fonte dos que dormem vicente franz cecim viagem a andara oo livro invisível.pdf
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Poemas: Cantos dos seres neblina de Andara.TRANSCRIPT
Oniá,
sim, Tu havias finalmente vindo, Sim
E a primeira coisa que me disseste foi havias vindo ver o Livro Invisível.
- Oniá, eu disse. Como quem dizia Sim, Não, Talvez, Quem sabe
Mas Tu já havias escondido atrás das costas as tuas Asas, e assim que não pude
ver essas asas no Princípio de Tudo
E Saber que, sim: Sim
Eras Tu que finalmente terias enfim vindo
fosse aquele dia um como os outros: o Sol no alto, sua luz que nos oculta a vida,
que nos oculta de nós mesmos, que nos oculta a luz com que o solzinho de cada
coisa em si se ilumina, de dentro para fora.
Quando aquelas Asas enegrecendo o céu: o que era Aquilo, eu me perguntando
na escuridão de repente temendo que já fossem os meus olhos se apagando, se apagando
como um dia eu sei que indo para acontecer. O Acontecimento
Mas não eram ainda os olhos, estes que insistem em ver além de mim, aquém de
mim, o: O
Eram as tuas Asas
descendo
teu o: primeiro pequenino, depois crescendo, descendo em Andara.
Caísse sobre tudo a tua Presença: ó teu O sobre nós, imenso.
Mas Tu, tu, agora ali como eu humano pequeno como eu como são os homens
quando vistos de perto
Ali: sob a Árvore das Vozes, fosse mais essa vez em Andara
E quando eu descobri quem eras, ó nãoEusou, Ó semNome
fosses tu eras Tu,
Aquele que Lá escreve o nãoLivro para que aqui eu escreva os livros visíveis
Tua mão sobre a minha, Se inscre Vendo
Então, cantei estes Cantos
não para quem me ouve
Para Ti em Silêncio
Na Fonte dos que dormem
Cinzas do Caminho que se encontra
porque o dia que passa agora é um Sol negro nos Passos humanos, sobre nós,
eu
te acolho em minha Sombra
de Ternura para o Incêndio das Fontes que virão
E se dizes, dos meus passos: São meus passos
eu digo dos teus passos: São Teus passos
E assim,
indo,
aVe
que o Vento nos ventos: Destinos de areia
já não sabe se conduz ao Crepúsculo
ou se a Aurora já é a Penumbra que cintila em nossos Olhos,
porque outra vez Somos o que fomos
Eis:
a Asa
Invisível
murmurante no Horizonte
Pois agora Teumeu é o Corpo Entre Véus
oO Pas
so
que vindo,
não passará
na via Lenta
este é o caminho das
Grades,
e ouves no fundo da Terra portões de ferro voltando ao pÓ,
como tu
Mas Tu não cumprirás toda a Profecia
Afinal,
não chegaste pela rua da tua Infância? N
ão tropeçaste na porta da Sede e a Água te ergueu?
Não testemunhas o regresso das árvores em Sonhos
e
não passa Dentro de ti
a Outra via?
leve
Que
leva
à Leveza invisível
esboçando no Sem Rumo
quando passas, em Si se esconde a Árvore
dos Negros Corais
tu passeias sem Clamor
quem sabe: Até cantes
e o Caminho não é longo
não colheste nenhum fruto,
mas os Corais vão contigo
e teus Passos vão deixando Rumor de treva e água profunda, pois
te seguem, Negros, os Corais
ó Árvore dos Negros Corais
quando passas em Ti
se esconde
a Residência entre Clarões está nas cinzas Agarrado ao teu Tronco, como não lamentarias a queda dos Frutos? Perdido de Ti, como colherias a Semente no ar e a semearias nas noites da Fadiga?
Para isso: ouvir
Aquilo que chama na Sombra
Para aquilo, ver
Isso: o Anel de Luz
na noite que mais pede sacrifícios à Aurora dos Destinos
ao passo
mais fiel ao caminho para a casa tombada, Lá: onde a Curva
no horizonte
oferta a Esfera ao fechar dos Círculos
à água de murmúrios dos Teus Olhos
À Asa murmurante que não pousa
Celebração das noites fatigadas
há Desesperos circulares, Tu sabes desesperos
como o do animal no Escuro escuro
Girando
contido no Centro que seu giro gera
E a cada giro, Pura
emissão de intensidade busca as margens para Além das margens
E a cada giro, o Não
Escrita de grades: a palavra Dor não é a palavra Sim
Mais um giro, e eis: a Queda
Luz fenecendo
Oo
Centro que des
morona, des
falece em centro
E se esmorece
o Desespero, e se
se apaga: Se sob a pele Negra olhos se ocultam,
na harpa de grades a pausa é breve e não há Música
pois foi escrito no Bosque Sem Ternuras, em nossa Face: Que os olhos que uma vez se
fechem outra vez se abram,
e eles se abrem,
Cílio sem paz se
acende o Desespero
e Testemunha: as Grades permanecem Lá
E
se adormece para os Sonos dos Alívios? Sem
remédio Sem
remédio,
porque sonha Grades
ah, tudo oculta em sonhos a Catedral de cinzas
as Margens
o Círculo
e a chave perdida
Animal escuro,
te tornaste o próprio Centro escuro
Tece teus cílios de Hera sagrada
Cintila
nas noites Sonha
com a Alvura
Não sabes que Outro centroO
te Ilumina,
mais Escuro?
há Desesperos circulares, Tu sabes
Caminho dos corpos lentos
E o Céu? Se
pergunta a Terra,
enquanto desces ao encontro do Teu Centro
eis: a espreita do Suspeito de Si Mesmo
Eis a Penumbra da Água em silêncio
Na Fonte,
não são Longos os peixes que te incineram
Ainda uma vez um Sim de pedra
se ocultou
na Noite,
e enquanto tombas vais lembrando que Não És
Noite de nutrições profundas Para nutrir o Lodo, tu não escreves Tu és o Livro que se lança em todas as direções nas Regiões Escuras: Agora oO Círculo cintilante que te envolve E nos limites da Esfera, se te voltas para te ver Fonte que se jorra, vê: o Outro, Água que no Centro da Esfera ainda Lá és tu de novo, murmurando: Tu és o Livro, que se lança: Chama
na noite do Grão luminoso
Quando a Esfera cantou na Penumbra para a Dúvida
a Vida é o que
é
coisa que a si SeFaz
longe, em Ti
ouviste O Eco É
só
isso
e nada Mais
ó Árvore de Negros Corais e dos silêncios do Céu
S
ubmerso
em Si como um homem
esquecido pelas paisagen
S
E vagando
Como se um mundo Não existisse
Um mundo não
como um mundo Sim
E convivendo com Ausência e Sombra
Quase deitado na linha do Horizonte, e sem temer a Lâmina, e com os pés pisoteando
estrelas:
dança,
mas não é O Dançarino
H
e
} quando o Silêncio horizontal se disser, te despindo, o Fulgor que És
e tudo em círculos vagando sobre a Esfera vier se Delatar a ti como
Máscara para esmagamentos > a horda escura e a História
e o ir e o ir e o ir dos frutos retornantes às sementes
mas não
o Vir
da Semente ao Fruto que nós chamamos Vida
e
quando na Clareira, Nu
testemunhares o desabrochar da Hera
#
Então
} haverá um dia seguinte
E nesse Dia
Manhã do Caminho sem caminhos,
despertando
abrirás a porta da tua casa
e verás
a Constelação Sem Centro
Porque o Centro tombou sem rumor toda a Noite para a Terra
Estás outra vez na rua onde passou por ti a Vertigem, a Tua Infância
E agora } o Centro
És Tu
A colheita das paisagens
Para descer o céu à terra num antro mais cheio de murmúrios
aquilO
que morre nas flores
canta
um Rumor de luz
Eu escuto, na Residência da Semente Branca daqueles que tiveram o pé esquerdo
devorado por ovelhas
Eu nutro: os caminhos apagados
Eu nutro: a mais antiga, a Visão que veio ao encontro dos que vão
em busca
da espera de Si mesmos
Eu não sou a semente
de uma intensidade nua de espinhos, eu não sou
Eu não sou
Fonte das constelações
Sem semear ossos no fim da tarde
e vindo ao encontro dos teus olhos nos Caminhos das espreitas,
eu busco
o segredo luminoso
da
Tua
Água
Soprando as cinzas,
mais humano que o Limo
Este é o Passo de Sombras
Esta é a Noite em que o céu virá beber nosso rumor de terra
Aqui
Eu espero
Como uma Construção erguida para baixo
rio em Silêncio, e serpentes: A Palavra
interminável
mente
calada
mente de Aves Profundas
e um Carrilhão de Luz
soando na Penumbra dos Seus Olhos,
dAquilo que escurece
as manhãs de cinzas
as pedras dos dedos da Oração
quando o mais Alto se ergue
e depõe o Muro Branco das Idades
como Transparência
no deserto Inundado
dos Teus sonhos: Cílio
da Carne,
e Rumor de Bosque Escuro
Curva dos Lábios
que não dizem - Rio
lá, onde
a Água Escura de um Abismo
Aquele que teve os olhos Selados
já não aguarda a Aurora das Virtudes: o Guardião de Sombras
Aurora das virtudes
Quando a terra se abre aos nossos pés,
quando a terra se abriu aos nossos pés
e vindo a ausência da Ausente, veio a Ausência
do ausente
e A que devorávamos na Sombra estava atrasada, e vindo
a que esperávamos estava atrasada
Caminho lento
que a terra ainda não abrira aos nossos pés
ainda Tantas vezes O teu silêncio e a Pálpebra
que não quis nos ver
Tantas vezes o Conselho: Soluça sem espreitas
Tu me nutriste de Escombros,
como uma construção erguida para baixo
não era os passos
Vocação de Olhos mais Escuros
quando a mão se abriu
para tocar O céu
Não eram os Passos dos que vieram antes
Sim
Quando a Árvore sem tréguas descer do céu
como saber: Se um homem vem por degraus
no coração da nave submersa nos Seus Olhos,
antes
que a Inquietante fale as Palavras
mas não após o silêncio das Virtudes
indo
ao Encontro das lápides Flutuantes e das Águas
se erguendo para a Sede
e na penumbra oh na Penumbra
de um Encanto
e
da Esfera tombada no Caminho
por Onde ainda Passam os que passaram antes
Na penumbra oh na Penumbra,
enquanto espera a tempestade, a: Tempestade
nos
Repousos
dos
Teus
Passos
Lodo das espécies
As Catedrais de Luzes já foram semeadas
no Centeio Negro
e não te voltas para colher a Sombra
O
Que Ora está ausente
onde murmura Silêncio a Serpente
Agora aquele que aguardou a Alvura
despertou na névoa e sem olhos
Agora, Aquilo se lançou nas Águas e
sem guelras
Nenhum Cílio
desvia o Pó de um homem das Visões
do Florescer
ao Fenecer
da vida,
indo
tu serás o Escombro de Lágrimas
Canto Mais Impuro
O
cantando
Se um Oceano de pedras descesse
uma palavra Não te espera
Reino que Se curva
Quando a Mente, sem espinhos,
torturou Teu Sangue
veio a lágrima
e O orvalho te doou
O Lago
Na Solidão
se tinge o Lodo
Ainda é a carne a Submersa na pedra
que o teu Dom adormece
Estação das seivas
Não era a Infância ainda,
pois foi antes
Instante
sem tempo, O cancelado instante
de Ressurreições
do Pó
enteNoite
ente de murmúrios: uma semente,
apenas Uma bastaria, Escura
Se
no Silêncio de Seivas em que nasceste
o teu Luar acolhesse a serpente
Corpo nu da Demanda profunda
Tomba,
quando virá à Tona coberto de Cinzas
quando dará às Fontes suas mãos de Encantos em ruínas até
à Seca folha lágrima Raiz da Desfolhada não nascida
quando dirá ao outroO
nascendo do seu Lado Esquerdo com a ferrugem
das Catedrais partidas
- Busca
O ourO Escuro
para onde, para onde
Irá
indo,
indo
com sua imortalidade de lençóis de Alvura: O naufragado em terra,
caminhando sobre águas brancas que não vê
Pó
de despedidas de reencontros de Trevas murmurantes
Pedra de Queda como um fruto: o Fruto O
que alcança a outra margem: Oo
Fervor de Limo
Levanta vôo para baixo
Quando obterá a recusa da Envolvente?
e o Não lhe será um Dom
de Indiferença
Respirando face a Face
Quando a Mãe se ergue na Alvorada,
quanta Espessura no sutil
quanta Presença no vazio
que contém
a mão dentro de Si, oculta de si mesma
Oco e Noite Esfera
da Espécie
Uma estrela desliza nos teus Olhos
buscando a Origem da Luz
na luz do Dia
De Rastros, animais imensos mais antigos
te dizem
que já foste e estás Aqui, escuro
Purificações da imagem maculada
nenhuma Ausência mais será sentida
aquela que Devora consolando
foi embora
Passo em sonho
A Construção de Carne está nas Trevas
e um Silêncio Branco
ressoa em toda parte: o
Ausente
permanece
o que deixam seus Ossos com sons de flauta
para a Música
e o Vento da Vida
Nós não somos um cortejo de Ruínas
nós não somos Nós
não somos os que vieram atrás do Manto
revestido de algas
celebrando o Encanto e o Musgo
que a Água dos Olhos não lava Nós
não permanecemos
indistintos
na Paisagem dos Crepúsculos Nós não
tememos
a nossa Fome das Auroras
nossa embriaguês de Vinho Pálido
enquanto passamos, e passamos,
exatamente
Agora
Ilusão das Sedes
agora, diante de ti está o Muro
que não existe
Construção mental
que esmaga
Mas teus cabelos, Antro de Musgo que te sonha, ainda sentem falta
das ramagens longas, das Ascensões
e da Floresta,
onde os teus Passos percorrendo insetos, mas te apoiando com Ternura nas Sementes,
te dizem:
que logo virá o Limo sobre a Pedra cravada nos teus Olhos
Pois continuas lá, e a Fonte e o Fruto,
ainda Lá,
Agora
não dizerSim
infinito é o que está Dentro in
terno?
Pois não magoas
esta Paisagem
Paraíso
que sem rancor acolhes sob os Cílios, ex
terna
na Pedra da Meditação
em que Te dormes
e te vê
um Horizonte todo em torno de Miragens,
sobre a Terra
Para abolir os lances de dados
unes com a Asa o Vento e a Árvore
e Agora dás adeus a ti, no Escuro
Há Água e Fogo e Terra e Ar
e a Música a Voz
que fala o que nenhum homem ainda Se disse
oO Eu
criou a Si
e ao seu redor a Esfera o Círculo a Vida
e a Multidão da Semente
Estás na Aurora do teu pensamento
oO d eu s
tem muitos eus
nossa habitada Constelação de Ser
seu Fruto e Cinzas
a Tua Criança Invisível
Mais simples que o sono da pedra
agora vem Aquele
que lança para Ti
tua mão cheia de ervas, e não há Eras entre dois
homens de limo
Agora,
te ouve em Teus Ouvidos te fala nos Teus Lábios E
já Sabias o que te diz
com gestos de aprendiz de Vinho e Sangue
Está te olhando dos Teus Olhos
Contempla:
é a Paisagem das Espécies
onde se faz a Colheita dos Dons
nenhum Espelho Nenhum espelho
O Semeado
Agora,
estás onde Só
tu Te Esperas
Residência Profunda
só tens a ti
e um Gesto se desfaz no Ar
Fala da Ponte
Onde a Palavra, oca, simula madeira
Para onde te voltes, não estás
E Ninguém
que seja Alguém espera, Se não existes
Dizer: Espelho de miragens
E Despertar dos Sentimentos de Ausência,
abandonar os pés:
já não se movam nem te mantenham em ti
E no entanto uma Ave canta
A Tarde já foi Manhã
e há Leitos com promessas de Ternuras
À noite, acolhe a Tua Penumbra
Tu lembras o Nome vago que não dizes
Teu Alento ergue o pó até Teus Olhos
Um animal antigo ainda é teu irmão
Há Luta preenchendo o intervalo dos seres
Um pensamento Deserto se nutre de areia
Há ondas de Lágrimas nos Oceanos, longe
Cinzas retornando ao Fogo, com branduras
Ossos de Flautas, ouves, se Incineram
E no entanto, uma Ave canta
e és aquático como: No Princípio Era o Verbo,
sobre as Águas
Silêncio Silêncio
Na Tarde houve uma Manhã
Só tens um Ti,
e um Gesto desfaz se no ar
Lua das idades
Sob o Cílio submerso
Onde um sol jamais ilumina
E no ar mais Elevado, vendo a Ave respirando o Pó
da Terra
Onde não houve o que Ver, do que passou na Noite
E depois das Lentidões e Cantos
E Antigo como um homem de Madeira na janela,
se abrindo
flutuante
aos Oceanos
E no fundo de Ti
Silêncio dos nomes
Indiferente e lento
mas como um movimento Adormecido
E no Deserto Verde
Diante de uma Casa de Penumbra
Quem saberia
O que dizer desta Paisagem onde um homem
semeado
Diante de uma casa em um deserto verde
espera
Indiferente e Lento
Mas com um movimento Adormecido
Antes da Aurora
E a Vida, num Sussurro, ainda não nasceu em parte alguma
para subir montanhas Murmurantes
Ali,
onde em cada corpo humano há um só homem
Lá
onde se reúnem para as Festas do Medo
passa uma Ave que nos vê: Espelhos ocultos em
espelhos
Cinzas
dos Campos de Silêncio
semeados
de
Vida Ausente cada um em si
E Odor
vindo do Círculo do Horizonte
guiar
os Passos a não dar,
pois estás Aí, Fantasma
da Amizade
Ponte
que sonha a Alucinação dos Gestos
Para alegrar uma esquina deserta
É Assim que tu habitas uma
Meditação
Peixes de Estrelas e Árvores e se apagando ao teu redor
no teu Rosto de Terra
Onde
Não todos choram juntos não
Todos riem juntos, e Não se sabe
até Saber:
que uma Lágrima é Meditação de Tudo
E o Riso: Meditação de Tudo
e Esses
são os Dons da Semente Una Oca
Escuta: O Eco,
aqui
O sermos
como Aves de Dois Cantos
enquanto, Lá,
O sorrindo chora O chorando ri
Enquanto passa uma Nau de Silêncio
Asa dos olhos
Quando um Lago
for lançado num Círculo
fora do tempo
por mãos vazias antes do gesto
Quem
estará na Margem
para receber, sem mãos,
as Doações do Centro adormecido
que Se amplia
despertado
em gratidões gratidões gratidões
em Cinzas Cinzas Cinzas
Quando descerem em Ti escuro e sol
A última
gota de água acaba de subir aos Céus e a Terra
não é mais
a Esfera de Miragens
Agora,
esses seres de Lágrimas banidos dos Teus Olhos
buscam Refúgio
na Tua Mão de Pó
E não és o Lago
O Uivo em Tua em Memória não é a Pedra que lançaste
voltando à tona
Um homem é Sua Curva só por ter nascido
Estás
entre a Aurora e o Crepúsculo
como uma Dádiva
que se oculta antes do Gesto
Deita no Centro do leito da Serpente
Se
confundires os perdões escuros com a Lentidão
da Tua Estrela,
estás perdido
Tudo é Caverna e ecoa
Consulta os Clamores da Vida
Se o Adormecido leva um Gesto aos lábios
não Falar
para não nascer do Seu Ouvido
em Rumor O
não dito, lentamente não
Ouvir
para não nascer no meu ouvido
em Ramagens A
não dita, lentamente não
para não assustar as Ramagens do Rumor
indo e vindo
entre nós
Asa no Ar
Exalado pelo Alento: por que veio o Homem de Vento
Inalado pelo Alento, para Onde voltará?
E a O Que Quem pergunta
aqui
na Breve Residência
onde é
Asa de Sombra
dO sido
e
dO não será
Um passo antes das Cinzas
Bastante silencioso
e Ausente
mas caminhando através de Onde em si há Ninguém
Um olhar mais fechado, para ser Amplo para acolher a
Constelação
que não cabe nos olhos
para não esquecer que é alguém
onde não há ninguém
E a Gotejante, ouçam: Está chamando, a cada um
pelo seu Nome
a Cada nenhum nome que não Diz
Ali,
onde a Fonte mais transforma Luz em Sombras
visto no Vazio
E então entendes:
que tudo que Passa se sonha um Eu,
e toda neblina quer Ser
E essa é a Origem
da Lágrima
Fonte dos que dormem
como se fosse uma centelha: } a Transparente
com som de Águas até o afogamento
e Asas cristalinas de Pudor
e O sangue
se desfazendo em lágrima a Gota
onde um relâmpago de patas mais selvagens
e a desabrochando: } a Constelação
suas figuras de Musgo suas serpentes de espinho
e O Jamais se acabar [ Suas Serpentes de Espinhos
de chegar
dAquele
que
Sempre passará
como o Cordão dO Tempo nos Teus Olhos }
O som das águas, ó Filho
O som das águas, ó Filho, estou ouvindo
Estou ouvindo a hera e a erva
e o teu espanto
quando refeito é, ó Filho
o milagre do tato
Estou ouvindo
Estamos juntos ouvindo a noite que mais gera
os espinhos de seda
e aquela que fabrica mais fantasmas
e no que fui, a seiva que não flui,
a que mais permanece
e a que não desespera em sua paixão pela pedra em nossa mão
Tu sabes o que não sabes, ó Filho, eu sei
Um sol mais negro vem nascendo em cada peito
para dar ao ouvido do homem
um canto mais escuro
a Voz a Música
A Voz
Existe a Noite sagrada
e nela Eu estou, no fundo dos céus que não existem
como uma criança em seu berço
velado
Velando.
Do fundo dos céus, do fundo da Noite sagrada que não é noite
Eu cintilo
a Luz
que envolve e anima a vida.
Eu sou a Origem. Eu estou Lá na origem de tudo.
Eu sou o Mantenedor, Eu sou o Destruidor. Por isso Eu também estou Aqui
vindo da Noite,
em plena luz
onde vocês estão
A Música,
se desprendendo das cinzas de Serdespanto. Ouçam a música
A Música
E primeiro eu vi: a senda é: Viver Sem Viver
E segundo eu vi: a senha é: Viver Sem Viver Viver
E depois eu vi: a senha é: tudo tem sentido
E depois eu vi: a senda é: nada tem sentido
Então eu vi: a senha é O
Eu em mim
vendo
E a senda é O
eu na vida
vivendo
A Música
cessa e regressa,
vindo das cinzas de Serdespanto
A Música, ouçam
Ó ânima que anima a vida desalmada da matéria, estou te vendo
Matéria e Mater, Mãe terra
- Mãe, eu chamava quando ainda ser de espanto,
mas leve imergia em sonhos, longe do peso da terra
A Música
Atravessar o que nos nega, chegar ao Sim
E é assim
que tu verás o que eu vi das cinzas: a madeira incendiada
e nela estava escrito, não: Tu, deixa toda a tua esperança
e sim:
um V que vela o caminho para o Eu grande
e um Z que zela no caminho do eu pequeno
pois é pelo Eu vendo
o eu na vida vivendo
que cessa a luta dos eus,
entre asas negras e brancas
e o Eu grande e o eu pequeno
se unem no Eu Um, Eum
que é ex-sou serei sido sendo
Sendo Lá sido Aqui por onde fluí, e não fui
Agora, dispersas as cinzas
sou sido ser o NãoSim ser sempre sendo
A voz
vem ainda uma vez das cinzas de Serdes- panto,
antes que se faça o silêncio de Andara na terra inteira e em todo o céu
antes que uma brisa leve, vinda do céu ou da terra, não se sabe,
se
somos só homenzinhos vivendo,
doe essas cinzas a um invisível e outro vento
A voz. E diz
A senha é e a senda é colher os ossos do osso Pai
E nessa voz um eco, sussurrante
que também quer me falar, me diz: Vicente, ó ser de espanto, em teu espanto
é
e sem mim
mas em mim
que tu sonhas Andara ir e vir, é minha a tua viagem
e ela só é
através da Origem e do Mantenedor e do Destruidor de ti
E dessa voz ainda uma vez o eco,
e sussurrante, a fonte de cinzas: Vicente, em meu Espanto
é
e sem mim
mas em mim
que tu sonhas Andara ir e vir, e a tua viagem
ela só é
através da Origem e do Mantenedor e do Destruidor em ti
no fundo da Noite sagrada,
Eu também sendo o Estrondo e o Espanto
e O espanto de mim
#
Bem-vindo à casa incendiada
Eu agradeço a vocês por existirem: meus ouvidos de madeiras sonoras
por existirem
e porque agora estou ouvindo as estrelas
e as cinzas
e as portas estão abertas para as chamas
e as luzes dos meus olhos sem infância
se parecem
a um amontoado de pedrinhas desbotadas
que me falam cinzas
e me dizem cinzas
e sussurram e desbotadas
murmuram
que o pior ainda não foi ter nascido das suspeitas
das montanhas
para as cinzas de outro ser
levado pelo vento
nas tempestades da carne
sob o céu e a árvore que doou a madeira
e doará seus frutos já sabemos
às descendências
e às chuvas
e às foices pouco brandas ah tão pouco branca é a veia aberta em nossos sonhos
onde um rio de areia passa em outro sono
Em nossos sonhos as palavras
suspiros dos homens
esperam
a música que um dia nascerá das heras
e já tendo escurecido em meus olhos de sonos
pendem estes jardins aflitos
as nossas cabeças
e agradecem aos olhos os seus silêncios
e por jamais sorrirem
para as águas das lágrimas
e perdoam à terra por ter nascido
e perdoam os caminhos rendas de ramos escuros
por haverem de nós se perdido
onde a água e as cinzas
já não bebem a alvura
a alvura
a alvura
a alvura
Bem-vindo à terra semeada
Oh Terra
Ah Mãe que não mente
e mata seu filho com um murmúrio ardente
Dado ao nada
depois de semeado
quem de mim relançará o dado
quem sem mim
semeará a semente?
Bem-vindo ao rumor das cinzas
Mas eis que a água chega
e já é tarde demais para viver tarde demais
As cinzas
vieram antes
e o fogo adormece apagado
E no entanto é preciso beber é preciso
a água das cinzas
E é um sonho ser um homem até os ossos
e suas canções do corpo
que nenhum ouvido ouve
que nenhuma boca canta
Ou só a boca de uma sombra cantará
Então que sejam assim as doações mais puras
E crepitantes sejam
os ossos se doando às cinzas
em que um dia irão se transformar
Ah crepitantes canções Ah sombras do corpo nu e nuas
Rendas tecida no escuro
por amor a um rumor de águas mais obscuras
Bem-vindo ao estranho mundo
Em algum lugar do estranho mundo
mãos se tocam em silêncio branco
Ah o encanto da carne
quando esquecida é a existência do deus
que causa a dor
Uma ave vai pousando em seu ninho,
traz nos olhos os espantos do dia que se acaba, se acaba
Mas a tarde nos serena, com a promessa
de que logo vai anoitecer
para novamente nos tornarmos sombras, nos tornarmos sombras,
nos tornarmos sombras
Devolvidos aos ninhos escuros, escuros, escuros
Ah como nos assusta caminhar sob um sol
A este lado da esfera
ainda não veio o tempo do repouso A terra geme,
a fatigada, fatigada
Os homens nos caminhos do crepúsculo da raça
perderam seus olhos
nos cílios pesados de bronzes antigos As estátuas com nódoas de vergonhas,
a vergonha, a vergonha
Nunca mais tu ouviste
o sino que chamava os gestos brandos do fundo
do templo
Ah a sina
do efêmero encarnada em tudo que se move
à nossa volta
Mas tu ouves num inseto de outono o Inseto
do outono
As folhas que se fecham sem desprezo
Num ramo que se parte e cai sozinho,
nenhuma força negativa pousou neste inverno
No estranho mundo, alguém está deixando
o pequeno porto
em seu leito de morte,
e isso nos faz mais lentos do que o cedro transformado em leito macio
porque de madrugada alguém, que será outro,
acaba de nascer na casa verde ao lado
Ah o ir e vir dos viajantes pelas estrelas, as estrelas,
as estrelas
Como tem poder um gesto
branco branco
quando vêm do fundo na noite os silêncios
em que nasce a flor a rubra da ternura
À noite a noite a noite
banhará as frontes que sonham serenas o sereno
Um cão se encosta ao dono
e ao seu odor humano
Ah como é lento este aprender a semelhança
entre a pata do animal e o gesto humano
Misteriosa, uma estrela agora desce sobre o bosque
dos destinos
A filha dos pântanos se agasalha em folhagens negras
O sol tem um ritmo de sangue,
anunciando um novo despertar do mundo
Ah como renasce este outro lado da terra, a dourada, para a luz
Um emblema de paixão te é dado a cada dia
E o vinho está servido nos sentidos
para ser bebido por aqueles que tiveram as suas mãos feridas, feridas,
as feridas
Claro e escuro é o mundo
Claro e escuro é o mundo
Ah o espanto daquele que desperta após um breve sono O anjo, em ossos
e sangue
Se adormeceu no fim da tarde
e abre os olhos na penumbra
que não sabe
se anuncia um anoitecer de pedra
ou ainda a areia as auroras da vida
Por algum tempo, permanece mudo
E não pode se dizer o que virá depois, se luz, se treva
Ah a garganta quando quer cantar uma canção de pura luz
Ah o irmão perdido Ah a voz que prefere calar
diante do crime do irmão
Em algum lugar do estranho mundo
mãos se tocam em silêncio branco,
olhos se olham em virtude azulada,
peles se roçam na intimidade dos amigos
Ah os ninhos que se constrói com o afagado
e o murmurado
Quem são aqueles dois que agora cruzam a ponte
entre suspiros e brumas,
ignorando o cão de ferro que late em seus calcanhares
Levando um peixe de ouro, o pescador de sonhos
Ei-lo que vai voltando para o recanto do estranho mundo onde ergueu sua casa
de palha e centelha convivendo em paz
Ah a ave distendendo as asas
no amanhecer do ninho, o ninho
para reiniciar a aventura da leveza
Como é leve esta pedra no caminho
Como é longo o culto à árvore
em que se enterram as raízes da família
e o choro da criança pela primeira vez
Não tires a tua mão da claridade
da minha mão cansada que repousa em ti,
para ocultar na sombra
Ah
não esperes o receio
para te abrigar em meu peito, diz a voz branda
e longe uiva a fera do adeus
Quem são aqueles que atravessam a ponte
sem temer o cão de ferro, a vida
E por que ainda está ausente o peixe
As planícies de escamas, ao longe, ao longe ao longe Mais uma estrela
caiu dos teus olhos
Ah os que caminham juntos sobre as águas
e a paciência do homem com a madeira
para fazer a casa e a cama
onde o recém-nascido acaba de chorar pela primeira vez
enquanto a vida também constrói para ele
uma ponte
e um latir de ferro em seu calcanhar
apontado para o céu,
enquanto o sangue verde lhe desce à cabeça
enquanto o olhar da mãe de lábios lívidos
Ah o nome que daremos a tudo isso
que nos envolve,
e que chamamos vida,
quando voltarem os tempos perdidos
ao regressarmos aos ninhos de verão,
dois a dois
atravessando a ponte,
pisando as marcas dos passos dados pelos anos puros
Aquela que tece a lã generosa
porque crê no balido do amigo,
ah
como a chamaremos depois que cessar nosso primeiro choro
e a Casa ao lado for a nossa casa?
Ah o encanto da carne
quando é esquecida a existência do deus
que causa a dor
Ah o encanto da dor
quando esquecida é a existência do deus
que causa a carne
Mãos se tocam em silêncio branco
em algum lugar do branco e estranho mundo
Para aquele que cai
O principal terror desceu cantando a montanha Máxima
até o Mínimo refúgio do ser
E depois veio o tempo
Flor das mais estranhas, que jamais saberia
o sabor da amizade
Mesmo que fosse um mérito
declarar ao mundo que ali ainda um anjo, ali
onde desceste um dia, espera
soluçando, negro e espiando a vida
A verdade não divina é que tingiram o vinho
do teu sangue
sem derramar uma gota no oceano
E o trabalho de purificar a renda negra do peito
foi para ti um corpo de criança
O que passou sem patas por aí?
Os que temiam as vinhas
não foram os mesmos que ofertavam com rigor à fraternidade das rochas
Passaram os dias de recusa
Nas trevas,
as pedras das trevas temendo um leite mais doce
Então, sempre um excesso de nuvens
O sol branco
nunca será essa coisa de homens semeados
em campos de prantos
e colhidos por ninguém
Ninguém para viver com lábios que não dizem: Luz
de murmurar na água dos ossos,
Luz de tudo isso que se ergue
e se inclina para ti
como a onda que traz os peixes da Vergonha
O principal terror desceu cantando a montanha Máxima
A parte dos dons
A submissão das espécies E tudo isso que jaz
sob esses hinos aos musgos
Depois, viriam aqueles que escutassem
as árvores murmuradas pelo vento
Em outras relvas, outros também já tiveram
a maçã da inocência
no lado esquerdo do peito
Eu,
palavra desconhecida dos homens que dormem,
não sou o dia claro sobre o túmulo de um rei
que sobrevive
entre o centeio negro
Ainda poderia dizer, sem os lábios que perdi
numa noite de sol,
tudo
o que esqueci, se aguardasse a pele nova
da serpente
Dizer: Quando o tronco da vida se retesa
e se abranda o arco,
para que não resseque,
devia ser beijado pela mão humana
Dizer: Também eram pequenos os animais buscando o ninho
do órfão silencioso,
e ninguém sabe o amanhã
Então, por um clarão da carne,
talvez o húmus iria sorrir o seu humor na pedra
A impaciência das sementes
O laço estava armado E o sol se pôs,
com um rumor escuro,
para que o animal conhecesse a armadilha,
para que a armadilha conhecesse o animal
Quantas vezes eu
esperei por ti, minha Sombra
e em mim nenhum passo foi dado que anunciasse a Tua chegada
Para que haja um espírito, as florestas cantam ventos
Existe uma árvore rara
dando seu fruto à vida
E ninguém sabe porque
os sóis brotam todo dia
Os grandes mestres
há Uma qualidade que os homens ignoram: viver é menos
Queda que a pedra da memória
e mais do que as serpentes reconhecem: O odor humano
Está
entre as estrelas morrendo nos seus sonhos
e a terra fria afagada contra o peito
antes de lançar um sol sobre as suas vítimas
Se isso se parece um pouco com as residências do mal
e com casas perdidas em si mesmas,
foram os Cálices da espécie que deram à vida a nutrição e os tumultos
Eu falo da invenção da sede
Porque o homem é o animal de areia que dá sentido às fontes do real
e quanto a noite cai,
bebemos a água escura do ventre das mulheres
Mas vejam: o escorpião instalou as suas ferragens
O céu tem suas lágrimas em silêncio
O caracol da voz,
quando sussurra os enigmas da chuva,
sabe:
Quase nunca é tempo
Quase nunca é tempo
para o perfume do sangue
Quase nunca é tempo
de permanecer humano
Esses rios têm espelhos partidos, e tudo o que foi submerso
é um caos perdido
Sete homens tristes
Agora nasce Aquele
que é um lago fundo onde lançamos cinzas
Agora volta,
para dizer a palavra nada
Agora senta pela primeira vez na pedra
e sonha com água
e inclina a fronte
Onde lançamos cinzas
É sempre e ainda esta a terra sob estrelas,
a fruta noturna
onde a luz das nossas faces iluminava faces mais antigas
E sempre e ainda este o sol
que nos reúne para os dias de irmãos,
quando mãos perdidas achavam as nossas mãos
O alado e o fervilhante,
o céu,
ainda dura após a lua dos olhos
Mas se um homem se turva na esperança,
como salgar a palavra dos aflitos?
Aqui ninguém mais nutre
a boca seca das hipóteses
Levantar uma pedra mais leve,
despertar todo o ninho da espécie
Tudo isso ainda seria a vida
para o ausente
indo pelos vales onde baliu a amizade extraviada
das coisas pelas coisas
Se voltasse em nós Aquilo que pela primeira vez sentou na pedra
e, para beber a água,
inclinou a fronte
para sonhar a inexistente fonte
Àquele que dorme sem sono
Os teus corpos, Um de Carne e Outro de Sombra,
envolve em óleos
pois são dois, e o segundo é mais real
É preciso ver num sonho
a paisagem das verdades
onde insetos vêm pousar em nossas mãos
Há palavras que os homens não dizem
Há águas tão amargas,
filho,
que se recusam a devolver às fontes
as antigas possibilidades musicais da espécie
Mas as luas da febre
estão passando
sobre os lugares onde a sombra humana ainda irá passar
Um longo caminho não é sinal de eternidade
Ninguém ainda foi ouvir o silêncio das estrelas
E não ter colhido o mel,
a um murmúrio de distância dos teus lábios,
salgou ainda mais as colméias eternas
É lenta a economia daqueles que aqui esquecem o sabor do sal
E há uns que temem a queda das unhas no inverno,
e há outros que pararam a vida
numa estação vazia
É preciso ir à paisagem das verdades: Insetos pousariam
em nossas mãos: Os ouvidos humanos
são cavernas escuras
Agora nascerão raízes,
quando esperavas asas
E quem sabe um dia virão frutos
para te dar ao leite coagulado,
suficiente é ter nascido
Suficiente é ser a sede, pois só por isso se obteve
a dádiva
dos lagos e da gota de veneno
e um oceano de lágrimas
para encher os olhos de ternura
O que tu sabes de ti?
Somente que já vai começando a desaceleração do vento
em teus cabelos
A menos que desças no caminho, para colher as imagens
que foram caindo da nossa memória,
estás perdido
A menos que subas, ao avistar uma montanha de homens
que foram virados do avesso, os ossos por fora,
a carne por dentro,
e te prostres em adoração ao pó,
em que esses homens se tornarão?
Chama o vento com o ar dos teus pulmões
por amor às cinzas
Estas perdido
Entre a festa para receber,
com festa humana,
e uma esperança de ferrugens
Sob os sons das estrelas,
uma esperança de ferrugens
é o que te fere a sombra
e estás perdido
A melhor coisa que fazes
e a pior, será parar a circulação contínua da máquina
Prova uma gota do nosso sangue,
e aceita, sorrindo,
que isso aconteceu,
que foram caindo da nossa memória
a polpa e a seiva, tingidas de vermelho
Um futuro de rodas que já não rodarão
para as colheitas do destino
Entrega o nosso trem ao delírio de uma floresta
virgem a cada dia
E a voz que te diz isso:
ao menos uma vez
teremos o ferro do nosso dispensável coração
Então, por que não semear de mãos vazias?
Caminho que os olhos não viram
Vento e passagem,
vento e passagem
Agora, jogar num poço
Agora, beber sem sede
Agora, dormir de novo
aninhado no peito do animal que semeia
a semente de areia
Os dias de nascer não são os dias de sorte
Na Casa dos homens as sombras vêm cedo,
mal nasce c
da dia
de fazer o bem e o mal
Estamos buscando a fonte
E ninguém pode ver a invisível, A
pensativa fronte
Fogo
apagado, enquanto ardemos no ser,
e vamos de ser em ser
sem poder dar nem receber
Se ouve essa voz na folhagem
Se entra com passos
caiados, e se vai por entre sombras nas paisagens da verdade
Vento e passagem,
vento e passagem
Agora, jogar num poço
Agora, beber sem sede
Agora, dormir de novo
Agora, descer sem olhos
rumo à água que salgou os oceanos e as lágrimas
Agora apagar
com dedos
de ervas
a chama de uma vela
e ver que escureceu mais uma estrela
Vento e passagem,
vento e passagem
Quais são os gestos para brilhar mais de uma noite?
Só há
sóis se pondo e luas pela metade?
Se isso já fosse a percorrida paisagem
Acima, embaixo
eis o caminho da ida
De puro amor pelas cinzas,
frutos entram pelos pés descalços
dando adeus ao lugar luminoso da partida
Para lavar o tecido em outras águas
O que veste o homem
para os dias do animal?
As rendas da carne,
elas vestem o homem para os dias do animal
As rendas do nascimento, as rendas da morte,
elas vestem o homem para os dias
e as noites do animal
pastando em campos que se erguem
para o céu, que acima é um outro véu,
que oculta o amor do pai
quando descobre a mãe terra, dilacerada nas sombras
que dão o frio e a luz
para que eu me veja humano
nos meus sonhos de animal
que se despe de ternura, quando se esconde a lua,
que se nutre de aflição
nos crepúsculos da raça
e arrependido deseja ser a pele da serpente
Tudo isso é o tempo fino
que flutua entre essas mãos
que desfiam
nossos panos, com que cubro a nudez da minha casinha de osso
Trabalho a que me dedico ouvindo os sons que não ouço
da catedral invisível que só posso visitar
nesses meus sonos sem sonhos
onde são iguais o filho, a renda e o pai calado do silêncio,
que vai queimando as estrelas
e se desfazendo em cinzas
para chover sobre mim,
aprendizado sereno
de dias que acabam assim
Chama sem nome ou fulgor de lama que os homens chamam:
O fruto do júbilo obscuro
Permissão para salgar o mármore
Porque se erguem da terra
e em toda a terra
ainda não se ouve o rumor negro da colheita,
é que esperam a tua sombra no crepúsculo
quando já passaste na manhã
a paciente,
a pedra
e a impaciente semente
Estás passando na amizade das coisas pelas coisas,
estás seguindo
e a luz é terrível
Paisagens
onde a infância doou seu fruto às Sombras
Serás azul
só na noite
em que partirem as tuas crinas
e o sol que semeamos ao redor da tua fronte,
com pensamentos de terra,
para dar ao ar
idéias
e os seus movimentos de nuvens
que às vezes formam a Lenta: A cabeça de um cavalo
Não há beijo
que console quem vê estrelas cadentes
Não há sede que apague esses fogos sobre nós
Aquilo
te deu mãos para cobrires teus olhos,
mas porque não são tuas mãos,
pára e colhe sem mágoa as lágrimas e a nossa água
Teus passos ainda são a fonte
Tu sempre estarás aqui,
pois em ti
se ergue o monte
Para que talhar nos lábios o espírito das ruínas?
As mãos são formas perdidas
e toda pedra torturada encontrada no caminho
já é a imagem de um deus
Para adormecer aquele que vela
Há montanhas em sonhos
tão antigas,
onde sonham
os grãos da areia que te sonha
O que sobrevive na hora
que apaga a última claridade?
De quem faz a Noite a vontade?
Dia ou homem,
uma túnica de rancor é o que eles vestem,
e as montanhas vêm rugir
Caladas
Se veio o Tempo,
é que é tempo de colher sob as estrelas
o centeio negro com mãos mais brancas, caiadas
Vinho do encontro
Por sua chegada com o acontecimento
dos repousos
Das regiões selvagens
Por sua chegada
Por sua vinda ao Encontro
daquele que na sombra treme de prazer
sua chegada de lodo
e sua chegada de fonte
que ali é
espera e guarda à residência
Dever de nutrir as sombras
uma construção em forma de círculo
Por que chamada a Casa da Vida?
Caminhos que dão voltas, onde não se encontra ninguém
Ninguém
que seja alguém A Companhia
Como empalideceu o grão, aqui,
agora que caiu
para crescer da terra,
órfão de uma estrela que se apaga na chama
de uma vela
Como teme
o rugido
da noite encerrada em si mesma o animal
que adormeceu
sem resolver o enigma
Uma construção em forma de círculo
onde homens-pássaros
com asas de pedras, impedidos de voar,
perseguidos pelo vento
e a ameaça das sementes,
ouvem no ninho das coisas nascidas de coisas nascidas
um voz que recita: Isto passará
Esse é
o grão da má sorte
uma construção em forma de círculo
Em forma de homem
abraçado a si mesmo,
como dois irmãos que se quisessem bem
Frágeis como a linha do horizonte
Fonte dos que choram
Não, não adianta temer O Que virá
um dia,
terrível e com prantos, a lua sangrando sobre nós,
pelos nomes das coisas perseguido
As coisas são pedras nas sombras,
a lua sangrando sobre nós
Não, não
Pois é o sacrifício,
a lua sangrando sobre nós
Aquele
que espera a voz da semente já não teve os olhos perfurados?
Como verá
a lua sangrado sobre nós?
Aquele
que esperava o leite do céu não teve suas mãos pregadas
com o Espinho?
Não dirá os nomes das pedras nas sombras
Não,
não
é o sol sangrando sobre nós,
se ainda é o sacrifício
Indo
ao encontro dos cardumes dos seres
Meu mais estranho som sai à porta e chama
do fundo do peito,
clama
para descer o abismo
Longo leito de areia para ti também lá
Tenho esses pés sempre perto das fontes,
que só dizem seus nomes jorrando Por isso, Não, não adianta temer O Que virá
um dia,
descendo das encostas
das fontes, que já nem se murmuram
Bosque sem paixões
quantas vezes ainda
o corpo de demônio
e o Outro corpo de vidro,
enquanto o ausente se transforma em cinzas
que um vento leva, leve
para a muralha do que não é,
cravado nos lábios
O nome do Nome
um dia passou coberto de eras,
sem haver vindo
Quando vier o tempo bom renascerá da semente O
Bosque sem paixões
O nome do fruto eu não digo
Tu não dizes O nome do fruto
O nome do fruto nenhum de nós dirá
Bosque sem paixões
enquanto isso sangra pelos pés
Mas eu tenho os meus pés sempre perto das fontes
para o bem dos meus pés,
para o mal da fontes
O Crime é: a água cristalina se tingindo
de vermelho
E o rumor que cala
sem dizer o nome da água das lágrimas, sem dizer o nome
das cores, não dirá
o nome da cor vermelha desse sangue
que marca os caminhos por onde pés te procuram, O caído, O tropeçado
A lua sangrando sobre ti
Bosque sem paixões,
meu mais estranho som
sai do fundo do peito,
lá no fundo eu espero encontrar o nome das palavras
O Centeio Negro não é o centeio branco
O Centeio Branco não é o centeio negro
A palavra Palavra
não grita o nome das palavras
cravado nos lábios
durante o sacrifício,
longo leito de arei para ti também lá
O centeio negro não é o Centeio Negro
O centeio branco não é o Centeio Branco
Lábios não se abrem para nós dizer o nome
da árvore, o nome
do homem, o nome
daquilo que um dia virá
sem achar o Caminho
da voz
que dirá o nome da Árvore, o nome
da Estrela, o nome
daquele que ainda não veio,
e está passando coberto de heras,
O Nome
do Bosque sem paixões
logo leto de arei para ti também lá
Não,
não adianta temer O Que virá
um dia
descendo das encostas
das fontes, que já nem se murmuram
Bosque sem paixões
terrível e com prantos, a lua sangrando sobre nós,
pelos nomes perseguido
Não é o sol sangrando sobre nós
Os nomes das coisas são pedras nas sombras,
a lua sangrando sobre nós
A lua é o sol
Um homem sorrindo é um Templo,
e os mortos
são os Belos Sagrados
Um homem chorando é um Templo
e ainda por cima da terra
flutua
o cemitério lunar :: A lua cheia de flores guarda
o teu lugar, o teu
lugar
Podes rugir nas noites, mas quem te ouvirá?
Ou, se preferires, uma residência com heras vai desmoronar
Onde és,
é o tigre e o homem
Aqui
não há tempo, nem o lugar lunar
À noite,
sempre rosnam os animais dos dias
Nos dias,
sempre rondam os animais das noites Não é tua a fome
daquele que come
as flores visionárias do ar?
Má sorte é ter nascido sem saber jogar com as sombras
Melhor será dormir abraçado
às garras de um deus
Pudesse um homem
Sentado à esquerda
observa
O
desgarrado
Os dias de temer agora estão ao teu lado
Como aquele que está ao teu lado,
como a tua sombra está ao teu lado,
como o teu corpo está ao teu lado
tentando achar uma saída na carne
Sobre o dia em que nasceste, lembra:
o céu foi um lago coagulado
Aos deuses do fogo
Para o encontro entre a mãe e o filho,
que continua
na noite escura,
a árvore do céu deu a lenha e as cinzas
Dádivas e alvura,
Dádivas e alvura
Rumor de ramos quebrados
Sim,
poderia ter sido
o que não foi
O silêncio
e o Grito
Sim, O animal da treva na água escura
que reflete embaixo o Alto, o Altíssimo
Quem assustou o céu a esse ponto
Poderia ter sido ainda mais
Um abismo
E o ter nascido assim
Não com um Rosto,
mas com um enigma com Olhos
Se te perguntas Como poderia ter sido
o Não sido,
O que te escuta?
O que te escutas?
Fontes por jorrar Pedras,
e pensativas frontes
Música com sombras
Porque te vestes de Sombra
é que eu te espero onde os dias morrem para sempre
Escuta É a voz humana
essa areia sufocada em tua garganta: isso, a areia
soprada por um vento,
é a coisa que os homens chamam a Voz humana
A Nossa voz,
ah
Dela, nada dizer Calar na bruma
Porque tu vestes de sombras
a criança que trazes pela mão,
torturada como um vício, branca como uma virtude triste
como uma flor presa em sua Raiz
Onde está o colar dos desesperos, ali
puseste os pulsos das manhãs nascentes Nenhum Anjo, nenhum Anjo
Estamos presos no Centro,
ou livres caindo no escuro
E eu não sei qual das duas portas, assim abertas, são mais terríveis são
mais belas
Se
só sei
que te espera
a que virá coberta pela Sombra
trazendo pela mão essa criança sem Face, sem rugas também
sem ter nascido
Se assim escurecesse em silêncio esta paisagem
onde pousamos ausentes para os olhos
dos cegos,
toda Serpente seria caridosa, todo encanto teria nervos azuis de pedras de fontes
de lamentos não-nascidos do fundo da garganta
nem a tua nem a da menor que tu, a tua criança
que devolves à claridade
com um gesto de amargura
e recuperas
para o negro dia dos meus olhos
com um gesto de ternura
Ela, a fonte em nossas frontes, pensativamente está pousada,
observa
Paisagem de deserto, e mão cheia de pó:
um sonho para olhos de vidros sonharem
com torturas
Ela: é a Paisagem: é o Lugar, e é o Pranto
do lugar onde os dias morrem
para sempre
Nenhum anjo, nenhum anjo
Não é a Voz humana, nem ao menos murmurando
Para obter do céu um animal sem asas
É quando tu vens com o Sangue que eu me dirijo à Fonte
com a lanterna
Em busca de uma pedra de esquecimento
Dando adeus
com mãos vazias à paisagem
Que nos persegue: Um animal de músculos nas montanhas
Que nos persegue: Um animal de lodo nos lagos do vício
Que nos persegue: Um animal sem alma
ainda maior que os sóis inchados dos poentes,
e ainda mais vasto que os desmoronamentos
do céu
que sempre vemos em nossos sonhos
Horizonte e olhar severo
Olha para dentro: o lapso
distante
Minérios e memória, e corpos ainda mais nus
que o Tempo e os nossos tempos decorridos
nos flagelam
Tudo nos ensina
a ser um ser menos doce
e mais temível
Cobertor feito de ervas
O animal do frio
dormiu três noites em meus ossos
A vida não é guardar as pedras do caminho
nos olhos
não deve ficar a paisagem ultrapassada
Os passos não sabem nada
A próxima será a última
e ninguém sabe onde está
Música do sangue das estrelas
Nos cílios do tempo, as Sombras
das coisas aladas
repousam,
depositadas
Nossa Compaixão
não pode com a Água Salgada dos olhos,
não pode
com a areia da vida, não pode com ela, não pode
Um corpo no templo de um lago gelado
Ninguém beberá dessa água
Um instante de força passado
No fundo do lago pousa
o naufragado Nossa Compaixão não pode com ela,
não pode com ela
o
amor, não pode nada com a vida salgada,
um instante de força, depois esgotado
O homem de pó deixou a sua sombra na estrada
Contra o sol,
as estrelas dos olhos
não podem nada
Os frutos dos olhos, as luzes das cinzas geladas
O homem de pó deixou a sua sombra na estrada
Foi pelo silêncio dos frutos maduros
que o fim da amizade foi anunciado
Depois se apagaram, nos frutos maduros,
os olhos fechados
Na encruzilhada, da vida, da estrada
crianças
brincavam
Bosque com paixões,
onde as crianças brincavam,
nossa Compaixão não pode com ela,
não pode com a vida,
não pode com nada O que fazer, não há nada fazer
Através das distâncias geladas
e da carne gelada
e dos gestos gelados
no fundo do templo de um lago gelado
Ali, se esperas pelos não-nascidos, os Calados, os
não-suscitados
eles
não chegam na hora da ceia,
não chegam na noite, enjaulados No fundo
do templo
de um lago gelado,
a nossa Compaixão
não pode com a força que o céu
escuro derrama
na mão das montanhas derrama
O estranho subiu
O estranho
querendo as estrelas o estranho, mas o céu não desceu
ao encontro da terra a sua chama
Não é no fundo
do lago gelado
a terra
dos homens alados
A terra está cheia de homens no pó naufragados
Você pisa o pó, e é um crânio rachado
Do escuro,
do céu, quem viu o homem de pó deixando a sua sombra na estrada
Animais, procurando abrigo,
onde os homens de fogo foram pagados
A nossa Compaixão não pode nada
Bosque das paixões,
a nossa Compaixão não pode com a água salgada,
crescendo nos olhos
A Árvore da Compaixão, crescendo nos olhos, não pode nada, não pode nada
Não dá frutos a Árvore
da Compaixão não dá
frutos, não pode dar frutos, não pode com ela, não poderá nada
Para onde foram as crianças
no Bosque das paixões sonhadas
A tua Compaixão não pode nada A Minha
não pode,
não pode com ela, não pode nada
Não éramos mais do que pedras no fundo de um lago,
e a Compaixão não podia nada,
não mergulhava nada no silêncio cantado
das águas
A água dos olhos também não cantava
Contra a Pedra
e a Sombra daquele que foi pelas águas escuras banhado,
debaixo da pedra largado, afundado,
os silêncios dos teus olhos sobre um nome escrito não podem nada,
a água dos teus olhos não pode nada
O sal dos teus olhos, o Sal
Um sol
por cima de nós ainda é o brilho das coisas doadas,
mas sob o céu não se pode nada
contra a Água Salgada dos olhos,
não se pode nada
Bosque das paixões,
quem vai beber nas mãos a água dos olhos, salgada
Nossa Compaixão foi bebida
pela areia molhada
O homem de pó que deixou a sua sombra na estrada
Não podia fazer mesmo nada
por nós, não podia com ela, não
podia com nada
Apedrejados com os frutos, doendo
de tanto ver,
eis
os teus Olhos
na estrada
e a Compaixão não pode mesmo nada, não poderá com ela, não pode
com a água dos olhos
Crianças sempre partem, depois de sonhadas
As crianças não estão mais na encruzilhada
O Bosque das paixões ficou vazio Ninguém podia mesmo nada,
não poderia com ela, não poderia,
com a areia não poderia,
não poderia com a água salgada
dos Olhos
Os olhos não viram as crianças partirem
e deixarem a inocência
jogada
Animais vêm olhar a ali soluçada
O animal dos teus olhos
fareja
a inocência largada, foi abandonada, eis o embrulho
na estrada
que leva ao
Bosque das paixões,
e a Compaixão não podia mesmo nada
A Compaixão não podia enxugar e levar no colo
os nossos olhos molhados
de água estagnada
As crianças deixaram embrulhadas, em peles humanas, como roupas usadas,
a compaixão e a inocência na encruzilhada
Aquele
que achar o embrulho terá o direito à primeira gota sangrada
As crianças depois foram embora, depois
de sonhadas
Quem ficou no Bosque das Paixões
No Bosque das paixões não ficou ninguém, não ficará mesmo nada
A nossa Compaixão não pode nada
com a água salgada
Não pode com
o embrulho deixado na estrada,
onde a compaixão e a inocência
estão abraçadas
Em sacrifício, tens de oferecer teus silêncios a nada
Para merecer a Estrela Sangrada,
gotejando vermelha a Centelha, a Chorada
Os vinhos das palmas das mãos podem ser tirados
da água gelada,
mas ninguém beberá dessa água
Bosque das paixões,
dos risos das crianças sobraram os ecos
e as alucinações
A nossa Compaixão não pode mesmo nada
As luzes se apagam, e ela não
pode com elas, não pode com as luzes agora apagadas,
não pode mesmo nada
Sob sangue da Estrela Sagrada, as areias
das ruínas estão paradas
Dias sem velas, noites veladas
Também na noite a nossa Compaixão não pode nada
Num sonho
se viu, no fundo do mar, uma grande embarcação
dos homens afundada,
e as vozes cantavam: nossa Compaixão não pode mesmo nada,
não pode com a água salgada dos Olhos,
não pode com ela,
não pode nada
não pode nada
O que fazer Não há nada a fazer
Somente ser no ser
Mas se ainda uma gota
do sangue das estrelas for gotejada
na tua fronte, da fonte sagrada,
a sombra do homem de pó outra vez irá cintilar
no pó da estrada
Música e luz,
pela Luz dedilhada
Aqueles círculos, aquelas quedas, como se não devêssemos chegar.
Sempre voltariam?
As águas de uma mais clara penumbra
Evitamos os rios
E tendo bebido novamente desta água amarga que bebes também agora comigo
enquanto me escutas, Andara então nos faria ver coisas.
Veja você Andara.
O que nós iríamos achar.
Uma casa em ruínas estaria aparecendo bem diante dos nossos olhos, aquela casa,
só ela, na floresta, como se tivesse que ser assim
- Parece longe, tu me dirias.
- Parece perto, eu te diria.
E no entanto nem longe nem perto, aquela casa estava ali.
Grande.
Diante de nós.
Era só o cansaço maior em um de nós fazendo vê-la longe, e menor no outro
fazendo vê-la perto.
Os ossos mais pesados em ti do que em mim.
Entraríamos.
E ali estava o primeiro adormecido. Ali estaria ele. Um menino.
Tentaríamos acordá-lo, mas viraria para o lado, continuaria a dormir.
Outros estavam ali também adormecidos. Homens, umas mulheres, os nãos e os
sins com que a vida nos faz
E veríamos também aves numas gaiolas, adormecidas.
E tropeçaríamos. No chão daquela casa, espalhados por toda parte, uns cães latiam
silenciosamente em sonhos, mas ainda tentavam morder.
Entenderíamos que seria preciso lutar para não sermos também tragados por
aquela noite que havia em tudo ali, enquanto era dia lá fora, e assim esqueceríamos
a festa, não iríamos mais
As vezes, se te narro isso com um tempo mais vivo, tu notas, é porque é mais real
quando fecho os meus olhos
Ouve:
Há uma mulher na casa que adormeceu em pé, encostada numa parede, e por uma
leve vibração do ar, quando passas, se desequilibra, cai para frente, e em sonho quer
se apoiar em ti, suas unhas cresceram durante o sono e rasgam a tua carne
Mas não a deixarias cair. E verias os olhos da mulher se abrirem um instante, sem
te ver, e a depositarias no chão suavemente.
Tu estás abrindo uma gaiola agora, posso te ver, tiras uma ave adormecida da
gaiola. Parece que vai acordar, pois bica a tua mão vazia. Procura alimento essa ave.
Jogarias a ave para o alto. Não voaria. Não cairia.
E então tu a pegas no ar e pões de novo na gaiola.
Mas depois de uns passos, estás de volta. Abres a gaiola. Se a ave um dia acordar
Aquilo era assim naquela casa.
Uma criança adormecida quer dizer algo. Ponho o ouvido em sua boca. Mas só
ouço um som de águas profundas.
Uma ave voa em sua gaiola como se estivesse sendo perseguida. Quer escapar.
Depois não se mexe mais. Teria sido devorada em sonhos?
Vê agora:
Dos adormecidos, todos, então começaria a vir o mesmo som de águas,
redemoinhos, que viera da criança.
Era a carne talando neles, agora só a carne estando todo o resto adormecido?
Se pudéssemos ouvir o que a carne tinha a nos dizer naquela casa
Ouviríamos:
Os sons de águas se transformavam em vozes nos adormecidos.
E nas gaiolas as aves adormecidas perguntariam: Por que a carne, de olhos
abertos, vira pó, e de olhos fecha dos é eterna em sonhos?
E as crianças, adormecidas, naquela casa, perguntariam: Por que a carne, de olhos
abertos, vira pó, e de olhos fechados é eterna em sonhos?
E os homens c mulheres, adormecidos: Por que a carne
E os cães, adormecidos, roendo seus ossos de sono: Por quê?
Depois, o silêncio voltava. As vozes paravam.
E então foi que começamos a ouvir, começaríamos a ouvir aquele canto.
Nele, tu verás, aqueles adormecidos iriam falar com a carne, dizer-lhe coisas,
fazer perguntas a ela.
Um dos adormecidos, abrindo os lábios, deixava ouvir, num murmúrio: Canção de
areia
E o canto estava começando:
Viver a cada dia o mais estranho ouro, eles cantavam
Eles cantariam: A concebida areia,
e a caminhante em volta da pedra, a areia
e o vento em volta da pedra
e na areia
e reunida areia, a carne
E a concebida da asa,
e na areia ainda
a reunida areia
Voltava o silêncio. Uma pausa. E o canto voltava:
Fomos aqueles que primeiro uivou para ti,
e na primeira noite, o que primeiro riu nos tempos
Fomos os nossos arrependidos ossos curvos
pois tu trituras amorosamente o que conténs,
e incontida
Silenciosos sob o silêncio da erva: sensíveis
à dor e à tua erva
Silenciosos até a altura dos ramos voltados
para a nascente, grande é a Face que te espia da
outra margem
Pois se das coisas temos um sol tombado, e a descida
sombra
e o canto aviltado da voz rouca,
e ainda os olhos da primeira vez
da primeira, ó inesquecível
e sem podermos ver
deitados sob o silêncio da erva, e sensíveis ao que fomos
Ao uivo aos ossos à face à erva
Novo silêncio. E o canto:
Pelos tempos e as geleiras,
animais fizeram a curva luminosa do teu dorso
Verão sobrenatural: não damos um passo
sem a tua companhia
Pelo espesso: dele a espessura se desprende
na forma dos cheiros selvagens que tanto
nos empalidecem à noite:
cada um de nós é um clarão visto à distância
Tu és o escândalo do deus que se desfez
do lado mudo dos seus gonzos. E se abres
a porta escura deste ombro,
fatigados pêlos campos
semeamos nossos ossos mais humanos
nos lugares onde tivemos lábios e ressecam da oração
O canto. Os adormecidos
Se estás deitada, é quando és a beleza
ainda que no corpo em movimento habite um músculo
de sedução
Se vem a morte,
é que estás te exercitando no cansaço
Caísse algo ali, mas estando de costas não verias
Se curva a árvore, água reduz
seu ritmo de música
a cada homem um outro pela mão
se as pernas o abandonam,
a escura lua que assombra
Pois voltas o rosto para uma parede
e a uma vida de ti está passando e vês
passar um inseto
saído do mais estranho sono, que é estar vivo
Existe um passo que não existe
Voltava o silêncio, toda a casa parecia adormecer, mas a boca de um dos
adormecidos fazia novamente aquele som de águas, e voltava o canto:
Pois tua é a sombra,
e o teu deserto percorrido diz:
a concebida da areia,
e na areia a reunida areia, a carne
O canto outra vez se elevando:
Tua lentidão me atravessa pelo corredor de mim,
os passos são antigos neste ouro
e ainda que se tenha um sol e um corrimão de apoio
para tudo
a ausente se esmerando
a sombra
Não passarias se um outro conspirasse
No nome que é a senha da imensa floração
ainda uma veia dá sentido ao único
Camadas após camadas, as invisíveis tintas te cobrindo,
não saberia um homem nunca qual seria: a nave a floração
desde que um pé arrastado pela luz
se quis ali nas águas, a árvore da tua seiva vindo
ao encontro dos mais jovens, à tona
Se devíamos estar vestidos para a fonte,
é que a transformação do ouro em ferros, nisso tudo,
é o que menos nos oprime a âncora da vida
O canto. Seus cantos. Aquilo seria assim naquela casa entre árvores. Este outro
agora:
Tua água estagnada está bebendo no escuro
um animal de bruma
Os ausentes deixaram seus cheiros
ali, uns ossos esperam só a febre para desmoronar
Aqui a pele é a residência, e nela habitam
uma alegria e sarças, o músico
Sua música: teus animais estão escoiceando
a música: paredes que se batem umas nas outras
O corpo é só um homem junto da sua pedra de ternura
Aqueles adormecidos falando com a carne. O canto:
Estás acumulando lentamente uma ferida na lâmina
real
do teu verão
Daqui podemos ver que o dia coagula
E aves como homens batem as asas, para se elevar
nosso anzol de nuvens
um rosto de pedra voltado para o céu
uma caminhada de monstros andando dentro
Desce a sombra da sentença sobre a mão que acena
adeus
Não passe o próximo minuto sem que soe
a voz da desfolhada
A lâmina é a oferta de um grito: pelos olhos,
quando é ainda mais bela a estação das febres,
pelos tempos, se foi a mais antiga raiz a que deu frutos
O canto: isso nos retém, isso nos retém, isso nos retém
Temos por ti a consideração de um vaso
onde está depositada a espécie
mas se abrindo, a terra mostra-se à floresta dos homens
que se estende
A pele, a gelada residência
E o corpo busca outras passagens clandestinas
para a região do fundo do peito,
seu clarão de incêndios,
flutuando num mar de cortiças, cedendo
aos silvos desta noite
Ritual de véus: o lodo
Pois sonhas em ti mesmo a tua visibilidade
se sonhas o limo
Uma ave novamente estaria esvoaçando em sua gaiola, talvez um outro sonho da
carne perseguida, e nós continuávamos ali ouvindo aquele canto, a carne dos
adormecidos falando com a carne
Pois se também és forma sólida da música: o sino,
e o homem é planta em sua estação de fruta
do alto das atenções simuladas, sem o artifício nulo
conspirando pelo talo do teu corpo
perdida está toda a colheita
Te toca a voz anunciando a quebradiça que se dobra,
imóvel junto a um muro está o muro
- Senha, então anunciaria uma voz entre os adormecidos. E os adormecidos todos
respondiam:
- A senha é não sonhar teu nome.
E o canto, prosseguindo:
Libélulas dos ossos, libélulas da cara quando à
meia-noite se estremece de ansiedade em sonhos
A revoada dos teus desejos me sobrepassa
em muito as costas voltadas para a casa
dos meus pais: o carrilhão de sombras
O canto: isso nos invade, quer nos habitar pelos ouvidos para sempre
Pois tua é a sombra e a Sombra
e na areia
a reunida areia, a carne
E a concebida asa,
e na areia ainda a reunida asa de areia
Iríamos também adormecer ouvindo aquele canto, aquelas vozes? Nunca mais
sairíamos daquela casa?
Saber o que a carne tinha a nos dizer, sim, isso nós queríamos. Mas viria vindo
então em nós, negro, um medo
Nunca mais sair daqui? O canto:
Não nos deixa esquecer a casa alta,
lá tempo repete: cascas,
ainda que nascidas pele leve e mesmo
se ergues no ar a nossa infância
E há ventos nos ramos, a areia do teu sono
Pois uma é a lei severa que se expressa: se
reverdecem se inclinando para a morte serão homens.
se escurecem e pontiagudos são espinhos
Mas a floresta genuína estranhará
Temos as aberturas do ser para observar dos olhos
os outros seres,
tanto melhor para a euforia da terra
Relva do destino suculento, vem a mim, lenta
antes da noite lenta
Não terminaria nunca aquele canto, não iria nunca acabar?
Em ti estou plantado pelos ossos até os sonhos,
temente às chuvas, e um estranho para os peixes,
aqueles adormecidos cantavam
Andara cantava para a carne naquela casa.
E antes de adormecermos para sempre, nos afastaríamos dali
Pois tua é a sombra
e na areia a reunida areia, a carne
ainda ouviríamos, longe.
Pois tua é a sombra
teríamos ouvido aquele canto se extinguindo ou eram apenas os nossos passos que
agora já nos levavam para mais longe?
Homens e cinzas
homens e cinzas enveredaram cedo
Deserto, passos de centeio negro
Ali
horizonte e noite e alimento Uno
As estações por onde passam
A mais rítmica terra uiva longe Silêncio
entre clarões
E clamo
Os trigais sagrados
A relva das desordens
Ex-voz interminavelmente sempre retorna um êxtase
Retorna a vaga espécie em turnos pela terra
Teu canto e sonho e sons do olhar Clarão da voz
Nascente e ida de outros homens para a morte e bebo ainda de um trigal,
prazer e noite
Agora ex-água é a tua areia
e há dias ímpares a par das fontes, dizes
Retorna a vaga espécie em turnos
pela terra
rondando imagem e ruínas de um rival de luz
e o belo som não escutas mais, longe te sela
e perto negas o ouvido azul do tempo
Tarde da carne, então
Tempo e adeus E um grito à estrela
antes que à residência extraviada torne
Clarear esta paisagem
água e agonia
e anônimo atear
um mar ao ossário luminoso dos teus dias
Tempo e tribo
Tua era a janela de longa ascensão e abria-se A lua Sedução de profundezas
Escândalo de escama e lodo
E um mar ali
Troféu de sombra
Tempo e tribo,
e as tuas revelações tarde demais
Tais são os gestos
e música de limo, ela virá insone
à sala de torturas de um instante
Esfera Reta do Fim,
temos a carne para a fome de si mesma
e há cantos percorrendo a nu
a voz
Campos de som que não ignoram o eclipse próximo e as ruínas
Face de puras asas
Teu pé fronteira de um passo silencioso
Fora
excluindo-se,
toda a luz e um retorno de cinzas
Exílio e reino oculto, Paz Vegetal
E eis: as formações, cruéis em bando
Se ali
revoada e festa interditada,
febre lunar
Onde as ruínas consagradas? À noite
a forma cega de um altar de fogo
Renovemos neste instante pacíficos ante um mar mais doce o sangue
E as sedes
em torno, dentro
A voz
Esta se eleva entre duas árvores de murmúrio e sombra nua, una face de puras asas
Vegetais e margens
De pé teu animal em ti adormecido e a tua ida ao mar
que te incinera,
as cinzas nunca falham
Os ventos na memória têm desertos e o passo onde me nego antigo e uivo
e eco
e ao longe acenam adeus os vegetais e margens
negam em silêncio um número mortal as esgotadas
multidões
Colméia e culto,
caminhos negros
Espelho sem paisagens
Vem rever sem fôlego um rosto de desejos, olhos do imenso
azul em teus delírios
Sorte
é ter ainda a Árvore da Voz, a asa e um grito
A relva negra dos sons
Quem nega este deserto é a ruína da mais antiga
residência, A Aniquilada
As esmeraldas deste funeral
Este trabalho é luminoso quando passo flagrado em crime contra a terra,
em sonhos
Verão,
e à noite te virão os cantos, a relva
negra dos sons
em sonhos
nua, a tua planície entre aves
e o teu anoitecer de lã de homem ao mar
Tambor de húmus
Avançava o veículo todo santo as multidões tinham
vertigens de azul
Murmurando entre dois homens
que não sou
e dando gritos
ali me esconde meu documento íntimo de sombra
e o teu incêndio E o meu
E o fogo fátuo e a Fruta de estar vivo
Tremor da pele, dias de sina
Ilha é a terra,
o animal respira lento em sua caverna
Tambor de húmus e hipótese de cinzas e à quarta porta um sol de sal e um espelho
Tensa se ergue por sobre a residência entre clarões
a mais árida hera,
a ira
Centeio e luz
Eis a colheita e em ti nem ave há, e lá a fruta, fêmea de cinza
Te deixam as árvores, a fibra e a residência E vens
À noite,
segue em círculos a vida e a colméia Abelha
e vítima, os vícios do mal
Espera e canto
As estações
Trigal azul os dias
e os homens bebem um mar indo à deriva e invisível
escura hora passa em ti, Lugar de Véus
Centeio e luz, então
Só amanhecem o grão e a solidão
E na manhã, o teu chamado mais selvagem
Te anunciam eclipse e alimento
e a voz incinerada
e a incinerada asa entre clarões
e o limo e o vento e a ilha das desordens, pois és a erva real do verão
e dando adeus às sinas e à ruínas, uma vez mais está pronta a semente
Teu lodo e o que te esquece
As armas submersas Teu lodo e o que esquece e lá
revelações
Tempos de cinza afundam Os teus clarões
Plantas à sombra um rival de musgo,
a árvore dos dias
Se inclinam frutos
Teu peixe antigo sonha
a negra
e dartro luminoso te entreabrem a porta
e à noite os teus cardumes Vem morder um sonho
e o Selo, o labial
de uma promessa
Tua floresta de estrelas pende Astro maduro
Te busca o teu verão
A voz narrando histórias E ainda mais se inclinam para nós
memória e mar
Entre raízes
teu lodo sonhará
Navio da voz
Carne fantasma
Renasce a arma amada, teu mar renascerá
Ave, fantasma
Nas fronteiras da carne, Horizonte Velado
passas
À tona,
a variedade sempre única de um vôo e velas lentas
A carne tem golfos de luz que te incineram
aVe, fantasma