FACULDADE DE DIREITO
CRISTIANE DE OLIVEIRA SANTOS
DA (IN)EXISTÊNCIA DO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL NO SÉCULO XXI
CANOAS 2012
CRISTIANE DE OLIVEIRA SANTOS
DA (IN)EXISTÊNCIA DO TRABALHO ESCRAVO NO BRASIL NO SÉCULO XXI
Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito do Centro Universitário Ritter dos Reis como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientador: Professor Andrio Portuguez Fonseca.
CANOAS 2012
Dedico esta obra in memorian de minha querida mãe que, apesar dos poucos anos de convívio, ensinou-me a ter objetivos e buscá-los, mesmo sabendo da possibilidade de, num primeiro momento, não obter o resultado almejado, pois o importante é nunca desistir e recomeçar sempre. São lembranças suas que sempre estão comigo aonde quer que eu esteja.
E também a todas as pessoas que com seu trabalho, lutam pela igualdade, liberdade daqueles que ainda estão submetidos as condições análogas de escravo.
Agradeço a todas as pessoas que, em algum, momento fizeram parte da minha vida e contribuíram para minha formação, aos colegas, amigos, familiares e professores e também aos colegas de SAJUIR.
Em especial ao meu esposo Ronaldo Andreoli, pelo apoio incondicional ao longo dos anos, por compreender minha ausência em muitas situações e pelo carinho.
E ao professor Andrio Fonseca, pelos seus ensinamentos, incentivos e pela paciência que teve comigo ao longo desta caminhada, o meu obrigado.
“A injustiça em qualquer lugar é uma ameaça a justiça em todo lugar”
(Martin Luther King)
RESUMO
O presente trabalho aborda as variadas formas de escravidão, que apesar de estar oficialmente abolida de nosso país, ainda existe nas relações de trabalho nas mais diversas partes do território nacional, desde a área rural até nas metrópoles. Relações estas que agora tem como base a exploração do homem meramente por questões econômicas, não mais por raça como aconteceu no passado, mas que ainda viola o princípio da dignidade da pessoa humana. Também verifica as diferentes ações criadas ao longo dos anos para erradicação desta prática, com destaque as iniciativas governamentais estabelecidas para o combate do trabalho escravo no Brasil, desde o inicio da aceitação oficial de que o país vivenciava situações de trabalhadores em condições análogas ao de escravo até o progresso nos instrumentos de erradicação desta chaga histórica, que ainda aflige as sociedades contemporâneas, que é a possibilidade de expropriação de terras quando da comprovação de escravidão, em tramitação no Congresso Nacional desde o ano de 2001.
Palavras-chave: Trabalho escravo. Princípio da Dignidade Humana. Formas de erradicação.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 7
2 AS DIFERENTES FORMAS DO TRABALHO ESCRAVO - UMA CHAGA EM ABERTO ..................................................................................................................... 9
2.1 NOÇÕES HISTÓRICAS DA ESCRAVIDÃO .................................................. 9
2.2 A ESCRAVIDÃO MODERNA ....................................................................... 12
2.3 O TRABALHO ESCRAVO E O ORDENAMENTO JURÍDICO ..................... 14
2.3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana ...................................... 17
2.3.2 Princípios Gerais do Direito do Trabalho .......................................... 20
2.3.2.1 Princípio da Proteção. ..................................................................... 20
2.3.2.2 Princípio da Irrenunciabilidade ........................................................ 21
2.3.2.3 Princípio da Primazia da Realidade. ............................................... 22
2.4 ELEMENTOS QUE CARACTERIZAM AS CONDIÇÕES ANÁLOGAS DE ESCRAVO. ............................................................................................................ 22
2.4.1 Trabalho Forçado. ............................................................................... 23
2.4.2 Servidão por Dívida. ............................................................................ 25
2.4.3 Trabalho Degradante. .......................................................................... 30
2.4.4 Trabalho Escravo Contemporâneo .................................................... 33
3 MEDIDAS DE COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO.................................... 38
3.1 PLANO NACIONAL PARA ERRADICAÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO. .. 38
3.2 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO: ........................... 40
3.2.1 Medidas Administrativas .................................................................... 43
3.2.2 Medida Judicial .................................................................................... 48
3.3 EXPROPRIAÇÃO DE TERRAS - PEC Nº 438/ 2001 ................................... 52
3.4 RESTRIÇÃO AO CRÉDITO: LISTA SUJA ................................................... 54
3.5 RESPONSABILIDADE PENAL. ................................................................... 56
7
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho busca verificar a situação em que se encontram as
relações de trabalho no mundo contemporâneo, especificamente no nosso país, no
tocante à situação de condições que se caracterizam como trabalho escravo.
O trabalho escravo sempre existiu nas diferentes sociedades desde os
primórdios da civilização e por mais avançada que esteja à humanidade na
atualidade, ainda encontramos esta forma de subjugação da pessoa humana nos
dias atuais.
Começaremos com a investigação das diferentes formas de trabalho escravo,
sendo que para isso revisitaremos o histórico desta relação trabalhista ao longo das
organizações sociais, iniciando com as primeiras formas de escravidão conhecidas,
passando pela sua evolução até os tempos atuais.
Neste contexto será analisado como o ordenamento jurídico tratou do tema e
como foram feitas as suas alterações para que pudesse erradicar este problema,
bem como os princípios que estão sendo infringidos por esta prática.
Apesar de que essa conduta tenha sido oficialmente abolida e repudiada, os
infratores ainda conseguem criar formas de manter viva esta chaga nas sociedades
contemporâneas, fazendo-se necessário distinguirmos os elementos que
caracterizam as condições análogas de escravo com o intuito de que possamos
identifica-lo e combatê-lo. Entre as formas existentes de condições análogas de
escravo na atualidade podemos destacar a servidão por dívida, sendo essa mais
antiga e comum, com grande incidência no trabalho rural, quase sempre
acompanhada pelo cerceamento de liberdade. Mas é de suma importância
sabermos distinguir tais formas, para não ficarmos atrelados ao passado e a ideia de
que só existe o trabalho escravo quando o trabalhador está sobre vigilância,
impedido de abandonar o lugar.
Após, serão apresentadas as iniciativas que formam adotadas por entidades e
organismos multilaterais, pelos poderes judiciário, legislativo e executivo com
objetivo de erradicação das formas de trabalho escravo no Brasil, em especial a
8
função do Ministério Público do Trabalho, e sua forma de atuação e resultados.
Tendo em vista que este utiliza medidas judiciais e administrativas, como forma de
sanção para aqueles que são flagrados utilizando-se do trabalho em condições
análogas de escravo, como a ação civil pública, e a restrição ao crédito por
instituições financeiras, ações que vem mostrando-se eficazes no combate desta
mazela.
Por último falaremos sobre outras medidas que estão em discussão na
sociedade como a aprovação da PEC nº 438/2001, onde prevê a expropriação de
terras na comprovação de trabalho escravo, que no momento em que este trabalho
estava sendo elaborado, ainda estava em tramitação no Congresso Nacional.
Também será abordado o papel da Lista Suja, como mecanismo de coibição de
acesso aos infratores de fontes de recursos público e da sanção no âmbito penal,
esse sendo um fator de grande contribuição para a continuidade do trabalho
escravo, o número de pessoas punidas mostram-se inexpressivos, quando
comparados ao de fiscalização e resgates realizados pelos órgãos competentes,
demonstrando que a impunidade, recorrente em quase todos os casos, mesmo
julgados procedentes, também é um dos incentivos a prática deste crime.
9
2 AS DIFERENTES FORMAS DO TRABALHO ESCRAVO - UMA CHAGA EM ABERTO
2.1 NOÇÕES HISTÓRICAS DA ESCRAVIDÃO
Para melhor compreensão da realidade do trabalho escravo no contexto atual
do nosso país é necessário revisitarmos os fatos históricos sobre a origem e
evolução do regime escravista.
A prática da escravidão é muito antiga na história da humanidade desde os
primórdios das organizações em sociedades, sendo utilizada como forma de
subjugação do grupo vencedor ao vencido, nas guerras que ocorriam entre os povos
naquele período,1 como em meados de 1730 a.c, quando as tribos de Canaã e Síria
derrotaram o domínio das dinastias e Império dos Faraós, sacrificando seus
habitantes e fazendo de escravos as mulheres e crianças, fato este reconhecido
como o primeiro registro de escravista na história.2
A escravidão teve como característica o critério de propriedade do homem
sobre o homem, onde o escravizado era obrigado a trabalhar para seu “dono”
independente de sua vontade. Esta relação estava protegida por um caráter de
legalidade, 3 em que o escravo era visto apenas como mais um tipo de mercadoria,
que poderia ser adquirida por captura ou compra4. Assim o escravo era considerado
como uma coisa, portanto, não poderia ser sujeito de direito, apenas uma
propriedade (dominus).5
Esta relação é verificada até mesmo nos textos e normas mais antigos, como
se segue:
O código de Hamurabi continha normas sobre o trabalho escravo, como limitação do tempo de trabalho dos escravos por dívidas, direito ao casamento entre escravos e homens livres e o direito a herança e à liberdade dos filhos. A cativação dos prisioneiros de guerra foi julgada pelos
1 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.29. 2 SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual. A supressão dos Direitos Sociais Fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.17. 3 NINA, Carlos Homero Vieira. Escravidão ontem e hoje: aspectos jurídicos e econômicos de uma atividade indelével sem fronteira. Brasília: [s.n.], 2010. p.57. 4 NINA, Carlos Homero Vieira. Escravidão ontem e hoje: aspectos jurídicos e econômicos de uma atividade indelével sem fronteira. Brasília: [s.n.], 2010. p.39. 5 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho, 26ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. p.04.
10
juristas romanos, nos anos de 189 a.c, que opunham a sacrificá-los, mas nada expressavam quanto a sua exploração para o trabalho.6
A escravidão está presente no nosso país desde a sua colonização pelos
portugueses, que tiveram no índio, habitante nativo do novo continente, e depois no
negro africano, a oportunidade de subjuga-los para realização de tarefas
consideradas “pesadas” e “não dignas”.
O inicio da ocupação portuguesa encontrou nos indígenas a oportunidade de
colocar em prática o processo de colonização, utilizando-os como a força de
trabalho necessária para garantir o plantio de gêneros alimentícios para sua
subsistência e também a implantação do cultivo da cana de açúcar.7
A prática da escravidão do índio era moldada conforme os interesses da
coroa portuguesa, pela legislação régia, que em alguns momentos impedia sua
utilização e em outras dava a sua plena permissão,8 como, por exemplo, em edições
emitidas nos anos de 1708 e 1718, onde era permitida a venda de aborígenes em
praça pública, para uso de sua força de trabalho na defesa da colônia portuguesa.9
Com a valorização do açúcar, surgiu a necessidade de um número cada vez
maior de trabalhadores para o aumento da produção e cultivo da cana de açúcar.
Segundo, Eliane Pedroso, “essa decisiva transformação sugere a adoção do
escravismo como única medida que viabilizaria a sua finalidade econômica de
geração de altos lucros exportáveis”.10 Como forma de incremento dessa força de
trabalho compulsória, foi incorporado o uso de trabalho exercido pelos negros
africanos.11
A partir do século XIX, a Inglaterra que até então tinha como prática e
incentivava o tráfico de escravos, encerrou-o em suas colônias, passando a exigir tal
6 SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual: A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.18. 7 GORENDER, Jacob. MOTA, LOURENÇO DANTAS(COORD). Brasil em preto e branco: o passado escravista que não passou. São Paulo: SENAC, 2000. p.24 e p.25. 8 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.38. 9 SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual: A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.19. 10 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.34. 11 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.38.
11
comportamento dos demais países da América Isso ocorreu pelo fato da revolução
industrial estar acontecendo na Europa.12
Assim ideias abolicionistas começaram a ser difundidas em nosso país, mas
esse era apenas os primeiros passos para a ruptura com o escravismo colonial.
Seria o início da edição de leis, para abolir a escravidão, mas que acabariam sendo
utilizadas como forma de postergação, já que havia uma resistência grande para que
não ocorresse sua extinção,13 como podemos ver a seguir:
A primeira vitória abolicionista foi em 13 de maio de 1827, quando o Brasil ratificou um pacto formado no ano anterior com a Inglaterra em que se comprometia a findar em três anos o tráfico de escravos da Costa da África. Muitas outras leis haviam sido criadas anteriormente devido a pressão inglesa, mas, de fato, não eram aplicadas; eram as famosas “leis pra inglês ver”.
14
Levando em consideração essas ideias, cada vez mais difundidas no país,
houve a edição de decretos, como forma de proteção ao escravo, como a Lei dos
Sexagenários de 28 de setembro de 1855 que tinha como principal medida a
libertação de escravo ao completar 60 anos de idade, porém essa liberdade não
seria concedida de imediato, pois o então liberto teria que trabalhar mais três anos
para seu dono. 15 Ao analisarmos esta lei, percebemos que veio em favor dos
proprietários, pois os escravos que conseguiam chegar a essa idade, já estavam
cansados, doentes e sem força para o trabalho, retirando-se assim a
responsabilidade de seus donos de cuidá-los e alimentá-los.16
Nesse mesmo sentido a Lei do Ventre Livre, editada em 28 de setembro de
1871, concedia a liberdade dos filhos de escravas nascidos no país, após atingirem
a sua maioridade, mas que também reservava a opção para seu proprietário da
12 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.61. 13 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.61. 14SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual. A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.27 15 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.39. 16 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.61.
12
entrega ao Estado, quando a criança atingisse 8 anos de idade, sendo por este
indenizado.17
Em 13 de maio de 1888 foi decretada a Lei da Abolição da Escravidão, que
apesar de ainda haver resistência no país, esta foi aprovada por 83 votos a favor e 9
contra e decretava uma liberdade imediata e não gradativa de todos os escravos do
país, ao menos na ordem jurídica.18
A partir deste evento o escravo deixou de ser uma propriedade de outro e
passou a condição de pessoa humana e após a abolição começou a vigorar no país
a modalidade de trabalho assalariado19.
Contudo não seria tarefa fácil a essas pessoas libertadas conseguirem
trabalho em melhores condições, onde muitos continuaram a trabalhar para os seus
antigos proprietários, com salários relativamente baixos e submetendo-se as
condições por eles impostas.
Pode-se dizer que a forma de exploração do ser humano, principalmente na
zona rural, continuou a acontecer de maneira muito semelhante ao que ocorria nos
anos anteriores. A pobreza e a falta de perspectivas de melhores condições
econômicas continuavam a obrigar estas pessoas a submeterem-se a condições de
trabalho humilhantes e, até mesmo, a suportar castigos físicos, da mesma forma que
quando o ordenamento jurídico as legitimava no período do regime escravocrata.
2.2 A ESCRAVIDÃO MODERNA
Apesar de não haver mais legalidade na manutenção do trabalho escravo no
país, na década de 70, Dom Pedro Casaldáliga, levantou o debate sobre novas
formas de continuidade destas relações de trabalho, em áreas de expansão
agrícolas, principalmente com o desmatamento da Amazônia para fins do
agronegócio. Relatos de maus tratos, espancamentos e mortes de trabalhadores,
17 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.40. 18SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual. A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.31. 19 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.40.
13
teriam sido denunciados pela CPT (Comissão da Pastoral da Terra), porém não
houve vontade das autoridades em combater tais fatos.20
Somente na década de 90, que o governo brasileiro reconheceu a prática do
trabalho escravo no país perante a OIT (Organização Internacional do Trabalho),
sendo uma das primeiras nações a reconhecer a escravidão contemporânea.21
Podemos dizer que o caso concreto de escravidão preconizado pelo
trabalhador brasileiro José Pereira, foi de suma importância na luta contra o trabalho
escravo no país e um marco na proteção dos direitos humanos perante a corte
interamericana.
Em 1989, quando da tentativa de fuga da Fazenda Espírito Santo, no Estado do Pará, José Pereira, à época com 17 anos, foi gravemente ferido, sofrendo lesões permanentes na mão e no olho direito, e outro trabalhador rural foi morto. O jovem fora atraído por falsas promessas acerca das condições de trabalho, mas restou por trabalhar forçadamente, sem liberdade para sair e sob condições desumanas e ilegais, situação esta que também afligia outros 60 trabalhadores rurais da fazenda.22
Diante do ocorrido, tais fatos foram narrados em uma petição pela CPT à
Comissão Interamericana de Direitos Humanos no ano de 1994, denunciando a falta
de proteção e garantias do Estado Brasileiro, por não tomar nenhuma medida aos
relatos que eram constantemente denunciados nessa região, e também a falta de
interesse nas investigações em processos de assassinatos e exploração
decorrentes das relações de trabalho escravo.23
Somente mais tarde, no ano de 2003, o governo brasileiro assinou um acordo
onde reconheceu sua responsabilidade pela violação de direitos humanos, no
referido caso, passando adotar algumas medidas como forma de reparação
pecuniárias, de prevenção e fiscalização ao trabalho escravo.24
Como forma de reparação foi paga ao trabalhador José Pereira uma
indenização por danos morais e materiais sofridos no valor de R$ 52 mil, por ter sido
20 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.75. 21 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.75. 22 Disponível em: http://www.social.org.br/relatorio2004/relatorio037.htm. Acesso em: 20 nov. 2011. 23 Disponível em: http://www.social.org.br/relatorio2004/relatorio037.htm. Acesso em: 20 nov. 2011. 24 Disponível em: http://www.social.org.br/relatorio2004/relatorio037.htm. Acesso em: 20 nov. 2011.
14
submetido a condições análogas de escravo e haver sofrido lesões corporais, como
determinado pela Lei nº 10.706/2003.25
A continuidade da exploração do trabalho humano, exercida de diferentes
formas, atualmente denominada como escravidão contemporânea, demonstra a
vulnerabilidade do nosso país, que tem na pobreza, falta de qualificação de seus
trabalhadores e na impunidade como seus fatores principais. 26
Desde o reconhecimento na década de 90 da existência da prática de
escravidão contemporânea, dados nos remetem a informação de que foram
encontrados mais de 40 mil trabalhadores nessa situação, e o mais agravante é que
muitos deles nem existiam até o momento para o Estado, pois não possuíam sequer
registro de nascimento.27
2.3 O TRABALHO ESCRAVO E O ORDENAMENTO JURÍDICO
Em face de preocupação mundial em relação ao tema encontramos
discussões em todos os ambitos da sociedade. Organizações Internacionais como a
OIT e a ONU (Organização das Nações Unidas) tem como uma das finalidades o
debate das condições do trabalho no mundo, editando recomendações como
medidas para o combate ao trabalho forçado que continua a existir em muitos
países.28
Ao longo dos anos a OIT, vem elaborando suas normas através de um
processo de diálogo entre os governos, representante de trabalhadores e
empregadores para a criação de regras internacionais, chamadas de convenções e
recomendações, que no seu conteúdo normatizam as condições nas relações de
trabalho.29
25 Disponível em: http://www.social.org.br/relatorio2004/relatorio037.htm. Acesso em 20/11/2011. 26 Disponível em: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/forced_labour/pub/perfil_atores_rev_632.pdf. Acesso em: 07 mai. 2012. 27 Disponível em: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/forced_labour/pub/perfil_atores_rev_632.pdf. Acesso em: 07 mai. 2012. 28 SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual. A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.46. 29 SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual. A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.39.
15
A OIT regulou a abolição do trabalho forçado nas convenções nº 29 e nº 105,
sendo essas ratificadas pelo Brasil, através do Decreto nº 41.721, de 25 de junho de
195730 . No artigo 5º §2º da CF/88 está previsto em seu texto que os tratados
internacionais no qual o Brasil é parte tornam-se uma condição de direito
fundamental.31
Art. 5º § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte32.
Cabe ressaltar que convenção de nº 29 nos fornece a definição do conceito
de trabalho forçado, conforme seu artigo 2º, onde analisando sua parte final, leva-
nos a entender que aqueles trabalhadores que partiram para um determinado
serviço de forma espontânea, não estariam protegidos pela legislação:
Para fins dessa convenção, a expressão “trabalho forçado ou obrigatório”, compreenderá todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob ameaça de sanção e para o qual não tenha se oferecido espontaneamente.33
De acordo com, Luis Antonio Camargo de Melo:
“[...] quando o trabalhador, ainda que ele vá de espontânea vontade, mas quando ele é vítima de uma fraude, é vítima de um engano, quando ele é enganado, e isso é comum, é cotidiano no Brasil, nos casos em que nós observamos do chamado “trabalho escravo contemporâneo”, ainda assim a convenção 29 é o marco legal internacional para a proteção desse trabalhador, ou seja, se o trabalhador se oferece de livre e espontânea vontade, mas a oferta de trabalho, na verdade é uma fraude, esse trabalhador está sendo enganado, incide como item de proteção, a convenção 29 da organização internacional do trabalho.34
Assim, mesmo que o trabalhador tenha aceitado de livre e espontânea
vontade a relação de trabalho, mas esta for feita de forma espúria pelo empregador,
estará caracterizado o trabalho forçado.
30 BELMONTE, Alexandre Agra. Curso de responsabilidade trabalhista: danos morais e patrimoniais nas relações de trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2009. p.254. 31 BELMONTE, Alexandre Agra. Curso de responsabilidade trabalhista: danos morais e patrimoniais nas relações de trabalho. 2. ed. São Paulo: LTR, 2009. p.254. 32 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 20 nov. 2011. 33 Disponível em: http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/convencoes/conv_29.pdf. Acesso em: 08 mai. 2012. 34 MELO, Luis Antonio Camargo de. Trabalho Escravo Contemporâneo. Revista Tribunal Superior do Trabalho, vol. 75, nº 01 jan/março 2009. p.95.
16
No ano de 1948 a Declaração Universal dos Direitos do Homem também
tratou do trabalho servil em seu artigo 4º “Ninguém será obrigado á escravidão nem
servidão; a escravidão e o tráfico de escravos serão proibidos em todas as suas
formas”35.
E na década de 50 que surgiu a preocupação com o trabalho forçado ou
compulsório para fins políticos36:
[...] sobre a abolição do trabalho forçado, cujos membros signatários obrigam-se a suprimir e não fazer uso de nenhuma forma de trabalho forçado ou obrigatório como meio de coerção ou de educação políticas, como medida de disciplina no trabalho, como medida de discriminação, social, nacional ou religiosa, como método de mobilização e utilização da mão-de-obra com fins de fomento econômico ou como castigo por haver participado de greves.
Onde a OIT editou a convenção nº 105 que estabelece a sua proibição em
seu artigo 1º:
a) Medida de coerção ou de educação política ou como punição por ter ou expressar opiniões políticas ou pontos de vista ideologicamente opostos por ter ou expressar opiniões políticas ou pontos de vista ideologicamente opostos ao sistema político, social e econômico vigente; b) método de mobilização e de utilização de mão de obra para fins de desenvolvimento econômico; c) meio de disciplinar a mão de obra; d) punição por participação em greves; e) medida de discriminação racial, social, nacional ou religiosa.
Mesmo havendo toda essa regulamentação criada ao longo dos anos, o
problema do trabalho escravo contemporâneo persiste, mas cabe ressaltar a
importância da ratificação dessas convenções internacionais pelos Estados para
despertar uma preocupação em relação ao problema e a adoção de medidas para a
sua extinção.37
No Brasil uma das medidas adotadas foi edição da Lei nº 10.803 de 11 de
dezembro de 2003 para alterar o artigo 149 do Código Penal Brasileiro onde prevê a
pratica de trabalho escravo como crime:
35 SILVA, Cristiane de Melo Mattos Sabino Gazola Silva. Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual. A supressão dos direitos Sociais fundamentais. São Paulo. LTR, 2009. p.50. 36 Organização Internacional do trabalho. Relatório não ao trabalho forçado. p.23. Disponível em: http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/forced_labour/pub/nao_trabalho_forcado_311.pdf. Acesso em: 09 jun. 2012.. 37 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo , v.34, n.131 , p. 64-95, jul./set. 2008. p.68.
17
Art. 149 – Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto: Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência. § 1º - Nas mesmas penas incorre quem: I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho; II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho. § 2º - A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido: I – contra criança ou adolescente; II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.38
A denominação para o ato ilícito tratado por esta lei é trabalho em condições
análoga a de escravo, mas não impede que se utilize a forma trabalho escravo,
porém essa é uma redução da expressão utilizada pela lei39. Isto ocorre por que a
prática do trabalho escravo não é admitida por nosso ordenamento jurídico, sendo
no máximo admito pelo Estado brasileiro a existência de condições análogas ao
trabalho escravo e não este de fato.
Observa-se, também, que este mesmo artigo da lei, menciona quatro
situações ilícitas: trabalhos forçados, condições degradantes, jornada exaustiva e
restrição de locomoção em razão de dívida contraída com o empregador, que de
acordo com Luis Antonio Camargo de Melo, “Dessas quatro condições, há
possibilidade de reduzir para apenas duas, dois grandes grupos: do trabalho forçado
e condição degradante.” 40
2.3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
A prática do trabalho escravo contemporâneo não viola apenas as relações
de trabalho, mas também os valores da pessoa humana garantidos pela Carta
Magna que tem este princípio como um de seus fundamentos, estabelecido no seu
artigo 1º, inciso III.
38 Lei nº 10.803 de 11 de dezembro de 2003. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.803.htm. Acesso em: 20 nov. 2011. 39 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.130. 40 MELO, Luis Antonio Camargo de. Trabalho Escravo Contemporâneo. Revista Tribunal Superior do Trabalho, vol. 75, nº 01 jan/março 2009. p.96.
18
Na antiguidade clássica, para o pensamento filosófico e político a dignidade
da pessoa humana era medida de acordo com a posição social ocupada e seu
reconhecimento dentro da comunidade, tinha um caráter de quantificação, o
indivíduo era mais digno ou menos, conforme seus bens.
No pensamento estóico, a dignidade era qualidade inerente ao ser humano,
todos são dotados da mesma dignidade, e possui cada qual a sua liberdade,
respondendo por seus atos, não qualificando o indivíduo por sua posição social, mas
elevando-o a sua existência a um sentido moral, de lealdade e integralidade41.
Atualmente, esse princípio traz consigo a ideia de que o valor maior na
sociedade contemporânea é a dignidade da pessoa humana, independente de seu
status econômico e social. É o princípio maior do direito constitucional e integra-se
com a valorização do trabalho, sendo um avanço aos sistemas jurídicos
constitucionais democráticos.42
A dignidade da pessoa, é algo único, não poderá ser substituída, não há valor
econômico que o substitua. Segundo Kant:
“no reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode por-se em vez dela qualquer coisa como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e, portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade".43
A utilização de uma pessoa como meio para alcançar uma finalidade viola
seus direitos, e com certeza o trabalho escravo viola todos os princípios
constitucionais, pois o indivíduo não é mais tratado como uma pessoa e sim como
um objeto.
Ingo Wolfgang Sarlet define a Dignidade da Pessoa Humana como:
[...] a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além
41 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 2. ed. Porto Alegre: Liv. do Advogado, 2002. p.30 e p.31. 42 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 2. ed. Porto Alegre: Liv. do Advogado, 2002. p.31. 43 KANT, Immanuel apud SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 2. ed. Porto Alegre: Liv. do Advogado, 2002. p.33.
19
de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comum com os demais seres humanos.44
A dignidade é algo irrenunciável ao homem, devendo ser reconhecida e
respeitada na prática do trabalho. Assim o trabalhador deve ter um ambiente em
boas condições e o direito de decidir se quer ou não manter a relação de trabalho.
Podemos concluir que toda escravidão é contraria ao princípio da dignidade
humana, a liberdade, legalidade e a igualdade.45
A Constituição Federal consagra o Princípio da Dignidade Humana regulando
um direito individual de proteção do Estado e dos demais indivíduos e assegurando
que todos sejam tratados da mesma forma.46
Podemos identificar esse princípio no nosso ordenamento jurídico, através da
seguinte decisão do STF:
EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 149 DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO Á CONDIÇÃO ANÁLOGA À DE ESCRAVO. TRABALHO ESCRAVO. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITOS FUNDAMENTAIS. CRIME CONTRA A COLETIVIDADE DOS TRABALHADORES. ART. 109, VI DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. A Constituição de 1988 traz um robusto conjunto normativo que visa à proteção e efetivação dos direitos fundamentais do ser humano. A existência de trabalhadores a laborar sob escolta, alguns acorrentados, em situação de total violação da liberdade e da autodeterminação de cada um, configura crime contra a organização do trabalho. Quaisquer condutas que possam ser tidas como violadoras não somente do sistema de órgãos e instituições com atribuições para proteger os direitos e deveres dos trabalhadores, mas também dos próprios trabalhadores, atingindo-os em esferas que lhes são mais caras, em que a Constituição lhes confere proteção máxima, são enquadráveis na categoria dos crimes contra a organização do trabalho, se praticadas no contexto das relações de trabalho. Nesses casos, a prática do crime prevista no art. 149 do Código Penal (Redução à condição análoga a de escravo) se caracteriza como crime contra a organização do trabalho, de modo a atrair a competência da Justiça federal (art. 109, VI da Constituição) para processá-lo e julgá-lo. Recurso extraordinário conhecido e provido.47
44 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na constituição federal de 1988. 2. ed. Porto Alegre: Liv. do Advogado, 2002. p.59/60. 45 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34, n.131 , p.64-95, jul./set. 2008. p.69. 46 SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed., Porto Alegre: Livr. do Advogado, 2003. pag. 48. 47 Supremo Tribunal Federal. Tribunal pleno. Recurso Extraordinário nº 398041/PA Rel.Min. Joaquim Barbosa, Brasília 30/11/2006. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28398041.NUME.+OU+398041.ACMS.%29+%28%28JOAQUIM+BARBOSA%29.NORL.+OU+%28JOAQUIM+BARBOSA%29.NORV.+OU+%28JOAQUIM+BARBOSA%29.NORA.+OU+%28JOAQUIM+BARBOSA%29.ACMS.%29%28%40JULG+%3E%3D+20061130%29&base=baseAcordaos.Acesso em: 20 nov. 2011.
20
Para que possamos ter um Estado Democrático de Direito, o trabalho humano
deve estar sempre em uma ordem de privilégio se comparado ao capital, o valor que
sempre deverá permanecer é o princípio da dignidade da pessoa humana, com seus
fundamentos na Constituição Federal e nos valores do direito do trabalho.48
2.3.2 Princípios Gerais do Direito do Trabalho
Como ainda persiste a condição de escravidão nas relações de trabalho,
apesar das diversas iniciativas governamentais e de organismos internacionais e da
criação de normas, que se mostraram inoperantes, existem princípios que regem o
direito, que mesmo não positivados, ajudam na solução deste problema.
Esses princípios são formas que o legislador encontrou para conseguir dar
uma maior proteção à classe trabalhadora, servem como base de apoio aos
operadores do direito quando constatada a prática do trabalho escravo
contemporâneo e para que fique comprovada a ilegalidade, assim auxiliando a
conquista dos direitos trabalhistas negados.
2.3.2.1 Princípio da Proteção.
No contrato de trabalho, sempre haverá duas partes, o empregador e
empregado, que está em situação de desigualdade, pois não tem condições de
competir nessa relação com o capital, pois se encontra numa situação
socioeconômica menos favorecida.49O princípio da proteção tem como finalidade
compensar a desigualdade econômica do trabalhador, com tratamento jurídico
diferenciado, privilegiando por considerá-lo hipossuficiente.
Segundo Mauricio Goldinho Delgado, parte importante da doutrina aponta
esse princípio como cardeal do direito do trabalho, por influir em toda a estrutura e
características próprias desse ramo jurídico especializado. 50
Como exemplifica Américo Plá Rodriguez:
Enquanto no Direito comum uma constante preocupação parece assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no Direito do trabalho a
48 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4.ed.. Porto Alegre, p.94. 49 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4.ed.. Porto Alegre, p.96. 50 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTR, 2010. p.183.
21
preocupação central parece ser a de proteger uma das partes com o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade substancial e verdadeira entre as partes.51
A melhor forma de correção das desigualdades seria criar outras
desigualdades, assim o princípio da proteção que procura compensar a
desigualdade econômica do trabalhador, expressa a ideologia do direito do trabalho
e baliza os demais princípios, da irrenunciabilidade e da primazia da realidade, que
tem como base esse valor de compensação.52
A aplicação desse princípio está baseada na regra do in dúbio pro operário,
que estipula aos juízes escolher entre os diferentes sentidos que uma norma pode
fornecer e interpretá-la de forma que seja mais benéfica ao trabalhador. No caso de
haver mais de uma norma aplicável, novamente ocorre a opção pela mais benéfica
ao trabalhador, mesmo que não corresponda aos critérios de hierarquia de
normas.53
2.3.2.2 Princípio da Irrenunciabilidade
O direito do trabalho não permite que o trabalhador renuncie de seus direitos
trabalhistas. Ainda que o empregado desista de seus direitos, sem indução de seu
empregador, por um ato voluntário, esse não irá gerar efeitos. 54 A própria
necessidade de manter um emprego para sobreviver e manter a família, o
desconhecimento em relação a seus direitos e por ser inferior hierarquicamente ao
seu empregador, tornaria fácil o ato de renúncia.
Presume-se que essa vontade de renunciar seus direitos, chamada iuris et de
iure, deve-se a inferioridade existente do empregado, no qual necessita do
emprego.55O trabalhador não pode renunciar a esses direitos, pois ele não os tem,
esses são uma garantia social que abrange a toda classe trabalhadora, é uma forma
de proteção às desigualdades econômicas entre as partes.
51 PLÁ RODRÍGUEZ, Américo. Princípios de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTR, 2000. p.83. 52 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4.ed.. Porto Alegre, p.95. 53 PLÁ RODRÍGUEZ, Américo. Princípios de direito do trabalho. 3. ed. São Paulo: LTR, 2000. p.107. 54 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4.ed.. Porto Alegre: IOB - Síntese, 2004. p.97. 55 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4.ed.. Porto Alegre: IOB - Síntese, 2004. p.97.
22
2.3.2.3 Princípio da Primazia da Realidade.
Esse princípio reforça a ideia que deve prevalecer a realidade dos fatos e não
o que pode constar em documentos, devido a isso na justiça processual do trabalho
a prova documental tem presunção relativa, conforme se observa na Súmula 12 do
TST.
Como consequência, temos uma maior incidência e necessidade da prova
testemunhal para todos os ritos processuais, não utilizando a regra do artigo 401 do
Código de Processo Civil56. Além do mais o artigo 9 da CLT57 aponta como questão
de ordem pública a nulidade ex tunc de qualquer documento que visa afastar algum
direito do empregado, desde que impugnado.
Conforme Carmen Camino, “da consensualidade natural do contrato de
trabalho resulta a prevalência dos fatos, sempre que estes estiverem em
discordância com documentos ou acordos.” 58
Para o direito do trabalho, o que deve ser considerado é a prática ao longo da
prestação de serviços, mesmo que tenha sido acordado entre as partes, diferentes
atividades, isso acaba alterando o contrato de trabalho e gerando novos direitos e
obrigações a parte contratante.59
Assim, com base no princípio da primazia da realidade, a real situação
vivenciada pelos trabalhadores é a que deve prevalecer, uma vez que a
documentação que pode ser apresentada pelos empregadores necessariamente não
espelha a realidade existente na relação de trabalho, burlando a Legislação
Trabalhista.
2.4 ELEMENTOS QUE CARACTERIZAM AS CONDIÇÕES ANÁLOGAS DE ESCRAVO.
Tendo em vista que o ordenamento jurídico não admite a existência de
trabalho escravo em nosso país, mas tão somente a constatação de condições
56 Vade-mécum: Saraiva. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 57 Vade-mécum: Saraiva. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 58 CAMINO, Carmen. Direito individual do trabalho. 4.ed.. Porto Alegre: IOB - Síntese, 2004. p.95. 59 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTR, 2010. p.193.
23
análogas ao trabalho escravo, é imprescindível entendermos as possíveis situações
que as caracterizam nas relações de trabalho.
2.4.1 Trabalho Forçado.
Apesar de haver uma definição pela OIT, sobre o conceito de trabalho
forçado, essa não é unânime em sua interpretação, há países que utilizam esse
termo a prática de trabalho em regimes totalitários em outros como expressões de
“escravidão moderna” e práticas análogas a de escravidão, são expressões para
definir baixos salários, condições muito precárias e insalubres de trabalho.60
Já as situações em que os trabalhadores são submetidos a trabalhos
forçados vão muito além de infligir as normas de proteção ao trabalho, é uma
violação bem mais grave porque fere o seu direito de liberdade.
Para definição da OIT, “o trabalho forçado apresenta dois elementos básicos:
trabalho ou serviço imposto sobre ameaça de punição e aquele executado
involuntariamente”.61
Essa situação costuma ocorrer com os trabalhadores levados de seus
municípios para trabalhar em outras cidades, geralmente estes lugares são poucos
desenvolvidos, de grande miséria, não tendo trabalho disponível para todos, acabam
se tornando fornecedores desta mão de obra 62 na maior parte das vezes são
ludibriados quando recrutados, por condições de trabalho e salários que na prática
não irão se concretizar.
Como meio de manter esse trabalhador, o empregador utiliza de intimidações,
que podem ocorrer de diferentes formas, desde castigos físicos, com ameaças de
morte a sua vida ou a membros de sua família, denuncias a imigração, quando
60 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Aliança global Contra o trabalhado forçado. Relatório global do seguimento da declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho. 2005. Relatório I(B) Conferencia internacional do trabalho, 93ª p.05 Reunião. 61 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Aliança global Contra o trabalhado forçado. Relatório global do seguimento da declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho. 2005. Relatório I(B) Conferencia internacional do trabalho, 93ª p.05 Reunião. 62 MELO, Luis Antonio Camargo de. Trabalho Escravo Contemporâneo. Revista Tribunal Superior do Trabalho, vol. 75 nº 1, jan/março 2009.
24
esses trabalhadores estão em situação ilegal no país, retenção de salários por
dívidas fraudulentas ou a retenção de documentos pessoais.63
Segundo José Cláudio Monteiro de Brito Filho, o trabalho forçado é
caracterizado quando efetuado contra a vontade do trabalhador desde seu início ou
durante a sua execução. 64 Sempre que houver impedimento ao trabalhador de
deixar o local da prestação de serviço haverá o cerceamento de sua liberdade.
Ao compreender o trabalho forçado como reduzir alguém à condição análoga
à de escravo, a Lei nº 10.803/2003 possibilitou a punição por essa prática em outras
áreas fora da relação de trabalho, por ser uma conduta ilícita.65
Caso real fora a condenação de um fazendeiro por submeter trabalhadores
em condições análogas de escravo, com aliciamento e ocultação de cadáver, em
fazendas do Pará e Maranhão:
[...] Segundo a denúncia feita pelo Ministério Público, os trabalhadores das fazendas de Gilberto Andrade, nos estados do Pará e Maranhão, eram aliciados com falsas promessas de emprego e submetidos às condições de trabalho escravo, inclusive com cerceamento da liberdade. Também foram encontrados corpos humanos enterrados nas propriedades do acusado. As denúncias contra o fazendeiro ganharam repercussão internacional após a acusação de que ele teria torturado um trabalhador com ferro quente de marcar bovinos, como punição por reclamações sobre a qualidade da comida e falta de salário. Ele foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 1° Região (TRF-1) a 14 anos de prisão em regime inicial fechado e ao pagamento de multa de 7,2 mil salários mínimos[..]66
O fazendeiro, em questão, Gilberto Andrade, teve negado seu pedido de
Habeas Corpus, por decisão monocrática pela ministra Laurita Vaz, por acórdão
proferido em apelação do Tribunal Federal da 1ª região:
HABEAS CORPUS Nº 203.937 - MA (2011/0085308-5) RELATORA: MINISTRA LAURITA VAZ IMPETRANTE: ALBERTO ZACHARIAS TORON E OUTROS ADVOGADO : ALBERTO ZACHARIAS TORON E OUTRO(S) IMPETRADO: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1A REGIÃO
63 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Aliança Global Contra o Trabalho Forçado. Relatório global do seguimento da declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho. 2005. Relatório I(B) Conferencia internacional do trabalho, 93ª. p.05. 64 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.131. 65 SILVA, Marcello Ribeiro. O desafio de definir trabalho análogo ao de escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo , v.35, n.134 , p.202-230, abr./jun. 2009. p.215. 66 Superior Tribunal de Justiça. Disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=101870&tmp.area_anterior=44&tmp.argumento_pesquisa=trabalho%20escravo. Acesso em: 01 nov. 2011.
25
PACIENTE: GILBERTO ANDRADE [...] No tocante à alegada inépcia da denúncia,não vislumbro o fumus boni iuris do pedido, porque, como é cediço, após a superveniência de sentença condenatória, confirmada em sede de apelação, resta preclusa a alegação, sobretudo quando fundada na validade do conjunto probatório contido nos autos. Já no que diz respeito à individualização da reprimenda, a espécie em testilha não se enquadra nas hipóteses excepcionais passíveis de deferimento do pedido em caráter de urgência, porquanto a medida liminar postulada é de natureza satisfativa, confundindo-se com o próprio mérito da impetração, cuja análise competirá ao órgão colegiado. Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de liminar[...]67
Em seu relatório, Uma Aliança Global Contra o Trabalho Forçado68, a OIT
relaciona algumas situações que ocorrem como prática de trabalho forçado, pela
falta de consentimento: escravidão por nascimento/descendência de escravo;
escravidão por dívida; rapto ou sequestro; venda de uma pessoa a outra;
confinamento no local de trabalho, em prisão ou cárcere privado; a coação
psicológica; a ordem para trabalhar apoiado em ameaça real ou de punição por
desobediência; a dívida induzida pela falsificação de contas; preço inflacionado;
redução do valor do valor de bens ou serviços produzidos; taxas de juros
exorbitantes; engano ou falsa promessa sobre tipo e condições de trabalho;
retenção ou não pagamento de salários; retenção de documentos de identidade e
bens pessoais de valores.69
2.4.2 Servidão por Dívida.
Uma das formas mais comum de trabalho escravo contemporâneo no Brasil é
a servidão por dívida, principalmente do trabalhador rural, que empenha a sua
capacidade de trabalho para saldar uma dívida, muitas vezes pré-estabelecida no
momento da sua contratação.
O trabalhador ao ser recrutado inicia dívidas com o empregador,
caracterizadas pela cobrança do transporte até o local da prestação do serviço,
alojamento e alimentação. Essa condição inicial faz com que ocorra a servidão por
67 Superior Tribunal de Justiça. Disponível em https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/revista/abreDocumento.jsp?componente=MON&sequencial=15175773&formato=PDF. Acesso em: 01 nov. 2011. 68 Disponível em: http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour/oit/relatorio/relatorio_global2005.pdf. Acesso em: 01 nov. 2011. 69 ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Aliança Global Contra o Trabalho Forçado. Relatório global do seguimento da declaração da OIT sobre princípios e direitos fundamentais no trabalho. 2005. Relatório I(B) Conferencia internacional do trabalho, 93ª. p.06.
26
divida e estes trabalhadores comecem a serem vigiados para que não saiam do
local de trabalho sem saldar estes débitos.70
Outra tática utilizada pelos aliciadores e bem eficaz é adiantar uma quantia
em dinheiro a esse trabalhador, que acaba por utiliza-lo para suprir as necessidades
básicas de sua família, que em decorrência dessas dividas acaba comprometendo-
se com seu futuro empregador.71 Isto fica evidenciado pelos relatos que aparecem
nas histórias daqueles que são escravizados e que estão distantes da família, como
trabalhador Assis das Chagas:
Ás vezes (há o) medo que a nossa família esteja passando mal. Não deixamos nada em casa. Ás vezes o fazendeiro não quer liberar um dinheiro para a gente mandar pra casa. A gente fica pensando naquilo. Pensando: como é que está passando em casa, passando mal (.....), se tem algum doente, a gente fica em dúvida, não é?72
Neste processo inicia-se a total negação dos direitos individuais e o uso de
coação moral e física, utilizando-se dessas formas de endividamentos como meios
persuadir o trabalhador a continuar preso aquele trabalho. Ademais, geralmente
essas pessoas são levadas a trabalhar em locais longe e desconhecidos, para
dificultar o abandono do local73.
O recrutamento de mão de obra é feito por empreiteiros ou “gatos”, assim
conhecidos, que tem como tarefa aliciar pessoas para o trabalho. São prepostos dos
empregadores, geralmente proprietários rurais, que os utilizam para que não seja
caracterizada o vinculo de emprego, possibilitando negar aos empregados seus
direitos trabalhistas74.
Estes trabalhadores recrutados são, em geral, pessoas desempregadas, que
desconhecem seus direitos oriundos dessa relação de trabalho, vivem na mais
absoluta miséria, com baixa escolaridade, por muitas vezes tratando-se de
analfabetos. Outro fator é a inexistência da documentação legal, como até mesmo a 70 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo , v.34, n.131 , p. 64-95, jul./set. 2008. p.74. 71 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.44. 72 FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil
contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.154. 73 FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.154. 74 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.44.
27
falta de certidão de nascimento, carteira de identidade e de trabalho, e que nos
casos do individuo as possuir estes são retidos pelos “gatos”, o que acaba criando
mais um vínculo do trabalhador aliciado com o seu empreiteiro75.
Para alcançar tal objetivo, os aliciadores iludem os trabalhadores com
propostas de salários atraentes e a esperança de obtenção de melhores condições
de vida. Mas na prática não é o que acontece, em grande parte destes contratos,
não é propiciado ao trabalhador às mínimas condições de sobrevivência, que
chegando ao local de trabalho, depara-se com uma realidade bem diferente,
precisando comprar os equipamentos necessários para realização do trabalho, bem
como todos os objetos que são de suma importância para a sua manutenção no
local, ficando assim submetidos a dívidas, perdendo o direito a liberdade.
Fato notório ocorre em relação aos alimentos, que acabam sendo vendidos
pelos próprios aliciadores aos aliciados, através de armazéns próprios ou por eles
indicados, que utilizam preços mais alto que a média de mercado e o que o
empregado consome é descontado do salário ao final do mês. Segundo Sento-Sé, é
o chamado sistema de barracão ou truck-system.76.
Essa prática é vedada pelo nosso ordenamento jurídico, de acordo com o que
dispõe os § 2º e 3º do artigo 462 da CLT77, que tem como finalidade proibir a
coerção ao trabalhador de livremente dispor do seu salário:
Art. 462 § 2° È Vedado à empresa que mantiver armazém para venda de mercadorias aos empregados ou serviços destinados a proporcionar-lhes prestações in natura exercer qualquer coação ou induzimento no sentido de que os empregados se utilizem do armazém ou dos serviços. § 3º Sempre que não for possível o acesso dos empregados a armazéns ou serviços não mantidos pela empresa, é lícito á autoridade competente determinar a adoção de medidas adequadas, visando a que as mercadorias sejam vendidas e os serviços prestados a preço razoáveis, sem intuito de lucro e sempre em benefícios dos empregados 78
Ao analisarmos o referido artigo, verifica-se que não é ilícita toda a disposição
de mercadorias e serviços pelo empregador, somente aquele ato de vontade que
seja viciado por ação direta ou indireta, forçando o empregado a adquirir tais
75 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.44. 76 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.44. 77 Vade-mécum: Saraiva. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 78 Vade-mécum: Saraiva. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
28
produtos. Se a aquisição ocorrer de forma livre, por opção do trabalhador e quando
o lucro for compatível com a média do mercado e o empregado tiver a liberdade de
dispor de seu salário como melhor entender, essa prática não é ilícita.79
Para haver a configuração da prática do truck system é preciso haver vício de
vontade, conforme entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, através da
súmula nº 34280, exemplificado na decisão da 8ª turma do TST, no seguinte acórdão
proferido:
[...] os empregados recebiam salário inferior ao mínimo legal, pago no primeiro sábado ao fim de contabilizada a quinzena, mediante cheques emitidos pelo réu, contra o Banco situado no Município de Rio Bonito, distante cerca de 40 Km das propriedades, o que obrigava os empregados a realizarem gastos com aquisição de mercadorias nas mercearias Snobs e Gaivota, localizadas em São Vicente de Paula, à 10 Km da Fazenda União, no valor mínimo de R$20,00 a R$30,00, para que a troca de cheques por espécie fosse aceita nestes comércios, o que configuraria a prática de truck, system.81
É permitido ao empregador urbano e rural pagar parte do salário em utilidade,
porém há regras que devem ser obedecidas, que variam para o empregador urbano
e rural. O trabalhador rural possui legislação especial, a Lei nº 5.889/73, desde que
compatível com a constituição, que equiparou os direitos dos trabalhadores urbanos
e rurais82.
De acordo com esta Lei em seu artigo 9º83 autoriza-se que sejam efetuados
descontos de parcelas, calculadas sobre o salário mínimo, em 20% para moradia e
25% para alimentação, desde que esta seja fornecida de forma abundante.
Normalmente estas leis não são respeitadas pelo empregador e o que
acontece é um endividamento do empregado que chega ao final do mês com valores
irrisórios para receber, quando não ficam em débito. Essa prática torna-se um ciclo
vicioso, um novo mês inicia e com ele a obrigação de continuar trabalhando para 79 SANTOS, Roseniura. Fornecimento de Bens e serviços pelo empregador aos seus empregados: Parâmetros de Licitude. Revista Justiça do Trabalho, Ex 1, v.22 nº 264, dez 2005, HS Editora. p.38. 80 SANTOS, Roseniura. Fornecimento de Bens e serviços pelo empregador aos seus empregados: Parâmetros de Licitude. Revista Justiça do Trabalho, Ex 1, v.22 nº 264, dez 2005, HS Editora. p.37. 81 Processo: AIRR - 33840-41.2004.5.01.0411 Data de Julgamento: 22/09/2010, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 24/09/2010. Disponível em: http://aplicacao5.tst.jus.br/consultaunificada2/inteiroTeor.do?action=printInteiroTeor&format=html&highlight=true&numeroFormatado=AIRR - 33840-41.2004.5. Acesso em 21 mai. 2012. 82. SILVA, Alessandro da (Coord.) et al. Direitos humanos: essência do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2007. p.110. 83 Lei nº 5.889/73. Disponível em : http://www81.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/1973/5889.htm. Acesso em: 12 jun. 2012.
29
pagamento dessa dívida, fica então o trabalhador preso a uma obrigação moral de
pagamento, utilizada para a manutenção da relação de trabalho e nos casos de
quem tenta voltar pra casa sem saldá-la é vitima de ameaças de castigos físicos.84
Nesse sentido, Raquel Elias Ferreira Dodge, nos diz:
A servidão por dívida distingue-se da escravidão tradicional apenas porque a vítima está impedida de deixar seu trabalho ou a terra onde trabalha até que sua dívida seja quitada. Ocorre que essa servidão se caracteriza, exatamente, porque, apesar de todos os esforços, o trabalhador não pode quitá-lo. O salário é muito baixo e o valor dos bens é supervalorizado no armazém do seu empregador85.
Essas pessoas retidas pelos seus aliciadores, por temor e por não terem a
quem recorrer não sabem o que fazer. Mas o medo que paralisa também pode dar
razão para reação86, como o seguinte relato demonstra:
Um grupo de peões que trabalhavam numa fazenda, chamada Arizona em 1990, conseguiram fugir, foram capturados e espancados antes de serem mortos perante os peões, para que servissem de exemplo aos demais. Mesmo assim houveram mais fugas, então como forma de coação a vítima e uma atitude que deixariam todos apavorados, um dos fugitivos foi capturado e levado ao local de trabalho por um pistoleiro que o submeteu com uma arma apontada para sua cabeça a abusos sexuais, perante aos demais.87
Apesar do insucesso na tentativa de fuga, os trabalhadores continuaram
tentando até que um deles conseguiu denunciar esta situação a CPT, que juntos
fizeram a denúncia ao procurador- Geral da República, Aristides Junqueira, dessa
forma ocorreu à fiscalização nessa fazenda, pelos órgãos competentes88.
O problema da servidão por dívida no Brasil é bastante antiga, de difícil
solução. Sua ocorrência é mais frequente em áreas agrícolas, sendo uma questão
cultural e está incorporada na percepção do trabalhador como um dever moral de
trabalhar pra honrar seu compromisso e saldar sua divida com o empregador nessa
relação de trabalho.
84 FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.178. 85 Fórum Social Mundial 2003 (2003 jan. 25: Porto Alegre, RS) Anais da oficina trabalho escravo: uma chaga aberta. -- Brasília: OIT, 2003. 86 FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.156. 87 FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.156. 88 FIGUEIRA, Ricardo Rezende. Pisando fora da própria sombra: a escravidão por dívida no Brasil contemporâneo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2004. p.156.
30
Através de dados fornecidos pela Polícia Federal, instituição que também
participa do resgate de trabalhadores nessas condições, os Estados com maior
incidência são: Pará, Maranhão, Tocantins, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, em
atividades de pecuária e desmatamento, atividade agrícola de extração de madeira e
carvão89.
Salienta-se que essa violação aos direitos do trabalhador ocorre em todos os
locais em nosso país, inclusive, nos Estados economicamente mais desenvolvidos.
Através de reportagem da revista Extra Classe fez-se a denuncia, de setores da
economia gaúcha que se beneficiam com o trabalho escravo, ocorrido na região da
serra, onde as temperaturas são as mais baixas do inverno gaúcho, em que um
grupo de jovens foi resgatado numa fazenda de extração de pinus.90
Gabriel e Eduardo, ambos de 15 anos e Rafael de 17 anos, carregaram peso, cortaram a própria pele sem querer, dormiram em colchões no chão e dentro de uma caçamba de caminhão, e viram sumir parte de seu salário comprando comida e as botas de proteção que o empregador deveria ter fornecido como equipamento de trabalho.91.
Assim fica evidenciado de que independe da situação econômica da região
em questão para que haja a servidão por divida nas relações de trabalho.
2.4.3 Trabalho Degradante.
Diferente do que acontece com as situações acima elencadas, não existe
uma norma que defina o trabalho degradante, sendo que o artigo 149 do Código
Penal92 fornece-a de forma subjetiva e sua interpretação fica a cargo do aplicador da
lei.
Há debates entre as autoridades, nacionais e internacionais, em que somente
considera-se a possibilidade de haver trabalho escravo nos casos em que há a
restrição da liberdade. Seguindo essa linha de pensamento não poderíamos
89 SILVA, Alessandro da (Coord.) et al. Direitos humanos: essência do direito do trabalho. São Paulo: LTR, 2007. p.108. 90 GLOCK, Clarinha. Revista Extra Classe, ano 17 nº 156, agosto de 2011. p.16. 91 GLOCK, Clarinha. Revista Extra Classe, ano 17 nº 156, agosto de 2011. p.16. 92 Vade-mécum: Saraiva. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010
31
considerar trabalho degradante como forma de trabalho em condições análogas a de
escravo, o que estaríamos contrariando o artigo 149 do código penal brasileiro.93
Porém há um consenso entre os doutrinadores, que o trabalho em condições
degradantes é aquele que não garante os direitos mínimos ao trabalhador, ferindo
sua dignidade. 94 Se o trabalhador presta serviço, com risco a sua saúde, sem
equipamentos de segurança, sem limite de jornada de trabalho, descanso, pouca
comida, muitas vezes sem água potável e péssimas condições de moradia, está
sendo negadas a esse trabalhador as condições básicas de trabalho, assim
caracteriza-se trabalho degradante.95
A reportagem que se segue elucida esta prática.
Erva Mate: cinco casos de trabalho escravo em 20 dias. A equipe de fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de Santa Catarina (STRE/SC), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Polícia Federal, encontraram situações de trabalho escravo contemporâneo em propriedades de erva mate. Foram resgatadas 33 pessoas, entre as quais 4 eram adolescentes, menores de 18 anos. As pessoas estavam em situações desumanas em “alojamentos” em paiol, não tinham banheiros adequados, as fezes ficavam expostas, os alimentos estavam roídos por ratos, dormiam em barracas de lonas, com colchões colocados diretamente no chão, em temperaturas a 1°C, não havia água potável no local, trabalhadores disseram que já haviam dormido em chiqueiros96.
Inúmeros são os casos deflagrados em que os trabalhadores estão expostos
ao trabalho degradante, como se pode observar na seguinte decisão do TST, que
manteve indenização a trabalhador, por condições precárias de trabalho.
A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve decisão desfavorável à empresa Nova América S.A. – Agrícola, que havia sido condenada por danos morais devido às condições inadequadas de trabalho oferecidas aos seus empregados. O órgão manteve o entendimento do Tribunal Regional do Trabalho do Paraná (9ª Região). De acordo com os autos, um empregado da empresa, admitido em 3.10.2006 para o corte de cana-de-açúcar, exercia suas atividades a céu aberto, em condições precárias, sem dispor de condições mínimas de trabalho, tais como banheiros, refeitório e local para aquecer alimentos. Ele recorreu à justiça do trabalho, insurgindo-se contra a conduta do empregador.
93 BRITO, Jose Claudio Monteiro de.Trabalho com redução do homem à condição análoga à de escravo e dignidade da pessoa humana. Disponível em: http://www.pgt.mpt.gov.br/publicacoes/escravo/pub100304.html. Acesso em: 17/10/11. 94 SILVA, Marcello Ribeiro. O desafio de definir trabalho análogo ao de escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.35, n 134, p.202-230, abr./jun. 2009. p.211. 95 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.133. 96 Site Repórter Brasil. Disponível em: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1916. Acesso em: 10 nov. 2011.
32
A empresa em questão foi condenada a indenizar o trabalhador, por dano
moral no valor de 5 mil reais.97
Outra condição que também é classificada como trabalho degradante é a
chamada jornada exaustiva, que não é medida somente pela quantidade de horas
trabalhadas, mas pela atividade praticada e suas condições, que poderiam levar o
trabalhador à exaustão98.
Nesse sentido:
Dou um exemplo bem recente: pelo menos 20 trabalhadores que morreram nos últimos dois ou três anos no interior de São Paulo.(...) cortando cana-de-açúcar, porque hoje se exige do trabalhador no corte de, no mínimo, 10 toneladas de cana por dia, e, para receber no final do mês uma quantia um pouco maior, chegam a cortar 18 toneladas de cana por dia.Uma média de 10 toneladas de cana por dia dá no final do mês cerca de R$700, 00/ R$800,00 reais por mês, dependendo da região do país onde o trabalhador estiver trabalhando99.
No que tange ao seu aspecto normativo, mesmo que a OIT nas convenções
de nº 29 e nº 50 não tenha mencionado trabalho degradante, o Brasil assinou
tratados internacionais, assumindo o compromisso de combatê-lo 100 , sendo
signatário do pacto Internacional dos Direitos Civis e Econômicos de 1966, aprovado
pelo decreto nº 226 de 12 de dezembro de 1991, promulgado pelo Decreto nº 592,
de 06 de julho de1992, que menciona em seu artigo 7º que ninguém será submetido
à tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.101
As condições degradantes são condutas mencionadas pela Lei 10.803/2003,
e tidas como crime de redução à condição análoga a de escravo, pois esse viola as
normas ratificadas pelo país como as normas constitucionais.102
97 Processo: RR-77000-05.2009.5.09.0093 disponível em http://ext02.tst.jus.br/pls/ap01/ap_red100.resumo?num_int=31344&ano_int=2011&qtd_acesso=994941. Acesso em: 10 jun. 2012. 98 MELO, Luis Antonio Camargo de. Revista Tribunal Superior do Trabalho, vol. 75, nº1 jan/março 2009. p.97. 99 MELO, Luis Antonio Camargo de. Revista Tribunal Superior do Trabalho, vol. 75, nº1 jan/março 2009. p.97. 100 MELO, Luis Antonio Camargo de. Revista Tribunal Superior do Trabalho, vol. 75, nº1 jan/março 2009. p.97. 101 SILVA, Marcello Ribeiro. O desafio de definir trabalho análogo ao de escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.35, n.134, p.202-230, abr./jun. 2009. p. 219. 102 SILVA, Marcello Ribeiro. O desafio de definir trabalho análogo ao de escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo , v.35, n.134 , p.202-230, abr./jun. 2009. p.219.
33
2.4.4 Trabalho Escravo Contemporâneo
O trabalho escravo, na atualidade, é utilizado como forma de aumentar os
lucros gerados na atividade, quer esta seja exercida pelos grandes latifundiários,
corporações de grandes empresas multinacionais e até mesmo as chamadas
empresas de “fundo de quintal”.
A escravidão contemporânea não acontece com base na aquisição do ser
humano, mas mediante seu uso e descarte. O uso desta relação de trabalho é vista
como necessária para diminuir despesas, garantir lucros e viabilizar
empreendimentos no campo ou na cidade.103
Como nos diz, Loris Rocha Pereira Junior:
O trabalhador escravo é o produto da desigualdade, da distribuição de renda, é o produto da desigualdade até mesmo na distribuição de terras neste país. Ele também é o resultado da ineficácia, da ineficiência dos nossos poderes constituídos, do Ministério Público, do Poder Judiciário, e do Poder Executivo.104
Mesmo quando um trabalhador é resgatado de uma situação análoga a de
escravo, por mais que venha a receber seus direitos trabalhistas, deveria haver
programas de capacitação a esses trabalhadores, para conseguir voltar ao mercado
de trabalho de forma digna, uma vez que as medidas hoje utilizadas não apagam a
sequela da opressão por ele vivenciada e tão pouco impede de que caia na mesma
situação. 105
Ao analisar o perfil dos escravos atualmente, suas algemas são mais sutis,
invisíveis, onde lhe é retirado não só a liberdade, mas também toda a cidadania e o
que há de mais valioso, a sua dignidade.106
Diante das formas e condições em que ocorre o trabalho análogo ao de
escravo, mesmo com o advento do artigo 149 da Lei nº 10.803/2003, existem
diferentes entendimentos para a forma correta de enquadramento da situação ao
103 Fórum Social Mundial 2003 (2003 jan. 25: Porto Alegre, RS) Anais da oficina trabalho escravo: uma chaga aberta. -- Brasília: OIT, 2003. p.48. 104 Fórum Social Mundial 2003 (2003 jan. 25: Porto Alegre, RS) Anais da oficina trabalho escravo: uma chaga aberta. -- Brasília: OIT, 2003. p.25. 105 GLOCK, Clarinha. Revista Extra Classe, ano 17 nº 156, agosto de 2011. p.16. 106 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34, n.131, p. 64-95, jul./set. 2008. p.71.
34
tema. O trabalho forçado é quando há restrição do direito de locomoção do
trabalhador em razão de dívida; o cerceio ao uso de qualquer meio de transporte ao
trabalhador; manutenção de vigilância no local de trabalho; retenção de documentos
ou objetos pessoais do trabalhador, como forma de mantê-lo no local de trabalho. O
trabalho degradante envolve condições subumanas, na forma como o serviço é
prestado e jornada exaustiva.107
Independente da terminologia adotada para definir trabalho análogo ao de
escravo, o vício de vontade é o elemento essencial, pois são empregados os mais
diversos meios de coação para que o trabalhador seja obrigado a prestar serviços,
muito além de suas possibilidades e em condições degradantes.108
Essa preocupação em diferenciar conceitos referentes ao trabalho escravo,
degradante, semiescravidão, jornada exaustiva, trabalho forçado, torna-se
irrelevante, pois segundo Lóris Rocha Pereira Junior, “quem acompanha a atuação
do grupo móvel no interior do Pará, do Mato Grosso, do Maranhão, no interior do
Piauí, sabe que não existem diferenças.”109
É importante ressaltarmos que apesar de todo o avanço jurídico e medidas de
combate ao trabalho escravo, esta chaga ainda está longe de ser curada e podemos
verificar casos de situações análogas ao trabalho escravo em lugares e com
empresas que estariam fora de “quaisquer suspeitas”. É este o caso das atividades
ligadas à confecção de roupas, as chamadas salas de costuras, na cidade de São
Paulo, onde as pessoas que ali trabalhavam eram em sua grande maioria de origem
boliviana, que acabaram vindos para o Brasil, por intermédio de “gatos” que atuam
em território Boliviano, e prometem emprego com um bom salário no Brasil. É de
costume que os bolivianos paguem por essa intermediação, pois o local onde vivem
107 SILVA, Marcello Ribeiro. O desafio de definir trabalho análogo ao de escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.35, n.134, p.202-230, abr./jun. 2009. p. 220. 108 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34, n.131, p. 64-95, jul./set. 2008. p.67. 109 Fórum Social Mundial 2003 (2003 jan. 25: Porto Alegre, RS) Anais da oficina trabalho escravo: uma chaga aberta. -- Brasília: OIT, 2003. p.30.
35
é de extrema pobreza, estão desempregadas e preferem tentar a sorte em outro
país, pois as condições salariais na Bolívia são muito ruins.110
Estes Bolivianos também são recrutados para o trabalho na construção civil, e
as mulheres para trabalhos domésticos, todos sem nenhuma garantia trabalhista, 111
são submetidos à forma de trabalhos subumanos, inclusive outros imigrantes latino-
americanos, paraguaios e peruanos, porém quando há denúncias e intervenções da
polícia, não são bem vistas por estes trabalhadores, que na grande maioria tem
situação irregular no país, o que acaba fazendo com que sejam sendo
deportados.112
Por outro lado o empregador utiliza dessa condição de irregularidade para
coagir o trabalhador e ter sua fidelidade e trabalho, junto com a coação física.113
[..] É situação comum que os trabalhadores morem e trabalhem no mesmo local, em média 12 pessoas, os quartos são coletivos, travesseiros e cobertas são feitos pelos costureiros com sobras de tecidos. A alimentação é quase sempre a mesma, arroz, feijão e salsicha, o café da manhã era pão puro e café preto. Muitas vezes essa alimentação é usada como forma de coerção, como conta Elizabete, “que em uma oficina onde trabalhou só tinha direito a refeição quem produzisse certa quantia de roupa estipulada pelo patrão[..]114
Outro fato recente que corrobora que as condições análogas ao de trabalho
escravo independe da região ou condição econômica dos aliciadores é a incidência
de trabalho escravo em oficinas subcontratadas que fabricavam roupas para Zara,
uma famosa marca do grupo empresarial espanhol Inditex, reveladas em
reportagens veiculadas por diversos meios de comunicação, onde foram
encontrados em apenas uma única oficina, 51 trabalhadores, dentre esse apenas
12, tinham documentação trabalhista. Segundo João Batista Amâncio, “no ato da
110 FELICIANO, Guilherme Guimarães. Sobre os caminhos institucionais para o combate ao trabalho escravo contemporâneo no âmbito dos municípios. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, Revista dos Tribunais n.116, out./dez. 2004, p. 77-90. p.79. 111 FELICIANO, Guilherme Guimarães. Sobre os caminhos institucionais para o combate ao trabalho escravo contemporâneo no âmbito dos municípios. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, Revista dos Tribunais n.116, out./dez. 2004, p. 77-90. p.80. 112 FELICIANO, Guilherme Guimarães. Sobre os caminhos institucionais para o combate ao trabalho escravo contemporâneo no âmbito dos municípios. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, Revista dos Tribunais n.116, out./dez. 2004, p. 77-90. p.80. 113 FELICIANO, Guilherme Guimarães. Sobre os caminhos institucionais para o combate ao trabalho escravo contemporâneo no âmbito dos municípios. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, Revista dos Tribunais n.116, out./dez. 2004, p. 77-90. p.79. 114 Reportagem em 19/08/2010 revista Marie Claire Clipping: escravas da moda Disponível em http://www.reporterbrasil.org.br/clipping.php?id=1271. Acesso em: 17 nov. 2011.
36
fiscalização, foram cobrados 150 mil reais entre direitos trabalhistas e fundo de
garantia.”115
[..] A investigação da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego de São Paulo (SRTE/SP) - que culminou na inspeção realizada no final de junho - se iniciou a partir de uma outra fiscalização realizada em Americana (SP), no interior, ainda em maio. Na ocasião, 52 trabalhadores foram encontrados em condições degradantes; parte do grupo costurava calças da Zara. O quadro encontrado pelos agentes do poder público, e acompanhado pela Repórter Brasil, incluía contratações completamente ilegais, trabalho infantil, condições degradantes, jornadas exaustivas de até 16h diárias e cerceamento de liberdade (seja pela cobrança e desconto irregular de dívidas dos salários, o truck system, seja pela proibição de deixar o local de trabalho sem prévia autorização). Apesar do clima de medo, um dos trabalhadores explorados confirmou que só conseguia sair da casa com a autorização do dono da oficina, concedida apenas em casos urgentes, como quando teve de levar seu filho às pressas ao médico[..]116
O fato teve grande repercussão no país e também a manifestação de grande
parte da população em repudiar essa conduta, a multinacional Inditex, responsável
pela marca Zara, manifestou através de nota para os veículos de comunicação, da
seguinte forma:
[...] A Inditex divulgou uma nota na qual afirma que o flagrante de trabalho escravo na oficina "representa uma grave infração de acordo com o Código de Conduta para Fabricantes e Oficinas Externas da Inditex" e que a empresa, ao tomar conhecimento dos fatos, exigiu que o fornecedor responsável pela terceirização não autorizada regularizasse a situação dos trabalhadores imediatamente". Segundo a nota, "a Inditex, em parceria com o MTE do Brasil, vai reforçar a fiscalização do sistema de produção tanto deste fornecedor como de todos os outros no país, para garantir que casos como este não se repitam"[..]117
Após serem flagradas tais condições por auditores fiscais do trabalho, a
empresa precisará realizar ajustes em sua conduta, adequando toda sua cadeia
produtiva, conforme TAC (Termo de Ajuste de Conduta) 118 assinada junto ao
Ministério Público do Trabalho.
Assim indiferente do local onde acontecem, seja no campo ou em grandes
centros urbanos, para viabilizar o trabalho em condições análogas de escravo, os
115 Disponível em: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2011/08/procuradora-diz-ter-achado-mais-6-grifes-em-blitz-contra-trabalho-escravo.html. Acesso em: 18 ago. 2011. 116 Disponível em: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1925. Acesso em: 17 nov. 2011. 117 Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/economia/trabalho-escravo-encontrado-na-rede-da-zara e http://noticias.r7.com/sao-paulo/noticias/ministerio-publico-investiga-oficina-de-roupas-da-zara-por-condicoes-semelhantes-a-escravidao-20110817.html. Acesso em: 17 nov. 2011. 118 Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/economia/trabalho-escravo-encontrado-na-rede-da-zara e http://noticias.r7.com/sao-paulo/noticias/ministerio-publico-investiga-oficina-de-roupas-da-zara-por-condicoes-semelhantes-a-escravidao-2011081vo 7.html. Acesso em: 17 nov. 2011.
37
aliciadores usam dos mesmos métodos, de coação, seja moral ou física, e da
extrema pobreza em que as pessoas vivem.
38
3 MEDIDAS DE COMBATE AO TRABALHO ESCRAVO
Diante do problema latente do trabalho escravo, e tendo em vista o objetivo
de sua erradicação em todas as sociedades, foram criados vários mecanismos e leis
no âmbito internacional pelos diversos países e organismos multilaterais.
No Brasil não foi diferente, e neste sentido foram tomadas várias iniciativas
para o combate das condições análogas ao trabalho escravo.
3.1 PLANO NACIONAL PARA ERRADICAÇÃO DO TRABALHO ESCRAVO.
Como mencionado anteriormente o Brasil, iniciou a discussão sobre a
escravidão moderna na década de 70, iniciado pela CPT, mas que naquele
momento não despertava interesse por parte da sociedade e das autoridades em
tomar iniciativas para punir essa prática.
Na década de 90 iniciou uma pressão ao governo brasileiro por órgãos
internacionais, devido a reclamações apresentadas contra o mesmo à Comissão
Interamericana de Direitos Humanos, por estar ocorrendo à prática de trabalho
forçado nas relações de trabalho, nas diversas áreas de seu território nacional.119
No governo de Fernando Henrique Cardoso, no ano de 1995, assumiu-se a
existência do trabalho escravo no país e através do decreto nº 1.538 criaram-se
medidas de fiscalização e repressão, como por exemplo, o Grupo Executivo de
Combate ao Trabalho Forçado (GERTRAF) e grupo móvel de fiscalização, que tinha
como coordenação o Ministério do Trabalho e Emprego, composto por Fiscais e
Procuradores do Trabalho e Agentes da Policia Federal, que investigavam as
denúncias feitas pela CPT, resultando no resgate de diversos trabalhadores em
condições de aprisionamento por dívidas.120
Contudo essas medidas não surtiram o resultado esperado, pois as multas
que foram aplicadas como forma de penalizar os infratores eram pequenas se
119 SCHWARTZ, Rodrigo Garcia. Trabalho Escravo: A abolição Necessária. LTR, 2008. p.144. 120 SCHWARTZ, Rodrigo Garcia. Trabalho Escravo: A abolição Necessária. LTR, 2008. p.144.
39
comparadas aos lucros obtidos com a prática e uso da mão de obra escrava, e,
ainda, não havia nenhum tipo de punição na esfera penal.121
A OIT reconheceu a importância dessas ações realizadas, até então, no país.
Porem destacou a carência de seus procedimentos, como a morosidade e quase
nenhuma sanção aqueles que se beneficiavam do trabalho escravo, sendo que os
poucos casos que chegaram à esfera judicial eram de pequenos fazendeiros ou
arrendatários, não havendo condenações dos grandes fazendeiros ou corporações,
que permaneciam na impunidade. Assim era preciso haver um aperfeiçoamento nas
medidas de combate ao trabalho escravo, para que o país pudesse cumprir com as
convenções por ele ratificadas.122
No ano de 2003, o governo Luiz Inácio Lula da Silva, lançou o Plano Nacional
para Erradicação do Trabalho Escravo, formando a CONATRAE, Comissão Nacional
para a Erradicação do Trabalho Escravo, substituindo o grupo de Repressão ao
Trabalho Forçado 123 , consciente que a eliminação dessa prática é condição
fundamental para um Estado Democrático de Direito, esse plano apresenta medidas
a serem cumpridas por diversos órgãos do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário,
Ministério Público e entidades da sociedade. 124
Esse plano contêm 76 ações, divididas em seis grupos, que são: Ações
Gerais; melhoria na estrutura administrativa do grupo de Fiscalização Móvel;
melhoria na estrutura administrativa da Ação Policial; melhoria na estrutura
administrativa do Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho;
ações específicas de promoção da Cidadania e combate a impunidade e ações
específicas de conscientização, capacitação e sensibilização.125
121 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.75. 122 SCHWARTZ, Rodrigo Garcia. Trabalho Escravo: A abolição Necessária. LTR, 2008. p.146. 123 Presidência da República. Plano Nacional para erradicação do trabalho escravo. Disponível em: http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour//brasil/iniciativas/plano_nacional.pdf. Acesso em: 22 nov. 2011. p.09. 124 Presidência da República. Plano Nacional para erradicação do trabalho escravo. Disponível em: http://www.oit.org.br/sites/all/forced_labour//brasil/iniciativas/plano_nacional.pdf. Acesso em: 22 nov. 2011. p.09. 125 ANTERO, Samuel A. Monitoramento e avaliação do Programa de Erradicação do Trabalho Escravo. Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro 42(5): 791-828, SET./OUT. 2008. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rap/v42n5/a02v42n5.pdf, Acesso em: 21 nov. 2011, p. 08.
40
A aplicação desse programa tem como base ações de fiscalização, inclusão
dos trabalhadores libertados em políticas públicas e campanhas informativas como
forma de conscientização de toda a sociedade ao problema, para que possa criar
formas que impeçam essa prática criminosa.126
Em 2008, foi elaborado o 2º Plano Nacional da Erradicação do Trabalho
Escravo, elaborado pela CONATRAE 127 que tem como medidas a melhoria da
fiscalização ao grupo móvel do Ministério do Trabalho e Emprego, como iniciativas
de capacitação aos trabalhadores libertados, visando a sua reinserção no mercado
de trabalho. Como forma de repressão econômica há um acordo aos empresários
signatários de não adquirir produtos, que tenham sido fornecidos por meio de mão
de obra escrava.128
3.2 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO:
Com o advento da Constituição de 1988, o Ministério Público passou a ter
independência institucional, tornando-se um instituto constitucional extra poderes.
Seus objetivos, de acordo com o artigo 127 da CF/88, baseiam-se na defesa da
ordem jurídica, regime democrático, interesses sociais e individuais, com autonomia
funcional administrativa e financeira e tem no Ministério Público do Trabalho seu
órgão especializado para atuar na Justiça do Trabalho.129
A Constituição Federal de 1988 inovou ao tutelar no ordenamento jurídico os
interesses de terceira dimensão, denominados interesses metaindividuais, que
buscam preservar não apenas o direito de um homem, mas de seu gênero,
abrangendo a todos os indivíduos. Esses interesses são representados pelo direito a
126 Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo. Segundo Plano para erradicar o trabalho escravo tem 66 metas. Disponível em: http://www.senado.gov.br/noticias/2-plano-nacional-para-erradicar-o-trabalho-escravo-tem-66-metas.aspx. Acesso em: 22 nov. 2012. 127 Planejamento Estratégico do MPT – Disponível em: http://portal.mpt.gov.br/wps/wcm/connect/3b9f1e0043fd52aebc5afcc0f7180bb0/relatorio_MPT_2009_WEB_Ajustado.pdf?MOD=AJPERES&CACHEID=3b9f1e0043fd52aebc5afcc0f7180bb0 Pagina 20 Acesso em: 24 nov. 2011. 128 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática . 2. ed. São Paulo: LTR, 2002. p.146. 129 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.113.
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fraternidade, ao desenvolvimento, à paz e ao meio ambiente sadio, como a
preservação do patrimônio comum da humanidade.130
O Ministério Público do Trabalho exerce sua função de duas formas, como
Parquet, elaborando pareceres, expressando sua opinião em processos em análise
dos Tribunais Regionais e também do Tribunal Superior do Trabalho, e também
possui legitimidade para atuar como agente, protegendo os direitos difusos, coletivos
e individuais homogêneos, sempre que foram desrespeitados.131
O Direito Coletivo que tem como titularidade um conjunto de pessoas de uma
determinada classe ou categoria são interesses comuns somente a essa
coletividade. Esses membros do grupo estão unidos por laço jurídico, podemos citar
como exemplo o sindicato, órgãos profissionais, esse interesse coletivo atinge uma
delimitação de pessoas. Tem como base o artigo 81, II da Lei 8.078/90.132
Já os Interesses Difusos tem como principal característica não ter vinculo à
existência de um individuo ou determinado grupo, seus interesses por uma
circunstancia, um fato. São de natureza transindividual, indivisíveis, não permitindo
seu partilhamento em cotas e no caso de lesão e reparação implica no tratamento
igual a todos os interessados, porém a titularidade é indeterminada. Essa situação
está sujeita a mudanças no tempo e no espaço e seus conceitos provem do artigo
81 § único da Lei nº 8.078/90. 133
Segundo Amarildo Carlos de Lima “para caracterização dos Interesses
Difusos deve se fazer presente sua natureza coletiva, do que decorre a
indivisibilidade de seu objeto, a indeterminabilidade de seus titulares e a existência
de uma circunstância fática e a inter-relacioná-los.”134
130 MORAIS, José Luis Bolzan de. Do direito social aos interesses transindividuais: o Estado e o direito na ordem contemporânea. Porto Alegre. p.128. 131 LIMA, Amarildo Carlos de. A ação civil pública e sua aplicação no processo do trabalho. São Paulo: LTR, 2002. p.37. 132 LIMA, Amarildo Carlos de. A ação civil pública e sua aplicação no processo do trabalho. São Paulo: LTR, 2002. p.38. 133 MORAIS, José Luis Bolzan de. Do direito social aos interesses transindividuais: o Estado e o direito na ordem contemporânea. Porto Alegre. p.128. 134 LOPES, Alpiniano do Prado. A ação civil Pública e o processo trabalhista. Revista do Ministério Público do Trabalho. LTR, ano IX, Nº 17, MARÇO DE 1999. p 32.
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Permite a Lei nº 8.078/90 por motivo de causa comum que os prejudicados
em conjunto ou de forma unitária para ressarcirem seus danos. Essa previsão tem
como propósito a economia processual, pois os interesses individuais pretendem a
satisfação jurídica através de um processo único caracterizando a homogeneidade
da causa. 135
Segundo, Alpiniano do Prado Lopes, desde a promulgação da Constituição
Federal de 1988, em seu artigo 129, III, onde se estabeleceu medidas como
proteção ao patrimônio público, meio ambiente e outros interesses coletivos de
função institucional do Ministério Público tornaram possível à propositura de ação
civil pública para proteção de interesse difuso ou coletivo, mesmo que estas não
estivessem regulamentadas pela lei nº 7.347/85.136
Os Direitos Individuais Homogêneos são um conjunto de interesses
individuais com causa comum porem seus titulares são identificáveis
individualizados. 137 Esses direitos afetam um número especifico de pessoas,
diferentes formas e consequências, para cada um dos envolvidos nesta relação.138
Para Carlos Henrique Bezerra Leite, ação civil pública em defesa dos direitos
individuais homogêneos por não estar expressa no artigo 29, III, da CF/88 e na
redação do artigo 83, III, da Lei Complementar nº 75/93 – LOMPU torna dúbia a
legitimidade do Ministério Público do Trabalho em ajuizá-la.139
Com o Código de Defesa do Consumidor – CDC, conforme Lei nº 8.078/90,
através do artigo 110, acrescentou o inciso IV, ao artigo 1º da Lei da ação civil
pública, positivando a ação civil pública a qualquer outro interesse difuso ou coletivo,
ressaltando que o parágrafo único do artigo 81 da referida lei define como defesa
135 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática . 2. ed. São Paulo: LTR, 2002. p.163. 136 MORAIS, José Luis Bolzan de. Do direito social aos interesses transindividuais: o Estado e o direito na ordem contemporânea. Porto Alegre. p.121. 137 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. A ação civil pública e a tutela dos interesses individuais homogêneos dos trabalhadores em condições análogas à de escravos. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, Síntese v.71, n.2, maio/ago. 2005, pág.25. 138 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática . 2. ed. São Paulo: LTR, 2002. p.148. 139 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. A ação civil pública e a tutela dos interesses individuais homogêneos dos trabalhadores em condições análogas à de escravos. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, Brasília, Síntese v.71, n.2, maio/ago. 2005, pág.25.
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coletiva quando tratar-se de interesses ou direitos difusos, direitos coletivos e
direitos individuais e homogêneos.140
A legitimação para a defesa dos interesses individuais homogêneos na
Justiça do Trabalho está ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana e no
valor social do trabalho, fundamentados nos Estado Democrático de Direito.141
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO. DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS. LEGITIMIDADE PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA. Diante de uma interpretação sistemática dos arts. 6.º, VII, -d-, e 83, III, da Lei Complementar n.º 75/1993, 127 e 129, III, da Constituição Federal, depreende-se que o Ministério Público detém legitimidade para ajuizar Ação Civil Pública buscando defender interesses individuais indisponíveis, homogêneos, sociais, difusos e coletivos. O STF e esta Corte possuem o entendimento pacífico no mesmo sentido. Decisão regional em consonância com o atual posicionamento do TST sobre a matéria. Aplicação da Súmula 333 do TST e do art. 896, § 4.º, da CLT. Agravo de Instrumento desprovido. Processo: AIRR - 25041-02.2006.5.03.0017 Data de Julgamento: 18/04/2012, Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/04/2012.142
A atuação do Ministério Público do Trabalho nos casos de trabalho escravo
ocorre basicamente de duas formas, uma sendo judicial, prevista no artigo 83 da Lei
Complementar nº 75/93 e outra administrativa com efeito no artigo 84 da referida
lei.143
Entre as funções exercidas pelo Ministério Público do Trabalho, destaca-se o
Inquérito Civil Público, a Ação Civil Pública e a possibilidade de uso do TAC (Termo
de Ajuste de Conduta).
3.2.1 Medidas Administrativas
Quando houver denúncia de condições análogas de escravo, o Ministério
Público do Trabalho instaurará um inquérito civil, com objetivo de reunir provas para
uma futura ação civil pública. A criação do Inquérito civil Público ocorreu pela Lei nº
7.347/85, onde lhe foi atribuído o mérito investigativo, no qual o Ministério Público
140 Lei nº 8.078/90. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm. Acesso em: 21 nov. 2011. 141 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Ministério Público do Trabalho: doutrina, jurisprudência e prática. 2. ed. São Paulo: LTR, 2002. p.143. 142 ARARUNA, Eduardo Varandas. A execução do termo de ajuste de conduta: pontos polêmicos. Revista do Ministério Público do Trabalho, v.12, n.23, MAR/2002, pág. 23. 143 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34. p.81.
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recebeu poderes para colher provas, possibilitando formar convicção sobre os
investigados. Todavia os inquéritos podem acabar através de arquivamento,
medidas judiciais ou até mesmo com acordo entre o MP e o acusado.144
Esse acordo onde o MPT pode propor a adequação cometida pelo infrator é
realizado pela assinatura do TAC, a fim de evitar a ação civil pública.145Neste termo
a parte investigada admite as irregularidades e compromete-se a sanar os danos
causados. O investigado assina o termo de conduta por vontade própria, não sendo
permitido ao MP impor esta condição.146Segundo Eduardo Varanda Araruna, “essa é
a raiz do termo de conduta: a vontade do inquirido, livre de qualquer vicio de
consentimento”.147
Além disso, há a possibilidade de aplicação de multa e penas pecuniárias ao
infrator, onde os valores das ações de dano moral coletivo e dos Termos de Ajuste
de Conduta são revertidos ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), instituído
através da Lei nº 7.998/90, que destina esses recursos aos programas do
PIS/PASEP e financia programas de desenvolvimento econômico e o custeio do
fundo desemprego, conforme seu artigo 10. 148 Questiona-se essas destinações
dadas a estes valores arrecadados e repassados ao FAT, pois tais recursos teriam
maior eficácia sendo utilizados em ações voltadas a programas que beneficiem
trabalhadores resgatados da condição análoga de escravo.149
Neste contexto, a destinação dada a esses valores raramente chegam a
beneficiar as vitimas de trabalho escravo, pois muitos só conseguem ter sua CTPS
assinada após serem resgatadas pelos grupos de fiscalização, e assim não
conseguem receber abono salarial e/ou outros benefícios sociais.150
144 ARARUNA, Eduardo Varandas. A execução do termo de ajuste de conduta: pontos polêmicos. Revista do Ministério Público do Trabalho, v.12, n.23, MAR/2002, pág. 24. 145 ARARUNA, Eduardo Varandas. A execução do termo de ajuste de conduta: pontos polêmicos. Revista do Ministério Público do Trabalho, v.12, n.23, MAR/2002, p.24. 146 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.197. 147 ARARUNA, Eduardo Varandas. A execução do termo de ajuste de conduta: pontos polêmicos. Revista do Ministério Público do Trabalho, v.12, n.23, MAR/2002. p.24. 148 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.196. 149 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.197. 150 SILVA, Cristiane de Mello Matos Sabino Gazola, Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual a supressão dos direitos sociais fundamentais, LTR, 2009, São Paulo. p.93.
45
Como modo de corrigir estas distorções através da Lei nº 10.608/02,151 que
garantiu-se aos trabalhadores resgatados em condição de trabalho escravo, o
acesso ao de seguro-desemprego, através do recebimento de três parcelas e desde
que haja comprovação de ter sido resgatado de trabalho forçado e não estar em
gozo de benefício previdenciário de prestação continuada, exceto pensão por morte
e auxílio-acidente.152
Nota-se a falta de programas oficiais de apoio aos trabalhadores resgatados
das condições análogas de escravo, como projetos de qualificação profissional, para
que possam ter condições de inserção social e concretiza-los o direito ao trabalho
digno, pois os recursos destinado ao FAT, não financiam qualquer projeto com tal
objetivo.
O uso do TAC é uma forma efetiva de corrigir lesões causadas a interesses
coletivos, difusos e individuais homogêneos e no caso de descumprimento deste
acordo celebrado, então não há outra forma a não ser o ajuizamento da execução
do termo firmado.153
Existe a possibilidade do infrator em negociar os termos e condições do
acordo, como prazos, valores e demais condições de junto ao MPT, como no caso
recente da Multinacional Inditex, que mesmo após ser comprovada a existência de
condições análogas ao de escravo na sua cadeia produtiva, relutou em assinar o
TAC primeiramente estabelecido, especialmente após o caso deixar de ter
“importância” na mídia nacional e internacional, como podemos ver na reportagem a
seguir:
MPT e Zara não chegam a acordo; procuradores podem ingressar com ação ainda este ano Contraproposta da empresa será analisada em 10 dias, mas diverge do objeto principal do TAC proposto ao grupo Inditex São Paulo (SP) - Terminou sem acordo a audiência entre Ministério Público do Trabalho e a empresa Zara, em São Paulo, na tarde desta quarta-feira (30). O Termo de Ajuste de Conduta (TAC) proposto pelos procuradores, que foi recusado pela diretoria espanhola, contém cláusulas que imputam responsabilidade trabalhista à marca sobre suas terceirizadas, além da proibição da subcontratação por fornecedores (a chamada quarteirização) e
151 Lei nº 10.608/02. Disponível em: http://www81.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2002/10608.htm. Acesso em 22 nov. 2011. 152 152 Lei nº 10.608/02. Disponível em: http://www81.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2002/10608.htm. Acesso em 22 nov. 2011. 153 ARARUNA, Eduardo Varandas. A execução do termo de ajuste de conduta: pontos polêmicos. Revista do Ministério Público do Trabalho, v.12, n.23, MAR/2002, pág. 24.
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a obrigação ao pagamento de R$ 20 milhões a título de indenização por danos morais. A Zara apresentou uma contraproposta com base em preceitos da responsabilidade social e do código de conduta da empresa, contendo um investimento de R$ 3,15 milhões em projetos elaborados pelo grupo Inditex, dono da marca. O procurador Luiz Carlos Fabre manifestou-se favorável à análise da proposta no prazo de 10 dias, mas adiantou que não vai abrir mão dos direitos considerados “indisponíveis aos trabalhadores”, entre eles, a obrigação da Zara em responder solidariamente pela sua cadeia produtiva. “Quem deve assumir o custo é aquela que, em última instância, é a maior beneficiária”, afirma Fabre. Em coletiva de imprensa, o procurador ainda afirmou que a responsabilidade social no mundo empresarial representa um compromisso das empresas para com seus consumidores, mas que tais práticas não garantem a “segurança jurídica”, com possíveis penalidades, inclusive pecuniárias, em caso de descumprimento da lei trabalhista. Por meio do TAC proposto, o MPT busca este compromisso da empresa. “A responsabilidade social desprovida de responsabilidade jurídica não quer dizer nada. Uma empresa socialmente responsável tende a firmar um compromisso com o MPT. Caso contrário, são palavras soltas ao vento”, finaliza. Na sua contraproposta, a Zara incluiu em uma das cláusulas que fica “adstrita às obrigações assumidas no presente instrumento, não devendo a empresa ser diretamente responsabilizada pelas irregularidades cometidas por seus fornecedores”. O entendimento do MPT diverge totalmente da referida cláusula, e considera a responsabilização trabalhista da Zara algo “inconciliável”. Segundo os procuradores, incluindo Fabíola Zani e Ronaldo Lira, de Campinas, titulares do processo originário no interior de São Paulo, as negociações estão chegando a um desfecho e existe a possibilidade de ingresso de ação civil pública ainda este ano. No meio tempo, o MPT e a empresa devem se corresponder para uma última tentativa de acordo.154
Como verificamos, através da noticia vinculada, apesar de sua culpabilidade
efetiva, o acusado mantém uma posição de “inocência”, sempre com as ressalvas
de que não é responsável direto pelo dano, uma vez que utiliza de sistemas
terceirizados (que teriam sido quarteirizados neste caso específico), porém sem a
atuação do Ministério Publico do Trabalho, tudo isso torna-se “palavras soltas ao
vento” como concluiu o procurador Luiz Carlos Fabre, na citada reportagem.
154 Disponível em: http://portal.mpt.gov.br/wps/portal/portal_do_mpt/comunicacao/noticias/conteudo_noticia/!ut/p/c5/dY_BUoMwGISfxQdw8gdawCMhaQgWTakUyqUDbc2khETFcVqeXhwvXtw97nf4FjVorm2_tGo_tbOtQTVqgoMsgT8QHEO0ywiIUuxIxEIMMaAMNcq4biYreuyv1MWKMlqMEwGTdl72LLhm2dbFLE_N_WDDmyQ9HDf-Xjk62Be9_KgnuTGhAcEtrvR5sb5wGB8Tb19bfGpukceb6YrlqFfj-ykqaSJNEajXMHf-ClU_xn8MORMJCJbgdZEXPkDwu8M_mR88pW44o7e-g8sivvsGwIk9LQ!!/dl3/d3/L2dJQSEvUUt3QS9ZQnZ3LzZfUFUwRzlCMUEwOFZKQjBJVUlWQjhFNzFCSjc!/?WCM_GLOBAL_CONTEXT=%2Fwps%2Fwcm%2Fconnect%2Fmpt%2Fportal+do+mpt%2Fcomunicacao%2Fnoticias%2Fmpt+e+zara+nao+chegam+a+acordo+procuradores+podem+ingressar+com+acao+ainda+este+ano. Acesso em: 09 jun. 2012..
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Através da incisiva atuação do MPT, o caso em questão teve seu desfecho
favorável aos trabalhadores, como consta na seguinte Nota à Imprensa veiculada
em 19 de dezembro de 2011:
Zara assina termo de ajuste de conduta com o MPT São Paulo (SP) – O Ministério Público do Trabalho, o Ministério do Trabalho e Emprego e a Zara Brasil, empresa do Grupo Inditex, comunicam hoje a assinatura do Termo de Ajuste de Conduta (TAC) que visa aperfeiçoar o controle sobre as confecções da indústria têxtil, eliminar a precarização e garantir melhor qualidade de vida aos trabalhadores. Para pôr em prática essas ações, a Zara realizará um investimento social de R$ 3,4 milhões e criará um fundo de emergência para resolver eventuais situações de precariedade de trabalhadores. O acordo demonstra o compromisso e o interesse do Grupo Inditex e da Zara Brasil em reforçar o controle da cadeia de suprimentos por meio do cumprimento da legislação brasileira e do Código de Conduta da companhia por parte de seus fornecedores e empresas subcontratadas. O TAC busca ainda incentivar a promoção dos direitos humanos, principalmente dos trabalhadores imigrantes. Com o TAC, as partes entendem que podem proporcionar mecanismos apropriados para a identificação, integração, proteção, e reabilitação das vítimas do trabalho forçado ou precário, com estruturas inovadoras que exijam o cumprimento das legislação [sic] e que aproveitem a extensa experiência da Zara e sua preocupação com a sustentabilidade e responsabilidade social. Tratam-se de ações realistas, efetivas, práticas e objetivas e que se articulam nas seguintes frentes: Ações corretivas: - Estruturar as relações de longo prazo entre as empresas da cadeia de suprimentos; - Formalizar as oficinas de costura; - Fortalecer os negócios das oficinas de costura; Ações informativas: Criar a consciência da necessidade de regularizar a situação trabalhista tanto do ponto de vista das relações entre empresa e trabalhador como da própria estrutura jurídica das oficinas. Para isso, serão realizados seminários e reuniões de conscientização com empregadores e trabalhadores e haverá a implementação de um serviço de orientação jurídica e administrativa especializada, que atuará junto às empresas nos processos de regularização. Estes programas serão realizados por ONGs como Centro Pastoral do Migrante, Centro de Apoio ao Migrante (Cami), CDHIC – Centro de Direitos Humanos de Cidadania do Imigrante, ANEIB – Associação Nacional de Estrangeiros e Imigrantes Brasileiros, entre outras. Ações formativas O principal objetivo é promover e garantir a inclusão ou reinclusão dos trabalhadores egressos do trabalho escravo e/ou em situação de vulnerabilidade no mercado de trabalho. Para isso, serão feitos cursos de capacitação e orientação profissional para a indústria têxtil, cursos de português e oferecidas bolsas de estudo.155
155 Disponível em http://portal.mpt.gov.br/wps/portal/portal_do_mpt/comunicacao/noticias/conteudo_noticia/!ut/p/c4/04_SB8K8xLLM9MSSzPy8xBz9CP0os_iAUAN3SydDRwOLMC8nA89QzzAnC1dzQycvc_2CbEdFANihpkc!/?WCM_GLOBAL_CONTEXT=/wps/wcm/connect/mpt/portal+do+mpt/comunicacao/noticias/zara+assina+termo+de+ajuste+de+conduta+com+o+mpt. Acesso em: 09 jun. 2012.
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Apesar de que neste novo acordo não haver desembolsos pecuniários
imediatos pela ré (note-se que inicialmente estava-se sendo exigida a obrigação ao
pagamento de R$ 20 milhões a título de indenização por danos morais) podemos
considerar o TAC assinado como um avanço na luta pela erradicação do trabalho
escravo, pois resultaram em ações efetivas de correção de distorções nas cadeias
produtivas, na responsabilização de todos os envolvidos no processo evitando assim
a terceirização como medida de burlar a legislação e encobrir delitos, e o mais
importante a promoção de ações de capacitação e formação destes trabalhadores
para que o problema não se repita.
3.2.2 Medida Judicial
A Ação Civil Pública surgiu através da Lei nº 7.347/85, sendo o primeiro
instrumento jurídico com o objetivo de proteção dos interesses da coletividade e
eventual responsabilização pelos danos ocorridos com o meio ambiente,
consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e
paisagístico.156
Podemos dizer que a jurisdição trabalhista metaindividual, também
desempenha o papel de igualdade aos trabalhadores, no acesso a justiça. O
trabalhador sozinho teria mais dificuldades em pleitear direitos e estando
empregado, não o faz com medo de perdê-los, sendo esse direito estendido a
instituições ou associações, que tem como função a proteção de seus interesses,
podemos afirmar que esse acesso ocorre de forma igualitária.157
No entanto a grande maioria dos envolvidos nas relação de trabalho escravo,
não possuem acesso a jurisdição trabalhista metaindividual através da CLT, pois
nessa não há base jurídica, utiliza-se a aplicação de princípios e normas que
possuem coerência entre si e com a Constituição Federal, que são o CDC e a
LOMPU.158
156 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7347orig.htm/. Acesso em: 09 jun. 2012. 157 LOPES, Alpiniano do Prado. A ação civil Pública e o processo trabalhista. Revista do Ministério Público do Trabalho. LTR ano IX, Nº 17, MARÇO DE 1999, p 33. 158 LOPES, Alpiniano do Prado. A ação civil Pública e o processo trabalhista. Revista do Ministério Público do Trabalho. LTR ano IX, Nº 17, MARÇO DE 1999, p 33.
49
Com esse propósito o Ministério Público do Trabalho, usando suas
atribuições, utiliza a ação civil pública como meio de restringir a prática de trabalho
escravo, tendo como base o artigo 83, III da LOMPU.
A legitimidade para propositura da ação nas relações de trabalho, prevista no
artigo 5º da mencionada lei, é deferida ao Ministério Público do Trabalho, aos órgãos
da administração pública direta e indireta e associações legalmente constituídas,
que tenham como finalidade a defesa de interesses oriundos da relação de trabalho,
cuja existência não seja inferior a 1 ano, sendo que tal requisito não exige-se dos
sindicatos.159Incluem-se no polo passivo todos aqueles que por ação ou omissão
causaram danos aos direitos trabalhistas reconhecidos na Constituição Federal e na
CLT, pessoas físicas ou jurídicas.160
Destacam-se como objeto da ação civil pública as obrigações de fazer e não
fazer, ações de dano moral individual e coletivo, como forma de efetivar direitos
fundamentais como a igualdade, à proibição de trabalho degradante, trabalho digno
e acesso à justiça, de forma especial aos trabalhadores submetidos á condição
análoga de escravo.161
Entre as ações com mais efetividade para a erradicação do trabalho escravo,
destaca-se o dano moral coletivo, que vem sendo usado como forma de penalidade
a esse crime desde o ano de 2001, onde o valor dessas indenizações impostas pela
justiça do trabalho leva em consideração a gravidade, extensão e a capacidade
econômica do infrator, no caso de haver reincidência e principalmente o caráter
pedagógico.162
Como demonstrado no seguinte caso, à jurisprudência reconhece a
legitimidade da ação civil pública na Justiça do Trabalho, como a defesa dos
interesses coletivo e difuso:
EMENTA:
159 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.194. 160 VELLOSO, Gabriel; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Trabalho escravo contemporâneo: o desafio de superar a negação. São Paulo: LTR, 2006. p.196. 161 LOPES, Alpiniano do Prado. A ação civil Pública e o processo trabalhista. Revista do Ministério Público do Trabalho. LTR ano IX, Nº 17, MARÇO DE 1999. p.33. 162 LOPES, Alpiniano do Prado. A ação civil Pública e o processo trabalhista. Revista do Ministério Público do Trabalho. LTR ano IX, Nº 17, MARÇO DE 1999. p.36.
50
DIREITO PROCESSUAL DO TRABALHO - ACP – LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – OCORRÊNCIA – INTERESSES COLETIVOS E DIFUSOS DOS TRABALHADORES – DANO MORAL COLETIVO - SEGURANÇA E MEIO AMBIENTE DO TRABALHO –COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO – SÚMULA 736/STF – Os empregadores podem ser responsabilizados, civil, administrativa e penalmente pelo mesmo ato (ou fato), comissivo ou omissivo, a que deram causa. Cabe o reconhecimento da legitimidade do MPT para a proposição da respectiva Ação Civil Pública, com pedido de reparação de dano moral coletivo, em atenção às expressas imposições constitucionais, insculpidas nos arts. 1º, III; 4º, II; 5º, III (CF/88), que, minimamente, estabelecem parâmetros em que se fundam o Estado Brasileiro e as garantias de seus cidadãos. Nessas hipóteses, o pedido do MPT, tem natureza nitidamente coletiva, o que autoriza a atuação do Órgão de acordo com sua competência constitucional, perante a Justiça do Trabalho (art. 83, “caput” e III, LC 75/93 c/c art. 7º, XXII, CF/88). A atividade produtiva impõe responsabilidade social (art. 1º, IV, da CF/88) e o direito de propriedade, que tem função de mesma natureza (social e não apenas individual), está ligado a esse Princípio por expresso substrato insculpido no art. 5º, XXIII, da CF/88, cabendo, portanto, a atuação do MPT como um dos órgãos legitimados a propor a ACP quando em discussão interesses que não podem ser classificados como meramente individuais. Os pedidos que tenham por fundamento questões de segurança e meio ambiente do trabalho, não se incluem dentre os admitidos à postulação individual quando referentes à direitos transindividuais, daí porque, o reconhecimento da legitimidade do Ministério Público do Trabalho para atuar em tais casos perante a Justiça Especializada. Inteligência da SÚMULA 736 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, que reconhece a competência da Justiça do Trabalho para decidir sobre tais matérias, em sintonia com o disposto nos ARTS. 6º, VII, “a”, “d”, XIV E 83, “caput” e III, DA LEI COMPLEMENTAR 75/93, uma vez que pelo Princípio da Inércia do Juiz, tal competência somente pode ser exercida através da provocação do MPT, como Órgão Agente, por meio da ação própria.163
Referida ação civil pública interposta gerou a maior condenação de dano
moral coletivo por manter pessoas em condições análogas de escravo, em desfavor
do grupo Lima Araújo, condenado ao pagamento de R$ 5 milhões.
O réu era reincidente, pois em fiscalização realizada pelos auditores do
Ministério do Trabalho em outro momento foi formulada ação civil pública Proc. JCJ-
ca 1227/98, que pediu sua condenação por obrigações de fazer e não fazer e
resultou na homologação de acordo judicial, na qual a ré comprometeu-se a cumprir
com todas as obrigações trabalhistas e multas e descumprimento de tal acordo.
Porem, no ano de 2001 em nova fiscalização pelo grupo móvel, foram encontrados
163 Ministério Público do Trabalho, da 8º região, na Justiça do Trabalho do Estado do Pará, Processo de nº 01780-2003-117-08-00-2.. disponível em http://www2.trt8.jus.br/consultaprocesso/formulario/ProcessoConjulgado.aspx?sDsTelaOrigem=ListarProcessos.aspx&iNrInstancia=2&sFlTipo=T&iNrProcessoVaraUnica=117&iNrProcessoUnica=178000&iNrProcessoAnoUnica=2003&iNrRegiaoUnica=8&iNrJusticaUnica=5&iNrDigitoUnica=13&iNrProcesso=0&iNrProcessoAno=0&iNrProcesso2a=8620&iNrProcessoAno2a=2005. Acesso em 12 jun. 2012.
51
50 trabalhadores em condições análogas de escravo, entre esses 02 eram
adolescentes, resultando que nesse ato foram lavrados 13 autos de infração.
A seguir observar-se a conclusão dos auditores fiscais após a inspeção:
Todo o quadro que vivenciamos, configurava uma inequívoca situação de servidão por dívida, onde os serviços contratados pelos “gatos” com gerente eram mantidos com a imposição do medo mediante vigilância armada, além de proibir-lhes de se ausentar da fazenda ou adquirir qualquer coisa que não fosse da sua cantina. Os instrumentos de trabalho eram vendidos, desde lima, machado, foice etc. No armazém era também revendido remédio, calça, lençol, rede, sandálias havaianas, lanternas, aguardente, fermento, plástico para cobertura do barraco, lima, esmeril, enfim só a água era gratuita porque a própria natureza fornecia nos córregos. A consciência do gerente sobre tanta iniqüidade praticada pelos seus “empreiteiros” ficou bem patente, tendo declarado, inclusive, que aquilo era normal no Pará. (...) A arregimentação no Estado do Tocantins, o desconto pelo transporte, a falta de garantia do retorno, as condições aviltantes e humilhantes de trabalho, trabalho infantil nas suas piores formas, saúde aviltada, “truck system”, venda de bebidas alcoólicas, isolamento familiar, informalidade do contrato de trabalho, tudo isso forma um quadro de desrespeito a toda espécie de ordenamento jurídico, com a anuência do gerente, cujo objetivo era apenas manter a fazenda que lhe foi confiada em funcionamento, às custas do sofrimento e opressão de trabalhadores. Os empregados fardadados, que são o cartão de visita da empresa, circulando em tratores logo na entrada, simulavam uma ordem e respeito à lei. Assim, qualquer autoridade que visitasse aquela propriedade sairia com a certeza de que não havia nenhuma infração (...). Somente um trabalhador que tivesse sido vítima dessa simulação poderia nos dar indicativos para que chegássemos até aquela vila de escravos camuflada.”
164
Tendo como base os fatos narrados, tais situações não são apenas infrações
a Lei Trabalhista, mas violação aos direitos fundamentais e difusos, consagrados na
CF/88, como a proteção da dignidade da pessoa humana, artigo 1º IV,
inviolabilidade do direito á vida, liberdade, igualdade, segurança, artigo 5º caput, a
liberdade do exercício de trabalho, artigo 5º XIII, de locomoção, artigo 5ºXV,
proibição de prisão civil por dívida, artigo LXVII.165
A erradicação da escravidão é um direito de toda a sociedade. A criação de
meios e a fiscalização, para que se possa acabar com a utilização dessa exploração 164 Ministério Público do Trabalho, da 8º região, na Justiça do Trabalho do Estado do Pará, Processo de nº 01780-2003-117-08-00-2.. disponível em http://www2.trt8.jus.br/consultaprocesso/formulario/ProcessoConjulgado.aspx?sDsTelaOrigem=ListarProcessos.aspx&iNrInstancia=2&sFlTipo=T&iNrProcessoVaraUnica=117&iNrProcessoUnica=178000&iNrProcessoAnoUnica=2003&iNrRegiaoUnica=8&iNrJusticaUnica=5&iNrDigitoUnica=13&iNrProcesso=0&iNrProcessoAno=0&iNrProcesso2a=8620&iNrProcessoAno2a=2005. Acesso em 12 jun. 2012. 165 SILVA, Cristiane de Mello Matos Sabino Gazola, Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual a supressão dos direitos sociais fundamentais. LTR, 2009, São Paulo. p.93.
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de trabalho é um dever do Estado. Ao se escravizar uma pessoa, está a fazer o
mesmo com toda a nação, esse direito é de natureza difusa, pois os titulares de tal
direito são indeterminados.166
3.3 EXPROPRIAÇÃO DE TERRAS - PEC Nº 438/ 2001
No ano de 2001 foi apresentada ao congresso Nacional a PEC nº 438/2001,
com objetivo de dar uma nova redação ao artigo nº 243 da CF/88, para estabelecer
como pena, onde for constatada a exploração do trabalho escravo, a expropriação
de terras e essas serão destinadas a reforma agrária ou ao uso social.
Não existe consenso sobre o assunto, há o posicionamento que essa pena
fere o direito de propriedade, já que a Constituição Federal autoriza a expropriação
de terras, sem indenização somente em propriedades que são encontradas plantas
psicotrópicas167 e outra corrente defende essa pena tendo como base o Artigo 5º,
XLVI, b, da CF/88 e que toda propriedade urbana e rural deve atender a sua função
social, e essa beneficiando-se de trabalho forçado, estaria sendo utilizada como
meio de opressão ao trabalhador, não sendo cumprida sua função.168
A proposta estava na pauta de votação na Câmara dos Deputados, mas
enfrentou mobilização por parte de representantes ruralistas para não haver
votação, devido à reclamação de não haver uma definição do que seria o trabalho
escravo, mesmo que esse já esteja tipificado em nosso ordenamento jurídico, como
já mencionado no artigo 149 do Código Penal.169 A intenção desses parlamentares é
que, havendo essa alteração no código penal, seja considerado trabalho em
condições análogas de escravo somente o trabalho forçado mediante ameaça,
coação ou restrição de locomoção por dívida, excluindo o trabalho degradante e
jornada exaustiva.170
Mobilização esta exemplificada na seguinte reportagem:
166 Disponível em: http://www.trabalhoescravo.org.br/conteudo/por-que-aprovar-pec-438. Acesso em: 20 mai. 2012. 167 Disponível em: http://www.trabalhoescravo.org.br/conteudo/por-que-aprovar-pec-438. Acesso em: 20 mai. 2012. 168 Disponível em: http://www.trabalhoescravo.org.br/conteudo/por-que-aprovar-pec-438. Acesso em: 20 mai. 2012. 169 Disponível em: http://www.valor.com.br/politica/2654424/proposta-de-ruralistas-restringe-conceito-de-trabalho-escravo. Acesso em: 20 mai. 2012. 170 Disponível em: http://www.trabalhoescravo.org.br/noticia/60. Acesso em: 20 mai. 2012.
53
O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), deputado Moreira Mendes (PSD-RO), apresentou nesta quinta-feira um projeto para restringir as situações que podem ser consideradas como trabalho escravo. O texto exclui a jornada exaustiva e as condições de trabalho degradantes das irregularidades que podem ser enquadradas como trabalho escravo. A proposta altera o Artigo 149 do Código Penal, que tipifica esse crime.171
Nota-se, em contrapartida, que há uma mobilização grande por parte da
sociedade para que finalmente seja aprovada a PEC 438/2001, sendo que
recentemente houve um seminário sobre escravidão contemporâneo, no Estado de
Santa Catarina, reunindo professores, universitários e pesquisadores do assunto,
que defendem a aprovação da PEC sem alterações.
Como afirma integrante do seminário, Angela de Castro Gomes, “tirar a ideia
da jornada exaustiva e do trabalho degradante seria uma perda absolutamente fatal.
O trabalho escravo é desumano, e jornadas exaustivas e degradantes envolve uma
profunda humilhação que pode levar até a morte,”172
Com tal propósito, no ano de 2004, ocorreu um caso de desapropriação
autorizado pelo Governo Federal, através de um decreto que desapropriava a área
por sanção trabalhista e violação da função social da propriedade, sendo essa
iniciativa inédita, que ocorreu na fazenda Castanhal Cabaceiras, cidade de Marabá
no Estado do Pará.173Essa propriedade foi alvo de fiscalização do Grupo Móvel do
Trabalho e Emprego (MTE), por três vezes onde foram encontrados trabalhadores
submetidos ao trabalho escravo e degradante, inclusive crianças. Essa área de
terras pertence a família Mutran, que encontra-se na “lista suja” do trabalho
escravo.174
No momento atual houve a aprovação integral da PEC 438/2001, na Câmara
dos Deputados, apesar das críticas de deputados para haver alterações no artigo
149 do Código Penal no que se refere ao conceito de trabalho escravo. A atual
definição é considerada adequada para as entidades envolvidas em projetos contra
171 Disponível em: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=147. Acesso em: 20 mai. 2012. 172 Disponível em: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1470. Acesso em: 20 mai. 2012. 173 Disponível em: http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/page/2/. Reportagem: Câmara aprova confisco de propriedade com trabalho escravo. Acesso em: 20 mai. 2012. 174 Disponível em: http://www.reporterbrasil.org.br/exibe.php?id=1470. Acesso em: 20 mai. 2012.
54
o trabalho escravo e essa aprovação recebeu o apoio de representantes da
Organização das Nações Unidas e Organização Internacional do Trabalho.175
3.4 RESTRIÇÃO AO CRÉDITO: LISTA SUJA
Com o intuito de buscar alternativas e contribuir com o Plano de Erradicação
do Trabalho Escravo, foi criado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, Cadastro de
Empregadores que contém nome de pessoas e empresas que tenham submetidos
seus empregados às condições análogas de escravo. Esse procedimento foi criado
pela Portaria nº 540 de 2004.176
Como forma de tornar-se prática essa medida foi editada a Portaria
Interministerial nº 2 de 12 de maio de 2011, que traz informações sobre a
atualização semestral dessa lista 177 , conforme o resultado das fiscalizações
realizadas pelos fiscais do Ministério do Trabalho.
A inclusão da empresa ou pessoa física nessa lista deverá ocorrer somente
após processo administrativo, sendo respeitado o direito de ampla defesa, com
decisão definitiva, sem hipótese de recurso. A exclusão do nome poderá acontecer
após um período de dois anos, desde que sejam cumpridas algumas condições,
como não reincidência, pagamento de multas, e os débitos trabalhistas e
previdenciários.178
Atualização dessa lista são divulgadas na internet do MTE, posteriormente
encaminhada a órgãos públicos, como a secretaria Especial dos Direitos Humanos,
Ministérios Públicos do Trabalho e Federal, Banco Central do Brasil, Ministério da
Fazenda, do Meio Ambiente, do Desenvolvimento Agrário, da Integração Nacional e
da Fazenda.179
175 Disponível em: http://www.trabalhoescravo.org.br/noticia/49. Acesso em: 20 mai. 2012. 176 Portaria Interministerial nº 540 de 2004. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/files/FF8080812BE914E6012BF2B6EE26648F/p_20041015_540.pdf. Acesso em: 21 nov. 2011. 177 Portaria Interministerial. nº 2 de 12 de maio de 2011. Disponível em: http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A2E7311D1012FFA7DD87E4E75/p_20110512_2.pdf. Acesso em: 21 nov. 2011. 178 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34, n.131. p.79. 179
FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34, n.131. p.79.
55
Essa medida tem mostrado ser um método eficaz de ajuda na erradicação do
trabalho escravo, pois ao ser incluído, não se consegue empréstimos e
financiamentos com recursos oficiais em instituições financeiras como Caixa
Econômica Federal, Banco do Brasil, BNDES, entre outros.
Mas existe outra forma de restrição, a comercial, feita por empresas, que não
realizam contratos com empresas que tem seu nome incluído na “lista suja”. Temos
como exemplo medida tomada pela Companhia Vale do Rio Doce, que rescindiu o
fornecimento de ferro das seguintes empresas autuadas e incluídas na lista, o
Siderurgia do Maranhão S/A, Siderurgia Marabá S/A, Ferro Gusa do Maranhão, por
favorecimento e utilização de carvão vegetal fabricados com mão de obra
escrava.180 Essa restrição efetivou as referidas empresas a perda de contratos, e
consequentemente muito dinheiro, o que as forçou a efetivar adequação na sua
cadeia produtiva, excluindo o uso de mão de obra análoga ao de escravo, para
garantir a continuidade de suas atividades.
Entretanto muitos empregadores conseguem a exclusão de seus nomes na
lista de restrição ao crédito ao recorrer ao Poder Judiciário, que lhes concede
aguardo ou suspensão da liminar ou análise de mérito do processo,181 como nesse
caso que vem sendo denunciado pela CPT182, referente a empresa COSAN S.A.,
uma das maiores produtoras de álcool e açúcar do país, que foi alvo de fiscalização
e estava utilizando de mão de obra escrava em suas atividades, tendo portanto seu
nome incluído na lista suja, mas que ao recorrer ao poder judiciário conseguiu
liminar impedindo sua inclusão enquanto aguarda o julgamento do processo.183
Com relação à competência para o ajuizamento dessa matéria existe
divergência, há quem defenda que é de competência da Justiça Federal, com base
180 SCHWARTZ, Rodrigo Garcia. Trabalho Escravo: A abolição Necessária, LTR, 2008. p.15. 181 Atualizada Lista Suja de Trabalho Escravo. Disponível em: http://www.mte.gov.br/sgcnoticia.asp?IdConteudoNoticia=7560&PalavraChave=escravo. Acesso em: 22 nov. 2011. 182 COMISSÃO PASTORAL DA TERRA 183 Revista Caros Amigos, ano XIV número 160, 2010. pág. 28
56
no artigo 109 caput I CF/88, porque nas ações em que a União configure como parte
deve ser ajuizadas na Justiça Federal.184
Mas com a Emenda Constitucional nº45, art. 114, VII, que diz:
“compete à justiça do trabalho processar e julgar as ações relativas às penalidades administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho.” 185
Tendo em vista o que nos menciona o artigo, não há dúvidas que seja de
competência da Justiça do Trabalho a competência para ajuizar essa matéria.
A atual lista foi divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, em 13 de
abril de 2012 e teve a inclusão de 52 infratores, totalizando 294 nomes, essa
expressiva quantidade deve-se a atuação do grupo móvel de fiscalização e vários
processos administrativos que iniciaram nos últimos anos.186
A adoção dessa medida significa um avanço no nosso país, passamos da
fase de discussão sobre o tema para medidas práticas, sendo a lista suja
consolidada através do Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, que
ocorre de forma conjunto com vários órgãos e setores da sociedade.187
3.5 RESPONSABILIDADE PENAL.
Apesar de haver tipificação como crime redução à condição análoga de
escravo, no artigo 149 Código Penal, a punição nem sempre acontece. Tal fato
criminoso, também pode ser chamado de sujeição ou plágio, conforme Jairo Lins de
Albuquerque Sento-sé, “[...] configura espécie de crime contra a liberdade individual
[...] é o apossamento do homem livre ou servo para obter lucro.188
184 CESÁRIO, João Humberto. Trabalho Escravo Contemporâneo. Breve estudo sobre o cadastro de empregadores que tenham mantido trabalhadores em condições análogas à de escravo (lista Suja): aspectos processuais e materiais. [s.l, s.e]. p.168. 185 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 20.11.2011. 186 Disponível em: http://portal.mte.gov.br/trab_escravo/portaria-do-mte-cria-cadastro-de-empresas-e-pessoas-autuadas-por-exploracao-do-trabalho-escravo.htm Acesso em: 21 mai. 2012. 187 FERNANDES, Iêda Andrade. Eficácia da lista suja no combate ao trabalho escravo. Revista de Direito do Trabalho (São Paulo), São Paulo, v.34, n.131. p.77. 188 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.87.
57
Ainda, em nosso país são raras as condenações criminais, decorrentes da
prática de trabalho escravo, por termos uma fiscalização ineficiente, pela falta de
pessoas e/ou recursos, os poucos casos que geram processos penais, contam com
a morosidade da justiça em julgá-los, onde muitos são absolvidos por falta de provas
ou até pela prescrição do crime,189 sendo que através das fiscalizações realizadas
desde o ano de 2003, tem-se o número de 42 mil trabalhadores libertados e nenhum
caso de empregador que tenha cumprido pena em regime fechado após sentença
transitada em julgado.190
Recentemente houve o oferecimento de denúncia no STF, em desfavor do
então Deputado Federal João José Pereira de Lyra, proprietário de empresa
denunciada por manter funcionários em condição análoga de escravo, uma das
maiores empresas da indústria canavieira do Estado de Alagoas e Minas Gerais,
que fora aceita pela maioria dos Ministros, através do inquérito nº 3412191, a partir
dessa decisão passará a ser investigado como réu em ação penal.
As irregularidades foram constatadas por fiscalização do Ministério do
Trabalho e Emprego, no ano de 2008 em uma das propriedades de suas empresas,
que segundo relatos feitos por agentes do Ministério Público, cerca de 53 pessoas
estavam alojadas em péssimas condições, dormindo em cima de espumas sujas de
espessura muito fina, não havia banheiros sanitários no local, nem ao menos fossas,
nenhum dos operários tinha qualquer equipamento de proteção, água fornecida era
impura, eram submetidos a jornadas exaustivas, longos períodos e não recebiam
hora extra.192
Diante de todos esses atos relatados, podemos verificar que estas situações
violam um bem maior, a dignidade da pessoa humana, e precisam ser punidas não
apenas com multas e a obrigação de pagar o que já é de direito do trabalhador.
189 SILVA, Cristiane de Mello Matos Sabino Gazola, Do Escravismo Colonial ao Trabalho Forçado Atual a supressão dos direitos sociais fundamentais. São Paulo: LTR, 2009. p.97. 190. Disponível em: http://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/. Acesso em: 12 jun. 2012. 191 . Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4209286. Acesso em: 12 jun. 2012. 192 Disponível em: http://congressoemfoco.uol.com.br/trabalho-escravo/deputado-mais-rico-e-acusado-de-trabalho-escravo/ Acesso em 21 mai. 2012.
58
Há outra conduta ilícita, que corrobora com o trabalho escravo, o aliciamento
de trabalhadores de um local para outro dentro do território nacional, elencado no
art. 207 Código Penal:
Art. 207 - Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra localidade do território nacional: Pena - detenção de um a três anos e multa § 1º Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu retorno ao local de origem. § 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental.
Como vimos anteriormente, o crime de aliciamento é muito comum nas
atividades rurais, onde se buscam pessoas para trabalhar em lugares distantes de
suas cidades de origem, com propostas de bom salário que muitas vezes são
apenas formas de conseguir cativar os trabalhadores, que chegando ao local de
trabalho são surpreendidos com uma realidade bem diferente, onde já estão em
dívida com o empregador pelas despesas da viagem e alimentação. Essa prática é
utilizada como um meio para chegar a servidão por dívida e conseguir manter uma
mão de obra com pouco custo ou quase nenhum e de forma a impedir que o
trabalhador deixe o lugar de trabalho para voltar pra sua cidade de origem193
193 SENTO-SÉ, Jairo Lins de Albuquerque. Trabalho escravo no Brasil na atualidade. São Paulo: LTR, 2000. p.91.
59
CONCLUSÃO
Podemos concluir que apesar de estarmos no século XXI, onde se passaram
mais de cem anos da abolição da escravatura, essa ainda continua a persistir, de
forma diferenciada pelas situações análogas ao trabalho escravo.
Apesar de inadmissível no ordenamento jurídico atual esta conduta continua a
ocorrer de forma dissimulada e desumana, e apesar do trabalhador submetido a
essa exploração não possuir uma conotação de propriedade como antigamente,
ainda é considerado descartável, sem haver nenhum vínculo com o empregador que
o usa para aumentar seus lucros com a sua atividade econômica e o descarta assim
que não tem mais utilidade, evidenciando que não há qualquer comprometimento e
responsabilidade com esta pessoa.
Hoje o termo utilizado para definir a prática do trabalho escravo é condições
análogas ao de escravo, mas a situação a que esses trabalhadores estão
submetidos assemelha-se muito ao tipo de regime escravocrata que consta de
nossa história, mesmo quando essa prática era considerada legal.
A figura do infrator contemporâneo se assemelha muito ao dos antigos donos
de escravos, para o qual esses trabalhadores deviam obediência e repetem-se as
situações por eles vivenciadas como no caso de que estão submetidos a
alojamentos de péssima qualidade, insalubres e sem qualquer cuidado com higiene.
Uma das práticas antigas e que continua a ser amplamente utilizada é servidão por
dívida, que podemos considerar como algo cultural, visto que na maioria dos casos é
empregada pelos grandes proprietários rurais de nosso país para manter a sua mão
de obra barata, como utilizado por seus antepassados.
Nota-se que diferentemente dos motivos de escravidão antiga ocorrer por
questões de diferenças raciais e culturais, hoje esta passou a ser por motivos
meramente de questão econômica.
Pelo que podemos analisar, nosso país instituiu várias medidas de formas de
combate ao trabalho em condições análogas de escravo, sendo reconhecido como
exemplo perante as outras nações. Entretanto ainda carecemos da falta de
efetividade em algumas dessas medidas, como por exemplo, a norma do artigo 149
60
do Código Penal, que considera como crime submeter alguém a essas condições,
mas que na prática sua aplicação é de pouca relevância, pois dificilmente existem
condenação e cumprimento de penas por estes infratores.
Independente dos resultados, cabe salientar que houve um grande avanço no
país no caminho da erradicação do trabalho escravo, em parte devida a criação de
novas leis, bem como o fortalecimento das instituições governamentais responsáveis
pela efetivação dessas normas, como MTE, MPT e as demais entidades não
governamentais que atuam fortemente nesta causa, como a CPT, ONG Repórter
Brasil e demais autores e juristas preocupados com este tema.
Há também uma grande perspectiva em torno da aprovação da PEC nº
438/2001, para que mediante a punição de expropriação de terras sem indenização
ocorra uma modificação de conduta por parte dos infratores, afastando assim a
cultura da escravidão no Brasil.
A conclusão que se chega é que precisamos, enquanto sociedade, não
somente combater o trabalho escravo, mas também atacar as causas que
impulsionam as pessoas para a sua exploração nas relações de trabalho, que são a
miséria, falta de escolaridade, de conhecimento de seus direitos, quer sejam através
de programas de inserção dos trabalhadores resgatados pelas fiscalizações ao
mercado formal de trabalho como a conscientização dos empregadores do uso
errôneo desta prática, seja por eles próprios, ou por seus parceiros em suas cadeias
produtivas, e o mais importante, todos nós cidadãos e consumidores usarmos de
nosso “poder de compra” para ajudar na erradicação do trabalho escavo no mundo.
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