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GESTÃO DE RESÍDUOS EM UNIVERSIDADES: UMA COMPLEXA RELAÇÃO QUE SE ESTABELECE ENTRE HETEROGENEIDADE DE RESÍDUOS, GESTÃO ACADÊMICA E MUDANÇAS COMPORTAMENTAIS Profa. Dra. Suzana Maria De Conto UCS

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GESTÃO DE RESÍDUOS EM UNIVERSIDADES: UMA COMPLEXA

RELAÇÃO QUE SE ESTABELECE ENTRE HETEROGENEIDADE DE RESÍDUOS, GESTÃO ACADÊMICA E MUDANÇAS

COMPORTAMENTAIS

Profa. Dra. Suzana Maria De ContoUCS

Os problemas relacionadosaos resíduos gerados emuniversidades não são apenasfísicos, químicos oubiológicos: são tambémcomportamentais e de gestãoacadêmica.

As mudanças de condutas da comunidadeacadêmica não ocorrem de um dia paraoutro. O favorecimento dessas mudançasem prol da Política Ambiental dasuniversidades exige a integração dediferentes áreas do conhecimento, sendo oapoio e a aprovação da alta direção(Reitoria) imprescindível para o sucesso damanutenção do comprometimentoambiental de todas as unidades e setoresda academia.

Como as universidades estruturam as suas políticasambientais?

As universidades possuem uma política ambiental?

O compromisso com o meio ambiente é apresentado namissão e princípios das instituições de ensino superior?

Como a dimensão ambiental é contemplada noplanejamento estratégico das instituições?

O Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) demonstrao compromisso das universidades com o meioambiente?

A efetiva gestão de resíduos é uma exigência no processode avaliação das instituições pelo Ministério daEducação?

Qual é o papel do governo federal, estadual e municipalem relação à gestão de resíduos nas universidades?

As universidades possuem licenciamento ambiental?

Existem programas de educação ambientalinstitucionalizados nas universidades?

Como as instituições de ensino e os órgãos de fomento apesquisa estimulam o desenvolvimento de estudosrelacionados à prevenção da geração de resíduos?

Refletir sobre os questionamentos ebuscar a definição deresponsabilidades no âmbito federal,estadual e municipal, como dasadministrações das universidades eanalisar os termos e expressões aquievidenciados, parece ser importantepara relacionar a gestão de resíduos àgestão acadêmica.

GESTÃO DE RESÍDUOS EM UNIVERSIDADES

COMO PARTE DA GESTÃO ACADÊMICA UTILIZADAPARA DESENVOLVER E IMPLEMENTAR POLÍTICASRELACIONADAS AOS ASPECTOS E IMPACTOSRESULTANTES DAS ATIVIDADES DE ENSINO,PESQUISA E EXTENSÃO. COMPREENDE AÇÕESREFERENTES À TOMADA DE DECISÕES, POLÍTICASE ESTRATÉGIAS, QUANTO A FATORESINSTITUCIONAIS, OPERACIONAIS, FINANCEIROS,SOCIAIS, EDUCACIONAIS E AMBIENTAIS DAGERAÇÃO AO DESTINO FINAL DOS RESÍDUOSGERADOS NAS ATIVIDADES ACADÊMICAS.

Como as instituições utilizamconhecimentos das diferentes áreas paraminimizar os impactos ambientaisprovocados pelas atividades de ensino,pesquisa e extensão?

Como é integrado o conhecimento dediferentes áreas no sentido de melhorplanejar a inserção da dimensão ambientalnos programas de ensino nos cursos degraduação e de pós-graduação? (PROJETOPEDAGÓGICO)

Como a dimensão ambiental éanalisada pelos setores: compras,contabilidade, jurídico, marketing,comunicação, ... como critério deplanejamento e de tomada dedecisões?

Como a área técnica dialoga comesses setores?

Ocorre o diálogo?

As despesas ambientais nas universidades sãocontabilizadas conforme prevê na Norma Brasileirade Contabilidade – NBC T 15 (NBC, 2004)?

Os contratos estabelecidos nas universidades nascompras e contratações de serviços são embasadosem critérios ambientais (licitação sustentável)?

Existem políticas de prevenção da geração deresíduos?

O projeto arquitetônico dos prédios construídosnas universidades prevê o espaço para o manejo earmazenamento de resíduos em conformidade comas suas características e quantidade gerada?

Como os professores e técnicos,principalmente os que desenvolvempráticas em laboratórios, são estimulados arepensar seus programas de ensino e ouprojetos, no sentido de minimizar oimpacto ambiental e a quantidade deresíduos decorrentes dos mesmos?

Que pesquisas científicas devem serdesenvolvidas sobre o comportamento dacomunidade acadêmica em relação àgeração e manejo de resíduos?

Que pesquisas científicas devem serdesenvolvidas sobre alternativastecnológicas de prevenção de resíduos deuniversidades?

Como desenvolver programas de ensinointegrando diferentes áreas doconhecimento?

Essas, entre outras questões, merecem umexame minucioso e serem respondidaspelos administradores das universidades,pelos professores, pelos colaboradores,pelos alunos e pelos governos federal,estadual e municipal.

Não se tratam de respostas verbais, mas denovas formas de agir, as quais sem dúvidaexigem novos conhecimentos, novascondutas e novas aprendizagens,possibilitando com maior clareza apontarnovas direções nos caminhos a percorrerpara superar os atuais problemasenfrentados pelas universidades em relaçãoà geração de resíduos.

A visão holística dos problemas ambientaisrelacionados à gestão de resíduos noâmbito das universidades é uma exigência aser atendida e que será possível a partir daintegração do conhecimento produzido nasdiferentes áreas e da construção de umagestão acadêmica diferente, moderna,contemporânea, onde o pensar ambientalesteja presente na concepção, noplanejamento, na implantação e naoperacionalização das atividades de ensino,pesquisa e extensão.

Os problemas relacionados aosresíduos em universidades sãocomplexos, exigindo soluçõescomplexas e sistêmicas,principalmente voltadas àprevenção da geração de seusresíduos.

A prevenção pressupõe a revisãode conceitos e reavaliação decondutas de técnicos, professorese alunos em relação às mudançasque devem ocorrer nas rotinas delaboratórios das universidades(substituição de reagentes,redução na quantidade desoluções, substituição de vidraria,economia de água e de energia,entre outras).

As universidades devem dar uma maioratenção à prevenção da geração deresíduos, revendo conceitos, banindopreconceitos, criando novos conceitos nagestão acadêmica, desestimulando acompartimentalização do conhecimento,revendo programas de ensino, estimulandoa produção de conhecimento sobreprevenção de impactos ambientais,desenvolvendo programas de educaçãoambiental, entre outras necessidades, nosentido de formar um novo profissional:mais humano, mais comportamental, maiscriterioso quando o assunto é o meioambiente.

Como avaliar se as alternativas tecnológicasplanejadas são ambiental, social eeconomicamente corretas? A resposta aesta questão merece análise criteriosa porparte dos gestores acadêmicos. Análise quenecessita conhecimentos relacionados àheterogeneidade de resíduos; a produçãomais limpa; a ciclo de vida do produto; alegislação ambiental vigente; a tecnologiasdisponíveis para acondicionamento,armazenamento, transporte, tratamento edestino final de resíduos; a processoseducativos; a análise comportamental nasorganizações, entre outros.

Lacuna em muitas instituições: falta deplanejamento para o armazenamento dosresíduos nos diferentes setores, identificadapela ausência de espaços específicos para talfinalidade. Se os resíduos são oriundos dasatividades de ensino, pesquisa e extensão noâmbito das universidades, por que o projetoarquitetônico das edificações em geral nãoprevêem o espaço para o acondicionamento earmazenamento provisório dos mesmos?

A estrutura de uma instituição de ensinosuperior é o resultado da organizaçãoconcebida para ela ou que é feita nela. ÉNECESSÁRIO DAR IDENTIDADE AOS RESÍDUOS

A visão sistêmica sobre as atividades a seremdesenvolvidas e os produtos decorrentes dasmesmas também parece configurar umalacuna, como por exemplo, nos responsáveispelo projeto arquitetônico dos prédios dasuniversidades.

Sommer (1979), ao examinar oprocesso de elaboração de projeto deedificações, comenta que há umatendência a enfatizar pouco asatividades que ocorrem dentro de umaestrutura. Nas edificações, em geral,são superestimadas a natureza ou assuas características, relegando aosegundo plano a função das mesmas.

O autor conclui que a arquitetura deveconter espaço em que algumas atividadespossam ser realizadas de maneira cômoda eeficiente.

A clareza quanto à importância dasistematização da fonte geradora deresíduos gerados em universidades e dadefinição do espaço para o manejo dosmesmos parece ser uma condiçãoimportante para auxiliar a reverter acondição marginal que foi relegada a essesprodutos resultantes da atividade deensino, de pesquisa e de extensão.

Os projetos de pesquisa precisam ser repensados,no sentido de serem desenvolvidos com o menorimpacto ambiental, independente da área doconhecimento que ele estiver vinculado.

Definição de critérios pelas instituições de ensino,como também pelos órgãos de fomento àpesquisa, com relação à sustentabilidade ambientalno processo de produção de conhecimento.

Todo projeto deve demonstrar medidas deprevenção da geração de resíduos, técnicasadotadas para o manejo correto dos mesmos(geração ao destino final), como também incluir emseus orçamentos as despesas ambientaisdecorrentes em todo o seu desenvolvimento.

LICENÇAS AMBIENTAIS PARA PROJETOS DE PESQUISA?

Em geral a solução dos problemasrelacionados aos resíduos de IES seapresenta no final do ciclo de vida, ouseja, quando o resíduo é gerado.

Não há participação efetiva dacomunidade acadêmica na intervençãodo problema, ou seja, antes dageração desses resíduos.

As soluções, mesmo iniciando no finaldo ciclo dos resíduos, em geral sãoparciais nessas instituições,restringindo-se a alguns setores,laboratórios ou departamentos, nãofazendo parte inicialmente de umapolítica institucional.

Em geral, são os preconceitos, os costumes,as indisposições e os hábitos deprofessores, técnicos e alunos que criamdificuldades para o desenvolvimento decondutas básicas que beneficiam ainstituição como um todo.

Sommer (1973), ao examinar a relação doambiente com o comportamento do indivíduo,destaca que “... algumas pessoas se acomodamao que quer que seja, por menos funcional oumais incômodo que seja, ou porque acreditam queas regras as proíbem de alterar a disposiçãoencontrada” (p.12).

O autor continua destacando “... asantificação institucional que existe sempreque as pessoas passam longos períodos detempo num ambiente. Depois de certotempo, por mais que parecesseinicialmente, o costumeiro se torna fixo enatural” (p. 99).

A identificação das situações com as quais acomunidade acadêmica se defronta com ageração de resíduos parece ser importanteno processo de elaboração de programas,projetos, sistemas e até mesmo de políticasvoltadas a gestão de resíduos gerados noâmbito das universidades. “O fato deperguntar às pessoas o que é que desejamquanto ao ambiente ajuda a superar adespersonalização e a alienaçãoinstitucional” (SOMMER, 1973, p.116).

Problemas que muitas vezes são originadosnos laboratórios de química, de materiais,de veterinária, de biotecnologia, demedicina, de física, de mecânica, quandoinexiste uma política ambientalinstitucionalizada, passam a ser, nomomento do descarte de seus resíduos,responsabilidade do setor de manutenção,da Prefeitura Universitária ou da equipeambiental.

A falta de interlocução entre os diferentesagentes responsáveis pelo ciclo dos resíduos émaléfica e contribui para a manutenção dos atuaisproblemas que as instituições de ensino vivenciamno dia a dia. Há um problema sério quando isso seconfigura: não há clareza do papel dos diferentesagentes responsáveis pela geração de resíduosnas atividades de ensino, pesquisa e extensão.

A adoção de uma engenhariacomportamental, conforme sugerida porSkinner (1978) pode ser entendida como oresultado de um esforço sistêmico(condutas, técnicas e tecnologias avançamarticuladas com relação ao fenômenoresíduos).

As condutas devem ser entendidas nãoapenas no âmbito individual, mas tambémno âmbito administrativo, político, técnico,econômico, educacional e científico.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL: DIFERENTES MANEIRAS DE SENSIBILIZAR

A proposição de um Programa de EducaçãoAmbiental em universidades surge da necessidadede esclarecer e sensibilizar a comunidadeacadêmica sobre as responsabilidadesocioambiental de cada indivíduo.

Considerando que a informação é uma variávelque determina o comportamento daspessoas em relação ao meio ambiente, éimportante que a mesma seja de qualidade e quepossa ser disponibilizada de forma contínua naacademia.

1) Inserção da dimensão ambiental nosprogramas de integração dos novosprofessores, colaboradores e alunos dauniversidade, como também na SemanaAcadêmica de todos os cursos;

2) Apresentação da política ambiental dauniversidade em disciplinas básicas doscursos, contemplando a informação nosprogramas de ensino para todos os alunos;

3) Implantação de trilhas ecológicas, propiciando acomunidade acadêmica e demais visitantesconhecer às centrais de armazenamento deresíduos, estação de tratamento de efluentes,vegetação imune ao corte, recursos hídricos (casoocorra) e demais tecnologias implantadas nainstituição no Sistema de gestão de resíduos;

4) Criação de uma coluna ambiental nos informativos,jornais, revistas e site da universidade;

5) Criação de um Programa ambiental na área decomunicação (rádio e televisão);

6) Comemoração da Semana do Meio Ambiente deforma integrada em todos os setores dauniversidade;

7) Disponibilização de informações sobre o combate aodesperdício de água, de energia e de papel nosdiferentes setores da instituição, com destaque as salasde aula, laboratórios e sanitários;

8) Criação de procedimentos para o material dedivulgação. Uso de notas de rodapé para informarsobre o tipo de papel adotado e como deveocorrer o descarte;

9) Criação de banco de dados sobre as publicaçõesrelacionadas a programas e ações ambientaisdesenvolvidas na universidade;

10) Incentivo ao desenvolvimento de teses,dissertações, monografias, estágios, trabalhos deconclusão de cursos e projetos de pesquisa com otema ambiental e em especial: universidade comoobjeto de estudos;

11) Implementação de programas de capacitação dos colaboradores para o manejo correto dos resíduos gerados nas universidades;

12) Criação de peças teatrais utilizando a política ambiental da universidade como tema principal;

13) Incentivo aos alunos, por exemplo, dos cursos de comunicação, artes e letras na criação de livretos de palavras cruzadas utilizando o tema ambiental;

14) Inserção da política ambiental dauniversidade no vídeo institucional;

15) Inserção de informações ambientais,principalmente relacionadas a mudanças decondutas das pessoas em relação àprevenção da geração de resíduos, nosistema de telefonia da universidade(disponibilizar a informação durante aespera telefônica).

Ainda que de forma preliminar, é possívelconcluir que os trabalhos apresentados emrevistas e congressos, em geral, estãocentrados na abordagem corretiva e passivado gerenciamento de resíduos,evidenciando a escassez de estudosfocados na prevenção e minimização nasdiferentes fontes geradoras das IES.

É importante e necessário incentivar odesenvolvimento de novos saberes sobre gestão deresíduos em universidades, investindo na produçãode conhecimento sobre a prevenção da geraçãodesses resíduos em suas diferentes atividades.

A universidade pode e deve contribuir nopreenchimento dessa lacuna, implantando noprocesso de avaliação de projetos de pesquisa,projetos pedagógicos e projetos de extensão adimensão ambiental (desenvolvimento de projetosque estejam enquadrados à política ambiental dainstituição, que contemple as despesas ambientaisdecorrentes do processo de produção e desocialização do conhecimento).

Órgãos financiadores de projetos de pesquisa:papel fundamental no que tange a definição dediretrizes voltadas a aumentar o incentivo naprodução de conhecimento sobre a prevençãoda geração de resíduos.

Com relação ao governo e as políticas deavaliação institucional e de cursos peloMinistério da Educação, cabe a inclusão dadimensão ambiental na análise do PDI e nosindicadores de avaliação ou requisitos legais,com ênfase ao compromisso da universidadeno cumprimento das diferentes etapas dagestão de resíduos.

É possível concluir que lidar com resíduos emuniversidades exige um esforço integrado emultiprofissional.

Diferentes pesquisas que vem sendodesenvolvidas em diferentes IES do paíspodem contribuir na minimização dosproblemas e dificuldades enfrentadas pelaacademia com relação aos resíduos que geraem suas atividades de ensino, pesquisa eextensão, no sentido de melhor construiras relações entre gestão de resíduos egestão acadêmica.

SUZANA MARIA DE CONTO

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