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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA CURSO DE PSICOLOGIA CENTRO DE ESTUDOS APLICADOS À PSICOLOGIA Grupo com Idosos em Instituições de Longa Permanência: (im)possibilidades Autor: Vinicius Furlan Relatório Final do Estágio Supervisionado em Psicologia, ligado ao Centro de Estudos Aplicados à Psicologia do curso de Psicologia da UNIMEP, exigido como parte dos requisitos dos alunos para a conclusão do curso. PIRACICABA-SP DEZEMBRO DE 2013

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UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA

CURSO DE PSICOLOGIA

CENTRO DE ESTUDOS APLICADOS À PSICOLOGIA

Grupo com Idosos em Instituições de Longa Permanência:

(im)possibilidades

Autor: Vinicius Furlan

Relatório Final do Estágio Supervisionado em

Psicologia, ligado ao Centro de Estudos

Aplicados à Psicologia do curso de Psicologia

da UNIMEP, exigido como parte dos

requisitos dos alunos para a conclusão do

curso.

PIRACICABA-SP

DEZEMBRO DE 2013

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Grupo com Idosos em Instituições de Longa Permanência:

(im)possibilidades

Autor:

Vinicius Furlan, Universidade Metodista de Piracicaba/ Universidade Federal do Ceará

Supervisora:

Ms. Maria Dolores Alvarez, Universidade Metodista de Piracicaba

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Resumo: Zimerman entende a velhice como uma questão social, e destaca que os fatores

psicológicos, sociais, culturais e ambientais podem qualificar ou prejudicar o processo de

envelhecimento. Neste sentido, trabalhou-se visando a interação social, a revinculação, o

resgate da história de vida, da identidade e da imagem, a escuta, o estímulo da memória, o

estímulo da linguagem, a orientação espaço-temporal e a auto-estima, a fim de colaborar com

estes fatores. Desenvolvemos, portanto, um trabalho com grupos de idosos, em duas

instituições distintas, como um espaço de escuta para que estes sujeitos pudessem expressar-

se. O trabalho foi desenvolvido em dois momentos. O primeiro, numa instituição durante o

primeiro semestre do estágio, e, o segundo, noutra, durante o segundo semestre. No primeiro,

o grupo foi com homens, e, no segundo, com homens e mulheres. Usou-se de recursos como:

a fotografia; relógio e calendários individuais e personalizados; e a técnica do desenho. No

segundo ainda foi criada uma horta como um dispositivo terapêutico e de produção de vida.

Em ambos os Lares o grupo permitiu a interação social entre os idosos, que se olhassem e

fossem olhados, o resgate de imagem, o resgate da história de vida, a estimulação da

comunicação verbal, bem como a estimulação da coordenação motora, da mutualidade, da

imaginação, da cognição e da memória. No Lar 1, encontramos resistência no trabalho

desenvolvido e fomos convidados a deixar o campo de estágio, o que implicou mudarmos

para o Lar 2. Pudemos ver que as (im)possibilidades no trabalho com grupos de idosos em

Instituição de Longa Permanência possui condições e peculiaridades distintas que configuram

diferentes arranjos e modos de conduzir a prática, que é atravessada pelo poder e cotidiano

institucional, que, dependendo do modo como se configura, pode ser alienador e levar a

solidão, ou possibilitar um espaço digno de ser vivido.

Palavras-chave: Idosos; Grupo; Instituição.

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1. Introdução

Este relato resulta do Estágio Supervisionado em Psicologia Clínica que recobre o

último ano do curso de Psicologia da Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP -, que

foi desenvolvido junto ao Centro de Estudos Aplicados em Psicologia, em que se trabalhou

com grupos de idosos em Instituições de Longa Permanência. O texto discorre acerca da

experiência do estagiário junto aos idosos em duas instituições do município e retrata as

(im)possiblidades do trabalho com grupos de idosos que vivenciam a institucionalização.

Para iniciar nossa discussão recorremos a Rozendo e Justo (2012) que destacam que,

nos últimos anos, houve um grande aumento na proporção da população idosa no Brasil. Isto

implicou reformas na Previdência Social e modificações nas políticas públicas relacionadas

aos direitos humanos dessa população.

De acordo com Zimerman (2000), houve um progressivo aumento da população idosa e isto

se deu por conta de alguns fatores, dentre os quais dois são relevantes: a diminuição da

natalidade e o aumento da longevidade.

No Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2012), a

população idosa chega a 14,5 milhões, ou seja, 9,1 % da população brasileira já atingiu 60-65

anos (idade estabelecida para idosos em países em desenvolvimento). Esta pode ser

considerada uma das maiores populações idosas do mundo ultrapassando a França, Itália e

Reino Unido. Por esse motivo o envelhecimento no Brasil requer planejamento na saúde

pública para atender a demanda de idosos que poderá chegar a mais de 30 milhões em 2025.

Para isso, os idosos necessitam de cuidados e uma boa qualidade de vida, tornando-a

prazerosa, digna e confortável.

Não obstante a população idosa esteja aumentando, dados do IBGE de 2012, apontam que

está havendo uma redução no número de casais com filhos, isto implica um futuro próximo

com idosos sem aqueles a quem provavelmente caberiam à tarefa de seus cuidados: seus

filhos. Portanto, torna-se de suma importância a preocupação na construção de políticas

públicas dirigidas à população idosa a fim de garantir-lhes seus cuidados e direito a uma vida

digna, e, neste sentido, investir em melhorias e qualidade em instituições para idosos.

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As instituições que abrigam idosos têm necessitado de adaptações que possam preservar as

qualidades de independência do idoso a fim de que o envelhecimento não seja apenas um

processo que leva ao fim da vida.

A institucionalização de idosos pode acelerar as perdas funcionais já que os mesmos são

submetidos a rotinas estabelecidas e perdem seus direitos de expressar desejos e deveres.

Raramente há propostas de incentivos à independência e autonomia. Muitos apresentam uma

boa aceitação asilar referindo considerar os colegas como “família”. Outros relatam à

convivência asilar como “depósito de velhos”, pois perderam o contato com familiares,

amigos e vizinhos, com o meio social e a independência, além de sentirem-se enganados com

falsas promessas de retorno para casa ou terem sido levados aos asilos à revelia.

Diante deste cenário, entendemos que Zimerman (2000) nos traz uma contribuição

interessante quando destaca que compreende a velhice como uma questão social, enfatizando

que os fatores psicológicos, sociais, culturais e ambientais podem qualificar ou prejudicar o

processo de envelhecimento.

É neste sentido que desenvolvemos um trabalho com os grupos de idosos, visando a

interação social, a revinculação, o resgate da história de vida e da imagem, a escuta, o

estímulo da memória, o estímulo da linguagem, a orientação espaço-temporal e a auto-estima,

a fim de colaborar com estes fatores conforme destacados por Zimerman.

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2. Descrição do trabalho

Esta experiência de Estágio Supervisionado em Psicologia retrata o estágio

desenvolvido com grupos de idosos em duas instituições distintas e que ocorreram em dois

momentos diferentes. Primeiro numa instituição de idosos que chamaremos aqui de Lar 1, e,

posteriormente, noutra instituição que chamaremos Lar 21. Para melhor entendimento do

processo de desenvolvimento dos estágios, os descreveremos sequencialmente do modo como

ocorreu.

2.1. Primeiro momento: dificuldades no trabalho com idosos que vivenciam a

institucionalização

No primeiro momento, visamos criar no Lar 1, um grupo de idosos como um espaço de

escuta para que estes sujeitos pudessem expressar-se.

Depois de uma longa discussão com a psicóloga do Lar acerca das possibilidades da

realização de um grupo misto para romper com a divisão sexual já estabelecida pela

instituição, pois, o distanciamento dos pavilhões impede a convivência entre homens e

mulheres, a psicóloga apontou que a distância entre os pavilhões não permitiria esta

formatação, por conta da dificuldade de locomoção dos idosos para participar do grupo caso

fosse misto. Deste modo, sugeriu que trabalhássemos com o pavilhão G, que é masculino2.

Após primeira visita ao Lar para conhecer os profissionais, bem como os moradores, o

estagiário começou a desenvolver seu trabalho, procurando estabelecer um vínculo com os

idosos e formar o grupo.

A proposta de se trabalhar com grupo, dá-se pelo fato de que o grupo permite que seus

membros possam reconhecer-se como iguais e, principalmente, favorecer a socialização entre

eles, possibilitando que relatem suas histórias, olhem um para os outros. Fatores que não eram

possíveis observar na vivência cotidiana dos idosos.

1 Os nomes das instituições serão preservados, bem como dos participantes dos grupos, a fim de resguardar suas

identidades e possível identificação. 2 É importante destacar que no Lar 1 eles chamam cada casa que compõem o Lar de pavilhão. Há uma distinção

entre chalés e pavilhão. Chalés são as casas particulares, compradas pelos moradores que as habitam. Pavilhões

são os grandes prédios que acolhem os idosos que são institucionalizados através do S.U.S. (Sistema Único de

Saúde). Os pavilhões são enormes e acolhem grande quantidade de idosos, bem como há excessivo número de

idosos por quarto.

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O Lar 1 configura-se de uma forma que impossibilita a convivência dos idosos entre si,

não possibilitando a interação entre eles. Neste sentido, foi possível observar que viviam sob a

solidão e o isolamento que imperava na instituição, sem estabelecerem contato entre si e

apresentavam uma aparência de quem experienciava uma morte simbólica antes mesmo da

biológica, por conta de identificarmos que a instituição não se orientava num movimento no

sentido de possibilitar um ambiente propício para o processo de envelhecimento.

De acordo com Reboredo (1994), o grupo permite com que os sujeitos rompam com a

alienação e com a cristalização de suas atitudes, além de perceber que juntos podem superar

as dificuldades presentes em seu contexto social. Acreditávamos, portanto, que a criação do

grupo permitiria a interação entre eles, facilitando o rompimento com o isolamento e solidão

vividos por estes idosos.

O grupo passou a ser construído pelo estabelecimento do vínculo do estagiário com os

idosos, sendo explicitados os objetivos do grupo e fortalecendo o convite para sua

participação.

Os encontros eram realizados duas vezes por semana, no período da tarde, devido a

atividades e programações que preenchiam os horários matinais. O grupo foi realizado com

homens moradores do pavilhão G e foi possível trabalhar a interação social entre os

participantes e os demais objetivos.

Utilizou-se de recursos como: a fotografia para se trabalhar a imagem; relógio e

calendários individuais e personalizados com foto e assinatura, mês a mês, para a orientação

espaço-temporal; e a técnica do desenho individual e compartilhado.

Outro fator que também sempre esteve presente foi o de dirigir-se aos idosos pelo nome

próprio para o resgate da identificação pelo nome. Pois, percebemos que havia uma tendência

dos profissionais do Lar em dirigirem-se aos idosos não pelo próprio nome, mas por

“vôzinho”, “tiozinho”, o que tinha implicações para a identidade.

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Participaram do grupo alguns idosos que viviam no pavilhão G. Todavia, a presença dos

participantes oscilava e era inconstante, pois, numa instituição que não se orienta no sentido

de promover vida e interação entre os idosos, a vontade em participar das atividades sempre

se apresenta de imediato pela desmotivação. Portanto, a construção de um espaço grupal

numa instituição como essa requer tempo, dedicação, empenho e paciência, e, principalmente,

o estabelecimento e fortalecimento do vínculo e da confiança, pois, estes sujeitos já possuem

um histórico de vínculos que foram rompidos e talvez reviver a desvinculação devido à

rotatividade de profissionais e estagiários lhes seja algo o qual busquem evitar.

Entretanto, os idosos sempre foram receptivos com o estagiário. Este, antes de mais nada,

procurava ouvir o que eles tinham a dizer, ouvir suas histórias, e após a construção de um

vínculo, que poderia levar dias, eram feitos os convites para a participação no grupo.

O grupo, após longo processo, se constituiu e permitiu os idosos se expressarem e serem

ouvidos e ainda possibilitou o resgate e ressignificação de suas histórias de vida, bem como

relatos do cotidiano de suas vidas na instituição.

A fotografia permitiu o desenvolvimento do olhar entre eles e de si mesmos.

Consequentemente, puderam ver e serem vistos, assim como o resgate da imagem com

aspectos de transformações corporais devido ao transcorrer do tempo, evidenciando uma

ferida narcísica no que tange ao “belo” sob o ponto de vista estético, pois não se sentem mais

objeto de desejo do outro.

O estímulo da linguagem verbal incentivou a socialização, a mutualidade e a possibilidade

de revinculação, pois houveram rupturas anteriores nos vínculos familiares e com a sociedade,

em que muitos deles foram abandonados pelas próprias famílias, que conforme assinala Elias

(2001), a admissão num asilo normalmente significa rupturas com os laços afetivos e com a

vida comunitária, podendo levar os indivíduos a solidão. E ainda pelo fato de neste lar os

idosos serem proibidos de sair de lá dentro, acentua-se essas rupturas e solidão.

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A técnica do desenho empregada no grupo estimulou a imaginação, a cognição, a

coordenação motora, a comunicação verbal, a memória, bem como a interação entre eles.

O fato de nos dirigirmos a eles nomeando-os, permitiu a afirmação de suas identidades,

visto que na instituição há uma tendência a designarem os idosos por “vôzinho”, “tiozinho” e

não pelo próprio nome. Embora o nome não designe nossa identidade, para Ciampa (2009) o

nome nos representa e é através dele que nos identificamos.

Podemos entender que a categorização destes sujeitos como “vôzinho”, “tiozinho”,

expressa aquilo que Goffman (1975) entende por estigmatização, em que se imprimi no

sujeito

(...) um atributo que o torna diferente de outros que se encontram numa categoria em que

pudesse ser incluído, sendo, até, de uma espécie menos desejável (...). Assim deixamos de

considerá-la criatura comum e total, reduzindo-a a uma pessoa estragada e diminuída. Tal

característica é o estigma, especialmente quando o seu efeito de descrédito é muito grande (...)

(p. 12).

Não consideramos que os termos “velho” ou “tio” possuem sentido pejorativo, mas o fato

de observarmos que os profissionais e aqueles que lidam com estes idosos – podemos

entender aqui aqueles que se entendem por normais, conforme Goffman – imputam, o tempo

todo, um caráter acerca daquilo que os idosos devem ser, afirmado por um atributo

depreciativo.

Embora possamos observar que o trabalho com grupo junto à população idosa pôde

contribuir com os fatores destacados por Zimerman, e possibilitar a interação social nesta

população que vivenciava o isolamento e a solidão da institucionalização, ainda vivenciamos

situações as quais foram possíveis identificar a violação dos direitos dos idosos.

Notou-se que tais violações estavam naturalizadas. Percebemos, então, que também era

necessária uma ação política para o controle do trabalho desenvolvido na instituição, e a ação

passou a ser junto ao Conselho Municipal de. Todavia, juntamente com a entrada no Conselho

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encerrava-se o primeiro semestre do estágio e a diretoria do Lar 1 solicitou a retirada do curso

de Psicologia do Lar, justificando que este passaria por reformas nas estruturas dos prédios.

Conforme destaca Bleger (2003), as instituições podem ser criadas com certos objetivos

que podem atender as necessidades de seus usuários, todavia, em determinados momentos as

instituições, para sua manutenção, entram em conflito com os objetivos pelos quais foram

criadas. E da mesma forma, os objetivos do trabalho com grupo pode entrar em conflito com

os objetivos da instituição e assim encontrar resistência quanto a sua relevância e significado,

sendo entendido como não mais necessário, como vimos em nossa experiência.

2.2. Segundo momento: uma experiência diferenciada com grupos de idosos que

vivem em instituição

Nesta parte discorreremos acerca do segundo momento do estágio e que foi

desenvolvido no Lar 2.

Como vimos não foi possível a continuidade do estágio no Lar 1 e, assim, migramos para o

Lar 2, onde coube ao estagiário dar continuidade ao trabalho ali realizado por outra estagiária.

O estágio desenvolvido pela estagiária anterior facilitou nosso trabalho, haja vista já haver um

grupo formado. No primeiro encontro com a instituição e os idosos, a estagiária nos

acompanhou, e, em seguida, assumimos o trabalho.

Os objetivos continuaram como os do estágio anterior, bem como os materiais e técnicas.

Todavia, por ter sido identificado que muitos dos moradores do Lar 2 vinham do contexto

rural, foi criada uma horta como um dispositivo para trabalhar oficinas com os idosos como

um meio terapêutico e de produção de vida, pois, destaca Afonso (2006) que as oficinas

podem trabalhar significados afetivos e vivências relacionadas ao temas a serem discutidos.

Os encontros do grupo aconteceram semanalmente nas tardes das segundas-feiras.

Entretanto, nas situações em que as oficinas ocorriam na própria horta, devido a esta ficar

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num espaço onde batia sol, agendávamos o período da manhã enquanto o sol ainda estava

mais fresco.

Participaram do grupo cerca de 10 moradores do Lar, todavia, a frequência na participação

também oscilava, e ainda contamos com a participação de cadeirantes. Neste Lar, diferente do

anterior, o grupo pôde ser misto, incluindo homens e mulheres, pois, devido à instituição ser

pequena, a convivência entre eles é mais próxima e significativa. Pelo fato de a instituição

possibilitar maior contato entre homens e mulheres, presenciamos alguns casos de namoro e

paquera entre os idosos, fato que não é comum nesta população por conta do estereótipo que

perdura no imaginário social de que idoso não pode exercer sua sexualidade.

Diferentemente da instituição anterior em que os idosos vivenciavam a solidão e o

isolamento que imperava na instituição por conta da falta do não incentivo e trabalho na

contramão deste fator, pudemos observar que no Lar 2, por ser menor, e possibilitar espaços

em que podem se interagir, os idosos funcionavam como grupo, todos se conhecem e se

dirigem uns aos outros pelo próprio nome, bem como conhecem peculiaridades uns dos

outros. Isto também foi observado com relação aos profissionais do Lar 2 e a interação entre

eles e os idosos.

Ao contrário da outra instituição em que os profissionais se dirigiam aos idosos por

“vôzinho”, “tiozinho”, no Lar 2 todos aqueles que por ali convivem se dirigem aos idosos

pelo próprio nome, permitindo assim a afirmação a partir da identificação pelo nome.

Outro fator que julgamos importante e que contribuía positivamente com a vida dos idosos

é o fato de que neste lar os idosos podiam sair de dentro da instituição. Rotineiramente eles

saem pra ir à um mercado próximo para comprar coisas de seus interesses; vão até uma feira

de frutas, legumes e verduras que também fica próxima; e ainda fazem caminhada pelo bairro

toda manhã acompanhados pela fisioterapeuta; e é possível observar que esta convivência

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com a comunidade faz com que as pessoas do bairro os conheçam e sempre parem pra

conversar com eles na instituição ou em suas saídas.

No Lar 2 observamos situações e condições bem distintas do Lar 1, que embora muito

maior que o Lar 2, não apresenta condições tão adequadas como neste último. Neste Lar

observamos: cuidado e zelo intenso com os idosos; espaços pra se resguardar a singularidade;

poucas pessoas vivendo no lar; poucos moradores em cada quarto; guarda-roupas e cômodas

individuais para cada um; manejo com os idosos orientados pelo respeito e, na maioria das

vezes, carinho e afeto; e nunca presenciamos situação de constrangimento, muito menos

agressão seja ela qual for.

Embora os dois Lares apresentem condições e peculiaridades bem distintas, iremos focar

nossa discussão a partir de agora no trabalho junto à horta, pois, foi o mais significativo para

os idosos deste Lar e aqui cabe dar vazão a este significado.

A construção da horta deu-se juntamente com o grupo, para que eles pudessem plantar,

cuidar, colher e se alimentar daquilo que produziam. Observamos que a horta contribuiu com

um processo terapêutico, com o resgate da história de vida e da memória, bem como

percebemos que a horta era “a menina dos olhos dos idosos”, pois, ela passou a configurar

objeto de afeto dos idosos carregada de sentido para eles.

Deste modo, o trabalho com a horta foi um dos objetivos centrais do desenvolvimento do

estágio, haja vista a importância que este dispositivo significou para os moradores.

Nas supervisões de estágio, pelo fato de observarmos o encantamento e o cuidado que os

idosos revelavam pela horta, fizemos a relação deste trabalho com a bela música de autoria de

Milton Santos e Chico Buarque, Cio da Terra, em que cantam que “Afagar a terra” é

“Conhecer os desejos da terra”, o “Cio da terra”, a “Propícia estação, De fecundar o chão”,

visto a terra ter sido para eles, neste tempo de estágio, material para o cuidado, não apenas da

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hortaliças, mas da própria vida, o desejo de cuidar da própria vida, como diz a letra “conhecer

os desejos da terra”, conhecer os desejos da vida.

Pudemos observar que a horta tornou-se significativa, pois, configurou-se como “a menina

dos olhos dos idosos”. Sempre que o estagiário chegava ao lar eles já vinham falar da horta,

contar do cuidado que estavam tendo com a horta e queriam que o estagiário fosse com eles

ver como as hortaliças estavam crescendo bonitas e bem cuidadas. Falas como “olha como

nossa horta está linda”, “olha como a horta está bonita”, “as plantas cresceram fortes e

bonitas”, “olha como estão verdes”, eram frenquentes, e não apenas por aqueles que estavam

envolvidos no grupo, mas por muitos outros moradores, pois, também passaram a admirar a

horta e as plantas. Alguns moradores, mesmo não participando do grupo, prestavam o cuidado

à horta: regavam as plantas, limpavam as ervas daninha, afagavam a terra, etc.

O fato de a horta ter se tornado tão significativa pode ser entendido pelo fato de que muitos

deles viveram quase toda a vida no contexto rural, e grande parte de suas vidas terem cuidado

de hortaliças e grandes plantações, portanto, a horta permitiu o resgate de suas histórias de

vida, o resgate daquilo que fizeram no passado.

Isto também pode ser entendido pela possibilidade de se produzir vida e de cuidar da vida,

pois, eles fecundavam a terra, tornavam-na propícia para a germinação, fertilizavam-na,

semeavam, cuidavam pra que germinasse a semente, cuidavam das plantas já germinadas e

grandes, depois eles mesmos colhiam e ajudavam na preparação das saladas e pratos para

servir os colegas. Ou seja, eles participavam de todo o processo de produção dos alimentos,

desde a germinação das plantas até o momento de comer, bem como forneciam aos colegas

moradores do Lar o que comerem, aquilo que foram eles mesmos que plantaram e cuidaram, e

naquele momento podiam partilhar isso com os demais. Além de que podiam se reconhecer

naquilo que estavam fazendo, pois, podiam ver e fazer usufruto daquilo que produziam.

Em nossa experiência, foi possível os idosos expressarem questões de sua singularidade,

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inclusive aquelas angustiantes, bem como a horta permitiu um espaço de convivência, criação

e reinvenção do cotidiano, não apenas durante as oficinas, mas também no dia-a-dia. Além de

ter sido um disparador para contarem e narrarem acerca de suas histórias de vida.

A horta, assim como destaca Zimerman (2000), possibilitou um espaço diferenciado do

costumeiramente confinado, às paredes de uma sala, às paredes de seus quartos, e permitiu um

ambiente prazeroso de atividades sociais.

O desejo por cuidar da horta foi visivelmente observável. E esta atividade lhes abriu um

novo leque de opções e a motivação na realização de novas tarefas e atividades. Tanto que

eles pensavam outras formas de estratégia para melhorar a horta, e ainda faziam algumas

coisas por conta própria para o benefício da horta em horários fora dos encontros formais.

A horta ainda possibilitou o exercício de atividades mentais e físicas, tendo vistas que o

estagiário sempre permitia que eles mesmos preparassem a terra, plantassem, cuidassem das

plantas, colhessem, etc., bem como o estagiário sempre permitia que eles pensassem o que

fazer com a horta e decidissem sobre isso, como também permitia que eles escolhessem o que

plantar, sempre dando voz aos idosos e ao seu direito de decisão.

Para finalizar cabe dizer que pudemos ainda observar que a horta funcionou como um

dispositivo que possibilitou a produção do desejo, da pulsão de vida, do novo, gerando

acontecimentos insólitos e transformadores.

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3. Considerações finais

Em ambos os Lares o grupo permitiu a interação entre os idosos, que se olhassem e

fossem olhados, o resgate de imagem e da história de vida, a estimulação da comunicação

verbal, bem como a estimulação da coordenação motora, da socialização, da mutualidade, da

imaginação, da cognição e da memória.

No Lar 1, embora o trabalho estivesse sendo construído de modo a colaborar com a

vida dos idosos, pudemos ver que as instituições podem entrar em conflito com os objetivos

pelos quais foram criadas a fim de perpetuar sua manutenção e assim encontrar resistência

quanto a relevância e significado de alguns trabalhos, sendo entendidos como não mais

necessários.

No Lar 2 vimos que foi possível o desenvolvimento do trabalho com o grupo de

idosos, em que a construção de um dispositivo (horta) que estava relacionado a vida e ao

contexto o qual os membros do grupo viveram pôde contribuir para o desenvolvimento do

trabalho, configurando-se como um dispositivo terapêutico e de produção de pulsão de vida e

desejo, bem como revelou o cuidado de si no cuidado das hortaliças. Consequentemente,

configurou uma saída para o cotidiano repetitivo da institucionalização e assim permitiu mais

um espaço para garantir dos direitos destes sujeitos.

No Lar 1, mesmo com uma grande estrutura e espaços para atender aos idosos, o

modelo arquitetônico desta instituição não propiciava as melhores condições para os

moradores viverem, levando-os ao isolamento e solidão, e a experienciarem um tipo de morte

simbólica antes da biológica, além do tipo de relação estabelecida entre funcionários e idosos

pautada não no respeito, mas, em muitas situçãoes, na violação dos direitos destes sujeitos,

recorrendo até mesmo a atos de violência. No Lar 2, todavia, embora o espaço e estrutura do

lar fosse menor, isto propiciava maior interação entre os moradores e uma convivência mais

significativa e calorosa, o que os fazia sentirem-se vivos. Ao contrário do Lar 1 em que se

transpirava um ar de espera da morte, no Lar 2 a brisa era de vida. E ainda a relação

estabelecida no Lar 2 entre funcionários e moradores pautada no respeito, carinho e afeto, e

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ainda a busca na tentativa de garantir o direitos dos idosos, permitia observar um espaço

possivelmente digno de ser vivido.

Podemos ver que as (im)possibilidades no trabalho com grupos de idosos em

Instituições de Longa Permanência possui condições e peculiaridades distintas que

configuram diferentes arranjos e modos de conduzir a prática, que é atravessada não apenas

pelo cotidiano institucional, que, dependendo do modo como se configura, pode ser alienador

e levar a solidão e ao isolamento, mas também pelo poder institucional que está colocado nas

mãos daqueles que dirigem a instituição. O poder e o cotidiano institucional podem

naturalizar práticas violentas e que violam os direitos dos cidadãos entendidas como

corriqueiras e necessárias para a manutenção da ordem. Nestas situações a condição de

cidadão dos humanos é deixada de lado, revitimizando os sujeitos e os colocando numa

situação de excluídos, violando seus direitos. Entretanto, se o poder e cotidiano institucional

forem organizados de modo a incluir aqueles que vivenciam o contexto da instituição por

meio do respeito e responsabilidade com estes sujeitos, e ainda por meio da inclusão destes

nas decisões a serem tomadas acerca de suas vidas reconhecendo-os como sujeitos de direitos,

onde se garante um espaço no qual podem se relacionar de forma mais significativa e

calorosa, como pudemos ver, tem-se assim uma melhor condição para garantir um possível

espaço digno de ser vivido.

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4. Apresentação do local e condições nas quais a atividade de estágio aconteceu

Lar 1 – É uma instituição beneficente de amparo para idosos. Reconhecida como de

utilidade pública, que atua há mais de 100 anos no mesmo local, acolhendo, abrigando e

amparando idosos que não têm condições de se manter por seus próprios meios ou que foram,

por opção própria ou da família, para a Instituição.

O Lar ocupa uma área própria, com cerca de 15 hectares (quinze mil metros

quadrados). Na entrada possui uma capela da igreja católica. É constituído por aquilo que

eles chamam de chalés, flats e pavilhões.

Os chalés são as casas que compõem o Lar e são vendidas para idosos que possuem

recurso financeiro para comprá-las. Os moradores dos chalés vivem em suas casas até não

terem mais independência de viverem sós, e são transferidos para os novos prédios, os flats,

ficando a casa sob posse do Lar.

Os flats são prédios construídos recentemente e possuem estrutura para acolher cada

ex-morador dos chalés em apartamentos individualizados. Cada flat tem cerca de 30 metros

quadrados, contando com sala, cozinha, quarto e banheiro. E ainda os profissionais de saúde,

psicóloga, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, enfermeiros etc., possuem suas salas.

Os pavilhões3 mais recentes foram construídos entre 1976 e 1983, os pavilhões antigos

foram edificados entre 1911 e 1953.

No todo, o Lar possui capacidade acima de 500 leitos.

Os pavilhões são para aqueles que precisam de assistência pública, não tendo como

pagar, em que pese eles contribuam com algumas coisas. Os pavilhões são divididos por sexo,

sendo distantes os masculinos dos femininos. Nos quartos são “acomodados” cerca de até 8

moradores, num espaço de 20 metros quadrados. Os moradores não possuem guarda-roupas

ou qualquer mobília para guardarem seus pertences, e as camas são muito próximos devido ao

pequeno espaço e a quantidade de moradores em cada quarto. As instalações apresentam

portas quebradas, camas quebradas, macas quebradas, cadeiras de rodas com defeitos. Os

pavilhões possuem banheiros coletivos, muitos apresentando paredes quebradas etc., e cheiro

desagradável. Possui refeitórios para cada pavilhão o que não possibilita a convivência entre

eles, principalmente, entre homens e mulheres, devido à divisão sexista dos pavilhões.

3 Destacamos que pavilhão é o nome dado pela instituição. Iremos preservá-lo em nossa discussão, pois,

entendemos que a discriminação que fazem possui características peculiares e problemáticas e queremos destacá-

las.

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O Lar possui um grande espaço livre, com muitas árvores, gramados, lago, todavia,

não é ocupado pelos idosos pelas dificuldades em se locomoverem devido às muitas rampas.

As quais muitos cadeirantes já caíram e a cadeira se perdeu na descida provocando acidentes.

No pavilhão G, no qual foi realizado o trabalho, viviam apenas idosos do sexo

masculino. Não tínhamos um espaço em que pudéssemos realizar o estágio, portanto,

usávamos a sala de estar do pavilhão F, ou até mesmo, quando a sala estava sendo usada,

íamos para uma sala onde cortavam o cabelo, ou ainda debaixo da sombra de uma bela árvore

que ficava próximo ao Pavilhão.

Neste lar os moradores eram proibidos de sair de lá de dentro. Eram permitidos que

saíssem apenas aqueles que moravam nos chalés.

Lar 2 - O Lar 2 é uma entidade reconhecida como filantrópica e de utilidade pública pelos

Governos Federal, Estadual e Municipal, que atende atualmente cerca de 90 idosos residentes.

A Instituição tem como finalidade auxiliar pessoas idosas reconhecidamente necessitadas, a

partir dos 60 anos, sem distinção de cor, raça ou crença religiosa, amparando-as moralmente

em regime integral. Além de alojamento, roupas e alimentação, oferece assistência nos

campos de lazer, saúde e cultura, contribuindo assim para a melhoria das condições de

reintegração social e qualidade de vida do idoso acolhido. Têm assistência constante de

nutricionista, fisioterapeuta, assistente social, psicóloga, terapeuta ocupacional, enfermeira,

técnicos e auxiliares de enfermagem 24 horas, cuidadores, manicure e cabeleireiro.

O lar tem cerca de 2.000 mil metros quadrados. Possui espaços externos com bancos,

árvores, jardins, etc. E uma pequena sala, que chamam também de capela, pelo fato de

realizarem cultos ali, mas que os profissionais usam para realizar suas atividades, a qual

também usamos para desenvolver o grupo.

Atrás desta sala fica um grande corredor, que no final consta com uma pequena

academia ao ar livre, na qual os idosos fazem exercícios pela manhã. E foi neste corredor em

que construímos a horta, na qual utilizamos vaseiras e as colocamos sob um pequeno muro,

da altura do tronco, pois, facilitaria o manejo pelos idosos, por não precisarem ficar

abaixando.

O lar possui vários quartos e numa mesma ala acomoda tanto mulheres quanto

homens, em que pese fiquem em corredores distintos. Acomoda-se até três por quarto e cada

um possui seu próprio guarda-roupa e sua própria cômoda, o que permite possuírem suas

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coisas e resguardar, ao menos em certa medida, suas singularidades. Possui vários banheiros

grandes e estes sempre estão limpos e com cheiro agradável.

Possui apenas um refeitório o que permite que almocem juntos tanto homens quanto

mulheres. Além de o próprio espaço do lar possibilitar essa convivência.

Neste lar as instalações são mais bem cuidadas, os quartos estão em bom estado, assim

como os demais cômodos, as camas estão boas, bem como as macas, as cadeiras de rodas

estão em boas condições. O lar não possui rampas, portanto, não provocava acidentes. E

ainda, pela pequena quantidade de moradores, sempre era possível ter alguém disponível para

locomover algum cadeirante, quando não, os próprios moradores o faziam, não tendo riscos

de sozinha na locomoção a pessoa cair.

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5. Referências bibliográficas

CIAMPA, A. C. A Estória de Severino e a História de Severina. Um ensaio de Psicologia Social. São

Paulo: Brasiliense, 1987.

BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de Indicadores Sociais: Uma

Análise das Condições de Vida da População Brasileira. Rio de Janeiro: IBGE, 2012.

DEBERT, G. G. Velhice e o Curso da Vida Pós-Moderno. Revista USP. N. 42, p. 70-83,

1999.

ELIAS, N. A Solidão do Moribundo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

GOFFMAN, E. Estigma – Notas Sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. Rio de

Janeiro: LTC, 1975.

REBOREDO, L. A. De Eu e Tu a Nós: O Grupo em Movimento como Espaço de

Transformação das Relações Sociais. Piracicaba-SP: UNIMEP, 1994.

ROZENDO, A. e JUSTO, J. S. "Fundo Nacional do Idoso" e as políticas de gestão do

envelhecimento da população brasileira. Psicologia Política. Vol. 12, n. 24, p. 283-296, 2012.

ZIMERMAN, G. I. Velhice: Aspectos Biopsicossociais. 1ª Ed. Porto Alegre: Artmed, 2000.

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6. Resumo

Zimerman entende a velhice como uma questão social, e destaca que os fatores

psicológicos, sociais, culturais e ambientais podem qualificar ou prejudicar o processo de

envelhecimento. Neste sentido, trabalhou-se visando a interação social, a revinculação, o

resgate da história de vida, da identidade e da imagem, a escuta, o estímulo da memória, o

estímulo da linguagem, a orientação espaço-temporal e a auto-estima, a fim de colaborar com

estes fatores. Desenvolvemos, portanto, um trabalho com dois grupos de idosos, em duas

instituições distintas, como um espaço de escuta para que estes sujeitos pudessem expressar-

se. O trabalho foi desenvolvido em dois momentos. O primeiro, numa instituição durante o

primeiro semestre do estágio, e, o segundo, noutra, durante o segundo semestre. No primeiro

o grupo foi com homens, e, no segundo, com homens e mulheres. Em ambos foi possível

trabalhar a interação social entre os participantes e os demais objetivos. Usou-se de recursos

como: a fotografia para se trabalhar a imagem; relógio e calendários individuais e

personalizados com foto e assinatura para a orientação espaço-temporal; e a técnica do

desenho. No segundo ainda foi criado uma horta como um dispositivo terapêutico e de

produção de vida. Em ambos os Lares o grupo permitiu a interação entre os idosos, que se

olhassem e fossem olhados, o resgate de imagem, o resgate da identidade, o resgate da

história de vida, a estimulação da comunicação verbal, bem como a estimulação da

coordenação motora, da socialização, da mutualidade, da imaginação, da cognição e da

memória. No Lar 1, em pese o trabalho estivesse sendo construído de modo colaborar com a

vida dos idosos, podemos ver, conforme enfatizado por Bleger (2003), que as instituições

podem entrar em conflito com os objetivos pelos quais foram criadas e assim encontramos

resistência no trabalho e o curso de Psicologia foi convidado a deixar o campo de estágio, o

que levou mudarmos para o Lar 2. Pudemos ver que as (im)possibilidades no trabalho com

grupos de idosos em Instituição de Longa Permanência possui condições e peculiaridades

distintas que configuram diferentes arranjos e modos de conduzir a prática, que é atravessada

pelo poder e cotidiano institucional, que, dependendo do modo como se configura, pode ser

alienador e levar a solidão, ou possibilitar um espaço digno de ser vivido.

Palavras-chave: Idosos; Grupo; Instituição.

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7. Memorial (Apreciação sobre o desenrolar das atividades e dos desafios enfrentados)

Podemos ver que uma característica comum nos dois lares foi encontrar um espaço

para desenvolver o trabalho. Sendo que no primeiro utilizamos uma sala de estar de um dos

pavilhões e, no segundo, a capela onde se fazem os cultos. Podemos ver, portanto, que uma

das dificuldades que podem ser encontradas no trabalho da Psicologia com idosos que vivem

em instituições é o espaço onde se realizará o trabalho. Neste sentido, considerávamos que o

espaço relacional estagiário-sujeito-grupo era o mais importante do trabalho.

Como pudemos ver, encontramos vários entraves no desenvolvimento do estágio no

Lar 1, devido aos maus tratos com os idosos, falta de cuidados, más instalações, e até

situações de agressões de todos os tipos. Até mesmo situações em que os coordenadores do

Lar deixavam o estagiário em situação constrangedora frente aos idosos, nas quais queriam

mostrar que o estagiário estava assumindo um compromisso com a diretoria e coordenação do

lar, comungando daquilo que eles vinham fazendo, e ainda querendo mostrar que o estagiário

estava para de alguma contribuir no controle dos moradores. Estas situações eram difíceis de

esquivar e poderiam ainda dificultar e até destruir qualquer possibilidade de vínculo com os

idosos, pois, os livros e manuais de Psicologia não explicam o que fazer em situações inéditas

como estas. Era necessário nestas situações demonstrar aos idosos, e ainda aos coordenadores,

que nosso trabalho estava direcionado aos idosos e era com eles nosso compromisso. Para

isso o estagiário sempre procurava estar próximo aos idosos e deixar claro este compromisso,

o que os fazia entender o constrangimento em tais situações, além de que quando colocado no

dilema em revelar o lado de quem o estagiário estava, sempre foi no sentido de valorizar o

idoso e desconstruir a idealização daquele psicólogo que serve pra curar doenças e controlar

manifestações de comportamentos entendidos por eles como desviantes.

Vemos ainda que diante daquilo que a instituição vem produzindo e os objetivos de um

trabalho compromisso não com aqueles que mandam, tais objetivos entram em conflito com

os da instituição que, para sua manutenção, revela resistência ao trabalho e o considera não

mais necessário.

Todavia, no Lar 2 como vimos o trabalho foi possível e pudemos perceber que muito

significativo, tanto para os idosos quanto para a diretoria e coordenação do lar que sempre nos

agradeceu e elogiou o trabalho que vinha sendo desenvolvido.

Em que pese possamos ver algumas emblemáticas no trabalho, o consideramos muito

significativo, pois, em ambos os lares os idosos sempre expressaram grande satisfação com a

presença do estagiário e com as atividades. Alguns sempre expressavam que estavam com

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saudades, que estavam esperando o estagiário chegar, sempre agradeciam pelo trabalho e

pelas atividades (destaco que as atividades sempre eram propostas pelos idosos, esta foi uma

prática adotada: dar voz a estes sujeitos, permitindo que eles decidissem o que fazer), alguns

até diziam que consideravam o estagiário como o próprio filho. Isto implicou um momento

difícil para o término do trabalho nos dois lares, principalmente no Lar 1. Pois, devido a estes

idosos já possuírem seus vínculos anteriores rompidos, alguns deles já não tem mais contato

nenhum com a família, seria necessário todo um processo para a saída do estagiário, que foi

possível apenas no Lar 2, e mesmo neste ainda foram momentos que precisaram ser muito

bem trabalhados, pois muitos até choraram pelo encerramento das atividades. E no Lar 1 pela

imposição da saída do curso de Psicologia do campo não foi possível este trabalho, o que

produziu até uma certa revolta dos participantes do grupo com relação a diretoria, pois apenas

reproduziu o que já viveram em outro momento da não escolha do rompimento do vínculo.

Todavia, insistimos de ao menos uma última vez que pudéssemos visitá-los e conversar com

eles, e neste momento foi possível esclarecer algumas coisas, especialmente, que a saída do

lar não foi por vontade do estagiário, mas que gostaria de continuar com eles.