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Educação para o Patrimônio Cultural Educação Patrimonial Sérgio Linhares

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Educação  para  o  Patrimônio  Cultural  Educação  Patrimonial    Sérgio  Linhares  

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Conceitos  da  área  do  Patrimônio  Cultural    

O   conceito   de   cultura   é   algo   intangível   e   complexo.   Denys   Cuche,   em  A  Noção   de  Cultura   nas   Ciências   Sociais   (2002),   e   Raymond   Williams,   em   Palavras   Chaves:   um  vocabulário   de   cultura   e   sociedade   (2007),   afirmam   que   nos   séculos   XVIII   e   XIX   o   termo  “cultura”  se  consolidou  nos  meios  intelectuais  e  artísticos.  

A   evolução   do   significado   de   cultura   levou   à   formação   das   duas   concepções   de  cultura  que  estão  na  base  dos  estudos  das  Ciências  Sociais:  

• Particularista:     Cultura  como  um  conjunto  de  conquistas  artísticas,  intelectuais  e  morais  

• Universalista:     Conjunto   de   conhecimentos,   crenças,   costumes   e   outras   capacidades   e   hábitos  adquiridos  pelo  homem  enquanto  membro  de  uma  sociedade.  (Tylor,  1871)  

  O  estudo  da  cultura  pelas  Ciências  Sociais   levou  à   formação  do  conceito  de  cultura  popular,   muito   utilizado   na   área   do   patrimônio   cultural   imaterial.   Apresentamos   duas  definições  clássicas  de  cultura  popular:  

“O  ‘popular’  não  está  contido  em  conjuntos  de  elementos  que  bastaria   identificar,   repertoriar   e   descrever.   Ele   qualifica,   antes   de  mais   nada,   um   tipo   de   relação,   um   modo   de   utilizar   objetos   ou  normas   que   circulam   na   sociedade,   mas   que   são   recebidos,  compreendidos   e   manipulados   de   diversas   maneiras.”   (Roger  Chartier)  

“É  a  cultura  comum  de  pessoas  comuns,  isto  é,  uma  cultura  que  se   fabrica   no   cotidiano,   nas   atividades   ao   mesmo   tempo   banais   e  renovadas  de  cada  dia.”(Michel  De  Certeau)  

  Nesse   contexto   do   desenvolvimento   da   noção   de   cultura   surge   o   conceito   de  patrimônio  histórico  e  artístico,  que  foi  empregado  para  definir  o  que  teria  valor  suficiente  para  ser  preservado  pelas  sociedades.  

  O   hábito   de   guardar   objetos   que   contenham   algum   significado   afetivo,   como  documentos,   cartas,   fotografias   e   uma   infinidade   de   pequenas   lembranças   sob   os   mais  variados   formatos,   é   comum   desde   que   o   homem   se   organizou   em   sociedade.   Nos   dias  atuais,   apesar   de   todo   o   desenvolvimento   tecnológico   advindo   da   área   da   informática,  continuamos  a  reunir  informações  que  nos  são  caras,  agora  em  arquivos  digitais,  registrados  em  CDs,  DVDs,  na  “nuvem”  e  outros  meios  magnéticos.  Se,  particularmente,  os   indivíduos  assim  procedem,  em  coletividade  passarão  por  processo  semelhante.    Assim,  é  usual  as    

 

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sociedades  preservarem  os  testemunhos  de  sua  história  e  de  sua  cultura.  O  resultado  dessa  preservação  compõe  o  que  chamamos,  atualmente,  de  Patrimônio  Cultural.  

O  Patrimônio  Cultural  consiste  de  tudo  o  que  a  sociedade  preserva  com  o  objetivo  de  garantir  a  sobrevivência  de  sua  história  e  de  sua  cultura,  como  o  patrimônio  arquitetônico  -­‐  palácios,   igrejas,  museus,  monumentos,   casarios;   a  produção   intelectual   -­‐   artes   plásticas,  literatura,  música,  cinema,   fotografia;  os  bens  naturais   -­‐   rios,  montanhas,   florestas,  praias,  lagoas,   dunas,   costões;   os   bens   imateriais   -­‐   costumes,   tradições,   folclore   e   ritos   dos  diferentes  grupos  que  integram  a  sociedade.  

“O   conceito   de   Patrimônio   Cultural,   tradicionalmente,   nos  remete   ao   passado   histórico   esquecendo   que   a   produção   presente  constituirá  a  herança  das  futuras  gerações.  É  importante  reconhecer  o  caráter   de   continuidade   dessa   produção   dentro   do   processo   de  desenvolvimento  humano  como  algo  vivo  e  integrado  à  realidade.  

A   crescente   preocupação   com   a   proteção   dos   ‘patrimônios  culturais’   reflete   o   desejo   de   se   valorizar   as  memórias   coletivas,   que  não   devem   ser   entendidas   como   uma   nostalgia   do   passado   ou   uma  recusa  em  viver  o  nosso  tempo.”  (Ferraz,  2008)  

Essa  nova  visão  de  Patrimônio  Cultural  leva  em  consideração  a  heterogeneidade  e  a  complexidade  da  cultura  brasileira,  não  mais  privilegiando  os  bens  culturais  representativos  das  elites  sociais.  Leva-­‐se  em  conta  também  as  formas  de  manifestação  cultural  de  todos  os  níveis  sociais,  de  todas  as  regiões  do  país,  de  todos  os  grupos  regionais  ou  étnicos.  

Esse   conceito   é   bem   definido   pela   Constituição   da   República   Federativa   do   Brasil,  promulgada  em  1988,  em  seu  Artigo  216:  

“Art.  216  -­‐  Constituem  patrimônio  cultural  brasileiro  os  bens  de  natureza  material  e  imaterial,  tomados  individualmente  ou  em  conjunto,  portadores  de  referência  à  identidade,  à  ação,  à  memória  dos  diferentes  grupos   formadores  da  sociedade  brasileira,  nos  quais  se  incluem:    

I  -­‐  as  formas  de  expressão;  

II  -­‐  os  modos  de  criar,  fazer  e  viver;  

III  -­‐  as  criações  científicas,  artísticas  e  tecnológicas;  

IV   -­‐   as   obras,   objetos,   documentos,   edificações   e   demais   espaços   destinados   às  manifestações  artístico-­‐culturais;  

V   -­‐   os   conjuntos   urbanos   e   sítios   de   valor   histórico,   paisagístico,   artístico,  arqueológico,  

   

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         §   1º   -­‐   O   Poder   Público,   com   a   colaboração   da   comunidade,   promoverá   e   protegerá   o  

patrimônio  cultural  brasileiro,  por  meio  de   inventários,   registros,  vigilância,   tombamento  e  desapropriação,  e  de  outras  formas  de  acautelamento  e  preservação.  [...]”  

    Se  uma  sociedade  preocupa-­‐se  em  preservar  aquilo  que  lhe  é  caro,  é  necessário  criar  mecanismos  para  que  isso  ocorra.  

 

Mas,  por  que  preservar?  

A  preservação  é  a  única  forma  de  se  manter  a  identidade  cultural  de  um  povo.    Cabe  à  sociedade  se  mobilizar  para  que  sejam  elaboradas  políticas  públicas  que  visem  valorizar  as  singularidades  e  a  diversidade  da  cultura  brasileira.  

 

Como  preservar?  

Investindo   em   ações,   como   Educação   Patrimonial;   investindo   em   Proteção   Legal,  como   o   Tombamento,   Áreas   de   Proteção   Cultural,   Corredores   Culturais,   Inventariação;  Arquivo   e   documentação;   Conservação   e   restauração   e   Catalogação   e   Registro   das  manifestações  culturais.  

Diante  dessa  temática,  as  mais  efetivas  formas  de  preservação,  são:  

• Tratando-­‐se  do  patrimônio  material,  ou  tangível:  o  Tombamento  e  o  Inventário;    • No  caso  do  patrimônio  imaterial,  ou  intangível:  o  Registro  

 

O  que  é  tombamento?  

É  uma  ação  legal,  um  instrumento  jurídico,  de  responsabilidade  do  Poder  Executivo,  que   se  aplica  aos  bens  móveis  e   imóveis,   edificados  ou  naturais.  O   tombamento  pode   ser  realizado  nas  esferas  federal,  estadual  ou  municipal.  Um  bem  cultural  pode,  em  função  de  sua   importância,   ser   tombado   nas   três   esferas,   como,   por   exemplo,   o   Copacabana   Palace  Hotel.  

É   importante   ressaltar   que,   embora   o   Tombamento   seja   um   procedimento  importantíssimo  de  preservação,  por  si  só  não  é  suficiente  para  assegurar  a   integridade  de  um  bem  cultural.  Para  isso,  é  fundamental  que  a  sociedade  desenvolva  uma  consciência  de  preservação   de   sua  memória.   É   essencial   o   investimento   na   Educação   para   o   Patrimônio  Cultural,   com   a   participação   de   professores,   alunos,   servidores   e,   posteriormente,   seu  desdobramento  para  toda  a  comunidade.      

 

   

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O  que  é  Inventário  ?  

O   inventário   consiste   na   identificação   e   registro   por   meio   de   pesquisa   e  levantamento   das   características   e   particularidades   de   um   determinado   bem.   Na   sua  elaboração  são  adotados  critérios  técnicos  objetivos  e  fundamentados  de  natureza  histórica,  artística,  arquitetônica,  sociológica,  paisagística  e  antropológica,  entre  outros.  Os  resultados  dos   trabalhos  de  pesquisa  para   fins  de   inventário  devem  ser   registrados  em   fichas,   com  a  descrição   do   bem   cultural,   informações   básicas   quanto   à   sua   importância,   histórico,  características  físicas,  delimitação,  estado  de  conservação,  proprietário  e  outros  de  interesse  para  o  pesquisador.    

O  inventário  permite  à  sociedade,  independentemente  do  poder  público,  registrar  os  bens  que  considere  importantes  para  sua  história  e  sua  cultura.  

 

O  que  é  o  Registro?  

Segundo  o   Iphan,   “[...]   corresponde   à   identificação   e   à   produção  de   conhecimento  sobre   o   bem   cultural.   Isso   significa   documentar,   pelos  meios   técnicos  mais   adequados,   o  Patrimônio   Imaterial   no   Brasil:   legislação   e   políticas   estaduais   passado   e   o   presente   da  manifestação  e  suas  diferentes  versões,  tornando  essas  informações  amplamente  acessíveis  ao  público  –  mediante  a  utilização  dos  recursos  proporcionados  pelas  novas  tecnologias  de  informação.”  (Iphan,  2006b,  p.  22).  

 

   

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Patrimônio  reconhecido  e  a  ação  dos  órgãos  de  Patrimônio  Cultural  

 

O  conceito  de  patrimônio  cultural  aqui  apresentado  é  complexo  e  nos  faz  pensar  em  uma  construção  social  cujo  significado  depende  do  contexto  histórico,  de  quem  a  emprega  e  com  que  finalidade  a  usa.  Portanto,  “patrimônio,  utilizando  a  expressão  de  Pierre  Bourdieu  (1999),  é  esse  capital  simbólico  que  tem  vínculos  com  a  identidade  e  que  deve  ser  protegido  não  tanto  por  seus  valores  estéticos  e  de  antiguidade,  como  pelo  que  significa  e  representa”.  (Zanirato,  2011)  

A   “[...]   preocupação   em   salvaguardar   o   que   se   denomina   patrimônio   [cultural]   é  condição   essencial   para   a  manutenção   do   sentimento   de   enraizamento   do   sujeito   com   o  espaço  que  habita,  para  a  configuração  de  suas  identidades”.  (Zanirato,  2011)    

O   Instituto  do  Patrimônio  Histórico  e  Artístico  Nacional  –   Iphan  foi  criado  em  13  de  janeiro  de  1937  pela   Lei   nº   378,   no   governo  de  Getúlio  Vargas,   como  Sphan  –   Serviço  do  Patrimônio   Histórico   e   Artístico   Nacional.   Rodrigo   Melo   Franco   de   Andrade   implantou   o  Serviço  do  Patrimônio  e  permaneceu  como  diretor  até  1967.  Em  30  de  novembro  de  1937,  foi   publicado   o   Decreto-­‐Lei   nº   25,   que   organiza   a   “proteção   do   patrimônio   histórico   e  artístico  nacional”.  Com  estes  instrumentos  inicia-­‐se,  efetivamente,  a  luta  pela  preservação  do  patrimônio  cultural  no  Brasil  e,  ao  mesmo  tempo,  começa  a  se  definir  o  que  é  realmente  importante  e  o  que  vai  ser  protegido.  

  Segundo   Márcia   Chuva   (2010)   “Nesse   percurso   de   construção,   há   diferentes  concepções  de  patrimônio  em   jogo   [...],   até   a   estabilização  de  nichos  e   a   consolidação  de  visões  hegemônicas  [...].”  Nesse  momento  enfocado  por  Chuva,  é  preciso  destacar,  há  uma  preocupação   social,   cultural   e   política,   em   formar   uma   identidade   nacional,   além   de   se  conhecer  e  preservar  a  cultura  brasileira.         O   Sphan   implantou   uma   política   de   preservação   dominada   por   arquitetos,   na   qual  predominou  a  preservação  dos  grandes  monumentos  (catedrais,  palácios,  alguns  conjuntos  expressivos,  etc...),  sobretudo  de  origem  colonial.  Essa  passou  a  ser  a  tendência  hegemônica.  A  “arte  popular”,  não  integrada  a  essa  concepção  de  patrimônio,  “[...]  não  foi  incorporada  às  práticas   de   proteção   nem   ao   rol   de   bens   culturais   passíveis   de   se   tornarem   patrimônio”.  (Chuva,  2010)         Em  1963,  foi  criada  no  antigo  Estado  da  Guanabara  a  Divisão  do  Patrimônio  Histórico  e   Artístico   (DPHA),   regulamentada   em   1964.   Este   foi   o   primeiro   órgão   de   proteção   do  patrimônio  cultural  em  nível  estadual.  Seus  primeiros  tombamentos  são  de  1965  e  denotam  uma   nova   preocupação,   principalmente   com   uma   arquitetura   que,   até   então,   era  desprezada:  o  estilo  eclético.  Em  1975,  com  a  fusão  do  antigo  Estado  do  Rio  de  Janeiro  e  o      

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         Estado  da  Guanabara,  imposta  à  população,  criou-­‐se  o  novo  Estado  do  Rio  de  Janeiro.  Com  isso  a  DPHA  foi  transformada  no  Instituto  Estadual  do  Patrimônio  Cultural  (Inepac).         As  décadas  de  1960  e  1970  foram  ricas  em  mudanças.  O  próprio  termo  “patrimônio  cultural”   é   um   conceito   mais   abrangente   do   que   o   antigo   “histórico   e   artístico”,   e   mais  adequado  às  mudanças  consolidadas  com  a  Carta  de  Veneza  de  19641.         Iniciou-­‐se  uma  política  de  descentralização  dos  trabalhos  de  preservação  no  Brasil.  O  governo   federal,   por   sugestão   do   Ministro   da   Educação   e   Cultura,   Jarbas   Passarinho,  organizou  o  1º  e  o  2º  encontros  dos  Governadores,  em  Brasília  e  Salvador,  nos  anos  de  1970  e  1971,  respectivamente.  

Segundo   Lia  Motta, “[...]   foi   no   documento   editado   pelo  Ministério   da   Educação   e  Cultura,   em   1975,   denominado   Política   Nacional   de   Cultura,   que   a   noção   de   pluralismo  cultural  associada  à  diversidade  regional  surge  como  indicativo  de  uma  ação  oficial  do  poder  público”.  (Motta,  2000)

  A   legislação   brasileira   permite   que   qualquer   cidadão   entre   com   um   pedido   de  tombamento   em   um   órgão   de   proteção   do   patrimônio   cultural.   Portanto,   a   tomada   de  consciência   da   população   é   a   única   forma   de   romper   com   a   prática   adotada   pelas  instituições  públicas  de  reconhecer  como  bem  cultural,  seja  material  ou  imaterial,  somente  os  elementos  da  cultura  de  uma  elite   intelectualmente  dominante.  Os   instrumentos   legais  existem.  O  reconhecimento  do  nosso  pluralismo  cultural  e  da  imensa  diversidade  regional,  é  o  que  nos  permite   ver  o   “Boi  Bumbá”,  de  Parintins,  o   “Bumba  meu  Boi”,  do  Maranhão,   a  “Lavagem  da  Escadaria  do  Nosso  Senhor  do  Bonfim”,  em  Salvador,  o  “Círio  de  Nazaré”,  em  Belém,  o  “Fandango  Galponeiro”,  do  Rio  Grande  do  Sul,  não  como  acontecimentos  exóticos,  mas  sim  como  parte  da  nossa  cultura.  

  A   Constituição   de   1988,   em   seu   Artigo   216,   Inciso   V,   Parágrafo   1º,   diz:   “O   poder  público,   com  a   colaboração  da   comunidade,   promoverá   e  protegerá  o  patrimônio   cultural  brasileiro,  por  meio  de  inventários,  registros,  vigilância,  tombamento  e  desapropriação,  e  de  outras   formas   de   acautelamento   e   preservação.”   Esta   prerrogativa   que   os   legisladores  garantiram  ao  cidadão  permitiu  que  as  comunidades,  em  qualquer  lugar  do  país,  passassem  a  pleitear  o   reconhecimento  do   seu  patrimônio  cultural   tanto  quanto  um  monumento  em  Brasília,  São  Paulo  ou  Rio  de  Janeiro,  reconhecidos  internacionalmente.  

  O  Círio  de  Nossa   Senhora  de  Nazaré,  o   Jongo  do  Sudeste,  o  Modo  de   Fazer  Renda  Irlandesa,  o  Ofício  dos  Mestres  de  Capoeira,  o  Ritual  Yaokwa,  o    Ritxòkò  -­‐  expressão  artística  e  cosmológica  do  povo  Karajá  são  exemplos  de  bens  culturais  imateriais,  reconhecidos  pelo  Iphan.   Isso   só   foi   possível   porque   as   comunidades   lutaram   pelo   seu   reconhecimento   e   a  sociedade  brasileira  ligada  à  área  da  cultura,  conseguiu  a  aprovação  do  Decreto  nº  3.551,  de    

                                                                                                                         1Carta  Internacional  sobre  conservação  e  restauração  de  monumentos  e  sítios,  1964.  Disponível  em  http://portal.iphan.gov.br/portal/baixaFcdAnexo.do?id=236  (consultado  em  13  de  agosto  de  2013)

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04/08/2000,  que   instituiu   o   Registro   de   Bens   Culturais   de   Natureza   Imaterial   e   criou   o  Programa  Nacional   do   Patrimônio   Imaterial   (PNPI)     e  consolidou   o   Inventário   Nacional   de  Referências  Culturais  (INCR).  

  Todas  essas  manifestações  fazem  parte  da  memória  do  povo,  expressas  na  forma  de  patrimônio   cultural,   seja   material   ou   imaterial.   Portanto,   para   uma   comunidade   de   um  determinado  local  não  há  diferença  entre  o  valor  do  Theatro  Municipal  do  Rio  de  Janeiro  e  o  coreto  ali  da  pracinha,  que  é  “testemunha”  de  múltiplas   festas  alegradas  pela  banda   local,  de  inúmeros  namoros  e  brincadeiras  e  tantas  outras  lembranças.    

A  memória  coletiva   local  é  tão  ou  mais   importante  que  a  memória  nacional.  Para  o  historiador  francês  Pierre  Nora  a  cultura  popular,  a  história  da  vida  familiar  e  a  religiosidade  são  elementos  importantes  na  construção  social  da  memória.  Assim,  é  fundamental  que  as  comunidades  valorizem  o  seu  patrimônio  cultural,  pois  o  significado  de  qualquer  elemento  cultural  local  é  dado  por  elas.     Aqui,   já   vimos   que  o   Tombamento,   ou   o   Registro,   são   instrumentos   legais,   porém,  cabendo  aos  órgãos  de  patrimônio  dar  o   aprovo,   ou  não,   para   cada  pedido   solicitado  aos  órgãos.  

No   entanto,   esta   não   é   a   questão   mais   importante.   Quem   dá   o   devido   grau   de  importância   ao   bem   cultural   é   a   comunidade.   Pouco   importa,   do   ponto   de   vista   do  significado,  se  ele  é  tombado  ou  registrado.  Deve-­‐se  sim,  reconhecida  a  importância  de  um  bem  cultural,   preservá-­‐lo   de   todas   as   formas  possíveis,   cultivando  o   amor  por   ele   junto   à  comunidade,   e   também   fazendo   um   inventário   para   que   todas   as   suas   características  estejam  ali   cadastradas,   seja  ele  material  ou   imaterial.  Não  há  mais   lugar  para  aceitarmos  que  “alguém”  diga,  tecnicamente,  se  um  bem  cultural  de  um  determinado  grupo  tem  valor  ou   não.   Esses   certificados   documentais   são   importantes,   mas   não   são   somente   eles   que  determinam  a  relevância  de  um  bem  cultural.  

Vale  ressaltar  que  um  bem  tombado,  em  função  de  condições  especiais,  embora  seja  muito  raro,  pode  ser  destombado.  

“Quando   um   grupo   social   considera   realmente   um   bem   cultural   como   seu,   como  parte  integrante  de  sua  vida  e  de  sua  história,  com  toda  a  certeza  esse  bem  terá  alcançado  a  condição   necessária   para   assegurar   sua   preservação   e   usufruto   das   futuras   gerações”.  (Campos,  2008)  

 

   

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Educação  Patrimonial  ou  Educação  para  o  Patrimônio  Cultural  

 

O  que  é  Educação  Patrimonial?  

 

É   um   processo   permanente   e   sistemático   de   trabalho  educacional  centrado  no  Patrimônio  Cultural  como  fonte  primária  de  conhecimento   e   enriquecimento   individual   e   coletivo.   A   partir   da  experiência   e   do   contato   direto   com  as   evidências   e  manifestações  da   cultura,   em   todos   os   seus   múltiplos   aspectos,   sentidos   e  significados,   o   trabalho   da   Educação   Patrimonial   busca   levar   as  crianças  e  adultos  a  um  processo  ativo  de  conhecimento,  apropriação  e   valorização   de   sua   herança   cultural,   capacitando-­‐os   para   um  melhor  usufruto  destes  bens,  e  propiciando  a  geração  e  a  produção  de  novos  conhecimentos,  num  processo  contínuo  de  criação  cultural.    

 

Horta,  Maria  de  Lourdes  Parreiras.  e  outros.  Guia  Básico  de  Educação  Patrimonial.  Brasília:  IPHAN,  1999.  

 

A   Educação   Patrimonial,   ou   Educação   para   o   Patrimônio   Cultural,   visa   desenvolver  um   conhecimento   crítico   que   possibilite   às   comunidades   se   apropriarem   do   patrimônio  cultural   que   lhes   pertence.   Dessa   forma,   é   possível   vislumbrar   a   possibilidade   de  fortalecimento  dos  sentimentos  de  identidade  e  cidadania,  assim  como  a  construção  de  um  processo  de  preservação  sustentável  desses  bens  culturais.  

  O   termo   Educação   Patrimonial,   já   consagrado,   também   pode   ser   substituído   por  Educação  para  o  Patrimônio  Cultural.  Esta  pequena  alteração  visa  a  reforçar  a  compreensão  e  a  assimilação  do  conceito  de  patrimônio  cultural.    

  A  Educação  Patrimonial,   é  bom  que   se  esclareça,  não  pode   ficar   restrita  ao  espaço  escolar.   Ela   se   dá   em   vários   espaços.   Quando   desenvolvida   em   escolas,   museus,   sítios  arqueológicos,  centros  culturais  e  outros  espaços  supervisionados,  ela  será  um  instrumento  pedagógico  calcado  em  uma  metodologia  de  trabalho.  No  entanto,  não  se  pode  esperar  que  algo  tão  importante  para  a  formação  da  cidadania,  que  é  tomar  consciência  dos  seus  valores  culturais,   fique   restrito   a   um   trabalho   sistemático.   Todos   podem   ser   agentes   educadores  nessa   área.   Todos   somos   agentes   de   nossa   própria   cultura,   portanto,   temos   a  responsabilidade   de   efetuar   um   trabalho   de   Educação   Patrimonial,   não   sistêmico,   mas  efetivo.  

   

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  Utilizando  uma  figura  muito  comum  na  cultura  popular  brasileira,  podemos  dizer  que  todo  garoto,  ao  chegar  em  casa,  vindo  da  maternidade,  já  tem  uma  bola  de  futebol  em  seu  berço,  embora  saibamos  que  não  seja  uma  verdade  absoluta.  Esta  é  uma  ação  de  Educação  Patrimonial.   Ao   observar   em   uma   banca   de   jornais   que,   praticamente   todas   capas   de  revistas   mostram   mulheres   brancas,   como   não   comentar   a   ausência   de   outras   etnias  representadas   ali?   Esse   comentário   é   uma   ação   de   Educação   Patrimonial.   Onde   está   a  diversidade  cultural  e  étnica,  tão  marcantes  em  nosso  país?    

O  patrimônio  cultural  do  Estado  do  Rio  de  Janeiro  é  riquíssimo.  E  este  aspecto  está  diretamente  relacionado  com  a  sua  história.  A  colonização  portuguesa  no  Brasil  foi  sempre  acompanhada  pelo  trabalho  efetivo  da   Igreja  Católica,  muitas  vezes  pioneira,  mas  também  predatória,  ocupando  territórios  antes  mesmo  da  chegada  de  colonos.  Promovia-­‐se  assim  a  catequese  indígena,  destruindo  a  cultura  nativa  e  consolidando  a  cultura  cristã  portuguesa.  Com   a   introdução   de   novos   processos   econômicos,   outro   elemento   foi   introduzido   neste  contexto:  o  africano,  trazido  para  o  Brasil  para  trabalhar  como  escravo.  

A  diversidade   cultural   se   ampliou   com  a   vinda  de  diversos   grupos  de   imigrantes,   a  partir   do   século   XIX.   O   resultado   disso   é   uma   cultura   diversificada.   No   entanto,   a  desigualdade   social   e   de   oportunidades   e   a   interferência   dos   meios   de   comunicação  aprofundaram   o   abismo   existente   entre   as   chamadas   “culturas   dominantes”   e   a   “cultura  popular”.  

“Ao  tentar  enfrentar  seu  problema  mais  urgente  –  a  desigualdade  social  –  o  país  vem  descobrindo  a  forte  influência  da  cultura  para  a  configuração  dessa  realidade,  bem  como  seu  potencial  de  transformação  social  do  cenário  atual”.  (Unesco)  

Falta  ainda  uma  abordagem  cultural  mais  profunda  com  relação  aos  povos  indígenas  e  aos  afrodescendentes.    

É   preciso   preservar   o   grande   acervo   cultural   salvaguardando   tradições   indígenas,  línguas  indígenas  ameaçadas  de  desaparecimento,  conhecimento  tradicional  indígena  sobre  a  natureza,  terras  indígenas,  a  cultura  africana  tão  presente  na  cultura  e  história  do  Brasil,  as  terras  quilombolas,  entre  outras  minorias.  

“Sobre  o  tempo,  sobre  a  taipa,  a  chuva  escorre.  As  paredes  que  viram  morrer  os  homens,  

que  viram  fugir  o  ouro,  que  viram  finar-­‐se  o  reino,  que  viram,  reviram,  viram,  

já  não  vêem.  Também  morrem.”    

A  história  esquecida  da  Vila  da  Estrela.    

Carlos  Drummond  de  Andrade  

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O   Inepac,   órgão   da   Secretaria   de   Cultura   do   Estado   do   Rio   de   Janeiro,   produziu   o  filme   “Cidades   Invisíveis”,   abordando   quatro   cidades   que   foram   importantes   centros   nos  períodos  colonial  e  imperial  e  hoje  são  ruínas.  Como  nada  foi  construído  sobre  elas,  estando  totalmente   abandonadas,   transformaram-­‐se   em   cidades   invisíveis.   Uma   delas   é   a   Vila   de  Estrela,  importante  porto  comercial,  no  Caminho  do  Ouro,  ligando  o  Rio  de  Janeiro  a  Minas  Gerais.  Dirigido  por  Elizabeth  Formaggini,  cineasta  e  historiadora  do  órgão,  é  uma  obra  de  forte   conteúdo  pedagógico.  Utilizado  em  debates  pela  equipe  do   Inepac   tem  se  mostrado  eficiente  no  processo  de  Educação  Patrimonial.  

A   Secretaria   de   Cultura   do   Estado   do   Espírito   Santo   publicou,   em   2010,   o  manual  Educar  para  Preservar  –  Educação  Patrimonial  no  Espírito  Santo,  uma  proposta  para  orientar  o  professor  na  tarefa  de  promover  a  Educação  Patrimonial.  

Outra   experiência   interessante   é   promovida   pela   Universidade   Federal   do   Rio   de  Janeiro  (UFF),  por  meio  do  Departamento  de  Artes  e  Estudos  Culturais,  que  desenvolve  um  programa  de  extensão  visando  à  preservação  do  patrimônio  cultural  em  Oriximiná,  no  Pará.  O   programa   denominado   Implicações   Socioeducacionais   do   Artesanato   em  Oriximiná   está  acessível  nos  Cadernos  de  Cultura  e  Educação  para  o  Patrimônio,  publicado  pela  UFF.  

   

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A  legislação  básica  que  orienta  a  área  do  Patrimônio  Cultural  

 

Quem   deve   preservar   o   Patrimônio   Cultural?   Esta   pergunta   já   foi   respondida   em  aulas   anteriores,   mas   para   melhor   entendimento,   ela   deve   ser   acompanhada   de   outra  questão:   que   instrumentos   legais   garantem   e   orientam   a   preservação   do   Patrimônio  Cultural?  

A   legislação   mais   importante,   porque   dela   emanam   todas   as   outras   leis,   é   a  Constituição  da  República  Federativa  do  Brasil  de  1988.  No  Capítulo  III,  Seção  II,  Da  Cultura,  encontramos:  

 

“Art.  215.  O  Estado  garantirá  a  todos  o  pleno  exercício  dos  direitos  culturais  e  acesso  às  fontes   da   cultura   nacional,   e   apoiará   e   incentivará   a   valorização   e   a   difusão   das  manifestações  culturais.  

§   1º   -­‐   O   Estado   protegerá   as   manifestações   das   culturas   populares,   indígenas   e   afro-­‐brasileiras,  e  das  de  outros  grupos  participantes  do  processo  civilizatório  nacional.  

§  2º   -­‐  A   lei  disporá  sobre  a   fixação  de  datas  comemorativas  de  alta  significação  para  os  diferentes  segmentos  étnicos  nacionais.  

§   3º   A   lei   estabelecerá   o   Plano  Nacional   de   Cultura,   de   duração   plurianual,   visando   ao  desenvolvimento  cultural  do  País  e  à  integração  das  ações  do  poder  público  que  conduzem  à:  (Incluído  pela  Emenda  Constitucional  nº  48,  de  2005)  

I   defesa   e   valorização   do   patrimônio   cultural   brasileiro;  (Incluído   pela   Emenda  Constitucional  nº  48,  de  2005)  

II  produção,  promoção  e  difusão  de  bens  culturais;  (Incluído  pela  Emenda  Constitucional  nº  48,  de  2005)  

Art.   216.   Constituem   patrimônio   cultural   brasileiro   os   bens   de   natureza   material   e  imaterial,  tomados  individualmente  ou  em  conjunto,  portadores  de  referência  à  identidade,  à  ação,  à  memória  dos  diferentes  grupos   formadores  da  sociedade  brasileira,  nos  quais  se  incluem:  

I  -­‐  as  formas  de  expressão;  II  -­‐  os  modos  de  criar,  fazer  e  viver;  III  -­‐  as  criações  científicas,  artísticas  e  tecnológicas;  IV   -­‐   as   obras,   objetos,   documentos,   edificações   e   demais   espaços   destinados   às  

manifestações  artístico-­‐culturais;    

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         V   -­‐  os  conjuntos  urbanos  e  sítios  de  valor  histórico,  paisagístico,  artístico,  arqueológico,  

paleontológico,  ecológico  e  científico.  §   1º   -­‐   O   Poder   Público,   com   a   colaboração   da   comunidade,   promoverá   e   protegerá   o  

patrimônio  cultural  brasileiro,  por  meio  de   inventários,   registros,  vigilância,   tombamento  e  desapropriação,  e  de  outras  formas  de  acautelamento  e  preservação.  

§  4º  -­‐  Os  danos  e  ameaças  ao  patrimônio  cultural  serão  punidos,  na  forma  da  lei.  §   5º   -­‐   Ficam   tombados   todos   os   documentos   e   os   sítios   detentores   de   reminiscências  

históricas  dos  antigos  quilombos.”    O   Sistema   Nacional   de   Cultura,   organizado   em   regime   de   colaboração,   de   forma  

descentralizada   e   participativa,   institui   um   processo   de   gestão   e   promoção   conjunta   de  políticas   públicas   de   cultura,   democráticas   e   permanentes,   pactuadas   entre   os   entes   da  Federação  e  a  sociedade,  tendo  por  objetivo  promover  o  desenvolvimento  humano,  social  e  econômico  com  pleno  exercício  dos  direitos  culturais.  (Incluído  pela  Emenda  Constitucional  nº   71,   de   2012).   O   Sistema   Nacional   de   Cultura   fundamenta-­‐se   na   política   nacional   de  cultura   e   nas   suas   diretrizes,   estabelecidas   no   Plano   Nacional   de   Cultura,   e   rege-­‐se   pelos  seguintes  princípios:  (Incluído  pela  Emenda  Constitucional  nº  71,  de  2012)  

 “I  -­‐  diversidade  das  expressões  culturais;  Incluído  pela  Emenda  Constitucional  nº  71,  de  

2012  II  -­‐  a  universalização  do  acesso  aos  bens  e  serviços  culturais;      §   4º   Os   Estados,   o   Distrito   Federal   e   os   Municípios   organizarão   seus   respectivos  

sistemas  de  cultura  em  leis  próprias.  Incluído  pela  Emenda  Constitucional  nº  71,  de  2012.”    

Os   artigos   215   e   216   da   Constituição   abrangem   toda   a   área   da   Cultura.   O  conhecimento   completo   desses   artigos   possibilita   a   compreensão   de   como   se   organiza   o  setor  da  Cultura  no  Brasil,  e  consequentemente,  da  área  do  Patrimônio  Cultural.  A  proteção  do  patrimônio  cultural  local  também  é  uma  preocupação  presente  na  Constituição  de  1988.  

“Art.  30.  Compete  aos  Municípios:  

IX   -­‐   promover   a   proteção   do   patrimônio   histórico-­‐cultural   local,   observada   a  legislação  e  a  ação  fiscalizadora  federal  e  estadual.”  

O  órgão  que  orienta  normativamente  a  proteção  do  patrimônio  cultural  brasileiro  é  o  Instituto  do  Patrimônio  Histórico  e  Artístico  Nacional  –  Iphan.    

“Há  mais  de  75  anos,  o   IPHAN  vem  realizando  um  trabalho  permanente  e  dedicado  de   fiscalização,   proteção,   identificação,   restauração,   preservação   e   revitalização   dos  monumentos,  sítios  e  bens  móveis  do  país.”    

 

 

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O   Decreto-­‐Lei   nº   25,   de   30   de   novembro   de   1937,   pioneiro   no   Brasil,   ainda   é   a  principal   legislação   federal.   Ele   organizou   a   proteção   do   patrimônio   histórico   e   artístico  nacional  e  regulamentou  a  ação  do  então  Sphan.  

Em  seu  artigo  1º  ele  define:  

“Art.   1º   Constitue   o   patrimônio   histórico   e   artístico   nacional   o   conjunto   dos   bens  móveis  e   imóveis  existentes  no  país  e  cuja  conservação  seja  de  interêsse  público,  quer  por  sua   vinculação   a   fatos   memoráveis   da   história   do   Brasil,   quer   por   seu   excepcional   valor  arqueológico  ou  etnográfico,  bibliográfico  ou  artístico.”  (texto  original)  

Cria   também   os   Livros   de   Tombo,   nos   quais   estão   registrados   os   tombamentos  efetuados  pelo  órgão:  

“Art.  4º  O  Serviço  do  Patrimônio  Histórico  e  Artístico  Nacional  possuirá  quatro  Livros  do  Tombo,  nos  quais  serão  inscritas  as  obras  a  que  se  refere  o  art.  1º  desta  lei,  a  saber:    

 1)   no   Livro   do   Tombo   Arqueológico,   Etnográfico   e   Paisagístico,   as   coisas  pertencentes   às   categorias   de   arte   arqueológica,   etnográfica,   ameríndia   e   popular,   e   bem  assim  as  mencionadas  no  §  2º  do  citado  art.  1º.    

 2)  no  Livro  do  Tombo  Histórico,  as   coisas  de   interêsse  histórico  e  as  obras  de  arte  histórica;    

 3)  no  Livro  do  Tombo  das  Belas  Artes,  as  coisas  de  arte  erudita,  nacional  ou  

estrangeira;    

 4)  no  Livro  do  Tombo  das  Artes  Aplicadas,  as  obras  que  se  incluírem  na  categoria  das  artes  aplicadas,  nacionais  ou  estrangeiras.”  

Na  área  do  patrimônio  imaterial  é  fundamental  o  conhecimento  do  Decreto  nº  3.551,  de  04  de  agosto  de  2000,  que  criou  o  Registro  de  Bens  Culturais  de  Natureza  Imaterial:  

       “Art.  1o    Fica   instituído  o  Registro   de  Bens   Culturais   de  Natureza   Imaterial   que   constituem  patrimônio  cultural  brasileiro.                  §  1o    Esse  registro  se  fará  em  um  dos  seguintes  livros:                  I  -­‐  Livro  de  Registro  dos  Saberes,  onde  serão  inscritos  conhecimentos  e  modos  de  fazer  enraizados  no  cotidiano  das  comunidades;                  II  -­‐  Livro  de  Registro  das  Celebrações,  onde  serão  inscritos  rituais  e  festas  que  marcam  a  vivência   coletiva   do   trabalho,   da   religiosidade,   do   entretenimento   e   de   outras   práticas   da  vida  social;                   III  -­‐  Livro   de   Registro   das   Formas   de   Expressão,   onde   serão   inscritas   manifestações  literárias,  musicais,  plásticas,  cênicas  e  lúdicas;                   IV  -­‐  Livro   de   Registro   dos   Lugares,   onde   serão   inscritos   mercados,   feiras,   santuários,  praças  e  demais  espaços  onde  se  concentram  e  reproduzem  práticas  culturais  coletivas.”  

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“O  decreto   rege  o  processo  de   reconhecimento  de  bens  culturais   como  patrimônio  imaterial,   institui   o   registro   e,   com   ele,   o   compromisso   do   Estado   em   inventariar,  documentar,   produzir   conhecimento   e   apoiar   a   dinâmica   dessas   práticas   socioculturais.”  (Iphan)  

Além   das   legislações   citadas,   o   Iphan,   ao   longo   dos   anos,   produziu   uma   série   de  regulamentações,  que  podem  ser  acessadas  em  seu  portal,  utilizando-­‐se  o  link  abaixo:  

http://portal.iphan.gov.br/portal/montarPaginaSecao.do?id=12141&retorno=paginaIphan  

O   Estado   do   Rio   de   Janeiro,   como   vimos,   foi   o   pioneiro   na   criação   de   um   órgão  estadual  de  proteção  do  patrimônio  cultural,  em  1963,  na  época  a  DPHA  e,  a  partir  de  1975,  o   Inepac.   A   legislação   que   rege   as   ações   do   Inepac   está   disponível   no   portal  www.inepac.rj.gov.br,  assim  como  todos  os  bens  tombados  pelo  Instituto,  desde  1965.  

A  Constituição  do  Estado  do  Rio  de  Janeiro  de  1989  em  seus  Artigos  73,  229,  230  e  231,  dispõe  sobre  questões  do  patrimônio  cultural  e  das  normas  das  cidades.  

É  fundamental  conhecer,  no  Estado  do  Rio  de  Janeiro,  a  seguinte  legislação:  

ü O  Decreto-­‐Lei  nº  02,  de  11  de  abril  de  1969,  do  antigo  Estado  da  Guanabara,  que   define   os   bens   integrantes   do   patrimônio   cultural   e   regulamentar   a   sua  proteção;  

ü A  Lei  nº  509,  de  03  de  dezembro  de  1981,  e  o  Decreto  nº  5.808,  de  13  de  julho  de   1982,   que   a   regulamenta,   dispondo   sobre   o   Conselho   Estadual   de  Tombamento   e   os   procedimentos   administrativos   e   legais   inerentes   ao  exercício   da   preservação   do   patrimônio   cultural   fluminense.   Esta   legislação  determina  que  o  Processo  de   tombamento   seja   iniciado  pelo   Inepac.   Enviado  pelo   Secretário   de   Cultura   ao   Governador   para   que   tome   ciência,   será  publicado   o   Tombamento   Provisório.   O   Conselho   Estadual   de   Tombamento  receberá  o  Processo  e  opinará  pelo  Tombamento  Definitivo,  ou  pela  denegação  do  tombamento;  

ü O   Decreto   nº   23.055,   de   16   de   abril   de   1997,   que   dispõe   sobre   a   tutela   do  patrimônio  cultural  fluminense,  no  que  se  refere  ao  poder  de  polícia,  controle,  sanções  e  penalidades.  

 

Procure   saber   se  o   seu  município  possui  um  Plano  Diretor,  obrigatório,   conforme  a  Constituição   Federal,   para   cidades   de   mais   de   vinte   mil   habitantes.   É   nele   que   estão  expressos  os  rumos  pretendidos  para  a  sua  cidade,  em  termos  de  desenvolvimento  urbano  e  proteção  ao  patrimônio  cultural  e  paisagístico.    

Se  o  seu  Município  tem  menos  de  vinte  mil  habitantes,  consulte  a  Lei  Orgânica,  que  também  dispõe  sobre  o  assunto.  

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Procure  saber,  também,  sobre  as  diretrizes  estabelecidas  pelo  Estatuto  da  Cidade,  Lei  nº   10.257,   de   10   de   julho   de   2001,   que   veio   regulamentar   diversos   aspectos   do  desenvolvimento   local,   inclusive   os   relacionados   à   preservação   do   patrimônio   cultural   e  natural.  

É  importante  saber  também  se  há  no  município  um  órgão  da  Prefeitura  responsável  pelo  Patrimônio  Cultural.  

É   também   muito   importante   que   você   conheça   o   Plano   e   o   Sistema   Nacional   de  Cultura.  Além  disso,  se  informe  sobre  os  Planos  e  Sistemas  de  Cultura  do  seu  Estado  e  do  seu  Município.  

Somente  com  o  estudo  desse  conjunto  de  leis,  decretos  e  regulamentações  sobre  o  patrimônio   cultural,   você   poderá   se   sentir   seguro   para   analisar   e   comentar   as   decisões  referentes  à  proteção  do  Patrimônio  Cultural.  

 

 

 

   

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