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  • FichaCatalográficaelaboradaporSuelyO.Moraes-CRB11/365

    FichaCatalográfica

  • APRESENTAÇÃO

    Estaobraapresentaumapesquisa frutodoMestradoSociedadeeCultura

    na Amazônia tendo a orientação da Professora Doutora Rosemara Staub,intitulada As práticas lúdicas na Comunidade Indígena Tabalascada emRoraima. Neste estudo reconhecermos que a ludicidade, apesar de servivenciadacommaiorintensidadenainfância,éumanecessidadehumanaemqualquer fase da vida, que o desenvolvimento do ser humano com o lúdicofacilitaosprocessosdecomunicação,socialização,expressãoeconstruçãodoconhecimento.

    Partindo destes princípios, a temática desta obra apresenta as práticaslúdicasindígenasoqualestefoionossoobjetodesteestudoecomoobjetivoanalisar as práticas lúdicas na Comunidade Indígena Tabalascada/RR,buscandoconhecerouniversosócioculturalpormeiodassignificaçõesqueassumemnossujeitosquedelasseutilizam,nostemposanterioreseatuais,navivênciadosmembrosdacomunidade,emsuasnarrativasorais,estabelecendoarelaçãoentreosaspectostradicionaisindígenasensinadoseaprendidosentregeraçõesmaisvelhasemaisnovas.

    Assim, esse estímulopode acontecer de forma rica, criativa e agradável,preservando o prazer da descoberta e a alegria contida emqualquer tipo deatividade,elevandoaautoestimadosenvolvidosnoprocesso.

    A intenção dessa obra é, sobretudo, apresentar as práticas lúdicas dessacomunidade indígena, realizada através de uma pesquisa etnográfica, comabordagemqualitativa, pormeio da observação participante e das narrativasoraisdosseusmoradores.

    No primeiro capítulo “Um Olhar na ludicidade indígena” almejou-se,numaperspectivosóciohistórico,entenderolúdiconocontextoindígenapor

  • meio da definição de conceitos e reflexões apresentados por autores comoKishimoto, Huizinga, Maluf, Brougèere, Vygotsky e outros. Neste capítulotraçou-sea revelaçãodouniverso lúdiconocontextodoBrasilenomundo,comotambémseapresentaolúdiconocotidianodascriançasindígenas,comosãoaspráticaslúdicasindígenasnoprocessodemodernização.

    Nosegundocapítulo,“Comoaludicidadeaconteceuevemacontecendonaatualidade na Comunidade Indígena Tabalascada”, buscou-se analisar aspráticaslúdicasdaComunidadeIndígenaTabalascadaecompreenderque,pormeiodasnarrativasorais,aspráticaslúdicasforamoguiaparaasconclusõesapresentadasnassistematizaçõesidentificadasnacomunidade.

    Importa salientar que após a realização das atividades comos indígenas,sempreeramfeitosregistrosdiáriosdecampo,nabuscadeumacompreensãopréviasobreoquefoireveladonodecursodapesquisaentreoinvestigadoreo investigado.Osdiáriosdecampocontribuíram,poisnamedidaemque sefinalizávamosostrabalhos,aindanocalordasfalas,onarradorrelatavasuasimpressões,sentimentoseopiniõesacercadosfatosememórias,naquiloqueseconstituíamdiálogos,conversasquesemprecontinuavampormaisalgumashoras.

    Para o desenvolvimento deste capítulo, as análises foram fundamentadasnos conceitos teóricos de Paul Ricoeur, Kishimoto, Clifford, Brougère,Huizinga,Koch-GrunbergeoutrosestudiososquevêmpesquisandonoBrasilenomundosobreolúdico.

    Diante de uma atitude interdisciplinar, ao colocar-me como umapesquisadora capaz de observar a comunidade sob uma perspectiva geral elocal. Paramim essa parte foi uma dasmais fáceis, isso por ser indígena esaberquenãohouveimpeditivosnarelaçãocomacomunidade,vistoqueumdos desafios do pesquisador é conseguirmanter sua presença no campo, demodoque respeite as normasde interação social em suas especificidadesnacomunidade.

    Acreditamos que esta obra contribuirá para o registro e valorização dosconhecimentostradicionaisdospovosindígenasemseusprocessosdeensinare aprender, suas vozes revelaram a importância da ludicidade presentes nas

  • práticascotidianas,bemcomoparatodososquedemonstrareminteresseporesseobjetodeestudo.

    EdlamarMenezesdaCosta

  • UMOLHARNALUDICIDADEINDÍGENA

    Desde o período de colonização no Brasil já se tinha a revelação do

    universo lúdico pormeio de fotos e gravuras, que retratavam as formas deviver de lusitanos, novos brasileiros, índios e escravos, estes dois últimosrevelavamsuasatitudescuriosaseestranhas.Nessasformasseproporcionavaàs crianças o desenvolvimento de aprendizagens levando-as à aquisição denovos conhecimentos e habilidades, de forma natural e agradável, enquantobrincavamaprendiam,comludicidade(SILVA,2007).

    Kishimoto (1997) apontaqueemnossocontexto infantil debrincadeiras,há modelos e formas de brinquedos trazidos e perpetuados por criançasportuguesas,negrase índias.Sabe-sequeoBrasil, sendoumpaísorigináriodamiscigenaçãodepovos,herdoumuitodaculturaproduzidaporestamisturaenãoseria,comcerteza,diferentenocasodasbrincadeirasinfantis.

    O folclore português foi passado de geração em geração por meio daoralidade,sendoconhecidasaslendas,contosesuperstições,objetosdeestudonas escolas e nas brincadeiras.Com a amplamistura existente na populaçãodosbrasileirosficadifícilafirmarqualaascendênciaespecíficadosbrancos,negros e indígenas nas brincadeiras e nos jogos tradicionais infantis, naatualidade.

    Otermolúdico,conformeMarinhoetal(2007),temsuaorigemnolatimnapalavra“ludus”quequerdizerjogo,eotermoestariasereferindoapenasaojogar,aobrincar,aomomentoprazeroso.Masatermologiaevoluiumuitonas pesquisas de várias áreas de estudo, na psicologia, na educação, naantropologia, na sociologia, dentre outras, de modo que deixou de serconsideradoapenasosentidodejogo.Olúdicosãoaçõesdobrincar,levandoaosmeiosde transmissãoe ressignificaçãodaculturanaqualo serhumano

  • estáinserido,osaspectosuniversaisdainteração,incluindosemelhançasentreosgêneroseentreoscontextosculturais.

    No tocante à etimologia do vocábulo “ludus”, Huizinga traz umaimportantecontribuiçãoaoafirmarque:

    Contrastando fortemente com a heterogeneidade e a instabilidade das

    designaçõesdafunçãolúdicaemgrego,olatimcobretodooterrenodojogocom uma única palavra: ludus, de ludere, de onde deriva diretamente lusus.Convém salientar que jocus, jocari, no sentido especial de fazer humor, dedizerpiadas,nãosignificaexatamentejogoemlatimclássico.Emboraluderepossaserusadoparadesignarossaltosdospeixes,oesvoaçardospássaroseo borbulhar das águas, sua etimologia não parece residir na esfera domovimentorápido,esimnadanãoseriedade,eparticularmentenada‘ilusão’e da ‘simulação’. Ludus abrange os jogos infantis, a recreação, ascompetições,asrepresentaçõeslitúrgicaseteatraiseosjogosdeazar.

    Naexpressão lares ludentes, significa ‘dançar ’. Parece estar no primeiroplanoà ideiade ‘simular ’oude ‘tomaroaspectode’.Oscompostosalludo,colludo, iludo apontam todos na direção do irreal, do ilusório. Esta basesemântica está oculta em ludi, no sentido dos grandes jogos públicos quedesempenhavamumpapeltãoimportantenavidaromana,ouentãonosentidode‘escolas’.Noprimeirocasoopontodepartidasemânticoéacompetição;nosegundo,éprovavelmentea‘prática’.(HUIZINGA,2008,p.29).

    Dessa afirmação, há que se acreditar que já há muito tempo não só os

    romanos, como Huizinga (2008) afirma, mas Souza (1996) aponta que osegípcios e maias já destacavam o lúdico com grande importância nasbrincadeiras e nos jogos, pois para eles, por meio das práticas lúdicas, asgerações mais jovens aprendiam com os mais velhos os valores e oconhecimentodesuacultura.ParaChateau(1984apudSOARES,2008,p.5),“[...]aaprendizagemquedecorredoatodebrincaréevidente[...]émuitoclaroqueojogoexercitanãoapenasosmúsculos,masainteligência”.

    Noentanto,o lúdico refere-seaumadimensãoqueevocaossentimentosde liberdade e espontaneidade de ação. Abrange atividades prazerosas,descontraídasedesobrigadasdetodaequalquerespéciedeintencionalidadeou

  • vontade alheia. Maluf (2009, p. 9) atribui uma relação do lúdico aocrescimentopessoaldoindivíduo:

    Abuscadosabertorna-seimportanteeprazerosaquandoacriançaaprende

    brincando.Épossível,atravésdobrincar,formarindivíduoscomautonomia,motivador para muitos interesses e capazes de aprender rapidamente. É sóacreditar,fazendodobrincarmomentosdegrandesconquistas.

    Nesseafã,oautorapontaqueolúdicopodelevaraumacompreensãode

    que é no brincar que as crianças passam a desenvolver sua criatividade,proporcionandoodesenvolvimentodaaprendizagemprazerosaeconstruindosuaautonomiasemaburocraciaquesetemnavidaadulta.

    OsignificadodelúdicoparaWiess(2002,p.71)édequeo“[...]processodejogar,brincar,representaredramatizarcomocondutassemelhantesnavidainfantil [...]”, logo, a criança está conhecendo e percebendo o mundo, poisassimolúdicotorna-seumapeçafundamentalnotrabalhocomela.

    ParaPiaget (1984), o lúdico é formadoporumconjunto linguísticoquefuncionadentrodeumcontextosocial,quepossuiumsistemaderegraseseconstitui em um objeto simbólico que designa também um fenômeno.Portanto,conduzacriançaàidentificaçãodeumsistemaderegrasquepermiteumaestruturasequencialqueespecificaasuamoralidade...eojogo“[...]comoumprocessodeajudaaodesenvolvimentodacriança,acompanha-a,sendoaomesmo tempo uma atividade consequente de seu próprio crescimento.”(PIAGET,1984,p.44).

    Vygotsky(1984)destacaqueolúdicoocorrenainteraçãocomaspráticaslúdicasqueenvolvemsimbologiaebrinquedosequeacriançaaprendeaagirnuma esfera cognitiva. Na visão deste autor “[...] a criança comporta-se deformamaisavançadadoquenasatividadesdavidareal,tantopelavivênciadeumasituaçãoimaginária,quantopelacapacidadedesubordinaçãoàsregras.”(Vygotsky,1984,p.29).

    Destemodo,aoapresentarestasrelaçõeseconceitos,osautoressuscitamqueolúdicocompreendeobrincar,asbrincadeiras,ojogo,comotodoatoqueacriançafazdeformavoluntáriaeprazerosa,bemcomoquandoelapassaadesenvolver sua criatividade, seu raciocínio e constrói seus conhecimentos.

  • Assim,olúdicopropiciaaaprendizagem,desenvolveashabilidadesnacriançatornando-aautônoma.

    Ascriançasaodesenvolveratividadescomludicidadeirãogradativamenteinteriorizarregrasdeconduta,respeitoenoçõesdecertoeerrado.Elaspodemexperimentar sensaçõese secolocarno lugardooutroparaexperimentá-lassobessepontodevista,podendoentendermelhorossentimentosquenorteiamas situações.Ao abordar a conduta de se viver ludicamente, Seber (1995, p.55)fazumaexposiçãosobreomodocomoaludicidadeseapresentanavidadacriança:

    A conduta de viver de modo lúdico situações do cotidiano amplia as

    oportunidades não só de compreensão das próprias experiências comotambémdeprogressodopensamento.Acriançaseapoianaimaginaçãoparareproduzir recordações ligadas aos momentos em que toma banho, sealimenta,dorme,passeia.Quantomaiselapuderbrincar,refazendodiferenteoseu dia a dia melhor entenderá o significado dessas experiências e maiorcondiçãodeprogressooseupensamentoalcançará.

    Portanto, consideradas as várias definições do lúdico, compreende-se a

    importânciadesteparaascrianças,independentedoseupertencimentoétnico,viver no mundo lúdico propicia-lhe o desenvolvimento das competências ehabilidades motoras, sociais e afetivas, inerentes às fases da infância,respeitadasassuasespecificidadesecontextocultural.

    Percebe-seque,detudoquefoiabordadosobrealudicidade,ascriançasdaComunidade Indígena Tabalascada vivenciam essas definições. Elas não sededicam às práticas lúdicas como um mero passatempo, mas como umprocesso de maturação, que propiciam o desenvolvimento, bem como napromoçãodosprocessosde socialização, issoporqueos indígenaspossuemsuasprópriasformasdesocializarascriançasnomeioemquevivem,enestasocialização, a ludicidade está muito presente. Nesse sentido, Piaget (1976)confirmaqueabrincadeiraestánaimitaçãoquesurgedapreparaçãoreflexaeda imitaçãoqueconsistenareproduçãodeumobjetoouato,napresençadomesmo.

  • Notranscorrerdapesquisafoipossívelobservarqueascriançasindígenasda Comunidade Indígena Tabalascada imitam o trabalho realizado pelosadultos, brincando de trabalhar.De acordo com aPsicologia, o processo deimitação passa por várias etapas, nisso as crianças serão capazes derepresentar um objeto na ausência do mesmo, porque ocorreu uma açãosimbólica de realidades ausentes. Essa imitação se dá porque o mundo dabrincadeiraéumaantecipaçãodomundodosobjetosedasocupaçõesadultas.

    A criança indígena ao fazer parte da cultura emque vive, desempenha opapel do adulto no seu mundo lúdico. Suas brincadeiras tornam-se umapreparaçãoparaasfunçõesqueserãodesempenhadasnavidaadulta.Acriançabrincaporquetemumpapel,umlugarespecíficonasociedade,enãoapenasporqueofazdecontacompõesuanatureza.Naculturaindígena,desdemuitocedo,ascriançasaprendemcomseuspaisváriasatividadesdoseudiaadia,ondeelaspassamafazerasimitaçõesdessasatividades.Dentreasbrincadeirasobservadas na Comunidade Indígena Tabalascada, ao se questionar quatroirmãos que “brincavamde casinha” falaramque estavam construindo a casaparadepoisirrepresentarumpersonagem:opai,amãe,osfilhoseosirmãosefazercomidinha.

    Emoutromomento, observamos as crianças brincando de carrinho comváriospedaçosdepau,outrasbrincandocomosanimaisdomésticos,meninoscombaladeirasparabalarpassarinhosparaconfecçãodecocares.

    Dessas brincadeiras, podemos dizer que são formas que as criançasencontram para representar o cotidiano em que estão inseridas. Ao brincar,elasestãoincorporandovaloressociais,moraisquecompõemsuacultura.Aobrincardetrabalhar,porexemplo,deflechar,decaçar,decasinha,implicaquese apropriam de características e dos atos da realidade. É a reprodução domeioemqueacriançaestá inserida.Brincando,ascriançasdemonstramseudireitodeencontrarnomundosuasidentidades.

    Ressaltamos que a importância da educação familiar indígena na qual setem a compreensão dos processos pelos quais os povos indígenas afirmamseus projetos de futuro. Principalmente reafirmando as identidades étnicas,tradições e saberes, bem como dando ênfase ao desenvolvimento

  • socioambiental no que concerne à sustentabilidade e garantia das geraçõesfuturaseseusterritórios.

  • Olúdiconocotidianodascriançasindígenas

    Cadaetniadeterminaosaspectosculturaisqueformamainfânciadesuas

    criançasapartirdoquejulgaútilelegítimoparaacomunidadeemqueestãoinseridas, procurando fazer aorientaçãoe socializaçãodos saberesque lhespossibilitaráodesenvolvimentofísico,sócio,afetivoecognitivo.Pormeiodepráticas que garantam a apropriação desses conhecimentos, dentre assingularidadesdessaetapadavidahumana,estápresentealudicidade.

    Pontuando sobre esse aspecto,Oliveira (2008, p. 1, grifo nosso) propõeque as práticas lúdicas estão sempre presente no cotidiano em que vive acriança:

    Entreossinaisdiacríticosquedefinema infância,a ludicidadesemprese

    destacouumavezqueestafasedociclodavidaécompreendidacomoafase,por excelência, da vivência do lúdico. Assim, a literatura antropológicaexistente sobre a infância entende que o apelo ao lúdico é uma marca dainfânciae sempreque fordadaàcriançaachancedeagir ela formatará suaação ludicamente.A importânciada ludicidadeparaas criançasdequalquercultura sedápelo fatodequea infânciaéomomentoemque se inauguraoprocesso de socialização na vida do indivíduo, devendo permanecer esteprocessoaolongodetodaasuavida.Masénoprimeiromomento,nainfância,queasocializaçãoapareceemseufuror.Eestasocializaçãoinfantilseutilizadoludismoparagarantirasuaefetivação.

    Aodiscorrersobreolúdicoindígena,énecessárioabordarsobreo“jogo”

    em suas muitas definições, norteando boa parte da reflexão sobre a esferalúdicaapartirdoqueJohanHuizinga(2008,p.16),nasuaobraclássicasobreojogoHomoLudens,quandoanalisaosignificadodojogocomoelementodacultura,resumindocaracterísticascomo:

  • [...] uma atividade livre, conscientemente tomada como ‘não séria’ eexterioràvidahabitual,masaomesmotempocapazdeabsorverojogadordemaneira intensa e total. [...] desligada de todo e qualquer interesse material,com a qual não se pode obter lucro, praticada dentro de limites espaciais etemporais próprios, segundo certa ordem e certas regras. Promove aformação de grupos sociais com tendências a se rodearem de segredo e asublinharem suas diferenças em relação ao resto do mundo por meio dedisfarcesououtrosmeiossemelhantes.

    Nesta obra também há uma associação dos jogos e brincadeiras às

    atividadesdiáriaseprodutivascomoacaça,apesca,acolheita,aproduçãodeartefatos, a construção de casas. A curiosidade, a aptidão, a criatividadeenvolvidanessasaçõeseemtantasoutras,permitereconheceraseriedadedadimensãopresentenasatividadescotidianaseprodutivas.

    Ao considerar que se deve reconhecer a seriedade nas atividades docotidiano,Oliveira (2011), emsuapesquisaapresentaqueaspráticas lúdicasdas crianças indígenas Guarani na Aldeia Três Palmeiras são planejadassistematicamenteemhoráriospré-determinados,assimdescritos:

    Pela manhã, seu grande compromisso é com a escola diferenciada da

    aldeia, que frequentam das 7:00 às 9:00h. Deste horário até o meio dia,dividemseutempocombrincadeirasnacabanacentral(protegendo-sedosol)enaajudadeseusfamiliaresnosafazeresdomésticos.Napartedatardeestãomais livresparabrincadeiras,aindaquecontinuemenvolvidasajudandosuasfamílias (cuidandodascriançasmenores,buscandoágua, levandoe trazendocoisas entre as casas). Com o sol um poucomais ameno, explorammais oambientedaaldeia,namaioriaemgruposdebrincadeiras.(OLIVEIRA,2011,p.99).

    Ascriançasdestaaldeia/comunidadetêmapermissãoparadesenvolverasmais diversas práticas lúdicas no seu cotidiano, isso porque nota-se umambienteagradável ebemdiversificado.Paraos indígenas,grandepartedasbrincadeirasestáinseridanofazerdasatividadesdiárias,noaprenderfazendo,apartirdasquesãorealizadaspelospaiscomseusfilhos.

    Na Comunidade Indígena Tabalascada, em Roraima, não poderia serdistinto, pois a ludicidade está presente no dia a dia dos seus moradores.Quando estão realizando os processos de produção da farinha e seus

  • derivados,ascriançasestãopresentesnosdiversosmomentoseambientessemnenhuma obrigação. Participam como divertimento ou lazer, entre risadas eafazeres,quandosecansamesãoautorizadospelosadultosprocuramoutraspráticaslúdicasparaexecutarem,taiscomoandardebicicleta,correratrásumdo outro, subir em árvores e depois eles voltam sem nenhuma obrigaçãoimpostapelosadultosqueseencontramparaafarinhada.

    Podemosdizerquealudicidadeindígenaaconteceemambientesquefazemparte do cotidiano infantil, na família ou comunidade, de acordo com ossignificadosculturaisdaspessoasquealivivem.Ascrianças,aobrincar,vãodescobrindoeaprendendonoconvíviocomseuspares, familiarespróximosou parentes da mesma idade ou até mais velhos, quando em visitas,reproduzemsuasbrincadeirase repassamseusconhecimentos,ematividadesquepropõemumaconstruçãosocialecultural.

    Dessaforma,reforçandoemsuaspesquisas,oantropólogoBaldus(1970)aponta que é essencial a relação que ocorre na natureza para quem está sedivertindo e ao mesmo tempo aprendendo, isso quando se tratava decomunidadesindígenas.Logo,sevêqueomundodacriançaestáligadoaodoadulto,apenasseparadospeloviésdadiversão,daludicidade.

    A natureza é o elemento propulsor do brincar indígena, visto que osdemais,presentesnomeioambiente,comosementes,folhas,cabaças,pedaçosdepaus,frutos,argila,entreoutros,sãoutilizadosnasbrincadeirasenosjogoscriativamenteinventadospelascriançasindígenas.Observandoasbrincadeirase jogos vivenciados pelas crianças indígenas, é possível perceber que sãobrinquedos naturais, ou seja, retirados da natureza, utilizados para sedivertirem ao redor de suas casas ou em correria pelo pátio da escola, nobarracãodacomunidade.Baldus(1970,p.65)ressaltaqueentreosbrinquedosfeitosporalgumasetniasdestacam-se:

    OsBakairis comasbolasdepalha,osParesis comasde seiva,ospiões

    entreosTapirapés,aspetecasebonecasdebarroentreosKarajás,apitosebonecasdealgodãosãofeitaspelosRikbaktsaseasflechasdeburiti feitas pelos Xavantes, entre outros. A prática lúdica entre os índiosbrasileiros ainda é uma atividade viva e exerce um importante papel nasocializaçãodosmembrosdascomunidadesindígenas.

  • Essa realidade constitui-se em um dos desafios que os povos indígenas

    têm, entre tantosoutros,manterviva a identidadeétnica e cultural, buscandocaminhos que possibilitem pelo menos uma convivência intercultural, ondeaspectos fundamentais da formação da criança e da construção da suaidentidade sejam resguardados. Isso porque a criança, pormeio do brincar,aprende e se diverte, faz atividades, começa a construir seu conhecimento econvívio social. Logo se entende que o jogo/brincadeira possui ordem e éregra, possibilitando à criança a construção de limites e o respeito a estes.Portanto,considera-seVygostsky(1994,p.118),quandoafirmaque:

    Acriançacomeçacomumasituaçãoimaginária,queéumareproduçãoda

    situaçãoreal,sendoabrincadeiramuitomaislembrançadealgumacoisaquerealmente aconteceu, do que uma situação imaginária nova.Àmedida que abrincadeira se desenvolve, observamos um movimento em direção àrealizaçãoconscientedoseupropósito.

    No momento em que acontecem os jogos/brincadeiras, a ludicidade

    promoveoenvolvimentonoprocessoemqueascriançasparticipam,levandotal participação à necessidade de desenvolverem-se normas para ojogar/brincare,finalmentesurgemasregras,quepossibilitarãooprocessodeaprendizagem e respeito, além da divisão na participação/ trabalho. E paranotar que a história do lúdico jamais poderá ficar isolada da influência dosportugueses,dosnegrosedosíndiosnasbrincadeirasdascriançasbrasileiras,a ludicidade é muito ampla e rica em materiais de pesquisa, por isso apreferência pelo tema abrangeu com intensidade também esta pesquisa, nareconstrução das práticas sociais da infância onde o lúdico se compôs econtinuapresentenahistóriaenarrativasdaquelesquesefizeramsujeitos.

    Parasituarojogonotempo,Kishimoto(1997,p.16)pontuaque:A tradicionalidadeeuniversalidadedos jogosassentam-senofatodeque

    povos distintos e antigos como os da Grécia e no Oriente brincaram deamarelinha, de empinar papagaios, jogar pedrinhas e até hoje as crianças ofazemdamesmaforma.

    Logo,esses jogos foramecontinuamsendo transmitidosentregerações,

    perpassadospormeiodeconhecimentoempíricoeconservam-senamemória

  • dassociedades.Vêmsendorepassadosdegeraçãoageraçãodamesmaforma,pormeiodaoralidade,eassimtornaram-seconhecidos tambémosmitos,aslendas,oscontoseéclaro,oobjetodesseestudoquesãoaspráticas lúdicasindígenas.

    Ainfluênciadosindígenasnasbrincadeirasinfantisnãoéumatarefafácilparaidentificar,devidoàimensidãoeàdiversidadeculturaldessespovos.Aocitaro artefato lúdicoemalgumascomunidades indígenas, asmães fazemobrinquedo para os seus filhos, como por exemplo, a figura de animais embarro cozido. A tradição indígena em que as bonecas de barro, figuras nasquaispredominaofeminino,nãosendo“simplesbrinquedo,maselementosdereligiosidade”. Kishimoto (1997, p. 60) descreve brincadeiras que sãorealizadasatéhoje:“Apráticadeutilizaravesdomésticascomobonecos,bemcomoousodobodoque1edoalçapão2parapegarpassarinhosedepoiscriá-los,sãotradiçõesquepermanecemnainfânciabrasileira”.Opapeldamulherindígenatemumafortecontribuição,poiselaébasedoexemplofamiliar,suasatividades estão relacionadas à confecção dos alimentos para a família e naconstrução dos utensílios de cozinha, bem como de adornos e vestimentasutilizados nas práticas culturais e rituais, bemcomodeoutros costumesqueestãopresentesatéhoje,nocotidiano.

    Omododebrincardascriançasindígenassetornamuitasvezessimbólico,isso porque o jogo não possui omesmo sentido entre eles, predominam asbrincadeiras junto à natureza.As brincadeiras funcionam sempre como umapreparação para a vida adulta, levando as crianças à realização de pequenastarefas domésticas como ir para roça, descascar a mandioca, pegar lenha,cozinhar,cuidardeirmãosmenores,dentreoutras.

    Herrero(2010)apresentaosresultadosdesuapesquisarealizadanaAldeiado Alto Xingu, afirmando que para a realização da ampla maioria dasbrincadeiras e jogos são aproveitadas o entorno existente a terra, a água, afogueira,apalhadeburiti,umtronco,aestruturadacasa,ocorpo,ocorpodooutro.Emsuma,percebe-sequenaconfecçãodealgunsbrinquedosindígenassão utilizadosmateriais que estão ao alcance da criança indígena, que estãodisponíveisnanatureza.

  • Aindanosdias atuais existembrinquedos indígenasquepermanecemnasbrincadeirasdascriançasbrasileiras,taiscomoo“ojogodofio”,conhecidotambémpor“camadegato”;“amatraca”,cujo“movimentodevirareesticarofioproduzum ronronarquediverteosmeninos”; apeteca,queé feitapelosadultosecriançasindígenas,brinquedoquetemsuaorigemnastribostupisdoBrasil(KISHIMOTO,1997,p.67).

    SegundoKishimoto(1999,p.61),datradiçãoindígenaficounobrasileiroogostopelosjogosebrinquedosimitandoanimais.PauloFreire(1999,p.17)coloca“[...]oprópriojogodobicho,tãopopularnoBrasil,originou-senesteresíduoanimistaetotêmicodaculturaindígena,sendoreforçadopelaÁfrica”.

    Em afirmações como estas vem à confirmação de que as criançasindígenas têma ludicidadecomouma formade aprendizagempormeiodasvárias atividades do dia a dia da comunidade, o que pode ser diretamenteobservado durante o trabalho etnográfico junto às crianças da comunidadeTabalascada, quando da realização dos seus afazeres de casa, da roça, semcomoseestivessembrincando.

    Os brinquedos para as crianças indígenas são instrumentos quepossibilitamacompreensãoda funcionalidadesocioculturaldomeioemquevivem, bem ao contrário da repressão/imposição existente na cultura dascrianças urbanas. As crianças indígenas não são castigadas, mas levadas acompreender seus erros sempre em conversas, semgritos, a criação ocorresem violência. Quando uma criança ganha algo, logo vai dividir com asdemaisqueestiveremjuntas,construindooprocessodesocializaçãodosbens,e de apropriação do conceito e respeito à coletividade. Também não foramobservadas atitudes de violências/agressões físicas entre elas, sempre estãosorrindocomtudoquerealizam.

    Aindasevêentreos indígenasafaltadecompetitividade,queé“[...]umacaracterísticadaspopulaçõesprimitivas,devidacomunitária,poisprecisamdacooperaçãoparasuasobrevivência.”(KISHIMOTO,1997,p.67).Mesmoentreosadultosnãoháafiguradeumvencedor,nãohácompetiçãonosjogosquesãorealizados,apontandoaautoraque:

  • O sentido do jogo como conduta típica de criança, não se aplica aocotidianodetribosindígenas.Atirarcomarcoeflechanãoéumabrincadeira,é um treinopara caça. Imitar animais são comportamentosmísticos tantodeadultoscomodecrianças,reflexosdesímbolostotêmicosantigos.Misturadoscom os adultos, participando de tudo na tribo, pequenos curumins não sedistinguem por comportamentos particulares como o brincar. Adultos ecriançasdançam,cantam,imitamanimais,cultivamsuasatividadesetrabalhampara sua subsistência. Mesmo os comportamentos descritos como jogosinfantis não passam de forma de conduta de toda tribo.As brincadeiras nãopertencemaoredutoinfantil.(KISHIMOTO,1997,p.72).

    Embora ainda se tenha nos dias atuais a influência indígena nas

    brincadeiras infantis,pode-sedizerquenãopossuemamesmacaracterística,nemamesmafinalidade.Osignificadoédistinto,sendoque,porexemplo,obrincaremoutrasculturasépertinenteaomundoinfantil,emboranãosetenhadúvida de que brincando, a criança estará realizando associações entre omundorealeoseumundonaqueleinstante.

    Inserir a criançae suaprodução lúdicanumcontextocultural é algoqueBrougère (1997) aponta como fundamental. O pesquisador devenecessariamenteconheceraculturaondeabrincadeirasedesenvolveafimdenãoincorrernoerrodeconsideraralgoquenaqueleambientenãoconstituiofenômeno. Essa tem sido uma preocupação recorrente visto que em certoscontextos onde as criançasmantêm forte proximidade com os adultos, suasbrincadeirasmuitasvezesseconfundemcomatividadesadultas.

    OestudodeGosso(2005)identificouaocorrênciadessefatonumatriboindígena brasileira é um exemplo disso. Nesta pesquisa, observou que ascriançasindígenasnãosofremcastigosourepreensões,possuemumgraudeliberdadeelevado,principalmentequandocomparadasàscriançasdosgrandescentros urbanos e brincam como quaisquer outras crianças. As brincadeiraspara essas crianças permitem que elas exercitem não somente habilidadesfísicas como também habilidades sociais, cognitivas e afetivas fundamentaispara a manutenção dos relacionamentos durante a vida adulta. Elasdemonstrarammaiornecessidadeem fazerusodehabilidades físicasdoquecriançasurbanasdevidoaosdesafiosimpostospelocontextoemquevivemeàs oportunidades de entrar em contato comum ambiente vasto e desafiador.

  • Essas constatações corroboram com as afirmativas sobre as influênciasambientais nos estilos e tipos de brincadeiras, ao mesmo tempo em quepermitemaidentificaçãodeumcomportamentoqueétipicamentehumano.Adizer,brincarécaracterísticodaespéciehumana,porémsuasdiversasfacetasapresentam-sedeacordocomasparticularidadessocioculturaisexibidaspelascriançasdurantesuasbrincadeiras(GOSSO,2005).

    Enfim, podemos colocar que o lúdico constituirá sempre uma atividadeinerente ao ser humano. E entre os indígenas as atividades de dança, caça,pesca e luta sempre foram tidas como de sobrevivência, deixando, muitasvezes, o caráter restrito de divertimento e prazer natural. Caracterizando aprópriacultura,possibilitandoaeducaçãofamiliarerepresentandosempreasformas próprias de viver. Ao praticar a ludicidade, o indígena em qualquermomentoda vida, seja quando criançaou já adulto, o faz semdúvida comoumatarefaqueseexigeumsentidoreal,verdadeiroemquetodosdevemestarpreparados para realizar de acordo com suas aprendizagens, recebidas dosseus antecedentes, visando à socialização desse conhecimento. Ou seja, aspráticaslúdicasestãosemprepreparandoparavidaedesenvolvendoemváriosaspectos,taiscomohabilidadefísica,acriatividade,asocialização,oconvívioerespeitofamiliarecoletivo,aténasexualidade,dentreoutros.

    Na concepção dos indígenas, ao praticar a ludicidade, há sempre o queaprender e isso ocorre ao longo da vida. Desse modo, percebe-se que nouniversolúdicoindígenaascriançastêmpossibilidadedecompreenderqueacultura é vista como algo abundante para sua construção. Afinal, não sãosomenteascrianças indígenasqueestãoaprendendocomaspraticas lúdicas,mas todos os sujeitos que estão inseridos na realidade cotidiana dacomunidade,atémesmoosadultoseosidosos.

  • Aspráticaslúdicasnascomunidadesindígenasnoprocessodemodernização

    Aspráticaslúdicas,porserementendidascomoatosprazerososdebrincar

    e jogar das crianças ou mesmo de outras fases da vida, permitem sempremergulhar na cultura e no seu caminho ao longo dos tempos. Esses atosrepetitivossãomanifestadosemcadaaçãoecada jogo,bemcomocarregamconsigo as brincadeiras perpetuando e se renovando a cada geração,permitindo a recriação e evolução nos novos jogadores ou brincantes, emtodosospovos.Comosebrincavaecomoeramosbrinquedossãoinvençõesque vão se renovando em cada contexto cultural, resguardadas asespecificidadesnasdiferentesépocas.

    Comamodernizaçãoeadventodatecnologia,alémdointensocontatodascomunidades indígenas com outras sociedades não indígenas, houve umimpacto na utilização das práticas lúdicas em suas formas e dos objetosutilizados pelas crianças indígenas para brincarem.A entrada de brinquedosindustrializados nas comunidades indígenas vem alterando a ludicidadeexistente no universo da criança indígena, ocorrendo na medida em que astecnologias presentes nos brinquedos começam a ser adotadas na prática erotina,atomaroespaçodasbrincadeirasepráticaslúdicastradicionais.

    Dessa forma,podemosafirmarqueasnovas tecnologias,potencializadaspelo processo de consumo e marketing, contribuem para que imagensextraordinárias fortifiquem um mercado consumidor, tendo como base ofascínio das pessoas por atividades que carreguem mensagens de aventura,fortes emoções e, de preferência, que seja capaz de fazê-las se deslocar dasrotinascotidianas.

    Isso por que as brincadeiras nas comunidades indígenas ocorriam eocorremaindaatéhojeemtodososlugares,naterra,naágua,namata,dentro

  • desuasmoradiasenosarredores,noentornodacomunidadesemprecomumaligaçãofortecomosanimaiseanatureza.

    Logo, grande parte das práticas lúdicas nas comunidades indígenas, queencantavamnãosóascriançascomoosadultos,quefaziampartedocotidianode várias gerações, estão desaparecendodevido à influência da televisão, daentrada e utilização de brinquedos industrializados e da tecnologia, uso decomputadores,celularesegamesacadadia.

    A presença das tecnologias de informações e de comunicação vemalterando principalmente as formas de socialização e de acesso aoconhecimento por parte das crianças indígenas.Essamodernização propostaporessesmeioseinstrumentosdemassificaçãoteminvadidoascomunidadesindígenas e tem sido responsável pelo desaparecimento de outras formas eespaçosdeaprendizagem,nosquaisascriançasestãoaprendendosobreoutrosmodos de ser e maneiras de viver, atendendo aos apelos domarketing, dapublicidade,doconsumoeentretenimento.

    Nessaperspectiva,Oliveira (1992, p. 59) aponta sobreoque a criança écapazemsuaaprendizagempormeiodebrincadeirasenoquesetransformaoseuaprendizado:

    Acriançaaprendeatravésdabrincadeiraaencontrarsuaprópriavida,naspessoasreais,acomplementaçãoparasuasnecessidadesafetivasecognitivas.Ela não precisa mais deformar a realidade para assimilá-la, ela aprendeu aconviver, a lidar, a compensar e a lidar através da interação comos outros,comobjetosreais.

    Paramelhorcompreensãodecomoainfânciavemsendovivenciadapelas

    criançasindígenasecomoestáacontecendooprocessodamodernizaçãonascomunidades indígenas, é necessário perceber como os modos e práticassociais semanifestamna realidade cultural, possibilitando um conhecimentoaprimoradodecomosedáaludicidadeindígenaedecomoestãoascondiçõesdevivênciadainfânciadospovosindígenasnacontemporaneidade.

    Vale ressaltar também que Koch-Grunberg (2006) em uma de suasexpedições pelas regiões de Roraima, descreveu de que modo às crianças

  • indígenas se comportavam e como era realizada a educação familiar ecomunitária:

    Quando vencem a timidez inicial; [...] essa crianças são criaturas maisconfiantes e alegres que possam imaginar. Aceitam cada brincadeiraminha,comalegria,masnuncasecomportammal.Sãoamáveiseeducadas;[...]vivememgrande harmonia entre si; [...].Nunca vi dois deles brigando, oumesmobatendo no outro.Não há duvida de que os pais dão bom exemplo e, nesseaspecto, são também os melhores professores para um europeu. Éextremamenteraroacriançaindígenaserrepreendidacompalavrasdurasoumesmocastigadapelospais;[...]constanteinfluenciadosbrancos;[...]trabalharparaeles;[...]essascriançasinocentese,aomesmotemposensíveis,tornam-secarrancudasefechadasouimpertinenteseatrevidas.Oencantonaturalsevai.(KOCH-GRUNBERG,2006,p.64-65).

    No entanto, essa é uma realidade que não se encontra mais nas

    comunidades indígenas, percebe-se que as brincadeiras nesses contextos,mesmo constituindo-se de importância para as crianças sem distinção decultura,comoprocessodemodernizaçãoquevemafetando-as,têmficadodeladoeaspráticas lúdicasqueseriamparaelasumacontribuiçãoparaavida,estãodeixandodeservivenciadas.

    Logo, para as crianças que vivem nas comunidades indígenas, abrincadeira não é um mero passatempo, as práticas lúdicas ajudam noprocessodematuraçãoedesenvolvimentoinfantil,promovendoprocessosdesocializaçãoedescobertadomundo. Issoporquenascomunidades indígenasos adultos e crianças dançam, cantam, imitam animais, cultivam suasatividades.Osadultostrabalhamparaseusustentoedesuafamíliaemesmooscomportamentosdescritoscomobrincadeirasinfantissão,muitasvezes,formade conduta de toda comunidade indígena, trazendo os ensinamentosnecessáriosàvidaemcoletividade.

    Nessesentido,essesacontecimentossãoverídicos,poisnacomunidadeemque foi feitaapesquisa,ouvimosdealgunsnarradoresquecomopassardotempo, o brincar no malocão e na frente das casas na comunidade, asatividadesdocorrer,subiremárvoresetomarbanhosnosigarapésenosrios,dentre outras muitas outras brincadeiras indígenas, estão cada vez mais

  • escassas, visto que neste tempo de modernidade e com as tecnologiascompondodesenfreadamentearealidadeecontextosindígenas,namaioriadascomunidades de Roraima já se faz uso da televisão, do computador e doscelulares.

    Os diversos usos que as crianças fazemdaTV incluem a referência aosdesenhos animados e seriados, aos quais todas elas têm acesso, como temapara conversar e brincar, servindodebasepara aorganizaçãode interaçõescoletivas, inclusive no espaço escolar. Da mesma forma, os significadoscompartilhados pelo público infantil, por meio do acesso às produçõestelevisivas, possibilitam a construção de saberes e se estendemaos produtosenfatizados nas propagandas, remetendo à análise do consumo comointermediadorderelaçõesnocotidianodascrianças(OLIVEIRA,1992).

    Portanto, as brincadeiras tradicionalmente indígenas estão sendosubstituídasporoutras.Amodernizaçãodaspráticaseafazeresdomésticos,asnecessidades profissionais dos pais nas comunidades, fazem com que ascrianças indígenas fiquem sozinhas em casa e passem a usar essesinstrumentos tecnológicos commais frequência e por não ter,muitas vezes,nenhumadultoquepossaestarinterferindonessesespaçoseutilizaçãodessesmeios,comopedirquedesliguematelevisão,ocomputador,ovídeogame,seelasocupamseustemposlivresdiantedessesprodutos?

    Essas mudanças conforme Oliveira (2008, p. 81) se deram “[...]principalmente, com as transformações no mundo do trabalho, quando asociedadetevequeseadaptarànovarealidadedomercadoedaprodução[...]”,ondeascomunidadesindígenasnãoficamlongedestarealidade,issoporqueahumanidadeviveemummundodemilharesdeinformaçõesdisponíveispelosmeiosdecomunicação,pelaviadaproduçãoeconsumismo.

    Daívemàinfluêncianavidaenaculturadacriançaindígena,ondeacadadia elas estão sendo influenciadas pelo consumo de brinquedosindustrializadose tambémpelomundoda informatização.Oliveira (2008,p.81) faladagrande influênciadoconsumoquea sociedadeemgeralatribuiupara o mundo das crianças que chega à desvalorização do lúdico nascomunidadesindígenas:

  • Essa sociedade apela, incansavelmente para o consumo, criando, noindivíduo,anecessidadedeconsumirmercadorias.Paraopúblicoinfantil,osbrinquedos industrializados são referências marcantes, além de outrosacessórios,comoroupasdemarcas,enlatados,CDsinfantis,etc.Nocasodosbrinquedos, estes já estão prontos, fazem toda a simulação (choro, som,movimento)eacriançaapenaspermanecefrenteaobrinquedopassivamente,olhandoeobservandocomoexpectadora.

    Nestes contextos, a cultura do consumo tem moldado o campo social,

    construindodesdemuitocedonacriançaenoadolescenteaexperiênciacomomodernoevê-sequeosmeiospelosquaisissoaconteceéainvasãodamídiano cotidiano das crianças indígenas, um exemplo é a televisão que “[...]transformouavidaeaculturadacriança,asreferênciasdequeeladispõe[...]influenciou,particularmente,suaculturalúdica.”(BROUGEÈRE,1995,p.50).

    Destemodo,devidoàsmudançasnarealidadeedasobrevivênciafamiliarnascomunidadesindígenasetambémtecnológica,pode-seentenderporqueasbrincadeiras de antigamente repassadas de gerações a gerações, osensinamentos do cotidiano que eram ensinados por necessidade deaprendizadoecomprazer,paraamantençadaidentidadeétnica,passamateruma desvalorização cultural e começam a ser substituídas por jogoseletrônicosebrinquedosindustrializados.

    Essasmudançasquevêmocorrendonasociedaderefletemdiretamentenavidadascrianças,poisestãocadavezmaiscedosendosolicitadasa realizaratividades extras, encaminhadas às instituições de ensino, realidade tambémpercebidanascomunidadesindígenas,ondeagoraasescolaspassamaassumiraresponsabilidadesdecuidar(crecheseescolasdeeducaçãoinfantil)eeducar(demais modalidades de ensino escolar/fundamental/médio eprofissionalizante),e,énesteambientequeelasterãooprimeirocontatocoma escola, ainda em seu período de infância (3 aos 5 anos), tarefas antesatribuídasaospais,mãeseavósindígenas.Ascriançassóiamàescolaapartirdosseteanoseenquantonãocompletavamessaidade,asmeninasficavamemcasaparaaprenderosafazeresdomésticos,eosmeninosiamparaaroçacomos pais aprender a plantar, caçar e pescar, atividades que garantissem asobrevivênciafamiliarecomunitária.

  • Ressaltamosaindaque,nasmuitasvezesemqueserealizouaobservaçãoparticipante ao longo da pesquisa na Comunidade Indígena Tabalascada, foipossívelobservarqueentreascriançasindígenasnãoháviolência,levamumavidatranquilaequebrincandoelasaprendemdiversasatividadesdocotidiano,quenãohágritosenembrigasentreosirmãos,tudoquefazemécomprazereque temmotivosde risosem todasemsuasatividadespormais simplesquesejam, sendo-lhes atribuídos os afazeres domésticos elementares enecessários, que contribuem com a coletividade. Nesse sentido, há entre osavós, pais e educadores um consenso sobre a importância da infância e quedevem vitalizar e valorizar as práticas culturais, os costumes tradicionais eintroduzi-losnavidadascrianças.

    Friedmann(2005,p.73)explanaqueénainfânciaqueacriançaaprendeetemnecessidadedeexternarseussentimentos:

    [...]comalma,comessência,comsignificado,aquelanaqualaspequenase

    simples atitudes, momentos, gestos, sabores, brinquedos, cantos, historias,pinturas,produções,toqueseolharessignificativos,valorizados.Umainfâncianaqualoserhumanoestejasensívelevoltadoàsmanifestaçõesdecarências,agressividades, dificuldades, interesses, desejos, conflitos dos gestos, doespaço, das produções artísticas, do significado oculto das brincadeiras dascrianças.

    Portanto, que não seja pelo processo da modernidade e tecnologias

    disponíveis no universo indígena que as práticas lúdicas deixem de servalorizadas ou entrem em desuso,mas que todos na comunidade validem ocuidado com a forma como as crianças se desenvolvem, se caracterizam,abstraem e vivenciam a cultura, os costumes e valores do seu povo,adquirindo-osnocontextoemqueestejaminseridas.

    Nesse sentido, ainda, Santos (2002, p. 12) relata que não se deve ver aludicidadecomodivertimento,massendoumanecessidadedoserhumano:

    [...] uma necessidade do ser humano em qualquer idade e não poder ser

    apenas como diversão. O desenvolvimento do aspecto lúdico facilita aaprendizagem, o desenvolvimento pessoal, social e cultural, colabora para

  • umasaúdemental,preparaparaumestadointeriorfértil,facilitaosprocessosdesocialização,comunicação,expressãoeconstruçãodeconhecimento.

    Diantedoexpostosobreasformasdebrincar,asbrincadeirasatuaiseos

    brinquedosqueforamsemodificandonodecorrerdotempoedahistória,quesepercebaoquantoolúdicoéindispensáveledeveestarpresentenavidadacriança,poisénobrincarqueserealizanaintegralidadedosaspectosfísico,sócio,afetivo,cognitivoecultural.

    É imprescindível considerar que, pormeio das brincadeiras, as criançaspassamadesenvolversuascapacidades/competênciasehabilidades,equetudoisso se adquire a partir da realidade em que estejam inseridas, pois vãoatribuindosignificadosepassamareproduziroquejáconhecem.Entendidasassim, as atividades lúdicas são indispensáveis à concretude da vida eproporcionamumaaprendizagemapreciativa.

    Acreditamos que as práticas lúdicas indígenas possam servir deinstrumentos educativos nas escolas indígenas, contribuindo para aautoafirmação dos indígenas, já que, durante os eventos, são revividas ashistóriaseasrelaçõessociaisqueosconstituemaojogar,sepintar,aodançareseapresentar.

  • ALUDICIDADE:COMOACONTECEUEVEMACONTECENDONAATUALIDADENACOMUNIDADE

    INDÍGENATABALASCADA

    Assimcomooutrosindígenasespalhadospelomundointeiro,osWapixanaeosMacuxiemRoraima,emespecialosmoradoresdaComunidadeIndígenaTabalascada, têm na tradição oral a forma de efetivar a transmissão deconhecimentos entre as gerações. Suas crenças, costumes, e práticas lúdicaseram,eaindasãorecordadoserepassadosemmomentoseespaçosdiversosemqueaoralidadeéamediação.

    Aspráticas lúdicas constituíram-senoprincipal focodesse estudoeparaissoforamrealizadasasobservaçõesparticipativasdurante todaapesquisaeasconversascomosmoradores.Asexpectativasforamasmaisvariadas,poispesquisarnãoé tarefa fácilenãosesabiacomoseriaaaceitaçãodoprojetopelacomunidade,qualadisponibilidadedosnarradoresemcolaborar.

    Nesta etapa da pesquisa, partimos da premissa apresentada por Cliffort(1998, p. 24-25) quando afirma que “A observação participante obriga seusparticipantes a experimentar, tanto nos termos físicos quanto intelectuais, asvicissitudesdapesquisa[...]aetnografiaémarcadaporumaacentuadaênfaseno poder da observação”. Logo nos faz crê que a observação participante éumadaspartesmaisimportantesnaetnografia.

    De maneira geral foram utilizadas três estratégias: a abordagemqualitativa, a observação participativa e a etnografia que, somadas,proporcionaram a sistematização das práticas lúdicas na comunidadeTabalascada.

  • A partir de várias leituras e interpretações, as práticas lúdicas sãoencontradas em várias culturas. Desde os tempos primitivos, a ludicidade éinerente à natureza dohomem, seja qual for sua origem. Isso nãogarante omesmo nível de importância à dimensão lúdica nas diferentes sociedadeshumanas,pelofatodehaverumagrandevariaçãoencontradanomodocomosãorepassadososjogos,asbrincadeiras,asdanças,aculturaeprincipalmente,asocialização.

    Por ser variável a organização da vida social e individual, estudiososcomentados nos capítulos anteriores, consideraram que o lúdico é umelementoimportanteparaodesenvolvimentodoserhumanoeessesresultadoscomeçamaprovocarmuitasreflexões,emvárioscamposdasciênciassociais,dapsicologia,sociologiaeantropologia.

    Para o levantamento etnográfico recorremos às indicações dos própriosmoradores,oquefoimuitoimportante,porquesereferiamaosseusvaloresepertenciam ao seu universo sociocultural. Ninguém melhor do que osindígenas que vivem em contato direto com as matas, rios, convívio docotidiano familiar - lugares onde vivenciaram e vivem até hoje suasexperiênciascomosparenteseantepassados,osquaisforamlembradoscommuitorespeito,oraseviaatélágrimasemseusolhos.

    Homens e mulheres simples, de corações abertos, aposentados,professores,farinheiros,roceiros,quedispuseramdeseustemposparanarraroqueconhecemmuitobem.Paraeles,fazerpartedestainvestigação,foivoltaraopassadocomminuciososdetalhes.

    Agendar com antecedência, para que não houvesse desencontros, éestratégia a que o pesquisador deve estar atento, pois nem sempre adisponibilidadedosnarradorescoincidecomaurgênciadapesquisaempauta.Compartilharsuashistóriasemsuasnarrativastãosingelasericasemdetalhesproporcionou momentos de alegria, satisfação, lembranças e plateiaparticipativaaoredor.Apresentamos,aseguir,cadaumdosnarradores:

    Na casa do senhorAlderisio (Wapixana, 67 anos), quemme levou foi ofilho dele, o Aldenisio. Fui bem recebida pela sua esposa, Dona3 Chica,dizendoqueeleestavapararoça,masqueeumesentasseparaesperar,assim

  • fiz.Logoelechegou,oferecendotucumãsefarinha.Falei-lheoquedesejava,emarcamosodiadenossoencontroocorridonodia16defevereirode2013.

    Na casa da Dona Cezarina (Wapixana), mais conhecida por dona Nega,apresentei-me a ela quando estava na casa da farinha.Com algumas filhas enetosfaziamfarinhaeraspavammandioca.Sentei-meetambémfuiparticipardo trabalho. Conversando comDona Cezarina, marcamos para o dia 16 defevereiro de 2013. Como combinado, ao chegar, ela estava a minha esperatodaarrumada,nãotinhanemidopararoçaporquetinhaessecompromisso.

    AochegaràcasadeDonaMariaAlaíde,nodia19demarçode2013,fuibem recebida, conversamos umpouco sobre o objetivo daminha visita.Elapropôs em fazer naquele dia mesmo. Dona Alaíde foi relembrando suainfância com muito entusiasmo e emoção que, ao narrar, as lágrimas iamrolandoemseurosto,sempremeseurosto.

    Nodia18demarçode2013,foiodiamarcadoparafazerparanossavisitanacasadoSeuMelquior.Aochegarfuidiretoparaacasadefarinha,ondeaesposa, anoraeosnetosestavam,mas seuMelquiorestavadormindonumarede na varanda da sua casa, foram chamá-lo e começamos o trabalhotomando caxiri. Durante nossa conversa, ele me fez um pedido para irmosbuscarlenha,nodiaquecombinamosformos,foiumaalegria,porqueelesjáestavamsemlenhaparafazerfarinha.

    A vista à casa do Senhor Cesar fui por duas vezes para marcar asgravações das narrativas e não o encontrava. No dia 21 demarço de 2013,quando cheguei a sua casa, fomos conversar sobre a minha pesquisa paramarcar omelhor dia. Logo, ele disse que eramelhor que fosse naquele diamesmoporqueeradifícil encontrá-lo emcasa, só estavanaquelediaporqueestavafaltandoáguanacomunidade.

    NodiaemquefuiàcasadeDonaCléia,jáestavadesaídaparaseusítioepediuqueeuvoltassenopróximofinaldesemana,nosábadoporqueelavinhapara sede só aos finais de semana para participar da missa no domingo,voltava à tarde para suas plantações e criações. Assim o fiz, no dia 24 demarço de 2013, com uma plateia imensa de filhos, netos e outros parentesiniciamosnossaconversa.

  • Dona Rosilda, primeira Macuxi a morar na comunidade indígenaTabalascada,resideumpoucoafastadadasede.Aochegaràsuacasaelaestavaumpoucodoente,poistemdiabetes,conversamosemarcamosumadata,masnodiaquemarcamos,infelizmente,elatinhaidoparaohospitalcomglicosemuito alta.Voltei no dia 21 demarço de 2013,mas ela ainda estava doente,mesmoassimmerecebeucommuitaalegriaefalouqueíamosassimmesmorealizarasatividades.

    SemprequeencontravacomoProfessorVitor,eleestavaocupado, falouqueeramelhornosencontrarmosaosfinaisdesemana.Nodia05dejunhode2013,chegueiàcomunidadeepergunteisepodíamosfazerasgravações,elefalouquesim.Quandochegueiasuacasaelejáestavadeitadoemumaredenacasadefarinhaelogocomeçamosaconversar.

    AcasadosenhorTennyson(Macuxi),porserumasdasprimeirascasasdasededacomunidadesemprepassavaporali.Nodia05dejunhode2013,pareiparaconversarcomeleparapudéssemosouvirsuashistórias,enoentusiasmoouvimosseusrelatosnomesmodia.

    Ao chegar à casa do Seu Cosme, no dia 17 de fevereiro, foi marcadoantecipadamente, ele não estava, mas ouvia um barulho de machadada bemperto e fui em direção do barulho, lá estava o senhor Cosme fazendo umaderrubadaparaesperarotratorparaararaterraparaelefazersuaplantação.Fomosparaacasadeledurantenossaconversa,elesempreestavalembrandooquejátinhavivido.

    Duranteosencontroscomosmoradores,eracomumnossolicitaralgum

    tipodeajuda,taiscomolevaralguémaomédico,buscarlenha,levarmandiocadeumaroçapraoutra,buscarmandioca,entreoutros,istoporqueocarro(domeupai)queutilizeipara fazer asvisitaspossui carroceria.Nesse convívio,ficaram muitas lembranças e boas amizades que jamais poderão ficar noesquecimento.

    Apóseuterdeixadoesclarecidoosobjetivosdapesquisa,osmoradoresdacomunidadeforamcontandosuasinfâncias,brincadeiras,brinquedos,fazendoumacomparaçãocomamodernidade,alémdetransmitiremnosrelatosoque

  • ouviamdeseuspais.O interessanteéque todossempreprocuravamtambémfalarumpoucosobresuasvidas.

    Ressaltamos que os relatos são encarados como pontos de vista dashistóriasvividas, acontecimentosque se compõemeconstroemvidas.Sendoassim,nãoserão identificadosnelesverdadesoumentiras,esimumaversãodosfatos,“[...]amemória repassadaporessasociedadede tradiçãooralnãosão uma memória literal, e sim narrações adaptadas.” (LE GOFF, 1996, p.429).

    A memória faz o homem lembrar acontecimentos vividos, que por sua

    razão, foram significativos e marcaram sua existência num determinadoperíodo.

    [...]Amemória,ondecresceahistória,queporsuavezaalimenta,procurasalvar o passado para servir o presente e o futuro. (LE GOFF, 1996, p.423;483).

    Nesse sentido, o entendimento de Le Goff (1996) é de que a memóriapermite a sobrevivência do passado, não existe uma memória espontânea everdadeira,amemóriasempreestabeleceumrecorteseletivo.Nocontextodasnarrativaselaspassamagarantirumacontinuaçãodoprocessohistóricoeasmemórias, individuais ou coletivas dão suporte para que a história secaracterizeviva,sãovivênciaseexperiênciasqueossujeitosvivenciaram.

    LembrandodequeaênfasemaiornasnarrativassobreaspráticaslúdicasnaComunidadeIndígenaTabalascadaampliou-se,poisquesãosereshumanosesuaspresençasnasnarrativaspermitemumarealizaçãoplena.Sabemosqueao transcrever estamos colocando seupensamento oudooutro nopapel, noentanto,“[...]avozéoverboencarnadonaescritura.” (ZUMTHOR,1993,p.113).Ouseja,avozécorpo,é linguagem,é ritmo,avozparticipadanossaindividualidade,aomesmotempoemquenosfazsersocial.

    Apesardetermosconhecimentodequeaspráticaslúdicasindígenasestãotambém marcadas pelos deveres e afazeres, no qual estão presentesdiretamenteos jogos ebrincadeiras, de certa forma,passama ter limitesourestrições quanto ao tempo livre dos afazeres para o lazer, tempo fora da

  • escola tanto na infância como na juventude, tempo de descanso para osaposentados, entre outros. Essa realidade não está distante da comunidadeindígena.

    Mesmo que se tenha idealizado esses tempos como adequados paraadquirir a experiência das práticas lúdicas, sempre se depende deoportunidadesqueofereçamtantoasociabilidade,quantoacriatividade,bemcomo o prazer. Tudo que contemple o desenvolvimento dessas experiênciasentre crianças, jovens e adultos, para quem a existência dessas práticas nãoapenas propõe a sobrevivência da cultura, provocam também, qualidade noprocessodeinteraçãocultural.

    Por ser a seletividade uma das características da memória, não foiignoradoofatodequeonarradornahoraderelatarsuaslembrançasagedemodo seletivo. Nesse sentido, sabemos que, nenhuma narrativa é completa,fechada, pois em função de uma série de questões se realizam recortes, seretira sentidos, institui silêncio (MONTENEGRO, 2007). Foi pontuado aosnarradoresparticipantesdestapesquisaqueaotrabalharcomhistóriasdevida,anarrativadeve ser livre,nãoestarcondicionadaacritérios,poiséomodocomo pretendemdeclarar suasmemórias que sejam relatadas e assim comoqueiramregistrar(BOSI,2006).

    TodososdiasvivenciadosnaComunidadeforamparticipandodetodasasatividades do cotidiano. Foram feitas anotações, filmagens, fotografias dasbrincadeirasdascrianças,dasatividadesqueos jovense adultospraticavam,semprelevandoemconsideraçãoaspráticaslúdicasqueeramrepassadasparatodos.Por ser indígena e ouvindo as narrativas, vieram lembranças boas domeu tempodecriança,oque foimuitobom, àsvezes eu intervinhae falava“dessa brincadeira também brinquei”, assegurando mais ainda importânciadosrelatos,asexperiênciasdosnarradores,queserviramcomoumaligaçãoparasecontarasexperiênciasdehoje,poisoquesecontahojefazrefletiroqueasoutraspessoasvivenciaramnoseupassado.

    Nesse sentido, utilizamos gravações em vídeo, pois todas as vezes queiniciávamos as nossas conversas, nos contavam inicialmente suas vivências,reconstituindo cenários, ambientes, relembrando os nomes dos amigos,parenteseparticipantesdassuasmemórias.Asgravaçõesemvídeofacilitaram

  • paraquepudéssemosdemonstrarasperformancesdashistóriascontadaspelospróprios narradores, pois o caráter performativo é um elemento que nãopoderiadissociar-sedahistórianarrada.ComoZumthor(1997,p.247)afirma“[...] a performance configura uma experiência, mas ao mesmo tempo é aprópriaexperiência.Acreditamosqueostrabalhosqueresultamemproduçõesescritasacabamseafastandodaexperiênciadosnarradores”.

    Asanálisesdesenvolvidasneste capítulobuscamdar resposta àsquestõesnorteadorasdapesquisa,ouseja,comosãorepassadasaspráticaslúdicaseseatualmentesãopraticadasnacomunidade.Para tanto,buscamosevidenciaraspráticas lúdicas tradicionais e as interferências da modernidade, e aimportânciadessasatividadesnocotidianofamiliareeducacional.

  • ConhecendootradicionaleomodernonaspráticaslúdicasnaComunidadeIndígenaTabalascada

    As práticas lúdicas estão presentes em todas as fases da vida dos seres

    humanos, tornando-se indispensáveis para o desenvolvimento mental,intelectual e social. De alguma forma o lúdico se faz presente.Compreendemosqueosjogoseasbrincadeirastradicionaiséumamodalidadeespecífica da cultura lúdica de determinadas épocas e lugares, conservandocaracterísticas e particularidades de umpovo, emumdeterminadomomentoda história, assumindo significados que dependem do contexto socioculturaldereferência(KISHIMOTO,1999).

    As práticas lúdicas que existiam na comunidade Indígena Tabalascadaaparecemalgumasacompanhadasdosadultos, issoporqueelesensinavamascrianças e orientavam para a vida cotidiana, permeadas pelos mitos, pelosensinamentosdosmaisvelhos,entreoutroselementosdaculturapeculiaresacadaetnia.EntreosWapixanaeMacuxi,asbrincadeiraseosjogosaparecemcom frequência tanto nas narrativas como na vivência, o que foi observadoduranteascoletascomosadultos,enquantoascriançasestavambrincando.

    Nesse sentido, houve contato com diferentes colaboradores, sendo esteshomens e mulheres, com idade entre 40 a 86 anos. Em suas narrações, osindígenascontamsobresuas infâncias,brincadeiras,brinquedos, jogos,alémdetransmitiremosrelatosdotempodeseuspaiseavós.

    Benjamim(2002),emseusestudoscolocaque,quandosepassaarefletirarespeito dos brinquedos e dos jogos, assim como omundo da infância estácheio das marcas do mundo adulto no qual as crianças se inserem, sãocolocadosàdisposiçãodacriançapelomundoadultosóadquirindoconotaçãodebrinquedoquandoelafazainteraçãocomsuaforçaimaginativa,quepassaa ser despertada ou desenvolvida pela tensão que trava como o

  • brinquedo/brincadeira. Essa ideia é complementada por Almeida (2006, p.544) que, ao estudar o brinquedo e a cultura do brincar, fundamentado emBenjamim,ressaltaqueanaturezapertenceàsmúltiplasfacesdobrinquedo

    [...] imprime-lhe um caráter mais que material: a simbologia deste

    instrumentodebrincaratravessaafronteiradofísicoemdireçãoaoespirituale faz dele um instrumento que promove interação, diálogo [...], além depossibilidadeslúdicasedesociabilidade.

    A ideia do filósofo, fazendo a relação entre o brinquedo, à criança e o

    adulto, está presente nas falas dos moradores da Comunidade IndígenaTabalascada,comnarrativasbemclaras,comasqueseguem:

    [...] A gente brincava com meu irmão de arco e flecha. Flechava todobichinho que a gente encontrava por ai. Flechava os peixinhos também queencontrava. Você sabe né que a brincadeira do índio era assim (informaçãoverbal)4 .

    [...]Voufazerumcarro,agentepegavaocaranã5, faziaa roda,colocava

    tipooeixoda roda.Aipegavagarrafaprapuxar tambémcomose fosseumcarro,elepegavaminhasbonecasdemilho,bonecademandioca,aicolocavanocarro,agentetinhavontadeterascoisas[...]comomeuirmãosóbrincavamesmodefazerroça,decozinhar,deasarascoisas,comoamamãefazia,nósfazia também. [...] Vamos caçar, essa brincadeira gerava coisa verdadeira,porque ele dizia assim vamos caçar e a gente ia mesmo, nós matava tatu,matavacutia(informaçãoverbal)6.

    [...]Agentefaziapanelinhadebarro,agentefaziabonequinha,osanimais,

    vovó fazendoo dela né, carregavabarro dela pra gente fazer a nossa parte,porque ela, ela brigava comnós, o barro criança não brincava (informaçãoverbal)7.

    [...] Brincava de talinha de pau pra fazer um cercado pra os boi, aí nós

    colocavapegavamangaverdinhaeraonossogadoaíagentefazia,tiravataladeburiti,nãoeradenajá8não,ainóscolocavaperna, ficadentrodocurral,colocava quebrava pedacinho de pau pra fazer o curral, nós fazia pra genteceradeabelhaefaziacabeçadeleredondoosolhos,epernaebraçoai já iapro curral, faziamuito ficava em pé ai a gente brincava de curral. [...] Nós

  • juntavafrutadão9poraiprapoderbrincar,odãoeraanossabola,aíagenteamontoava, jogavapracimaaioutropegava,outronãopega,odão tambémera a nossa peteca, tinha muito, naquele tempo não tinha bola (informaçãoverbal)10.

    [...] A gente inventava um avião, a gente colocava muito pena, a gente

    colocavapenanosabugoquebravasabugonomeio,nãotemaquelefofinhonomeioagentecolocavaaquelerabodegalo,quemamãematavaàsvezesgalo,galinha,assim,agentefaziaummonte,prajogar(informaçãoverbal)11.

    [...]Aprimeira caçaquematei tinhaoito anos, sete anosmaisoumenos,

    assimguiadoporela(avó)[...]Ele(pai)ensinavaaflechar,faziaumarodaecolocavaumacoisaaomeiopragenteficarflechandooqueacertava,eleerarespeitado(informaçãoverbal)12.

    [...] O carro de boi, caranã,madeirinhas, sabugo demilho, e usava essa

    imaginação com as latas de conservas, de sardinha que era a carroceria docarro(informaçãoverbal)13.

    Omundodoadultopresentenosrelatoseraummundopróximoaomundodascrianças,pois avidaacontecianoentornodasmoradias,nas roçasondepassavam muito tempo com seus filhos. Naquele período, produziam suasubsistência nas casas de farinha, no mato com a caça, ou nos rios com apesca,desdecedojáparticipavam,dealgumaforma,destasatividades.Assimsendo, brincar de caça e pesca, arco e flecha, o carrinho de sardinha, umaimitaçãodocarrodebois,construçõesderoça,fazercoisascombarro,todosos objetos pertencentes ao universo adulto e utilizados nos afazeres,constituíamumabrincadeiracomreferênciaaomundodoadulto.

    OfatodeSeuCosme,DonaCezarina,DonaMariaAlaíde,DonaRosilda,Seu Vitor e do Seu Tenison, quando crianças, em suas práticas lúdicasconstruírem brinquedos que imitavam o mundo do adulto demonstra acapacidade de criação e imaginação que as crianças possuem, além deconfirmaraatraçãopelomundodoadultoqueascriançastêm,nãosetratadeumacópiaemminiaturasimplesmente,esimdeummundorecriadoparaosseus interesses, suasbrincadeiras, representações reais e simbólicasque lhesremetemaoprazer,àconstrução,aoconhecimento.Emrelaçãoaesseaspecto,

  • Vygotsky (1998, p. 137) afirma“[...] a essênciadobrinquedo é a criaçãodeuma nova relação entre o campo do significado e o campo da percepçãovisual, ou seja, entre situações no pensamento e situações reais [...]”, sendoassimquandoascriançaspassamacriarnoseumundo,pormeiodaproduçãodeminiaturas domundo dos adultos, amargem de liberdade, imaginação ecriatividadeaumentam.

    A importância do brincar para a criança é uma construção histórica,quandobrincaexperimentasensaçõesantesdesconhecidas,entranomundodoadulto, reproduz as relações sociais e de trabalho de forma lúdica e seapropria domundo em seu processo de construção como sujeito histórico-social. SegundoVygotsky (1998) o brincar cria a zona de desenvolvimentoproximalnacriança.Sejapelacriação,pela imitaçãoouaindapeladefiniçãoderegrasespecíficas.

    As brincadeiras tradicionais são passadas de geração a geração,modificadascomoopassardotempooupodempermanecerdamesmaforma.Essasbrincadeirassãofiliadasaofolcloreeincorporamaculturapopular,sãotransmitidasoralmenteepossuemcaracterísticasdeanonimato,permanecendona memória das crianças. A origem de tais brincadeiras é desconhecida,ninguém conhece a origem da amarelinha ou do pião. “Por pertencer àcategoriadeexperiênciastransmitidasespontaneamenteconformemotivaçõesinternasdacriança,abrincadeiratradicionalgaranteapresençadolúdico,dasituaçãoimaginária.”(KISHIMOTO,2009,p.39).

    Foi possível compreender a ludicidade presente nas narrativas ligadastambémàspráticasdegeraçõesanteriores,comsuasexperiênciasvividascomjogos e brincadeiras tradicionais, narrando sobre as brincadeiras querealizavam, com irmãos, parentes e outros moradores da comunidade.Apresentamosalgumasdestasnarrações:

    [...]Asbrincadeirasdosmeninoseracavalodepau,entãopião(informação

    verbal)14 .[...] Quando juntava todas as crianças, a gente brincava de roda, a gente

    brincavadebombarqueiro,bombarqueiro,naquele tempo jáagentevia,ascriançasdeBoaVista,nãodeondevinha,euseiqueensinavamagente,afazer

  • bombarqueiro,oquemaisagentebrincavaeraderoda,juntavamuitagente,muitascrianças,vamosbrincarderoda,tantalaranjamaduramaninhaquecorsão ela, então, era de brincar de cirandinha eu lembro que a gente brincavacomasoutrascrianças(informaçãoverbal)15.

    [...]Brincavamaisnofinaldesemana,brincavadepapagaio,apipané?.Eu

    vi um rapaz fazer [...] Brincava todo mundo junto, menina e menino dabrincadeirade ratocomgato.TudoemWapixana16.Eunão sei quem trouxeessasbrincadeiraspracá.Abrincadeirademanja,deseesconder,agentenemsabiaoqueerapolicia,agentebrincava(informaçãoverbal)17.

    [...] A gente brincava de roda, tudo em Macuxi18, né? (informação

    verbal)19.[...] As brincadeiras que papai ensinava era sempre tinha momento, não

    tinhanadapra fazer, ajuntavamuitacriançabrincavade roda,brincadeiradecaça e o caçador, a brincadeira de resistência, a luta corporal, já começavaaprenderdesdecriança(informaçãoverbal)20.

    [...]Onossocabodeguerrananossabrincadeira comosnossos amigos

    eraocipóescadadejabuti21,papaitiravanamataetraziapragente,eletraziaaíagentetinhaessanossadiversão(informaçãoverbal)22.

    As falas dos narradores descrevem suas vivências, momentos da vida

    cotidiana, brincadeiras tradicionais, lembranças que constituem suasidentidadesindividuaisecoletivas.Apesardeseremosnarradoresadultos,emalgumasobservaçõesparticipativas,ascriançasestiverampresentes,orapelapartedamanhãeorapelaparteatarde,devidoaoturnodasaulasnaescolanacomunidade.

    Oritmodaspráticaslúdicaséintenso,presentenasatividadesdiárias,poisascriançasnãogostamdeficarsemsemovimentarem.Aidaàroçaaconteceunodiaemquesolicitaramque levassealgunsmoradoresdeumacasaparaaroçadeles.Nestedia,aochegarparairàroçaascriançasestavamcontentes,foiumaalegriasó,algunstiveramqueficar,porqueocarronãocomportavaatodos.Naroça,foramalgumashorasarrancandoamandiocaefazendomontesdemanivaparaseremcarregadosparaocarro.

  • As crianças da comunidade não têm hora para praticar a ludicidade,costumam brincar diariamente deste o amanhecer até ao anoitecer. Sempreestãoenvolvidasnopreparodafarinha,emumarodadepessoas(FIGURA1)elas estão também, no descascar da mandioca, no colocar a mandioca demolho na água, no colocar a massa para torrar no tacho, por elas mesmasparavam,começavamabrincar(FIGURA2)edepoisretornavamparaarodadafarinhadanacasadeforno.

    Figura1-Criançaparticipandodotrabalhodafarinhada

  • Fonte:Aautora(2013).Algumas crianças, principalmente as meninas vão ajudar no trabalho

    doméstico. Já alguns meninos maiores vão para a roça colher mandioca eplantar maniva23 (FIGURA 3), acompanhar seus pais na caça, na pesca ealgumasvezesjásejuntamdois,trêsoumaisevãosozinhoscaçar.

    Figura2-Criançasbrincando

  • Fonte:Aautora(2013).Figura3-Criançaeadolescentesparticipandodacolheitadamandiocae

    maniva

  • Fonte:Aautora(2013).Certaocasião,aopassardeumacasaparaoutraobserveialgumascrianças

    brincandodefazercasinha(FIGURA4),nestediaeraquaseumahoradatarde,osolestavamuitoquenteepareciaumahoranormalparabrincarem.

    Figura4-Criançasconstruindoumacasinhaparabrincarem

  • Fonte:Aautora(2013).Ao observar as Figuras 5 e 6, aparecem bonecas industrializadas,

    diferentementedecomoeramasbonecascomquebrincaramosnarradores:[...]agenteinventava,fazendobonecovelhodepapel,desabugodemilho,

    né?Fazia bracinho, fazia cabelo tudomesmo a gente inventava (informaçãoverbal)24 .

  • [...] quando já tava o milho grande, já tinha macaxeirinha, maninha voufazerbonecaprati,aífaziabonecademandioca,demilho,quandoomilhoeranovo, ele fazia cabelo vermelho, cabelo branco, ele mesmo colocava osbracinhos,aspernas(informaçãoverbal)25.

    [...] A minha irmã tinha as bonecas feita tudo de sabugo de milho com

    pedaço de madeirinha e usava as sementes das frutas, da castanha do caju,aquilo a gente transformava eles como nosso brinquedo do nosso dia a dia(informaçãoverbal)26.

    A brincadeira de casinha, que até hoje está presente entre as crianças,

    representamseuimaginário,osimbólicoqueconstróiomundoadultoesuasrepresentações. Enquanto brincam, elas estão interagindo o tempo todo,experimentam papéis diferentes, com variedade de atitudes sociais,reproduzempráticasqueobservamentreosadultos,daíadvémoaprendizadodaimportânciadasrelaçõesentreoshumanose,sobretudo,omundodecoisasqueenvolvemoviveremsociedade.

    Figura5-Criançabrincandodecasinhacomsuaboneca

    Fonte:Aautora(2013).

  • Nunes (1997), em sua dissertação de mestrado em antropologia ao

    observar as crianças na aldeia A’uwé-Xavante, aponta que no ato destabrincadeira, elas estariam ampliando práticas para serem relacionadas àsoutrasculturas.

    A ‘brincadeira de casinha’ oferece imensas possibilidades de reflexõessobreleituraqueacriançafazdasuasociedade,desdeogrupodomésticoatéouniversodetodasasrelaçõescomunitárias,elaborando-as,reformulando-aseexpressando-as, manifestando apreensão de traços culturais através de umapráticamaiscomumentreascriançasdetodasasculturasedetodasasépocas.(NUNES,1997,p.197).

    Assim, de uma forma ou de outra a criança está inserida em umabrincadeira de faz de conta, por exemplo, quando usa sua imaginação parabrincar comoutras crianças de papai,mamãe e filhos, distribuindo papéis eincorporando outros. Elas passam a realizar entre si um tipo de interaçãosocial que é de suma importância para sua formação enquanto pessoa,realizando trocas variadas quando riem, se desentendem, choram ou trocamcarinhosquesósãopossíveisnumasituaçãoimaginária.

    Figura6-Criançabrincandodeboneca

  • Fonte:Aautora(2013).DonaCléia(2013)dizque:“[...]Brincavaassimtambém,osmaisgrandes

    eraonossopai emãe, faziao casal, agoraosmaismiudinhos eramnossosfilhos(informaçãoverbal)”.

    Comoadventodastecnologiasdeinformaçãoemeiosdecomunicaçãodemassacomoatelevisãoeinternet, jádisponíveisnascomunidadesindígenas,

  • muitas crianças acabam deixando as brincadeiras tradicionais e buscam olúdicoemjogosdecomputadores,decelulareseembrinquedoseletrônicos.

    A cena (FIGURA 7) foi observada na casa do Seu Fausto, morador dacomunidade. São seus netos que já utilizam a tecnologia, gostam muito dejogar no computador, celular e ficam com frequência na frente da televisãoassistindoaosvídeosdedesenhosanimadosefilmesinfantis.

    Figura7-Criançasjogandonocelular

    Fonte:Aautora(2013).Certa ocasião, ao chegar numa casa da comunidade, observamos um

    menino que estava com uma baladeira27 tentando balar passarinhos que

  • pousavam nas árvores, perguntei para a avó dele por que ele queria ospassarinhos;elame respondeuque ia fazerumcocardaspenasparausarnasemanadospovosindígenas.Hoje,aindaécomumabrincadeiradabaladeira(FIGURA 8), veem-se sempre os meninos com essas penduradas em seuspescoços.SeuAlderisiocolocacomoeleviupelaprimeiravezeoqueachoudessabrincadeira:

    [...]baladeiraeuvimconhecerdepoisdegrandequeaiopapaifoiemBoa

    Vista, trouxe do comércio, mas não achei muito bom não sabe, balar debaladeira,pramimmaiseraflecha,é,pramimeraflechamesmo,flechavaeviaobichocaicomfecha,baladeiranãoaprendibalarmuitonão,useipoucobaladeira(informaçãoverbal)28.

    Figura8-Criançabalando

  • Fonte:Aautora(2013).Os jogos são práticas culturais lúdicas que se inserem no cotidiano das

    sociedadesemdiferentespartesdomundoeemdiferentesépocasdavidadaspessoas.Poroutrolado,elestambémcumprempapéisdiversosrelacionadosàexpressão da cultura dos povos. Kishimoto (2009, p. 17) exemplifica taldimensão históricamostrando que “[...] se o arco e a flecha hoje aparecemcomo brinquedos, em certas culturas indígenas representavam instrumentos

  • para a arte da caça e da pesca [...]” (FIGURA 9), ou seja, que o brinquedorepresentaumadasmaneirasdeguardarhistóriadahumanidade.

    Figura9-Criançabrincandodeflecharparaacertarnoalvo

    Fonte:Aautora(2013).

  • Oarcoeaflechasãoinstrumentosquefazempartedaculturadasdiversas

    etnias indígenas. Eram utilizados não somente para as disputas em festascomemorativas, mas com objetivo de instrumentalizar a sobrevivência pormeio da caça e pesca e para proteção da comunidade, pois foramutilizadoscomoarmaemconflitoscomoutrospovos.Astécnicasnecessáriasaoseuusosão aprendidas nessas sociedades por meio de jogos e brincadeiras quedesenvolvem habilidades específicas desde muito cedo, na infância(ALMEIDA,2008).

    Oautorreforçaaindaqueapósocontatocomonãoíndioeaassimilaçãode uma série de comportamentos culturais, algumas etnias mantêm o usodesses instrumentos com outros sentidos, enquanto outras não têm mais ocostumede“flechar”.

    Interessante narrar também duas práticas lúdicas presenciadas por váriasvezes, chamada de taco (FIGURA 10), as crianças gostam muito dessabrincadeiranacomunidade.Abrincadeiradotacopornãoserumabrincadeiratradicional,vindadeoutropaís, já émuitoconhecidaporoutrascriançasdeoutrasetnias.

    Figura10-Brincandodabrincadeiradetaco

  • Fonte:Aautora(2013).Outra brincadeira é roda corda, também não tradicional indígena, mas

    muitoutilizadapelascriançasnacomunidade.

  • Esta brincadeira de roda corda (FIGURA 11) as crianças gostammuito,brincamentressi,éumdivertimento,todosqueremganhar,poislutamparaacordanãotocarnaspernas,ficambrincandohoras.

    Figura11-CriançaBrincandodabrincadeirarodacorda

  • Fonte:Aautora(2013).Uma prática lúdica vivenciada todos os dias nesta comunidade pelas

    crianças (FIGURA 12), feminino (FIGURA 13), adolescentes (FIGURA 14),jovenseadultosdosexomasculino(FIGURA15),éofutebol.Todasastardesapráticadojogodefuteboléexercitada,existemdoiscamposumgrandeeumpequeno feitospor elesmesmos.Em todas as festasde comemoração fazem

  • campeonatos,adquirempremiaçõesvariadasdesdedinheiroatérefrigerantes.A paixão é tão grande pelo futebol, que esse jogo é apreciado até pelascriançasqueestãocomeçandoadarseusprimeirospassos.

    Figura12-Bebêbrincandocomboladefutebol

  • Fonte:Aautora(2013).ObservandoosrelatoseasFiguras(12,13,14e15),observamosqueera

    muito diferente de como brincavam e com era a bola de antigamente:DonaCléia,Sr.TenisoneDonaRosildacomentam:

    [...] Nós juntava fruta dão29 por ai pra poder brincar, o dão era a nossa

    bola,aíagenteamontoavaejogavapracimaaíoutropegava,outronãopega,odão tambémeraanossapeteca, tinhamuito,naquele temponão tinhabola(informaçãoverbal)30.

  • [...]Anossabolanessetempoagenteamarravaváriospedaçosdepanoe

    fazia a nossa bola, que a gente brincava o nosso futebol aimesmo em casa(informaçãoverbal)31.

    [...] A gente fazia bola de palha de milho de todo tamanho (informação

    verbal)32.Figura13-Mulheresjogandofutebol

    Fonte:Aautora(2013).Figura14-Adolescentesjogandofutebol

  • Fonte:Aautora(2013).Figura15-Jovemeadultosjogandofutebol

  • Fonte:Aautora(2013).Algumas práticas lúdicas tradicionais estão entrando em desuso, sendo

    praticadassomentequandotemcomemoraçãonacomunidadecomoadisputade arco e flecha, cabo de guerra, teatro da homologação da terra, dança doparixara33,pularcorda.Ouvimosdeumaprofessoraquandoestavaensaiandoadançadoparixaranasaladeaulaque“[...]ascriançastinhamquelevarmaisasériooensaio,porestavamaprendendosuacultura”.

    A dança do parixara na comunidade Indígena Tabalascada não é maispraticadacomoantigamente,quandoeracomofestejodiárioapóso trabalhonasroçasdacomunidade,comemorarafarturadaplantaçãoouochamadodachuva.

  • Figura16-Comunidadedançandoparixara

  • Fonte:Aautora(2013).OSenhorCesareaDonaRosildanoscontamcomovivenciaramadança

    doparixaraquandoeramcrianças:

  • [...]Eununcadanceinaminhavidaessetaldeparixara,maseuviomeuspais dançar, mas assim não fazendo festa aqui assim pra dança do parixaracomo eles fazia: iamna roça, aí da roça quandovoltava é que se preparavatodomundo, fazia aquelas saias e tudo, aí vinha andando de lá pra cá, aí asmulheradasabiaqueestãovindo,vinhamencontrar.Nuncavifazerfestaparadançarparixaracomoagora(informaçãoverbal)34 .

    [...] nós dançava muito parixara, nossa dança, né? Antigamente deixada

    pelosantepassados,pranósconservemosoqueanossavidadeíndio,anossaetnia, valorizar o que é nosso, nossa fala, nossa dança, nossa vida, nossacomida, nossa bebida, tudo nós procura conservar. Quem era dançador erameuavô,dançavamanoite todinha, tinhacaxiri,natal,àsvezesanonovo,àsvezesemeventos,nasfestasnacomunidade.Dançavaatéodiaamanhecer.Osvelhos vão dançar até de manhã, as crianças assim como nós ia dormir(informaçãoverbal)35.

    Figura17-Mulherservindocaxirinadançadoparixara

  • Fonte:Aautora(2013).DonaRosildalembrou-sedecomoelesbrincavamadançadoparixara:[...] a gente brincava parixara, brincava a tucuia, areruia, tudo a gente

    imitavaosvelhostambémsabe,nósfazianossasaia,nossasaiadosvelhoseraolhodeburitibemesticadinhopalhadeburiti,anossaeradepalhadecoco,

  • folha de banana, assim pra gente fazer nossa festinha, nossa brincadeira eraassimnopassado(informaçãoverbal)36.

    As práticas lúdicas, vivenciadas hoje, pelas crianças da comunidade são

    bem variadas e quase sempre realizadas debaixo das árvores. Andar debicicleta(FIGURA18),brincarcomosanimaisdacasa(FIGURA19),fazembalançosnosgalhosdasarvoresparabrincarem(FIGURA20),gostammuitodesubirnasárvoresporprazere,àsvezes,parapegarfrutas(FIGURA21).

    Figura18-Criançabrincandodebicicleta

    Fonte:Aautora(2013).Figura19-Criançabrincandocomanimais

  • Fonte:Aautora(2013).Ascriançasdacomunidadebrincamdasmaisvariadasbrincadeiras:correr

    uma atrás das outras; subir nas árvores frutíferas para pegar frutas paracomerem,quandonão,subirsóparaterprazerdeestarsubindoedescendonasárvores; umas vão brincar de boneca; brincar com os filhotes de cachorro;andardebicicleta;seembalarnasredesnosbarracões;outrasvãoparafrentedatelevisãoassistiraosdesenhosanimados;e,umasatébrincarnosjogosdoscelularesdeseuspais.

    Figura20-Criançabrincandodebalançar

  • Fonte:Aautora(2013).Observamosaexistênciadebrincadeirascomunsentremeninosemeninas

    nasquaisparticipamjuntos,outrassãoespecíficas,sóparameninosehomens,sóparameninasemulheres.

  • Figura21-Criançabrincandodesubirnasárvores

  • Fonte:Aautora(2013).Gostamsempredeestar juntos.Todasessaspráticaslúdicasestãosempre

    presentes na comunidade toda, pois a presença de crianças nas casas éconstante.

    Dessaobservação,podemoscolocartambémquealudicidade,entreoutrosaspectos,édiversaentreospovos.

  • AscategoriasdolúdicodaComunidadeIndígenaTabalascada

    Após descrever as narrativas orais, as brincadeiras, os jogos e fazer

    análise das práticas lúdicas da Comunidade Indígena Tabalascada, aslembranças dos narradores apareceram e surpreenderam pela sua riqueza.Bosi(2006,p.81)nosfazrefletircolocandoqueamemóriatemumafunçãosocialquejamaispodeseresquecida:

    Umalembrançaéumdiamantebrutoqueprecisaserlapidadopeloespírito.

    Sem o trabalho da reflexão e da localização, seria uma imagem fugidia. Osentimentotambémprecisaacompanhá-laparaqueelanãosejaumarepetiçãodoestadoantigo,masumareaparição.

    Diante da citaçãodeBosi, a sistematizaçãodas práticas lúdicas narradas,

    bem como as que foram observadas diretamente, aparecem 30 (trinta)brincadeiras diferentes, que serão classificadas estas entre duas categorias:JogossimbólicoseJogosderegras.

    1ªCategoria:jogossimbólicosQuadro1-Jogossimbólicos

  • CATEGORIA PRÁTICASLÚDICAS OBSERVAÇÃO

    Jogossimbólicos

    Brincadeiradecasinha;Brincadeiradecarrinhodelatadesardinhaeconserva;Brincadeiradocarrinhodecapenga;Brincadeiradebonecasdemandioca,sabugoepalhademilho.Brincadeiradecasinha;Brincadeiradecarrinhodelatadesardinhaeconserva;Brincadeiradocarrinhodecapenga;Brincadeiradebonecasdemandioca,sabugoepalhademilho.Brincadeiradecasinha;Brincadeiradecarrinhodelatadesardinhaeconserva;Brincadeiradocarrinhodecapenga;Brincadeiradebonecasdemandioca,sabugoepalhademilho.

    Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,enasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,enasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.

    Fonte:Aautora(2013).Para melhor entendimento sobre os jogos simbólicos, apresentamos

    algunsconceitosdeteóricosdediversasáreasdeconhecimento.Maluf(2009,p.84)apontaqueosjogossimbólicossãoosquepossuemas

    seguintescaracterísticas:Liberdadetotalderegras(anãoseraquelascriadaspelaprópriacriança);

    desenvolvimento da imaginação e da fantasia; ausência de objetivos (brincapeloprazerdebrincar); ausênciadeuma rígidada realidade; assimilaçãodarealidadeaoeu(acriançaadaptaarealidadeaseusdesejos).

    Kishimoto (2009), por sua vez, coloca que asmeninas, ao brincaremosjogosdefazdeconta,reproduziamavidadoengenho,ondeasmeninasnegraseram tratadas como servas pela sinhazinha e que estes jogos sempre estãoligadoscomoresultadosdeprocessossociais:

  • O jogo simbólico auxiliava as meninas, tanto brancas como negras, acompreenderem a trama de relações de dominação na época e funcionavacomo mecanismo auxiliar para a incorporação dessas relações. A meninaescrava,desdepequena,emseupapeldeserviràsenhorabranca,obedecer-lhee a menina branca, em seu posto de mando, de administradora de negrasescravas.(KISHIMOTO,2009,p.46).

    Emsuaspesquisassobreasbrincadeirasindígenas,aautoraexplicaqueos

    indígenasao“[...]imitaranimaissãocomportamentosmísticostantodeadultoscomodecrianças, temreflexossimbólicosantigos.” (KISHIMOTO,2009,p.47).

    Nestaperspectiva,Vygotsky(1998,p.135)apontaque:A brincadeira fornece ampla estrutura básica para mudanças das

    necessidadesedaconsciênciacriandoumnovotipodeatitudeemrelaçãoaoreal.Nelaapareceaaçãonaesferaimaginativanumasituaçãodefaz-de-conta,acriaçãodasintençõesvoluntáriaseaformaçãodosplanosdavidareal.

    Vygotsky (1984) elenca os elementos fundamentais da brincadeira como

    sendo:asituaçãoimaginária,aimitaçãoeasregras.Segundoele,semprequeaobrincar,acriançacriaumasituação imaginárianaqualassumeumpapel,que pode ser, inicialmente, a imitação de um adulto observado. Assim, acriançacriaregrasdecomportamentoqueestãoimplícitasesãoculturalmenteconstituídas.

    De acordo com as concepções de Maluf, Kishimoto e Vygotsky,verificamos que o jogo simbólico sofre algumas modificações diante daproporção que a criança vai progredindo em seu desenvolvimento e osimbolismo faz parte da representação corporal do imaginário, utilizandoregras,apesardepredominarafantasia.

    Issoquerdizerque, aodesenvolverum jogo simbólico, a criança ensaiacomportamentosepapéisematividadesdosadultos,atécolocaregras,ensaiaatitudes,valores,hábitosesituaçõesdiversas.

    2ªCategoria:jogosderegrasMaluf (2009, p. 85) apresenta os critérios para enquadrar os jogos de

    regra,sendonecessárioque:

  • Hajaumobjetivoclaroaseralcançado;existamregrasdispondosobreeste

    objetivo;existiamintençõesopostosdoscompetidores;hajapossibilidadesdecada competidor levantar estratégias de ação. Nos jogos de regras existe oprazer do exercício, o lúdico do simbolismo, a alegria do domínio decategorias espaciais e temporais, os limites que as regras determinam asociabilizaçãodecondutasquecaracterizamavidaadulta.

    Segundo Piaget (1978, p. 29), “[...] os jogos de regras são a atividades

    lúdicasdosersocializado”.Ouseja,pormeiodosjogosderegras,acriançaassimilaanecessidadedecumprimentodasleisdasociedadeedasleismorais.

    Para Macedo (1995, p. 8), os jogos de regras constituem-se em “[...]formas democráticas de intercâmbio social entre crianças ou adultos”. Énecessáriaumaconsideraçãorecíproca,sendoatransgressãodasregrasumafaltagrave.Osjogadoresdependem,assim,umdooutro,sendoacoletividadeumcaráterprópriodessaestrutura,alémda importânciadodesenvolvimentoda criança ao formular estratégias no decorrer da atividade, enfim, serhabilidosonahoraqueestiverexecutandosuasjogadas.

    A partir dessas citações podemos dizer que os jogos de regras sãonecessáriosparaqueasconvençõessociaiseosvaloresmoraisdeumaculturasejam transmitidos a seus membros. Assim, as crianças ao brincarem,constroem a consciência da realidade e, ao mesmo tempo, vivenciam apossibilidadedetransformá-la.

    Quadro1-Jogosderegras

    CATEGORIA PRÁTICASLÚDICAS OBSERVAÇÃO

    BrincadeiradaRaposa;DançadoParixara;Brincadeiradepularcorda;Brincadeiradepeteca;Brincardepularnorio,igarapé;Brincardesubiremárvore;Brincadeiradepularcorda;BrincadeiradoBalanço;Brincardeandardecavalo;Brincardeandarde

    Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,bemcomonasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.Todosesses

  • JogosderegrasJogosderegrasJogosde

    regrasJogosderegras

    cavalo;Brincardeandardebicicleta;Brincardecorreratrásdeanimais;Caçar;Pescar;Arcoeflecha;Atirarcombaladeira;Atirarcomzarabatana;Lançarpedrasnaágua.BrincadeiradaRaposa;DançadoParixara;Brincadeiradepularcorda;Brincadeiradepeteca;Brincardepularnorio,igarapé;Brincardesubiremárvore;Brincadeiradepularcorda;BrincadeiradoBalanço;Brincardeandardecavalo;Brincardeandardebicicleta;Brincardecorreratrásdeanimais;Caçar;Pescar;Arcoeflecha;Atirarcombaladeira;Atirarcomzarabatana;Lançarpedrasnaágua.BrincadeiradaRaposa;DançadoParixara;Brincadeiradepularcorda;Brincadeiradepeteca;Brincardepularnorio,igarapé;Brincardesubiremárvore;Brincadeiradepularcorda;BrincadeiradoBalanço;Brincardeandardecavalo;Brincardeandardebicicleta;Brincardecorreratrásdeanimais;Caçar;Pescar;Arcoeflecha;Atirarcombaladeira;Atirarcomzarabatana;Lançarpedrasnaágua.

    registros.Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,bemcomonasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,bemcomonasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,bemcomonasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.Todosessesjogossimbólicosforamrelembradosnasnarrativas,bemcomonasobservaçõesparticipantes.Foramvivenciados,tantopelascriançascomopelosnarradoresquefizerampartedestapesquisacomregistros.

    Fonte:Aautora,2013.

  • Na subsecção a seguir, apresentaremos a sistematização das práticaslúdicas ouvidas nas narrativas e de algumas outras que foram observadasdurantetodaapesquisanaComunidadeIndígenaTabalascada.

  • Sistematizaçãodaspráticaslúdicas

    Daspráticas lúdicaspresentesnasnarrativasoraisdosdezmoradoresda

    comunidadeTabalascada,bemcomodasqueforamobservadasnocotidianoeoutras que estão em desuso, consideramos: o nome das práticas; materiaisutilizados;faixaetáriadeseusparticipantes;e,ocontextosocialderealização.

    Osbrinquedos tambémvariamentreos tradicionaisemodernos.Existemjogos e brincadeiras tanto coletivos como individuais, reais comrepresentaçãosimbólicae todosacontecemnasmoradias,nomalocão37, nosigarapés, nas roças, na igreja ou em lugares escondidos nos arredores dacomunidade.

    No entanto, ao recriar, ao usar o imaginário simbolicamente em suasbrincadeiras com os afazeres do cotidiano, a criança ao brincar e ao joga