentes reguladores nacionais
dos pases desenvolvidos repercutem em todo sistema financeiro internacional
e, potencialmente, no bem-estar das pessoas em todo o mundo e que a
escolha por uma maior ou menor regulao prudente obedece a uma srie de
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fatores domsticos necessrio, para assegurar a estabilidade do sistema, um
marco regulador multilateral construdo por meio da cooperao entre os pases.
Na verdade, j existe um acordo nesse sentido, o chamado Acordo de Basilia
II, que foi criado com base na idia de que ningum melhor que os bancos
para gerir seus prprios riscos. Basilia II tem mritos por estabelecer padres
internacionais de avaliao e gesto de riscos por parte dos bancos; no entanto,
apesar de ter como um dos seus pilares o reconhecimento do papel dos agentes
reguladores como supervisores, no estabeleceu padres claros para essa
superviso. A regulao, por exemplo, que se faz das seguradoras e das
agncias classificadoras de risco mnima.Um fato recorrente na histria o de que crises sistmicas como a que
vivemos agora so na verdade uma oportunidade para se rever as instituies e
regras vigentes. No caso de Basilia II, a perspectiva que, antes mesmo de ser
totalmente implementada pelos pases, ela passe por uma profunda reviso ou
que seja substituda por outro marco regulador. O movimento de alguns lderes
polticos, como o presidente da Frana e da Comisso Europia, Nicolas
Sarkozy, por mecanismos de regulao do sistema financeiro que o
aproximem da economia real. O desafio est lanado.
7. Uma retrao do liberalismo?
O presidente Luiz Incio Lula da Silva, em discurso no plenrio das
Organizaes das Naes Unidas, por ocasio da 63 Assemblia Geral,
afirmou que a euforia dos especuladores transformou-se em angstia dos
povos. O presidente afirmou ainda que as indispensveis intervenes doEstado, contrariando os fundamentalistas do mercado, mostram que chegada
a hora da poltica, e que somente a ao determinada dos governantes, em
especial naqueles pases que esto no centro da crise, ser capaz de combater
a desordem que se instalou nas finanas internacionais.14 J o presidente
14http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/discurso_detalhe3.asp?ID_DISCURSO=3368. Acesso em: 1 de novembro de 2008.
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francs Nicolas Sarkozy afirmou que o mundo do sculo XXI no pode ser
gerido com instituies do sculo XX.15 Na viso desses lderes polticos, os
mercados no devem ser deixados prpria sorte e mais: a crise atual
evidencia que as regulaes e normas vigentes no tm sido suficientes para
garantir bons resultados.
A crise financeira atual representa, portanto, uma retrao do liberalismo?
Primeiramente, importante ressaltar que a soluo liberal clssica de permitir
que os mercados possam, sozinhos, encontrar seus pontos de ajuste , hoje,
politicamente invivel. Enquanto a economia um mundo calcado na aceitao
de que incertezas fazem parte do jogo, a poltica procura oferecer a segurananos rendimentos que muitas pessoas demandam. No fazer nada significaria
arcar com custos que o sistema financeiro e o mundo poltico no estariam em
condies de suportar: inflao, enfraquecimento do dlar, depresso
econmica, desemprego, crise de crditos e muito mais. Alm disso, o Estado
americano sempre interferiu na economia quando se viu diante de crises: foi
assim na dcada de 1930, est sendo assim em 2008. Por outro lado, Kenneth
Rogoff, professor da Universidade de Harvard e economista-chefe do Fundo
Monetrio Internacional (FMI) at recentemente, ressalta: Wall Street precisa ter
a chance de curar a si mesma, os lderes das grandes empresas financeiras mal
gerenciadas tm de perder seus cargos, investidores que ignoram riscos tm de
perder dinheiro. O sistema, enfim, tem de vergar sob o peso dos erros que
cometeu.16 O desafio, no entanto, como fazer isso sem piorar a liquidez
financeira e manter vivo o sistema de crditos que fundamental para o bom
funcionamento de qualquer economia.
Nos EUA, mudanas nos marcos reguladores j esto em curso: configura-se um novo desenho de superviso bancria no qual a Securities and Exchange
Comission (SEC), o rgo criado para regular os mercados financeiros aps o
crash de 1929, ter muito mais recursos e poder de interveno. O mpeto para
construir novas regulaes parece insacivel. No entanto, importante notar:
15http://www.ambafrance-uk.org/President-Sarkozy-s-speech-at-UN,11208.html. Acesso em: 1 denovembro de 2008.
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um erro pensar que os problemas enfrentados pelo sistema financeiro decorrem
nica e exclusivamente da falta de regulao. A conjuntura atual tambm tem
razes e propostas que retornam interveno do Estado na economia. O
governo dos EUA, por exemplo, optou por uma emisso exagerada de moeda
para custear os dficits fiscal e externo. O dficit comercial atingiu nveis recorde
pelo quinto ano consecutivo, chegando a U$ 784,2 bilhes no final de agosto de
2007: em termos anuais, 9,4% a mais que em 2006.17 Por outro lado, o
Departamento do Tesouro informou que o governo de George W. Bush gerou
um dficit fiscal de U$ 157,3 bilhes no ano fiscal de 2007, que comeou no dia
1 de outubro daquele ano e terminou em 30 de setembro ltimo. O dficit emconta corrente chegou a 6,2% do PIB em 2007.18Nos anos anteriores crise
financeira, o governo americano injetou mais moeda na economia por meio dos
altos gastos, o que, junto com os juros artificialmente baixos mantidos pelo FED,
ajudou a criar um excesso de liquidez e causou impacto no descontrole dos
financiamentos. A injeo de liquidez nos mercados, os mecanismos
reguladores frouxos, as tentativas de manuteno do boom econmico e taxas
de juros artificialmente baixas tambm se encontram nas razes dessa crise:
estimularam o crescimento especulativo, possibilitaram a euforia dos crditos
baratos e deram incentivos errados quanto tomada de riscos.
Alm disso, preciso analisar se a crise financeira uma crise do
liberalismo, isto , se as instituies liberais esto em crise. Apesar de o
tamanho do pacote de salvamento do governo americano significar uma
interveno estatal sem precedentes, o que prevalece a idia de garantir o
desenvolvimento dos mercados sob uma nova gide reguladora. Regulao no
significa altos nveis de planejamento econmico. No significa que o Estadoest assumindo o controle do sistema financeiro (ainda que o regule de modo
mais intrusivo). Em outras palavras, um sistema de mercado continua em
operao, porm o que deve mudar so as regras e normas que gerem esse
16Revista VEJA, 1 de outubro. 2008, p. 71.17http://www.whitehouse.gov/omb/budget/fy2009/pdf/hist.pdf. Acesso em: 1 de novembro de 2008.18Ibidem.
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sistema, com uma maior presena do Estado na conduo desse
gerenciamento.
8. Concluso
A primeira e mais imediata conseqncia da crise financeira a reduo do
tamanho do mercado financeiro como proporo da economia real. Ainda
segundo o diretor geral do FMI, Dominique Strauss-Kahn, a economia mundial
dever sofrer desacelerao. H uma forte contrao do crdito que poder
levar a uma retrao do comrcio internacional e, claro, dos fluxos deinvestimentos entre os pases. Economias emergentes, como os pases da
Amrica Latina, podero sofrer com menores nveis de investimentos e uma
reduo na demanda por commodities, por exemplo. Alm disso, planos de
contingncia j foram instaurados tambm na Europa para possibilitar o
abastecimento de liquidez, a recompra dos ativos desvalorizados e a injeo de
capital nas instituies financeiras. J a aprovao do plano de ajuda do
governo americano pode fornecer certo alvio s crescentes incertezas que
permeavam os mercados financeiros nas ltimas semanas.
Alm da deteriorao do cenrio econmico, as conseqncias polticas
dessa crise tambm se fazem notar. Em primeiro lugar, h uma clara
contestao, no meio externo, da real capacidade de liderana dos EUA no
gerenciamento dos sistemas financeiro e monetrio internacional. A crise surgiu
no corao do capitalismo mundial. Dessa forma, o governo americano sofre,
sobretudo, uma sria crise de confiana, o que acaba por afetar seu papel como
hegemon. Por outro lado, espera-se que, da crise, surja um sistema financeiromais enxuto, movimentando valores mais compatveis com a economia real, em
um ambiente regulador mais prudencial.
Novas regras para as transaes financeiras so apostas certas. Elas viro
atreladas ao pacote de salvao proposto por Washington. Porm, o papel do
governo americano no gerenciamento da crise luz dos conceitos da teoria da
escolha pblica evidencia um importante aspecto da economia poltica: aquilo
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que qualquer governo deve fazer diferente daquilo que qualquer governo
capaz de fazer. Um maior controle dos mercados financeiros no garante
como nunca garantiu que normas, regras ou burocratas visionrios
conseguiro harmonizar as interaes econmicas de milhes de pessoas em
substituio s leis do mercado. Uma maior presena do Estado no
planejamento da economia poder, inclusive, aumentar os nveis de
dependncia entre os investidores privados e o governo, o que normalmente
significa menos eficincia e menos prudncia econmica e financeira.
Ainda mais, a possibilidade de o plano de resgate no funcionar persiste,
em razo da magnitude da atual crise financeira, que pode ter razes aindadesconhecidas. Deve-se avaliar tambm como os U$ 700 bilhes sero
distribudos, para no dar margens procura de privilgios especiais por parte
de agentes privados.
Cabe, por fim, notar: maximizar eficincia e prudncia nos marcos
reguladores do sistema financeiro no depende somente da vontade das
autoridades. Depende de como os indivduos iro reagir perante as normas e
regras implementadas pelos Estados. O principal ponto , sobretudo, garantir
que as regras do jogo possibilitem a continuidade do prprio jogo.
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