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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ
NORMA BENJAMIN DE AZEVEDO
Representações Sociais de Identidade Docente de Professores das
séries iniciais do Ensino Fundamental em uma Escola de Elite
Rio de Janeiro
2009
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UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ
NORMA BENJAMIN DE AZEVEDO
Representações Sociais de Identidade Docente de Professores das
séries iniciais do Ensino Fundamental em uma Escola de Elite
Dissertação apresentada à Universidade Estácio de Sá como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Educação
Orientadora: Profª Drª Alda Judith Alves- Mazzotti
Rio de Janeiro
2009
13
VVIICCEE--RREEIITTOORRIIAA DDEE PPÓÓSS--GGRRAADDUUAAÇÇÃÃOO EE PPEESSQQUUIISSAA
NORMA BENJAMIN DE AZEVEDO HOFFMANN
RREEPPRREESSEENNTTAAÇÇÕÕEESS SSOOCCIIAAIISS DDEE IIDDEENNTTIIDDAADDEE DDOOCCEENNTTEE DDEE
PPRROOFFEESSSSOORREESS DDAASS SSÉÉRRIIEESS IINNIICCIIAAIISS DDOO EENNSSIINNOO FFUUNNDDAAMMEENNTTAALL
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DDiisssseerrttaaççããoo aapprreesseennttaaddaa àà UUnniivveerrssiiddaaddee EEssttáácciioo ddee SSáá
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PPrrooffªª DDrrªª AAllddaa JJuuddiitthh AAllvveess--MMaazzzzoottttii PPrreessiiddeennttee
UUnniivveerrssiiddaaddee EEssttáácciioo ddee SSáá
PPrrooffªª DDrrªª RRiittaa ddee CCáássssiiaa PPeerreeiirraa LLiimmaa
UUnniivveerrssiiddaaddee EEssttáácciioo ddee SSáá
PPrrooffªª DDrrªª Ana Canem
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
14
Dedico este trabalho em especial a meu pai, João de Azevedo,
e à minha avó, Helena Benjamin, que me antecederam e,
tendo acesso apenas à cultura informal e incomparável que
colheram da vida, semearam em mim a autoestima, que
permitiu que me sentisse capaz, e a curiosidade, que me
trouxe tão longe.
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AGRADECIMENTOS
Sendo uma pessoa da ciência que crê em uma ordem superior, sem a qual supõe
que o caos se instalaria e muitas respostas seriam devidas, penso com gratidão em
Deus, sentimento que, colocando-me tão próxima d‟Ele, distancia-me de qualquer
outra emoção menos acolhedora.
Quanto aos demais, sinto-me incapaz de hierarquizar a importância da participação
nessa construção. Será Anita, que cuidou da minha casa e de meus maiores
amores, garantindo-lhes o bem-estar de um lar bem cuidado e, afetuosamente,
municiou-me com o café que, em tantas longas, mas nunca suficientes, noites de
trabalho me manteve acordada, menos importante que Marcele que, com sua
tranquila “sabedoria tecnológica”, socorreu-me inúmeras vezes, auxiliando-me em
uma (in)competência, não por acaso apontada nesta pesquisa, que tanto me
amedronta? Áurea e Ana Paula estarão sempre em minhas lembranças carinhosas.
E Julia, sobrecarregada pelas inúmeras responsabilidades que sua capacidade
incomensurável atrai para si com a mesma naturalidade com que o pólen das flores
atrai os pássaros, ainda assim encontrou tempo para mais uma tarefa: a revisão
cuidadosa desse texto? Não é possível estabelecer uma ordem de importância.
Agradeço a satisfação de ter produzido este trabalho à minha querida professora,
mestre, orientadora Alda Mazzotti, que me proporcionou o privilégio de seus
ensinamentos, e personifica um ideal de ser humano e profissional que desejo,
perdoe-me a pretensão, atingir um dia.
À Direção do Colégio Cruzeiro e à Diretoria da Sociedade Beneficente Humboldt,
que abriram suas portas para a realização da pesquisa, conscientes de sua
responsabilidade com o meio acadêmico, e abriram, ainda, seus braços e coração
para me acolher e incentivar em um momento tão significativo, reiterando os
resultados da própria pesquisa, um reconhecimento eterno.
Agradeço a disponibilidade generosa da banca, dispensando um tempo precioso
para validar meu trabalho.
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Meus amigos, impossível enumerá-los, injustiças seriam certamente cometidas pelas
traições e peças que a memória nos prega. Portanto, tornam-se uma entidade a
quem serei carinhosamente grata.
Meu filho merece um destaque. Privado muitas vezes da companhia e paciência da
mãe, ainda assim foi generoso o suficiente para se oferecer para digitar, apontar
uma tecla do computador para mim desconhecida, massagear os ombros e o ego,
dizendo tantas vezes o quanto me ama. Esse amor, sem dúvida, fortalece e
impulsiona, e foi um norte que me guiou até aqui.
E ao meu marido, meu grande amor, que sempre viu minha capacidade com lentes
de aumento e incentivou-me a ir mais longe do que, certamente, não teria ido sem
ele. Por sua compreensão amorosa e capacidade de fazer-me sentir especial,
obrigada. Jamais expressarei com exatidão o que sua chegada à minha vida me
proporcionou.
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Renascimento
Diz-se, que mesmo antes de um rio cair no
oceano, ele treme de medo....
... Vê à sua frente um oceano tão vasto que entrar
nele,
Nada mais é do que desaparecer para sempre.
Mas não há outra maneira. O rio não pode voltar.
Ninguém pode voltar. Voltar é impossível na
existência.
Você pode apenas ir em frente.
O rio precisa se arriscar e entrar no oceano.
E somente quando ele entra no oceano,
É que o medo desaparece.
Porque, apenas então, o rio saberá
Que não se trata de desaparecer no oceano.
Mas tornar-se oceano.
Por um lado é desaparecimento
E por outro lado é renascimento.
(Osho)
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RESUMO
O objetivo deste estudo foi levantar indícios da representação social de identidade docente construída por professores das primeiras séries do ensino fundamental de uma escola de elite do município do Rio de Janeiro, buscando verificar em que medida significativas diferenças nas condições de trabalho e remuneração dos professores, quando comparados aos da rede pública, interferem no sentido conferido ao ser professor. Adicionalmente, procurou aferir o que significa para os sujeitos da pesquisa participar da formação da elite. Participaram do estudo 32 professores. Desses, 24 trabalham exclusivamente na instituição pesquisada, 8 na rede pública, sendo 6 como regentes de turma e 2 em funções burocráticas. O referencial teórico empregado foi a teoria das representações sociais, associando a abordagem processual à estrutural, utilizando-se teste de livre evocação de palavras com hierarquizações e justificativas e grupos focais. O tratamento dos dados das evocações recebeu o auxílio do software EVOC, que identificou como possíveis elementos do núcleo central competência, compromisso, desafio e responsabilidade, indicando uma representação marcada por elementos positivos. Os grupos focais realizados confirmaram esses resultados e reforçaram os indícios obtidos na análise das justificativas, de que os professores parecem objetivar a representação de ser professor de uma escola de elite, na ideia de desafio e ancorá-la na representação de bom profissional.
Palavras- chave: Ensino fundamental I; Identidade docente; Escola de elite.
19
ABSTRACT
The aim of this study was to gather evidence of social representations of teacher‟s identity presented by primary school teachers of an upper class school in the city of Rio de Janeiro, to verify in what way, significant differences in teachers‟ work conditions and payment, when compared to those of public schools, interfere in the meaning given to being a teacher. Thirty-two teachers took part in the study. The theoretic reference used was the Social Representations theory, associating the processual approach to the structural one, making use of free word evocation test, with hierarquies and justifications, and focus group. The evocation data treatment was made with the aid of the software EVOC, which identified the possible elements of the central nucleous: competence, commitment, challenge and responsibility, indicating a representation strongly marked by positive elements, much different from those found in research done with public school teachers. The focus groups confirmed the results got from the others methods. The survey of the evidence of the representation formation process indicated that the teachers seem to objectify the representation of being un upper class teacher today in the idea of challenge and anchor it on the good professional. Key words: Social representations; Teacher‟s identity; Upper Class Schools.
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Estrutura das representações sociais ....................................................29
Quadro 2 – Características do núcleo central e do sistema periférico ......................61
21
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Ser professor, hoje (escola de elite) ........................................................62
Tabela 2 - Ser professor da elite ...............................................................................65
Tabela 3 - Ser professor, hoje (escola municipal) .....................................................73
22
SSUUMMÁÁRRIIOO
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................12
1. INTRODUÇÃO.......................................................................................................14
1.1- OBJETIVO DO ESTUDO....................................................................................19
2. REFERENCIAL TEÓRICO ....................................................................................21
2.1 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS......................................................................21
2.1.1 Origem e definição do conceito.....................................................................21
2.1.2 FUNÇÕES DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS.............................................23
2.1.3 PROCESSOS E PRODUTOS DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS...............24
2.1.4 A ABORDAGEM ESTRUTURAL......................................................................27
2.1.5 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E PRÁTICAS SOCIAIS ...............................29
2.2 TRABALHO DOCENTE E IDENTIDADE .................................................................31
2.2.1 Desprofissionalização....................................................................................32
2.3 PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE...................................................37
2.3.1 POLÍTICAS PÚBLICAS, PROLETARIZAÇÃO E PERDA DE AUTONOMIA....37
2.3.2 PERDA DO PODER AQUISITIVO DE AS........................................................39
2.3.3 DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL E DESPRESTÍGIO SOCIAL...............41
2.3.4 DIFICULDADES COM AS NOVAS TECNOLOGIAS........................................41
2.3.5 RELAÇÃO COM AS FAMÍLIAS ........................................................................46
3. CONTEXTO E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA............51
3.1 O CONTEXTO ....................................................................................................51
3.2 O CAMPO DE PESQUISA ..................................................................................52
3.3 OS SUJEITOS DA PESQUISA ...........................................................................53
3.4 TÉCNICA DE COLETA DE DADOS.....................................................................54
3.5 TÉCNICAS DE ANÁLISE DOS DADOS ..............................................................56
4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.....................................59
4.1 RESULTADOS DO QUESTIONÁRIO DE PERFIL DO RESPONDENTE............59
4.2 RESULTADO DO TESTE DE LIVRE EVOCAÇÃO E GRUPOS FOCAIS...........60
5. DISCUSSÃO, CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES..........................................75
REFERÊNCIA............................................................................................................80
23
ANEXOS..................................................................................................................94
24
APRESENTAÇÃO
Esta pesquisa surgiu de uma curiosidade que me acompanha desde a
infância: como se sentem os professores diante de seu ofício, para mim tão
marcante a ponto de influenciar a escolha profissional que me acompanharia por
toda vida? Que poder haveria naqueles homens e mulheres capazes de nos
conduzir por caminhos tão fantásticos quanto inverossímeis, mas para nós tão reais:
os atalhos para a fantasia e o conhecimento? Como não nos deixarmos marcar por
uma professora que nos falou pela primeira vez sobre um assunto tabu, sexo, com
uma naturalidade libertadora, ou comentou o livro que líamos escondidos de nossos
pais como aquilo que representava realmente: uma obra literária? Como não
entender o poder que havia por trás do professor que nos ameaçava com provas e
notas que representavam, muitas vezes, o passaporte para o afeto de nossos pais, a
única medida de nossa capacidade de ser alguém?
De normalista orgulhosa de suas abotoaduras, das mangas compridas e saias
pregueadas - cantadas por Ataulfo Alves como um “sorriso franco no rostinho
encantador” - à direção de um colégio conceituado, atendendo a alunos de camadas
sociais privilegiadas e corpo docente tão bem formado quanto exigente, o que se
passou? Talvez a primeira pista tenha vindo do choque de ouvir de uma professora
de didática que, sendo eu tão inteligente, deveria escolher outra profissão, arquiteta,
por exemplo.
Tendo vivido papéis tão significativos na Educação, desde “professora
primária”, função que exerci por vinte anos, formada por uma das mais conceituadas
escolas de formação de professores, o Instituto de Educação do Rio de Janeiro, na
época em que a escola normal era uma instituição de ensino que se destinava à
educação das moças burguesas (NAGLE, 1985), à pedagoga, coordenadora, autora
de livro didático e vice-diretora de escola - testemunhei a proletarização do
magistério e o orgulho se transformar em preconceito por parte da sociedade. Algo
que suplanta a formação acadêmica e perpassa as questões do que é ser professor
e de como acontece o fazer-se professor, como ele constitui sua identidade.
No que se refere a esta pesquisa, minha posição atual como parte da direção
de uma “escola de elite”, privilegiada por um lado e arriscada por outro, leva-me a
algumas considerações. A quase totalidade das pesquisas sobre a identidade
25
docente é realizada na rede pública de ensino, que apresenta condições de trabalho
e remuneração bastante diferenciadas daquelas encontradas nas escolas que
atendem à classe econômica abastada.
Considerando-se a íntima relação entre representações e práticas é, portanto,
relevante para a discussão sobre esses temas buscar compreender em que medida
as profundas diferenças nas condições de trabalho oferecidas aos professores
dessas escolas afetam as representações sobre sua identidade profissional. A
pesquisa torna-se ainda mais relevante se considerarmos que os alunos dessas
escolas têm alta probabilidade de ocupar cargos de liderança nas áreas cultural,
política e econômica. O acesso a essas escolas, porém, não tem sido fácil, uma vez
que elas não costumam abrir suas portas a qualquer um.
Nesse sentido, a posição em que me encontro, como parte da direção de uma
dessas escolas, é privilegiada neste estudo de caso. Por outro lado, ela traz em si o
perigo de que a minha função de direção na escola se confunda com meu papel de
pesquisadora e influencie as respostas dos professores, distorcendo os dados da
investigação. Após profunda discussão, da qual participaram vários pesquisadores
de prestígio na área de representações sociais, internos e externos ao Mestrado em
Educação da Universidade Estácio de Sá, decidimos correr o risco, recorrendo a
mecanismos de controle das possíveis influências desse meu duplo papel, os quais
são apresentados na Metodologia.
26
1. INTRODUÇÃO
Há homens que lutam um dia, e são bons;
Há outros que lutam um ano, e são melhores;
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons;
Porém, há os que lutam toda a vida.
Estes são os imprescindíveis.
Bertold Brecht
A identidade e o trabalho docente têm sido objeto de inúmeros estudos, que
se intensificam a partir das duas últimas décadas (ALVES-MAZZOTTI et al, 2004;
ALVES-MAZZOTTI, 2007, 2008; MARIN, 2004; NÓVOA, 1995; OLIVEIRA, 2004;
PERRENOUD, 2000; SAMPAIO; TARDIF, 2000, 2008; TARDIF; LESSARD, 2005).
Esses estudos buscam compreender como o professor constitui e reconstitui sua
identidade profissional em suas relações com o próprio trabalho e nas interações
mantidas com outros atores sociais, em particular, aqueles que povoam o ambiente
escolar. Tal preocupação deve-se, em grande parte, ao fato de que, tendo sido, em
outras épocas, bem remunerada e reconhecida socialmente, a profissão de
professor é hoje marcada pelos baixos salários e pelo desprestígio, além do acúmulo
de tarefas, o que levou muitos autores a identificar uma crise de identidade docente
(SILVA,1996; SOUZA, 2006). Termos como precarização, proletarização e
objetivação do trabalho docente, bem como desprofissionalização do magistério, têm
sido usados para descrever situações apontadas como responsáveis por esta “crise
de identidade”, as quais vêm ocorrendo em diversos países, como indicam Tardif e
Lessard (2005). Esses autores associam a precarização à massificação do ensino
ocorrida após a Segunda Guerra Mundial em países europeus e na América do
Norte. Para atingir um número maior e mais diversificado de alunos, os quais
deveriam conquistar resultados semelhantes ao final da escolarização, julgou-se
necessário padronizar e controlar o trabalho escolar, com a utilização de modelos de
gestão e normas de execução próprias de empresas. O desconhecimento das
peculiaridades do trabalho docente contribuiu para a desprofissionalização do
27
ensino, proletarizando e precarizando o trabalho docente de tal forma que a tarefa
do professor ficou reduzida ao seguimento de prescrições externas.
No Brasil, a precarização do trabalho do professor evidencia-se a partir dos
anos 70, com a massificação do ensino fundamental, e se agudiza nos anos 90, em
decorrência das reformas educacionais que introduziram mudanças profundas nos
objetivos, funções e organização do sistema escolar, bem como nos currículos das
escolas e na formação de seus profissionais. A lógica que orientou a expansão da
educação básica no país; fruto de compromissos assumidos com organismos
internacionais de financiamento, levou as autoridades educacionais a buscarem
estratégias de ampliação do atendimento sem aumentar, na mesma proporção, os
investimentos, depreciando, ainda mais, os salários e sobrecarregando
significativamente os professores com novas tarefas que, até então, não lhes
cabiam. Tais reformas, de modo semelhante ao descrito por Tardif e Lessard (2005),
foram marcadas pela padronização e massificação dos processos administrativos e
pedagógicos, objetivando o trabalho docente, na medida em que tendiam a
transformar o professor em mero executor de tarefas definidas por outros
(OLIVEIRA, 2004; SAMPAIO; MARIN, 2004 ).
Esse processo de proletarização incluiu, além da objetivação do trabalho e da
deterioração das condições em que ele se exerce, a perda do poder aquisitivo dos
salários, hoje entre os piores do mundo, superando apenas a Indonésia e o Peru
(SAMPAIO, MARIN, 2004). Segundo Peralva, (1990), nenhuma categoria urbana no
Brasil foi mais intensamente afetada pela proletarização do que a do professor.
Quanto a essa questão, Cunha (1991) informa que, no Rio de Janeiro, o salário/hora
médio do professor era equivalente a 9,8 vezes o salário mínimo em 1950, passando
a 4 vezes em 1960, 2,8 vezes em 1977, atingindo 2,2 salários mínimos em 1990.
Intimamente ligada aos baixos salários está a perda de prestígio social, que
gera baixa autoestima e tem efeitos negativos na identidade profissional do
professor; como aponta Bourdieu (1998, p.11), o “desprezo por uma função se
traduz, primeiro, na remuneração mais ou menos irrisória que lhe é atribuída. O
salário é um sinal inequívoco do valor atribuído ao trabalho e aos trabalhadores”. A
baixa remuneração leva o professor a uma sobrecarga de trabalho ainda maior,
representada pelas duplas jornadas e agravada pelo acúmulo de tarefas resultante
da falta de recursos materiais disponíveis nas escolas, da crescente burocratização
28
do trabalho docente e da necessidade de assumir funções tradicionalmente
atribuídas às famílias (ALVES-MAZZOTTI, 2007a).
Finalmente, a velocidade com que as informações são geradas e comunicadas,
graças às novas tecnologias, em particular a internet, provoca insegurança nos
professores no que se refere à atualidade de seus conhecimentos, fato que não
pode ser desvinculado da carência de recursos materiais. A precariedade das
condições oferecidas na formação inicial é um entrave para o atendimento a esses
desafios, e é consenso entre todos os autores que se ocupam dessa questão. É
grande a distância entre as teorias vistas nos cursos de formação para o magistério
e o cotidiano escolar contemporâneo.Torna-se um sério desafio para o desempenho
da docência, fato reiteradamente apontado pelos professores ALVES-MAZZOTTI,
( 2004, 2007, 2009). Gatti (2009) ressalta que o cenário das condições de formação
dos professores não é animador, o que é evidenciado não apenas pelos dados
obtidos em inúmeras pesquisas, mas pelo fraquíssimo resultado apresentado pelos
sistemas de ensino, denunciado por processos de avaliação nacionais e locais.
Tais constatações têm ressaltado o que vários autores sinalizam: a
importância de programas de formação continuada, como forma de garantir a
atualização de conhecimentos, acompanhando a velocidade do desenvolvimento
das ciências, técnicas e artes no mundo globalizado (PAIVA, 2004; TERRAZZAN,
GAMA 2007). Esta modalidade de formação, porém, ainda está longe de atender a
esses propósitos. Libâneo (2004) afirma que as deficiências na formação, inicial e
continuada, geram um grande contingente de professores despreparados para as
exigências mínimas da profissão (domínio de conteúdos e procedimentos
específicos da docência, consistente cultura geral), o que se alia à dificuldade em
lidar com os novos problemas sociais e pedagógicos que acompanham os alunos
(familiares, de comportamento social, concorrência com meios de comunicação,
desemprego, migração).
As dificuldades decorrentes da falta de integração entre teoria e prática
parecem induzir os professores a camuflarem suas dificuldades com os conteúdos
das disciplinas, levando-os a privilegiarem, como finalidade da educação, formar
cidadãos conscientes e desenvolver a criatividade e o senso crítico, em detrimento
da aquisição do conhecimento (ALVES-MAZZOTTI, 2007; CERISARA, 2002;
SAMPAIO; MARIN, 2004; SARTI; BUENO 1997). Pesquisa realizada pela UNESCO
(2004) sustenta essa visão, ao revelar que, ao serem questionados sobre as
29
finalidades mais importantes da educação, 72% dos professores apontaram “formar
cidadãos conscientes”, 60,5% responderam“ desenvolver o espírito crítico”, e apenas
8,9% assinalaram“ proporcionar conhecimentos básicos”. Surpreendente foi o fato
de que 21,4% afirmaram que transmitir conhecimentos básicos é um dos objetivos
menos importantes.
Todos os fatores mencionados nesta breve revisão da atual situação do
magistério vão dar origem ao que Esteve (1995) denominou “mal-estar docente”,
expressão usada para designar os efeitos negativos que afetam o professor, como
resultado das atuais condições psicológicas, sociais e políticas em que se exerce a
docência. Também Nóvoa (1995) faz referência ao mal-estar docente quando alude
ao sofrimento gerado pelas rápidas transformações sociais, políticas e econômicas
que vêm ocorrendo no capitalismo globalizado.
Ao incidir sobre o trabalho docente, essas transformações afetam
necessariamente a identidade do professor, como aponta Tardif (2000, p. 2):
Se uma pessoa ensina durante trinta anos, ela não faz simplesmente alguma coisa, ela faz também alguma coisa de si mesma: sua identidade carrega as marcas de sua própria atividade e uma boa parte de sua existência é caracterizada por sua atuação profissional, como também sua trajetória profissional estará marcada pela sua identidade e vida social, ou seja, com o passar do tempo, ela tornou-se – aos seus próprios olhos e aos olhos dos outros - um professor, com sua cultura, seu ethos, suas ideias, suas funções, seus interesses etc.
A Teoria das Representações Sociais (MOSCOVICI, 1978) tem contribuído de
forma relevante para a pesquisa educacional, especialmente, no que se refere aos
estudos sobre identidade, uma vez que as representações têm uma função
identitária (ABRIC, 1996), indicando como um dado grupo social se percebe e como
é afetado pelas representações que os grupos com os quais interage constroem
sobre ele (HALL, 2000). No caso da identidade profissional, as condições materiais
e simbólicas em que o trabalho se exerce desempenham importante papel na
constituição da identidade, uma vez que, como observa Ciampa (1998, p. 201) “na
práxis, que é a unidade da subjetividade e da objetividade, que o homem produz a si
mesmo. Concretiza sua identidade”. Essa questão nos remete ao presente estudo.
Embora muitas pesquisas (ALVES-MAZZOTTI et al, 2004; ALVES-MAZZOTTI, 2007;
INEP, 2003; PIMENTA, 1996) já tenham sido realizadas no Brasil com o objetivo de
investigar as representações dos professores sobre a sua identidade profissional, a
30
quase totalidade delas toma como campo de investigação escolas da rede pública
de ensino. Nessas escolas, os problemas de proletarização e precarização do
trabalho do professor são evidentes por força de políticas públicas a que o
magistério da rede pública vem sendo submetido nas últimas décadas.
Nesse sentido, chamaram-me a atenção os resultados de uma pesquisa
realizada por Alves-Mazzotti et al (2007) da qual participei. A pesquisa teve por
objetivo identificar as representações da identidade docente construídas por
professores da rede pública de ensino fundamental do Rio de Janeiro frente aos
desafios postos à escola na contemporaneidade. Os dados foram coletados por
meio de entrevistas e de um teste de associação de palavras com justificativa, e
participaram do estudo 248 professores, sendo 123 de 1º ao 4º ano e 125 de 5º ao
8º ano do ensino fundamental.
Os resultados referentes aos professores de 1º ao 4º ano (atual ensino
fundamental I) - que é o segmento que o presente trabalho irá focalizar - indicaram
que os professores apresentam inúmeras queixas referentes às suas atuais
condições de trabalho, as quais têm impacto sobre sua identidade profissional. É
unanimemente enfatizado o acúmulo de exigências feitas ao professor, destacando-
se aí a de ter que assumir o papel da família como instância responsável pela
socialização básica das crianças, as quais estão sem limites, são desinteressadas e
não respeitam o professor. A essas dificuldades somam-se as turmas superlotadas;
a falta de infraestrutura e de apoio especializado na escola, que faz com que o
professor tenha que assumir também o papel de inspetor; as sucessivas mudanças
de orientação das Secretarias de Educação; as crescentes exigências burocráticas;
a perda de autonomia, em função de ingerências das Secretarias e dos Conselhos
Tutelares e a degradação dos salários, que os leva à dupla jornada de trabalho, não
lhes deixando tempo livre para se atualizar, ou mesmo para planejar aulas mais
interessantes. Destacam, ainda, a disseminação das tecnologias audiovisuais, como
a televisão e a internet, que constituem fontes de informação mais atrativas do que a
escola, com as quais esta não está preparada para competir. Finalmente, as
exigências feitas ao professor são por eles classificadas como “sobre-humanas”,
“absurdas”, “estressantes”, por levá-los a desempenhar vários papéis que não lhes
cabem e para os quais não foram preparados. Dizem que se sentem “perdidos” e
que, para lidar com este problema, contam apenas com os colegas que estão na
31
mesma situação, acrescentando que, na verdade, “hoje ninguém sabe mais qual é a
função do professor”.
Quanto ao impacto dessa situação sobre a identidade profissional dos
professores, a invasão de seu espaço profissional por funções que não consideram
ser suas, bem como o cerceamento daquelas que sempre lhe couberam, parece
estar levando-os a uma crise de identidade, tendo, muito deles, admitido que já
tiveram ou têm vontade de desistir. Para isto também contribui a imagem pública que
acreditam ter, classificada como a pior possível: pessoas “incompetentes”, “que não
gostam de trabalhar” e “só são professores por não terem melhor opção”.
Consideram que a desvalorização profissional por eles percebida está estreitamente
vinculada ao fato de ganharem pouco, uma vez que a sociedade atual vincula a
competência profissional ao salário e não à importância social da profissão. Tudo
isso afeta sua identidade profissional, fazendo com que se sintam “injustiçados”,
“inseguros”, “cansados”, “estressados”, “frustrados”, “desestimulados”,
“desamparados” (ALVES-MAZZOTTI, 2008 )
Todas essas queixas são consistentes com as atuais condições de trabalho
impostas aos professores da rede pública e com as interações sociais a elas
relacionadas. Há, porém, escolas privadas, classificadas como “escolas de elite”1
(BRANDÃO, 2006), que oferecem condições de trabalho e remuneração
extremamente favoráveis. Considerando que as representações devem ser vistas
“como uma condição das práticas e as práticas como um agente de transformação
das representações” (ABRIC, 1998, p. 43, grifos no original), torna-se relevante
investigar se o professor dessas escolas tem a mesma representação de identidade
docente verificada entre os professores da rede pública.
1.1 OBJETIVO DO ESTUDO
Este estudo buscou investigar as representações de identidade profissional
docente construídas por professores do Ensino Fundamental I de uma escola de
1 O termo “escolas de elite” refere-se ao fato de que seus alunos vêm de famílias de alta renda e que os
professores, além de receberem salários muito mais altos que os da rede pública, contam com o apoio dos
recursos humanos e materiais necessários ao bom desenvolvimento do trabalho pedagógico.
32
elite, da rede privada, situada no Município do Rio de Janeiro. O estudo restringe-se
a esses professores em função do fato de que a quase totalidade desses
profissionais trabalha apenas na escola pesquisada, com exceção de 8 que
trabalham na rede pública, sendo 6 como regentes de turma e 2 em funções
burocráticas. A escola selecionada oferece aos seus professores alta remuneração,
formação continuada, horários remunerados para estudo e planejamento, equipe
psicopedagógica de apoio, gestão participativa, equipamento tecnológico de ponta,
além de ter corpo discente oriundo de famílias de classe média alta, providas de
capitais econômico, acadêmico, intelectual, linguístico e social.
Este trabalho pode ser considerado uma réplica da pesquisa de Alves-
Mazzotti et al (2007) sobre representações da identidade profissional docente
construídas por professores de escolas públicas de Ensino Fundamental do Rio de
Janeiro2, uma vez que utilizará os mesmos instrumentos e procedimentos.
Buscaremos verificar em que medida significativas diferenças nas condições de
trabalho afetam o sentido atribuído ao ser professor por esses docentes.
Adicionalmente, procuraremos verificar o que significa para esses professores
participar da formação da elite.
2“Representações sociais de professores da rede pública sobre sua identidade profissional, hoje”. Pesquisa
apoiada pelo CNPq.
33
2. REFERENCIAL TEÓRICO
Nossa vida visível e as ações desta vida não são mais que uma série de expressões significativas, mas aquilo que ela tenta expressar não está na superfície; nossa existência é algo bem maior que este ser frontal aparente que nós mesmos supomos ser e que oferecemos ao mundo em volta de nós.
Sri Aurobindo
2.1 AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
2.1.1 Origem e definição do conceito
A teoria das representações sociais foi introduzida por Serge Moscovici, em
seu clássico trabalho La psycanalyse, son image et son public, publicado em 1961,
na França, e em 1978 no Brasil, sob o título A Representação Social da Psicanálise.
Tomando como objeto de pesquisa a apropriação da psicanálise pelo público
francês, Moscovici busca entender a forma como o saber científico se difunde e se
transforma em uma modalidade de conhecimento socialmente elaborado como
saber do senso comum. Esse conceito remodelado ao ser apropriado pelo senso
comum é o que o autor chama de representação social. De acordo com Moscovici
(1978), as representações sociais têm duas funções principais: contribuir com os
processos de formação de condutas e orientar as comunicações.
Na elaboração do conceito de representação social, Moscovici parte do
conceito de representação coletiva, proposto por Durkheim. Este autor faz uma
separação radical entre representações individuais e representações coletivas,
considerando que as primeiras pertencem ao campo da Psicologia e as segundas à
Sociologia. Isso porque, para ele, as representações individuais têm origem na
consciência de cada um, apresentando caráter efêmero e variável, enquanto as
representações coletivas são homogêneas e partilhadas por todos os membros do
grupo, exercendo influência coercitiva sobre os indivíduos por gerações (DUVEEN,
2003; JOVCHELOVITCH, 2008). Moscovici (1978) retoma este conceito e mostra
que este se referia a um conjunto muito genérico de fenômenos psíquicos e sociais,
34
incluindo os referentes à ciência, aos mitos e à ideologia, sem a preocupação de
explicar os processos que dariam origem a essa pluralidade de modos de
organização do pensamento. Embora Moscovici (1978) reconheça que as
representações coletivas eram uma forma rica de lidar com alguns fenômenos da
vida social, sua concepção era muito estática e, portanto, não adequada ao estudo
das sociedades contemporâneas, que se caracterizam pela multiplicidade de
sistemas de referência e pela rapidez com que as informações são produzidas e
circulam, associadas a variados fenômenos do mundo moderno como a “intensidade
e fluidez das trocas e comunicações; desenvolvimento da ciência, pluralidade e
mobilidade sociais” (JODELET, 2001, p.17-18). A noção de representação social
proposta por Moscovici corresponde à busca desta especificidade (ALVES-
MAZZOTTI, 1994). Conforme esclarece o próprio Moscovici (2001, p. 62):
Trata-se de compreender não mais a tradição, mas inovação; não mais uma vida social já feita, mas uma vida social em vias de se fazer. Que ela não tenha acontecido antes e os esforços empregados para compreender as representações tenham se limitado às sociedades ditas primitivas explicam, em parte, porque depois de uma partida fulgurante, a noção tenha permanecido tanto tempo em abandono.
Assim, afastando-se da abordagem sociológica de Durkheim e da Psicologia
norte-americana, de caráter individualista, Moscovici propõe uma nova abordagem,
psicossociológica, que integra o individual e o coletivo. Para Farr (1998), o conceito
das representações sociais pode ser concebido como uma transformação
psicossocial do conceito das representações coletivas. Nessa perspectiva, Jodelet
(2001, p. 22), principal colaboradora de Moscovici, define representações sociais
como:
Uma forma de conhecimento socialmente elaborada e partilhada com um objetivo prático e que contribui para a construção de uma realidade comum a um conjunto social. Nesse sentido, elas são concebidas como um saber gerado através de comunicações da vida cotidiana, com o objetivo prático de orientação de comportamentos em contextos sociais concretos.
Procurando esclarecer melhor esse conceito, Jodelet (1990, p.361) define as
representações sociais como “uma forma específica de conhecimento, o saber do
senso comum, cujos conteúdos manifestam a operação de projetos generativos e
funcionais socialmente marcados. De uma maneira mais ampla, ele designa uma
35
forma de pensamento social”. Esse conhecimento diz respeito ao modo como os
acontecimentos e informações que circulam por nosso cotidiano são apreendidos,
dando origem ao senso comum. As representações sociais referem-se, portanto, a
um conjunto de informações, crenças, opiniões partilhadas por um grupo a respeito
de um objeto social.
A esse respeito, Moscovici (1978) afirma que para um conhecimento exterior
(que pertence ao especialista, está fora do nosso campo de ação), tornar-se interior,
ele precisa penetrar no “mundo da conversação”, o que é confirmado por Jodelet
(2001, p.17-18) ao esclarecer que as representações sociais “circulam nos
discursos, são trazidas pelas palavras e veiculadas em mensagens e imagens
midiáticas, cristalizadas em condutas e em organizações materiais e espaciais”.
Assim, as representações sociais são um conhecimento prático, elaborado e
compartilhado socialmente, que nos possibilita dominar o ambiente em que estamos
inseridos, apreendendo fatos e ideias, agindo com e sobre outros, situando-nos a
respeito deles.
No que diz respeito à aplicação dessa teoria no campo da educação, um grande
número de pesquisas tem demonstrado sua eficácia na compreensão de fatos
relacionados à educação. De acordo com Gilly (2001, p. 221), a utilização da teoria
das representações sociais “oferece um novo caminho para a explicação de
mecanismos pelos quais fatores propriamente sociais agem sobre o processo
educativo e influenciam seus resultados”. Assim, o interesse de pesquisadores da
educação, e de várias outras áreas do conhecimento, na investigação das
representações sociais justifica-se pelo fato de esta teoria apresentar um modelo
capaz de dar conta dos mecanismos sociais e psicológicos que atuam na produção
das representações (ALVES-MAZZOTTI, 1994).
2.1.2 FUNÇÕES DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Moscovici (1978) atribuiu às representações sociais duas principais funções:
contribuir com os processos de formação de condutas e orientar as comunicações
sociais. Essas funções foram enriquecidas pela contribuição de Abric (1998),
destacando mais duas funções: a identitária, uma vez que as representações sociais
ajudam a definir a identidade e a salvaguardar a especificidade do grupo, e a
36
justificadora, que tem por finalidade permitir aos atores sociais justificar
posteriormente as tomadas de posição e os comportamentos. Embora essas duas
últimas funções destacadas por Abric já estivessem presentes no trabalho inicial de
Moscovici, ele optou por enfatizá-las pela importância, evidenciada em pesquisas de
laboratório, da relação entre cognições, práticas sociais e identidades. (WILSON,
2003).
2.1.3 PROCESSOS E PRODUTOS DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
Segundo Jodelet (2001), o estudo das representações está interessado em
uma modalidade de pensamento sob dois aspectos: constituinte, referente aos
processos geradores das representações, e constituído, voltado para os produtos ou
conteúdos. Entretanto, para que esses elementos constituam uma representação,
eles devem-se apresentar como campo estruturado, com a organização e
hierarquização dos elementos que configuram seu conteúdo. No que diz respeito ao
estudo da representação como processo, o interesse está focado na relação entre a
estrutura da representação e suas condições sociais de produção, assim como nas
práticas sociais, que induz e justifica. Nessa perspectiva, a elaboração e o
funcionamento das representações sociais devem ser compreendidos por meio de
seus processos de produção, objetivação e ancoragem (ALVES-MAZZOTTI, 1994).
De acordo com Moscovici (2003) objetivar é descobrir a qualidade icônica de
uma idéia, é reproduzir um conceito em uma imagem. A objetivação é definida por
Jodelet (1993) como uma operação imaginante e estruturante que concretiza o que
era abstrato, reabsorvendo o excesso de significações e dando corpo aos esquemas
conceituais. Ao realizar esse processo, faz-se uma triagem das informações que
circulam sobre o objeto, fornecendo uma imagem coerente e de fácil percepção.
Jodelet (1990) distingue três fases nesse processo: a construção seletiva, a
esquematização estruturante e a naturalização. É na construção seletiva que as
informações que circulam sobre determinado objeto sofrem uma seleção e uma
descontextualização, retendo-se o que está de acordo com o sistema de valores do
grupo. A esquematização estruturante atribuirá uma forma ou figura específica ao
conhecimento acerca do objeto, tornando concreto o conceito abstrato, formando
37
uma imagem coerente e exprimível dos elementos que constituem o objeto da
representação, dando origem ao núcleo figurativo. E, por fim, a naturalização
conferirá realidade ao que era mera abstração, tornando o objeto de representação
um elemento comum no cotidiano do indivíduo, materializando-o através de
imagens, discursos, comportamentos ou práticas sociais.
O segundo processo descrito por Moscovici, a ancoragem, permite
compreender como a significação é conferida ao objeto, como a representação é
utilizada como um sistema de interpretação do mundo social e instrumentaliza a
conduta e, ainda, como se dá sua integração em um sistema de recepção e como
esse novo objeto influencia e é influenciado pelos elementos que aí se encontram
(ALVES-MAZZOTTI, 1994). Para Moscovici, ancorar é classificar e rotular, levando-
nos a nos familiarizarmos com algo que nos é estranho e ameaçador. Então, torna-
se necessário posicionar-se frente ao objeto estranho, ou seja, aproximá-lo de algo
conhecido, para que, dessa forma, o objeto adquira características daquele ao qual
é associado, reajustando-se para adequar-se a ele; assim, o que era incomum,
passará a ser comum e real para os sujeitos. Em outras palavras, a ancoragem
permite compreender como a significação é conferida ao objeto apresentado, como
a representação é utilizada como sistema de interpretação do mundo social e
instrumentaliza a conduta e, ainda, como se dá sua integração em um sistema de
recepção, influenciando e sendo influenciada pelos elementos que aí se encontram
(ALVES-MAZZOTTI, 1994; JODELET, 2001).
De acordo com Jodelet (2001), a ancoragem desempenha um papel decisivo
no que diz respeito ao enraizamento da representação e do objeto em uma rede de
significações, o que permite situá-los em relação aos valores sociais, dando-lhes
coerência. O objeto torna-se significativo e familiar ao sujeito em seu contexto social,
tecendo redes de sentidos ou campos de representações que orientarão suas
comunicações e condutas cotidianas. A partir de um trabalho de memória, o
pensamento constituinte apoia-se no pensamento constituído, adequando a
novidade ao pensamento antigo. Nesse processo de assimilação e acomodação, o
novo vai sendo incorporado ao pensamento existente, tornando-o familiar ao grupo.
A partir dessa incorporação, o agora familiar adquire um valor de funcionalidade para
a interpretação e gestão do ambiente, e dessa forma, ele instrumentaliza o saber.
(JODELET, 2001)
38
Madeira (2002, p.207) alerta que o “processo de apropriação do novo é
complexo e implica diversas ordens e níveis de tensão e construção de sínteses”.
Nesse processo, o sujeito estrutura os sentidos de determinado objeto, a partir das
experiências acumuladas nas suas relações sociais, carregadas de características
psicossociais e simbólicas. Esse novo passa por um filtro interpretativo proveniente
dos valores, modelos, símbolos e normas que orientam as práticas dentro de uma
determinada cultura.
A aproximação do não-familiar a uma categoria conhecida faz-se por meio da
classificação e nomeação, o que torna possível imaginar e representar esse objeto
estranho, atribuindo-lhe sentido (ALVES-MAZZOTTI, 1994; MOSCOVICI, 2003).
Madeira (2002, p. 208) afirma que:
O objeto torna-se familiar e significativo ao sujeito pelas articulações
a outros tantos objetos que se lhe vão associando, na experiência,
na vivência do sujeito, em suas relações e pertenças grupais. Desta
forma, a apropriação do novo atualiza, na reconstrução do objeto,
tempos e espaços, informações e experiências, afetos e
necessidades, saberes e fazeres, tecendo redes de sentidos e
campos de representações que vão orientar comunicações e
condutas.
Campos (2003), alerta para a necessidade de a ancoragem ser compreendida
como processo permanente da representação, pois ela cria e mantém vivas suas
raízes nos sistemas de pensamento. Assim, seu estudo é fundamental para que se
compreenda o funcionamento de uma representação social.
Os processos de objetivação e ancoragem desenvolvem entre si uma relação
dialética e articulam três funções básicas das representações: a função cognitiva de
integração da novidade, a função de interpretação da realidade e a função de
orientação das condutas e das relações sociais, o que permite compreender: a)
como a significação é conferida ao objeto representado; b) como a representação é
utilizada como um sistema de interpretação do mundo social e instrumentaliza a
conduta; c) como se dá sua integração em um sistema de recepção e como
influenciam e são influenciados pelos elementos que aí se encontram (JODELET,
1990).
39
2.1.4 A ABORDAGEM ESTRUTURAL
A abordagem estrutural, também conhecida como Teoria do Núcleo Central,
foi proposta por Jean Claude Abric e complementada por Flament, Guimelli, Moliner
e vários outros colaboradores em todo o mundo. O trabalho inaugural de Moscovici é
reconhecido por Abric como a “grand théorie” psicossociológica, e a partir dela ele
buscou o aprofundamento dos aspectos específicos da estrutura das
representações, guardando a coerência com a teoria proposta por Moscovici
(ALVES-MAZZOTTI, 2002).
Essa abordagem tem como hipótese geral que toda representação se
organiza em torno de dois sistemas: o sistema central ou núcleo central e o sistema
periférico. A pesquisa do núcleo central é uma tarefa bastante complexa, pois busca
compreender a atividade simbólica de indivíduos e grupos humanos. Abric (1998)
justifica a existência do núcleo central afirmando que as representações sociais são
manifestações do pensamento social. Sendo assim, a manutenção da identidade e
continuidade do grupo social exige um certo número de crenças partilhadas,
elaboradas coletivamente, ao longo da história, que sejam “inegociáveis”, isto é, que
não possam ser questionadas, por constituírem o fundamento do modo de vida e do
sistema de valores do grupo.
O núcleo central é determinado pela natureza do objeto representado, pelo
tipo de relações que o grupo mantém com o objeto, pelo sistema de valores e
normas sociais e pela memória coletiva do grupo, constituindo-se como a base
comum, coletivamente partilhada, da representação. E, de acordo com Abric (2003,
p.40), partilhar uma representação com outros indivíduos significa “partilhar com eles
os valores centrais associados ao objeto”. Assim, torna-se necessário conhecer o
núcleo central para entender uma representação.
O núcleo central, composto por um ou poucos elementos, desempenha três
funções essenciais descritas por Abric (2001, p.163):
a) função geradora: é o elemento pelo qual se cria ou se transforma a significação dos outros elementos constitutivos da representação. É aquilo por meio do qual esses elementos ganham um sentido, uma valência; b) função organizadora: é o núcleo central que determina a natureza dos vínculos que unem entre si os elementos da representação. É nesse sentido, o elemento unificador e estabilizador da representação. c) função estabilizadora: seus elementos são os que mais resistem a mudanças.
40
Abric (2003) ainda destaca dois tipos de elementos no que diz respeito à
natureza do núcleo central: a hierarquia dentro do núcleo - os elementos não são
equivalentes entre si, sendo uns mais importantes que outros - e a diferença entre
eles, classificados em normativos e funcionais. Os elementos normativos são a
dimensão essencialmente social da representação, vinculada à história e à ideologia
do grupo, e se originam diretamente do sistema de valores dos sujeitos, o que
determina seus julgamentos e tomadas de posição com relação ao objeto. Os
elementos funcionais são associados às características descritivas do objeto, às
práticas sociais e operatórias, e determinam as condutas relacionadas ao objeto. A
coexistência desses dois elementos permite ao núcleo central realizar um duplo
papel, avaliativo e pragmático: de um lado justifica os julgamentos de valor e de
outro orienta práticas específicas.
Abric (2003) esclarece que identificar o núcleo central consiste em buscar a
raiz, o fundamento social da representação, que será modulado, se diferenciado e
individualizado na parte operatória da representação, ou seja, no sistema periférico,
o qual desempenha um papel decisivo no funcionamento e na dinâmica da
representação, pois só há evolução ou transformação superficial se houver
mudanças do sentido ou da natureza dos elementos periféricos.
Quanto ao sistema periférico, constituído pelos demais elementos da
representação, é a parte mais acessível e mais viva da representação, dotada de
grande flexibilidade, diferentemente do núcleo central, configurando a parte
operatória da representação e seu papel é fundamental na dinâmica e
funcionamento das representações.
Abric (1998) distingue cinco funções do sistema periférico:
a) concretização do núcleo em termos imediatamente compreensíveis e transmissíveis; b) regulação, que consiste na adaptação da representação às transformações do contexto, integrando novos elementos ou modificando outros em função de situações concretas; c) prescrição de comportamentos: os elementos periféricos funcionam como esquemas organizados pelo núcleo, garantindo o funcionamento da representação como grade de leitura das situações e, consequentemente, orientando tomadas de posição; d) proteção do núcleo: o sistema periférico é um elemento essencial nos mecanismos de defesa que visam proteger o núcleo, absorvendo as informações novas suscetíveis de pô-lo em questão; e) modulações individualizadas: é o sistema periférico que permite a elaboração de representações relacionadas à história e às experiências pessoais do sujeito.
41
Assim, no cotidiano, as representações aparecem por meio dos elementos
periféricos, destacando-se que o funcionamento do núcleo central não pode ser
compreendido sem uma relação dialética com os elementos periféricos, pois
qualquer mudança no núcleo central, por menor que seja, exigirá uma longa
preparação na periferia (ALVES-MAZZOTTI, 2002).
O quadro a seguir compara os dois sistemas.
Quadro I – Estrutura das representações sociais
Núcleo Central Sistema Periférico
Ligado à memória coletiva e à história do
grupo
Permite a integração das experiências e das
histórias individuais
Consensual: define a homogeneidade do
grupo
Suporta a heterogeneidade do grupo
Estável, coerente e rígido Flexível, suporta contradições.
Resiste à mudança Transforma-se
Pouco sensível ao contexto imediato Sensível ao contexto imediato
Gera a significação da representação e
determina sua organização
Permite a adaptação à realidade concreta e a
diferenciação de conteúdo; protege o sistema
central
Fonte: ALVES-MAZZOTTI, (2002).
Considerando-se as representações sociais como “um conjunto organizado e
hierarquizado de julgamentos, atitudes, e informações que um dado grupo social
elabora sobre um objeto” (ABRIC, 1996, p. 11), interessa-nos a relação entre
representações e práticas, de modo a responder à questão central desta pesquisa:
Em quê a representação de identidade docente construída pelo professor que
exerce sua prática em condições altamente favoráveis difere da do professor que
trabalha em condições adversas?
2.1.5 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS E PRÁTICAS SOCIAIS
Foi destacada anteriormente a importância da aplicação da teoria das
Representações Sociais aos fenômenos, de modo geral, e à educação em especial,
42
como uma prática mundial. Marková (2006, p. 53) afirma que “nas últimas quatro
décadas a teoria das representações sociais tem demonstrado seu poder teórico no
estudo dos fenômenos que tiveram efeitos fundamentais no pensamento social e na
comunicação no mundo inteiro”.
A discussão sobre as práticas sociais e as relações destas com as
representações torna-se necessária, pois há ligações indissociáveis entre elas que
nos conduzem a vários questionamentos, entre eles os processos de transformação
da representação social em face às mudanças nas práticas. No caso desta
pesquisa, essa é uma questão importante, considerando-se que as condições que
envolvem as práticas docentes na escola focalizada, como será visto adiante, são
muito diversas daquelas encontradas nas escolas da rede pública. Analisar os
fatores sociais que atuam no processo educativo, influenciando as representações
sobre o trabalho e a identidade docente poderá trazer uma importante contribuição
para essa área.
Quanto à relação das práticas com as representações, Campos (2003)
observa que essa é uma questão complexa e ainda pouco estudada, havendo
pesquisas que mostram que as práticas determinam as representações; outras em
que as representações determinam as práticas; e, ainda outras em que práticas e
representações se engendram mutuamente. Abric alerta que não se trata, porém, de
simples reciprocidade, pois considera que as representações são “uma condição das
práticas e as práticas um agente de transformações das representações” (ABRIC,
1998, p. 43).
Campos (2003) esclarece ainda que, quando uma situação é percebida como
reversível, as novas práticas tendem a promover modificações, porém unicamente
no sistema periférico, ou seja, na parte operatória da representação, mantendo a
estabilidade do núcleo central. Porém, se as situações forem vistas como
irreversíveis, as novas práticas operarão mudanças importantes no sistema de
representações, a saber: (a) transformações resistentes, quando as práticas são
gerenciadas pelo sistema periférico; (b) transformações progressivas, em que a
situação em que os esquemas ativados pelas novas práticas vão-se integrar aos
esquemas do núcleo central, gerando um novo núcleo e, a partir dessa fusão, uma
nova representação; e (c) transformações brutais, originando uma transformação
direta e completa do núcleo central e, consequentemente, da representação.
Com relação a essa questão, Abric (2003, p.47-48) afirma:
43
Para que uma representação se transforme diante de novos eventos ou informações, é necessário que o grupo pense que a nova situação é irreversível (quer dizer, definitiva). Se eles percebem possibilidades de retorno à situação anterior (situações reversíveis), os grupos, então, desenvolvem mecanismos de defesa e resistência à mudança. Assim, a mudança das práticas supõe que estejam reunidas, ao menos duas condições: ataque ao núcleo central: irreversibilidade da situação.
A aplicação da teoria das Representações Sociais no campo educacional é
extremamente significativa, não somente pela complexidade dos fenômenos pelos
quais o sentido de um objeto é estruturado na construção de suas relações com a
sociedade, mas também pelo potencial de contribuição à explicação de como os
fatores sociais agem sobre o processo educativo e influenciam seus resultados
(GILLY, 2001).
No caso da identidade do professor do Ensino Fundamental I da escola de
elite o levantamento das opiniões, atitudes e crenças dos professores sobre o tema,
além da observação de suas práticas, facilitará a compreensão do significado por
eles elaborado, permitindo o acesso ao sentido que atribuem, bem como de que
forma a interpretação desse sentido se relaciona com seus comportamentos e
tomadas de posição em suas práticas cotidianas. De acordo com Madeira (2001, p.
136):
O objeto, assim apropriado, torna-se objeto de sentido, mobilizando condutas em coerência com um “saber-do-viver” pelo qual acontecimentos, ideias, experiências, ações etc tornam-se inteligíveis, explicáveis e motivadores. Esse é o saber que rege o cotidiano, definido como um conjunto de normas, símbolos e valores que, tão sutil quanto continuamente, se recriam e se conservam: um saber organizado, cuja coerência garante ao homem uma explicação de mundo, de si e dos outros, dando-lhes condição para se situar e se relacionar.
Concluindo, pesquisar as interações entre práticas e representações sociais é
fundamental para compreendermos a representação da identidade docente das
professoras participantes de nosso estudo.
2.2 TRABALHO DOCENTE E IDENTIDADE
44
2.2.1 Desprofissionalização
O papel do professor vem-se modificando em consequência das transformações
determinadas pelas políticas de formação docente ao longo das últimas décadas,
bem como pelas reformas educacionais implantadas nesse período, que, ao
introduzirem estratégias de padronização do trabalho docente, com formas de
controle sobre esse trabalho, têm impacto sobre as identidades dos professores
(HIPÓLITO, 2002).
Robertson (1996, p. 16) aponta como consequências dessas reformas sobre o
trabalho do professor:
[...] restrições de tempo, turmas maiores e gerência de outros
trabalhadores/as sobre o seu trabalho. O que decorre daí é uma autoridade
despersonalizada – uma docência de resultados confundida com
profissionalismo. Aos/às docentes não tem sido dada ou prometida a
oportunidade para negociar os novos moldes do seu trabalho. Ao contrário,
o trabalho docente tem sido crescentemente moldado pelos imperativos e
conveniências econômicas, e é o resultado das necessidades do Estado em
estabelecer as novas condições para acumulação.
O processo de profissionalização-desprofissionalização a que o docente é
submetido “alterna-se na história dos professores desde o século XIX” (Nóvoa apud
Roldão, 2007, p.4 ), com repercussões, que atingem a todos. A identidade docente
sofre injunções que são fruto do processo de fragilização que atinge este grupo
profissional, cuja função vem perdendo sua especificidade. Essa perda ocorre, em
especial, no caso do professor do ensino fundamental, levando alguns a pensarem
que qualquer adulto pode exercê-la. O fato de um grande número de pessoas, com
diferentes qualificações, ou mesmo nenhuma, desempenharem funções de
magistério sabota a constituição da profissionalidade docente, conforme denunciam
LUDKE e BOING (2004).
Na visão de Roldão, profissionalidade significa “aquele conjunto de atributos,
socialmente construídos, que permitem distinguir uma profissão de outros muitos
tipos de atividade, igualmente relevantes e valiosos” (2005, p. 108). Em um cenário
de políticas educacionais que não valorizam o trabalho docente, associadas a
reformas, especialmente as dos anos 90, que reiteram o processo de desvalorização
45
profissional, o professor se vê, também, em uma situação de depreciação junto à
sociedade. Como consequência, constrói uma identidade fragmentada, confusa,
desagregada, sequestrada pela expropriação crescente de suas condições de
realização e afirmação e naturalmente destituída de sua relevância e valor,
distanciando-se do conceito de profissionalidade, ao deparar com a distorção de seu
papel. Surge a desprofissionalização e, consequentemente, a perda da identidade
profissional.
Às pesquisas citadas na introdução deste estudo poderiam ser acrescidas
diversas outras que vêm denunciando um amplo conjunto de fatores que constituem
o que podemos denominar de mal-estar docente. O conceito de mal-estar docente,
termo cunhado e denunciado por Esteve (1999), deu origem a inúmeras pesquisas
em todo o mundo. No Brasil, muitas delas (CODO, 1999; DELCOR, 2003; BUENO E
LAPO, 2003; OLIVEIRA, 2003; ARAÚJO et al., 2005; GASPARINI, 2005; JESUS,
2007; LEMOS, 2005; MOSQUERA E MISSEL, 2005)),focalizam as consequências
para os professores diante das mudanças ocorridas. Esteve (1999, p.12) salienta
que:
A expressão „mal-estar docente‟ é intencionalmente ambígua. O termo „mal-estar‟ refere-se, segundo o Dicionário da Academia Real da Língua, a um „desolamento ou incômodo indefinível‟. A dor é algo determinado e que podemos localizar. A doença tem sintomas manifestos. Quando o usamos o termo „mal-estar‟ sabemos que algo não vai bem, mas não somos capazes de definir o que não funciona e por quê.
A desprofissionalização vincula-se ao processo de proletarização, uma vez
que, em decorrência da perda do controle sobre seu trabalho, o magistério não mais
se enquadra no conceito de profissão baseado na "autonomia para organizar e
regular as respectivas atividades; monopólio profissional, ou seja, a faculdade
jurídica de impedir todos os que não são oficialmente acreditados de oferecer
serviços no domínio definido como exclusivo de uma profissão" (RODRIGUES,
2002, p. 41).
Além disso, como observa Barreto (2002), a própria designação da atividade
relativa à docência vem-se deteriorando, sendo o professor denominado de
“facilitador”, “animador”, “monitor”, referências que contribuem para a imagem
precária de seu trabalho apesar de as novas exigências feitas ao professor
associarem as funções docentes a conceitos como “competência”, “eficiência”,
46
“qualidade”, “responsabilidade”, por exemplo. Sobre esta questão, Frigotto (2003, p.
19) assinala:
As novas demandas de educação explicitadas por diferentes documentos dos novos senhores do mundo – FMI, BIRD, BID – e seus representantes regionais – CEPAL, OREALC – baseadas nas categorias sociedade do conhecimento, qualidade total, educação para a competitividade, formação abstrata e polivalente, expressam os limites das concepções da teoria do capital humano e as redefinem sobre novas bases.
A preocupação com a profissionalização do professor tem ganho crescente
destaque na política educacional de vários países. Por meio de documentos oficiais,
organizações internacionais, como o Banco Mundial, a OEI – Organização dos
Estados Ibero-Americanos- 2000 e a UNESCO (1996) trouxeram à baila a questão
da profissionalização do professor como um problema mundial. Um documento do
Programa de Promoção da Reforma Educativa na América Latina – PREAL
(PURYEAR, 2003) afirma que “o maior obstáculo para a implementação das
reformas educativas é o professor”.
O que se percebe é que as negociações com os envolvidos nas políticas
educacionais e, em especial, com o professor, ao mesmo tempo em que
demonstram um desejo de trazê-lo à participação, quando a própria legislação
educacional adota a expressão “valorização do magistério”, o desqualificam e
engessam sua atuação, propondo reformas marcadas pela padronização e
massificação de processos administrativos e pedagógicos, a título de uma
organização sistêmica. É gerado um modelo de gestão escolar que combina formas
de planejamento e controle central na formulação de políticas, tendendo a retirar do
docente a autonomia. São reformas que, ao determinar uma reestruturação do
trabalho docente, produzem uma sobrecarga de trabalho, resultando em um
acúmulo de tarefas que se sobrepõem às diretamente ligadas à área pedagógica
(ALVES-MAZZOTTI, 2007; OLIVEIRA, 2004), que imputa aos professores maiores
responsabilidades, inclusive levando-os a desempenhar funções para as quais não
estão qualificados. É comum que o professor se veja no papel de agente público,
assistente social, enfermeiro, psicólogo, entre outros, contribuindo para um
sentimento de desprofissionalização, de perda de identidade profissional, da
47
constatação de que ensinar às vezes não é o mais importante (ALVES-MAZZOTTI,
2007; Noronha, 2001).
Verifica--se, ainda, que a busca de atualização no seu campo específico de
atuação torna-se pouco importante, como mostram outros dados da pesquisa da
UNESCO (2004) ao relatar que menos de 10% dos educadores consideram a
finalidade mais importante da educação proporcionar conhecimentos básicos,
enquanto a esmagadora maioria considera que o mais importante é formar cidadãos
conscientes e críticos.
Os estudos de Rodrigues (2002) apontam a emergência de um novo fator que
ameaça a autonomia do professor: tendo-se tornado consumidores menos passivos,
com maiores expectativas de participação, melhores níveis educativos e
informacionais, os pais almejam influir mais decisivamente nos rumos e práticas da
escola, o que traz aos professores um sentimento de perda do poder e da
autoridade, aspectos diretamente ligados à profissionalização:
A desqualificação e desvalorização do magistério como fruto das políticas públicas, de uma formação precária, desvinculada da prática, traz como consequência uma atitude defensiva por parte dos professores. Sentindo-se acuados, por um lado pela degradação das condições de funcionamento das escolas, pelo excesso de tarefas, pelas péssimas condições de trabalho e, por outro lado, inseguros quanto às suas capacidades de lidar com os alunos, sofrem um duro golpe em sua identidade, o que se traduz em uma autodesqualificação que o leva a destacar a dedicação e o amor como cerne de seu trabalho (ALVES-MAZZOTTI, 2007).
Acrescenta, ainda, que o mal-estar docente é um fenômeno internacional, com
seus sintomas se evidenciando no início da década de 80, nos países
desenvolvidos, entre eles França, Suécia e Reino Unido, trazendo problemas
relacionados à saúde, além de conflitos típicos da função do professor que
implicaram mudanças no contexto social, que afetaram significativamente o perfil do
professor e as exigências pessoais e sociais em relação à eficácia de sua atividade,
o que é reafirmado por Guglielmi e Tatrow (apud HARDEN, 1999, p.247):
O que está possivelmente em jogo é não somente a saúde e a satisfação ocupacional destes valiosos profissionais, mas, tão importante quanto, sua eficácia em sala de aula, o processo de ensino e aprendizagem e a qualidade em geral da educação em nossas escolas.
48
Os prejuízos ficam evidentes em seu planejamento de aula, que se torna
menos frequente e cuidadoso, além da perda da criatividade e do surgimento de um
sentimento de menor apreço pelos alunos e uma avaliação menos otimista quanto
ao seu futuro (CARLOTTO, 2002). A esses aspectos podemos acrescentar o
aumento do nível de absenteísmo, da lentidão, da ineficácia, das interações hostis
com os colegas, dos conflitos com autoridade e comunicações deficientes.
( ALVAREZ et. al., apud MOURA, 2000).
Pedrabissi et al. (apud MOURA, 2000, p.91-92) apresenta como as dez maiores
fontes de esgotamento para docentes:
[...] a desmotivação dos alunos, comportamento indisciplinado dos alunos; falta de oportunidades de ascensão na carreira profissional; baixos salários; más condições de trabalho (falta de equipamentos e instalações adequadas); turmas excessivamente grandes; pressões de tempo e prazos; baixo reconhecimento e pouco prestígio social da profissão; conflitos com colegas e superiores; rápidas mudanças nas exigências de adaptação dos currículos.
Esteve (1999) complementa, denunciando que o mal-estar docente traz
grande sofrimento psíquico, exteriorizado por reações neuróticas, um eu depreciado,
uma permanente ansiedade, comportamentos esses associados a dificuldades de
relacionamento interpessoal. Também sinalizou que o professor se sente
profundamente inseguro diante dos problemas que a prática de ensino apresenta,
tendo como consequência um esquema de inibição que busca desvincular uma
implicação pessoal do trabalho que realiza.
A pesquisa “Fracasso escolar”: representações de professores e de alunos
repetentes (MAZZOTTI, 2003) utiliza a análise retórica do material obtido, a partir da
qual se verifica que a metáfora que parece coordenar a representação de “fracasso
escolar” apresentada pelos professores é um grande complô. A falta de apoio do
Governo à escola, os currículos distantes da realidade, o desinteresse dos alunos
pelos conteúdos escolares, a falta de apoio da família, a crise de valores, a falta de
oportunidades com que se defrontam as crianças pobres e a sedução exercida pelos
ganhos em atividades ilícitas, são reiteradamente citados pelos professores como
responsáveis pelo fracasso escolar, desvinculando-o de sua participação pessoal.
Esta explicação indica uma ambiguidade no discurso do professor, uma vez que este
ancora o papel do docente do ensino fundamental público à ideia de “salvação”, ao
49
mesmo tempo em que vive a sensação de desânimo e impotência pelo fato de
acreditar que o problema do fracasso foge ao seu controle. É cada vez maior o
número de pedidos de transferência ou abandono da profissão, um desejo manifesto
que se realiza ou não, além de acentuado absenteísmo, forma comum de fugir das
situações conflituosas. Todo esse quadro tem sido atribuído à autoculpabilização
perante o insucesso.
Condições de trabalho desfavoráveis e exigências cada vez maiores têm
provocado preocupantes reflexos na saúde do professor, que acaba contraindo
doenças como a síndrome de Burnout, que na definição de Silva (2007) é a perda de
energia, a desistência, que implica outros fatores, como o esgotamento emocional,
fruto das condições de trabalho. É sobre os fatores que têm influenciado diretamente
a formação da identidade docente e produzido o quadro descrito anteriormente que
discorreremos a seguir.
2.3 PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE
2.3.1 Políticas públicas, proletarização e perda de autonomia
As reformas educacionais a partir dos anos 70 expandiram de forma
desordenada o sistema público de ensino fundamental, repercutindo fortemente na
organização escolar e provocando a necessidade de reestruturação do trabalho
pedagógico (NORONHA, 2001; OLIVEIRA, 2004; SAMPAIO, MARIN, 2004).
Na década de 90 marca um novo movimento de reformas na educação
brasileira que vem a implantar um modelo ditado pela globalização. Robertson
(2000, p.23), sustentou que
... no final dos anos 90 havia considerável evidência de que o professorado, tanto nos países desenvolvidos como naqueles em desenvolvimento, enfrentava grandes desafios como membros da classe média profissional. Isso era o resultado de profundas mudanças que ocorriam no interior dos estados-nações e o resultado de amplos processos globais, cujos efeitos poderiam ser registrados nas transformações das práticas e das relações sociais em diferentes níveis no sistema educacional.
A estratégia proposta para a implantação das políticas dos anos 90 do século
passado só poderia ser concretizada por meio de padronização e massificação dos
50
processos pedagógicos, facilitando o controle central das políticas assumidas, às
expensas da perda do domínio do seu trabalho pelo professor.
A partir de compromissos assumidos com organizações internacionais, como
a Conferência Mundial sobre Educação para todos, realizada em março de 1990,
propõe-se uma nova orientação para reformas educacionais em países pobres e
populosos do mundo voltadas para a busca da equidade social. A ação de órgãos
como o Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (BIRD), o Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID) e o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) teve por objetivo orientar os países pobres a retomarem o
desenvolvimento dentro de um padrão capitalista, mas é importante ressaltar que a
tutela dessas agências internacionais não foi imposta, pois aceitá-la foi uma opção
de nossas elites econômicas e políticas (FIORI, 2001). Os compromissos assumidos
visavam à expansão da educação básica, sem, entretanto, aumentar os
investimentos na mesma proporção.
As reformas educacionais eram parte de um processo que, ensejado pelos
movimentos que pleiteavam a gestão democrática, reivindicava maior participação
da comunidade na escola e, especialmente, nos processos decisórios, o que passa
a ser uma exigência legal no ensino público com a inclusão no art. 206 da
Constituição Federal da República, em 1988. Embora este dispositivo constitua um
movimento de luta em defesa da escola pública e democrática, passa a constituir
uma ameaça para os profissionais da educação no que se refere à atuação em
algumas questões, como, por exemplo, a discussão de conteúdos pedagógicos e
práticas de avaliação. Além disso, a gestão democrática representou uma carga
extra no trabalho docente, que passou a incluir as reuniões pedagógicas, a
participação na gestão da escola e no planejamento dos programas e currículos
(OLIVEIRA, 2008).
Emerge aí um aspecto importante a ser considerado na formação da
identidade docente: a proletarização do professor, que se traduz no processo de
objetivação do trabalho docente, distancia-o do polo da profissionalização, o que
leva Oliveira e Melo (2006) a creditarem às reformas educacionais a
responsabilidade pelos novos problemas, conflitos e resistências, como expressão
da insatisfação dos docentes.
A perda do controle sobre seu trabalho com a crescente burocratização do
ensino, transformando o docente em mero executor de tarefas prescritas por outros
51
é, de acordo com a literatura revista, a principal característica do processo de
proletarização do magistério, embora os baixos salários também sejam vinculados a
esse conceito.
2.3.2 PERDA DO PODER AQUISITIVO DE SALÁRIOS
Um dos aspectos mais visíveis do desprestígio social da profissão docente é
o salário do professor, especialmente o dos professores da rede pública. É uma luta
antiga, conforme observamos em Freire (1996, p. 66):
Se há algo que os educandos brasileiros precisam saber, desde a mais tenra idade, é que a luta em favor do respeito aos educadores e à educação inclui que a briga por salários menos imorais é um dever irrecusável e não só um direito deles. A luta dos professores em defesa de seus direitos e de sua dignidade deve ser entendida como um momento importante de sua prática docente, enquanto prática ética. Não é algo que vem de fora da atividade docente, mas algo que dela faz parte.
No que se refere ao Ensino Fundamental II, o salário do professor no Brasil
está entre os sete piores do mundo, segundo dados colhidos por Siniscalco (2006),
e no Fundamental I fica acima apenas da Indonésia e quase empatado com o Peru.
(LUDKE, BOING, 2004; SAMPAIO, MARIN, 2004).
Pesquisa em 40 países abrangendo apenas aqueles desenvolvidos ou em
desenvolvimento realizada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco)
divulgada em Genebra, na Suíça, denuncia que um professor brasileiro do Ensino
Fundamental I, em início de carreira, recebe em média menos de 5 mil dólares por
ano para dar aulas. Cabe assinalar que o cálculo foi feito incluindo os professores
da rede privada, o que elevou o valor. Na comparação com outros países, vemos
que, na Alemanha, um professor com a mesma experiência ganha, em média, 30
mil dólares por ano. Em Portugal, o salário anual chega a 50 mil dólares,
equivalente aos salários pagos aos suíços. Na Coreia, os professores do Ensino
Fundamental I ganham seis vezes o que ganha um brasileiro.(UNESCO e OIT,
2002). O problema é mais grave em países subdesenvolvidos, destacando-se a
52
América Latina e o Caribe, onde os docentes, especialmente do Ensino
Fundamental, estão abaixo da linha da pobreza.(GENTILI, 2006; CTERA, 2005).
Os estudos estatísticos do INEP (2003) demonstram que um professor no nível
médio ganha, em média, quase a metade do salário de um policial civil e um quarto
do que ganha um delegado de polícia no Brasil. O menor salário, o de professor da
educação infantil, se comparado ao de juiz, apresentará uma diferença que chega a
ser de 20 vezes. As discrepâncias salariais também são marcantes entre os
professores nas diversas regiões do País, sendo que os menores rendimentos estão
no Norte e Nordeste. Um professor da Região Sudeste ganha, em média, duas
vezes mais que seu colega da Região Nordeste.
Convém destacar que, segundo Castro e Ioshpe (2007), a resposta maior dos
professores com relação às reformas educacionais foi relacionada com sua
autonomia, ante condições desfavoráveis de trabalho. Os fatores relacionados com
a precarização do trabalho docente, como as más condições de trabalho, seriam
mais relevantes que as queixas dos professores sobre o salário.
A pauperização profissional – a maioria dos professores ganha entre 2 e 10
salários mínimos- reflete-se no empobrecimento da vida pessoal, em especial no
acesso às atividades culturais, como aponta estudo realizado pela UNESCO (2004)
com professores brasileiros:
62% nunca frequentam concertos de música erudita
14% não frequentam museus
17% não frequentam teatro
33% assistem a fitas de vídeo uma vez por semana
49% vão ao cinema algumas vezes no ano
Como consequência ainda do empobrecimento do professor, a realimentação
de informações se dá, na maioria das vezes, pela televisão ou por cursos de
especialização que, segundo sinalizam os docentes, não atendem às reais
necessidades. Assim, o que ocorre na esfera cultural está fora do seu universo.
Para compensar os baixos salários, o professor vê-se obrigado a assumir uma
carga horária que implica trabalhar em mais de uma instituição, situação comum nas
escolas públicas e privadas brasileiras, em geral professores do Ensino
Fundamental II e Médio, dobrando ou triplicando a quantidade de tarefas envolvidas
em seu exercício profissional: preparo de aulas e atividades, correção de trabalhos
de alunos, apoio aos alunos em atividades extracurriculares e formação continuada,
53
sendo que as horas de trabalho coletivo nas escolas nem sempre são remuneradas.
Importante ressaltar que o cumprimento dessas múltiplas jornadas se dá em escolas
que apresentam turmas numerosas, conforme confirmam os dados do Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP) que revelaram que o número
médio de alunos por turma variava de 30,9 a 43.
2.3.3 DESVALORIZAÇÃO PROFISSIONAL E DESPRESTÍGIO SOCIAL
A perda de prestígio social está diretamente ligada aos baixos salários,
trazendo inquestionáveis efeitos na autoestima e na identidade profissional do
professor. O sentimento de desvalorização é evidenciado em uma pesquisa
realizada em 2007 pela Fundação SM- Fundação espanhola que desenvolve
trabalhos com vistas ao desenvolvimento de iniciativas sociais e culturais em países
ibero-americanos, promovendo a formação e especialização de profissionais da
educação- e pela Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI) com 3500
professores de todo o Brasil, que indicou que 79,5 % deles consideram que a
sociedade não os valoriza. A mesma pesquisa indica que 76,7% dos docentes não
se sentem valorizados pelos órgãos responsáveis pela educação, o mesmo
acontecendo com um pouco mais da metade dos docentes (51%) em relação aos
pais dos alunos.
O desconforto dos professores com o desprestígio social é reforçado pela
dificuldade em dominar cada vez mais novas competências que lhes são exigidas,
como, por exemplo, as tecnologias.
2.3.4 DIFICULDADES COM AS NOVAS TECNOLOGIAS
Estudos sobre representações sociais acerca das novas tecnologias, em
especial da internet e do computador nas práticas educativas, vêm buscando
compreender os “medos”, “resistências” ou “fascínios”, “presentes no imaginário
individual e coletivo, no que se refere à representação da informática no cotidiano,
particularmente, na educação”. (CARNEIRO, 2002, p.15). Embora muitas pesquisas
tenham sido feitas com o objetivo de investigar a inserção da informática na
54
educação, de maneira geral (COSTA, 2001; CHAIB, 2002; CARNEIRO, 2002;
FARIAS, 2006; SAN MARTIM, 2006), a maioria esmagadora tem considerado o
professor como sujeito de investigação, (BELLONI 2001, CHIAVENATO, 2004;
FELIPE, 2001; ROSA, 2007; SOBRINHO, 1997; TOSTA , OLIVEIRA, 2000)
denunciando a perplexidade e despreparo desse profissional frente às mudanças
trazidas pelas novas tecnologias da informação e comunicação, as quais
representam um grande desafio, diante do qual ele se sente incapaz.
Esteve (1999, p.13) já denunciava como parte do mal-estar docente a
dificuldade do professor em acompanhar o ritmo acelerado das mudanças e a
exigência de uma atualização nem sempre possível:
A acelerada mudança do contexto social em que exercemos o ensino apresenta, a cada dia, novas exigências. Nosso sistema educacional, rapidamente massificado nas últimas décadas, ainda não dispõe de uma capacidade de reação para atender às novas demandas sociais. Quando consegue atender a uma exigência reivindicada imperativamente pela sociedade, o faz com tanta lentidão que, então, as demandas sociais já são outras. Portanto, os professores se encontram ante o desconcerto e as dificuldades de demandas mutantes e a contínua crítica social por não chegar a atender essas novas exigências. Às vezes o desconcerto surge do paradoxo de que essa mesma sociedade, que exige novas responsabilidades dos professores, não lhes fornece os meios que eles reivindicam para cumpri-las. Outras vezes, da demanda de exigências opostas e contraditórias.
Em se tratando de um profissional que personificou no imaginário social a
figura do detentor do saber, o docente depara com o choque de perceber que lhe
falta uma dimensão do conhecimento que pode comprometer fortemente sua
imagem de indivíduo letrado, pois, conforme ressalta Dionísio (2005, p.159), o
indivíduo letrado, em nossa sociedade, “deve ser uma pessoa capaz de atribuir
sentido a mensagens oriundas de múltiplas fontes de linguagem, bem como ser
capaz de produzir mensagens, incorporando múltiplas fontes de linguagem”. Em
uma ideia de multiletramento, o professor sente-se excluído do letramento digital.
Considere-se, também, que o aluno tem acesso às tecnologias mais
avançadas, enquanto o professor e a escola frequentemente não têm essa
condição, na maioria dos casos, inclusive de oferecer o respaldo do conhecimento
55
previamente adquirido. Na cibercultura3, os jovens leem e escrevem, comunicam-se
e interagem virtualmente, tornando-se sujeitos menos passivos diante da
informação, o que gera o desejo de atuação maior também na escola, deixando de
ser meros consumidores passivos. Nessa situação, o professor recusa-se a fazer
uso dessa ferramenta para que os alunos não percebam sua limitação ao usar a
tecnologia, o que desacreditaria, a seu ver, sua competência em ensinar. Isso trouxe
ao professor uma pressão psicológica por ter que buscar o domínio das tecnologias
para não ficar em condições de desigualdade com seus alunos e incorrer na perda
de profissionalidade. (ALMEIDA, 2005).
Destaque-se, ainda, que a resistência também tem raízes na idéia de que o
computador em sala de aula dispensaria a presença do professor. Santos (2003)
ressalta que essa visão evidencia a necessidade e a dificuldade de se criar um
modelo de formação de professores que permita uma apropriação crítica e
contextualizada da informática, redimensionando o papel do professor, dando-lhe
segurança para que tenha a convicção de que, como Nóvoa (2006, p.116-117)
afirma enfaticamente, “nada substitui um bom professor”. A partir dessa tese, ele
alerta:
É nesse sentido que julgo que nós podemos e devemos caminhar, no sentido de celebrar um novo contrato educativo com a sociedade, que passa também pela reformulação da profissão. Pois com certeza, não haverá sociedade do conhecimento sem escolas e sem professores. Não haverá futuro melhor sem a presença dos professores e da nossa profissão.
O sentimento de distanciamento da maioria dos professores frente às novas
tecnologias torna-se um entrave à conquista de sua soberania. O receio é justificado
pela estranheza que o novo traz, como sinaliza Freitas (2005) ao afirmar que é
natural e inevitável a desconfiança e o medo diante do computador/internet por ser
inovador e estranho. Para Melo Neto (2007), uma determinada tecnologia possui em
si outras tecnologias, e a introdução de novas tecnologias no ambiente escolar pode
3 O fenômeno da cibercultura pode ser entendido como resultante dos efeitos do ciberespaço
sobre a sociedade, isto é, como o cenário sociocultural contemporâneo, atravessado pelas
tecnologias digitais de informação e comunicação. Não se trata, porém, de uma cultura restrita
ao ciberespaço, mas constitui uma reconfiguração de modos de vida, trabalho,
educação.(LEVY, 1999)
56
resultar em diferentes comportamentos entre os professores. É ainda Melo Neto
(2007) quem categoriza os professores, caracterizando-os como: (a) indiferentes, os
que aguardam com apatia o rumo que as coisas tomam, para então se definir,
mesmo que em outros comportamentos assumam uma posição mais crítica; (b) os
céticos, que enfatizam a pobreza do sistema educacional brasileiro, identificando
necessidades muito mais prementes que a tecnologia, vendo-a bastante distanciada
das reais necessidades dos alunos, acrescentando-se a esse sentimento a crença
na possibilidade de a máquina substituir o professor, eliminando, assim, o contato do
professor com o aluno; e (c) os otimistas, profissionais que inseriram o computador
em seu cotidiano, medida que não garante uma mudança de postura, pois não
utilizam a tecnologia devidamente, inclusive por possuírem poucos fundamentos.
O desafio do novo pode criar, em última instância, no professor que não
compartilha o saber necessário para o uso do instrumento, uma postura paralisante,
mantendo uma posição conservadora denominada tecnofobia, que significa
“rechaçar qualquer tecnologia que a pessoa não tenha utilizado desde pequena e
tenha passado a fazer parte de sua vida pessoal e profissional” (SALVAT, 2002, p.
88).
Estudos de Felipe (2001), Sobrinho (1997) e Tosta e Oliveira (2000)
identificam o medo por parte dos professores diante das novas tecnologias, que
variam do medo do computador ao de ver sua autoridade ameaçada por lecionarem
para alunos que detêm mais conhecimento do que eles nessa área. O medo do
novo, característico em todas as mudanças, também foi apontado por assumir
maiores proporções na atualidade por exigir dos professores que, além de saberem
utilizar e aplicar as novas tecnologias, também promovam uma mudança
educacional, o que significa uma implicação muito maior do que simplesmente a
adequação de um novo recurso à sua atuação profissional, mas uma participação
decisiva em transformações que, além do aspecto educacional, atingirão um aspecto
social mais amplo. Talvez esse receio explique, em parte, as conclusões de
Sobrinho (1997, p. 149) ao constatar, em sua pesquisa com os professores, que
estes acreditam que não há necessidade de modificar seus modos de atuação e
concepções de ensino frente às demandas da tecnologia, revelando que: “o
movimento de hibridação tecnológica na escola tende mais para acomodar as
inovações do que para configurar uma outra prática de ensino”.
57
É Perrenoud, (1999) quem chama a atenção para a influência dos
procedimentos rotineiros como empecilho a mudanças, atribuindo a lenta evolução
do trabalho dos professores ao fato de a relação educativa obedecer a uma trama
bastante estável, decorrente de condições de trabalho e cultura profissional que
instalem os professores em rotinas.
A reversão de uma representação que é construída sobre resistência, medo e
desconfiança exige que o professor efetue uma mudança que implicaria abandonar
modos de pensar e agir naturalizados, instalados em rotinas pertencentes a outro
contexto. Significaria abrir mão, por exemplo, da idéia de que o professor deve
superar o aluno em todas as dimensões do conhecimento, despindo-se da condição
de ensinante para assumir também a posição de aprendiz. O computador não
garante uma mudança de postura do professor, que enfrenta alunos para os quais
uma sala de aula passiva fica cada vez mais desinteressante, pois se distancia da
forma de aprendizagem interativa que já se tornou parte de sua vida. (SARTORE,
2008). Torna-se indispensável uma formação que supra essa carência, o que leva
Lima (2000) a afirmar que oferecer ao professor oportunidade de formação contínua
não basta, é fundamental que o professor queira essa formação e dela sinta
necessidade.
Os antigos cursos de formação de professores, Curso Normal e de
Pedagogia, promoviam o acesso do professor aos recursos tecnológicos da época
chamados, então, de recursos audiovisuiais, como retroprojetor, vídeo cassete e
fotocopiadoras (CANDAU, 2003; LOPES, 2003; PILETTI, 2002). Os novos cursos de
formação de professores não incluem as novas tecnologias em suas disciplinas,
negando-lhes a absoluta familiaridade com os recursos tecnológicos atuais. Lopes e
Piletti afirmam que grande parte dos professores não gosta de usar a tecnologia,
muitas vezes escondendo-se na falta de recursos das escolas, mas que na verdade
não usariam ainda que tivessem acesso, justificando esse comportamento com a
argumentação de que é perda de tempo e que os alunos ficam mais indisciplinados
quando recursos tecnológicos são utilizados, camuflando o receio e a dificuldade.
A sensação do professor é de exclusão, que leva a uma frustração, à qual se
acrescenta um sentimento de inferioridade diante do conhecimento dos alunos, e à
resistência ao uso, que se reafirma diante da premissa de que “qualquer criança lida
melhor com o computador do que os adultos” (CARNEIRO, 2002, p.57). Diante dos
sentimentos de “recusa, medo e sedução” (CARNEIRO, 2002, p.55), o professor
58
enfrenta mais uma insegurança que interfere diretamente com uma das mais difíceis
relações estabelecidas pelos professores das escolas de elite: as relações com as
famílias e o poder que lhes é conferido.
2.3.5 RELAÇÃO COM AS FAMÍLIAS
Nas duas últimas décadas, tem-se evidenciado a atenção dedicada ao tema
família, especialmente no que diz respeito ao seu processo formativo, aos papéis
que lhe são atribuídos e, consequentemente, como essa questão tem sido
conduzida no cenário educativo (ALMEIDA, CUNHA, 2003; ARAÚJO, 2002;
DAMASCENO, TERTO, & SILVA, 2003; PASSOS, 2002).
Os papéis bem definidos estabeleciam as relações interpessoais nas famílias
baseando-as na autoridade imposta pela figura paterna, que assumia funções
relativas ao sustento econômico. À família competia não apenas a garantia da
segurança do aspecto físico, mas respondia, principalmente, pelo aspecto moral.
Cabia aos pais transmitir valores socialmente construídos e regras essenciais para a
participação da vida em sociedade, ou seja, responsabilizava-se pela socialização
primária das crianças. A função da mulher restringia-se à organização da casa, a
cuidar do marido e da educação dos filhos, e quanto à sua própria educação, esta
geralmente se resumia à aprendizagem de boas maneiras e prendas domésticas, ou
seja, aprendia apenas o necessário para ser boa mãe e boa esposa.
(VASCONCELLOS, 2005).
O papel da mulher na condição de mãe na família contemporânea sofreu as
transformações mais significativas, em decorrência do acesso à escolaridade, do
ingresso no mercado de trabalho e, muitas vezes, da mulher assumindo-se como
provedora do lar. Aliado à ausência da mãe submissa que exercia a função de dona
de casa, tínhamos o pouco envolvimento do pai, provedor do lar, que ditava as
regras. Surgem novas configurações que impuseram um distanciamento dos filhos e
diluíram a idéia de poder e autoridade no seio da família nuclear. (DONATELLI,
2004). A ausência dos pais permitiu que alguns fatores alterassem o cotidiano das
famílias ocidentais, com a presença excessiva da televisão, a supervalorização do
consumo (TRANCREDI; REALI, 2001) e a delegação do processo formativo, que
cabia aos pais, a pessoas, muitas vezes, despreparadas para assumir a
responsabilidade da socialização primária da criança, como babás e empregadas.
59
As ausências e a consequente culpa pelo distanciamento têm levado os pais
a esgarçarem os limites que devem ser impostos às atitudes dos filhos, causando
uma desestrutura familiar caracterizada pela falta de afeto, limites e problemas
psicoemocionais (OLIVEIRA, 2002).
A questão da indisciplina e falta de limites, diretamente ligada aos valores
considerados pelas famílias, e que a escola esperava que fossem promovidos pelos
pais, tem sido uma das maiores queixas dos professores. Parte do problema é
creditada à diminuição efetiva do tempo que os pais passam com os filhos, trazendo
como consequência uma permissividade maior pela dificuldade de impor limites e
regras sociais (ALVES-MAZZOTTI, 2007; MIZRAHI, 2004), aliada à ideia de que o
escasso tempo passado com os filhos deve-se constituir de momentos agradáveis.
A transformação dos papéis de pai e mãe modifica a organização simbólica
que constitui o sujeito e que ocorre por meio do desempenho das funções dentro da
família. A esse respeito, afirma Passos (2005):
Maternar é a primeira função da mãe junto à criança e, embora esse momento da recepção do bebê a coloque em primeiro plano, é preciso considerar a presença do pai/cônjuge nos bastidores, dando sustentação a essa função. [...] Se a recepção e os cuidados primários estão sob a responsabilidade da mãe, o pai, além de também participar dessas atribuições, introduz a autoridade, e ambos desenvolvem a contenção dos excessos pulsionais dos filhos. É por meio das proibições impostas pela autoridade paterna que, progressivamente, os filhos adquirem suas próprias referências, com as quais serão inseridos no mundo das leis, da ética e de uma moral mais ampla.
A modificação de papéis transforma a família hierárquica em família
igualitária, situação que, mal administrada, tira a posição de poder assentada
anteriormente em sexo e idade, valorizando opções e a vida privada de cada
membro (NOGUEIRA, 2005, p.p. 571-572). A posição do filho na família
contemporânea é, naturalmente, ressignificada, segundo esclarece Godart (1992, p.
119):
Tudo se passa como se o êxito do filho constituísse uma espécie de símbolo do êxito pessoal dos pais, do bem fundado de seus valores e de sua concepção de educação: como se esse êxito se tornasse para os pais um critério fundamental da sua autoestima.
Vários estudos apontam a falta de estrutura familiar e a situação socieconômica
da sociedade como os principais fatores responsáveis pela indisciplina na escola
60
(LONGAREZZI, 2001; OLIVEIRA, 2002; PAPPA, 2004; LOBATO, 2006). Importante
ressaltar que, na opinião dos professores, as condições financeiras desfavoráveis ou
excessivamente favoráveis produzem indisciplina (LOBATO, 2006). Também é uma
representação da maioria dos professores que os alunos “são na escola o que
trazem de casa” (PAPPA, 2004).
As profundas transformações que as instituições família e escola têm sofrido
na contemporaneidade são tangíveis, principalmente, nas relações estabelecidas
entre pais e educadores no dia a dia escolar. Constata-se, cada vez mais, que essas
relações têm gerado tensões e comportamentos contraditórios. As dificuldades
desse relacionamento podem ser observadas, inclusive, nos títulos de pesquisas
recentes sobre o tema: Diálogo impossível (MONTANDON E PERRENOUD, 2001);
Relação armadilhada (SILVA, 2003); Proximidade distante (SANTOS, 2001), por
exemplo.
O problema não se restringe às escolas públicas, sendo também verificado na
rede privada de ensino, visto que as famílias contemporâneas de classe média
dividem, cada vez mais, com as escolas a responsabilidade da educação de seus
filhos, como observam Tancredi e Realli (2001).
Se, por necessidade, muitas famílias deixam de perceber a escola como instituição que tem a função de ensinar o conhecimento sistematizado e, assim, transferem para ela a responsabilidade mais ampla de educar as crianças, a escola tem tido dificuldade de aceitar e adequar-se a essas novas atribuições.
Outras pesquisas, porém, apontam uma tendência oposta, com a escola
trazendo para si funções que fogem à sua alçada, como, por exemplo, se
responsabilizar pelo bem-estar psicológico e o desenvolvimento emocional dos
alunos. É o que afirma Montandon (2001, pág. 17-18):
Na medida em que [...] há uma maior preocupação com a felicidade e o desenvolvimento da criança, onde os educadores não se atêm exclusivamente ao desenvolvimento cognitivo da criança, na medida em que a escola utiliza uma pedagogia invisível e em que a socialização aí feita tem vindo a ser menos neutra, mais personalizada, o território afetivo da família é, de qualquer forma, invadido [pela escola].
Cabe ressaltar que os pais de classe média, usuários da escola privada,
apresentam uma tendência a verem sua relação com os professores em termos de
61
igualdade, se não mesmo de superioridade, contrastando com a relação
desenvolvida pelos pais de alunos da rede pública. (Silva, 2003).
Em função das novas relações que se estabelecem entre famílias e escolas,
pesquisas (NOGUEIRA, ROMANELLI, PARO, 2000; ZAGO, 2000, 2003; HARDT,
NEGRI, 2001; SAES, 2003; ALMEIDA, 2004; CUNHA, 2007) tentam esmiuçar a
relação entre essas instituições .Os resultados apresentam uma relação permeada
por diversos fatores: o sofrimento dos pais por afastarem seus filhos de si mesmos,
muitas vezes sentindo-se enciumados dos professores; um nível de exigência
superdimensionado com relação à escola, esperando dela o melhor em todos os
aspectos. As pesquisas mostram também que o fracasso escolar é um fantasma,
muitas vezes aliado aos próprios fracassos dos pais que desejam ser
recompensados pelo desempenho dos filhos, embora seja comum demonstrarem
pouco interesse pela sua vida escolar. Finalmente, com relação ao contexto
socioeconômico, ressalta-se que, ao longo do tempo, a família deixou de constituir
uma unidade de produção para se transformar em uma unidade de consumo.
Assim, família e escola, que antes tinham objetivos e funções claramente
definidos, agora encontram dificuldades em estabelecer os limites dos seus papéis,
com a redefinição do trabalho educativo entre as instituições. A escola já não limita
sua função ao desenvolvimento intelectual dos alunos, atuando em questões morais
e emocionais. Por outro lado, a família reivindica o direito de interferir em questões
de aprendizagem e outras questões de ordem pedagógica e disciplinar. As fronteiras
perderam seus limites.
Para Trancredi e Reali (2001), a escola caracteriza-se como uma importante
agência educacional e socializadora, complementando o trabalho desenvolvido
pelas famílias. Porém, a escola e, em especial, o professor não têm muita clareza do
que constitui a função educacional - muitas vezes negligenciada no seu caráter
acadêmico para suprir a função da família, na avaliação dos professores - e o que
englobaria a função socializadora.
Tal situação contribui para um processo de transformação identitária, já que
os professores constroem e desconstroem sua identidade de acordo com demandas
e regras visíveis na instituição a que pertencem. Mas, quais são as regras visíveis?
A relação harmoniosa entre essas duas instituições constitui hoje um desafio que
vem despendendo muita energia de profissionais e famílias.
62
As transformações cada vez mais velozes e significativas, em diferentes
aspectos - conflitos entre modelos e normas culturais, esvaziamento das funções da
família, crise ética, entre outros -, às quais as sociedades contemporâneas vêm
sendo submetidas, exige que a escola, e consequentemente o professor, enfrentem
desafios que põem em discussão as funções clássicas da escola e o papel do
docente ( Alves-Mazzotti, 2007c).
No que tange à escola de elite, esse é um aspecto de suma importância, que
vai implicar diretamente os valores que permearão as relações da família com a
escola.
63
3. O CONTEXTO E OS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA
3.1 O CONTEXTO
O ponto de partida deste estudo foi, como citado anteriormente, a pesquisa
“Representações sociais de professores da rede pública sobre sua identidade
profissional, hoje”. ( ALVES-MAZZOTTI, 2007), que verificou que o núcleo central
das representações sobre a identidade profissional de professores das séries iniciais
do Ensino Fundamental era composto de um único elemento: dedicação, um sentido
atribuído tradicionalmente às professoras desse segmento. Os dados da pesquisa
foram obtidos com a realização de 30 entrevistas conversacionais, seguidas de
quatro grupos focais, com professoras das séries iniciais (1a a 4a série, de acordo
com a nomenclatura da época) em escolas públicas do Rio de Janeiro.
Em contraponto a esse estudo, a pesquisa que é objeto do presente trabalho
foi realizada em uma escola de elite, termo aqui utilizado para designar o tipo de
escola em que os professores recebem alta remuneração, formação continuada
garantida pela própria escola e remunerada, equipe psicopedagógica de apoio,
participação de pais e professores na gestão da escola, equipamento tecnológico de
última geração, além de ter corpo discente pertencente a famílias de classe média
alta. O fato de o estudo ser realizado em apenas uma escola e, principalmente a
existência de condições de trabalho tão peculiares, permitem que este possa ser
caracterizado como estudo de caso. De acordo com Alves-Mazzotti (2006) 4
3.2 O CAMPO DE PESQUISA
A pesquisa foi desenvolvida no Colégio Cruzeiro, antiga Escola Alemã do Rio
de Janeiro, fundada em 1863, que teve como proposta inicial atender aos filhos de
imigrantes alemães vindos para o Brasil em busca de melhores oportunidades de
vida. Logo se configurou como uma escola brasileira que lecionava a língua alemã,
4 São poucas as pesquisas sobre escolas que atendem a esse segmento da sociedade e apenas em alguns
estados do Brasil – em São Paulo, A escolarização das elites: panorama internacional, de Almeida e Nogueira ( 2003) e ainda , das mesmas autoras Circulação internacional e formação intelectual das elites brasileiras (2004); no Rio de Janeiro : Elites acadêmicas e escolarização dos filhos, de Brandão e Lellis (2003); em Florianópolis: A fabricação escolar das elites (2001) , de Dallabrida e em Porto Alegre, Uma escola para ricos: estudo de caso de como uma escola se adapta aos ricos (2005) , de Kieling, entre outras, constituindo todas
estudos de caso. Cabe ressaltar que essas pesquisas, em sua maioria, focalizaram pais e estrutura da escola, sem se deter nos professores.
64
pois abriu suas portas a alunos sem distinção de nacionalidade, o que foi
reconhecido durante a Segunda Grande Guerra, permitindo que a escola, fechada
por questões políticas, logo fosse reaberta. Atualmente é bastante restrito o número
de alunos que descendem de famílias alemães, sendo o corpo discente e docente
formado maciçamente por brasileiros. Para as famílias, o estudo da língua alemã é
bastante valorizado como um componente diferencial na formação acadêmica,
considerando que a língua inglesa, apenas, não distingue um bom currículo.
Cabe ressaltar que a escola realiza um trabalho visando à inclusão,
oferecendo abordagens diferenciadas a alunos com necessidades especiais e não
excluindo de seu corpo discente alunos que não se destaquem em exames como os
já citados, pois entende a educação como “processo participativo, interacional,
interdisciplinar de formação, informação, adaptação e transformação do ser
individual e social”, não selecionando ou mantendo seus alunos pelas condições de
destaque que eles poderiam proporcionar à escola em exames de grande projeção,
fato comum em escolas de elite.
Em relação ao ensino de idiomas, além da língua alemã são oferecidas classes
de língua inglesa e espanhola - são ministradas para turmas divididas em grupos,
utilizando áudios especiais.
Em seu espaço físico, conforme pode ser observado nas fotos em anexo,
encontramos sala de psicomotricidade, sala de idiomas, sala de música, sala de
artes, horta, duas piscinas, duas quadras esportivas, parquinho, areal, ginásio
poliesportivo, salas de aula adequadas às faixas etárias, destacando-se salas com
banheiro anexo para alunos e professores, varandas amplas com material
pedagógico e um bebedouro, no caso da educação infantil. O Ensino Médio desfruta
de duas salas com quadro multimídia. Nos refeitórios são oferecidas as refeições
(almoço e lanche) para os alunos do tempo integral e demais alunos que são
inscritos em atividades extracurriculares. Tal alimentação é orientada por uma
nutricionista, já que o colégio apresenta uma proposta de alimentação saudável.
O setor de multimeios conta com retroprojetores, data-show, máquinas
digitais, filmadora, uma televisão e um DVD player para cada corredor, dois
laboratórios de informática com um total de 35 computadores de ponta e duas salas
multimídia com quadro eletrônico.
Os professores fazem uso de um setor de mecanografia, que digita e
reproduz o material, inclusive, se necessário, imprimindo cópias coloridas. A verba
65
para aquisição de livros da biblioteca gira em torno de R$ 2.000,00 mensais,
atendendo aos pedidos de professores, coordenadores e alunos.
Em 2008, as mensalidades variavam de acordo com o segmento, com valores
entre R$1.139,10 e R$ 1.449,37 para o horário regular. O horário integral
praticamente duplica esse custo. Mesmo com esse preço, há muita procura por
vagas, principalmente no horário da manhã, única forma de acesso ao horário
integral. Muitas vezes, há necessidade de se fazerem sorteios entre os interessados
por uma vaga na educação infantil. Nos demais segmentos, o ingresso se dá por
meio de provas de avaliação do conteúdo.
3.3 OS SUJEITOS DA PESQUISA
A unidade a pesquisada tinha em seu quadro, por ocasião da coleta dos
dados, de setembro a novembro de 2008, 198 professores, sendo 60 da Educação
Infantil, 51 do Ensino Fundamental I, 49 do Fundamental II e 38 do Ensino Médio.
Este estudo restringe-se aos professores do Ensino Fundamental I, em função de a
quase totalidade dos profissionais desse segmento trabalhar apenas na escola
pesquisada, conforme foi dito anteriormente, só 4 professoras regentes de turma
também lecionam na rede pública e 2 têm função burocrática. Participaram do
estudo, portanto, 32 professores. Estes foram escolhidos pela disponibilidade de
horário, pois os grupos focais foram realizados fora do horário regular.
Os professores da Educação Infantil e do Fundamental I são mensalistas,
recebendo o valor de R$ 3.211,43 mensais, o que corresponde
a, aproximadamente, 7,5 salários mínimos, com hora-aula no valor de 23,79
mensais, por 30 tempos semanais, para o horário de trabalho de 7h 30 min às 12h
30 min ou de 12h 35 min às 17h 35 min. O piso salarial da educação básica, em
2009, é R$950,00. Os professores do Fundamental II recebem R$ 36, 98 por hora-
aula, enquanto o Ensino Médio tem a remuneração de R$48,07 por tempo de aula.
Todos os professores usufruem dois tempos semanais, remunerados à parte,
para planejamento e estudos. Atualmente, as equipes de professores de
Jacarepaguá e Centro estão se reunindo para analisar os conteúdos, a grade
curricular e o sistema de avaliação, que o corpo docente considera carentes de
reformulações.
66
São realizados seminários periódicos, ciclos de debates, grupos de estudos,
cafés literários, viagens de estudo com alunos para trabalhos de campo, nas quais
os professores são pagos, à parte, para acompanhá-los.
Todos os professores têm o nível superior, a maioria tem pós-graduação, 3 têm
mestrado e um fez o doutorado. O período de férias é composto de três semanas
em julho, 10 dias em dezembro e, oficialmente, 30 dias em janeiro, perfazendo um
total de, aproximadamente, dois meses anuais de descanso. Os alunos realizam
intercâmbios no sul do Brasil, na Alemanha, no Canadá e na Inglaterra, no período
de férias escolares, acompanhados por professores. São oferecidas gratuitamente,
ao corpo docente e demais funcionários, aulas de natação, hidroginástica em piscina
aquecida e informática. Aulas de alemão são subsidiadas, assim como o almoço e
plano de saúde.
A equipe pedagógica da escola é composta por um diretor, dois vice-
diretores, um coordenador, um orientador educacional ou psicólogo e uma assistente
para cada coordenação, coordenadores para cada área de estudo, assessoria de
língua portuguesa, assessoria de uma mestra em educação, completando o
doutorado, especialista em adaptação curricular para atender aos alunos de
inclusão, além de uma especialista em matemática que capacita os professores.
Diante desse quadro, fica caracterizado que, ao contrário dos docentes da
rede pública, os professores do colégio não são submetidos a baixos salários,
condições deficientes ou sobrecarga de trabalho, alijamento do processo de gestão,
confrontos com alunos e famílias de nível financeiro ou cultural desfavorecidos, nem
lhes falta acesso à formação continuada ou recursos tecnológicos. É essa situação,
aparentemente ideal de exercício do magistério, que possibilitará aferir se as
condições de trabalho vão afetar as representações sociais de identidade
profissional docente apresentadas por estes professores.
3.4 TÉCNICA DE COLETA DE DADOS
A coleta de dados foi realizada a partir do segundo semestre de 2008 e tomou
por base a abordagem teórico-metodológica das representações sociais, que sugere
um amplo espectro de opções no que diz respeito aos métodos de pesquisa, como
afirma Sá (1998).
67
No caso desta pesquisa, optamos pela perspectiva estrutural proposta por
Abric (1994, 2003), que define a representação social como um conjunto de
informações, opiniões, atitudes e crenças organizadas em torno de uma significação
central, o que exige o conhecimento de seus três elementos constituintes: o
conteúdo, a estrutura interna e o núcleo central. Considerando-se que nenhuma
técnica permite, por si só, identificar esses três componentes, Abric sugere uma
abordagem plurimetodológica, articulada em três etapas:
1. Levantamento do conteúdo da representação, etapa em que se utiliza
amplamente a técnica de livre associação de palavras pela vantagem de reduzir a
utilização de mecanismos de defesa que podem surgir na situação de entrevista.
2. Pesquisa da estrutura e do núcleo central. Inicialmente, organizam-se e
categorizam-se os conteúdos em um subsistema temático, para, posteriormente,
identificar as relações e hierarquizar os elementos da representação.
3. Verificação da centralidade, que consiste em testar os elementos identificados
como os mais significativos nas etapas anteriores, a fim de verificar sua centralidade
dos elementos do núcleo central (ALVES MAZZOTTI, 2002).
As técnicas propostas para essa verificação assumem o pressuposto
conceitual segundo o qual os elementos centrais são “inegociáveis”, ou seja, se
forem retirados da representação, esta perde seu significado. Considerando-se a
complexidade das representações, diferentes combinações de técnicas são
utilizadas na tentativa de dar conta de seus significados.
Nesta pesquisa, utilizamos o teste de livre evocação de palavras proposto por
diversos autores (ABRIC, 1994; SÁ, 1996; TURA, 1998), com justificativas e
hierarquização das palavras evocadas para levantar o conteúdo da estrutura e do
núcleo central. Para a verificação da centralidade, lançamos mão de três grupos
focais com os professores da escola pesquisada.
Tura (1998) defende a utilização dos testes de evocação, considerando que
estes têm-se mostrado úteis nos estudos de estereótipos, percepções e atitudes, os
quais são elementos importantes na organização das representações sociais.
68
A primeira parte da coleta de dados consistiu em pedir aos professores que
preenchessem um formulário para caracterização dos respondentes. Este formulário
contemplava itens sobre nível de formação, tempo de magistério, idade, sexo,
considerando-se também se trabalha ou trabalhou em outra instituição e, em caso
positivo, se pertencia à rede pública ou particular. Após o preenchimento, foi
realizado o teste de livre evocação das palavras, solicitando-se aos sujeitos que
escrevessem as quatro primeiras palavras que lhe viessem à mente ao ouvir a
expressão indutora: ser professor, hoje. A seguir, pedimos a indicação das duas
mais importantes, entre as quatro escolhidas, ordenando-as. Finalmente, solicitou-se
que, em um pequeno texto, justificassem a importância atribuída a essas palavras. A
proposta foi repetida com a expressão indutora ser professor da elite. A aplicação do
teste foi feita individualmente.
Após a análise preliminar desses dados, foram realizados três grupos focais,
cada um com oito professores da escola pesquisada, e duração de
aproximadamente uma hora. Esse procedimento teve por objetivo testar a
centralidade dos elementos identificados por meio das técnicas precedentes, bem
como aprofundar os sentidos atribuídos a esses elementos. Essa é uma técnica
considerada especialmente adequada nos estudo das representações sociais, pelo
fato de ser realizada por meio de conversações (MAZZOTTI, 2000).
3.5 TÉCNICA DE ANÁLISE DOS DADOS
Para a tabulação das informações – dados contidos no formulário de
caracterização do respondente, juntamente com as palavras evocadas,
hierarquizações e justificativas – foi utilizado o programa Excel. Com os resultados
dessa tabulação, foi construído um “mapa” contendo todas as informações
levantadas,que permite a visualização de todos os dados em um mesmo espaço,
tornando mais fáceis os cruzamentos necessários
Os dados das evocações livres foram tratados com o auxílio do software
EVOC, a partir de orientações de Vergès (1994) e Tura (1998). Essa técnica
69
possibilitou a identificação dos possíveis elementos do núcleo central e periféricos
considerando a freqüência (f)5 e a ordem média de evocação da palavra (OME) 6.
Os resultados são distribuídos em dois eixos ortogonais com as palavras de
maior frequência e menor OME situadas no quadrante superior esquerdo,
correspondente ao núcleo central. As que se situam no quadrante superior direito
são consideradas “periferia próxima” ao núcleo e as do quadrante inferior direito
constituem a periferia propriamente dita; no quadrante inferior esquerdo situam-se os
elementos de contraste, os quais são de mais difícil interpretação, podendo indicar
mudanças em curso na representação ou a existência de subgrupos (ALVES-
MAZZOTTI, 2009).
Machado (2006) sinaliza-nos que a frequência de uma palavra é o indicador
bruto de quantos sujeitos, dentro do universo total, fizeram referência a ela. No caso
da ordem média, o resultado refere-se à acessibilidade das palavras. A combinação
desses dois critérios é o ponto de partida para a distribuição dos resultados em dois
eixos ortogonais que formam quatro quadrantes com quatro conjuntos de termos.
As justificativas das palavras livremente evocadas foram submetidas a uma
pré-análise que consistiu em uma leitura flutuante de todo o material (BARDIN,
1979). A análise inicial desse material bruto levantou algumas indicações para a
etapa seguinte da análise. Nessa etapa, fez-se uma leitura sistemática com o
objetivo de identificar as relações entre os elementos da representação, além de
levantar indícios dos processos formadores da representação dos professores sobre
a identidade docente e sobre a participação na formação da elite.
Quanto aos grupos focais Gatti (2005) destaca, entre suas várias finalidades a
fundamentação de hipóteses, a verificação de tendências e a testagem de idéias,
planos, materiais, propostas. Diz, ainda, que esta técnica pode ser usada para o
aprofundamento da compreensão de algo, a partir de dados provenientes de outras
técnicas.
A partir do conhecimento do conteúdo, da estrutura interna e do núcleo
central, a análise foi complementada com uma argumentação sobre a forma como
5 A frequência da evocação é encontrada pelo somatório das frequências em que a palavra foi evocada em cada
posição. (TURA, 1998)
6 A ordem média de evocação é obtida ponderando-se com peso 1 a evocação feita em primeiro lugar, com 2 em
segundo, e, assim por diante, com tantos índices de ponderação quanto for o número de associações solicitadas.
70
esses diferentes componentes se relacionam ao contexto de sua produção, em uma
busca por identificar os processos formadores da representação, assim como as
atitudes, valores e referências dos sujeitos.
É importante ressaltar que todas as técnicas utilizadas obedeceram ao
princípio de pedir ao grupo que fizesse um trabalho de análise, comparação e
hierarquização de sua produção discursiva. Trata-se de um princípio metodológico
que permite reduzir, significativamente, o trabalho interpretativo do pesquisador, em
uma significativa contribuição para minimizar seus vieses. (ALVES-MAZZOTTI,
2002).
71
4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
4.1 RESULTADO DO QUESTIONÁRIO DE PERFIL DO RESPONDENTE
A seguir são apresentados os resultados dos dados levantados a partir do
questionário que caracterizou os sujeitos participantes da pesquisa, contendo idade,
tempo de exercício no magistério e formação.
No que diz respeito à idade, a pesquisa apresentou as seguintes informações:
32,5% tem entre 26 e 55 anos, 53,1% entre 36 e 45 anos e entre 46 e 55 anos
encontram-se 15,6% das entrevistadas. Portanto, a maior concentração encontra-se
na faixa de 36 a 45 anos ( 53,1% do total), seguindo-se a faixa entre 26 e 35 anos
(32,5%). Considerando-se que entre 46 e 55 anos encontram-se 15,6% das
entrevistadas, temos, portanto, 68,7% das professoras têm entre 36 e 55 anos.
No que diz respeito à formação, todas possuem nível universitário, exigência
da instituição, sendo que predomina o curso de Pedagogia, com 78,1% dos
professores, ou seja, 24 dos 32 profissionais. Do total, 7 ( 21,8%) possuem pós-
graduação e uma cursa o Mestrado em Educação
Trata-se de um grupo bastante experiente, posto que 50% exercem a
profissão entre 16 e 20 anos, 25% lecionam entre 11 e 15 anos, 9,3% entre 21 e 25,
o mesmo percentual ocorrendo entre os que têm mais de 25 anos de magistério.O
percentual dos que lecionam entre 6 e 10 anos é de 6,2%, significando que 84,3% ,
ou seja , 22 professoras, exercem o magistério há mais de 15 anos.
Tais dados revelam que os respondentes da pesquisa da rede particular são,
predominantemente, mulheres maduras, com grande experiência no magistério.
No que diz respeito à idade dos professores, os dados desta pesquisa são
muito semelhantes aos que aparecem, também, nas pesquisas da UNESCO ( 2004)
e de Brandão e Lellis (2006). Segundo a UNESCO, a idade média dos professores,
considerando-se todos os segmentos, é de 37,8 anos. De acordo com Brandão e
Lellis, que seguiram o mesmo critério, a idade média é 40 anos, concluindo que as
escolas de elite apresentam um corpo docente experiente, com índice compatível
com as escolas da união europeia.
Quanto ao sexo, os dados seguem a tendência historicamente registrada
sobre a quase exclusividade de mulheres no magistério das séries iniciais, uma vez
72
que todos os sujeitos desta pesquisa são mulheres. Dados de pesquisa da UNESCO
(2004) apontam 83,4% de mulheres e 18,6 de homens.
A identidade da mulher como profissional da educação tende, ainda hoje, a
ser vinculada à maternidade, à domesticidade e aos sentidos que a ela são
agregados, conforme apontado por ALVES-MAZZOTTI (2008), como sendo cuidado,
dedicação e amor. Em sua pesquisa Representação do trabalho do professor das
séries iniciais: a produção do sentido de “dedicação, 2008, a autora buscou
compreender como esse sentido é produzido. A análise dos resultados sugeriu que:
A idade das crianças, e o tempo de permanência da professora com elas, aliados à carência e ao desamparo a elas atribuído, parecem desempenhar um papel fundamental na produção do sentido de dedicação.Esse sentido parece se ancorar nos sentidos associados à maternidade, ao cuidar e proteger. (ALVES-MAZZOTTI, 2008, p. 522)
4.2 - RESULTADO DO TESTE DE LIVRE EVOCAÇÃO E GRUPOS FOCAIS
Antes de apresentarmos os resultados do teste de livre evocação é
importante destacar, para melhor compreensão e leitura dos resultados, que quanto
menor é OME de cada palavra, mais prontamente evocada ela foi , e quanto maior a
OME, mais tardiamente ela foi evocada.
Ressalte-se que os elementos do núcleo central exercem a função de defesa
da representação, a mais rígida, a menos sensível a mudanças em função do
contexto externo ou das práticas dos sujeitos. (MARQUES; OLIVEIRA; GOMES,
2004). O quadro abaixo sintetiza as características do núcleo central e do sistema
periférico:
73
Fonte : ALVES-MAZZOTTI, (2002).
O grupo estudado apresenta elevado nível de capital acadêmico e trabalha
em uma das mais importantes escolas brasileiras, secular, prestigiada e reconhecida
por seus resultados em todo o Brasil, em função da publicação dos principais
avaliadores de desempenho.
Entre as professoras pesquisadas foram contabilizadas 181 evocações. A
ordem de evocação média das palavras é igual a 2, a frequência média 5 e a mínima
6, conforme registra a tabela 1, que apresenta a possível estrutura da representação
social de ser professor , hoje para os sujeitos da pesquisa.
Núcleo Central Sistema Periférico
Ligado à memória coletiva e à
história do grupo
Permite a integração das
experiências e das histórias
individuais
Consensual: define a
homogeneidade do grupo
Suporta a heterogeneidade do grupo
Estável, coerente e rígido
Flexível, suporta contradições.
Resiste à mudança
Transforma-se
Pouco sensível ao contexto imediato
Sensível ao contexto imediato
Gera a significação da
representação e determina sua
organização
pPermite a adaptação à realidade
concreta e a diferenciação de
conteúdo; protege o sistema central
74
Tabela 1 – Ser professor, hoje (escola de elite)
O.M.E. 2,0 2,0
Freq.
Méd.
Termo evocado Freq. O.M.E. Freq. O.M.E.
13
competência
compromisso
desafio
5
8
14
1,800
1,375
1,714
criatividade
dedicação
8
6
2,833
2,000
13
amor
perseverança
responsabilidade
3
2
2
1,667
1,500
1,500
atualização
conhecimento
desgaste
ética
4
2
4
3
2,500
2,000
2,000
3,000
As evocações indicam competência, compromisso e desafio como elementos
do núcleo central e, na periferia próxima, os elementos criatividade e dedicação.
Constituindo-se como elementos periféricos, portanto localizados no quadrante
inferior direito, encontramos as palavras atualização, conhecimento, desgaste, ideal,
paciência, prazeroso e ética, e no esquerdo, os chamados elementos de contraste,
que são amor, perseverança e responsabilidade.
A análise das justificativas apresentadas indicou que a palavra desafio
destaca-se no núcleo central, sendo a palavra de maior frequência. Esse núcleo
gera o sentido e organiza as relações com o sistema periférico. Dessa forma,
podemos observar que os elementos que compõem a periferia (criatividade e
dedicação) remetem à preocupação dos professores em estarem preparados para
atender às necessidades da escola, fortemente determinadas pela “clientela” e pelas
exigências da própria escola. Essa preocupação é expressa na identificação de dois
fatores: o excelente nível cultural dos alunos e as exigências da própria escola,
conforme indicam as justificativas dos professores, apresentadas abaixo:
75
P. É fundamental estar preparado pedagogicamente para trabalhar
com as exigências educacionais da clientela em questão.
P. Muito estudo para atender a alunos questionadores, com
vivências diferenciadas e de bom nível cultural.
P. Estar sempre preparado de forma adequada para uma atuação
compatível com o nível da escola
A análise da relação do núcleo central com a periferia propriamente dita
mostra-nos a coerência entre os termos, ou seja, a ancoragem na constante busca
de respostas e soluções vivida por esses profissionais nas suas práticas docentes. A
importância que as professoras atribuem ao elemento desafio, este, concebido como
fruto de dedicação e criatividade diante do novo, traz à tona uma outra característica
do sistema periférico, descrita por Alves-Mazzotti (2002) no que diz respeito ao
funcionamento e dinâmica das representações. Trata-se da prescrição de
comportamento, orientando, assim, as tomadas de posições do grupo.
É nesta perspectiva que constatamos que os elementos dedicação e
criatividade orientam as condutas das professoras, favorecendo o enfrentamento dos
desafios, por meio da busca da competência. Para elas, mudanças efetivas só
ocorrerão nas suas práticas, se houver estudo e empenho.
Podemos observar que os termos que se apresentam na periferia dessa
representação remetem às competências que devem ser desenvolvidas para que o
desafio seja superado. Criatividade e dedicação são uma clara indicação de que o
desafio deve ser vencido pela profissionalização resultante da formação continuada
adequada. A análise indica que desafio em sentidos altamente valorizados, como
atualização, conhecimento e ética. No entanto, esses elementos apresentam uma
associação com desgaste e paciência (periferia), mas que não superam a força dos
aspectos positivos, pois professoras demonstraram vivenciar o magistério como uma
atividade que traz prazer. Porém, invariavelmente, nos discursos surge uma parcela
de sofrimento, quando surge a questão da legitimação do papel do professor e da
importância da educação.
Pesquisa realizada pela Fundação SM e pela Organização dos Estados Ibero-
americanos (OEI) em 2007, envolvendo 3500 professores de todo o Brasil, como foi
apontado anteriormente, denunciou a extensão do sentimento de desvalorização,
76
revelando que quase 80% dos professores pesquisados consideram que a
sociedade não os valoriza.
Em função dessa desvalorização generalizada do professor, os profissionais
da escola de elite salientam a necessidade de atualização e formação contínuas:
P. [..]e ainda ter tempo para estudar mais, pra se aprimorar mais , porque estar numa escola de elite também faz com que a gente esteja na elite da educação... (GF)
Tal informação está em consonância com o que diz Alves-Mazzotti (2002), ao
afirmar que para compreender melhor o funcionamento do núcleo central torna-se
necessário examiná-lo em uma dialética contínua com o sistema periférico, uma vez
que é ele que nos indica como os elementos do núcleo central se concretizam no
cotidiano. Sendo assim, o elemento dedicação, presente na periferia próxima,
expressa a sua importância na concretização da identidade docente, estabelecendo
uma relação próxima com desafio, surgido no núcleo central.
Considerando-se que os elementos do núcleo central exercem a função de
defesa da representação, caracterizando-se na parte dura da mesma, ou
seja, menos sensível a mudanças em função do contexto externo ou das práticas
dos sujeitos (MARQUES; OLIVEIRA; GOMES, 2004), observa-se nos resultados que
a identidade docente é fortemente marcada por aspectos positivos, identificados na
quase totalidade das palavras evocadas e das suas respectivas justificativas.
Também faz parte dessa pesquisa verificar o que significa para as
professoras participar da formação da elite. A partir desta expressão indutora-
participar da educação da elite- observou-se que as professoras refutavam a ideia
de que ser professor da elite diferenciasse da visão do ser professor , hoje.
Enfatizaram que um professor não pode fazer distinção de atuação docente em
função da realidade da escola em que trabalha. Este conceito foi refletido no
resultado advindo do termo indutor participar da educação da elite.
A partir do termo indutor participar da educação da elite, constatamos que os
elementos competência, desafio e responsabilidade constituem o núcleo central,
sendo os elementos periféricos próximos atualização e paciência. Localiza-se no
quadrante inferior direito compromisso, conflito, criatividade, futuro, privilégio,
reconhecimento, trabalhoso e ética e, no esquerdo, cobrança e perseverança, como
podemos observar na Tabela 2.
77
Tabela 2 – Participar da educação da elite
Observa-se a partir da análise das evocações que, tanto as que partiram do
termo indutor ser professor, hoje quanto do termo ser professor da elite, apresentam-
se fortemente marcadas por aspectos positivos, de comprometimento, identificados
na maioria dos termos evocados e suas justificativas. Não se observa uma
dissonância entre o que representa ser professor ou ser professor da elite, sendo
que as palavras que diferem no núcleo central- responsabilidade e compromisso-
tanto no seu aspecto morfológico quanto no campo semântico se confundem,
apontando que não há distinção clara ou conflito entre as representações, o que foi
confirmado nos grupos focais. O termo desafio aparece com quase o dobro das
evocações, mas ganha importância, especialmente, pelo sentido.
Novamente a palavra desafio destaca-se no núcleo central. As análises das
justificativas dessas palavras mostram a preocupação das professoras em se
mostrarem atualizadas diante dos novos conhecimentos. Elas reconhecem e
valorizam a importância da produção do conhecimento na escola da qual fazem
O.M.E. 2,0 2,0
Freq.
Méd.
Termo evocado Freq. O.M.E
.
Termo evocado Freq. O.M.
E.
11
competência
desafio
responsabilidade
5
13
5
1,600
1,615
1,200
atualização
paciência
6
5
2,833
2,200
11
cobrança
perseverança
2
2
1,500
1,500
compromisso
conflito
criatividade
futuro
privilégio
reconhecimento
trabalhoso
ética
3
2
2
2
2
2
2
2
2,000
2,000
2,000
2,500
2,500
2,000
2,000
2,000
78
parte, detectando possibilidades de mudanças e melhorias em suas práticas, como
apresenta Santos (2007, p. 52):
A construção do conhecimento em espaços coletivos está relacionada à capacidade do grupo em expor informações, ideias, concepções, explicitar as práticas coletivas, refletir sobre elas e reformulá-las.
Compartilhar o conhecimento torna-se um elemento estimulador e unificador
do grupo, favorecendo a integração de novos conhecimentos que se refletem na
prática desses profissionais, como pode ser observado nas justificativas que se
seguem:
P. [...] a questão [do compromisso] é acadêmica, a gente acaba se envolvendo no ambiente que existe no nosso colégio, quer dizer, uma procura, se forma em algo, a outra vai a um congresso, a outra vai... P. [...] como se fosse assim, uma epidemia, certo? Você vai tomando conta, vai contaminando ... porque a gente vai vendo que nosso compromisso interno é maior que o externo.
Uma das motivações para a constante atualização é o reconhecimento quanto
ao investimento que a escola realiza com seus profissionais, lhes conferindo, ainda,
uma noção de pertencimento que extrapola o grupo da escola para uma esfera
maior, como apresentam as falas:
P .[..]mas se você para pra pensar quais as condições que você tem, que você teria em outra escola que não essa?... Na outra escola que eu trabalhava era impossível estudar tanto quanto estudei nessa, que eu não tinha dinheiro mesmo para bancar esse estudo, então eu acho que trabalhar passa por esse, permeia esse compromisso, esse tipo de coisa. (GF) P [...] essa [escola] ela te dá a oportunidade de você ter [formação] parece que você tem um compromisso maior... porque você ganha mais, então eu acho que você tem obrigação de buscar essa informação continuamente, acho que você parar , estacionar ali, parece que você não ta merecendo aquele trabalho. (GF)
A necessidade de atender às novas demandas e adquirir saberes de outras
áreas para garantir conhecimentos que complementem sua atuação também faz com
que as profissionais busquem formação continuada:
79
P. [...] a gente vive num mundo muito, cada vez mais especializado, mundo
dos especialistas, então, as crianças que nós trabalhamos aqui têm acesso
a isso,... e você tem que ter competência pra saber pra onde vai: psicólogo,
vai para fono, vai pra psicopedagogo...(GF)
P. [...] a gente só se preocupava com o pedagógico, ...hoje você vai em
busca de cursos de psicologia, de fono, de... tem que abrir um leque muito
grande até para ter argumento pra chegar pra uma família ou para outro
profissional ...(GF)
P?- [...] você só tratava de livros, letras e cálculos. Hoje você lê lá os
psicólogos, as fontes, tudo para ter embasamento pra fazer essa troca [com
famílias e outros profissionais]. (GF)
Pudemos observar nos professores pesquisados o que a pesquisa realizada
na PUC-Rio em 2006, intitulada Processos de produção de qualidade de ensino:
escola, família e cultura, desenvolvida pelo SOCED –Grupo de Estudos em
Sociologia da Educação- coordenado pela professora Zaia Brandão denominou
“efeito escola“ e o “efeito professor” na produção da qualidade de ensino. O termo
“efeito professor” foi a constatação de que o corpo docente das escolas de elite
constitui uma das principais características que as tornam eficazes, com professores
capazes de coordenar os conteúdos curriculares, organizar e articular os
conhecimentos coerentemente. Esses professores davam assistência aos alunos e
tinham boas expectativas em relação ao desempenho dos mesmos. Porém, lidar
com classe dominante, preferencialmente detentora do capital econômico, surge
como preocupação, conforme revelam as justificativas da evocação desafio:
P. É desafiador trabalhar com um grupo que costuma dar ordens. P. É um desafio também participar da educação da elite uma vez que, muitas vezes a família não legitima o papel do professor e a importância da educação. P. É um grande desafio, pois, como já mencionei anteriormente, ser professor é se sentir desafiado todos os dias. O que torna um pouco mais difícil é que, com a elite, entra o fator “valor financeiro” , que acaba com valores e mexe com o emocional de todos que lidam com isso.
Muitas famílias acreditam que o dinheiro é, também, a solução imediata para
todos os problemas, tentando fazer uso do poder financeiro que elas detêm. Os
professores se ressentem da forma como, muitas vezes, as famílias se posicionam
diante dos profissionais e das próprias orientações da escola como instituição, em
uma relação que parece aos pais conferir-lhes poder de decisão e autoridade que
não lhes cabem, baseada em uma superioridade econômica, como ilustram as falas
das professoras:
80
P. Você percebe nitidamente a família que, mesmo ausente, consegue dar um apoio aos filhos e aquela que não tem condição nenhuma porque, por não ter tempo mesmo, ou porque delega pra escola essa obrigação: “Não, eu tô pagando por isso, então vocês têm que dar conta disso”. ... é trabalho ...intenso e diário, intenso e diário.(GF) P. [...] [o problema] é a criança olhar pra você e dizer “é porque meu pai vem aqui falar com o diretor porque você não deixou ter recreio”. P. [...] exatamente “ meu pai está pagando o seu salário”. (GF)
P. Você é [para as famílias] um reles professor. (GF)
Cabe ressaltar que a escolarização e socialização das classes dominantes
no Brasil difere de países avançados, onde se valoriza a alta cultura que prevê
domínio de conhecimentos científicos e obtenção de títulos em universidades de
grande prestígio. Os professores apontam “vivências diferenciadas e de bom nível
cultural” que se restringem a um bem cultural voltado para cinemas, eventos
esportivos, teatros e shows musicais. Referem-se a pouco investimento, com raras
exceções, quanto a frequentar locais que oferecem bens da alta cultura, como
pinturas, esculturas e outras obras de arte.
Bourdieu (1999) aponta a existência de mais de um tipo de elite, com suas
especificidades. As mais ricas em capital cultural têm a propensão de investir mais
na educação dos filhos, ao mesmo tempo em que investe em práticas culturais. As
elites em capital econômico dão preferência aos investimentos econômicos em
lugar dos culturais e educativos. Ao buscarem uma escola de elite de prestígio –
que vem a constituir um capital simbólico, as classes dominantes buscam adquirir
uma distinção, condição muito importante para essas famílias.
Os professores percebem, explícita ou implicitamente, características da
classe dominante em uma mobilização quanto a reforçar sua posição preponderante:
As classes dominantes constroem-se continuamente, mobilizam-se sem parar para manter sua reprodução ampliada, para assegurar sua existência cotidiana com vistas à preservação e à transmissão das posições dominantes para seus descendentes (PINÇON; PINÇON-CHARLOT, 2003, p. 102).
A transmissão da posição dominante implica perpetuar uma séria crise de
valores éticos, morais, políticos, sociais e ideológicos que aparece recorrente e
intensamente na fala dos professores. O termo “humanização” surgiu algumas vezes
nas falas dos pesquisados, em uma tentativa de nomear o trabalho a ser feito com
vistas a implantar e reforçar esses valores tão esgarçados:
81
P . Eu acho que tem que humanizar... (GF)
P . [...] talvez esse humanizar seja substituir valor. (GF)
P . [...] mas para mim, os valores de hoje em dia, os valores
da sociedade, tem que humanizar, passaria por isso [ a
evolução] também, pelos valores. (GF)
Podemos verificar nas falas dos professores uma visão negativa, que é
prevalente na classe média, com relação às elites políticas e econômicas. Os
constantes atos praticados por essas elites e que desafiam a ética e a moral,
especialmente os da classe política, têm forte componente na construção dessa
representação.
Outros aspectos relacionados ao grupo família aparecem como desafios a
serem enfrentados com muita competência e dedicação. Um deles é a ausência das
famílias, fator que os professores atribuem ao compromisso com o enriquecimento
ou manutenção de um status, levando a uma terceirização da maternagem, como
denunciam as falas retiradas dos grupos focais:
P. É um ponto em que todos os educadores têm que pensar com seriedade na família que ta delegando a outros, de repente nem só ao professor, de repente a avó, uma terceira pessoa, ta terceirizando, uma babá, ta terceirizando muita coisa que pertence à família, entendeu? P. Nós temos famílias que viajam demais e ficam muito [os filhos] por conta de uma empregada, uma tia de alguém da família que não tem uma rotina diária ... você fica com pena de ver aquela criança completamente perdida ... e você vê uma família mais perdida ainda porque o pai trabalha em São Paulo , tem mãe que trabalha em Paris ... uma criança que às vezes a avó vem de São Paulo pra ficar com o neto porque o pai ta na África e a mãe em Paris.
Ao terceirizarem uma atribuição historicamente de responsabilidade das
famílias, surgem novas questões apontadas pelos professores: um número
excessivo e, muitas vezes desnecessário, de profissionais de outras áreas para
resolverem situações da esfera educacional, e um “adoecimento” das crianças, que
pode ser real, pelas condições emocionais frágeis em que vivem algumas delas, ou
pela busca de uma solução mágica, o que leva os pais a procurarem uma patologia
82
que trará um remédio ilusório, fenômeno conhecido como “ritalinização das
crianças”, em referência ao medicamento ritalina, que se apresenta como um
sortilégio que solucionaria todos os problemas.
Os professores revelam sua indignação nas falas:
P. [...] não é só os valores, é o despreparo emocional , é o descuido,
é ...não são cuidadas. (GF)
P. É tudo junto, é perceber como essas crianças andam doentes,
tendo que tomar remédio, entendeu?(GF)
P. Fragilizadas.(GF)
P. [...] já se percebe lá no maternal e pensa [ a família] tendo que
correr a esses profissionais para pedir ajuda a esses profissionais ,
fono, psicopedagoga, é uma psicóloga, terapeuta familiar ... às
vezes o profissional de fora vem com um monte de coisas pra você
atuar em sala de aula que não são possíveis porque é outra
realidade, uma coisa é a realidade do consultório com eles, outra
coisa ...trabalham com 1, 2 , não sabem o que é trabalhar com 20
numa sala de aula.(GF)
Os professores percebem a necessidade de incorporarem conhecimentos de
outras áreas, motivando a constante atualização, claramente associada ao termo
competência, que aparece no núcleo central. Um dos aspectos que mais mobilizam
os professores na busca pela atualização dos conhecimentos está relacionado com
as novas tecnologias.
Embora não deva ser considerado um saber de outra área, pois as
tecnologias devem ser uma dimensão que compete ao professor gerenciar, este é
um ponto em que o desafio aparece com muita força. O professor denuncia sua
fragilidade, porém se vê com condições de enfrentar o obstáculo. Sabe que o aluno
domina as tecnologias com mais propriedade, mas encara com certa leveza a
dificuldade, mais uma vez um problema encarado como desafio.
Os professores não desconhecem o que revelam Neves e Duarte (2008, p. 777)
ao declararem que crianças e jovens nascidos após a popularização dos
computadores pessoais e a criação da internet, os chamados de “nativos digitais”,
compõem um segmento de usuários das tecnologias da informação e comunicação,
que além de fazerem uso das correntes das mesmas, antecipam o que está por vir,
83
sendo capazes de explorar de forma criativa e diversificada tudo o que essa
tecnologia pode oferecer. Porém, a esmagadora maioria dos professores devido à
geração a que pertencem, são consideradas em geral, como “imigrantes digitais”.
Assim, é preciso atualizar-se quanto às novas tecnologias, pois o aluno, por
nascer imerso nesse ambiente, domina com muita facilidade essas ferramentas,
como declararam os professores pesquisados:
P. Estas crianças ..., a informática já está dentro delas... e já começam a buscar outro ensino. (GF) P. [...] trabalhar mais a questão da informática que é... o aluno, o filho tem tudo de bom e do melhor porque ele faz isso em casa ... se você não ta preparado, não tem competência pra isso também é um outro desafio que o pai mostra o Google Earth pra ele, se eu nunca escutei falar do Google Earth eu vou ficar com cara de tacho,... trabalhe assim relevo, olha que o Google Earth é legal.(GF) P [...] se você nunca escutou falar, não tem acesso a isso, então eu acho que o desafio maior aqui é você... tem que ta na ponta da coisa da educação.(GF) P [...] a demanda é maior, eu digo, de cobrar isso de você,... cobrar essas novidades.(GF)
Novamente a força da pressão da família surge como um fator de peso:
P- Ele [ o pai] acha que tá pagando, que tá investindo, ele quer esse retorno, não é, quase imediato “ meu filho tem acesso, escola tem “, ...na verdade o desejo desse pai é que até na sala de aula tivesse uma tela com computador que a gente pudesse estar disponibilizando. (GF)
Desta forma, ao deterem conhecimentos cada vez mais especializados, o
diálogo com os pais ganha força, a força da profissionalização, pois os professores
são instados a utilizarem o seu próprio capital: o cultural, como podemos observar
nas falas:
P. Talvez o desafio aqui porque não sei se os pais cobram muito porque têm um acesso maior às informações do que no colégio de crianças em que os pais podem ser analfabetos...aqui você tem muitos pais com mestrados, doutorados...(GF) P. Então o pai chega e diz” não sei o que fazer, me diz o que fazer, eu dou tudo pra ele , me ensina o que eu devo fazer”.(GF)
As demonstrações de fragilidade como a relatada não são comuns por parte
dos pais. Na maioria das vezes, os professores se deparam com a situação de
superar um grande desafio que se estabelece: educar a elite significa enfrentar
pessoas que depositam sua autoridade no capital econômico, o qual, para muitas
84
famílias, é um elemento suficientemente capaz de colocar o professor e a própria
escola em uma posição de desprestígio. O professor recorre à responsabilidade,
termo do núcleo central, de formar os cidadãos que estarão à frente de importantes
cargos e com o poder de tornar a sociedade mais justa, conforme denunciam as
falas:
P. Uma enorme responsabilidade, uma vez que muitas das decisões futuras poderão estar nas mãos daqueles que hoje são meus alunos. É também uma forma de “interferir” nesse futuro (por assim dizer) de algum modo, com o objetivo claro de ajudá-los a exercer, da maneira mais plena possível, sua humanidade. Um projeto futuro posto em prática. (GF) P. Trabalhar com um grupo que provavelmente será parte da elite intelectual. (GF) P. É preciso ser muito consciente de que, muito possivelmente, esses alunos (elite) estarão à frente de cargos importantes que determinarão a construção de uma sociedade justa e viável para todos. (GF)
Os instrumentos utilizados nessa pesquisa sinalizaram que os professores se
sentem comprometidos e responsáveis por seus alunos, pela sociedade e por eles
próprios, por demonstrarem uma crença, um ideal de interferir na sociedade,
modificando valores incompatíveis com a formação humanística e solidária, ao
mesmo tempo buscando reforçar sua imagem social positiva. Essa é uma indicação
de que os professores dão importância ao papel que desempenham na construção
do caráter de seus alunos e temem que se perpetue uma forma de liderança na
sociedade com graves danos para todas as classes sociais, caso não haja uma
intervenção no processo em curso de formação dos cidadãos.
Quando comparamos os resultados das pesquisas na escola de elite e a
pesquisa Alves-Mazzotti et al (2007) sobre representações da identidade profissional
docente construídas por professores do de escolas públicas de Ensino Fundamental
do Rio de Janeiro na rede pública, observamos que o professor da escola pública
apontou como núcleo central um único elemento: dedicação, associado à vocação,
missão, dom, como algo intrínseco e quase naturalizado na profissão. É esse núcleo
que gera os sentidos e organiza as relações dos elementos constitutivos do sistema
periférico (amor, ter paciência, muita responsabilidade, aprendizagem, carinho,
alegria e esperança) remetendo a uma realidade idealizada, enfatizando o
socialmente desejável, coadunando-se com o sentido de dedicação. Na periferia
próxima, com forte tendência à centralidade, está o termo cansativo, e a análise
permitiu perceber que dedicação e cansativo, termos mais destacados nas
85
evocações, apresentam uma ambivalência entre os elementos constitutivos da
representação.
É a seguinte a tabela com resultados do teste de livre associação de idéias da
pesquisa realizada com professores das séries iniciais da rede municipal, a partir do
termo indutor ser professor, hoje.
Tabela 3 – Ser professor, hoje (escola municipal)
Essas características levam a pensar em uma representação
estável, fortemente arraigada na história e cultura deste grupo. Porém, a tendência à
centralidade do termo cansativo pode ser indício de mudanças.
Dedicação é um elemento de longa duração relacionado ao perfil do
professor, sendo um componente tradicionalmente atribuído à função docente. No
caso da rede pública, os resultados apontam para uma visão de magistério ligada à
doação e sofrimento e intimamente associada à desprofissionalização. Dedicação
também é parte da formação da representação dos professores da escola de elite,
porém diferencia-se essencialmente no sentido. É Abric (2003, p.41) quem
apresenta que o núcleo de uma representação é constituído por elementos
normativos (decorrentes do sistema de valores dos indivíduos e responsáveis pelas
tomadas de posição frente ao objeto), e elementos funcionais, “associados às
características descritivas e à inscrição do objeto nas práticas sociais”. Esses
elementos são acionados de forma diferenciada segundo a natureza do objeto, o
tipo de relação que o grupo mantém com o objeto e a finalidade da situação. Nesse
sentido, os elementos normativos e funcionais são acionados de forma bastante
Evocação F OME<2,7 Evocação f OME≤2,7
f> 25 Dedicação 35 2,143 Cansativo 27 2,741
7>F
<25
Dificuldades 22 1,727 Amor 20 2,800
Desafio 15 1,533 Ter paciência 17 3,294
Amigo 11 2,455 Muita responsabilidade 15 2,733
Gosta do que faz 9 1,778 Aprendizagem 11 2,818
Gratificante 9 1,889 Carinho 9 2,667
Vocação 9 2,333 Alegria 8 3,000
Luta 8 1,875 Esperança 8 3,750
Persistência 8 2,250
86
diferenciada, especialmente porque o professor da rede pública vincula sua
representação à desprofissionalização, o oposto ocorrendo com o profissional da
escola de elite.
87
5. DISCUSSÃO, CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES
Analisar a representação social de professores acerca da docência e, em
especial, dos professores de escolas de elite, exige uma profunda reflexão sobre o
sistema educacional brasileiro, em uma realidade que é determinada por um
conjunto de fatores que envolve várias instâncias da sociedade. A tensão que marca
a identidade do professor imbrica-se nas transformações que caracterizam a
sociedade contemporânea, exigindo cada vez maior compromisso e uma gama de
conhecimentos que se modificam em uma velocidade além da capacidade de
absorção imediata. O professor, que vive diariamente as inseguranças e as
contradições de nossa sociedade e assume a frente dos dramas sociais que advêm
dessas transformações, dificilmente escapa da “crise de identidade do magistério”
(CANDAU, 1997).
Ao compararmos as duas pesquisas envolvendo os professores da rede
pública e da escola de elite, encontramos dificuldades comuns, enfatizadas por
professores que se tornaram os sujeitos de ambos os estudos: a luta pela
manutenção do prestígio social, no caso do professor da escola particular de elite, e
as dificuldades para readquirir essa importância quando se trata do professor da
rede pública; o embate com famílias desestruturadas acarretando, em muitas
ocasiões, no abandono dos filhos, independentemente da condição econômica,
vendo-se os professores obrigados a assumirem funções consideradas da esfera
familiar, o que representa para muitos o esvaziamento da função docente. O desafio
de atualização constante, uma luta diária pela inserção em um universo novo,
assustador e exigente, tentando atender a uma demanda difícil de ser suprida,
atinge todos os professores.
Essa pesquisa buscou ampliar um olhar sobre a sociedade, as relações que a
organizam, e como o professor se insere neste universo, tentando identificar seus
limites e possibilidades.
Os resultados desta pesquisa mostram professoras com uma visão bastante
positiva do trabalho e da identidade docente, com a consciência de que as
mudanças sociais trouxeram novas demandas para famílias e escolas e que se
devem traçar, claramente, os limites dessa relação. Observa-se um grupo de
professores que não contemporiza com situações de exclusão e desigualdades, nem
as minimiza e que se percebe como elementos-chave para mudança, encarando
88
seus medos, fragilidades e inseguranças com a convicção de que dispõem de
recursos para superar esses sentimentos.
O termo desafio parece ter mais a ver com as exigências da escola, das
famílias e, muito fortemente, dos próprios professores. É uma constante busca pela
qualidade no trabalho docente, como indica a análise das justificativas, podendo-se,
neste caso, considerar que o grande desafio seria o investimento que deve ser feito
na formação contínua para instrumentalizar o professor. Dessa forma, ele estaria
preparado para lidar com as famílias, seus valores e, no caso da escola de elite, as
tentativas de se impor por meio de uma superioridade econômica. A visão que o
professor de elite tem das famílias tende a considerá-las responsáveis por uma série
de problemas sociais, como enfraquecimento de valores éticos e morais, em uma
visão hedonista de vida, permeada pelo consumismo desmedido e falta de
responsabilidade e compromisso. Tal visão compromete, de certa forma, a qualidade
das relações com as famílias, colocando-se os professores, muitas vezes em uma
posição defensiva em função da visão, apresentada anteriormente, sobre a
representação que os professores têm das elites políticas e econômicas.
Reconhecem a importância de se investir no diálogo e o impacto que a boa relação
professor/ aluno/ família pode provocar na aprendizagem, inclusive da própria família
como instituição.
Os professores sinalizaram que a tarefa de transmitir conhecimentos
atualizados e relevantes torna-se , muitas vezes , secundária diante da necessidade
da formação moral e ética, percebendo que a formação do cidadão é uma tarefa que
lhes cabe e à qual não se furtam. A mesma constatação foi percebida na pesquisa
realizada na rede pública, na qual os professores denunciaram a mesma situação,
vendo-se muitas vezes tendo que abrir mão de lecionar os conteúdos para oferecer
a formação deficitária que os alunos trazem e que é vista como fruto de um
abandono familiar e estatal.
O grupo mostrou-se , em sua maioria, aberto às novas demandas do seu
tempo, identificando um novo sujeito social em si e no aluno, buscando estratégias
para propiciar um ensino acadêmico de qualidade, mas também uma aposta em
uma formação menos competitiva e mais solidária.
São profissionais que se sentem comprometidos com a instituição pela
valorização que lhes é dada como reconhecimento pelos seus esforços. O
comprometimento se dá não só como forma de reconhecimento e retribuição, mas
89
também como percepção do atendimento a uma necessidade cada vez maior de
expandir seus conhecimentos, pois se sentem parte de uma elite profissional,
atestando que as condições de trabalho modificam a identidade.
Contribui para essa visão positiva acerca de sua atuação o fato de se verem
contaminados pelo prestígio que fazer parte da escola lhes confere. Pertencer a uma
escola com excelência acadêmica implica, no imaginário social, verbalizado
frequentemente pelos responsáveis, inclusive, que seus professores também são
portadores dessa excelência ou não fariam parte do corpo docente da escola. O
mesmo fato se dá com os professores que lecionam nos colégios de aplicação das
universidades, sendo detentores de significativo prestígio.
O fato de os professores se sentirem valorizados, prestigiados, não estarem
expostos às condições de desprofissionalização, como objetivação do trabalho e
precarização de sua atuação não significa que não estejam sujeitos a uma grande
pressão. A diferença é que se sentem em condições de suportá-la em função da
segurança que as condições de trabalho lhes garantem. O fato de se sentirem parte
de uma equipe aumenta a percepção de que existe na escola uma atuação
pedagógica coletiva, ou seja, um sentimento coletivo de responsabilização pelo
aprendizado do aluno, colaborando eficazmente para o aprendizado. (FRANCO;
BONAMINO, 2005).
Essa pesquisa é réplica do trabalho de Alves-Mazzotti et al (2007) realizado
em escola pública que apresenta sentidos indicativos de desprofissionalização da
identidade do professor, além de outros sentidos negativos relacionados ao trabalho
docente. Diferentemente, este estudo realizado em escola de elite aponta a
profissionalização, o bom desempenho como o sentido da docência. Tais diferenças
corroboram a proposição de Abric (2001, p. 156), segundo a qual as representações
devem ser vistas “como uma condição das práticas e as práticas como um agente de
transformação das representações”.
As recomendações quanto ao aspecto geral vão ao encontro de
procedimentos já adotados pela instituição pesquisada, que tem forte política de
formação continuada, abrangendo diversas dimensões do conhecimento que hoje
são gerenciadas pelos professores, como as relacionais, sociais, de áreas de
conhecimento afins e de conhecimento específico, proporcionando oportunidades
frequentes de trocas, o que valoriza e fortalece o grupo. São essas práticas
que permitem o conhecimento das estratégias inovadoras do âmbito da prática dos
90
professores e das escolas, facilitando a compreensão dos sujeitos que as compõem:
professores e alunos.
Os professores sinalizaram que consideram as pesquisas importantes
indicadores da qualidade do seu trabalho e veem em seus resultados possibilidades
de melhoria e estabelecimento de novas práticas. Portanto é importante que esse
instrumento seja realizado com constância, o que mostra, também, uma avaliação
positiva e aproximação favorável com a academia.
Ficou claro que o conhecimento fortalece a base relacional com as famílias e
que se deve continuar apostando na prática da escola de propiciar viagens de lazer
aprofundamento cultural, acesso à vasta bibliografia tanto técnica como literária,
além de estimular a presença em eventos culturais.
É fundamental garantir o acesso às novas tecnologias, promovendo a integração
com o profissional da área, de forma que, efetivamente, o professor, ao se sentir
fortalecido e amparado, naturalize essa prática, tornando-a cotidiana.
Destacamos como uma ação de grande importância apontada por essa pesquisa
o posicionamento claro e firme da escola nas relações da instituição com as famílias,
estabelecendo limites de atuação definidos, fortalecendo, dessa forma, o professor,
a própria escola e as famílias. Embora não encarem as famílias como um obstáculo
à formação de uma identidade positiva acerca do magistério, sem dúvida são elas
quem constituem hoje, por todos os motivos expostos anteriormente, um grande
desafio que tem exigido dos professores da escola de elite uma imensa dedicação e
criatividade.
O investimento na profissionalidade dos professores é a ação apontada por essa
pesquisa como sendo a de maior importância para a manutenção e fortalecimento
de uma identidade docente positiva, que traz como retribuição por parte dos
professores um investimento cada vez maior na profissionalidade. Nessa medida, é
necessária uma profunda reflexão sobre os discursos oficiais e políticas públicas que
apontam para soluções imediatistas - como aquelas que visam à mera inclusão
digital dos docentes como uma panacéia que, instantaneamente, sane os dilemas e
conflitos pelos quais passa o professor da rede pública atualmente. Em lugar de
apontar para uma recuperação do prestígio e honra antes desfrutados, tais soluções
podem até mesmo reforçar preconceitos e estereótipos em relação aos docentes,
uma vez que sugerem que a excelência profissional está, necessariamente, atrelada
a meros paliativos que camuflam as reais e precárias condições de trabalho às
91
quais estes docentes estão submetidos. As possibilidades de discussão nas esferas
adequadas, de efetivas soluções para recuperar o exercício da docência em sua
forma plena e eficiente para a sociedade ficam cada vez mais distantes,
O que se conclui, após a realização deste trabalho, é que todo docente
submetido às mesmas condições de valorização, reconhecimento e aprimoramento
profissional, tende a realizar um trabalho de excelência, como era tradição há
algumas décadas. Os professores do quadro de docentes da escola de elite e da
rede pública pertencem a um único grupo, com falhas e deficiências comuns em sua
formação, receios, anseios e ideais semelhantes, que só poderão ser alcançados
quando todos estiverem, independentemente de uma remuneração à altura de sua
importância social, no caminho da profissionalização.
92
REFERÊNCIAS
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106
ANEXO I
Roteiro de Entrevista
nº…..
Entrevistador ----------------------- Data -----------------------
Caro(a) professor(a):
Este questionário é parte da pesquisa sobre Identidade Docente, cujo
tema é “Representações Sociais da identidade profissional docente de
professores das séries iniciais”, réplica da realizada na rede pública de
ensino, sob orientação da Drª Alda Judith Alves-Mazzottil. Suas respostas
são muito importantes para que possamos oferecer um panorama realista
sobre esse tema, tão relevante para o País. Obrigada por sua
colaboração!
1ª parte: Caracterização do respondente 1) Instituição de ensino em que trabalha -------------------------------------------------------- 2) Idade: 20 a 25 ( ) 26 a 35 ( ) 36 a 45 ( ) 46 a 55 ( ) 56 a 70 anos ( ) 3) Sexo: Masculino ( ) Feminino ( ) 4) Formação:
( ) Curso Normal Médio
( ) Curso Normal Superior
( ) Curso de Pedagogia
( ) Mestrado
( ) Doutorado
6) Tempo de atuação no magistério:
5 anos ( ) 6 a 10 anos ( ) 11 a 15 anos ( ) 15 a 20 anos ( )
21 a 25 anos ( ) ) Mais de 25 anos: ---------anos
107
2ª parte: Associação de palavras:
1. Escreva as três primeiras palavras que lhe vêm à cabeça ao ouvir a expressão:
SER PROFESSOR, HOJE.
___________________________________________ ( )
____________________________________________ ( )
____________________________________________ ( )
a) Numere as palavras escritas acima por ordem de
importância, da mais importante para a menos importante
utilizando a escala de 1a 3.
b) Justifique as escolhas feitas (se precisar de mais espaço, use o verso da folha):
Justificativa da primeira escolha: ______________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
Justificativa da segunda escolha: ______________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
Justificativa da terceira escolha: _______________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
2. Escreva as três primeiras palavras que lhe vêm à cabeça ao ouvir a expressão
PERTICIPAR DA EDUCAÇÃO DA ELITE
_____________________________________________ ( )
_____________________________________________ ( )
_____________________________________________ ( )
108
a) Numere as palavras escritas acima por ordem de importância, da mais
importante para a menos importante utilizando a escala de 1a 3.
b) Justifique as escolhas feitas (se precisar de mais espaço, use o verso da folha):
Justificativa da primeira escolha: ______________________________________
_________________________________________________________________
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Justificativa da segunda escolha: ______________________________________
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Justificativa da terceira escolha: _______________________________________
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109
ANEXO II
Foto
Vista aérea
Fachada
Fachada Ginásio Poliesportivo
110
Parque aquático com um das piscinas aquecidas
Biblioteca
Enfermaria
111
Sala de aula do Ensino Médio
Sala de aula da Educação Infantil
aquecidas
Ginásio Poliesportivo