fazendo 36
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boletim doque por cá se fazTRANSCRIPT
À espera de D. Sebastião
FAZENDO8 de Abril de 2010 | Quinta | Edição # 36 | Quinzenal | Agenda Cultural Faialense | Distribuição Gratuita
boletim do que por cá se faz
Opinião Opinião
02
ficha técnica - fazendo - isento de registo na erc ao abrigo da lei de imprensa 2/99 de 13 de janeiro, art. 9º, nº 2 - direcção geral: jácome armas - direcção editorial: pedro lucas - coordenadores temáticos: catarina azevedo, luís
menezes, luís pereira, pedro gaspar, ricardo serrão, rosa dart - colaboradores: aurora ribeiro, cláudia ávila gomes, filipe m. porteiro, genuíno madruga, parque natural do faial, sara soares, tiago vouga, tomás silva - projecto
gráfico: paulo neves, elcubu, [email protected] - capa: “ecce-femina” de gil teixeira lopes - produção e paginação: aurora ribeiro - propriedade: associação cultural fazendo - sede: rua rogério gonçalves, nº 18, 9900 horta -
periodicidade: quinzenal - tiragem: 400 exemplares - impressão: gráfica o telégrapho - contactos: [email protected], http://fazendofazendo.blogspot.com - distribuição gratuita - apoio: direcção regional da cultura:
Entrevista
Transformarte
Genuíno MadrugaAurora Ribeiro
Pedro Lucas
Há uma nova publicação nos Açores dedicada
às “artes e às coisas mundanas”. O fanzine Transformar.te foi
recentemente lançado pela Associação Cultural Burra de
Milho, sediada na ilha Terceira, e pretende ser um espaço,
não temático, de intervenção e divulgação. Para a elaboração
de conteúdos a organização faz um convite aberto à
participação de todos os interessados em colaborar ou
promover o seu trabalho, que têm assim um novo meio de dar
visibilidade às suas ideias.
Já deu duas voltas ao mundo. Encontrou algum
lugar onde achasse que as pessoas fossem especialmente
felizes ou satisfeitas com a vida?
Esta pergunta é muito subjectiva, há gente boa e má em toda
a parte do mundo. Mas nas ilhas da Polinésia, nomeadamente
nas Ilhas Marquesas, a forma de vida daquelas gentes tem
pouco a ver com esta daqui dos chamados países ocidentais.
E perguntamo-nos afinal o que é civilização? É a nossa, que
está dando cabo disto tudo, do clima? Esta civilização do
plástico e das latas de coca-cola, da droga, assaltos a bancos
e bombas? Nessas pequenas ilhas do Pacífico e do Índico não
precisam de polícias. A maior parte delas está livre de drogas
porque têm os seus próprios meios de resolver esses
problemas. Melhor do que tudo: não há gente miserável como
há nos países ocidentais e lá há uma forte e importante
ligação com a Terra e com o Mar.
O que é que podia ser feito para que aqui também houvesse
uma maior ligação com a Terra e com o Mar?
A Horta é um dos maiores portos do mundo em movimento de
iates, mas as pessoas limitam-se a vê-los passar. Mesmo assim
já vai havendo um maior número de pessoal com barcos, mas
a ligação da Horta com o Mar está principalmente relacionada
com a passagem dos estrangeiros, o que eu não compreendo.
Só para dar um exemplo, nas Ilhas Marquesas há um dia por
semana, a sexta-feira, em que todas as crianças da escola
vão aprender a nadar, remar, andar à vela, para além de que
nos outros dias à tarde vão todos para o mar, com as suas
canoas, etc. A formação básica escolar já traz disciplinas
sobre o estudo do mar. Aqui vivemos practicamente de costas
Cada estação do ano trará um novo número do fanzine que
terá distribuição regional gratuita em formato físico assim
como acesso livre na internet:
www.issuu.com/transformarte.
Dos assuntos que preenchem a edição desta primavera fazem
parte, entre outros, os “fanzines” (em sentido genérico), o
trabalho plástico multidiscplinar “À prova de fogo e Bala” e a
fotografia de Pedro Duarte Jorge. De notar também a
excelente apresentação gráfica da publicação. O
voltadas para o mar, apesar de que, nos últimos anos, mesmo
assim, houve alguma melhoria. Fundamentalmente a mudança
na mentalidade tem que passar pela escola, o ensino têm que
estar inserido na nossa realidade: pouca terra, mar e turismo.
Porque carga de água é que têm que vir estrangeiros trabalhar
para esses ferry boats? Porque carga de água é que quem vai
para o mar é quem não sabe ler nem escrever?
Houve recentemente um debate no Parlamento onde se
defendeu a construção de uma escola de pescadores nos
Açores. Mas como é que isso iria ser feito? E onde? Em São
Miguel? Ir estudar para São Miguel exige quase o mesmo
esforço do que ir estudar para Lisboa. Eu, por exemplo,
estudei em Lisboa. Criar uma escola dessas implicaria custos
enormes. Em vez disso porque não implementar-se logo de
princípio os ensinamentos básicos sobre o mar, com o intuito
de incentivar a rapaziada a gostar e os entusiasmasse então a
ir estudar para fora?
Na sua função, como é que contribui para melhorar o nosso
futuro?
Falando de coisas práticas, dando exemplo de vida, utilizando
os conhecimentos das duas viagens de circum-navegação que
realizei, palestrando aos alunos das escolas, tanto os maiores
como os pequeninos. Não faço mais porque não tenho
oportunidade de o fazer, sou pescador, vivo no mar, nem
sempre tenho tempo em terra disponível, mas atendo todos
que vão conversar comigo. E estes são temas que a rapaziada
gosta muito. O importante é lançar as sementes. Contar-lhes
sobre o primeiro barco que tive, construí-o com 12 anos, era
uma chata com 2,60m, incentivá-los a realizar seus sonhos,
não só dar a volta ao mundo, mas estudar, comprar uma casa,
formar-se numa profissão, etc.
Estamos melhor hoje que antes?
Claro que sim, falando da pesca, apesar de todos os
problemas que vão condicionando o nosso futuro na pesca,
vive-se melhor do mar. A segurança é maior, as condições de
vida a bordo são melhores. Mas também é facto que não há
muito tempo quem vivia do mar tinha alguma qualidade de
vida, o que hoje já não é bem verdade. O futuro é também
uma incógnita muito grande e as consequências já aí estão.
Na exploração do nosso mar há stocks em ruptura: espécies
demersais como o goraz, a boca negra e em muito pouco
também o cherne. Mas ainda se continua a aumentar o
esforço de pesca!!! Os rendimentos estão a diminuir e os
custos, como o combustível, a manutenção dos barcos, os
aparelhos, entre outros, continuam a aumentar. Cada vez se
ganha menos e vêm a caminho sérios problemas sociais.
Crianças das Ilhas Marquesas | Foto: Genuíno Madruga
MúsicaMúsica
03
Música no PapelFausto
A pauta musical, tal como hoje a
conhecemos, é o conjunto de 5 linhas horizontais, paralelas e
equidistantes que formam entre si 4 espaços onde são
colocadas as notas da partitura. É também denominada de
pentagrama, no sistema de notação da música ocidental, e
apesar de ter sido estabelecida no séc. XI, só entrou em uso
definitivo a partir do século XVII. Antes deste modelo, usava-
-se apenas uma linha, com o mesmo princípio deste método,
ou seja, a distanciação à linha para cima (agudos) ou para
baixo (graves), criava as diferentes notas. Tratava-se de um
método impreciso, pelo que as linhas foram aparecendo,
primeiro num esquema de quatro (tetragrama) e depois cinco
com os respectivos espaços. Na idade média, através das
pautas era já possível representar não só a altura das notas,
como também a sua duração e os compassos das músicas.
Mas apesar deste percurso lento e fungiforme da notação em
pauta tradicional, sempre houve paralelamente quem
experimentasse novas formas de escrever ou representar
música, sem música. Ao longo dos tempos, vários músicos
propuseram sistemas de simbologia alternativos, sendo que
muitos deles nunca foram além do interesse estético. Outros,
apesar de lógicos e intuitivos, não eram precisos, ou seja,
eram concebidos à imagem do autor, dando lugar a variadas
interpretações por parte de intérpretes (o que também tem o
seu interesse).
Um dos grandes mestres da desconstrução do sistema
tradicional foi Pierre Schaeffer, músico de Nancy nascido em
1910. Em termos musicais experimentou em Paris técnicas
pioneiras de gravação e sobreposição de sons, e com eles
compunha peças completas. O seu primeiro trabalho de 1948
intitulou-se “Étude aux chemins de fer”, feito com
equipamentos de uma estação de rádio, onde o músico
subverteu todas as regras até então estabelecidas com as
suas misturas sonoras (dub). Foi o primeiro compositor a
utilizar fitas magnéticas e sintetizou os seus métodos de
trabalho naquilo que chamou “música concreta”, em oposição
à música clássica. O seu génio inventivo estendeu-se à
notação musical, onde experimentou técnicas de
representação algo bizarras. Estas técnicas, rompendo com o
paradigma instalado, eram difíceis de interpretar e perceber,
e não seguiam uma linha condutora comum, eram “esquemas”
mentais que obrigavam à interpretação emocional de cada
peça através da sua representação simbólica. Ou seja,
Schaeffer não teve a intenção de criar um novo método que
substituísse o pentagrama, apenas exercia a liberdade de
expressar a sua música como lhe apetecia.
À semelhança de Schaeffer, muitos músicos antigos e
contemporâneos apresentaram alternativas à escrita musical,
todos eles com conceitos diferentes, mas todos eles
igualmente interessantes. Músicos como John Cage, John
Bergamo, Brian Eno, John Zorn, e Emanuel Pimenta, foram e
são verdadeiros experimentalistas da música e da sua
representação. Emanuel Pimenta, músico, arquitecto e
escritor que já nos visitou no Faial, e com quem tive o prazer
de conversar sobre este e outros assuntos, vai mais longe na
representação musical, criando a pauta tridimensional,
através de sistemas digitais. Essa pauta, a que Emanuel
Pimenta chama máquina, é uma verdadeira construção
tridimensional, onde através de ordens do compositor,
determinados fenómenos musicais acontecem, alguns de
carácter aleatório, outros controlados. Assim, o resultado
final é por vezes inesperado, e a representação tridimensional
da música é ao mesmo tempo o instrumento para a mesma se
manifestar.
Na música Ocidental, adoptou-se o pentagrama ou pauta
como método consensual de representação musical, o que se
torna importante no sentido em que universaliza a sua
compreensão. Isto não implica porém que novos sistemas não
sejam experimentados, e mais importante do que isso: não
pode servir de limitação a um músico. Assim como a
criatividade musical não tem limites, a sua representação
também não pode ter, e cada um terá de criar os seus
esquemas e métodos representativos, tradicionais ou não.
Quem sabe um destes dias não surgirá um sistema de notação
inovador, mais simples e democrático, e que remeta o velho
pentagrama para os livros empoeirados da história. Seria
bom, pois na minha opinião o pentagrama funciona muito
bem, mas é chato e aborrecido, e algo limitador até (perdoe-
me o reservatório de conservas). O
“kepler’s vestiges emanuel dimas de melo pimenta 2007 to audrey riley”
Pauta musical de Schaeffer
Cinema Arquitectura e Artes PlásticasTeatro e Cinema
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História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voarTiago Vouga - Teatro de Giz
O Espectáculo
Depois de “Paisagens em Trânsito” de Patrick Murys, as
marionetas voltam a pisar o palco do Teatro Faialense, desta
vez manipuladas pela arte dos actores e actrizes do Teatro
Art’Imagem. Próxima do seu trigésimo aniversário, a
companhia portuense exibe uma invejável vitalidade, criando
três novos espectáculos por ano e assegurando a realização
de eventos consolidados tais como os festivais Fazer a Festa e
o Festival Internacional de Teatro Cómico da Maia.
O espectáculo “História de Uma Gaivota e do Gato que a
Ensinou a Voar” é certamente um dos seus espectáculos de
maior sucesso. Estreado no ano de 2008, o espectáculo tem
estado permanentemente em digressão, tendo sido
apresentado em palcos como o do Centro Cultural de Belém e
o do Festival Teatralia, em Madrid.
O ponto de partida para o espectáculo é a história de Luís
Sepúlveda com o mesmo nome, que aborda os temas da
poluição ambiental e da tolerância perante diferenças/
naturezas aparentemente inconciliáveis. Através de
marionetas em polioretano flexível, os actores empregam
todo o seu talento e experiência para contar esta fábula
ecológica e social. O resultado é um espectáculo de grande
beleza tanto ao nível da forma como do conteúdo, apropriado
para qualquer público a partir dos 4 anos. O
O espectáculo é apresentado domingo, dia 11 de Abril, pelas
16h no Teatro Faialense.
A Oficina
O Teatro Art’Imagem apresenta-se em tertúlia logo após o es-
pectáculo “História da Gaivota e do Gato que a Ensinou a
Voar”. Uma oportunidade para satisfazer qualquer curiosi-
dade àcerca do espectáculo, conhecer melhor o grupo, os
seus actores e as marionetas que dão vida a esta história. O
À espera de GodotTiago Vouga - Teatro de GizCumprida metade da programação da edição deste
ano do Festival de Teatro do Faial, chega a hora dos grupos
faialenses se apresentarem. Começamos pelo Teatro de Giz,
já no dia 17 de Abril, com “À Espera de Godot” de Samuel
Beckett, com encenação de João Garcia Miguel.
Apontado por muitos como o melhor texto dramatúrgico do
século XX, esta obra de Beckett é uma trágicomédia em dois
actos. Centra-se sobre a espera de duas personagens por
Godot (algo ou alguém que tarda em chegar) e que os obriga
a criar diversões para “matar o tempo”. O resultado são
situações aparentemente absurdas que carregam tanto de
imprevisível como de familiar.
De entre todos os textos equacionados pelo elenco e o
encenador, “À Espera de Godot” era o mais cativante mas
também o mais audacioso. Prevaleceu o desafio sobre os
escassos três meses e meio entre o início dos ensaios e a
estreia e as limitações habitualmente impostas pela
profissionalização dos membros do Teatro de Giz em outras
áreas que não a do teatro.
Decorridos três meses de ensaios, estamos confiantes de que
tomámos uma boa decisão. Sob a exigente orientação de João
Garcia Miguel e de Sara Ribeiro, a assistente de encenação,
desenha-se um espectáculo surpreendente e divertido, para
que o resultado final seja um espectáculo digno do Teatro
como João Garcia Miguel o define: “a arte do tempo, a arte
de bem saber matar o tempo”.O
O espectáculo é apresentado Sábado, dia 17 de Abril, pelas
21h30 no Teatro Faialense
Arquitectura e Artes plásticasArquitectura e Artes Plásticas
05
Gil Teixeira Lopes , nasceu em Mirandela em 1936, e
de 1960 a 1995 foi Professor Catedrático da Faculdade de
Belas-Artes da Universidade de Lisboa, tendo desempenhado
múltiplas funções de âmbito académico, e feito parte de júris
artísticos nacionais e internacionais.
Pintor, gravador, escultor, pedagogo, investigador, Gil Teixeira
Lopes tem uma vasta obra de projecção internacional. É
membro honorário da Academia Nacional de Belas Artes,
Medalha de Ouro das Cidades de Génova e Mirandela e
Comendador da Ordem do Infante D. Henrique.
Figura incontornável no panorama da arte contemporânea
portuguesa, expõe desde 1955, contando com mais de 800
exposições em diversos países, tais como: Alemanha, Angola,
Áustria, Bélgica, Brasil, Bulgária, Coreia, Dinamarca, Egipto,
Espanha, Estados Unidos da América, França, Índia, Inglaterra,
Itália, Japão, Jugoslávia, México, Noruega, Nova Zelândia,
Polónia, Taiwan, Rússia.
Entre o seu vasto currículo artístico, Gil Teixeira Lopes
recebeu, entre 1960 e 2005, cerca de 40 prémios e distinções,
quer no país, quer no estrangeiro. O
( Consultar Fazendo nº 35)
A exposição inaugura hoje dia 8 de Abril, na sala de Exposições
da Biblioteca.
Nota BiográficaExposição temporária de Gil Teixeira Lopes
Luís Menezes
História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar
Era uma vez um Príncipe marinheiro que se
apaixonou pela vida marinha e fez do Mar dos Açores o seu
jardim-laboratório de águas profundas. A descoberta dos
segredos marinhos ocultos era a paixão do Príncipe Alberto I
do Mónaco. Claro, que o soberano-oceanógrafo não se ficou
pelos prazeres da investigação e nestas ilhas cultivou
frutíferas amizades, iniciou naturalistas interessados, registou
costumes locais, redescobriu sítios de interesse ecológico e
paisagístico, lançou as bases da rede regional de meteorologia
e escreveu poeticamente sobre nós e sobre a história natural
das nossas ilhas. Os Açores para o Príncipe foram um local de
eleição.
Sobre os seus auspícios fizeram-se 13 campanhas
oceanográficas no Mar os Açores. Nos seus quatro navios,
entre 1885 e 1914, uma equipa multidisciplinar desenvolveu
técnicas e equipamentos inovadores aplicados à biologia,
oceanografia, geomorfologia e meteorologia. Descreveram-se
centenas de espécies exóticas e bizarras e habitats
desconhecidos, da superfície ao abismo; estudaram-se
correntes marinhas e largaram-se balões atmosféricos;
descobriram-se bancos oceânicos (como o Princesa Alice) e
fossas abissais (como a Hirondelle). As ciências do mar
conheceram um impulso invulgar.
O seu legado está registado em numerosas publicações
científicas dadas ao prelo com a sua chancela. As instituições
científicas por si fundadas (Museu Oceanográfico e o Instituo
Oceanográfico do Mónaco, entre outros) projectam no tempo
a sua visão moderna dos estudos oceânicos. As suas memórias
ficaram gravadas no seu livro autobiográfico La Carrière d’un
Navigateur, onde também descreve de forma apaixonada as
ilhas e as suas gentes. Escreveu milhares de cartas com
detalhes sobre as suas descobertas, projectos, sentimentos e
impressões.
Alberto I do Mónaco era um filantropo de destaque na
sociedade científica e cultural da Europa de então; hoje a sua
obra é referência incontornável quando nos debruçamos
Filipe M. Porteiro - DOP/UAç
Um Príncipe e um Observatório no Cabeço das Moças
sobre a história e o ensino da oceanografia biológica.
Assim sendo, não é desprezível, nem despropositado,
perpetuar a sua memória e a herança que o Príncipe nos
deixou. Neste âmbito, é de referir que os açorianos
reconheceram este legado e desde cedo organizaram eventos
e manifestações em sua homenagem: baptizaram-se ruas com
o seu nome (onde Alberto I esteve presente); promoveram-se
sessões e publicações temáticas comemorativas das suas
campanhas; escreveram-se livros e estudos sobre a sua
actividade cultural e científica; editaram-se gravuras alusivas
às suas estadias nos Açores; lançaram-se carimbos filatélicos
comemorativos; e baptizaram-se edifícios com o seu nome,
como o Observatório Meteorológico Príncipe Alberto I do
Mónaco, situado estrategicamente no Cabeço das Moças, na
Horta.
Este posto meteorológico, como é popularmente conhecido,
inclui belas peças museológicas de equipamento científico e
um espólio documental de inegável valor patrimonial e
histórico. Acontece que o edifício onde se registou e
acompanhou a maioria das crises sísmicas que abalaram esta
terra, durante o século XX, quase que ia sucumbindo ao
terramoto de 1998!
Em boa hora, no entanto, a casa Grimaldi, com o apoio da
Concelho da Horta e do Instituto de Meteorologia recuperaram
o observatório, onde Alberto II do Mónaco, descerrará uma
lápide onde se evoca a “contribuição [do seu trisavô] para o
conhecimento científico do Mar dos Açores”.
Agora, após a recuperação e reabilitação do edifício, será
tempo de pensar na integração funcional deste património
cultural, científico e paisagístico. A musealização do
observatório, conjugada com a acção de uma equipa de
meteorologistas e/ou sismologistas, seria, neste contexto
uma iniciativa fundamental.
Por outro lado, este edifício classificado e recuperado
pontifica uma mancha claramente degradada, implantada no
coração da cidade, e cujo destino não se vislumbra fácil.
Criar um parque, à semelhança do belo Jardin Exotique, que
em socalcos enquadra a zona ribeirinha do Principado do
Mónaco, seria uma ideia complementar. Diz-se que Alberto I
do Mónaco ao conceber o Jardin Exotique, se inspirou em
outros que viu durante as suas viagens aos Açores,
nomeadamente em S. Miguel e na Horta.
Os proveitos de tais iniciativas seriam diversificados e
consideráveis:
- Dignificava-se a memória de Alberto I do Mónaco;
- Promovia-se um centro de monitorização em áreas que para
nós são fundamentais, como a meteorologia e a sismologia;
- Incentivava-se a mobilidade e a fixação de pessoas e a
transferência de tecnologias e de saberes;
- Recuperava-se património cultural e científico;
- Resgatava-se para a cidade uma mancha feia e com
possibilidades de uso muito restritas;
- Nascia um novo espaço verde, imprescindível em cidades
modernas;
- Criava-se oferta científica, cultural e turística sustentada;
- E enfim, promovia-se a qualidade de vida desta cidade.
Se isto acontecesse seria tão bom, não seria? As moças
voltariam felizes a seu cabeço de sempre, o Príncipe seria
mais uma vez lembrado de forma digna, a Horta valorizar-se-
-ia e a Ilha cumpria um destino. O
Em boa hora, no entanto, a casa Grimaldi, com o apoio da Concelho da Horta e do Instituto de Meteorologia recuperaram o observatório, onde Alberto II do Mónaco, descerrará uma lápide onde se evoca a “contribuição [do seu trisavô] para o conhecimento científico do Mar dos Açores”.
Literatura Literatura
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Vinte e Quatro Horas na vida de uma mulher de Stefan Zweig
Catarina Azevedo
Stefan Zweig começou por ser essencialmente
tradutor (com a particularidade de se ter tornado amigo
pessoal de quase todos os autores que traduziu) e biógrafo,
embora também fosse poeta, dramaturgo e romancista. Mas,
se tivéssemos de o definir, era antes do mais um viajante
convicto e um defensor impenitente da liberdade.
Aliás, foi o seu amor pela liberdade e por uma sociedade mais
justa que o fez trocar a Áustria inicialmente por Londres
(onde conheceu aquela que viria a ser a sua mulher) e depois
pelo Brasil e, em última instância, o que o levou ao suicídio
quando, em 1942, se deu conta que as trevas que cobriam a
Europa pareciam capazes de durar para sempre.
A mensagem de adeus que escreveu espelha bem o seu
desalento e é de uma lucidez terrível, “Antes de deixar a vida
pela minha própria vontade e com total lucidez, sinto
necessidade de cumprir um último dever: agradecer ao Brasil,
este país maravilhoso que me permitiu, bem como ao meu
trabalho, um repouso tão amigável e hospitaleiro. De dia para
dia, aprendi a gostar mais dele e em nenhuma outra parte
teria preferido edificar uma nova existência, agora que o
mundo da minha linguagem desapareceu para mim e que a
minha pátria espiritual, a Europa, se destruiu a si própria.
Mas, com mais de sessenta anos, seriam precisas forças
particularmente grandes para recomeçar a vida de fio a
pavio. E as minhas desvaneceram-se em longos anos de
errância. Assim, penso que mais vale pôr fim a tempo, e com
a cabeça erguida, a uma existência onde o trabalho
intelectual foi sempre a alegria mais pura e a liberdade o
bem supremo deste mundo.
Saúdo todos os meus amigos. Que eles ainda possam ver a
aurora depois da longa noite! Eu, eu sou demasiado
impaciente, parto antes deles.”
Se não tivesse partido, três anos depois teria visto o fim do
domínio nazi, mas Sweig era um céptico e, em 1942, muitos
teriam partilhado a certeza de que Hitler não seria vencido.
Dele resta uma obra extraordinariamente rica, com
personagens habituadas pela paixão de que Vinte e Quatro
Horas na Vida de uma Mulher é um excelente exemplo.
Esta novela começa num quadro o mais formal possível, numa
pensão de família da Côte d’Azur, onde tudo parece muito
banal até que um desconhecido leva consigo uma das jovens
esposas que abandona marido e filhos sem hesitação. As
interrogações e os julgamentos morais que esta atitude
levanta vão levar a que o narrador e uma senhora já idosa se
arvorem em defensores da jovem o que levará a confidências
e à partilha de um segredo.
Num monólogo, esta conta como, já viúva, a sua vida foi
mudada por um encontro com um homem, jovem, e como em
vinte e quatro horas as suas convicções, a sua alma e a sua
vida foram destroçadas perante um encontro que nada faria
prever.
Mais do que a paixão entre dois seres, Zweig evoca sobretudo
a paixão do jogo, esse fogo que consome tudo e não deixa
lugar para mais nada, tal como já o tinha feito noutras das
suas obras (em particular, em O Jogador de Xadrez), aliás,
para Zweig, a paixão é quase sempre uma febre que destrói
tudo o que se atravessa no seu caminho e não é de todo um
autor dado a finais felizes.
Por ser uma novela, Vinte e Quatro Horas na Vida de uma
Mulher é uma boa forma de se descobrir este autor prolífico e
que tão bem retratou os meandros do espírito humano. O
Pequenas ilhas a meio canalCatarina Azevedo
Guernesey, uma das ilhas anglo-normandas, um mero
ponto no Canal da Mancha, famosa por ter sido o abrigo do
poeta Vítor Hugo quando se viu exilado, passou quase
despercebida aos olhos de todos.
No entanto, um simples romance, escrito a quatro mãos,
volta a pô-la no mapa e revela o quotidiano da ocupação
alemã durante a Segunda Guerra Mundial. Sem excessos
caricaturais e sem contemplações confronta-nos com
pequenos detalhes: o racionamento, a falta de bens
essenciais, a fome e a sujidade, as denúncias e os silêncios,
as crianças que foi preciso mandar para Inglaterra sem que se
soubesse qual seria o seu destino (os pais “proibidos” de
passar para além das portas da escola para que as despedidas
fossem menos dolorosas), o “inimigo”.
Um caleidoscópio de momentos que constroem a imagem de
uma ilha e dos seus habitantes num dos momentos negros da
sua existência.
Na realidade, o romance não se debruça directamente sobre
os acontecimentos, filtra-os duplamente. Primeiro, através da
distância temporal, ainda que breve, dado que retrata o pós-
-guerra. Depois, pela distância inerente à tipologia escolhida,
o romance epistolar, visto que cada carta exige uma resposta
que condiciona o próprio ritmo da escrita (desabituámo-nos
dos romances epistolares que estiveram tão em voga, talvez
porque nos desabituámos de escrever cartas, mas o género
confere ao romance um certo encanto, como se
mergulhássemos automaticamente num tempo ido).
Pelas cartas de Juliet e dos seus correspondentes descobrimos
os que não regressaram a casa, os que sobreviveram e os que
redescobrem o seu caminho no meio dos escombros, retratos
esboçados ou completos das transformações que a guerra
trouxe a cada um e, no permeio, uma estranha sociedade
literária, criada num momento de urgência para evitar um
confronto com os alemães e que se torna uma porta de
evasão para um quotidiano demasiado frustrante.
As sociedades literárias que fizeram as delícias do século XIX
e do início do século XX aparecem aqui numa outra dimensão,
lugares de esperança e de consolo.
Embora o livro ainda só exista na versão português do Brasil e
com um título que pode parecer desencorajador, A Sociedade
Literária e a Torta de Casca de Batata, Mary Ann Shaffer e
Annie Barrows traçaram um retrato interessante de uma
comunidade isolada e das formas como o espírito humano se
sobrepõe ao sofrimento.O
Umberto Eco dispensa apresentações, autor
consagrado, conhecido sobretudo pelo extraordinário O Nome
da Rosa, professor universitário, exímio orador e ensaísta, é o
protótipo do pensador moderno.
Contudo, a maior parte das pessoas centra-se na sua obra
romanesca, deixando de parte os ensaios, que parecem
demasiado herméticos para o leitor comum. Fazê-lo é
esquecer a veia pedagógica de Eco e a sua vontade de
explicar os bastidores daquilo que observa, seja um livro,
uma música ou simples factos sociais, tal como fez em A Obra
Aberta.
Sobre a Literatura é uma colectânea que se esforça sobretudo
para revelar o que está por detrás de uma obra, os meandros
da construção de autores consagrados, levando-nos a
compreender melhor a intenção por detrás das opções feitas
pelos autores dos clássicos. O
Sobre a literatura
Humberto Eco
Catarina Azevedo
Lembras-te do Pedro, do Chico, do João e das
inseparáveis gémeas, a Teresa e a Luísa? Imagina que desta
vez o Pedro e o Chico vão a passar por uma casa abandonada
quando ouvem um grande reboliço e descobrem um telemóvel
e umas cartas misteriosas. Quem será o Alcateia e quem serão
Almina e Jerónimo? Qual será a sua história e o que se terá
passado no Pulo do Lobo (nunca ouviste falar deste lugar?
Fica no Alentejo e tem este nome porque se diz que para
passar de uma margem para a outra basta um “pulo de lobo”,
desde que não tenhas medo dos vinte metros de altura que o
local tem)? Se queres descobrir o que aconteceu basta leres
Uma aventura no Pulo do Lobo, de Ana Maria Magalhães e
Isabel Alçada, mais uma aventura destes amigos e dos seus
cães.
Uma palavrinha aos pais – Não é preciso apresentar Ana
Maria Magalhães nem Isabel Alçada, os seus livros fizeram
certamente as delícias de grande parte dos pais quando não
havia assim tantos livros que tivessem por pano de fundo
Portugal ou cujos heróis se parecessem com as crianças que
eram. Esta nova aventura não foge à regra. O
Mãe, não tenho nada para lerCatarina Azevedo
Ciência e AmbienteCiencia e Ambiente
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A Reserva Natural do Morro de Castelo Branco Parque Natural do Faial
A Reserva Natural do Morro do Castelo
Branco detém uma área de 15,7 hectares e é constituída por
um domo traquítico (estrutura rochosa resultante da
acumulação de lava traquítica, que, devido à sua elevada
viscosidade, solidifica na parte terminal da conduta antes de
atingir a superfície), unido a terra por uma península, e
arribas com falésias verticais com fendas que formam
pequenas grutas, calhau rolado e blocos rochosos. Este é um
importante local de nidificação de aves marinhas como o
cagarro (Calonectris diomedea), garajau-comum (Sterna
hirundo) e o frulho (Puffinus assimilis baroli). Relativamente
a esta última espécie, existem nos Açores, cerca de 800 a
1500 casais, representando cerca de 21% da população
Europeia.
Este ano procede-se também com o avanço do Plano Regional
de Erradicação e Controlo de Espécies de Flora Invasoras em
Áreas Sensíveis (PRECEFIAS), uma acção do Governo Regional
dos Açores, orientada pela Secretaria Regional do Ambiente e
do Mar, que dará continuidade à recuperação de espécies
endémicas e de Áreas Naturais Protegidas, que, no Faial,
englobam as Áreas de Paisagem Protegida do Monte da Guia,
a Reserva Natural da Caldeira e do Morro de Castelo Branco
e, ainda, as Áreas Protegidas para a Gestão de Habitats ou
Espécies da Ponta do Varadouro e do Vulcão dos Capelinhos.
Na Reserva Natural do Morro de Castelo Branco, na qual se
contou com a colaboração da Junta de Freguesia de Castelo
Branco, foi já efectuado o arranque e corte de cerca de 30
000 m2 de cana (Arundo donax) e algum repovoamento com
faias e pau-branco. Espera-se, assim, reduzir os impactos
negativos da flora exótica sobre este magnífico local para
observação de flora, fauna e geologia únicas. O
Acção de Voluntariado no Monte da Guia Cláudia Ávila Gomes
Está em preparação uma acção de voluntariado
para erradicação de invasoras e plantação de endémicas na
Paisagem Protegida do Monte da Guia, a decorrer no dia 10
de Abril. Esta acção é organizada pelo Governo dos Açores,
através do Parque Natural de Ilha do Faial, e visa estimular a
participação de todas as pessoas a ajudar a cuidar de um
património que é de todos.
A actividade decorrerá no Sábado e o ponto de encontro é à
porta do Centro do Mar (antiga Fábrica da Baleia), às 9h30 e
às 14h30. O objectivo é que cada voluntário proceda à
limpeza de canas (Arundo donax) de uma determinada área,
e em seu lugar plante uma endémica, o pau-branco (Picconia
azorica).
Todo o trabalho será acompanhado por técnicos, que
trabalharão com os Voluntários, e poderão esclarecer
questões relacionadas com a Paisagem Protegida do Monte da
Guia e o seu património natural e cultural. A todos os
voluntários será dado um diploma de participação. Contamos
convosco, a vossa ajuda é muito importante!O
Fazendos fazendos
08
AgendaExposição de Pintura
“A Terra do Mar”
de Fernando Avellar
XF - Bar | Encerra às 2ªas feiras
8 de Abril
Inauguração da Exposição
“Na Máquina do Tempo”
de Gil Teixeira Lopes
Biblioteca Pública | 18h
9 de Abril
Cinema: “Nas Nuvens”
de Jason Reitman
Cine-teatro Faialense | 21h30
10 de Abril
Acção de Voluntariado “Erradicação de Invasoras da
Paisagem Protegida do Monte da Guia”
Ponto de Encontro | Centro do Mar | Fábrica da Baleia
9h30 | 14h30
Reunião do Grupo de Apoio ao Aleitamento Materno
Unidade de Obstetrícia | Hospital da Horta | 15h
Cinema: “Planeta 51”
de Jorge Blanco, Javier Abad e Marcos Martinez
Cine-teatro Faialense | 17h
Gatafunhos Tomás Silva
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Teatro: “História da Gaivota e do
Gato que a Ensinou a Voar”
de Luís Sepúlveda
(seguido de tertúlia)
Companhia Teatro Art’Imagem
Cine-teatro Faialense | 16h | M4
13 de Abril
Cinema: “O Negócio”
de Steven Schachter
Cine-teatro Faialense | 21h30
16 de Abril
Teatro: “Eu vos declaro Marido e Marido”
com Chamarrir
S.F. Faialense | 21h
17 de Abril
Teatro: “À espera de Godot”
de Samuel Becket
Teatro de Giz
Cine-teatro Faialense | 21h30
20 de Abril
Cinema: “Estrela Cintilante”
de Jane Campion
Cine-teatro Faialense | 21h30