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# 78 OUTUBRO ‘12 O BOLETIM DO QUE POR CÁ SE FAZ MENSAL / DISTRIBUIÇÃO GRATUITA David vs. Golias, em sonhos e todos os dias!

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primeira edição do Quinto Fazendo o boletim do que por cá se faz

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Page 1: Fazendo 78

#78 OUTUBRO ‘12 O BOLETIM DO QUE POR CÁ SE FAZMENSAL / DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

David vs. Golias, em sonhos e todos os dias!

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O Quinto Fazendo foi buscar o seu ordinal ao Impé-rio. Depois de uma terminologia tecnológica (versão 4.0) procurou-se outro tipo de utopia. As dúvidas humanas são eternas e a esperança na salvação é das mais queridas formas de as combater. E foi por ela, pela salvação, que já se fez tudo. Mas tudo mesmo, porque por ela, até arrancar olhos vale. Foi pela salvação que a Inquisição e o Nacional Socialis-mo actuaram. É pela salvação que o “Socialismo Real” ainda actua, por exemplo na China. E pela salvação (de quem??) se rebentaram duas bombas atómicas em cidades com pessoas vivas lá dentro.

A salvação, a haver, terá que ser social. Porque a salvação individual, acreditando nas velhinhas Vidas de Santos e nos já não tão novos Livros de Auto-Ajuda, é mais comum. Já aconteceu. Cada uma à sua maneira, mas parece que sim. Para o povo, as gentes, as pessoas, a sociedade, a maralha, é que é mais complicado. Porque essa entidade colectiva não se entende a si própria. E nem morre (há quem seja salvo pela morte). Porque há sempre mais gen-te. E existindo sempre, sempre se interroga, sempre se insatisfaz e mais procura. E espera. Por quem? Ou pelo quê? Que trará a manhã de nevoeiro? E como será que vamos merecer essa salvação? Como é que se consegue ser assim tão feliz como os desenhos das brochuras das Testemunhas de Jeová (mas com roupas mais modernas, de preferência...)?

Não há salvação, dizem muitos. Mas há proble-mas e eles têm que ser resolvidos. Há desigualdades, há abusos ambientais, há crimes, há doenças. Há insustentabilidade. Na impossibilidade de costurar uma nova realidade, que se remendem ao menos os buracos. Embora nunca deixem de existir e hajam

A beleza natural dos Açores faz-nos sonhar. Faz com que tenhamos orgulho de sermos Açorianos e de podermos dizer “somos um dos melhores sítios no mundo para se visitar, e até mesmo morar!”. Faz-nos sonhar, sonhar para que, um dia mais tarde, depois de formados, possamos voltar. Mas quando volta-mos… É David vs. Golias, todos os dias!

O sedentarismo cultural que sobrevoou os Aço-res, do qual tenho mais perceção na ilha do Pico, local de onde sou natural, alojou-se como o nevoeiro de inverno — ora sobe, ora desce, mas nunca desapare-ce — provocando inércia e falta de desenvolvimento sustentável. Torna-se muito complicado desenvol-ver determinados papéis sociais, quando toda a gen-te quer “ter alguma coisa a ganhar” e só participa quando lhe dão algo em troca.

A nível profissional, a fraca capacidade de pensar a médio e longo prazo, e falta de informação que reina junto de empreendedores locais, para não re-ferirmos o problema de falta de qualidade de produ-ção — tudo tem de ser o mais barato e rápido possível

Fazendo Editorial

Editorial

Capa

2.

O Quinto Fazendo

O sonho de regressar e o problema de não conseguir executar

Fazendo - DirecçãoAurora RibeiroTomás Melo

CoordenadoresAlbino Carla Cook Carlos Alberto Machado Fernando Nunes Filipe Porteiro Helena Krug Lídia Silva Pedro Gaspar Pedro Afonso

CapaMauro Santos Pereira

Colaboradores Cristina Lourido Francisco HenriquesLia GoulartLuís HenriquesMarco MirandaOrlanda AndréPaulo Ricardo BicudoRui PrietoRuth BartenschlagerTeresa AlmeidaTerry Costa Victor Rui Dores

Design EditorialMauro Santos Pereirawww.comunicaratitude.pt

Organização EditorialSandra Cristina Sousawww.comunicaratitude.pt

Propriedade Associação Cultural Fazendo

Sede Rua Concelheiro Medeirosnº 19 — 9900 Horta

Periodicidade Mensal

Tiragem 500 exemplares

Impressão Gráfica O Telégrapho

As opiniões expressas nesta edição são dos autores e não necessariamente da direcção do Fazendo

sempre outros novos a surgir. Quanto mais rota está a rede menos buracos tem, também dizem.

Ainda é cedo para o Quinto Império. Talvez seja sempre cedo para Quintos Impérios. Uma concreti-zação utópica tem contornos de paraíso. O paraíso é o “viveram felizes para sempre”. Depois disso a novela acaba. Ou então a saga continua sob a for-ma de Quinto Império 2, que nunca será tão bom como o primeiro. Vamos vivendo, vamos fazendo, enquanto ainda estamos mais ou menos sãos e... salvos. Haja saúde.

Mas o Quinto Império é o do espírito. Santo? Talvez. Mas do espírito, e isso é bom que não fique esquecido.

Aurora Ribeiro

— causa também grandes questões culturais. A falta de brio profissional e pensamentos como “trabalhar para desenrascar” e “ao preço que é está muito bom”, instalam-se e rebentam, literalmente, com qualquer serviço, ideia, estratégia ou, até mesmo, orçamento. Na maioria das ocasiões, a razão pela qual o barato sai caro, não é por ser barato, é por ser mal pensa-do — investe-se tempo, vontade e dinheiro em vão. É um problema de bases. David não comprou um cão, David pensou! Organizou-se e criou uma estratégia…

Se as medidas e atitudes não são pensadas, se não existe uma estratégia, nunca haverá espaço para a cultura e, por sua vez, se a cultura não for pensa-da, nunca será autónoma. Se nunca pensarmos no desenvolvimento sustentável dos Açores, nunca seremos, na realidade, autónomos. É esse o sonho de todos os dias, o sonho de um dia poder pensar, executar e ter “pernas para andar”.

Mauro Santos Pereira

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O Banco dá!.3

No início de 2012, a Empresa Municipal Hortaludus, em conjunto com a Câmara Municipal da Horta, lan-çou um desafio às várias Associações culturais da ilha: elaborar uma proposta para dinamizar o Banco de Portugal, espaço de excelência da cidade, que sob a alçada do munícipio se encontrava sem fun-ção própria, desocupado e desprovido da vida e do papel social que um espaço daquela natureza pode e deve abraçar. Depois de reunidas as necessárias forças sinergéticas, 3 Associações (FAZENDO, Tea-tro de Giz e Música Vadia) apresentaram um pla-no concreto que assentava em duas vertentes: 1) a da apresentação de produções (próprias ou não) e iniciativas ligadas às artes e 2) a da formação em linguagens artísticas diversas. Paralelamente, em conjunto com as entidades já referidas, fizeram um levantamento da planta do local e definiram as in-tervenções físicas que o espaço deveria sofrer de forma a que, com um custo mínimo, se pudessem ter as condições necessárias para desenvolver os tra-balhos. A proposta foi aceite e o Banco passou a ter novo apelido – BANCO de ARTISTAS.

A primeira amostra do “edifício” que se procurou (e se procura agora todos os dias) recriar e recons-truir aconteceu poucos meses depois, em plena Semana do Mar, que no mês de Agosto incita as pessoas a sair de casa e a estarem disponíveis para o que der e vier. No espaço exterior do Banco, no lado da Avenida marginal, as Associações compu-seram um espaço e um plano de actividades diário que integrava um período infantil (das 18:00 às 21:00) e um período para todas as idades (das 21:00 à 1:00). Quer isto dizer que, durante a tarde, várias crianças (passaram por lá 95!) se encontraram com avós que contavam histórias, formadores que os levaram para o mundo dos jogos tradicionais, ar-tes plásticas, pintura, ciência, teatro, dança, yoga

É verdade.O Banco de Portugal na Horta deixou definitivamente de garantir poupanças, atribuir empréstimos, cobrar juros e saldar créditos mal parados. Depois de um período de hibernação indefinida, despertou, mudou de nome e vai começar a dar. Dar tudo para que a cidade e a ilha continuem a crescer culturalmente num ambiente de partilha. Mas começemos pelo princípio...

e outras crianças com quem brincar e sonhar. À noite, houve projecções de filmes, concertos, oficinas de teatro e houve conversa e convívio espraiados no

“Bar dos Artistas” e nas mesas, cadeiras e adereços do Teatro de Giz que se espalharam por ali. Foi um sucesso e um conforto a existência deste pequeno mundo alternativo durante as festividades. Mais, autofinanciou-se, sendo que as receitas das entra-das (foram cobrados 5€ por dia por criança) e do Bar, foram suficientes para pagar as despesas materiais para formação, auxiliares de educação, animadoras culturais, etc). Para este desfecho, também contri-buíram algumas empresas locais que se sentiram estimuladas pelo processo e que acabaram por for-necer alguns produtos para serem utilizados nas oficinas de formação para as crianças.

Com o exemplo, retemperaram-se as forças e as vontades.

Agora, as Associações concentram-se no pró-ximo passo: inaugurar o espaço interior do Banco e iniciar as actividades que se querem regulares e para todos. A saber – no início de Novembro, abrem-

-se as portas pela primeira vez com uma tarde e noi-te rechedas de exposições, teatro, música e festa. A partir daí surge uma agenda que inclui módulos

de formação em pintura/artes plásticas, dança con-temporânea, instrumentos tradicionais e clássicos, canto e oficinas de carácter temporário (espera-se ter uma oficina em construção de cordofones tra-dicionais, por exemplo). As Associações residentes mostrarão também ao público as suas mais recen-tes produções e outras serão levadas até lá, porque a troca de experiências e conhecimentos se quer viva e pulsante.

Até lá, ainda há paredes por pintar, insonoriza-ção de espaços, arrumação de materiais e espólios, montagens e desmontagens e mais ideias que se querem transformadas em acções para com pouco fazer o necessário. Precisam-se de mãos e cabeças e afirma-se já que todo aquele que sentir a necessi-dade de concretizar e o prazer de criar em conjunto deve juntar-se ao colectivo.

Mas para acabar e e em resumo - procurar-se--à criar um espaço aconchegante mas espevitado,

chamativo e peculiar, onde a população do Faial possa ter acesso à cultura e ao que cá e lá se vai fa-zendo. Sem contenções, imposições nem pactos papões!

Fazendo Actualidade

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Page 4: Fazendo 78

Fazendo História

Entrevistando a BaleaçãoA caça à baleia nos Açores terminou em 1987 e já teve o seu luto, mas as memórias individuais sobre-vivem, difusas, subjectivas e sempre insubstituíveis. Na senda de trabalhos feitos há demasiados anos por Dias de Melo, Gemina Garland-Lewis calcorreou as aldeias e vilas do Triângulo, subiu aos montes das vigias e pediu para entrar nas casas dos baleeiros e escutar as suas histórias.

Há 4 anos, vieste aos Açores e entrevistaste al-guns antigos baleeiros. Este Verão, não pudes-te reencontrar alguns porque já tinham faleci-do ou estão muito doentes. Sentiste que o teu trabalho é urgente?Sem dúvida. O meu trabalho há quatro anos teve um foco mais abrangente sobre as relações açorianas com as baleias e não se limitou à baleação, razão pela qual na altura só entrevistei quatro baleeiros. Desses quatro, um já tinha falecido quando regres-sei e outro faleceu duas semanas depois de eu ter chegado. Pareceu-me claro que este trabalho tinha que ser feito o mais rápido possível e tentei fazer o máximo de entrevistas possível. As histórias des-tes homens estão a desaparecer à frente dos nossos olhos e quanto mais tempo se esperar para as reco-lher, menos existirão para contar.

Hoje em dia a baleação é malvista em muitas culturas e os baleeiros são vistos como vilões; o teu trabalho pode ajudar a humanizar a balea-ção e os baleeiros?Acho que o meu trabalho é uma forma eficiente para as pessoas humanizarem os baleeiros, embora não acredite que todos queiram ver nesta perspectiva. Algumas pessoas opõem-se tanto à baleação que nada que se possa dizer as fará mudar de ideias, principalmente a partir de um meio jornalístico. Apercebi-me disto quando recebi vários comentá-rios negativos dos leitores, sobre o meu trabalho e sobre os baleeiros que tinha entrevistado. Mas também recebi várias reacções positivas. Indepen-dentemente de concordar ou não com a baleação, o meu objectivo é mostrar como estes homens são apenas humanos, conduzidos por circunstâncias que afectam a todos.

Depois de teres falado com os baleeiros, acredi-tas que sentem falta dos dias da baleação?Sim, de uma maneira geral. Realizei 30 entrevistas no Faial, Pico e São Jorge e embora a maioria sinta falta dos tempos da baleação, a intensidade do que sentem e aquilo de que sentem falta varia. Alguns disseram-me prontamente que não tinham sauda-des nenhumas, mas de uma forma geral isso aconte-cia em resultado de uma experiência negativa com a gestão da baleação. Por outro lado, outros disse-ram-me que embarcariam num bote baleeiro sem pestanejar, mesmo com as pernas a fraquejar com a idade, e arpoariam uma baleia se tivessem oportuni-dade. Na Fábrica de São Roque do Pico, um baleeiro subiu ao bote em exibição para me mostrar como se procedia a bordo, dizendo “fica-se mais fraco mas não se esquece”. Normalmente, estes homens recordar-se-iam do dinheiro que lhes trazia, da caça, de estar no mar com a família, ou do estilo de vida e daquilo que traziam para as suas povoações.

4.

E as mulheres dos baleeiros, o que sabemos so-bre as suas vidas?Acho que se poderia fazer um projecto totalmente independente com a perspectiva feminina sobre a baleação. Só consegui falar com duas senhoras, mulheres de baleeiros, sobre como era a vida em terra quando os homens estavam no mar. A maioria das histórias que conhecemos sobre a baleação são contadas pelos homens, mas existem histórias igual-mente interessantes daquelas que ficaram na reta-guarda e viram os homens da sua família irem para o mar, sem nunca saber se voltariam em segurança. Ouvir apenas as histórias daqueles que estiveram no mar significa perder metade do panorama.

Na tua opinião, porque é que a cultura baleeira está tão viva nos Açores?Julgo que em parte se deve ao facto da baleação ter terminado muito recentemente nos Açores – não é preciso ser muito velho para recordar aspectos da baleação e a sua envolvência. O contacto desta cultura baleeira com as festas religiosas é também um factor assinalável nos Açores. Será interessante ver como sobrevive esta cultura depois dos últimos baleeiros desaparecerem. Também registei algumas opiniões discordantes sobre a definição de cultura baleeira, já que muitos vêem a renovada utilização dos botes baleeiros em regatas e festividades como a continuação da tradição, enquanto muitos ba-leeiros consideram isto completamente separado daquilo que eles fizeram. Caçar uma baleia é dife-rente de ganhar uma regata, e as práticas e cultura associada aos botes baleeiros está a ser modificada, pouco a pouco. Penso, no entanto, que existe uma grande esperança na preservação das histórias dos baleeiros e da sua cultura, tendo em conta que vá-rias das pessoas que colaboraram comigo perten-cem às gerações mais novas.

Entrevista e tradução por:

Francisco Henriques e Rui Prieto

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Fazendo Arte

M, ou A busca de sentido

O colectivo teatral As Descalças, sediado em Ponta Delgada, editou em 2011 o texto teatral M. A sede dos outros, de Judite Canha Fernandes. O teatro também se faz no papel, a par das “tábuas do pal-co”, com autonomia ou sem ela. O importante é que o teatro também assim viva e assim possa estimu-lar o surgimento de mais edições e de mais espec-táculos.

O texto de Judite Fernandes é uma matéria que claramente respira teatro. O que lhe falta aqui e ali, nada muito importante, de “literatura”, sobra-

-lhe em teatro. Uma análise aprofundada permitiria perceber isso: na sua materialidade, na forma como organiza e agencia os elementos da cena, na sua

“respiração”, M. A sede dos outros é um texto teatral, diferente de uma “peça” teatral, se aceitarmos que esta antecede a cena, e o primeiro nasce com ela, cresce com e para ela. Mas não termina nela, pois creio que um texto assim criado é um desmultiplica-dor performativo.

O texto que lemos pode ser considerado um monólogo, um monólogo especial. “M.” (enfermeira especialista em reabilitação) dialoga, desdobra-se em várias outras figuras femininas: “Yara”, a índia brasileira que sofre com o quase desaparecimento do seu povo. “Elisabeth”, a açoramericana, cliente

assídua da psiquiatria do Memorial de S. Francisco, que “vai ser alguém!”, no seu desabamento huma-no. “Miriam”, a velha puta holandesa, artrite reuma-tóide, que foi aquilo que pôde ser mas se lhe fosse dada mais uma vida para viver seria “outra pessoa”.

“Kitty”, figura como que surgida de uma Manga japo-nesa, jovem anoréxica que descobre que tem SIDA.

“Faíza”, a jovem missionária moçambicana que per-deu o filho pequeno num atropelamento rodoviário e que aceita o condutor como esposo. E ainda a ou-tra metade de “M.”

Na sua busca de “seres incompletos – que todos, afinal, somos – “M.” “recolecta” todas estas mulheres que têm o sofrimento como denominador comum. O contacto de “M.” com cada uma destas vidas é um processo de procura de sentido, para a vida passada e presente de cada uma, mas também de completa-mento: “Mabaça”, o “apelido” de “M.”, significa, embo-ra algo imprecisamente, gémeo, e o gémeo é por de-finição um ser incompleto, em busca da sua metade verdadeira.

“M. Mabaça” deambulou por mais de 40 países. Após a ausência de 33 anos, voltou à sua terra na-tal, os Açores. Apresentou-se aos outros, descalça, agradecida por a “recolectarem”. E nós com ela.

Carlos Alberto Machado

Myosotis Azorica

Se o sangue correr e subir ao cimo do verde da montanhaagarra a única certeza reconhece pétala a pétala provavelmente assim provarása sua existência é fruto de uma inglória narrativa pois à noite já não aguardamos o amanhã de te avistar

Fajã Grande, verão de 2012

Fernando Nunes

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Fazendo Arte

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Fazendo Arte

Canhões de Paz

Brutatormenta

Porque não lançar sementes aladas?Nas asas de mil mãos humanas semeadasEm vôos intermináveisEspalhadas.

Como que para sempre libertadas.O Esperado, amor - as suas fontesInfindáveis.

(No redondo azul)De canhões sonantes,Músicai sem fim,No Roteiro de paz,Energia, triunfante.

Sentida.

.

Coração verde Lusitano

Olho teus filhos ao longe,Desamparados...

Mas que prado quereis maisQue aquele que nunca jaz?Ao redor da Alva pomba douradaque se ergue de seu coração,Emplumada.

A partilha que teu povo é capaz,Tão a mais!..Alcança tempoTão eterno... Paz...

Como canhões de flores e músicaEm minha alma, rimbombarás.

Oh mas que chuva de flechas quereis ter pelo arA da gentil senhora da iluminação?Um facho de luz em cada braço, traçado,O renascer da canção?Marítima...

Como canhões de flores e músicaEm minha alma, rimbombarás.

A tua volta, ao mundo retornaEm apertos de mão retribuída.Lágrimas nos olhos dos que vão,Abraços que ficam,Para sempreno coração.

Paulo Ricardo Bicudo

“Nadine” forma-se à velocidade de uma prova olímpica de 100m crawl.

São 19 horas. A chuva varre numa grande corti-

na cinzenta em forma de ilha que se dirige a nós sem hesitar. Estacamos, de coração a bater descompassado. O vento desabafa nas fajãs semelhan-do uma manada a correr matos fora, acocoramo-nos para não voar.

Perto, uma enorme araucária can-sada de resistir faz o pino, desnudan-do as raízes despenteadas. Surgem rios como se nascentes jorrassem do solo. Já não há céu nem terra, apenas essa mancha coalhada de lama e ven-to e árvores voadoras.

De tanto derrocar a montanha per-de volume, casas desbotadas derre-tem-se e diluem-se na paisagem. Não houve tempo de acautelar hortas nem galinhas. O céu parece um papagaio de papel demasiado veloz. Os caminhos estragados de silêncio e casas.

Sim, as ladeiras começaram a chorar as casas. O que estava a acontecer só podia ser um absurdo, as casas e as ár-vores a saírem do sítio, como em pas-seio mas desencontradas e logo numa ilha tão florida em pleno mar.

Relembro os homens velhos jo-gando dominó em frente à “casa dos botes”. O olhar dos baleeiros era mais profundo e mais vasto, à luz difusa e cintilante do Oceano Atlântico. O charme dos rostos curtidos pelo tem-po fascina neste ambiente vulcânico, escarpado e agressivo.

Cresci a ver as casas semeadas pelas ruas, pelas encostas, iguais a pedras grandes, inteligentes, todas senhoras dos seus narizes. Era uma ideia muito peregrina, a de pensar que as casas eram para sempre, infinitas, erguidas à noite e ao frio sem medo.

No dia em que as ladeiras choraram as casas e as árvores e as pessoas, mesmo as que estavam longe, sabiam que a terra nem sempre tem tempo de beber toda a água dos céus.

Cresci a esperar que as casas cons-truíssem o mar como os búzios e brin-cassem com as árvores, esses seres tão grandes e maravilhosos, como se fossem gente comprida a enfeitar o mundo.

Gostava de ter um martelo e pre-gos mágicos que ajoujassem as casas ao centro do chão, para garantir que nenhuma outra casa ou árvore ou vaca se poria a passear. E assim cuidar, acarinhar e vigiar, como quem se põe à espreita a meter juízo na mãe-natu-reza, que ela às vezes também dispa-rata sem pensar.

Cristina Lourido

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Fazendo Arte

Fazendo Arte

Mantém-se nos Açores uma tradição bem portugue-sa que consiste em cantar e bailar nas grandes ro-marias. Refiro-me a um tempo em que o povo bailava, no arraial ou no terreiro, as folgas ou os chamados bailes de roda; por sua vez, as pessoas pertencentes às classes mais privilegiadas dançavam, nos salões, o minueto, a gavota e, já no século XIX, a quadrilha, a polca ou a valsa.

Cada um, à sua maneira, exprimia e exteriorizava a sua alegria. É o caso da canção “Bela Aurora”:

A Bela Aurora no mato Decerto que não tem medo Faz a cama, dorme só Debaixo do arvoredo.

Datam do século XVIII as primeiras informações so-bre esta cantiga que, segundo alguns estudiosos, começou por ter algumas afinidades marroquinas, mas que ao longo do tempo foi perdendo esse cará-ter e hoje, pela índole musical em que se enquadra, poderemos considerar uma canção dos Açores. Aliás, o insuspeito César das Neves, no seu Cancioneiro de Músicas Populares (Porto, 1893-1899), considera-a precisamente de criação açoriana.

A “Bela Aurora” é cantada em todas as ilhas dos Açores, com variantes poéticas e musicais.

Victor Rui Dores

Uma Nota Biográfica

Manuel de Tavares

Manuel de Tavares terá nascido em Portalegre por volta de 1585 e morreu em Cuenca (Espanha), a 14 de Outubro de 1638. Terá estudado em Portalegre com António Ferro, mestre de capela da Catedral. Por volta de 1611 Tavares aparece como mestre de capela da Catedral de Baeza (Andaluzia) e, em 1612, torna-se mestre de capela na Catedral de Murcia. Em 1629 concorre pela segunda vez, vinte anos após o primeiro concurso, ao posto de mestre de capela na Catedral de Las Palmas (Gran Canária) obtendo o posto em 1631. Em 1638 muda-se novamente para a Península, mais concretamente para Cuenca, a fim de ocupar o cargo de mestre de capela na Catedral. À chegada a esta cidade, em Setembro, adoeceu gra- vemente vindo a morrer um mês depois.

A obra musical de Manuel de Tavares que sobreviveu até à actualidade encontra-se distribuída pelos ar-quivos das catedrais de Baeza, Las Palmas, Valência, Saragoça, Salamanca e Puebla (México). Conta vinte e oito obras para um ou mais coros, compreendendo missas, motetes, e vilancicos.

Luís Henriques

www.luiscfhenriques.com

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A Bela Aurora

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Fazendo Arte

Fazendo ArteMiratecaArts

Uma questão de forma (A matter of form)Exposição de esculturas, desenhos e projectos na Sala de Exposições da Biblioteca da Horta

From the desk of

Agnes Juten

Estou numa sala cheia de crianças de 4 a 6 anos de idade. Não interessa o tópico, cenário ou a sugestão mais surrealista que tentamos encenar, existe sempre participação total. To-das estas crianças são os melhores pilotos ou arqueólogos, piratas ou extraterrestres do mundo. A criati-vidade desde o mais simples ao mais abstracto está viva e com abundân-cia. Ao ver algo concretizar-se dá es-perança não só aos colegas da aula mas também ao professor, esperança que um dia esta criatividade se ma-terialize transformando um mundo de política e pessimismo num mundo mais criativo e optimista. Mas não leva muito mais tempo e já antes dos 10 anos de idade a turma tem uma visão completamente diferente. A televisão

e internet ocupam a maior parte do seu dia-a-dia e não necessariamente os programas educativos que podem dar lugar ao novo professor. A edu-cação de escravatura para com ideo-logias de globalização começa a ter forma e a criar muros mentais que im-pedem o progresso total do ser huma-no. Mas mesmo assim, ainda se conse-gue concretizar algum surrealismo de beleza. Talvez seja mesmo a partir dos 12, 13 anos de idade que já fica muito mais difícil, pois é aqui que imagens de violência e o que há de errado no nosso mundo ocupam muito espaço na men-te destes futuros líderes da socieda-de. Os tais pilotos criativos já praticam a religião do “não posso”, “não con-sigo”, ”não é para mim”, assim desfo-cando a mentalidade de todas as pos-

sibilidades que podemos desfrutar das oportunidades lançadas na nossa frente. Chegando à idade adulta, os artistas de crianças por vezes não co-nhecem o museu, o teatro, a escola de artes ou mesmo o palheiro do vizinho. Começamos a viver num mundo vir-tual em que os nossos pensamentos são apenas a matéria que visionámos naquela manhã num site na Internet. Temos que começar a aprender nova-mente o que é ser único, ter as nossas opiniões mesmo que às vezes sejam contra o estabelecido pelos nossos patrões ou país, lutar por aquilo que acreditamos mesmo…

A educação artística e criativa está a ficar cada vez mais importante não só para as nossas crianças mas tam-bém na fase adulta. Abrir a mente,

derrubar muros psicológicos, voltar a ser herói no nosso dia-a-dia é neces-sário para que o progresso exista na nossa realidade como uma verdade. Desafio todos vós que lêm estas pa-lavras para se inscreverem numa aula artística. Se já o fazem, então procu-rem uma área diferente, algo que ain-da ontem pensavam “não é para mim”. Só assim é que nos vamos compreen-der uns aos outros…

Terry Costa

www.mirateca.com

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8.

Agnes Juten (Free Academy of Art - The Hague / Holanda 1986-72) iniciou a sua carreira trabalhando sobretudo em cerâmica. Em 1972/73 foi convida-da pela prestigiada “European Ceramic Work Centre” como artista residente, o que se repetiu em 1980 e 1990.

Foi no “Work Centre” que em 1980, criou a sua primeira obra monumental

“Eleven Columns” e em 1990 a escul-tura em nove partes “After Image”, da qual um dos elementos está patente nesta exposição.

A partir de 1990 mudou a sua for-ma de trabalhar, optando por uma maior variedade de materiais. Actual-mente é raro trabalhar em argila.

Agnes já fez várias exposições a solo e participou em muitas colectivas. O seu trabalho encontra-se na Dutch Na-tional Collection, em alguns museus e em colecções privadas. Foi membro da Dutch Society of Sculptors, como curadora convidada, organizando di-versas exposições.

Três esculturas de aço da sua auto-ria estão colocadas em espaço público numa cidade no norte da Holanda.

Na exposição estarão algumas obras mais antigas da colecção da ar-tista bem como trabalhos novos feitos desde 2010 no seu atelier da Horta.

Dieter Ludwig

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Fazendo Arte

Fazendo ArteCidade da Horta - 1852 versus 2011

Há pessoas “singulares” e pessoas “plurais”

Duplas

Singular / Plural .9

O Singular é talhado para um caminho, um objectivo, um destino. O Plural não se revê em nada em concreto mas tudo o atrai. O Singular não toma ata-lhos. O Plural não conhece estradas. O Singular planeia a viagem, previne-

-se da eventualidade. O plural espera pelo inesperado para que a viagem aconteça. O Singular conhece um, ama um, casa um. O plural ama vários ou não ama nenhum. O Singular tem raí-zes. O Plural tem asas (mas nem sabe as sabe usar). O Singular não percebe a constante instabilidade e insegurança da vida de um Plural. O Plural não per-cebe que a vida possa ser formatada e balizada como a vida de um Singular.

Singular é a unidade. O plural é a multiplicação.

Lia Goulart

Tomás Melo

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10.

(des)Fazendo

O dever cumprido e ... a Kima Maracujá !!!Pierluigi Bragaglia é italiano e chegou há vinte e seis anos à Ilha das Flores. Fundaria entretanto a casa de hóspedes “Argonauta” e por ali ficou, na Fajã Gran-de, actual capital da balneação do grupo ocidental. Amante de pergil e Kima Maracujá, foi através dos li-vros que ele publica regularmente sobre a belíssima ilha das Flores que quisemos saber mais um pouco sobre este “neo-açoriano” que, para lá de todo o en-cantamento florentino, também já se desiludiu.

Como é que foi a tua chegada à Ilha das Flores? Recordas-te do primeiro dia que chegaste à Ilha?A memória do primeiro dia em que cheguei às Flores como backpacker, em Agosto de 1986, é de um for-tíssimo vendaval de chuva e vento que impediu de acampar na Fajã Grande. Completamente encharca-do, tive que aceitar boleia de um táxi com passagei-ro italiano (!) que me levou até às Lajes, onde conse-gui acampar por 3 dias antes de voltar – dessa vez com sucesso – à Fajã Grande… Qual foi a reação da população à tua chegada/presença na Ilha?A reação da população foi sempre uma mistura de desconfiança (de uns) e grande amizade (de outros), mas sempre num contexto geral de grande hospita-lidade. Porque decidiste permanecer?A decisão de permanecer foi um processo que ama-dureceu no espaço de vários anos, com muitas eta-pas importantes, como separar-me da namorada italiana, aprender Português em Lisboa, conduzir os meus estudos para áreas açorianas, conseguir com-prar a casa que agora é o “Argonauta” com dois ami-gos e, finalmente, instalar-me na Fajã Grande com uma bolsa do atual Instituto Camões de Lisboa, para a redação da minha tese de licenciatura em Bolonha. O mar, a pesca e o mergulho, o campo com suas la-goas, ribeiras e cascatas, a qualidade do ambiente e de vida, a baixa densidade populacional e de trânsi-to automóvel são geralmente os atrativos principais de quem decide ficar-se pelos Açores, como foram para mim. Tens um trabalho imenso à volta dos trilhos e roteiros pedestres. Quando é que iniciaste este trabalho?Por volta de 1995 apresentei à Câmara das Lajes uma proposta para a realização de um roteiro pe-destre, depois de andar fascinado pelos trilhos há

cerca de uma década. Com o apoio iluminado do então Presidente da autarquia Cristiano Gomes, edi-támos nas Lajes das Flores o 1º roteiro pedestre (e histórico) do Arquipélago dos Açores, sobre os an-tigos caminhos do concelho das Lajes. Esse roteiro foi publicado em 4 línguas: Inglesa, Francesa e Ale-mã para além da Portuguesa. Só com o novo roteiro histórico-pedestre sobre o concelho de Santa Cruz das Flores, em 1999, e graças ao excelente apoio do então Presidente Vasco Avelar, concebi a sinaliza-ção dos caminhos, tendo sido instaladas uma série de placas de madeira ao longo de todo o concelho, com vários anos de avanço sobre as sinalizações go-vernativas oficiais.

Como é que te sentes na “capital da balneação” da Ilha das Flores tantos anos depois?Actualmente, na “capital da baleação e pôr-do-sol etc.” da ilha sinto-me bem, livre de qualquer preo-cupação sobre o futuro da ilha das Flores com o sentimento de “dever cumprido”( e comprido...) em relação à defesa do ambiente e das característi-cas únicas desta ilha. Escrevi e disse publicamente o que penso, nestes mais de vinte anos de residên-cia no arquipélago, sobre os modelos de gestão que se deveriam aplicar ao turismo nas ilhas, e mais não posso fazer. Deixo agora às atuais e às vindouras ge-rações de florentinos, de nascimento ou adotados, as decisões sobre os trilhos a percorrer… Quando foi a última vez que te desiludiste?A última vez que me desiludi foi em 2012, quando vi a construção da horrível e completamente inútil nova estrada costeira, aqui na Fajã Grande…

Para além da Kima maracujá, o que continuas a recomendar aos visitantes que aqui chegam pela primeira vez?Para além da Kima, continuo a recomendar os pas-téis de algas e o pergil (pickles de crithmum mari-timum), especialidades hoje em dia quase exclusi-vamente da ilha das Flores, o araçá, fruto tropical desconhecido na Europa, o ananás, o vinho do Pico, o café de S. Jorge, o peixe e a carne, mas sobretudo, o mar, as paisagens e o silêncio…

Entrevista realizada por:

Fernando Nunes

#78 OUTUBRO ‘12

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(des)Fazendo

Todas as cidades têm uma identidade, algo que as distingue de todas as outras cidades do mundo. Ao vermos uma fotografia de uma rua perdida em Paris sabemos logo que é Paris. O mesmo acontece com Londres ou Nova Iorque, Lisboa ou Porto. Elementos que criam saudades, que tornam cada recanto da cidade singular. São estes elementos que dão um carácter especial aos lugares. São o típico. Quem os vê todos os dias quer continuar. Quem nunca os viu quer vir ser turista, fotografar, conhecer, visitar.

Os elementos típicos podem ter muitos anos como as arcadas da cidade de Évora, podem ser mui-to recentes como as placas das ruas de Nova Iorque, podem ser muito difíceis de conceber como as entra-das de metro de Paris ou muito fáceis de conseguir como as cores das casas em Siena.

E na Horta? E no Pico? O que temos de especial? O que temos de típico? O que é que podemos e deve-mos preservar e multiplicar? O que é que podemos construir ou repensar para se tornar típico?

Tomás Melo

What makes Açores look like Açores?

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Dobra o teu destino aguarda em comoção à partida um fio de linhono gorro a tradiçãoamplexo ao tempo presenteroda antiga de ternuraé ainda longíquo o sonhodesfaz-se briosa na despedida pequena rocha de aventura...

Corvo, verão de 2012

Fernando Nunes

Corvo

(des)Fazendo

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Page 12: Fazendo 78

O que a terra nos oferece

Muito se tem escrito sobre alimenta-ção saudável e, na verdade, no íntimo de cada um todos nós sabemos o que é, porém, muitas vezes resistimos à mudança ou tentamos, durante al-gum tempo fazê-la mas acabamos por voltar à alimentação tradicional. Justificamos esta resistência, ou pou-ca persistência, com a falta de tempo, desconhecimento de receitas gosto-sas, ingredientes caros ou até mesmo pouca variedade de sabores. E, assim, continuamos de costas voltadas à ali-mentação saudável.

Depois surgem os resultados das primeiras análises: triglicéridos altos, colesterol elevado… e os médicos falam-nos de dietas e restrições ali-mentares.

Porque não começámos mais cedo? É a questão que surge de ime-diato nas nossas mentes.

É de facto importante começar mais cedo. Deste modo, não só pre-paramos as papilas gustativas das nossas crianças com novos sabores e texturas como também nos prote-gemos da doença.

É neste sentido que aqui deixa-mos algumas receitas saudáveis, para que experimentem um pouco do que se pode fazer pela nossa saúde, de forma rápida, apetitosa, recorrendo a ingredientes comuns e a baixo custo. Deliciem-se!

Teresa Almeida e J.A.

Faz do teu alimento o teu medicamento Hipócrates

Menu 1Legumes no forno

- 3 cebolas médias- 3 batatas doces- 200 gramas de abóbora- 1 fio de azeite- Um pouco de água- Sal q.b.

Descasque as cebolas e corte-as em meias luas.

Descasque as batatas e corte-as às rodelas.

Lave a abóbora e corte-a, com a casca, em fatias finas.

Misture tudo num tabuleiro, tempere com sal, azeite, acrescente um pouco de água e leve ao forno cerca de 30 minutos.

Sirva com uma fatia de tofu grelhada, temperada com limão e ervas aromáticas e acompanhe com uma salada de beldroegas, rabanetes e maçã temperada com azeite e limão.

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Desbravando terreno lançamos a semente: o que é isso da saúde?Tem saúde? Tem a certeza que é saudável?!E se fracturar um dedo?E se vomitar a noite inteira, continua com saúde?E quem tem uma doença incurável está irremediavelmente condenado a ser um doente?E se quiser tornar-se doente mental? É fácil! O psiquiatra José Luis Pio Abreu explica no seu livro: “Como tornar-se doente mental”. Mesmo que não queira tornar-se doente mental, leia o livro.

Orlanda André

Fazendo Saúde

#78 OUTUBRO ‘12

Fazendo Saúde

Fazendo Saúde

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Cartas do Exílio IV

A(s) ilha(s) que vamos deixando de ser

Fazendo Viagens

Algumas horas antes de já falar fluen-temente em russo chega o momento de montar num comboio novamen-te: o transiberiano que, no meu caso, é um comboio chinês com condutores chineses e tudo escrito em chinês!

Apesar de ser uma estação gigan-tesca (uma das várias em Moscovo) é muito fácil encontrar o meu cami-nho – simplesmente seguindo a mul-tidão que tem o maior número de ba-gagens. Caixas, malas, sacos, móveis embrulhados, barris e mais caixas, aproximadamente 8 peças por pas-sageiro; um grande movimento de carga começa a mexer-se no momen-to em que o número da plataforma é anunciado.

Há 3 tipos de transiberianos, o mais tradicional vai para Vladivostok (mas quem é que quer estar em Vla-divostok???), os outros dois terminam, depois de quase 8000 km, em Pequim, um via Manchúria, outro via Mongólia.

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Leva mais de uma hora para sair dos subúrbios de Moscovo até as bétulas começarem a ladear os carris. Às 2 da manhã ainda há bétulas, agora tapa-das com neve. Às 6 da manhã: bétulas com neve. Meio dia: neve com bétulas. Às 5 da tarde: uma casa interrompe o cenário das bétulas com neve. No dia seguinte... mais bétulas e menos neve, agora de vez em quando apa-rece uma fábrica abandonada dentro das bétulas.

Há 3 classes diferentes nas car-ruagens: a 1ª tem cabines de 2 camas, uma em cima da outra, uma mesa e um sofá cadeira – a 2ª classe tem 4 camas e nenhum espaço a mais do que o necessário para 4 camas e a 3ª, chamada Platzkart tem lugar para 54 passageiros que dormem, comem, ressonam, peidam,... todos juntos. Para manter alguma sanidade mental nisto, toda a gente bebe vodka duran-te todo o dia e durante toda a noite.

A melhor coisa no comboio é o Sa-movar ao fundo de cada carruagem. Uma máquina, provavelmente do séc. XIX, com dezenas de válvulas e tubos propulsionada a carvão, que dá água quente 24 horas por dia, o que é per-feito para chá, café ou sopas.

Evidentemente há também um restaurante, que é de uma empresa privada, só os empregados é que ain-da não sabem disso – o seu serviço é de há 30 anos atrás, comunismo no seu pico; nem um sorriso nas ca-ras chateadas à entrada, a ementa é atirada (deitada com força) à tua frente e mais de ¾ do que está ilus-trado (sempre com informação sobre o peso em gramas e do preço), eles não têm.

Dia 3: Houve alguma vez vida fora do comboio? Uma certa rotina come-ça a dominar os dias; refeições, jogos de cartas, fumar ao fundo do corredor, ler... mas a maior parte do dia é passa-

do a olhar para as janelas, as bétulas finalmente foram substituídas pelos pinheiros e de vez em quando cruza-mos um rio.

Dia 4: Passámos o poste do quiló-metro 3932. A cada 10 km há um poste ao lado dos ferros a indicar a distância de/até Moscovo, 3932 é metade, ago-ra estamos mais perto de Pequim do que de Moscovo, agora o outro ocea-no aproxima-se a cada dia.

Ruth Bartenschlager

O núcleo histórico de Estrasburgo, dominado pela sua catedral – outro-ra o edifício mais alto da Cristanda-de – encontra-se numa quase-ilha (“presqu’île”), numa espécie de pe-nínsula, diríamos nós, que apresenta vários istmos – como se querem as

“(paene) insulae” modernas. Há canais e barcas por todos os lados mas, mesmo assim, não parece es-tarmos numa quase-ilha, isto é, numa península. Há quase ilhas que não se sentem ilhas e há pedaços continen-

tais que são mais insulares do que ilhas de verdade.Nas penínsulas que somos e que nos vamos tornando cabem ilhas de amar-gura, de bondade, de abraços, de afei-ção, de coragem, de desespero, de bo-nomia, em suma, de humanidade.As nossas penínsulas vão-se deli-neando e ocupando continentes de beleza que trazemos por dentro. Uma das coisas mais importantes nas pe-nínsulas que somos são os istmos, o cesto da gávea da nossa actividade

pontifícia em direcção ao outro pois apenas neste ir-e-vir entre a penínsu-la que somos e a península que vamos sendo, i.e. o outro, vamos descons-truindo a ilha que queremos deixar de ser (e que, na realidade, nunca fomos).Nem o governo poder ser uma ilha pois pode tornar-se uma metáfora de si mesmo. Contudo, a pior ilha será, certamente, a da indiferença como aquela em que foram evacuados os representantes do Movimento dos In-dignados, em Hong Kong – uma (pen)

insula chinesa – que acampavam des-de há 11 meses diante do banco HSBC, esse sim, uma verdadeira ilha. Muitas (pen)insulas a todos!

MARco Miranda

[email protected]

www.homem-em-pe.blogspot.com

(v. fotografia, infra, da minha autoria e que mostra

dois arco-íris que iluminam a Praça Kléber, em

Estrasburgo; um dos arco-íris parte da torre da

Catedral, o edifício mais alto à direita da fotografia).

Fotografia tirada no dia 24 de Setembro de 2012.

Fazendo Viagens

#78 OUTUBRO ‘12

Page 14: Fazendo 78

O que é que pequeno-almoçaste?Bebi uma caneca de nescafé a acompanhar duas torradas de pão com doce de amora. Quando te-nho laranjas do meu quintal, inicio o p. a. com sumo de laranja. Se o Conde Drácula viesse cá às ilhas onde o le-varias?A parte nenhuma, não me foi apresentado. Um ami-go dele que tratasse disso. Qual é a semelhança entre o Pico e o Faial?Pedaço de terra rodeado de mar por todos os lados. Se não gostas de chuva o que é que estás aqui a fazer?Consigo aguentar a chuva, porque quando aparece o sol já me esqueci dela. Na escola que outra “disciplina” deveria ser obrigatória?O inicio à Filosofia, logo na primária, para fazer as criancinhas começarem a pensar e a conhecer o eu e o outro… Porque é que tens alguns projectos na gaveta?Porque vou fazendo tudo com muita calma… não stressar é o lema de quem vive nas ilhas.

O que é que mais odeias na internet?Quando está muito lenta…e roda, roda… ou quando quero tirar uma simples dúvida e me aparecem mi-lhares de resoluções, e tenho de descobrir a que me convém. Que forma de arte é que te aguça os caninos?Aguça os caninos com indignação? Exibirem seres vivos como peças de arte em exposições… Ou tipo, uma tela rectangular pintada de preto ser a atrac-ção de uma exposição de arte. Ou aguça os caninos de prazer?Pinturas de Van Gogh, Matisse, Manet, … Júlio Pomar. O que é que gostavas de ter nascido?Estou bem assim, obrigada. Gostavas de ir morrer longe?Não, por acaso nasci nos Açores, e por acaso vim para cá viver, posso morrer por cá também.

Entrevista com o MorcegoHelena Maria de Noronha Krug

Nome: Helena Maria de Noronha KrugIdade: é para dizer? (55)Profissão: Bióloga e Pintora nas horas vagas.

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Fazendo Avarias

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Hora: 21:00Local: Centro de Artes e Ciências do Mar (Fábrica da Baleia SIBIL)Lajes do Pico, Ilha do Pico

Aniversário de Adiaspora,o verbo viageiro Data: 27 e 28 de OutubroLocal: Sociedade Filarmónica União e ProgressoMadalena, Ilha do Pico

Exposições

Esculturas, Projectos e DesenhosAutor: Agnes JutenLocal de Realização: Biblioteca Pública ARJJGHorta, Ilha do Faial

Cartoons “Paródias no Pico”Autor: Rui PimentelSegunda a sexta-feira das 9h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h30Fins-de-semana: 14h00 às 17h30Data: até 2012-12-16Local: Museu dos

Baleeiros, Lajes do PicoIlha do Pico

ailleursAutor: Helena LousinhaTerça a sexta-feira das 10h00 às 12h30 e das 14h00 às 17h30Local: Casa Manuel Arriaga, HortaIlha do Faial

Música

Recital de Violoncelo e PianoMúsicos: Varoujan Bartikian (violoncelo)

e Karina Aksenova (piano)Data: 16 novembroHora: 21h30Local: Salão Nobre da Câmara Municipal de São Roque do PicoIlha do PicoData: 17 novembroHora: 21h30Local: Teatro FaialenseHorta, Ilha do Faial

Actividades

Encontro Descobrir Artistas nas Lajes do Pico + Lançamento do Quinto Jornal FazendoData: 26 Outubro

Agenda Outubro / novembro ‘12

GatafunhosTomás Melo

Todos os desenhos estão à mesma escala

#78 OUTUBRO ‘12

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Page 16: Fazendo 78

Horários

Horta — Madalena7h30; 10h30; 13h15; 15h15; 17h15

Madalena — Horta8h15; 11h15; 14h00; 16h00; 18h00

Cedros — Horta7h00; 12h45; 16h00;Sábados: 8h00

Piedade — S. Roque — Madalena6h15; 13h30;Domingos e feriados: 13h15

Piedade — Lajes — Madalena5h45; 12h55;Domingos e feriados: 12h55

Madalena — Lajes — Piedade10h00; 17h45;Domingos e feriados: 9h30

Horta — Cedros11h45; 15h20 (Hospital); 18h15;Sábados: 13h15

P. Norte — Horta7h00; 12h45;Sábados: 8h00

Madalena — S. Roque — Piedade10h00; 17h45;Domingos e feriados: 9h30

Horta — P. Norte11h45; 17h30;Sábados: 13h15

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Índice

O Banco dá!

Entrevistando a Baleação

M, ou A busca de sentido

Myosotis Azorica

Bruta tormenta

Canhões de Paz

A Bela Aurora

Manuel de Tavares

From the desk of

Agnes Juten

Singular / Plural

Duplas

O dever cumprido e ... a Kima Maracujá!!!

What makes Açores look like Açores?

Corvo

O que a terra nos oferece

Fazendo Saúde

Cartas do Exilio IV

A(s) ilha(s) que vamos deixando de ser

Entrevista com o Morcego

Agenda

Gatafunhos

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