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Trabalho de Conclusão de Curso ESTUDO DE CASO DAS CONDICIONALIDADES DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA APLICADAS AOS IMIGRANTES HAITIANOS Márcia Cristina Hipólito Lemos de Lima 1 Ana Carolina da Silva Monteiro 2 Resumo: O objetivo desta pesquisa, com base empírica, é apresentar o Programa Bolsa Família como uma opção de acolhimento e amparo social ao imigrante haitiano que busca o município de Campo Grande (MS) como destino para recomeçar sua vida, uma vez que não há oferta de políticas públicas específicas de atendimento aos indivíduos estrangeiros pelo município. Além disso, serão discutidas as dificuldades que o município enfrenta na questão de acolhimento aos imigrantes haitianos e a consequente não oferta de políticas públicas direcionadas ao indivíduo imigrante. Pela falta de políticas públicas específicas para os imigrantes haitianos, propõe-se que eles poderiam ser assistidos pelo Programa Bolsa Família, respeitadas as mesmas condicionalidades a que são submetidos os demais beneficiários. Palavras-chave: Imigrantes. Haitianos. Condicionalidades. Programa Bolsa Família. INTRODUÇÃO Em tempos de migração maciça, os flagelos da fome e das guerras fazem com que o indivíduo se sinta obrigado a se deslocar de seu território de origem para buscar em outros países melhores condições de sobrevivência. No caso específico do Haiti, foi uma catástrofe que o país enfrentou em 2010, um terremoto, que devastou e vitimou milhares de haitianos. À época, vários países ofereceram ajuda e contribuíram efetivamente para o restabelecimento da ordem no país, no entanto, diversos problemas políticos e casos de corrupção inviabilizaram a reconstrução do Haiti. 1 Assistente Social formada pela Newton PAIVA. Pós-Graduação em Psicologia Médica Hospitalar, Medicina Psicossomática e Neurociência. Instituto Sapiens. Pós psicopedagogia Clinica e Institucional. Pós Neuropsicopedagogia, Hipnose Clinica. E-mail: [email protected]. Artigo do Eixo 1. 2 Servidora técnico-administrativa em Educação na UFMS. Bacharel em Comunicação Social Jornalismo (2000, UFMS), Mestre em Comunicação (2015, UFMS). Tutora e orientadora do Curso de Especialização em Educação, Pobreza e Desigualdade Social. E-mail: [email protected].

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Trabalho de Conclusão de Curso

ESTUDO DE CASO DAS CONDICIONALIDADES DO PROGRAMA BOLSA

FAMÍLIA APLICADAS AOS IMIGRANTES HAITIANOS

Márcia Cristina Hipólito Lemos de Lima1

Ana Carolina da Silva Monteiro2

Resumo:

O objetivo desta pesquisa, com base empírica, é apresentar o Programa Bolsa Família como

uma opção de acolhimento e amparo social ao imigrante haitiano que busca o município de

Campo Grande (MS) como destino para recomeçar sua vida, uma vez que não há oferta de

políticas públicas específicas de atendimento aos indivíduos estrangeiros pelo município.

Além disso, serão discutidas as dificuldades que o município enfrenta na questão de

acolhimento aos imigrantes haitianos e a consequente não oferta de políticas públicas

direcionadas ao indivíduo imigrante. Pela falta de políticas públicas específicas para os

imigrantes haitianos, propõe-se que eles poderiam ser assistidos pelo Programa Bolsa

Família, respeitadas as mesmas condicionalidades a que são submetidos os demais

beneficiários.

Palavras-chave: Imigrantes. Haitianos. Condicionalidades. Programa Bolsa Família.

INTRODUÇÃO

Em tempos de migração maciça, os flagelos da fome e das guerras fazem com que o

indivíduo se sinta obrigado a se deslocar de seu território de origem para buscar em outros

países melhores condições de sobrevivência. No caso específico do Haiti, foi uma catástrofe

que o país enfrentou em 2010, um terremoto, que devastou e vitimou milhares de haitianos. À

época, vários países ofereceram ajuda e contribuíram efetivamente para o restabelecimento da

ordem no país, no entanto, diversos problemas políticos e casos de corrupção inviabilizaram a

reconstrução do Haiti.

1 Assistente Social formada pela Newton PAIVA. Pós-Graduação em Psicologia Médica Hospitalar, Medicina

Psicossomática e Neurociência. Instituto Sapiens. Pós psicopedagogia Clinica e Institucional. Pós

Neuropsicopedagogia, Hipnose Clinica.

E-mail: [email protected]. Artigo do Eixo 1. 2 Servidora técnico-administrativa em Educação na UFMS. Bacharel em Comunicação Social – Jornalismo

(2000, UFMS), Mestre em Comunicação (2015, UFMS). Tutora e orientadora do Curso de Especialização em

Educação, Pobreza e Desigualdade Social. E-mail: [email protected].

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Por isso, a partir de 2010, houve um grande fluxo de haitianos adentrando as

fronteiras brasileiras, causando uma verdadeira crise humanitária na fronteira do Acre. Esses

imigrantes vêm ao Brasil em busca do “sonho brasileiro”, uma ideia parecida com a que

muitos brasileiros têm do “sonho americano”, ou seja, o sonho de vir para o país, mesmo sem

nenhuma formação ou dinheiro, e conseguir um trabalho, enriquecer e melhorar a vida de sua

família em seu país de origem. Contudo, desde que o Brasil ampliou a emissão de vistos pelas

embaixadas em Porto Príncipe (Haiti), Quito (Equador) e Lima (Peru), em 2015, houve uma

queda de 96% no número de haitianos ilegais que chegaram ao Brasil pelo estado.

Atualmente, o Brasil emite mais de 100 vistos por mês para cidadãos do Haiti, conforme o

Ministério da Justiça (2016). O Acre tem deixado de ser a principal rota para entrada de

imigrantes haitianos no país. Enquanto em janeiro houve o registro de 1.393 imigrantes, em

dezembro esse número foi reduzido a 54, segundo a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos

do Acre (Sejudh, 2015).

A expansão dos refugiados reconhecidos e do número de solicitações ocorre em meio

a uma das mais graves crises migratórias já enfrentadas pelo mundo. Segundo a convenção

das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados (1951), refugiado é toda pessoa que por

motivos decorrentes de temores de perseguição à raça, religião, nacionalidade encontra-se

fora de seu país de origem. Não, necessariamente é a situação dos haitianos que hoje entram

pelas fronteiras brasileiras, particularmente, os que estão em Campo Grande (MS), que mais

se caracterizam como portadores de visto humanitário, mas são beneficiários da mesma

política de atendimento aos refugiados.

Diante do grande número de refugiados e da tradição brasileira de dar abrigo aos

migrantes, o governo federal adotou várias medidas de apoio nos últimos anos. De acordo

com o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), constam ações como os programas de

vistos humanitários para cidadãos haitianos e o programa de vistos especiais para os afetados

do conflito sírio.

Outras ajudas têm sido oferecidas pelos dois Centros de Referência e Acolhimento de

Migrantes e Refugiados (CRAI) em atividade em São Paulo. Outros centros estão previstos

para Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Guarulhos.

Essas medidas têm sido acompanhadas da facilitação do acesso à documentação para

a retomada de vida regular no Brasil, com auxílio para emissão de carteira de identidade

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estrangeira para refugiados e asilados e ajuda para retomada de uma vida produtiva com

condições de sustento para o indivíduo e a família.

Neste contexto é que foi formulada a hipótese desta pesquisa: É possível identificar e

incluir no Programa Bolsa Família, uma ação social do governo, os imigrantes haitianos que

passam a residir com suas famílias, em Mato Grosso do Sul, mais especificamente no

município de Campo Grande, e que estão em situação de vulnerabilidade socioeconômica

prevista pelo PBF?

Em uma pesquisa exploratória de busca ativa em órgãos de atendimento como o

Centro de Referência de Assistência Social-CRAS, a Secretaria de Assistência Social - (SAS)

e a Pastoral do Imigrante, o que se constatou é que ainda não há no município uma rede

especializada para acolhimento dos imigrantes haitianos, em contrapartida a demanda por

ajuda é numerosa. Os serviços ainda estão em aprimoramento, não há profissionais da área

habilitados a realizar os atendimentos. Não há um formulário para coleta dados que reflitam

especificamente as situações vivenciadas pelo imigrante haitiano. Os profissionais que

atendem não falam inglês, francês ou o crioulé, um dialeto haitiano, ou seja, existem várias

barreiras para o acolhimento eficaz dos haitianos que chegam ao município à procura de uma

vida melhor, dentre elas a barreira linguística e a cultural.

O objetivo desta pesquisa é mostrar que as famílias de haitianos residentes no

município de Campo Grande, cuja situação documental esteja regular, não necessariamente

precisam ser determinadas como público-alvo do PBF, mas poderiam ser incluídas dentro da

perspectiva de que o Programa é direcionado às famílias em situação de pobreza e de extrema

pobreza em todo o País, de modo que consigam superar a situação de vulnerabilidade e

pobreza em que se encontram por meio do direito à alimentação e o acesso à educação e à

saúde, garantidos pelo Programa, desde que cumpram as condicionalidades que lhe seriam

impostas.

A possibilidade que se vislumbrou como resposta à hipótese desta pesquisa e que

levou esta pesquisadora a campo foi a de que as famílias de imigrantes haitianos poderiam ser

atendidas pelo Programa Bolsa Família, como ajuda em caráter humanitário, depois de se

inscreverem no Cadastro Único e passarem pelas demais fases do processo impostas às

demais famílias beneficiárias do Programa.

O PBF configura-se num Programa de Transferência Condicionada de Renda e tem o

papel fundamental de reforçar o acesso das famílias à educação e à saúde, por meio de alguns

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compromissos, chamados condicionalidades, aos quais as famílias de imigrantes haitianos

também seriam impostas. Mas não são apenas os beneficiários que têm a responsabilidade de

cumprir esses compromissos. O poder público também deve ter um foco nessas famílias ao

garantir a elas a oferta e a qualidade dos serviços. Dentro das exigências de quem pode

participar, o Ministério do Desenvolvimento Social (2015) limita-se a informar que podem

fazer parte do Programa: “Todas as famílias com renda por pessoa de até R$ 85,00 mensais.

Famílias com renda por pessoa entre R$ 85,01 e R$ 170,00 mensais, desde que tenham

crianças ou adolescentes de 0 a 17 anos”. Não há exclusão para estrangeiros.

Este estudo é inédito e está estruturado numa pesquisa de base empírica, com

fundamentação teórica cujo recorte de tempo e espaço obedeceu à regra de estudo de caso.

Delimitou-se analisar duas famílias de haitianos (esposo, esposa e filhos), membros de um

grupo de haitianos, mas que na sua grande maioria é composta por casais sem filhos, rapazes

e moças solteiros em busca de estudo e emprego. O questionário e as entrevistas foram

realizados em setembro de 2016.

As constatações desta pesquisa são apresentadas neste artigo que está dividido em XX

seções, além desta Introdução. No desenvolvimento estão o resgate teórico do assunto e as

caracterizações das famílias entrevistadas, os nomes dessas famílias não serão divulgadas por

questão de privacidade, isto porque os haitianos que vivem em Campo Grande não gostam de

ter suas fotos ou nomes divulgados como pessoas que necessitam de ajuda de qualquer tipo,

pois não querem que os seus demais familiares que ainda residem no Haiti fiquem conheçam

as dificuldades encontradas no país , por isso, tais famílias serão identificadas aqui como

Família 1, a qual veio da cidade de Porto Príncipe entraram no pais por corumbá, onde Brasil

tem uma fronteira seca, família com visto humanitário composta de quatro membros mãe pai

e duas crianças do sexo feminino com idade 5 e 2 resolveram buscar emprego e melhor

condição de vida no pais. Mas já pretendem mudar de estado pois estão a dois meses e não

conseguem trabalho tendo como ponto de barreira a língua já que a mulher só fala criolé e o

marido entende inglês porém só fala criolé e francês escolaridade correspondente a ensino

fundamental, estão buscando ajuda na comunidade católica que encontra-se no bairro Rita

Vieira onde existe um grupo improvisado de acolhimento mas sem direcionamento para

trabalho e políticas públicas disponíveis, Família 2, casal com 1 filho do sexo feminino

também com escolaridade nível fundamental estavam no Rio Grande do sul vieram para mato

grosso do sul para o marido trabalhar na construção civil porém a empresa retém a carteira

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de trabalho e não paga o salário a mais ou menos seis meses. O estado parece desconhecer o

tratado humanitário pois não disponibiliza atendimento específicos para imigrantes o CRAS

que deveria direcionar o atendimento torna-se uma barreira pois os profissionais de

acolhimento não falam inglês ou francês ou espanhol impedindo a comunicação, também não

existe formulário próprios onde poderia se montar o histórico do imigrante. O mesmo

impasse acontece quando buscam tratamento médico nas (UBS) unidade básica de saúde

também profissionais de acolhimento que não falam a língua, existe uma pequena

comunidade dentro dos bairros Rita Viera e Vila Progresso onde eles se ajudam buscando

aqueles que já falam português funciona como interprete dos que vão chegando,

recentemente ouve uma iniciativa do Fórum de Trabalho Descente Mulher de dar aulas de

português aos haitianos, a ideia surgiu após um dos coordenadores do Fórum assistir a defesa

de monografia da acadêmica de graduação de direito Wanessa Hipólito Lemos Silva, onde a

mesma apresentava as dificuldades enfrentadas pelos haitianos na efetivação dos direitos

sociais, principalmente na área de saúde, trabalho e educação, onde a maior dificuldade foi

identificada como sendo o desconhecimento da língua portuguesa, o que atrapalha para que

essas pessoas consigam emprego, tenham acesso a educação e possam ser atendidos

corretamente nas Unidades de Saúde (já que o fato de não saberem falar português, faz com

que torne difícil a comunicação médico-paciente). E nas considerações finais, estão as

propostas de intervenção à realidade local, as possíveis melhorias que podem ser feitas na

rede de Assistência Social no atendimento e acolhimento ao imigrante.

Este artigo está dividido em 4 seções, incluindo esta Introdução e as Considerações

Finais. Na segunda parte, está a maior parte das informações deste estudo. Por isso, trata-se

da caracterização da pesquisa, da análise e discussão dos dados coletados.

2. DA CHEGADA AO BRASIL E OUTRAS SITUAÇÕES: ANÁLISE E DISCUSSÃO

DOS DADOS COLETADOS

Segundo relatou o haitiano J. W. B. 49, as alternativas de entrada no Brasil são

facilitadas por uma grande área de fronteira seca

Quem escolhe fazer o percurso Haiti – República Dominicana – Equador –

Peru – Acre (Brasil) exige um esforço que custa em torno de R$ 4,5 mil,

além de US$ 50 a US$ 100 que é preciso pagar a “atravessadores” cada vez

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que o veículo para em alguma das oito cidades do trajeto percorrido nos

países da América do Sul.

Quando há mulheres na viagem, os haitianos entrevistados contaram que o risco de

violência sexual, agressão e roubo são mais altos. Muitas vezes, para garantir que o dinheiro

carregado não seja levado, é necessário escondê-lo em qualquer parte possível do corpo.

Em Brasileia e Assis Brasil, ambas no Acre, em torno de 1,5 mil haitianos chegam por

mês. Como essas cidades, tem de 21,3 mil a 6 mil habitantes respectivamente, não possuem

estrutura para receber tantos migrantes, as condições de estadia e atendimento ao estrangeiro

são precárias.

Por isso, os haitianos vão se distribuindo pelo país, indo para Mato Grosso – que

também é de porta de entrada para quem decide chegar ao Brasil pela Bolívia–, Mato Grosso

do Sul, São Paulo, Paraná e Santa Catarina. “Lá no Acre, as empresas fazem propaganda de

trabalho e a gente decide para onde vai. Vim para cá há um ano para trabalhar no Aquário do

Pantanal, depois de ver anúncio no Acre (J. W. B. 49).

Depois da chegada ao Brasil, os haitianos, em sua maioria, encontram-se sem

documentos, ou seja, não possuem visto para permanecerem no país e trabalharem, por isso,

inicialmente todos fazem um pedido de refúgio, sendo que, logo que tal pedido é feito, antes

mesmo de ser aprovado, os haitianos recebem uma permissão para permanecer no país junto

com Carteira do Trabalho e Previdência Social (CTPS), e um registro no Cadastro de Pessoa

Física (CPF).

2.1 QUEM RECEBE O VISTO HUMANITÁRIO

O Brasil é signatário do Estatuto dos Refugiados das Nações Unidas e possui uma

própria legislação sobre o refúgio (Lei nº 9.747/97). A maioria das solicitações de refúgio

está na Região Sul (35%), seguida do Sudeste (31%), e São Paulo é o estado com mais

demandas (23%) – de acordo com dados do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE),

consolidados em abril de 2016. A região Centro-Oeste possui apenas 7% do número total de

solicitações de refúgio do Brasil.

Dados da Divisão de Imigração do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty)

apontam que a emissão de vistos a haitianos subiu 1.537% de 2012 a 2015. Isso mostra que

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os imigrantes têm entrado no país regularizados por capitais como São Paulo e Rio de

Janeiro, em vez de fazer a longa e cara viagem para entrar ilegalmente pelo Acre.

Segundo dados do Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), o Brasil possui

8.863 refugiados reconhecidos, de 79 nacionalidades diferentes (28,2% deles são mulheres).

Nos últimos cinco anos (2010 – 2015), as solicitações de refúgio no Brasil cresceram

2.868%. Passaram de 966, em 2010, para 28.670, em 2015. Até 2010, haviam sido

reconhecidos 3.904 refugiados. Em abril deste ano, o total chegou a 8.863, o que representa

aumento de 127% no acumulado de refugiados reconhecidos – incluindo reassentados. A

maior parte dos refugiados que buscam abrigo no País possui idade entre 18 e 59 anos, em

várias situações formadas por famílias compostas também por crianças e adolescentes.

No entanto, os haitianos não se enquadram dentro das hipóteses de refúgio, ou seja,

não fugiram de seu pais em razão de perseguição por motivos de raça, pensamento político,

religião, ou por conta de uma guerra. Porém, conforme visto acima, essas pessoas vêm em

busca de uma vida melhor, porque não acreditam que teriam como trabalhar em seu país, então

o Brasil passou a conceder o Visto Humanitário, o qual foi criado e é concedido pelo Conselho

Nacional da Imigração (CNig).

O Brasil começou a conceder o Visto Humanitário aos haitianos em 2012. Como eles

chegavam ao Brasil fugindo principalmente das consequências humanitárias de um

terremoto, o Itamaraty e o Ministério da Justiça criaram essa categoria especial de proteção,

que não era refúgio, mas também não era a simples aplicação dos vistos tradicionais de

turismo (que tem curta duração), de estudo (que requer vinculação com universidades) e de

trabalho (que requer vínculos empregatícios).

Eles podem solicitar o Visto Humanitário nas embaixadas brasileiras localizadas nos

países vizinhos ao Haiti. Quando chegam ao Brasil, trocam esse visto pelo status de

refugiados, uma vez que o Haiti está sofrendo graves problemas com a miséria.

Tal visto é concedido por razões humanitárias, ou seja, em razão das condições

difíceis pelas quais o Haiti está passando, como a alta taxa de mortalidade infantil, a falta de

saneamento básico e a miséria crônica, por tudo isso é considerado que o país está em uma

crise humanitária, ou seja, em uma crise que viola os direitos humanos, como a saúde e o

direito a uma vida digna.

Por isso, quando os haitianos chegam ao país é concedido um Visto Humanitário que

lhes permite permanecer no Brasil, trabalhar e estudar de maneira permanente, sem que

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necessitem de mais permissões para permanecer no país, tal visto é concedido depois da

publicação de edital pelo CNig, e posterior entrega de uma série de documentos que devem

ser enviados para Brasília.

Em Mato Grosso do Sul, recentemente a Secretaria de Estado de Direitos Humanos,

Assistência Social e Trabalho, fez convênio com várias outras instituições, e com a

embaixada do Haiti, e auxiliou muitos haitianos residentes em Mato Grosso do Sul a

reunirem os documentos necessários para receberem o Visto Humanitário para permanecerem

no país.

Este é justamente o público-alvo da pesquisa que se realizou com famílias

entrevistadas que dispuseram a participar e que se enquadravam na condição de família com

filhos menores, pois o foco da pesquisa é o Programa Bolsa Família e suas condicionalidades.

Nessa perspectiva, foram encontradas duas famílias que aqui serão chamadas de

família 1 e 2. A família 1 é composta de 4 membros: pai e mãe e duas filhas menores que

ainda não estão na creche, pois precisam de vacinas para concorrer à vaga. Com isso, a mãe

está impedida de buscar. O pai realiza pequenos bicos que gera uma renda entre R$100 e 150

reais, mesmo assim em visita ao CRAS não lhe foi disponibilizada a informação sobre o

Programa Bolsa Família, para o qual a família tem enquadramento social.

No CRAS a alegação é de que os haitianos dispensam ajuda governamental, mas a

profissional não soube dizer porque, então foi feito o questionamento à família que alega não

saber como proceder se o programa será cobrado e se é lícito receber essa ajuda, por existir

uma comunicação basicamente em linguagem de sinais, pouco se entende do que falam e

pouco são entendidos, com isso o atendimento não é eficaz.

A família 2 é composta de 3 pessoas mãe, pai e uma menina, também recém-

chegados à capital de Mato Grosso do Sul. Já residem no Brasil há um ano, possuem

escolaridade de nível fundamental e dificuldade de comunicação. Não recebem Bolsa Família

e quando questionados se no estado do Rio Grande do Sul, de onde vieram, lhes foi ofertada a

política pública da Bolsa Família a resposta foi negativa. Não sabem nem entendem como

funciona.

A pesquisa foi realizada de 04 de abril até 15 de setembro buscando aqueles que

participassem de forma voluntária, pois segundo a fala da coordenadora do recém criado

(CERMA) Conselho Estadual para Refugiados Migrantes e Apátridas, os imigrantes haitianos

não participam de entrevistas ou fotos que mostre sua condição de vulnerabilidade por

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saberem que os parentes e amigos que ficaram no Haiti assistem e leem assuntos relacionados

a eles vindo do Brasil.

Os imigrantes haitianos que migram para a região tem um perfil bastante específico,

em sua maioria possuem escolaridade nível médio ou sem diploma com reconhecimento no

território nacional, situação que dificulta sua inserção no mercado de trabalho. Com poucas

alternativas se inserem na construção civil ou em geral concorrem às vagas destinadas a

semialfabetizados.

O atendimento de acolhimento é inexistente e realizado por profissionais sem

qualificação específica no que tange à imigração e com isso os imigrantes que vem de uma

realidade de fragilidade social passam necessidades e não são completamente assistidos pelo

Estado. Ressalta-se aqui que boa vontade não é tudo, é preciso uma estrutura minimamente

organizada para que se possa receber de forma humanizada e eficiente esses e outros

imigrantes.

A Pastoral do Imigrante cuja proposta é a liberdade do imigrante, fala que não tem

planejamento ou coordenação por parte da Pastoral para a recepção e atendimento dos

imigrantes em suas dificuldades e desafios enfrentados quando chegam a Campo Grande. O

auxílio a essas pessoas é prestado de maneira descoordenada e emergencial e ocorre por

demanda espontânea, não há dados ou quantitativo específico de imigrantes que buscam

auxílio. Por contarem com as sazonalidades do mercado de trabalho, os imigrantes fazem

mudanças exploratórias pelo país, deslocando-se conforme há abertura de vagas de trabalho

no território nacional.

Esta dinâmica de vida faz com que os próprios imigrantes busquem ajuda de modo

individual e descoordenado, tal auxílio dependerá de ajuda da comunidade onde estão

inseridos e será descontinuada, dependendo apenas da disponibilidade e do pedido por parte

dos imigrantes.

Nenhuma informação é prestada de forma espontânea pelo grupo que os atende e

nenhum direcionamento é realizado sem o pedido do próprio imigrante, o qual tem de

desbravar a cidade e os desafios advindos do choque de culturas, em muitos casos, sozinho.

Muitos imigrantes chegam às cidades em grupos e acabam por depender da ajuda dos

próprios compatriotas, os quais convivem com eles na mesma comunidade e tendem a

auxiliar e dar as orientações das coisas que sabem e descobrem com os brasileiros com os

quais se relacionam acerca dos direitos e costumes brasileiros.

Trabalho de Conclusão de Curso

Isto demonstra que há necessidade de que a recepção e a orientação dessas pessoas

sejam realizadas de maneira prévia e coordenada, senão por parte do próprio Estado, seja

realizada por parte da sociedade civil organizada, para que esses imigrantes sejam

corretamente orientados e amparados em suas vulnerabilidades sociais, e possam ter acesso

efetivo a uma melhor qualidade de vida. Contudo também podemos brevemente falar dos

movimentos que têm se desenvolvido com êxito em Rio Branco e São Paulo, onde o

contingente imigratório é maior e existem grupos que organizam e dissipam aos imigrantes as

políticas públicas existente, inclusive dando acesso ao Bolsa Família aos imigrantes que se

enquadram no Programa.

2.2 O PBF E AS CONDICIONALIDADES

Em 1994, no município de Campinas (SP) foi criado o programa Bolsa Escola, em

seguida, tal programa também foi implantado por outros municípios, e, em 2001, no governo

do, então, presidente Fernando Henrique Cardoso foi implantado pelo governo federal como

um programa de redistribuição de renda. Depois, tal programa foi incorporado, juntamente

com o programa Fome Zero, do governo seguinte, o qual tinha como objetivo erradicar a

fome no país. E por fim, foi unificado, juntamente com outros programas implantados pelo

governo FHC, que possuíam a finalidade de redistribuição de renda, no chamado Bolsa

Família.

O programa Bolsa Família (PBF) consiste na transferência de uma renda mensal por

parte do governo, para as famílias mais carentes, tal renda varia de acordo com o número de

crianças na família, sendo que para o recebimento dessa renda é necessário que sejam

cumpridas as condicionalidades do programa, as quais serão discutidas abaixo.

O Programa Bolsa Família é financiado pelos tributos pagos por cada contribuinte, de

acordo com seus rendimentos. Assim, aqueles que possuem mais posses são os que mais

contribuem para o governo, o qual usa este dinheiro, para, dentre outras coisas, financiar a

assistência social, setor de programas tais como o Bolsa Família. Desta forma, ocorre a

chamada redistribuição, os mais ricos contribuem em grande parcela para a distribuição de

renda por parte do governo para a população mais carente.

Essa redistribuição de renda é de capital importância para a economia do país, porque

com isso, melhoram-se as condições de vida das famílias mais vulneráveis da sociedade.

Trabalho de Conclusão de Curso

Segundo o Produto Interno Bruto (PIB) per capita, o Brasil é um dos mais ricos do mundo, no

entanto, o país está também entre os países com maior desigualdade social, e tal

redistribuição de renda, tem por finalidade reduzir essa desigualdade social.

Tabela 1- Valores do Programa Bolsa Família em 2016

PBF Valor

Básico 85,00 por mês

Variável a gestante 38,00 por mês

Variável de 0 a 15 anos 39,00 por criança/adolescente, limitado a 5 por

família. Variável nutriz

Variável vinculada ao adolescente 46,00 por adolescente, por mês, limitado a 2 por

família

Benefício para superação da

extrema pobreza.

O valor desta variável é calculado caso por caso para

garantir que as famílias consigam ultrapassar o limite

de renda da extrema pobre

Fonte: www.mds.gov.br acesso 08/11/2016

2.3 DIREITOS ADQUIRIDOS EM SOLO BRASILEIRO

O Brasil tem como meta, dentre seus princípios constitucionais, alcançar a dignidade

da pessoa humana. Elenca o princípio da igualdade ou isonomia que tem como significado

que todos são iguais perante a lei sem qualquer distinção. Com as políticas públicas existente

no país voltadas ao atendimento para pessoas em fragilidade social, busca-se cumprir o que

preceitua a Constituição Federal (1988), que é o maior marco regulador da nação e contempla

todos os que residem ou passem pelo Brasil.

Parte integrante das políticas públicas de Assistência Social, o PBF tem por finalidade

erradicar a fome e subsidiar famílias em fragilidade social, dando-lhes o mínimo possível de

condição humana, a fim de que lhe tenham acesso a três refeições diárias, sendo

desnecessário que a pessoa tenha contribuído de qualquer forma para subsidiar o programa,

ou tenha contribuído para a previdência social.

Assim, existe o entendimento jurídico e social de que dignidade também cabe ao

imigrante que chega ao país desde que obedeça às condicionalidades. Na inexistência de

Trabalho de Conclusão de Curso

programas específicos que atendam os imigrantes, se fez necessário o enquadramento nas

políticas já existentes que tenham abertura jurídica e social desde que obedeçam às

condicionalidades a que possam fazer jus, conforme quadro abaixo:

Tabela 1 - Condicionalidade PBF

3www.mds.gov.br acesso 08/11/2016

As duas primeiras condicionalidades dizem respeito à saúde. Uma consiste no

acompanhamento do calendário vacinal, do crescimento e desenvolvimento das crianças

menores de sete anos, ou seja, consiste em garantia de que a criança menor de sete anos,

portanto, na primeira infância seja devidamente acompanhada no que diz respeito à sua

saúde, evitando-se assim, em uma maior escala, que se aumente a mortalidade infantil.

O acompanhamento se dá conforme o calendário vacinal, peso e medidas com o

acompanhamento nutricional que é realizado por agentes de saúde comunitários ou

voluntários da pastoral da criança no caso de crianças menores de 7 anos, e, já na fase da

adolescência e da juventude o acompanhamento pode se dar conforme o programa específico

de cada fase do crescimento.

A outra consiste em observar as gestantes, quanto ao pré-natal, e acompanhar as

nutrizes. Em outras palavras, trata-se do acompanhamento da mãe e do bebê desde o ventre

até o fim da amamentação, a qual, de acordo com as mais recentes orientações do Ministério

da Saúde deve ocorrer até os dois anos de idade da criança. Mais uma vez tal diretriz tem por

3 MDS, (www.mds.br) acessado em 08.11.2016

Trabalho de Conclusão de Curso

finalidade reduzir a mortalidade infantil. Nessa condicionalidade, também é válido atentar

para o fato de que também são exigidas a participação nas atividades educativas ofertadas

pelas equipes de saúde sobre aleitamento materno e promoção da alimentação saudável.

Assim que as famílias atenderem as duas condicionalidades acima, será necessária

uma conscientização junto ao grupo de imigrante da importância do estabelecimento do

calendário vacinal, pois existe uma barreira cultural que os faz resistir à ideia de vacinação

como política de atendimento.

É preciso que seja instituído um atendimento especial de uma equipe capaz de

perceber e ajudar os haitianos a superarem essa resistência facilitando a adesão aos

programas de saúde sem causar traumas e fuga do sistema de saúde. Por fim, na área da

saúde, é necessário que seja possibilitada a garantia efetiva do atendimento aos imigrantes no

serviço de saúde pública, inclusive na saúde psicossocial, abrangendo a prevenção e detecção

de doenças infecciosas, bem como políticas de combate à proliferação do HIV/AIDS e de

atenção às vítimas. É necessário elaborar um programa de saúde para atendimento à

população refugiada e identificação de hospitais de referência, criação junto às universidades

públicas da possibilidade de atendimento odontológico, intervenção na formalização de

acordos junto às secretarias de saúde (estadual e/ou municipal) para políticas de saúde de

atendimento aos refugiados.

Ainda, no que tange ao direito à saúde dos estrangeiros é importante trazer á colação:

No tocante ao direito à saúde, a Constituição Federal brasileira em seu

artigo 194, inciso I, a universalidade da cobertura e do atendimento, e no

artigo 196 determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, já nos

artigos seguintes regulamenta o acesso à saúde no Brasil, não havendo

qualquer impedimento em relação a nacionalidade no que se refere ao

acesso a saúde, porém, segundo o artigo 199 parágrafo terceiro é vedada a

participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros na

assistência à saúde no país, salvo nos casos previstos em lei. Deste modo,

quando o estrangeiro necessitar de qualquer atendimento de saúde no Brasil

basta que ele se dirija ao posto de saúde ou hospital público mais próximo e

ele receberá o tratamento gratuito de que necessite.4 (SILVA,2010, p.45-46)

A terceira condicionalidade, por sua vez, diz respeito à educação, e consiste no fato de

que as crianças de 6 a 15 anos tenham frequência escolar mensal de, no mínimo 85%. Tal

condicionalidade tem por objetivo fazer com que os níveis de escolaridade da população

4 SILVA, Wanessa Hipólito Lemos, Direitos Sociais e a questão dos Refugiados Haitianos, p. 45-46, 2015.

Trabalho de Conclusão de Curso

sejam aumentados, garantindo também a redução do analfabetismo de crianças e

adolescentes.

A quarta e última condicionalidade do Programa Bolsa Família é a exigência de

frequência escolar mensal mínima de 75% para adolescente de 16 a 17 anos, isso porque,

nesta idade, já é permitido que os adolescentes passem a trabalhar nas empresas na condição

de aprendizes, desde que tal trabalho não prejudique o rendimento escolar dos adolescentes,

bem como sua convivência familiar. Tal política garante por sua vez, que a escolaridade da

população aumente, bem como, garante a entrada dos jovens no mercado de trabalho, com

sua profissionalização, dando-lhes oportunidade para a melhoria de sua condição social.

Quando o imigrante chega ao país na faixa etária entre 16 e 17 anos, normalmente,

vem com uma defasagem escolar, o que exige uma fiscalização do Ministério do Trabalho e

Emprego e de Conselhos Tutelares para que se cumpram as leis brasileiras, dentre as quais,

destaca-se o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que determina:

Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é regulada por legislação

especial, sem prejuízo do disposto nesta Lei.

Art. 62. Considera-se aprendizagem a formação técnico-profissional

ministrada segundo as diretrizes e bases da legislação de educação em vigor.

Com relação ao direito à educação, é importante destacar que os haitianos, que se

enquadram na categoria de estrangeiros regularizados com visto permanente podem se

beneficiar do seguinte direito:

Em relação aos estrangeiros com visto permanente, o direito à educação é

exercido da mesma forma que o direito à saúde, conforme o artigo 205 da

Constituição Federal é um direito de todos e dever do Estado, a dificuldade

de exercer tal direito à educação gratuita também está na falta de

entendimento da língua portuguesa, pois, a maioria dos profissionais da

educação básica, obrigatória e gratuita não fala outra língua, tornando difícil

o aprendizado pelos estrangeiros que não saibam falar português. Tal

realidade, no entanto muda pouco quando se fala de ensino superior, mas,

nesta etapa o aluno pode ter um maior aproveitamento porque as

universidades costumam manter programas de intercâmbio e auxiliar alunos

estrangeiros a entender a língua portuguesa com maior frequência.5

5 SILVA, Wanessa Hipólito Lemos, Direitos Sociais e a questão dos Refugiados Haitianos, p. 46-47

Trabalho de Conclusão de Curso

Além disso, podemos entender, que, ao final, o atendimento dessas quatro

condicionalidades também garante o respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA), que dispõe em seu artigo 4º:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder

público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos

referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à

profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à

convivência familiar e comunitária. (ECA 1990)

O descumprimento ou desatendimento de qualquer uma das condicionalidades acima

descritas poderá resultar no bloqueio e até mesmo no cancelamento do benefício do Programa

Bolsa Família tanto para os beneficiários brasileiros como, se por ventura for, no caso de

estrangeiros.

2.4 OS HAITIANOS EM CAMPO GRANDE (MS)

Atualmente, vivem 55 haitianos em Campo Grande, capital do Estado de Mato Grosso

do Sul, conforme pesquisa de campo realizada no período de 1º de março a 15 de setembro de

2016. Desse total, 25 são mulheres e 20 são homens, e a dinâmica social deles é diferenciada

até mesmo por sua cultura ser diferente da cultura brasileira.

Os imigrantes haitianos recebem visto humanitário para se deslocarem até o Brasil,

com isso os grupos de haitianos são compostos por homens entre 20 e 27 anos, que optam por

vir sozinhos para mudar a vida da família e retornar ao Haiti, mas também há aqueles que

imigram com seu grupo familiar, com isso as dificuldades aumentam, pois esse grupo precisa

de uma ajuda urgente por possuir crianças em seu meio. Segundo o ECA, as crianças são

prioridade absoluta e em cumprimento à lei o município deve atender com políticas públicas

e programas que alcem essas famílias. Por não serem considerados refugiados, os haitianos

acabam por se tornar invisíveis aos órgãos de fiscalização e controle. Muitos escolhem

adentrar o país por fronteiras secas onde os custos da viajem são menores.

De acordo com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS),

42.091 imigrantes já recebem o Bolsa Família no Brasil. Além disso, esta possibilidade está

prevista no Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815/1980), que afirma que “o estrangeiro residente

no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aos brasileiros”.

Trabalho de Conclusão de Curso

Nos dias 18 e 19 de agosto, o serviço será levado a Itaquiraí (MS). A ação também

será realizada em Três Lagoas (MS), onde há grande concentração de haitianos nas indústrias

e na construção civil, mas a data ainda não foi divulgada. De acordo com a assistente social

Rosângela Rodrigues de Araújo, a viagem do Haiti ao Brasil custa cerca de R$ 9 mil, valor

majorado pela ação dos atravessadores. É preciso cruzar as fronteiras da República

Dominicana, Panamá, Equador, Peru. O ingresso no Brasil é pelo Acre. Em Mato Grosso do

Sul, a primeira parada é em Campo Grande, contudo também há haitianos em outros

municípios do Estado.

O levantamento do MDS não especifica a nacionalidade de mais da metade dos

imigrantes que recebem o benefício (28.721), mas, entre aqueles com origem conhecida, os

cidadãos do Paraguai são os maiores beneficiados (3.354), seguidos dos da Bolívia (2.458),

Portugal (1.451), Japão (704), Haiti (598), Peru (591), Argentina (580), Uruguai (571),

Estados Unidos (535) e Espanha (441). Para ser beneficiário do programa, o responsável

legal precisa ter um documento brasileiro válido, que pode ser um título de eleitor ou um

CPF, segundo informações na internet da Diretoria do Cadastro Único dos Programas Sociais

do MDS.

Quando legalizados, os imigrantes recebem um CPF como qualquer brasileiro. O

atendimento dessas pessoas, portanto, não é irregular de acordo com a legislação do Bolsa

Família. Como imigrantes legais, eles possuem os mesmos direitos dos brasileiros. A

possibilidade de imigrantes e refugiados pleitearem o benefício era, até então, praticamente

desconhecida. O tema ganhou visibilidade a partir de ações realizadas pela secretaria de

Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo, com intuito de identificar e cadastrar

imigrantes de baixa renda no CadÚnico (cadastro único), porta de entrada para 15 programas

sociais do governo. Em São Paulo, o sistema de mutirão foi a forma encontrada pela capital

paulista de apresentar e inserir os imigrantes no CadÚnico.

O município de Campo Grande (MS) ainda tem dificuldades admirativas para a

inclusão desses imigrantes haitianos, pois existe uma deficiência no atendimento e na

identificação dos imigrantes em solo sul-mato-grossense, onde os profissionais de

intervenção e suas respectivas Secretarias não quantificaram e identificaram a necessidade de

acolhimento e amparo aos imigrantes. Essas instituições parecem ir na contramão dos direitos

sociais que têm sido referência no país no trato ao acolhimento a imigrantes em solo nacional,

por não os considerar uma população a quem se concederia o Bolsa Família.

Trabalho de Conclusão de Curso

No decorrer da pesquisa já se pôde deduzir que o atendimento é precário ou

inexistente. Pôde-se apontar como fator complicador a língua e qualificação dos profissionais

que acolhem. Se faz necessário que o estado disponibilize profissionais no mínimo bilíngues,

também é preciso que ocorra uma sensibilização e humanização para com os imigrantes, de

modo que os profissionais de acolhimento entendam as diferenças entre refugiados e aqueles

com visto humanitário.

Durante o período de pesquisa, foram realizadas visitas e observações, por meio das

quais se constatou que em razão da falta de documentos ou até de dificuldades de fala que o

acolhimento no município de Campo Grande ainda é precário. Já se estão criando caminhos

de inclusão na educação, por meio das convalidações de diplomas e cotas para acesso ao

ensino superior, contudo o Sistema Nacional de Emprego (SINE), que consiste em um

programa do Governo Federal, que deveria facilitar a inserção ou reinserção do trabalhador

no mercado de trabalho, ainda não consegue atender os imigrantes.

As unidades de saúde tornam-se um entrave onde o atendimento também não

acontece, em vez de ser um local de construção de entendimento entre os profissionais de

acolhimento e os imigrantes. O tempo urge e os atendimentos não têm acontecido no volume

desejado e de forma adequada.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Depois da análise realizada no presente artigo, pode-se concluir que os haitianos têm o

direito de receber os benefícios do Programa Bolsa Família limitados por conta da falta de

planejamento estatal. O Estado apesar de ter a obrigação de recepcionar essas pessoas, não se

planeja para que recebam atendimento digno e eficaz nos mais diversos setores, como da

saúde, do trabalho e da assistência social.

De fato, é impossível que o Estado tenha condições de oferecer pessoas que falem

todas as línguas com tanta celeridade, mas se houvesse planejamento estatal, quando do

aumento da entrada de haitianos no país, o Estado já possuiria pessoas capacitadas para

atender os imigrantes em todos os setores de que necessitam diretamente de auxílio, tais

como saúde, educação e assistência social.

Tal planejamento poderia possibilitar a efetivação do direito a que estas famílias

possuem de receber os benefícios do Programa Bolsa Família, bem como permitira o acesso a

Trabalho de Conclusão de Curso

outras políticas públicas a que eles têm direito. Evitaria, que muitos haitianos, que chegam ao

país e demoram para conseguir emprego, passassem fome, bem como poderia tornar mais

célere a resolução de alguns problemas para estas pessoas que poderiam estar melhor

informadas e recorrer aos órgãos aos quais devem recorrer para solucionar a questão que

precisam, ao invés de passarem meses de angústia, sem saber quais são os seus direitos e

quais são as pessoas a quem devem recorrer para a solução definitiva de quaisquer demandas

que possuam.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Paulo, 2012,14ª edição, Ed. Saraiva.

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SIMÕES, Carlos, Curso de Direito do Serviço Social, São Paulo, 2008, 2ª edição, Ed.

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TAVARES, André Ramos, Curso de Direito Constitucional, São Paulo, 2012, 10ª edição,

Ed. Saraiva.

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Amorim, DE ALMEIDA, Luciane Pinho, Migração Haitiana e relações desiguais no

trabalho em Campo Grande/MS, 2016, artigo apresentado no Seminário Internacional

Mobilidade humana hoje: Abordagens de Direitos Humanos.

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Sobre os Refugiados no Brasil, 2008, artigo publicado da REMHU, Revista de Mobilidade

Humana.