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Uma explicação necessária: não tenho nenhuma ligação com qualquer
religião. Ao contrário, delas me afasto, até porque não consegui, até hoje, ver sentido em
nenhuma delas, das muitas que pululam por aí. Todas elas, a meu ver, vendem o seu
“peixe”, a sua “verdade”; mercantilizam Deus e não se preocupam em desvendar,
entender e praticar os Seus mistérios. Transformaram-se numa espécie de praça de
pedágio para o céu.
Fui batizado com poucos meses de vida, como a maioria das pessoas em
nosso país, na Santa Madre Igreja Católica Apostólica Romana. Não tive escolha! Porém,
hoje vejo que ela - como as muitas que hoje proliferam numa espantosa escala geométrica
e sob as mais exóticas denominações - está mais preocupada em submeter as pessoas ao
seu gládio, instigando-as à divergência, à cizânia, do que a levá-las ao relacionamento
fraterno, oriundas que são do mesmo Pai.
Esquecem-se de que a vida é efêmera e que, nessa efemeridade, não temos
tempo para questiúnculas; que a nossa passagem nesse mundo é tão rápida, que nem
mesmo chegamos a descobrir, realmente, quem somos, de onde viemos e para onde vamos.
Contudo, ainda que em poucas palavras, quero deixar bem claro que, ao
menos no meu consciente, não há nenhuma intenção de denegrir esse, ou aquele, credo
religioso; nem, tão pouco, de que eu tenha a pretensão de ser uma espécie de
parapsicólogo, vidente, ou, ainda, que eu me comunique intimamente com o Além.
O fato é que, certo dia, que não me lembro qual, passava diante de um
“sebo”, situado na Praça Tiradentes, no Rio de Janeiro, quando me senti compelido para o
seu interior, como se tivesse sido agarrado e levado para dentro da loja.
Literalmente, fui empurrado, arrastado, para uma das diversas bancas
repletas de livros velhos, sobre os quais se destacava este que ora trago aos Irmãos:
INICIACION ANTIGUA Y MODERNA – LA FRATERNIDAD ROSACRUZ, de autoria
de Max Heindel, da Editora Kier – Buenos Aires – Argentina.
Diante da banca e deparando-me com o livro, ouvi uma voz interior que me
disse:- Traduz e dá aos teus Irmãos. Peguei o livro, abri e comecei a lê-lo, correntemente,
como se estivesse escrito em português. Eu que nunca havia estudado espanhol! Num
impulso, comprei-o e o levei para casa, ávido e curioso em desvendar o seu conteúdo. De
imediato comecei a traduzi-lo. Todavia, quando o trabalho já estava terminado, restando
apenas a revisão, o computador deu “tilti”; simplesmente apagou...
Dei uma pausa... mais de um ano! Até que um dia fui cobrado, certamente
pela mesma “força” que me arrastou para o interior da livraria. E a cobrança foi de tal
maneira incisiva, que eu não via outra coisa na minha frente a não ser aquele velho livro.
Até meu trabalho ficou relegado em meu escritório.
Reiniciei e concluí a tradução numa só tirada que, é importante dizer, foi
feita sem qualquer auxílio de dicionário. É, na medida do possível, graças à minha total
ignorância do idioma espanhol, uma tradução literal e não literária, com gostaria, e
deveria, de ter feito. Porém, como o “demônio” que me acicatava me deixou em paz,
também deixei ficar desse jeito. Talvez, mais tarde, quem sabe?...
Aí está! Na minha ótica, o livro tem um conteúdo deveras interessante e
espero que, de alguma forma, seja útil aos Irmãos e a tantos outros que o leiam.
Roberto Ribeiro – MI.’. – Gr.’. 33 REAA
E-mail: [email protected]
Tel. (021) 2601-4411 – (021) 2603-8111 e Cel. (021) 9875 -6565
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TRADUÇÃO DO LIVRO
INICIAÇÃO ANTIGA E MODERNA
A FRATERNIDADE ROSA-CRUZ
Max Heindel
Editorial Kier
Buenos Aires
Nova versão iniciada em 02 de outubro de 2008, às 19:45 horas.
A primeira tradução foi perdida com a formatação do computador, feita
em 29 de setembro de 2008, quando o texto traduzido já estava sendo
revisado.
Orelha:
Max Heindel, que foi o mensageiro da verdadeira Fraternidade, ou Ordem
Rosa-Cruz, viveu os ensinamentos que pregava. Somente quem haja sofrido fisicamente,
como ele sofreu durante toda sua vida, é capaz de fazer vibrar as fibras do coração da
humanidade.
Somente alguém que, como ele, tenha sentido as dores de um nascimento
espiritual, que o admitiu nos planos da alma, pode escrever com o poder de cativar seus
leitores.
Como resultado de seu nascimento espiritual, os escritos de Max Heindel,
que ele legou à humanidade, podem florescer e dar frutos.
Oxalá os leitores deste livro possam sentir os batimentos do coração deste
grande espírito da humanidade, que sacrificou sua própria existência física no desejo de
compartilhar com os homens as verdades maravilhosas que ele recolheu por meio de seu
contato com os Irmãos Maiores da Ordem Rosa-Cruz.
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INICIAÇÃO ANTIGA E MODERNA
A FRATERNIDADE ROSA-CRUZ
PREFÁCIO
No conteúdo das páginas deste pequeno volume se acham algumas das mais
apreciadas jóias pertencentes às fases mais profundas da religião Cristã. Estas jóias são o
resultado das investigações espirituais do inspirado e iluminado Max Heindel, o mensageiro
autorizado dos Irmãos Maiores da Ordem Rosa-Cruz, que estão trabalhando para
disseminar por todo mundo ocidental o profundo significado espiritual que se acha, por sua
vez, revelado e oculto, dentro da religião Cristã.
Os diversos e importantes passos, como os vemos perfilados na vida de
nosso salvador Jesus Cristo, formam o plano geral da Iniciação para a humanidade. Max
Heindel, nesta obra, nos oferece uma visão mais profunda e mística deste processo
alquímico, posto que se efetua dentro do próprio corpo do homem. Pois, nós somos “um
pouco abaixo dos anjos... e não aparentamos, todavia, o que chegaremos a ser”.
Este volume será uma edição muito bem recebida nas bibliotecas de muitos
sacerdotes e organizações eclesiásticas de todo mundo; pois fará soar uma nova nota de
inspiração e de ânimo para todos aqueles que trabalham em seu nome.
A Escola Rosa-Cruz tem uma herança inapreciável na oportunidade de
propagar, durante esta época de prova, e decisiva, para a evolução espiritual dos homens e
das nações, os ensinamentos esotéricos pertencentes à Igreja Cristã. “A aquele a quem
muito se tem dado, se lhe exigirá muito também.” Portanto, a Fraternidade Rosa-Cruz
dedica, com o maior espírito de reverência e humildade, os valiosos ensinamentos contidos
neste livro, para o serviço da humanidade.
Que sua Verdade ilumine; sua Sabedoria guie e seu Amor abrace a todos
aqueles que participem destas Águas da Vida e que todos, e cada um dos que se acerquem
delas, encontrem a Iluminada Senda que aqui se perfila, é o veemente desejo da
Fraternidade Rosa-Cruz.
“O Reino dos Céus é semelhante a um mercador
que buscava pérolas e que, uma vez que achou uma
pérola de grande valor, foi e vendeu tudo que
possuía e a comprou.”
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PRIMEIRA PARTE
O TABERNÁCULO NO DESERTO
CAPÍTULO PRIMEIRO
O TEMPLO DE MISTÉRIOS ATLANTE
Desde que a humanidade, os espirituais filhos pródigos de nosso Pai
celestial, deambulou pelo deserto do mundo e se alimentou dos resíduos e sobras de seus
prazeres, que depauperam a alma, do mesmo modo que desperdícios de alimentos
depauperam o corpo, tem havido dentro do coração do homem uma voz sem palavras que o
tem premido e acossado para que volva a seu lugar; porém, a maioria dos homens se acha
tão embevecida em seus interesses materiais, que não a ouve. O maçon místico, que ouve
essa voz sem palavra, se sente compelido por uma força interna a buscar a Palavra Perdida;
a construir uma casa para Deus, um templo do espírito, onde possa encontrar o Pai frente a
frente e responder à sua chamada.
Nesta busca não está abandonado às suas próprias forças, pois nosso Pai
celestial nos tem preparado, por Ele mesmo, um caminho marcado com guias e sinais, o
qual nos conduzirá a Ele, se o seguirmos até o fim. Porém, como esquecemos a Palavra
divina e agora não seríamos capazes de compreender seu significado, o Pai nos fala numa
linguagem simbólica, a qual, por sua vez, revela e oculta as verdades espirituais que nós
devemos saber antes que cheguemos a Ele. Do mesmo modo que nós damos a nossos filhos
livros ilustrados, os quais revelam às suas mentes infantis conceitos intelectuais que não
poderiam compreender de outra maneira; também, todos os símbolos que Deus nos dá têm
um profundo significado que não pode ser aprendido, a não ser por tais símbolos.
“Deus é espírito e deve ser adorado em espírito.” Portanto, está proibido,
estritamente, fazer alguma imagem material d’Ele, ou coisa semelhante, porque nada que
nós possamos fazer pode nos dar uma idéia adequada. Porém, da mesma forma que nós
saudamos a bandeira de nosso país com alegria e entusiasmo, devido a que ela desperta e
acende em nossos peitos os sentimentos mais ternos, por tudo que representa a nosso lugar
e a nossos seres queridos; devido a que ela excita e levanta nossos mais nobres impulsos;
devido a que ela é um símbolo de todas as coisas que nos são mais queridas; do mesmo
modo, os diferentes símbolos divinos, que têm sido dados à humanidade, vez ou outra,
falam a esse tribunal da verdade que há dentro de nossos peitos e despertam nossas
consciências para idéias divinas que estão completamente fora do alcance das palavras.
Assim, pois, o simbolismo, que tem desempenhado um papel de primordial importância em
nossa passada evolução, é também uma necessidade vital para nosso desenvolvimento
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espiritual, daí a conveniência de estudá-lo com nossos corações, e não com os nossos
intelectos.
É óbvio que nossa atitude mental de hoje depende do modo como
pensávamos ontem e, também, que nosso estado atual e as circunstâncias que nos rodeiam
dependem do modo como satisfizemos, ou rechaçamos, nossas obrigações no passado.
Cada novo pensamento, ou idéia, que chega ao nosso cérebro, nós o vemos mediante a luz e
raciocínio de nossa experiência anterior e, desse modo, podemos deduzir que nosso
presente e nosso futuro estão determinados por nossa maneira de viver no passado. De
igual modo, o caminho do esforço espiritual que foi percorrido e pavimentado por nós
mesmos em passadas experiências, determina nossa atitude atual e o caminho que devemos
seguir para alcançar nossas aspirações. Portanto, não conseguiremos alcançar uma
perspectiva verdadeira de nosso desenvolvimento futuro, a menos que, primeiramente, nos
familiarizemos com o passado.
É pelo reconhecimento deste fator que a Maçonaria volve o olhar para trás
para entender, observar e estudar tudo referente ao templo de Salomão. Isto está muito bem
até este ponto; porém, com o objetivo de que tenhamos e abarquemos uma perspectiva total
e absoluta, devemos tomar em consideração, também, o antigo Templo de Mistérios
Atlante: o Tabernáculo no Deserto. Nós devemos compreender a importância relativa
daquele Tabernáculo e também a dos templos, o primeiro e o segundo, pois havia entre eles
diferenças vitais; cada um deles dotado de significado cósmico e dentro de todos eles se
projetava a sombra, ou perspectiva, da Cruz salpicada com Sangue, a qual se converteu em
Rosas.
O TABERNÁCULO NO DESERTO
Lemos na Bíblia a história do modo como Noé, e um resíduo de seu povo
com ele, foi salvo do dilúvio e formou o núcleo da humanidade da época, ou Idade do
ARCO IRIS, na qual nos achamos atualmente vivendo. Na Bíblia se diz, também, que
Moisés tirou seu povo do Egito, a terra do Touro – Taurus – atravessando as águas que
afogaram seus inimigos e os libertou, com a denominação de povo eleito, para adorar o
Cordeiro – Áries – em cujo signo entrou, então, o Sol, pela precisão dos equinócios. Estas
duas narrativas se referem a uma só e mesma coisa, isto é: a emergência da humanidade
infantil do inundado continente atlântico à presente época de ciclos alternantes, na qual o
verão e o inverno, o dia e a noite, o fluxo e o refluxo se sucedem invariável e
constantemente. Então, a humanidade, que acabava de ser dotada de mente, começou a
compreender e a avaliar a perda da visão espiritual, que até aquele momento o homem
havia possuído, com o que nasceu nela uma nostalgia e anelo pelo mundo espiritual e seus
guias divinos, que acostumara a ver e que não nos tem abandonado, nunca, pois a
humanidade nunca cessou de lamentar aquela perda. Assim, pois, o antigo Templo de
Mistérios Atlante, o Tabernáculo no Deserto, lhe foi dado para que pudesse achar a seu
Senhor quando se houvesse qualificado para isso, por meio do serviço e da subjugação da
natureza inferior pelo Eu Superior. Como havia sido desenhado e projetado por Jeová, era a
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incorporação de grandiosas verdades cósmicas ocultas com o véu do simbolismo, e que lhe
falavam a seu foro íntimo, isto é: a seu Eu Superior.
Em primeiro lugar, é digno de notar que este Tabernáculo de ideação divina
foi dado a um povo eleito, que devia erigi-lo, ou levanta-lo, graças a donativos e oferendas
voluntárias, entregues com toda a sua alma e coração.Aqui temos para aprender uma lição
muito importante, porque a ordem para seguir o caminho do progresso não se dá sem que se
tenha feito previamente uma aliança com Deus, pela qual se compromete a servir-Lhe e se
acha voluntarioso para oferecer o sangue de seu coração, vivendo uma vida de serviço, sem
buscar a sua própria conveniência. O termo “maçon” é derivado de phree messem, que são
vocábulos egípcios que significam “Filhos da Luz”. Na linguagem maçônica, Deus é
conhecido com o nome de Grande Arquiteto. Arche é uma palavra grega que quer dizer
“substância primordial ou primária”. Tekton é uma palavra grega que significa
“construtor”. Diz-se que José, o pai de Jesus, era “carpinteiro”, porém a palavra original
empregada é a grega “tekton”, isto é: construtor. Da mesma forma, se diz que Jesus foi um
tekton, ou seja: um construtor. De modo que todo místico “franco-maçon” verdadeiro é um
filho da luz, um construtor, que está se esforçando para construir o templo místico, de
acordo com a ordem, ou modelo divino, que lhe foi dada por nosso Pai que está nos Céus.
A esse fim ele dedica todo seu coração, alma e mente. É sua aspiração, ou deve ser, a de ser
“o maior no reino de Deus”, e, portanto, deve ser o servente de todos.
O próximo ponto que requer nossa atenção é a colocação do Templo, com
respeito aos pontos cardeais, e achamos que estava disposto diretamente de Este para Oeste.
Assim, pois, vemos que o caminho do progresso espiritual é o mesmo que o do astro do dia,
isto é: marcha de Este para Oeste. O aspirante que entrava pela porta oriental e continuava
andando adiante, tocava o Altar das Oferendas, ou Altar dos Sacrifícios, onde se
queimavam aquelas oferendas, depois chegava ao Lavabo de Bronze, para, em continuação,
penetrar no vestíbulo, quarto departamento oriental do Tabernáculo propriamente dito,
chamado Lugar Santo e, por último, na parte mais ocidental do Tabernáculo, o Santo dos
Santos, onde a Arca, o símbolo mais grandioso de todos, estava colocada. Tal como os três
homens sábios, ou Reis Magos do Oriente, seguiram a estrela de Cristo em direção do
Oeste, até chegar a Belém; do mesmo modo, o centro espiritual do mundo civilizado se
desloca, ou marcha, sempre para o Oeste, até que, hoje, a crista da onda espiritual, que em
um distante dia partiu da China, das bordas ocidentais do Pacífico, agora chegou às bordas
orientais deste mesmo Oceano, onde está juntando suas forças para saltar uma vez mais, em
sua cíclica jornada, através da imensidão das águas para voltar a começar de novo, em um
distante futuro, uma nova jornada cíclica ao redor da terra.
A natureza ambulante deste Tabernáculo no Deserto é, portanto, uma
excelente representação simbólica da natureza migratória do homem, um eterno peregrino,
passando constantemente das bordas do tempo na eternidade e volvendo outra vez. Do
mesmo modo que um planeta revolve e gira em sua jornada cíclica em redor do Sol, assim
o homem, o pequeno mundo ou microcosmos, se move ciclicamente em um círculo ao
redor de Deus, que é a origem e a meta de todos.
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O grande cuidado e a atenção tida nos detalhes acerca da construção do
Tabernáculo no Deserto nos indicam que algo muito mais sublime, que uma mera
impressão do sentido ocular, se intentava com a sua construção. Sob sua aparência material
e terrena, ali estava desenhada a representação de coisas celestiais e espirituais tais, que
continham uma completa instrução para o candidato à Iniciação e, por conseguinte, não é
aceitável que esta refração nos excite a buscar naquele antigo santuário um conhecimento
íntimo e familiar?
Seguramente está justificado que consideremos todas as partes de seu plano
com séria atenção, cuidadosa e reverente; recordando, a cada passo, a origem divina de
todo ele e nos esforçando, humildemente, para decifrar, através das trevas de seu serviço
terreno, suas sublimes e gloriosas realidades, as quais, de acordo com a sabedoria do
espírito, se nos oferecem e propõem para nossa solene contemplação.
Para que possamos ter a adequada concepção daquele lugar sagrado,
devemos considerar o Tabernáculo em si mesmo; sua ornamentação, ou mobiliário, e seu
átrio. A figura que mostramos adiante pode ajudar a que o leitor forme uma idéia mais
perfeita da disposição dos objetos que havia dentro desse Tabernáculo.
O PÁTIO, OU ÁTRIO, DO TABERNÁCULO
Este espaço era um cercado que rodeava o Tabernáculo. Seu comprimento
era o dobro de sua largura e a entrada se achava colocada na fachada oriental. A porta, ou
entrada, achava-se coberta, ou cerrada, por uma cortina de fino linho retorcido, nas cores
azul, escarlate e púrpura; cores que, sem esforço algum para nossa imaginação, podemos
ver que proclamam, ou definem, claramente o relativo estado cósmico deste Tabernáculo
no Deserto. Está dito, no sublime Evangelho de São João, que “Deus é luz”, e não há
descrição, nem símile, que possa envolver, nem comunicar, uma concepção melhor, ou
mais iluminada a uma mente espiritual, que estas palavras. Quando refletimos que os
maiores e mais modernos telescópios ainda não lograram alcançar os limites, ou fronteiras,
da luz, apesar de penetrarem milhões e milhões de milhas no espaço, aquela definição que
São João nos dá de Deus nos oferece uma débil, porém, não obstante, compreensível idéia
da infinidade de Deus.
Nós sabemos que a luz, que é Deus, é refratada em três cores primárias pela
atmosfera que rodeia a Terra e cujas cores são: azul, amarelo e vermelho. E é uma realidade
bem conhecida por todo ocultista que o raio do Pai é azul; por sua vez que o do Filho é
amarelo, assim como o do Espírito Santo é vermelho. Somente o raio mais potente e
espiritual pode alcançar e penetrar até o centro, ou raiz, da consciência da onda da vida que
se acha incorporada no reino mineral de nosso planeta e, por esta razão, vemos nas encostas
das montanhas o raio azul do Pai refletido pelas áridas colinas e flutuando como uma
bruma, ou neblina, pelas gargantas e quebraduras das montanhas. O raio amarelo do Filho,
mesclado com o azul do Pai, proporciona a vida e a vitalidade do mundo vegetal, o qual,
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por esta razão, se nos oferece refletido na cor verde, porque a planta é incapaz de conservar
dentro dela este raio. Porém, no reino animal, ao qual anatomicamente pertence o homem
ainda não regenerado, os três raios são absorvidos, e o raio vermelho do Espírito Santo é o
que empresta a cor encarnada a seu sangue e à sua carne. A mescla do azul e do vermelho é
evidente no sangue purpúreo, envenenado como conseqüência do pecado. Porém o amarelo
não se evidencia nunca, até que se manifesta como o corpo da alma, o “traje dourado de
bodas” que ostenta a noiva mística do místico Cristo, emanado desde dentro.
De modo que as cores dos véus do Templo, tanto o da entrada como o da
porta do Tabernáculo, indicavam que esta edificação foi projetada para um período anterior
ao tempo de Cristo, posto que só haviam presentes, como se disse, as cores azul e escarlate,
do Pai e do Espírito Santo, junto, como resultante de sua mescla, a púrpura. Porém, a cor
branca é a síntese de toda gama de cores e, portanto, o raio amarelo de Cristo se achava
oculto naquela parte do véu, até que, ao correr dos tempos, apareceria Cristo para nos
emancipar das ordenanças e das restrições da lei e nos iniciar nessa total emancipação da
liberdade como Filhos de Deus, Filhos da Luz, Criaturas da Luz, “Phree messem”, ou
Maçons místicos.
CAPÍTULO I I
O ALTAR DE BRONZE E O LAVABO, OU PIA
O Altar de Bronze estava colocado dentro do recinto, logo após a entrada
Leste, e era usado para o sacrifício dos animais durante o serviço do Templo. A idéia de
empregar touros e cabras para o sacrifício poderá parecer bárbara às mentes de hoje e nós
não podemos conceber que pudesse ter nenhuma eficácia neste sentido. A Bíblia, sem
dúvida alguma, corrobora e apóia esta nossa idéia a respeito deste ponto, porque nela se nos
diz, repetidamente, que Deus não deseja sacrifícios, mas um espírito humilde e um coração
contrito, e que para Ele não há prazer em tais sacrifícios. Em vista disso, parece estranho
que se hajam empregado e pedido sacrifícios de tal índole. Entretanto, nós devemos ter em
conta que não há religião que possa levar àqueles para quem estão destinados seus
ensinamentos, se estes ensinamentos estão muito acima de seu nível intelectual ou moral.
Para que uma religião possa atrair e servir a um bárbaro deve ter em si certos rasgos de
barbárie. Uma religião de amor não podia fazer prosélitos naquela gente israelita, para a
qual se lhes deu uma lei que exigia “olho por olho e dente por dente”. Não se acha em
nenhuma parte do Velho Testamento alguma menção de imortalidade, porque aqueles
homens não podiam compreender nada de um céu, nem tão pouco aspirar a ele. Porém, em
troca, eles amavam e tinham carinho por suas propriedades materiais e, em conseqüência,
se lhes predisse que se trabalhassem bem e justamente, tanto eles como sua semente
habitariam na Terra para sempre; que seus ganhos seriam multiplicados, etc., etc.
Amavam, sim, seus bens materiais e eles sabiam que o aumento de seus
rebanhos era devido ao favor do Senhor, já que Ele se lhes o concedia por mérito de suas
boas obras. De modo que se lhes ensinou a que obrassem com justiça, com a esperança de
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uma recompensa imediata neste mundo. Do mesmo modo, se lhes inculcava a idéia de
repelir o mau obrar, por causa do castigo rápido e imediato que ele levaria consigo, isto é:
todos aqueles castigos recebidos, se lhes foi dito que eram a retribuição, ou conseqüência,
de seus pecados. Este era o único meio que havia para levá-los no caminho do bem. Em tal
estado de evolução, não obravam com justiça por amor à justiça; nem, tão pouco, podiam
compreender o princípio de se fazerem a si mesmos “sacrifícios viventes” e,
provavelmente, eles sentiam, então, a perda de um animal cedido em sacrifício por um
pecado, ou transgressão da lei, com a mesma intensidade que nós sentimos hoje os
remorsos da consciência por nossas más ações.
O Altar era feito de bronze, metal que não se acha em estado natural, mas
que é produzido pelo homem, mediante uma mistura de cobre e zinco. Disto se deduz que
com ele se insinuava, simbolicamente, que o pecado não estava compreendido, nem
previsto, no plano de nossa evolução e, portanto, é uma anomalia na Natureza, assim como
também, suas conseqüências: a dor e a morte, que estão simbolizadas pelas vítimas
sacrificadas. Porém, se o Altar, em si, era feito com material de composição artificial, o
fogo que ardia incessantemente sobre ele era de origem divina e era mantido ardendo
constantemente, ano após ano, com o mais zeloso cuidado. Nunca se fez uso de outro fogo,
distinto do original e podemos meditar, para nossa iluminação interna, que em uma ocasião
em que um dos sacerdotes presunçosos e rebeldes, desdenhando este mandamento,
pretendeu empregar um fogo estranho, se deparou com uma pavorosa retribuição e com
morte instantânea. Quando fazemos o juramento de aliança com o Mestre místico, o Eu
Superior, é extremamente perigoso o desdenhar os preceitos desse juramento de aliança.
Quando o candidato aparece na entrada oriental está “pobre, desnudo e
cego”. Em tal momento, é um objeto de lástima e de comiseração, necessitando ser vestido
e levado até a luz; contudo, isto não pode se fazer imediatamente no Templo místico.
Durante o tempo de seu progresso, de seu estado de nudez até que tenha
sido vestido com o magnífico manto do grande sacerdote, transcorre um enorme espaço de
tempo, durante o qual tem que percorrer um grande e difícil caminho. A primeira lição que
se lhe dá é que o homem avança unicamente mediante o sacrifício. Na Iniciação mística
Cristã, quando o Cristo lava os pés de seus Discípulos, se dá a explicação de que se não
fosse pela decomposição dos minerais de modo que sirvam para dar corpo ao reino vegetal,
não teríamos vegetação; que se o alimento vegetal não provesse sustento para os animais,
estes últimos seres não poderiam viver, nem existir, e assim sucessivamente, o superior, o
mais acima, necessita sustentar-se com o mais abaixo, o inferior. Por esta razão, o homem
tem uma dívida contraída com eles e, como conseqüência, o Mestre lava os pés de seus
Discípulos, simbolizando, no ato desse serviço servil e baixo, o reconhecimento de que eles
o têm servido como escalão para poder chegar a algo superior.
Do mesmo modo, quando o candidato é levado ao Altar de Bronze aprende
a lição de que o animal é sacrificado por seu amor e benefício, dando seu corpo para
alimento e sua pele para agasalho. Ademais, vê a densa nuvem de fumo que flutua sobre o
Altar e percebe dentro dela uma luz, porém aquela luz é demasiado tênue, demasiada
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envolta em fumo, para que possa servir-lhe de guia permanente. Seus olhos espirituais estão
débeis e, portanto, não pode expô-los imediatamente à luz de verdades espirituais mais
elevadas.
O apóstolo São Paulo nos diz que o Tabernáculo no Deserto era uma
sombra, perspectiva ou projeção, de coisas maiores que haviam de vir. Portanto, será de
interesse e benefício conhecer qual é o significado deste Altar de Bronze, com seus
sacrifícios e a queima das carnes, para o candidato que chega à porta do Templo nestes
tempos modernos.
A fim de que possamos compreender este mistério, primeiramente devemos
imaginar a grande idéia absolutamente essencial subjacente, que compreende todo
verdadeiro misticismo, isto é: que todas estas coisas estão dentro e não fora do candidato,
ou do místico. Ângelus Silesius disse acerca da Cruz:
“Ainda que Cristo nascesse mil vezes
em Belém e não dentro de ti mesmo, tua alma estará desencaminhada. A Cruz do
Gólgota contemplarás em vão, enquanto não se levante dentro de ti mesmo”.
Esta idéia deve ser aplicada a cada símbolo e fase das experiências místicas.
Não é o Cristo externo o que nos salva, porém é o Cristo interno a nascer dentro de nós. O
Tabernáculo foi construído realmente em uma época determinada, como se pode ver
claramente na Memória da Natureza, quando a vista interna se tenha desenvolvido em certo
grau; porém, nada é ajudado, e não o foi nunca, pelo símbolo externo. Nós devemos
construir o Tabernáculo dentro de nossos próprios corações e de nossas consciências e, uma
vez construído, devemos viver, durante nossa passagem por todo ele, em forma de
experiência real, todo o ritual do serviço que no símbolo do Tabernáculo externo se
realizava. Devemos, também, nos converter no Altar de Sacrifícios e ao mesmo tempo ser a
hóstia, ou oblação, que nele se oferece e que simbolizará o animal que em tempos passados
nele se imolava como oferenda. Devemos, assim, converter-nos no sacerdote que degola o
animal e, ao mesmo tempo, ser a vítima que é imolada. Posteriormente, devemos aprender
o modo de nos identificar com o Lavabo místico, assim como conhecer o modo de nos
lavarmos nele, em espírito. Então, devemos passar ao compartimento oriental, que está
atrás do primeiro véu e ministrar nele; e assim, sucessivamente, passar através de todo o
serviço do Templo, até que nos convertamos no maior de todos aqueles símbolos, a Glória
do Shekinah, pois do contrário tudo de nada nos servirá. Em resumo: antes que o símbolo
do Tabernáculo possa realmente nos favorecer, devemos transferi-lo da aridez e esterilidade
do deserto para os nossos próprios corações, de modo que quando nos tenhamos convertido
em tudo que aquele símbolo significa, também nos tenhamos transformado em tudo aquilo
que de espiritual tem seu significado.
Em todo caso, devemos começar a construir e a levantar dentro de nós
mesmos o Altar de Sacrifícios, antes de podermos oferecer sobre ele nossos erros e faltas,
para então poder purgá-los no crisol do remorso. Isto se efetua no moderno sistema da
preparação para o discipulado, por meio de um exercício que se executa ao se deitar;
exercício que foi criado pelos Hierofantes da Escola de Mistérios Ocidental, de acordo com
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bases científicas, para o adiantamento do aspirante na senda que conduz ao discipulado.
Outras Escolas dão um exercício semelhante, porém este oferece uma diferença, em um
ponto especialíssimo, de todos os outros métodos. Depois de explanar o exercício de
referência, detalharemos a razão dessa distinção radical. Este especial método tem um
efeito de adiantamento tão transcendental que permite, ao que o executa devidamente, o
aprender agora não somente as lições que deveria aprender ordinariamente nesta atual vida,
mas também alcançar um adiantamento e efetuar um desenvolvimento espiritual que não
conseguiria senão depois de viver várias vidas, isto é: depois de passar por várias
encarnações.
O exercício a que nos referimos, é conhecido com o nome de exercício
noturno, ou de retrospecção, e se executa do seguinte modo: depois de se deitar na cama, a
primeira coisa a se fazer é relaxar o corpo. Isto é muito importante, porque quando há
alguma parte do corpo que está em tensão, o sangue não circula livre e uniformemente, pois
parte dele, devido à pressão, fica contida por algum tempo ao passar pelo órgão em tensão,
como é natural, e todo desenvolvimento espiritual depende do sangue. Não se pode fazer o
máximo esforço para alcançar o crescimento da alma quando há alguma parte do corpo que
está em tensão.
Quando se alcança o perfeito relaxamento, o executante, que deve ser todo
aspirante à vida superior, começa a repassar o que fez durante o dia que acaba de viver;
porém, e nisto se estriba aquela diferença radical, não começa vivendo, ou repassando, os
primeiros acontecimentos da manhã, para terminar com os atos executados nos últimos
momentos da noite; mas os revisa e examina em ordem inversa como os viveu, isto é:
primeiro vê as cenas vividas há poucos minutos; continuando retrocedendo pela cena; a
saída do trabalho; o trabalho da tarde; os atos executados ao meio-dia, passando aos da
manhã, para terminar pelas primeiras ocorrências da manhã. Com isso se vê o nome
adequado que lhe dá nossa Escola, ou seja: de “retrospecção”.
A razão para isto está em que desde o primeiro momento do nascimento de
uma criança, quando esta faz a primeira inspiração, o ar que se inala nos pulmões leva
consigo uma fotografia, ou imagem, do mundo externo que rodeia a criança e, à medida que
o sangue corre e passa pelo ventrículo esquerdo do coração, cada cena da vida se grava, ou
se imprime, em uma célula que está colocada ali. Cada nova respiração traz com ela novas
imagens e quadros e, deste modo, se imprime e grava, em tal célula, um registro, ou
recordação, de todas as cenas e atos de toda nossa vida, desde a primeira respiração que
damos ao nascer, até o último suspiro ao morrer. Depois da morte, todas essas imagens, ou
impressões, formam a base de nossa vida no purgatório. Devido às condições próprias do
mundo espiritual, sofremos os remorsos da consciência tão agudamente por cada ato mau
cometido que, até parece incrível, com o sofrimento, chega à nossa consciência a
necessidade de abandonar o caminho do erro e do mau obrar. De outra parte, a intensidade
do gozo que experimentamos, como conseqüência de nossos bons atos, nos estimula a
seguir a senda da virtude em nossas vidas futuras.
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Porém, em nossa existência post mortem, este panorama da vida se revive
em ordem inversa, com o propósito de demonstrar primeiramente os efeitos e logo depois
as causas que deram lugar àqueles, com o quê o espírito pode aprender o modo como a lei
de Causa e Efeito atua na vida. Por esta razão, ao aspirante que está sob a guia e direção
dos Irmãos Maiores dos Rosa-Cruzes, se lhe ensina a realizar este exercício noturno em
ordem inversa e também a julgar-se a si mesmo a cada dia, de modo que possa escapar a
esse sofrimento do purgatório, depois da morte. Porém, é preciso fazer notar que de nada
servirá uma mera e superficial revisão de nossos atos e cenas de cada dia. Não é suficiente
que, ao chegar a um momento em que tenhamos feito um grave dano a alguém, dizer
displicentemente: “Homem, sinto muito, Fiz sem querer!” Não! Devemos ter em conta
que, naquele instante, somos iguais àquele animal sacrificado e que se achava estendido em
cima do Altar das Oferendas, disposto para ser queimado. E, a menos que sintamos no mais
profundo de nossos corações o efeito daquele fogo do remorso (que sabemos aceso pela
Divindade), isto é: um sentimento de arrependimento que chegue até mesmo à medula de
nossos ossos, por nossas faltas durante o dia, não evoluiremos nada.
Durante a dispensação antiga, todos os sacrifícios eram purificados com sal
antes de serem colocados sobre o Altar das Oferendas e Sacrifícios e destinados ao fogo.
Todos nós sabemos o quanto queima quando se toca com sal uma ferida recente. Aquela
purificação das vítimas, nos sacrifícios que se faziam naquele antigo Templo de Mistérios,
simbolizava a intensidade do remorso e queimação interna que nós devemos sentir quando,
voluntariamente, nos colocamos sobre o Altar dos Sacrifícios, como sacrifícios viventes. É
a sensação do remorso (a dor sincera e profunda) que sentimos por nossos erros, ofensas e
faltas, o que apaga a impressão, ou imagem, da célula semente até deixá-la limpa e sem
mancha; da mesma forma que, sob a dispensação no Antigo Testamento, os transgressores
ficavam perdoados quando apresentavam ante ao Altar das Oferendas um sacrifício para ser
queimado; assim nós, nos tempos atuais, pela execução desse exercício noturno
retrospectivo, apagamos as lembranças de nossos pecados. É uma conclusão lógica,
evidente, de que não podemos continuar, noite após noite, realizando este sacrifício vivente
sem nos fazermos melhores e, por conseqüência, deixarmos de fazer, pouco a pouco, as
coisas pelas quais nos censuramos a nós mesmo, durante este exercício noturno. De modo
que, além de eliminar nossas faltas atuais, este exercício nos eleva a tão alto nível
espiritual, que de nenhum modo haveríamos chegado nesta vida sem fazê-lo. Também é
digno de observar o fato de que quando alguém havia cometido um crime grave e chegava
ao Santuário, encontrava à sombra do Altar de Sacrifícios toda impunidade, porque ali
somente o fogo aceso por Deus podia executar o julgamento. O criminoso, pois, escapava
às mãos dos homens pondo-se, voluntariamente, sob as mãos de Deus. Assim, também, o
aspirante que reconhece seus erros e faltas, à noite, acercando-se espontaneamente ao altar
de seu juízo vivente, chega também ao Santuário da Lei de Causa e Efeito, com o que,
“ainda que seus pecados sejam vermelhos como escarlate, ficarão tão brancos como a
neve.”
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O LAVABO DE BRONZE, OU PIA
O Lavabo de Bronze era uma grande pia que sempre se mantinha cheia
d’água. Diz-se, na Bíblia, que estava assentada sobre os lombos, ou partes traseiras, de doze
bois, também feitos de bronze, ficando, portanto, suas partes traseiras no centro daquela
grande vasilha. Sem embargo do exame da Memória da Natureza, parece que aqueles
animais não eram bois, mas, sim, representações simbólicas dos doze signos do zodíaco. A
humanidade, naqueles tempos, se achava dividida em doze grupos, um por cada signo
zodiacal. Cada símbolo animal atraia um determinado raio e, da mesma forma que a água
benta que hoje se emprega nas igrejas católicas é magnetizada pelo sacerdote durante a
cerimônia da consagração, assim também a água daquela Pia era magnetizada pelas
Hierarquias divinas que guiavam a humanidade.
Não pode haver dúvida acerca do poder da água benta preparada por uma
personalidade forte e magnética. Essa água toma, ou absorve, o eflúvio do corpo vital do
sacerdote que a bendiz e os fiéis que a usam se fazem afins e flexíveis à sua finalidade, em
um grau proporcional à sensibilidade de cada um deles. Do mesmo modo, os Lavabos de
Bronze dos Templos de Mistérios da antiga Atlântida, onde a água era magnetizada pelas
Hierarquias divinas de incomensurável poder, constituíam um poderoso fator para a guia
daquele povo, de acordo com a vontade daqueles poderosos regentes. Por esta razão, os
sacerdotes agiam em perfeita obediência aos mandados e ordens de seus invisíveis
caudilhos espirituais e, por meio deles, o povo os seguia cegamente. Requeria-se que os
sacerdotes lavassem suas mãos e pés antes de penetrar no Tabernáculo propriamente dito.
Se este mandamento era desobedecido, imediatamente seguia-se a morte
daquele sacerdote, ao penetrar no Tabernáculo. Portanto, podemos dizer que, assim como a
nota-chave do Altar de Bronze era “justificação”, a idéia base, ou central, do Lavabo de
Bronze era a de “consagração”.
“Muitos são os chamados, porém poucos os escolhidos”. Nós temos o
exemplo do jovem rico que chegou a Cristo perguntando-lhe o que deveria fazer para
chegar a ser perfeito. Ele disse que havia guardado a lei, porém quando Cristo lhe disse:
“Segue-me”, não pode fazê-lo, porque tinha muitas riquezas que o prendiam e o sujeitavam
como um cepo. Do mesmo modo que a grande maioria da humanidade se contentava em
escapar à condenação, o jovem rico era demasiado tíbio, ou negligente, para fazer esforços
com objetivo de alcançar o prêmio merecido por suas obras, ou serviços. O Lavado de
Bronze é o símbolo da “santificação e da consagração” da vida para o serviço. Assim
como Cristo deu começo a seus três anos de ministério passando pelas águas do batismo,
assim também o aspirante ao serviço, no antigo Templo, devia santificar-se e si mesmo
naquela corrente sagrada que fluía daquela grande pia conhecida pelo nome de Mar
Fundido. E o maçon místico que está se esforçando em construir um templo “sem ruído de
martelos”, com objetivo de servir nele, deve também se consagrar e se santificar a si
próprio. Deve, voluntariamente, estar disposto a deixar todas as posses terrenas, de modo
que possa seguir sem vacilação, nem inconveniências, ao Cristo interno.
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Ainda que possa conservar suas riquezas, não obstante, deve considerá-las
como um sagrado depósito que se lhe tem confiado, o qual deve ser usado por ele como o
faria um prudente administrador com os bens que os tem confiado seu senhor. E nós
devemos estar sempre preparados para obedecer ao Cristo interno que nos diga “segue-
me”, ainda que a sombra da Cruz se projete, na obscuridade, sobre o fim de nosso caminho,
porque sem esse abandono decidido e completo de tudo da vida pela Luz, pelos propósitos
superiores e espirituais, não pode haver grande progresso nessa senda de perfeição. Da
mesma forma que o Espírito Santo desceu sobre Jesus quando saiu da água batismal da
consagração, assim também o maçon místico que se banha no Lavabo do Mar Fundido,
começa a ouvir debilmente a voz do Senhor dentro de seu próprio coração, ensinando-lhe
os segredos da Arte que deve usar para o benefício de seus semelhantes.
CAPÍTULO III
O COMPARTIMENTO ORIENTAL DO TEMPLO
Uma vez que tenha dado seus primeiros passos na Senda, o aspirante se
acha em frente ao véu que pende ante a entrada do Templo místico. Correndo-o para o lado,
penetra no interior do compartimento oriental do Santuário, o qual era chamado o “Lugar
Santo”. Não havia nenhuma janela, nem abertura de nenhuma espécie no Tabernáculo, que
permitisse deixar passar para dentro dele a luz do dia, porém esse compartimento nunca
estava obscuro. Noite e dia se achava brilhantemente iluminado por lâmpadas que ardiam.
Seu mobiliário era um símbolo dos métodos que o aspirante deve seguir
para alcançar o desenvolvimento de sua alma para o serviço. Consistia este mobiliário,
principalmente, em três objetos: o Altar do Incenso, a Mesa dos Pães da Proposição e o
Candelabro de Ouro, do qual procedia a luz.
Ao israelita comum não era permitido o ingresso nesse compartimento, nem que ele
visse os objetos lá existentes. Nada, senão um sacerdote, podia passar o véu externo e entrar
neste primeiro compartimento. O Candelabro de Ouro se achava colocado no lado Sul do
Lugar Santo, de modo que se achava ao lado esquerdo da pessoa que entrava nele. Era feito
de ouro puro e consistia em um braço, ou coluna central, elevando-se desde a base, da qual
saiam seis braços. Estes braços se destacavam de três pontos diferentes da coluna principal
e se curvavam para cima em três semicírculos de diâmetros diferentes (como é natural,
posto que saiam da coluna em alturas diferentes) e simbolizavam os três Períodos de
desenvolvimento (os Períodos de Saturno, Solar e Lunar) pelos quais passou o homem
antes de chegar ao atual Período Terrestre, em que, então, não havia chegado nem à metade
de seu desenvolvimento. Este último Período estava simbolizado pela sétima luz. Cada um
destes sete braços terminava em uma lâmpada e estas lâmpadas se nutriam do mais puro
azeite de oliva, que se fazia por um processo especial. Os sacerdotes eram encarregados de
cuidar do Candelabro, que nunca se achava sem alguma luz acesa. Todos os dias se
examinavam as lâmpadas, se as arrumava e se lhes colocava azeite, de modo que pudessem
arder constantemente.
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A Mesa dos Pães da Proposição estava colocada no lado Norte do
compartimento, de modo que se encontrava à mão direita do sacerdote, conforme entrava
neste compartimento e mirando o segundo véu. Em cima desta Mesa havia, sempre, doze
pães sem levedura, os quais se achavam em dois montes de seis pães cada um, pão sobre
pão e em cima de cada pilha, ou monte, se colocava uma pequena quantidade de incenso.
Estes pães eram chamados o pão da proposição, ou pão da face, porque eram postos
solenemente naquela Mesa, ante a presença do Senhor, que morava na Glória do Shekinah,
isto é: no compartimento atrás do segundo véu. A cada sábado, estes pães eram trocados
pelos sacerdotes: os velhos eram tirados dali e, em seu lugar, eram postos pães novos. Os
pães que eram retirados deviam ser comidos pelos sacerdotes e por ninguém mais, pois não
era permitido a nenhum outro que provasse deles; assim como não se tolerava que fossem
consumidos em outro lugar, a exceção feita dentro do Pátio do Santuário, devido a que
aquele pão era santo e, portanto, só podia ser tomado por pessoas sagradas e em terreno
santo.
O incenso que estava sobre as duas pilhas de pães da proposição era
queimado, ao se trocar os pães, como uma oferenda de fogo ante o Senhor, que se fazia em
lugar dos pães.
O Altar do Incenso, ou o Altar de Ouro constituía o terceiro objeto que
havia no Compartimento Oriental do Templo. Achava-se situado no centro do
compartimento, isto é: à idêntica distância das paredes Norte e Sul e em frente do segundo
véu. Nunca se queimava carne neste Altar, assim como tão pouco se o tocava com sangue
das vítimas, exceto em ocasiões soleníssimas e, então, somente seus vasos se marcavam
com o vermelho do pecado, ou da mácula. O fumo que se alçava de sua superfície nunca
era outro que o procedente do incenso queimado. Aquele fumo se elevava todas as manhãs
e noites, enchendo o Santuário com uma nuvem fragrante e levando ao exterior um olor
refrescante por todo ao redor, estendendo-se por todo o território em várias milhas à volta.
Devido a que todos os dias se o queimava, este incenso era chamado “um incenso perpétuo
diante do Senhor”.
Não era um incenso simples o que se queimava, mas um composto desta
substância com outras espécies doces, mescladas de acordo com as instruções dadas por
Jeová, especialmente para isto e, portanto, era considerado sagrado, até o extremo de que
não era permitido a ninguém o fazes para ser empregado comumente. O sacerdote tinha um
mandamento expresso de nunca oferecer um incenso diferente sobre o Altar de Ouro, ou
seja: que devia sempre empregar aquela composição sagrada. Este Altar se achava colocado
precisamente diante do véu, pela parte de fora, porém em contraposição ao Trono de
Misericórdia, que se achava detrás daquele véu; por essa razão, ainda que o sacerdote
oficiasse ante o Altar do Incenso, não podia ver o Trono de Misericórdia, devido a impedi-
lo o segundo véu; não obstante, devia, ao oferecê-lo, mirar para aquela direção e dirigi-lo
em tal sentido. Ademais, havia o costume de que quando a nuvem fragrante e odorífera do
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fumo do incenso se elevava por cima do templo, todas as pessoas que se achavam no Pátio
do Santuário enviavam suas preces a Deus, silenciosamente, cada uma para si.
O MÍSTICO SIGNIFICADO DO COMPARTIMENTO ORIENTAL
E SEU MOBILIÁRIO
O CANDELABRO DE OURO
Como foi dito anteriormente, quando o sacerdote se achava de pé no centro
do Compartimento de Este do Tabernáculo, o Candelabro de Sete Braços ficava à sua mão
esquerda e na parte do Sul. Isto simbolizava o fato de que os sete doadores, ou planetas,
que fazem sua dança mística ao redor da órbita central, o Sol, correm uma estreita faixa que
compreende oito graus de cada lado da senda do Sol, a qual é chamada o Zodíaco. “Deus é
Luz” e os “Sete Espíritos ante o Trono” são os ministros de Deus; portanto, são os
mensageiros da luz para a humanidade e eles são os que têm guiado o homem em sua senda
evolutiva. Ademais, assim como os céus estão resplandecentemente iluminados quando a
Lua, em sua fase, chega à sua plenitude na parte oriental dos céus, assim também o
Compartimento Oriental do Tabernáculo está pleno de LUZ, que indicava visivelmente a
presença nele de Deus e de seus sete Ministros, os Anjos das Estrelas.
Nós podemos notar, de passagem, que a luz do Candelabro de Ouro era
clara e a chama inodora, e compara-la com a chama meio envolta pelo fumo que se via no
Altar das Oferendas - de vítimas queimadas - a qual, em certo sentido, gerava trevas, em
vez de dissipá-las. Porém, há, ainda, um significado mais profundo e mais sublime neste
símbolo de fogo, o qual não discutiremos até que cheguemos à Glória do Shekinah, cujo
brilho deslumbrante flutuava sobre o Trono da Misericórdia, no Compartimento Ocidental.
Antes de penetrarmos neste tema, é preciso que nos familiarizemos com todos os símbolos
que se ofereciam à nossa vista, entre o Candelabro de Ouro e aquele sublime Fogo do Pai,
que era a glória coroada do Santo dos Santos, o Sancta Sanctorum, a parte mais sagrada do
Tabernáculo no Deserto.
A MESA DO PÃO DA PROPOSIÇÃO
O Compartimento Oriental do Templo pode ser chamado o Vestíbulo de
Serviço, pois ele corresponde aos três anos do ministério de Cristo e contém todos os
ornamentos e requisitos para o desenvolvimento da alma, ainda que, como já dissemos, só
estava adornado com três principais objetos. Entre eles, destaca-se a Mesa dos Pães da
Proposição, sobre a qual, como já sabemos, se colocavam duas pilhas, ou montes, de pães
caseiros, sem levedura, cada um dos quais continha seis pães, e sobre estes pães se colocava
um punhado de incenso. O aspirante que chegava à porta do Templo, “pobre, desnudo e
cego”, era levado, pois, à luz do Candelabro de Sete Braços, adquirindo um certo grau de
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conhecimento cósmico, que ele precisava empregar em benefício de seus semelhantes; e a
Mesa do Pão representava este símbolo.
O grão, do qual se havia elaborado aquele pão, em princípio, havia sido
dado por Deus; porém, depois, foi plantado pelo homem, que previamente havia arado e
preparado o terreno no qual o havia de semear. Depois de plantá-lo, teve também que
cultiva-lo e rega-lo; e quando o grão deu seu fruto, de acordo com a natureza do solo em
que crescia e do cuidado que havia recebido em seu crescimento, teve que ser segado,
batido, moído e purificado. Depois, os antigos servidores de Deus tinham que leva-lo ao
Templo, onde era colocado ante a presença do Senhor, como pão, para “demonstrar que os
homens haviam executado sua tarefa e rendido o serviço necessário”.
Os grãos de trigo dados por Deus, contidos nos doze pães, representam as
oportunidades para o desenvolvimento da alma que Deus nos deu e que nos vêem a todos e
a cada um, por meio dos doze departamentos da vida, representados pelas doze casas do
horóscopo, que estão sob o domínio das doze Hierarquias divinas, conhecidas como signos
do Zodíaco. Porém, é da incumbência e obrigação do maçon místico, o genuíno e autêntico
construtor do templo, o aproveitar tais oportunidades, cultiva-las e nutri-las, ou fomenta-
las, de modo que possa extrair delas o PÃO DA VIDA que nutre e alimenta a alma.
Não obstante, nós não assimilamos ordinariamente o total de nossa
alimentação física; há um resíduo, uma grande quantidade de cinzas sobrando, depois de
haver amalgamado a quinta-essência em nosso sistema. Por esta mesma razão, o Pão da
Proposição não se queimava, nem era consumido, ante ao Senhor, mas que se colocava dois
montinhos de incenso sobre os montes dos Pães de Proposição, um sobre cada monte. Isto
se considerava que era o aroma deles, e mais tarde era consumido pelo fogo no Altar do
Incenso.
Assim mesmo, o serviço prestado diariamente pelo maçon místico, e que
serve de sustento para sua alma, à noite é pulverizado no moinho da Retrospecção, ao
retirar-se para seu leito e praticar esse exercício científico indicado pelos Irmãos Maiores
da Rosa-Cruz. Porém, há uma época, cada mês, em que é particularmente propícia à
extração do incenso do crescimento da alma e queima-lo ante ao Senhor, de maneira que
possa ser amalgamado com corpo da alma e fazer parte da “radiante e dourada vestimenta
nupcial”, ou seja: quando a Lua se aproxima ao plenilúnio. Então, se encontra a Lua no
Este e os céus estão deslumbrantes de Luz, como o estava a habitação do Este do antigo
Templo de Mistérios atlânticos, onde o sacerdote fortificava o pábulo da alma simbolizado
pelo Pão da Proposição e de sua fragrante essência, que deleitava a nosso Pai celestial,
tanto então como agora.
Que o maçon místico tome especial nota, não obstante, de que o Pão da
Proposição não era obra de visionários, nem o produto de especulações sobre a natureza de
Deus, da luz ou coisa semelhante, mas que era o produto de um labor real, de um trabalho
ordenado e sistemático, isto é: que nos aguilhoa para seguir a senda de um serviço real, se
nós desejamos cultivar esse tesouro que podemos acumular no céu. A menos que
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trabalhemos realmente, SERVINDO À HUMANIDADE, não teremos nada que levar, nem
“pão” para propor nos festivais da Lua cheia e nas Bodas Místicas do Eu superior com o eu
inferior; nos encontraremos desprovidos do radiante e dourado corpo da alma – o místico
“MANTO DOURADO NUPCIAL” – sem o qual não se poderá consumar, nunca, a união
com Cristo.
O ALTAR DE INCENSO
No Altar de Incenso, conforme dissemos na descrição geral do Tabernáculo
e de seu mobiliário, continuamente se oferecia incenso ante ao Senhor, e o sacerdote que
estava oficiando diante do Altar, naquele momento, se achava em posição tal que mirava
para o Trono da Misericórdia por cima da Arca, se bem que lhe era impossível vê-la,
devido a que o impedia o segundo véu, que se achava interposto entre o primeiro e o
segundo Compartimento do Tabernáculo, chamados, respectivamente, o Lugar Santo e o
Santo dos Santos, ou o Sancta Sanctorum. Também vimos, ao tratar do “pão da
proposição”, que o incenso simbolizava o extrato, o aroma do serviço que temos prestado
de acordo com as ocasiões que se nos têm apresentado e às oportunidades que temos tido;
do mesmo modo que o animal imolado sobre o Altar de Bronze representa nossas faltas e
erros cometidos durante o dia, assim como o incenso queimado sobre o Altar de Ouro, que
é um doce aroma para o Senhor, representa as ações virtuosas de nossas vidas.
CAPÍTULO IV
A ARCA DA ALIANÇA
É de se ter em conta, por ser de grande significado místico, que o aroma do
serviço voluntário está representado por um doce olor, como incenso fragrante, enquanto
que o odor do pecado, do egoísmo e da transgressão da lei, representados por um sacrifício
obrigado, ou compulsório, sobre o Altar dos Sacrifícios, é nauseabundo, pois não é
necessária uma grande imaginação para compreender que a nuvem de fumo que se elevava
continuamente dos esqueletos e carnes queimados dos animais imolados originavam um
fedor nauseabundo, para conceber e demonstrar o quanto ele é repugnante; enquanto que o
incenso oferecido perpetuamente sobre o Altar diante do segundo véu, indicava, por
antítese, a beleza e sublimidade do serviço voluntário e desinteressado, exortando deste
modo o maçon místico, como um filho da luz, a evitar um e inclinar-se para o outro.
Gravemos bem em nossa consciência, que o serviço não consiste
unicamente em fazer grandes coisas. Alguns dos que o mundo reputa como heróis foram
insignificantes e vulgares em suas vidas, em geral, e se fizeram notáveis, um certo dia, por
um grande feito extraordinário e circunstancial. Tem havido mártires que foram postos no
calendário dos Santos porque morreram por uma causa; porém, algumas vezes, é um
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heroísmo maior, é um martírio maior, o fazer as pequenas coisas, que ninguém observa, e
sacrificar-se a si mesmo em um simples serviço pelos demais.
Já vimos que o véu da entrada do pátio exterior e o véu do compartimento
oriental do Tabernáculo estavam ambos confeccionados com tela de quatro cores: azul,
vermelha, púrpura e branca. Porém, o segundo véu, o véu que separava os dois
compartimentos em que se dividia o Tabernáculo propriamente dito, se diferenciava dos
outros dois em sua confecção, ou adornos, estando bordado com figuras de Querubins. Não
examinaremos o significado desta confecção, até que tratemos da questão da Lua nova e a
Iniciação, visto que agora penetraremos no segundo compartimento do Tabernáculo, o
compartimento ocidental chamado o Santo dos Santos.
Nenhum mortal podia ultrapassar este segundo véu e penetrar neste
segundo compartimento, senão o Grande Sacerdote, e unicamente o estava permitido fazê-
lo uma vez em todo o ano, ou seja: no dia da festividade do Yom Kippur, isto é, o Dia da
Proposição; e somente depois da preparação mais solene e com a reverência mais
majestosa. O Sancta Sanctorum se achava saturado da solenidade de outro mundo,
percebendo-se a presença de uma grandeza não terrena. O Tabernáculo todo era santuário
de Deus, porém aqui neste lugar se via a imponente manifestação de sua presença, a
morada excepcional da Glória do Shekinah, e bem se compreende que um mortal tremesse
ao só pensamento de se apresentar dentro de tão sagrado recinto, como o Grande Sacerdote
devia fazê-lo no Dia da Proposição.
No extremo ocidental deste compartimento, na parte mais extrema para o
Oeste de todo o Tabernáculo, descansava a ARCA DA ALIANÇA. Era um receptáculo
côncavo que continha o Pote de Ouro do Maná, a Vara de Aarão, que floresceu, e as
Tábuas da Lei que foram dadas a Moisés. Enquanto esta Arca da Aliança permaneceu no
Tabernáculo no Deserto, havia sempre postas duas estacas nos quatro anéis da Arca, de
modo que podia ser levantada instantaneamente e transportada, porém, quando a Arca,
finalmente, foi colocada no Templo de Salomão, aquelas estacas foram retiradas de seu
lugar. Isto é muito importante, por seu significado simbólico. Em cima da Arca se erguiam,
inclinados, dois Querubins, e entre eles morava a Glória incriada de Deus. “Ali – Ele disse a
Moisés – Eu estarei contigo e Me comunicarei contigo por cima do Trono da Misericórdia,
por meio dos Querubins que estão sobre a Arca do Testemunho”.
A glória do Senhor, vista por cima do Trono da Misericórdia, tinha a
aparência de uma nuvem. O Senhor disse a Moisés: “Diz a teu irmão Aarão que não entre
a todo instante no Santo dos Santos, isto é, por dentro do véu que está diante do Trono da
Misericórdia, o qual está sobre a Arca, para que não morra, pois Eu aparecerei em forma
de nuvem sobre o Trono da Misericórdia”.
Esta manifestação da divina presença foi chamada entre os judeus a Glória
do Shekinah. Sua aparição, sem dúvida alguma, se veria acompanhada de tão sublime glória
espiritual, que a nós é impossível formamos dela a devida idéia. Saindo daquela nuvem, se
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ouvia a voz de Deus, com profunda solenidade, quando era consultado sobre o bem estar,
interesse ou necessidade de Seu povo.
Quando o aspirante está qualificado para entrar nesta câmara, que o
segundo véu oculta, se encontra com tudo que é obscuro para seu olho físico e é necessário,
por esta razão, que tenha outra luz dentro dele. Quando, primeiramente, chegou à entrada
oriental do templo, se achava “pobre, desnudo e cego”, e vinha em busca da LUZ. Então se
lhe mostrou aquela luz nebulosa que se entrevia no fumo que saia do Altar dos Sacrifícios e
se lhe disse que, para que pudesse avançar, deveria acender dentro dele mesmo aquela
chama pelo arrependimento de seus erros e obras más. Posteriormente, se lhe mostrou a
brilhantíssima luz que se via no compartimento oriental do Tabernáculo, que procedia do
Candelabro de Sete Braços; em outras palavras: se lhe deu a luz do conhecimento e da
razão, com a qual poderia avançar em sua marcha pela Senda. Porém, se lhe exigiu que
mediante seu serviço desenvolvesse, ou evoluísse, dentro dele e ao seu redor outra luz, o
“traje dourado das bodas”, que é também a luz de Cristo do corpo da alma. Devido a seus
atos de ajuda a seus semelhantes durante suas vidas, essa gloriosa substância da alma,
gradualmente, rodeia toda sua aura, até que se acende e brilha como uma luz dourada. Não
lhe é possível penetrar nos recintos do segundo Tabernáculo, que é, como algumas vezes é
chamado, o Sancta Sanctorum, até que tenha cultivado e desenvolvido esta iluminação
interna.
“Deus é Luz” e “se nós caminharmos na luz, como Ele está na luz, teremos
fraternidade uns com os outros”. Esta sentença se toma, em geral, unicamente para indicar
a fraternidade, ou comunhão, dos Santos; porém, real e verdadeiramente, se aplica também
à fraternidade, ou união, que temos com Deus. Quando o discípulo penetra no segundo
Tabernáculo, a luz que existe dentro dele vibra em harmonia com a LUZ da Glória do
Shekinah, que está entre os Querubins e, então, compreende a amizade e fraternidade com o
Fogo do Pai.
De modo que os Querubins e o Fogo do Pai, que flutua sobre a Arca,
representam as Hierarquias divinas que guiaram a humanidade durante sua peregrinação
pelo deserto; assim, também, a Arca que está ali representa o homem em sua máxima
evolução. Existe dentro desta Arca, conforme já dissemos, três coisas: o Pote de Ouro do
Maná, a Vara florescida e as Tábuas da Lei.
Quando o aspirante se apresentou na entrada oriental, como um filho do
pecado, a lei estava fora dele para ensinar-lhe e dirigir-lhe para o Cristo. Então, a lei
pesava sobre ele com inexorável severidade, exigindo a estrita retribuição de “olho por
olho e dente por dente”. Toda transgressão implicava um castigo justo e eqüitativo e o
homem se achava circunscrito, em tudo, às leis que lhe ordenavam as coisas que devia
fazer, assim como as que NÃO devia fazer. Porém, quando, por meio do sacrifício e do
serviço, chega finalmente a tal estado de evolução, simbolizado pela Arca na Câmara
Ocidental do Tabernáculo, as Tábuas da Lei estão dentro e, então, se acha emancipado de
todas as coações e interferências externas de suas ações, não porque acha que pode
quebrantar, ou romper, as leis, mas porque ele já é um agente que trabalha com elas.
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Justamente, do mesmo modo que nós aprendemos a respeitar a propriedade dos demais e,
portanto, nos emancipamos do mandamento “Não furtar”; de igual modo, aquele que
guarda todas as leis, porque sente a necessidade e dever de fazê-lo assim, não tem
necessidade de um orientador externo, e alegremente manifesta obediência em todas as
coisas devido a que é um servidor da lei e atua com ela, por eleição e espontaneidade
próprias e não por necessidade.
A ARCA DA ALIANÇA
O POTE DE OURO DO MANÁ
“Manas”, “mensch”, “mens”, ou man” – esta última palavra que significa
“homem” em inglês – todos são vocábulos que se associam facilmente com o de “manna”,
ou “maná”, que caía do céu. Ele é, pois, o espírito humano que desceu do Pai para fazer sua
peregrinação pela matéria, e o Pote de Ouro onde se o conservava, dentro da Arca da
Aliança, simboliza a aura dourada do corpo da alma.
Ainda que o relato descrito na Bíblia não se ache em estrita concordância
com os fatos, não obstante, contém os fatos principais do místico maná que caía do céu. Se
nós desejamos conhecer qual é a natureza desta substância chamada pão, podemos recorrer
ao capítulo sexto do Evangelho de São João, onde se descreve que Cristo alimentou as
multidões com pães e peixes, o que simboliza a doutrina mística que havia de servir para os
dois mil anos seguintes e cuja época Ele inaugurava, pois durante esse espaço de tempo, o
Sol, por precisão dos equinócios, passaria pelo signo dos peixes – Peixes - e é por esta
razão que se dispôs que as gentes cristãs se abstivessem, por pelo menos um dia da semana
– às sextas-feiras – em uma determinada época do ano, de se alimentar de carne, que
corresponde ao Egito e aos antigos atlantes. Também se lhes pôs a água de Peixes nas
portas dos templos e as hóstias virginais nas mesas da comunhão, ante o Altar, onde eles
adoram a Virgem Imaculada, que representa o signo celestial de Virgem (que é o oposto ao
signo de Peixes) e entra em comunhão com o Sol iluminado por ela.
Cristo explicou, também, naquele momento, em mística, porém, inequívoca
linguagem, o que era aquele pão de vida, ou maná, isto é: o Ego. Encontraremos esta
definição nos versículos 33 e 35, onde se lê: “Pois o pão de Deus é aquele que desceu do
céu e deu a luz ao mundo”... “Eu sou – ego sum – o pão da vida.” Este é, pois, o símbolo
do Pote de Ouro do Maná, que se achava na Arca. Este maná é o Ego, ou espírito humano,
que dá vida aos organismos que vemos no mundo físico. Acha-se oculto dentro da arca de
cada ser humano, e o Pote de Ouro, ou corpo da alma, ou traje nupcial, está também latente
em todos nós e que se faz mais robusto, brilhante e resplandecente pela alquimia espiritual,
mediante a qual o serviço se transmuta em crescimento da alma. É, pois, a eterna casa
celestial construída sem empregar, para isto, as mãos, e de que São Paulo anelava ser
vestido, como nos disse em sua Epístola aos de Corinto. Todo aquele que se esforça em
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ajudar a seu próximo constrói e tece dentro de si esse véu e amontoa um tesouro que se
deposita no céu, onde nem a ferrugem nem a traça podem destruí-lo, nem esmaecê-lo.
A VARA DE AARÃO
Uma antiga lenda relata que quando Adão foi expulso do Paraíso do Éden
levou com ele três ramos da Árvore da Vida que, posteriormente, foram plantados por Set.
Set, o segundo filho de Adão, é, de acordo com a historia maçônica, o pai da hierarquia
espiritual dos clérigos, que trabalham com a humanidade por meio do Catolicismo,
enquanto que os filhos de Caim são os artífices, ou artesãos, do mundo. Estes últimos
trabalham na franco-maçonaria, promovendo o progresso material e industrial, como
construtores do templo de Salomão, o universo. Os três brotos plantados por Set têm
desempenhado uma missão muito importante no desenvolvimento espiritual da humanidade
e um deles se diz que é a Vara de Aarão.
No princípio da existência concreta do homem, a procriação se efetuava sob
a sábia guia e vigilância dos Anjos, que faziam que o ato criador se realizasse nos
momentos em que os raios das forças interplanetárias fossem propícios para o caso; assim o
homem foi proibido de comer da Arvore do Conhecimento. A natureza desta árvore fica
claramente determinada pelas sentenças bíblicas, tais como as seguintes: “Adão conheceu a
sua esposa e esta deu à luz Caim”; “Adão conheceu a sua esposa e ela pariu a Set”; ou
bem esta outra: “Como poderei eu conceber um menino, se não conheci a um homem?”,
que disse Maria a Gabriel, o Anjo anunciador. À luz desta interpretação, a sentença do Anjo
(não foi uma maldição), quando descobriu que seus preceitos haviam sido desobedecidos,
isto é: “vós morrereis”; mas que é perfeitamente natural e lógica, porque não se pode
esperar, nem pretender, que persistam os corpos gerados sem se ter em conta as influências
cósmicas. Daí que o homem foi expulso, desterrado, dos reinos etéreos da força espiritual
(o Éden), onde cresce a árvore da força vital; desterrado à existência concreta em corpos de
densidade física que conquistou para si por meio da geração. Tal sentença do Anjo, nestas
circunstâncias, é, sem dúvida alguma, uma bênção, pois quem é que tem um corpo
suficientemente bom e perfeito, a seu próprio juízo, no qual gostaria de viver eternamente?
A morte, pois, é uma fortuna e uma bênção, no sentido de que por ela podemos volver,
periodicamente, aos reinos espirituais e construir neles melhores veículos para cada vez que
voltemos à vida na Terra, conforme nos disse Oliver Wendell Holmes, em seu poema.
“Alma minha! Constrói mansões mais permanentes, segundo vão passando as estações. Abandona teus baixos tetos abobadados do passado e faz que
cada novo templo seja mais nobre que o passado. Isola-te do céu com uma
cúpula cada vez maior, até que, por último, te libertes, abandonando tua concha, já inservível, pela incessante vida do mar.”
No curso da vida, quando aprendemos a dominar o orgulho da vida e a
luxúria da carne, a geração deixará de absorver e esgotar nossa vitalidade. A energia vital
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se utilizará, então, da regeneração e as forças espirituais, simbolizadas pela Vara de Aarão,
se desenvolverão.
A varinha do mago, a lança sagrada de Parsifal, o Rei do Graal, e Vara
florescida de Aarão, são emblemas desta divina força criadora, que executa maravilhas de
tal natureza que nós as chamamos: milagres. Porém, há que se ter bem em conta que não há
ninguém que tenha chegado ao grau de evolução simbolizado pela Arca da Aliança, ante a
Câmara Ocidental do Tabernáculo, que utilize esta força com fins egoístas. Quando
Parsifal, o herói do mito da alma, que tem por título aquele nome, sofreu a tentação de
Kundry e comprovou por si mesmo a sua emancipação do pecado mais horroroso de todos,
o pecado da luxúria e da falta de castidade, ele recobra a sagrada lança que havia sido
tomada pelo mago negro, Klingsor, ao vencido e não casto Rei do Graal, Amfortas. Desde
aquele dia, Parsifal, durante muitos anos, viajou muito e percorreu todo o mundo buscando
novamente o Castelo do Graal e, ao volver a falar-se acerca dele, disse ao que o interrogava
de onde vinha: “Amiúde, eu tenho sido atacado ferozmente por inimigos e tentado ao uso
desta lança em defesa própria, porém eu entendia bem que a lança sagrada não deve ser
utilizada para ferir, mas unicamente para curar”.
E esta é a atitude de todo aquele que desenvolve dentro dele a florida Vara
de Aarão. Ainda que possa converter esta faculdade espiritual no sentido de prover de pão a
uma multidão, ele nunca (nem passará por sua imaginação) converterá uma só pedra em
pão para aplacar sua própria fome. Ainda que ele fosse pregado numa cruz e crucificado até
morrer nela, não intentaria libertar a si mesmo por meio de seus poderes espirituais, os
quais já empregou, anterior e prontamente, para salvar a outros da morte. Ainda que se
visse, diária e constantemente, acusado de trapaceiro e charlatão, nunca se determinaria a
fazer o uso indevido desta força espiritual, para mostrar um sinal, ou fazer um milagre, pelo
qual o mundo poderia conhecer, sem nenhuma sombra de dúvida, que ele é um regenerado,
ou nascido do céu. Esta foi a atitude de Jesus Cristo, e tem sido também a de todo aquele
que, como um Cristo em formação, segue Seus passos e quer imitá-Lo.
CAPÍTULO V
A SAGRADA GLÓRIA DO SHEKINAH (¹) (1) O SHEKINAH era chamado, no Tabernáculo, o ponto situado sob as asas dos
Querubins em adoração, e de onde se manifestava a invisível presença de Deus, ou
Jeová. (Nota do Tradutor)
O compartimento ocidental do Tabernáculo estava tão obscuro com o estão
os céus quando o luminar menor, a Lua, se acha na porção ocidental do firmamento, à caída
da tarde, e perto do Sol, isto é: nas fases da Lua nova, que é quando dá começo a um novo
ciclo em um novo signo do Zodíaco. Na parte mais ocidental deste Santuário, em trevas, se
achava colocada a Arca da Aliança, com dois Querubins em reverente adoração sobre ela, e
também a ardente Glória do Shekinah, da qual saia a Luz do Pai e comungava com seus
adoradores, porém, para a vista física, era invisível e, por conseguinte, obscura.
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Geralmente, nós não percebemos que o mundo todo é incandescente; que
há fogo na água; que esse elemento arde continuamente no vegetal, no animal e no homem;
pois, com efeito, não há nada no mundo que não esteja animado pelo fogo. A razão pela
qual não percebemos isto mais claramente é porque não podemos dissociar o fogo da
chama. Porém, realmente, o fogo tem a mesma relação com a chama, como a que guarda o
espírito com o corpo; é, sem dúvida alguma, a invisível, porém poderosa, força da
manifestação. Em outras palavras: o fogo é verdade obscura e, por conseguinte, invisível a
nossos olhos físicos. Fica unicamente envolto, ou rodeado, pela chama quando consome
alguma matéria física. Consideremos, como via ilustrativa, o modo pelo qual o fogo salta
da pederneira ao ser esta golpeada com um ferro, ou aceiro, e também o modo que uma
chama de gás do candeeiro tem o centro obscuro sob a porção que emite a luz, ou a chama,
e também como um fio pode transportar uma corrente elétrica e estar completamente frio e,
não obstante, deste fio saem chispas e chamas sob certas condições.
Neste ponto, pode ser oportuno o marcar a diferença existente entre o
Tabernáculo no Deserto, o Templo de Salomão e o último templo, edificado por Herodes.
Há entre eles uma diferença vital. Tanto o fogo milagrosamente aceso, que havia no Altar
de Bronze na parte oriental do Tabernáculo no Deserto, como a invisível Gloria do
Shekinah, na parte totalmente oposta, isto é: o ponto mais ocidental do Santuário; ambos se
achavam presentes no Templo de Salomão. Estes dois eram, pois, santuários em um sentido
não igualado pelo templo construído por Herodes. Este último foi, sem dúvida alguma, em
certo sentido, o mais glorioso dos três, posto que ficou santificado pela presença corporal
de nosso Senhor Jesus Cristo, em Quem morava a Deidade. Cristo é quem fez o primeiro
auto-sacrifício, com o que ab-rogou o sacrifício de animais e, finalmente, à consumação de
Sua obra no mundo visível, rasgou o véu e abriu o caminho do Sancta Sanctorum, não
somente para uns quantos privilegiados, os sacerdotes, ou levitas, mas para TODO
AQUELE QUE QUEIRA ir e servir à Deidade, que nós conhecemos com o nome de Pai.
Havendo guardado a lei e cumprido o profetizado pelos profetas, Cristo deu fim à época do
Santuário externo e então, desde aquele dia em diante, o Altar dos Sacrifícios e Oferendas
deve levantar-se dentro do coração para reparar e purgar os erros e faltas. O Candelabro de
Ouro deve ser aceso dentro do coração para que nos guie em nossa marcha pela senda
como o Cristo interno e a Glória do Shekinah do Pai, deve morar dentro dos recintos
sagrados de nossa própria consciência divina.
A SOMBRA DA CRUZ
Paulo, em sua carta aos hebreus, faz uma descrição do Tabernáculo e dá
uma detalhada informação sobre os usos e costumes que vigoravam nele, que nos seriam
muito interessante conhecer. Entre outras coisas, notemos que o Apóstolo denomina o
Templo “UMA SOMBRA DE BOAS COISAS QUE VIRÃO”. Há neste Templo de
Mistérios uma promessa feita, a qual ainda não foi cumprida; promessa tão firme e válida
hoje como no dia em que foi feita.
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Se, com os olhos da alma, visualizarmos a disposição das coisas dentro do
Tabernáculo, veremos, em seguida, projetar-se a sombra da CRUZ. Começando pela porta
oriental, estava o Altar das Oferendas e dos Sacrifícios; um pouco mais adiante e seguindo
o caminho que conduz ao mesmo Tabernáculo, encontramos o Lavado, ou Pia, da
Consagração, o Mar Fundido, em que se lavavam os sacerdotes. Depois, ao entrar na Sala
Este do Templo, encontramos um artigo de mobiliário, o Candelabro de Ouro, no extremo
à esquerda; a Mesa do Pão da Proposição à direita, formando os dois uma cruz com o
caminho que vimos seguindo para dentro do Tabernáculo. No centro, em frente do segundo
véu, se achava o Altar do Incenso, que forma o centro da cruz, enquanto que a Arca, situada
no ponto mais extremo do Oeste do compartimento ocidental, o Sacrário dos Sacrários,
forma a parte curta e superior da Cruz. Assim, pois, o símbolo do desenvolvimento
espiritual, que é o nosso mais caro ideal, hoje em dia, estava já definido no antigo Templo
de Mistérios, e essa CONSUMAÇÃO que se alcançava ao final da Cruz, a realização de
possuir a lei dentro de nós mesmos, como o estava dentro da Arca, é a coisa primordial de
que temos de nos ocupar no presente.
A luz que brilha em cima do Trono da Misericórdia, no Sancta Sanctorum,
na parte superior, ou cabeça da Cruz, ao final do caminho neste mundo; é a luz, ou reflexo,
do mundo invisível em que o candidato deseja entrar, quando neste plano físico tudo se lhe
parece obscuro e tétrico. Somente quando tivermos chegado ao grau em que possamos
perceber a luz espiritual, que nos incita a prosseguir adiante; a luz que flutua por cima da
Arca; somente quando nos rodeie a sombra da Cruz, poderemos realmente conhecer o
significado, o objeto e o sentido da vida. Podemos aproveitar as oportunidades que se nos
oferecem e praticar o serviço mais ou menos eficientemente; porém, somente quando,
mediante esse serviço, tivermos acendido a luz espiritual dentro de nós mesmos, cuja luz é
o corpo da alma e, quando por este serviço, tivermos ganhado a admissão na Sala do Oeste,
chamada a SALA DA LIBERAÇÃO, é quando realmente poderemos perceber e entender o
porquê de estarmos no mundo e o que necessitamos para nos fazermos úteis na devida
forma. Não devemos pensar que ficaremos ali para sempre, depois de haver entrado pela
primeira vez, não. O Sumo, ou Grande Sacerdote, somente podia entrar nela uma vez ao
ano. Transcorria um grande espaço de tempo entre esse reflexos, ou vislumbres, do objeto
real da existência. Entre os intervalos, era necessário que o Grande Sacerdote saísse ao
mundo para praticar suas funções entre seus irmãos - a humanidade; servir-lhes o melhor
que pudesse, e até para pecar, pois, todavia, era imperfeito, voltando a entrar no Santo dos
Santos, depois de haver feito as devidas reparações por seus pecados.
Algo igual nos sucede, hoje em dia. Às vezes, logramos vislumbrar as coisas
que nos estão reservadas, as coisas que temos de fazer para seguir a Cristo ao lugar por
onde Ele caminhou. Recordemos que Ele disse aos Seus discípulos: “Vós não podeis
seguir-me ainda, porém me seguireis mais tarde”; e isto ocorre também conosco. Temos
que olhar, uma e outra vez, para o interior obscurecido do Templo, o Santo dos Santos,
antes de estarmos capacitados para ficar ali de todo e dermos o último salto; antes que
estejamos realmente em condição de chegar à cúspide da Cruz, o lugar do crânio; esse
ponto de nossas próprias cabeças pelo qual marcha o espírito ao abandonar o corpo
definitivamente, ao morrer; ou bem para desempenhar suas funções de Auxiliar Invisível.
Este GÓLGOTA é o ponto final acessível do desenvolvimento humano e devemos nos
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preparar para entrar na habitação obscura muitas vezes, antes que estejamos preparados
para o CLÍMAX final.
A LUA CHEIA
COMO FATOR PARA O CRESCIMENTO DA ALMA
Consideremos, agora, a Senda da Iniciação, conforme estava representada
simbolicamente nos antigos Templos, com a Arca, o Fogo e o Shekinah; assim como nos
últimos Templos, onde Cristo ensinou. Notemos, primeiramente, que quando o homem foi
expulso do Jardim do Éden, por ter provado a fruta proibida, isto é: porque havia comido da
Árvore do Conhecimento; os Querubins guardavam a entrada do Paraíso com uma espada
flamígera na mão. As passagens bíblicas, tais como as seguintes: “Adão conheceu a Eva e
esta pariu a Abel”; Adão conheceu a Eva e esta pariu a Set”; “Elkanah conheceu a Hanah
e daí nasceu Samuel”; e a pergunta dirigida por Maria ao anjo Gabriel: “Como conceberei
se não conheci a nenhum homem?”; todas elas demonstram que a execução do ato carnal
significa na Bíblia pela palavra casta de “conhecer”, isto é: “comer da Arvore do
Conhecimento”. Quando esta função se executa passionalmente e sob raios planetários
pouco propícios, é um pecado cometido contra a lei da Natureza e é o que traz a dor e a
morte ao mundo, e nos separou de nossos prístinos guardiões, forçando-nos a peregrinar
pelo deserto do mundo durante séculos e séculos. À entrada do Templo Místico de Salomão
encontramos de novo o Querubim, porém suas mãos já não sustêm a espada de fogo, têm
nelas uma flor, um símbolo pleno de mística significação. Comparemos, agora, o homem
com a flor, para que conheçamos a grande importância e significação deste emblema.
O homem toma seus alimentos por via da cabeça, de onde vão para baixo; a
planta toma sua nutrição pela raiz e a impele para cima. O homem é apaixonado em seus
amores e dirige seu órgão gerador para a terra, escondendo-o envergonhado por essa
mácula de sua paixão. A planta não conhece a paixão; sua fecundação se efetua da maneira
mais casta e pura imaginável; devido a isto, projeta seu órgão gerador, a flor, para o Sol, e é
um objeto de beleza, que deleita a todos que o contemplam. O homem, caído e passional,
exala o mortífero dióxido de carbono; a casta flor inala esse veneno, transmuta-o e o
devolve em forma pura, doce e perfumada, isto é: em um fragrante elixir de vida. Este foi o
mistério do Cálice do Graal; este é o significado emblemático do Cálice da Comunhão,
chamado “ketch”, em alemão, e “cálix” em latim, significando ambos os nomes a cápsula
da semente. Este Cálice da Comunhão, com seu “Sangue” místico, limpo do incidente da
paixão para a geração, portanto, brinda, a quem realmente bebe nele, a vida eterna,
transformando-se no veículo de regeneração, de um Nascimento Místico em uma esfera
superior, UM PAÍS ESTRANGEIRO, onde quem tenha feito seu noviciado na construção
do Templo e tenha dominado as “artes e ofícios” deste mundo, pode aprender coisas
superiores. O símbolo do Querubim, com a flor aberta, situado na porta do Templo de
Salomão, dá ao aspirante a mensagem de que a pureza, em si, é a chave com a qual
unicamente, pode esperar abrir a entrada que conduz até Deus, ou, como o expôs Cristo:
“Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus”.
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A carne deve ser consumida no altar de sacrifício próprio e a alma deve ser
purificada no Lavabo da Consagração, para uma vida superior antes de chegar à porta do
Templo. Quando chegue o momento em que, “desnudo, pobre e cego” pelas lágrimas da
contrição, ande na obscuridade em busca da porta do Templo, encontrará o Compartimento
do Serviço, o Compartimento Oriental do Tabernáculo, que está deslumbrante pela luz que
derrama o Candelabro de Sete Braços, emblema da plena luminosidade da Lua, que troca
de ciclo a cada sete dias. Nesta SALA DO SERVIÇO se ensina a tecer a flamígera
vestimenta luminosa que Paulo, na 1ª Epístola aos de Corinto, vers. 15h47min, denominou
“soma psuchicon”, ou corpo da alma, formada do aroma extraído do Pão da Proposição.
Com a frase de corpo da alma queremos significar exatamente o sentido
literal destes vocábulos e este veículo não deve ser confundido por nenhum motivo com a
alma que a interpenetra O Auxiliar Invisível, que o emprega em seus vôos de alma, sabe
que é tão real e tangível como o corpo denso com sua carne e seu sangue. Porém, dentro
deste “traje dourado de bodas” há um algo intangível, conhecido por espírito de
introspecção. É inominável e indescritível, e escapa e ilude aos esforços mais persistentes
para ser examinado e, sem embargo, ali está tão clara e distintamente como o veículo ao
qual preenche totalmente. Não é vida, amor, beleza, sabedoria, nem, tão pouco, nenhum
outro conceito humano, o que nos pode dar uma idéia aproximada do que é; pois, na
realidade, é a soma de todas as faculdades humanas, atributos e conceitos do bem, porém
intensificados incomensuravelmente. Ainda que fôssemos despojados de todo o resto do
que existe em nós, essa realidade prima ainda permaneceria e seríamos ricos com a sua
posse, pois por meio dela percebemos a força atrativa de nosso Pai celestial, essa
estimulação interna que todos os aspirantes conhecem tão bem.
A esse algo indefinível e interno se referia Cristo, quando disse: “Nenhum
homem vem a Mim sem que seja atraído por meu Pai”. Justamente do mesmo modo que o
Fogo real está escondido na chama que o encerra e envolve, esse algo sem nome e
intangível se oculta no corpo da alma e queima o incenso extraído dos Pães da Proposição
e, desta maneira, acende o fogo que faz com que o corpo da alma seja luminoso. E o aroma
do serviço amoroso e altruísta, que se presta aos demais, atravessa o véu como um doce
sabor para Deus, que mora na Glória do Shekinah, criado de forma semelhante e que flutua
por cima da Arca desse Santuário interno, o Sancta Sanctorum.
CAPÍTULO VI
A LUA NOVA E A INICIAÇÃO
Quando o candidato entrava pela porta oriental do Templo, em busca de
luz, se encontrava imediatamente com o fogo do Altar das Oferendas e Sacrifícios, que
despendia uma luz mortiça e envolta em nuvens de fumo. Então, se achava no estado
espiritual obscurecido do homem ordinário; faltava-lhe a luz interna e, portanto, era
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necessário lhe dar alguma luz externa. Porém, quando havia chegado àquele ponto em que
estava pronto para penetrar no obscuro Compartimento do Oeste, supunha-se que já havia
desenvolvido o luminoso corpo da alma, por seus serviços prestados à humanidade. Então,
pois, se presumia que tinha a luz dentro dele mesmo, “essa luz que ilumina e acende todo
homem”, pois, a menos que se a possua, não se pode penetrar no obscuro Compartimento
do Templo.
O que sucede secretamente no Templo se mostra, abertamente, nos Céus.
De modo que a Lua aumenta sua luz, atraída do Sol, durante a sua passagem da fase de
nova à cheia; da mesma forma, o homem que percorre a senda da Santidade, pelo uso das
oportunidades favoráveis que teve durante o tempo de sua estadia no Compartimento de
Este, empregando-as para prestar um serviço desinteressado e altruísta a seus semelhantes,
reúne e junta materiais, com os quais constrói seu luminoso “traje nupcial” e esses
materiais se amalgamam melhor nas noites de Lua Cheia. Porém, vice-versa, do mesmo
modo que a Lua gradualmente perde a luz acumulada e se aproxima do Sol, com objetivo
de começar um novo ciclo, com a fase de outra Lua Nova; também assim, de acordo com a
lei da analogia, aqueles que amontoaram seus tesouros, depositando-os no céu, mediante
suas boas obras e atos de serviços para os demais, se acham em tal momento do mês mais
próximos à sua Origem e ao seu Criador, o Fogo do Pai, nas esferas superiores, que em
qualquer outro instante. De modo que os grandes Salvadores da humanidade nascem no
solstício do inverno, na maior e mais obscura noite do ano; assim, também, o processo da
Iniciação, que brinda o nascimento no mundo invisível de algum dos pequenos Salvadores,
os Auxiliares Invisíveis, se efetua mais facilmente na noite mais clara e obscura do mês,
isto é: a noite da Lua Nova, quando este satélite se acha na parte ocidental mais extrema de
nosso hemisfério.
Todo desenvolvimento oculto começa no corpo vital e a nota chave deste
veículo é a de repetição. Para aproveitarmos o máximo de qualquer assunto, é necessária a
repetição.
Com a finalidade de compreender o consummatum final, do qual nós temos
nos aproximado com tudo que foi dito; por último, dirijamos nossos olhares, por outro
ângulo de visão, às três classes de fogo que havia dentro do Templo.
Próximo à entrada oriental do mesmo se achava o Altar das Oferendas.
Daquele Altar saía, constantemente, o fumo produzido pelos corpos imolados, que depois
se queimavam e, desde longe, a coluna de fumo era vista pela multidão, que não tinha
nenhum conhecimento dos mistérios internos da vida. A chama, isto é, a luz que aquela
nuvem de fumo ocultava e envolvia, era, no melhor dos casos, percebida muito
confusamente. Isto nos indica que a grande maioria da humanidade aprende,
principalmente, pelas leis imutáveis da Natureza, as quais exigem um sacrifício por seus
ensinamentos - tanto se sabe como se ignora. Assim como a chama da purificação era,
então, alimentada pelos corpos mais baixos e grosseiramente construídos (dos animais
sacrificados) exigidos de acordo com a lei de Moisés; do mesmo modo, hoje em dia, as
massas mais baixas e passionais da humanidade são mantidas na linha pelo medo ao castigo
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da lei neste mundo, mais do que pelo temor, ou apreensão, do que lhes possa sobrevir no
outro.
Uma luz de diferente natureza era a que brilhava no Compartimento
Oriental do Tabernáculo. Em lugar de extrair sua nutrição da carne bruta e passional dos
animais sacrificados, era alimentada por azeite de oliva extraído do reino vegetal, que é
casto e sem paixões. Ademais, a chama que saía das luzes do Candelabro não se achava
envolta em fumo, mas era clara e brilhante, de modo que podiam iluminar o aposento e
guiar os sacerdotes, que eram os servidores do Templo, em seus ofícios e ministério. Os
sacerdotes se esforçavam para trabalhar em harmonia com o plano divino e, portanto, eles
viam a luz mais claramente que a descuidada e ignara multidão. Hoje, também, a luz
mística brilha para todos aqueles que anelam e se esforçam; para aqueles discípulos que
prometeram sua aliança a alguma Escola de Mistérios, como a Ordem Rosa-Cruz. Todos
eles estão caminhando por uma luz que não é vista pela multidão e, se realmente estão
servindo, isto é, sacrificando-se a si mesmos, terão a verdadeira guia dos Irmãos Maiores da
humanidade, que estão sempre dispostos a ajudá-los quando se apresentem os pontos
difíceis e perigosos do Caminho.
Porém, o fogo mais sagrado de todos os três era a Glória do Shekinah, que,
como já sabemos, se achava no Compartimento ocidental do Tabernáculo e em cima do
Trono da Misericórdia. Como este compartimento se achava em trevas, deduziremos que o
fogo da Glória do Shekinah era um fogo invisível, isto é, uma luz procedente de outro
mundo.
Agora, note-se isto: o fogo que estava envolto entre fumo e chama, sobre o
Altar das Oferendas, que consumia os sacrifícios oferecidos pela expiação dos pecados
cometidos contra a lei, era o símbolo do Legislador, de Jeová; devendo recordar que a lei se
deu para nos levar a Cristo. A luz clara e brilhante que brilhava no compartimento do
Serviço, isto é, o Compartimento oriental do Tabernáculo, é o halo amarelo de ouro da luz
de Cristo, que guia a todos aqueles que se esforçam em imitá-lo e seguir Seus passo pela
senda do sacrifício altruísta e bem feito.
Assim como Cristo disse: “Eu vou a meu Pai”, quando se aproximava a
hora de ser sacrificado; assim, também, ao Servidor da Cruz, que aproveitou diligentemente
todas as oportunidades de fazer o bem, que lhes foram apresentadas em seu caminho neste
mundo visível; se lhe permite a entrada na glória do Fogo do Pai, a invisível Glória do
Sheekinah. Então, cessa de ver através do cristal obscurecido de seu corpo e contempla,
cara a cara, a seu Pai, nos planos invisíveis da Natureza.
O campanário das igrejas é muito amplo em sua base, põem, gradualmente,
vai se estreitando, mais e mais, até que, em sua cúspide, é somente um ponto com a Cruz
sobre ele. O mesmo se passa com a Senda da santidade: a princípio, existem muitas coisas
que podem ser permitidas e toleradas, porém, à medida que se avança por ela, uma após
outra, todas aquelas primeiras digressões devem ser eliminadas e o que a percorre deve
dedicar-se, cada vez com mais abnegação e exclusividade, ao serviço da santidade. Por
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último, chegamos a um ponto neste Caminho, que é tão afilado e agudo como o fio da
navalha, e, então, unicamente podemos nos agarrar à Cruz. Porém, quando alcançamos este
ponto; quando podemos andar e percorrer esta parte, a mais angustiosa de todo o caminho,
então, também, estamos preparados para seguir a Cristo no mais além e servir por ali com a
mesma diligência que temos servido e trabalhado aqui.
Aquele antigo símbolo representava as provas e o triunfo do servente fiel e,
ainda que tenha sido derrogado por outros símbolos mais grandiosos, que envolvem um
ideal maior e uma promessa maior; os princípios básicos incorporados naquele primeiro são
tão válidos hoje como o foram sempre.
No Altar das Oferendas vemos, claramente, a nauseabunda natureza do
pecado e, por conseguinte, a necessidade de sua expiação e da justificação.
Todavia, pelo Mar Fundido nos é ensinado que devemos viver uma vida de
santidade e de consagração, sem mácula alguma.
Hoje em dia, do Compartimento Oriental, podemos tirar o ensinamento do
modo que, diligentemente, devemos fazer uso de nossas oportunidades para cultivar o grão
dourado do serviço altruísta e fazer esse “pão da vida”, que alimenta a alma, o Cristo
interno.
E, quando tivermos subido os escalões da Justificação, Consagração e
Abnegação pessoal, chegaremos ao Compartimento do Oeste, que é o umbral da Liberação.
Deste Compartimento, o candidato passa a planos mais amplos, de onde se pode alcançar
um maior desenvolvimento e evolução da alma.
Ainda que, em um passado distante, tenha sido levantado nos planos onde
os israelitas fizeram seus acampamentos; esse antigo Templo pode servir como um fator
mais potente para o desenvolvimento da alma de qualquer aspirante de hoje, que o foi para
os antigos israelitas, contanto que se o construa de acordo com o modelo adequado. Não há
que se lamentar a falta de ouro, cujo emprego poderia servir para o desastre de alguém, pois
hoje o Tabernáculo deve ser construído no Céu – e o Céu está dentro de todo homem. Para
construir, bem e realmente, de acordo com as regras do antigo artesão da Maçonaria
mística, o aspirante primeiramente deve aprender a construir dentro dele o altar com seus
sacrifícios; logo deve “orar e velar”, enquanto aguarda pacientemente que fogo divino
consuma sua oferenda. Em continuação, deve banhar-se com suas lágrimas de contrição,
até que tenha lavado toda mácula de pecado. Entrementes, deve manter cheia a lâmpada de
guia divina, de modo que possa perceber como, onde e quando; deve trabalhar
vigorosamente para ter abundante “pão da proposição”, e o incenso da aspiração e da
oração deve estar sempre em seu coração e em seus lábios. Então, o Yom Kippur, o Grande
Dia da Propiciação, o encontrará seguramente disposto para ir a seu Pai e aprender melhor a
auxiliar a ajudar a seus irmãos menores para que ascendam pela Senda.
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SEGUNDA PARTE
INICIAÇÃO CRISTÃ MÍSTICA
CAPÍTULO PRIMEIRO
A ANUNCIAÇÃO E A IMACULADA CONCEPÇÃO
Muito se disse, em certas partes do mundo ocidental, a respeito da
Iniciação. Isto, para as mentes de muitas pessoas, parece estar associado, geralmente, com o
ocultismo ensinado nas regiões do distante Oriente; algo que é peculiar aos devotos do
Budismo, Hinduismo e semelhantes espécies de fé, e que é uma coisa que não tem nada a
ver com a religião do mundo ocidental, especialmente no que concerne à religião Cristã.
Demonstramos, nos capítulos precedentes sobre os “Símbolos da Iniciação
Antiga e Moderna”, que esta idéia é completamente gratuita e que o antigo Tabernáculo no
Deserto projeta, com seu simbolismo, a Senda da progressão da humanidade, desde a sua
infância ignorante ao conhecimento supra-humano. Assim como os Vedas dão luz aos
índios devotos que adoram, com fé e fervor, nas margens do Ganges; também os Eddas
foram uma estrela orientadora para os filhos das desaparecidas regiões do Norte, que viram
a luz da vida na antiga Islândia, de onde os valorosos vikings levantavam as âncoras de seus
barcos nos mares gelados. “Arjuna” que sustém a nobre batalha no “Mahabharata”, ou
seja, a “Grande Guerra”, sendo constantemente incentivado e combatido por seus “Eu” –
inferior e superior – não se diferencia em nada do herói do mito nórdico “Sigfried”, que
significa “Aquele que traz a vitória, alcança a paz”.
Ambos são símbolos do candidato que está passando pela Iniciação e, ainda
que suas experiências nesta grande aventura variem em certos sentidos; exigidos assim
pelas diferenças de temperamento das gentes do Norte e as do Sul, e previstos, por
conseguinte, nas respectivas Escolas, às quais estão entregues para o desenvolvimento de
suas almas. Não obstante, os traços principais são idênticos e o fim, isto é, a iluminação, é o
mesmo. Almas aspirantes têm seguido o Caminho para a Luz nos templos brilhantemente
iluminados da Pérsia, onde o deus Sol, em sua deslumbrante carruagem, era o símbolo da
Luz; assim como, também, sob a magnificência mística da chuva iridescente da aurora
boreal do gelado Norte. De modo que a Luz verdadeira do mais profundo conhecimento
esotérico tem estado, sempre, presente em todas as idades por que tem passado o homem e,
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também, na mais tenebrosa, que se chama a Idade Média, existe uma grande evidência que
demonstra nossa afirmação.
O pintor Rafael empregou seu maravilhoso domínio da palheta e do pincel
para exteriorizá-lo em seus melhores quadros “A Madona da Sixtina” e o “Matrimônio da
Virgem”, que aconselhamos que o leitor interessado examine por si mesmo. Cópias destas
admiráveis pinturas se encontram em quase todas as partes em que se acham à venda
quadros e estampas. No original, se vê uma tintura particular no halo dourado detrás da
Madona e do Menino que, ainda que excessivamente cru, para uma pessoa dotada de vista
espiritual é, sem embargo, uma imitação tão exata e fiel da cor básica do Mundo do
Primeiro Céu, como é possível conseguir com pigmentos e cores terrenas. Uma detida
análise de seu fundo revelará que esse halo amarelado está composto de uma multidão de
figuras desse seres que chamamos “anjos”, com cabeças e asas.
Esta, pois, é uma representação tão literal dos fatos concernentes aos
habitantes daquele mundo, como é possível faze-la; pois, durante o processo de purgação
que se efetua nas religiões inferiores do Mundo do Desejo, as partes inferiores do corpo se
acham realmente desintegradas, de modo que somente a cabeça, que contém a inteligência
do homem, é o que resta de seu corpo de desejos, quando penetra no primeiro ciclo e é um
fato que tem desorientado e confundido a muitos que, por azar, têm visto as almas em tal
região. As asas, certamente, não têm realidade fora da pintura, porém foram colocadas ali
para assinalar a faculdade de se mover velozmente, o que é inerente a todos os seres que
habitam nos mundos invisíveis. O Papa está representado apontando à Senhora e ao Menino
Cristo e, analisando atentamente, de perto, se vê que a mão com a qual aponta tem seis
dedos. Não há indício histórico que nos confirme a realidade de que o Pontífice tinha tal
deformidade, nem, tão pouco, de que aquele dedo foi um erro. Os seis dedos da mão no
quadro devem, portanto, obedecer a um desejo por parte do pintor.
Qual foi seu propósito podemos ver confirmado, se examinarmos seu
quadro o “Matrimônio da Virgem”, em que se pode notar uma anomalia semelhante. Em
tal quadro, Maria e José estão representados juntos com o Menino Cristo e, sob tais
condições, que é evidente que se acham no preciso momento de sua partida para fugir para
o Egito, um rabino está no ato de uni-los em matrimônio. O pé esquerdo de José é o objeto
mais adiantado e saliente do quadro e, se observarmos, encontraremos seis dedos naquele
pé. Por meio dos seis dedos da mão do Papa em um quadro e de outros seis dedos no pé de
José, Rafael quis nos ensinar que ambos possuíam um sexto sentido, faculdade semelhante
à que se obtém por meio da Iniciação. Por este sutil sentido, o pé de José foi guiado na sua
fuga, para manter a salvo aquele Tesouro sagrado que se havia confiado a seu cuidado. No
outro caso, o Papa, se assinala que se lhe deu um sexto sentido para que não fosse um
caudilho “cego guiando cegos”; mas que possuía um “olho que visse”, como é preciso
para guiar a outros e lhes assinalar o Caminho, a Verdade e a Vida. E é uma verdade, ainda
que não comumente sabida, que, à exceção de um dos casos nos quais a força política foi
suficientemente poderosa para corromper o Colégio dos Cardeais, todos os demais que se
sentaram no Trono de São Pedro possuíam a vista espiritual em maior ou menor grau.
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Vimos nos capítulos da série “Símbolos da Iniciação Antiga e Moderna”,
que precederam a este, que o antigo Templo de Mistérios atlânticos, conhecido como o
Tabernáculo no Deserto, foi uma Escola para o desenvolvimento da alma e não deve nos
surpreender o saber que os quatro Evangelhos, que relatam a vida de Cristo, são, também,
fórmulas de Iniciação, revelando outro e posterior Caminho para adquirir aquela força para
a alma. Nos antigos mistérios egípcios, “Horus” era o primeiro fruto que o aspirante devia
se esforçar em igualar e é muito significativo que no Ritual de Iniciação que se achava em
voga naqueles dias, o qual nós agora chamamos o “Livro dos Mortos”, o aspirante à
Iniciação era sempre chamado com o nome de Horus N.N. Seguindo o mesmo método, hoje
em dia, poderemos, muito apropriadamente, nomear aqueles que seguem o Caminho da
Iniciação Cristã como o Cristo N. N. (aqui o nome civil do aspirante), pois, na realidade,
todo aquele que percorre esta Senda é, verdadeiramente, um Cristo em formação. Todos
nós, em nossa vida, passaremos por todas as diferentes estações da Via Dolorosa, ou Rua da
Amargura, que leva ao Calvário, e experimentaremos em nossos próprios corpos as dores,
agonias e ferimentos sofridos pelo herói dos Evangelhos. A Iniciação é um processo
cósmico de iluminação e evolução de poderes, pelo qual as experiências de todos serão
semelhantes em suas partes e traços principais.
A forma de Iniciação mística Cristã difere radicalmente da do método Rosa-
Cruz, que pretende levar o candidato a sentir a compaixão por meio do conhecimento e,
portanto, anela que o aspirante cultive nele as faculdades latentes, de vista e de ouvido
espirituais, desde o momento do começo de sua carreira, como aspirante à vida superior.
Esta Escola o ensina a conhecer os ocultos mistérios da existência e a perceber,
intelectualmente, a unidade de cada um com todos, de modo que, ao final, por meio desse
conhecimento, se desperta em seu interior esse sentimento que o faz conceber, realmente e
com toda certeza, sua unidade com todo o que vive e move; sentimento que o põe em
perfeita e completa afinidade e harmonia com o Infinito, formando dele um verdadeiro
auxiliar e operário no reino divino da evolução.
A meta alcançada por meio da Iniciação mística Cristã é a mesma, porém o
método, como já dissemos, é completamente distinto.
Em primeiro lugar, geralmente, o candidato está inconsciente do fato de que
está se esforçando para alcançar um objetivo definido (pelo menos durante os primeiros
passos de seus esforços), e nesta nobre Escola de Iniciação não há mais que um só Mestre –
Cristo - que está sempre diante sa visão espiritual do candidato como Ideal e Meta de todos
seus esforços.
O mundo ocidental já ficou tão imbuído e apegado ao intelectualismo, que
os aspirantes de hoje em dia não entram na Senda senão quando sua razão ficou satisfeita e,
desgraçadamente, é só o desejo de adquirir mais conhecimentos o que traz a maioria de
discípulos à Escola Rosa-Cruz. É uma tarefa muito árdua o cultivar neles a compaixão, que
deve se mesclar e se amalgamar com seus conhecimentos e servir de fator guia ao seu uso,
antes que se achem aptos para penetrar no Reino de Cristo.
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Porém, aqueles que são atraídos à Senda mística Cristã não notam
dificuldade de tal natureza. Têm dentro deles um amor que abrasa a tudo; que lhes surge e
impele para adiante e, no momento oportuno, gera neles um conhecimento de tal magnitude
que o escritor crê que é muito superior a todo aquele conseguido por meio de outro método
qualquer.
O que segue a Senda do desenvolvimento intelectual é capaz de rir e
zombar, altiva e desdenhosamente, de alguém cujo temperamento o impele a seguir a Senda
mística. Semelhante disposição mental, não somente é prejudicial para o desenvolvimento
espiritual de qualquer um que tenha tal crença, mas, também, completamente gratuita,
como nos podem demonstrar os trabalhos de Jacobo Boehme, Tomás de Kempis, e de
muitos outros que seguiram o Caminho Místico.
Quanto maior o conhecimento que nós tivermos, maior será a condenação
que cairá sobre nós, se não o usarmos retamente. Porém, se fizermos isso com amor, que é
o princípio básico da vida Cristã mística, não poderá nunca nos levar à condenação, ou no
colocar em conflito com a vontade, ou propósito, de Deus. É infinitamente melhor o sentir
qualquer emoção nobre, que possuir o intelecto mais agudo e perspicaz e que ter a
habilidade de definir todas as emoções humanas. O dissertar, ou fazer lucubrações, a
respeito da constituição e evolução do átomo, seguramente não promoverá, nem acarretará,
tanto crescimento e desenvolvimento anímico como a dócil e humilde ajuda e o bem fazer
para o nosso próximo.
Há nove passos definidos na Iniciação Cristã mística, começando-se pelo
Batismo, que é como a dedicação. A Anunciação e a Imaculada Concepção precedem a
todos eles, como é natural e por razões que diremos depois.
Como já temos nossas mentes preparadas pelas considerações precedentes,
agora nos achamos preparados para definir e considerar cada passo, separadamente, neste
glorioso processo de desenvolvimento espiritual.
A ANUNCIAÇÃO
E A IMACULADA CONCEPÇÃO
Permitimo-nos afirmar, terminantemente, que um Cristão Místico não é o
resultado de uma vida, mas uma floração e fruto de muitas existências anteriores, nas quais
cultivou as fases preparatórias; fomentou e cultivou dentro de si essa sublime compaixão,
que faz tal pessoa sentir e sofrer em si mesma todas as misérias e dores do mundo; e evoca,
ante sua visão espiritual, o ideal de Cristo como o verdadeiro bálsamo de Galahad, cuja
prática é o único paliativo contra todas as dores e tristezas humanas. Uma alma semelhante
é, constantemente, objeto de uma vigilância e cuidados especiais por parte das Hierarquias
divinas que têm a seu cargo a direção de nosso progresso na senda da evolução e, quando o
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momento é oportuno e o aspirante chegou à sua maturidade para entrar na vida espiritual,
na qual deverá fazer seu último esforço para chegar à meta e se converter em um Salvador
de sua espécie; há anjos, sem dúvida alguma, que o vigiam, que o aguardam à sua chegada,
e que entoam cânticos e hosanas em antecipação de semelhante acontecimento.
O igual sempre atrai ao igual e, naturalmente, os pais são eleitos
devidamente por (e para) uma tão nobre alma, entre os “filhos e filhas do Rei”. Pode ser
que eles se achem nas circunstâncias e condições mais miseráveis, sob o ponto de vista das
riquezas humanas; pode ocorrer que eles se vejam obrigados a utilizar um presépio como
cama de seu filho, porém, não se pode conferir, nunca, dádiva mais rica a tais pais que o
privilégio de engendrar uma semelhante alma. Entre as condições necessárias para poder
servir de pai de um tal Ego estão as da que a mãe deve ser “virgem” e o pai deve ser um
“construtor”.
Diz-se, na Bíblia, que José era carpinteiro, porém a palavra original grega é
“tekton”, o que significa “construtor”. Na Maçonaria Mística, Deus é chamado o Grande
Arquiteto, ou seja: uma concreção de Arche-tekton. Arche é um vocábulo grego que
significa substância prima, ou primordial, e um “tekton”, como dissemos acima, é um
construtor. Portanto, podemos considerar que Deus é o Grande Mestre Construtor, que da
substância primordial formou o mundo, como campo evolucionário para diversas classes de
seres. Ele usa, em Seu Universo, muitos “tektons”, ou construtores, de diversos graus. Cada
pessoa que percorre a Senda do desenvolvimento espiritual, esforçando-se para trabalhar
em harmonia e em sentido construtivo com as leis da Natureza, como um servidor da
humanidade, é um “tekton”, ou construtor, no sentido de que possui as condições
necessárias para ajudar a que nasça no mundo uma grande alma. Assim, pois, quando se
disse que Jesus foi um carpinteiro e filho de carpinteiro, nós entendemos que ambos foram
“tektons”, ou construtores, ao largo das linhas cósmicas.
A Imaculada Concepção, tal como todos os outros sublimes mistérios, tem
sido vilipendiada e ultrajada; menosprezada e ridicularizada pelo materialismo e, como é de
uma espiritualidade tão sublime, tem sofrido mais que qualquer outro dos ensinamentos
espirituais, por tão rude e grosseiro tratamento. Quiçá, tem sofrido ainda mais pelas torpes
explicações que dela têm dado seus ignorantes partidários, que pelas burlas e escárnios dos
cínicos. A doutrina da Imaculada Concepção, segundo se a entende popularmente, é que, há
coisa de dois mil anos, Deus, de modo miraculoso, fez que uma donzela de nome Maria, a
qual era virgem, concebesse e desse a luz a Jesus, um ser que, em conseqüência, era Filho
de Deus, no sentido diferente de todos os outros homens. Também, há no povo a crença de
que esse incidente é o único na história do mundo.
Especialmente a última falácia é a que tem servido para falsear e
tergiversar a belíssima verdade espiritual concernente à Imaculada Concepção. Não é um
caso único, com efeito, em nenhum sentido. Toda grande alma que veio ao mundo para
viver uma vida de sublime santidade, tal como se requer para aspirar à Iniciação Cristã
Mística, veio aqui graças a uns pais de virgindade imaculada, que não se achavam
dominados pela degradante e degeneradora paixão quando consumaram o ato carnal que
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deu lugar à geração de tão nobre alma, fazendo-o mais como um sacrifício que como um
mero prazer. “O homem não colhe uvas de sarças”. Esta sentença é uma verdade
axiomática, baseada na lei de que o igual atrai a seu semelhante e, portanto, para que
alguém possa se converter em um Salvador, é preciso que seja puro e sem pecado. De modo
que, como ele é puro, não pode nascer de outra pessoa que seja viciosa e vil; deve, pois,
nascer de mãe (e de pai) virgem.
Porém, a virgindade, a que nos referimos, não se refere meramente ao
organismo físico. Não há nenhuma classe de virtude inerente à virgindade física, pois todos
nós a possuímos ao princípio de nossas vidas; não importa a má e viciosa disposição que
possa haver em nossa natureza. A virgindade da mãe de um Salvador é uma qualidade da
alma, cuja qualidade anímica permanece sem mancha, nem alteração, apesar da função
carnal realizada por seus pais no ato físico para a concepção. Quando os homens efetuam o
primeiro ato criador sem o desejo de dar vida a um novo ser, mas que o fazem
exclusivamente para a satisfação de sua luxúria e inclinações animais; perdem a única
virgindade (física) que possuíam; porém, quando há uns pais que se unem guiados por um
espírito de sacrifício, oferecendo seus corpos como um holocausto no Altar de Sacrifício,
com objetivo de facilitar a uma alma que deve vir à Terra, o corpo físico que lhe é preciso
para viver aqui, para que aqui possa dar um passo a mais para o seu desenvolvimento
espiritual; a pureza de seu propósito preserva a virgindade e atrai essa alma nobre para seu
lugar e pátria. Que um menino seja concebido em pecado, ou não imaculadamente, depende
de sua própria e inerente qualidade anímica, pois esta é a que sem titubeios, nem
vacilações, o levará a nascer de pais que possuam uma natureza semelhante a sua. Para ser
filho de uma virgem preconiza-se e se exige uma carreira passada de espiritualidade, por
parte daquele que nasce.
O “nascimento místico” de um “construtor” é um acontecimento cósmico
de grande importância e não é surpreendente, pois que está escrito nos céus, indicando por
um simbolismo no grande mundo, ou macrocosmos, o que a seu momento se converte em
realidade no homem, isto: o pequeno mundo, ou microcosmos.
Todos nós estamos destinados a experimentar todos os mistérios pelos que
Jesus passou, inclusive o da Imaculada Concepção, que é um requisito prévio da vida dos
Santos e dos Salvadores de diversos graus. Uma vez que compreendamos este grande
símbolo cósmico, será mais fácil entendermos a sua aplicação ao ser humano
individualmente.
O Sol é “a luz do mundo”, no sentido material. Quando, na época do
inverno, chega à sua extrema declinação Sul, no solstício de 23 de dezembro, as gentes do
hemisfério nórdico – no qual nasceram todas as religiões de hoje em dia – estão envoltas
em profundas trevas e privadas da força vital emanante do Sol, que é a sustentadora de toda
vida; de modo que o Sol se acha parcialmente morto, no que respeita à sua influência sobre
os homens dessa parte do planeta. É, portanto, necessário que uma nova luz brilhe nas
trevas; que um Sol de Bondade nasça para salvar a humanidade do frio e da fome que
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inevitavelmente se seguiriam se o astro Sol permanecesse definitivamente na posição do
Sul, que ocupa no solstício do inverno.
Na noite entre 24 e 25 de dezembro, o Sol, havendo começado a elevar-se,
lentamente, para o Equador da Terra, o signo zodiacal de Virgem, a imaculada Virgem
celestial, está no horizonte oriental, em todas as latitudes nórdicas e durante as horas que
imediatamente precedem à meia-noite. Na ciência da Astrologia é o signo e o grau que se
acham no horizonte oriental, no momento do nascimento, o que determina a forma do corpo
da criatura nascida. Portanto, o “Sol de Bondade” se diz que nasceu de Virgem, a sublime
Virgem celestial, que permanece tão pura depois de dar a luz a seu filho Sol, como o era
antes. Por analogia, o Filho de Deus, que vem salvar a seus semelhantes, deve nascer
também de uma espiritual virgem imaculada.
Do que acabamos de dizer, resulta evidente que há um grande período de
preparação, anterior à entrada de um Cristão Místico na esfera da vida humana, ainda que
ele mesmo, em sua consciência física, geralmente está inconsciente da grande aventura que
está preparada para ele. Segundo todas as probabilidades, os dias de sua infância e os
primeiros de sua juventude passarão na obscuridade; enquanto isso, ele vive uma vida de
incomum profundidade, preparando-se inconscientemente para o Batismo, que é o primeiro
dos nove passos deste método de desenvolvimento e de fusão com o Pai.
CAPÍTULO I I
O RITO MÍSTICO DO BATISMO
É muito importante se ter em conta que quase todos os sistemas religiosos
têm prescrito abluções prévias à realização do deveres religiosos, e a adoração que se fazia
no antigo Templo de Mistérios atlante, o Tabernáculo no Deserto, não foi uma exceção,
como vimos nos capítulos da Primeira Parte, ou “Símbolos da Iniciação Antiga e
Moderna”. Depois de haver alcançado a justificação pelo sacrifício feito sobre o Altar de
Bronze, o candidato se via compelido a lavar-se no Lavabo, ou Pia, da Consagração, o Mar
Fundido, antes que lhe fosse permitida a entrada para levar a cabo os deveres de seu
ministério, no próprio Santuário. E é de conformidade com essa regra, também, que o Herói
dos Evangelhos foi ao rio Jordão, onde passou pelo rito místico do Batismo. Quando saiu
da água, diz-se que o Espírito Santo desceu sobre Ele. Portanto, é óbvio que aqueles que
seguem a Senda da Iniciação Cristã mística devem, também, igualmente ser batizados,
antes que possam receber o Espírito, que deve ser seu guia através de todas as provas que
tem ante de si.
Porém, o que constitui o Batismo é um assunto que tem dado lugar às
discussões mais desencontradas e ao emprego de argumentos de uma intensidade quase
incrível. Alguns defendem que é um roçado d’água e outros insistem em que o corpo todo
deve ser submerso na água. Alguns dizem que é suficiente levar o menino à igreja, borrifa-
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lo com água, apesar de seus choros, e eis aqui um infante convertido em cristão; um
herdeiro do céu; porém, no caso de morrer antes de se executar nele este rito sagrado, irá
inevitavelmente para o inferno. Outros tomam uma posição mais lógica e dizem que o
desejo do indivíduo em ser admitido na igreja é o fator primordial, necessário, para fazer
efetivo o rito e, portanto, aguardam até a idade adulta, antes de levar a cabo a cerimônia;
então a realizam submergindo todo o corpo do neófito na água.
Porém, tanto se o rito se efetua na infância, como anos depois, parece
estranho que uma momentânea imersão, ou um simples respingado d’água, tenha a
influência, ou poder, de salvar a alma. E, quando se examina e observa a vida subseqüente
daqueles que foram batizados, de um modo ou de outro, na idade adulta e com todo seu
pleno consentimento e desejo, podemos achar na grande maioria muito pouco, ou nenhum,
desenvolvimento. Em conseqüência disto, se nos mostra evidente que este não pode ser o
rito adequado e próprio, visto que o Espírito não desceu sobre eles. Pelo que, nos é forçoso
achar outra razão que nos explique o que constitui o autêntico rito místico do Batismo.
“Conta uma lenda que um rei otomano declarou guerra a uma nação
vizinha; pelejou várias batalhas contra ela, com diversos resultados e, finalmente, foi
vencido e levado cativo para o palácio do vencedor, onde foi obrigado a trabalhar nos
serviços mais comuns, como um escravo. Depois de levar tal vida por muitos anos, a sorte
lhe favoreceu e escapou para um país distante, onde, trabalhando arduamente, adquiriu uma
pequena propriedade rural; se casou e teve vários filhos, que cresceram ao passar dos anos.
Por fim, se viu em seu leito de morte, já em idade muito avançada, e ao efetuar seu último
suspiro, se acomodou sobre a almofada, olhou ao redor, porém seus filhos já não estavam
ali, nem nada. Tão pouco se achava no lugar que havia considerado como seu durante
muitos anos; mas em seu próprio palácio, que supunha haver abandonado em sua juventude
ao se empenhar na guerra, vendo-se, ademais, tão jovem como era ao abandoná-lo. Assim,
se achou sentado numa cadeira, com uma bacia d’água próxima ao seu rosto e um servo
lavando-lhe a barba”.
O que ocorreu foi que, no preciso momento de lavar o rosto, começou a
sonhar que ia para a guerra e passou todo o tempo de uma vida na terra dos sonhos, durante
os poucos segundos que transcorreram até que levantou a cabeça. São conhecidos milhares
de casos semelhantes, os quais nos demonstram que fora do mundo físico não existe noção
de tempo e os acontecimentos de um milhar de anos são facilmente percorridos em um
curto momento.
Também, é bem conhecido o fato de que quando uma pessoa está debaixo
d’água a ponto de se afogar, toda a sua vida precedente se passa ante seus olhos com
cristalina clareza e até os mais mínimos detalhes, que estavam esquecidos com o transcurso
dos anos, se revelam com toda precisão. Deve, pois, haver, e, com efeito, há um depósito de
acontecimentos, que pode ser examinado sob determinadas condições, quando os sentidos
estão acalmados, ou inibidos, e nos achamos perto do sonho, ou da morte.
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Para que esta última parte seja clara ao leitor, deve ser compreendido e tido
em conta que o homem é um ser composto, que tem veículos muito finos e sutis que
interpenetram o corpo físico, que geralmente se crê que é o único que forma o homem.
Durante a morte, ou sonho, este corpo denso está inconsciente, devido à sua completa
separação de seus veículos mais finos, porém tal separação é só parcial durante os
momentos em que sonha, ao se achar dormindo; ou ao se afogar. Esta condição capacita o
espírito gravar os acontecimentos no cérebro, mais ou menos fixamente, de acordo com as
circunstâncias, especialmente gravar aqueles incidentes que estão relacionados consigo
mesmo. À luz dessas explicações, nós compreendemos facilmente o que constitui realmente
o rito do Batismo.
De acordo com a teoria nebulosa, o que agora constitui este planeta Terra
foi um dia uma luminosa neblina ígnea que, gradualmente, se esfriou pelo contato com o
frio do espaço.Este encontro, ou contato do calor com o frio gerou uma umidade que,
evaporada, voltava a levantar-se do centro do fogo, até que o frio lograva condensa-la,
caindo novamente como umidade sobre o planeta ardente. A superfície da Terra, tendo
estado de tal modo sujeita, durante idades sem conta, a uma liquefação e evaporação
alternantes, finalmente, se cristalizou em uma crosta que cobriu, perfeitamente, o centro
ígneo. Esta crosta mole carregada de umidade, naturalmente, gerou uma neblina que rodeou
o planeta como uma atmosfera, e esta foi o berço de tudo que tem existência sobre a terra: o
homem; o animal e a planta.
A Bíblia descreve este estado no segundo capítulo do Gênesis, onde nos diz
que, no tempo do primeiro homem, saía da Terra uma neblina, “mas, todavia, não havia
chovido”. Este estado de coisas, evidentemente, continuou até o Dilúvio, quando, por fim, a
umidade desceu, deixando a atmosfera clara, de modo que se pôde ver, pela primeira vez, o
arco-íris; dissipando-se as trevas e dando origem à “época das alternativas”: dia e noite,
inverno e verão, etc.
Por meio do estudo da Cosmologia e do pictórico resumo da evolução que
se nos dá nos “Eddas Do Norte”, entesourados pelos sábios Escandinavos antes da era
Cristã; podemos aprender mais deste período da história da Terra e a importância que tem
sobre o tema que debatemos. Do mesmo modo que nós ensinamos às nossas crianças,
valendo-nos de contos e figuras, lições que elas não poderiam conceber intelectualmente;
assim, também, os divinos Caudilhos da humanidade se viram obrigados a ensinar às almas
da humanidade infantil, que estava sob a sua custódia, por meio de imagens e alegorias e,
por sua ação, prepara-las para um ensinamento de índole mais elevada e superior, num dia
vindouro. O grande poema épico chamado “A Lei de Nibelungo”, conta-nos a lenda do que
nós estamos buscando agora, isto é: a origem cósmica do rito do Batismo e porque é
necessariamente o ponto preliminar no desenvolvimento espiritual do Cristão Místico.
A cosmogonia dos Eddas, em alguns sentidos, é semelhante à da Bíblia, e,
em outros pontos, está de acordo com a teoria de Laplace. Copiemos alguns versos da
versão da mesma, feita por Oehlenschlaeger:
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“Na primitiva alvorada dos seres, tudo não era mais que um abismo
tenebroso, e não se conhecia nem céu, nem terra. Ao Norte, densíssimas
névoas e frios gelos se agrupavam em montanhas pelo lúgubre desfiladeiro
de “Niflheim”; em contraposição, ao Sul, pelo radiante pólo de “Muspel”, o fogo se erguia vitorioso.
“Então, passadas muitas idades, a névoa do caos se encontrou com um sopro tíbio, o torvelinho de “Niflheim”, resultando dele um frio com
prolífico calor. Daí se formaram gotas que, com o paternal ar que chegava
desde a tíbia região de “Muspel”, produziram o grande “Aurgelmer”.”
De modo que, pela ação do calor e do frio, primeiramente, foi formado
“Aurgelmer”, ou como é chamado, o “Gigante Ymer”. Este foi a semente de onde vieram
as Hierarquias espirituais, os espíritos da terra, do ar, da água e, finalmente, o homem. Ao
mesmo tempo, o Pai de Tudo criou a “Vaca Audumla”, de cujas quatro tetas saíram quatro
jorros de leite, que nutriam e alimentavam a todos os seres. Estes são os quatro éteres, um
dos quais, agora, sustém o mineral; dois deles alimentam as plantas; três ao mineral e todos
os quatro ao reino humano. Na Bíblia se fala de quatro rios que nasciam do Paraíso.
Em algum momento, segundo postula a ciência, deve ter-se formado uma
crosta, pela contínua ebulição da água, da qual ascenderia uma neblina, segundo se diz no
segundo capítulo do Gênesis. Gradativamente, aquela névoa foi se esfriando e se
condensando, impedindo a passagem da luz solar, de modo que devia ser impossível para
aquela nascente humanidade o perceber seus corpos, ainda que houvessem possuído o olho
físico. Porém, naquelas condições, o homem de então não tinha mais necessidades dos
olhos que a tem hoje em dia a toupeira que cava a terra. Sem embargo, não eram cegos,
pois nos é dito que “ele viam a Deus”, como “as coisas (e seres) espirituais são vistos (ou
percebidos) espiritualmente”; os homens de então deviam estar dotados de vista espiritual.
Nos mundos espirituais há um diferente tipo de realidade que a daqui, o qual forma a base
de todos os mitos.
Em tal estado de coisa não podia haver choque de interesses e, enquanto
vivia embaixo d’água, na antiga Atlântida, a humanidade se considerava a si mesma como
todos filhos de um Grande Pai. O egoísmo não fez sua aparição, até que a névoa se
condensou e deixaram a aqüífera atmosfera da Atlântida. Quando se abriram seus olhos de
modo que puderam perceber o mundo físico e as coisas que contém; quando cada um viu a
si próprio como um ser separado e distinto de todos os demais; a consciência do “eu e
meu” e “tu e teu” tomou forma em suas primitivas mentes e uma avareza egoísta substituiu
o sentimento de camaradagem e fraternidade que prevalecia sob as águas, nos primitivos
atlantes. Desde aquela época até o presente estado social, o egoísmo tem sido considerado
como a única atitude legítima e até em nossa civilização o altruísmo é considerado como
um sonho utópico, indigno de ser tido em conta por uma pessoa sensata e prática.
Se à humanidade tivesse sido permitido que se entregasse ao egoísmo e à
avareza sem nenhum tipo de impedimento, ou de oposição, é difícil prever e prognosticar
qual teria sido o fim de tudo. Porém, devido à imutável Lei de Conseqüência, cada causa
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deve produzir um efeito equivalente e o princípio do sofrimento (efeito) nasceu do pecado
(causa) com o benévolo propósito de nos fazer volver à Senda da virtude. É preciso sofrer
muito e viver muitas vidas, ou renascer muitas vezes, para alcançar esse propósito; porém,
quando, finalmente, nós estivermos familiarizados com a aflição e as penalidades; quando
tivermos cultivado essa pronta e aguda simpatia que sente e se faz solidária de todos os
males e misérias do mundo; quando Cristo tiver nascido dentro de nós, então vem ao
Cristão Místico essa ardente aspiração de “buscar e salvar a todos aqueles que estão
perdidos” e lhes ensinar o caminho que leva à Luz à Paz Eternas.
Porém, para ensinar o Caminho, primeiramente, nós devemos conhecê-lo e,
sem um conhecimento e compreensão verdadeiros da causa da dor, nós não devemos
ensinar aos outros o modo de encontrar a paz permanente. Esse conhecimento da dor, do
pecado e da morte, não pode ser obtido por meio da leitura de livros, de conferências, e
nem até pelos ensinamentos pessoais de outro; sem uma impressão suficientemente
profunda e intensa que encha todo o ser do aspirante, não é possível, de nenhum modo,
conseguir-se por tais meios. Somente o Batismo é o que produzirá este efeito de maneira
adequada; por isso é que o primeiro passo da vida de um Cristão Místico é o Batismo.
Entretanto, quando nós dizemos Batismo, não nos referimos
necessariamente ao batismo físico, àquele em que o neófito é respingado, ou submergido,
em água, e onde este faz certas promessas ao que o batiza. O Batismo Místico pode ter
lugar em um deserto arenoso, tão facilmente como numa ilha, pois se trata de um processo
espiritual, para conseguir um propósito também espiritual. Pode, assim, se executar a
qualquer momento do dia ou da noite, no inverno ou no verão, pois ocorre no momento em
que o candidato sente com suficiente intensidade o anelo de conhecer a causa da dor e
alivia-la. Então, seu espírito é levado sob as águas atlantes, onde vê o primitivo estado de
amor e bondade fraternais; onde percebe a Deus como Grande Pai de todos os seres, que
estão ali rodeados de seu maravilhoso e divino amor. Por sua vez, de maneira consciente de
tal Oceano de Amor, o candidato fica tão inteira e intensamente imbuído e infundido com
esse sentimento de bondade, de relação e de unidade com sua espécie, que o espírito do
egoísmo desaparece dele para sempre. É devido a essa saturação do Espírito Universal, que
o homem pode dizer depois: “Se um homem te tira a capa, dá-lhe também teu manto; e se
te faz caminhar com ele uma milha, vá com ele uma milha mais”. Sentindo-se um com
todos, o candidato não considera a sua crucificação, ou sacrifício, como uma ofensa que se
lhe faz e pode dizer: “Pai, perdoai-lhes”, pois seus verdugos e ele são idênticos e estão
unidos a ele e sofrem por sua má ação, sendo, por sua vez, agressores e vítimas. Este é o
verdadeiro e autêntico Batismo espiritual do Cristão Místico e qualquer outro batismo que
não produza naquele que o recebe esse sentimento de simpatia e afeição universais para
seus próximos, não é digno de tal nome.
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CAPÍTULO III
A TENTAÇÃO
Freqüentemente, ouvimos devotos Cristãos lamentarem-se de seus períodos
de depressão. Em tais momentos, se acham quase no sétimo céu de exaltação espiritual,
durante os quais parecem que só vêem a Face de Cristo e estão em tal estado de ânimo,
como se Ele guiasse todos seus passos; e logo, quase sem transição, sem advertência, nem
causa apreciável ou conhecida para eles, se vêem envoltos entre brumas; o Salvador oculta
Sua Face e, por momentos, para eles o mundo se faz tétrico e insuportável. Em tais crises,
não podem trabalhar, nem tão pouco orar; para eles o mundo não tem nenhum atrativo e a
porta do céu parece que lhes está fechada, de modo, que durante o tempo que dura essa
depressão espiritual, a vida lhes parece indigna de ser vivida. Certamente, a razão disto é a
de que estas pessoas vivem em suas emoções e sob a Lei das Alternativas o pêndulo está
condenado a subir para um lado com tem subido para o outro, ou seja: há uma eqüidistância
do ponto neutro, ou de gravidade. À mais brilhante luz, mais profunda a sombra e à maior
exaltação, mais profunda será a depressão do espírito, que seguirá aquela exaltação
anímica. Unicamente aqueles que, por um frio raciocínio, contêm suas emoções, escapam
aos períodos de depressão; todavia, tão pouco nunca colhem a bênção celestial que se sente
na exaltação. E é esta entrega emocional de si mesmo o que facilita e subministra ao
místico cristão a energia dinâmica para projetar-se aos mundos invisíveis, onde ele se faz
uno com o ideal espiritual que atraiu e despertou em sua alma a força para se elevar, do
mesmo modo que o Sol construiu o olho com o qual o percebemos. O filhote cai muitas
vezes na terra antes de aprender a se servir das asas com segurança e, da mesma forma, o
aspirante que percorre a Senda do Cristianismo Místico pode chegar uma infinidade de
vezes em suas exaltações e arroubos até mesmo ao trono de Deus, para logo cair aos poços
mais profundos do inferno, em sua desolação. Contudo, algum dia dominará o mundo,
poderá desafiar a Lei das Alternativas e se elevar pela força do Espírito até o Pai dos
Espíritos, livre dos efeitos da emoção, inflamado e rodeado por “essa paz que está mais
para lá de toda compreensão”.
Entretanto, esse é o fim a que se chega somente depois do Gólgota e do
Batismo místicos, este último explanado no capítulo anterior. Ademais, isto é somente o
começo da carreira ativa do Cristão Místico, na qual este fica total e completamente
saturado e convencido do transcendental fato da unidade de toda a vida, e infundido com o
sentido de confraternidade com todas as criaturas até um extremo tal que, desde aquele
momento, não só anunciará e postulará, mas, também, praticará todos os mandamentos e
princípios do Sermão da Montanha.
Se as experiências do Cristão Místico não o levaram mais que até este
ponto, ainda assim isto constituiria a maior aventura do mundo, pois a magnitude desta
transformação pessoal não pode ser definida com palavras e as conseqüências somente
podem ser obscuramente imaginadas.
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Muitos estudantes das filosofias superiores crêem na fraternidade do
homem pela convicção mental de que todos emanamos da mesma origem, do mesmo modo
como os raios emanam do Sol. Contudo, há um abismo de profundidade e largura
inconcebíveis entre esta fria concepção intelectual e a saturação batismal do Cristão
Místico, que sente no mais profundo de seu coração e em cada fibra de seu ser com tal
intensidade, que chega até lhe causar dor, pois o domina e inflama com tal desejo e
veemência, com um amor tão ao vivo, como o expressam as palavras de Cristo:
“Jerusalém, Jerusalém, como tenho desejado reunir todos seus filhos, tal como uma
galinha acolhe seus pintinhos sob as asas!”, isto é: um amor protetor, tão intenso, que
chega a lhe causar sofrimento; um amor que não pede nada para si, mas unicamente o
privilégio de aliviar, de acariciar, de curar e de fazer todo o bem imaginável.
Oh! Se houvesse, unicamente, um pálido reflexo de semelhante sentimento
universal de amor ao próximo entre a humanidade nestes dias tenebrosos, que paraíso seria
a Terra. Em vez de cada mão do homem se levantar contra seu irmão para matá-lo com a
espada, com a rivalidade e a competência; ou para destruir sua moral e degrada-lo com as
barras da prisão; ou com a servidão industrial, pelo látego da necessidade; não teríamos
nem guerreiros, nem prisioneiros, mas sim um mundo feliz e contente, que viveria em paz e
harmonia, em que aprenderíamos as lições que nosso Pai celestial deseja nos ensinar
durante nossa permanência nestas condições materiais. E toda a miséria do mundo pode ser
atribuída ao fato de que, se nós cremos na Bíblia, o fazemos com a nossa cabeça e não
com nosso coração.
Quando surgimos das águas do Batismo, o Dilúvio atlântico, na idade do
Arco Íris de estações alternantes, nos convertemos numa presa de emoções cambiantes, que
nos levam de um lado a outro, sobre o mar da vida. A fé fria, refreada pela razão, que
mantém a maioria dos que professam o Cristianismo, pode lhes dar uma grande paciência e
um equilíbrio mental que lhes pode propiciar algum estímulo nos momentos de depressão e
das provas da vida; porém, quando a maioria obtiver a FÉ VIVA do Cristianismo Místico,
que sobrepõe a razão, porque é sentida com o coração, então A Idade das Alternativas
haverá passado; o Arco Íris cairá com as nuvens e com o ar que agora compõem a
atmosfera e, então, haverá um novo céu de éter puro, de onde receberemos o Batismo do
Espírito e “ali haverá paz”, que é o que significa a palavra JERUSALÉM.
Todavia, nos achamos na Época do Arco Íris e sujeitos à sua lei, de modo
que podemos compreender que, como o Batismo do Cristão Místico ocorre em um
momento de exaltação espiritual, essa exaltação deve, necessariamente, ser seguida de uma
reação. A enorme magnitude da revelação o inunda e o abate; não pode concebê-la, nem
responde-la em seu veículo de carne e sangue, de modo que ele, que a experimenta, foge
das reuniões e do contato com os homens, o que o leva a essa solidão representada
alegoricamente pelo deserto. Tão arrebatado se acha em seu sublime descobrimento que,
durante o tempo de seu êxtase, pode ver a Fonte da Vida, onde os corpos de tudo que vive
são formados – desde o menor ao maior – tanto o rato como o homem; o caçador e sua
caça; o guerreiro e sua vítima. Contudo, para ele, não estão separados, nem apartados, uns
dos outros, pois, ao mesmo tempo, também vê o dourado elo divino de luz e vida, único,
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que “une a todos e a tudo rodeia e enlaça”. E, todavia, ainda mais, pois ouve também a
flamígera nota chave que canta suas aspirações e entoa suas esperanças e temores, e
percebe este composto de cor e som, como a antena de Deus feito carne. Primeiramente,
tudo isto está completamente fora de sua compreensão; o volume e magnitude de seu
descobrimento o ocultam e não pode conceber, nem compreender, o que vê, ouve e sente,
pois não há palavras para descrevê-lo e não há conceito que o defina e o abarque.
Entretanto, gradualmente, desce sobre ele a sensação e conhecimento de que se acha na
própria Fonte da Vida, vendo e observando, mais ainda, SENTINDO todas as batidas de
seu pulso e quando tem esta compreensão, então, chega ao cume de seu êxtase.
Tão arrebatado e extasiado fica o Cristão Místico com essa belíssima
aventura que as necessidades corporais são olvidadas completamente, até que cessa o
êxtase, e é, portanto, natural que a sensação de fome venha a ser a sua primeira necessidade
corporal, quando volta ao seu estado normal de consciência e também, naturalmente, tem a
voz da tentação que diz: “Faz que estas pedras se convertam em pão”.
Poucas passagens das Escrituras Sagradas são tão obscuras como os
primeiros versículos do Evangelho de São João: “No princípio era o Verbo”... “e sem ele
(o Verbo) nada do que foi feito se fez”. Um estudo superficial da ciência do som, de pronto
nos familiariza com o fato de que o som é vibração e que sons diferentes moldaram a areia,
ou a outros materiais leves, em figuras geométricas de formas distintas.
Um Cristão Místico pode ser ignorante deste fenômeno, de um ponto de
vista científico; entretanto, ele aprendeu da mesma Fonte da Vida a cantar o Canto do Ser,
que dá vida e existência a quanto deseje um maestro compositor como ele. Há uma nota
básica para a indigerível pedra mineral; contudo, uma modificação poderá convertê-la em
ouro, com o qual se pode comprar os meios de subsistência, e outra particular nota chave do
reino vegetal, poderá convertê-la em alimento; uma realidade conhecida de todos os
ocultistas avançados, que, legitimamente, praticam encantamentos com propósitos
espirituais, porém nunca por uma ganância material.
Porém, o Cristão Místico que acaba de sair das águas do Batismo da
própria Fonte da Vida, imediatamente se horroriza à simples sugestão de que use, com
propósitos egoístas, essa força espiritual que acaba de conquistar. Precisamente, foi a rara
qualidade de sua alma, do desinteresse e do altruísmo, que o conduziu às águas da
consagração da Fonte da Vida e, prontamente, sacrificará tudo de seu, até mesmo a vida,
antes de utilizar essa nova força para afastar de si próprio o efeito de uma dor.
Como já sabemos, e se tem repetido muitas vezes, um ser espiritual de
semelhante desenvolvimento pode utilizar essa magnífica força, com toda sua liberdade,
vontade e desejo, para alimentar milhares de pessoas famintas, que se lhe acerquem com
esse objetivo; porém, por qualquer propósito pessoal e egoísta, nunca a empregará para
alterar o equilíbrio do mundo.
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O Cristão Místico, não obstante, não age assim, como resultado de um
processo de raciocínio. Conforme se tem dito freqüentemente: chegado a tal estado de
desenvolvimento não emprega o raciocínio; contudo, em troca, ele possui uma orientação e
uma bússola muito mais seguras numa voz interna que sempre lhe fala nos momentos em
que deve tomar uma determinação: “Nem só de pão vive o homem, mas por cada palavra
de procede de Deus”, o que também constitui outro mistério.
Para aquele que ganhou acesso à Fonte da Vida, não há necessidade de se
sustentar de pão terreno. Quanto mais os nossos pensamentos estão centrados em Deus,
tanto menos nos veremos atraídos pelos chamados prazeres da mesa e pelo fato de
alimentarmos, sobriamente, nossos corpos físicos com alimentos simples, escolhidos e
selecionados, obteremos uma iluminação espiritual que será impossível se conseguir por
aqueles que se satisfazem com alimentos impuros e em grande quantidade, os quais nutrem
a natureza inferior.
Os Irmãos Maiores da humanidade, que conhecem e vivem de acordo com a
Lei, tomam alimentos unicamente a intervalos medidos com a medida de anos. A palavra
de Deus é para eles um “pão de vida”. Assim, também, se passa com o Cristão Místico e a
Tentação, em vez de afundá-lo e domina-lo, leva-o a alturas mais proeminentes.
CAPÍTULO IV
A TRANSFIGURAÇÃO
.
Recordemos que, pelo processo místico do genuíno Batismo Espiritual, o
aspirante fica tão completamente saturado do Espírito Universal que, como coisa sabida por
sentimento e experiência, se converte em uno com tudo aquilo que vive, se move e tem
existência; uno com a Vida divina, que pulsa e grita ao nosso redor, a qual surge em
cadência rítmica, tanto no grande quanto no pequeno, e, uma vez que tenha ouvido e
aprendido a canção do canto celestial, fica, então, investido com uma força espiritual de
enorme magnitude, que pode empregar tanto para o bem como para o mal.
Deve ser lembrado e bem compreendido, ainda que a pólvora e a dinamite
facilitem os trabalhos agrícolas como, por exemplo, para arrancar os troncos das árvores
que, para serem extraídos, se empregassem outros meios, seriam muito demorados e
custosos; também, esses elementos podem ser empregados com propósitos destrutivos,
como na guerra européia. As forças espirituais também podem ser utilizadas para o bem ou
para o mal, pelo que há que ter em conta o caráter de quem a possui e o motivo pelo qual
ele as emprega. Portanto, todo aquele que tenha passado pelo rito do Batismo e por ele
tenha adquirido poderes espirituais é, em seguida, tentado com objetivo de que possa ser
definitivamente decidido o lado para o qual se inclinará: para o bem ou para o mal. Neste
ponto se converte num futuro “Parsifal”, um Cristo, ou em um “Herodes”, ou um
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“Klingsor”, que combate os Cavaleiros do Santo Graal, com todos os poderes e meios da
Irmandade Negra.
Há uma tendência na ciência materialista moderna para repudiar a fábula,
que seria unicamente digna da atenção de pobres serventes supersticiosas, ou tidas como
conto de velhas as idéias aceitas e comumente generalizadas na Idade Média, de que
comunidades espirituais semelhantes à dos Cavaleiros do Graal, tiveram existência real em
um momento histórico, ou de que existem seres como os “Irmãos Negros”.
A sociedade de ocultismo, durante o último século, tem comunicado a
milhares de afiliados a realidade da existência dos Irmãos Bons (ou Brancos), que podem
ser achados por todo aquele que os busque de modo adequado. Hoje, desgraçadamente, há a
tendência entre as pessoas de aceitar fechar seus olhos a qualquer um que se apresente
diante delas dizendo que é um Mestre, ou um Adepto. Entretanto, ainda que entre estes
últimos existam poucos que levem a sério a existência dos Irmãos Negros, ou que
concebam o enorme dano que estão fazendo ao mundo e o modo que eles se vêem
ajudados, excitados e favorecidos pela tendência geral da humanidade a se entregar às
paixões da carne.
Assim como as forças boas, que são simbolizadas pelos servidores do Santo
Graal, vivem e se desenvolvem pelos serviços desinteressados e altruístas que aumentam o
brilho e lustro do reluzente Cálice do Graal; assim, também, as Forças do Mal, conhecidas
como o Graal Negro, representadas na Bíblia pela côrte de Herodes, que se alimentam e se
nutrem do orgulho e da sensualidade; da voluptuosidade e da paixão, simbolizados na
figura de Salomé; as quais se vangloriam com a decapitação de São João Batista e da
degolação dos Santos Inocentes.
Também mostramos, na lenda do Graal, segundo a versão da ópera de
Wagner - “Parsifal” – que, quando aos Cavaleiros que o guardavam, lhes era negada a
inspiração do Santo Cálice, a qual lhes fortalecia, impulsionava e excitava a executar os
feitos de maior amor e serviço; seu ânimo decaía como inerte. Igualmente se passa com os
Irmãos do “Graal Negro”. A menos que se lhes deixe executar seus atos iníquos e
malvados, ficarão esgotados e morrerão de inanição. Portanto, sempre estão muito
ocupados em suas atividades de incitar o mundo a cometer iniqüidades, cometendo-as eles
também por sua vez.
Se essa atividade perniciosa não fosse contestada e neutralizada, em grande
parte, pelos Irmãos Maiores (Brancos) nos seus serviços de meia-noite, durante os quais
convertem a si mesmos em magnetos para atrair para eles todos os maus pensamentos do
mundo ocidental, para depois, mediante uma alquimia de sublime amor, transmuta-los em
bem; há muito tempo teria ocorrido um cataclismo de maior magnitude e transcendência
que o da guerra mundial. Devido a essa atuação, o Gênio do Mal tem sido mantido na linha,
pelo menos em certos limites e, se a humanidade não se achasse tão inclinada a se passar
para as fileiras do mal, o êxito teria sido ainda maior. Porém, espera-se que o despertar
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espiritual alentado pela guerra resulte em fazer que as agências construtoras da evolução
somem novas forças e recebam um grande impulso benéfico.
É uma força maravilhosa a que converge sobre o Cristão Místico, no
momento de seu Batismo, pela descida e concentração sobre ele do Espírito Universal, e
quando recusa, durante as horas de tentação, profana-la por um benefício, fama ou poder
pessoal; necessariamente terá que emprega-la em outro sentido, pois se vê impelido por um
irresistível acicate interno, que não lhe permitirá o sentar-se e passar uma vida inerte e
contemplativa. A força de Deus o invade para que anuncie as alegres boas novas à
humanidade; para ajudar e curar. Nós sabemos que, carregada de combustível e acesa, uma
estufa não pode deixar de aquecer a atmosfera ao seu redor; do mesmo modo, tão pouco o
Cristão Místico pode evitar que dele irradie a divina compaixão que enche seu coração e
que transborda dele; nem, tão pouco, está em dúvidas sobre a quem amar, ou a quem servir,
ou onde buscar as ocasiões para fazê-lo.
Do mesmo modo que a estufa acesa irradia e comunica calor a tudo e a
todos que se acham dentro da esfera de sua irradiação; assim, também, o Cristão Místico
sente o amor de Deus, que arde em seu coração e o está continuamente irradiando a todo
aquele com quem se põe em contato. Mais ainda: assim como a estufa quente, por seu calor
reconfortante, atrai, para ela, todos aqueles que têm frio físico; do mesmo modo, os
calorosos raios de amor do Cristão Místico são como um magneto para todos aqueles
corações encolhidos pelo frio e crueldade do mundo, isto é: pela desumanidade do homem
para com o homem.
Se a estufa se achasse vazia, porém dotada da faculdade da fala, poderia
passar o tempo pregando o evangelho do calor a todos aqueles que sentem frio, fisicamente;
porém, até a oratória mais superlativa não satisfaria a seus ouvintes. Entretanto, quando está
cheia de fogo e irradia calor, não tem necessidade alguma de pregar; os homens
enregelados pelo frio, espontaneamente, se acercarão dela e se sentirão satisfeitos.
Da mesma forma, um sermão acerca da fraternidade, pregado por quem não
se tenha banhado na Fonte da Vida, soará vazio, sem eco. O verdadeiro místico não
necessita pregar. Sua silenciosa presença, unicamente, será mais poderosa que todos os
mais profundos discursos de frases feitas e vazias de sentido, dos mais pomposos doutores
em filosofia.
Corre uma lenda de São Francisco de Assis, que ilustra este caso e que,
confiamos, nos revelará mais argumentos, pois é verdadeiramente importante: “Diz-se que,
um dia, São Francisco se aproximou de um jovem monge no monastério onde se
encontrava naquele momento e lhe disse: “Irmão, vamos à aldeia próxima pregar aos seus
habitantes”. O jovem irmão, naturalmente, se sobressaltou de alegria ao ver a honra e a
oportunidade que se lhe apresentava, a de acompanhar um tão santo homem, como São
Francisco; e juntos os dois partiram para o povoado, falando todo o tempo sobre coisas
espirituais e da vida que leva a Deus. Entretidos com essa conversação, passaram várias
vezes pelas diferentes ruas da aldeia, parando aqui e ali para dizer uma palavra de amor e
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de bondade a uns e outros de seus moradores. Depois de haver rodeado completamente o
povoado, São Francisco tomou a direção do caminho que conduzia ao monastério, quando,
de repente, o jovem monge recordou-lhe a intenção que os havia levado ao povoado e lhe
perguntou se não havia esquecido: “Filho meu – respondeu-lhe – não haveis dado conta de
que durante todo o tempo que estivemos no povoado não fizemos outra coisa que pregar a
essa gente? Em primeiro lugar, nosso hábito simples proclama o fato de que nós nos
dedicamos ao serviço de Deus e, prontamente, qualquer um que nos veja, seus
pensamentos se dirigem naturalmente para o céu. Ademais, haveis podido ver que todos os
moradores da aldeia estão nos observando, tomando nota de nossos modos para ver se
todos eles se conformam com nossa profissão. Assim mesmo, todos eles ouviram nossa
conversa e atendido nossas palavras, com objetivo de ver se eram referentes a coisas
religiosas ou profanas. Têm vigiado nossos gestos e visto que as palavras de simpatia que
dirigimos a alguns deles saíam diretamente de nossos corações, as quais caíam
profundamente dentro dos seus. Nós, pois, estivemos pregando um sermão mais eficaz e
poderoso do que se houvéssemos chegado à praça do mercado, os houvéssemos
convocados ao nosso redor e, depois, tivéssemos lhes dirigido uma arenga exortando-lhes
à santidade”.
São Francisco era um Cristão Místico no mais profundo sentido da palavra
e, sendo ensinado pelo Espírito de Deus, ele conhecia muito bem os mistérios da vida, da
mesma forma que Jacob Boehme e outros homens santos, que foram ensinados do mesmo
modo. São, em certo sentido, mais sábios que os mais sábios da Escola intelectual; porém,
não é necessário postular grandes mistérios com a finalidade de cumprir sua missão e servir
como farol de sinais para outros que também estão buscando Deus. A própria simplicidade
de suas palavras, e de seus atos, leva em si o poder da convicção. Naturalmente, que nem
todos chegam à mesma altura; nem todos possuem as mesmas forças; assim como nem
todas as estufas são do mesmo tamanho, nem têm a mesma capacidade de calefação.
Aqueles que seguem a Senda do Cristianismo Místico, desde o menor ao
maior, têm experimentado as forças conferidas pelo Batismo de acordo com sua
capacidade. Têm sido tentados para que usem seus poderes em má direção, em proveito
próprio; entretanto, havendo dominado a atração do mundo e o desejo das coisas mundanas,
têm sido guiados para a Senda do ministério e do serviço como fez Cristo; suas vidas não
estão caracterizadas pelo que eles têm dito, nem pelo que eles têm feito. O autêntico Cristão
Místico é facilmente distinguido, pois nunca emprega os seis dias da semana preparando
um grande discurso para impressionar seus ouvintes no domingo; mas que passa os dias
com igual humildade e esforçando-se em fazer a vontade do Senhor, sem se importar (nem
buscar) com o aplauso público. Desse modo, inconscientemente, trabalha e vai se
aproximando do tão grandioso clímax, que na história dos mais nobres seres que têm
percorrido esta Senda se conhece com o nome de “Transfiguração”.
A Transfiguração é um processo alquímico, pelo qual o corpo físico,
formado pela química de processos fisiológicos, se converte na “pedra viva”, tal e como se
menciona na Bíblia. Os alquimistas da Idade Média, que anelavam achar a Pedra Filosofal,
não andavam atarefados com a transmutação de tal escória, como o ouro material; mas
aspiravam chegar a esta grande meta indicada acima, a de uma transfiguração espiritual.
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A umidade reunida nas nuvens cai na Terra em forma de chuva, quando se
condensou suficientemente, e, novamente, pelo calor do Sol, torna a se evaporar para
formar outras nuvens. Esta é a formula cósmica prima. O espírito também se condensa em
matéria e se faz mineral. Porém, ainda que fique cristalizado em coisa tão dura como a
pedra, a vida permanece em tal matéria e, pela alquimia da Natureza, atuando por meio de
outra corrente de vida, o mineral denso dos constituintes do solo, são transformados em
uma composição de contextura mais flexível como é o vegetal que, neste estado, pode ser
utilizado como alimento pelo animal e pelo homem. Estas substâncias se fazem carne
sensível pela alquimia da assimilação. Quando notamos e diferenciamos as trocas, que são
evidentes na estrutura do corpo humano; quando comparamos os hotentotes com chineses,
índios, latinos, celtas e anglo-saxões; vemos claramente que a carne do homem está
sofrendo um constante processo de refinamento, pelo qual se eliminam as substâncias e
formas grosseiras e ásperas. Com o tempo, e mediante a evolução, este processo de
espiritualização tornará nossa carne transparente e radiante, pela Luz que arde dentro:
radiante como o rosto de Moisés; o corpo de Buda, ou o de Cristo, na Transfiguração.
Atualmente, a fulgência do espírito que mora dentro de nós se acha,
realmente, obscurecida por nosso corpo denso; contudo, podemos ter esperança e, para isso,
até podemos nos apoiar na química. Não há nada na Terra tão raro e precioso como o rádio,
o extrato luminoso de um denso mineral negro chamado quimicamente uranato de uranilo.
Assim mesmo, não há nada tão raro e precioso como o extrato do corpo humano: o Cristo
radiante. Hoje em dia, nós estamos trabalhando para formar o Cristo dentro de nós mesmos;
porém, quando o Cristo interno tiver chegado a seu total desenvolvimento, brilhará através
dos corpos transparentes como a Luz do Mundo.
É um fato anatômico, de conhecimento comum e geral, que o cordão
espinal está dividido em três seções, pelas quais se controlam os nervos motores, sensoriais
e simpáticos. Astrologicamente, eles são regidos pela Lua, Marte e Mercúrio - Hierarquias
divinas que, valendo-se dos três sistemas nervosos indicados, têm desempenhado um
importantíssimo papel na evolução humana. Entre os antigos alquimistas estes nervos
foram designados com os nomes de três elementos químicos: sal, enxofre e mercúrio; entre
e pelos quais atuava o Fogo Espiritual de Netuno, da coluna vertebral. Sobe em forma de
serpentina por todo o cordão espinal até chegar aos ventrículos do cérebro; porém, na
grande maioria da humanidade, este Fogo Espiritual é ainda excessivamente débil. Todavia,
quando ocorre o despertar espiritual em alguém, semelhante ao que se manifesta em uma
genuína e autêntica conversão, ou melhor, no Batismo do Cristão Místico, então a descida
do Espírito, o qual é um fato real, aumenta o Fogo Espiritual da coluna vertebral de um
modo quase incrível; então, graças a ele começa um processo de regeneração, pelo qual as
substâncias toscas do tríplice corpo do homem são, gradualmente, eliminadas e expulsas,
fazendo os veículos mais permeáveis e mais sensíveis aos impulsos espirituais e quanto
mais adiante se leve este processo, mais eficiente operário da Vinha do Senhor se fará o
aspirante.
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O despertar espiritual, que dá começo a este processo de regeneração no
Cristão Místico, que se purifica a si mesmo pela oração e pelo serviço; chega também,
como é natural, a todos aqueles que se acham buscando a Deus pelo caminho do
conhecimento e do serviço, porém, atua em sentido diferente, como é observado pelo
investigador espiritual.
No Cristão Místico, o regenerativo Fogo Espiritual da espinha dorsal se
concentra, principalmente, para o segmento lunar da coluna, que governa os nervos
simpáticos, sob a regência de Jeová. Portanto, seu crescimento espiritual se realiza por meio
da fé tão simples, infantil e obediente com o foi a da humanidade nos dias dos primitivos
atlantes, quando o homem não tinha mentalidade. Deste modo, o aspirante atrai para si a
grande Luz Branca da Deidade, refletida através de Jeová, ou Espírito Santo, e se eleva ao
plano da sabedoria total do mundo, sem necessidade de nenhum processo de raciocínio
intelectual. Isto transforma, gradualmente, seu corpo na branca Pedra Filosofal, o
diamante da alma.
Ao contrário, naqueles cujas mentes são fortes e insistem em seus desejos de
saber a razão do porquê e como, de cada regra dos dogmas, o Fogo Espiritual da
regeneração atua nos segmentos vermelhos de Marte e nos incolores de Mercúrio,
esforçando-se em infundir e coordenar o desejo com a razão, em purificar a influência
passional do primeiro (Marte) para que possa converter-se em casto como a rosa e, deste
modo, transmutar o corpo no rubi da alma, a Pedra Filosofal vermelha, provada e
purificada pelo Fogo, isto é: um casulo criador de individualidade.
Todos aqueles que se acham no Caminho da Perfeição, tanto pelo lado
ocultista, como pelo lado do misticismo, estão tecendo o “traje dourado de bodas” por
esses trabalhos, tanto interior, como exteriormente. Em alguns, o ouro é excessivamente
pálido e em outros é profundamente vermelho. Porém, uma vez que ambos tenham
completado do processo da Transfiguração, ou melhor, quando está próxima a sua
conclusão, os extremos se mesclam e os corpos transfigurados ficam equilibrados em sua
cor, pois o ocultista deve aprender a lição da profunda devoção e o Cristão Místico deve
aprender como adquirir o conhecimento por seus próprios meios, sem necessidade de
superar-se, ou atraí-lo do manancial universal de toda sabedoria.
Estas considerações nos levam a uma observação e visão mais profundas da
Transfiguração, que a que nos é relatada nos Evangelhos. Devemos recordar, precisa e
exatamente, que foram os veículos de Jesus os que foram momentaneamente transfigurados
pelo Espírito de Cristo que morava neles. Porém, ainda que nós concedamos algum efeito à
enorme potencialidade do Espírito de Cristo no ato da Transfiguração, é evidente, não
obstante, que Jesus devia ser um caráter sublime, sem mácula.
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A Transfiguração, conforme se vê na memória da Natureza, nos revela que
seu corpo era de uma brancura deslumbrante, com o quê se nos demonstra a fusão, ou
comunhão, com o Pai, o Espírito Universal.
Há grande diversidade nas evoluções espirituais de hoje, até chegar à fusão
com o Espírito Universal; porém, no reino de Cristo, tais diferenças desaparecerão,
gradualmente, e será adquirida por todos uma cor uniforme que indicará tanto o
conhecimento como a devoção. Esta cor corresponderá à cor rosa vista pelos ocultistas
como o Sol Espiritual, isto é, o veículo do Pai. Quando isto se tenha efetuado, a
Transfiguração de toda a humanidade ficará completa e, então, nós seremos uno com o Pai
e Seu Reino terá vindo a nós.
CAPÍTULO V
A ÚLTIMA CEIA E O LAVA-PÉS
Nos Evangelhos, onde se relatam as cenas da Iniciação do Cristão Místico,
diz-se que na noite em que Cristo participou da Última Ceia com seus Discípulos (naquele
momento, terminava seu ministério externo) se levantou da mesa e, munindo-se de uma
toalha, pôs água numa vasilha e começou a lavar os pés dos doze discípulos: um ato do
serviço mais humilde, porém motivado por uma razão oculta muito importante.
Poucos são os que se dão conta de que, quando nos encontramos na escala
da evolução, podemos nos apoiar nos ombros de nossos irmãos mais débeis, por seu atraso;
consciente, ou inconscientemente, os utilizamos como pontos de apoio para ascendermos a
lugares mais altos e alcançarmos nossos fins. Este procedimento tem a mesma realidade e
se efetua em todos os reinos da Natureza.
Quando uma onda de vida chega ao nadir da involução e se incrusta na
forma mineral, é imediatamente presa por outra onda de vida, ligeiramente mais elevada,
que toma os cristais minerais desintegrados e os adapta a seus próprios fins, como
cristalóides, e os assimila como parte de uma forma de vegetal. Se não houvesse minerais
sobre os quais se prendesse e se agarrasse essa onda do reino vegetal, desintegrando-os e
transformando-os, a vida das plantas seria impossível. Assim, as formas da planta são
utilizadas por muitas espécies animais; mastigadas por eles até formar uma pasta, que é
engolida, servindo de alimento a este reino da Natureza mais elevado. Se não houvesse
plantas, os animais não poderiam existir e o mesmo princípio pode se aplicar à evolução
espiritual, pois se não houvesse discípulos que se achassem nos primeiros degraus da escala
do conhecimento, requerendo, portanto, quem os instrua, não haveria necessidade de tal
instrutor, ou mestre. Contudo, aqui há uma diferença muito importante: o mestre se eleva
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pela instrução que dá a seus alunos e por lhes servir. Apoiando-se em seus ombros, ascende
a um degrau mais alto na escala do conhecimento, isto é: eleva a si mesmo, ao elevá-los;
porém, não obstante, adquire com eles uma dívida de gratidão, que reconhece e satisfaz
simbolicamente pelo lava-pés, um ato de humilde serviço para aqueles que o têm servido.
Quando percebemos que a Natureza, que é a expressão de Deus, está
continuamente fazendo esforços para criar e para dar a vida, também podemos
compreender que quem mata a outro, ou tira a vida de alguma coisa, por menor que seja e
aparentemente insignificante, executa um ato que, em tal raio de ação, altera e perturba os
propósitos do plano divino da criação. Isto se aplica especialmente ao aspirante à vida
superior, e, portanto, Cristo exortou a seus discípulos a “que fossem astutos como as
serpentes e sensíveis como as pombas”. Todavia, não importa quão sincero seja nosso
desejo de seguir o preceito da inofensividade: nossas tendências e necessidades
constitucionais nos obrigam a matar a cada momento de nossas vidas para podermos viver,
e não é somente nas grandes coisas que estamos constantemente cometendo assassinatos.
Foi relativamente fácil, para a alma investigadora simbolizada por Parsifal, o quebrar o arco
com que havia atirado a flecha que matou o cisne dos Cavaleiros do Graal, uma vez que
estes lhe explicaram o mal que havia feito o erro em que havia incorrido.
Desde aquele momento, Parsifal ficou inclinado a viver uma vida
inofensiva, no que respeitava às grandes coisas. Todos os aspirantes sinceros seguem-no
prontamente em tal direção, uma vez que se tenham convencido do quanto é contrário para
a evolução da alma a prática de comer alimentos que requeiram a morte de um animal.
Contudo, o mais nobre e gentil dos homens se acha constantemente
envenenando a todos aqueles que estão ao seu redor, por meio de sua respiração e é, por sua
vez, envenenado por eles, pois todos exalamos o venenoso e mortífero dióxido de carbono,
e somos, portanto, um perigo uns para os outros. Não se trata de uma idéia extravagante; é,
pelo contrário, um perigo muito real, que se fará muito mais evidente e se porá muito mais
manifesto com o transcurso dos tempos, quando a humanidade se fizer mais sensitiva. Em
um submarino submerso, ou sob condições semelhantes, onde haja um grupo de homens
reunidos, o dióxido de carbono exalado por eles rapidamente faz com que a atmosfera
daquele lugar seja imprópria para sustentar a vida.
Sabe-se de um caso ocorrido na Índia onde, em um pequeníssimo quarto,
que somente possuía uma pequena abertura para renovar o ar, foram encerrados vários
prisioneiros ingleses. Em um curto espaço de tempo o oxigênio foi consumido e os pobres
prisioneiros começaram a lutar entre si, como bestas, buscando ocupar uma posição perto
da entrada de ar; e lutaram até que quase todos eles morreram, tanto pela luta, quanto pela
asfixia.
O mesmo princípio se via no antigo Templo de Mistérios atlante, o
Tabernáculo no Deserto, onde havia um cheiro nauseabundo e um fumo sufocante, que se
elevavam do Altar das Oferendas e dos Sacrifícios, e onde eram consumidos pelo fogo os
corpos dos animais imolados como vítimas involuntárias pelos pecados cometidos por
aqueles que as ofereciam; corpos que estavam carregados de substâncias venenosas, e onde
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vemos que a luz (a chama) se percebia mui confusamente, por causa do fumo que a
envolvia. Isto podemos contrastar com a luz que emanava, clara e brilhante, das sete
lâmpadas do Candelabro de Sete Braços, as quais eram alimentadas com azeite de oliva,
que procede do casto reino vegetal e onde, também, o fumo do incenso, que simboliza o
serviço voluntariamente prestado dos devotos sacerdotes, se elevava para o céu com uma
doce e suave fragrância. Foi dito em muitas passagens, que tal fragrância e olor do incenso
eram prazerosos à Deidade, enquanto que o sangue das vítimas involuntárias – os touros e
as cabras – era motivo de dor e desgosto para Deus, que se deleita mais com o sacrifício da
oração, o qual favorece ao devoto e não maltrata a nada.
Tem-se dito, com referência a alguns santos, que exalavam de si um suave e
doce odor e, muitas vezes, temos tido ocasião de dizer que isto não é um conto sem
fundamento, mas que é um fato oculto. A grande maioria da humanidade inala durante
todos os momentos de sua vida o vital oxigênio contido no ar que respiramos. Em cada
expiração exalamos uma quantidade de dióxido de carbono, que é um veneno mortífero e
que, certamente, com o tempo, viciaria o ar, se a pura e casta planta não inalasse esse
veneno, utilizando uma parte dele para construir organismos que duram muitos séculos, ou
quiçá milhares de anos, como, por exemplo, os pinheiros gigantescos da Califórnia,
devolvendo-nos o resto em forma de oxigênio puro, que nos é necessário para viver.
Estes organismos carboníferos do reino vegetal, mediante um certo
processo ulterior da Natureza, no passado estiveram convertidos em minerais em forma de
pedra, antes de se desintegrar. Podemos vê-los, hoje, em forma de carvão, a Pedra
Filosofal predecessora, feita por meios naturais no laboratório da Natureza. Porém, a
Pedra Filosofal pode também ser feita artificialmente pelo homem em seu próprio corpo.
Deve-se entender bem e para sempre que a Pedra filosofal não se faz em um laboratório
químico externo, mas que o corpo mesmo é a oficina do Espírito, que contém todos os
elementos necessários para produzir esse elixir da vida e que a Pedra Filosofal não é coisa
exterior do corpo, mas que é o próprio alquimista que se converte em Pedra Filosofal. O
sal, o enxofre e o mercúrio contidos, emblematicamente, nos três segmentos do cordão
espinal, que controlam os nervos simpáticos, motores e sensoriais, que são manipulados
pelo Espírito do Fogo espinal de Netuno, constituem os elementos essenciais neste processo
alquímico.
Não é necessário nenhum argumento para provar que o abuso da
sensualidade e o entregar-se a uma vida de brutalidade e bestialidade fazem com que nosso
corpo se degenere. Contrariamente, a devoção à Divindade; uma atitude de oração
contínua; um sentimento de amor e compaixão por tudo que vive e se move; a emissão de
pensamentos amorosos para todos os seres e os que, inevitavelmente, se recebem em troca,
tudo isso, invariavelmente, surte o efeito de refinar e espiritualizar a natureza humana.
Nós dizemos de uma pessoa de tal sorte, que respira e irradia amor, uma
expressão que define mui adequadamente o fato exato e verídico que a maioria das pessoas
notam, pois se tem observado muito bem que a percentagem de veneno contido na
respiração de um indivíduo está na exata proporção da inclinação perversa que existe em
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sua natureza, em sua vida interior e nos pensamentos que emite. O índio yogui tem a prática
de encerrar o candidato a certo grau de Iniciação dentro de uma cova, ou buraco, que não é
muito maior que o corpo, na qual deve permanecer durante algumas semanas, respirando o
mesmo ar, para lhe demonstrar, praticamente, que cessou de exalar o mortífero dióxido de
carbono, começando, portanto, a construir dele o seu próprio corpo.
A Pedra Filosofal, pois, não é um corpo da mesma natureza da planta, ainda
que puro e casto; mas se trata de um corpo celestial, tal como o que São Paulo faz
referência no Capítulo 5 de sua segunda Carta aos coríntios, isto é: um corpo que se faz
imortal, igual a uma pedra preciosa como o diamante ou o rubi. Não é duro e inflexível
como o mineral; trata-se de um diamante, ou rubi, macio e por meio dos atos, como temos
dito, o Cristão Místico constrói esse corpo, ainda que, provavelmente, se ache inconsciente
disso durante muito tempo. Quando chega a esse grau de santidade, não é necessário que
execute o lava-pés, literalmente, no que concerne ao discípulo que o ajuda a se elevar, mas
sentirá sempre uma grande gratidão, simbolizada por aquele ato, por aqueles que ele tem a
fortuna de atrair para si como seus discípulos e para quem possa dar o pão da vida, que os
nutre e os conduz à imortalidade.
Compreende-se que isto é uma parte do processo que, oportunamente,
culmina na Transfiguração; porém, também, deve se ter em conta que na Iniciação Cristã
Mística não há graus fixos ou definidos. O candidato aspira a chegar até Cristo como o
princípio e fim de sua fé e anela imitar-Lhe e seguir Seus passos durante todos os
momentos de sua existência. De modo que todos os diversos estados que temos
considerado se alcançam pelo processo de evolução da alma que, simultaneamente, a levam
a pontos mais elevados a todos estes graus que agora estamos analisando.
A esse respeito, a Iniciação Cristã Mística difere radicalmente do processo
atualmente em voga entre os Rosa-Cruzes, no qual se considera indispensável que o
aspirante tenha entendimento e compreensão daquilo que se lhe prepara. Porém, chega um
momento em que o Cristão Místico deve compreender e saber a Senda que deve percorrer e
isto é o que constitui o Getsêmani, que estudaremos no próximo capítulo.
CAPÍTULO VI
GETSÊMANI: O HORTO DA AGONIA
E depois que eles cantaram um hino, caminharam para o Monte das
Oliveiras. E Jesus lhes disse: “Vós os escandalizareis por Mim, esta noite, pois está
escrito: Eu ferirei ao Pastor e as ovelhas se dispersarão. Mas, depois de tudo isso, Eu
ressuscitarei e irei adiante de vós a Galiléia.”
Porém, Pedro lhe disse: “Ainda que todos se escandalizem, eu não me
escandalizarei”.
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E Jesus respondeu-lhe: “Em verdade, em verdade, te digo, que nesta noite,
antes que o galo cante duas vezes, tu me negarás três vezes”.
Porém, ele lhe respondeu mui veementemente: “Ainda que tenha de
morrer, eu não te negarei de nenhum modo”. Do mesmo modo, afirmaram todos os
demais.
“E eles chegaram a um lugar chamado Getsêmani e Jesus disse a seus
Discípulos:“Sentai aqui enquanto Eu vou orar um pouco mais adiante”. E levou consigo
Pedro, Santiago e João, e começou a sentir-se triste e lhes disse: “Minha alma está triste
até a morte: velai e orai”. E Ele se foi um pouco mais adiante e caiu ao solo e rogou que se
fosse possível passasse dEle aquela hora de angústia. E ele disse: “Aba, Pai, todas as
coisas são possíveis para Ti, afaste de mim este Cálice; não obstante, não se faça a minha
vontade, mas a Tua”. E, voltando aos três discípulos encontrou-os dormindo, e disse a
Pedro: “Simão, dormes? Não pudestes velar pelo espaço de uma hora? Velai e orai para
não cairdes em tentação. O Espírito, certamente, está disposto, mas a carne é fraca”. (São
Marcos – Cap. 14, versículos 26/38).
Nessa narração tomada dos Evangelhos, temos uma das mais tristes e
difíceis experiências do Cristão Místico, determinadas em forma espiritual. Durante suas
experiências anteriores tem vindo caminhando cegamente, isto é: no sentido de que se acha
no Caminho que, seguido consistentemente, leva-o a uma meta definida; porém, às vezes,
sentindo-se muito afetado ante os sofrimentos de todo ser humano. Tem concentrado todos
seus esforços para aliviar as penas de seu próximo: físicas, morais e mentais; tem servido a
seus semelhantes o quanto lhe tenha sido possível; tem lhes ensinado o evangelho do amor:
“Ama a teu próximo como a ti mesmo”, e tem sido um exemplo vivente para todos na
prática desse mandamento divino. Como conseqüência disso tem reunido em torno de si um
pequeno grupo de amigos, a quem ama com o mais terno dos afetos. Ademais, tem lhes
ensinado e servido incansavelmente, chegando até ao lava-pés. Entretanto, durante esse
período de provação, ou de serviço, tem ficado tão saturado das dores e misérias do mundo
que, sem dúvida alguma, é um homem de dores e familiarizado com as penas mais que
outro qualquer.
Esta é uma experiência definida do Cristão Místico e é o fator mais
importante para impulsionar seu progresso espiritual. Enquanto nos moleste que o nosso
próximo nos venha contar seus problemas; enquanto procuremos nos evadir às suas
consultas e escapar de seu lado, com a idéia de não ouvir suas lamentações, nos achamos
longe do Caminho. Ainda quando o escutamos com paciência e nos achamos disciplinados
para não mostrar em nossos semblantes o desgosto e o tédio que nos causam com seus
casos; quando dizemos com nossos lábios simplesmente umas quantas palavras de
simpatia, que chegam friamente ao ouvido do que sofre, não ganharemos nada no Caminho
do desenvolvimento espiritual. É absolutamente essencial para o Cristão Místico que se
sinta tão impressionado e afetado pela dor e miséria do mundo, que chegue até o ponto de
sentir em seu próprio ser todas as penas e desgraças de seus semelhantes, como si ele
mesmo as sofresse e as acumulasse todas em seu coração.
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Quando Parsifal entrou pela primeira vez no Templo do Santo Graal e viu o
sofrimento de Amfortas, o ferido Rei do Graal, ficou mudo de simpatia e compaixão
durante um longo espaço de tempo depois de haver passado a procissão pelo vestíbulo e,
por conseguinte, não pode responder às perguntas de Gurnemanz; sendo aquele profundo
sentimento de fraternidade e de dor o que o impulsionou a buscar aquela lança que haveria
de curar a Amfortas. A dor de Amfortas, sentida pelo coração de Parsifal, por simpatia e
afinidade, foi o que o susteve firmemente na senda da virtude, quando a tentação chegou
ao seu máximo poder. Foi aquela profunda sensação de compaixão pela dor do próximo
que o impulsionou e estimulou durante muitos anos a buscar o sofrido Rei do Graal e,
finalmente, quando o encontrou, também foi aquele sentimento de caridade humana que lhe
permitiu e capacitou para emitir e aplicar o bálsamo curativo.
Do mesmo modo que se ensina no mito da alma chamado Parsifal, assim se
passa realmente na vida e nas experiências do Cristão Místico: deve, pois, beber até às
fezes do cálice da dor e da amargura; deve apurá-lo totalmente, de modo que com a dor
acumulada que ameaça consumir seu coração, possa se dar e se oferecer a si mesmo sem
reservas, nem limitações, para a cura e ajuda de seus semelhantes. Então, o Getsêmani, o
horto da agonia, se converte em um lugar familiarizado com o aspirante, o qual é regado
com as lágrimas ardentes que correm de seus olhos pelas desgraças e sofrimentos da
humanidade.
Durante todos seus anos de sacrifício pessoal, aquele pequeno grupo de
amigos foi o consolo de Jesus. Ele já havia aprendido a renunciar aos laços de sangue:
“Quem é minha mãe e quem são meus irmãos? Aqueles que fazem a vontade de meu Pai”.
Ainda que nenhum Cristão autêntico abandone, ou desdenhe, seus deveres sociais, ou
diminua, ou retire o amor devido à sua família, assim e todos os laços espirituais são os
mais fortes e por meio deles vem a dor e a amargura que há de coroá-lo; pela deserção e
abandono em que o deixam seus amigos espirituais aprende a beber o cálice da dor até às
fezes. Ele não os censura por sua fuga, mas, pelo contrário, desculpa-os com as palavras:
“O Espírito, indubitavelmente, está pronto, mas a carne é fraca”, pois Ele conhece, por
experiência pessoal, quão certo isto é. Todavia, Ele observa que na suprema dor eles não
podem confortá-lo e, portanto, Ele volve seus olhos para o único manancial de consolo, o
Pai celestial. Chegou a um ponto onde a resistência humana parece ter alcançado seu limite
e, como conseqüência de tal suposição, ora porque se poupa de um ordálio maior; mas, com
uma cega confiança no Pai, aceita e acata sua vontade e se oferece a Ele sem reservas nem
limite algum.
Este é o momento da realização. Havendo bebido a taça da dor até às fezes;
vendo-se abandonado por todos; experimenta esse horroroso temor momentâneo de se ver
absolutamente só, que é uma das mais terríveis experiências, senão a maior de todas, que
pode sobrevir na vida de um ser humano. Todo o mundo lhe parece tétrico a seu redor. Ele
vê que, a despeito de todo o bem que Ele tem feito e intentado fazer, as forças das trevas se
conjuraram para assassiná-lo. Ele vê que a multidão, que uns poucos dias antes gritava:
“Hosana”, na manhã seguinte clamará: “Crucifica-o, crucifica-o!” Seus familiares, e
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agora seus últimos amigos, fugiram de seu lado; assim como se achavam, dispostos a negá-
lo.
Entretanto, quando o aspirante se acha no pináculo da dor e da amargura,
se acha, também, mais perto do trono da graça. A agonia e a amargura; a dor e o sofrimento
acumulados no peito do Cristão Místico são mais preciosos e valiosos que todas as riquezas
das Índias, porque quando perdeu toda companhia humana e quando se dá e se oferece a si
mesmo, total e completamente, ao Pai, ocorre uma transformação: a amargura se converte
em compaixão, a única força no mundo que pode fortificar um homem para poder ascender
ao monte do Calvário, o Gólgota, e dar sua vida pela humanidade, não um sacrifício mortal,
mas um sacrifício vivente, elevando-se e ascendendo ele mesmo ao elevar e subir aos
outros.
CAPÍTULO VII
AS ESTIGMATAS E A CRUCIFICAÇÃO
Conforme dissemos no princípio destes trabalhos, a Iniciação Cristã Mística
difere radicalmente da Iniciação oculta passada por aqueles que se acercam do Caminho
pelo lado intelectual.
Entretanto, todos os Caminhos convergem ao Getsêmani, onde o candidato
à Iniciação fica saturado com a dor que floresce e se transmuta em compaixão, um
vivíssimo amor maternal que tem um só desejo, que absorve todos os demais: o de
sacrificar-se para aliviar todos os males do mundo; o de salvar e socorrer a todos aqueles
que são débeis e levam muita carga; o de lhes confortar e lhes proporcionar descanso. Em
tal ponto, os olhos do Cristão Místico se abrem à completa realização e concepção das
misérias do mundo e de sua missão como um Salvador; e o ocultista encontra, também, ali
o coração do amor, que é o que unicamente pode dar gosto, zelo e ardor na luta. Pela união
da mente e do coração, ambos estão dispostos da dar o passo seguinte, o qual compreende a
manifestação das “estigmatas”, que é uma preparação necessária para a morte e
ressurreição místicas. A narração dos Evangelhos a respeito das “estigmatas” se contém
nas seguintes palavras, cuja cena preliminar ocorre no horto de Getsêmani:
“Judas, tendo-lhe sido dada uma companhia de soldados e oficiais pelo
Príncipe dos Sacerdotes e fariseus, vinha com eles levando lanternas, tochas e
armas. Jesus, pois, sabendo todas as coisas que haviam de ocorrer, saiu a seu
encontro e lhes disse: A quem buscais? E eles responderam: A Jesus de Nazaré.
Jesus lhes disse, então: Eu sou... Então a companhia de soldados, o capitão e os
oficiais dos judeus se apoderaram de Jesus, manietaram-no e o levaram,
primeiramente, à presença de Anás... O grande sacerdote, então, perguntou-lhe a
respeito de seus discípulos e de sua doutrina, a que Jesus respondeu: Eu tenho
falado claramente ao mundo... Por que me perguntas a mim? Pergunta a todos os
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que têm ouvido as coisas que Eu lhes tenho dito e verás como eles sabem o que lhes
disse. Então, Anás o enviou atado à casa de Caifás, o grande sacerdote..; e aqueles
homens levaram Jesus à presença de Caifás, na Sala do Juízo...”
“Pilatos perguntou aos que levavam Jesus preso: Que acusação tendes a
fazer contra este homem? Ao que lhe responderam: Se não fosse um malfeitor, não
o teríamos trazido a ti... então, Pilatos entrou, novamente, na Sala do Juízo e
chamando Jesus, disse-lhe: És tu o rei dos judeus? Jesus respondeu-lhe: Tu mesmo
o diz, ou disseram-te outros de mim?... Meu reino não é deste mundo, pois se meu
reino fosse deste mundo, é claro que meus soldados haveriam lutado por mim e não
haveriam permitido que eu fosse entregue aos judeus, porém, agora, meu reino não
está distante.” Então, Pilatos lhe disse: És tu, pois, um rei? Jesus respondeu: Tu o
disseste, Eu sou um Rei. Para este fim nasci e por esta causa vim ao mundo: para
dar testemunho da verdade. Todo aquele que ouve a verdade ouve a minha voz.
Pilatos perguntou-lhe: E o que é a verdade?... Então, novamente, Pilatos saiu e disse
aos judeus: Eu não encontro nenhum crime nele. Porém, como há o costume de que,
na Páscoa, se ponha um preso em liberdade, quereis, pois, que eu solte o vosso rei?
Então, gritaram todos a uma só voz: Não a este, mas a Barrabás. É preciso que se
saiba que Barrabás era um ladrão. Pilatos, ante isto, tomou a Jesus e o açoitou. E os
soldados fizeram uma coroa de espinhos e a puseram em sua cabeça, e também lhe
puseram um manto grená e fincando um joelho na terra o saudavam em tom de
mofa: Salve, rei dos judeus! E davam-lhe bofetadas.
“Pilatos voltou a sair e lhes disse: Vede que aqui volto a trazê-lo, para que
saibais que não acho falta alguma nele. Então, Jesus saiu levando sobre suas
têmporas a coroa de espinhos e, sobre os ombros, o manto púrpura. E Pilatos lhes
disse: Eis o homem! Quando os príncipes dos sacerdotes e os oficiais o viram,
gritaram a uma voz: Crucifica-o, crucifica-o! Pilatos, ante isto, lhes disse: Tomai,
vos outros e crucificai-o, pois eu não acho crime nele. Os judeus lhe disseram: Nós
temos uma lei e segundo essa lei deve morrer, porque se tem dito filho de Deus...
Pilatos, ao ouvir isto, pensava como liberta-lo, porém os judeus voltaram a gritar
mas forte, dizendo: Si tu soltas este homem, não és amigo de César, pois todo
aquele que se faz rei, ao César contradiz... Voltaram a gritar: Fora com ele; fora
com ele; crucifica-o! Pilatos lhes disse: Ides crucificar a vosso rei? Ao que o
contestou o Príncipe dos Sacerdotes: Não temos outro rei, senão a César. Então,
Pilatos o entregou para que o crucificassem. E Jesus, levando a cruz nas costas, foi
levado a um lugar chamado de “as Caveiras”, que em hebreu é Gólgota. Ali o
crucificaram - e a outros dois com ele - um de cada lado e Jesus no meio. E Pilatos
escreveu um letreiro que foi posto na Cruz. E o escrito dizia: “Jesus Nazareno rei
dos judeus”.
Aqui temos um relato de como foram produzidas as “estigmatas”, ou
chagas, no Herói dos Evangelhos, ainda que a localização delas não está dita exatamente e
o processo está apresentado de forma narrativa, que difere, amplamente, do modo que
realmente as coisas sucederam. Contudo, nós estamos diante de um dos mistérios que
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devem permanecer selados e ocultos para o profano, ainda que os fatos místicos subjacentes
sejam tão claros e simples como a luz do Sol, para aqueles que os conhecem.
O corpo físico não é o homem real. Tangível, sólido e dotado de vida, como
o vemos é, realmente, a parte mais morta do ser humano, pois está cristalizado dentro de
uma matriz de veículos mais finos, que são invisíveis para nossa vista física ordinária. Se
colocarmos uma vasilha com água a uma temperatura muito baixa, a água logo se tornará
em gelo e, quando se examina esse gelo, descobre-se que está formado de inumeráveis
cristais diminutos, que têm diversas formas geométricas e linhas de demarcação. Trata-se
de linhas de forças etéreas, as quais se achavam presentes na água, antes que esta se
congelasse. Do mesmo modo que a água se endureceu e se amoldou de acordo com tais
linhas, assim também, nosso corpo físico está congelado e solidificado de acordo com as
linhas das forças etéreas de nosso invisível corpo vital, o qual, durante o curso ordinário da
vida, se acha inextricavelmente unido ao corpo físico, desperto ou dormindo, até que a
morte dissolve a ligadura. Contudo, como a Iniciação implica a liberação do homem real do
corpo do pecado e da morte para que, desse modo, possa singrar, à vontade, as sutis esferas
do infinito e volver a seu corpo a seu gosto, é óbvio que antes que isto possa se efetuar, a
entrelaçante presa, ou união, existente entre o corpo físico e o veículo etéreo, cuja união é
extremamente forte e rígida na humanidade comum deve-se dissolver. Essa união é mais
forte e íntima nas palmas das mãos, nos arcos dos pés e na cabeça. As Escolas de ocultismo
insistem e concentram seus esforços para cortar a conexão em tais pontos e produzir as
“estigmatas” invisivelmente.
Ao Cristão Místico falta o conhecimento do modo que se pode fazer isto,
sem que se produza a manifestação externa. As “estigmatas” se desenvolvem nele
espontaneamente, por sua constante contemplação de Cristo e por seus incessantes esforços
para imitar-Lhe em todas as coisas. Estas “estigmatas” externas compreendem, não
somente as chagas das mãos, dos pés e das costas, mas, também, todas aquelas impressas
na cabeça pela coroa de espinhos e pelas produzidas no resto do corpo pela flagelação.
O caso mais notável de estigmatização é o que se diz haver ocorrido no ano
de 1224 a São Francisco de Assis, no monte Albernia. Achando-se absorto na
contemplação da Paixão de Jesus Cristo, viu um deslumbrante Serafim de Fogo aproximar-
se-lhe, levando entre suas asas a figura do Crucificado. São Francisco se deu conta de que
nas mãos, pés e costas havia recebido externamente as marcas da crucificação. Tais marcas
continuaram subsistindo até sua morte, dois anos após, e se diz que foram vistas por muitas
testemunhas oculares, inclusive pelo Papa Alexandre IV.
Os dominicanos discutiram o fato e, afinal, reclamaram a mesma distinção
para Santa Catarina de Sena, cujas “estigmatas” diz-se que se faziam invisíveis aos demais,
por seu próprio pedido e vontade. Os franciscanos apelaram a Sixto IV, que proibiu que se
representasse Santa Catarina com as “estigmatas”. Ainda mais, o fato das “estigmatas” é
recordado no Breviário dos Ofícios e Bento XIII concedeu aos dominicanos uma festa em
comemoração do fato. Outros, especialmente mulheres, pois elas têm o corpo vital positivo,
diz-se que têm tido algumas, ou todas, “estigmatas”. A última que foi canonizada pela
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Igreja Católica por esta razão foi Verônica Juliana, no ano de 1831. Casos mais recentes
são os de Ana Catarina Emmerich, que foi uma monja de Agnetenberg; a estática Maria
Von Moerl de Caldero; Luisa Lateau, cujas “estigmatas” diz-se que sangravam todas
sextas feiras, e a Senhora Girling, da comunidade de Newport Shaker.
Porém, se tanto as “estigmatas” são visíveis ou invisíveis, o efeito é o
mesmo. As correntes espirituais no corpo vital da pessoa que as recebe são tão poderosas
que o corpo da mesma pode se dizer que é flagelado por elas, especialmente na região da
cabeça, onde produzem um efeito parecido ao da coroa de espinhos. Devido a isto,
finalmente, inunda a pessoa uma completa convicção de que o corpo físico é uma cruz que
está sobrelevando, isto é: uma prisão e não o homem real. Isto a leva ao passo seguinte em
sua Iniciação, isto é: à crucificação, que é experimentada pelo desenvolvimento dos outros
centros de suas mãos e pés, com o quê o corpo vital fica separado do corpo denso.
Temos dito, já na narração anterior tomada do Evangelho, que Pilatos
colocou um letreiro na Cruz de Jesus Cristo que dizia: “Jesus Nazarenus Rex Judaeorum”,
e isto está traduzido na versão autorizada deste modo: “Jesus de Nazaré, rei dos judeus”.
Contudo, as iniciais INRI, colocadas na cruz, significam os nomes dos quatro elementos
em língua hebréia: Iam, água; Nour, fogo; Ruach, espírito, ou ar vital, e Iabashab, terra.
Esta é a chave oculta do mistério da crucificação, pois simbolizam em primeiro lugar o sal,
enxofre, mercúrio e ázoe, que foram empregados pelos alquimistas da antiguidade para
construir a Pedra Filosofal: o dissolvente universal, o elixir da vida. Os dois “II” (de Iam e
Iabeshab), representam a água salina lunar: a, em um estado fluídico, que contém sal em
solução, e b , o extrato coagulado desta água: o sal da terra; em outras palavras: os sutis
veículos fluídicos do homem e seu corpo denso. O N (Nour), em hebreu representa o fogo e
os elementos combustíveis, entre os quais os principais são o enxofre e o fósforo, que são
tão necessários para a oxidação, sem a qual o sangue quente seria impossível. O Ego, se
não fosse por esta condição de calor do sangue, não poderia funcionar no corpo nem achar
um meio de se manifestar materialmente. O R (Ruach), em hebreu, é o equivalente do
espírito, isto é: o ázoe dos alquimistas, que funciona na mente mercurial. De modo que as
quatro letras iniciais do letreiro colocado por Pilatos na Cruz de Cristo, de acordo com o
Evangelho e que lemos INRI, representam o homem composto, o Pensador, no ponto de
sua evolução espiritual, quando está se libertando da cruz de seu veículo denso.
Ampliando algo da elucidação deste mesmo ponto, podemos dizer que INRI
é o símbolo do candidato crucificado, pelas seguintes razões complementares:
Iam, é a palavra hebraica que significa água, ou fluído, ou elemento lunar,
que forma a maior parte do corpo humano; podemos dizer, em torno de 87%. Esta
palavra é, também, o símbolo dos veículos fluídicos mais sutis do desejo e da
emoção.
Nour, a palavra hebraica que significa fogo; é uma representação alegórica
do calor produtor do sangue vermelho, carregado do produto marcial procedente de
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Marte: o ferro, que é fogo e energia, o qual o ocultismo vê circulando como um gás,
pelas veias e artérias do corpo humano, infundindo-lhe a energia e a ambição, sem o
qual não poderia haver progresso, nem material, nem espiritualmente. Assim
também, representa o enxofre e o fósforo, que são necessários para a manifestação
material do pensamento, como dissemos anteriormente.
Ruach, é um vocábulo hebraico para indicar o espírito, ou o ar vital, e é um
excelente símbolo do Ego, envolto na mente, influenciada por Mercúrio, que é o que
faz o ser humano homem e o que o capacita para governar e dirigir seus veículos
corpóreos e suas atividades de uma maneira racional.
Iabesahb, é a expressão hebraica para significar a terra e representa a parte
sólida da carne do homem e forma o corpo terrestre cruciforme, isto é: em forma de
uma cruz; cristalizado dentro de veículos mais sutis ao nascer e separado deles ao
morrer, no curso ordinário das coisas, ou no acontecimento extraordinário pelo qual
aprendemos a morrer misticamente e ascender às gloriosas esferas superiores em
momentos determinados.
Este estado de evolução espiritual do Cristão Místico, portanto, requer uma
reversão da força criadora, ou sexual, de seu curso ordinário para baixo, onde geralmente se
desperdiça e esgota na satisfação de paixões bestiais; em uma corrente dirigida para cima,
através do tríplice cordão espinal, cujos três segmentos são regidos pela Lua, Marte e
Mercúrio, respectivamente, e onde os raios de Netuno acendem o Fogo regenerador da
espinha dorsal. Esta elevação, ou ascensão, da força regeneradora põe em vibração o corpo
pituitário e a glândula pineal, abrindo deste modo a vista espiritual do sujeito e batendo, ou
percutindo, no seno, ou cavidade frontal, dá começo aos efeitos da coroa de espinhos,
palpitando de dor quando a ligação com o corpo físico é consumida pelo sagrado Fogo
Espiritual, que desperta este centro de sua milenar letargia, começando a pulsar e a vibrar
com vida que se esparrama para os outros centros da estrela estigmática de cinco pontas.
Estes, por sua vez, ficam vitalizados, também, e todo o veículo fica aceso e luminoso, com
uma aura dourada e gloriosa. Logo, num momento oportuno, com um arranque final, o
grande vórtice do corpo de desejos, localizado no fígado, fica em liberdade e a energia
marciana contida em tal veículo impulsiona para cima o veículo sideral (assim chamado
devido a que as “estigmatas” da cabeça, mãos e pés, estão situadas na mesma posição
relativa entre si como estão os pontos de uma estrela de cinco pontas), o qual ascende por
meio do crânio – Gólgota – e, então, o Cristão crucificado lança o grito triunfante de:
“Consummatum est”, e começa a singrar as sublimes esferas siderais para buscar a Jesus,
cuja vida tem imitado com completo êxito e de quem, desde então, é companheiro
inseparável.
Jesus é seu Mestre e seu Guia para o Reino de Cristo, onde todos ficaremos
unidos em um só corpo, para aprender a praticar a Religião do Pai, a Quem o reino
reverterá oportunamente para que Ele possa ser Todo em Todos.
Colubandê – São Gonçalo/RJ, às 21,03 horas do dia 23 de novembro de 2008.