fas@jus - e -revista da f aculdade de direito santo...

84
FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012 1

Upload: dinhminh

Post on 13-Dec-2018

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

1

Page 2: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

2

Page 3: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

3

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho,v. 2, n. 1/2012 – ISSN 2179-8222 – Semestral – Montes Claros

EditorEditorEditorEditorEditor

Richardson Xavier Brant

e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho

Page 4: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

4

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho

Organizadores

Raíssa Neiva Melo FrancoRichardson Xavier Brant

Vívian Cristina Maria SantosWaldir de Pinho Veloso

Conselho Editorial

Edson Pires da FonsecaElton Dias Xavier

Hamilton de AlmeidaLiz Helena Silveira do AmaralRaíssa Neiva Melo FrancoRichardson Xavier Brant

Vívian Cristina Maria SantosWaldir de Pinho Veloso

Correção Linguística

Waldir de Pinho Veloso

Editoração Gráfica

Maria Rodrigues Mendes

Capa

Adriano Magno de FreitasMaria Rodrigues Mendes

Ficha catalográfica elaborada por Edmar dos Reis de Deus CRB6 2486.

FAS@JUS : e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho / Faculdade de Direito SantoAgostinho. – Vol. 2, n. 1, 2012 - . - Montes Claros, MG. Fundação Santo Agostinho, 2012-

v. : il. 21 x 29 cm.

SemestralISSN 2179-8222

1. Direito. I. Faculdade de Direito Santo Agostinho. lI. Título.

CDU: 34 (05)

Page 5: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

5

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho (FADISA),v. 2, n. 1/2012 - Semestral – Montes Claros

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ...........................................................................................................................

ENTREVISTA..................................................................................................................................

ARTIGOS DO CORPO DOCENTE

ALIMENT OS GRAVÍDICOS: DIFICULDADES NA APLICAÇÃO DA LEICyntia Mirella Cangussu Fernandes Sales.......................................................................................

A INSUFICIÊNCIA DO FINANCIAMENTO PÚBLICO DE CAMPANHAS PARA O COMBATEAO ABUSO DE PODER ECONÔMICORichardson Xavier Brant ................................................................................................................

ARTIGOS DO CORPO DISCENTE

O SISTEMA PUNITIVO: UMA TRAJETÓRIA DE POUCAS SOLUÇÕESCyntia Cybelle Pinheiro Barbosa ...................................................................................................

JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA NAS LIQUIDAÇÕES JUDICIAISAndréia Coutinho Santos ................................................................................................................

TEORIA DOS LIMITES DOS LIMITESVânio Soares Guimarães...............................................................................................................

ARTIGOS DE EGRESSOS

A REPÚBLICA: UMA ABORDAGEM SOBRE A TEORIA DA SELEÇÃO DE FÁBULAS NOENSINO JURÍDICOIgor Ramos Rosa.............................................................................................................................

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO NO DIREITOBRASILEIROLorena Moreira Santos....................................................................................................................

AUTOR CONVIDADO

AS RELAÇÕES ENTRE A VERDADE E A PROVA SOB A ÓTICA DO CONVENCIMENTOJUDICIALVitor Luís de Almeida.........................................................................................................................

RESENHA

A IDEIA DE JUSTIÇA DE AMARTYA SEN (2011)Tacyana Karoline Araújo Lopes........................................................................................................

7

9

13

19

29

37

45

55

61

69

81

Page 6: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

6

Page 7: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

7

APRESENTAÇÃO

Na ausência de um rigor normativo dos textosacadêmicos, este espaço poderia receber o título deEditorial. Não, necessariamente, de autoria exclusivado Editor, mas da coletividade dos Organizadoresda Revista como um todo.

E assim é exatamente porque há umarealização científica completa com o vir a lume demais um número da Revista Eletrônica Fas@Jus,do Curso de Direito da Faculdade de Direito SantoAgostinho. Não somente pelo fato do nascimentoliterário em si, mas pelo convencimento presente ereinante entre os Organizadores da Revista de quehá qualidades nos textos que elevam, e muito, o nívelda publicação.

A Revista Eletrônica Fas@Jus se mostrasegmentada, para efeitos de organização e leiauteinterno. A primeira seção é sempre solteira emconteúdo, pois a Entrevista é peça semcompanheirismo no espaço. E sequer haverianecessidade de mais de uma, quando se pensa noconhecimento externado, na vivência demonstradae na detenção de qualidades jurídicas quecaracterizam o entrevistado, o Representante doMinistério Público, Ivan Eleutério Campos. Aotratar das questões eleitorais, o entrevistado, comoPromotor com funções eleitorais em Montes Claros,responde a questionamentos com maestria ímpar.

A segunda seção é ponto de divulgação dostextos dos Professores do Curso de Direito daFaculdade de Direito Santo Agostinho (FADISA).Embora a Revista seja do Curso, não é dosProfessores do Curso. Assim, o segmento édestinado a, no máximo três textos científicos deautoria de Professores da Casa. A ProfessoraCyntia Mirella Cangussu Fernandes Salesocupa do tema alimentos gravídicos, analisandoa Lei 11.804, de 5-11-2008, não somente pelo seuaspecto formal, mas, por acréscimo, com a visãoprática da sua aplicabilidade. Como trabalhocientífico que é, o texto apresenta críticas pontuais,mostrando a inviabilidade da obtenção do fim socialao qual a Lei em comentário se destina, devido àsdificuldades do andamento de um processo judicialem face do inexorável caminhar de uma gravidez,cuja trajetória tem curso sem ato de enfrenar. Defato, uma vez iniciada e exceto em havendo umainterrupção por afecção ou provocada por meiosmecânicos, uma gravidez não espera por nada:

desenvolve-se por si só. De lado oposto, uma açãojudicial na qual se clama por alimentos pararobustecer essa própria gravidez, se não célere ecompatível com o evento, tornar-se-á inócua pelomenos quanto ao adjetivo “gravídicos”. É o quemostra a autora, com o que se pode chamar deestudo de caso.

Também há um artigo científico de autoria doProfessor Richardson Xavier Brant, que utilizaos seus conhecimentos jurídicos recheados deexperiência prática, em razão de ser mais do queum Juiz de Direito e Juiz Eleitoral, também o JuizDiretor do Foro Eleitoral da Comarca de MontesClaros, para mostrar os bons motivos pelos quaisdeveriam ser as campanhas políticasfinanciadas com verbas públicas. A exposição,em complemento, prova o sucesso do financiamentopúblico das campanhas eleitorais virá de umafiscalização firme em relação à prestação de contasdo dinheiro empregado na campanha, por serdinheiro oriundo do orçamento público.

Inicialmente paradoxal, o tema central do artigodo Professor Richardson Xavier Brant conduz oleitor a entender como o financiamento dascampanhas políticas com o dinheiro do público aindaficaria mais barato à sociedade do que a captaçãode verbas com pessoas que, em vez de doar valorespara a campanha política de quem tem ideiasconvergentes com as suas, tratam a entrega devalores como um “investimento” pelo qual esperaretribuição “cem por um, cinquenta por um, trintapor um”, em uma inversão da aplicabilidade do textobíblico. E este “retorno do investimento” será obtidode maneira ímproba, ilícita, em detrimento dos cofrespúblicos, cujo elemento que os enche é, exatamente,a contribuição feita pelo público. O mesmo públicoque poderia financiar campanha política com valoresna proporção de “tanto por tanto”, para ficar emexpressão jurídica.

Uma terceira seção da Revista EletrônicaFas@Jus é ocupada pelos Acadêmicos do Cursode Direito da Faculdade de Direito Santo Agostinho.Assim, comparecem Acadêmicos capazesabordando temas de Direito que se mostravam, atéentão, carentes de melhor análise. O primeiro artigocientífico da seção é de Cyntia Cybelle PinheiroBarbosa, enfocando o sistema punitivo, com umavisita aos tempos antigos – possível apenas por meio

Page 8: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

8

da história – até os dias atuais, passível de umaconfrontação física, em querendo o leitor, uma vezque a concretização do sistema prisional é marcadopelos presídios, em termos físicos, e seus interiores(físicos e quanto aos procedimentos neles existentese praticados). Outro artigo científico da seção é dalavra da Acadêmica Andréia Coutinho Santos,que entrou em detalhes quanto aos métodos de secalcular juros e correção monetária nasliquidações judiciais. Mostra o texto, inicialmente,que a Lei atribui atualização monetária a partir depontos fixados em razão da matéria. E, a busca poreste ponto inicial para colocar os valores pecuniárioscompatíveis com a época em que há a percepçãopor parte do beneficiário da Sentença, foi a tarefada qual se desincumbiu a autora.

O terceiro e último texto da seção é escritopelo Acadêmico Vânio Soares Guimarães. Sob otítulo “Teoria dos Limites dos Limites”, o textocientífico mostra quais as limitações ao poder delegislar que devem ter os autores das leis referentesaos direitos fundamentais. A limitação, pelo quedescreve o autor, não se trata necessariamente deum teto, mas o interstício que balança entre arestrição e o ponto máximo e extremo previamentefixado pelo texto constitucional, em espécie diretaou por meio de normas programáticas, além dosprincípios de observância obrigatória no segmento.

A Revista ainda traz uma seção destinada àpublicação dos textos científicos de autoria dosegressos do Curso de Direito da Faculdade de DireitoSanto Agostinho. E as presenças dos hojeprofissionais do Direito que um dia figuraram comoalunos da FADISA têm, para a Revista Fas@Jus,uma das forças que justifica a sua existência. Afinal,um elo iniciado nos tempos de bancos escolares nãose apresenta motivado a se desfazer.

Um dos egressos que comparece é IgorRamos Rosa, hoje Professor Universitário. O seutexto mostra que a teoria da seleção de fábulas,presente no livro “A República”, de Platão, é umaforma pedagógica de apresentar para as criançasuma proposta para o comportamento. E essa mesmateoria de seleção de fábulas pode ser aplicada noensino jurídico, como que mostrando o caminhodo Direito ou do dever-ser. Também há um artigocientífico de autoria de Lorena Moreira Santos,que trata da evolução histórica daresponsabilidade civil do Estado. O texto fazuma composição dos elementos históricos, mostrandoa fase em que ordenamento jurídico nacional indicava

a irresponsabilidade civil do Estado, passando peladiscussão – sob a égide do Código Civil de 1916 –sobre a responsabilidade objetiva ou subjetiva doEstado e, finalmente, alcançando a responsabilidadeobjetiva garantida pela Constituição Federal de 1988.

A seção de estreia é a dos autores convidados.A decisão do Conselho Editorial é que tal espaçoseja ocupado solitariamente, mas com autoresdiferentes a cada publicação. O artigo inserido nestaedição é de Vítor Luís de Almeida, Juiz de Direito,e abordou o tema “as relações entre a verdadee a prova sob a ótica do convencimentojudicial ”. As palavras carregam o leitor a entendercomo há a formação do convencimento do julgador,que deve se mostrar necessariamentefundamentado. Para tal, há uma abordagem sobrea prova realizada nos processos judiciais que têm afinalidade não somente de convencimento do Juizde Direito, mas, principalmente, de descortinar averdade processual que conduz a uma decisãocarregada de justiça.

A Revista se encerra com a seção Resenha.O encargo foi atribuído à Professora TacyanaKaroline Araújo Lopes, que falou sobre o tema“A Ideia de Justiça de Amartya Sen”. Trata-se,obviamente, de um trabalho crítico focado em umaobra científica, mas a autora da Resenha inicialembrando de Aristóteles, em seu livro Ética aNicômaco, que já trazia a ideia de justiça até hojeestudada em disciplinas como Teoria do Direito eFilosofia do Direito. Como tema central, há umaanálise detalhada do livro “A Ideia de Justiça”, deautoria do economista indiano Amartya Sen, com oqual foi laureado com o Prêmio Nobel de Economiaem 1998. A obra, mesmo tendo a Economia comotema principal, traz o Direito e o DesenvolvimentoSocial como atividades desenvolvidastransversalmente. A forma de exposição no livro“A Ideia de Justiça”, fez de Amatya Sen um autorestudado em vários Cursos de muitas Faculdadesem todo o mundo.

Em palavras finais, ficam os agradecimentosaos autores que fazem deste número da RevistaEletrônica Fas@Jus um repositório capaz de textosigualmente qualificados. Com a firme certeza deque a alegria de trazer à luz esta publicação restourenovada. O que se traduz em força na busca dopróximo passo, que se materializará na continuidadedeste veículo de divulgação científica.

Os Organizadores

Page 9: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

9

1) Na comemoração, neste ano de 2012, de80 anos de criação da Justiça Eleitoral, quais sãoos principais marcos da atuação reconhecidamenteeficiente no processo eleitoral?

R: É inegável que o processo eleitoralbrasileiro se mostra como um dos maiseficientes do mundo, se não o mais eficiente.A criação das urnas eletrônicas trouxereconhecido avanço, já que afastou adúvida comum quanto a real vontade doeleitor – dúvida esta criada pelos própriosinteressados – que surgia na interpretaçãodo voto escrito. Também trouxe umaapuração célere, isenta de fraudes, já queos votos recebidos pelaurna eletrônica sãoregistrados em mídia queé entregue nos cartórioseleitorais, sendo dalitransferidos imediata-mente aos TribunaisRegionais Eleitorais,cujos sistemas já apre-sentam a totalização dosresultados, com indi-cação dos eleitos e res-pectivos suplentes, estesquando se trata de eleição proporcional.

2) Nos anos recentes, sobretudo a partir dapromulgação da Constituição de 1988, revela-senítida a tendência de combate ao abuso de poder,tanto no campo político quanto econômico. O que– nesse aspecto – é mais significativo para asEleições de 2012?

R: A meu sentir, o aspecto de maiorsignificado e relevância para as eleições

ENTREVISTA

Entrevistado: Ivan Eleutério Campos1

1 Promotor de Justiça integrante do Ministério Público do Estado de Minas Gerais e designado para as funçõeseleitorais perante as Zonas Eleitorais de Montes Claros nas Eleições de 2012.

deste ano é a completa e total aplicaçãoda Lei Complementar n.º 135, de 2010 (LCn.º 135/2010), a chamada Lei da FichaLimpa. Ela trouxe um maior rigor naanálise dos requerimentos de candidaturas,bem como incrementou as sanções aosautores de atos que impliquem em abusosde poder político ou econômico.

3) Quais os temas mais importantes do atualdebate sobre o processo eleitoral?

R: Penso que um deles são as discussões arespeito do sistema eleitoral brasileiro, noque concerne à representação proporcional

nas Casas Legislativas.Também reputo relevante odebate quanto àsistematização do ProcessoEleitoral, com a elaboraçãode normas processuaisespecíficas. Além disso, éclaro, um maior aprimora-mento das regras eleitoraispara que sejam afastados dadisputa dos cargos eletivosaqueles que não apresentamconduta ilibada ou que

ostentem em sua vida pessoal ouprofissional práticas de atos ilícitos, emqualquer das esferas da vida cotidiana.

4) A Lei da Ficha Limpa (LC n.º 135/2010),fruto de iniciativa da Sociedade Civil organizada,traz que inovações importantes ao processoeleitoral?

R: Como já afirmado anteriormente, elapermite um maior rigor na análise dos

A Lei da Ficha Limpatrouxe um maior rigor

na análise dosrequerimentos decandidaturas...

Page 10: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

10

requerimentos de registro de candidatura,já que ampliou as causas deinelegibilidade e afastou da disputadiversos interessados que não preenchemplenamente as condições exigidas em leipara o exercício da capacidade eleitoralpassiva, isto é, de ser votado.

5) Quais são os principais desafios, no Brasil,para o aperfeiçoamento do processo eleitoral?

R: Penso ser necessário um estudo mais

aprofundado do sistema de representaçãonas Casas Legislativas, o estabelecimentode regras processuais próprias epermanentes para o processo eleitoral,bem como definição de regras ainda maisrigorosas para permitir ao brasileiro oexercício da capacidade eleitoral passiva,de forma a permitir que somente aquelesabsolutamente íntegros e probos possamconcorrer e exercer cargos eletivos, tãocaros e importantes ao destino dapopulação brasileira.

Page 11: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

11

ARTIGOS DO CORPO DOCENTE

Page 12: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

12

Page 13: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

13

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar aefetivação dos alimentos destinados ao nascituro,após a implementação da Lei 11.804/08. Apesar dodispositivo legal em referência, percebem-se, naprática forense, alguns embaraços na concessão dosalimentos gravídicos, seja pela dificuldade noconvencimento do magistrado encarregado deapreciar a questão, seja pela morosidade naprestação jurisdicional, que quase sempre deixa deconceder os referidos alimentos, tendo-se em vistaa perda do objeto da ação, qual seja, o nascimentoda criança. Com esse desfecho, a lei sob comentodeixa de cumprir com a sua finalidade, e não prestara necessária assistência ao ser que está por nascer.

Palavras-chave: Nascituro. Alimentos gravídicos.

ABSTRACT

This study aims to analyze the effectiveness ofthe right of maintenance for the unborn child, afterthe implementation of Law 11.804/08. Despite thelegal regulations, is perceived in the forensicpractice, great difficulties in granting alimony tounborn child, due to the difficulty in convincing themagistrate to examine the question, and the delaysin judicial assistance, which almost always fails toprovide the required right before the child‘s birth.With this outcome, the law fails to fulfill its purpose,and does not provide the necessary assistance tothe unborn child.

Keywords: unborn child. Alimony to unborn child

INTRODUÇÃO

Os alimentos gravídicos foram introduzidosno Brasil através da Lei n.º 11.804, em cinco de

ALIMENT OS GRAVÍDICOS:DIFICULDADES NA APLICAÇÃO DA LEI

Cyntia Mirella Cangussu Fernandes Sales1

novembro de 2008. Essa norma regulamentou odireito de a gestante obter, do suposto pai, alimentosque garantam uma gravidez saudável.

A referida Lei aplacou tormentosa questãona doutrina e jurisprudência brasileiras acerca dapossibilidade de concessão de alimentos aonascituro, legitimando a própria gestante a pleitear,em nome próprio, verba para manutenção de suagravidez, deixando de lado a discussão acerca daexistência ou não da personalidade de quem estarpor nascer.

Porém, outras barreiras estão sendoestabelecidas na busca pela efetivação do direitoaos alimentos no período gestacional. A primeiradelas é de cunho subjetivo, e esbarra no livreconvencimento do julgador que, deverá fixar osalimentos gravídicos quando estiver convencido deque haja indícios de paternidade.

A outra dificuldade encontrada na aplicaçãoda Lei sob análise é a falta de mecanismos eficazesda justiça para apreciar a questão em tempo hábil,haja vista que a morosidade na solução dasdemandas dessa natureza, acarreta a perda do seuobjeto, pelo transcurso do tempo, alcançando o fimda gravidez, com o consequente nascimento dacriança.

Ao longo do presente trabalho se pretendeevidenciar a Lei dos alimentos gravídicos, bemcomo as dificuldades de sua implementação,através da análise de casos concretos, cujas açõestramitaram na Comarca de Montes Claros, MinasGerais.

1 Alimentos em Direito de Família

Os alimentos são verbas fixadas para proveras necessidades imprescindíveis para a vida dequem não tem condição de manter a si próprio.Como lembra Lobo (2008), são valores nãosomente destinados à alimentação propriamentedita, como também abrangem o necessário para asubsistência como vestuário, saúde, educação,

1 Advogada. Professora da Faculdade de Direito Santo Agostinho. Especialista em Ciências Penais. Inscrita noDoutorado em Direito Civil pela Universidade de Buenos Aires.

Page 14: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

14

transporte, moradia, e tudo o mais que for essencialà manutenção de uma da vida digna.

No Direito de Família, segundo Diniz (2010),os alimentos têm por fundamentos a preservaçãoda dignidade da pessoa humana, bem como asolidificação da solidariedade social e familiar, jáque, para a autora, a obrigação de prestar alimentosse justifica em razão do parentesco, do vínculoconjugal ou da convivência familiar.

Reforçando os argumentos acima, Farias eRosenvald (2010, p. 666) afirmam: “a obrigaçãoalimentar é, sem dúvida, expressão dasolidariedade social e familiar (enraizada emsentimentos humanitários) constitucionalmenteimpostas como diretriz da nossa ordem jurídica.”.

Neste viés, segundo Lobo (2008), fazem jusà percepção de alimentos as pessoas naturais,provenientes de relação de parentesco, decasamento e de união estável, além dos idosos quenão tenham condições de manter a si próprios.

Aponta Lobo (2008), como a principal relaçãode parentesco geradora de alimentos, a existenteentre pais e filhos, pois decorrem do dever desustento, como também poderá advir da obrigaçãode prestar alimentos.

Sobre a distinção das duas circunstânciasgeradoras de alimentos, esclarece Diniz (2010, p.591):

Não se pode confundir a obrigação deprestar alimentos com os deveres familiaresde sustento, assistência e socorro que temo marido em relação à mulher e vice-versa eos pais para com os filhos menores, devidoao poder familiar, pois seus pressupostossão diferentes. A obrigação alimentar érecíproca, dependendo das possibilidadesdo devedor, e só é exigível se o credorpotencial estiver necessitado, ao passo queos deveres familiares não têm o caráter dereciprocidade por serem unilaterais e devemser cumpridos incondicionalmente.

Na relação paterno-filial, a obrigação alimentardos pais em relação aos filhos vai além dos deveresdecorrentes do poder familiar, pois permanecerá,ainda, nos casos de destituição do referido poder epoderá ser mantido, mesmo depois que o filho atingira maioridade, como lembrado por Farias e Rosenvald(2010). Basta, para tanto, que seja demonstrado,pelo filho, a necessidade de manutenção.

Percebe-se, portanto, que o dever alimentardos pais para com os filhos é bem mais abrangentedo que os alimentos fixados noutras situaçõesfamiliares também merecedoras dessa prestação,justificado inclusive por norma constitucional, já queno art. 229 da Constituição da RepúblicaFederativa do Brasil de 1988, está determinado:“Os pais têm o dever de assistir, criar e educar osfilhos menores [...]”.

Porém, apesar da importância dada peloordenamento jurídico brasileiro ao dever dealimentar na relação paterno-filial, no que concerneà obrigação de prestar alimentos ao nascituro,antes da Lei que instituiu os alimentos gravídicosnão era consenso, entre os doutrinadores e tribunaispátrios, a constituição da obrigação alimentar nessacircunstância.

Segundo Dias (2009), havia uma tendênciaao reconhecimento da obrigação alimentar paternasomente depois do nascimento do filho. Momentoa partir do qual estaria o filho autorizado a se dirigira um Tribunal em busca do direito alimentar. Éque, segundo o Código Civil, art. 2.°, primeira parte,é com o nascimento com vida que há o início dapersonalidade civil.

Desconsiderava-se, dessa forma, o dispostono Código Civil Brasileiro de 2002, art. 2.°, in fine,que determina a preservação dos direitos donascituro desde a sua concepção; nelescompreendidos, inclusive, o direito de nascer.

Muito embora fosse esse o entendimentopredominante – a obrigação e prestação dealimentos somente após o nascimento – algunsvisionários e entendedores do verdadeiro sentidoda prestação alimentar já disseminavam a ideia deque a obrigação alimentar poderia começar antesmesmo do nascimento, a fim de garantir aonascituro um desenvolvimento saudável, comconsequente nascimento viável.

Esse pensamento é compartilhado por PabloStolze Gagliano2. Já em 2006, muito antes da Lei11.804/08, ele já defendia a ideia de que havia odever alimentar do companheiro reconhecido aofilho que estaria por nascer, por ser injusta asituação de a mãe ter que arcar, sozinha, com todasas despesas decorrentes da gestação. Ejustificavam Gagliano e Pamplona Filho (2006, p.86) antes mesmo da norma em comentário: “Talmatéria, embora não seja objeto de legislaçãoexpressa, pode ser reconhecida judicialmente em

2 Doutrinador e Juiz de Direito no Estado da Bahia.

Page 15: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

15

função da necessidade de proteção do feto paraseu regular desenvolvimento.”.

Assim, alguns Tribunais concediam aonascituro a possibilidade de receber alimentos dosuposto pai. E outros Tribunais, negavam-lhe essesdireitos. E nessa circunstância, seria a mãe a únicaresponsável por garantir ao ser que ainda nãonasceu, o direito a um desenvolvimento regular ea um nascimento saudável.

2 Alimentos Gravídicos e os Problemas nasua Aplicação

Como anteriormente noticiado, a Lei n.º11.804/08 instituiu os alimentos gravídicos no Brasila fim de auxiliar a mulher grávida na suamanutenção, desde a concepção ao nascimentode seu filho, para atender às necessidades de suasituação especial no que se refere à alimentaçãodiferenciada, à assistência médica e psicológica, àlocomoção, aos exames pré-natais, aosmedicamentos e demais prescrições médicasatinentes a essa condição. Além disso, comolembrado por Farias e Rosenvald (2010), a fixaçãodessa verba alimentar deve abarcar, também, asdespesas necessárias à formação do enxoval dobebê que está por vir.

Para a fixação da verba alimentar nessacircunstância, o juiz deverá levar em conta asituação econômica paterna, considerando também,a contribuição da própria mãe na proporção deseus recursos. Observará, ainda, como na fixaçãodos alimentos devidos aos filhos, o binômiopossibilidade/necessidade, bem como o princípioda proporcionalidade.

A Lei sob comento determina que osalimentos deverão ser fixados a partir do meroindício de paternidade, deixando a cargo do supostopai, para se ver livre da obrigação alimentar, a provade que não existe entre ele e o nascituro relaçãopaterno-filial.

Embora ainda muito cedo para se avaliar,diante da novidade da Lei em questão, o que seobserva até o momento é que a concessão dosalimentos na gravidez se efetiva com tranquilidade,quando proveniente de uma relação matrimonialpor força da presunção operada no art. 1.597, incisoII, do Código Civil brasileiro de 2002. Traz assimgravado desse Código:

Art. 1.597. Presumem-se concebidos naconstância do casamento os filhos:[...]II – nascidos nos trezentos dias

subseqüentes à dissolução da sociedadeconjugal, por morte, separação judicial,nulidade e anulação do casamento.

Observa-se, ainda, que, quando da existênciade uma união estável reconhecida, para que haja aconcessão dos alimentos na gravidez, aplica-se,analogicamente, a mesma presunção aplicada aomatrimônio. Daí, ser também tranquilo oreconhecimento do direito disposto na Lei n.º11.804/08.

Em outras relações, porém, não é tão simplesevidenciar o vínculo de paternidade/filiaçãoessencial para a concessão dos alimentos nagravidez. Para se conceder os alimentos gravídicos,o juiz deverá se basear em mero indício depaternidade, não se exigindo, segundo Farias eRosenvald (2010), uma prova irrefutável daperfilhação. Entretanto, a análise indiciária ésubjetiva, e o que é indício para alguns magistrados,não o será para outros.

Se não bastasse a fragilidade da análiseindiciária proposta pelo legislador, relações há emque não é possível constatar nenhum indício depaternidade, seja pela efemeridade dosrelacionamentos, seja pela clandestinidade naforma como eles se perfazem, o que dificulta aprodução de provas nessas circunstâncias,impossibilitando a concessão dos alimentospleiteados pela gestante.

Quando da determinação da necessidade daprodução da mera prova indiciária, o legisladorexcluiu a necessidade da realização do exame doDNA, pois para muitos doutrinadores (FARIAS;ROSENVALD, 2010), apesar de ser provairrefutável, traria riscos ao nascituro.

Assim, a fixação dos alimentos gravídicosdeverá ser baseada no livre convencimento do juiz.E como dito, o que convence a um julgador nãonecessariamente convencerá a outro. Umafotografia, por exemplo, que para um magistradopoderá ser considerada como um forte indício depaternidade, nem sempre se apresentará comoeficaz para convencer a um outro.

Na prática forense se observa que, não seconvencendo o juiz da prova documentalapresentada na inicial, tratam de marcar umaaudiência prévia para a oitiva da mãe, e quandocitado, também do suposto pai, para averiguar osindícios de paternidade.

Só que nem sempre essa audiência se mostraviável, pois quando se consegue um lugar naapertada pauta de audiências, a grávida, a ser

Page 16: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

16

ouvida, já não se encontra em situação que lhepermita assumir compromissos pelo avançar dagravidez. Em outros casos, mesmo com a oitivada mãe, não ocorre o convencimento domagistrado, necessitando, dessa forma, de umamaior dilação probatória. E nessa corrida contra otempo, sempre quem perde é o nascituro, que deixade ser assistido no seu período gestacional.

Ante as dificuldades probatórias nessa searada intimidade das pessoas, o julgador deveriaconceder os alimentos pleiteados sempre queestiver diante de uma situação de paternidadeprovável, e deixar a cargo do suposto pai, a provade que não é o responsável pela gravidez dagestante autora.

Ademais, a prática forense tem demonstradoque dificilmente uma mãe procura o PoderJudiciário sem que haja qualquer chance de ser overdadeiro pai do filho que carrega, quem elaaponta como suposto pai.

Ao se negar a fixar os alimentos gravídicos,o Judiciário estabelece privilégios aos supostos paisnegligentes, os quais se aproveitarão do benefícioda dúvida para não efetivar a tão festejadapaternidade responsável. E deixam, por sua vez,de contribuir com o regular desenvolvimentogestacional de seus filhos.

Outro problema de ordem prática com quese tem deparado para a efetivação da Lei dosalimentos gravídicos é a falta de aparelhamentodo judiciário para a apreciação rápida conforme anecessidade que a Lei em análise impõe.

Se for observado o trâmite regular das açõesde alimentos para os já nascidos, pouca serventiateria a determinação legal em questão. Pois até sechegar à fixação, o nascituro já haveria nascido e,portanto, perder-se-ia o objeto da ação propostapara assegurar o direito a receber alimentosdurante a gravidez.

Há, nas ações de alimentos gravídicos, umaverdadeira corrida contra o tempo, as quais devemser resolvidas antes do termo da gravidez, a fimde assegurar os direitos de quem está sendogestado, bem como, a titularidade da gestanteautora, para a proposição da ação em destaque.

Porém, das muitas dificuldades enfrentadaspelo Judiciário para garantir o trâmite célere dessaação, pode-se destacar, como uma das principais,a promoção da citação válida, em tempo hábil, dosuposto pai.

Muitas vezes, quando se consegue citarvalidamente a parte indicada como suposto pai, paraa regular composição do polo passivo da ação em

referência, isso só se verifica após o nascimentoda criança. Como ela (a criança) não figurou nopolo ativo da ação de alimentos gravídicos propostapor sua mãe, não está legitimada para nelaprosseguir. Além do mais, não existe, nesse referidomomento tardio, uma gravidez, requisito essencialpara o prosseguimento da demanda em epígrafe.O que resulta, por conseguinte, na extinção do feito.

Citam-se, para ilustrar, as duas situaçõeselencadas, quais sejam, o problema do livreconvencimento do julgador quanto ao indício depaternidade e a falta de aparelhamento judicial paraas demandas dessa natureza. Mas, há outrospontos, presente em ações judiciais que tramitaramem Montes Claros, Minas Gerais, perante as Varasde Família.

A primeira a ser analisada será a ação dealimentos gravídicos, cujo processo é o de número0433.09.275732-0, ajuizada em 19 de março de2009, logo no início da vigência da Lei em estudo.

A referida ação tinha por Requerente CLS,que após um curto relacionamento amoroso comRJDS, veio a se engravidar dele. Mesmo já seconhecendo desde a infância, apenas em julho de2008, Requerente e Requerido iniciaram o namorona total clandestinidade, sem o conhecimentosequer dos familiares de qualquer deles. E emnovembro do mesmo ano se constatou a gravidezda Requerente. Ocasião em que Requerido nãomais quis dar prosseguimento ao relacionamento,negando-se a reconhecer a paternidade donascituro em referência.

A ação sob comento frustrou-se,primeiramente, pela falta de convencimento do juizcompetente para julgá-la, acerca da probabilidadede ser o Requerido o pai da criança que estava pornascer. Apesar das fotografias e mensagens,juntadas aos autos, comprobatórias dorelacionamento entre Autora e réu, o juiz não seconvenceu dos indícios de paternidade. Negou,portanto, a concessão liminar dos alimentospleiteados.

Não se convencendo da prova indiciáriatrazida com a inicial, o juiz determinou a citaçãodo Requerido sem fixar alimentos. Com essamedida, evidenciou-se outro problema naefetivação do direito assegurado pela Lei dosalimentos gravídicos.

Como não havia a fixação dos alimentosliminarmente, fator preponderante para ocomparecimento do réu nas demandas judiciais, afim de apresentar sua defesa – uma vez que suainércia ocasiona um significativo aumento do seu

Page 17: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

17

débito – ao tomar conhecimento da ação ajuizada,o Requerido se furtou, o quanto pôde, à citação.Tinha ciência de que dependeria de sua integraçãoà lide para que os alimentos fossem fixados, vistoque a prova carreada pela Autora não foi suficientepara a constituição do direito pleiteado.

Sabia também que quanto mais demorassea comparecer em juízo, maior a probabilidade dese perder o objeto da citada ação, pois ocasionariao nascimento da criança, e deixaria de contribuircom o sustento de sua filha durante todo o períodogestacional. Situação que faria restar à criança,após o seu nascimento, iniciar uma nova demandaem busca do reconhecimento de sua paternidade,bem como dos alimentos para a sua manutenção.

Embora seja entendimento doutrinário(DIAS, 2009; FARIAS; ROSENVALD, 2010) deque os efeitos dos alimentos gravídicos retroagirãoà concepção e não à citação, no caso sob comento,como não houve a citação, não houve, porconseguinte, a constituição da obrigação alimentar,e com o nascimento da criança, a ação dealimentos gravídicos perdeu o objeto.

Achou-se por bem, nesse caso, desistir daação que concederia os alimentos durante operíodo de gravidez, e como já havia seconfigurado o nascimento da criança MCS, ajuizouuma ação de investigação de paternidade, cumuladacom alimentos para que a criança pudesse agorausufruir do benefício que poderia ter sido concedidoanteriormente à sua mãe, quando da sua gestação.

A Requerente CLS, à época em que moveua ação para a consecução de alimentos gravídicos,estava desempregada. E com o advento dagravidez, maiores dificuldades encontrou paraconseguir um emprego que lhe facultasse mantersua gravidez com dignidade. Teve que suportartodo o ônus comum ao seu estado, sem acontribuição do antigo namorado, contando apenascom a ajuda de amigos e familiares, para suprir atodas as necessidades provenientes da gravidez.

No caso em análise, mais de três anos apóso ajuizamento da ação em que se pleiteavam osalimentos gravídicos, até a presente data, nãohouve um pronunciamento judicial que concedesseà criança MCS uma tutela que lhe garantissemelhores condições de subsistência. E seu paicontinua sem ter constituída a obrigação alimentar,embora já se tenha comprovada a paternidadeatravés do exame de DNA. A ação de investigaçãode paternidade cumulada com alimentos continua

em curso aguardando a homologação do acordoentabulado pelas partes.

Em reforço aos argumentos aquidefendidos, destaca-se também a ação em que sepleiteava alimentos gravídicos na mesma Comarca,ajuizada em dezembro de 2010, processo de número0115552.89.2010, a qual teve o mesmo desfechoda ação anteriormente analisada.

Antes da citação do suposto pai, não houvea fixação da pensão pleiteada, por falta doconvencimento acerca dos indícios de paternidade.E nas várias tentativas infrutíferas de fazer comque o requerido integrasse a lide, ocorreu onascimento da criança e, portanto, restará maisuma vez, à criança, que deveria ser a parte protegidana demanda, pleitear seus direitos em ação diversa.Tudo levando a ocasionar, por conseguinte, a nãoefetivação dos direitos garantidos pela Lei n.º11.804/08.

Percebe-se que se o Judiciário brasileiromantiver posicionamentos como os aquiapresentados, além de ignorar interesses maioresem jogo, como a vida, bem maior a ser protegido,afrontará outros preceitos constitucionais quetutelam a efetiva prestação jurisdicional, além dedesconsiderar por completo à Lei recém-editada.

A Lei dos Alimentos Gravídicos determina aconversão dos alimentos fixados durante a gravidezem alimentos ao filho recém-nascido, destacando,desta feita, o principio da economia processual.Objetiva com essa mudança de titularidade, evitar aformação de novas demandas após o nascimentoda criança gestada. Todavia, não havendo a fixaçãodos alimentos nas ações em que se pleiteiam osalimentos com esta característica em destaque, apóso nascimento é que o filho deverá procurar oJudiciário para ter reconhecida a sua paternidade,bem como se ver provido do necessário ao seusustento e manutenção.

Por isso, para evitar que a Lei n.º 11.804/08seja fadada ao insucesso, ou mesmo que sejaaplicada somente nas relações matrimoniais e nasuniões estáveis devidamente reconhecidas,necessária se torna uma uniformização deprocedimentos ágeis nas ações que tenham porobjeto o recebimento dos alimentos durante agravidez para se estabelecer na prática forense aconsecução dos direitos garantidos pelo legislador.O que levaria a evitar a perpetuação de injustiçascomo as que restaram demonstradas no presenteestudo.

Page 18: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

18

3 Considerações Finais

Com a finalidade de implementar regraconstitucional que impõe à família assegurar aosfilhos o direito à vida, à saúde e à alimentação, aLei n.º 11.804/08 veio consolidar a divisão igualitáriadesse dever a ambos os pais, desde o momento daconcepção de seus filhos.

Garante à mulher grávida, diante de indíciosde paternidade, pleitear alimentos do suposto pai,os quais serão fixados desde a concepção, em favorda mãe, e perdurarão após o nascimento,transformando-se em pensão alimentícia, em favorfilho.

Entretanto, para alcançar esse benefício,problemas de ordens prática têm surgido nostribunais brasileiros, e têm sido verdadeiros entravesna concessão dos alimentos gravídicos.

Observa-se até aqui, que a não concessão inlimem da medida, associada às dificuldades nacitação do suposto pai, que se furta deliberadamentea integrar à lide proposta, inviabiliza a aplicação daLei dos alimentos gravídicos.

Como a mãe, carecedora de alimentos, nemsempre consegue provar num curto espaço detempo, com provas irrefutáveis, quem é oresponsável por sua gravidez, suporta todo o custoadicional do período gestacional.

Diante do que apregoa o princípio dapaternidade responsável, e o que era a real intençãodo legislador quando editou a lei em referência,caberia ao julgador o dever de impor o pagamentodos alimentos pleiteados. E somente após essamedida, determinar a citação do suposto pai, quecertamente não se furtaria à citação.

Com esse posicionamento, ter-se-iamgarantidos ambos os interesses. Os do suposto pai,que teria a possibilidade de apresentar defesaimediata quanto à paternidade afirmada na inicial,livrando-se, por conseguinte, da obrigação imposta,se inveridicamente lhe atribuída; e, principalmente,os interesses do nascituro, pois, teria asseguradoum auxilio para que tenha um período gestacionalsaudável, bem como a garantia do direito de nascer.

Referências

BRASIL. Constituição (1988). Constituição daRepública Federativa do Brasil. Brasília: Senado,1988.

BRASIL. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial[da] República Federativa do Brasil, Brasília,DF, 11 jan. 2002.

BRASIL, Lei 11.804, de 5 de novembro de 2008.Disciplina o direito a alimentos gravídicos e aforma como ele será exercido e dá outrasprovidências. Diário Oficial [da] RepúblicaFederativa do Brasil, Brasília, DF, 6 nov. 2008.

DESTEFENNI, Marcos. Curso de processocivil. São Paulo: Saraivam 2006.

DIAS, Maria Berenice. Manual de direito dasfamílias. 5. ed. São Paulo: Revista dosTribunais, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civilbrasileiro: direito de família. v. V. 25. ed. SãoPaulo: Saraiva, 2010.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD,Nelson. Direito civil: teoria geral. 8. ed. Rio deJaneiro: Lumen Juris, 2009.

______. Direito das famílias. 2. ed. Rio deJaneiro: Lumen Juris, 2010.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONAFILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:parte geral. v. I. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2006.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civilbrasileiro: parte geral. v. I. 6. ed. São Paulo:Saraiva, 2006.

______. Direito civil brasileiro: direito defamília. v. VI. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

LOBO, Paulo. Direito civil: famílias. São Paulo:Saraiva, 2008.

MORAES, Alexandre de. Direitoconstitucional. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

SANTOS, Moacyr Amaral dos. Primeiraslinhas de direito processual civil. v. II. 24. ed.São Paulo: Saraiva 2008.

Page 19: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

19

RESUMO

Este artigo procura abordar o tema dofinanciamento público de campanhas eleitorais,sustentando-se o argumento de que essefinanciamento deve ser exclusivamente público.Para que isso tenha eficácia, defende-se a adoçãode rigorosa disciplina, na prestação de contas àJustiça Eleitoral, dos recursos captados e aplicadospelos partidos e candidatos. O aperfeiçoamentodemocrático e do sistema eleitoral e partidário, noBrasil, neste limiar de século e milênio, dependede edição legislativa que garanta ao eleitorado aindependência financeira dos candidatos e partidoscomo modo de coibir o abuso de poder econômico.

ABSTRACT

This article addresses the theme related to thepublic funding of election campaigns, supportingthe argument that this funding must be exclusivelypublic. So that it is effective, the adoption of astrict discipline is defended, in the accounting tothe Electoral Court, of the raised and appliedresources by the parties and candidates. Thedemocratic improvement and of the electoral andparty system, in Brazil, at this threshold of centuryand millennium, depend on legislative issue thatensures to the electorate the financialindependence of candidates and parties as a wayto curb the abuse of economic power.

1 Introdução

Não foram suficientemente submetidos àanálise da sociedade civil organizada os estudos epropostas de reforma do sistema político-partidário

A INSUFICIÊNCIA DO FINANCIAMENT O PÚBLICO DE CAMPANHASPARA O COMBATE AO ABUSO DE PODER ECONÔMICO

Richardson Xavier Brant1

e do sistema eleitoral, no debate que se iniciara, noâmbito do Congresso Nacional, desde abril de 1995,ainda no início do Governo de Fernando HenriqueCardoso. O objetivo da Comissão Provisória entãocriada seria estudar, ampliar o debate e amadurecera compreensão da reforma política necessária aoaperfeiçoamento do sistema democrático no Brasil.

Entre as principais propostas destacam-se aintrodução do voto distrital misto, a extinção dascoligações proporcionais para o Poder Legislativo,a filiação partidária e o domicílio eleitoral, adisciplina da fidelidade partidária e as regras derestrição à divulgação de pesquisas eleitorais. Noque interessa mais de perto nesse estudo, assumeespecial destaque a discussão acerca dofinanciamento público de campanhas eleitoraiscomo meio de prevenir e coibir o abuso de podereconômico nas eleições.

A Lei 9.504/97, editada com o objetivo decriar normas estáveis para as eleições, previu emseu artigo 79: “o financiamento de campanhaseleitorais com recursos públicos será disciplinadapor lei específica.”. Embora não encontreresistência declarada em segmento algum da classepolítica, ainda não houve a edição da “leiespecífica”, registrando-se a existência dequestionamentos quanto à oportunidade de suaelaboração.

Propõe-se, neste estudo, abordar o temapolêmico do financiamento público de campanhas,sob a perspectiva de que um dos mais gravesproblemas atuais da democracia brasileira é aapropriação do Estado pelas elites econômicas eque isso se realiza, em larga medida, em virtudeda grande influência de pesados “investimentosfinanceiros” feitos por grupos nem sempreidentificados, porque clandestinos, nas campanhaseleitorais.

1 Juiz de Direito no Estado de Minas Gerais. Exerce, atualmente, as funções de Juiz Eleitoral da 184.ª Zona Eleitoral eDiretor do Foro Eleitoral em Montes Claros. É Professor dos Cursos de graduação e Pós-Graduação na UniversidadeEstadual de Montes Claros (Unimontes) e nas Faculdades Santo Agostinho de Montes Claros. É Mestre emDesenvolvimento Social pela Unimontes e doutorando em Direito pela Universidade de Buenos Aires (UBA).

Page 20: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

20

Parte-se da ideia de que a democraciabrasileira, entre os avanços e retrocessos de umlongo processo de construção2, exige eleiçõesjustas e livres. Compreende-se assim um processode escolha de governantes em que prevaleçamminimamente os princípios da liberdade deconvicção do eleitor e da efetiva igualdade deoportunidades entre os candidatos, como doisaspectos necessários e complementares doprincípio de igualdade política.

A Justiça Eleitoral, com a implantação dovoto eletrônico, praticamente impossibilitou aprática de fraudes, tornando certa e imune aviolações a manifestação de vontade do eleitorquando de seu comparecimento para o exercíciodo direito de sufrágio.

Resta o desafio de assegurar que oconvencimento do eleitor, ao menos no período depropaganda eleitoral3, faça-se também de maneiralivre e sem aliciamento, sem compra de votos nemquaisquer outras formas de pressão e cooptação.

Para que seja afastado ou minimizado, tantoquanto possível, o abuso de poder econômico, sãoexigidas várias alterações legislativas cujaimplementação, para que sejam efetivas, hão deocorrer pari passu com o exclusivo financiamentopúblico de campanhas.

Algumas dessas alterações legaisconsideradas necessárias integram as propostasde reforma. Poder-se-iam mencionar, entre as maisimportantes – além do financiamento público – aintrodução do voto distrital misto, e as regras querestringem a divulgação de pesquisas eleitoraiscomo “estratégia de marketing político-eleitoral.”(MEZZAROBA, 2004, p. 295).

Ao se basear em um modelo de democraciaem que os atores políticos agem com racionalidade4,

Anthony Downs entende que assim pondera oeleitor, quando se orienta para a escolha de partidosou candidatos em eleições:

Num sistema multipartidário, estima o quecrê serem as preferências de outroseleitores; daí age do seguinte modo: a. Seseu partido favorito parece ter uma razoávelchance de vencer, vota nele; b. Se seupartido favorito parece não ter quasenenhuma chance de vencer, vota em algumoutro partido que tenha uma chancerazoável, a fim de impedir que vença opartido que menos apóia. (DOWNS, 1999,p. 70).

O questionamento sobre a possívelmanipulação de resultados de pesquisas eleitoraisde intenção de voto avalia se isso não tem servidode induzimento ao chamado voto útil. Tem-se emconta que os eleitores, racionalmente orientados,votarão no candidato que tem mais chance devencer, ou em outro candidato que tambémconcorra com chance de vencer, no intuito deimpedir que vença um candidato que o eleitormenos prefira, mesmo que não seja este candidatoescolhido o de sua preferência.

A defesa da introdução do voto distrital mistono Brasil tem-se baseado no argumento de queesse sistema pode diminuir a distância entrerepresentantes e representados. Seriam criadosdistritos nos Estados e combinados os sistemasmajoritário e proporcional. Os candidatosconcorreriam nos distritos, em votação uninominal,pelo sistema majoritário; e em listas, em votaçãoplurinominal, pelo sistema proporcional. Cadasistema preencheria metade do número de vagas5.

Definido esse panorama das principaispropostas discutidas no âmbito da reforma eleitoral

2 “A ‘abertura democrática’ tem início com Geisel em 1974, com mudança do‘tom do discurso’ que evidenciava aantecipação de uma crise de legitimidade do regime estabelecido e que até então se sustentava no desenvolvimentoeconômico. Mas é, no ano de 1979, com Figueiredo, que acontecem a Anistia Política e a Reforma Partidária, o quecontribui significativamente para a eclosão de manifestações de descontentamento popular. Nessa onda, omovimento das ‘Diretas Já’, em 1984; a eleição de Tancredo Neves e, logo a seguir, o movimento para a convocaçãode uma Assembléia Nacional Constituinte.” (CARVALHO; QUADRA, 2000, p. 378-380).

3 “A mídia, com seu poder de alcance de massa, serve de instrumento de legitimação e de imposição hegemônica e,assim, divulga cotidianamente notícias que evidenciam determinados candidatos e partidos, bem como mensagensque levam à despolitização do eleitor.” (MILIBAND, 1972, p. 268).

4 Utiliza, ele, do conceito de racionalidade na teoria econômica. Para tanto, esclarece que “o termo racional nunca éaplicado aos fins do agente, mas somente a seus meios. Isso resulta na afirmação de racional como eficiente, istoé, maximizar o produto no caso de um dado insumo, ou minimizar o insumo no caso de um dado produto.” (DOWNS,1999, p. 27).

5 O sistema distrital misto permite outras variações, como listas fechadas ou abertas na votação proporcional, com apossibilidade de os candidatos concorrerem nos dois sistemas, cláusula de barreira para os partidos que nãolograrem obter pelo menos 5% (cinco por cento) dos votos ou de obter votos em um mínimo de distritos, etc. Parauma pesquisa mais completa ver a obra Sistemas Eleitorais, de Jairo Nicolau. Rio de Janeiro: FGV, 2004.

Page 21: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

21

e político-partidária, pode-se passar, agora, ao temaprincipal deste estudo: o financiamento público decampanhas.

2 O financiamento Público e aImpr escindibilidade de AlteraçõesLegislativas

Nesse desiderato de contenção ao abuso depoder econômico, o financiamento público decampanhas, de par com a vedação aofinanciamento privado, assume aspecto importante,diria mesmo imprescindível, para a consecução detal objetivo.

A referência a outras medidas consiste emespecíficas alterações da legislação eleitoral paramelhor disciplinar a prestação de contas de gastosrealizados em campanhas eleitorais, a fiscalizaçãodo emprego de recursos destinados a campanhaseleitorais e as sanções que devem ser preconizadaslegalmente pela violação dessas regras6.

Sustenta-se que, embora seja estritamentenecessário o exclusivo financiamento público decampanhas eleitorais, tal proposta de reforma semostra insuficiente para coibir os abusos, se nãofor acompanhada de vedação ao recebimento derecursos privados e de um rigor maior nafiscalização e no controle do emprego de recursosnas campanhas. O que se quer evitar é orecebimento clandestino de recursos privados comomeio de burlar a vedação legal.

Tenha-se em conta que é relevante a objeçãode que alguns partidos, candidatos ou coligaçõespoderiam receber recursos públicos e, em nãohavendo rigoroso controle dos recursosarrecadados e efetivamente aplicados, arrecadare aplicar também recursos oriundos de pessoasfísicas ou jurídicas privadas. Situação em que adesigualdade não será evitada, mas ainda maiscomprometida pela concorrência de fundospúblicos para sua efetivação.

Para que seja possível conter o abuso,defende-se a adoção de um sistema de controledo emprego de recursos em campanhas eleitorais

que se baseará em quatros aspectos fundamentais:a) recebimento e emprego exclusivo de recursospúblicos; b) divisão equitativa dos recursos entreos partidos, criando-se um piso e um teto,respectivamente para as agremiações menores emaiores, sempre considerando a representação naCâmara dos Deputados; c) o emprego de recursosdeveria ser orientado por um plano de gastospreviamente apresentado à Justiça Eleitoral, o qualnorteará um controle pormenorizado dos recursosrecebidos e empregados; d) a aplicação da sançãode perda de mandato aos infratores das normasque empregarem recursos além daquelesrepassados publicamente, pela configuração de atode improbidade que compromete a moralidade docandidato e o impede de assumir um cargo públicoeletivo7.

O controle dos recursos empregados emcampanhas eleitorais, por se tratarem de verbaspúblicas, far-se-ia pelo Tribunal de Contas da União,em auxílio à Justiça Eleitoral, dentro de prazosuficiente para viabilizar a preparação de decisãojudicial sobre a prestação de contas. Isso para que seviabilize a apreciação de impedimento do candidatoà assunção do cargo para o qual concorreu. Ocandidato infrator estaria impedido de assumir o cargopor não deter condições de probidade e moralidadeexigidas constitucionalmente. Isso garantiria, emacréscimo, o princípio constitucional da legitimidaderepublicana e democrática das eleições. Essa é asanção adequada pela prática de ato ilícito em violaçãoàs normas que regulam o financiamento decampanhas.

3 Partidos Políticos

Os partidos políticos, na concepção do sistemarepresentativo desenvolvido por Kelsen, cumpremo papel de evitar a distância e afrouxamento de laçosentre eleitores e eleitos. As agremiações partidáriasconstituem um elo entre a sociedade civil e o Estado,entre o governado e o governante, entre o cidadão/mandante e o escolhido/mandatário (KELSEN,2000, p. 153).

6 A Resolução n.º 23.376/2012 disciplina, para as eleições de 2012, a arrecadação e os gastos de recursos por partidospolíticos, candidatos e comitês financeiros nas campanhas eleitorais. O capítulo III, Seção II, da referida Resolução,em seu artigo 32 e parágrafo único, dispõe sobre recursos de origem não identificada. Esse Regulamento trata commaior rigor essa matéria, confirmando tendência atual de aperfeiçoamento gradativo da disciplina legal de captaçãoe emprego de recursos financeiros em campanhas eleitorais com vistas ao combate ao abuso de poder econômico.

7 A Lei Complementar n.º 135/2010, conhecida Lei da Ficha Limpa, ampliou, de forma significativa, as hipóteses deinelegibilidades e possibilitou o cancelamento do registro ou a cassação do diploma em caso de abuso de podereconômico.

Page 22: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

22

Os partidos sustentam, desse modo, o sistemademocrático, favorecendo a apresentação deprogramas de governo e gestão aos eleitores. Taisprogramas são previamente submetidos à crítica eao aperfeiçoamento pelas discussões no âmbitointerno da agremiação. Os vários projetos de vida,interesses particulares de grupos, princípios evalores dos múltiplos segmentos sociais encontram,no interior do partido político, campo próprio àveiculação.

A seguinte passagem, que coloca no centrodo debate a questão da representação, corroboraesse entendimento: “O princípio de que só se deveadmitir a existência de um partido, com a finalidadede assegurar a viabilidade do governo, é umelemento comum às ideologias antidemocráticasdo fascismo, do nacional-socialismo e docomunismo.” (KELSEN, 2000, p. 153).

A chamada crise de representatividade deixaentrever os contornos dessa questão crucial parao aperfeiçoamento e consolidação da democracia.Em estudo sobre os mecanismos de participaçãopopular, encontra-se um revelador aspecto dessaquestão:

Na verdade, na democracia indireta, ditarepresentativa, cada vez mais se denota quenem sempre a maioria parlamentar exprimeos anseios da maioria do povo, gerandouma crise de legitimidade, de consenso. Namedida em que ocorre esse distanciamento,há quebra da estabilidade social. Geram-seleis que carecem de efetividade. A sociedadecria “sistemas paralelos” de resolução deconflitos, porque as “leis do Estado” nãoalcançam ou não servem para seusproblemas. (MELO, 2001, p. 35).

Na formulação kelseniana de umademocracia de partidos, as agremiações partidáriasdeveriam contar com estrutura internademocrática, depurada de vícios, com livre escolhade seus dirigentes pela base sem qualquercorrupção ou resquício de burocracia, e comfinanciamentos transparentes e públicos (KELSEN,2000, p. 154).

Em análise do sistema representativo, emoutra passagem, encontra-se a compreensão deque há enfraquecimento do princípio da soberaniapopular quando, na chamada “repúblicapresidencial”, o Poder Executivo é confiado a um

presidente eleito diretamente pelo povo, em vezde ser escolhido pelo Parlamento. E complementao auto citado: “Realmente, quando à frente dapopulação de eleitores, que conta milhões deindivíduos, está um único indivíduo eleito, a idéiada representação do povo necessariamente perdeo seu último resquício de fundamento.” (KELSEN,2000, p. 154)8.

A função do partido político, nesse sentido,seria a de “agrupar as vontades individuaiscoincidentes e interpô-las, de forma conjunta, naesfera estatal” e a “organização partidária nasceriade um processo sócio-político que envolveria umconjunto de pessoas com afinidades ideológicas ecom um projeto definido de ação de governo.”(MEZZAROBA, 2004, p. 84-85).

Todavia, para que os partidos políticos sejamindependentes e autônomos, devem ter condiçõesde financiar suas próprias atividades. Oscandidatos devem, sobretudo em campanhaeleitoral, resguardar-se de receber recursos dosetor privado para que os interesses dos eleitoressejam a única matéria de que se ocupará o futurogovernante.

Sobre o recebimento de recursos, destaca-seque um “Outro aspecto importante do fundopartidário, enquanto instituto, está na possibilidadede os Partidos virem a disputar eleições comrecurso próprios.” (MEZZAROBA, 2004, p. 282).

E destaca o autor o seguinte aspecto:

Isso faz com que eles se desvinculem dequalquer financiamento particular, o quereforça, sem dúvida alguma, a independênciae a autonomia dos Partidos frente aosinteresses econômicos e políticos departiculares e grupos isolados. [...] aconstitucionalização do direito ao fundopartidário possibilita que cada organizaçãopartidária financie suas próprias atividadessem precisar depender de doações depessoas jurídicas privadas ou de pessoasfísicas, cuja pressão política acabafreqüentemente ocorrendo. (MEZZAROBA,2004, p. 282).

Se somente forem viáveis candidaturas emque houver emprego de elevados recursosfinanceiros de origem privada, o poder econômicocontinuará comprometendo os mandatos e seapropriando do Estado para realização dos

8 Não se pode aprofundar, neste estudo, a discussão entre presidencialismo e parlamentarismo.

Page 23: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

23

interesses de minorias. Grupos que, embora sejamminoritários em quantidade, exercem influência esão considerados hegemônicos.

Os interesses dos segmentos maisdesfavorecidos da população continuarãorelegados a planos secundários, mantendo-os emcondição de não-integração e dependência eperpetuando-se – desse modo – a situação atualde injustiças e desigualdades sociais.

De outro ponto de vista, não se pode deixarde reconhecer que o financiamento públicocoloca os partidos políticos em relação dedependência com o Estado, quando o que sepretendeu – desde a constitucionalização dasregras político-partidárias e com a edição da Lein.º 9.096/95 – foi lhes assegurar autonomia. Essasituação, embora não desejável, parece menosprejudicial.

Foram transformados os partidos de entesde direito público em entidades de direito privado,garantindo-lhes a elaboração autônoma de seusestatutos. O fortalecimento de uma agremiaçãopartidária se efetiva pelo apoio social que logreobter e não por benefícios corporativos oferecidospelo Estado.

Haverá de ser encontrado, no entanto, umponto de equilíbrio entre essa situação de relativadependência com o Estado, propiciada pelorecebimento de recursos públicos, e a necessáriaindependência dos setores privados, viabilizada peloexclusivo financiamento público de campanhas.Acrescente-se a imprescindível complementaçãode vedação ao recebimento de recursos de fonteprivada, para o desiderato de contenção dos abusos.

Alcança-se, nesse mister, o desejadoafastamento da hegemônica atuação dentro dospartidos de “interesses econômicos e políticos departiculares e grupos isolados.” (MEZZAROBA,2004, p. 292).

A independência dos partidos políticos écondição necessária ao aperfeiçoamentodemocrático. A autonomia administrativa, decriação, funcionamento e estruturação, deve seharmonizar com a independência financeira.

4 Exclusivo Financiamento Público deCampanhas e Vedação ao FinanciamentoPrivado

O financiamento público – garantindorecursos mínimos a todos os candidatos, partidose coligações – é condição necessária paraminimizar o abuso do poder econômico. Com ainjeção de recursos privados – de pessoas físicas,jurídicas e talvez até de organizações criminosasque se utilizam, hodiernamente, das maissofisticadas técnicas para o alcance de seusobjetivos – tem-se a quebra do princípio daigualdade de oportunidades entre os candidatos.

Considere-se que foi unânime a aprovaçãopela Comissão de Reforma Política da propostade que, por meio de projeto de lei, se estabeleçaque as campanhas eleitorais sejam financiadasexclusivamente com recursos públicos. Esse o teordo dispositivo então proposto:

Nos anos eleitorais, as dotações do FundoPartidário (art. 17 da Constituição Federal)teriam R$7,00 (sete reais) por eleitor alistadopela Justiça Eleitoral até 31 de dezembro doano anterior. [...] nos períodos em quefossem realizadas as eleições, os PartidosPolíticos estariam proibidos de receberdoações de pessoas físicas ou jurídicas.(MEZZAROBA, 2001, p. 296).

Mas, isso não é bastante. Como funciona, hoje,o sistema de prestação de contas, não se mostraeficiente no sentido de verificar a efetiva aplicaçãode recursos em campanhas eleitorais. O que seconstata, a partir de observações empíricas, é a maisgrosseira desproporção entre os valores declarados,na prestação de contas à Justiça Eleitoral, e omontante de recursos empregados em dispendiosascampanhas. Antes não eram raras as“apresentações artísticas”9 nos comícios, ainstalação de muitos comitês e a contratação degrande número de pessoas. Isso em franco

9 Com a edição da Lei n.º 11.300/2006 ficaram vedados os “showmícios”, prática de contratação de artistas populares,de alto custo, para os comícios e reuniões de eleitores. Somente os candidatos com mais recursos conseguiampagar as apresentações, com quebra - clara - da regra de isonomia.

Page 24: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

24

descompasso, a olhos vistos, entre o que se declarae o que foi gasto na campanha.

E esse fenômeno era comum e constatávelpor meio de inúmeros eventos promovidos quandodas campanhas eleitorais e que não são sequerdeclarados nas prestações de contas. Mesmo quesejam doados serviços e uso de bens, essasdoações deveriam ser declaradas paraconhecimento pela população dos “apoios”recebidos para conquista dos mandatos eletivos.

A distribuição de recursos deve ser maisequitativa, contemplando-se os partidos menores,com a fixação de uma quota mínima que lhesassegure efetiva participação no processo político--eleitoral. Há de se superar a desigualdadeencontrada na divisão de tempo reservado aospartidos menores, sem funcionamento parlamentar.Isso ocorre tanto do tempo de acesso à televisão eao rádio quanto na participação em uma quota dofundo partidário.

5 Disciplina Atual da Prestação de Contas eProposta de Alteração Legislativa

A legislação eleitoral, em atendimento aocomando da Constituição da República Federativade 1988, determina a prestação de contas do partidoà Justiça Eleitoral, e regula a prestação de contase a constituição de Comitê Financeiro. Dispõe aLei n.º 9.504/97, em seu artigo 29, incisos III e IV,e em seu § 2.º, que a prestação de contas dosgastos de campanha eleitoral deve ser feita até 30(trinta) dias após a realização das eleições.

O candidato somente pode recebercontribuições financeiras depois de oficialmenteregistrada a candidatura perante a Justiça Eleitoral,com a constituição de Comitê Financeiro e aberturade conta corrente específica para receber osrecursos destinados à campanha (CERQUEIRA,2004, p. 1.079).

Os partidos políticos podem receber doaçõese utilizar tais recursos para fazer pré-campanhas,mas não os candidatos10. Os comitês têm a

obrigação de se inscrever no Cadastro Nacionalde Pessoa Jurídica (CNPJ), inscrição que serácancelada em dezembro do ano das eleições,porque destinada somente ao controle dos recursosrecebidos para financiamento das campanhaseleitorais.

Existem limites para a doação de recursos.As pessoas jurídicas somente podem doar até 2%(dois por cento) do faturamento bruto do anoanterior. As pessoas físicas têm o limite de 10%(dez por cento) dos rendimentos brutos do anoanterior, limitado a mil Unidades de ReferênciaFiscal (UFIR’s). As coligações, partidos ecandidatos devem comunicar o valor máximo degastos à Justiça Eleitoral, quando do registro deseus candidatos, como prevê a Lei n.º 9.504/1997.

A Lei n.º 11.300/2006 previu que os partidos,coligações e candidatos devem disponibilizar, narede pública de computadores, os valores dosrecursos arrecadados e gastos em campanhas, parainformação aos cidadãos.

Apresenta-se proposta de alteraçãolegislativa para que – a par do financiamentopúblico exclusivo de campanhas eleitorais – aprestação de contas seja feita diretamente aoTribunal de Contas da União, com registro prévio,perante a Justiça Eleitoral, do planejamento eorçamento do emprego dos recursos.

O plano de gastos permitirá um detalhadoacompanhamento pela Justiça Eleitoral e peloseleitores dos eventos e despesas a serem feitaspor cada partido, coligação e candidatos, reduzindo– significativa e eficazmente – a possibilidade deabusos.

6 Sanções pela Aplicação de RecursosClandestinos

Sugere-se também a previsão de sançõesseveras ao candidato, partido ou coligação quereceberem recursos clandestinos, que efetuaremgastos além dos recursos públicos recebidos, comomaneira de pôr cobro ao risco calculado11.

10 Distinguem-se propaganda eleitoral, propaganda partidária e pré-campanhas. A propaganda partidária consiste emdireito reconhecido ao partido político de divulgar seus princípios, programas e organização, sendo reservado tempona televisão e no rádio, em cadeia nacional, para esse fim. Propaganda eleitoral é aquela de que se valem oscandidatos, coligações e partidos para divulgação de seu(s) nome(s) e propostas, veiculada em período determinadona legislação eleitoral, antes da fase de recepção de votos, para que se tornem conhecidos do eleitorado os candidatosconcorrentes em um pleito. As pré-campanhas, ou propaganda intrapartidária, acontecem no interior dos partidospolíticos, de modo mais reservado, visando obter apoio a algum integrante do partido que pretenda se candidatar emconvenção partidária na qual há escolha dos integrantes do partido que concorrerão em um pleito eleitoral.

11 Assim considera-se quando o candidato utiliza-se de práticas abusivas, ilegais e desonestas calculando que obenefício da conquista do mandato compensa o risco de ser apanhado (prática utilitária).

Page 25: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

25

A sanção adequada, para evitar o utilitarismodesonesto, seria a perda do mandato conquistadoindevidamente, pela simples verificação da faltaética praticada. Inviável qualquer condicionamentoà influência no resultado das eleições, pelaimpossibilidade fática de verificação dessapotencialidade danosa.

A previsão de abuso do poder econômico naseleições é antiga, datando de 1965, com a ediçãodo Código Eleitoral. Vários diplomas legislativosdisciplinaram o abuso e instituíram meio processualde apuração e aplicação de sanções, inclusive deperda do mandato obtido com violação da lei.

A jurisprudência dos tribunais brasileiros, noentanto, em vários casos, condicionou a perda domandato à “potencialidade do dano”, no sentidode que o abuso – para justificar a perda do mandato– deveria comprometer o resultado das eleições.Além disso, somente após o trânsito em julgado dadecisão, ocorreria a perda do mandato. Naesmagadora maioria dos casos, o candidatobeneficiado pelo abuso terminava o mandato semque o julgamento tivesse chegado ao final.

Nesse aspecto, a Lei n.º 9.840/97, conhecidalei que define a captação ilícita de sufrágio,introduziu inovações. Desse modo, a perda domandato pela prática da conduta de ofertarqualquer vantagem ao eleitor independe de“potencialidade do dano” e impede o candidato deassumir o cargo, tendo efeito imediato. OsTribunais pátrios, sensíveis à origem popular da lei12,têm construído jurisprudência inovadora, com amoralizadora perda de mandatos de candidatos queincorrem na pratica de captação ilícita de sufrágio.

Posteriormente, confirmando essa tendênciamoralizadora, a Lei Complementar n.º 135/2010(Lei da Ficha Limpa) introduziu norma queestabelece não depender de influência no resultadodas eleições a conduta grave de improbidade queconstitui abuso de poder econômico ou político.

Nesse sentido, a comunidade jurídicacomprometida com o ideal democrático recebe comentusiasmo essa manifestação de franco respeitoao cidadão e à lisura do pleito. Com a edição denormas que tornam mais efetiva a exigência deprobidade e moralidade da vida pregressa docandidato, disciplina mais severa do abuso de poder

econômico foi introduzida, o que contará – de mododecisivo e firme – com a alentadora interpretaçãodos Tribunais pátrios.

7 Considerações Finais

Não se quer sustentar seja “uma panaceiapara todos os males” o financiamento público decampanhas. Todavia, sua introdução é um avançosignificativo, desde que as necessárias alteraçõeslegislativas tratadas sejam também consideradase aplicadas com o apoio da legitimidade popular.

Certo que – a par dos necessáriosaperfeiçoamentos que o debate na esfera públicapermitirá – o exclusivo financiamento público decampanhas poderá se tornar um meio eficiente dereduzir, em medida considerável, o abuso do podereconômico e político nas eleições.

A par disso, se forem ampliadas e tornadasefetivas as instituições que permitem a participaçãodo cidadão na formação e deliberação da decisãopolítica, com a abertura de um canal de diálogocom a sociedade civil, mediado pelos movimentossociais, a democracia brasileira pode dar um passodecisivo na dinâmica de sua consolidação. Isso éum fator imprescindível para a construção coletivade uma sociedade menos injusta e desigual.

Ao cabo dessa análise, cuida-se de traçaralgumas considerações que servem de síntese aoestudo e como pontos de discussão sobre o tema.

Mostra-se necessário, mas não suficiente, ofinanciamento público de campanhas eleitorais, peloainda ineficaz sistema de fiscalização previsto pelalegislação atual que deixa inúmeras “brechas”, porser um controle apenas formal, à captação eemprego de recursos privados sem declaração àJustiça Eleitoral.

Além de ser público, então, o financiamentodeve ser exclusivamente público, vedando-se orecebimento de recursos de origem privada, depessoas físicas ou jurídicas, assim como as doaçõesde qualquer espécie.

A exclusividade do financiamento público,para ser um modo efetivo de controle do abuso depoder econômico, depende de acompanhamento efiscalização do plano de gastos em campanhas.Sem isso, perde-se o controle eficaz da aplicação,

12 A Lei de Captação Ilícita de Sufrágio teve iniciativa popular. Ocorre que, embora tenham sido colhidas mais de ummilhão de assinaturas, por não terem sido identificados os subscritores da proposta, não foi aceita pelo parlamentoa iniciativa popular. Porém, um parlamentar apresentou o projeto que já iniciou com o aval de um número significativode eleitores. Nasceu a referida lei com essa legitimidade.

Page 26: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

26

em campanhas eleitorais, de recursos recebidosclandestinamente.

Para prevenir a prática do abuso de podereconômico, dentro da previsão de que oscandidatos podem se valer de uma orientaçãoracionalmente utilitária, quando se sujeita ao “riscocalculado”, a sanção para o emprego de recursossem declaração à Justiça Eleitoral, seja qual for omontante de recursos, deve ser a perda do mandatoou o impedimento à assunção no cargo.

O efetivo acompanhamento da arrecadaçãoe aplicação de recursos não prescinde de um planode gastos a ser registrado perante a Justiça Eleitoralantes do início da propaganda eleitoral, permitindoacompanhamento e controle simultâneo peloseleitores, partidos e pela Justiça Eleitoral.

Em se tratando de recursos públicos, aprestação de contas deve ser aferida pelo Tribunalde Contas da União, com apresentação de parecerprévio à Justiça Eleitoral, para apreciação antesda diplomação dos candidatos, de modo a viabilizara não diplomação de candidatos cujas contas nãoforem aprovadas.

O procedimento previsto no artigo 96 da Lein.º 9.504/9713 deve assegurar a necessáriaobservância do devido processo legal ao candidatoque tiver impugnação na prestação de contas, acargo do Ministério Público, de qualquer candidato,coligação e partido que concorrerem ao pleito.

Referências

CERQUEIRA, Thales Tácito Ponte Luz dePádua. Direito eleitoral brasileiro . BeloHorizonte: Del Rey, 2004.

DOWNS, Anthony. Uma teoria econômica dademocracia. Tradução de Sandra GuardiniTeixeira Vasconcelos. São Paulo: Edusp, 1999.

KELSEN, Hans. A democracia. Tradução deIvone Castilho Benedetti et al. São Paulo:Martins Fontes, 2000.

MELO, Mônica de. Plebiscito, referendo einiciativa popular : mecanismos constitucionaisde participação popular. Porto Alegre: SAFE,2001.

MEZZAROBA, Orides. Introdução ao direitopartidário brasileiro . 2. ed. Rio de Janeiro:Lúmen Juris, 2004.

NICOLAU, Jairo. Sistemas eleitorais. Rio deJaneiro: FGV, 2004.

TOURAINE, Alain. O que é democracia? 2.ed. Petrópolis: Vozes, 1995.

RIBEIRO, Fávila. Pressupostosconstitucionais do direito eleitoral. PortoAlegre: SAFE, 1998.

SILVA, Francisco Carlos Teixeira da. Amodernização autoritária. Com a colaboraçãode Alessandra Carvalho e Samantha VizQuadrat. In: LINHARES, Maria Yedda (Org.).História geral do Brasil. Rio de Janeiro:Campus, 2000.

13 Prevê o artigo 96 da Lei n.º 9.504/97 um procedimento célere para apuração de reclamações ou representações pordescumprimento daquele diploma legal.

Page 27: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

27

ARTIGOS DO CORPO DISCENTE

Page 28: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

28

Page 29: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

29

RESUMO

O texto trata do sistema punitivo desde os temposantigos até os dias atuais, demonstrando umatrajetória de equívocos e ineficácia que vão desde afalta de infraestrutura até a grave violação de direitoshumanos. Buscou-se conhecer a história do sistemapunitivo, sua evolução e estratégias de atuação como objetivo de diagnosticar problemas existentes desdeos primórdios da humanidade até os dias atuais. Otrabalho se justifica a partir do interesse pelapreservação os direitos humanos, bem como peloapontamento de políticas preventivas à criminalidade,a partir de uma busca pelo bem-comum que,consequentemente, culminará em justiça social. Ametodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica evirtual. Somente partindo do respeito pelo serhumano é que a sociedade se transformará a pontode não mais ser necessário o cárcere.

Palavras-chave: Sistema punitivo; trajetória;violação de direitos humanos.

EXEMPLAR Y SYSTEM:a journey of a few solutions

Cyntia Cybelle Pinheiro Barbosa2

ABSTRACT

The paper deals with the punitive system sinceancient times to the present day, showing a trendof misunderstandings and inefficiency ranging fromthe lack of infrastructure to the serious human rightsviolations. We tried to know the history of thepunitive system, its evolution and action strategiesin order to diagnose problems since the dawn ofhumanity to the present day. The work is justifiedby the interest in preserving human rights as well

O SISTEMA PUNITIVO:UMA TRAJETÓRIA DE POUCAS SOLUÇÕES

Cyntia Cybelle Pinheiro Barbosa1

as the appointment of the crime prevention policies,based on a search for the common good that,consequently, will culminate in social justice. Themethodology used was literature and virtual. Onlybased on the respect for human beings is thatsociety will become the point of no longer needthe prison.

Keywords: Punitive system; trajectory; humanrights violation

1 Introdução

O homem, ao se agrupar socialmente, esteveem toda sua trajetória histórica e política impelidoa punir os desviantes e/ou divergentes de maneiraque fosse exemplar para evitar que outros indivíduosse motivassem às práticas criminosas.

Não se pode negar que, ao longo da história,o sistema punitivo passou por significativasmudanças. Buscaram-se, em vários momentos, amodernização das formas e a humanização daspenas, com o fito de se garantir direitos e tornarefetivo o sistema em sua totalidade.

Embora com importantes progressos havidos,o que se observa hoje é que tais medidas coercitivasfracassaram, pois comungam de uma experiênciaaltamente injusta e revoltante, levando a umaumento quase palpável da criminalidade.

Mas, como falar em progressos e fracassosao mesmo tempo? Há que se considerar apassagem de um sistema que massacravadiretamente o corpo físico como forma de castigopelos males praticados, a um sistema que “poupa”o homem de flagelos corporais, mas lhes impingempenas semelhantemente brutais ao se pensar nocárcere com todas as mazelas que lhe sãoinerentes.

1 Graduada e Pós-graduada em Arte Educação pela Universidade Estadual de Montes Claros; Professora de Cantono Conservatório Estadual de Música Lorenzo Fernandez; Acadêmica do Sexto Período do Curso de Direito daFaculdade de Direito Santo Agostinho.

2 Graduate and Post-graduate degree in Art Education from Montes Claros State University, Professor of Singing atthe Music State Conservatory Lorenzo Fernandez; Academic Sixth Period of the Course of Law, of Faculdade deDireito Santo Agostinho.

Page 30: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

30

2 Uma trajetória a “duras penas”

Por volta de 1700 a.C. o Código deHamurabi3, baseando-se na Lei de Talião,estabeleceu como critério de justiça uma supostaproporcionalidade entre o crime e a condenação.Suposta porque, para a época, medidasseveríssimas de castigo eram consideradasnaturais, o que nos dias atuais seria inconcebível,como por exemplo, decepar a mão do ladrão paraque este não voltasse a delinquir, medidadesarrazoada nos tempos modernos, masabsolutamente comum naquela época.

Na Idade Média, as penas corporais erampredominantes e, em face do desenvolvimento doDireito germânico, as ofensas – segundo AníbalBruno, que é citado por Dotti (1998) – eramgradativamente substituídas pela compositio,4

inicialmente voluntária e depois imposta atravésda lei. Não obstante haver previsão desdeHamurabi para a composição como forma deimputação patrimonial, determinados crimes só sedepuravam através da expiação física docriminoso.

Tem-se com Foucault (1987), em Vigiar ePunir, uma visão panorâmica da política punitiva docomeço do século XVIII, a partir dos suplíciosimpostos aos condenados, que tinham na humilhaçãopública e nos flagelos corporais a execução dasentença pelos males praticados. A obra segueapresentando as muitas formas de punição atéchegar ao sistema carcerário, que de certo modo,ainda é tal qual se conhece hoje. Para Dotti

a pena pública era caracterizada por umadupla natureza originária: ora seapresentava como exercício da vingançacoletiva, ora como sacrifício expiatório.[...]A ideia da pena como instituição de garantiafoi obtendo disciplina através da evoluçãopolítica da comunidade (grupo, cidade,Estado) e o reconhecimento da autoridadede um chefe a quem era deferido o poder decastigar em nome dos súditos. É a penapública que, embora impregnada pelavingança, penetra nos costumes sociais e

procura alcançar a proporcionalidadeatravés das formas do talião e dacomposição. A expulsão da comunidade ésubstituída pela morte, mutilação,banimento temporário ou perdimento debens. (DOTTI, 1998, p. 31).

Os flagelos corporais e os suplícios em praçapública foram, por séculos, as principais medidaspunitivas, cujo objetivo era servir de exemplo anovos possíveis delinquentes. A punição era algoespetacular, capaz de provocar discrepantessentimentos em seus expectadores.

Ocorre que tais sentimentos não eramsempre favoráveis à severidade e aos martíriosimputados aos transgressores. Em um determinadomomento, o carrasco se torna equivalente aocriminoso, deixando de portar o emblema da justiçapara se emparelhar àqueles cujas condutas eramcastigadas. Abrem-se novas ideologias equestionamentos acerca da necessidade demedidas tão desumanas aos condenados.

A história da punição, que vinha sendo trilhadasempre numa perspectiva desproporcional ao dodelito cometido, passa a ter novo enfoque no fimdo século XVIII e início do século XIX. O cárcerese torna uma opção mais humanizada de se punir,cujo intuito era, segundo Foucault (1999), tornaros indivíduos dóceis e úteis, através de um trabalhopreciso sobre seu corpo.

No fim do século XVIII e princípio do séculoXIX se dá a passagem a uma penalidade dedetenção, é verdade; e era coisa nova. Masera na verdade abertura da penalidade amecanismos de coerção já elaborados emoutros lugares. Os “modelos” da detençãopenal — Gand, Gloucester, Walnut Street— marcam os primeiros pontos visíveisdessa transição, mais que inovações oupontos de partida. A prisão, peça essencialno conjunto das punições, marcacertamente um momento importante nahistória da justiça penal: seu acesso à“humanidade.” (FOUCAULT, 1999, p. 260).

Os castigos do século XVIII eram de grandeselvageria, mas alguns criminosos eram tolerados

3 O Código de Hamurabi é um conjunto de leis criadas na Mesopotâmia, por volta do século XVIII a. C. pelo reiHamurabi, da primeira dinastia babilônica. É baseado na Lei de Talião “olho por olho, dente por dente”. Hamurábi,ou “Khammu-rabi” em babilônico, foi o sexto rei da Suméria por volta de 1750 a.C. e também foi ele quem uniu ossemitas e sumérios, fundando o império babilônico.

4 Compositio (composição) era uma espécie de indenização através da qual o transgressor poderia satisfazer aofensa. Incluída no código de Hamurabi, foi acolhida pelo Direito Germânico dando origem à indenização no direitoprivado e à multa no direito penal.

Page 31: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

31

pela população. Com a industrialização e acapitalização da classe popular, surge a necessidadede proteção da riqueza gerada. E já não se aceitammais aqueles de comportamento consideradodesviante. Assim, no início do século XIX buscou--se uma moralização através de campanhas decristianização da classe operária e da populaçãocomo um todo. “Foi absolutamente necessárioconstituir o povo como um sujeito moral, portantoseparando-o da delinquência.” (FOUCAULT,2001, p. 133).

Embora houvesse grande empenho para apreservação do patrimônio e transformação dasociedade em um ente moral, a consolidação dosistema prisional foi inevitável, pois toda sociedadeabriga indivíduos delinquentes.

A prisão tinha, desde o começo, o objetivode transformar os indivíduos. Deveria ser uminstrumento tão eficaz quanto a escola, comcritérios, inclusive, pedagógicos de ressocialização,mas fracassou concomitantemente com suacriação. Desde 1820, para Foucault (2001), a prisãonão é capaz de transformar os criminosos empessoas honestas, mas serve apenas para fabricarnovos criminosos ou afundá-los ainda mais nocrime.

Com Beccaria, em Dos Delitos e das Penas,nota-se uma abordagem muito mais preocupadacom o ser humano envolvido nos processos dedelinquência e punição. É mister repensar o sistemapunitivo, de modo a torná-lo menos desumano emais justo:

As penas que vão além da necessidade demanter o depósito da salvação pública sãoinjustas por sua natureza; e tanto maisjustas serão quanto mais sagrada einviolável for a segurança e maior aliberdade que o soberano propiciar aossúditos. (BECCARIA, p. 20).

Assim, passa-se a uma nova perspectiva,mais equânime e mais profícua do direito de punir,com justiça e com precisão para que inocentessejam poupados da amargura do cárcere. O focoagora é a justiça em sua totalidade, é o ser humanodesviante e a sua integridade que estão em jogo:

À proporção que as penas forem maissuaves, quando as prisões deixarem de ser ahorrível mansão do desespero e da fome,quando a piedade e a humanidadeadentrarem as celas, quando, finalmente, osexecutores implacáveis dos rigores da justiçaabrirem o coração à compaixão, as leis

poderão satisfazer-se com provas mais fracaspara pedir a prisão. (BECCARIA, p. 26).

Embora houvesse uma preocupação honestacom a efetivação da justiça e a humanização daspenas, o direito de punir ainda latejava das feridasmedievais e da tradição funesta dos horroresaplicados aos criminosos. Beccaria trouxe umareflexão humanizada e franca que teve o condãode modificar grande parte do pensamento de seutempo.

Para Lombroso (2011), um século mais tarde,a etiologia do crime é substancialmente individuale deve ser buscada através de um estudopormenorizado do próprio delinquente. A condutahumana está atrelada à sua própria natureza, demodo que é através dela que se pode descobrir acausa dos delitos. Assim surgiu o determinismobiológico, fruto de um estudo que organizouestruturas físicas individuais a fim de enquadrar opossível delinquente em estereótipos engendradospela ciência. Desse modo, seria possível constatara predisposição ao crime apenas observando ascaracterísticas físicas dos indivíduos.

Tal teoria foi criticada severamente ao longoda história, mas sem resultados práticos. Fato éque, hodiernamente, em razão dela ou não, observa--se que a prisão é local de recrutamento deindivíduos estereotipados biológica e socialmente.Segundo Hulsman e Celis (1997), os discursospolíticos, a imprensa e alguns estudiosos da políticacriminal concordam com a existência de um“homem comum” obtuso, covarde e vingativo.Mas, ele mesmo defende que tal homem não existe,sendo uma cômoda abstração para legitimar osistema existente e reforçar suas práticas.

Para mim, cada ser é, ao mesmo tempo,profundamente diferente e existencialmentepróximo. Isto me livra de explicações domundo que se assentam em discriminaçõese pretendem provocar o isolamento dealgumas pessoas vistas como más.(HULSMAN; CELIS, 1997, p. 46).

3 Violação de direitos no Brasil

No Brasil, desde os tempos da Colônia, ospresídios possuem o mesmo caráter segregativo epunitivo, ineficaz para a recuperação dos presos.As condições de vida são precárias, convivendo odetento com superlotação, doenças que seproliferam rapidamente devido à falta de higiene,enfim, sobrevive-se em condições subumanas.

Page 32: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

32

As mais antigas prisões do Brasil, como aCadeia Velha, na ex-capital imperial,possuem relatos de suas condiçõesmiseráveis. A prisão de Aljurbe, já em 1808,tinha capacidade para 20 presos e abrigava390. Em 1834 foi iniciada a construção daprimeira Casa de Correção da capital federal,somente terminada em 1850, após inúmerasinterrupções e alterações de projeto. Noestado do Rio Grande do Sul, as cadeiasexistentes também apresentavam condiçõeslamentáveis de funcionamento, nãohavendo, por parte das autoridades,interesse em melhorá-las; menos ainda emconstruir novas. Dados históricosestabelecem a construção da Cadeia Velhapor volta de 1812, mas já em 1824 era referidacomo um lugar de infecção e morte. Foifinalmente desativada em 1841. Em 1853 foicriada a Cadeia Civil em Porto Alegre; maistarde, em 1897, denominada Casa deCorreção. Sua construção foiacompanhada de polêmicas e críticas.(GUIMARÃES, 2002, p. 287-288).

Embora, com o decorrer do tempo, as penasprivativas de liberdade tenham sofrido importantesmodificações no sentido da humanização e garantiade direitos fundamentais dos presos, pouca coisamudou ao longo desses duzentos anos. Modernizou--se a legislação, a começar pela Constituição doImpério de 1824 que, segundo Guimarães (2002),aboliu os castigos bárbaros. Em 1830, promulgou--se o Código Criminal do Império que, além deestabelecer limites às punições, determinou que ascadeias fossem limpas e arejadas e os réus fossemseparados em conformidade com seus crimes.Ainda segundo Guimarães (2002), vieram emseguida o Código Penal de 1890, já na República,e o Código Penal de 1940, que introduziu o regimeprogressivo. E, mais recentemente, a Lei 7.210,de 1984, chamada de Lei de Execução Penal(LEP).

Apesar dos avanços havidos, jamais seconseguiu efetivar o que as leis sempre previram.Não é necessário ser especialista para saber queos prédios dos cárceres se encontram deteriorados,os direitos e garantias fundamentais sãoconstantemente violados dentro dos presídios, ospresos não desfrutam de segurança ou de condiçõesmínimas de higiene e saúde. Além disso, o sistemacarcerário é feito para minorias específicas dapopulação. Para Zaffaroni (1999), “os órgãoslegislativos inflacionam as tipificações aumentandoo arbítrio seletivo dos órgãos executivos do sistemapenal e seus pretextos para o exercício de ummaior poder controlador.”.

Em geral, é bastante óbvio que quase todasas prisões do mundo estão povoadas depobres. Isto indica que há um processo deseleção das pessoas às quais se qualificacomo ‘delinqüentes’ e não, como sepretende, um mero processo de seleção dascondutas ou ações qualificadas como tais.(ZAFFARONI, 2001, p. 58).

Guimarães (2002, p. 292) afirma que “ospresos em sua maioria são pessoas oriundas dasclasses sociais mais humildes e com baixaescolaridade.”. Nos dizeres de Andrade (1997, p.265) “a criminalização é, com regularidade,desigual ou seletivamente distribuída pelo sistemapenal. Desta forma, os pobres não têm uma maiortendência a delinquir, mas sim a seremcriminalizados.”. Daí pode-se inferir que orecrutamento vivenciado no sistema carcerário seliga visceralmente à pobreza e, ainda, que a faltade oportunidades é um fator relevante que leva ohomem a delinquir.

Outra doutrina que se adapta ao tema queestá em discussão é a que diz:

A prisão não reúne apenas indivíduosinfratores. Ela abriga em seus altos murostodos aqueles que de certa forma sãoconsiderados “anormais”. Criançasabandonadas, loucos, psicóticos,adolescentes “mal comportadas”, enfim,todos os “desviados” encontrados emsociedade. Reúne todos em um só“caldeirão”, submetendo-os às mesmaspunibilidades. (ALMEIDA; AGUIAR;NEVES, 2004, p. 137-138).

Observa-se que não apenas a forma depunição viola os direitos humanos, mas o serhumano, que por infortúnio encontra-seencarcerado, na maioria das vezes já sofreu aolongo da vida algum ou vários tipos de violaçõesde direitos, tais como nenhum ou pouco acesso àeducação, lazer, moradia, dentre outros, semesquecer do mais importante: o direito à dignidade.

Para Symonides (2003, p. 208) “a violaçãode um direito humano mina o respeito por todos osdemais.”. Percebendo-se desprovido de direitos egarantias elementares para subsistir em sociedade,o homem se torna marginal.

É gravoso concluir que há todo um aparatolegal e social de exclusão capaz de ceifar dasubjetividade humana a visão imanente dos própriosvalores, levando ao caos social. Para Zaffaroni(1999, p. 27) “os órgãos executivos têm ‘espaçolegal’ para exercer poder repressivo sobre qualquer

Page 33: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

33

habitante, mas operam quando e contra quemdecidem.”.

Tal seletividade, por si só, é uma forma deviolação dos direitos humanos. Some-se a isso aviolação da legalidade processual e, também, aviolação da legalidade penal, a partir da duraçãoexorbitante dos processos, além de fatores legaise doutrinários, cuja obscuridade pode levar àaplicação injusta da pena através da utilizaçãovalorativa de determinados elementos, ou seja,possibilitando ampla margem de arbitrariedade dosagentes. Como se não bastasse, ao cair na redecarcerária, o condenado – ainda que não o seja defato, dada a morosidade do sistema – conviverácom abusos infinitos pela máquina estatal, por suaineficácia atestada de longa data.

Promessas vitais descumpridas, excessivasdesigualdades, injustiças e mortes nãoprometidas. Mais do que uma trajetória deineficácia, o que acaba por se desenhar éuma trajetória de eficácia invertida, na qualse inscreve não apenas o fracasso doprojeto penal declarado mas, por dentrodele, o êxito do não-projetado; do projetopenal latente da modernidade. (ANDRADE,1997, p. 293).

Tendo por escopo suavizar as eloquentesmazelas causadas pelo sistema em voga, correntessurgem clamando seu fim e/ou sua repaginação,correntes abolicionistas e minimalistas tentamestabelecer um roteiro rumo à salvação do sistema.Nestes termos,

O abolicionismo nega a legitimidade dosistema penal tal como atua na realidadesocial contemporânea e, como princípiogeral, nega a legitimação de qualquer outrosistema penal que se possa imaginar nofuturo como alternativa a modelos formaise abstratos de solução de conflitos,postulando a abolição radical dos sistemaspenais e a solução dos conflitos porinstâncias ou mecanismos informais.(ZAFFARONI, 1999, p. 89).

Pinto (2008), a seu turno, afirma que oAbolicionismo não será uma empreitada imediatapara o sistema de Justiça, muito embora possuaum grande valor humanitário e ético, haja vista quea sociedade é o que a classe dominante preconizae etiqueta.

Quanto ao Minimalismo Penal ou contraçãopenal, Zaffaroni (1999, p. 89) leciona que “aexemplo do abolicionismo, nega a legitimidade do

sistema penal, tal como hoje funciona, mas propõeuma alternativa mínima que considera como malmenor necessário.”.

Em complemento ao mesmo raciocínio, tem--se que

Pelo minimalismo penal, propõe-se adiminuir os usuários do sistema carcerário,aprisionando somente os sujeitos quecometeram delitos mais graves. Isto é:aplicar penas alternativas, além de inseriroutras esferas para a resolução dessesconflitos. (PALADINO, 2010, p. 61).

O que se busca, na verdade, é uma espéciede garantismo penal, objetivando assegurar aospresos a preservação de sua dignidade e dos seusdireitos. Garantismo penal no sentir de Carvalho(apud PALADINO, 2010, p. 65),

visa a estabelecer critérios de racionalidadeà aplicação do Direito Penal, deslegitimandoqualquer prática maniqueísta que aponte adefesa social acima dos demais direitosindividuais. Os direitos individuais são,pois, intangíveis. Por conseguinte, temcomo escopo a desconstituição dofundamento terapêutico e o diagnóstico dasfalhas da instrumentalidade processual.

4 Conclusão

No desenrolar dos grossos tapetes da históriada humanidade, nota-se que sempre houve esempre haverá segregação social. Sem políticaspúblicas que ofereçam equidade de direitos egarantias individuais a todas as pessoas, dificilmentese poderá pensar em uma sociedade cujo sistemapunitivo seja abolido por completo.

No mesmo lastro se pode inferir que muitomais urgentes são as políticas preventivas àspráticas criminosas, tais como a garantia de acessoà saúde, educação, lazer, moradia, alimentação etc.,pilares para a construção e preservação dadignidade da pessoa humana.

Melhor seria se não fosse necessário ocárcere, mas como ainda não há meio menosagressivo de se punir condutas criminosas, há quese pensar nos direitos de quem se encontra atrásdas grades.

O primeiro Congresso das Nações Unidaspara a Prevenção do Delito e o Tratamento doDelinquente, realizado em Genebra em 1955,adotou regras mínimas para o tratamento dosreclusos, dentre elas constam a não discriminação

Page 34: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

34

de presos, proibição de que alguém seja preso semuma ordem válida de detenção, separação dospresos em razão do sexo, idade, etc., bem comopelo motivo da prisão (se civil ou criminal),condições mínimas dos presídios, em termos dehigiene e preservação da dignidade humana, direitoe dever de trabalhar, etc.

Também há as palavras de Herkenhoff, quecombinam com o que até aqui vem sendo exposto.Diz o doutrinador que

A “Convenção contra a Tortura e outrosTratamentos ou Penas Cruéis, Desumanasou Degradantes” foi adotada e aberta aadesões, pela Assembleia Geral das NaçõesUnidas, em 10 de dezembro de 1984. Entrouem vigor em 26 de junho de 1987.(HERKENHOFF, 1997, p. 115).

Tal convenção tem por objetivo preservar aintegridade física do preso, a fim de que não lhesejam impostos sofrimentos físicos ou mentais, porpessoa no exercício de função pública oufuncionário, haja vista atos violentos terem setornado práticas comuns, especialmente naobtenção de confissões.

Mas, ainda há muito o que fazer. É claro quehá de se considerar importantes avanços havidosao longo desses muitos séculos de quando datamos mais longínquos registros da atuação do homemna esfera penal, mas é possível verificar ainda nosdias atuais muito do Talião sendo praticado pelospróprios detentos, uns contra os outros, dentro dospresídios, onde não há fiscalização adequada.

Com vontade política se constrói uma novasociedade, justa, humana e igualitária, e na qual,talvez um dia, se possa falar em abolicionismopenal.

Por enquanto, basta que se pense emgarantias de direitos dos presos e já será umgrande passo.

Referências

ALMEIDA, Margarida Maria Barreto;AGUIAR, Cynara Silde Mesquita Veloso de;NEVES, Lailson Braga Baeta. Vozes docárcere: uma investigação da vida carcerária.Montes Claros, Ed. Unimontes, 2004.

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A ilusãode segurança jurídica: do controle da violênciaà violência do controle penal. Porto Alegre:Livraria do Advogado, 1997.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas.São Paulo: Martin Claret, 2005.

CESARE LOMBROSO. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Cesare_Lombroso>.Acesso em: 5 maio 2012.

DOTTI, René Ariel. Bases e alternativas parao sistema de penas. São Paulo: Revista dosTribunais, 1998.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder.Organização, introdução e revisão de RobertoMachado. Rio de Janeiro: Graal, 2001.

______. Vigiar e punir: nascimento da prisão.Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis:Vozes, 1987.

GUIMARÃES, Tânia Lopes de Almeida.Estabelecimentos penais e o tratamento penal.In: ZIMERMAN, David E.; COLTRO, AntônioCarlos Mathias. Aspectos psicológicos naprática jurídica. Campinas: Millenium, 2002.

HERKENHOFF, João Batista. Direitoshumanos: a construção universal de uma utopia.Aparecida (SP): Santuário, 1997.

HULSMAN, Louk; CELIS, Jacqueline Bernatde. Penas perdidas: o sistema penal emquestão. Rio de Janeiro: Luam, 1997.

MICHAELIS: Moderno dicionário da línguaportuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 1998.

MOTA, Maurício Jorge Pereira da. O crimesegundo Lombroso. Disponível em: <http://criminologiafla.wordpress.com/2007/08/20/aula-2-o-crime-segundo-lombroso-texto-complementar/>. Acesso em: 19 mar. 2012.

PALADINO, Carolina Freitas. Política criminal:direito penal mínimo x direito penal máximo.Disponível em: <http://www4.jfrj.jus.br/seer/index.php/revista_sjrj/article/viewFile/189/200>.Acesso em: 2 abr. 2012.

PINTO, Carlos Alberto Ferreira. Oabolicionismo penal. Disponível em: <http://www.recantodasletras.com.br/textosjuridicos/922323>. Acesso em: 20 mar. 2012.

Page 35: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

35

SILVA, Lívio Paulino Francisco da. Dos delitos edas penas: Beccaria e a proporcionalidade daspenas. Disponível em: <http://naletradalei.wordpress.com/2011/02/08/dos-delitos-e-das-penas-beccaria-e-a-proporcionalidade-das-penas/>. Acesso em: 19mar. 2012.

SIRENA, Gustavo. Antropologia criminal deLombroso: uma visão atual. Disponível em:<http://www.pontojuridico.com/modules.php?name=News&file=article&sid=159>.Acesso em: 19 mar. 2012.

STIPP, Álvaro. Garantismo. Disponível em:<http://www.esmpu.gov.br/dicionario/tiki-

index.php?page=Garantismo>. Acesso em: 9 abr.2012. SYMONIDES, Janusz (Org.). Direitoshumanos: novas dimensões e desafios. Brasília:Unesco, 2003.

ZAFFARONI, Eugênio Raúl. Em busca daspenas perdidas: a perda da legitimidade dosistema penal. Tradução de Vânia RomanoPedrosa e Almir Lopes da Conceição. Rio deJaneiro: Revan, 1999.

ZAFFARONI, Eugênio Raul; PIERANGELI,José Henrique. Manual de direito penalbrasileiro: parte geral. 3. ed. São Paulo: Revistados Tribunais, 2001.

Page 36: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

36

Page 37: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

37

RESUMO

Existe, no âmbito do Poder Judiciário, um grandenúmero de processos que tratam sobre dívidas,inclusive quando a Fazenda Pública é parte. Noentanto, apesar de haver leis que tratam sobredébitos discutidos judicialmente, elas normalmenteestão esparsas no ordenamento jurídico. Alémdisso, é grande a dificuldade em calcular estesdébitos considerando as variações de valores queocorrem quando a ação é proposta até a decretaçãode sua Sentença, além da carência deconhecimento a respeito desses cálculos. Estetrabalho tem por objetivo esclarecer as formas dejuros e correção monetária segundo o ordenamentojurídico brasileiro, assim como seus valores. Paratanto, foi realizado um levantamento bibliográfico,analisando-se doutrinas, normas e jurisprudência.A moeda, apesar de prevalecer com o decorrerdos anos, tem o seu valor alterado em virtude devariações que ocorrem na Economia. Paraacompanhar estas mudanças, no sentido deminimizar ou neutralizar as variações de valoreseconômicos, é necessário fazer sua correçãomonetária. Faz-se essa correção pelo valornominal da moeda afetado pela inflação e incide,também, sobre qualquer débito que resulte dedecisão judicial, segundo a Lei n.º 6.899/81. Osjuros são a quantia em moeda corrente que secalcula percentualmente sobre o valor do capital eem proporção ao decurso do tempo; podem serclassificados, dentre outros, em simples oucompostos, e legais ou convencionais. Segundo oart. 406 do Código Civil brasileiro de 2002, quandoos juros moratórios não forem convencionados, ouo forem sem taxa estipulada ou, ainda, quandoprovierem de determinação da lei, serão fixadoscom base na taxa que estiver em vigor para a morado pagamento de impostos devidos à FazendaNacional que, no caso, variará conforme o SistemaEspecial de Liquidação e de Custódia (SELIC).

JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA NAS LIQUIDAÇÕES JUDICIAIS

Andréia Coutinho Santos1

No tocante ao pagamento de juros moratórios pelaFazenda Pública, regulamenta a Lei n.º 4.414/64,esta responderá por tais juros na forma do DireitoCivil. Sobre a capitalização dos juros, dispõe doart. 4.º do Decreto n.º 22.626/33 que é vedada acontabilização de juros compostos. Portanto, osdébitos judiciais devem ser corrigidos com baseem juros simples e sofrer efeitos da correçãomonetária. Esta se fará com base nas tabelaspróprias, atualizadas mensalmente e disponíveis nossítios eletrônicos do Tribunal de Justiça Estadual edo Tribunal Regional Federal, para cálculos noâmbito da Justiça Estadual e Federal,respectivamente. Além disso, a taxa de juros éfixada em 1% ao mês, inclusive nos processos emque a Fazenda Pública seja parte.

Palavras-chave: juros; correção monetária; art.406 do Código Civil.

INTERESTS AND CORRECTIONMONETARY IN JUDICIAL

PROCEEDINGS

Andréia Coutinho Santos2

ABSTRAT

Exists a large number of judicial proceedings thatdeal with debt, even when the Treasury is a party.However, despite the existence of laws that dealwith debts discussed in judicially, they are normallyscattered in the legal system. Furthermore, it isnot easy to calculate these debts considering thevariations of values that occur when the action isproposed until the adjudication of his sentence,beyond lack of knowledge about these calculations.This paper aims to explain the forms of interestand inflation according to the Brazilian legal system,as well as their values. To that end, we conducteda literature review, analyzing the doctrines, rules

1 Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual de Montes Claros. Acadêmica do Curso de Direito daFaculdade de Direito Santo Agostinho.

2 Graduated in Biology by Montes Claros University Stated; Student of Law by Santo of Law Agostinho Facultyes

Page 38: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

38

and jurisprudence. The money, though prevail withthe years, its value has changed because ofvariations that occur in economics. To accompanythese changes in order to minimize or to neutralizethe changes in economic values , it is necessaryto make its monetary correction. This correctionis made at the nominal value of the currencyaffected by inflation relates and also on any debtresulting from judicial decision, according to LawNo. 6.899/81. Interest rates is the amount ofcurrency that percentage is calculated on theamount of capital and in proportion to the passageof time, can be classified, among others, in simpleor compound and legal or conventional. Accordingto art. 406, CC/02, when the moratorium interestis not agreed, or are without the rate stipulated, oreven when they come from determination of thelaw shall be fixed based on the rate that is in effectfor late payment of taxes due to National Treasurythat, in this case will vary depending of SistemaEspecial de Liquidação e de Custódia (SELIC).Concerning to the payment of default interest bythe Public Treasury, regulates Law No. 4.414/64that account for such interest in the form of civillaw. On the capitalization of interest, provides art.4 of Decree No. 22.626/33 which is forbidden tocharge interest compounds. Therefore, the judicialdebts should be corrected based on simple interestand suffer effects of monetary correction, this willbe done based on the tables themselves, updatedmonthly and available from the State Court andFederal Court, for calculations in the State Courtsand Federal, respectively. Moreover, the interestrate is fixed at 1% per month, including in cases inwhich the Treasury is a party.

Keywords: interest; monetary correction; art. 406,CC.

Introdução

No âmbito do Poder Judiciário, há um grandenúmero de processos que tratam sobre dívidas. Umasimples busca no sítio Google, com o termo “débitosjudiciais”, obteve, aproximadamente, quatro milhões,seiscentos e dez mil resultados (GOOGLE, 2011).No entanto, apesar de haver leis que tratam sobredébitos discutidos judicialmente, elas normalmenteestão esparsas no ordenamento jurídico. Além disso,é grande a dificuldade em calcular estes débitosconsiderando as variações de valores que ocorremquando a ação é proposta até a decretação de sua

Sentença, além da carência de conhecimento arespeito desses cálculos. Em virtude disso, faz-senecessário, muitas vezes, a presença de profissionaisdas áreas de Contabilidade, Economia eAdministração.

Este trabalho tem por objetivo esclarecer asformas de juros e correção monetária segundo oordenamento jurídico brasileiro, assim como seusvalores. Não objetiva, porém, esgotar todo oassunto uma vez a sua tamanha dimensão e suainterdisciplinaridade.

1 Juros e correção monetária

A moeda, apesar de prevalecer com odecorrer dos anos, tem o seu valor alterado emvirtude de variações que ocorrem na Economia.Pode haver, portanto, uma inflação ou umadeflação. Vieira Sobrinho diferencia estes doistermos: “a inflação caracteriza-se por aumentospersistentes e generalizados dos preços dos bense serviços à disposição da sociedade; quandoocorre o fenômeno inverso, tem-se a deflação.”(VIEIRA SOBRINHO, 2000, p. 261).

Ainda acerca da deflação, ou índicesnegativos de inflação, tem-se que

Salvo decisão judicial em contrário, os índicesnegativos de correção monetária (deflação)serão considerados no cálculo de atualização.Contudo, se a atualização implicar reduçãodo principal, deve prevalecer o valor nominal.A redução do valor nominal comoconsequência da correção monetáriarepresentaria o descumprimento do títuloexecutivo e infringiria a coisa julgada.Ademais, poderia acarretar reduções vedadasconstitucionalmente. (CONSELHONACIONAL DE JUSTIÇA, 2010, p. 33).]

Para acompanhar estas mudanças, no sentidode minimizar ou neutralizar as variações de valoreseconômicos, é necessário fazer sua correçãomonetária. Faz-se essa correção pelo valornominal da moeda afetado pela inflação e incide,também, sobre qualquer débito que resulte dedecisão judicial, segundo a Lei n.º 6.899/1981(GUIMARÃES, 2010, p. 240). Conforme VieiraSobrinho, é através da correção monetária que osvalores ditos monetários – como preços de bens eserviços, salários, empréstimos e financiamentos– podem ser reajustados com base na inflaçãoocorrida no período anterior. Esta inflação é medidapor um índice de preços calculado, normalmente,pela Fundação Getúlio Vargas ou pelo Instituto

Page 39: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

39

Brasileiro de Geografia e Estatística (VIEIRASOBRINHO, 2000, p. 261).

Os juros são a “quantia em moeda correnteque se calcula percentualmente sobre o valor docapital e em proporção ao decurso do tempo (arts.389, 404 e 890, do Código Civil)” (RIO GRANDEDO SUL, 2010). Eles podem ser capitalizados(juros compostos), quando se calculam sobre ocapital já acrescido de juros referentes adeterminado período; ou podem ser compensatórios,que são os juros devidos como compensação ourenumeração do capital no sentido negocial (jurossimples) (GUIMARÃES, 2010, p. 408-409);podem, ainda, ser legais (disciplinados na lei) ouconvencionais (estabelecidos mediante acordoentre as partes); além de outras classificações.

De Plácido e Silva (1987, p. 35) conceituajuros como sendo os

[...] frutos do capital, ou seja, os justosproventos ou recompensas que deles setiram, consoante permissão e determinaçãoda própria lei, sejam resultantes de umaconvenção ou exigíveis por faculdadeinscrita em lei.

Parizatto (2001, p. 105), por sua vez, afirmaque juros são “o rendimento auferido pelo uso dodinheiro durante um determinado período, privando--se o credor de seu uso em tal período”.

Segundo Theodoro (2010) e, de acordo como art. 1.º da Lei 6.899/81, a correção monetáriaincide sobre qualquer débito resultante de decisãojudicial, além das custas e honorários advocatícios.Já quanto aos juros, apesar de não haver leiexpressa sobre sua incidência nas custas ehonorários, o STF editou a Súmula 254, na qualdetermina “Incluem-se os juros moratórios naliquidação, embora omisso o pedido inicial ou acondenação.”.

2 Normas jurídicas

Muitas são as normas jurídicas que regulamsobre as taxas de juros a ser cobradas no âmbitojudicial. Tais normas, porém, ora se contrapõem,ora se complementam. Assim, por exemplo, previao Código Civil de 1916, em seu art. 1.062 que “ataxa dos juros moratórios, quando nãoconvencionados, será de 6% ao ano (0,5% aomês).”.

Em 24 de agosto de 2001, foi editada a MedidaProvisória 2.180-35, que inseriu o art. 1.º-F à Lei9.494/97, segundo o qual

Os juros de mora, nas condenaçõesimpostas à Fazenda Pública para pagamentode verbas remuneratórias devidas aservidores e empregados públicos, nãopoderão ultrapassar o percentual de seispor cento ao ano.

Este artigo chegou a ser contestado peranteo Supremo Tribunal Federal, mediante RecursoExtraordinário (REx) n.º 453740, sob a alegaçãode ser inconstitucional pois, apesar de estar emacordo com o Código Civil vigente à época,desrespeitava o princípio da isonomia previsto noart. 5.º da Constituição Federal. Este argumento,no entanto, não foi aceito pela maioria dos Ministrosdo STF, que declararam sua constitucionalidade.O Relatório do Ministro Gilmar Mendes, no referidoRecurso Extraordinário, confirmou o teor do artigocitado, sendo seguido pelos demais integrantes daCorte. Vale ressaltar que, em 2009, o dispositivosupracitado foi novamente alterado pela Lei n.º11.960, passando a vigorar a Lei 9.494, de 1997,do seguinte modo:

1.º-F. Nas condenações impostas à FazendaPública, independentemente de suanatureza e para fins de atualizaçãomonetária, remuneração do capital ecompensação de mora, haverá a incidênciauma única vez, até o efetivo pagamento,dos índices oficiais de remuneração básicae juros aplicados à caderneta de poupança.

Em 2002, a entrada do Novo Código Civilprovocou mudanças sobre o percentual de juros.Em seu Capítulo IV, este Código trata dos juroslegais. O artigo 406 do referido diploma estabeleceque,

Art. 406. Quando os juros moratórios nãoforem convencionados, ou o forem sem taxaestipulada, ou quando provierem dedeterminação da lei, serão fixados segundoa taxa que estiver em vigor para a mora dopagamento de impostos devidos à FazendaNacional.

A taxa de juros moratórios referida nestedispositivo está disciplinada no art. 39, § 4.º, daLei n.º 9.250, de 26/12/1995 (que instituiu a taxaSELIC para o pagamento de tributos em atraso) eassim está grafado:

Art. 49. [...]§ 4.º A partir de 1º de janeiro de 1.996, acompensação ou restituição será acrescida

Page 40: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

40

de juros equivalentes à taxa referencial doSistema Especial de Liquidação e deCustódia – SELIC para títulos federais,acumulada mensalmente, calculados partirda data do pagamento indevido ou a maioraté o mês anterior ao da compensação ourestituição e de 1% relativamente ao mêsem que estiver sendo efetuada.

A Constituição Federal, ao se manifestarsobre as taxas de juros, em seu texto original,estabelecia:

Art. 192. O sistema financeiro nacional,estruturado de forma a promover odesenvolvimento equilibrado do País e aservir aos interesses da coletividade emtodas as partes que o compõem,abrangendo as cooperativas de crédito,será regulado por leis complementares, quedisporão, inclusive, sobre a participação docapital estrangeiro nas instituições que ointegram.[...]§ 3.º As taxas de juros reais, nelas incluídascomissões e quaisquer outrasremunerações direta ou indiretamentereferidas à concessão de crédito, nãopoderão ser superiores a doze por cento aoano; a cobrança acima deste limite seráconceituada como crime de usura, punido,em todas as suas modalidades, nos termosque a lei determinar.

Esta norma provocou diversas controvérsiassobre sua autoaplicabilidade. Embora alguns julgadosdos Tribunais Regionais e mesmo dos TribunaisSuperiores tenham sido favoráveis à suaautoaplicabilidade, o Supremo Tribunal Federal (STF)determinou que cabia à lei definir os limites da taxade juros, posicionando, então, pela não-aplicabilidadeda norma. No entanto, a falta de lei complementarnão impedia que o art. 192, § 3.º fosse autoaplicávelao menos no âmbito do limite das taxas de juros. Ocaput do artigo 192 e todos os seus parágrafos eincisos, neles incluído o § 3.º do mencionado artigoque limitava os juros anuais em doze por cento,acabou por ser revogado pela Emenda Constitucionaln.º 40/03.

Sobre o pagamento de juros moratórios pelaFazenda Pública (União, Estados, Distrito Federal,Municípios e Autarquias), regulamenta a Lei n.º4.414, de 24 de setembro de 1964, que estaresponderá por tais juros na forma do Direito Civil.

O Decreto n.º 22.626, de 7 de abril de 1933,conhecido como Lei da Usura, dispõe sobre os jurosnos contratos nos seguintes termos:

Art. 1.º É vedado, e será punido nos termosdesta lei, estipular em quaisquer contratostaxas de juros superiores ao dobro da taxalegal.[...]§ 3.º A taxa de juros deve ser estipulada emescritura publica ou escrito particular, e nãoo sendo, entender-se-á que as partesacordaram nos juros de 6% ao ano, a contarda data da propositura da respectiva açãoou do protesto cambial.

Art. 2.º É vedado, a pretexto de comissão,receber taxas maiores do que as permitidaspor esta lei.

Art. 4.º É proibido contar juros dos juros:esta proibição não compreende aacumulação de juros vencidos aos saldoslíquidos em conta corrente de ano a ano.

Ar t. 5.º Admite-se que pela mora dos juroscontratados estes sejam elevados de 1% enão mais.

Percebe-se, desse modo, que é vedada acontabilização de juros compostos (art. 4.º doDecreto n.º 22.626/33). Outros dispositivos legaistratam sobre as taxas de juros e correçãomonetária: artigos 407, 409, 475, e 591, do CódigoCivil, por exemplo. Há também diversas Súmulasdo Superior Tribunal de Justiça que tratam doassunto, dentre elas as de números 8, 14, 16, 29,30, 35, 36, 43, 67, 71, 148, 160, 162, 179, e 249. Porseu lado, o Supremo Tribunal Federal também cuidado tema na Súmula 618.

Em face ao Superior Tribunal de Justiça,assim descreve a Súmula 148:

148. Os débitos relativos a benefícioprevidenciário, vencidos e cobrados emjuízo após a vigência da Lei nº 6.899/81,devem ser corrigidos monetariamente naforma prevista nesse diploma legal.

Considerando que o Superior Tribunal deJustiça (SJT) é órgão jurisdicional nascido com aConstituição Federal de 1988 em substituição aoentão existente Tribunal Federal de Recursos(TFR), e que as Súmulas editadas pelo TRFcontinuam em vigor, se não revogadas, ouderrogadas, vale ressaltar que, segundo o Manualde Orientação de Procedimentos para Cálculos naJustiça Federal,

A Súmula n. 71/TFR foi revogada pelaSúmula n. 148/STJ. Porém, se a decisão

Page 41: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

41

judicial, com trânsito em julgado, houverdeterminado a aplicação da Súmula n. 71/TFR, deverão ser observados os critériosnela estabelecidos, ou seja, correçãomonetária com base na variação do saláriomínimo, até o ajuizamento da ação (posiçãoanterior do STJ – vide REsp n. 72.163/SP)(CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA,2010, p. 39-40).

Sobre a correção monetária, tem-se, comoexemplo, a Lei n.º 4.591, de 16 de dezembro de1964, art. 63, § 9.º; e a Lei n.º 9.069, de 29 dejunho de 1995, arts. 19 a 22, 24, 27, 28, 44 e 47.Esta última dispõe, dentre outros temas, sobre oSistema Monetário Nacional.

A correção monetária se faz através de umataxa que restaura o poder aquisitivo da moeda.Diversos são os indexadores. Estes são construídosde acordo com o emprego de índices a fim derefletirem a variação verificada por índice geralde preços da economia brasileira. Algumasentidades de medição de fatores de inflação quemerecem destaque são a Fundação Getúlio Vargas(FGV), a Fundação Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística (IBGE), e a FundaçãoInstituto de Pesquisas Econômicas (FIPE)(MARTINS, 1990). A indexação implica namodificação de dados iniciais “para valorescompatíveis com a mesma capacidade aquisitivaverificada numa data posterior.” (MARTINS,1990).

O Código Civil de 2002, ao tratar sobre oDireito das Obrigações, disciplina, no Título III,Capítulo I, sobre o pagamento. Prescreve oreferido diploma

Ar t. 315. As dívidas em dinheiro deverãoser pagas no vencimento, em moedacorrente e pelo valor nominal, salvo odisposto nos artigos subsequentes.

Trata-se aqui do pagamento em dinheiro, aforma mais importante de pagamento. Dívida emdinheiro, segundo Gonçalves (2010, p. 272) “é aque se representa pela moeda considerada em seuvalor nominal, ou seja, pelo importe econômico nelaconsignado.”. Este é o princípio do nominalismo.

Os artigos subsequentes mencionados noart. 315 são os arts. 316 e 317, que determinamque:

Art. 316. É lícito convencionar o aumentoprogressivo de prestações sucessivas.

Art. 317. Quando, por motivosimprevisíveis, sobrevier desproporçãomanifesta entre o valor da prestação devidae o do momento de sua execução, poderá ojuiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modoque assegure, quanto possível, o valor realda prestação.

Em 1997, foi realizado o Encontro Nacionaldo Colégio dos Corregedores-Gerais da Justiça dosEstados e do Distrito Federal. A partir deste,passou-se à uniformização da tabela de fatores deatualização monetária em âmbito estadual. Estastabelas, disponíveis nos sítios dos Tribunais deJustiça dos respectivos Estados-membros, dividem--se em “com expurgo” e “sem expurgo”, no quese refere aos indexadores alterados pelos planoseconômicos.

A Resolução n.º 134, de 21 de dezembro de2010, do Conselho de Justiça Federal, de cujaementa consta que aprova o Manual deOrientação de Procedimentos para os Cálculosna Justiça Federal e, em seu art. 4º, revoga aResolução 561/2007, que também tratava de umManual, mas este estava desatualizado em virtude,por exemplo, da Lei n.º 11.960/2009 e da EmendaConstitucional (EC) n.º 62/2010.

Este novo Manual tem basicamente trêsobjetivos: reduzir incidentes processuais; auxiliaros magistrados nas suas decisões que envolvamcálculos; e, “orientar os setores de cálculos nointeresse da instrução processual ou dasexecuções.” (CONSELHO NACIONAL DEJUSTIÇA, 2010, p. 9).

O novo Manual de Cálculos, as Tabelas deCorreção Monetária, disponibilizados aos usuáriosinternos da Justiça Federal e ao público em geral,e o Sistema Nacional de Cálculos Judiciais (SNCJ),destinado ao uso dos setores de cálculos da JustiçaFederal, são instrumentos que têm o escopo depropiciar celeridade à prestação jurisdicional, comsegurança e qualidade, por meio da uniformizaçãoe padronização de procedimentos. (CONSELHONACIONAL DE JUSTIÇA, 2010, p. 9).

O Manual apresenta diversas normas queregulam sobre os débitos judiciais, os indexadores,as taxas de juros e correção, dentre outrasinformações, numa linguagem clara e concisa, demodo a facilitar seu entendimento. Sobre os jurose a correção monetária nas repetições de indébito,afirma o Manual que serão calculadas pela taxaSelic, em razão do princípio da simetria/isonomia. Há, ainda, menção de alguns julgados:

Page 42: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

42

REsp. n.º 722.890/RS, REsp. n.º 1.111.189/SP,REsp. n.º 1.086.603/PR, AGA n.º 1.133.737/SC,AGA n.º 1.145.760/MG (CONSELHONACIONAL DE JUSTIÇA, 2010, p. 42,43).

A taxa denominada Sistema Especial deLiquidação e Custódia (Selic) deve ser calculadacom base na capitalização simples “sendo vedadasua incidência cumulada com os juros de mora ecom a correção monetária.” (CONSELHONACIONAL DE JUSTIÇA, 2010, p. 20). Alémdisso, deve ser aplicada “a partir do mês seguinteao da competência da parcela devida até o mêsanterior ao pagamento, e 1% no mês dopagamento.” (CONSELHO NACIONAL DEJUSTIÇA, 2010, p. 20).

3 Cálculos

3.1 Taxa de juros

“Taxa de juros é a razão entre os jurosrecebidos (ou pagos) no final de um certo tempo eo capital inicialmente aplicado (ou emprestado).”(VIEIRA SOBRINHO, 2000, p. 20). Assim,

obtém-se a seguinte fórmula: onde i é a

taxa de juros; J o valor dos juros e P o capitalinicial.

Em geral, as taxas de juros podem serclassificadas conforme dois critérios: quanto aoregime de capitalização, em taxas simples ecomposta, como já mencionado; e quanto ao valordo capital inicial tomado como base de cálculo, emtaxa nominal, efetiva e real. (VIEIRASOBRINHO, 2000, p. 183). Interessa aqui oprimeiro critério.

3.2 Capitalização simples

“Capitalização simples é aquela em que a taxade juros incide somente sobre o capital inicial; nãoincide, pois, sobre os juros acumulados. Nesteregime de capitalização a taxa varia linearmenteem função do tempo.” (VIEIRA SOBRINHO,2000, p. 21). A fórmula para obtenção do valor

dos juros é: onde J é o valor dos

juros; P, o valor do capital inicial ou principal; i, ataxa de juros; e n o prazo.

3.3 Capitalização composta

Capitalização composta é aquela em que ataxa de juros incide sobre o capital inicial,acrescido dos juros acumulados até o períodoanterior. Neste regime de capitalização, o valordos juros cresce em função do tempo.(VIEIRA SOBRINHO, 2000, p. 34).

Fórmula:

Onde P é o capital inicial; S, o montante(“soma do capital aplicado ou devido mais o valordos juros correspondentes ao prazo da aplicaçãoou da dívida”); n, o prazo; e, i, a taxa.

Com base na análise das duas fórmulas, pode--se observar que “as diferenças entre os montantesproduzidos a juros simples e compostos acentuam--se em função do aumento dos prazos.” (VIEIRASOBRINHO, 2000, p. 60).

4 Considerações finais

Visto que o ordenamento jurídico brasileiroproíbe a cobrança de juros compostos, os débitosjudiciais devem ser corrigidos com base em jurossimples. Além disso, devem sofrer efeitos, também,da correção monetária que se fará com base nastabelas próprias, atualizadas mensalmente edisponíveis nos sítios dos Tribunais de JustiçaEstaduais e do Tribunal Regional Federal, paracálculos no âmbito da Justiça Estadual e Federal,respectivamente.

Observa-se, também, que a taxa de jurosdeverá ser fixada com base na taxa SELIC,podendo sofrer variações mensais conformedecisões do Banco Central do Brasil, a quemcompete gerir o Sistema, inclusive nos processosem que a Fazenda Pública seja parte, a fim se deevitar abusos nos casos de desproporção manifestaentre o valor devido e o valor cobrado.

Referências

ARANHA, Ricardo Gomes. Direito tributário.Belo Horizonte: Del Rey, 2001.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição daRepública Federativa do Brasil. Brasília: SenadoFederal, 1988.

Page 43: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

43

BRASIL. Decreto 22.626, de 7 de abril de 1933.Dispõe sobre os juros nos contratos e da outrasprovidencias. Diário Oficial [dos] EstadosUnidos do Brasil. Rio de Janeiro, RJ, 8 abr.1933.

BRASIL. Decreto-Lei n.º 75, de 21 de novembrode 1966. Dispõe sobre a aplicação da correçãomonetária aos débitos de natureza trabalhista,bem como a elevação do valor do depósitocompulsório nos casos de recursos perante osTribunais do Trabalho, e dá outras providências.Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil, Brasília, DF, 11 nov. 1966.

BRASIL. Decreto-Lei 2.290, de 21 denovembro de 1986. Estabelece normas sobre adesindexação da economia e dá outrasprovidências. Diário Oficial [da] RepúblicaFederativa do Brasil, Brasília, DF, 22 nov.1986.

BRASIL. Decreto-Lei 2.322, de 26 de fevereirode 1987. Altera o Decreto-lei n° 2.290, de 21 denovembro de 1986, e dá outras providências.Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil, Brasília, DF, 27 fev. 1987.

BRASIL. Lei 4.414, de 24 de setembro de 1964.Regula o pagamento de juros moratórios pelaUnião, pelos Estados, Distrito Federal,Municípios e autarquias. Diário Oficial [da]República Federativa do Brasil, Brasília, DF,29 set. 1964.

BRASIL. Lei 4.591, de 16 de fevereiro de 1964.Dispõe sobre o condomínio em edificações e asincorporações imobiliárias. Diário Oficial [da]República Federativa do Brasil, Brasília, DF,21 fev. 1964.

BRASIL. Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966.Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional einstitui normas gerais de direito tributárioaplicáveis à União, Estados e Municípios.(Código Tributário Nacional). Diário Oficial[da] República Federativa do Brasil, Brasília,DF, 27 out. 1966.

BRASIL. Lei 6.899, de 8 de abril de 1981.Determina a aplicação da correção monetárianos débitos oriundos de decisão judicial e dáoutras providências. Diário Oficial [da]

República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 9abr. 1981.

BRASIL. Lei 9.069, de 29 de junho de 1995.Dispõe sobre o Plano Real, o Sistema MonetárioNacional, estabelece as regras e condições deemissão do REAL e os critérios para conversãodas obrigações para o REAL, e dá outrasprovidências. Diário Oficial [da] RepúblicaFederativa do Brasil, Brasília, DF, 30 jun. 1987.

BRASIL. Lei 9.250, de 26 de dezembro de1995. Altera a legislação do imposto de rendadas pessoas físicas e dá outras providências.Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil, Brasília, DF, 27 dez. 1995.

BRASIL. Lei 9.494, de 10 de setembro de 1997.Disciplina a aplicação da tutela antecipadacontra a Fazenda Pública, altera a Lei nº 7.347,de 24 de julho de 1985, e dá outras providências.Diário Oficial [da] República Federativa doBrasil, Brasília, DF, 11 set. 1997.

BRASIL. Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.Institui o Código Civil. Diário Oficial [da]República Federativa do Brasil, Brasília, DF,11 jan. 2002.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RecursoExtraordinário 453.740-1 Rio de Janeiro/2007.Julgado em 27 de fevereiro de 2007. RelatorMinistro Gilmar Mendes. Diário Oficial [da]República Federativa do Brasil, Brasília, DF,28 fev. 2007.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula n.º254, de 13 de dezembro de 1963. Súmula dajurisprudência predominante do SupremoTribunal Federal: anexo ao regimento interno.Brasília: Imprensa Nacional, 1964, p. 119.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA.Resolução N.º 134, de 21 de dezembro de 2010.Aprova o Manual de Orientação deProcedimentos para os Cálculos na JustiçaFederal e dá outras providências. Disponível em:<http://www.jfsp.jus.br/assets/Uploads/administrativo/NUAJ/Doctos-Diversos/Manual-Res-134-10.pdf> Acesso em: 4 maio 2012.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civilbrasileiro: teoria geral das obrigações. v. 2. 7.ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

Page 44: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

44

GOOGLE. Disponível em<www.google.com.br>. Acesso em: 10 maio2011.

GUIMARÃES, Deoclesiano Torrieri.Dicionário técnico jurídico. 13. ed. São Paulo:Rideel, 2010.

KUHNEN, Osmar Leonardo; BAUER, UdibertReinoldo. Matemática financeira aplicada eanálise de investimentos. 3. ed. São Paulo:Atlas, 2001.

MARTINS, Eliseu; ASSAF NETO, Alexandre.As finanças das empresas sob condiçõesinflacionárias. São Paulo: Atlas, 1985. 6.ªtiragem 1990.

MENDES, José Piragibe Figueiredo.Amortização de empréstimos a juros simples:sistemas de pagamento sem anatocismo.Disponível em: <http://www.aui.org.br/artigos/docs/Amortizacao_de_Emprestimo_a_Juros_Simples-Jose_Piragibe.pdf>. Acesso em: 3 abr. 2011.

NEVES, Marcelo. Estudo sobre a viabilidadejurídica do pagamento de juros de mora aservidor público em âmbito administrativo.

Disponível em: <http://www.artigonal.com/doutrina-artigos/estudo-sobre-a-viabilidade-juridica-do-pagamento-de-juros-de-mora-a-servidor-publico-em-ambito-administrativo-1031580.html>. Acesso em: 3 maio 2011.

PARIZATTO, João Roberto. Multas e juros. 4.ed. São Paulo: Edipa, 2001.

RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça doRio Grande do Sul. Apelação Cível MCM N.º70038595617/2010/CÍVEL. 2.ª Câmara EspecialCível. Relator Desembargador Marcelo CezarMüller. Julgado em 15 dez. 2010. Diário Oficial[do] Estado do Rio Grande do Sul. PortoAlegre, 30 dez. 2010.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico.Rio de Janeiro: Forense, 1987.

THEODORO, Anderson. Juros e correçãomonetária em sentenças judiciais. Disponível em:<http://pt.shvoong.com/law-and-politics/law/1980708-juros-corre%C3%A7%C3%A3o-monet%C3%A1ria-em-sente%C3%A7as/#ixzz1IV9hw3wi>. Acesso em: 4 maio 2011.

VIEIRA SOBRINHO, José Dutra. Matemáticafinanceira. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

Page 45: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

45

RESUMO

A atividade do legislador ordinário se dá, muitasvezes, nas chamadas normas constitucionais deeficácia contida, ou seja, normas que nascemplenas, mas terão seu âmbito de eficácia restrito.Dessa forma, essa atividade poderá restringirdireitos fundamentais de tal forma que podem deixá--los vazios, sendo necessário impor um limite a essaatuação. A teoria moderna que estrutura essaatuação do legislador é a teoria dos limites doslimites, ou seja, limites para a limitação ou restriçãodos direitos fundamentais. Para nortear a atividadedo legislador, é necessária a observância, segundoa teoria, do núcleo essencial do direito fundamental,a restrição seja genérica e abstrata, e a haja asubmissão ao princípio da proporcionalidade.Assim, a restrição irá desenvolver mais do queprejudicar o direito fundamental, sendo a atuaçãodo legislador ordinário compatível com aproporcionalidade para não esvaziar o âmbito deproteção da norma constitucional, maculando anorma de inconstitucionalidade.

Palavras-chave: Direito fundamental; restrição;eficácia; âmbito de proteção.

ABSTRACT

The activity takes place of the ordinary legislatoroften calls on constitutional efficacy contained, ie,rules that are born full, but have limited their scopeof effectiveness. Thus, this activity may restrictfundamental rights so that they can leave themempty, being necessary to impose a limit to thisaction. The modern theory that this action of thelegislative framework is the theory of limits of limits,or limits to the limitation or restriction offundamental rights. To guide the activity of thelegislature, it is necessary to observe, according totheory, the core of a fundamental right, therestriction is generic and abstract, and there issubmission to the principle of proportionality. Thus,

TEORIA DOS LIMITES DOS LIMITES

Vânio Soares Guimarães1

the restriction will develop more than underminethe fundamental right, and the performance of theordinary legislator compatible with theproportionality not to empty the scope of protectionof constitutional law, abusing the standard ofunconstitutionality.

Keywords: Fundamental right; restriction;effectiveness; scopeof protection.

1 Introdução

O tema ora abordado se refere à análise daspossíveis limitações aos direitos fundamentais,expressos na Constituição da República Federativado Brasil, de 1988 (CRFB/88), feitas pelo legisladorinfraconstitucional. A ideia permeia um âmbito deproteção do direito fundamental que precisa serpreservado quando trabalhado pelo legisladorordinário, para que não haja o esvaziamento doconteúdo desse direito fundamental. Conformedestaca Fernandes (2011), questiona-se aqui comorestringir um direito fundamental e não eivar aprática de vício (inconstitucionalidade). Para isso,lança-se mão da chamada “Teoria dos limites doslimites”, que traduz um norte para a atuaçãolegislativa ordinária, diante de uma normaconstitucional de eficácia contida.

1.1 Considerações Sobre DireitosFundamentais

Na evolução do Direito Constitucional, algunsapontam como evidente um constitucionalismo dofuturo ou neoconstitucionalismo, de acordo comLenza (2009), que passa pela ideia de concretizaçãodos valores constitucionais e estruturaçãodogmática dos direitos fundamentais. Fernandes(2011) expressa parecer inegável à relação entreo avanço do constitucionalismo e a afirmação dosdireitos fundamentais.

1 Graduando em Direito pela Faculdade de Direito Santo Agostinho.

Page 46: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

46

Nas palavras de Fernandes (2011, p. 229),os direitos fundamentais

Seriam, ao mesmo tempo, ora vistos comodireitos de defesa (ligados a um dever deomissão, um não fazer ou não interferir nouniverso privado dos cidadãos),principalmente contra o Estado; mas ainda,como garantias positivas para o exercíciodas liberdades (e aqui, entendidos comoobrigações de fazer ou de realizar) por partedo mesmo Estado.

Dessa forma, os direitos fundamentais sãofruto do desenvolvimento do direito, principalmentepor estarem entrelaçados com os DireitosHumanos. Galuppo, apud Fernandes (2011, p. 231),sintetiza que:

Os direitos fundamentais são produtos deum processo de constitucionalização dosdireitos humanos, entendidos estes últimoscomo elementos de discursos morais aolongo da história. Assim, os direitosfundamentais não podem ser tomadoscomo verdades morais dadas previamente,mas como elemento de constante processode (re)construção, haja vista que suajustificação e normatividade decorrem deuma Constituição positiva, igualmentemutável.

Sendo assim, Bonavides (2004, p. 561)expressa que “falar em direitos fundamentais éfalar em condições para a construção e o exercíciode todos os demais previstos no OrdenamentoJurídico, e não apenas em uma leitura reducionista,como direito oponíveis contra o Estado”.

Cavalcanti Filho2 destaca que:

Com base nisso, poderíamos definir osdireitos fundamentais como os direitosconsiderados básicos para qualquer serhumano, independentemente de condiçõespessoais específicas. São direitos quecompõem um núcleo intangível de direitosdos seres humanos submetidos a umadeterminada ordem jurídica.

Dessa forma, Sena3 explora que os DireitosHumanos passam a ser reflexos dos valores da

sociedade positivados na Constituição. Aindaacrescenta a referida autora que,

Como constituem a base do ordenamentojurídico, os direitos e garantias fundamentaispassam a assumir uma eficácia irradiante,formando uma correia de interligação comtodos os direitos inseridos na ordem vigente.Tornam-se diretrizes para a aplicação einterpretação das normas jurídicas. Há, assim,uma filtragem constitucional: qualquernorma somente estará em conformidade coma Constituição se passar por este filtro.

Esboçados os primeiros aspectos dos direitosfundamentais, outro ponto de relevância diz respeitoàs características dos direitos fundamentais. NunesJúnior, apud Lenza (2009), destaca algumascaracterísticas, sendo as principais, necessárias aeste trabalho, a historicidade, a universalidade, aconcorrência, irrenunciabilidade e a limitabilidade(relatividade).

Assim, em breves linhas, faz-se a análise decada característica, a começar da historicidade.Segundo Lenza (2009), os direitos fundamentaispossuem caráter histórico, nascendo com ocristianismo, passando pelas diversas revoluçõese chegando aos dias atuais. Adiciona Mendes(2009, p. 275) que se “afirma que os direitosfundamentais são um conjunto de faculdades einstituições que somente faz sentido numdeterminado contexto histórico.”.

A universalidade é outra característica quese desponta nos direitos fundamentais. Nessatoada, Fernandes (2011, p. 248) assevera que, nauniversalidade, “reconhece-se como seu titular todaa coletividade jurídica, garantindo assim um sistemade igualdade na distribuição dos direitosfundamentais que não comporta discriminação dequalquer espécie.”.

A concorrência se refere à possibilidade dese exercer cumulativamente os direitosfundamentais. Outra característica típica é airrenunciabilidade que, segundo Fernandes (2011,p. 248), “apresenta a noção de que, em regra,direitos fundamentais não podem ser objeto derenúncia por seu titular.”.

2 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20 dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 22 maio 2012.3 Disponível em: <http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/docs/convidados/ 13_convidado_renata1.pdf >. Acessoem: 22 maio 2012.

Page 47: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

47

Acrescente-se, por fim, a limitabilidade, ourelatividade – este último termo, segundo algunsautores. Para Lenza (2009, p. 672),

Os direitos fundamentais não são absolutos(relatividade), havendo, muitas vezes, nocaso concreto, confronto, conflito deinteresses. A solução ou vem discriminadana própria Constituição (ex.: direito depropriedade versus desapropriação), oucaberá ao intérprete, ou magistrado, no casoconcreto, decidir qual direito deveráprevalecer, levando em consideração a regrada máxima observância dos direitosfundamentais envolvidos, conjugando-acom sua mínima restrição.

Tavares (2010, p. 558) aponta que

Não existe nenhum direito humanoconsagrado pelas Constituições que sepossa considerar absoluto, no sentido desempre valer como máxima a ser aplicadanos casos concretos, independentementeda consideração de outras circunstânciasou valores constitucionais. Nesse sentido,é correto afirmar que os direitosfundamentais não são absolutos. Existeuma ampla gama de hipóteses que acabampor restringir o alcance absoluto dosdireitos fundamentais.

Assim, Fernandes (2011, p. 249) arremataque “não haveria possibilidade de absolutização deum direito fundamental (‘ilimitação’ de seumanuseio) pois ele encontraria limites em outrosdireitos tão fundamentais quanto ele.”. Dessaforma, das várias características abordadas, arelativização dos direitos fundamentais tem funçãovital para o desenvolvimento do tema aqui discutido.

1.1 O Âmbito de Proteção e a Restrição dosDireitos Fundamentais

Observa-se que a limitação de direitosfundamentais é possível, conforme já abordado, edeve ser tratada como um tema central dadogmática constitucional. Parte-se, assim, paraapreciação do estudo do direito fundamental, daindispensável apreciação do âmbito de proteçãodeste direito, pois, segundo Mendes (2009), estaanálise configura pressuposto primário para

aprofundar no entendimento de qualquer direitofundamental.

De acordo com Mendes (2009, p. 328), oâmbito de proteção de um direito fundamental“abrange os diferentes pressupostos fáticos ejurídicos contemplados na norma jurídica e aconsequência comum, a proteção fundamental.”.Ainda acrescenta o referido autor que “nos direitosfundamentais de proteção ou de defesa cuida-sede normas sobre elementos básicos dedeterminadas ações ou condutas explicitadas deforma a lapidar: propriedade, liberdade deimprensa, inviolabilidade do domicílio, dentreoutros.”.

Nesse aspecto, observa-se que os direitosfundamentais possuem um determinado âmbito ounúcleo essencial de proteção, sendo, conformecomentários de Mendes (2009), aquela parcela oufração da vida protegida por uma garantiafundamental. É necessária a identificação doâmbito de proteção do direito fundamental para oexame das restrições possíveis de serem feitas naatividade do legislador ordinário.

Canotilho, apud Cavalcanti Júnior4, apontaque

Quando nos preceitos constitucionais seprevê expressamente a possibilidade delimitação dos direitos, liberdades egarantias, fala-se em direitos sujeitos areserva de lei restritiva. Isso significa que anorma constitucional é simultaneamente: (1)uma norma de garantia, porque reconhecee garante um determinado âmbito deproteção ao direito fundamental; (2) umanorma de autorização de restrições, porqueautoriza o legislador a estabelecer limitesao âmbito de proteção constitucionalmentegarantido.

Vale dizer que a CRFB/88, com frequência,solicita a intervenção do legislador ordinário pararestringir por lei a eficácia das normas que,conforme classificação de Silva (2011) são normasde eficácia contida. Sobre essas normasrestringíveis, dispõe Oliveira (2012, p. 45) serem“aquelas que têm aplicabilidade imediata, integral,plena, mas podem ter reduzido o seu alcance pelaatividade do legislador ordinário, em virtude deautorização constitucional.”.

4 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 23 maio 2012.

Page 48: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

48

Assim, em muitos casos, a atividadelegislativa comum se destina a restringir o âmbitode proteção de determinado direito fundamental.É o que se verifica, como exemplo, nos artigo 5.º,incisos XII, XIII, XXIX, XXVI, XXVII, XXVIII,XXXV e outros, da CRFB/88.

Nesse sentido, toma-se como exemplo oartigo 5.º, inciso XIII, da CRFB/88, que diz é “livreo exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,atendidas as qualificações profissionais que a leiestabelecer;”. Este inciso comenta a liberdade deprofissão, e se destaca por ser uma norma deeficácia contida, que, segundo Lenza (2009), podea lei infraconstitucional limitar seu alcance, fixandocondições ou requisitos para o pleno exercício daprofissão.

Pelo exposto, vale dizer que, dependendo dascondições ou requisitos, o legislador ordináriopoderia tocar no núcleo essencial do direitofundamental, ferindo o âmbito de proteção dessanorma. Cavalcanti Filho5 desdobra essa possívelrestrição à liberdade de profissão, exemplificando:

é legítimo, portanto, exigir que alguém sópossa clinicar se possuir o curso superiorde Medicina. Porém, seria constitucionalexigir que só podem exercer a advocaciapessoas que ostentassem o título de pós--doutor (Ph.D.) em Direito? Certamente,não. E por quê? Porque essa restriçãodesbordaria do razoável, restringiria tantoo direito fundamental que o tornaria vazio.Dito de outra forma: porque essa restriçãoviolaria o próprio núcleo essencial(=essência) do direito em questão.

Nesse sentido, o Supremo Tribunal Federal(STF) decidiu como desproporcional a exigênciade diploma de nível superior para jornalista, porobservância do núcleo essencial do direito àliberdade de profissão. Colaciona-se a Ementa:

ÂMBITO DE PROTEÇÃO DA LIBERDADEDE EXERCÍCIO PROFISSIONAL (ART. 5.º,INCISO XIII, DA CONSTITUIÇÃO).IDENTIFICAÇÃO DAS RESTRIÇÕES ECONFORMAÇÕES LEGAIS CONSTITU-CIONALMENTE PERMITIDAS. RESERVALEGAL QUALIFICADA. PROPORCIO-NALIDADE. A Constituição de 1988, aoassegurar a liberdade profissional (art. 5.º,

XIII), segue um modelo de reserva legalqualificada presente nas Constituiçõesanteriores, as quais prescreviam à lei adefinição das “condições de capacidade”como condicionantes para o exercícioprofissional. No âmbito do modelo dereserva legal qualificada presente naformulação do art. 5.º, XIII, da Constituiçãode 1988, paira uma imanente questãoconstitucional quanto à razoabilidade eproporcionalidade das leis restritivas,especificamente, das leis que disciplinam asqualificações profissionais comocondicionantes do livre exercício dasprofissões. Jurisprudência do SupremoTribunal Federal: Representação n.º 930,Redator p/ o acórdão Ministro RodriguesAlckmin, DJ, 2-9-1977. A reserva legalestabelecida pelo art. 5.º, XIII, não confereao legislador o poder de restringir oexercício da liberdade profissional a pontode atingir o seu próprio núcleo essencial.(Grifo nosso)

Mendes (2009, p. 331) ainda destaca:

Assinala-se, pois, que a norma constitucionalque submete determinados direitos à reservade lei restritiva contém, a um só tempo, umanorma de garantia, que reconhece e garantedeterminado âmbito de proteção e umanorma de autorização de restrições, quepermite ao legislador estabelecer limites aoâmbito de proteção constitucionalmenteassegurado.

Carvalho (2009) aponta outro exemplo,expressando que o texto constitucional é explicitoem seu artigo 5.º, XXXV, ao estabelecer que “a leinão excluirá da apreciação do Poder Judiciáriolesão ou ameaça a direito;”, ficando evidente quea intervenção legislativa não é apenas inevitável,como também necessária, vedando-se aquelaintervenção legislativa que possa afetar a proteçãojudicial efetiva.

Sena6 ainda comenta que “a leiinfraconstitucional também pode ser utilizada parapromover restrições aos direitos fundamentaisquando retiram seu fundamento de validadediretamente da Carta Magna ou para preservarum outro direito constitucionalmente assegurado.”.Dessa forma, observa Mendes (2009), extrai-se aconclusão de que direitos, liberdades, poderes e

5 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20 dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 29 maio 2012.6 Disponível em: <http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/docs/convidados/ 13_convidado_renata1.pdf >. Acessoem: 29 maio 2012.

Page 49: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

49

garantias são passíveis de limitação ou restrição,mas sendo guardando obediência ao âmbito deproteção da norma.

2 A Teoria dos Limites dos Limites

Tendo já abordado que há possiblidade derestrição de um direito fundamental que aguarda areserva legal, cabe saber como se dará essalimitação, sem esvaziar o direito fundamental. Paraessa resposta, parte da doutrina moderna trabalhacom os chamados “limites dos limites”, quebalizarão a ação do legislador infraconstitucionalquando restringe direitos individuais. ConformeMendes (2009, p. 348) “preciso não perder de vista,porém, que tais restrições são limitadas.”.

Analisando a restrição aos direitosfundamentais, expressa Fernandes (2011):

A limitação deve surgir para desenvolver odireito fundamental ou outros direitosfundamentais previstos constitucional-mente em caso de colisão. Certo é que arestrição (limitação) não pode ser tal, queao invés de desenvolver (dar maisefetividade) prejudique o direitofundamental (ou os direitos fundamentaisem questão), amesquinhando-o(s) de talforma que torne o ato (do legislador ouadministrador) inconstitucional.

É importante estabelecer, nesta análise, oslimites da atuação do Legislador infraconstitucionalquando limitam direitos fundamentais previstos naConstituição Federal. Sena7 afirma que

o cerne da questão, no entanto, cinge-seaos moldes desta restrição, em cujocontexto insere-se a teoria dos limites doslimites, de origem alemã. Os direitosfundamentais podem ser limitados tanto pordeterminação expressa da Constituição,quanto por lei ordinária com fundamentoimediato naquela, porém tais restrições sãolimitadas.

Para Dimoulis, apud Cavalcanti Filho8, “éproibido proibir o exercício do direito além donecessário.”.

Em conformidade com o acima abordado,Fernandes (2011) delimita que frente à possibilidadeda lei infraconstitucional restringir direitos egarantias fundamentais, exige-se a imposição dedeterminados requisitos limitadores (parâmetros),trazidos pela teoria dos limites dos limites, que sãoa observância do núcleo essencial, a restriçãogenérica e abstrata, e a submissão ao princípio daproporcionalidade.

Nessa visão, há um perigo de se atingir onúcleo essencial do direito fundamental, eivandode vício de inconstitucionalidade a leiinfraconstitucional, ferindo o âmbito de proteçãoda norma e, por necessidade de ponderação, seráa teoria dos limites dos limites norteadora daatividade legislativa infraconstitucional. DestacaMendes (2009, p. 353) que “a não admissão deum limite ao afazer legislativo tornaria inócuaqualquer proteção fundamental.”.

Sobre a teoria dos limites dos limites, destacaFernandes (2011, p. 252):

[...] a teoria dos limites dos limites(Schranken – Schranken), ou seja, limites(com base em determinados parâmetros)para limitação (restrição) dos direitosfundamentais. Assim sendo, critérios(limites) para que tais limitações ocorramforam estabelecidos [...].

Cavalcanti Filho9 comenta que

Embora os direitos fundamentais sejamrealmente limitados, é preciso que essasrestrições não sejam tão profundas a pontosde torná-los verdadeiras conchas vazias.Para garantir que a atividade do legisladorordinário não possa efetivamente esvaziarde conteúdo os direitos fundamentais,surge a teoria segundo a qual as própriaslimitações a tal classe de direitos sofrelimitações: é a teoria dos limites dos limites.

Estabelecendo um limite a atuação dolegislador ordinário ao restringir direitosfundamentais, toma-se como primeiro parâmetropara a atividade do legislador a observância donúcleo essencial dos direitos fundamentais que,

7 Disponível em: <http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/docs/convidados/ 13_convidado_renata1.pdf >. Acessoem: 29 maio 2012.

8 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20 dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 29 maio 2012.9 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20 dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 29 maio 2012.

Page 50: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

50

como destaca Mendes (2009), é inequívoco que oPrincípio da Proteção do Núcleo Essencial decorredo próprio modelo garantístico utilizado peloconstituinte, fazendo-se necessária a observaçãoconstante pelo legislador ordinário.

Sena10 disserta que

O núcleo essencial apresenta-se como oconteúdo mínimo e intangível do direitofundamental, que deve sempre serprotegido em quaisquer circunstâncias, sobpena de criar grave situaçãoinconstitucional. Desta forma, as limitaçõesaos direitos fundamentais encontram suaconstitucionalidade na preservação donúcleo essencial.

Dessa forma, invoca-se como necessário oPrincípio da Proteção do Núcleo Essencial, pois aatividade do legislador ordinária de restringir direitosfundamentais só se mostra válida respeitando essenúcleo essencial de proteção. Como expressaMendes (2009, p. 350), o princípio em foco“destina-se a evitar o esvaziamento do conteúdodo direito fundamental decorrente de restriçõesdescabidas, desmesuradas ou desproporcionais.”.

Ainda ratifica Fernandes (2011, p. 256) quequalquer limitação (restrição) aos direitosfundamentais tem que respeitar o núcleo essencialdestes, ou seja, “o núcleo essencial que envolvediretamente os direitos fundamentais e, porderivação, a noção de dignidade da pessoa humana,que não pode ser abalada.”.

A doutrina aponta duas teorias sobre o núcleoessencial de proteção do direito fundamental, sendoelas a teoria absoluta e a relativa. ConformeCavalcanti Filho11 “de acordo com a teoriaabsoluta, o núcleo essencial dos direitosfundamentais não pode ser violado em hipótesealguma. Já de acordo com a corrente relativa, essenúcleo básico poderia variar de acordo com o casoconcreto.”.

Quanto às teorias, assevera Mendes (2009,p. 351) que “tanto a teoria absoluta quanto a teoriarelativa pretendem assegurar maior proteção dos

direitos fundamentais, na medida em buscampreservar os direitos fundamentais contra umaação legislativa desarrazoada.”. Não há consensodoutrinário sobre qual deve prevalecer, sendo amaior inclinação sobre a teoria absoluta, conformese vê nos dizeres de Dimoulis, apud CarvalhoFilho12, “defender que existe um núcleo essencial,mas que ele é relativo significaria, na prática,retirar-lhe qualquer utilidade.”.

Assim, a Suprema Corte entende comoessencial a observância do núcleo de proteção dodireito fundamental, conforme Sena13, nojulgamento do HC 82.959, sendo o Relator oMinistro Marco Aurélio, “marca-se a contemplaçãodo núcleo essencial, assegurando a proteção aodireito fundamental da individualização da pena”,in verbis:

A imposição de um regime único e inflexívelpara o cumprimento da pena privativa deliberdade, nota Maria Lúcia Karam, com avedação da progressividade em suaexecução, atinge o próprio núcleo doprincípio individualizador , assim,indevidamente retirando-lhe eficácia,assim indevidamente diminuindo a razãode ser da norma constitucional que,assentada no inciso XLVI do ar t. 5.º daCarta de 1988, o preconiza e garante. (grifonosso).

O segundo parâmetro estabelecido namencionada teoria, pela própria defesa da isonomia,está na observância de cunho geral e abstrato dasrestrições, ou seja, como desenvolve Fernandes(2011, p. 253), “as limitações devem abarcar umaconstelação de situações e indivíduos, mostrandoproibido o uso da legislação como forma de criarlimitações casuísticas, que gerem discriminaçõesabsurdas ou arbitrárias (desarrazoadas).”.

Salienta Sena sobre o aspecto geral e abstratoda restrição que

A teoria dos limites dos limites impõe, ainda,que a restrição deve ser e abstrata. Nestestermos, a lei que venha a limitar o direito

10 Disponível em: <http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/docs/convidados/ 13_convidado_renata1.pdf >. Acesso em: 29 maio 2012.11 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20 dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 29 maio 2012.12 Disponível em: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20 dos%20direitos%20fndamentais.pdf>. Acesso em: 29 maio 2012.13 Disponível em: <http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/docs/convidados/ 13_convidado_renata1.pdf >. Acesso em: 29 maio 2012.

Page 51: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

51

fundamental não pode ser casuística,discriminatória, sob pena de ofensa aosprincípios da igualdade material e dasegurança jurídica. Do mesmo modo, ainterpretação das normas que venhamdispor de restrições a esse direito deve serfeita de forma a evitar contradições com aConstituição. A ingerência no âmbito dosdireitos fundamentais a pessoasdeterminadas, atingindo-as individual econcretamente afronta os postuladosbásicos do Estado Democrático de Direito,que veda o tratamento desigual e arbitráriono sentido de prejudicar ou beneficiar taispessoas.

O último parâmetro vinculador é o princípioda proporcionalidade que, conforme construçãodoutrinária, em especial Fernandes (2011), parasua plenitude, subdivide-se o princípio emsubprincípios, quais sejam a adequação (meio quedeve ser apto ao fim visado), a necessidade (nãodeve haver outro meio menos gravoso para seatingir o objetivo) e a proporcionalidade em sentidoestrito, ou seja, o ônus com a medida restritiva deveser menor que o bônus.

O subprincípio da adequação, de acordo comMendes (2009, p. 366), “exige que as medidasinterventivas adotadas se mostrem aptas a atingiros objetivos pretendidos.”. Para Sena, tendo emvista a teoria dos limites dos limites e o subprincípioda adequação “a restrição é possível se forsuficiente para alcançar o pretendido.”.

Por sua vez, o subprincípio da necessidade,segundo Fernandes (2011, p. 257), “a única formade alcançar o fim visado deve ser pela restriçãoou limitação ao direito fundamental, visto que nãohá outro meio menos gravoso.”. Mendes (2009, p.366) expressa de forma semelhante, ao comentarque “o subprincípio da necessidade significa quenenhum meio menos gravoso para o indivíduorevelar-se-ia igualmente eficaz na consecução dosobjetivos pretendidos.”.

Salienta ainda Mendes (2009, p. 366) que “emoutros termos, o meio não será o necessário se oobjetivo almejado puder ser alcançado com aadoção de medida que se revele a um só tempoadequada e menos onerosa.”. Arremata o referidoautor que, na prática, adequação e necessidadenão têm o mesmo peso ou relevância no juízo deponderação. Assim, “apenas o que é adequado podeser necessário, mas o que é necessário não podeser inadequado.”.

Nesse viés, cabe ainda a observância dosubprincípio da proporcionalidade em sentido estritoque, de acordo com Mendes (2009, p. 366), “umjuízo definitivo sobre a proporcionalidade da medidahá de resultar da rigorosa ponderação e do possívelequilíbrio entre o significado da intervenção para oatingido e os objetivos perseguidos pelo legislador.”.

Em outros termos, conforme Fernandes(2011), o subprincípio exposto está em uma relaçãode custo/benefício. Assim, sintetiza Mendes (2009,p. 367) que “a proporcionalidade em sentido estritoassumiria o papel de um controle de sintonia fina,indicando a justeza da solução encontrada ou anecessidade de sua revisão.”.

Em razão de todo exposto até aqui, tendo porbase a preocupação com a atividade do legisladorao restringir direitos fundamentais e a verificaçãoda teoria dos limites dos limites, toma-se nota deum quadro de Pieroth e Schlink, apud Mendes(2009, 391), que explicita um norte para a limitaçãode direitos fundamentais:

Exame de constitucionalidade da leirestritiva de direitoI – a conduta regulada pela lei estácontemplada no âmbito de proteção dedeterminado direito fundamental?II – a disciplina contida na lei configura umaintervenção no âmbito de proteção dodireito fundamental?III – essa intervenção justifica-se do prismaconstitucional?[...]4. a restrição atende ao princípio daproporcionalidade?4.1 a restrição é adequada?4.2 a restrição é necessária?4.3 a restrição é proporcional em sentidoestrito?5. o núcleo essencial do direito fundamentalfoi preservado?6. a lei é suficientemente genérica ou afigura--se aplicável apenas a determinado caso (leicasuística)?[...]

Por fim, Fernandes (2011) completa que, pelouso dos parâmetros (limites) acima esboçados, arestrição irá desenvolver mais do que prejudicar odireito fundamental. Dá-se o norte para a discussãoda atividade do legislador infraconstitucionalquando implica restrições a direitos fundamentais,evitando-se assim o esvaziamento e o consequentevício de inconstitucionalidade de normasinfraconstitucionais.

Page 52: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

52

Referências

BONAVIDES, Paulo. Curso de direitoconstitucional. 14. ed. São Paulo: Malheiros,2004.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição daRepública Federativa do Brasil. 17. ed. SãoPaulo: Rideel, 2011. Organização de MarcosAntônio Oliveira Fernandes. Coordenação deAnne Joyce Angher.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RecursoExtraordinário 511.961/SP. Ministro GilmarMendes. Diário Oficial [da] RepúblicaFederativa do Brasil, Brasília, DF, 12 nov.2009.

CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direitoconstitucional. 15. ed., rev., atual. e ampl. BeloHorizonte: Del Rey, 2009.

CAVALCANTI FILHO, João Trindade. Teoriageral dos direitos fundamentais. Disponívelem: <http://www.tvjustica.jus.br/documentos/Joao%20Trindadade%20-%20Teoria%20Geral%20dos%20direitos%20fndamentais.pdf>.Acesso entre: 22 e 30 maio 2012.

FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso dedireito constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2011.

LENZA, Pedro. Direito constitucionalesquematizado. 13. ed. rev., atual. e ampl. SãoPaulo: Saraiva, 2009.

MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO,Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo GustavoGonet. Curso de direito constitucional. 4. ed.São Paulo: Saraiva, 2009.

OLIVEIRA, Erival da Silva. Práticaconstitucional. 4. ed. rev. e atual. São Paulo:Revista dos Tribunais, 2012.

SENA, Renata Martins. Direitos e garantiasfundamentais e a teoria dos limites doslimites. Disponível em: <http://direito.newtonpaiva.br/revistadireito/ docs/convidados/13_convidado_renata1.pdf >.Acesso em: 22 maio 2012.

SILVA, José Afonso da. Curso de direitoconstitucional positivo. 34. ed. São Paulo:Malheiros, 2011.

TAVARES, André Ramos. Curso de direitoconstitucional. São Paulo: Saraiva, 2010.

Page 53: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

53

ARTIGOS DE EGRESSOS

Page 54: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

54

Page 55: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

55

RESUMO

Trata-se de artigo produzido a partir das discussõese pesquisas desenvolvidas no Grupo de EstudosJurídicos Críticos da Faculdade de Direito SantoAgostinho, que tem como objeto de estudo o ensinojurídico. Especificamente aborda este artigo a teoriada seleção de fábulas, descrita no livro “ARepública” de autoria de Platão, apresenta-se comoo assunto central o controle do que é ensinado paraas crianças e também no curso de Direito. Defende--se que a teoria de Platão de filtragem das fábulasdeve ser aceita, bem como se ressalta sua existênciano atual ordenamento jurídico. Em consideraçõesfinais, apresenta-se que a filtragem se faz necessáriadesde a educação infantil até o ensino superior, como intuito de garantir um adulto/profissional qualificadoe com competências exigidas pelo atual mercado.

Palavras-chave: ensino jurídico, educação, seleção.

THE REPUBLIC: an approach of the theoryof fables‘ selection in legal education

ABSTRACT: This work was produced throughdiscussions and surveys conducted by theCritical Legal Studies Group, from the Faculty ofLaw St. Agostinho, whose object of research is thelegal education. In this work, it‘s talked about theselection of fables, described in the book ”TheRepublic” written by Plato, presents as the centralsubject the control that is taught to children as wellas in law school. It is argued that Plato’s theory offiltering fables must be accepted and, as well, it ispointed out its existence in the current legalsystem. In conclusion, it appears that the filtering isneeded from early childhood education to highersuperior education in order to ensure an adultqualified professional and skilled, required by thecurrent market.

Keywords: legal education, education, selection.

A REPÚBLICA: UMA ABORDAGEM SOBRE A TEORIA DASELEÇÃO DE FÁBULAS NO ENSINO JURÍDICO

Igor Ramos Rosa1

1 Introdução

O presente artigo foi produzido a partir dasdiscussões desenvolvidas no Grupo de EstudosJurídicos Críticos, que tem como objeto de estudo oensino jurídico.

Quando da análise da obra “A República”, deautoria de Platão, buscou-se apreciar osensinamentos ali contidos e sua possível aplicaçãonas bases metodológicas do ensino jurídico.

Neste trabalho, analisa-se a teoria apresentadapor Platão que determina a seleção das fábulas queserão ensinadas às crianças, verificando se háaplicação no ordenamento jurídico brasileiro e emqual medida pode ser utilizada no ensino jurídico.Tem como questionamento central: a seleçãoproposta por Platão deve ser aplicada ou trata-sede censura prévia injustificada?

Como primeira hipótese, apresenta-se aseleção como necessária, uma vez que a formaçãodeterminará o futuro do indivíduo, razão pela qualdeve ser realizada da melhor maneira possível.

Para confirmar ou refutar essa hipótese,utiliza-se o método de procedimento monográfico eo método de abordagem, dedutivo.

2 Teoria de Seleção de Fábulas no Livro “ARepública”, de Platão

A formação do indivíduo é tema recorrentenos escritos que postulam sobre ensinamentosfilosóficos para a vida, encontrando-se, inclusive nosensinamentos de Salomão (Provérbios 22, 6) que éenfático em dar a relação de causa e efeito naformação humana ao dizer que “Educa a criançano caminho em que deve andar; e até quandoenvelhecer não se desviará dele.”.

A discussão sobre educação, principalmentea infantil, como já visto na citação bíblica, não éalgo recente. No livro “A República”, escrito porPlatão, no diálogo transcrito a seguir, observa-se a

1 Advogado, Especialista em Direito Público.

Page 56: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

56

preocupação com a educação daqueles que estavaminiciando a vida (2009, p. 65-66):

[...]- Ora, tu sabes que, em qualquerempreendimento, o mais trabalhoso é ocomeço, sobretudo para quem for novo etenro? Pois é sobretudo nessa altura que seé moldado, e se enterra a matriz que alguémqueira imprimir numa pessoa?- Absolutamente.- Então, havemos de consentir sem mais queas crianças escutem fábulas fabricadas aoacaso por quem calhar, e recolham na suaalma opiniões na sua maior parte contráriasàs que, quando crescerem, entendemos quedeverão ter?- Não consentiremos de maneira nenhuma.- Logo, devemos começar a vigiar os autoresde fábulas, e selecionar as que forem boase proscrever as más. As que foremescolhidas, persuadiremos as amas e asmães a contá-las às crianças, e a moldar assuas almas por meio de fábulas, com muitomais cuidado do que os corpos com asmãos. Das que agora se contam, a maioriadeve rejeitar-se.

Verifica-se que, neste trecho, é proposta aseleção de quais serão as fábulas a serem ensinadasàs crianças, com a finalidade de garantir uma boaformação.

Conduzindo de forma a surtir os efeitosdesejados, é proposto que depois de selecionadasas boas fábulas, houvesse mecanismos de obrigaras mães e as amas a ensinarem às crianças aquelasfábulas escolhidas.

As fábulas são conceituadas segundo Ferreira(1999, p. 870):

Fábula. [Do lat. Fabula] S. f. 1. Historieta deficção, de cunho popular ou artístico. 2.Narração breve, de caráter alegórico emverso ou prosa, destinado a ilustrar umpreceito....

Entretanto, através do proposto, estende-se oconceito de fábula, e utiliza-o como nomeador detodas as formas de repasse de ensinamento, tal comoos programas de televisão, revistas ou outro meioinformativo existente.

O sistema de seleção das fábulas é pensadopara garantir a boa formação, uma vez que a criançaestá em desenvolvimento e, por isso, está maisvulnerável a aceitar influencias, tanto agradáveiscomo desagradáveis.

O cuidado na seleção das influências é

encontrado também em Aristóteles (2011, p. 37),que considera que o aprendizado infantil refletirá nafase adulta:

Em uma palavra: nossas disposições moraisnascem de atividades semelhantes a elas. Épor esta razão que devemos atentar para aqualidade dos atos que praticamos, poisnossas disposições morais correspondem àsdiferenças entre nossas atividades. E nãoserá desprezível a diferença se, desde anossa infância, nos habituarmos desta oudaquela maneira. Ao contrário, terá imensaimportância, ou seja, será decisiva. (grifosnossos).

E em outro trecho, Aristóteles, de forma maisincisiva, mostra sua preocupação com a forma deeducação (2011, p. 39) ao dizer que “[...] Por isso,como diz Platão, deveríamos ser educados desde ainfância de maneira a nos deleitarmos e desofrermos com as coisas certas; assim deve ser aeducação correta.”.

Aristóteles demonstra a importância daeducação não só de forma teórica, mas aborda anecessidade de se constituir hábitos virtuosos desdea infância, considerando que será importante naformação do adulto.

Cercam-se de razão esta preposição deAristóteles e a preocupação de Platão sobre oconteúdo ensinado, pois o ensinamento de valoresimorais fatalmente acarretará em indivíduos queadotarão tais posturas por considerarem comonormais.

O adulto somente será bem formado se, desdecriança, receber a devida e cuidadosa educação, afim de que se garanta o contato com informaçõesque prestigiem o bom caráter.

3 A Seleção de Fábulas no OrdenamentoJurídico Brasileiro

Até este momento, considerou a seleção defábulas como uma teoria filosófica. Apresenta-se,neste instante, sua aplicação ao ordenamento jurídicobrasileiro, com o intuito de se averiguar a existênciaou não da sua utilização, a fim de se impedir que acriança tenha contato com informações que nãoedificam sua educação.

O primeiro documento a ser analisado éConstituição da República Federativa do Brasil de1988 (CRFB/88), que prevê:

Art. 227. É dever da família, da sociedade edo Estado assegurar à criança, ao

Page 57: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

57

adolescente e ao jovem, com absolutaprioridade , o direito à vida, à saúde, àalimentação, à educação, ao lazer, àprofissionalização, à cultura, à dignidade, aorespeito, à liberdade e à convivência familiare comunitária, além de colocá-los a salvo detoda forma de negligência, discriminação,exploração, violência, crueldade eopressão. (grifos nossos).

Esse artigo constitucional, em seu início, colocaa Família, a Sociedade e o Estado como garantidoresdos direitos das crianças e dos adolescentes,relevando que todos são responsáveis da formaçãodestes seres participantes da sociedade.

Esse mandamento não somente envolve todosos entes, como também utiliza a expressão “absolutaprioridade”, que aparece somente uma vez naCRFB/88 demonstrando que o cuidado com acriança e o adolescente é de primeira ordem e esteé o pensamento que deve ser seguido em todo oordenamento. Razão pela qual se percebe, desdejá, que não somente na época de Platão sepreocupava com a educação e formação dascrianças: esta é uma das preocupações do mundomoderno; sobretudo, no Brasil.

A partir dessa premissa de prioridade absoluta,deve ser observado o diploma legal específico querege as relações entre Sociedade, Estado e Criançae Adolescentes. Trata-se do Estatuto da Criança edo Adolescente (ECA), instituído pela Lei n.º 8.069,de 13 de julho de 1990, que, além de outros princípios,rege-se pelo princípio da proteção integral. Por sinal,este princípio é o pilar para toda a interpretação dodiploma mencionado.

No art. 4.º do ECA se percebe que a expressão“absoluta prioridade” é repetido, balizando-se como disposto na CRFB/88:

Art. 4.º É dever da família, da comunidade,da sociedade em geral e do poder públicoassegurar, com absoluta prioridade, aefetivação dos direitos referentes à vida, àsaúde, à alimentação, à educação, aoesporte, ao lazer, à profissionalização, àcultura, à dignidade, ao respeito, à liberdadee à convivência familiar e comunitária.[...].

Sem necessitar discutir artigo por artigo do ECA,apresentam-se alguns, com o intuito de mostrar quepouco ou nada se mudou desde os escritos de Platão.

Assim se acha descrito no ECA:

Ar t. 15. A criança e o adolescente têm direitoà liberdade, ao respeito e à dignidade como

pessoas humanas em processo dedesenvolvimento e como sujeitos de direitoscivis, humanos e sociais garantidos naConstituição e nas leis.

Mostra-se peculiar a denominação dada peloECA àqueles que visa proteger, como pessoashumanas em processo de desenvolvimento, situaçãoespecial que requer cuidados redobrados, razão pelaqual se mostra condizente com o pensamentoexpresso no livro em análise que busca, por causadisso, a melhor formação deste ser. E que, por isso,utiliza-se dos meios necessários como a filtragemde conteúdo.

Situação idêntica se encontra determinado noart. 53 do mesmo estatuto: “A criança e oadolescente têm direito à educação, visando ao plenodesenvolvimento de sua pessoa, preparo para oexercício da cidadania e qualificação para otrabalho, assegurando-se-lhes: [...]”. Mais uma vez,o ECA coloca a necessidade de se preocupar coma situação especial que vive este ser, ou seja, o fatode não estar completa a sua formação, e que, emrazão disso, pode sofrer em maior grau as influênciasboas ou ruins do ambiente em que vive.

Já o art. 71 do ECA prescreve:

Ar t. 71. A criança e o adolescente têm direitoa informação, cultura, lazer, esportes,diversões, espetáculos e produtos e serviçosque respeitem sua condição peculiar depessoa em desenvolvimento. (grifosnossos).

Neste artigo de lei, encontra-se destacada acondição especial que envolve a criança e oadolescente, motivo pelo qual se devem adotarmedidas que possibilitem assegurar sua boaformação. E um dos mecanismos disponíveis parapromover a boa educação é a seleção do que se éensinado. A teoria escrita em Platão encontra-sepositivada, de forma mais consistente, no art. 74 doECA, que determina:

Art. 74. O poder público, através do órgãocompetente, regulará as diversões eespetáculos públicos, informando sobre anatureza deles, as faixas etárias a que não serecomendem, locais e horários em que suaapresentação se mostre inadequada.

Momento em que se coloca o Poder Público,como está escrito também no livro, como aqueleque regulará o que estes jovens devem ter ou nãoacesso.

Page 58: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

58

E se reforça no art. 76 do ECA:

Ar t. 76. As emissoras de rádio e televisãosomente exibirão, no horário recomendadopara o público infanto-juvenil, programascom finalidades educativas, artísticas,culturais e informativas.Parágrafo único. Nenhum espetáculo seráapresentado ou anunciado sem aviso de suaclassificação, antes de sua transmissão,apresentação ou exibição.

Por este trecho se percebe que há uma ordemque somente permite a exibição de certos tipos deprograma e só permite com o devido aviso declassificação.

Trata-se do verdadeiro controle de fábulas,utilizando os meios existentes na atualidade e sendomais amplo que as histórias, incluindo qualquer tipode exposição que este jovem pode sofrer.

4 A Seleção de Fábulas e sua Aplicação aoEnsino Jurídico

Até o momento, abordou-se neste artigo aanálise da teoria e sua aplicação no ensinamentodas crianças e dos jovens, como foi proposta porPlatão. Neste momento, abstraindo-se da ideiaoriginal, analisa-se a teoria perante o ensino jurídico,e se sua aplicação é viável.

Inicialmente, percebe-se que a seleção dosensinamentos também existe no ensino jurídico. E abarreiras filtradoras são inúmeras.

Sem a pretensão de esgotar o tema, serãoanalisados alguns desses filtros, buscando percebersua aproximação com a teoria platônica.

4.1 O Professor

O professor é um dos principais filtros que sepode encontrar no ensino jurídico, pois a este cabema tarefa de ensinar/repassar a matéria, e ametodologia, livros e avaliações.

Acontece, muitas vezes, de haver a imposiçãoaos alunos apenas de uma visão ideológica damatéria, limitando até mesmo as respostas dos alunosem provas, caso estas não estejam de acordo coma sua (do professor) visão de mundo.

Outra forma de filtragem aparece na escolhado conteúdo, material e metodologia de apresentaçãoda aula, que são elementos conexos.

Quando um professor indica certo livro, nestemomento já há a relação de filtragem, uma vez queapresenta qual o livro que possivelmente irá utilizar

para repassar o conteúdo.Por este momento já se apresentam dois tipos

de filtragem. Para o professor, foi a busca do bommaterial que o fez indicar aquele específico livro. Ea sua metodologia está diretamente ligada ao tipode livro.

Neste momento, apresenta-se um bom uso daseleção de fábulas. Em outros termos, a visão doprofessor é que a seleção dos conteúdos ministradosgarantirá que se formem bons alunos e,consequentemente, bons profissionais.

E, para que essa boa seleção aconteça, faz--se necessário que esteja adequada ao modelode ensino em sala de aula, que será o próximotópico abordado.

4.2 A Metodologia de Ensino na Sala de Aula

Em uma analise mais detalhada deste espaço,observa-se que, atualmente, encontram-se duasprincipais formas metodológicas de ensino: asconsideradas tradicionais e as em formato decursinho, sobretudo os telepresenciais.

No formato tradicional, o professor apresentaa matéria de forma mais detalhada e em ritmo menosacelerado, possibilitando as manifestações dos alunose auxiliando, de forma individual, aos alunos quenecessitarem. Neste momento, faz-se necessárioum limite de alunos por sala, para que haja o devidoauxilio àqueles que precisarem. A função precípuado professor são o ensino e a formação crítica doaluno.

No “modelo cursinho”, apresentam-sematérias condensadas em mínimas horas possíveis,sem explicações aprofundadas e sem espaço paraqualquer interrupção dos alunos. Por não haverauxílio de forma individual pelo professor expositor,não há qualquer limite de alunos por aula, podendoser transmito até mesmo via satélite, garantindo queo conhecimento será transmitido da mesma forma.Sua função é basicamente a de relembrar osconteúdos vistos na educação seriada, auxiliar emmétodos de realização de provas específicas etransmitir o maior número de informações objetivaspara determinadas provas.

Nestes dois modelos, a filtragem ocorrerá deacordo com a função da aula. Se se busca aformação de alguém, deve ser apresentado umconteúdo de forma a possibilitar a participação, aresolução de perguntas naquele momento, a fim dese garantir que o ensinado está sendo compreendido.Entretanto, se o objetivo é a aprovação em algoespecifico (como um exame de suficiência

Page 59: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

59

determinado, como os processos seletivos), buscam--se relembrar o máximo que já foi aprendido eensinar técnicas de memorização para serempregado no momento da prova.

São dois objetivos distintos que permitem queo conteúdo seja transmitido de forma distinta.

4.3 A Instituição de Ensino

Existe a filtragem, também, a partir daideologia/filosofia da faculdade. Ela acontece quandoa faculdade adota algum ritmo de aprendizado,baseado em alguma doutrina central. Muitas vezesessa doutrina é repassada de forma velada; outrasvezes, é bem divulgada.

Uma forma de detectar qual é a ideologia dafaculdade é observar os livros disponíveis parapesquisa em sua biblioteca e quais são os mais citadosnos planos de ensino. Desta forma, pode-se perceberqual linha de pesquisa adotará a faculdade e qual éa sua forma filosófica de atuar.

Outra forma de seleção é a maneira como ainstituição de ensino se comporta perante o mercado.Caso seu objetivo seja a formação de bonsprofissionais, terá como filosofia a sustentabilidadede debates em sala de aula, com o intuito de formarprofissionais capazes de pensar o novo. Entretanto,caso seu objetivo seja exclusivamente o lucro, afaculdade adotará o pensamento do “quanto mais,melhor” e, com isso abarrotará suas salas de alunos,impedindo que haja um trabalho individualizado,trazendo para dentro da faculdade a mentalidadedo cursinho de que “eu apresento o conteúdo o alunoque estude sozinho.”. Como consequência, as aulasse mostram cada vez mais dogmáticas, uma vezque uma sala, com sessenta alunos, por exemplo,não permite que haja a formação de sessentapensadores críticos, pois não há como promover aparticipação de todos em uma discussão de umproblema.

Como se observa nas consideraçõesanteriores, um bom uso das seleções das fábulas noensino jurídico poderá promover a formação deprofissionais capacitados a atuar no mercado detrabalho. De igual modo, o mau uso das seleçõespromoverá a diplomação de pessoas incapacitadasdo exercício profissional. Razão pela qual a seleção

se mostra necessária no ensino jurídico e suaaplicação deve ser com o objetivo da formação dobom profissional.

5 Considerações Finais

Considerando todo o exposto, percebe-se quea teoria proposta no livro de Platão revela umapreocupação que perpassa pelo tempo. A formaçãoda criança e do jovem é assunto de suma importânciae presente nas pautas de discussões em leis e emoutros escritos filosóficos.

Desta forma, até os dias de hoje, quando sebusca formas de garantir a boa educação, recorremao proposto no livro em exame, considerando que ésaudável a seleção daquilo que é permitido o acessoà criança e ao adolescente.

Destarte, em considerações finais, confirma--se a hipótese inicialmente apresentada, uma vezque a filtragem se faz necessária desde a educaçãoinfantil até o ensino superior, com o intuito de garantirum adulto/profissional qualificado e comcompetências exigidas pelo atual mercado.

Referências

ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 5. ed. SãoPaulo: Martin Claret, 2011.

BÍBLIA Sagrada. São Paulo: Ave Maria, [19__].

BRASIL. Constituição (1988). Constituição daRepública Federativa do Brasil. Brasília: Senado,1988.

BRASIL. Lei n.º 8.069, de 13 de julho de 1990.Dispõe sobre o Estatuto da Criança e doAdolescente e dá outras providências. DiárioOficial [da] República Federativa do Brasil,Brasília, DF, 16 jul. 1990 e retificada 27 set. 1990.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novoaurélio século XXI: o dicionário da línguaportuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: NovaFronteira, 1999.

PLATÃO. A república. 2. ed. São Paulo: MartinClaret, 2009.

Page 60: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

60

Page 61: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

61

RESUMO

O presente artigo objetivou analisar o instituto daresponsabilidade civil do Estado, verificando-seo seu surgimento e evolução histórico-social atéos atuais contornos visualizados pela sociedadeno ordenamento jurídico nacional. Ao final,conclui-se que no direito brasileiro inexistiu a faseda irresponsabilidade civil do Estado, vez que emtodas as fases de seu desenvolvimentoconstitucional sempre houve previsão daresponsabilidade civil do Estado. Percebe-se quecom o decorrer do tempo as normas foram seadaptando à realidade vivida pela sociedade,buscando-se cada vez mais assegura à vítima odireito a indenização pelo mal sofrido.

Palavras-chave: responsabilidade civil do Estado,evolução histórica, direito positivo brasileiro.

ABSTRACT

This article aims to analyze the institution of civilliability of the state, verifying their creation andsocio-historical developments up to the actualcontours viewed by society in national law. At theend, it is concluded that under Brazilian lawnonexistent phase of the irresponsibility of the civilstate, since in all phases of its development therehave been predicting the constitutional liability ofthe state. It can be seen that over time the ruleswere adapting to the reality experienced by society,seeking to increasingly ensure that victims havethe right to compensation for harm suffered.

Keywords: civil liability of the state, historicalevolution, positive law in Brazil.

1 Introdução

O instituto da responsabilidade civil temrelevância social e jurídica pelo fato de que todo

A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RESPONSABILIDADE CIVILDO ESTADO NO DIREIT O BRASILEIRO

Lorena Moreira Santos1

aquele que tem um direito violado e sofre algumdano de ordem patrimonial ou moral, tem interessede ser ressarcido. Sendo assim, a responsabilidadecivil tem a finalidade de preservar a ordem jurídica,estabelecendo medidas punitivas ao infrator, comorestabelecer o status quo ante ou, diante daimpossibilidade, ao pagamento de um valorpecuniário à vítima a título de compensação.

A responsabilidade civil do Estado passou porvárias transformações no decorrer de seudesenvolvimento histórico até atingir aos atuaiscontornos jurídicos visualizados pela humanidade.E é este o objetivo deste trabalho: analisar a evoluçãohistórica da responsabilidade civil do Estado no direitobrasileiro.

Serão abordados os seguintes assuntos:distinção entre obrigação e responsabilidade; breveconceito de responsabilidade civil; teoria dairresponsabilidade; a evolução histórica do instituto,e por fim o desenvolvimento constitucional dentrodo ordenamento jurídico brasileiro.

Nesse contexto, é importante ressaltar queno direito positivo brasileiro inexistiu a fase dairresponsabilidade. E o primeiro dispositivo legal atratar da responsabilidade do Estado foi o CódigoCivil de 1916. Desde então, todas as constituiçõeseditadas previam a responsabilidade do Estado,distinguindo-se apenas no que se refere àfundamentação. A vigente Constituição daRepública Federativa do Brasil (CRFB/88)consagra em seu artigo 37, parágrafo 6.º, aresponsabilidade civil do Estado.

2 Obrigação e Responsabilidade (distinção)

O vocábulo responsabilidade originou-sedo verbo latino respondere, designando aobrigação que alguém tem de assumir asconsequências jurídicas pelo ato ilícito praticado;contém a raiz latina spondeo, fórmula pela qual odevedor estará vinculado nos contratos verbais dodireito romano.

O Novo Dicionário da Língua Portuguesaapresenta o conceito do termo responsabilidade:

1 Bacharela em Direito pela Faculdade de Direito Santo Agostinho (FADISA).

Page 62: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

62

1. Qualidade ou condição de responsável.2. Jur. Capacidade de entendimento ético--jurídico e determinação volitiva adequada,que constitui pressuposto penalnecessário de punibilidade. (FERREIRA,1993, p. 1.496).

Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho(2005, p. 3):

Responsabilidade, para o Direito, nada maisé, portanto, que uma obrigação derivada –um dever jurídico sucessivo – de assumiras conseqüências jurídicas de um fato,conseqüências essas que podem variar(reparação dos danos e/ou na puniçãopessoal do agente lesionante) de acordocom os interesses do lesado.

Com base no conceito referido, pode-se dizerque haverá responsabilidade quando um indivíduoresponder pelos próprios atos ou pelos atos deoutrem, devido a um dano causado a terceiro, umavez que se encontra responsável pelo ato ilícitocometido.

Cavalieri Filho (2010) apresenta ossignificados dos termos schuld e haftung, palavrasda língua alemã que designam o vínculo existenteentre o credor e devedor. Compõe-se esse liamede dois momentos: schuld (débito, dever) ehaftung (responsabilidade). Pode-se dizer que,numa relação obrigacional, o devedor tem numprimeiro momento schuld (dever) de cumprirespontaneamente a obrigação assumida. Em umsegundo momento, caso não seja cumprida aprestação ajustada, haverá haftung(responsabilidade).

De acordo com Gonçalves (2008), aobrigação que se origina de fontes diversas deveser cumprida de forma livre e espontânea. Comoocorre na relação entre credor e devedor, a qualse extingue com o cumprimento de determinadaprestação. Caso o sujeito passivo não cumpra aobrigação e vier se tornar inadimplente, surge aresponsabilidade.

3 Responsabilidade Civil (conceito)

O Direito Positivo brasileiro consagra normasque são inerentes à vida em sociedade e propíciasa uma harmoniosa convivência, sendo que todosaqueles que infringirem tais normas e causaremalgum dano a terceiros serão responsabilizados. Aresponsabilidade do Estado, numa acepção ampla,é o dever de reparar o dano causado a terceiro em

virtude de um ato ilícito praticado por um agentepúblico, nesta qualidade.

A doutrina ensina que “A responsabilidadecivil do Estado consiste no dever de indenizar asperdas e danos materiais ou morais sofridos porterceiros em virtude de ação ou omissão antijurídicaimputável ao Estado.” (JUSTEN FILHO, 2006, p.806).

Com base neste conceito, pode-se inferir que,caso haja agressão ao direito de um particular, oinfrator ficará sujeito ao pagamento de reparaçãopecuniária à vítima. É um meio de ressarcir ouindenizar a parte pelos danos sofridos.

4 Teoria da Irr esponsabilidade

Com o nascimento do Estado moderno,vigorou por muito tempo o princípio dairresponsabilidade do Estado. Predominava a ideiade “soberania”: o Rei encontrava-se acima daprópria lei.

Para Di Pietro (2006), o Estado exerce opoder absoluto, e por isso não pode agir contra elemesmo. Surgem, desse modo, as concepções deque “o rei não pode errar”; “aquilo que agrada aopríncipe tem força de lei”; “o Estado atua paraatender o interesse de todos e não pode serresponsabilizado por isso.”. Qualquerresponsabilidade atribuída ao Estado significariaigualá-lo aos seus subordinados, já que o Estadoera soberano e seu poder incontestável.

Segundo Carvalho Filho (2009, p. 522),“Essa teoria não prevaleceu por muito tempo emvários países. A noção de que o Estado era o entetodo-poderoso confundia com a velha teoria daintangibilidade do soberano e que o tornavainsuscetível de causar danos e ser responsável[...]”.

Nesse mesmo sentido dispõe Di Pietro (2006)que a teoria da irresponsabilidade logo foicontestada pela injustiça de o Estado não serresponsabilizado ante os danos que seus própriosfuncionários causavam à população. Se o Estadoé pessoa jurídica de direito público, tem deveres eobrigações, não podendo deixar de responder pelosdanos causados à sociedade.

4.1 Teorias Civilistas

Numa segunda fase, nos dizeres de CavalieriFilho (2010), a irresponsabilidade do Estado passoupara uma concepção civilista da responsabilidadeestatal, fundada na culpa do funcionário e nos

Page 63: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

63

princípios da responsabilidade por fato de terceiro.Para definir a responsabilidade do Estado

com base na culpa, distinguiam-se os atos de impérioe os atos de gestão.

De acordo com Di Pietro (2006), os atos deimpério seriam os praticados pelo Estado com todasas prerrogativas e privilégios que lhe eramconcedidos, e impostos de forma coercitiva aoindivíduo. A prática de tais atos era concedidaapenas ao Estado em sua posição suprema. Ocidadão comum jamais poderia exercer atossemelhantes aos da Administração. Já os atos degestão seriam aqueles em que o Estado atuavacomo um particular, ou seja, em posição deigualdade com o cidadão, ao passo que, nos atosde império, a responsabilidade do Estado era regidapor um direito especial (posição de supremacia).

Posteriormente, já com a responsabilizaçãodo Estado, adotava-se uma forma de minimizar osprejuízos causados a terceiros. Porém, para finsde responsabilidade, somente se admitia os atosde gestão. O Rei praticava atos de império e oEstado, atos de gestão.

Segundo Di Pietro (2006), essa distinção logofoi rejeitada, devido à grande dificuldade de sedividir a personalidade do Estado e ainda, pelaimpossibilidade de equiparar como atos de gestãotodos os atos praticados pelo Estado em suaadministração.

4.2 Teorias Publicistas

A respeito da teoria publicista, Di Pietro(2006, p. 620) expõe a seguinte lição:

O primeiro passo no sentido da elaboraçãode teorias de responsabilidade do Estadosegundo princípios do direito público foiadotado pela jurisprudência francesa, como famoso caso Blanco, ocorrido em 1873: amenina Agnès Blanco, ao atravessar umarua da cidade de Bordeaux, foi acolhida poruma vagonete da Cia. Nacional deManufatura do Fumo; seu pai promoveuação civil de indenização, com base noprincípio de que o Estado é civilmenteresponsável por prejuízos causados aterceiros, em decorrência de ação danosade seus agentes. Suscitado o conflito deatribuições entre a jurisdição comum e ocontencioso administrativo, o Tribunal deconflitos decidiu que a controvérsia deveriaser solucionada pelo tribunaladministrativo, porque se tratava deapreciar a responsabilidade decorrente de

funcionamento do serviço público.Entendeu-se que a responsabilidade doEstado não pode reger-se pelos princípiosdo Código Civil, porque se sujeita a regrasespeciais que variam conforme asnecessidades do serviço e a imposição deconciliar os direitos do Estado com osdireitos privados.

Com o surgimento das teorias publicistas,consagra-se a teoria da culpa do serviço ou daculpa administrativa e teoria do risco administrativo.

A teoria da culpa do serviço ou da culpaadministrativa, “[...] procura desvincular aresponsabilidade do Estado da idéia de culpa dofuncionário. Passou a falar em culpa do serviçopúblico.” (DI PIETRO, 2006, p. 621).

Desse modo, pode-se dizer que houve umaevolução da culpa individual em que o própriofuncionário responde por seus próprios atos, paraa culpa anônima do serviço público; pela qual oagente causador do dano não é identificado e seconsidera que o serviço funcionou mal, nãofuncionou ou funcionou atrasado. Portanto, haveráa culpa do serviço ou culpa administrativa, sendoo Estado responsável, independentemente da culpado empregado.

“Na teoria da culpa administrativa exige-sea falta do serviço; na teoria do risco administrativoexige-se apenas o fato do serviço. Naquela, aculpa é presumida da falta administrativa; nesta, éinferida do fato lesivo da Administração.”(MEIRELLES, 2008, p. 658).

Sobre a teoria do risco, Cavalieri Filho (2010,p. 142) explicita:

[...] todo prejuízo deve ser atribuído ao seuautor e deve ser reparado por quem ocausou, independentemente de ter ou nãoagido com culpa. Resolve-se o problemana relação de causalidade, dispensávelqualquer juízo de valor sobre a culpa doresponsável, que é aquele quematerialmente causou o dano.

A teoria do risco administrativo serviu defundamento para a responsabilidade objetiva doEstado, abstraindo-se da discussão do dolo ouculpa.

Pode-se dizer, com base na teoria do risco,que todo aquele que desenvolve uma atividadeperigosa ou que cause algum dano, deve assumiros riscos e responder pelos danos decorrentes dodesenvolvimento de sua atividade.

Page 64: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

64

5 Evolução Histórica da Responsabilidade

De acordo com Diniz (2003) a evolução daresponsabilidade civil se deu da seguinte forma:nos primórdios da civilização humana, aresponsabilidade civil fundava-se na vingançacoletiva, que era caracterizada pela reação conjuntade um grupo contra o agressor, quando um de seuscomponentes era ofendido.

Evoluiu, em seguida, para uma reaçãoindividual, quando passou a ser uma vingança emque os homens faziam justiça pelas próprias mãos,ou seja, era uma vingança privada: o ofendidoreagia ao dano de maneira imediata, brutal einstintiva, prevista na Lei de Talião, conhecidagenericamente pela expressão “olho por olho, dentepor dente.”.

Nessa etapa evolutiva, assinala a mesmaautora que, com o passar do tempo, o PoderPúblico começou a intervir apenas com o propósitode evitar punição em excesso, declarando quandoa vítima poderia ter direito à vingança, causandoao autor do ato ilícito um dano semelhante ou igualao sofrido pelo lesado. Este critério se encontrapresente na Lei das XII Tábuas, tábua VII, lei 11.ª:“si membrum rupsit, ni cume o pacit, talio esto”(se alguém fere a outrem, que sofra a pena deTalião, salvo se existiu acordo).

Posteriormente, houve o período dacomposição, em que havia uma tentativa deconciliação entre as partes. Era uma faculdade quetinha o ofendido de substituir a retaliação ao agentepor uma compensação de ordem econômica. Oautor repararia o dano mediante prestação depagamento de certa quantia em dinheiro.

Em seguida, ainda segundo Diniz (2003),surgiu a Lex Aquilia de damno que estabeleceuas bases da responsabilidade extracontratual,criando uma ideia de reparação pecuniária do dano,em razão do valor da res, apontando a noção deculpa como fundamental para a caracterização daresponsabilidade. Nessa fase, sem a caracterizaçãoda culpa não havia que se falar emresponsabilidade. A citada lei deu início ao damnuminiuria datum, a diminuição do patrimônio docausador do dano deve ser significativa, porém,sem servir de enriquecimento à vítima: é apenasuma compensação razoável pelo dano sofrido.

Outros tempos se passaram e o Estadocomeçou a intervir nos conflitos privados, pois assanções impostas por esta lei passaram a seraplicadas tanto aos casos de danos por omissãocomo àquelas situações em que não houvesse umefetivo estrago físico ou material.

O Estado era quem determinava o valor aser pago, que deveria ser proporcional ao prejuízosofrido. E a vítima era obrigada a renunciar àvingança e aceitar a composição. Já não se tratavamais uma faculdade, como ocorria antes.

6 Evolução no Direito Positivo Brasileiro

No Brasil, inexistiu a fase dairresponsabilidade civil do Estado, na qual aAdministração Pública negava a obrigação deindenizar os prejuízos que seus agentes pudessemcausar aos administrados. Baseava-se nofundamento de que o Estado absoluto ou Estadode Polícia não causaria danos a nenhum ser,expressado pelas fórmulas le roi ne peut mal faire(o rei não pode fazer mal) e the king do no wrong(o rei não erra).

O desenvolvimento da responsabilidade civilno Direito Positivo brasileiro se robusteceu após aedição da primeira Constituição, quando o Brasilfoi constituído, propriamente, como nação. SegundoDi Pietro (2006), a Constituição do Império,outorgada em 1824, não continha disposiçõesacerca da responsabilidade do Estado, mas jáconsagrava o princípio da responsabilidade dosagentes públicos pelos abusos e omissõespraticados no exercício de sua função.

O Código Civil de 1916, precisamente em seuartigo 15, foi o primeiro dispositivo legal a tratar daresponsabilidade do Estado. E se filiou à teoriasubjetiva, exigindo-se a configuração de culpa oudolo do causador do dano para a obrigação derepará-lo.

De acordo com Diniz (2003), aresponsabilidade civil evoluiu também em relaçãoao seu fundamento (obrigação do lesado de repararo dano moral ou patrimonial, causado à vítima emdecorrência de uma atividade ilícita), uma vez que,antes, para que houvesse a reparação, eraimprescindível a comprovação de culpa(responsabilidade subjetiva). E passou a serampliada para a indenização de danos semexistência de culpa (responsabilidade objetiva).

A evolução constitucional da responsabilidadecivil do Estado no Direito Positivo brasileiro, deacordo com Coelho (2004) seguiu as seguintesfases:

l a Constituição de 1934 e a de 1937consagraram a responsabilidade solidáriaentre o Estado e o funcionário, na esferada responsabilidade subjetiva;

Page 65: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

65

l a Constituição de 1946 adotou a teoria daresponsabilidade objetiva, com base nateoria do risco administrativo;

l a Constituição de 1967 conservou aresponsabilidade objetiva pelo risco, sendoque a Administração Pública era obrigadaa indenizar os danos que seus agentescausassem a terceiros por atos omissivosou comissivos;

l a vigente Constituição da RepúblicaFederativa do Brasil (CRFB/88) tambémconsagrou a responsabilidade objetiva, emseu artigo 37, § 6.º, contemplando, além daresponsabilidade por atos comissivos, aqueladecorrente da conduta omissiva, e incluindoainda as pessoas jurídicas de direito privadoprestadoras de serviço público.

7 Considerações Finais

Durante muito tempo, prevaleceu a teoria dairresponsabilidade do Estado. Essa formulaçãobaseava-se na ideia de soberania, quando a figurado rei se encontrava ainda acima da própria lei.Essa teoria logo foi contestada pela injustiça de oEstado não poder ser responsabilizado pelos danosque seus funcionários causassem aos então súditos.Verificou-se que, com o passar do tempo,desenvolveu-se a compreensão de que o Estadodeveria ser responsabilizado.

No Brasil, o desenvolvimento daresponsabilidade civil se deu após a edição daprimeira Constituição, quando se deu,propriamente, a formação da nação brasileira. AConstituição de 1824 só previa a responsabilidadedos funcionários nos casos de abuso ou omissão.Contudo, foi com a edição do Código Civil de 1916,em seu art. 15, o primeiro dispositivo legal a tratarda responsabilidade do Estado. Ainda era aresponsabilidade subjetiva, modalidade que exigiaa prova da ação ativa do Estado, por seusservidores, para que houvesse a caracterização daresponsabilidade de indenizar.

A Constituição da República Federativa doBrasil de 1988 (CRFB/88) passou a consagrar aresponsabilidade civil do Estado em seu art. 37, §6;º, segundo o qual as pessoas jurídicas de direitopúblico e as de direito privado prestadoras deserviços públicos responderão pelos danos que seusagentes causarem a terceiros, em decorrência decomportamento lícito ou ilícito. Trata-se, pois, daresponsabilidade objetiva: provado o dano e o nexocausal, há a responsabilidade de indenizar.

Conclui-se que, no ordenamento jurídicobrasileiro inexistiu a fase da irresponsabilidade civildo Estado, uma vez que em todas as fases de suaevolução constitucional sempre esteve prevista aresponsabilização do Estado pelos eventuais danoscausados a terceiros, mudando apenas no que dizrespeito à fundamentação. Em outras palavras, como passar do tempo as normas foram seaperfeiçoando, com o objetivo de assegurar odireito da vítima de ser ressarcida pelo mal sofrido.

Referências

BRASIL. Constituição (1988). Constituição daRepública Federativa do Brasil. 38 ed. SãoPaulo: Saraiva, 2006.

______. Lei n.º 10.406, de 10 de janeiro de2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial[da] República Federativa do Brasil, Brasília,DF, 11 jan. 2002.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manualde direito administrativo. 22. ed. rev., atual. eampl. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009.

CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa deresponsabilidade civil. 9. ed. rev. e ampl. SãoPaulo: Atlas, 2010.

COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manualde direito administrativo. São Paulo: Saraiva,2004.

DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro:responsabilidade civil. 17. ed. atual. e aum. SãoPaulo: Saraiva, 2003.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direitoadministrativo. 19 ed. São Paulo: Atlas, 2006.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novodicionário da língua portuguesa. 2. ed. rev. eaum. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONAFILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:responsabilidade civil. v. 3. 3. ed. São Paulo:Saraiva, 2005.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civilbrasileiro: responsabilidade civil. v. 4. 3. ed. rev.e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

Page 66: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

66

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direitoadministrativo. 2. ed. rev. e atual. São Paulo:Saraiva, 2006.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direitoadministrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo:Malheiros, 2008.

Page 67: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

67

AUTOR CONVIDADO

Page 68: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

68

Page 69: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

69

RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo abordar algunspolêmicos aspectos inerentes à definição, objeto efunção da prova, bem como sua realização narelação processual com fins ao estabelecimentoda verdade e à formação do convencimento dojulgador. Com o predomínio do sistema do livreconvencimento motivado ou persuasão racional dojuiz no ordenamento jurídico pátrio, a valoração dasprovas colacionadas aos autos pelas partes oudaquelas cuja produção foi determinada de ofíciopelo magistrado, mostra-se fundamental para aformação do convencimento judicial. Entretanto,esta valoração apenas se concretizará de formaadequada quando os litigantes, em atenção aosprincípios do contraditório e da cooperação,preocuparem-se em efetivar um conjuntoprobatório o qual possibilite ao julgador a máximaaproximação da verdade processual possível, demaneira a realizar uma correta subsunção dos fatosà norma, decidindo de forma a garantir a aplicaçãoda justiça.

Palavras-chave: Prova. Verdade. ConvencimentoJudicial. Princípio do Contraditório. Princípio daCooperação.

ABSTRACT

This paper aims to address some controversialaspects inherent in the definition, object andfunction of proof, as well as their realization inrelation to procedural purposes the establishmentof truth and the formation of the conviction of thejudge. With the predominance of the system of freerational persuasion or conviction motivated thejudge the national laws, the valuation of chargedevidence before the Court by the parties or thosewhose production was determined by themagistrate office, has proven crucial for the

AS RELAÇÕES ENTRE A VERDADEE A PROVA SOB A ÓTICA DO CONVENCIMENT O JUDICIAL

Vitor Luís de Almeida1

formation of legal persuasion. However, thisassessment will only be operational appropriatelywhen the litigants in regard to the principles ofcontradiction and cooperation, brooding into effecta set of evidence which the judge allows themaximum possible procedural approximation to thetruth in order to perform a correct subsumption offacts to the rule, deciding to ensure the applicationof justice.

Keywords: Proof. Truth. Judicial conviction.Principle of Contradictory. Principle ofCooperation.

Introdução

O conceito de prova, em sentido lógico oufilosófico, significa um processo mediante o qualse estabelece a conclusão que se segue daspremissas, sendo uma garantia de realização deum processo justo, com a eliminação do arbítrio dojulgador. A função da prova é a demonstração darealidade dos fatos. Assim, a prova se insere emuma vasta gama de operações da consciênciahumana, desenvolvida na busca da verdade e emsua demonstração dentro do processo, com fins apropiciar ao julgador a possibilidade de proferir umadecisão justa, que resolva a demanda judicial levadaa seu conhecimento.

O presente trabalho tem por escopo analisaras relações entre a verdade e a prova na seara dosistema de valoração do livre convencimentomotivado, ou persuasão racional do juiz, objetivandouma análise teórica e crítica sobre odesenvolvimento da atividade processual. Talatividade se dá com a participação dos litigantes edo magistrado, na busca da essência da verdadefática, que propicie ao julgador efetivar a subsunçãonormativa, proferindo uma decisão que se mostreadequada aos ditames de realização da justiça.

1 Juiz de Direito do Estado de Minas Gerais; Mestrando em Ciências Jurídicas na Faculdade de Direito da Universidadede Lisboa/PT; Graduado e Especialista em Direito Público Municipal pela UMIMONTES/MG. Professor universitárioe dos cursos de formação da PMMG.

Page 70: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

70

Partindo-se de uma análise da verdade comopressuposto da prova, pretende-se estabelecerlimites entre a verdade substancial e a verdadeformal, bem como a evolução de suas aplicaçõesno processo. Procurar-se-á ainda abordar o deverde colaboração das partes para elucidação daverdade no processo, sob o prisma de princípiosprocessuais e constitucionais, em especial ocontraditório e o da colaboração.

Ao final, será apresentada uma sucintaconclusão, desenvolvendo algumas impressõespessoais acerca do tema, discorrendo sobre algunsaspectos abordados ao longo do trabalho. Tambémserão formulados breves comentários e sugestõesque possam contribuir para o deslinde das questõescontrovertidas, considerando-se, especialmente, anecessidade de descoberta da verdade processualatravés da dilação probatória.

1 A Verdade como Pressuposto da Prova edo Convencimento Judicial

Na óptica do Direito Processual, asdiscussões abrangendo a prova se encontramintimamente ligadas à ideia de sua função,intuitivamente revelada pela tese de que a provabusca investigar a verdade dos fatos, sobre os quaisserá aplicada a norma jurídica abstratamenteprevista, atingindo-se a solução do litígio. Não hádúvidas de que a comprovação dos fatos éabsolutamente essencial, eis que pressuposto paraa aplicação do Direito e, por consequência, para arealização do escopo da jurisdição.

Durante o desenrolar de um litígio judicial aspartes dissentem sobre os fatos, sobre o direitoaplicável ou sobre ambos. Para solucionar os temaspuramente jurídicos aplica-se a “Ciência do Direito”(CORDEIRO, 2011, p. 459) e para esclarecer osfatos utiliza-se da prova, que foi definida porMendes como “o pressuposto da decisãojurisdicional que consiste na formação através doprocesso no espírito do julgador da convicção deque certa alegação singular do fato éjustificavelmente aceitável como fundamento damesma decisão.” (1961, p. 741).

Na doutrina italiana, Ferrajoli define provascomo “eventos presentes interpretáveis como sinaisde eventos passados.” (1989, p. 98). Já nos dizeresde Lombardo, na íntima essência, o conceito de prova“não é somente um meio do qual se serve o juiz paraatingir os dados de fato úteis aos fins do juízo, masum raciocínio probatório que concorre para aformação do juízo sobre o factum probandum.”(1999, p. 11).

A descoberta da verdade sempre foiindispensável para o processo, sendo um de seusprincipais objetivos. Somente através dadescoberta da verdade dos fatos pode o julgadoraplicar devidamente a norma apropriada,adequando o caso à ideia do conhecido “juízo desubsunção”. A este propósito, Liebman (1984, p.4) já conceituava o termo “julgar” como o atoconsistente em valorar um determinado fatoocorrido no passado, com base no direito vigente,determinando, via de consequência, a normajurídica que regerá o caso concreto.

Como cabe ao Poder Judiciário, na divisãode funções estatais, aplicar o direito objetivo aoscasos concretos revelados pelos litígios, a adequadareconstrução dos fatos se torna imprescindível paraa devida aplicação da norma abstrata à hipóteseconcreta. A esse respeito, após defender que oprocesso é um trabalho, Carnelutti asseverou que

[...] aquilo que é necessário saber, antes demais nada, é que o trabalho é união do homocom a res, sendo que esta coisa vimos estarem torno de um homo: que o homoiundicans trabalhe sobre o homoiudicandus significa, no fundo, que deveunir-se com ele; somente através da uniãoele conseguirá saber como se passaram ascoisas (come sono andate le cose) e comodeveriam passar-se, a sua história e o seuvalor; em uma palavra, a sua verdade(CARNELUTTI, 1958, p. 124).

A verdade pode ainda ser vista como um fatorde legitimação para o Direito Processual. Em sendoas decisões judiciais o resultado da aplicação doDireito ao caso concreto e considerando-se que oDireito Positivo, ao menos em tese, deriva davontade popular, eis que emanado dosrepresentantes do povo, a subsunção dos fatosdevidamente comprovados à norma, atenderia aosanseios populares. Nesta perspectiva, a atividadedo magistrado seria realizada apenas na aplicaçãodo Direito abstrato ao caso concreto, sem odesenvolvimento de atividade interpretativa. Bemexpressando o espírito desses entendimentos à suaépoca, ao analisar a questão da interpretação,Chiovenda (1922, p. 90-91) já defendeu que o juiznada mais faz do que aplicar o Direito, sendo ainterpretação obra da doutrina a qual, seconsiderada como fonte do Direito, não foi feita,mas apenas formulada pelo julgador.

Também o raciocínio iluminista e liberal,cristalizado na célebre ideia de Montesquieu (1748)de que o juiz nada mais é do que a bouche de la

Page 71: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

71

loi (a boca da lei) teve uma definida função noperíodo das Revoluções do século XVIII, visandoà proteção dos interesses da coletividade contraos abusos da aristocracia, dominante do Executivoe Judiciário daquela época. Ficando o juiz cingidoa verificar os fatos ocorridos e aplicar a eles odireito pré-estabelecido pelo Legislativo, jamais sepoderia ter uma atuação ilegítima do Judiciário, quenão seria mais do que um executor das diretrizesjá estabelecidas pelo Legislativo.

Apesar de já não se concordar com a posiçãode Chiovenda, eis que a atividade interpretativatambém é realizada pelo Judiciário e, embora averdade não consista um fim em si mesma, suabusca se apresenta como condição imprescindívelpara a garantia de uma justa composição da lide eda qualidade da prestação jurisdicional.

O ideal seria estabelecer a verdade dosdireitos postos em litígio como aquela determinada,tomando-se por base os meios de prova relevantese admissíveis, como forma a lograr a realizaçãode uma das metas fundamentais da administraçãoda justiça, qual seja, o estabelecimento da verdadepara a apreciação do caso concreto.

A melhor solução para o conflito de interessesentre as partes é uma decisão adequada e corretaque se baseie em um juízo verdadeiro acerca dosdireitos controvertidos existentes no caso concreto.A solução da controvérsia não é necessariamenteboa apenas porque põem fim ao conflito deinteresses do caso concreto. Dentro de qualquersistema jurídico baseado no Estado de Direito, sóse obtém uma boa solução se esta for obtidaatravés de uma decisão judicial legítima.

Sobre este ponto de vista, como já afirmado,a verdade dos direitos em litígio não se apresentacomo um objetivo em si mesmo, ou como opropósito final do processo; mas, sim, uminstrumento ou condição necessária para umadecisão justa e legítima que, por consequência,apresenta uma solução adequada e correta para acontrovérsia existente entre as partes (TARUFFO,2008, p. 22-23).

A verdade que pode ser alcançada dentro docontexto do processo é definida como formal ouconvencional e se apresenta, por várias vezes erazões, como uma verdade bastante diferente dareal. Isto se dá porque os processos judiciaisconstituem um contexto muito especial no qual as

partes e o juiz não podem se valer de qualquermeio que possibilite a busca da verdade e tambémpor abandonarem esta busca quando a necessidadede alcançar uma solução final se impõe sobre anecessidade de reconstituir os fatos através demeios de prova adicionais.

Na realidade, conforme defendido nadoutrina italiana sob o escólio de Taruffo (2008, p.26), em todo o contexto do conhecimento científicoou empírico, incluindo os processos judiciais, averdade é relativa.

É usual assumir que a teoria da verdadejudicial é baseada na correspondência de umapremissa, no objetivo de se afirmar que a decisãojudicial sobre os direitos deve ser adequada àverdade, para que possa ser justa e correta.Entretanto, o conteúdo de uma decisão apenas éverdadeiro quando coincidente e correspondentecom os fatos que realmente ocorreram na situaçãoconcreta que deu base à controvérsia judicial. Afunção da prova é justamente fornecer ao julgadorconhecimentos fundados empírica e racionalmenteacerca dos direitos da causa, reconstruindo os fatosocorridos e demonstrando se as alegaçõesformuladas pelas partes são verdadeiras ou falsas(TARUFFO, 2008, p. 28-29).

Na óptica do contemporâneo sistemaprocessual, apesar do dever de colaboração daspartes para elucidação da verdade, o magistradopoderá – e talvez mesmo, deverá – de formajustificada, determinar a realização das provas queentender necessárias à adequada solução da lide.Saliente-se que as partes poderão participar naprodução e na interpretação de tais provas, podendoatuar desde sua formação e ainda se manifestarapós seus resultados.

Entretanto, uma vez realizados todos os meiosde prova admissíveis e relevantes2 no processo,chega o momento de se tomar a decisão, ocasiãona qual o julgador deve assumir que as provas sãoum ponto de partida de um raciocínio que o leve àconclusão do litígio e que estabeleça se os direitosdemonstrados pelas partes são ou não verdadeiros.

A valoração da prova tem por objetoestabelecer uma conexão final entre os meios deprova produzidos e a verdade ou falsidade dosargumentos formulados pelas partes sobre o direitoem litígio, possibilitando ao julgador elementosessenciais para elaboração de sua decisão.

2 Sobre o tema ver MICHELLE TARUFO, Studi sulla rilevanza della prova. Padova: Cedam, 1970.

Page 72: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

72

2 A Verdade Substancial e a Verdade Formal

No intuito de garantir a correta revelação dosfatos atinentes à causa de pedir, desenvolveu-se,na teoria processual, o princípio da verdadesubstancial, ou real. Nos dizeres de Mittermayer(1879, p. 78) a verdade substancial expressa averdade como concordância entre um fato ocorridona realidade sensível e a ideia que se faz dele.Esta típica visão, embora tenha a maioria de seuspressupostos já superados pela Filosofiacontemporânea, ainda continua a orientar grandeparte dos processualistas modernos e dosaplicadores do Direito (MARINONI;ARENHART, 2011, p. 28), que se preocupam emgarantir que o fato ocorrido no mundo físico guardeconsonância com o fato que se obtém na relaçãoprocessual, decorrente da dilação probatória.

Com fins a viabilizar a descoberta da verdadematerial, substancial ou real, foram desenvolvidosdiversos dos mais importantes institutos do DireitoProcessual. Dentre eles, a prova. Observe-se que,ao conceituar a prova, Lent (1962, p. 197)ressaltou sua função de convencimento do juiz arespeito da verdade ou falsidade de uma afirmação.Outro instituto processual de grande relevância nopertinente era a coisa julgada, fundada napresunção de verdade sobre os fatos versados naSentença, obtida através do silogismo judicial.

A reconstrução dos fatos no processo, comfins a viabilizar a decisão judicial, apresenta-secomo pressuposto da legitimação das decisõesjudiciais eis que se tornaria difícil fazer com que apopulação tivesse crença em decisões que nãodeclarassem a realidade da hipótese sobre qual seaplicou a norma. Sobre esta raiz, funda-se adoutrina processual da verdade substancial.

Esta posição, sempre aplicada com maiorforça no Direito Penal, foi desenvolvida desdeRoma antiga, quando era possível ao iudex seabster de decidir a questão que lhe era posta, desdeque declarasse, sob juramento, que os fatos nãoestavam suficientemente aclarados (MARINONI;ARENHART, 2011, p. 31). Atualmente, semelhantepapel é desempenhado pelo regime de ônus daprova, mitigado, entretanto, pela atuação maisefetiva do juiz no processo, permitindo-lhe umaposição mais ativa na colheita da prova, com finsa viabilizar a descoberta da verdade real,necessária à devida prestação jurisdicional.

Entretanto, desde já é importante frisar aconcordância com o posicionamento de Neves(2011, p. 407) que, na doutrina nacional, defende

que a obtenção da verdade absoluta se apresentacomo algo meramente utópico e ideal. Asexplicações são de que, no processo, a participaçãode diferentes sujeitos contribui para que o conteúdoprobatório não reproduza exatamente os fatospassados, como efetivamente ocorreram.

Durante algum tempo, a doutrina processualprocedeu a distinção entre as formas em que oprocesso penal e processo civil deveriam analisar aquestão da verdade. Neste ínterim, sustentava-seque o processo penal trabalhava com a verdadesubstancial e o processo civil se satisfazia com averdade formal. A distinção foi bem definida porAlvim (1976, p. 99) ao lecionar que a verdadeformal, ao contrário da verdade substancial, é aquelarefletida no processo, e juridicamente apta asustentar a decisão judicial.

Diversamente da noção de verdade real, averdade formal não pretende a identificaçãoabsoluta do conceito extraído com a essência doobjeto, habituando-se mais a uma verdadeira ficçãoda verdade. A aplicação do princípio da verdadeformal ao processo civil se baseia na premissa deque este ramo do Direito lida com bens menosrelevantes que o processo penal, podendo, portanto,contentar-se com um menor grau de segurança esatisfazendo-se com um grau de certeza aquémdaquele necessário para a aplicação do DireitoPenal.

Contemporaneamente, tal distinção perdeuboa parte seu brilho, sendo corretamenterechaçada, de forma sistemática, por boa parte dadoutrina, tendo em vista que os interesses objetoda relação jurídica processual penal não possuemqualquer particularidade que autorize a utilizaçãode um método de reconstrução dos fatos que sejadiverso do adotado no processo civil. Afinal, se oprocesso penal está intimamente ligado à liberdadedo indivíduo e a proteção de interessesjuridicamente de acentuada relevância, o processocivil também atua com direitos fundamentais dapessoa humana como as relações familiares,capacidade jurídica, personalidade, interessesdifusos, coletivos e metaindividuais, dentre outros.

Devido a esta inconsistência, a verdadeformal foi paulatinamente perdendo seu prestígiono seio do processo civil. Falar-se em aplicaçãoda verdade formal significa dizer que a decisãojudicial se fundou em uma verdade que podeexpressar uma não verdade. Conforme a lição dodoutrinador francês Villey (1995, p. 1), a verdadese apresenta como um conceito absoluto: ou é ounão é. A verdade formal se apresenta como verdade

Page 73: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

73

parcial, imperfeita ou incompleta, por simplesquestão de lógica, não podendo ser consideradano conceito, o qual apenas é atingido na base daverdade substancial. Assim, a doutrina modernacritica tal distinção, defendendo que a aplicaçãoda verdade formal já não apresenta utilidadeprática ao processo civil, apresentando-se comoum mero argumento a sustentar uma posição deinércia do juiz na reconstrução dos fatos, o quenão mais tem fundamento no atual objetivo derealização da justiça.

Sob o escólio de Theodoro Júnior (2002, p.26), o sistema não quer dizer que o magistradopossa ser arbitrário, pois a finalidade do processoé a justa composição do litígio, a qual só pode seralcançada quando se baseie em uma verdade realou material e não na presumida por prévios padrõesde avaliação dos elementos probatórios.

No ordenamento jurídico brasileiro,aparentemente, a interpretação meramentegramatical do art. 131 do Código de Processo Civil,ao autorizar o juiz a se utilizar de todos os fatos ecircunstâncias constantes dos autos, ainda que nãoalegados pelas partes, pode levar ao entendimentode que a lei se contentou com a existência daverdade formal para o processo civil. Entretanto,não se olvide que a interpretação da referida normalegal há de ser realizada de forma sistemática, emconjunto com a norma do art. 130 do mesmodiploma legislativo. Este cânone ordena que o juiz,de forma oficiosa, determine as provas necessáriasà instrução do feito. Tal determinação repete atendência manifestada no art. 156 do Código deProcesso Penal, que outorga ao magistrado poderespara determinar de ofício diligências referentes adúvidas existentes sobre pontos relevantes à causa(PAIXÃO JÚNIOR, 2002, p. 249).

Embora a moderna teoria processual estejacalcada no ideal de verdade como único caminho aconduzir à Justiça, como pressuposto para aplicaçãoda lei ao caso concreto, não se pode olvidar que aideia de atingir a verdade absolutamente real sobredeterminados acontecimentos, por meio da dilaçãoprobatória no processo, apresenta-se como umainegável utopia, eis que a essência da verdade semostra como intangível. Assim já afirmava Voltaire,apud Marinoni e Arenhart (2011, p. 36), ao lecionarque “lês vérités historiques ne sont que dêsprobabilités”3, conceito reafirmado por Reale (1983,

p. 17-18) ao desenvolver a definição de “quase--verdade”.

Realmente, não se acredita em uma absolutareconstrução dos fatos ocorridos no passado, eisque, na produção das provas, estes sempre virãoinfluenciados por aspectos subjetivos das pessoasque os assistiram ou, ainda, do juiz, que procede avaloração da prova. Apesar de se exigir domagistrado uma ativa atuação na busca da verdade,certo é que esse também não pode ser consideradoum ser divino, ante a falibilidade humana, aobservância da produção das provas apenas pelosmeios legalmente permitidos e ainda a própriadivergência de manifestações e apresentaçõesrealizadas pelas partes e demais envolvidos no feito.Cada uma sob sua própria perspectiva.

Nesta análise, uma das grandes soluções aoproblema foi idealizada por Calamandrei (1955, p.169-170) no sentido de que, mesmo o juiz maisescrupuloso e atento, encontra-se limitado pelarelatividade própria da natureza humana, fundandosua decisão não na descoberta da verdade; mas,sim, da verossimilhança. Ou seja, decidindo combase na aparência de verdade atingida de acordocom as provas colacionadas ao processo e daaplicação das máximas da experiência.

A máxima de experiência é uma regra queexpressa o que acontece na maioria dos casos, ouseja, uma regra extraída de casos similares. Aexperiência pode permitir a formulação de um juízode relação entre os fatos com base no qual emergeo raciocínio de que, em casos similares, existemidênticos comportamentos humanos. Nestes casos,o juiz aplica um raciocínio do tipo indutivo, quandoexamina casos similares e formula uma regra deexperiência. Sucessivamente, o juiz aplica umraciocínio dedutivo, aplicando ao caso em examea regra geral anteriormente obtida.

Entretanto, com acerto, a doutrina processualdominante ainda insiste em defender a aplicaçãodo conceito de verdade, eis que apenas um fatopretérito devidamente ocorrido poderá gerar aaplicação da norma abstrata e a consequênciaprevista no ordenamento jurídico. Permitir que ojuiz aplique a norma e as eventuais sanções deladecorrentes baseado apenas em uma realidadefundada na verossimilhança enseja a perda delegitimidade da atuação jurisdicional, eis que o fatopoderia ter ocorrido de forma diversa, ensejandodecisão em sentido diferente.

3 Tradução livre: As verdades históricas não são mais que hipóteses.

Page 74: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

74

Apesar do respeito à tese de Calamandrei,não se concorda com a posição de que, para adecisão do processo, basta a presença daverossimilhança como demonstração de umasimples verdade possível. Apesar de a verdadeabsoluta se mostrar como inatingível, deve-sesempre buscar a melhor verdade possível4 dentrodo processo, levando-se em conta as limitaçõesexistentes e a consciência de que a busca daverdade não é um fim em si mesma, apenasfuncionando como um dos fatores para a efetivarealização da justiça, por meio de uma prestaçãojurisdicional de boa qualidade.

A solução talvez cabível seja a aplicação emsede processual de um fundamento oriundo de outrasáreas do conhecimento, capaz de se adequar àsnecessidades da ciência e às possibilidades dacognição humana, como a teoria da verdade,desenvolvida pelo filósofo Habermas (1997, p. 20),a qual a compreende como um conceito dialético,construído com base na argumentação desenvolvidapelos sujeitos cognoscentes – a verdade não sedescobre, mas se constrói, através daargumentação, no caso dos litigantes.

Partindo-se desta lógica, a construção daverdade deve ser desenvolvida através de umprocedimento de argumentação e colaboraçãoentre os litigantes e a atuação do magistrado natentativa de se atingir a essência da verdadeprocessual possível, que guiará à aplicação da leiao caso concreto e à realização da justiça.

Não obstante se ter conhecimento da teseportuguesa, defendida por Matta (2004, p. 233),de que a verdade processual é efetivamente umaverdade formal, que pode ser ou não a verdadehistoricamente verificada, entende-se que não setrata de construir no processo uma verdade fictícia,ou uma verdade processual que procure superar obinômio verdade formal/verdade material. Deve--se, apenas, proceder à possibilidade deconstatação pelo julgador no sentido de que essepossa se fundar, dentro de suas limitações humanas,nos fatos e direitos efetivamente ocorridos damaneira pela qual foram demonstrados noprocesso. Consoante a doutrina espanholaexpressada por Fenoll (2010, p. 23-24), este éjustamente o objetivo da valoração da prova:averiguar a verdade na medida do que seja humanae juridicamente possível.

Portanto, ainda que se admita que asrestrições no processo civil sejam em maior númeroe com maior intensidade do que as presentes noprocesso penal, em ambos só se revela possível aexistência de uma única verdade, manifestadacomo aquela processualmente alcançável. Odiferente tratamento tradicionalmente dado àsesses duas áreas do Direito – falando-se emverdade real para o processo penal e em verdadeformal para o processo civil – já se demonstraultrapassado.

3 O Dever de Colaboração das Partes para aElucidação da Verdade

É cediço que o Estado deve solucionar osconflitos de interesses com a finalidade de aplicaro Direito. Para tanto, a sociedade deve tambémministrar meios para que a decisão judicial sejaproferida de forma mais adequada. Daí resulta queo dever de colaboração das partes decorre daprópria sujeição de todos ao poder estatal.

A parte tem o ônus de provar e não anecessidade de produzir provas para obter umresultado favorável. Deste modo, a ideia de ônusda prova significa apenas que a não produção daprova pode, ainda que com probabilidade,eventualmente resultar em julgamento desfavorável(MARINONI; ARENART, 2011, p. 187). A regrado ônus configura, assim, um indicativo à parte deque a produção da prova lhe confere maioreschances de obter um julgamento favorável.Segundo a doutrina de Cordeiro (2011, p. 465), esteônus permitirá ao julgador decidir quando nada seapure, de definitivo, quanto aos fatos discutidos noprocesso, demonstrando quem perde, na hipótesede falta de provas.

Antes de qualquer manifestação judicial, oordenamento jurídico sempre oferece à parte aoportunidade de alegar e provar a efetivaveracidade de fatos relevantes à acolhida de suapretensão ou da defesa. Somente após a parte nãofazer uso dos meios processuais e probatórios, quelhe foram oportunizados, é que o magistradoaplicará a determinação da realização de provasde ofício, ou mesmo o emprego de mecanismosrelativos ao ônus da prova.

Se é certo que o juiz deve buscar seconvencer da verdade, também é correto que sua

4 Por verdade possível entenda-se a verdade alcançável no processo, que coloque o magistrado o mais próximopossível do que efetivamente ocorreu no mundo dos fatos, a qual se obtém com a ampla produção das provas,inclusive as determinadas de ofício, com respeito aos limites legais.

Page 75: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

75

convicção se faz com base na argumentação daspartes e nas provas produzidas nos autos, inclusiveaquelas cuja produção foi determinada de ofício, oque gera uma verdade construída no processo. Oque legitima esta decisão judicial, ou mesmo a coisajulgada eventualmente dela decorrente, é a devidaparticipação dos sujeitos processuais através docontraditório e da colaboração, e a atuação conjuntado juiz.

Tradicionalmente se entendia o princípio docontraditório como a oportunidade garantida à partede se manifestar sobre uma proposição ou pedidoformulado pelo ex adverso antes de qualquerdecisão judicial, garantindo assim odesenvolvimento de uma discussão processualdialética. Consoante o escólio de Freitas (2009, p.108-109), esta concepção substitui-se hoje por umanoção mais lata de contrariedade, originada nagarantia constitucional do rechtliches Gehorgermânico. Tal teoria expressa a garantia departicipação efetiva dos litigantes ou interessadosno desenvolvimento do litígio, mediante apossibilidade de influírem nos elementos fáticos,probatórios e jurídicos que encontrem congruênciacom o objeto da causa, em igualdade. O escopoprincipal do princípio do contraditório deixou assimde ser a defesa, no sentido de resistência à atuaçãoalheia, para passar a ser influência no sentido dese incidir positivamente no desenvolvimento e êxitodo processo.

Sob esta óptica, no plano probatório, oprincípio do contraditório exige a garantia às partes,de forma igualitária, da faculdade de propor erealizar todos os meios de prova que se mostrempotencialmente relevantes para a apuração darealidade dos fatos ligados à causa, bem como napossibilidade de pronunciamento dos litigantes sobretodas as provas produzidas no processo. Já no planodas questões de direito, o contraditório exige que,antes da decisão judicial, seja facultada aoslitigantes a discussão efetiva dos fundamentosjurídicos em que a decisão possa se basear.

De outra senda, no que se refere ao princípioda cooperação, saliente-se que os litigantes devemcooperar entre si e com o magistrado para que sepossa apurar a verdade dentro do processo,propiciando a este realizar sua função, inclusiveem um prazo razoável. A colaboração pode serrealizada nos planos material e formal, conformedefendido por Freitas (2009, p. 164-167). Este deverde cooperação para a descoberta da verdade,radicado pelas próprias partes, constitui emanação

do dever geral de cooperação, consagrado,inclusive, no art. 226 do Código de Processo Civilportuguês.

Saliente-se que no exercício da funçãojurisdicional o magistrado é independente parareceber e analisar os fatos que foram narrados ouque restaram registrados nos autos, para verificara jurisdicidade e proceder à subsunção. Emcontrapartida, recebe o dever de fundamentar suadecisão.

A valoração da prova consiste assim emdeterminar o valor probatório alcançado por cadameio em relação a um direito específico e tem porobjeto estabelecer quando e até que ponto podeser considerada verdadeira sobre as basesprobatórias a alegação formulada pela parterelativa ao direito controvertido.

Importante ressaltar que, conforme osensinamentos do espanhol Aroca (2011, p. 589-590) os fenômenos da valoração e da apreciaçãoda prova, apesar de se aproximarem, não sãoidênticos ou tidos como sinônimos eis que apreciartem um significado mais amplo do que valorar. Nofenômeno da apreciação das provas estão implícitasatividades intelectuais que devem ser claramentediferenciadas ao se referir a um sistema devaloração das provas. A interpretação é realizadaapós a produção da prova, com relação a qualresultado se depreende dessa, considerada deforma isolada. Já a valoração consistiria emdeterminar o valor concreto que se deve atribuircom relação à certeza e credibilidade da prova,confrontada com os outros meios probatóriosrealizados.

Apesar da divergência doutrinária, aconcordância é com a tese de que o conjuntoformado entre a interpretação e a valoração resultana apreciação da prova, que consiste em operaçõesmentais realizadas pelo julgador, partindo das fontesde provas e objetivando estabelecer a certeza sobreas afirmações inerentes aos fatos e ao direito,argumentadas pelos litigantes.

Apenas sobre a óptica de realização daverdade através da prova, decorrente dodesenvolvimento de uma relação processualdialética, na qual além do respeito ao contraditórioas partes procurem agir de forma a cooperar entresi e com o julgador, poder-se-á desenvolver umaadequada valoração e atingir uma decisãopertinente, que realize os objetivos de aplicaçãoda justiça.

Page 76: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

76

Considerações Finais

A apreciação da prova constitui mais um deverdo julgador do que um poder, impondo-se-lhe comouma verdadeira obrigação a ser cumprida noexercício do poder soberano de aplicar a Justiça,que lhe é transferido pelo Estado. A valoração daprova é uma atividade jurisdicional muito relevantee extraordinariamente complexa, que pode ser vítimade uma superficialidade da análise do julgador nocaso concreto.

Diante da análise procedida no presentetrabalho, resta claro que o juiz deve procurar seconvencer da verdade material, embora possa secontentar, em determinadas situações, com amelhor verdade processualmente disposta, ante aslimitações humanas, legais e processuais àreprodução dos fatos preteritamente ocorridos.

Em matérias científicas considera-se obtidaa verdade quando a proposição formulada comohipótese corresponde à medida quantitativa dofenômeno observado, a exemplo de um teoremamatemático. Em contrapartida, em matéria jurídica,o julgador obtém a verdade quando a hipótese sobreum fato anteriormente verificado corresponde àreconstrução do mesmo fato obtida através dasprovas.

Para realizar a justiça não é preciso atingir averdade absoluta, dado às limitações dacapacidade do conhecimento humano. Não énecessário que a reconstituição dos fatos sejaperfeita, devendo ser razoável e respeitar osprincípios gerais e éticos.

No sistema do livre convencimento motivado,contemporaneamente majoritário nosordenamentos jurídicos, a análise das provasconduz à fundamentação que se apresenta comoelemento compositivo da sentença, veiculando seuconteúdo racional. A Sentença funciona como umajunção entre um ato de vontade combinado commanifestação da razão, conforme a formulação“kelseniana” que reputa a interpretação ultimadapelo aplicador – no caso, o magistrado – comointerpretação autêntica e criadora do Direito.

Em um Estado Democrático de Direito, éessencial que a relação processual se preocupeem realizar uma eficiente dilação probatória, comcooperação entre as partes e o julgador, no intuitode garantir uma adequada reconstrução daverdade, que propiciará uma apropriada valoraçãodas provas e, consequentemente, a possibilidadede elaboração pelo julgador de uma fundamentadadecisão judicial, que possa viabilizar a plenarealização da Justiça.

Referências

ALVIM, José Manoel Arruda. Dogmáticajurídica e o novo código de processo civil.Revista de Processo, São Paulo, Ed. Revistados Tribunais, n. 1, jan.-mar. 1976.

AROCA, Juan Montero. La prueba em elproceso civil. 6. ed. Pamplona: Civitas, 2011.

BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas.Tradução de Paulo M. Oliveira. São Paulo:Saraiva, 2011.

CALAMANDREI, Piero. Verità everosimiglianza nel processo civile. Rivista diDiritto Processuale, Padova, Ed. Cedam, 1955.

CARNELUTTI, Francesco. Diritto e processo.Napoli: Morano, 1958.

CHIOVENDA, Guiseppe. Principios dederecho processual civil. Tradução de JoséCasais y Santaló. v. 1. Madrid: Reus, 1922.Tradução da 3.ª edição italiana.

CORDEIRO, Antônio Menezes. Tratado dedireito civil. v. 5. Coimbra: Almedina, 2011.Reimpressão.

DINAMARCO, Cândido Rangel. Ainstrumentalidade do processo. 8. ed. rev. eatual. São Paulo: Malheiros, 2000.

FENOLL, Jordi Nieva. La valoración de laprueba. Madrid/Barcelona/Buenos Aires:Marcial Pons, 2010.

FERRAJOLI, Luigi. Diritto e ragione: teoriadel garantismo penale. Roma: Bari, 1989.

FREITAS, José Lebre. Introdução ao processocivil: conceitos e princípios gerais. 2. ed.Coimbra: Coimbra, 2009. Reimpressão.

HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia,entre facticidade e validade. Tradução deFlávio Beno Siebeneichler. v. 1. Rio de Janeiro:Tempo Brasileiro, 1997.

IACOBONI, Alessandro. Prova legale e liberoconvincimento del giudice. Milano: Giuffrè,2006.

Page 77: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

77

KELSEN, Hans. Teoria pura do direito.Tradução de João Baptista Machado. 4. ed. SãoPaulo: Martins Fontes, 1995. 1.ª reimpressão.

LENT, Friedrich. Diritto processuale civiletedesco. Napoli: Morano, 1962.

LIEBMAN, Enrico Tullio. Manual de direitoprocessual civil. Tradução de Cândido RangelDinamarco. v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 1984.

LOMBARDO, Luigi. La prova giudiziale:contributo alla teoria del giudizio di fatto nelprocesso. Milão: Giuffrè, 1999.

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART,Sérgio Cruz. Prova. 2. ed. São Paulo: Revistados Tribunais, 2011.

MATTA, Paulo Saragoça da. A livre apreciaçãoda prova e o dever de fundamentação dasentença. In: PALMA, Maria Fernanda(Coord.). Jornadas de direito processualpenal e direitos fundamentais. Coimbra:Almedina, 2004.

MENDES, João de Castro. Do conceito deprova em processo civil. Lisboa: Ática, 1961.

MITTERMAYER, Carl Joseph Anton. Tratadoda prova em matéria criminal. Tradução deAlberto Antônio Soares. 2. ed. Rio de Janeiro:Eduardo & Henrique Laemmert, 1879.

MONSTESQUIEU, Charles-Louis de Secondat,

baron de La Brède et de. O espírito das leis.[S.n.], 1748.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manualde direito processual civil. 3. ed. São Paulo:Método, 2011.

PAIXÃO JÚNIOR, Manuel Galdino. Teoriageral do processo. Belo Horizonte: Del Rey,2002.REALE, Miguel. Verdade e conjectura. Rio deJaneiro: Nova Fronteira, 1983.

TARUFFO, Michele. Funzione della prova: lafunzione dimostrativa. Rivista Trimestrale diDiritto e Procedura Civile. Milano, Ed. Giuffrè,1997.

______. La prueba. Tradução de LauraManríquez e Jordi Ferrer Beltrán. Madrid/Barcelona/Buenos Aires: Marcial Pons, 2008.

______. Studi sulla rilevanza della prova.Padova: Cedam, 1970.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso dedireito processual civil. v. 1. 38. ed. Rio deJaneiro: Forense, 2002.

TONINI, Paolo. A prova no processo penalitaliano. Tradução de Alexandra Martins eDaniela Mróz. São Paulo: Revista dos Tribunais,2002.

VILLEY, Michel. Réflexions sur laphilosophie et le droit: lês carnets. Paris: PUF,1995.

Page 78: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

78

Page 79: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

79

RESENHA

Page 80: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

80

Page 81: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

81

No Direito, a justiça encontra-se como pontocomum entre as disciplinas de Teoria do Direito eda Filosofia do Direito. No pensamento ocidental, aideia de justiça como equidade começou a serdesenvolvida a partir no pensamento de Aristóteles,em sua obra, Ética a Nicômaco, na qual surgiu oconceito de justiça retributiva, distributiva e legal.(DIMOULIS, 2011).

Apesar de ser tema primordial para o Direito,já que sua busca configura o próprio objetivo oufinalidade do ordenamento, a construção de umconceito de justiça mostra-se tão difícil de serformulada, quanto desejada.

A tarefa mostra-se difícil na medida em queas construções teóricas sobre o tema envolvemsempre uma visão carregada de subjetivismo e davisão ideológica de quem o produz, influenciada porfatores externos como os econômicos e políticos.

Além disso, a concepção de justo pode variarculturalmente no tempo e no espaço, impossibilitandoa formulação de um conceito universal válido emtodas as épocas.

Por outro lado, nítido observar que a justiça éo elemento valorativo conformador do ordenamentoque confere legitimidade e aceitação às normaspostas.

Para Bergel (2006, p. 21) o tema justiça éperseguido e consagrado entre o pensamento e atécnica jurídica, como um elemento essencial epermanente, que testa a coerência das soluçõesapresentadas pelo ordenamento jurídico. O autorreforça, ainda, as diferentes concepções de justiçatrazidas pelos juristas e moralistas.

A presente Resenha analisa a obra: “A Ideiade Justiça”, lançada pelo economista indiano,Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia em 1998,na qual o autor reascende a relevância da discussãosobre o conceito de justiça e retoma muito de suasideias sobre liberdade e oportunidade de escolhas,mas dessa vez aplicadas à justiça.

Em sua obra, Amartya Sen revisa as principaisteorias existentes, formulando críticas e apontandocontributos.

A IDEIA DE JUSTIÇA DE AMAR TYA SEN (2011)

Tacyana Karoline Araújo Lopes1

O presente estudo objetiva expor,resumidamente, mas de forma simplista, as ideiastrazidas por Sen na obra, sem, contudo, substituir aleitura da obra, que se mostra densa pelo conteúdo,suave pela escrita simples e instigante pelaabordagem alternativa e humanizada conferida aotema.

Com sua obra, o autor objetiva a reformulaçãode uma Teoria da Justiça a que reputa iluminista econtratualista, que até então vinha sendodesenvolvida por filósofos modernos, cujas ideiasse apoiariam em um modelo essencialmente burguêsde igualdade, o que, de fato, influencia na formulaçãoda nossa ideia de equidade.

Para tanto, o economista abordou o tema comonenhum jurista o fez, formulou, fundamentadamente,ao nosso ver, algumas críticas às ideias de Rawls(1971) em sua obra “Uma Teoria da Justiça”.

Sen (2011) apoiou-se nas ideias de Rawlsaliando-as às de Marx, Condorcet e Smith, e Millpara sustentar seus argumentos e para denunciar anecessidade de se mitigar a ideia do utilitarismo doconceito de justiça que se pretenda geral, com baseno uso da racionalidade, da noção de alteridade, naescuta dos interesses do outro e da redução dasinjustiças.

A obra está dividida em quatro partes. Noprimeiro capítulo, intitulado “As exigências dajustiça”, o autor ressalta a necessidade dodesenvolvimento da razão humana como meionecessário para a adequada formulação de juízosde valor que fornecem poder de julgamento aosindivíduos.

Além disso, o desenvolvimento dessa razãopossibilita a adequada formulação de juízos dealteridade e constitui, ainda, o meio necessário paradesmanchar preconceitos que se fundamentam emargumentos que também se utilizam da razão.

Para Sen (2011, p. 20) “a desrazão não consistena prática de dispensar completamente a razão, masde contar com uma argumentação racional bastanteprimitiva e falha”, razão pela qual, o desenvolvimento

1 Bacharela em Direito, Especialista em Direito Público e Mestre em Desenvolvimento Social pela Unimontes, atuacomo docente na Faculdade de Direito Santo Agostinho de Montes Claros.

Page 82: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

82

da razão para o autor se mostra essencial naformulação de conceitos de justiça e para saberreconhecer e superar os argumentos falaciosos.

Assim, no primeiro capítulo de sua obra, o autordeixa registrado como requisito de uma teoria dajustiça, o desenvolvimento da razão comomecanismo que diagnostica a justiça e a injustiça(SEN, 2011) e essa razão seria algo essencial parainstruir as pessoas a agir melhor em relação a outraspessoas. Para o autor, o desenvolvimento da razãoajuda os indivíduos a pensar sobre a perspectivacoletiva e sobre as nossas responsabilidades sociais.

Sen passou a tratar o tema justiça, entre outrasmultiplicidades, numa perspectiva binária na medidaem que a formulação de uma Teoria da justiça passaa ter como objetivo a redução das injustiças.

Sen aborda, ainda, que teóricos contemporâneoscomo Ronald Dworkin, Harbermas, David Gauthierdesenvolvem o pensamento sobre justiça, tendo aidentificação de instituições e regras justas comocentro de suas teorias, ainda que em diferentesperspectivas.

Sen informa que compartilha do pensamentoinstitucionalista e ressalta a importância dopensamento rawlsiano em sua obra, mas apenas comoponto de partida para a formulação de uma teoria dejustiça, e que igualmente se utiliza as ideias de Smith,Mill, Condorcet e Marx para focar sua análise naspráticas que ocorrem nas sociedades e não apenasnas instituições, de forma que o autor percebe a justiçaa partir de uma ideia comparativa de retrocesso ouavanço da justiça, vista a partir de práticas sociais.

O autor apresentou em seu pensamento duasdivergências básicas em relação ao pensamentoinstitucionalista, a apresentada acima, a que chamade “factibilidade” (procura observar práticas sociaise não apenas arranjos institucionais) e a redundânciado enfoque transcendental ao pensar em acordosconsensuais sem levar em conta alternativaspossíveis.

Nesse ponto, Sen critica a ideia iluminista eburguesa de justiça e formula críticas à perspectivainstitucionalista com que a justiça é tratada emRawls. Para Sen (2011, p. 36)

[...] é claro que a natureza da sociedade queresulta de determinado conjunto deinstituições, depende necessariamente decaracterísticas não institucionais, tais comoos comportamentos reais das pessoas e suasinterações sociais.

No segundo capítulo, sobre formas deargumentação racional, Sen desenvolve a influênciada posição dos objetos ou situações na visão dequem o interpreta, as ilusões que podem decorrerdessa posição e como essa posição limita acompreensão da realidade, e, consequentemente opoder de julgamento de uma situação.

Reforça a importância da racionalidade comomeio de avaliar corretamente justiça e injustiça e daimplementação dessa justiça, da necessidade dedesenvolvimento de uma razão pública paraobtenção da redução das injustiças e não apenas darazão como busca do “autointeresse”.

Ao discorrer sobre o conflito de posições derazões, Sen defende a necessidade do conceito dealteridade, para que os indivíduos consigam secolocar no lugar dos outros, para sentir a situaçãode forma diferente, sem que isso fuja ao exercícioda razão, mas que dela seja um desdobramento.

Trecho que resume o pensamento do autornesse capítulo diz que “ser atencioso com osobjetivos e desejos dos outros não precisa ser vistocomo uma violação da racionalidade.” (SEN, 2011,p. 227), mas como a tomada desses objetivos comopróprios também. Trazendo à teoria da justiça alémdos interesses coletivos, ou do utilitarismo, aconcepção das liberdades, da escuta dos interessesdas minorias, na formulação de um conceito maisdemocrático de justiça.

No terceiro capítulo, o autor aborda, ainda, aideia da ampliação de capacidades como fatornecessário a uma adequada formulação do justo, jáque é evidente que o grau de privação dedeterminados indivíduos pode influenciar nacapacidade dos indivíduos buscar seus objetivos e,ainda, em sua capacidade de escolha.

O autor aborda a dificuldade de decisões quebaseiam suas escolhas a partir de argumentossociais, estruturados na meritocracia ou trabalho,em sociedades em que a obtenção de tais méritosenvolve injustiças estruturais.

No quarto capítulo, o autor tem como foco arealização dos Direitos Humanos como “imperativosglobais” e a redução das injustiças como a fome e oacúmulo como um objetivo que deve ser levado emconta e que refletem na elaboração de um conceitode justiça. O autor enfatiza ainda a necessidade dajustiça como bem da vida humana.

Por fim, Sen trata a argumentação e ainconformidade como elementos úteis à razão naconstrução ações justas na medida em que possapermitir uma leitura crítica da realidade e ajudar atraçar soluções plausíveis para redução das injustiças.

Page 83: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

83

Todas as questões levantadas na obra de Sennos faz refletir sobre conceitos, teorias e abordagensexistentes, sobre a real necessidade de(des)construção de um conceito de justiça queacomode visões divergentes.

Obra que convida a pensar sobre o tema,agrega críticas e evoluções alcançadas, trazendoum contraponto da cultura indiana, sem formularum conceito acabado ou sem esgotar o tema a serdesenvolvido pela literatura, apresentando a taldiscussão como uma necessidade vital para o direito,que ainda não restou satisfeita.

REFERÊNCIAS

BERGEL, Jean Louis. Teoria geral do direito.Tradução de Maria Ermantina Prado de AlmeidaGalvão. São Paulo: Martins Fontes, 2006.

DIMOULIS, Dimitri. Manual de introdução aoestudo do direito. 4. ed. rev., atual. e ampl. SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 2011.

SEN, Amartya. A idéia de justiça. Tradução deDenise Bottmann e Ricardo Doninelli Mendes.São Paulo: Cia. das Letras, 2011.

Page 84: FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo ...institucional.fasa.edu.br/assets/arquivos/files/Fas@Jus v_2, n_1... · FAS@JUS - e -Revista da F aculdade de Direito Santo Agostinho,

FAS@JUS - e-Revista da Faculdade de Direito Santo Agostinho, v. 2, n. 1/2012

84