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ESTUDO ECONÔMICO-FINANCEIRO DA AGÊNCIA
NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR PARA O EQUILÍBRIO DA FUNÇÃO DE ÓRGÃO REGULADOR
por
Rosena Maria Bastos de Melo
Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em Saúde Pública.
Orientador: Profª. Drª. Maria Cristina Trindade Terra Co-Orientador: Horácio Luiz Navarro Cata Preta
Rio de Janeiro, - 2004 -
ESTUDO ECONÔMICO-FINANCEIRO DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR PARA O
EQUILÍBRIO DA FUNÇÃO DE ÓRGÃO REGULADOR
Esta dissertação, intitulada
Estudo econômico-financeiro da Agência Nacional de Saúde Suplementar
para o equilíbrio da função de órgão regulador
Apresentada por
Rosena Maria Bastos de Melo
Foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros:
Profª. Drª. Theresa Duclos - Doutora em Economia Fundação Getúlio Vargas – FGV 1ª Examinadora Prof. Dr José Mendes Ribeiro – Doutor em Saúde Pública Escola Nacional de Saúde – ENSP/FIOCRUZ 2° Examinador Prof.ª Dr.ª Maria Cristina Trindade Terra Presidente da Comissão Examinadora
Dissertação defendida e aprovada em: 05 de julho de 2004
“...o trabalho desenvolvido até o momento constitui,
sobretudo, uma rota de aprendizagem, pois seu
amadurecimento decorre de um processo contínuo
de reflexão e novas descobertas.”
Maria Stella Gregori – Diretora da ANS
Agradecimentos
Agradeço a Deus pelo dom da vida, a meus pais quem me ensinaram a persistir ideais.
Aos meus filhos por entenderem minha ausência, ao meu esposo pela compreensão e
incentivo.
Aos mestres pela partilha do conhecimento.
Aos diretores da ANS pelo apoio, e aos amigos pelo carinho.
À todos muito obrigada.
Rosena Melo
SUMÁRIO
pág.
Introdução
08
Capítulo I – Aspectos Gerais da ANS........................................................................ 11
1.1. Contextualização..................................................................................................... 11
1.2. Histórico da Saúde no Brasil.................................................................................. 14
1.3. Finalidade, Estrutura e Funcionamento da ANS.................................................... 18
1.4. Importância e Limites da Independência................................................................
22
Capítulo II – Estudo Econômico-Financeiro da ANS............................................. 25
2.1. Processo Orçamentário........................................................................................... 25
2.2. O Orçamento e Receitas da ANS........................................................................ 26
2.3. Conceitos e Instrumentos para o Diagnóstico Financeiro...................................... 29
2.4. Diagnóstico Financeiro com base nos Conceitos e Instrumentos da ANS............ 32
2.5. Desempenho Econômico-Financeiro...................................................................... 36
2.6.A Taxa de Saúde Suplementar como Principal Fonte de Recursos da ANS..........
41
Capítulo III – O Desempenho da ANS como Órgão Regulador............................. 47
3.1. A Regulação Efetivada........................................................................................... 47
3.2. Programas Desenvolvidos e Principais Resultados ............................................... 50
3.3. Perspectivas............................................................................................................ 53
3.4. Mudanças anunciadas no Governo Lula................................................................. 56
Considerações Finais e Recomendações ........................................ 59
Bibliografia......................................................................................................... 63
RESUMO
As agências reguladoras foram criadas com a intenção de normatizar os setores dos serviços públicos delegados e de buscar equilíbrio e harmonia entre o Estado, usuários e delegatários. De um modo geral, as agências adquiriram grande importância no cenário econômico nacional na medida em que passaram a deter o poder de amplos setores da atividade econômica do interesse de investidores. Por isso, o modelo das agências reguladoras foi implantado de forma a concedê-las autonomia administrativa e financeira para evitar que tanto governo quanto empresas ajam de forma oportunista. Este estudo teve como objetivo geral analisar o processo orçamentário da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, pretendendo conhecer sua limitação de receitas e a expansão de seus gastos na tentativa de avaliar sua autonomia financeira - inerente a todo órgão regulador, face ao cumprimento de suas metas estabelecidas no contrato de gestão. Para tanto, a pesquisa teve caráter exploratório com características de estudo de caso, visto a escolha de apenas uma agência dentre várias. O estudo envolveu pesquisa bibliográfica e documental sendo os dados tratados de forma qualitativa. Os resultados da pesquisa mostraram que os recursos que sustentam a ANS são oriundos da Taxa de Saúde Suplementar, de multas aplicadas e de outras receitas previstas em Lei, além dos recursos que são repassados pelo Governo Federal. Pela análise dos balanços e demonstrações contábeis constatou-se que a agência vem empregando suas atividades, seu patrimônio e os seus recursos nos fins para os quais foi instituída.
PALAVRAS-CHAVE: Agência Reguladora, autonomia financeira, recursos orçamentários.
ABSTRACT
The regulating agency had been created to make rules to the supplementary health sector of the public services looking over harmony among the State, users and the commanders. Nowadays, agencies had acquired great importance in the national economic scene in the measure where they had passed to withhold the power of ample sectors of the economic activity of the interest by investors. Therefore, the regulating agency’s model was implanted of form to grant them administrative and financial autonomy to prevent that as much government as companies act with an opportunist form. This study had an objective to analyze the budgetary process of the National Agency of Supplemental Health-NASH (ANS ), intending to know its income limitation and the expansion of its expenses in the attempt to evaluate the financial autonomy - inherent of all regulating agencies, face to the fulfillment of its goals established by the management contract. Therefore, the research had an exploiting character with characteristics of a case study, since it occurred a choice of only one agency among several. The study involved documentary and bibliographical research and the dates have been treated to qualitative form. The results of research had shown that the resources that support the ANS are deriving of Supplementary Health Tax, fines applied and other incomes foreseen by the Law, besides the resources that are repassed by the Federal Government. For the analysis the balances and countable demonstrations it was evidenced that the agency has been using its activities, patrimony and resources for which it was instituted. Finally The ANS is to improve the performance of Supplemental Health sector. Key word: Regulating agency, financial autonomy, budgetary resources.
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INTRODUÇÃO
No Brasil, as agências reguladoras são exemplos concretos da nova organização do Estado,
edificado a partir da segunda metade da década de 90. Seguindo uma forte tendência mundial,
o país começou a organizar uma nova estrutura de Estado baseada em um modelo mediador e
regulador. Dessa forma, rompe-se o modelo do monopólio estatal - resquício de modelos
interventores e criam-se as Agências Reguladoras.
Por esse novo modelo estatal, que trouxe um nível mais amplo de participação da sociedade
ao mesmo tempo em que redesenhou o próprio papel do governo, permite-se a expansão da
atividade privada em diversos campos da economia sem abrir mão da ação governamental em
promover o equilíbrio social.
A criação da ANS, no início do ano 2000, marcou a atual etapa da regulamentação de um
setor que, a partir dos anos 60, transformou-se numa relevante atividade econômica na área de
saúde. Como agência reguladora, esta também foi concebida como um tipo de entidade que,
embora mantendo algum tipo de vínculo com a Administração Central, tem em relação a ela
um acentuado grau de autonomia.
Para se saber, precisamente, em que consiste essa autonomia, recorreu-se aos estudos do Prof.
Diogo de Figueiredo Moreira Neto (2000, ps. 416/418), que aponta quatro aspectos
fundamentais dessa autonomia, sem os quais “qualquer ente regulador que se institua não
passará de uma repartição a mais na estrutura hierárquica do Poder Executivo, pois estará
impossibilitado de executar a política legislativa do setor, como se pretende que deva fazê-
lo”. São eles: a independência política dos gestores; a independência técnica decisional, que
assegura a atuação apolítica da agência; a independência normativa; e a independência
gerencial, financeira e orçamentária, que “completa o quadro que se precisa para garantir as
condições internas de atuação da entidade com autonomia na gestão de seus próprios
meios”.
Assim sendo, constitui objeto desse estudo a análise do processo orçamentário da Agência
Nacional de Saúde Suplementar – ANS, pretendendo conhecer sua limitação de receitas e a
expansão de seus gastos na tentativa de avaliar sua autonomia financeira - inerente a todo
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órgão regulador, face ao cumprimento de suas metas estabelecidas no contrato de gestão, na
tentativa de conhecer e, ao mesmo tempo, reconhecer sua independência financeira e
orçamentária para a realização das políticas regulatórias que lhes são atribuídas, e, que, para
tanto, necessita gerir, de forma independente, seus próprios recursos sem descartar a aplicação
das normas e princípios da administração.
A pesquisa teve caráter exploratório, assumindo características de estudo de caso, verificado
quando da escolha de apenas uma agência dentre várias. O estudo envolveu pesquisa
bibliográfica e documental sendo os dados tratados de forma qualitativa.
Para a realização da análise documental, a Contabilidade, na qualidade de metodologia
especialmente concebida para captar, registrar, acumular e interpretar os fenômenos que
afetam as situações patrimoniais, financeiras e econômicas de qualquer ente, foi de grande
utilidade para a interpretação dos balanços e relatórios que compõem a organização financeira
da ANS.
Assim, a partir dos dados coletados foi possível dividir esse estudo em três capítulos
buscando-se organizar esses dados de maneira sistemática e, com isso, formar um corpo
consistente de idéias. O capítulo I apresenta posições diversas, constantes na literatura, sobre
agências reguladoras, situando a criação da ANS dentro de um contexto histórico abrangente,
bem como seu papel como órgão regulador do mercado de planos de saúde.
O capítulo II apresenta um estudo econômico-financeiro da ANS, mostrando como se dá o
processo orçamentário e apresentando aspectos de sua execução de receitas e despesas. O
capítulo III apresenta as principais realizações da ANS desde a sua criação até os dias atuais,
verificando-se ali, a importância desse órgão possuir autonomia administrativa e financeira
para o desempenho do seu papel de órgão regulador e fiscalizador do setor de saúde
suplementar.
As principais fontes de consulta abrangeram livros, textos, sites da Internet, relatórios de
gestão da ANS, matérias publicadas em jornais, dentre outros. Convém ressaltar que não se
pretendeu esgotar aqui esse assunto, a idéia de reunir dados diversos em uma só pesquisa
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deveu-se unicamente a constatação da escassez de material de pesquisa sobre a ANS, que é
um acontecimento recente e possui uma história bastante complexa.
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CAPÍTULO I
ASPECTOS GERAIS DA ANS
1.1. Contextualização
A Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS é um órgão regulador criado pelo governo,
vinculado ao Ministério da Saúde, que, entre outras atribuições, fiscalizará a prestação de
serviços pelas operadoras de planos de assistência a saúde. De acordo com a Lei 9961 de 20
de janeiro de 2000, Art. Art. 3o “A ANS terá por finalidade institucional promover a defesa
do interesse público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais,
inclusive quanto às suas relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o
desenvolvimento das ações de saúde no País.”
Teoricamente, pode-se afirmar que sua origem é conseqüência do processo que pode ser
chamado de reliberalização do Estado brasileiro que se verifica atualmente. Conforme aponta
Araújo (2003), o Estado intervencionista é um fenômeno do século XX em substituição ao
modelo do Estado Liberal caracterizado pela não-intervenção deste na economia. À guisa do
que propõe o autor como conceito de reliberalização, este, envolve o resgate de certos
princípios que pareciam estar ignorados como é o caso da autonomia da vontade e do contrato
como lei entre as partes.
Nesta perspectiva o autor é claro e enfático quanto ao papel do Estado enquanto aparelho a
serviço de uma burguesia que lhe orienta os ditames. Dessa forma, analisando tanto sob o
ponto de vista marxista quanto dos liberalistas, o autor encara de forma positiva o fato do
Estado estar deixando de ser paternalista ao se livrar do pesado ônus causado pela
manutenção da Educação, Saúde e Previdência que teve de assumir durante todo o século
passado.
O autor levanta aspectos de grande relevância que perpassam por questões referentes às
mudanças e avanços gradativos no cenário econômico provocando mudanças, também, no
Direito Público e no Direito Privado, passando do fator socialização para a concorrência
inevitável entre as empresas após o fenômeno da Internet e da globalização.
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Para esse autor, a “influência significativa” no direito da concorrência representa uma forma
de interferir na administração da empresa voltada para o antitruste, ou seja, aquelas que se
comportam com vistas à restrição da concorrência e controle de preços.
Assim sendo, segundo Salgado (2003), ante a idéia da passagem ao setor privado de certas
atribuições e atividades de interesse geral, no sentido de buscar uma maior eficiência ou até
mesmo suplementar as realizações executadas pelo poder público, é que se dá a origem do
Estado Regulador imprescindível para controlar, fiscalizar as atividades, estabelecer normas
técnicas e dirimir conflitos existentes.
O Estado está, realmente, retirando-se da prestação de determinadas atividades as quais se viu
obrigado a assumir ao longo do século XX. A ampliação do grau de intervenção estatal na
economia está sendo deixada de lado.
Ao longo do século XX o Estado assumiu funções que ele nunca deteve e que se
convencionou serem inerentes a ele: a Educação, a Saúde, a Previdência. O Estado ter
responsabilidade sobre essas áreas da vida é noção sem sentido para o homem do século XIX,
por exemplo. O Estado garantindo a todos Educação, Saúde, e Previdência são fenômeno
específico do século XX, em que o capitalismo se viu envolvido numa ferrenha luta de
classes. O sistema capitalista precisou defender-se de um perigo real e forte, e, para isso, usou
o Estado com o objetivo de oferecer uma parte daquilo que era prometido pelo socialismo às
massas desprovidas.
Dessa forma, já que o socialismo fracassou, não há mais por que manter estes gastos. O
Estado, por conseqüência, retrai-se no fim do século XX, uma vez que não é mais necessário
gastar com coisas que se justificavam num momento de guerra, como a guerra fria, que só
iria acabar no fim dos anos 80, com a Glasnost e com a Perestroika; com a desarticulação dos
Estados socialistas da Europa.
Em função dessa guerra é que o Estado capitalista foi obrigado a criar e ampliar mecanismos
de Previdência Social, a prestar serviços de Educação e Saúde.
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Segundo a análise liberal a questão da redução do tamanho do Estado no fim do século XX
tem explicação bem diferente. Para esta visão o desenvolvimento da Informática, da Internet,
o aumento das possibilidades de comunicação entre pessoas dos mais diversos pontos do
Planeta, faz com que ocorra uma integração, pode-se dizer, forçada, entre as economias
nacionais. Estão dadas as condições tecnológicas de uma integração comercial planetária.
Isto, no entanto, demanda maior agilidade das diversas economias para enfrentar a
concorrência global. Esse ajuste esbarra no que se convencionou chamar de “custo-Brasil”.
Nesse contexto, o significado do “custo-Brasil” representa o quanto o preço de produtos ou
serviços fabricados ou comercializados no Brasil acresce em função do Estado Brasileiro ser
maior do que deveria. Desta forma, se a empresa brasileira competir com a de um Estado mais
liberalizado talvez nem consiga, simplesmente, competir. O economista liberal diria, portanto,
que o Estado está reduzindo porque, caso não o fizesse, as empresas brasileiras não iriam
encarar a competição com as empresas internacionais, que vivem num cenário liberal.
De uma forma ou de outra, optando pela análise marxista ou pela análise liberal, o fato é que
o Estado está se livrando de um ônus que durante o século XX, chamou para si, que é o da
manutenção de algumas comodidades para todos os cidadãos: a Educação, a Saúde e
Previdência Social.
No Brasil, a idéia de um corpo orgânico de normas de proteção ao consumidor foi lançada em
meados da década de 1970, motivada pelas inúmeras e ineficientes intervenções estatais na
economia, e sem resposta satisfatória, de inúmeros direitos dos consumidores, em ações de
que resultaram falta de produtos no mercado, sonegação de mercadorias, formação de
estoques especulativos e cobrança de ágio na comercialização, dentre outras práticas abusivas,
principalmente na década de 80.
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1.2. Histórico da Saúde no Brasil As primeiras notícias médicas registradas no Brasil datam de 1500. A princípio, a população
indígena que aqui habitava era, via de regra, muito saudável e, quando alguém adoecia era
atendida pelo pajé que conhecia as virtudes da flora nativa.
Com a colonização, os brancos trouxeram consigo os germes de algumas doenças como da
varíola e do sarampo, contaminando a população aqui existente. Posteriormente, os negros
trouxeram novas doenças como a filariose e a febre amarela.
Nesse particular, o período colonial foi caraterizado pela deficiência de medicamentos e
profissionais médicos, além da precária técnica que imperava nos hospitais, considerados
verdadeiros depósitos de doentes. Esta situação só começou a modificar-se a partir da chegada
da família real ao Brasil, em 1808.
Com o avançar da colonização, foram criados estabelecimentos hospitalares, semelhantes aos
que existiam em Portugal. Contudo, nos três primeiros séculos, as enfermarias jesuítas e,
posteriormente, as Santas Casas de Misericórdia eram as únicas formas de assistência
hospitalar disponíveis para a população.
A partir do século XVIII, surgem os primeiros hospitais militares destinados à tropa.
Anteriormente, o governo internava os soldados nas Santas Casas, mediante pagamento de
pequena remuneração. Em contrapartida, os hospitais militares passaram a receber civis,
mediante cobrança de uma taxa.
Em 1808, é criado o cargo de Provedor Mor da Saúde, ao qual, entre outras funções, compete
cuidar do controle sanitário dos portos, das quarentenas dos escravos e das medidas de higiene
geral. O cargo é extinto em 1828, ocorrendo à descentralização das atividades, atribuindo-se
às Câmaras Municipais a responsabilidade de fixar as normas sanitárias, fiscalizar o exercício
da profissão bem como o comércio de medicamentos.
Em 1850, é criada a Junta Central de Higiene Pública, com a incumbência de coordenar as
Juntas Municipais e, especialmente, atuar no combate a febre amarela. No período de 1881 até
o final do século XIX, ocorre a substituição da Junta pela Inspetoria Geral de Saúde e Higiene
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Pública. Posteriormente é criada a Inspetoria Geral de Saúde dos Portos, com a finalidade de
controlar e bloquear a entrada de doentes no país.
Em 1923, através da Lei Elói Chaves, são criadas as Caixas de Aposentadorias e Pensões para
trabalhadores das ferrovias, incluindo entre seus encargos, a assistência médica aos filiados,
iniciando-se, desta forma, uma nova fase na medicina do Brasil. As Caixas de Aposentadoria
e Pensões foram as precursoras dos Institutos de Aposentadoria e Pensões que, posteriormente
resultariam no Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).
De acordo com os registros históricos, a época de maior crescimento da Saúde no Brasil
ocorre durante a era Vargas, tendo sido criados vários hospitais e centros médicos. A
revolução de 1930 trouxe novos conceitos sociais, principalmente sobre a assistência
previdenciária e médica aos trabalhadores. Também foram criados os Ministérios da
Educação e Saúde e do Trabalho, Indústria e Comércio.
Entre 1933 e 1939, o governo Vargas unifica as diversas Caixas de Aposentadoria e Institutos
de Aposentadoria, por categoria profissional (IAPI, IAPC, IAPTEC, etc.). Posteriormente, em
1954, as Caixas de Aposentadoria e Pensão dos ferroviários e de funcionários públicos. Todas
estas alterações criaram grandes inovações na assistência médica do Brasil, porém não
abrangeram a totalidade da população, em virtude de só atenderem aos respectivos afiliados
das categorias e seus dependentes.
Durante o ano de 1953, o Ministério da Saúde esteve voltado para ações de prevenção e
pesquisa. As atividades de medicina curativa a nível individual, inclusive assistência médica e
hospitalar em geral, ficaram na área do Ministério do Trabalho e Previdência Social, a cargos
dos Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAP's). Posteriormente, com a unificação dos
institutos, passaram para a responsabilidade do Ministério da Previdência e Assistência
Social, a cargo do Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social - INAMPS.
Em 1960 surge, em São Paulo, a primeira empresa de Medicina de Grupo, a Policlínica
Central. Em 1964, surge a primeira tentativa de se dividir o pesado encargo do Estado com a
saúde, mediante a celebração dos primeiros convênios com empresas, realizada pelo extinto
IAPI. Por estes convênios, as empresas que contratavam assistência médica privada, podiam
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deduzir, da cota devida ao INPS – Instituto Nacional Previdência Social , 2% da folha de
pagamento.
Em 1980, o Ministério da Saúde começa o programa de ações integradas de saúde,
envolvendo os Estados e Municípios. Nessa época, o INAMPS, ainda está subordinado ao
Ministério da Previdência e Assistência Social e é responsável pela assistência médica
individualizada.
Como a rede governamental de hospitais e ambulatória não é suficiente para o atendimento da
população, a rede hospitalar privada é credenciada e as internações passam a ser autorizadas
através das GIH - Guias de Internação Hospitalar. Em 1986, o Ministério da Saúde cria o
SUDS - Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde substituído em 1988 pelo SUS -
Sistema Único de Saúde.
Com a promulgação da nova Constituição Federal de 1988, é institucionalizada a abertura da
assistência saúde à iniciativa privada. Os programas de Assistência Médico-Hospitalar
Privado, incluindo o Seguro Saúde, aumentam, significativamente, a sua participação no
modelo de assistência à saúde durante a década de 80, sendo os mais comuns os de Medicinas
de Grupo e Cooperativas Médicas.
Durante aquela década, devido à queda da qualidade e das condições de assistência à saúde no
setor público, como conseqüência da crise econômica que diminuiu os recursos destinados ao
setor e, por motivos estruturais, devido ao aumento da utilização do sistema pela população,
tem início um processo de valorização do sistema privado, com a procura de modalidades
alternativas.
As seguradoras, empresas de Medicina de Grupo e Cooperativas percebem a formação desse
mercado e iniciam investimentos crescentes na área, contribuindo para a proliferação das
diversas formas de Seguro Saúde.
O Ministério da Saúde é responsável pela normatização e coordenação das ações, bem como
pela liberação dos recursos para pagamento da rede hospitalar privada que mantém convênio
com o SUS.
17
As Secretarias Estaduais de Saúde são responsáveis pela coordenação das ações dos
respectivos Estados e os Municípios pela execução das atividades de assistência médica
preventiva e curativa, em sua área territorial.
Apesar da Constituição Federal de 1988, estabelecer em seu artigo 196, que “a saúde é direito
de todos e dever do Estado”, não existem recursos suficientes para viabilizar esse preceito.
Nos últimos anos, a rede pública de hospitais federais, estaduais e municipais vem sendo
submetida a um processo de deterioração acelerada por motivos diversos, como escassos
recursos orçamentários para custeio das operações e novos investimentos; desmotivação do
pessoal; falta de medicamentos e materiais, aumento da demanda devido à expansão da
população urbana e do atendimento aos contingentes rurais antes desassistidos.
Neste cenário é que se insere o papel dos Planos Privados de Saúde e Seguro Saúde, atuando
de forma a contribuir para a desoneração do Estado, com o compromisso de atendimento
eficiente a seus associados e segurados.
Conforme Marques (1998), a chamada “medicina de grupo” surgiu no ABC paulista, nos anos
60, para atender basicamente à classe trabalhadora, suprindo as necessidades de grandes
empresas em grande parte estrangeiras que ali se instalaram. Desejando proporcionar aos seus
funcionários um atendimento médico-hospitalar nos padrões de suas matrizes norte-
americanas e européias, estas empresas incentivaram a criação dos primeiros grupos médicos
no Brasil.
Assim, diante do caos do setor público, os serviços privados de saúde apresentam veloz
processo de expansão. Existem, hoje, cerca de 870 empresas prestando serviços nesse setor,
com cerca de 41 milhões de associados. Longe de significar confiança no sistema, esse
elevado número apenas demonstra o descaso de que é alvo a saúde pública no país.
Até o advento da Lei nº 9656/98 não havia nenhum controle por parte do Estado para esse
setor. Daí a necessidade de se atuar no desenvolvimento dessa atividade, ampliando a
competitividade e ao mesmo tempo protegendo o consumidor, constituiu, então, o grande
desafio da Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS criada em 2000 pela Lei nº
9961/00.
18
1.3. Finalidade, Estrutura e Funcionamento da ANS
A ANS é uma autarquia sob regime especial, com autonomia administrativa, financeira e
patrimonial, vinculada ao Ministério da Saúde, que tem como competência regulamentar e
fiscalizar os planos privados de assistência à saúde.
Diante do exposto, cabe à ANS intervir no mercado de planos de saúde que funcionava pela
vontade própria das operadoras dada a ausência de um órgão regulador que contivesse seu
comportamento, muitas vezes abusivo, nas relações contratuais que assumiam com os
compradores de planos coletivos e individuais.
Conforme Giovanella et al (2002, p. 161), “o regime de regulação por agência se integra,
ainda, às iniciativas de defesa dos consumidores por parte de entidades civis e de instituições
e organizações públicas”. Essa medida busca compensar a assimetria existente entre empresas
e consumidores de planos de saúde.
Nesse sentido, a ação regulatória é feita por meio de leis, regulamentos e outras regras
editadas pelo poder público e por entidades às quais os governos delegam poderes
regulatórios ou normativos. Assim, dependendo das suas finalidades, a regulação pode ser
econômica, social ou administrativa. O primeiro tipo, propicia a estrutura institucional para
agentes econômicos, empresas e mercados. Seu principal objetivo é facilitar, limitar ou
intensificar os fluxos e trocas de mercado, através de políticas tarifárias, princípios de
confiabilidade do serviço público e regras de entrada e saída do mercado.
O segundo tipo, a regulação social, é a que intervém na provisão dos bens públicos e na
proteção do interesse público. Define padrões para a saúde, segurança e meio ambiente e os
mecanismos de oferta universal desses bens. Já a regulação administrativa é aquela interfere
nos procedimento administrativos e burocráticos, bem como aos procedimentos
administrativos adotados pelo Poder Público em sua relação com os administrados. (BRASIL,
2003).
Conforme Art. 4º da Lei 9961/ 2000, compete à ANS, dentre outras ações:
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- propor políticas e diretrizes gerais ao Conselho de Saúde Suplementar - CONSU para a
regulação do setor de saúde suplementar;
- estabelecer as características gerais dos instrumentos contratuais utilizados na atividade
das operadoras;
- fixar critérios para os procedimentos de credenciamento e descredenciamento de
prestadores de serviço às operadoras;
- estabelecer parâmetros e indicadores de qualidade e de cobertura em assistência à saúde
para os serviços próprios e de terceiros oferecidos pelas operadoras;
- estabelecer normas para ressarcimento ao Sistema Único de Saúde - SUS;
- estabelecer normas relativas à adoção e utilização, pelas operadoras de planos de
assistência à saúde, de mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde;
- normatizar os conceitos de doença e lesão preexistentes;
- estabelecer critérios de aferição e controle da qualidade dos serviços oferecidos pelas
operadoras de planos privados de assistência à saúde, sejam eles próprios, referenciados,
contratados ou conveniados;
- estabelecer normas, rotinas e procedimentos para concessão, manutenção e cancelamento
de registro dos produtos das operadoras de planos privados de assistência à saúde;
- autorizar reajustes e revisões das contraprestações pecuniárias dos planos privados de
assistência à saúde, de acordo com parâmetros e diretrizes gerais fixados conjuntamente
pelos Ministérios da Fazenda e da Saúde; (conforme MP nº 2177-44, de 24/08/2001);
- expedir normas e padrões para o envio de informações de natureza econômico-financeira
pelas operadoras, com vistas à homologação de reajustes e revisões;
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- autorizar o registro dos planos privados de assistência à saúde;
- monitorar a evolução dos preços de planos de assistência à saúde, seus prestadores de
serviços, e respectivos componentes e insumos;
- autorizar o registro e o funcionamento das operadoras de planos privados de assistência à
saúde;
- fiscalizar as atividades das operadoras de planos privados de assistência à saúde e zelar
pelo cumprimento das normas atinentes ao seu funcionamento;
- exercer o controle e a avaliação dos aspectos concernentes à garantia de acesso,
manutenção e qualidade dos serviços prestados, direta ou indiretamente, pelas operadoras
de planos privados de assistência à saúde;
- fiscalizar a atuação das operadoras e prestadores de serviços de saúde com relação à
abrangência das coberturas de patologias e procedimentos;
- adotar as medidas necessárias para estimular a competição no setor de planos privados de
assistência à saúde;
- zelar pela qualidade dos serviços de assistência à saúde no âmbito da assistência à saúde
suplementar;
- administrar e arrecadar as taxas instituídas pela Lei.
Por ter surgido em conseqüência das falhas de mercado observadas na relação entre
operadoras de planos e seguros de saúde e os consumidores, as funções da ANS se orientam
no sentido de corrigir desequilíbrios. Assim sendo, sua avaliação de eficiência estará,
indubitavelmente, associada à sua capacidade de correção das disparidades existentes nas
relações mercado versus consumo.
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Nesse sentido, conforme explica Salgado (2004), qualquer proposta que tenha por objeto
estender a competência da ANS para regular todos os aspectos da relação usuário-prestadora,
implicaria ineficiências visto que tais aspectos já encontram eco nas instituições de defesa do
consumidor.
Quanto a Administração, a Lei 9961/200, Arts. 14 e 15 prevê que: “A administração da ANS
será regida por um contrato de gestão, negociado entre seu Diretor-Presidente e o Ministro de
Estado da Saúde e aprovado pelo Conselho de Saúde Suplementar”. “O Contrato de Gestão
estabelecerá os parâmetros para a administração interna da ANS, bem assim os indicadores
que permitam avaliar, objetivamente, a sua atuação administrativa e o seu desempenho. O
descumprimento injustificado do contrato de gestão implicará a dispensa do Diretor-
Presidente, pelo Presidente da República, mediante solicitação do Ministro de Estado da
Saúde.”
Os contratos de gestão também são considerados instrumentos de controle social que podem
(e devem) ser utilizados para acompanhar a implementação de “metas de transparências”,
visando contribuir também para a melhoria da eficiência regulatória.
De forma muito específica, um contrato de gestão, ainda que possa prever metas para
o exercício da fiscalização, deve ser utilizado primordialmente para acompanhar a
implementação de metas de transparência, contemplando em especial prazos para o
estabelecimento de forma e periodicidade dos relatórios a serem enviados ao
congresso. A formalização da relação entre a administração direta e as agências
apontam também para a importância de desenvolverem-se mecanismos visando
facilitar a previsibilidade do fluxo de recursos orçamentários e financeiros disponíveis
para as agências. (BRASIL, 2003)
O contrato de gestão é negociado entre a ANS e o Ministério da Saúde, aprovado pelo
CONSU e acompanhado por Comissão de Acompanhamento específica, integrada também
pelo Ministério do Planejamento e Orçamento, conforme exigência legal.
De acordo com Montone (2003), como agência reguladora a ANS goza das prerrogativas que
são atribuídas ao novo modelo do Estado: maior poder de atuação; autonomia política,
administrativa e financeira com arrecadação própria; decisões em Diretoria Colegiada, cujos
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membros têm mandatos definidos em lei e não coincidentes; poder legal para efetivação de
suas resoluções.
Conforme explica Salgado (2004), a origem da idéia de regulação exercida com autonomia
técnica e decisória, reside na preocupação com o problema da captura, visto que a experiência
mundo afora indica que os objetivos da regulação são melhores atendidos quanto mais
limitado for o espaço de influência de grupos de interesse – político ou econômicos – sobre as
decisões de cunho regulatório. Porém, isso não significa que as agências estejam isentas de
qualquer controle, pois tão importante quanto à autonomia é a transparência das decisões e
prestação de contas sistemática à sociedade por parte dos dirigentes dos órgãos, de modo a
evitar que esta seja exercida de forma discricionária.
Ainda conforme Montone (2003), o modelo de agência reguladora definido para a ANS é o
mesmo projetado para a ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária - diferenciando-
se, em vários aspectos, de modelos estabelecidos para outras agências como a ANATEL –
Agência Nacional de Telecomunicações, ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica e
ANP – Agência Nacional de Petróleo. O modelo da ANS e da ANVISA permite maior
interação com o Ministério ao qual são vinculadas, sendo as únicas que possuem Diretoria
Colegiada com atuação subordinada ao contrato de gestão.
A ANS também dispõe de Procuradoria-Geral, Corregedoria, Ouvidoria e de um órgão
consultivo permanente, a Câmara de Saúde Suplementar (CSS), cujos membros são
designados pelo diretor-presidente da ANS, assegurando um amplo rol de representantes do
executivo de entidades representativas no setor saúde e no mercado setorial e do Conselho
Nacional de Saúde, que proporciona à agência grande interface societária. (cf. RELATÓRIO
DE GESTÃO DA ANS, 2002/2003, P.21).
1.4. Importância e Limites da Independência
De acordo com Salgado (2003), a independência da agência é instrumento indispensável para
evitar a interferência política nos critérios de ponderação técnica entre custos privados e
benefícios coletiva da intervenção estatal na liberdade privada.
23
Conforme explica Di Pietro (2002), as agências reguladoras são dotadas de independência em
relação aos Poderes Estatais se observados os seguintes fatos: em relação ao poder
Legislativo, por editarem normas próprias focando determinado segmento de mercado; em
relação ao poder executivo, pelo fato de suas decisões serem definitivas; quanto ao judiciário,
pelo fato de solucionarem diversos litígios envolvendo a atividade reguladora e o segmento
regulado. Entretanto, observa a autora que a independência em relação ao Poder Legislativo
não é tão grande por considerar-se que as normas estabelecidas pela agência reguladora não
poderão conflitar com o vigente ordenamento legal.
Da mesma forma, diz Di Pietro (2002), também não há acentuada independência em relação
ao Poder Judiciário visto que a própria constituição da República não permite que nenhuma
lesão ou ameaça de lesão seja subtraída da apreciação do Poder Judiciário. Somente em
relação ao Poder Executivo é que se observa um grau acentuado de independência exatamente
pelo caráter definitivo dos atos emanados pela agência reguladora.
A vantagem de distanciar o regulador das partes interessadas (através da independência), é
que esse mecanismo reduz o risco de captura do regulador pelos interesses tendentes a
influenciar indevidamente o processo regulatório e impedir sua efetividade. A independência,
nesse caso, traria imparcialidade e neutralidade no exercício dos poderes regulatórios.
Contudo, tentativas de influenciar o processo regulatório com vistas à satisfação de interesses
próprios são legítimas, a dificuldade surge quando o sistema regulatório é influenciado em
uma forma não transparente, destruindo-se a imparcialidade. (BRASIL, 2003).
Segundo Majone (1999), um dos fatores mais relevantes para a criação de agências
reguladoras dotadas de graus de independência é acreditar-se na força dos conhecimentos e
experiência específicos como motor da melhoria social. Entretanto, essa especificidade
técnica, que não é detida nem pelos legisladores, nem pelos tribunais, nem pelos burocratas,
sempre foi uma fonte importante de legitimidade para as agências reguladoras, atendendo de
forma mais adequada ao “imperativo funcional” da especialização em troca de um maior grau
de autonomia frente ao poder político e à necessidade de assegurar a “continuidade das
políticas” nos setores regulados.
24
Assim sendo, a independência é vista como um modo de evitar o envolvimento da agência
reguladora com os interesses dos regulados – produtores, consumidores e outros agentes no
domínio regulatório, sendo a transparência fundamental para assegurar a independência no
exercício e no resultado das funções regulatórias.
Contudo, estruturas regulatórias independentes têm algumas desvantagens. Primeiro, o
organismo independente pode ser visto como distanciado do poder político central quanto à
formulação de políticas e, com isso, ter reduzida sua influência no desenvolvimento da
política pública. Esse distanciamento do Poder Executivo pode dar origem à negligência da
autoridade do regulador para com outros fortes atores políticos do Executivo ou Legislativo,
pode também minar a confiança na força da entidade reguladora e na significância do seu
trabalho. Segundo, pode ser argumentado que, sendo menor e mais focalizada que um
ministério, a instituição regulatória independente é mais vulnerável à captura, sendo esse fato,
muitas vezes, suficiente para reduzir a confiança na estrutura, o que reforça a importância da
existência de mecanismos que reduzam esse risco. (BRASIL, 2003).
Em alguns sistemas, a independência regulatória é obtida por intermédio de organismos
colegiados, entretanto, esses organismos podem ser vulneráveis à captura, particularmente se
seus membros interpretarem suas tarefas como uma representação das disciplinas de suas
profissões. Uma outra forma é a autarquia, nesse caso, sua independência pode ser
severamente constrangida se estiver sujeita a mecanismos que exijam aprovação ministerial
de certas decisões (como por exemplo, emissão de licenças, regras de preço, de acesso, que
tornam os ministros em instância recursal, etc.) ou quando é possível a exoneração de
dirigentes por razões de ordem política.
O mandato fixo para dirigentes é característica chave para a independência das agências,
assim como a sua não coincidência com a do Presidente da República é fundamental, pois
implica a redução da formação de expectativas dos produtores em relação a eventuais
aumentos dos custos de transação envolvidos na negociação da melhoria de uma falha de
mercado. (op. Cit).
25
CAPÍTULO II
ESTUDO ECONÔMICO-FINANCEIRO DA ANS
2.1. Processo Orçamentário
A escassez de recursos é quase sempre a realidade encontrada pelos gestores públicos.
Conforme Silva (1996), a idéia de controle dos recursos públicos era prevista já em 1300 a.C.,
quando eram reguladas as funções da justiça e arrecadação dos dízimos.
No Brasil, segundo Piscitelli (1997), somente em 1808, o início de um processo de
orçamentação começou a despertar a atenção dos gestores públicos. Foram criados então o
‘Erário Régio’ e o Conselho da Fazenda, com o fim de controlar o patrimônio real e os fundos
públicos. A partir daí, surgiram diversas constituições e outras leis complementares que
trataram dos assuntos públicos. A mais importante delas, tratando dos recursos públicos de
forma pormenorizada, representando um avanço na época e estando vigente até hoje, foi a Lei
4320/64. Junto a esta, agregando mais exigências quanto à destinação dos recursos públicos,
veio a Constituição de 1988, que estabelece também a necessidade de planejamento a médio e
longo prazo, bem como a execução e controle dos gastos públicos.
Na análise de Balleiro, citado por Sanches (1997), o orçamento é fundamental em qualquer
entidade; assim, o orçamento público, mais que uma exigência legal, pode se tornar um
instrumento estreitamente vinculado ao planejamento. Por definição, o orçamento, no regime
democrático, é o ato em que o Poder Legislativo autoriza a execução do planejamento feito
pelo Poder Executivo, onde constam as despesas necessárias para o funcionamento dos
serviços públicos (despesas de custeio) e também ao cumprimento de políticas públicas
estabelecidas, bem como a arrecadação das receitas legalmente instituídas.
Na concepção de Sanches (1997), visto como instrumento econômico, o orçamento público
proporciona, através do uso de informações sobre a situação sócio-econômica local, uma
visão de quais áreas necessitam de maiores investimentos e onde devem ser implantados
projetos de crescimento econômico e desenvolvimento social. Ele também é considerado um
26
instrumento gerencial, por ser uma fonte de informações que podem ser utilizadas pelos
gestores no intuito de melhorar a administração dos recursos públicos.
Como instrumento financeiro, “sistematiza, através de categorias apropriadas, as entradas
(receitas) e as saídas (despesas) assumindo caráter de autêntico plano financeiro”, ou seja,
torna-se um instrumento auxiliar no processo de gestão, demonstrando as prováveis entradas
de recursos e as saídas ocasionadas pelo pagamento das despesas.
Ainda conforme Sanches (1997), o orçamento é programático porque “constitui autêntico
instrumento de planejamento de curto prazo, detalhando ações, definindo os responsáveis pela
execução, organizando a distribuição espacial dos empreendimentos e fixando as metas e
custos”. Ele é, essencialmente, a representação do plano anual de gastos e investimentos de
determinado local, ressaltando as prioridades do período.
2.2. Orçamento e Receitas da ANS
O desenvolvimento institucional da ANS requer elevados investimentos necessários ao
cumprimento das funções que lhes são atribuídas e para o cumprimento do contrato de gestão
a que está submetida. Assim sendo, a agência, em conjunto com o Ministério da Saúde,
participa do processo de elaboração da proposta orçamentária da União, assim como os
demais órgãos que compõem a administração pública federal. Essa tarefa é realizada
conforme instruções contidas no Manual Técnico de Orçamento-MTO.
A proposta orçamentária compreende os orçamentos fiscais, da seguridade social e de
investimento, que, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da
República passa a Lei Orçamentária Anual, norteada pela Lei de Diretrizes Orçamentárias –
LOA e ainda no Plano Plurianual –PPA que é um instrumento de planejamento de médio
prazo do governo federal que estabelece de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e
metas da administração pública federal.
Assim, as receitas públicas são estimadas e as despesas se encontram autorizadas na lei
orçamentária, a chamada lei de meios, cuja execução o Poder Público arrecada os recursos de
27
que necessita e efetua os gastos visando à consecução do bem comum. Toda e qualquer
despesa só pode ser validamente efetivada se estiver legalmente autorizada
Em direito financeiro, a lei de diretrizes orçamentárias é, por excelência a mais graduada
norma própria da entidade estatal, vez que subsidia a elaboração e a execução de peça
essencial da administração financeira, renovável a cada ano civil: o orçamento programa.
Dessa forma, o orçamento viabiliza a realização anual dos programas mediante a
quantificação das metas e a alocação de recursos para as ações orçamentárias (projetos,
atividades e operações especiais).
Para alguns autores, em certo sentido, o orçamento é antecipação ou previsão de um gasto
público. De maneira simplificada, o orçamento é composto de expressões que descrevem
objetos de despesas (salários, equipamentos e viagens, dentre outros) ou propósitos (melhora
da saúde da população, redução das desigualdades regionais, promoção das exportações) que
são relacionados a determinados valores.
Nesse caso, pode-se dizer que os orçamentos públicos são elos entre recursos financeiros e
comportamentos humanos direcionados para alcançar objetivos de políticas públicas. Assim,
se as receitas previstas forem arrecadadas e disponibilizadas tempestivamente, e, se as
despesas foram gastas de acordo com as instruções; ou ainda, se as ações envolvidas
produzirem as conseqüências esperadas, então, teoricamente, os propósitos consignados no
orçamento serão alcançados. Por observação, é possível determinar até que ponto as previsões
postuladas no orçamento se tornam verdadeiras.
As receitas públicas são classificadas em quatro grandes grupos: receitas administradas; não
administradas; diretamente arrecadadas e operações de créditos. A Lei de Responsabilidade
Fiscal tem o objetivo de que as previsões de arrecadação de receitas sejam tão fidedignas
quanto possível, particularmente pela exigência de explicação das metodologias de cálculo e
pelo desdobramento das previsões em metas bimestrais de arrecadação. Busca também
garantir que a renúncia de receitas, na forma de anistia, remissões, subsídios, créditos
presumidos, isenções, etc., se opere em consonância com as diretrizes (Lei de Diretrizes
Orçamentárias - LDO) e metas orçamentárias (Lei Orçamentária Anual – LOA), seja pela
28
demonstração da neutralidade fiscal de seus efeitos, seja pela compensação desses efeitos,
quando não se demonstrarem neutros, na própria esfera tributária.
Define-se como despesa pública o conjunto de dispêndios do Estado ou de outra pessoa de
direito público, para o funcionamento dos serviços públicos. Nesse sentido, a despesa é parte
do orçamento, ou seja, aquela em que se encontram classificadas todas as autorizações para
gastos com as várias atribuições e funções governamentais.
Em outras palavras as despesas públicas formam o complexo da distribuição e emprego das
receitas para custeio de diferentes setores da administração. Em sentido genérico define-se
despesa pública como o conjunto de dispêndios do Estado e em sentido restrito, como a
aplicação de certa quantia, em dinheiro, por parte da autoridade ou agente público
competente, dentro de uma autorização legislativa, para execução de fim a cargo do governo.
De acordo com o artigo 12, da Lei 4.320/1964, classifica-se a despesa em categorias
econômicas de despesa de correntes e despesas de capital. As despesas correntes referem-se
ao conceito de consumo do governo na teoria Keynesiana, e as despesas de capital à idéia de
investimento do setor governamental. As despesas, que implicam correntes não produzem
qualquer acréscimo patrimonial, ao contrário das despesas de capital aumenta.
Constituem receitas da ANS, conforme Art. 17 da Lei 9961/2000:
“I - o produto resultante da arrecadação da Taxa de Saúde Suplementar de que trata o art. 18;
II - a retribuição por serviços de quaisquer natureza prestados a terceiros;
III - o produto da arrecadação das multas resultantes das suas ações fiscalizadoras;
IV - o produto da execução da sua dívida ativa;
V - as dotações consignadas no Orçamento-Geral da União, créditos especiais, créditos
adicionais, transferências e repasses que lhe forem conferidos;
29
VI - os recursos provenientes de convênios, acordos ou contratos celebrados com entidades ou
organismos nacionais e internacionais;
VII - as doações, legados, subvenções e outros recursos que lhe forem destinados;
VIII - os valores apurados na venda ou aluguel de bens móveis e imóveis de sua propriedade;
IX - o produto da venda de publicações, material técnico, dados e informações;
X - os valores apurados em aplicações no mercado financeiro das receitas previstas neste
artigo, na forma definida pelo Poder Executivo;
XI - quaisquer outras receitas não especificadas nos incisos I a X deste artigo.”
2.3. Conceitos e Instrumentos para o Diagnóstico Financeiro
A transparência dos atos da Administração Pública teve sua importância citada na Lei
4320/64 que, além de padronizar a forma como os planos de governo e execução orçamentária
deveriam ser apresentados, ressaltou a necessidade de se aplicar os recursos públicos de forma
eficaz e eficiente. Alguns aspectos foram reforçados com a Constituição Federal de 1988,
principalmente no que diz respeito às competências nos diversos âmbitos de governo e à
necessidade de prestação de contas.
Além disso, nos últimos tempos, tem-se a atenção voltada à Lei Complementar 101/2000 –
Lei de Responsabilidade Fiscal – como um esforço dos legisladores em busca da moralização
da Administração Pública, fixando novos parâmetros para a gestão dos recursos e,
principalmente, reforçando a importância do planejamento, da transparência dos atos e da
prestação de contas. Os gestores passam a ser responsabilizados pela sua atuação, que deve
ser de acordo com o interesse público.
Tudo isso contribui de forma decisiva para o aumento do controle social exercido pelos
cidadãos através da avaliação dos serviços públicos e até mesmo, em alguns casos, da sua
participação na gestão destes.
30
A contabilidade é o meio pelo qual a administração procede ao registro, controle e análise das
diferentes operações, de caráter orçamentário, financeiro e patrimonial, levadas a efeito em
seu âmbito, durante o exercício. A escrituração contábil dá ao administrador a possibilidade
de medir a sua ação em termos financeiros, fornece-lhes os elementos para a elaboração da
prestação de contas, além de dar-lhe as informações indispensáveis à tomada de decisões e ao
aperfeiçoamento da administração.
A execução contábil relativa aos atos e fatos de gestão financeira, orçamentária e patrimonial,
por parte dos Órgãos e Entidades da Administração Pública Federal obedece ao Plano de
Contas elaborado e mantido de acordo com os padrões estabelecidos, tendo como parte
integrante a Relação das Contas, a Tabela de Eventos e os Indicadores Contábeis.
O objetivo do Plano de Contas é atender, de maneira uniforme e sistematizada, ao registro
contábil dos atos e fatos relacionados com os recursos colocados à disposição dos órgãos da
Administração Direta e Indireta, de forma a proporcionar maior flexibilidade no
gerenciamento e consolidação dos dados e atender às necessidades de informações em todos
os níveis da Administração Pública Federal, pretendendo, principalmente:
- realçar o estado patrimonial e suas variações, concentrando as contas típicas de controle
nos grupos de compensação, de forma a propiciar o conhecimento mais adequado da
situação econômico-financeira da gestão administrativa;
- padronizar o nível de informações dos Órgãos da Administração Direta e Indireta com a
finalidade de auxiliar o processo de tomada de decisão, ampliando a quantidade dessas
informações e facilitando a elaboração do Orçamento Geral da União - OGU;
- permitir, através da relação de contas e tabelas, a manutenção de um sistema integrado de
informações orçamentárias, financeiras e patrimoniais na Administração Pública Federal,
com a extração de relatórios necessários a análise gerencial, inclusive Balanços e demais
Demonstrações Contábeis, capazes de atender aos aspectos legais e fiscais.
O Balanço é uma das mais importantes demonstrações contábeis, através da qual pode-se
atestar a situação patrimonial-financeira de uma entidade em determinado momento.
31
São quatro os balanços públicos (Orçamentário, Financeiro, Patrimonial e Econômico),
fixados pela Lei Federal 4.320/1964 para União, Estados e Municípios, além de vários
anexos. São publicados apenas uma vez por ano na prestação de contas, depois do final do
exercício, no intuito de tornar transparente os gastos públicos.
A análise de balanço é feita para se conhecer a real situação financeira de uma instituição e
para fins gerenciais ou de financiamento. Com base nela, fixa-se limite de crédito, valor de
empréstimo a ser concedido, nega-se este ou se tomam decisões gerenciais.
No Balanço ficam claramente evidenciados:
O Ativo – compreende os bens e os direitos da entidade demonstrando a aplicação dos
recursos.
O Passivo – compreende as contas relativas às obrigações, evidenciando as origens dos
recursos aplicados no ativo.
A Despesa – inclui as contas dos recursos despendidos na gestão, a serem computados na
apuração do resultado.
A Receita – inclui as contas dos recursos auferidos na gestão, a serem computados na
apuração do resultado.
O Resultado Diminutivo do Exercício – inclui as contas representativas de variações,
resultantes ou independentes da execução orçamentária, a serem computadas na apuração do
resultado.
O Resultado Aumentativo do Exercício – inclui as contas das variações positivas da situação
líquida do patrimônio e da apuração do resultado respectivo..
Como o modelo das agências reguladoras foi implantado de forma a concedê-las autonomia
administrativa e financeira (para evitar que funcionem como instrumento das vontades do
32
Governo Federal), os recursos que sustentam as agências vêm de multas aplicadas,
porcentagens recebidas nas concessões, entre outros.
Como sustenta Aquino (2002), não depender de receitas do Governo Federal é um passo
importante e talvez o que poderia ser o principal entrave para a autonomia. Assim, como o
interesse precípuo dessa pesquisa é verificar se a ANS tem conseguido se manter com
recursos próprios nos últimos anos de sua existência e, por isso, ter garantido sua autonomia
financeira como órgão regulador, foram analisados os seguintes Balanços: Orçamentário,
Financeiro, Patrimonial e Econômico, importando aqui, verificar as execuções das receitas
arrecadas no período de 2000 a 2003 conforme relatórios publicados pela ANS.
2.4. Diagnóstico Financeiro com Base nos Conceitos e Instrumentos da ANS
Com base nos conceitos apresentados anteriormente e de posse de instrumentos de análise
publicados pelas ANS (Balanços, relatórios, etc.) pôde-se elaborar os gráficos a seguir que
demonstram a evolução financeira da agência nos períodos já mencionados.
Gráfico I – Evolução dos recursos orçamentários Tesouro Nacional e Arrecadação Própria – 2000 a 2003
Fonte : SIAFI
Através da leitura do gráfico apresentado, pode-se afirmar que o orçamento da ANS tem sido
compatível com a obtenção de recursos, havendo, inclusive, discriminação das fontes de
receita e as previsões da despesa no balanço orçamentário estudado.
0
1 0 .0 0 0
2 0 .0 0 0
3 0 .0 0 0
4 0 .0 0 0
5 0 .0 0 0
6 0 .0 0 0
2 0 0 0 2 0 0 1 2 0 0 2 2 0 0 3
R ecurso s P ró p rio s R ecurso s d a U nião
33
Convém ressaltar que, no início de suas atividades, houve somente ingresso de recursos do
Tesouro Nacional, tendo a ANS sido financiada por receita própria somente a partir do final
do ano de 2000, quando finalmente foi aprovado seu orçamento. Contudo, seus gastos foram
crescendo à medida que aumentavam também suas atividades, tendo sido priorizadas as
despesas com ações diretamente relacionadas à sua função principal.
No período observado entre 2002 e 2003 há uma baixa considerável na arrecadação da ANS,
fato esse verificável pelas inúmeras intervenções realizadas pela agência sobre as operadoras
com funcionamento irregular. Quando isso ocorre, a agência deixa de recolher algumas taxas
que lhes são devidas, cobrando apenas as multas a que tem direito. Além disso, com as novas
exigências da ANS para registro de produtos no período de 2003, a taxa recolhida através
dessa sistemática, também decresceu.
Gráfico II – Evolução do Orçamento Aprovado e Executado – Período 2000/2003
Fonte SIAFI
A partir de então, observa-se que o crescimento das dotações provenientes dos recursos
próprios teve reflexos positivos nos saldos orçamentários que se destinam a acumular
previsões de arrecadação (receitas) para a execução de suas despesas, fundamentais para
viabilizar políticas de investimento no setor.
0
1 0 .0 0 0
2 0 .0 0 0
3 0 .0 0 0
4 0 .0 0 0
5 0 .0 0 0
6 0 .0 0 0
7 0 .0 0 0
8 0 .0 0 0
9 0 .0 0 0
1 0 0 .0 0 0
2 0 0 0 2 0 0 1 2 0 0 2 2 0 0 3
A p ro v ad o E x e c u tad o
34
Pela análise dos gráficos I e II, pode-se observar, a priori, que as Receitas e Despesas
realizadas pela ANS apresentam perfeito equilíbrio nos resultados. Tanto as receitas quanto às
despesas apresentam crescimento linear tendo em vista o próprio desenvolvimento do trabalho
de regulação. Assim, a arrecadação foi maior em determinados períodos e os gastos se
apresentam em constante evolução, na medida em que a agência foi tomando assento e seu
trabalho de fiscalização foi sendo praticado.
Gráfico III – Evolução das Despesas por Atividade – Período 2000/2003
Fonte SIAFI
As despesas enquadradas na atividade administração tratam dos gastos relativos a convênios
com instituições sem fins lucrativos, assinatura e periódicos, diárias, terceirização de mão-de-
obra, vigilância, limpeza e conservação, copeiragem, passagens, locação de veículos, ajuda de
custo, material de expedientes, locação de imóveis, energia elétrica, condomínios, serviços de
telecomunicações, ajuda de custo, publicidade, obrigações tributárias, comunicação em geral,
restituições.
As despesas da atividade Regulação e Fiscalização compõem os gastos com diárias, passagens
aéreas, convênio com organismos internacionais, serviços de publicidade, locação de
veículos, imóveis serviços de telecomunicações, terceirização de mão de obra.
Na atividade informática estão os gastos com o desenvolvimento de programas, terceirização
de mão de obra, manutenção e demais serviços de processamento de dados. Na atividade
direção fiscal estão os gastos com salários dos liquidantes e quanto à atividade pessoal são
0 5.000 10.000 15.000 20.000 25.000 30.000
2000
2001
2002
2003
Pessoal Administração Regulação e Fiscalização Direção Fiscal Informática Capacitação
35
pagos salários, benefícios, encargos sociais dos servidores requisitados (cargo efetivo) de
outros órgãos do governo federal, estadual, municipal, empresas de economia mista, pessoal
de contrato temporário, e pessoal que exerce funções de comissão (gerentes, assessores,
coordenadores).
As despesas realizadas, principalmente nos dois primeiros anos, referem-se aos gastos com
aluguéis, compra de equipamentos necessários ao desenvolvimento das atividades da
instituição, divulgação, dentre outros. Cabe salientar que a ANS iniciou seus trabalhos sem
dispor de acervo, estudo ou série histórica que lhe permitisse compreender a sistemática de
funcionamento e da complexidade do mercado em que atua. Para tanto, também desprendeu
recursos para especialização de mão-de-obra, fomentando pesquisas e investindo em cursos
técnicos e de pós-graduação para o seu pessoal.
Também foram desenvolvidos sistemas que visavam facilitar as consultas às informações
disponíveis na agência como a central de atendimento ao consumidor, o Disque ANS e a
Central de Atendimento às operadoras e prestadoras de serviços de saúde. Além desses, para a
administração interna da agência foram desenvolvidos e adquiridos aplicativos de
gerenciamento financeiro, dos recursos humanos e de compras; mais outros dois, buscados no
mercado, para auxiliar a Procuradoria Geral da ANS e o Centro de Documentação; e, foi
criado um sistema de informações para realizar as análises e os estudos necessários à
regulação e à fiscalização do setor.
36
2.5. Desempenho Econômico-Financeiro
A ANS vem ao longo dos anos, apresentado expressivo crescimento nos gastos,
principalmente com folha de pagamento e despesas administrativas. Com base na leitura da
demonstração da movimentação orçamentária da Agência, pôde-se perceber que no período
correspondente a 2000/2003, a evolução dos gastos realizados atingiu os seguintes
percentuais, segundo dados do Sistema de Administração Financeira do Governo Federal –
SIAFI.
Tabela I. Porcentual das Despesas Realizadas - Período 2000/2003.
Autoria própria
Os gastos com informática, aqui representados, devem-se as atividades de terceirização do
ramo. Quanto às despesas do quadro de pessoal (vencimentos, vantagens, gratificações, etc.)
deve-se ao quantitativo total de servidores, composto de funções de confiança exercidos por
servidores de cargo efetivo (cedidos de outros órgãos), e nomeados por cargos de comissão
(direção, gerência e assessoramento) e temporários, que são custeados com recursos da União.
O ano de 2003 foi o que apresentou maior evolução no contingente de pessoal. É provável que
tenha havido considerável aumento de contratações temporárias e outros serviços
terceirizados, posto que até o momento a agência ainda está impedida de realizar concurso
público conforme liminar do Supremo Tribunal Federal – STF. Entretanto, somente um
estudo mais detalhado pode ser garantia desse fato.
Por outro lado, verificando-se que ANS não dispõe de arrecadação própria para atender os
gastos com pessoal, tal fato torna-a dependente das verbas do governo e, segundo
Tipo de despesa PercentualFolha de Pagamento 24%Administrativas 27%Terceirização de mão-de-obra 10%Regulação e Fiscalização 34%Informática 10%Capacitação 2%
37
especialistas em regulação, esse motivo é bastante comprometedor para a independência
financeira do órgão.
Importa salientar que ANS, ao longo de sua existência, tem conseguido se manter muito mais
pelos seus recursos próprios do que pelo repasse de verbas orçamentárias do governo federal.
Convém ressaltar que o grande sustentáculo financeiro encontrado pela agência tem sido a
Taxa de Saúde Suplementar.
A tabela a seguir (Tabela n° II), apresenta uma análise dos exercícios de 2002 em
comparação a 2003, tendo em vista que a partir desse período a ANS já havia superado a fase
de instalações, refletindo a realização de suas atividades sempre voltadas ao cumprimento de
sua missão.
38
Tabela II. Comparativo da Evolução da Despesa em Percentagem – período 2002 a 2003
Fonte SIAFI
Administração
Tipo de gasto 2002 2003
Pessoal e encargos sociais 17.244.201 20.837.779 1,2
Ressarcimento pessoal requisitado 1.600.000 2.703.351 1,7
Diárias 179.580 120.763 0,7
Passgens e Locomoção 996.942 1.318.917 1,3
Apoio Administrativo 2.341.379 4.701.657 2,0
Limpeza e Conservação 69.062 177.987 2,6
Vigilância Ostensiva 85.986 100.472 1,2
Auxílio alimentação 319.196 404.795 1,3
Ajuda de custo 56.100 94.769 1,7
Indenização de moradia 989.518 1.020.262 1,0
Convênio empresa sem fins lucrativos 213.077 1.415.315 6,6
Material de Consumo 176.526 1.596.348 9,0
Assinatura e Periódicos 89.520 252.481 2,8
Serviços Técnicos Profissionais (PJ) 121.502 547.521 4,5
Locação de Imóveis 1.779.133 3.412.248 1,9
Energia Elétrica 271.347 493.348 1,8
Serviços de Comunicação em Geral 1.799.070 1.179.684 0,7
Serviços de processamento de dados 760.635 1.402.109 1,8
Serviços de telecomunicações 2.105.627 2.392.855 1,1
Serviços de Publicidade de Utilidade 183.979 421.255 2,3
Obrigações tributárias e Contribuição 922.389 525.461 0,6
Restituíções 1.258.932 1.702.246 1,4
Outras despesas de custeio 3.359.250 1.528.682 0,5
Direção Fiscal/Liquidantes 896.493 1.740.677 1,9
Total 36.922.951 48.350.306 1,3
Regulação e Fiscalização
Tipo de gasto 2002 2003
Diárias 718.319 483.054 -0,3
Passagens Aéreas 1.264.949 1.113.415 -0,1
Apoio Administrativo 3.512.069 7.052.485 1,0
Convênio com Organismos Internacionais 11.000.000 14.570.000 0,3
Material de Consumo 176.526 1.596.348 8,0
Locação de Veículos 143.823 236.945 0,6
Locação de Imóveis 593.044 1.137.416 0,9
Serviços de processamento de dados 2.281.905 4.206.327 0,8
Serviços de telecomunicações 1.403.751 1.595.237 0,1
Serviços de Publicidade de Utilidade 735.915 1.685.021 1,3
Outras despesas de custeio 3.152.727 1.284.081 -0,6
Total 24.983.028 34.960.329 0,4
Valores/Ano%
Valores/Ano%
39
Para alguns estudiosos da gestão pública é necessário buscar a melhoria dos serviços públicos
através da otimização da utilização dos recursos financeiros, por meio da eliminação dos
gastos desnecessários, ou seja, a eliminação dos desperdícios. Em relação a ANS, os
expressivos gastos com material e pessoal podem estar associados a esse fator, entretanto,
somente um estudo mais aprofundado ou até mesmo uma auditoria, poderá dar certeza disso e
oportunizar a potencialização de resultados através da eliminação dos desperdícios.
A questão do desperdício pode ser melhor compreendida a partir dos conceitos dos três
elementos que influenciam significativamente no processo operacional das entidades públicas.
Conforme explica Nogueira (2003), são eles:
♦ A necessidade de superávit: refere-se ao excedente que deverá ocorrer na realização das
despesas de custeio. Ou seja, é o resíduo na equação dos gastos públicos que possibilitará
disponibilidade de recursos para a aplicação em investimentos, e naturalmente, criando
condições de crescimento da economia.
♦ O custo como medida de desembolso: custo é o valor econômico dos recursos usados
para executar o trabalho necessário para o atendimento ao público/consumidor.
Compreende cada hora de trabalho, cada real de material e cada despesa indireta causada
pela decisão de fornecer produtos ou serviços. Se esses custos forem mantidos
suficientemente controlados, a entidade poderá esperar resultado positivo de suas
atividades;
O custo é baseado no melhor que a entidade pode oferecer com relação a máquinas, pessoas e
serviços de apoio, utilizada para criar produtos ou serviços que são valorizados pela
população. Ainda segundo Nogueira (2003), pode-se observar dois tipos de custo:
a) Custo de agregação de valor, que significa o valor econômico de recursos mínimos
necessários para se produzir produtos ou fornecer serviços ao cidadão.
b) Custo de valor não-agregado, mas exigido, que é o valor econômico dos recursos
mínimos necessários para sustentar a organização.
40
♦ Desperdícios: é representado basicamente pelos gastos realizados na produção de um
produto ou serviço, sejam eles agregadores de valor ou não, mas que representem excesso
em relação ao que seria efetivamente necessário. Sob esse enfoque, o desperdício pode ser
representado por máquinas ociosa, pessoal subtilizado, material desnecessário, encargos
financeiros desnecessários, dentre outros.
Onde quer que ocorram na organização, os desperdícios prejudicam seus resultados e o futuro
e são provocados principalmente por falhas no processo. Nesse caso, um dos maiores desafios
que seu combate pode enfrentar é a capacidade instalada excessiva. Não se deve, pois,
segundo Nogueira (2003), instituir novas frentes de trabalho a não ser que a capacidade de
todo o sistema instalado tenha se esgotado e as possibilidades de manutenção da curva
ascendente da demanda seja garantida a, pelo menos, um prazo médio. Quando se projeta uma
nova intervenção ou se acrescenta uma nova à estrutura existente, com freqüência o resultado
é desperdício por geração de capacidade ociosa.
Missões pouco claras e processos que não são enfocados também criam desperdícios,
obrigando, pessoas a fazerem menos que o desejável em termos de maximização de valor em
longo prazo. Quando não se estabelece claramente a meta, a estrutura e o enfoque de uma
entidade ou organização e de suas cadeias de valor, é muito provável que grande parte das
tarefas realizadas e dos resultados buscados pelos indivíduos ou grupos de trabalho sejam
desnecessários e causem desperdício.
Essa possível relação com o desperdício também pode ser encontrada nos estudos de alguns
especialistas em regulação que, preocupados com a excelência dos serviços prestados à
população, vêem à eficácia da regulação também associada a transparência dos gastos com os
serviços regulatórios assim como a credibilidade da sociedade na instituição reguladora.
Nesse sentido, avaliar o desempenho de órgãos público é tarefa complexa visto que não há um
índice de aferição, nota, conceito, ou outra forma de mensuração dessa natureza, dada pela
sociedade ou mesmo pelo governo.
O Legislativo, através do Tribunal de Contas da União – TCU, fiscaliza os aspectos legais e
de legitimidade. Não enfoca aspectos de economicidade ou atuação administrativa-técnica.
Nesse sentido, o contrato de gestão representa significativo avanço muito embora seja
41
incipiente para a sociedade visto que apenas avalia o desempenho e o cumprimento das metas
do ente regulador.
2.6. A Taxa de Saúde Suplementar como Principal Fonte de Recursos da ANS
Em função do exercício de seu poder de fiscalização, foi instituída a Taxa de Saúde
Suplementar que compõe receita própria da ANS. A Taxa da Saúde Suplementar - TSS,
instituída pela Lei 9961/2000, é dividida por todas as pessoas jurídicas que operam no
mercado de saúde suplementar. A respectiva taxa é composta por dois blocos: o primeiro
vinculado à contraprestação de serviços, inclui os registros de operadoras ou de produtos. O
segundo vinculado aos planos de assistência à saúde por parte das prestadoras de serviços de
saúde (operadoras), é cobrada conforme o número de usuários.
Os valores cobrados para o primeiro bloco são os apresentados a seguir, conforme atos de
saúde suplementar instituídos pela Lei 9961/2000.
Quadro I – Atos de Saúde Suplementar – Valor (R$)
Descrição R$ Registro de Produto 1.000,00 Registro de Operadora 2.000,00 Alteração de Dados – Produto 500,00 Alteração de Dados – Operadora 1.000,00 Pedido de Reajuste de Mensalidade 1.000,00
Fonte: Anexo IV da Lei 9961/2000
Conforme Art. 19 da lei 9961/200, “São sujeitos passivos da Taxa de Saúde Suplementar as
pessoas jurídicas, condomínios ou consórcios constituídos sob a modalidade de sociedade
civil ou comercial, cooperativa ou entidade de autogestão, que operem produto, serviço ou
contrato com a finalidade de garantir a assistência à saúde visando à assistência médica,
hospitalar ou odontológica”.
42
Conforme Art. 20 da mesma lei, a Taxa de Saúde Suplementar será devida:
“I - por plano de assistência à saúde, e seu valor será o produto da multiplicação de R$
2,00 (dois reais) pelo número médio de usuários de cada plano privado de assistência à saúde,
deduzido o percentual total de descontos apurado em cada plano, de acordo com as Tabelas I
e II do Anexo II desta Lei;
II - por registro de produto, registro de operadora, alteração de dados referente ao
produto, alteração de dados referente à operadora, pedido de reajuste de contraprestação
pecuniária, conforme os valores constantes da Tabela que constitui o Anexo III desta Lei.
§ 1º. Para fins do cálculo do número médio de usuários de cada plano privado de
assistência à saúde, previsto no inciso I deste artigo, não serão incluídos os maiores de
sessenta anos”.
O quadro a seguir apresenta os valores recebidos pela ANS, em exercícios anteriores a 2003,
conforme receitas a que tem direito legal, como as especificadas acima, em conformidade
com a Lei 9961/2000.
43
Tabela III. Valores Arrecadados por Atos de Saúde – Período de 2000 a 2003 (em R$ mil)
Fonte SIAFI
Tipo da Receita
Taxa de Saúde Suplementar por:
- Plano de Assistência à Saúde 37.487 32.784 33.142 36.915 140.328
- Plano de Assistência à Saúde (em atraso) 1.555 1.511 3.350 0 6.417
- Registro de Produtos 1.539 2.139 1.719 0 5.398
- Registro de Operadoras 947 461 179 133 1.719
- Alteração de Dados Cadastrais Produtos 143 186 13 0 342
- Alteração de Dados Cadastrais Operadoras 202 354 24 0 579
- Pedido de Reajuste de Contraprestação Pecuniária 0 0 404 459 862
- Devolução de TSS - Plano de Assistência à Saúde 0 -19 -106 -234 -359
- Reajuste de Mensalidades 166 410 0 209 785
- Rendimentos de Aplicação 2.031 4.910 11.136 4.346 22.423
Total (1) 44.069 42.737 49.861 41.828 178.495
- Infração a Legislação 55 25 173 661 914
Total (2) 55 25 173 661 914
- Depósitos Referente Sentenças Judiciais 0 23 0 1.730 1.753
- Parcelamento de TPS 0 0 0 82 82
- Parcelamento 0 0 190 0 190
- Parcelamento da Massa Liquidanda 0 0 0 82 82
Total (3) 0 23 190 1.894 2.107
TOTAL 44.124 42.786 50.224 44.383 181.517
TOTAL2000 2001 2002 2003
44
Numa representação gráfica os valores demonstrados podem ser visualizados na forma a
seguir:
Gráfico IV – Evolução das Receitas Arrecadadas – Período 2000/2003.
Fonte SIAFI
A Taxa de Saúde Suplementar - TSS desde sua criação com a edição da Lei 9961/200 tem
sido objeto de controvérsia e críticas jurídicas sobre a sua exigibilidade. Essas controvérsias e
críticas geralmente tem girado em torno da constitucionalidade da taxa cobrada com base no
artigo 20, inciso I da Lei citada. Os contribuintes e críticos de um modo geral alegam que este
aspecto da TSS tem base de cálculo própria de imposto, o que tem sido rebatido
veementemente pela Procuradoria Federal junto a ANS. A norma em pauta institui como
critério de apuração o número médio de associados ao plano, taxados em R$ 2,00 por
beneficiário por ano. Ou seja, será paga uma determinada quantia para cada pessoa assistida
por contrato de prestação de assistência à saúde.
Nesse particular, alguns legisladores sustentam que se deve analisar se a forma de cálculo do
montante devido se coaduna com a atividade fiscalizadora da ANS. O contribuinte, alvo da
fiscalização, é a operadora do plano de saúde, no entanto, a despesa decorrente da fiscalização
está estimada pelo legislador como decorrente do número de associados da operadora, como
se o custo das diligências de fiscalização estivesse diretamente ligado à quantidade de pessoas
que a operadora atende.
30.000
31.000
32.000
33.000
34.000
35.000
36.000
37.000
38.000
2000 2001 2002 2003
45
Na verdade, o que a operadora oferece ao associado é um contrato, que permita a este usufruir
serviços médicos, hospitalares, ou odontológicos, não necessariamente prestados pela
operadora em si, mas também por terceiros (profissionais ou empresas da área de saúde) que
mantém relação contratual com a primeira. O objeto do contrato são os serviços de assistência
à saúde proporcionados, como se depreende da legislação do Imposto sobre Serviços de
qualquer natureza, que inclui, nos itens 5 e 6 da lista anexa ao Decreto Lei 406/68, esta
modalidade de negócio jurídico entre os serviços tributados.
Visto por esse ângulo, a Taxa de Saúde Suplementar, na visão de alguns aplicadores da Lei,
não pode eleger como base de cálculo o número de associados, pois não é esta a forma que
tomam as diligências que precedem os atos de polícia praticados que ensejam a cobrança de
taxa. O tributo que se pretende cobrar não encontra fundamento de validade no ordenamento
brasileiro, podendo os contribuintes valer-se da via judicial para ver resguardado o direito de
não se submeter à exação abusiva.
As operadoras, devido à necessidade de adequar suas atividades ao interesse comum, ficam
submetidas a uma disciplina normativa específica, decorrente do Poder de Polícia latu sensu,
definido por Mello (1999, p. 553) como “o complexo de medidas do Estado que delineia a
esfera juridicamente tutelada da liberdade e propriedade dos cidadãos”. Neste ponto, porém,
não diferem de outros particulares, fiscalizados de maneira a garantir a adequação e qualidade
de seus produtos.
A doutrina e a jurisprudência brasileiras, admitindo a dificuldade prática de avaliar o real
custo das diligências ou do serviço para a Administração, optam pela teoria da “razoável
equivalência” entre o valor do tributo cobrado e o custo da atividade estatal. Por este
raciocínio, há margem de liberdade deixada pelo constituinte ao legislador ordinário para
escolher o critério de cálculo da taxa, desde que não se torne flagrantemente desproporcional
ou desarrazoado.
Contudo, toda a controvérsia sobre a constitucionalidade da TSS não impediu que 80% das
operadoras efetuassem o seu pagamento. Hoje essa taxa é a grande responsável pela
autonomia financeira da ANS que, até outubro de 2000, se manteve às custas do Ministério da
Saúde enquanto aguardava a aprovação do seu orçamento.
46
Além disso, a criação da TSS e a instituição do ressarcimento ao SUS contribuíram de forma
relevante para a criação de um banco de dados real sobre o número de beneficiários de planos
privados de assistência à saúde. Antes da exigência desse mecanismo de fiscalização, as
operadoras informavam um número de usuários bem abaixo do verdadeiro, isto porque a base
de cálculo da taxa de saúde é aferida sobre o número de usuários pertencente à operadora.
47
CAPÍTULO III
O DESEMPENHO DA ANS COMO ÓRGÃO REGULADOR
3.1. A Regulamentação Efetivada
Como é papel da ANS zelar pela adequada prestação de serviços de atenção à saúde oferecida
pelo setor privado, monitorando e fiscalizando sua eficiência, qualidade e preços praticados e
sendo sua missão - inscrita na sua própria lei criadora – “promover a defesa do interesse
público na assistência suplementar à saúde, regulando as operadoras setoriais, inclusive
quanto às relações com prestadores e consumidores, contribuindo para o desenvolvimento das
ações de saúde no País”, a ANS iniciou o processo de regulação do setor, editando normas
que permitissem a coleta das informações desse mercado.
Disciplinou critérios de ingresso, operação e saída do setor; instrumentos de acompanhamento
econômico-financeiro das operadoras; condições essenciais para registro de produtos;
aplicação de penalidades por descumprimento da lei e de sua regulamentação; transferência
de carteiras; e procedimentos para controle e adequação de preços.
Em um segundo momento, a ANS intensificou sua atuação no sentido de sanear e
profissionalizar esse mercado setorial. No âmbito econômico-financeiro, estabeleceu a
segmentação das operadoras, classificando-as segundo suas peculiaridades, e fixou a
exigência de apresentação de plano de contas padrão, de envio de informações periódicas, de
publicação de balanços e de constituição de garantias financeiras, além de disciplinar os
regimes especiais de Direção Fiscal e Técnica e de Liquidação Extrajudicial.
Conforme Maria Stella Gregory - Diretora da ANS - em discurso proferido no Senado Federal
em 2002, essa regulamentação teve reflexos concretos e imediatos para o setor. Segundo
informa, em três anos a ANS instalou 94 direções fiscais e 2 técnicas, dentre elas 8 tiveram
sua liquidação extrajudicial decretada e 3 com falência requerida, cabendo mencionar que a
48
Agência orientou a absorção da carteira pelo mercado, a fim de evitar prejuízo à continuidade
da assistência.
Por esse mesmo instrumento, foram saneadas 8 operadoras postas em direção fiscal,
permitindo que seus consumidores mantenham seus planos de assistência à saúde em
condições efetivas de receber o atendimento contratado.
Essas iniciativas adotadas evidenciam o caráter preventivo da ANS com vistas a evitar que as
operadoras cheguem ao estágio do regime especial. A Agência aprovou 30 Planos de
Recuperação dos mais de 90 por ela exigidos, o que, juntamente com outras medidas, resultou
o aumento do patrimônio das operadoras em acompanhamento na ordem de 162 milhões de
reais, a maior parcela já integralizada.
Segundo Relatório de Gestão da ANS (2000/2003), no campo da assistência, foram
regulamentados temas estratégicos para a garantia de qualidade da atenção à saúde,
destacando-se, entre outros, a atualização do rol de procedimentos obrigatórios; a definição
dos procedimentos de alta complexidade para aplicação de cobertura parcial temporária; e a
exigência de designação do coordenador médico responsável pelo fluxo de informações
relativas à assistência médica prestada aos consumidores, visando proteger o sigilo médico.
Foi também instituído o Sistema de Informações de Produtos - SIP, pelo qual as operadoras
estão obrigadas a fornecer dados sobre consultas, exames, internações, partos, média de
despesa por usuário, entre outras informações que permitem o monitoramento de seu
desempenho gerencial e assistencial.
Quanto à regulação de preços, foram fixadas normas para reajustes até abril de 2003 e
definidos mecanismos de acompanhamento da variação dos preços que não dependem de
autorização da ANS, com vistas a subsidiar a formulação de uma política efetiva de controle,
na busca da sustentabilidade do mercado.
Desde abril de 2000 – quando a Diretoria Colegiada da ANS foi plenamente constituída foram
estabelecidas as formas provisórias para operação no setor e definidas as normas necessárias
ao ressarcimento ao SUS (RDC18), que seria restrito às internações e cobrado conforme
49
tabela de valores estabelecidos pela média nacional dos valores pagos pelo SUS e aqueles
pagos pelas operadoras aos prestadores de suas redes de serviço.
Assim, segundo informações da ANS, já existe um sistema de ressarcimento ao SUS
regulamentado e implantado, tendo sido capaz de identificar mais de 300 mil atendimentos do
SUS a usuários de plano privados de saúde. Já foram arrecadados cerca de 32 milhões de reais
e estão em fase de cobrança outros 180 milhões, nos mais de 150 mil processos analisados
pela agência.
Para Maria Stella Gregory, já citada, esses resultados iniciais podem ser considerados como
um avanço significativo, já que permitirá, por esse processo de resgate, que os recursos
obtidos com o ressarcimento se revertam para a rede pública. Para aumentar sua efetividade, a
ANS está promovendo um aperfeiçoamento na sistemática de arrecadação, além de ter
aprovado a revisão dos valores dos procedimentos da Tabela Única Nacional de Equivalência
de Procedimento - TUNEP.
Dessa forma, após o marco regulatório, não mais se admite que operadoras se soergam
contando com a complementaridade dos serviços do SUS, notadamente para os
procedimentos de alta complexidade, de custo elevado ou de longa duração, como era
comum. O ressarcimento é tido como uma das molas-mestra da regulação por consistir em
medida educativa, no sentido de levar o mercado a prestar a integralidade da assistência
contratada pelo consumidor.
Há também dois instrumentos para a garantia do cumprimento da legislação: o Termo de
Compromisso de Ajuste de Conduta celebrado com as operadoras, pelo qual elas se
comprometem a cessar irregularidades e rever seus efeitos, e o Termo de Compromisso
voltado à implementação de práticas que consistam em vantagens para os consumidores.
A Câmara de Saúde Suplementar passou a ter uma atuação mais sistemática, assumindo
importância relevante na construção de uma agenda de prioridades e na avaliação dos
resultados obtidos. As instâncias de participação foram fortalecidas com a realização de
diversas Câmaras Técnicas, destinadas a discutir normas para temas específicos da
regulamentação, bem como com a instituição de Consultas Públicas, onde temas de interesse
do setor foram postos a debate e sugestões.
50
Normas sobre garantias financeiras; políticas de reajuste e revisão técnica; informações ao
cadastro de beneficiários; revisão do rol de procedimentos; alienação compulsória de
carteiras, entre outras, resultam de decisões compartilhadas entre esses setores.
Basicamente, o ano de 2003 foi dedicado ao estudo do desequilíbrio econômico e a
descompostura administrativa. Com regras de intervenção bem definidas, a ANS realizou 210
ações de intervenção no mercado. Dos 123 regimes de direção fiscal ou técnica, 105 foram
decretadas entre 2002 e 2003. Nesse mesmo período foram realizadas vinte e duas liquidações
extrajudiciais. Também ocorreu a totalidade dos registros cancelados após o encerramento dos
regimes especiais. (cf. RELATÓRIO DE GESTÃO DA ANS, 2002/2004, p. 47).
Dentre as várias realizações importantes desse período, pode-se destacar: a proibição, pela
Diretoria Colegiada da ANS, da comercialização de cartões de descontos como plano de
saúde e a prática usual do cheque-caução; o aumento em até 20 vezes o valor da multa
pecuniária no caso de infrações que produzem efeitos de natureza coletiva.
3.2. Programas Desenvolvidos e Principais Resultados
Os programas CIDADANIA ATIVA e o OLHO VIVO foram criados como resposta aos
desafios que a ação fiscalizatória enfrentaria a partir das novas normas e seus impactos nas
organizações. A ANS, em seus relatórios de gestão, considera seus resultados significativos.
Informa ainda, que esses programas não restringem as ações de fiscalização apenas à uma
dimensão punitiva, mas a projeta também como instrumento de importante transformação de
comportamento dos agentes desse mercado, contribuindo para estabelecer um novo padrão de
conduta para as operadoras tanto no que diz respeito a uma maior aderência às normas, quanto
às práticas que respeitem o consumidor.
O foco do CIDADANIA ATIVA está na participação do consumidor quando traz suas
denúncias à ANS, e o do OLHO VIVO está na ação de fiscalização permanente que envolve a
verificação das atividades das operadoras como um todo em relação ao cumprimento integral
da legislação aplicável ao setor.
51
O Programa CIDADANIA ATIVA prevê ainda o estabelecimento de padrões de atendimento,
tanto para aquele realizado pelos canais de comunicação à distância como aquele feito
pessoalmente, voltado principalmente para formar uma parceria com o consumidor nessas
atividades de controle, fiscalização e melhoria do setor, ajudando a ANS a exercer sua missão
de forma equilibrada e justa.
Pela visão da ANS, o programa não se destina à solução individualizada do problema
apresentado pelo consumidor, visto que o papel da ANS é a regulação do mercado como um
todo, diferente do papel exercido pelos órgãos de defesa do consumidor. Contudo, as
múltiplas formas de atendimento previstas para o CIDADANIA ATIVA permitem que o
consumidor de serviços de saúde suplementar seja estimulado a apresentar suas dúvidas ou
denúncias à ANS e, a partir dessa participação cidadã, são criados procedimentos que vão do
simples esclarecimento sobre a consulta trazida até a própria autuação da operadora, quando
uma infração à norma é constatada.
Assim, esse programa, além de fomentar a participação do cidadão na defesa de seus direitos,
tem também função saneadora e seus resultados estão focados na mudança do comportamento
específico, com o intuito de contribuir para a melhoria nos serviços prestados pelas
operadoras.
Alguns dos seus resultados concretos nesses três anos, segundo relatório de gestão da ANS:
- Implantação de uma Central de Atendimento, disponibilizando um serviço nacional gratuito
o Disque-ANS que, desde de julho de 2001, recebeu aproximadamente 77 mil chamadas
telefônicas entre consultas e denúncias.
Praticamente 88% desse número são atendimentos imediatos prestados ao consumidor. O
restante, em torno de 11%, que envolve cerca de 8000 demandas, constitui o foco do
cidadania ativa e sobre o qual se volta à fiscalização descentralizada da ANS, onde são
realizadas diligências ou algum tipo de verificação e, se evidenciada a procedência da
denúncia, ou seja, se há infração à legislação, é instaurado processo administrativo para
aplicação de penalidade.
52
Para esse trabalho, o Programa conta ainda com 8 Núcleos Regionais de Atendimento e
Fiscalização, situados nos Estados da Bahia, Ceará, Distrito Federal, Minas Gerais, Pará, Rio
de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo, bem como 19 Unidades Estaduais de Fiscalização,
todos orientados para ter como foco o atendimento das demandas do consumidor de plano de
saúde.
O Programa CIDADANIA ATIVA também desenvolveu parceria com o Sistema Nacional de
Defesa do Consumidor que permite, com a interface da Secretaria de Direito Econômico, do
Ministério da Justiça, permanente diálogo com os PROCONS e Entidades Civis de Defesa do
Consumidor, visando uma cooperação mútua e um encaminhamento eficaz dos assuntos de
competência de cada uma dessas entidades, para que os direitos dos consumidores possuam
efetivamente mecanismos de proteção e resolutividade.
Para tanto, a ANS tem realizado visitas sistemáticas a esses órgãos, na formação de agendas
comuns, participando dos fóruns oficiais patrocinados pelo Ministério da Justiça, programas
de treinamento e intercâmbio de informações. Além disso, a agência estuda proposta no
sentido de se estabelecer cooperação financeira para entidades que apresentem projetos que
ampliem o atendimento ao consumidor no campo da saúde suplementar.
O outro programa, OLHO VIVO, é considerado pela ANS como um modelo inovador da ação
fiscalizadora visto que esta, ocorre de forma pró-ativa, planejada e realizada de forma
continuada, com o objetivo de verificar o equilíbrio econômico-financeiro, a conformidade
legal e o padrão de qualidade dos serviços oferecidos pelas operadoras. “A própria
denominação do Programa visa traduzir a idéia de vigilância constante e ampla do
funcionamento dessas empresas”
Conforme explica Stella, esse Programa foi pensado para exercer uma função preventiva e
pedagógica, onde se espera como resultado a mudança geral de conduta das operadoras, em
face da maior nitidez e amplitude de suas responsabilidades.
Trata-se de um programa que, a partir do fluxo de informação interno e externo e da utilização
de indicadores que, por uma metodologia e modelos estatísticos construídos especificamente
para este tipo de fiscalização, extrai uma amostra do universo desse setor.
53
A meta estabelecida para o ano de 2002 foi de 200 inspeções e, até setembro do mesmo ano,
já haviam sido realizadas 182.
Essa fiscalização, segundo afirma a ANS, leva em conta a representatividade do setor, pois a
amostra considera a proporcionalidade das operadoras registradas na agência, por segmento e
faixa de beneficiários e utiliza, sobre esse universo, um ranqueamento por coeficiente de
risco. Inclui também, as operadoras denunciadas a ANS que não tenham registro (estas têm
prioridade na fiscalização).
Contudo, mesmo sendo dito por muitos que a ANS ainda está bem distante de um setor com
condições ideais de organização e funcionamento, também se admite que houve grande
avanço nessa direção.
3.3. Perspectivas
De acordo com Fausto Pereira dos Santos (Presidente da ANS/2004), em matéria publicada
em jornal de grande circulação, a perspectiva para a gestão que se inicia em seu mandato, será
cobrar das operadoras de planos de saúde o cumprimento dos contratos com os usuários e a
qualidade nos serviços que oferecem. Para tanto a agência já começou a preparar metas de
atendimento para obrigar as empresas a acompanharem de perto se os usuários estão
recebendo atendimento adequado.
Baseada no cumprimento ou não das metas, a ANS vai preparar um ranking e divulgar ao
público quais empresas têm atendimentos considerados ruins, como forma de forçar as
empresas a aperfeiçoarem os seus serviços.
Uma dessas metas poderá ser o acompanhamento do tratamento de pacientes com hipertensão,
pois, segundo Fausto “se os doentes de um plano tiverem mais AVCs que a média, a
operadora poderá estar descumprindo a meta.
As metas serão fixadas de acordo com estatísticas feitas pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A Agência também deve estabelecer metas de mortalidade materna, infantil, de
acompanhamento de diabéticos e de pessoas diagnosticada com câncer.
54
Outra novidade que está sendo preparada pela ANS é a cobrança de uma taxa das operadoras
para compensar o atendimento de usuários de planos que hoje é feito pelo sistema de saúde
pública. Atualmente a cobrança é feita por meio de um ressarcimento ao SUS, mas o governo
ainda arrecada muito menos do que gasta com atendimento de clientes de planos de saúde.
Segundo o governo, as empresas de planos de saúde têm uma dívida de R$ 225 milhões com
o SUS. A nova taxa será cobrada de cada operadora de acordo com seu número de usuário.
Assim, o governo passará a receber antecipadamente o valor do atendimento e poderá investir
em hospitais de urgência. A medida ainda exige mudanças na lei dos planos de saúde, mas
deve ser feita ainda em 2004.
Outra mudança diz respeito às regras para reajustes anuais das mensalidades dos planos. A
partir desse ano, os aumentos autorizados pela ANS para cada operadora serão baseados no
percentual que ela negociar com seus planos coletivos. Atualmente, os aumentos são
estabelecidos por uma média nacional dos valores negociados pelas operadoras com os
clientes de planos coletivos, mas sem considerar as diferenças entre empresas e regiões.
Assim, a ANS entende que, com o reajuste mais segmentado, os aumentos ficarão mais
equilibrados entre as operadoras. Para as empresas que não têm contratos coletivos, o
aumento será baseado em um índice regional.
Também há grande otimismo em relação à migração dos usuários de planos com contratos
antigos, anteriores à legislação de 1998, para os contratos mais novos e com cobertura ampla.
A expectativa do governo é que mais de 70% dos usuários façam a migração, apesar do custo
que será cobrado para os 22,3 milhões de usuários de planos antigos.
Os projetos citados pelo atual Presidente da ANS têm características de uma regulação
necessária e bem aceita pelos estudiosos da regulação. Fica clara a preocupação com a
qualidade e eficácia dos serviços oferecidos pelas operadoras. Entretanto, faltou
esclarecimento sobre como se dará a implementação dessa política no que se refere aos
recursos para custear tais ações.
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Para efetuar uma melhoria nos padrões de assistência é necessário uma ampliação das
informações que hoje são enviadas para o SIP - Sistema de Informações de Produtos,
permitindo com isso que as operadoras concebam a assistência de maneira mais atenta e com
maior seriedade nessa ampliação de informações, e, assim, exigir dos prestadores melhores
resultados, levando a uma melhoria na qualidade da assistência.
Analisando o aspecto geral do processo de regulação, pode-se dizer que no mercado ainda
existem muitas barreiras a serem enfrentadas, como minimizar a assimetria de informações
entre operadoras, consumidores e provedores de serviço e estimular a concorrência, e a ANS
tem um papel de equilíbrio fundamental na condução desses debates, sempre com foco no
principal bem a ser protegido: a saúde. Visto desse modo, o foco da regulação deve estar
direcionado às demandas do consumidor, especialmente em face da nova ordem trazida pelo
Código de Defesa do Consumidor.
Como afirma Maria Stella Gregory, citada anteriormente, “pelo pouco tempo de vida da ANS,
o momento ainda é de erros e acertos, próprios de experiências inovadoras, como são as
Agências Reguladoras, mas, inegavelmente, as mudanças até agora produzidas têm sido um
enorme aprendizado para que, no futuro, o trabalho empreendido contribua para a melhoria
dos serviços prestados pelas operadoras de planos de assistência à saúde aos seus
consumidores”.
Conforme Relatório de Gestão da ANS (2002/2003), com a exigência de celebração de
contratos formais entre operadoras e prestadores de serviços hospitalares, a ANS concluiu a
primeira etapa de regulação do setor. A principal perspectiva para o ano de 2004 é assegurar,
para os consumidores, que a prestação de serviço de saúde contratada será realmente
garantida, visto que os contratos contemplarão, obrigatoriamente, os requisitos que envolvem
diretamente o paciente, dentre várias exigências relacionadas pela agência.
Para ANS os desafios da regulação a serem vencidos ainda são grandes. Entretanto, os
objetivos da regulamentação, que surgem do marco regulatório e evoluem a partir da
ampliação do conhecimento do setor, serão mantidos e praticados. Especificamente, os
objetivos da regulamentação são: assegurar aos consumidores de planos privados de
assistência à saúde cobertura assistencial integral e regular as condições de acesso; definir e
56
controlar as condições de ingresso, operação e saída das empresas e entidades que atuam no
setor; definir e implantar mecanismos de garantias assistenciais e financeiras que assegurem a
continuidade da prestação dos serviços de assistência a saúde contratados pelos consumidores;
dar transparência e garantir a integração do setor de saúde suplementar ao SUS – Sistema
Único de Saúde e o ressarcimento dos gastos gerados por usuários de planos privados de
assistência à saúde no sistema público; estabelecer mecanismos de controle da abusividade de
preços; e definir os sistema de regulamentação, normatização e fiscalização do setor de saúde
suplementar.
3.4. Mudanças Anunciadas no Governo Lula
Depois de ampla consulta pública, realizada em 2003, pela Casa Civil da Presidência da
República, o Planalto anuncia que vai encaminhar à apreciação do Congresso Nacional o
projeto de lei sobre o novo formato para as agências reguladoras.
Mesmo antes do texto do projeto chegar ao Poder Legislativo, a matéria já causa polêmica
entre os deputados. O vice-líder da bancada do PCdoB, Daniel Almeida (BA), tende a
concordar com as modificações que o governo anunciou na consulta pública que realizou no
ano passado.
Para ele, “o conceito do PSDB e PFL, de esvaziamento do Estado, transferindo para as
agências reguladoras o papel de regulador de serviços prestados à sociedade, está esvaziado.
Por outro lado, ao instituírem essas agências sem uma infra-estrutura, eles acabaram por criar
contradições entre o papel das agências e os serviços prestados à sociedade”, destacou. “Com
o formato atual as agências não cumprem seu papel, é preciso alterar isso”, emendou.
“Nossa visão é de que o governo atual precisa remodelar as agências, para que elas existam
com força para regular o mercado, sobretudo protegendo o consumidor. As agências não estão
acima do Estado”, enfatizou. Almeida lembrou ainda que “as agências reguladoras, numa
concepção moderna de Estado podem apresentar políticas públicas estruturantes e podem ser
um braço operacional dessas políticas de governo”.
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Os parlamentares da bancada do PT também acreditam que haverá polêmica com a oposição
em torno do projeto sobre agências reguladoras. A tendência é um embate entre a base do
governo e a oposição conservadora, que concorda com o esvaziamento das funções
preponderantes do Estado.
O deputado federal Fernando Ferro (PT/PE) prevê que o projeto do governo sobre o
funcionamento das agências reguladoras deverá provocar acirrados debates. “É provável que
exista polêmica porque a visão dos partidos conservadores é de que qualquer procedimento
para retirar o controle do mercado sobre essas agências é visto como um processo de
reestatização”.
Para o deputado, é preciso definir o papel das agências reguladoras dentro do que considera
marcos republicanos. “No passado, as agências quase assumiram o caráter de empresas de
Estado capturadas pelos interesses particulares. Nosso esforço agora é transformar essas
agências em entes públicos de controle”, afirmou Fernando Ferro, para quem é inaceitável
manter o Estado afastado dessa questão num país com a desigualdade social como a do Brasil.
“A agência deve trabalhar a política de tarifas e administrar os conflitos entre os agentes do
setor. Não está havendo uma reestatização, mas o fato de o Estado brasileiro estar voltando a
planejar. Temos de ter uma política de Estado para o setor energético, como qualquer país do
mundo” declarou o parlamentar. ( por Marcos Verlaine, Brasília, 09 de março de 2004).
O projeto de lei que trata do funcionamento das agências reguladoras deverá ser enviado ao
Congresso até o final do mês. O texto já foi fechado pela Casa Civil, que aguarda a definição
do presidente do Brasil Luiz Inácio Lula da Silva a respeito de mais um ponto polêmico: a
estabilidade no cargo ou não dos presidentes das agências.
Segundo Luiz Alberto dos Santos, subchefe de Coordenação da Ação Governamental da Casa
Civil, não há possibilidade de as modificações no funcionamento das agências serem
definidas por medida provisória e haverá um único projeto. Antes, havia a possibilidade de o
governo dividir as modificações em dois projetos: um para a forma de atuação das agências e
outro para o relacionamento delas com os ministérios.
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Agora, o governo poderá decidir que a estabilidade é somente para o cargo de diretor
(membro do conselho). Nesse caso, caberia ao governo escolher o presidente da agência entre
os diretores aprovados pelo Senado. Com esse sistema, o presidente poderia ser modificado a
qualquer momento e ser substituído por outro diretor. O presidente demitido voltaria a ser um
diretor da agência.
Outra possibilidade é vincular a estabilidade ao cargo que o diretor ocupa. Dessa forma, se um
nome fosse aprovado no Senado para ocupar a presidência, teria estabilidade até o fim de seu
mandato.
O projeto que será enviado ao Congresso tem modificações em relação ao texto que havia
sido colocado em consulta pública em setembro. Os recuos no texto, no entanto, já haviam
sido anunciados pelo governo, quando foi divulgado o relatório técnico do grupo de trabalho
que elaborou os projetos.
Na ocasião, Santos já havia dito que não haveria mais possibilidade de os diretores perderem
seus mandatos caso não cumprissem metas estabelecidas nos contratos de gestão. “A minuta
(dos projetos) dava uma idéia de punição”, afirmou. (por HUMBERTO MEDINA da Folha
de S.Paulo, em Brasília 23/03/2004).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS E RECOMENDAÇÕES
Estudos recentes comprovam que a existência de agências reguladoras tem especial
importância para o bom desempenho dos setores encarregados de efetuar serviços públicos,
além dos vários benefícios que trazem para economia como um todo.
Seja por meio de agências ou por outra via qualquer, a regulação torna-se indispensável onde
haja falhas no mercado como assimetrias de informação e externalidades negativas de
impacto, para garantir que a relação entre produtores e consumidores de bens e serviços seja
eficiente quanto à qualidade, acessibilidade e quantidade do que é oferecido. Nesse sentido,
pelas análises aqui efetuadas, pode-se dizer que a Agência Nacional de Saúde Suplementar –
ANS, tem procurado exercer suas funções apesar de todas as barreiras que tem tido que
superar.
Concebida como autarquia especial e, sendo sua finalidade a de executar as diretrizes de
governo, a ANS é também responsável pela regulação social - à medida que intervém na
provisão dos bens públicos e na proteção do interesse público, definindo padrões para a saúde,
e os mecanismos de oferta universal desses bens.
Assim sendo, para seu melhor desempenho, requer gestão administrativa e financeira
descentralizada e o grau de autonomia que caracteriza esse tipo de instituição. A preocupação
com a autonomia se manifesta tendo em vista o risco de captura do órgão regulador pelos
setores regulados ou mesmo pelo governo (dependendo de seu interesse político).
Como bem salientado na literatura, esse risco pode ser agravado em situação em que se
verifica a existência de dependência dos tomadores de decisão; a influência política; quando o
grau de conhecimento tecnológico da agência reguladora é menor do que a do ente a ser
regulado; a seleção indiscriminada de quadros técnicos oriundos do setor regulado para servir
à agência; a rotatividade dos dirigentes das agências entre funções exercidas no governo e na
iniciativa privada; e quando a agência reguladora, por qualquer razão, necessita do
reconhecimento e cooperação do setor regulado.
60
O estudo econômico-financeiro da ANS, aqui apresentado, demonstra que a agência está
vulnerável há alguns desses riscos contidos na teoria da captura. Primeiramente, observa-se
que suas atribuições e competências não têm sido fortalecidas com os investimentos
necessários à provisão de recursos operacionais, financeiros e de pessoal para a realização de
todas as funções que lhes são atribuídas na legislação. Exemplo disso é a impossibilidade da
agência para a realização de concurso público para a montagem de quadro técnico. Muito
embora a agência esteja investindo em capacitação de pessoal, há que se notar a existência de
importante paradoxo: seu quadro de pessoal é fortemente caracterizado pela realização de
contratos de trabalho temporários, cujo prazo máximo de exercício, é de dois anos. Ou seja,
investe-se na preparação de pessoas que ficarão por pouquíssimo tempo na instituição. Tempo
insuficiente para dotar o órgão da necessária competência técnica para a eficácia das políticas
públicas de regulação e tão significativa para minimizar o risco de captura.
Por outro lado, a ausência de quadro técnico efetivo acarreta dispendiosos gastos não
suportados pelas receitas arrecadas da ANS, o que vem acarretando uma sobrecarga em seu
orçamento e a ausência de superávit. Além disso, essa situação pode levá-la a dependência de
recursos do governo federal o que pode representar grande entrave para a sua autonomia.
Pela análise de relatórios e outros documentos publicados pela ANS, reconhece-se que a Taxa
de Saúde Suplementar e as demais taxas devidas por atos de gestão, como registro de
produtos, dentre outros, representa o principal financiamento das ações de fiscalização,
monitoramento e operacionalização, tendo sido esse tipo de arrecadação sempre maior do que
os repasses do Tesouro Nacional.
Para alguns especialistas em regulação, até mesmo para o bom cumprimento das atribuições
legais que são previstas para a ANS, faz-se necessário um verdadeiro investimento
institucional acompanhado da necessária provisão de recursos operacionais, financeiros e
humanos para o fortalecimento das competências da agência reguladora.
Quanto à cobrança da Taxa de Saúde Suplementar – TSS, mesmo tendo sido alvo de
contestação por parte das operadoras (a cobrança da taxa tem levado o judiciário a atestar sua
inconstitucionalidade), não houve expressiva resistência, por parte das operadoras, em efetuar
o recolhimento. Em parte, isso garantiu o alcance dos resultados que estão pactuados no
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Contrato de Gestão que é celebrado entre a ANS e o Ministério da saúde, cujo intuito, é servir
de instrumento de controle quanto às metas de transparências na busca de eficiência para
garantir um setor estável e seguro para os seus operadores, usuários e prestadores.
O segundo ponto observado como fator de risco para a captura, diz respeito ao mandato fixo
para os dirigentes. Estando a escolha desses dirigentes e a possibilidade de demissão delegada
ao Poder Executivo, pode-se gerar uma idéia de enfraquecimento da autonomia administrativa
da agência, o que seria prejudicial para uma regulação estável.
Não obstante, dentre as novas medidas anunciadas pelo o atual governo em relação à agências
reguladoras, consta o fim do mandato fixo e não-coincidente para seus dirigentes. Caso essa
decisão seja mantida, há motivo de grande preocupação para com o futuro das agências
reguladoras, em particular, da ANS, visto que na visão dos mais renomados especialistas, o
mandato fixo para os dirigentes representa importante fator de inibição de pressão por parte
de grupos interessados na captura do órgão regulador sendo, portanto, a existência de mandato
fixo e a vantagem da não-coincidência, recomendada como essencial para a efetividade e
cumprimento da missão da ANS.
Não basta, portanto, a garantia Legal da autonomia financeira e administrativa. É necessário
que, na prática, essas duas concepções se estabeleçam. Ou seja, pelos estudos até então
realizados e pelo registro das várias experiências ocorridas mundo à fora, há que se concluir
que qualquer que seja a motivação para a regulação econômica, é fundamental para o bom
desempenho institucional a existência de harmonia entre as instituições regulatórias e os
ambientes político, administrativo, social e econômico, e com o sistema de regência no qual
as agências operam; independência operacional e sujeição dos agentes reguladores à prestação
de contas, visto que, a interdependência dessas práticas representa a garantia da credibilidade
do órgão regulador em face da sociedade e a minimização dos riscos da discricionariedade,
captura e desinteresse público.
Outrossim, recomenda-se um estudo mais detalhado quanto à inconstitucionalidade da
cobrança da Taxa de Saúde Suplementar – TSS, para que se possa desfazer as barreiras de
oponências que descaracterizam a autonomia para regulação, e para que se possa encontrar
medidas eficientes de modo que a efetiva regulação atenda aos interesses sociais gerais.
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Por outro lado, tendo em vista que o equilíbrio da regulação depende, em grande parte da
integração e harmonização dos três poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário), o mesmo
pode ser dito em relação a diversas gerências e diretorias que compõem a ANS, por
observações empíricas percebe-se haver distâncias substanciais entre as diversas gerências e
diretorias ali estabelecidos, com notória ausência de comunicação. Contudo somente um
estudo mais aprofundado poderia garantir que essa falha possa significar tanto uma
descontinuidade de interação, quanto falhas de planejamento para a eficiência do trabalho de
regulação.
Da mesma forma, convém a realização de uma análise mais específica que possa esclarecer se
os efetivos gastos observados podem ser caracterizados como desperdícios para que,
eliminado-os, possa haver maiores investimentos em competência técnica, fortalecimento e
aprimoramento do sistema de ouvidoria, pesquisa constante e maior formulação e
cumprimento de políticas que promovam a concorrência.
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