315 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Taxonomia dos axiacuteōmata da loacutegica proposicional estoica
Aldo Dinucci1
Resumo
Realizaremos neste trabalho uma anaacutelise da teoria estoica dos axiacuteōmata Partindo de uma
apresentaccedilatildeo histoacuterica sobre a redescoberta da loacutegica proposicional estoica apresentaremos as
definiccedilotildees de loacutegica do Poacutertico e sua taxonomia dos axiacuteōmata Os axiacuteōmata satildeo os equivalentes
estoicos das proposiccedilotildees da loacutegica contemporacircnea e distinguem-se destas por terem valor de
verdade associado ao tempo bem como por no caso da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo exclusiva
terem um criteacuterio de verdade que vai aleacutem da verofuncionalidade que eacute aquele do conflito
Aleacutem disso os estoicos estavam cientes de algumas equivalecircncias loacutegicas
Palavras-chave Estoicismo Loacutegica proposicional Axiacuteōma
Abstract
We will make in this paper an analysis of the Stoic theory of axiacuteōmata Starting from a
historical presentation about the rediscovery of Stoic propositional logic we will present the
definitions of Stoic logic and its taxonomy of axiacuteōmata Axiacuteōmata are the equivalent of the
propositions of contemporary logic and differ from these by having its truth-value associated
with time and also as in the case of implication and exclusive disjunction have a criterion of
truth that goes beyond the verofunctional one the notion of conflict Furthermore Stoics were
aware of some logical equivalences
Keywords Stoicism Proposicional logic Axiacuteōma
Introduccedilatildeo
O Estoicismo foi o berccedilo de uma dos dois grandes sistemas de loacutegica da Antiguidade O
outro sistema foi o confeccionado por Aristoacuteteles e seguido e desenvolvido pelos
peripateacuteticos assim chamados relativamente ao Peripatos colunata que havia nas
proximidades do Liceu2 no qual se reuniam e pesquisavam Aristoacuteteles e seus alunos e
posteriormente os alunos dos alunos de Aristoacuteteles A loacutegica estoica foi desenvolvida
primeiramente por Crisipo de Solis3 que por sua vez foi aluno dos megaacutericos A
1 Doutor em filosofia pela PUC-RJ professor associado do DFLUFS Membro permanente do Mestrado
em FilosofiaUFS 2 O Liceu iniciou suas atividades em 335 aC soacute encerrando-as no seacuteculo III A escola tinha esse nome
(Lyceum) porque se encontrava nas proximidades do templo de Apolo Lykeios 3 Crisipo viveu aproximadamente entre 280 aC e 208 aC Cf Ciacutecero De Finibus 49 (= SVF 147) ldquoA
dialeacutetica foi desenvolvida por Crisipo mas por Zenatildeo muito menos que pelos filoacutesofos anterioresrdquo (de
quibus etsi a Chrysippo maxime est elaboratum tamen a Zenone minus multo quam ab antiquis)
316 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Escola Megaacuterica foi fundada por Euclides de Meacutegara4 que teve alunos como Eubuacutelides
de Mileto5 autor de sete ceacutelebres paradoxos loacutegicos
6 e Trasiacutemaco de Corinto professor
de Stilpo7 ceacutelebre professor do fundador do estoicismo Zenatildeo de Ciacutetio
8 Eubuacutelides
por seu turno teve como alunos Apolocircnio Crono Diodoro Crono9 autor do ceacutelebre
Argumento Mestre10
e que teria formulado argumentos contra o movimento (Cf Sexto
Empiacuterico Adversus Mathematicos 1085) e Philo o Dialeacutetico11
Diodoro e Philo
debateram questotildees relativas agrave modalidade loacutegica e agraves condicionais12
sobre o que
tinham visotildees distintas e contrastantes De forma sinteacutetica podemos atribuir aos
megaacutericos (i) a invenccedilatildeo de paradoxos (ii) o exame da questatildeo da modalidade loacutegica e
(iii) a criaccedilatildeo do debate sobre as condicionais (Kneale amp Kneale 1962 p 114) Desse
debate como veremos agrave frente participou Crisipo o segundo fundador do estoicismo
sem o qual afirma Dioacutegenes Laeacutercio (Vida dos Filoacutesofos Ilustres 7183) natildeo haveria
estoicismo Crisipo a quem como notamos acima atribui-se a criaccedilatildeo da loacutegica estoica
Dioacutegenes Laeacutercio nos diz que Crisipo adquiriu tamanho reconhecimento como loacutegico que a opiniatildeo geral
naqueles tempos era que se os deuses usassem loacutegica usariam a de Crisipo (Vida dos Filoacutesofos Ilustres
7180 = SVF 21) 4 Viveu aproximadamente entre 435 aC ndash 365 aC
5 Viveu no seacuteculo IV a C
6 Cf Dioacutegenes Laeacutercio Vida dos Filoacutesofos Ilustres 2108 Satildeo eles
-O Paradoxo do Mentiroso Algueacutem diz ldquoO que digo agora eacute uma mentirardquo Se a proposiccedilatildeo eacute verdadeira
ele estaacute mentindo Se eacute falsa ele natildeo estaacute mentindo Logo se diz a verdade estaacute mentindo se estaacute
mentindo diz a verdade
-O Paradoxo do Mascarado ldquoConheces este mascaradordquo ldquoNatildeordquo ldquoEle eacute o teu pai Logo natildeo conheces o
teu proacuteprio pairdquo
-O paradoxo de Electra Electra natildeo sabe que o homem que se aproxima eacute seu irmatildeo Orestes Mas
Electra conhece seu irmatildeo Conhece entatildeo Electra o homem que se aproxima
-O Paradoxo do ignorado Algueacutem ignora quem se aproxima dele e o trata como um estranho O homem eacute
seu pai Aquele entatildeo ignora quem seja seu proacuteprio pai e o trata como um estranho
-O paradoxo do Sorites Um uacutenico gratildeo natildeo eacute um monte Nem a adiccedilatildeo de um soacute gratildeo eacute o suficiente para
transformar um tanto de areia num monte Mas sabemos que adicionando-se gratildeos um a um em algum
momento teremos um monte
-O Paradoxo do Careca um homem com muitos cabelos na cabeccedila natildeo eacute careca Nem a supressatildeo de um
fio de cabelo o tornaraacute careca Mas se arrancarmos seus fios de cabelo um a um eventualmente ele ficaraacute
careca
-O paradoxo dos Chifres ldquoO que natildeo perdeste ainda tens Natildeo perdeste teus chifres Logo ainda os tensrdquo 7 Que viveu aproximadamente entre 360 aC e 280 aC
8 Que viveu aproximadamente entre 334 aC e 262 aC
9 Falecido aproximadamente em 284 aC Zenatildeo de Ciacutetio teria sido tambeacutem aluno de Diodoro Crono (Cf
Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1034 e) 10
O argumento chamado Mestre parece ter sido proposto a partir de princiacutepios como os tais haacute de fato
uma contradiccedilatildeo comum entre uma e outra nestas trecircs proposiccedilotildees cada par em contradiccedilatildeo com a
terceira As proposiccedilotildees satildeo (1) toda verdade passada deve ser necessaacuteria (2) uma impossibilidade natildeo
segue de uma possibilidade (3) algo que natildeo eacute verdade nem o seraacute eacute possiacutevel Diodoro observando essa
contradiccedilatildeo empregou a forccedila probativa dos dois primeiros para a demonstraccedilatildeo desta proposiccedilatildeo Que
nada que eacute nem seraacute verdade eacute possiacutevel (Cf Epicteto Diatribes 2191) 11
Floresceu por volta de 300 aC 12
Sobre o debate acerca das condicionais na Antiguidade falaremos brevemente adiante
317 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
teria escrito 705 livros 118 dos quais tratavam exclusivamente de loacutegica13
mas nenhum
deles nos chegou exceto em fragmentos Na verdade com exceccedilatildeo dos estoicos do
periacuteodo imperial romano todas as obras dos estoicos nos chegaram em fragmentos o
que gera a questatildeo das fontes que devem ser consultadas para o estudo da loacutegica estoica
sobre o que falaremos a seguir
1 Principais autores e fontes para o estudo da loacutegica estoica
Devido ao caraacuteter fragmentaacuterio das fontes antigas e ao fato destas fontes soacute terem sido
organizadas por volta do iniacutecio do seacuteculo XX por muito tempo natildeo se teve uma clara
noccedilatildeo sobre o que realmente eacute a loacutegica estoica Apenas em 1903 foi publicada uma obra
que agrupou e organizou o pensamento dos estoicos antigos o Stoicorum Veterum
Fragmenta14
trabalho monumental de Hans von Arnim que foi publicado entre 1903 e
1905 em trecircs volumes aos quais Maximilian Adler adicionou um quarto em 1924 com
os iacutendices15
A ausecircncia de evidecircncias reunidas e a incompreensatildeo sobre o que significam as
variaacuteveis da loacutegica estoica levaram comentadores importantes como Prantl e Zeller a
emitir juiacutezos bastante desfavoraacuteveis quanto a essa loacutegica Prantl chega a afirmar que
uma era como a heleniacutestica que designou Crisipo como o maior dos loacutegicos16
deveria
necessariamente ser decadente e corrompida (Prantl 1855 p 404) pois Crisipo natildeo
inventara absolutamente nada em loacutegica (Prantl 1855 p 408) asserccedilatildeo para qual como
observa Benson (1961 p 87) Prantl natildeo oferece qualquer evidecircncia Zeller (1880 p
123-4) aparentemente segue Prantl repetindo em linhas gerais as reflexotildees deste uacuteltimo
quanto agrave loacutegica estoica e natildeo oferecendo igualmente qualquer evidecircncia como suporte
ao seu juiacutezo
O passo inicial para a redescoberta da loacutegica estoica deu-se anos depois com Peirce
(1931-1934 volume 3 p279-280)17
que foi o primeiro a notar que a noccedilatildeo de
13
E sete destes tratavam do Argumento do Mentiroso Cf Dioacutegenes Laeacutercio Vida dos Filoacutesofos Ilustres
7180 14
Doravante SVF 15
Estas obras estatildeo disponiacuteveis para download em
httpptwikipediaorgwikiStoicorum_Veterum_Fragmenta 16
Clemente de Alexandria observa que entre os loacutegicos o mestre eacute Crisipo como entre os poetas
Homero (Stromata vii 16) Dioacutegenes Laeacutercio por sua vez afirma que ldquoSe os Deuses usassem a dialeacutetica
eles natildeo usariam nenhuma outra senatildeo a de Crisipordquo (Vida dos Filoacutesofos Ilustres 7180) 17
Em um texto de 1898 presente na obra citada referindo-se agrave controveacutersia das condicionais Peirce
declara-se philocircnico Diz-nos ele Cicero informs us that in his time there was a famous controversy
between two logicians Philo and Diodorus as to the signification of conditional propositions Philo held
318 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
implicaccedilatildeo do megaacuterico Philo coincidia com a contemporacircnea noccedilatildeo de implicaccedilatildeo
material e que o debate das condicionais que ocorrera no periacuteodo heleniacutestico
correspondia ao que transcorria em sua proacutepria eacutepoca
Entretanto soacute em 1927 a loacutegica estoica foi propriamente redescoberta e esse feito se
deve ao loacutegico polonecircs Lukasiewicz (1970) que percebeu que os estoicos anteciparam
natildeo somente questotildees relativas agrave implicaccedilatildeo mas muitos outros pontos concernentes agrave
loacutegica moderna Lukasiewicz (1970 p 199) foi o primeiro a compreender que
enquanto na loacutegica aristoteacutelica as variaacuteveis devem ser substituiacutedas por termos na
estoica elas devem ser substituiacutedas por proposiccedilotildees Em outras palavras Lukasiewicz
compreendeu que a loacutegica estoica eacute na verdade uma loacutegica proposicional similar em
muitos aspectos agrave contemporacircnea A partir daiacute sucederam-se os estudos sobre a loacutegica
estoica sendo que os principais que nortearatildeo nosso trabalho satildeo aqueles de Benson
Mates Suzanne Bobzien Kneale amp Kneale e Long amp Sedley18
Voltemo-nos agrave questatildeo relativa agraves fontes antigas Como dito acima natildeo nos chegaram
obras completas dos antigos estoicos e os manuais de loacutegica estoica que circulavam
entatildeo19
haacute muito se perderam com exceccedilatildeo de fragmentos muitos dos quais em obras
de opositores dos estoicos
Nossa principal fonte eacute indubitavelmente Sexto Empiacuterico20
do qual nos chegaram duas
obras Esboccedilos de Pirronismo21
em trecircs livros (doravante HP) e Contra os
Matemaacuteticos22
(doravante AM) Sexto eacute o uacutenico comentador antigo que demonstra real
compreensatildeo da loacutegica estoica chegando a nos informar sobre discussotildees e debates
sobre a loacutegica entre os proacuteprios estoicos Nossa segunda melhor fonte eacute Dioacutegenes
Laeacutercio em sua obra Vida dos Filoacutesofos Ilustres (doravante DL) Laeacutercio posterior a
Sexto jaacute que o menciona (DL 9116) cita verbatim trechos de um manual de loacutegica de
certo Diocles de Magneacutesia estudioso acerca do qual natildeo temos qualquer outra
that the proposition if it is lightening it will thunder was true if it is not lightening or if it will thunder
and was only false if it is lightening but will not thunder Diodorus objected to this Either the ancient
reporters or he himself failed to make out precisely what was in his mind and though there have been
many virtual Diodorans since none of them have been able to state their position clearly without making
it too foolish Most of the strong logicians have been Philonians and most of the weak ones have been
Diodorans For my part I am a Philonian but I do not think that justice has ever been done to the
Diodoran side of the question The Diodoran vaguely feels that there is something wrong about the
statement that the proposition If it is lightening it will thunder can be made true merely by its not
lighteningrdquo 18
Cf referecircncias bibliograacuteficas 19
As Introduccedilotildees agrave Loacutegica (Eisagōgḗ Dialektikḗ) 20
Meacutedico grego e ceacutetico que viveu aproximadamente entre 160 e 210 dC 21
HP trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 2 22
AM trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 8
319 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
informaccedilatildeo fora da obra de Laeacutercio23
Haacute tambeacutem referecircncias agrave loacutegica estoica na obra
de Galeno24
Seus comentaacuterios sobre a loacutegica estoica aparecem sobretudo em suas obras
Historia Philosopha e Institutio Logica Esta uacuteltima obra eacute atribuiacuteda a Galeno no
manuscrito atribuiccedilatildeo entretanto agraves vezes posta em duacutevida25
Temos ainda referecircncias
e informaccedilotildees sobre a loacutegica estoica em Ciacutecero26
Aulo Geacutelio27
Apuleio28
Alexandre de
Afrodiacutesias29
Temiacutestio30
Boeacutecio31
Amocircnio32
Simpliacutecio33
e Filopono34
2 Divisatildeo estoica da Loacutegica
Dioacutegenes Laeacutercio (741-4) nos informa que os estoicos natildeo tem uma concepccedilatildeo
unificada sobre a divisatildeo da loacutegica Alguns a dividem em duas ciecircncias retoacuterica e
dialeacutetica outros em um ramo concernente agraves definiccedilotildees e outro aos criteacuterios haacute
tambeacutem os que eliminam o ramo relativo agraves definiccedilotildees Laeacutercio nos apresenta a
definiccedilatildeo estoica de retoacuterica ciecircncia de bem falar em discursos contiacutenuos (DL
742535
) Quanto agrave dialeacutetica os estoicos a definem seja como ldquoo discorrer corretamente
acerca de discursos por meio de perguntas e repostasrdquo (DL 7425)36
seja como ldquoa
ciecircncia do verdadeiro do falso e de nenhum destesrdquo (DL 7425)37
A dialeacutetica por sua
vez divide-se assim
[] No toacutepico relativo aos significados e agraves vozes o toacutepico relativo
aos significados [se divide] no [toacutepico] acerca das representaccedilotildees e
dos diziacuteveis38
subjacentes a elas assertiacuteveis39
[diziacuteveis] completos
23
Cf DL 282 612 13 20 36 87 91 99 103 748 162 166 179 181 961 65 1012 24
Claacuteudio Galeno ou Eacutelio Galeno tambeacutem conhecido como Galeno de Peacutergamo viveu entre c 129 e c
217 foi famoso meacutedico e filoacutesofo romano de origem grega 25
A Institutio Logica apresenta uma curiosa siacutentese da loacutegica estoica e da peripateacutetica 26
Marco Tuacutelio Ciacutecero (3 de Janeiro de 106 aC mdash 7 de Dezembro de 43 aC) filoacutesofo orador escritor
advogado e poliacutetico romano 27
Aulo Geacutelio (125 - 180) autor da ceacutelebre obra Noites Aacuteticas 28
Luacutecio Apuleio (c 125 - c 170) escritor e filoacutesofo romano 29
Alexandre de Afrodiacutesias (fl c 198ndash209 dC) filoacutesofo peripateacutetico 30
Temiacutestio (c 317 - c 387) peripateacutetico tardio 31
Aniacutecio Macircnlio Torquato Severino Boeacutecio (c 480 mdash 524 ou 525) filoacutesofo estadista e teoacutelogo romano
famoso por sua traduccedilatildeo comentada da Isagogḗ de Porfiacuterio 32
Amocircnio Sacas (175 mdash 242) filoacutesofo grego neoplatocircnico alexandrino 33
Simpliacutecio (c 490 ndash c 560) filoacutesofo neoplatocircnico bizantino 34
Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) ou Joatildeo o Gramaacutetico filoacutesofo neoplatocircnico cristatildeo 35
τήν τε ῥητορικὴν ἐπιστήμην οὖσαν τοῦ εὖ λέγειν περὶ τῶν ἐν διεξόδῳ λόγων Quanto agrave concepccedilatildeo de
Crisipo acerca da retoacuterica cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1047 a-b (= SVF 2297-8) 36
καὶ τὴν διαλεκτικὴν τοῦ ὀρθῶς διαλέγεσθαι περὶ τῶν ἐν ἐρωτήσει καὶ ἀποκρίσει λόγων Todos os
textos citados aqui do grego e do latim foram diretamente traduzidos por noacutes a partir dos idiomas em que
foram originalmente escritos 37
ἐπιστήμην ἀληθῶν καὶ ψευδῶν καὶ οὐδετέρων 38
Lektaacute (cf definiccedilatildeo abaixo) 39
Axiacuteōmata (cf definiccedilatildeo abaixo)
320 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
predicados e de semelhantes ativos e passivos gecircneros e espeacutecies e
igualmente tambeacutem de argumentos modos silogismos e sofismas
que dependem da voz e dos estados de coisas (DL 7435- 7441)40
Como vemos os estoicos incluem muito mais coisas do que atualmente se concebe
como fazendo parte da loacutegica Caber-nos-aacute aqui como dissemos acima apresentar os
princiacutepios do que denominaremos loacutegica proposicional estoica loacutegica cujas inferecircncias
tratam das relaccedilotildees entre entidades que tecircm a estrutura de proposiccedilotildees (os axiacuteōmata41
os portadores primaacuterios de valor de verdade) e que se divide em duas partes a teoria
dos axiacuteōmata e a teoria dos argumentos
Os estoicos consideram tal loacutegica indispensaacutevel para que o saacutebio (o filoacutesofo ideal) seja
infaliacutevel na argumentaccedilatildeo (DL 747-8 (= SVF 2130) 783 (= SVF 2130))42
Diferentemente de Aristoacuteteles e dos peripateacuteticos e com exceccedilatildeo do estoico Ariston43
estimam ser a loacutegica uma ciecircncia uma parte integrante da filosofia e natildeo mero estudo
propedecircutico agraves ciecircncias44
A concepccedilatildeo tradicional estoica da filosofia eacute tripartida loacutegica fiacutesica e eacutetica distinccedilatildeo
que Dioacutegenes atribui a Zenatildeo de Ciacutetio Crisipo de Solis Dioacutegenes da Babilocircnia45
e
Posidocircnio de Rhodes (DL 739-41)46
Os estoicos comparam a filosofia a um animal no
qual os ossos e tendotildees satildeo a loacutegica a eacutetica a carne e a fiacutesica a alma47
Alguns
estoicos dizem que nenhuma parte tem precedecircncia em relaccedilatildeo agrave outra Outros poreacutem
datildeo prioridade ao estudo da loacutegica seguido pelo estudo da fiacutesica e da eacutetica Segundo
40
Τὴν δὲ διαλεκτικὴν διαιρεῖσθαι εἴς τε τὸν περὶ τῶν σημαινομένων καὶ τῆς φωνῆς τόπον καὶ τὸν μὲν
τῶν σημαινομένων εἴς τε τὸν περὶ τῶν φαντασιῶν τόπον καὶ τῶν ἐκ τούτων ὑφισταμένων λεκτῶν
ἀξιωμάτων καὶ αὐτοτεe λῶν καὶ κατηγορημάτων καὶ τῶν ὁμοίων ὀρθῶν καὶ ὑπτίων καὶ γενῶν καὶ εἰδῶν
ὁμοίως δὲ καὶ λόγων καὶ τρόπων καὶ συλλογισμῶν καὶ τῶν παρὰ τὴν φωνὴν καὶ τὰ πράγματα
σοφισμάτων 41
Cf abaixo 42
Cf Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os Toacutepicos de Aristoacuteteles I 8-14 (= SVF 2124) Epicteto
Diatribes 4812 172-5 10 1177-8 22344-6 43
Ariston de Quios (fl c 260 aC) considerava que ao filoacutesofo cabia apenas estudar eacutetica (cf DL 7160-
1 = SVF 1351) 44
Amocircnio (Sobre os Primeiros Analiacuteticos de Aristoacuteteles 820-2 e 91-2 (= SVF 249)) observa que os
estoicos natildeo consideram a loacutegica como mero instrumento nem como mera sub-parte da filosofia mas
como uma parte primaacuteria desta 45
c 230 aCndashc 150140 aC 46
Crisipo e Eudromus (estoico de florescimento incerto) chamam tais partes de ldquoespeacuteciesrdquo Apolodoro de
Atenas de ldquotoacutepicosrdquo os outros de ldquogecircnerosrdquo Cleanto entretanto divide a filosofia em seis partes
dialeacutetica retoacuterica eacutetica poliacutetica fiacutesica teologia Outros ainda como Zenatildeo de Tarso (fl 200 aC) dizem
que a filosofia natildeo tem partes 47
Sexto observa que Posidocircnio apresenta concepccedilatildeo divergente comparando a fiacutesica agrave carne e a eacutetica agrave
alma (Cf AM 719 Posidocircnio frag 88) Os estoicos comparam tambeacutem as partes da filosofia a um ovo
do qual a casca seria a loacutegica a clara a eacutetica a gema a fiacutesica E ainda a um campo feacutertil do qual a
cerca seria a loacutegica a terra ou as aacutervores a fiacutesica e os frutos a eacutetica (DL 739-41) Long amp Sedley (1987
(1) p 25) observam que os estoicos inauguram a ideia de filosofia como sistema embora Xenoacutecrates
possa tecirc-los precedido com a divisatildeo tripartite (loacutegica eacutetica e fiacutesica)
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
316 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Escola Megaacuterica foi fundada por Euclides de Meacutegara4 que teve alunos como Eubuacutelides
de Mileto5 autor de sete ceacutelebres paradoxos loacutegicos
6 e Trasiacutemaco de Corinto professor
de Stilpo7 ceacutelebre professor do fundador do estoicismo Zenatildeo de Ciacutetio
8 Eubuacutelides
por seu turno teve como alunos Apolocircnio Crono Diodoro Crono9 autor do ceacutelebre
Argumento Mestre10
e que teria formulado argumentos contra o movimento (Cf Sexto
Empiacuterico Adversus Mathematicos 1085) e Philo o Dialeacutetico11
Diodoro e Philo
debateram questotildees relativas agrave modalidade loacutegica e agraves condicionais12
sobre o que
tinham visotildees distintas e contrastantes De forma sinteacutetica podemos atribuir aos
megaacutericos (i) a invenccedilatildeo de paradoxos (ii) o exame da questatildeo da modalidade loacutegica e
(iii) a criaccedilatildeo do debate sobre as condicionais (Kneale amp Kneale 1962 p 114) Desse
debate como veremos agrave frente participou Crisipo o segundo fundador do estoicismo
sem o qual afirma Dioacutegenes Laeacutercio (Vida dos Filoacutesofos Ilustres 7183) natildeo haveria
estoicismo Crisipo a quem como notamos acima atribui-se a criaccedilatildeo da loacutegica estoica
Dioacutegenes Laeacutercio nos diz que Crisipo adquiriu tamanho reconhecimento como loacutegico que a opiniatildeo geral
naqueles tempos era que se os deuses usassem loacutegica usariam a de Crisipo (Vida dos Filoacutesofos Ilustres
7180 = SVF 21) 4 Viveu aproximadamente entre 435 aC ndash 365 aC
5 Viveu no seacuteculo IV a C
6 Cf Dioacutegenes Laeacutercio Vida dos Filoacutesofos Ilustres 2108 Satildeo eles
-O Paradoxo do Mentiroso Algueacutem diz ldquoO que digo agora eacute uma mentirardquo Se a proposiccedilatildeo eacute verdadeira
ele estaacute mentindo Se eacute falsa ele natildeo estaacute mentindo Logo se diz a verdade estaacute mentindo se estaacute
mentindo diz a verdade
-O Paradoxo do Mascarado ldquoConheces este mascaradordquo ldquoNatildeordquo ldquoEle eacute o teu pai Logo natildeo conheces o
teu proacuteprio pairdquo
-O paradoxo de Electra Electra natildeo sabe que o homem que se aproxima eacute seu irmatildeo Orestes Mas
Electra conhece seu irmatildeo Conhece entatildeo Electra o homem que se aproxima
-O Paradoxo do ignorado Algueacutem ignora quem se aproxima dele e o trata como um estranho O homem eacute
seu pai Aquele entatildeo ignora quem seja seu proacuteprio pai e o trata como um estranho
-O paradoxo do Sorites Um uacutenico gratildeo natildeo eacute um monte Nem a adiccedilatildeo de um soacute gratildeo eacute o suficiente para
transformar um tanto de areia num monte Mas sabemos que adicionando-se gratildeos um a um em algum
momento teremos um monte
-O Paradoxo do Careca um homem com muitos cabelos na cabeccedila natildeo eacute careca Nem a supressatildeo de um
fio de cabelo o tornaraacute careca Mas se arrancarmos seus fios de cabelo um a um eventualmente ele ficaraacute
careca
-O paradoxo dos Chifres ldquoO que natildeo perdeste ainda tens Natildeo perdeste teus chifres Logo ainda os tensrdquo 7 Que viveu aproximadamente entre 360 aC e 280 aC
8 Que viveu aproximadamente entre 334 aC e 262 aC
9 Falecido aproximadamente em 284 aC Zenatildeo de Ciacutetio teria sido tambeacutem aluno de Diodoro Crono (Cf
Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1034 e) 10
O argumento chamado Mestre parece ter sido proposto a partir de princiacutepios como os tais haacute de fato
uma contradiccedilatildeo comum entre uma e outra nestas trecircs proposiccedilotildees cada par em contradiccedilatildeo com a
terceira As proposiccedilotildees satildeo (1) toda verdade passada deve ser necessaacuteria (2) uma impossibilidade natildeo
segue de uma possibilidade (3) algo que natildeo eacute verdade nem o seraacute eacute possiacutevel Diodoro observando essa
contradiccedilatildeo empregou a forccedila probativa dos dois primeiros para a demonstraccedilatildeo desta proposiccedilatildeo Que
nada que eacute nem seraacute verdade eacute possiacutevel (Cf Epicteto Diatribes 2191) 11
Floresceu por volta de 300 aC 12
Sobre o debate acerca das condicionais na Antiguidade falaremos brevemente adiante
317 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
teria escrito 705 livros 118 dos quais tratavam exclusivamente de loacutegica13
mas nenhum
deles nos chegou exceto em fragmentos Na verdade com exceccedilatildeo dos estoicos do
periacuteodo imperial romano todas as obras dos estoicos nos chegaram em fragmentos o
que gera a questatildeo das fontes que devem ser consultadas para o estudo da loacutegica estoica
sobre o que falaremos a seguir
1 Principais autores e fontes para o estudo da loacutegica estoica
Devido ao caraacuteter fragmentaacuterio das fontes antigas e ao fato destas fontes soacute terem sido
organizadas por volta do iniacutecio do seacuteculo XX por muito tempo natildeo se teve uma clara
noccedilatildeo sobre o que realmente eacute a loacutegica estoica Apenas em 1903 foi publicada uma obra
que agrupou e organizou o pensamento dos estoicos antigos o Stoicorum Veterum
Fragmenta14
trabalho monumental de Hans von Arnim que foi publicado entre 1903 e
1905 em trecircs volumes aos quais Maximilian Adler adicionou um quarto em 1924 com
os iacutendices15
A ausecircncia de evidecircncias reunidas e a incompreensatildeo sobre o que significam as
variaacuteveis da loacutegica estoica levaram comentadores importantes como Prantl e Zeller a
emitir juiacutezos bastante desfavoraacuteveis quanto a essa loacutegica Prantl chega a afirmar que
uma era como a heleniacutestica que designou Crisipo como o maior dos loacutegicos16
deveria
necessariamente ser decadente e corrompida (Prantl 1855 p 404) pois Crisipo natildeo
inventara absolutamente nada em loacutegica (Prantl 1855 p 408) asserccedilatildeo para qual como
observa Benson (1961 p 87) Prantl natildeo oferece qualquer evidecircncia Zeller (1880 p
123-4) aparentemente segue Prantl repetindo em linhas gerais as reflexotildees deste uacuteltimo
quanto agrave loacutegica estoica e natildeo oferecendo igualmente qualquer evidecircncia como suporte
ao seu juiacutezo
O passo inicial para a redescoberta da loacutegica estoica deu-se anos depois com Peirce
(1931-1934 volume 3 p279-280)17
que foi o primeiro a notar que a noccedilatildeo de
13
E sete destes tratavam do Argumento do Mentiroso Cf Dioacutegenes Laeacutercio Vida dos Filoacutesofos Ilustres
7180 14
Doravante SVF 15
Estas obras estatildeo disponiacuteveis para download em
httpptwikipediaorgwikiStoicorum_Veterum_Fragmenta 16
Clemente de Alexandria observa que entre os loacutegicos o mestre eacute Crisipo como entre os poetas
Homero (Stromata vii 16) Dioacutegenes Laeacutercio por sua vez afirma que ldquoSe os Deuses usassem a dialeacutetica
eles natildeo usariam nenhuma outra senatildeo a de Crisipordquo (Vida dos Filoacutesofos Ilustres 7180) 17
Em um texto de 1898 presente na obra citada referindo-se agrave controveacutersia das condicionais Peirce
declara-se philocircnico Diz-nos ele Cicero informs us that in his time there was a famous controversy
between two logicians Philo and Diodorus as to the signification of conditional propositions Philo held
318 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
implicaccedilatildeo do megaacuterico Philo coincidia com a contemporacircnea noccedilatildeo de implicaccedilatildeo
material e que o debate das condicionais que ocorrera no periacuteodo heleniacutestico
correspondia ao que transcorria em sua proacutepria eacutepoca
Entretanto soacute em 1927 a loacutegica estoica foi propriamente redescoberta e esse feito se
deve ao loacutegico polonecircs Lukasiewicz (1970) que percebeu que os estoicos anteciparam
natildeo somente questotildees relativas agrave implicaccedilatildeo mas muitos outros pontos concernentes agrave
loacutegica moderna Lukasiewicz (1970 p 199) foi o primeiro a compreender que
enquanto na loacutegica aristoteacutelica as variaacuteveis devem ser substituiacutedas por termos na
estoica elas devem ser substituiacutedas por proposiccedilotildees Em outras palavras Lukasiewicz
compreendeu que a loacutegica estoica eacute na verdade uma loacutegica proposicional similar em
muitos aspectos agrave contemporacircnea A partir daiacute sucederam-se os estudos sobre a loacutegica
estoica sendo que os principais que nortearatildeo nosso trabalho satildeo aqueles de Benson
Mates Suzanne Bobzien Kneale amp Kneale e Long amp Sedley18
Voltemo-nos agrave questatildeo relativa agraves fontes antigas Como dito acima natildeo nos chegaram
obras completas dos antigos estoicos e os manuais de loacutegica estoica que circulavam
entatildeo19
haacute muito se perderam com exceccedilatildeo de fragmentos muitos dos quais em obras
de opositores dos estoicos
Nossa principal fonte eacute indubitavelmente Sexto Empiacuterico20
do qual nos chegaram duas
obras Esboccedilos de Pirronismo21
em trecircs livros (doravante HP) e Contra os
Matemaacuteticos22
(doravante AM) Sexto eacute o uacutenico comentador antigo que demonstra real
compreensatildeo da loacutegica estoica chegando a nos informar sobre discussotildees e debates
sobre a loacutegica entre os proacuteprios estoicos Nossa segunda melhor fonte eacute Dioacutegenes
Laeacutercio em sua obra Vida dos Filoacutesofos Ilustres (doravante DL) Laeacutercio posterior a
Sexto jaacute que o menciona (DL 9116) cita verbatim trechos de um manual de loacutegica de
certo Diocles de Magneacutesia estudioso acerca do qual natildeo temos qualquer outra
that the proposition if it is lightening it will thunder was true if it is not lightening or if it will thunder
and was only false if it is lightening but will not thunder Diodorus objected to this Either the ancient
reporters or he himself failed to make out precisely what was in his mind and though there have been
many virtual Diodorans since none of them have been able to state their position clearly without making
it too foolish Most of the strong logicians have been Philonians and most of the weak ones have been
Diodorans For my part I am a Philonian but I do not think that justice has ever been done to the
Diodoran side of the question The Diodoran vaguely feels that there is something wrong about the
statement that the proposition If it is lightening it will thunder can be made true merely by its not
lighteningrdquo 18
Cf referecircncias bibliograacuteficas 19
As Introduccedilotildees agrave Loacutegica (Eisagōgḗ Dialektikḗ) 20
Meacutedico grego e ceacutetico que viveu aproximadamente entre 160 e 210 dC 21
HP trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 2 22
AM trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 8
319 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
informaccedilatildeo fora da obra de Laeacutercio23
Haacute tambeacutem referecircncias agrave loacutegica estoica na obra
de Galeno24
Seus comentaacuterios sobre a loacutegica estoica aparecem sobretudo em suas obras
Historia Philosopha e Institutio Logica Esta uacuteltima obra eacute atribuiacuteda a Galeno no
manuscrito atribuiccedilatildeo entretanto agraves vezes posta em duacutevida25
Temos ainda referecircncias
e informaccedilotildees sobre a loacutegica estoica em Ciacutecero26
Aulo Geacutelio27
Apuleio28
Alexandre de
Afrodiacutesias29
Temiacutestio30
Boeacutecio31
Amocircnio32
Simpliacutecio33
e Filopono34
2 Divisatildeo estoica da Loacutegica
Dioacutegenes Laeacutercio (741-4) nos informa que os estoicos natildeo tem uma concepccedilatildeo
unificada sobre a divisatildeo da loacutegica Alguns a dividem em duas ciecircncias retoacuterica e
dialeacutetica outros em um ramo concernente agraves definiccedilotildees e outro aos criteacuterios haacute
tambeacutem os que eliminam o ramo relativo agraves definiccedilotildees Laeacutercio nos apresenta a
definiccedilatildeo estoica de retoacuterica ciecircncia de bem falar em discursos contiacutenuos (DL
742535
) Quanto agrave dialeacutetica os estoicos a definem seja como ldquoo discorrer corretamente
acerca de discursos por meio de perguntas e repostasrdquo (DL 7425)36
seja como ldquoa
ciecircncia do verdadeiro do falso e de nenhum destesrdquo (DL 7425)37
A dialeacutetica por sua
vez divide-se assim
[] No toacutepico relativo aos significados e agraves vozes o toacutepico relativo
aos significados [se divide] no [toacutepico] acerca das representaccedilotildees e
dos diziacuteveis38
subjacentes a elas assertiacuteveis39
[diziacuteveis] completos
23
Cf DL 282 612 13 20 36 87 91 99 103 748 162 166 179 181 961 65 1012 24
Claacuteudio Galeno ou Eacutelio Galeno tambeacutem conhecido como Galeno de Peacutergamo viveu entre c 129 e c
217 foi famoso meacutedico e filoacutesofo romano de origem grega 25
A Institutio Logica apresenta uma curiosa siacutentese da loacutegica estoica e da peripateacutetica 26
Marco Tuacutelio Ciacutecero (3 de Janeiro de 106 aC mdash 7 de Dezembro de 43 aC) filoacutesofo orador escritor
advogado e poliacutetico romano 27
Aulo Geacutelio (125 - 180) autor da ceacutelebre obra Noites Aacuteticas 28
Luacutecio Apuleio (c 125 - c 170) escritor e filoacutesofo romano 29
Alexandre de Afrodiacutesias (fl c 198ndash209 dC) filoacutesofo peripateacutetico 30
Temiacutestio (c 317 - c 387) peripateacutetico tardio 31
Aniacutecio Macircnlio Torquato Severino Boeacutecio (c 480 mdash 524 ou 525) filoacutesofo estadista e teoacutelogo romano
famoso por sua traduccedilatildeo comentada da Isagogḗ de Porfiacuterio 32
Amocircnio Sacas (175 mdash 242) filoacutesofo grego neoplatocircnico alexandrino 33
Simpliacutecio (c 490 ndash c 560) filoacutesofo neoplatocircnico bizantino 34
Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) ou Joatildeo o Gramaacutetico filoacutesofo neoplatocircnico cristatildeo 35
τήν τε ῥητορικὴν ἐπιστήμην οὖσαν τοῦ εὖ λέγειν περὶ τῶν ἐν διεξόδῳ λόγων Quanto agrave concepccedilatildeo de
Crisipo acerca da retoacuterica cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1047 a-b (= SVF 2297-8) 36
καὶ τὴν διαλεκτικὴν τοῦ ὀρθῶς διαλέγεσθαι περὶ τῶν ἐν ἐρωτήσει καὶ ἀποκρίσει λόγων Todos os
textos citados aqui do grego e do latim foram diretamente traduzidos por noacutes a partir dos idiomas em que
foram originalmente escritos 37
ἐπιστήμην ἀληθῶν καὶ ψευδῶν καὶ οὐδετέρων 38
Lektaacute (cf definiccedilatildeo abaixo) 39
Axiacuteōmata (cf definiccedilatildeo abaixo)
320 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
predicados e de semelhantes ativos e passivos gecircneros e espeacutecies e
igualmente tambeacutem de argumentos modos silogismos e sofismas
que dependem da voz e dos estados de coisas (DL 7435- 7441)40
Como vemos os estoicos incluem muito mais coisas do que atualmente se concebe
como fazendo parte da loacutegica Caber-nos-aacute aqui como dissemos acima apresentar os
princiacutepios do que denominaremos loacutegica proposicional estoica loacutegica cujas inferecircncias
tratam das relaccedilotildees entre entidades que tecircm a estrutura de proposiccedilotildees (os axiacuteōmata41
os portadores primaacuterios de valor de verdade) e que se divide em duas partes a teoria
dos axiacuteōmata e a teoria dos argumentos
Os estoicos consideram tal loacutegica indispensaacutevel para que o saacutebio (o filoacutesofo ideal) seja
infaliacutevel na argumentaccedilatildeo (DL 747-8 (= SVF 2130) 783 (= SVF 2130))42
Diferentemente de Aristoacuteteles e dos peripateacuteticos e com exceccedilatildeo do estoico Ariston43
estimam ser a loacutegica uma ciecircncia uma parte integrante da filosofia e natildeo mero estudo
propedecircutico agraves ciecircncias44
A concepccedilatildeo tradicional estoica da filosofia eacute tripartida loacutegica fiacutesica e eacutetica distinccedilatildeo
que Dioacutegenes atribui a Zenatildeo de Ciacutetio Crisipo de Solis Dioacutegenes da Babilocircnia45
e
Posidocircnio de Rhodes (DL 739-41)46
Os estoicos comparam a filosofia a um animal no
qual os ossos e tendotildees satildeo a loacutegica a eacutetica a carne e a fiacutesica a alma47
Alguns
estoicos dizem que nenhuma parte tem precedecircncia em relaccedilatildeo agrave outra Outros poreacutem
datildeo prioridade ao estudo da loacutegica seguido pelo estudo da fiacutesica e da eacutetica Segundo
40
Τὴν δὲ διαλεκτικὴν διαιρεῖσθαι εἴς τε τὸν περὶ τῶν σημαινομένων καὶ τῆς φωνῆς τόπον καὶ τὸν μὲν
τῶν σημαινομένων εἴς τε τὸν περὶ τῶν φαντασιῶν τόπον καὶ τῶν ἐκ τούτων ὑφισταμένων λεκτῶν
ἀξιωμάτων καὶ αὐτοτεe λῶν καὶ κατηγορημάτων καὶ τῶν ὁμοίων ὀρθῶν καὶ ὑπτίων καὶ γενῶν καὶ εἰδῶν
ὁμοίως δὲ καὶ λόγων καὶ τρόπων καὶ συλλογισμῶν καὶ τῶν παρὰ τὴν φωνὴν καὶ τὰ πράγματα
σοφισμάτων 41
Cf abaixo 42
Cf Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os Toacutepicos de Aristoacuteteles I 8-14 (= SVF 2124) Epicteto
Diatribes 4812 172-5 10 1177-8 22344-6 43
Ariston de Quios (fl c 260 aC) considerava que ao filoacutesofo cabia apenas estudar eacutetica (cf DL 7160-
1 = SVF 1351) 44
Amocircnio (Sobre os Primeiros Analiacuteticos de Aristoacuteteles 820-2 e 91-2 (= SVF 249)) observa que os
estoicos natildeo consideram a loacutegica como mero instrumento nem como mera sub-parte da filosofia mas
como uma parte primaacuteria desta 45
c 230 aCndashc 150140 aC 46
Crisipo e Eudromus (estoico de florescimento incerto) chamam tais partes de ldquoespeacuteciesrdquo Apolodoro de
Atenas de ldquotoacutepicosrdquo os outros de ldquogecircnerosrdquo Cleanto entretanto divide a filosofia em seis partes
dialeacutetica retoacuterica eacutetica poliacutetica fiacutesica teologia Outros ainda como Zenatildeo de Tarso (fl 200 aC) dizem
que a filosofia natildeo tem partes 47
Sexto observa que Posidocircnio apresenta concepccedilatildeo divergente comparando a fiacutesica agrave carne e a eacutetica agrave
alma (Cf AM 719 Posidocircnio frag 88) Os estoicos comparam tambeacutem as partes da filosofia a um ovo
do qual a casca seria a loacutegica a clara a eacutetica a gema a fiacutesica E ainda a um campo feacutertil do qual a
cerca seria a loacutegica a terra ou as aacutervores a fiacutesica e os frutos a eacutetica (DL 739-41) Long amp Sedley (1987
(1) p 25) observam que os estoicos inauguram a ideia de filosofia como sistema embora Xenoacutecrates
possa tecirc-los precedido com a divisatildeo tripartite (loacutegica eacutetica e fiacutesica)
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
317 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
teria escrito 705 livros 118 dos quais tratavam exclusivamente de loacutegica13
mas nenhum
deles nos chegou exceto em fragmentos Na verdade com exceccedilatildeo dos estoicos do
periacuteodo imperial romano todas as obras dos estoicos nos chegaram em fragmentos o
que gera a questatildeo das fontes que devem ser consultadas para o estudo da loacutegica estoica
sobre o que falaremos a seguir
1 Principais autores e fontes para o estudo da loacutegica estoica
Devido ao caraacuteter fragmentaacuterio das fontes antigas e ao fato destas fontes soacute terem sido
organizadas por volta do iniacutecio do seacuteculo XX por muito tempo natildeo se teve uma clara
noccedilatildeo sobre o que realmente eacute a loacutegica estoica Apenas em 1903 foi publicada uma obra
que agrupou e organizou o pensamento dos estoicos antigos o Stoicorum Veterum
Fragmenta14
trabalho monumental de Hans von Arnim que foi publicado entre 1903 e
1905 em trecircs volumes aos quais Maximilian Adler adicionou um quarto em 1924 com
os iacutendices15
A ausecircncia de evidecircncias reunidas e a incompreensatildeo sobre o que significam as
variaacuteveis da loacutegica estoica levaram comentadores importantes como Prantl e Zeller a
emitir juiacutezos bastante desfavoraacuteveis quanto a essa loacutegica Prantl chega a afirmar que
uma era como a heleniacutestica que designou Crisipo como o maior dos loacutegicos16
deveria
necessariamente ser decadente e corrompida (Prantl 1855 p 404) pois Crisipo natildeo
inventara absolutamente nada em loacutegica (Prantl 1855 p 408) asserccedilatildeo para qual como
observa Benson (1961 p 87) Prantl natildeo oferece qualquer evidecircncia Zeller (1880 p
123-4) aparentemente segue Prantl repetindo em linhas gerais as reflexotildees deste uacuteltimo
quanto agrave loacutegica estoica e natildeo oferecendo igualmente qualquer evidecircncia como suporte
ao seu juiacutezo
O passo inicial para a redescoberta da loacutegica estoica deu-se anos depois com Peirce
(1931-1934 volume 3 p279-280)17
que foi o primeiro a notar que a noccedilatildeo de
13
E sete destes tratavam do Argumento do Mentiroso Cf Dioacutegenes Laeacutercio Vida dos Filoacutesofos Ilustres
7180 14
Doravante SVF 15
Estas obras estatildeo disponiacuteveis para download em
httpptwikipediaorgwikiStoicorum_Veterum_Fragmenta 16
Clemente de Alexandria observa que entre os loacutegicos o mestre eacute Crisipo como entre os poetas
Homero (Stromata vii 16) Dioacutegenes Laeacutercio por sua vez afirma que ldquoSe os Deuses usassem a dialeacutetica
eles natildeo usariam nenhuma outra senatildeo a de Crisipordquo (Vida dos Filoacutesofos Ilustres 7180) 17
Em um texto de 1898 presente na obra citada referindo-se agrave controveacutersia das condicionais Peirce
declara-se philocircnico Diz-nos ele Cicero informs us that in his time there was a famous controversy
between two logicians Philo and Diodorus as to the signification of conditional propositions Philo held
318 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
implicaccedilatildeo do megaacuterico Philo coincidia com a contemporacircnea noccedilatildeo de implicaccedilatildeo
material e que o debate das condicionais que ocorrera no periacuteodo heleniacutestico
correspondia ao que transcorria em sua proacutepria eacutepoca
Entretanto soacute em 1927 a loacutegica estoica foi propriamente redescoberta e esse feito se
deve ao loacutegico polonecircs Lukasiewicz (1970) que percebeu que os estoicos anteciparam
natildeo somente questotildees relativas agrave implicaccedilatildeo mas muitos outros pontos concernentes agrave
loacutegica moderna Lukasiewicz (1970 p 199) foi o primeiro a compreender que
enquanto na loacutegica aristoteacutelica as variaacuteveis devem ser substituiacutedas por termos na
estoica elas devem ser substituiacutedas por proposiccedilotildees Em outras palavras Lukasiewicz
compreendeu que a loacutegica estoica eacute na verdade uma loacutegica proposicional similar em
muitos aspectos agrave contemporacircnea A partir daiacute sucederam-se os estudos sobre a loacutegica
estoica sendo que os principais que nortearatildeo nosso trabalho satildeo aqueles de Benson
Mates Suzanne Bobzien Kneale amp Kneale e Long amp Sedley18
Voltemo-nos agrave questatildeo relativa agraves fontes antigas Como dito acima natildeo nos chegaram
obras completas dos antigos estoicos e os manuais de loacutegica estoica que circulavam
entatildeo19
haacute muito se perderam com exceccedilatildeo de fragmentos muitos dos quais em obras
de opositores dos estoicos
Nossa principal fonte eacute indubitavelmente Sexto Empiacuterico20
do qual nos chegaram duas
obras Esboccedilos de Pirronismo21
em trecircs livros (doravante HP) e Contra os
Matemaacuteticos22
(doravante AM) Sexto eacute o uacutenico comentador antigo que demonstra real
compreensatildeo da loacutegica estoica chegando a nos informar sobre discussotildees e debates
sobre a loacutegica entre os proacuteprios estoicos Nossa segunda melhor fonte eacute Dioacutegenes
Laeacutercio em sua obra Vida dos Filoacutesofos Ilustres (doravante DL) Laeacutercio posterior a
Sexto jaacute que o menciona (DL 9116) cita verbatim trechos de um manual de loacutegica de
certo Diocles de Magneacutesia estudioso acerca do qual natildeo temos qualquer outra
that the proposition if it is lightening it will thunder was true if it is not lightening or if it will thunder
and was only false if it is lightening but will not thunder Diodorus objected to this Either the ancient
reporters or he himself failed to make out precisely what was in his mind and though there have been
many virtual Diodorans since none of them have been able to state their position clearly without making
it too foolish Most of the strong logicians have been Philonians and most of the weak ones have been
Diodorans For my part I am a Philonian but I do not think that justice has ever been done to the
Diodoran side of the question The Diodoran vaguely feels that there is something wrong about the
statement that the proposition If it is lightening it will thunder can be made true merely by its not
lighteningrdquo 18
Cf referecircncias bibliograacuteficas 19
As Introduccedilotildees agrave Loacutegica (Eisagōgḗ Dialektikḗ) 20
Meacutedico grego e ceacutetico que viveu aproximadamente entre 160 e 210 dC 21
HP trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 2 22
AM trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 8
319 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
informaccedilatildeo fora da obra de Laeacutercio23
Haacute tambeacutem referecircncias agrave loacutegica estoica na obra
de Galeno24
Seus comentaacuterios sobre a loacutegica estoica aparecem sobretudo em suas obras
Historia Philosopha e Institutio Logica Esta uacuteltima obra eacute atribuiacuteda a Galeno no
manuscrito atribuiccedilatildeo entretanto agraves vezes posta em duacutevida25
Temos ainda referecircncias
e informaccedilotildees sobre a loacutegica estoica em Ciacutecero26
Aulo Geacutelio27
Apuleio28
Alexandre de
Afrodiacutesias29
Temiacutestio30
Boeacutecio31
Amocircnio32
Simpliacutecio33
e Filopono34
2 Divisatildeo estoica da Loacutegica
Dioacutegenes Laeacutercio (741-4) nos informa que os estoicos natildeo tem uma concepccedilatildeo
unificada sobre a divisatildeo da loacutegica Alguns a dividem em duas ciecircncias retoacuterica e
dialeacutetica outros em um ramo concernente agraves definiccedilotildees e outro aos criteacuterios haacute
tambeacutem os que eliminam o ramo relativo agraves definiccedilotildees Laeacutercio nos apresenta a
definiccedilatildeo estoica de retoacuterica ciecircncia de bem falar em discursos contiacutenuos (DL
742535
) Quanto agrave dialeacutetica os estoicos a definem seja como ldquoo discorrer corretamente
acerca de discursos por meio de perguntas e repostasrdquo (DL 7425)36
seja como ldquoa
ciecircncia do verdadeiro do falso e de nenhum destesrdquo (DL 7425)37
A dialeacutetica por sua
vez divide-se assim
[] No toacutepico relativo aos significados e agraves vozes o toacutepico relativo
aos significados [se divide] no [toacutepico] acerca das representaccedilotildees e
dos diziacuteveis38
subjacentes a elas assertiacuteveis39
[diziacuteveis] completos
23
Cf DL 282 612 13 20 36 87 91 99 103 748 162 166 179 181 961 65 1012 24
Claacuteudio Galeno ou Eacutelio Galeno tambeacutem conhecido como Galeno de Peacutergamo viveu entre c 129 e c
217 foi famoso meacutedico e filoacutesofo romano de origem grega 25
A Institutio Logica apresenta uma curiosa siacutentese da loacutegica estoica e da peripateacutetica 26
Marco Tuacutelio Ciacutecero (3 de Janeiro de 106 aC mdash 7 de Dezembro de 43 aC) filoacutesofo orador escritor
advogado e poliacutetico romano 27
Aulo Geacutelio (125 - 180) autor da ceacutelebre obra Noites Aacuteticas 28
Luacutecio Apuleio (c 125 - c 170) escritor e filoacutesofo romano 29
Alexandre de Afrodiacutesias (fl c 198ndash209 dC) filoacutesofo peripateacutetico 30
Temiacutestio (c 317 - c 387) peripateacutetico tardio 31
Aniacutecio Macircnlio Torquato Severino Boeacutecio (c 480 mdash 524 ou 525) filoacutesofo estadista e teoacutelogo romano
famoso por sua traduccedilatildeo comentada da Isagogḗ de Porfiacuterio 32
Amocircnio Sacas (175 mdash 242) filoacutesofo grego neoplatocircnico alexandrino 33
Simpliacutecio (c 490 ndash c 560) filoacutesofo neoplatocircnico bizantino 34
Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) ou Joatildeo o Gramaacutetico filoacutesofo neoplatocircnico cristatildeo 35
τήν τε ῥητορικὴν ἐπιστήμην οὖσαν τοῦ εὖ λέγειν περὶ τῶν ἐν διεξόδῳ λόγων Quanto agrave concepccedilatildeo de
Crisipo acerca da retoacuterica cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1047 a-b (= SVF 2297-8) 36
καὶ τὴν διαλεκτικὴν τοῦ ὀρθῶς διαλέγεσθαι περὶ τῶν ἐν ἐρωτήσει καὶ ἀποκρίσει λόγων Todos os
textos citados aqui do grego e do latim foram diretamente traduzidos por noacutes a partir dos idiomas em que
foram originalmente escritos 37
ἐπιστήμην ἀληθῶν καὶ ψευδῶν καὶ οὐδετέρων 38
Lektaacute (cf definiccedilatildeo abaixo) 39
Axiacuteōmata (cf definiccedilatildeo abaixo)
320 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
predicados e de semelhantes ativos e passivos gecircneros e espeacutecies e
igualmente tambeacutem de argumentos modos silogismos e sofismas
que dependem da voz e dos estados de coisas (DL 7435- 7441)40
Como vemos os estoicos incluem muito mais coisas do que atualmente se concebe
como fazendo parte da loacutegica Caber-nos-aacute aqui como dissemos acima apresentar os
princiacutepios do que denominaremos loacutegica proposicional estoica loacutegica cujas inferecircncias
tratam das relaccedilotildees entre entidades que tecircm a estrutura de proposiccedilotildees (os axiacuteōmata41
os portadores primaacuterios de valor de verdade) e que se divide em duas partes a teoria
dos axiacuteōmata e a teoria dos argumentos
Os estoicos consideram tal loacutegica indispensaacutevel para que o saacutebio (o filoacutesofo ideal) seja
infaliacutevel na argumentaccedilatildeo (DL 747-8 (= SVF 2130) 783 (= SVF 2130))42
Diferentemente de Aristoacuteteles e dos peripateacuteticos e com exceccedilatildeo do estoico Ariston43
estimam ser a loacutegica uma ciecircncia uma parte integrante da filosofia e natildeo mero estudo
propedecircutico agraves ciecircncias44
A concepccedilatildeo tradicional estoica da filosofia eacute tripartida loacutegica fiacutesica e eacutetica distinccedilatildeo
que Dioacutegenes atribui a Zenatildeo de Ciacutetio Crisipo de Solis Dioacutegenes da Babilocircnia45
e
Posidocircnio de Rhodes (DL 739-41)46
Os estoicos comparam a filosofia a um animal no
qual os ossos e tendotildees satildeo a loacutegica a eacutetica a carne e a fiacutesica a alma47
Alguns
estoicos dizem que nenhuma parte tem precedecircncia em relaccedilatildeo agrave outra Outros poreacutem
datildeo prioridade ao estudo da loacutegica seguido pelo estudo da fiacutesica e da eacutetica Segundo
40
Τὴν δὲ διαλεκτικὴν διαιρεῖσθαι εἴς τε τὸν περὶ τῶν σημαινομένων καὶ τῆς φωνῆς τόπον καὶ τὸν μὲν
τῶν σημαινομένων εἴς τε τὸν περὶ τῶν φαντασιῶν τόπον καὶ τῶν ἐκ τούτων ὑφισταμένων λεκτῶν
ἀξιωμάτων καὶ αὐτοτεe λῶν καὶ κατηγορημάτων καὶ τῶν ὁμοίων ὀρθῶν καὶ ὑπτίων καὶ γενῶν καὶ εἰδῶν
ὁμοίως δὲ καὶ λόγων καὶ τρόπων καὶ συλλογισμῶν καὶ τῶν παρὰ τὴν φωνὴν καὶ τὰ πράγματα
σοφισμάτων 41
Cf abaixo 42
Cf Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os Toacutepicos de Aristoacuteteles I 8-14 (= SVF 2124) Epicteto
Diatribes 4812 172-5 10 1177-8 22344-6 43
Ariston de Quios (fl c 260 aC) considerava que ao filoacutesofo cabia apenas estudar eacutetica (cf DL 7160-
1 = SVF 1351) 44
Amocircnio (Sobre os Primeiros Analiacuteticos de Aristoacuteteles 820-2 e 91-2 (= SVF 249)) observa que os
estoicos natildeo consideram a loacutegica como mero instrumento nem como mera sub-parte da filosofia mas
como uma parte primaacuteria desta 45
c 230 aCndashc 150140 aC 46
Crisipo e Eudromus (estoico de florescimento incerto) chamam tais partes de ldquoespeacuteciesrdquo Apolodoro de
Atenas de ldquotoacutepicosrdquo os outros de ldquogecircnerosrdquo Cleanto entretanto divide a filosofia em seis partes
dialeacutetica retoacuterica eacutetica poliacutetica fiacutesica teologia Outros ainda como Zenatildeo de Tarso (fl 200 aC) dizem
que a filosofia natildeo tem partes 47
Sexto observa que Posidocircnio apresenta concepccedilatildeo divergente comparando a fiacutesica agrave carne e a eacutetica agrave
alma (Cf AM 719 Posidocircnio frag 88) Os estoicos comparam tambeacutem as partes da filosofia a um ovo
do qual a casca seria a loacutegica a clara a eacutetica a gema a fiacutesica E ainda a um campo feacutertil do qual a
cerca seria a loacutegica a terra ou as aacutervores a fiacutesica e os frutos a eacutetica (DL 739-41) Long amp Sedley (1987
(1) p 25) observam que os estoicos inauguram a ideia de filosofia como sistema embora Xenoacutecrates
possa tecirc-los precedido com a divisatildeo tripartite (loacutegica eacutetica e fiacutesica)
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
318 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
implicaccedilatildeo do megaacuterico Philo coincidia com a contemporacircnea noccedilatildeo de implicaccedilatildeo
material e que o debate das condicionais que ocorrera no periacuteodo heleniacutestico
correspondia ao que transcorria em sua proacutepria eacutepoca
Entretanto soacute em 1927 a loacutegica estoica foi propriamente redescoberta e esse feito se
deve ao loacutegico polonecircs Lukasiewicz (1970) que percebeu que os estoicos anteciparam
natildeo somente questotildees relativas agrave implicaccedilatildeo mas muitos outros pontos concernentes agrave
loacutegica moderna Lukasiewicz (1970 p 199) foi o primeiro a compreender que
enquanto na loacutegica aristoteacutelica as variaacuteveis devem ser substituiacutedas por termos na
estoica elas devem ser substituiacutedas por proposiccedilotildees Em outras palavras Lukasiewicz
compreendeu que a loacutegica estoica eacute na verdade uma loacutegica proposicional similar em
muitos aspectos agrave contemporacircnea A partir daiacute sucederam-se os estudos sobre a loacutegica
estoica sendo que os principais que nortearatildeo nosso trabalho satildeo aqueles de Benson
Mates Suzanne Bobzien Kneale amp Kneale e Long amp Sedley18
Voltemo-nos agrave questatildeo relativa agraves fontes antigas Como dito acima natildeo nos chegaram
obras completas dos antigos estoicos e os manuais de loacutegica estoica que circulavam
entatildeo19
haacute muito se perderam com exceccedilatildeo de fragmentos muitos dos quais em obras
de opositores dos estoicos
Nossa principal fonte eacute indubitavelmente Sexto Empiacuterico20
do qual nos chegaram duas
obras Esboccedilos de Pirronismo21
em trecircs livros (doravante HP) e Contra os
Matemaacuteticos22
(doravante AM) Sexto eacute o uacutenico comentador antigo que demonstra real
compreensatildeo da loacutegica estoica chegando a nos informar sobre discussotildees e debates
sobre a loacutegica entre os proacuteprios estoicos Nossa segunda melhor fonte eacute Dioacutegenes
Laeacutercio em sua obra Vida dos Filoacutesofos Ilustres (doravante DL) Laeacutercio posterior a
Sexto jaacute que o menciona (DL 9116) cita verbatim trechos de um manual de loacutegica de
certo Diocles de Magneacutesia estudioso acerca do qual natildeo temos qualquer outra
that the proposition if it is lightening it will thunder was true if it is not lightening or if it will thunder
and was only false if it is lightening but will not thunder Diodorus objected to this Either the ancient
reporters or he himself failed to make out precisely what was in his mind and though there have been
many virtual Diodorans since none of them have been able to state their position clearly without making
it too foolish Most of the strong logicians have been Philonians and most of the weak ones have been
Diodorans For my part I am a Philonian but I do not think that justice has ever been done to the
Diodoran side of the question The Diodoran vaguely feels that there is something wrong about the
statement that the proposition If it is lightening it will thunder can be made true merely by its not
lighteningrdquo 18
Cf referecircncias bibliograacuteficas 19
As Introduccedilotildees agrave Loacutegica (Eisagōgḗ Dialektikḗ) 20
Meacutedico grego e ceacutetico que viveu aproximadamente entre 160 e 210 dC 21
HP trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 2 22
AM trata da loacutegica estoica sobretudo no livro 8
319 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
informaccedilatildeo fora da obra de Laeacutercio23
Haacute tambeacutem referecircncias agrave loacutegica estoica na obra
de Galeno24
Seus comentaacuterios sobre a loacutegica estoica aparecem sobretudo em suas obras
Historia Philosopha e Institutio Logica Esta uacuteltima obra eacute atribuiacuteda a Galeno no
manuscrito atribuiccedilatildeo entretanto agraves vezes posta em duacutevida25
Temos ainda referecircncias
e informaccedilotildees sobre a loacutegica estoica em Ciacutecero26
Aulo Geacutelio27
Apuleio28
Alexandre de
Afrodiacutesias29
Temiacutestio30
Boeacutecio31
Amocircnio32
Simpliacutecio33
e Filopono34
2 Divisatildeo estoica da Loacutegica
Dioacutegenes Laeacutercio (741-4) nos informa que os estoicos natildeo tem uma concepccedilatildeo
unificada sobre a divisatildeo da loacutegica Alguns a dividem em duas ciecircncias retoacuterica e
dialeacutetica outros em um ramo concernente agraves definiccedilotildees e outro aos criteacuterios haacute
tambeacutem os que eliminam o ramo relativo agraves definiccedilotildees Laeacutercio nos apresenta a
definiccedilatildeo estoica de retoacuterica ciecircncia de bem falar em discursos contiacutenuos (DL
742535
) Quanto agrave dialeacutetica os estoicos a definem seja como ldquoo discorrer corretamente
acerca de discursos por meio de perguntas e repostasrdquo (DL 7425)36
seja como ldquoa
ciecircncia do verdadeiro do falso e de nenhum destesrdquo (DL 7425)37
A dialeacutetica por sua
vez divide-se assim
[] No toacutepico relativo aos significados e agraves vozes o toacutepico relativo
aos significados [se divide] no [toacutepico] acerca das representaccedilotildees e
dos diziacuteveis38
subjacentes a elas assertiacuteveis39
[diziacuteveis] completos
23
Cf DL 282 612 13 20 36 87 91 99 103 748 162 166 179 181 961 65 1012 24
Claacuteudio Galeno ou Eacutelio Galeno tambeacutem conhecido como Galeno de Peacutergamo viveu entre c 129 e c
217 foi famoso meacutedico e filoacutesofo romano de origem grega 25
A Institutio Logica apresenta uma curiosa siacutentese da loacutegica estoica e da peripateacutetica 26
Marco Tuacutelio Ciacutecero (3 de Janeiro de 106 aC mdash 7 de Dezembro de 43 aC) filoacutesofo orador escritor
advogado e poliacutetico romano 27
Aulo Geacutelio (125 - 180) autor da ceacutelebre obra Noites Aacuteticas 28
Luacutecio Apuleio (c 125 - c 170) escritor e filoacutesofo romano 29
Alexandre de Afrodiacutesias (fl c 198ndash209 dC) filoacutesofo peripateacutetico 30
Temiacutestio (c 317 - c 387) peripateacutetico tardio 31
Aniacutecio Macircnlio Torquato Severino Boeacutecio (c 480 mdash 524 ou 525) filoacutesofo estadista e teoacutelogo romano
famoso por sua traduccedilatildeo comentada da Isagogḗ de Porfiacuterio 32
Amocircnio Sacas (175 mdash 242) filoacutesofo grego neoplatocircnico alexandrino 33
Simpliacutecio (c 490 ndash c 560) filoacutesofo neoplatocircnico bizantino 34
Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) ou Joatildeo o Gramaacutetico filoacutesofo neoplatocircnico cristatildeo 35
τήν τε ῥητορικὴν ἐπιστήμην οὖσαν τοῦ εὖ λέγειν περὶ τῶν ἐν διεξόδῳ λόγων Quanto agrave concepccedilatildeo de
Crisipo acerca da retoacuterica cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1047 a-b (= SVF 2297-8) 36
καὶ τὴν διαλεκτικὴν τοῦ ὀρθῶς διαλέγεσθαι περὶ τῶν ἐν ἐρωτήσει καὶ ἀποκρίσει λόγων Todos os
textos citados aqui do grego e do latim foram diretamente traduzidos por noacutes a partir dos idiomas em que
foram originalmente escritos 37
ἐπιστήμην ἀληθῶν καὶ ψευδῶν καὶ οὐδετέρων 38
Lektaacute (cf definiccedilatildeo abaixo) 39
Axiacuteōmata (cf definiccedilatildeo abaixo)
320 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
predicados e de semelhantes ativos e passivos gecircneros e espeacutecies e
igualmente tambeacutem de argumentos modos silogismos e sofismas
que dependem da voz e dos estados de coisas (DL 7435- 7441)40
Como vemos os estoicos incluem muito mais coisas do que atualmente se concebe
como fazendo parte da loacutegica Caber-nos-aacute aqui como dissemos acima apresentar os
princiacutepios do que denominaremos loacutegica proposicional estoica loacutegica cujas inferecircncias
tratam das relaccedilotildees entre entidades que tecircm a estrutura de proposiccedilotildees (os axiacuteōmata41
os portadores primaacuterios de valor de verdade) e que se divide em duas partes a teoria
dos axiacuteōmata e a teoria dos argumentos
Os estoicos consideram tal loacutegica indispensaacutevel para que o saacutebio (o filoacutesofo ideal) seja
infaliacutevel na argumentaccedilatildeo (DL 747-8 (= SVF 2130) 783 (= SVF 2130))42
Diferentemente de Aristoacuteteles e dos peripateacuteticos e com exceccedilatildeo do estoico Ariston43
estimam ser a loacutegica uma ciecircncia uma parte integrante da filosofia e natildeo mero estudo
propedecircutico agraves ciecircncias44
A concepccedilatildeo tradicional estoica da filosofia eacute tripartida loacutegica fiacutesica e eacutetica distinccedilatildeo
que Dioacutegenes atribui a Zenatildeo de Ciacutetio Crisipo de Solis Dioacutegenes da Babilocircnia45
e
Posidocircnio de Rhodes (DL 739-41)46
Os estoicos comparam a filosofia a um animal no
qual os ossos e tendotildees satildeo a loacutegica a eacutetica a carne e a fiacutesica a alma47
Alguns
estoicos dizem que nenhuma parte tem precedecircncia em relaccedilatildeo agrave outra Outros poreacutem
datildeo prioridade ao estudo da loacutegica seguido pelo estudo da fiacutesica e da eacutetica Segundo
40
Τὴν δὲ διαλεκτικὴν διαιρεῖσθαι εἴς τε τὸν περὶ τῶν σημαινομένων καὶ τῆς φωνῆς τόπον καὶ τὸν μὲν
τῶν σημαινομένων εἴς τε τὸν περὶ τῶν φαντασιῶν τόπον καὶ τῶν ἐκ τούτων ὑφισταμένων λεκτῶν
ἀξιωμάτων καὶ αὐτοτεe λῶν καὶ κατηγορημάτων καὶ τῶν ὁμοίων ὀρθῶν καὶ ὑπτίων καὶ γενῶν καὶ εἰδῶν
ὁμοίως δὲ καὶ λόγων καὶ τρόπων καὶ συλλογισμῶν καὶ τῶν παρὰ τὴν φωνὴν καὶ τὰ πράγματα
σοφισμάτων 41
Cf abaixo 42
Cf Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os Toacutepicos de Aristoacuteteles I 8-14 (= SVF 2124) Epicteto
Diatribes 4812 172-5 10 1177-8 22344-6 43
Ariston de Quios (fl c 260 aC) considerava que ao filoacutesofo cabia apenas estudar eacutetica (cf DL 7160-
1 = SVF 1351) 44
Amocircnio (Sobre os Primeiros Analiacuteticos de Aristoacuteteles 820-2 e 91-2 (= SVF 249)) observa que os
estoicos natildeo consideram a loacutegica como mero instrumento nem como mera sub-parte da filosofia mas
como uma parte primaacuteria desta 45
c 230 aCndashc 150140 aC 46
Crisipo e Eudromus (estoico de florescimento incerto) chamam tais partes de ldquoespeacuteciesrdquo Apolodoro de
Atenas de ldquotoacutepicosrdquo os outros de ldquogecircnerosrdquo Cleanto entretanto divide a filosofia em seis partes
dialeacutetica retoacuterica eacutetica poliacutetica fiacutesica teologia Outros ainda como Zenatildeo de Tarso (fl 200 aC) dizem
que a filosofia natildeo tem partes 47
Sexto observa que Posidocircnio apresenta concepccedilatildeo divergente comparando a fiacutesica agrave carne e a eacutetica agrave
alma (Cf AM 719 Posidocircnio frag 88) Os estoicos comparam tambeacutem as partes da filosofia a um ovo
do qual a casca seria a loacutegica a clara a eacutetica a gema a fiacutesica E ainda a um campo feacutertil do qual a
cerca seria a loacutegica a terra ou as aacutervores a fiacutesica e os frutos a eacutetica (DL 739-41) Long amp Sedley (1987
(1) p 25) observam que os estoicos inauguram a ideia de filosofia como sistema embora Xenoacutecrates
possa tecirc-los precedido com a divisatildeo tripartite (loacutegica eacutetica e fiacutesica)
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
319 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
informaccedilatildeo fora da obra de Laeacutercio23
Haacute tambeacutem referecircncias agrave loacutegica estoica na obra
de Galeno24
Seus comentaacuterios sobre a loacutegica estoica aparecem sobretudo em suas obras
Historia Philosopha e Institutio Logica Esta uacuteltima obra eacute atribuiacuteda a Galeno no
manuscrito atribuiccedilatildeo entretanto agraves vezes posta em duacutevida25
Temos ainda referecircncias
e informaccedilotildees sobre a loacutegica estoica em Ciacutecero26
Aulo Geacutelio27
Apuleio28
Alexandre de
Afrodiacutesias29
Temiacutestio30
Boeacutecio31
Amocircnio32
Simpliacutecio33
e Filopono34
2 Divisatildeo estoica da Loacutegica
Dioacutegenes Laeacutercio (741-4) nos informa que os estoicos natildeo tem uma concepccedilatildeo
unificada sobre a divisatildeo da loacutegica Alguns a dividem em duas ciecircncias retoacuterica e
dialeacutetica outros em um ramo concernente agraves definiccedilotildees e outro aos criteacuterios haacute
tambeacutem os que eliminam o ramo relativo agraves definiccedilotildees Laeacutercio nos apresenta a
definiccedilatildeo estoica de retoacuterica ciecircncia de bem falar em discursos contiacutenuos (DL
742535
) Quanto agrave dialeacutetica os estoicos a definem seja como ldquoo discorrer corretamente
acerca de discursos por meio de perguntas e repostasrdquo (DL 7425)36
seja como ldquoa
ciecircncia do verdadeiro do falso e de nenhum destesrdquo (DL 7425)37
A dialeacutetica por sua
vez divide-se assim
[] No toacutepico relativo aos significados e agraves vozes o toacutepico relativo
aos significados [se divide] no [toacutepico] acerca das representaccedilotildees e
dos diziacuteveis38
subjacentes a elas assertiacuteveis39
[diziacuteveis] completos
23
Cf DL 282 612 13 20 36 87 91 99 103 748 162 166 179 181 961 65 1012 24
Claacuteudio Galeno ou Eacutelio Galeno tambeacutem conhecido como Galeno de Peacutergamo viveu entre c 129 e c
217 foi famoso meacutedico e filoacutesofo romano de origem grega 25
A Institutio Logica apresenta uma curiosa siacutentese da loacutegica estoica e da peripateacutetica 26
Marco Tuacutelio Ciacutecero (3 de Janeiro de 106 aC mdash 7 de Dezembro de 43 aC) filoacutesofo orador escritor
advogado e poliacutetico romano 27
Aulo Geacutelio (125 - 180) autor da ceacutelebre obra Noites Aacuteticas 28
Luacutecio Apuleio (c 125 - c 170) escritor e filoacutesofo romano 29
Alexandre de Afrodiacutesias (fl c 198ndash209 dC) filoacutesofo peripateacutetico 30
Temiacutestio (c 317 - c 387) peripateacutetico tardio 31
Aniacutecio Macircnlio Torquato Severino Boeacutecio (c 480 mdash 524 ou 525) filoacutesofo estadista e teoacutelogo romano
famoso por sua traduccedilatildeo comentada da Isagogḗ de Porfiacuterio 32
Amocircnio Sacas (175 mdash 242) filoacutesofo grego neoplatocircnico alexandrino 33
Simpliacutecio (c 490 ndash c 560) filoacutesofo neoplatocircnico bizantino 34
Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) ou Joatildeo o Gramaacutetico filoacutesofo neoplatocircnico cristatildeo 35
τήν τε ῥητορικὴν ἐπιστήμην οὖσαν τοῦ εὖ λέγειν περὶ τῶν ἐν διεξόδῳ λόγων Quanto agrave concepccedilatildeo de
Crisipo acerca da retoacuterica cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos Estoicos 1047 a-b (= SVF 2297-8) 36
καὶ τὴν διαλεκτικὴν τοῦ ὀρθῶς διαλέγεσθαι περὶ τῶν ἐν ἐρωτήσει καὶ ἀποκρίσει λόγων Todos os
textos citados aqui do grego e do latim foram diretamente traduzidos por noacutes a partir dos idiomas em que
foram originalmente escritos 37
ἐπιστήμην ἀληθῶν καὶ ψευδῶν καὶ οὐδετέρων 38
Lektaacute (cf definiccedilatildeo abaixo) 39
Axiacuteōmata (cf definiccedilatildeo abaixo)
320 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
predicados e de semelhantes ativos e passivos gecircneros e espeacutecies e
igualmente tambeacutem de argumentos modos silogismos e sofismas
que dependem da voz e dos estados de coisas (DL 7435- 7441)40
Como vemos os estoicos incluem muito mais coisas do que atualmente se concebe
como fazendo parte da loacutegica Caber-nos-aacute aqui como dissemos acima apresentar os
princiacutepios do que denominaremos loacutegica proposicional estoica loacutegica cujas inferecircncias
tratam das relaccedilotildees entre entidades que tecircm a estrutura de proposiccedilotildees (os axiacuteōmata41
os portadores primaacuterios de valor de verdade) e que se divide em duas partes a teoria
dos axiacuteōmata e a teoria dos argumentos
Os estoicos consideram tal loacutegica indispensaacutevel para que o saacutebio (o filoacutesofo ideal) seja
infaliacutevel na argumentaccedilatildeo (DL 747-8 (= SVF 2130) 783 (= SVF 2130))42
Diferentemente de Aristoacuteteles e dos peripateacuteticos e com exceccedilatildeo do estoico Ariston43
estimam ser a loacutegica uma ciecircncia uma parte integrante da filosofia e natildeo mero estudo
propedecircutico agraves ciecircncias44
A concepccedilatildeo tradicional estoica da filosofia eacute tripartida loacutegica fiacutesica e eacutetica distinccedilatildeo
que Dioacutegenes atribui a Zenatildeo de Ciacutetio Crisipo de Solis Dioacutegenes da Babilocircnia45
e
Posidocircnio de Rhodes (DL 739-41)46
Os estoicos comparam a filosofia a um animal no
qual os ossos e tendotildees satildeo a loacutegica a eacutetica a carne e a fiacutesica a alma47
Alguns
estoicos dizem que nenhuma parte tem precedecircncia em relaccedilatildeo agrave outra Outros poreacutem
datildeo prioridade ao estudo da loacutegica seguido pelo estudo da fiacutesica e da eacutetica Segundo
40
Τὴν δὲ διαλεκτικὴν διαιρεῖσθαι εἴς τε τὸν περὶ τῶν σημαινομένων καὶ τῆς φωνῆς τόπον καὶ τὸν μὲν
τῶν σημαινομένων εἴς τε τὸν περὶ τῶν φαντασιῶν τόπον καὶ τῶν ἐκ τούτων ὑφισταμένων λεκτῶν
ἀξιωμάτων καὶ αὐτοτεe λῶν καὶ κατηγορημάτων καὶ τῶν ὁμοίων ὀρθῶν καὶ ὑπτίων καὶ γενῶν καὶ εἰδῶν
ὁμοίως δὲ καὶ λόγων καὶ τρόπων καὶ συλλογισμῶν καὶ τῶν παρὰ τὴν φωνὴν καὶ τὰ πράγματα
σοφισμάτων 41
Cf abaixo 42
Cf Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os Toacutepicos de Aristoacuteteles I 8-14 (= SVF 2124) Epicteto
Diatribes 4812 172-5 10 1177-8 22344-6 43
Ariston de Quios (fl c 260 aC) considerava que ao filoacutesofo cabia apenas estudar eacutetica (cf DL 7160-
1 = SVF 1351) 44
Amocircnio (Sobre os Primeiros Analiacuteticos de Aristoacuteteles 820-2 e 91-2 (= SVF 249)) observa que os
estoicos natildeo consideram a loacutegica como mero instrumento nem como mera sub-parte da filosofia mas
como uma parte primaacuteria desta 45
c 230 aCndashc 150140 aC 46
Crisipo e Eudromus (estoico de florescimento incerto) chamam tais partes de ldquoespeacuteciesrdquo Apolodoro de
Atenas de ldquotoacutepicosrdquo os outros de ldquogecircnerosrdquo Cleanto entretanto divide a filosofia em seis partes
dialeacutetica retoacuterica eacutetica poliacutetica fiacutesica teologia Outros ainda como Zenatildeo de Tarso (fl 200 aC) dizem
que a filosofia natildeo tem partes 47
Sexto observa que Posidocircnio apresenta concepccedilatildeo divergente comparando a fiacutesica agrave carne e a eacutetica agrave
alma (Cf AM 719 Posidocircnio frag 88) Os estoicos comparam tambeacutem as partes da filosofia a um ovo
do qual a casca seria a loacutegica a clara a eacutetica a gema a fiacutesica E ainda a um campo feacutertil do qual a
cerca seria a loacutegica a terra ou as aacutervores a fiacutesica e os frutos a eacutetica (DL 739-41) Long amp Sedley (1987
(1) p 25) observam que os estoicos inauguram a ideia de filosofia como sistema embora Xenoacutecrates
possa tecirc-los precedido com a divisatildeo tripartite (loacutegica eacutetica e fiacutesica)
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
320 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
predicados e de semelhantes ativos e passivos gecircneros e espeacutecies e
igualmente tambeacutem de argumentos modos silogismos e sofismas
que dependem da voz e dos estados de coisas (DL 7435- 7441)40
Como vemos os estoicos incluem muito mais coisas do que atualmente se concebe
como fazendo parte da loacutegica Caber-nos-aacute aqui como dissemos acima apresentar os
princiacutepios do que denominaremos loacutegica proposicional estoica loacutegica cujas inferecircncias
tratam das relaccedilotildees entre entidades que tecircm a estrutura de proposiccedilotildees (os axiacuteōmata41
os portadores primaacuterios de valor de verdade) e que se divide em duas partes a teoria
dos axiacuteōmata e a teoria dos argumentos
Os estoicos consideram tal loacutegica indispensaacutevel para que o saacutebio (o filoacutesofo ideal) seja
infaliacutevel na argumentaccedilatildeo (DL 747-8 (= SVF 2130) 783 (= SVF 2130))42
Diferentemente de Aristoacuteteles e dos peripateacuteticos e com exceccedilatildeo do estoico Ariston43
estimam ser a loacutegica uma ciecircncia uma parte integrante da filosofia e natildeo mero estudo
propedecircutico agraves ciecircncias44
A concepccedilatildeo tradicional estoica da filosofia eacute tripartida loacutegica fiacutesica e eacutetica distinccedilatildeo
que Dioacutegenes atribui a Zenatildeo de Ciacutetio Crisipo de Solis Dioacutegenes da Babilocircnia45
e
Posidocircnio de Rhodes (DL 739-41)46
Os estoicos comparam a filosofia a um animal no
qual os ossos e tendotildees satildeo a loacutegica a eacutetica a carne e a fiacutesica a alma47
Alguns
estoicos dizem que nenhuma parte tem precedecircncia em relaccedilatildeo agrave outra Outros poreacutem
datildeo prioridade ao estudo da loacutegica seguido pelo estudo da fiacutesica e da eacutetica Segundo
40
Τὴν δὲ διαλεκτικὴν διαιρεῖσθαι εἴς τε τὸν περὶ τῶν σημαινομένων καὶ τῆς φωνῆς τόπον καὶ τὸν μὲν
τῶν σημαινομένων εἴς τε τὸν περὶ τῶν φαντασιῶν τόπον καὶ τῶν ἐκ τούτων ὑφισταμένων λεκτῶν
ἀξιωμάτων καὶ αὐτοτεe λῶν καὶ κατηγορημάτων καὶ τῶν ὁμοίων ὀρθῶν καὶ ὑπτίων καὶ γενῶν καὶ εἰδῶν
ὁμοίως δὲ καὶ λόγων καὶ τρόπων καὶ συλλογισμῶν καὶ τῶν παρὰ τὴν φωνὴν καὶ τὰ πράγματα
σοφισμάτων 41
Cf abaixo 42
Cf Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os Toacutepicos de Aristoacuteteles I 8-14 (= SVF 2124) Epicteto
Diatribes 4812 172-5 10 1177-8 22344-6 43
Ariston de Quios (fl c 260 aC) considerava que ao filoacutesofo cabia apenas estudar eacutetica (cf DL 7160-
1 = SVF 1351) 44
Amocircnio (Sobre os Primeiros Analiacuteticos de Aristoacuteteles 820-2 e 91-2 (= SVF 249)) observa que os
estoicos natildeo consideram a loacutegica como mero instrumento nem como mera sub-parte da filosofia mas
como uma parte primaacuteria desta 45
c 230 aCndashc 150140 aC 46
Crisipo e Eudromus (estoico de florescimento incerto) chamam tais partes de ldquoespeacuteciesrdquo Apolodoro de
Atenas de ldquotoacutepicosrdquo os outros de ldquogecircnerosrdquo Cleanto entretanto divide a filosofia em seis partes
dialeacutetica retoacuterica eacutetica poliacutetica fiacutesica teologia Outros ainda como Zenatildeo de Tarso (fl 200 aC) dizem
que a filosofia natildeo tem partes 47
Sexto observa que Posidocircnio apresenta concepccedilatildeo divergente comparando a fiacutesica agrave carne e a eacutetica agrave
alma (Cf AM 719 Posidocircnio frag 88) Os estoicos comparam tambeacutem as partes da filosofia a um ovo
do qual a casca seria a loacutegica a clara a eacutetica a gema a fiacutesica E ainda a um campo feacutertil do qual a
cerca seria a loacutegica a terra ou as aacutervores a fiacutesica e os frutos a eacutetica (DL 739-41) Long amp Sedley (1987
(1) p 25) observam que os estoicos inauguram a ideia de filosofia como sistema embora Xenoacutecrates
possa tecirc-los precedido com a divisatildeo tripartite (loacutegica eacutetica e fiacutesica)
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
321 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Dioacutegenes Laeacutercio (DL 739-41) professam essa concepccedilatildeo estoicos como Zenatildeo
Crisipo Arquedemo de Tarso48
e Eudromo49
Paneacutecio de Rhodes50
e Posidocircnio
comeccedilam pela fiacutesica Poreacutem com a jaacute mencionada exceccedilatildeo de Ariston de Quios todos
os estoicos consideram fundamental o estudo da loacutegica A seguinte diatribe de Epicteto
ilustra a importacircncia que os estoicos datildeo aos estudos loacutegicos
(1) Quando algum dos presentes indagou ndash Persuade-me que a loacutegica
eacute uacutetil ndash Queres disse Epicteto que te demonstre isso (2) ndash Sim ndash
Portanto eacute-me preciso selecionar um argumento demonstrativo
Quando o outro concordou ltEpicteto dissegt ndash E como saberaacutes se eu
te apresentar um sofisma (3) Quando o homem se calou Epicteto
disse ndash Vecircs como tu mesmo concordas que a loacutegica eacute necessaacuteria jaacute
que sem ela natildeo eacute possiacutevel saber se eacute necessaacuteria ou natildeo (Epicteto
Diatribes 225)51
3 Lektoacuten
A primeira noccedilatildeo que precisa ser esclarecida ao tratarmos dos axiacuteōmata da loacutegica
estoica eacute a de lektoacuten Este termo eacute adjetivo verbal de leacutegō (falar) e significa ldquoo
exprimiacutevelrdquo ldquoo diziacutevelrdquo ldquoo significadordquo Dioacutegenes Laeacutercio quanto ao conceito de
lektoacuten diz-nos
A voz difere da fala porque a voz eacute tambeacutem som mas somente a fala
eacute articulada E a fala difere da linguagem porque a linguagem tem
significado mas a fala eacute tambeacutem sem significado como blituri
enquanto a linguagem jamais Difere tambeacutem o dizer do proferir Pois
as vozes satildeo proferidas mas as coisas que satildeo afinal lektaacute satildeo ditas
(DL 7574)52
Sexto Empiacuterico por sua vez informa-nos que
48
Floresceu em 140 aC 49
Florescimento incerto 50
c 185 aC - c 11009 aC 51
Diatribe intitulada ldquoQuatildeo necessaacuteria eacute a loacutegicardquo Τῶν παρόντων δέ τινος εἰπόντος Πεῖσόν με ὅτι τὰ
λογικὰ χρήσιμά ἐστιν Θέλεις ἔφη ἀποδείξω σοι τοῦτο (2) ndash Ναί ndash Οὐκοῦν λόγον μ
ἀποδεικτικὸν διαλεχθῆναι δεῖ ndash Ὁμολογήσαντος δὲ Πόθεν οὖν εἴσῃ ἄν σε (3) σοφίσωμαι ndash
Σιωπήσαντος δὲ τοῦ ἀνθρώπου Ὁρᾷς ἔφη πῶς αὐτὸς ὁμολογεῖς ὅτι ταῦτα ἀναγκαῖά ἐστιν εἰ χωρὶς
αὐτῶν οὐδ αὐτὸ τοῦτο δύνασαι μαθεῖν πότερον ἀναγκαῖα ἢ οὐκ ἀναγκαῖά ἐστιν 52
διαφέρει δὲ φωνὴ καὶ λέξις ὅτι φωνὴ μὲν καὶ ὁ ἦχός ἐστι λέξις δὲ τὸ ἔναρθρον μόνον λέξις δὲ λόγου
διαφέρει ὅτι λόγος ἀεὶ σημαντικός ἐστι λέξις δὲ καὶ ἀσήμαντος ὡς ἡ βλίτυρι λόγος δὲ οὐδαμῶς
διαφέρει δὲ καὶ τὸ λέγειν τοῦ προφέρεσθαι προφέρονται μὲν γὰρ αἱ φωναί λέγεται δὲ τὰ πράγματα ἃ δὴ
καὶ λεκτὰ τυγχάνει
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
322 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Havia tambeacutem outro desacordo entre eles [os filoacutesofos] segundo o
qual alguns sustentaram que o verdadeiro e o falso [eacute] acerca do
significado outros acerca da fala outros ainda acerca do movimento
do pensamento E os [filoacutesofos] do Poacutertico defenderam a primeira
opiniatildeo dizendo que trecircs coisas unem-se umas agraves outras o significado
(toacute sēmainoacutemenon) o signo (toacute sēmaicircnon) e que eacute o caso (toacute
tynchaacutenon) dos quais o que significa eacute a voz (como por exemplo
ldquoDionrdquo) e o significado a coisa mesma evidenciada pela voz que
recebemos subsistindo em nosso pensamento (mas os baacuterbaros
embora ouvindo a voz natildeo a compreendem) O que eacute o caso eacute o
substrato exterior como o proacuteprio Dion Por um lado dois desses satildeo
corpos a voz e o que ocorre Mas um eacute incorpoacutereo a coisa
significada ie o diziacutevel (lektoacuten) que eacute ou verdadeiro ou falso (AM
8115-1210 8111 (= SVF 2166))53
Sexto Empiacuterico informa-nos ainda a definiccedilatildeo estoica de lektoacuten segundo a qual este eacute
ldquoo que subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional (phantasiacutea logikḗ) e a
representaccedilatildeo racional aquela segundo a qual o que eacute representado eacute por palavras
apresentado [agrave mente]rdquo (AM 870 (= SVF 2187))54
Assim vemos que os estoicos distinguem trecircs acircmbitos da linguagem o signo o
significado e o objeto exterior O signo diremos em terminologia moderna tem uma
conotaccedilatildeo (um sentido ou uma intensatildeo) e uma denotaccedilatildeo (ou extensatildeo) Tanto o signo
quanto sua extensatildeo (o que ocorre a realidade exterior) satildeo corpoacutereos enquanto o
lektoacuten (o diziacutevel ou o sentido do signo55
) eacute incorpoacutereo O incorpoacutereo por sua vez
subsiste segundo uma representaccedilatildeo racional Natildeo cabe aqui um estudo detalhado sobre
a noccedilatildeo de corpoacutereo e incorpoacutereo no sistema estoico mas contentar-nos-emos em dizer
que de acordo com a tinologia estoica56
haacute trecircs categorias fundamentais para as coisas
existentes57
(1) algo existente ou corpoacutereo (2) algo inexistente ou incorpoacutereo (3) natildeo-
algo As coisas materiais se encaixam na categoria (1) na categoria (2) temos o tempo
53
ἦν δὲ καὶ ἄλλη τις παρὰ τούτοις διάστασις καθἣν οἱ μὲν περὶ τῷ σημαινομένῳ τὸ ἀληθές τε καὶ
ψεῦδος ὑπεστήσαντο οἱ δὲ περὶ τῇ φωνῇ οἱ δὲ περὶ τῇ κινήσει τῆςδιανοίας καὶ δὴ τῆς μὲν πρώτης δόξης
προεστήκασιν οἱ ἀπὸ τῆς Στοᾶς τρία φάμενοι συζυγεῖν ἀλλήλοις τό τε σημαινόμενον καὶ τὸ σημαῖνον
καὶ τὸ τυγχάνον ὧν σημαῖνον μὲν εἶναι τὴν φωνήν οἷον τὴν Δίων σημαινόμενον δὲ αὐτὸ τὸ πρᾶγμα τὸ
ὑπαὐτῆς δηλούμενον καὶ οὗ ἡμεῖς μὲν ἀντιλαμβανόμεθα τῇ ἡμετέρᾳ παρυφισταμένου διανοίᾳ οἱ δὲ
βάρβαροι οὐκ ἐπαΐουσι καίπερ τῆς φωνῆς ἀκούοντες τυγχάνον δὲ τὸ ἐκτὸς ὑποκείμενον ὥσπερ αὐτὸς ὁ
Δίων τούτων δὲ δύο μὲν εἶναι σώματα καθάπερ τὴν φωνὴν καὶ τὸ τυγχάνον ἓν δὲ ἀσώματον ὥσπερ τὸ
σημαινόμενον πρᾶγμα καὶ λεκτόν ὅπερ ἀληθές τε γίνεται ἢ ἢ ψεῦδος 54
λεκτὸν δὲ ὑπάρχειν φασὶ τὸ κατὰ λογικὴν φαντασίαν ὑφιστάμενον λογικὴν δὲ εἶναι φαντασίαν καθ ἣν
τὸ φαντασθὲν ἔστι λόγῳ παραστῆσαι 55
Bobzien diz-nos que ldquoos lektaacute satildeo os sentidos subjacentes a tudo o que pensamos ou dizemos
subjazendo a toda representaccedilatildeo racional que tenhamos e subsistem mesmo quando ningueacutem pensa neles
ou os pronunciardquo (Bobzien 2003 p 86) 56
O termo tinologia refere-se ao fato de que os estoicos ao contraacuterio de Platatildeo e Aristoacuteteles natildeo elegem
o ser como categoria uacuteltima do real mas o algo (ti) ndash cf Areas 2012 57
Por exemplo Secircneca Ad Lucilium 5813-15 (= SVF 2332) Alexandre de Afrodiacutesias Sobre os
Toacutepicos de Aristoacuteteles 301 19-25 (= SVF 2329)
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
323 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
o espaccedilo o vazio e o lektoacuten na categoria (3) temos as entidades fictiacutecias e os limites O
incorpoacutereo como vimos acima embora natildeo existente subsiste Sellars (2006 p 85)
observa que com isso
Os estoicos querem ser capazes de dizer que esses incorpoacutereos satildeo
reais pois para serem objetos de pensamento devem ao menos ser
algo mas na medida em que natildeo satildeo corpos os estoicos natildeo podem
dizer que eles existem Ao inveacutes disso eles dizem que esses
incorpoacutereos subsistem eles satildeo reais mas satildeo realidades natildeo-
existentes58
Especificamente quanto ao lektoacuten Long amp Sedley (1987 (1) p 164-5) sugerem que sua
incorporeidade foi primariamente proposta no acircmbito da causalidade
Pois um efeito causal eacute um predicado incorpoacutereo ndash natildeo um corpo mas
isso que se torna verdade de um corpo ou que pertence a ele como
atributo [] Logo embora num contexto loacutegico os lektaacute possam ser
em alguma medida dependentes do pensamento no contexto causal
eles subsistem objetivamente
Em outros termos o lektoacuten eacute objetivo na medida em que se refere a certo atributo de um
corpo mas enquanto propriedade de uma representaccedilatildeo (que eacute algo corpoacutereo uma
modificaccedilatildeo do hēgemonikoacuten) eacute dependente e subsiste apenas subjetivamente59
Aleacutem disso sendo o lektoacuten o intermediaacuterio entre as palavras e as coisas podemos
afirmar junto com Drozdek (2002 p 99) que ao introduzir a noccedilatildeo de lektoacuten os
estoicos evitam os problemas de determinar como diferentes pensamentos ndash
modificaccedilotildees do hēgemoacutenikon de duas pessoas ou de uma pessoa em diferentes
momentos ndash podem ter o mesmo sentido Pois para os estoicos a comparaccedilatildeo de
pensamentos eacute possiacutevel porque haacute um tertio comparationis a saber o sentido objetivo
do pensamento o lektoacuten Em outros termos o lektoacuten eacute o conteuacutedo articulaacutevel em forma
linguiacutestica da phantasiacutea Esse conteuacutedo eacute o resultado da accedilatildeo do pensamento sobre a
percepccedilatildeo pela qual ele a classifica ou interpreta
58
Cf AM 117
59 Tomemos por exemplo a formulaccedilatildeo quiacutemica da essecircncia da baunilha Vanilina ou seriam
signos do lektoacuten que se refere agrave disposiccedilatildeo atocircmica que caracteriza a baunilha A baunilha eacute corpoacuterea
assim como os signos de sua composiccedilatildeo quiacutemica O lektoacuten referente aos signos que eacute expressatildeo objetiva
da composiccedilatildeo da baunilha eacute obviamente incorpoacutereo Eacute a expressatildeo dessa composiccedilatildeo e natildeo a proacutepria
composiccedilatildeo
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
324 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
22 Axiōma
Os lektaacute dividem-se em deficientes ou incompletos (ellipeacutes) e completos (autoteleacutes) Os
primeiros tecircm expressatildeo incompleta como ldquoescreverdquo ou ldquoandardquo casos em que
perguntamos ldquoQuemrdquo Os completos tecircm expressatildeo completa como ldquoSoacutecrates
escreverdquo Estes incluem axiacuteōmata questotildees inqueacuteritos comandos juramentos
invocaccedilotildees exortaccedilotildees saudaccedilotildees e semi-axiacuteōmata (DL 7 65-8)60
Um axiacuteōma por
sua vez eacute definido como ldquoum lektoacuten completo em si mesmo que pode ser afirmado no
quanto concerne a si mesmordquo (HP 2104)61
Assim de acordo com Sexto o que
distingue os axiacuteōmata dos demais lektaacute eacute (i) que podem ser afirmados (ii) na medida do
que se refere a eles mesmos Embora possam ser afirmados natildeo satildeo proposiccedilotildees mas
as proposiccedilotildees ocorrem quando se diz um axiacuteōma (DL 765 HP 2104 Aulo Geacutelio
Noites Aacuteticas 168) Ser afirmado (i) eacute a funccedilatildeo primaacuteria do axiacuteōma enquanto (ii) se
refere ao fato de que duas coisas satildeo necessaacuterias para se dizer um axiacuteōma o proacuteprio
axiacuteōma e algueacutem que o pronuncie (Bobzien 2003 p86)62
Haacute signos de diversos tipos que correspondem a distintos lektaacute incompletos que por sua
vez combinam-se para formar um axiacuteōma o verbo (rhḗma) o nome proacuteprio (oacutenoma63
)
o nome de uma classe (prosēgoriacutea64
) a frase (loacutegos) O lektoacuten correspondente ao verbo
60
Um inqueacuterito se distingue de uma questatildeo por natildeo poder ser respondido com um simples ldquosimrdquo ou
ldquonatildeordquo Um semi-axiacuteōma ocorre quando se pronuncia um axiacuteōma com emoccedilatildeo ou tom intensificado por
exemplo ldquoOacute como eacute belo o Partenonrdquo 61
καὶ τὸ μὲν ἀξίωμά φασιν εἶναι λεκτὸν αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ Em Dioacutegenes Laeacutercio
(7654-5) temos definiccedilatildeo proacutexima ldquoAxiacuteōma eacute o que eacute verdadeiro ou falso o lektoacuten completo que se
afirma no quanto concerne a si mesmo Como Crisipo diz em suas Definiccedilotildees Dialeacuteticas ldquoAxiacuteōma eacute o
que se afirma ou se nega no quanto concerne a si mesmo Por exemplo ldquoEacute diardquo ldquoDion caminhardquo
(Ἀξίωμα δέ ἐστιν ὅ ἐστιν ἀληθὲς ἢ ψεῦδος ἢ πρᾶγμα αὐτοτελὲς ἀποφαντὸν ὅσον ἐφ ἑαυτῷ ὡς ὁ
Χρύσιππός φησιν ἐν τοῖς 7655 Διαλεκτικοῖς ὅροις ldquoἀξίωμά ἐστι τὸ ἀποφαντὸν ἢ καταφαντὸν ὅσον ἐφ
ἑαυτῷ οἷον Ἡμέρα ἐστί Δίων περιπατεῖ) Como tambeacutem em Aulo Geacutelio (Noites Aacuteticas 168) Redimus
igitur necessario ad Graecos libros Ex quibus accepimus ἀξίωμα esse his uerbis λεκτὸν αὐτοτελὲς
ἀπόφαντον ὅσον ἐφ αὑτῷ 62
Dioacutegenes Laeacutercio observa que ἀξίωμα eacute derivado do verbo ἀξιόω que significa o ato de aceitar ou
rejeitar (DL 765) Nesse ensaio simplesmente transcreveremos o termo para evitar confusatildeo com a
proposiccedilatildeo moderna O axiacuteōma literalmente eacute o que eacute asserido sendo traduzido por lsquoassertiacutevelrsquo ou
lsquoasseriacutevelrsquo em portuguecircs Os romanos ofereceram algumas opccedilotildees para traduzir o termo Aulo Geacutelio
(Noites Aacuteticas 1688) nos informa que Varro o traduziu por proloquium Ciacutecero traduziu-o
provisoriamente por pronuntiatum (Questotildees Tusculanas 1714) optando mais tarde por enunciatio (Do
Destino I) 63
Um nome proacuteprio eacute uma parte da linguagem que se refere a uma qualidade de no maacuteximo um
indiviacuteduo Cf DL 758 AM 1133 64
Cumpre notar que o lektoacuten de uma classe (prosēgoriacutea) eacute uma propriedade comum a vaacuterios indiviacuteduos
(koinḗ poiotḗs) Cf DL 758 AM 1133 Para uma discussatildeo aprofundada sobre o tema remetemos o
leitor a Mates 1961 p 23-26
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
325 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
eacute o katēgoacuterēma65
(o predicado) O lektoacuten correspondente ao oacutenoma e agrave prosēgoriacutea eacute o
ptṓsis (sujeito) Tais lektaacute satildeo deficientes isto eacute incompletos e o axiacuteōma que eacute um
lektoacuten completo eacute composto por ptṓsis e katēgoacuterēma 66
Por fim O lektoacuten
correspondente agrave frase eacute evidentemente o axiacuteōma
Os axiacuteōmata satildeo os portadores primaacuterios de valores de verdade ou falsidade (Cf AM
874 812 DL 765-66 Ciacutecero Do Destino 38) Para os estoicos verdade e falsidade
em sentido primaacuterio satildeo propriedades de axiacuteōmata ldquoquem diz que lsquoeacute diarsquo parece aceitar
que eacute dia assim quando eacute dia o presente axiacuteōma se torna verdadeiro e quando eacute noite
torna-se falsordquo (DL 765 Cf AM 874 8103 Ciacutecero Do Destino 38) Em outros
termos um axiacuteōma expresso por uma sentenccedila eacute verdadeiro quando o estado de coisas
correspondente a ele eacute a realidade e eacute falso quando se daacute o contraacuterio Pois como
observa Sexto ldquoo verdadeiro axiacuteōma eacute aquele que eacute (toacute hypaacuterchei) e eacute contraditoacuterio a
algo ie a outro axiacuteōma e o axiacuteōma falso eacute aquele que natildeo eacute (ouk toacute hypaacuterchei) e eacute
contraditoacuterio a algo ie a outro axiacuteōmardquo (AM 810 85 88)67
Para Kneale amp Kneale
(1962 p 153) a definiccedilatildeo de Sexto ldquosugere que o axiacuteōma verdadeiro tem uma estrutura
correspondente agrave estrutura similar no objeto descritordquo 68
Em outros termos o axiacuteōma
verdadeiro seria a afirmaccedilatildeo de uma estrutura ou propriedade estrutural de algo69
Segundo Bobzien (2003 p 87) a noccedilatildeo estoica de axiacuteōma parece-se de certa forma
com a proposiccedilatildeo fregeana diferenciando-se desta por ter o valor de verdade associado
65
DL 758 Quanto agrave definiccedilatildeo de katēgoacuterēma cf nota imediatamente abaixo 66
Cf DL 764 ldquoUm predicado eacute de acordo com os seguidores de Apolodoro o que eacute dito de algo em
outras palavras algo associado a um ou mais sujeitosrdquo (Ἔστι δὲ τὸ κατηγόρημα τὸ κατά τινος
ἀγορευόμενον ἢ πρᾶγμα συντακτὸν περί τινος ἢ τινῶν ὡς οἱ περὶ Ἀπολλόδωρόν φασιν) 67
ἀληθὲς γάρ ἐστι κατ αὐτοὺς τὸ ὑπάρχον καὶ ἀντικείμενόν τινι καὶ ψεῦδος τὸ μὴ ὑπάρχον καὶ
ἀντικείμενόν τινι Cf AM 885 888 68
Bobzien (2003 p 88) entretanto observa que ldquoO uacutenico acesso que haacute para os assertiacuteveis eacute via
linguagem mas natildeo haacute correspondecircncia biuniacutevoca entre essertiacuteveis e sentenccedilas declarativas Uma uacutenica
sentenccedila de certo tipo pode expressar lektaacute completos pertencentes a diferentes classes Igualmente duas
sentenccedilas de diferentes estruturas gramaticais podem expressar o mesmo assertiacutevel Como entatildeo sabemos
que assertiacutevel uma sentenccedila expressardquo Entretanto quanto a isto podemos responder tratar-se de uma
questatildeo de ambiguidade que pode ser resolvida de modo simples 69
Por exemplo o axiacuteōma (significado) referente agrave frase (signo) ldquoO diamante consiste numa rede
cristalina de carbonos com hibridaccedilatildeo sp3 formando 4 ligaccedilotildees que definem acircngulos de 1095ordm entre sirdquo eacute
verdadeiro na medida em que retrata a estrutura molecular das pedras de diamante O mesmo axiacuteōma
pode ser expresso pela imagem (signo)
Ambos os signos remetem-se evidentemente ao que significam a afirmaccedilatildeo da estrutura molecular dos
diamantes sendo tal estrutura propriedade molecular dos diamantes
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
326 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
agrave temporalidade (DL 765)70
Como vimos para os estoicos a proposiccedilatildeo expressa por
ldquoEacute diardquo eacute verdadeira quando eacute dia e ela mesma eacute falsa quando eacute noite ao passo que
Frege consideraria tratar-se de diferentes proposiccedilotildees expressas pela mesma frase
Os estoicos distinguem entre axiacuteōmata simples e natildeo-simples distinccedilatildeo anaacuteloga agrave das
proposiccedilotildees loacutegicas contemporacircneas que se dividem em atocircmicas e moleculares (DL
768-9)71
Os axiacuteōmata simples distinguem-se dos natildeo-simples por natildeo possuiacuterem
conectivos (syacutendesmos) partes indeclinaacuteveis da linguagem que unem outras partes da
linguagem (DL 758) Por essa definiccedilatildeo os estoicos natildeo consideram a negaccedilatildeo um
operador loacutegico embora reconheccedilam sua verofuncionalidade (cf abaixo) Assim a
negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute para os estoicos tambeacutem um axiacuteōma simples ao
contraacuterio do que vale para a loacutegica contemporacircnea segundo a qual a negaccedilatildeo de uma
proposiccedilatildeo simples eacute uma proposiccedilatildeo complexa Os axiacuteōmata natildeo-simples aleacutem de
possuiacuterem conectivos satildeo compostos por axiacuteōmata simples ou pela repeticcedilatildeo de um
mesmo axiacuteōma simples (DL 768-9)72
Os axiacuteōmata simples dividem-se em trecircs tipos afirmativos e trecircs tipos negativos (DL
769-70 AM 8 96-100) Dioacutegenes Laeacutercio (DL 769-70 (= SVF 2204)) e Sexto
Empiacuterico (AM 893-8 (= SVF 2205)) nos informam sobre essa classificaccedilatildeo com
pequena diferenccedila entre os relatos
Sexto nos diz que os axiacuteōmata simples afirmativos dividem-se em (i) definidos
(hōriacutesmena) (ii) indefinidos (aoacuterista) e (iii) meacutedios (meacutesa)73
Os definidos seriam os
expressos atraveacutes de referecircncia demonstrativa por exemplo ldquoEste caminhardquo Essa
referecircncia demonstrativa (kataacute deicircxin) seria o proacuteprio ato de apontar para alguma coisa e
referir-se a ela74
Os indefinidos seriam primariamente constituiacutedos por um pronome
indefinido por exemplo ldquoAlgueacutem estaacute caminhandordquo Os meacutedios satildeo aqueles que nem
satildeo definidos nem indefinidos por exemplo ldquoSoacutecrates caminhardquo ldquoUm homem estaacute
sentadordquo Este porque natildeo faz referecircncia a qualquer pessoa em particular Aquele por
70
Esses assertiacuteveis que sofrem mudanccedila em seu valor de verdade satildeo chamados pelos estoicos de
metapiptoacutenta axiacuteōmata O princiacutepio da bivalecircncia segundo o qual ldquotoda proposiccedilatildeo eacute ou verdadeira ou
falsardquo tambeacutem recebe a seguinte formulaccedilatildeo ldquoa disjunccedilatildeo de uma proposiccedilatildeo com sua negaccedilatildeo eacute sempre
verdadeirardquo (cf Ciacutecero Academica 297) Tal princiacutepio na concepccedilatildeo de Crisipo e dos demais estoicos
aplica-se igualmente a todos axiacuteōmata sejam eles referentes ao passado ao presente ou ao futuro (Cf
Ciacutecero Do Destino 37 20-1) 71
Laeacutercio afirma ser tal classificaccedilatildeo adotada pelos seguidores de Crisipo como Arquedemos de Tarso
(fl c 140 aC) e Crinis (c seacuteculo II aC) 72
Exemplo deste uacuteltimo ldquoSe eacute dia eacute diardquo 73
τῶν δὲ ἁπλῶν τινὰ μὲν ὡρισμένα ἐστὶν τινὰ δὲ ἀόριστα τινὰ δὲ μέσα 74
Bobzien (2003 p 89) define deicircxis como ldquoo ato de fisicamente apontar para algo junto com a elocuccedilatildeo
da sentenccedila com o pronomerdquo
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
327 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
natildeo conter referecircncia demonstrativa ou pronome indefinido Dioacutegenes Laeacutercio por sua
vez (que como jaacute observamos acima cita verbatim um manual de loacutegica de Diocles de
Magneacutesia) apresenta divisatildeo similar (i) assertoacutericos (kategorikaacute) (ii) demonstrativos
(kategoreutikaacute) (iii) indefinidos (aoacuterista)75
Os assertoacutericos satildeo compostos de um caso
nominativo e um predicado por exemplo ldquoDion caminhardquo Os demonstrativos satildeo
compostos de um pronome demonstrativo no nominativo e um predicado por exemplo
ldquoEste caminhardquo Os indefinidos satildeo compostos por uma ou mais partiacuteculas indefinidas e
um predicado por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo Os indefinidos aparecem em ambas as
listas os demonstrativos correspondem aos definidos os assertoacutericos correspondem aos
meacutedios Somando os dois relatos temos o seguinte
(i) definidos (hōriacutesmena) ou demonstrativos (kategoreutikaacute) expressos com referecircncia
demonstrativa constituiacutedos por pronome definido e predicado76
(ii) indefinidos (aoacuterista) constituiacutedos por pronome indefinido e predicado
(iii) meacutedios (meacutesa) ou assertoacutericos (kategorikaacute) nem definidos nem indefinidos
Quanto agraves condiccedilotildees de verdade dos axiacuteōmata Sexto nos informa que um axiacuteōma
indefinido eacute verdadeiro quando seu correspondente definido tambeacutem o eacute77
Por outro
lado um axiacuteōma definido eacute verdadeiro quando o predicado pertence agravequilo a que se faz
a referecircncia demonstrativa (AM 8100 (= SVF 2205)) Haacute exceccedilatildeo poreacutem no caso de
um axiacuteōma definido como por exemplo ldquoEsse estaacute mortordquo (apontando para a Dion) e
o meacutedio correspondente ldquoDion estaacute mortordquo Para os estoicos esses dois axiacuteōmata ao
serem pronunciados ao mesmo tempo podem ter diferentes valores de verdade (Cf
Alexandre de Afrodiacutesias In An Pr 17725 - 1794) ldquoEsse estaacute mortordquo (referindo-se a
Dion) eacute falso quando Dion estaacute vivo Entretanto tal axiacuteōma eacute ldquodestruiacutedordquo quando Dion
estaacute morto (pois o objeto da referecircncia demonstrativa deixa de existir) enquanto ldquoDion
estaacute mortordquo apenas muda de valor quando Dion morre Quanto a isso Long amp Sedley
(1987 (1) p 206-7) argumentam que os estoicos concordariam com loacutegicos modernos
para os quais expressotildees como ldquoO atual rei da Franccedila eacute carecardquo satildeo carentes de valor de
75
κατηγορικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoΔίων περιπατεῖrdquo
καταγορευτικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ πτώσεως ὀρθῆς δεικτικῆς καὶ κατηγορήματος οἷον ldquoοὗτος
περιπατεῖrdquo ἀόριστον δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀορίστου μορίου ἢ ἀορίστων μορίων ltκαὶ κατηγορήματοςgt
οἷον ldquoτὶς περιπατεῖrdquo ldquoἐκεῖνος κινεῖταιrdquo 76
Nesse contexto eacute importante mencionar um fragmento de Crisipo do seu hoje perdido Acerca da Alma
citado por Galeno (Sobre as doutrinas de Platatildeo e Hipoacutecrates 229-11 = SVF 2895) quanto ao uso do
pronome egṓ (eu) Para Crisipo o uso do pronome ldquoeurdquo implica um axiacuteōma demonstrativo pois ldquoeurdquo faz
referecircncia ao lugar onde se encontra aquele que fala Em outros termos quando o usamos implicitamente
fazemos uma referecircncia demonstrativa a noacutes mesmos 77
Por exemplo ldquoAlgueacutem caminhardquo eacute verdadeiro quando ldquoEsse caminhardquo o for Cf AM 898 ( =
SVF2205)
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
328 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
verdade e que os axiacuteōmata correspondentes a tais frases satildeo ldquodestruiacutedosrdquo quer dizer
ldquodeixam de satisfazer as condiccedilotildees que qualquer diziacutevel completo deve cumprir para
serem proposiccedilotildees de qualquer tipordquo No axiacuteōma definido ldquoEsse estaacute mortordquo ldquoesserdquo estaacute
para ldquoesse homemrdquo e se Dion estaacute morto ldquoEsse estaacute mortordquo se torna impossiacutevel quando
referindo-se a Dion jaacute que natildeo haacute mais Dion para se fazer a referecircncia demonstrativa78
ldquoos estoicos pode-se supor como Russell tecircm razotildees epistecircmicas para dar tamanho
peso agrave referecircncia demonstrativa esse eacute o meio mais direto de indicar sem descrever
algo que um falante sabe ou crecirc existirrdquo
Kneale amp Kneale (1962 P 146) observam que duas peculiaridades dessa classificaccedilatildeo
devem ser notadas Primeiro nenhuma distinccedilatildeo eacute feita entre axiacuteōmata expressos por
sentenccedilas com nomes proacuteprios e os expressos por sentenccedilas que tecircm nomes de classe
como sujeito Isso porque para os estoicos em ambos os casos o lektoacuten significa uma
determinada qualidade Como vimos acima aos signos do nome proacuteprio (oacutenoma) e do
nome de uma classe (prosēgoriacutea) correspondem como lektoacuten o sujeito (ptṓsis) o nome
proacuteprio aponta para uma qualidade que pertence a no maacuteximo um indiviacuteduo enquanto o
nome de classe aponta para uma qualidade proacutepria a muitos indiviacuteduos Segundo natildeo
haacute espaccedilo aiacute para proposiccedilotildees como as universais aristoteacutelicas79
Para os estoicos
informa-nos Sexto (AM 898) definiccedilotildees distinguem-se dos axiacuteōmata apenas na
expressatildeo pois a definiccedilatildeo ldquohomem eacute um animal mortalrdquo corresponde ao axiacuteōma ldquoSe eacute
homem entatildeo eacute animal mortalrdquo Essa concepccedilatildeo sobre as universais em forma de
condicionais reflete o nominalismo estoico Para os estoicos natildeo haacute Formas platocircnicas
ou universais aristoteacutelicos Os nomes de classe natildeo se referem a qualquer entidade
extramental que exista por si mesma ou separadamente da mateacuteria Quando por
exemplo dizemos ldquoHomem eacute animal racionalrdquo podemos ser tentados a considerar o
sujeito ldquoHomemrdquo como algum tipo de realidade existente por si Mas esse problema se
dilui se pusermos na forma condicional ldquoSe eacute homem entatildeo eacute animalrdquo (Cf AM 28)
Nessa perspectiva Crisipo desenvolveu o que chamaremos de argumento ldquonenh-umrdquo
Se algum homem estaacute em Atenas natildeo estaacute em Meacutegara
homem estaacute em Atenas
Logo homem natildeo estaacute em Meacutegara
78
Como observa Joatildeo Filopono de Alexandria (c 490 ndash c 570) tambeacutem conhecido como Joatildeo o
Gramaacutetico ldquoA palavra esse sendo decircitica significa algo que existe mas a palavra morto significa algo
que natildeo existe Eacute impossiacutevel para o que existe natildeo existir Logo lsquoEsse homem estaacute mortorsquo eacute impossiacutevelrdquo
(apud Mates 1961 p 30 nota 1) 79
Ie ldquoTodo A eacute Brdquo e ldquoNenhum A eacute Brdquo onde A e B satildeo variaacuteveis que devem ser substituiacutedas por nomes
de classe (universais)
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
329 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
(Simpliacutecio Sobre as Categorias de Aristoacuteteles 1057-16 Cf DL
7187)80
Como observa Sellars (2006 p 85) Crisipo deseja com esse argumento direcionado
aos platocircnicos mostrar que o termo ldquohomemrdquo refere-se a coisa ldquonenh-umardquo De acordo
com a tinologia estoica uma coisa antes de ser o que for tem de ser algo (ti) Um
platocircnico aceitaria a primeira premissa e natildeo teria razatildeo para recusar a segunda mas a
conclusatildeo seria obviamente inaceitaacutevel Para evitar a conclusatildeo o platocircnico tem de
rejeitar a premissa entimemaacutetica segundo a qual ldquohomem eacute algo (ti)rdquo Poreacutem ao fazecirc-lo
eacute forccedilado a admitir que ldquohomemrdquo natildeo eacute algo
Passemos aos axiacuteōmata simples negativos Como vimos acima a negaccedilatildeo (apoacutephasis)
natildeo eacute um conectivo para os estoicos razatildeo pela qual a negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute
tambeacutem um axiacuteōma simples Sexto nos informa que para os estoicos as contraditoacuterias81
ldquosatildeo aquelas que excedem uma agrave outra pela negaccedilatildeordquo (AM 888-90 (= SVF 2214))82
Sexto esclarece ainda que tal negaccedilatildeo deve ser anteposta ao axiacuteōma para que possa
ldquocomandaacute-lordquo quer dizer para que possa negaacute-lo como um todo83
Segundo Dioacutegenes
Laeacutercio haacute trecircs tipos de axiacuteōmata simples negativos na loacutegica estoica
Entre os axiacuteōmata simples estatildeo o negativo (apophatikoacuten) o
assertoacuterico negativo (arnētikoacuten) o privativo (sterētikoacuten) [] O
negativo ltconsiste de uma negaccedilatildeo e um axiacuteōmagt por exemplo ldquoNatildeo
eacute diardquo Espeacutecie desse eacute a dupla negaccedilatildeo (hyperapophatikoacuten) A dupla
negaccedilatildeo eacute a negaccedilatildeo da negaccedilatildeo por exemplo ldquoNatildeo eacute o caso que natildeo
seja diardquo que equivale a ldquoEacute diardquo O assertoacuterico negativo eacute a uniatildeo de
uma partiacutecula negativa e um predicado por exemplo ldquoNingueacutem
caminhardquo O privativo eacute a uniatildeo de uma partiacutecula de privaccedilatildeo e de um
axiacuteōma potencial por exemplo ldquoEsse [homem] eacute desumanordquo (DL
769-70)84
Bobzien (2003 P 90) observa que o mais importante axiacuteōma negativo eacute a negaccedilatildeo
Uma negaccedilatildeo eacute formada pela adiccedilatildeo da partiacutecula ldquonatildeordquo a uma axiacuteōma (por exemplo
80
ldquoεἴ τις ἐστιν ἐν Μεγάροις οὐκ ἔστιν ἐν Ἀθήναις ἄνθρωπος δ ἐστὶν ἐν Μεγάροις οὐκ ἄρ ἐστὶν
ἄνθρωπος ἐν Ἀθήναιςrdquo 81
ἀντικείμενά 82
ἀντικείμενά ἐστιν ὧν τὸ ἕτερον τοῦ ἑτέρου ἀποφάσει πλεονάζει 83
Por exemplo a negaccedilatildeo (apoacutephasis) de ldquoEacute diardquo eacute ldquoNatildeo Eacute diardquo e natildeo ldquoEacute natildeo-diardquo Feita essa ressalva
usaremos nesse artigo o siacutembolo corrente para a negaccedilatildeo (~) pois embora natildeo vista pelos estoicos como
um conectivo reconhecem sua verofuncionalidade 84
Ἐν δὲ τοῖς ἁπλοῖς ἀξιώμασίν ἐστι τὸ ἀποφατικὸν καὶ τὸ καὶ τὸ ἀρνητικὸν καὶ τὸ στερητικὸν καὶ τὸ
κατηγορικὸν καὶ τὸ καταγορευτικὸν καὶ τὸ ἀόριστον [] καὶ ἀποφατικὸν μὲν οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα ἐστίνrdquo
εἶδος δὲ τούτου τὸ ὑπεραποφατικόν ὑπεραποφατικὸν δ ἐστὶν ἀποφατικὸν ἀποφατικοῦ οἷον ldquoοὐχὶ ἡμέρα
ltοὐκgt ἔστιrdquo τίθησι δὲ τὸ ldquoἡμέρα ἐστίνrdquo Ἀρνητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐξ ἀρνητικοῦ μορίου καὶ
κατηγορήματος οἷον ldquoοὐδεὶς περιπατεῖrdquo στερητικὸν δέ ἐστι τὸ συνεστὸς ἐκ στερητικοῦ μορίου καὶ
ἀξιώματος κατὰ δύναμιν οἷον ldquoἀφιλάνθρωπός ἐστιν οὗτοςrdquo ( lacuna)
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
330 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
ldquoNatildeo Dion caminhardquo) Isso se distingue de ldquoDion natildeo caminhardquo que na verdade conta
como uma afirmaccedilatildeo que ao contraacuterio de ldquoNatildeo Dion caminhardquo pressupotildee a existecircncia
de Dion para ser verdadeira (Cf Apuleio De Int 17722-31 Alexandre de Afrodiacutesias
In An Pr 4028-12) A negaccedilatildeo estoica eacute verofuncional adicionando a partiacutecula
negativa a um axiacuteōma verdadeiro se obteacutem um axiacuteōma falso e vice-versa (AM 7203)
A negaccedilatildeo de um axiacuteōma simples eacute um axiacuteōma simples85
Evidentemente a negaccedilatildeo de
um axiacuteōma natildeo-simples eacute um axiacuteōma natildeo-simples A dupla negaccedilatildeo tambeacutem eacute um
axiacuteōma simples O segundo tipo de negaccedilatildeo consiste em uma partiacutecula negativa e um
predicado O privativo eacute um axiacuteōma simples composto por uma partiacutecula privativa e um
axiacuteōma potencial
Passemos agora aos axiacuteōmata natildeo-simples Tais axiacuteōmata satildeo compostos por axiacuteōmata
simples ou pela repeticcedilatildeo de um mesmo axiacuteōma (DL 768-9) 86
Como vimos acima os
axiacuteōmata natildeo-simples satildeo unidos por conectivos partes indeclinaacuteveis da linguagem que
unem outras partes da linguagem (DL 758) Um axiacuteōma natildeo-simples pode ser
composto por dois ou mais axiacuteōmata simples (Cf Plutarco Das Contradiccedilotildees dos
Estoicos 1047 c-e) Aleacutem disso podem tambeacutem ser constituiacutedos por axiacuteōmata natildeo-
simples (embora em uacuteltima anaacutelise sejam evidentemente compostos por axiacuteōmata
simples) Por exemplo ldquoSe tanto eacute dia quanto o sol estaacute sobre a terra haacute luzrdquo Tambeacutem
conjunccedilotildees e disjunccedilotildees podem ter mais trecircs ou mais elementos Por exemplo ldquoOu a
sauacutede eacute boa ou eacute maacute ou eacute indiferenterdquo (AM 8434)
Dioacutegenes oferece-nos uma lista dos tipos de axiacuteōmata natildeo-simples que comentaremos a
seguir acrescentando informaccedilotildees obtidas por outras fontes primaacuterias
Em primeiro lugar Dioacutegenes Laeacutercio cita a condicional (DL 771)87
tomando uma
definiccedilatildeo que ele afirma estar presente nos Tratados de Dialeacutetica de Crisipo e na Arte
de Dialeacutetica de Dioacutegenes da Babilocircnia ambas obras hoje perdidas Segundo a
definiccedilatildeo um axiacuteōma condicional seria ldquoo que eacute unido atraveacutes do conectivo hipoteacutetico
ldquoserdquo (DL 771)88
Quanto agrave questatildeo das condicionais esse debate como observamos
acima iniciou-se entre os megaacutericos e tornou-se tatildeo inflamado que segundo Caliacutemaco
ldquomesmo os corvos nos cimos dos telhados corvejam sobre a questatildeo acerca de que
85
O mesmo vale para a dupla negaccedilatildeo 86
διαφορουμένου particiacutepio de διαφορέω que significa literalmente ldquoespalhadordquo ldquodisperso 87
συνημμένον particiacutepio perfeito do verbo συνάπτω (unir) Os gregos tambeacutem referem-se agrave condicional
como σημεῖον (Cf HP 2110) 88
τὸ συνεστὸς διὰ τοῦ ldquoεἰrdquo συναπτικοῦ συνδέσμου
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
331 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
condicional eacute verdadeirardquo (AM 1309-310)89
Esse debate parece ter-se iniciado com os
megaacutericos Philo90
e Diodoro Crono Sexto Empiacuterico nos informa que Philo ldquodiz ser uma
condicional verdadeira aquela em que natildeo eacute o caso que a antecedente 91
seja verdadeira
e a consequente92
falsa ndash por exemplo quando eacute dia e estou conversando lsquoSe eacute dia eu
conversorsquordquo (HP 21101)93
Essa concepccedilatildeo corresponde exatamente ao que se chama
hoje de implicaccedilatildeo material A segunda concepccedilatildeo sobre as condicionais mencionada
por Sexto eacute aquela de Diodoro Crono
[] que nem foi possiacutevel nem eacute possiacutevel a antecedente ltsergt
verdadeira e a consequente falsa segundo esta visatildeo parece ser falsa a
condicional dita acima94
jaacute que quando eacute dia e estou calado a
antecedente eacute verdadeira a conclusatildeo95
eacute falsa mas esta eacute verdadeira
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos
indivisiacuteveis das coisasrdquo Pois eacute sempre falsa a antecedente ldquonatildeo haacute
elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo e segundo ele verdadeira a
consequecircncia ldquohaacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo (HP 21105 ndash
1115)96
Segundo tal concepccedilatildeo uma condicional verdadeira eacute aquela para a qual eacute impossiacutevel
que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsa Tal concepccedilatildeo envolve uma
teoria de modalidade97
A terceira concepccedilatildeo mencionada por Sexto eacute atribuiacuteda pelos
comentadores a Crisipo embora o nome deste natildeo seja mencionado na passagem
Os que introduzem lta noccedilatildeo degt conexatildeo98
dizem ser verdadeira a
condicional quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
89
Caliacutemaco foi um famoso gramaacutetico e poeta chefe da Biblioteca de Alexandria entre 260 e 240 aC e
professor de Eratoacutestenes e Apolocircnio de Rhodes Quanto ao debate das condicionais cf tambeacutem Ciacutecero
Academica 2143 (ldquoQue grande disputa haacute sobre o elementar ponto da doutrina loacutegica [das condicionais]
Diodoro tem uma visatildeo Philo outra e Crisipo uma terceirardquo) Cf tambeacutem AM 8113 ss HP 2110 90
Philo Dialeacutetico ou de Meacutegara (c 300 aC) Eacute dito de Meacutegara por sua associaccedilatildeo agrave escola megaacuterica mas
sua cidade natal eacute desconhecida 91
ἀρχόμενον sinocircnimo de ἡγούμενον 92
λῆγον oposto a ἡγούμενον a consequente 93
ὁ μὲν γὰρ Φίλων φησὶν ὑγιὲς εἶναι συνημμένον τὸ μὴ ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς καὶ λῆγον ἐπὶ ψεῦδος
οἷον ἡμέρας οὔσης καὶ ἐμοῦ διαλεγομένου τὸ lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἐγὼ διαλέγομαιrsquo 94
ldquoSe eacute dia eu conversordquo 95
Κατάληξις 96
ὁ δὲ Διόδωρος ὃ μήτε ἐνεδέχετο μήτε ἐνδέχεται ἀρχόμενον ἀπὸ ἀληθοῦς λήγειν ἐπὶ ψεῦδος καθ ὃν τὸ
μὲν εἰρημένον συνημμένον ψεῦδος εἶναι δοκεῖ ἐπεὶ ἡμέρας μὲν οὔσης ἐμοῦ δὲ σιωπήσαντος ἀπὸ
ἀληθοῦς ἀρξά μενον ἐπὶ ψεῦδος καταλήξει ἐκεῖνο δὲ ἀληθές lsquoεἰ οὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖα
ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo ἀεὶ γὰρ ἀπὸ ψεύδους ἀρχόμενον τοῦ lsquoοὐκ ἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων
στοιχεῖαrsquo εἰς ἀληθὲς καταλήξει καταὐτὸν τὸ lsquoἔστιν ἀμερῆ τῶν ὄντων στοιχεῖαrsquo 97
Natildeo discutiremos neste artigo as concepccedilotildees de modalidade seja a de Diodoro seja a de Crisipo Para
mais informaccedilotildees sobre a concepccedilatildeo de Diodoro sobre as condicionais cf Mates 1949 98
συνάρτησις que significa literalmente junccedilatildeo uniatildeo conexatildeo coesatildeo
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
332 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
com a antecedente segundo esses a condicional dita acima seraacute
falsa99
mas esta eacute verdadeira ldquoSe eacute dia eacute diardquo (HP 21115-1121)100
Bobzien (2003 p 94 Cf DL 781) nos diz que em meio a tal debate ldquoconcordava-se
[] que a condicional lsquoanunciarsquo uma relaccedilatildeo de consequecircncia [] que sua consequente
segue de sua antecedenterdquo e que numa condicional verdadeira ldquose a antecedente eacute
verdadeira a consequente tambeacutem o eacuterdquo o que de acordo com o princiacutepio da bivalecircncia
significa que ldquonatildeo eacute o caso que a antecedente seja verdadeira e a consequente falsardquo o
que equivale ao criteacuterio de Philo Quanto agrave identificaccedilatildeo da posiccedilatildeo acima com aquela
de Crisipo e dos estoicos tal se faz cruzando outras citaccedilotildees acerca da concepccedilatildeo de
Crisipo sobre as condicionais Tomemos o que nos diz Ciacutecero em Do Destino
[1205] Sejam entatildeo as observaccedilotildees (percepta) dos astroacutelogos deste
modo ldquoSe algueacutem por exemplo nasceu quando Sirius101
despontou
natildeo morreraacute no marrdquo Cuidado Crisipo natildeo desertes a tua causa
sobre a qual grande disputa haacute entre tu e Diodoro o poderoso
dialeacutetico Se pois eacute verdadeiro que assim estaacute conectado ldquoSe algueacutem
nasceu quando Sirius despontou natildeo morreraacute no marrdquo tambeacutem isto eacute
verdade ldquoSe Faacutebio nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo
morreraacute no marrdquo [1210] Entatildeo entram em conflito (pugnant) entre si
ldquoFaacutebio nasceu quando Sirius despontou no Orienterdquo e ldquoFaacutebio morreraacute
no marrdquo e jaacute que eacute certo predicar de Faacutebio ter nascido ao despontar
de Sirius estas tambeacutem entram conflitam tanto Faacutebio existir [1215] e
estar para morrer no mar Entatildeo esta conjunccedilatildeo tambeacutem eacute conflituosa
ldquoTanto existe Faacutebio quanto Faacutebio morreraacute no marrdquo [] [151] Aqui
Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo [155] mas antes assim
falem ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius quanto
que morra no marrdquo (Ciacutecero Do Destino 12-15)102
99
ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das coisasrdquo 100
οἱ δὲ τὴν συνάρτησιν εἰσάγοντες ὑγιὲς εἶναί φασι συνημμένον ὅταν τὸ ἀντικείμενον τῷ ἐν αὐτῷ
λήγοντι μάχηται τῷ ἐν αὐτῷ ἡγουμένῳ καθ οὓς τὰ μὲν εἰρημένα συνημμένα ἔσται μοχθηρά ἐκεῖνο δὲ
ἀληθές lsquoεἰ ἡμέρα ἔστιν ἡμέρα ἔστινrsquo 101
Sirius (Alpha Canis Majoris ou Canicula em latim) localizada na constelaccedilatildeo de Canis Major eacute a
estrela mais brilhante no ceacuteu noturno 102
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
333 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Tal passagem parece supor a posiccedilatildeo mencionada por Sexto acima pois Crisipo
segundo Ciacutecero considera que natildeo havendo real conflito entre ldquoFaacutebio nasceu quando
Sirius despontourdquo e ldquoFaacutebio morreraacute no marrdquo natildeo cabe aqui a condicional ldquoSe Faacutebio
nasceu quando Sirius despontou Faacutebio natildeo morreraacute no marrdquo mas antes a conjunccedilatildeo
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto Faacutebio nasceu quando Sirius despontou quanto morreraacute no marrdquo
Confirmaccedilatildeo adicional temos por Dioacutegenes Laeacutercio que nos diz
Ainda dos axiacuteōmata quanto ao verdadeiro e ao falso satildeo
contraditoacuterios uns dos outros aqueles que satildeo um a negaccedilatildeo do outro
como por exemplo ldquoEacute diardquo e ldquoNatildeo eacute diardquo Com efeito eacute verdadeira a
condicional da qual a contraditoacuteria da consequente entra em conflito
(maacutechetai) como a antecedente por exemplo ldquoSe eacute dia haacute luzrdquo Isso eacute
verdadeiro pois ldquoNatildeo haacute luzrdquo contraditoacuteria da consequente entra em
conflito com ldquoEacute diardquo Mas eacute falsa a condicional da qual a contraditoacuteria
da consequente natildeo entra em conflito com a antecedente como por
exemplo ldquoSe eacute dia Dion caminhardquo Pois ldquoDion natildeo caminhardquo natildeo
entra em conflito com ldquoEacute diardquo (DL 773)103
Quanto agrave noccedilatildeo de conflito envolvida aqui Bobzien (2003 p 95) observa que eacute
historicamente inapropriado indagar se Crisipo se referia a um conflito empiacuterico
analiacutetico ou formal na medida em que faltava aparato conceitual para acomodar tais
noccedilotildees agrave loacutegica heleniacutestica Poreacutem podemos afirmar que o que se chama hoje de
incompatibilidade formal (ou loacutegica) eacute o que subjazia agrave noccedilatildeo de conflito de Crisipo jaacute
que axiacuteōmata como ldquoSe haacute luz haacute luzrdquo eram considerados verdadeiros (Cf Ciacutecero
Academica 298) Mas tambeacutem alguns casos de incompatibilidade empiacuterica eram
aceitos por alguns estoicos ndash por exemplo ldquoSe Teognis tem um ferimento no coraccedilatildeo
Teognis morreraacuterdquo (AM 8254-5)104
bem como alguns casos de incompatibilidade
analiacutetica ndash por exemplo ldquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moverdquo105
Passemos agora aos axiacuteōmata disjuntivos Os estoicos datildeo especial atenccedilatildeo ao que se
chama hoje de disjunccedilatildeo exclusiva que se distingue da disjunccedilatildeo inclusiva por natildeo ser
verdadeira no caso em que as proposiccedilotildees que a compotildeem satildeo verdadeiras Quanto a
103
ἔτι τῶν ἀξιωμάτων κατά τ ἀλήθειαν καὶ ψεῦδος ἀντικείμενα ἀλλήλοις ἐστίν ὧν τὸ ἕτερον
τοῦ ἑτέρου ἐστὶν ἀποφατικόν οἷον τὸ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo καὶ τὸ ldquoοὐχ ἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον οὖν ἀληθές
ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστιrdquo τοῦτ
ἀληθές ἐστι τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ φῶςrdquo ἀντικείμενον τῷ λήγοντι μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo συνημμένον δὲ
ψεῦδός ἐστιν οὗ τὸ ἀντικείμενον τοῦ λήγοντος οὐ μάχεται τῷ ἡγουμένῳ οἷον ldquoεἰ ἡμέρα ἐστί Δίων
περιπατεῖrdquo τὸ γὰρ ldquoοὐχὶ Δίων περιπατεῖrdquo οὐ μάχεται τῷ ldquoἡμέρα ἐστίrdquo 104
Cf Long amp Sedley 1987 (1) p 35 ldquoembora nenhuma definiccedilatildeo precisa de conflito tenha sobrevivido
[] eacute bem claro [hellip] que se trata de uma incompatibilidade conceitual e natildeo empiacutericardquo 105
Cf Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16891 Mas o que os gregos chamam de axiacuteōma alguns dos nossos
chamam ldquoadiunctumrdquo outros ldquoconexumrdquo Esse ldquoconexumrdquo eacute como lsquoSe Platatildeo anda Platatildeo se moversquordquo
(Sed quod Graeci συνημμένον ἀξίωμα dicunt id alii nostrorum adiunctum alii conexum dixerunt Id
conexum tale est si Plato ambulat Plato mouetur
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
334 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
isso Dioacutegenes Laeacutercio nos informa ldquoA disjunccedilatildeo ltexclusivagt eacute disjungida pelo
conectivo disjuntivo ldquoourdquo como por exemplo ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo Esse conectivo
proclama que um dos axiacuteōmata eacute falsordquo (DL 772)106
Aulo Geacutelio poreacutem acrescenta
outro criteacuterio para tal disjunccedilatildeo
(168121) Haacute igualmente outro ltaxiacuteōma natildeo-simplesgt que os gregos
chamam diezeugmeacutenon axiacuteōma107
e noacutes chamamos disiunctum108
Esse lt axiacuteōmagt eacute deste modo ldquoOu mal eacute o prazer ou eacute bom ou nem
bom nem maurdquo (168131) Eacute necessaacuterio que todos os axiacuteōmata que
satildeo disjungidos estejam em conflito entre si e que as contraditoacuterias
deles que os gregos chamam de antikeiacutemena109
tambeacutem se oponham
entre si De todos ltos axiacuteōmatagt (168141) disjungidos um deve ser
verdadeiro os demais falsos Porque se ou nenhum eacute verdadeiro ou
todos satildeo verdadeiros ou mais que um eacute verdadeiro ou os disjuntos
natildeo estatildeo em conflito ou suas contraditoacuterias natildeo se opotildeem
(168145) entatildeo essa proposiccedilatildeo disjuntiva eacute falsa e eacute chamada
paradiezeugmeacutenon110
assim como esta na qual as contraditoacuterias natildeo
se opotildeem ldquoOu corres ou caminhas ou ficas paradordquo Porque os
axiacuteōmata se opotildeem mas as contraditoacuterias deles natildeo estatildeo em conflito
pois ldquonatildeo andarrdquo e ldquonatildeo ficar paradordquo e ldquonatildeo correrrdquo (1681410) natildeo
satildeo contraditoacuterios entre si jaacute que satildeo chamados ldquocontraditoacuteriosrdquo os
ltaxiacuteōmatagt que natildeo podem ser simultaneamente verdadeiros pois
podes simultaneamente nem andar nem permanecer parado nem
correr (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 168121-1681410)111
Assim de acordo com esse testemunho de Aulo Geacutelio a disjunccedilatildeo exclusiva dos
estoicos continha como sua noccedilatildeo de implicaccedilatildeo um componente que vai aleacutem da mera
verofuncionalidade a necessidade de que as contraditoacuterias dos disjuntos estejam em
106
διεζευγμένον δέ ἐστιν ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἤτοιrdquo διαζευκτικοῦ συνδέσμου διέζευκται οἷον ldquoἤτοι ἡμέρα ἐστὶν ἢ
νύξ ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος οὗτος τὸ ἕτερον τῶν ἀξιωμάτων ψεῦδος εἶναι 107
διεζευγμένον ἀξίωμα 108
proposiccedilatildeo disjuntiva 109
ἀντικείμενα 110
Παραδιεζευγμένον essa equivale ao que se chama hoje de lsquodisjunccedilatildeo inclusivarsquo Sobre seu criteacuterio de
verdade temos o testemunho de Galeno (Inst Log 12) segundo o qual ela deveria ter um ou mais
disjuntos verdadeiros Tal eacute reafirmado por Apolocircnio Diacutesculo (Periacute Syndeacutesmōn 219) que assevera ser a
distinccedilatildeo entre essa disjunccedilatildeo e a exclusiva justamente poder ter mais de um disjunto verdadeiro aleacutem de
mencionar a comutatividade de ambos os tipos de disjunccedilatildeo (Periacute Syndeacutesmōn 484 493) Entretanto com
exceccedilatildeo dessas fontes a disjunccedilatildeo inclusiva natildeo eacute mencionada 111
Est item aliud quod Graeci διεζευγμένον ἀξίωμα nos disiunctum dicimus Id huiuscemodi est aut
malum est uoluptas aut bonum aut neque bonum neque malum est 168131 Omnia autem quae
disiunguntur pugnantia esse inter sese oportet eorumque opposita quae ἀντικείμενα Graeci dicunt ea
quoque ipsa inter se aduersa esse Ex omnibus quae 168141 disiunguntur unum esse uerum debet falsa
cetera Quod si aut nihil omnium uerum aut omnia pluraue quam unum uera erunt aut quae disiuncta
sunt non pugnabunt aut quae opposita eorum sunt contraria inter sese non erunt 168145 tunc id
disiunctum mendacium est et appellatur διεζευγμένον sicuti hoc est in quo quae opposita non sunt
contraria aut curris aut ambulas aut stas Nam ipsa quidem inter se aduersa sunt sed opposita eorum non
pugnant non ambulare enim et non stare et non currere 1681410 contraria inter sese non sunt
quoniam contraria ea dicuntur quae simul uera esse non queunt possis enim simul eodemque tempore
neque ambulare neque stare neque currere
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
335 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
conflito112
O proacuteprio Geacutelio nos informa ainda outra propriedade que a disjunccedilatildeo deve
possuir Segundo ele o seguinte raciociacutenio eacute equivocado
Ou casas com uma bela mulher ou com uma feia Se ela eacute bela a
dividiraacutes com outros Se ela eacute feia ela seraacute um castigo Mas ambas as
coisas natildeo satildeo desejaacuteveis Logo natildeo cases (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas
5111-2)
Geacutelio argumenta que a disjunccedilatildeo que serve de premissa maior para o argumento acima
natildeo eacute ldquojustardquo pois natildeo eacute necessaacuterio que um dos disjuntos seja verdadeiro o que para
ele eacute requerido numa disjunccedilatildeo verdadeira (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 511 9)113
Em
outra parte Aulo Geacutelio refere-se agrave seguinte disjunccedilatildeo como falsa pelo mesmo motivo
ldquoAs ordens de um pai satildeo ou dignas ou indignasrdquo pois a ela falta o terceiro disjunto
ldquonem dignas nem indignasrdquo (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 2721)
Entretanto o axiacuteōma conjuntivo (sympeplegmeacutenon) para os estoicos eacute puramente
verofuncional ldquoO axiacuteōma conjuntivo114
eacute um axiacuteōma que eacute conjungido por alguns
conectivos de conjunccedilatildeo como por exemplo lsquotanto eacute dia quanto haacute luzrsquordquo (DL 773)
Geacutelio salienta o criteacuterio de verdade de tais axiacuteōmata
[] O que eles chamam de sympeplegmeacutenon noacutes chamamos ou de
coniunctum ou de copulatum115
que eacute deste modo lsquoScipio filho de
Paulo tanto foi duas vezes cocircnsul quanto triunfou e foi censor e foi
colega como censor de L Mumiusrsquo Se em toda a conjunccedilatildeo um
ltaxiacuteōmagt eacute falso mesmo se os demais satildeo verdadeiros a conjunccedilatildeo
toda eacute dita falsa (Aulo Geacutelio Noites Aacuteticas 16810-11)116
Sexto Empiacuterico criticando esse criteacuterio de verdade da conjunccedilatildeo transmitiu-nos a
defesa estoica dele Segundo os estoicos assim como um casaco natildeo eacute dito lsquointactorsquo117
112
Sexto (HP 2191) parece referir-se a essa necessidade embora sua linguagem natildeo seja clara ldquoPois eacute
proclamada verdadeira a disjunccedilatildeo na qual um ltdos disjuntosgt eacute verdadeiro e o restante ou os restantes
falsos por conflito (metaacute maacutechecircs)rdquo --τὸ γὰρ ὑγιὲς διεζευγμένον ἐπαγγέλλεται ἓν τῶν ἐν αὐτῷ ὑγιὲς εἶναι
τὸ δὲ λοιπὸν ἢ τὰ λοιπὰ ψεῦδος ἢ ψευδῆ μετὰ μάχης 113
Non ratum id neque iustum diiunctiuum esse ait quoniam non necessum sit alterum ex duobus quae
diiunguntur uerum esse quod in proloacutequio diiunctiuo necessarium est 114
συμπεπλεγμένον 115
O que chamamos hoje de ldquoproposiccedilatildeo conjuntivardquo ou simplesmente ldquoconjunccedilatildeordquo 116
Item quod illi συμπεπλεγμένον nos vel coniunctum uel copulatum dicimus quod est huiuscemodi
P Scipio Pauli filius et bis consul fuit et triumphauit et censura functus est et collega in censura L
Mummii fuit In omni autem coniuncto si unum est mendacium etiamsi cetera uera sunt totum esse
mendacium dicitur Cf AM 8125 Epicteto Diatribes 298 117
ὑγιής termo entatildeo usado relativamente aos axiacuteōmata designando os verdadeiros e que significa
literalmente ldquosaudaacutevelrdquo Em inglecircs o termo eacute normalmente traduzido por ldquosoundrdquo Na falta de termo
melhor decidi traduzi-lo simplesmente por ldquoverdadeirordquo No caso presente referindo-se a um casaco
decido traduzi-lo por ldquointactordquo
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
336 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
se possuir um uacutenico furo assim tambeacutem um axiacuteōma conjuntivo natildeo seraacute verdadeiro se
contiver um uacutenico axiacuteōma falso (AM 2191)
Aleacutem desses axiacuteōmata natildeo-simples Dioacutegenes Laeacutercio refere-se tambeacutem ao pseudo-
condicional (parasynēmmeacutenon na forma ldquoJaacute que p qrdquo118
) O criteacuterio de verdade de tal
axiacuteōma eacute o seguinte (i) a consequente deve seguir da antecedente e (ii) a antecedente
deve ser verdadeira A concepccedilatildeo de tal axiacuteōma eacute atribuiacuteda por Dioacutegenes a Crinis que
teria falado sobre ele em sua obra (hoje perdida) Arte Dialeacutetica119
O exemplo dado por
Dioacutegenes eacute ldquoJaacute que eacute dia haacute luzrdquo que eacute verdadeiro quando eacute o caso que eacute dia e por
isso haacute luz Benson Mates (1961 p 54-5) observa que natildeo eacute claro o que o ldquoseguirrdquo
(akoloucircthein) significa aiacute pois referindo-se agrave implicaccedilatildeo material teria o mesmo valor
da conjunccedilatildeo o que natildeo parece ser o caso
Temos ainda o axiacuteōma causal120
no qual haacute uma relaccedilatildeo causal entre os axiacuteōmata que o
compotildeem ndash por exemplo ldquoPorque eacute dia haacute luzrdquo Tal conectivo evidentemente natildeo eacute
verofuncional (DL 77274) Embora outros tantos conectivos sejam mencionados por
fontes antigas121
eles natildeo possuem caraacuteter verofuncional Assim podemos dizer que a
negaccedilatildeo (embora natildeo vista como conectivo) a implicaccedilatildeo a conjunccedilatildeo e a disjunccedilatildeo
exclusiva formam a base do caacutelculo proposicional estoico
Vejamos agora a questatildeo da inter-definibilidade dos conectivos Como observa Mates
(1961 p 65) embora essa descoberta seja atribuiacuteda ora aos medievais ora a Leibniz
ela data pelo menos de 250 aC A primeira equivalecircncia entre axiacuteōmata natildeo-simples eacute
aquela mencionada na passagem citada acima do Do Destino de Ciacutecero
Aqui Crisipo agitando-se espera estar errados os caldeus e os demais
adivinhos e que natildeo usem conjunccedilotildees para que assim suas
observaccedilotildees pronunciem ldquoSe algueacutem nasceu ao despontar da
Caniacutecula no oriente natildeo morreraacute no marrdquo mas antes assim falem
ldquoNatildeo eacute o caso que tanto nasccedila ao despontar de Sirius e que morra no
marrdquo (Ciacutecero Do Destino 15-16)122
118
Em grego ldquoepeirdquo 119
A passagem em grego referente agrave pseudo-condicional eacute a seguinte παρασυνημμένον δέ ἐστιν ὡς ὁ
Κρῖνίς φησιν ἐν τῇ Διαλεκτικῇ τέχνῃ ἀξίωμα ὃ ὑπὸ τοῦ ldquoἐπείrdquo συνδέσμου παρασυνῆπται ἀρχόμενον ἀπ
ἀξιώματος καὶ λῆγον εἰς ἀξίωμα οἷον ldquoἐπεὶ ἡμέρα ἐστί φῶς ἐστινrdquo ἐπαγγέλλεται δ ὁ σύνδεσμος
ἀκολουθεῖν τε τὸ δεύτερον τῷ πρώτῳ καὶ τὸ πρῶτον ὑφεστάναι (DL 771-72) 120
αἰτιώδης 121
Cf DL 771-73 onde satildeo mencionados outros conectivos natildeo-verofuncionais 122
Sint igitur astrologorum percepta huius modi Si quis verbi causa oriente Canicula natus est is in mari
non morietur Vigila Chrysippe ne tuam causam in qua 125 tibi cum Diodoro valente dialectico
magna luctatio est deseras Si enim est verum quod ita conectitur Si quis oriente Canicula natus est in
mari non morietur illud quoque verum est Si Fabius oriente Canicula natus est Fabius in mari non
morietur 1210 Pugnant igitur haec inter se Fabium oriente Canicula natum esse et Fabium in mari
moriturum et quoniam certum in Fabio ponitur natum esse eum Canicula oriente haec quoque pugnant
et esse Fabium et in mari esse moriturum Ergo haec 1215 quoque coniunctio est ex repugnantibus Et
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
337 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Long amp Sedley (1987 (1) p 211) observam que essa passagem mostra que ldquoCrisipo
reteve o uso da condicional material de Philo para expressar uma forma mais fraca de
conexatildeo mas para evitar confusatildeo ele a reformulou como uma conjunccedilatildeo negadardquo ie
Crisipo estava ciente da equivalecircncia entre ab (implicaccedilatildeo material ou philonica) e
~(a~b)123
Galeno nos informa tambeacutem sobre a seguinte equivalecircncia
[] uma frase tal como ldquoOu eacute dia ou eacute noiterdquo lteacute chamada degt axiacuteōma
disjuntivo pelos filoacutesofos mais novos e proacutetasis hipoteacutetica descontiacutenua
pelos antigos A proacutetasis descontiacutenua pode ser igual a tal frase lsquoSe
natildeo eacute dia eacute noitersquo a qual quando dita na forma de condicional eacute
chamada de condicional pelos quantos que somente datildeo atenccedilatildeo aos
sons mas de disjunccedilatildeo pelos quantos que datildeo atenccedilatildeo agrave natureza das
coisas Do mesmo modo a forma de tal qualidade do dito ldquoSe natildeo eacute
noite eacute diardquo eacute um axiacuteōma disjuntivo pela proacutepria natureza das coisas
mas tem a forma de condicional segundo o que eacute dito (Galeno
Institutio Logica 34- 35)124
Mates (1961 p 56) observa que Galeno utiliza aqui natildeo o termo estoico para disjunccedilatildeo
inclusiva (paradiezeugmeacutenon) mas o usado para a disjunccedilatildeo exclusiva (diezeugmeacutenon)
e ele tem essa mesma disjunccedilatildeo em vista pelo exemplo que daacute e por remetecirc-la aos que
datildeo atenccedilatildeo ao que eacute dito que Galeno expressamente afirma serem os seguidores de
Crisipo em outra passagem (Galeno Institutio Logica 461)125
Assim natildeo teriacuteamos aiacute
a afirmaccedilatildeo da equivalecircncia entre (p v q) e (~p rarr q) como o pensa Lukasiewicz (Apud
Mates 1961 p 56) mas antes entre ~ (p v q) e p harr q Poreacutem como observa Mates
(1961 p 56) as evidecircncias satildeo inconclusivas e natildeo nos permitem afirmar que os
estoicos tivessem ciecircncia de tal equivalecircncia visto que em parte alguma a relaccedilatildeo
bicondicional eacute mencionada na Antiguidade
est Fabius et in mari Fabius morietur [hellip] 151 Hoc loco Chrysippus aestuans falli sperat Chaldaeos
ceterosque divinos neque eos usuros esse coniunctionibus ut ita sua percepta pronuntient Si quis natus
est oriente Canicula is in mari non morietur 155 sed potius ita dicant Non et natus est quis oriente
Canicula et is in mari morietur 123
Barnes (1997 p 31-2) propotildee uma releitura de um trecho de uma diatribe epicteteana (Diatribes
I81) pela qual seria afirmada a equivalecircncia entre proposiccedilotildees na forma (pq)rarrr e ~((pq) ~r) que eacute
formalmente idecircntica agrave afirmada na passagem acima 124
ὡς ὀνομάζεσθαι τὸν μὲν τοιοῦτον λόγον lsquoεἰ ἡμέρα ἐστίν ὁ ἥλιος ὑπὲρ γῆς ἐστινrsquo συνημμένον ἀξίωμα
κατά γε τοὺς νεωτέρους φιλοσόφους κατὰ μέντοι τοὺς παλαιοὺς πρότασιν ὑποθετικὴν κατὰ συνέχειαν
τοὺς δέ γε τοιούτους lsquoἤτοι γ ἡμέρα ἐστὶν ἢ νύξ ἐστιrsquo διεζευγμένον μὲν ἀξίωμα παρὰ τοῖς νεωτέροις
φιλοσόφοις πρότασιν δὲ ὑποθετικὴν κατὰ διαίρεσιν παρὰ τοῖς παλαιοῖς ἴσον δὲ ἡ διαιρετικὴ πρότασις
δύναται τῷ τοιούτῳ λόγῳ lsquoεἰ μὴ ἡμέρα ἐστί νύξ ἐστινrsquo ὃν ἐν σχήματι λέξεως συνημμένῳ λεγόμενον
ὅσοι μὲν ταῖς φωναῖς μόνον προσέχουσι συνημμένον ὀνομάζουσιν ὅσοι δὲ τῇ φύσει τῶν πραγμάτων
διεζευγμένον ὡσαύτως δὲ καὶ τὸ τοιοῦτον εἶδος τῆς λέξεως lsquoεἰ μὴ νύξ ἐστιν ἡμέρα ἐστίνrsquo διεζευγμένον
ἐστὶν ἀξίωμα τῇ φύσει τῶν πραγμάτων αὐτῇ συνημμένου δὲ ἰδέαν ἔχει τῇ λέξει 125
Entretanto como observa Mates (1961 p 57) natildeo eacute claro se a expressatildeo ldquoseguidores de Crisipordquo se
refere aos estoicos como um todo ou a uma facccedilatildeo destes
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
338 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
As equivalecircncias reconhecidas pelos estoicos dever-se-iam agrave distinccedilatildeo de Crisipo entre
sua concepccedilatildeo de condicional e aquela de Philo Crisipo insistiria em dispor a
implicaccedilatildeo material de Philo na forma de uma conjunccedilatildeo negada exatamente para
distingui-la de sua proacutepria concepccedilatildeo de condicional que supotildee conflito entre a
contraditoacuteria da consequente e a antecedente e que eacute o que hoje chamamos de uma
implicaccedilatildeo estrita
Podemos aprofundar essas reflexotildees contra-argumentando uma asserccedilatildeo de Kneale amp
Kneale (1962 p 148) segundo a qual os estoicos pareciam natildeo estar cientes da
diferenccedila que haacute entre proposiccedilotildees verofuncionais (cuja verdade ou falsidade depende
apenas da verdade e falsidade de seus componentes) e natildeo verofuncionais Na verdade
a apresentaccedilatildeo do debate sobre as condicionais feita por Sexto e apresentada acima (HP
21101 ss) evidencia que Crisipo conscientemente rejeitou as concepccedilotildees de Philo e de
Diodoro buscando evitar o que alguns chamam hoje de paradoxos da implicaccedilatildeo
material e valorizando o que hoje se chama de implicaccedilatildeo estrita Segundo a concepccedilatildeo
de Philo que eacute exatamente aquela da implicaccedilatildeo material contemporacircnea uma
condicional somente eacute falsa quando a antecedente eacute verdadeira e a consequente eacute falsa
Assim uma implicaccedilatildeo material eacute verdadeira tanto nos casos em que as consequentes e
as antecedentes satildeo simultaneamente verdadeiras e falsas quanto no caso em que a
antecedente eacute falsa e a consequente eacute verdadeira (pelo que a implicaccedilatildeo material ararrb
equivale a ~(a~b) Este uacuteltimo caso gera os assim por vezes chamados ldquoparadoxos da
implicaccedilatildeo materialrdquo pois a partir disso qualquer implicaccedilatildeo material que tenha como
antecedente uma falsidade eacute verdadeira inclusive uma condicional que tenha como
antecedente a contraditoacuteria de uma consequente verdadeira Por exemplo ldquoSe natildeo estou
escrevendo estou escrevendordquo eacute verdadeira quando eu estiver escrevendo Um exemplo
como esse eacute dado para a implicaccedilatildeo de Diodoro que distingue-se da material pelo fato
de que soacute seraacute verdadeira se natildeo for possiacutevel que a antecedente seja em algum momento
verdadeira ldquoSe natildeo haacute elementos indivisiacuteveis das coisas haacute elementos indivisiacuteveis das
coisasrdquo (HP 21105 ndash 1115) Cremos que justamente para evitar essa possibilidade
Crisipo propotildee um criteacuterio natildeo meramente verofuncional O caraacuteter bizarro da
implicaccedilatildeo aplicada a certos casos foi reconhecido por uma seacuterie de loacutegicos
contemporacircneos como por exemplo Rescher que nos daacute como exemplo disso o
seguinte
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
339 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
Vocecirc estaacute em Nova Iorque e pede ao seu agente de viagens uma rota
para Toacutequio Ele passa a vender a vocecirc um ticket para Paris Vocecirc
pede uma explicaccedilatildeo e ele replica ldquoSe vocecirc estaacute em Paris vocecirc estaacute
em Toacutequiordquo Sua viagem eacute uma decepccedilatildeo No retorno vocecirc o acusa de
tecirc-lo enganado Ele responde ldquoo que eu disse a vocecirc eacute verdade
Conversamos em Nova Iorque assim a antecedente ldquoVocecirc estaacute em
Parisrdquo eacute falsa E eacute claro uma condicional (material) com uma
antecedente falsa eacute verdadeirardquo Eacute certo que nem vocecirc nem o juiz ou
juacuteri no seu processo contra a fraudulenta deturpaccedilatildeo ficariam
satisfeitos com a explicaccedilatildeo do agente de viagens (2007 p 41)
A partir disso Rescher observa que a implicaccedilatildeo material natildeo eacute capaz de capturar a
ideia de condicionalizaccedilatildeo em geral Pelo exemplo de Sexto supracitado fica claro que
os antigos estavam cientes dessa dificuldade Assim podemos supor que Crisipo tenta
evitar tais paradoxos atraveacutes de sua proacutepria concepccedilatildeo das condicionais inclusive
reservando para a sua concepccedilatildeo a forma da implicaccedilatildeo e enfatizando que a implicaccedilatildeo
material equivale a uma conjunccedilatildeo negada (ie ararrb equiv ~(a ~b)) Como observa
Rescher essa equivalecircncia natildeo vale para a implicaccedilatildeo de Crisipo que soacute eacute verdadeira
quando a contraditoacuteria da consequente entra em conflito com a antecedente ou seja
quando (p rarr q) IFF (p ~q) |- contradiccedilatildeo Segundo esta concepccedilatildeo ensina-nos
Rescher (2007 p 49) exige-se da implicaccedilatildeo uma conexatildeo conceitual e natildeo mais a
verofuncionalidade eacute o centro das atenccedilotildees126
Assim Crisipo teve diante de si a
possibilidade de adotar uma concepccedilatildeo meramente verofuncional de implicaccedilatildeo127
mas
natildeo o fez E essa decisatildeo refletiu-se em seu sistema loacutegico e em sua concepccedilatildeo dos
axiacuteōmata Portanto o caraacuteter natildeo verofuncional da implicaccedilatildeo e da disjunccedilatildeo128
para
Crisipo e seus seguidores natildeo eacute como pensaram os Kneale uma deficiecircncia da loacutegica
estoica mas antes uma escolha consciente
REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSICAS On Aristotles Prior analytics Trad Jonathan
Barnes Ithaca Cornell University Press 1991
ALEXANDRE DE AFRODIacuteSIAS Eis ta Topika Aristotelous hypomnemata in Topica
Aristotelis commentarii Veneza In aedibvs Aldi et Andreae Soceri 1513
AMOcircNIO On Aristotles on Interpretation 1-8 (Ancient Commentators on Aristotle)
David Blank (Trad) Cornell Cornell University Press 1996
126
Como observa Rescher as implicaccedilotildees de Crisipo satildeo estritas pois |- p rarr ⟥ p 127
O que poderia ter feito simplesmente adotando a concepccedilatildeo de Philo 128
Evidentemente derivada da concepccedilatildeo de implicaccedilatildeo de Crisipo jaacute que ⟥(ararr 119901) equivale a ⟥ (~a v b)
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
340 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
APOLOcircNIO DIacuteSCULO Scripta Minora Periacute Sundesmon Gramatici graeci volume 2
Leipzig Teubner 1878
APULEIO The Logic of Apuleius Trad David George LondeyCarmen J Johanson
Leiden Brill 1987
AREAS J ldquoAs veias abertas da ontologiardquo O que nos faz pensar 15 2012 p 155-167
AULO GEacuteLIO Attic Nights Trad J H Rolfe Harvard Loeb 1927
BARNES J Logic and Imperial Stoa Leiden Brill 1997
BOBZIEN S ldquoStoic Logicrdquo The Cambridge Companion to Stoics Edited by Inwood
Brad Cambridge Cambridge University Press 2003
CIacuteCERO On the Nature of the Gods Academics Trad H Rackham Harvard Loeb
1933
CIacuteCERO On the Orator Book 3 On Fate Stoic Paradoxes Divisions of Oratory Trad
H Rackham Harvard Loeb 1942
DIOacuteGENES LAEacuteRCIO Lives of Eminent Philosophers Trad R D Hicks Harvard
Loeb 1925
DROZDEK A ldquoLektoacuten Stoic logic and ontologyrdquo Acta Ant Hung no 42 2002 p
93-104
EPICTETUS Discourses Trad Oldfather Harvard Loeb 1925
GALENO Omnia quae extant opera Veneza Lunta 1550
KNEALE W KNEALE M The development of logic Oxford Clarendon Press
1962
LONG amp SEDLEY Hellenistic Philosophers (volume 1 e 2) Cambridge Cambridge
University Press 1987
LUKASIEWICZ ldquoOn the History of the Logic of Propositionrdquo [1934] Jan Lukasiewicz
Selected Works L Borkowski (Ed) Amsterdam North-Holland Pub Co 1970
MATES B ldquoDiodorean Implicationrdquo IN Philosophical Review 58 3 1949 p 234-
242
MATES B Stoic Logic Berkeley-Los Angeles University of California Press 1961
PEIRCE Collected Papers vol 3 Cambridge Harvard 1931-1934
PLUTARCO Moralia Volume XIII Part 2 Stoic Essays Trad H Cherniss Harvard
Loeb 1976
POSIDOcircNIO Posidonius Volume 3 The Translation of the Fragments (Cambridge
Classical Texts and Commentaries) Trad I G Kidd Cambridge Cambridge
University Press 2004
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880
341 | O que nos faz pensar nuacutemero 34 2014 (PUC-RJ)
PRANTL Geschichte der Logik im Abendlande Leipzig Hirzel 1855
RESCHER Conditionals Boston MIT 2007
SELLARS Stoicism Berkeley University of California Press 2006
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Logicians Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1935
SEXTO EMPIacuteRICO Outlines of Pyrrhonism Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1933
SEXTO EMPIacuteRICO Against the Professors Translated by R G Bury Harvard Loeb
Classical Library 1949
SIMPLIacuteCIO On Aristotles Categories Trad Barrie Fleet Ithaca Cornell University
Press 2002
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 1 Zeno or Zenonis Discipuli
[1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 2 Chrysippi Fragmenta
Logica et Physica [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 3 Chrysippi fragmenta
moralia Fragmenta Successorum Chrysippi [1903] Berlim De Gruyter 2005
VON ARNIM H Stoicorum Veterum Fragmenta Volume 4 Indeces [1905] Berlim
De Gruyter 2005
ZELLER Stoics Epicureans and Sceptics Trad O J Reichel Londres Longmans
Green and Co 1880