identificando valores e o uso das tecnologias nas animações das
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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI
PATRÍCIA BERTACHINI BISSETTI
IDENTIFICANDO VALORES E O USO DAS TECNOLOGIAS NAS ANIMAÇÕES DAS PRINCESAS DE WALT DISNEY
SÃO PAULO 2012
B532i Bissetti, Patrícia Bertachini Identificando valores e o uso das tecnologias nas animações das princesas de Walt Disney / Patrícia Bertachini Bissetti. – 2012. 77f.: il.; 30 cm. Orientadora: Maria Ignez Carlos Magno. Dissertação (Mestrado em Comunicação) – Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo, 2012. Bibliografia: f.74-77.
1. Comunicação. 2. Animação. 3. Tecnologia. 4. Valores. 5. Contos de fadas. I. Título.
CDD 302.2
PATRÍCIA BERTACHINI BISSETTI
IDENTIFICANDO VALORES E O USO DAS TECNOLOGIAS NAS ANIMAÇÕES DAS PRINCESAS DE WALT DISNEY
Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Contemporânea da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Ignês Carlos Magno.
SÃO PAULO 2012
PATRÍCIA BERTACHINI BISSETTI
IDENTIFICANDO VALORES E O USO DAS TECNOLOGIAS NAS ANIMAÇÕES DAS PRINCESAS DE WALT DISNEY
Dissertação de Mestrado apresentada à Banca Examinadora, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação, área de concentração em Comunicação Contemporânea da Universidade Anhembi Morumbi, sob a orientação da Profa. Dra. Maria Ignês Carlos Magno.
Aprovada em 19/09/2012
____________________________________
Profa. Dra. Maria Ignês Carlos Magno
____________________________________
Prof. Dr. Vicente Gosciola
____________________________________
Profa. Dra. Débora Mallet Pezarim de Angelo
RESUMO
A proposta dessa pesquisa é estudar três animações produzidas pela Walt Disney
Animation Studios, que foram baseadas em contos de fadas escritos pelos irmãos
Grimm, identificando os papéis das princesas "Aurora", "Tiana" e "Rapunzel" e os
valores que podem ser encontrados nas histórias produzidas para o cinema de
animação, assim como, o uso da tecnologia em cada um deles. Os longas-
metragens analisados serão: “A Bela Adormecida”, “A Princesa e o Sapo” e
“Enrolados”. Ao longo do tempo, com o avanço da tecnologia, as animações,
inicialmente produzidas apenas para o público infantil, passaram a encantar cada
vez mais o público adulto. Dessa forma, as contribuições e transformações geradas
através do uso da tecnologia possibilitaram a criação de personagens muito mais
reais e, ao mesmo tempo, induziram o espectador ao mundo imaginário e
impossível, lançando imagens e fatos que transcendem a realidade, promovendo
assim um interesse maior, cativando adultos e crianças.
PALAVRAS-CHAVE: Animação, tecnologia, valores, contos de fadas.
ABSTRACT The purpose of this research is to study three animations produced by Walt Disney
Animation Studios, which were based on fairy tales written by the Brothers Grimm,
indentifying the roles of princesses "Aurora", "Tiana" and "Rapunzel" and the values
that can be found in the stories produced for animation, as well as the use of
technology in each. The feature films will be analyzed: "Beauty Sleeping", "The
Princess and the Frog" and "Tangled". Over time, with the technology advances, the
animation, initially produced solely for children, became increasingly enchanted adult
audiences. Thus, contributions and transformations generated through the use of
technology, made possible the creation of characters so more real and at the same
time induce the viewer to the imaginary world and impossible, showing images and
events that transcend reality, thus promoting a greater interest, captivating adults and
children.
KEY-WORDS: Animation, technology, values, fairy tales.
LISTA DE IMAGENS
A Princesa e o Sapo ......................................................................................... 14
Irmãos Grimm ................................................................................................... 15
A Bela Adormecida – Irmãos Grimm ................................................................ 26
Rapunzel na janela ........................................................................................... 27
O Príncipe Sapo ............................................................................................... 28
Mickey Mouse .................................................................................................. 30
Exemplo de Lanterna Mágica ........................................................................... 31
Fantasmagorie – Emile Cohl ............................................................................ 33
Little Nemo ....................................................................................................... 33
Exemplo de Rotoscopia ................................................................................... 35
Max Fleischer – Betty Boop e Popeye ............................................................. 35
Steamboard Willie ............................................................................................ 35
Arabesque ........................................................................................................ 37
Andre & Wally B. ............................................................................................. 38
Walt Disney ...................................................................................................... 40
New man’s Laugh-o-Glams .............................................................................. 40
Pixar ................................................................................................................. 41
Toy Story .......................................................................................................... 41
Princesa Aurora e Malévola ............................................................................. 45
A Princesa e o Sapo ......................................................................................... 45
Enrolados ......................................................................................................... 47
A Bela Adormecida - 1959 ............................................................................... 52
1ª linha de Barbies ........................................................................................... 55
Misses do Brasil ............................................................................................... 56
Marilyn Moroe, Brigitte Bardot .......................................................................... 56
Princesa Aurora ................................................................................................ 57
Tiana – A Princesa e o Sapo ............................................................................ 58
Tiana ................................................................................................................ 59
Ray e Louis ...................................................................................................... 59
Rapunzel .......................................................................................................... 62
Pascal e Maximus ............................................................................................ 63
Rapunzel e Flynn Rider .................................................................................... 63
Enrolados ......................................................................................................... 64
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................. 9
1. Contos de fadas .......................................................................................... 15
1.1 A linha do tempo dos contos de fadas .................................................. 19
1.2 Irmãos Grimm e os contos de princesas ............................................... 23
2. O cinema de animação ............................................................................... 30
2.1 O uso da tecnologia nos desenhos animados ...................................... 36
2.2 A animação de Walt Disney e a parceria com a Pixar .......................... 39
2.3 A produção dos longas-metragens de princesas .................................. 43
3. Valores ........................................................................................................ 49
3.1 Reflexões sobre a importância do trabalho com valores ...................... 51
3.2 Generosidade, desobediência e coragem: Aurora, um modelo de beleza em 1959 ...................................................................................... 52
3.3 Auto realização, crença, teimosia e segurança: Tiana, a realização de um sonho ............................................................................................ 58
3.4 Força, ousadia, obediência: Rapunzel, a princesa perdida .................. 62 4. Proposta de uma metodologia para identificação de valores e
tecnologias empregadas nas animações de princesas produzidas
pela Walt Disney Pictures ........................................................................... 66
CONCLUSÃO .................................................................................................. 72
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................ 74
10
INTRODUÇÃO Este trabalho tem origem em anos de análise como espectadora do cinema de
animação. Iniciei com o primeiro longa-metragem de Walt Disney, Branca de Neve,
no Cine Espacial, quando criança, e foi nesse momento que comecei a me encantar
pelo cinema e, principalmente, pelo mundo de Walt Disney. Ao longo dos anos me
dediquei à educação de crianças e fui me especializando nesse aspecto, nunca
deixando de admirar e analisar o cinema como uma grande possibilidade,
principalmente as animações que foram surgindo. Com o nascimento da minha
primeira filha, hoje com 15 anos, esse interesse aumentou e enfatizou a conquista
de um sonho: conhecer a Disneylândia na Flórida e depois o Walt Disney World, na
Califórnia. As salas em 3D e 4D nos encantaram, assim como todo uso da
tecnologia, vivenciada em todos os parques temáticos. Essas experiências vividas
por mãe e filha ampliaram ainda mais o interesse por descobrir mais sobre o cinema
de animação e esse mundo encantador, onde criança e adulto entram na fantasia,
misturando o real e o imaginário. Das duas viagens retornamos com experiências
significativas, cada uma na sua área de interesse: ela, pelo aperfeiçoamento da
língua inglesa e eu, certamente, pelos meios midiáticos e uso da tecnologia nesse
processo.
Na primeira oportunidade de ampliar meus estudos, dediquei-me ao mestrado e a
escolha certamente seria por meios audiovisuais, estudar o cinema, com ênfase no
cinema de animação, principalmente as animações produzidas por Walt Disney.
Com certeza, ao longo desses anos, desde criança, depois quando levava minha
filha a todas as estreias de animações, até os tempos atuais, hoje com o filho menor
de cinco anos, observei o crescimento do interesse da população pelo cinema de
animação atualmente, não apenas produzidas pelo estúdio da Disney, apesar do
foco deste trabalho estar relacionado às produções de Walt Disney.
Desenvolvendo trabalhos para o público infantil, relacionados também à formação de
docentes e orientação de pais, verifiquei a importância do trabalho com valores
como base para construção do conhecimento. Relacionei então esse trabalho com
as animações analisadas e fui encontrando uma forma de destacar valores nas
princesas produzidas pelo estúdio da Disney. No entanto, o objetivo aqui não é
desenvolver essa metodologia, mas sim analisar três longas-metragens produzidos
11
pela Disney, que foram baseados em contos de fadas escritos pelos Irmãos Grimm.
Dentro dessas animações, destacaremos os valores no papel das três princesas:
Aurora (A Bela Adormecida, 1959); Tiana (A Princesa e o Sapo, 2009) e Rapunzel
(Enrolados, 2010). Para tanto, foi necessária uma pesquisa não apenas filmográfica,
mas, principalmente, bibliográfica sobre o cinema de animação, o surgimento do
estúdio Disney, o encontro com a Pixar e o uso da tecnologia, assim como um
estudo sobre os contos de fadas, sua origem e os contos que foram utilizados como
base para as produções cinematográficas analisadas neste trabalho. Como analisamos anteriormente, atualmente o cinema de animação é admirado por
uma grande parte da população. Com os avanços tecnológicos os diretores e
produtores das animações produzem longas-metragens onde os personagens criam
vida e traduzem parte da sociedade atual. Além disso, verificamos que os efeitos
produzidos pela tecnologia encantam não apenas as crianças, mas também os
adultos, que cada vez mais se interessam por essas produções. Muitas dessas
animações são baseadas em contos de fadas, especialmente as analisadas nesse
trabalho. Os contos de fadas também podem ser formas literárias em que os valores
aparecem e são explorados desde sua origem. Nas produções cinematográficas os
mesmos valores vão sendo traduzidos e apresentados aos espectadores de acordo
com o período em que a animação é produzida, mantendo geralmente a essência do
valor, independente da época, que podem contribuir para uma construção positiva
ou negativa. No caso desse trabalho, especificamos o papel da mulher, através dos
longas-metragens de três princesas e a maneira que os valores são transmitidos e
podem ser trabalhados, sugerindo uma metodologia de trabalho com valores através
das animações. Uma outra proposta relaciona-se ao uso da tecnologia em cada
animação e a maneira como pode ser estudada. Pretendemos desenvolver uma
proposta metodológica para identificação dos valores e o uso da tecnologia nas
animações das princesas que incorporam esse estudo. O mundo nos oferece vários tipos de experiências, e toda a informação que
adquirimos acrescenta conhecimento, que precisamos valorar de acordo com o que
é bom e melhor para nossas vidas e coletividade. Os valores não são a medida de
comportamento, mas têm a tarefa muito mais nobre que é a de formar caráter,
desenvolver sentimento e conscientizar cada um do seu papel importante enquanto
12
indivíduo capaz de transformar o ambiente ao qual pertence, respeitando a diferença
e a identidade de cada um.
O conhecimento e a prática de valores ajudam o indivíduo a desenvolver seu
comportamento em relação ao mundo em que vive, contribuindo para pensar em
coletividade e transformar seu espaço social. Valorar significa não apenas dar
importância a certos sentimentos, mas também, e quando necessário, rever, refletir
e avaliar determinados conceitos pessoais.
O ser humano, através de experiências próprias, possui valores adquiridos em casa,
na rua, na igreja, na escola, na vizinhança onde mora, e essa mistura de vivências
vai formando o caráter e desenhando um perfil enquanto indivíduo ativo e capaz,
transformador da sociedade em que vive.
Os valores estão em nossas vidas em todos os momentos, nas mais diversificadas
situações. Valoramos a pontualidade, a limpeza, o cuidado e nem nos damos conta
disso. Valores estão em todos os lugares e podem ou não divergir, dependendo da
cultura da sociedade onde o indivíduo está inserido.
As pessoas têm conhecimento dos valores e das regras que envolvem seu
comportamento, mas a maneira como irão praticar esses mesmos valores poderá
afetar um grupo muito grande de pessoas e a si mesmos.
Refletindo sobre a possível influência e o interesse dos espectadores nas
animações, buscamos formas de destacar os valores dentro dessas produções,
sobretudo nos contos de fadas das princesas, que representam através do papel
delas não apenas o papel da mulher, mas a forma que esta foi se transformando e
exercendo sua influência na sociedade em que atua.
Ao longo dos tempos surgiram muitas produções sobre o trabalho com os valores e
também sobre o uso do cinema como estratégia para transmissão de conteúdos,
principalmente para adolescentes e adultos.
No caso desse trabalho a importância se dá no ponto que pretende criar uma forma
de destacar os valores nas animações, relacioná-los com a realidade e produzir
maneiras de utilizar as animações para construção mais significativa de valores. Os
recursos midiáticos podem ser transformados em uma forma de transmitir e construir
esses conhecimentos essenciais para formação do ser social.
Em relação à organização deste trabalho, no primeiro capítulo pretendo realizar um
histórico sobre os contos de fadas, destacando os contos escritos pelos Irmãos
13
Grimm, principalmente os que deram origem aos longas-metragens produzidos pela
Disney, que tratam das histórias das princesas Aurora, Tiana e Rapunzel, analisando
o personagem feminino nos contos de fadas.
No capítulo 2 será apresentado um histórico do cinema de animação, com alguns
exemplos dos primeiros artefatos utilizados para produção de imagens em
movimento, assim como os seus criadores. O desenvolvimento do capítulo
apresenta o início do trabalho de Walt Disney e, na sequência, o uso da tecnologia
para a produção das animações Disney. Ainda no segundo capítulo, uma análise da
história das três princesas, destacando um perfil para a personalidade de cada
personagem.
As questões relacionadas aos valores e o destaque enfatizado no cinema de
animação será abordado no capítulo 3, onde serão retirados os valores que
aparecem nos personagens de cada princesa, realizando um contraponto entre
aspectos positivos e negativos de seus personagens no contexto da história em que
estão inseridos.
No capitulo 4 será apresentada a proposta de uma metodologia para identificação de
valores e o uso da tecnologia nas animações de princesas produzidas pela Disney,
trabalho onde pretendo despertar e motivar as pessoas das mais diversas áreas,
que de alguma forma se interessam pelo cinema de animação e que possam fazer
uso dele em suas funções acadêmicas, profissionais ou pessoais.
Para realização deste trabalho foram assistidos e analisados alguns curtas e longas-
metragens da Disney e da Pixar :
• Plane Crazy (1928)
• Steamboat Willie (1928)
• Flores e Árvores (1932)
• Os Três Porquinhos (1933)
• Branca de Neve e os Sete Anões (1937)
• Pinóquio (1940)
• Fantasia (1940)
• Dumbo (1941)
• Bambi (1942)
• Alô Amigos (1943)
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• Cinderela (1950)
• Alice no País das Maravilhas (1951)
• A Dama e o Vagabundo (1953)
• Peter Pan (1953)
• A Bela Adormecida (1959)
• 101 Dálmatas (1961)
• A Espada era a Lei (1963)
• Mogli – o Menino Lobo (1967)
• Aristogatas (1970)
• Bernardo e Bianca (1977)
• Andre & Wally B. (1984)
• Luxo Jr. (1986)
• Oliver e sua turma (1988)
• Tin Toy (1988)
• A Pequena Sereia (1989)
• A Bela e a Fera (1991)
• Aladdin (1992)
• O Rei Leão (1994)
• Toy Story (1995)
• Pocahontas (1995)
• O Corcunda de Notre Dame (1996)
• Mulan (1998)
• Vida de Inseto (1998)
• Toy Story 2 (1999)
• A Nova Onda do Imperador (2000)
• Dinossauro (2000)
• Monstros S.A. (2001)
• Lilo & Stitch (2002)
• Procurando Nemo (2003)
• Irmão Urso (2003)
• Os Incríveis (2004)
• Nem que a Vaca Tussa (2004)
15
• Carros (2005)
• O Galinho Chicken Little (2005)
• A Família do Futuro (2007)
• Ratatouille (2007)
• Up – Altas Aventuras (2009)
• A Princesa e o Sapo (2009)
• Encantada (2009)
• Toy Story 3 (2010)
• Enrolados (2010)
• Valente (2012)
Apenas os longas-metragens “A Bela Adormecida”, “A Princesa e o Sapo” e
“Enrolados” fizeram parte da decupagem para realização desta pesquisa, onde
analisamos as produções que envolveram histórias de princesas em diferentes
contextos e que foram baseadas nos contos de fadas escritos pelos Irmãos Grimm.
No final do trabalho, apresento uma conclusão reduzida e provisória, já que através
desta proposta muitas outras produções poderão ser analisadas para o destaque de
valores e outros desdobramentos ainda poderão surgir.
Boa Leitura!
A Princesa e o Sapo
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1. Contos de Fadas
Irmãos Grimm Este capítulo apresenta um histórico dos contos de fadas e a maneira como foram
sendo produzidos e compreendidos desde seu surgimento, tornando-se modelos de
visão de mundo mágico, difundidos através de inúmeras versões no universo.
Tratamos também dos contos de fadas dos Irmãos Grimm, onde foram baseadas as
produções cinematográficas de Walt Disney, explorados nesse trabalho, sintetizando
a história de cada princesa e seu papel nos contos de fadas, destacando as
seguintes obras: “A Bela Adormecida”, “A Princesa e o Sapo” e “Rapunzel”.
Desde sua origem até por volta do século XVIII os contos de fadas se destinaram
aos adultos, contados tradicionalmente nas vilas, praças, eventos como forma de
animar o público. Ao longo do tempo, essas histórias baseadas em fatos e criações
populares passaram a serem vistas como histórias inventadas apenas para distrair
as crianças. No entanto, após vários estudos científicos e literários, foram
elaboradas diversas teorias sobre os contos de fadas, que se multiplicaram em
diversos países.
De acordo com a autora Nelly Novaes Coelho (COELHO, 1998), os contos de fadas
originam-se de narrativas orientais, enfatizando a parte material, sensorial e ética do
ser humano, revelando suas necessidades básicas. Surgem como uma forma de
desvendar mistérios, fatos além do simplesmente humano. O homem vai sendo
seduzido pelas maravilhas, pelas coisas desconhecidas e isso passa a ser um
17
desafio constante. Nos contos de fadas as atitudes humanas são reveladas e essa
forma de expressar a vida é traduzida através de histórias com ou sem a presença
de fadas, mas sempre com um eixo gerador, com uma problemática existencial.
Geralmente os contos são iniciados com palavras acolhedoras que introduzem o
leitor ou ouvinte a uma atmosfera de tranquilidade, interrompida por acontecimentos
tensos, inesperados, uma catástrofe que desencadeia o interesse do leitor (ou
ouvinte) e, assim, os acontecimentos começam a desencadear-se. Dessa forma,
uma desgraça qualquer provoca reações que determinam o assunto do conto.
Geralmente, no final do conto, esse acontecimento se transforma em ventura.
Observa-se que no desenrolar do conto, após o movimento crítico, o que chamamos
de desgraça, o herói recebe um dom mágico, uma aquisição que permitirá (ou
ajudará) que consiga seu objetivo. Esse é o momento central da história, o ponto
culminante, onde geralmente é um auxiliar ou guardião, algumas vezes representado
por um animal, que fornece esse material mágico, esse recurso que ajudará o herói
(ou heroína). Nesse momento ocorre uma mudança significativa entre o personagem
do início do conto e o que já caminha confiante para o objetivo que lhe cabe atingir.
Essa travessia do “herói” de um momento do conto para o outro constitui a metade
do tempo da narrativa.
Esses objetos mágicos citados têm origens diversas, podem ser de origem animal,
vegetal, provenientes de utensílios, de composição ou forças diversas, ligados ou
não ao culto dos mortos.
Para a autora Marie-Louise Von Franz (FRANZ, 1972), a narrativa de um conto de
fadas sofre a influência de quem conta, seja homem ou mulher. “Pode-se então
supor que as versões dos contos, na forma em que chegaram até nós, sofreram ora
uma influência feminina dominante, ora a marca masculina, e que assim certos
traços foram sublimados e outros atenuados, segundo tenham sido relatadas, em
último lugar, por um homem ou por uma mulher” (FRANZ, 2010, p: 9). Sendo assim,
compreendemos que os contos sobre mulheres contados por homens exprimem
suas aspirações, dificuldades, emoções em viver seu lado feminino ou de se
relacionar com as mulheres. Uma das dificuldades dos contadores de histórias é
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ajustar essas emoções às figuras femininas, mas esse estudo é apenas citado neste
trabalho, pois não enfatizaremos esse campo desenvolvido pela psicologia.1
Um dos pontos que devemos tratar nesse texto relacionado ao tema do trabalho
desenvolvido refere-se à forma como a mulher foi sendo reconhecida e interpretada
nos contos de fadas dentro da nossa civilização. Ainda de acordo com Marie-Louise
Von Franz (FRANZ, 2010), dentro dessa tradição patriarcal, a história nos mostra
que não existia uma imagem arquetípica da mulher, a mulher ficava incerta quanto à
sua própria essência. Nesse caso, o sentimento de algumas mulheres por terem sido
rejeitadas ou negligenciadas acabou desencadeando um movimento emancipatório
da mulher no início do século XIX. De acordo com a autora, esses movimentos se
refletem, entre outros, nos contos de fadas. Os contos, algumas vezes, representam
a mulher concreta e, em outras, um pouco do que sente aquele que conta o conto,
marcando sua narrativa.
O conto maravilhoso, como denomina Vladimir Propp (PROPP, 2002), tem seus
rituais e costumes ligados ao contexto que os gerou e remontam a sociedade e
instituições sociais que lhe deram origem. É importante ver a relação entre os
motivos do conto e a realidade em que surgiram, mas cabe observar que essa
relação só aparece retratada nas formas de pensamento que permitam explicar a
gênese dos gêneros folclóricos.
Muitos motivos dos contos só se explicam quando relacionados aos vestígios dos
mitos, ritos e costumes culturais diferentes. O conto enquanto fenômeno cultural tem
relação direta com o modo de produção da vida social de várias sociedades
(sociedades remotas). É necessário encontrar a base histórica responsável pela
criação do conto, mas não é possível descrever com precisão o fenômeno que o
conto representa em sua totalidade e em todos os países.
Propp (PROPP, 2002) estuda o gênero dos contos que iniciam por um dano ou
prejuízo causado a alguém ou pelo desejo de possuir algo. De acordo com o autor,
“a origem do conto não está ligada à base econômica de produção em curso no
início do século XIX, quando se começou a registrá-lo... É com a realidade histórica
que devemos confrontar o conto e ali procurar suas raízes” (PROPP, 2002, p:7).
1 As questões relacionadas à compreensão da psique e do comportamento humano através dos contos de fadas foi desenvolvido pela autora Maria-Louise Von Franz em seu livro O Feminino nos Contos de Fadas . Tradução Regina Grisse de Agostino. Petrópolis: Editora Vozes, 2010.
19
Iniciamos esse capítulo com base nesses estudos para reforçar a ideia de que para
entender a história dos contos de fadas é necessário descobrir o sistema, a fase ou
estágio de desenvolvimento social onde os fatos ocorrem. Para um folclorista, por
exemplo, é importante estabelecer um paralelo entre a realidade histórica e o rito. No
conto é mais frequente notarmos uma reinterpretação do rito, ou seja, a substituição
no conto de um elemento (ou vários) do ritual de acordo com as modificações
históricas ou até por uma forma mais compreensível ao leitor ou ouvinte.
O mito é compreendido como toda narrativa sobre deuses e seres divinos em cuja
realidade um povo acredita realmente. O mito e o conto se distinguem por sua
função social, ou seja, a função social do mito não é sempre a mesma, mas depende
do grau de cultura de um determinado povo.
Propp (PROPP, 2002, p: 20) também cita que embora procuremos origens dos
contos em acontecimentos históricos do passado, existem contos que não remontam
nenhuma realidade remota, como por exemplo, histórias de serpentes e cavalos
alados.
Os contos de fadas são compostos por fases e cada fase remonta uma instituição
social, de acordo com Propp (PROPP, 2002, p: 437) “essas partes são idênticas
para os diversos assuntos. Decorrem sucessivamente uma das outras e formam o
todo.” O ciclo de iniciação é a base mais antiga do conto e outro ciclo que mostra
correspondência com o conto é o ciclo das concepções de morte. A soma desses
ciclos são componentes fundamentais nos contos.
A unidade de composição de um conto de fadas está na realidade histórica, seja
vivenciada ou criada. A grande maioria do material encontrado nas narrativas dos
povos primitivos está apenas em forma de textos, faltando material sobre a maneira
como eram contados e as circunstâncias envolvidas. No entanto, de acordo com
alguns coletores de materiais, ainda foram encontrados alguns detalhes sobre o
modo que aconteciam tais narrativas. Nos estudos de Propp (PROPP, 2002, p: 442)
observamos que para alguns povos eram necessários rituais e materiais específicos
que representavam questões relacionadas ao sagrado, como um amuleto, por
exemplo. As danças também faziam parte deste contexto, onde ocorria um outro
fenômeno visto até os dias atuais que era o fenômeno da proibição de contar. Em
vários casos encontramos essa proibição relacionada ao aspecto religioso.
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Percebemos o quanto os contos de fadas estão relacionados ao contexto social, seja
dentro de uma tribo, de uma sociedade arcaica ou atual. O conto tomou emprestado
de sociedades arcaicas a cultura social e ideológica, mas seria um engano dizer que
apenas o conto é herdeiro da religião. A religião também sofreu transformações
entre as épocas e as regiões, mas algumas dessas características ainda foram
conservadas nos contos de fadas, como exemplo, os rituais xamânicos,
representados até os dias atuais nos contos e mesmo nas animações de Disney,
como veremos nos próximos capítulos.
1.1. A Linha do Tempo dos Contos de Fadas
Baseada nas pesquisas e obra da autora Nelly Novaes Coelho (COELHO, 1992)
desenvolvemos um breve histórico dos contos de fadas desde sua origem, buscando
refletir sobre a importância social dos contos, assim como a influência dos costumes
de cada sociedade onde o conto foi narrado, apresentado anteriormente neste
capítulo.
Na Índia, século VI, surge a obra Calila e Dimna, como uma primitiva epopeia
indiana Mahabarata (escrita entre os séculos IV a.C. e IV d.C.). Essa obra difundiu-
se pelo mundo da Antiguidade entre os séculos VI e XIII através de inúmeras
versões. A mais importante é a versão árabe feita por Ibn All-Mukafa, no século
XVIII, que serviu para tradução brasileira. Foi considerado um exemplário de boa
conduta e um grande modelo de visão de um mundo mágico, onde o real e o
imaginário se unem.
No século XVII, na França, os contos clássicos infantis nascem com o escritor
Charles Perrault, e são contos escritos para adultos. Essas narrativas perdem um
pouco a força no século XIX, onde surgem estudos sobre a literatura folclórica e
popular de cada nação, que representam valores, maneira mais verdadeira de ver a
vida.
No final do século XIX é encontrado um manuscrito egípcio de 3.200 anos pela
egiptóloga Mrs. D’Orbeney, com textos mais antigos que os textos indianos. Um
deles é o romance “Os dois irmãos”, texto-fonte do episódio bíblico “José e a mulher
Putifar”. Uma das fontes principais do ciclo narrativo era a visão negativa da mulher.
21
“Sedenbar” ou “O livro dos enganos das mulheres” representa o eixo entre paixão –
ódio – sabedoria. Esse texto é de fonte oriental, que está na gênese das narrativas
maravilhosas no Ocidente. A maior divulgação de “Sedenbar” na Europa se dá entre
os séculos X e XIII, período em que a igreja intensifica seus esforços de
cristianização do mundo ocidental. Entre tais esforços estava a valorização e a
idealização da mulher, um verdadeiro repúdio à mulher demônio e exaltação da
mulher anjo.
“Sedenbar” originou as “Mil e uma Noites”, a mais célebre compilação dos contos
maravilhosos. A forma original surgiu no século XV eno início do século XVIII é
divulgada no mundo europeu, traduzida pelo francês Antonie Galland. “Os Contos de
Sherazade ao rei Schariar”, onde o amor e a morte são as forças polares que a
palavra narrada mantém equilibrada, conta a história da encantadora contadora de
histórias, Sherazade que, noite após noite, conta um conto ao rei para evitar sua
morte.
As fadas surgem no povo celta, na criação poética céltico-bretã, onde surgiram as
primeiras mulheres sobrenaturais que deram origem à linhagem das fadas. Fada e
bruxa são vistas como formas simbólicas da eterna dualidade da mulher ou da
condição feminina. O povo celta foi o povo da antiguidade que mais influenciou os
demais povos com relação à convivência humana, à espiritualidade, à religiosidade
ou à exaltação do imaginário. Tinham um espírito naturalista e dedicavam-se às
manifestações da natureza. A passagem do real para o imaginário, da existência
histórica dos celtas para o surgimento dos romances e narrativas maravilhosas dos
bretões, célula-primeira dos contos de fadas, fez-se através da espiritualidade
marcante ou da tentativa para a fantasia e o próprio mistério, característica do
espírito céltico.
Na França, século XII, na corte de Luís VII, norte da França, sob a influência da
rainha Alienor D’Aquitânia, apaixonada pelas artes, seguida pela filha Marie de
France, primeira poeta francesa. Marie de France, encantada com os primitivos e
líricos lais bretões, impregnados desse novo ideal, entrega-se ao trabalho de traduzi-
los para o francês. Assim nascem as primeiras narrativas maravilhosas, conhecidas
como os Lais de Marie de France. Neles se expressa uma visão nova da mulher, do
amor e do mundo misterioso. Nasce o amor cortês, espiritualizado através da
valorização da mulher. Nesse enfoque é interessante lembrar que a religiosidade
22
mágica dos celtas criou as fadas e a religiosidade cristã criou o culto da Virgem
Maria, ambas convergindo na valorização da mulher.
Marie de France escreve sobre o amor cortês na região de Champagne, tornando-se
o centro da cultura no século VII. Nessa corte viveu Chrétien de Troyes, escritor
medieval, tradutor e recriador do romance bretão. O sucesso dessas narrativas deu
origem ou passaram a ser conhecidas como romance. Chrétien escreve dois
romances originais: Erec e Enide (1168) e Cligès (1170). Durante o século XIII os
romances tornam-se conhecidos por toda Europa, enfatizando uma crescente
espiritualidade.
Juntamente com as extraordinárias aventuras de cavaleiros e suas amadas mistura-
se o sobrenatural, o maravilhoso das metamorfoses e a magia das fadas, em sua
ambivalência de seres benéficos e maléficos. Dessa complexa mistura de elementos
transparece o ideal da vida cristã que tenta transformar a ordem sentimental em
disciplina ética ou, ainda, confunde emoções da arte e do amor com a ação prática
do real. A esse ideal liga-se uma imagem poderosa da mulher fada ou bruxa.
No fim da Idade Média, a partir do Renascimento, no século XVI, surgem duas
fontes europeias importantes relacionadas ao maravilhoso: “Noites Prazerosas, de
Gianfrancesco Straparola de Caravagglio, e no século XVII, em Nápoles (1634) “O
conto dos contos” de Giambattista Basile. Este último foi traduzido em nove idiomas
e alguns deles serviram de fonte para Charles Perrault, como por exemplo: “Sole,
Luna e Talia”, que virou “A Bela Adormecida” e “Zezolla”, que virou “A Gata
Borralheira”.
Com o passar do tempo os contos maravilhosos foram se transformando em contos
de fadas para crianças. O início dessa transformação deu-se concretamente no
século XVII, na França, com Charles Perrault, que redescobriu o maravilhoso
popular com histórias e contos de tempos passados na obra denominada “Contos de
minha Mãe Gansa” (1697). Os contos defendiam os direitos intelectuais e
sentimentais da mulher, apoiando a causa feminista. Nos contos as mulheres eram
injustiçadas, ameaçadas ou vítimas. Os contos “A paciência de Grisélidis” e “Os
desejos ridículos” não foram criados para crianças. Apenas após a terceira obra “A
pele de asno” é que Perrault manifesta o desejo de escrever para crianças. Os três
livros foram publicados em volume em 1696. Perrault, a partir daí, volta-se para a
redescoberta da narrativa popular maravilhosa com duplo intuito: provar a
23
equivalência de valores ou de sabedoria entre os antigos greco-latinos e os antigos
nacionais e, com esse material redescoberto, divertir as crianças, principalmente as
meninas, orientando sua formação moral.
Com a publicação dos oito “Contos da Mãe Gansa”, nasce a literatura infantil,
conhecida hoje como clássica. Pela primeira vez são publicados “A Bela Adormecida
no Bosque”, “Chapeuzinho Vermelho”, “O Barba Azul”, “O Gato de Botas”, “As
Fadas”, “A Gata Borralheira”, “Henrique do Topete” e “O Pequeno Polegar”. Em 1785
e 1789 é publicada a série “Gabinete de Fadas”, coleção escolhida de contos de
fadas e outros contos maravilhosos com 41 volumes, de vários autores, que marcam
o fim dessa produção literária fantástica destinada aos adultos.
Participantes do Círculo Intelectual de Heidelberg, na Alemanha, Jacob e Wilhelm
Grimm (filósofos, folcloristas, estudiosos da mitologia germânica e da história do
direito alemão), pesquisam e tiram da memória popular as antigas narrativas
maravilhosas. Redescobrem o mundo maravilhoso da fantasia e dos mitos que
seduziam a imaginação humana. Publicam “Contos de fadas para crianças e
adultos”, em 1812-1822.
A atração pelo maravilhoso popular não se deu apenas nas pesquisas linguísticas,
mas também em uma tendência generalizada da literatura dos fins do século XVIII
em descobrir possíveis mistérios, explicação de fenômenos, inclusive do
comportamento humano.
Mais de um século separa os contos alemães dos Grimm daqueles descobertos na
França por Perrault. Entretanto verificamos inúmeras semelhanças de fundo comum
nas fontes orientais, célticas e europeias, onde surgiram.
Hans Christian Andersen surge vinte anos após os Grimm. É poeta e novelista
dinamarquês, buscando a literatura popular nórdica. Entre 1835 e 1872, escreve
duas centenas de contos infantis e a obra “Eventyr”. Foi o grande criador da
literatura infantil romântica, propondo uma fusão entre o pensamento mágico das
origens arcaicas e o pensamento racionalista dos novos tempos.
Em 1865 é publicado na Inglaterra “Alice no País das Maravilhas” de Lewis Carroll e
em 1883, “Pinóquio”, por Collodi, na Itália.
Os contos de fadas contribuíram no decorrer da história e ainda contribuem para
formação de valores morais, mas a principal contribuição é a relação entre o mundo
24
real e imaginário, necessária para o desenvolvimento emocional de todo ser
humano.
1.2. Irmãos Grimm e os contos de princesas De acordo com Vladimir Propp (PROPP, 2002, p: 365), “existem dois tipos de
princesas e seus papéis são determinados menos por qualidades especiais do que
pelo curso da ação”. A princesa dócil é aquela salva pelo príncipe e a outra é a
princesa domada à força. Para o autor, as princesas devem ser compreendidas
pelas ações, pois através delas podemos descobrir progressivamente suas
qualidades. No caso do casamento, o marido pode ser introduzido no clã da mulher
ou a mulher no clã do marido.
Uma das funções da princesa é determinar ao príncipe tarefas difíceis. Ao estudar
essas tarefas podemos destacar duas questões. A primeira refere-se às causas que
provocam tais tarefas, a segunda diz respeito ao conteúdo. As tarefas têm
motivações diferentes, dependendo do desenrolar da história, e nem sempre se
relacionam com a situação em que são impostas. Através das tarefas podemos
conhecer o herói (príncipe), que geralmente reflete os costumes da sociedade onde
o conto acontece. No entanto, o herói não é um homem comum, mas um homem
dotado de força, magia e coragem trazidos pelo seu auxiliar mágico.
Vejamos, então, como os Irmãos Grimm traduzem esses papéis em seus contos,
principalmente naqueles que serviram como base para as animações de Disney, que
retratam os papéis de príncipes e princesas. Para uma análise mais significativa,
escolhemos três princesas, que nas animações recebem os nomes de Aurora
(1959), Tiana (2009) e Rapunzel (2010). Já nos contos de fadas, suas histórias são
contadas de uma forma um pouco diferente, onde alguns fatos presentes nas
animações não aparecem com tanta relevância no contexto do conto. Para isso,
passaremos para um breve histórico da vida dos autores desses contos de fadas, os
Irmãos Grimm.
Jacob e Wilhelm Grimm nasceram na cidade de Hanau, Alemanha, nos anos de
1785 (Jacob) e 1786 (Wilhelm), e dedicaram suas vidas a pesquisas,
desempenhando papéis diplomáticos em vários momentos de sua existência.
25
Dedicaram-se ao registro de contos infantis, dando grande contribuição ao estudo da
sociedade alemã, ao folclore e à sua língua materna, produzindo um dicionário
alemão de muita repercussão até a atualidade.
Buscaram encontrar as origens históricas de seu país. Suas pesquisas tinham dois
objetivos básicos: o levantamento de elementos linguísticos para fundamentação
dos estudos da língua alemã e a fixação dos textos do folclore literário germânico,
expressão do espírito nacional.
Jacob estudou Direito na Universidade de Mauburg, como seu pai. Seu irmão se
juntou a ele após um ano no mesmo curso. Foi convidado por um dos seus
professores para auxiliar na biblioteca, voltando-se durante meses ao estudo da
literatura jurídica, afastando-se para dedicar-se, juntamente com seu irmão Wilhelm,
aos estudos da história e linguística alemã, recolhendo informações da memória
popular, das antigas narrativas, lendas ou sagas que foram conservadas pela
tradição oral.
Em 1806, Wilhelm terminou seus estudos na Universidade de Mauburg e os dois
foram viver com a mãe em Kassel. Dessa época datam as primeiras compilações de
contos e histórias. Após o falecimento da mãe, em 1808, Jacob fica responsável pela
família e assume o cargo de diretor na biblioteca privada de Jérome Bonaparte e, em
1809, um cargo de assessor no conselho de Estado. Nesse período, Wilhelm sofre
com sua saúde debilitada e passa um tempo em tratamento, financiado por seu
irmão. Durante esses anos, eles tinham reunidos material e contos e publicado
textos em revistas sobre mestres trovadores. Em 1810 os irmãos Grimm encontram-
se novamente juntos em Kassel e em 1811 Jacob publica sua primeira obra sobre os
mestres cantores alemães. Wilhelm publica também seu primeiro livro sobre as
traduções de lendas dinamarquesas antigas, em 1811.
A primeira obra comum aos dois irmãos foi publicada em 1812, sobre
“Hildebrandslied e o Wessobruner Gebet” e, em seguida, a primeira coletânea,
“Contos da Criança e do Lar” (Kinder und Hausmärchen), com uma tiragem de 900
exemplares.
Em 1814, Wilhelm torna-se secretário da biblioteca do museu de Kassel e instala-se
em um alojamento pertencente à casa do príncipe-eleitor de Hesse. Jacob se junta a
ele quando retorna de Paris, onde desempenha um papel diplomático. Em 1815
26
abandona a carreira diplomática para dedicar-se aos estudos e, nesse mesmo ano,
publica uma seleção de antigos romances espanhóis.
Em 1815, os irmãos Grimm produzem o segundo volume dos “Contos da Criança e
do Lar”, reimpresso de forma aumentada em 1819. As notas sobre os dois volumes
foram publicadas em 1822. Uma nova publicação nasce em 1825, condensando os
três volumes. Durante a vida dos irmãos Grimm são publicadas sete impressões da
edição completa em três volumes dos contos e dez da edição reduzida a um volume
único. A 50ª edição, enquanto os autores ainda estavam vivos, totalizava 181
narrativas. Muitas dessas histórias são de fundo europeu, tendo sido recolhidas por
Charles Perrault, na França, no século XVII.
Após várias publicações e anos de serviço na biblioteca de Kassel, os irmãos se
demitem e passam a lecionar. São convidados pelo rei da Prússia para trabalhar
como membros da Academia de Ciências, tornam-se professores na Universidade
Humboldt e se instalam em Berlim. Nesse período os irmãos Grimm consagram a
escrita de um dicionário histórico da língua alemã, que apresentaria cada palavra
com sua origem, sua evolução, seus usos e significação. Foram poucas as
publicações que aconteceram enquanto estavam vivos. O primeiro volume aparece
apenas em 1854. Em 1961, o 32º volume do dicionário foi publicado. Em 1957, uma
nova revisão foi iniciada e o primeiro volume desse trabalho publicado em 1965. Em
2004, o conjunto do dicionário foi editado em CD-ROM pela Edições
Zweitausendeins (Frankfurt).
Wilhelm morreu em 16 de dezembro de 1859. Jacob deu continuidade à obra deles,
até morrer em 20 de setembro de 1863.
Foram os irmãos Grimm que dedicaram às crianças contos destinados aos adultos,
que foram sendo recontados dentro de uma temática de magia, unindo dois
universos, o infantil e o popular.
O romantismo encontrado nos contos dos Grimm trouxe um sentido mais
humanitário, destacando o maravilhoso da vida, perpassando em suas temáticas,
questões relacionadas à esperança, amor ao próximoe confiança na vida.
Os contos dos irmãos Grimm não são apenas contos de fadas, mas podem ser
distribuídos em: contos de encantamento, contos maravilhosos, fábulas, lendas,
contos de enigma e contos jocosos.
27
A característica básica das narrativas dos Grimm é a de apresentar um problema
simples, um núcleo dramático, que gera toda a história, de forma que a repetição, a
estrutura narrativa e a simplicidade cativem o público infantil.
Entre os contos mais famosos destacaremos “A Bela Adormecida”, “A Princesa e o
Sapo” e “Rapunzel”.
A Bela Adormecida
A Bela Adormecida
A Bela Adormecida foi publicada em 1812 pelos Irmãos Grimm, na obra “Contos da
Criança e do Lar” (Kinder und Hausmärchen). A primeira versão foi publicada em
1634 no livro “O Conto dos Contos” de Giambattista Basile. Em 1697 foi traduzida
pelo escritor francês Charles Perrault, no livro “Contos de minha Mãe Gansa” sob o
título de “A Bela Adormecida no Bosque”, que por sua vez também se inspirou no
conto de Basile.
O conto foi adaptado para o teatro e balé em 1890 por Pyotr Llyich Tchaikovsky, cuja
inspiração obteve no conto de Perrault e, em 1959, para o cinema pelo estúdio
Disney.
A Bela Adormecida é um clássico conto de fadas, em que a personagem principal é
uma princesa que é enfeitiçada para cair num sono profundo, até que um príncipe
encantado a desperte com um beijo provindo de um amor verdadeiro.
O tema central desse conto, o sono profundo, parece remontar uma época muito
antiga e muito divulgada, e esse tema pode serencontrado tanto no oriente, como no
ocidente. Mesmo quando emigra para outro país adaptando-se, seu tema
fundamental é mantido, pois verificamos que temas que buscam a libertação da
princesa se encontram nos contos e nas lendas.
28
No conto dos Irmãos Grimm a princesa é dotada de virtude, beleza, riqueza,
inteligência e graça, dons que lhe são ofertados no dia do nascimento pelas fadas do
reino. No conto havia 13 fadas, mas apenas 12 pratos de ouro para servi-las, sendo
que uma das fadas não seria convidada. Essa fada, para vingar-se, joga uma
maldição na princesa que, aos 15 anos, espetaria o dedo em um fuso e cairia morta.
Esse desejo foi atenuado pela 12ª fada que lhe concede o sono profundo até que o
beijo do amor verdadeiro viesse acordá-la.
Rapunzel
Rapunzel
O conto de fadas “Rapunzel” foi publicado pela primeira vez pelos Irmãos Grimm em
1812 no livro “Contos da Criança e do o Lar”. A história produzida pelos Irmãos
Grimm é uma adaptação do conto de fadas “Persinette”, escrito em 1698 por
Charlotte-Rose de Caumont de La Force.
No conto dos Irmãos Grimm, o nome Rapunzel é dado pela bruxa e é o nome de
uma planta que é roubada de seu quintal. O conto não cita os pais de Rapunzel
como reis, mas como um casal que morava ao lado da casa de uma bruxa e, no final
da gravidez, a mulher tem o desejo de comer os frutos de uma árvore desse quintal.
Em troca da fruta o homem dá a menina que nasceu e que é trancada em uma torre
e mantida prisioneira pela bruxa. O cabelo da menina nunca é cortado e é
conservado por uma trança. Um dia um príncipe ouve o canto de Rapunzel e resolve
salvá-la. É castigado com uma cegueira e Rapunzel enviada para um deserto por
29
estar grávida. Rapunzel tem dois filhos, gêmeos e um dia encontra com o príncipe e
cura sua cegueira com suas lágrimas e a família vai viver feliz no reino do príncipe.
As virtudes descritas de Rapunzel são a bela voz, a obediência e a beleza. Como
em outros contos escritos pelos Irmãos Grimm, verificamos que os acontecimentos
são atenuados pelo romantismo, característico dos escritores, até mesmo quando a
bruxa descobre sobre a gravidez de Rapunzel. Nesse conto Rapunzel não era uma
princesa, mas transforma-se em princesa ao casar com o príncipe que a salva da
bruxa.
O Príncipe Sapo
O Príncipe Sapo
O conto de fadas “O Príncipe Sapo” é conhecido como o primeiro conto da coleção
dos Irmãos Grimm. O título original em alemão era Der Froschkönig oder der eiseme
Heinrich (O rei-rã ou o Henrique de Ferro), mas em português se popularizou como
sapo, não rã e, com o tempo, o conto foi então chamado de O Príncipe Sapo.
No conto dos Irmãos Grimm, uma princesa encontra um sapo que lhe devolve sua
bola e reluta em hospedá-lo em seu castelo, mesmo depois de ter combinado isso
com ele. Para obedecer seu pai, o rei, a princesa aceita recebê-lo em seu castelo,
onde ele se transforma em príncipe. Em algumas versões essa transformação ocorre
após um beijo da princesa, mas na versão original dos irmãos Grimm, a
transformação ocorre após a princesa ter jogado o sapo contra parede, com
aversão.
30
Nesse conto de fadas as virtudes da princesa citadas são infinita beleza e
obediência ao pai. Uma outra característica, era o fato de ser mimada, citada no
início da história. No conto, mesmo quando o sapo transforma-se em príncipe, a
princesa em nenhum momento mostra-se arrependida, mas aceita casar-se com ele,
a pedido de seu pai. Um personagem que aparece apenas no final do conto, mas
que demonstra fieldade ao principe e bondade é Henrique, o escudeiro do príncipe
que fica tão triste com o feitiço que acorrenta seu coração e essas correntes de ferro
são retiradas apenas quando acaba o feitiço.
Nesse conto verificamos a preocupação dos escritores em desmistificar as
aparências, transmitindo para as crianças que, muitas vezes, o que considera-se feio
pode ser belo.
Como percebemos durante a leitura desse capítulo, os contos de fadas iniciaram
como uma forma de entretenimento e podem ser considerados assim também até os
dias atuais. No entanto, hoje somam uma série de trabalhos onde várias análises
são realizadas através dessas histórias que percorreram séculos e séculos em
diversos países, escritas e contadas por diferentes autores.
Conforme citado anteriormente nesse trabalho, os contos de fadas dos Irmãos
Grimm são a base de criação de alguns longas-metragens de animação de Walt
Disney. Escolhemos três princesas que foram personagens dos contos de fadas dos
Irmãos Grimm, onde Disney se baseou para a produção de suas animações: “A Bela
Adormecida”, “A Princesa e o Sapo” e “Enrolados”. Ao todo, Walt Disney criou onze
princesas: Branca de Neve, Cinderela, Aurora (A Bela Adormecida), Ariel (A
Pequena Sereia), Bela (A Bela e a Fera), Jasmine (Aladdin), Mulan, Pocahontas,
Tiana (A Princesa e o Sapo), Rapunzel (Enrolados) e Merida (Valente).
Para entrarmos nesse contexto cinematográfico, passaremos no próximo capítulo
para outra história: a história do cinema de animação, admirada e estudada por
tantos pesquisadores da área, que procuram em seus estudos consolo para seus
encantamentos com as formas de animação e a incrível influência da tecnologia.
31
2. O Cinema de Animação
Mickey Mouse
Este capítulo apresenta um histórico do cinema de animação desde seu surgimento,
com alguns dos primeiros desenhos animados, incluindo as contribuições de Walt
Disney nos curtas e longas-metragens, enfatizando as produções baseadas em
contos de fadas de princesas escritos pelos Irmãos Grimm.
Apresentamos um estudo sobre a transformação da animação tradicional com a
chegada das novas tecnologias e os ganhos que esses recursos proporcionaram à
animação, ampliando cada vez mais o número de espectadores interessados nessas
produções cinematográficas, como podemos perceber ao frequentarmos as salas de
cinemas que projetam as animações. Atualmente, logo na pré-estreia de uma
animação podemos ver filas enormes nas portas dos cinemas. Naturalmente isso se
dá também pela influência da mídia e talvez até por falta de outras opções de
diversão. No entanto, acreditamos que, em algum momento do cinema, o público
despertou seu interesse para o cinema de animação. De acordo com as pesquisas
desenvolvidas, percebemos que os avanços da tecnologia tiveram uma influência
significativa nesse sucesso de público, não apenas infantil, mas de todas as idades.
Este capítulo também traz uma síntese de três longas-metragens, onde o
personagem principal é representado por uma princesa em um determinado período,
assim como o trabalho tecnológico realizado durante essas produções. Desde a época da pré-história, homens utilizavam desenhos para se comunicar e
representar momentos de suas vidas. No entanto, o homem sentiu necessidade de
criar vida às imagens, surgindo então invenções que davam movimento às imagens
32
produzidas. No século VII, o alemão Athanasius Kircher criou a lanterna mágica, que
era uma caixa cilíndrica iluminada à vela. Sua função era projetar as imagens
desenhadas em uma lâmina de vidro.
Lanterna Mágica
Com o passar do tempo o homem continuou sua busca em aperfeiçoar os meios
para produzir o movimento de imagens. As primeiras projeções cinematográficas
eram em preto e branco e ainda não havia recursos técnicos que permitissem a
captação e a reprodução da voz do ator em sincronia com o movimento de sua boca.
As imagens não eram muito nítidas e os enredos eram simples e curtos registrando,
na maioria das vezes, cenas do cotidiano captadas ao ar livre.
No decorrer dos anos o cinema mudou com as diversas técnicas de produção que
foram sendo criadas até o uso da tecnologia e construção de personagens e cenas
através da computação gráfica, desde a época de sua criação e exibição pública em
1895, produzida em Paris pelos irmãos Louis e Auguste Lumière, até os tempos
atuais. Segundo Araújo (1995) o cinema encontrou sua primeira e mais completa
definição: um modo de captar a realidade em movimento sem nenhuma interferência
humana (ARAÚJO, 1995). Através do cinema podemos conhecer mais a realidade.
Entretanto não enfatizamos nesse trabalho a história do cinema, mas a forma como
as produções em desenhos animados foram sendo realizadas e a necessidade que
o homem sentiu ao longo da história de retratar uma sequência de fatos, expandindo
os desenhos de quadros simples e estáticos para quadros sequenciados, com uma
narrativa.
Aos poucos a realidade capturada começou a interagir com a fantasia, e os filmes
começaram a levar para as telas do mundo possibilidades experimentadas somente
no campo da imaginação. Assim a arte da animação ganhou vida e passou a ser
reconhecida como linguagem.
33
De acordo com o autor Alberto Barbosa Lucena Júnior (LUCENA, 2005) a animação
no cinema é conhecida como a arte de dar vida e movimentos a objetos inanimados.
Todo desenho animado é um cinema de animação, que abrange várias outras
técnicas. Utiliza a imagem, música, fala, escrita, tudo se movimentando. Os
personagens são variados (animais, mocinhos, bandidos, criações, entre outros),
dentro de um universo mágico, onde tudo é possível.
Na animação há uma sequência de imagens estáticas que se projetam em uma
determinada velocidade sugerindo movimentos. O desenho animado é a mais
conhecida técnica de animação – animação em 2D. Outras técnicas de animação
utilizadas: película - o artista desenha na película cinematográfica; animação de
objetos - stop motion; animação de recortes; sombra chinesa; pixalation – mistura de
atores com objetos.
Em 1906, o produtor de filmes inglês John Stuart Blackton realizou a apresentação
do que é considerado o primeiro filme de animação, o “Humorous Phases of Funny
Faces”, onde um cartunista desenha expressões engraçadas com giz em uma lousa.
O filme tem cerca de três minutos de duração e mistura ação real com a técnica de
stop motion (LUCENA, 2005).
No entanto, a paternidade do desenho animado atribui-se ao cartunista francês
Émile Cohl (1857-1938), considerado “o pai do desenho animado”, com seu primeiro
filme animado de dois minutos intitulado “Fantasmagorie” projetado em Paris pela
primeira vez em 1908. Depois desse início com um curta-metragem, outras várias
experiências em animação surgiram com marcas, estilos e técnicas variando de
acordo com cada animador.2
2 Esse primeiro filme realizado completamente por Cohl é também o primeiro desenho animado de verdade, com seus dois minutos fotografados frame a frame e apresentando características estilísticas bem definidas. Cohl desenhou em papel utilizando tinta nanquim, o que lhe permitia flexibilidade. Simplificou o traço para agilizar a execução dos desenhos, mas sem abdicar da expressividade da linha. No laboratório reverteu a impressão para preservar no filme o efeito de linha branca sobre fundo negro. Para evitar descontinuidade dos traços, o que gera movimentos repentinos, lançou mão da caixa de luz, que permitia sobrepor as folhas de papel e, assim, retraçar os desenhos com precisão. (LUCENA, 2005, p:50)
34
Fantasmagorie
Em 1911, o cartunista norte-americano Winsor McCay, foi considerado o pioneiro do
desenho animado ao transpor para o cinema os personagens animados de seus
cartuns “Little Nemo in Slumberland”, onde utilizou tiras de suas histórias em
quadrinhos publicadas em dois jornais, o New York Herald e o New York American.
Seu segundo filme de animação foi projetado em 1914, considerado sua grande
obra, o “Gertie the Dinosaur”, sinalizando um momento em que os personagens dos
desenhos animados ganham personalidade, com vontade própria, poder de tomar
decisões e resolver problemas. As criações passam a ter vida (LUCENA, 2001).
McCay criou um padrão para animação que seria utilizado por Disney e outros em
décadas seguintes.
Little Nemo Gertie the Dinosaur
No início a animação não foi reconhecida e aceita pelo público tão facilmente,
necessitando de um desempenho acentuado dos desenhistas que buscavam
descobertas e maneiras de tornar as animações mais atrativas ao público, buscando
35
respeito profissional e uma audiência que apreciasse as expressões e movimentos
criados no papel. Para produzir as animações surgem os estúdios de animação,
gerenciados por animadores autodidatas no domínio do processo básico da
animação, que ensinavam aos jovens suas descobertas e novas técnicas. A
formação em escolas de belas artes era um ponto comum entre todos que
trabalhavam nos estúdios (LUCENA, 2001).
O salto da animação para produção em grande escala aconteceu nos Estados
Unidos e teve início antes da eclosão da Primeira Guerra Mundial, fato que
fortaleceu a indústria cinematográfica americana, pois não havia nessa época a
concorrência europeia.
O animador americano John Randolph Bray teve um grande papel na inovação e
organização na maneira de produzir filmes de animação. Era um empreendedor e
vislumbrava o potencial da animação em seus desenhos. Com ele se inicia o
processo de industrialização do desenho animado, investindo em técnicas para
divisão do trabalho, distribuição no mercado e marketing dos filmes.
Nessa etapa do desenvolvimento da animação, duas descobertas foram anunciadas:
a primeira foi a maior contribuição técnica para a animação tradicional até o
surgimento da computação gráfica, o desenho sobre folhas de celuloide
transparente, o acetato. Foi um impacto para a industrialização da animação,
afetando desde o processo básico de confecção técnica da animação, passando
pelos estúdios e ampliando a divisão do trabalho. Essa inovação foi criada em 1914
pelo animador norte-americano Earl Hurd (LUCENA, 2001).
A segunda descoberta técnica foi a rotoscopia, inventada pelos irmãos Max e Dave
Fleischer, no ano de 1915. “A rotoscopia era um engenhoso artifício para se obter
movimentos realistas no desenho. Uma sequência de imagens reais pré-filmadas era
projetada frame a frame numa chapa de vidro, permitindo que se decalcasse no
papel ou acetato a parte da imagem que se desejasse.” (LUCENA, 2001, p: 69).
36
A rotoscopia de Max Fleischer
Essa técnica foi usada na série “Out of the Inkwell”, estrelada pelos personagens
Koko the Clown e Fitz the Dog, lançada em 1919. Os estúdios de Fleischer também
foram responsáveis por outros personagens, como Betty Boop (1930) e Popeye
(1933) (LUCENA, 2001).
Max Fleischer – Betty Boop e Popeye
Muito se modificou desde a descoberta da rotoscopia, porém a técnica continua
sendo utilizada até hoje.
A década de 1920 pode ser considerada como um grande divisor de águas dos
desenhos animados, que até o momento eram considerados apenas como
acessórios de programas dos cinemas (MUTRAN, 2010).
Em 1923, o estúdio Disney surge com muitas histórias animadas e personagens que
ganham características humanas, com emoções, ideias, conflitos e diversão, o que
faz com que aconteça uma maior identificação do público. Para essas produções, a
indústria cinematográfica Disney iniciou utilizando acetato transparente. Um artista
ficava responsável pela animação; outro por passar os desenhos para o acetato e
outro fazia os cenários. Eram necessários 24 desenhos por segundo para obter um
movimento perfeito.
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Em 1928, Disney lança o primeiro desenho animado com som sincronizado,
“Steamboat Willie”. Esse desenho marca o início de uma nova era, onde os
desenhos de animação seriam sonorizados.
Stemaboat Willie
Disney teve um papel fundamental para as mudanças na história da animação
tradicional, com estudos, técnicas e descobertas que foram se aperfeiçoando ao
longo dos anos, inspirando animadores a produções que captassem cada vez mais
espectadores no cinema de animação.
No entanto, uma das grandes descobertas nasceu na década de 50, a animação por
computa dor, conforme veremos a seguir.
2.1. O uso da tecnologia digital nos desenhos animados
A animação por computador nasceu da pesquisa de animação abstrata do animador
americano John Whitney, conhecido como pai da computação gráfica, que durante a
década de 50 utilizou técnicas de animação para criar sequências de programas de
TV e comerciais. Seus primeiros trabalhos no cinema foram os filmes 8 mm de um
eclipse lunar que ele fez com um telescópio caseiro. Junto com o irmão James
Whitney, começou a elaborar uma série de filmes abstratos. Em 1950, um dos
trabalhos mais famosos desse período foi a animada sequência do título de Alfred
Hitchcock’s, em 1958, o filme “Vertigo”, juntamente com o designer gráfico Saul
Bass. Com um computador analógico construído por ele em meados dos anos 50 e
60, realizou várias aberturas de filmes e novelas e uma série de filmes abstratos,
38
usando suas técnicas de animação, um deles, o “Arabesque”, em 1975, foi o auge
dos seus filmes digitais. John Whitney conseguiu atrelar composições musicais aos
filmes experimentais e imagens de computador, criando harmonia entre imagem e
som. Seu trabalho nos anos de 1980 e 1990 beneficiou outros animadores ao longo
dos tempos (VALENTE, 2001).
Arabesque
Com o uso da computação as animações eram digitalizadas por intermédio de um
scanner e coloridas na própria máquina. Um artista passa a colorir 500 celuloides
(antes eram 50) por dia. Todo processo de composição e edição passam a ser feitos
no computador.
O ano de 1984 pode ser considerado um marco para o cinema de animação, com o
lançamento de “Andre & Wally B.” que foi o primeiro desenho animado por
computador que não se resumia a imagens compostas por formas geométricas. A
animação tinha um enredo e personagens de formas orgânicas, considerada a
primeira animação por computador feita por um animador profissional, John
Lasseter3
(MUTRAN, 2010).
3 John Alan Lasseter é um dos principais animadores da Pixar Animation Studios. Em 1995 dirigiu o longa-metragem de animação Toy Story, primeiro filme feito somente com o uso de computadores.
39
Andre & Wally B.
Nessa mesma época, algumas empresas e produtoras faziam as primeiras
experiências com animação por computador e era um trabalho geralmente realizado
por pessoas com experiência em computadores, mas sem experiência em
animação. Entre essas empresas estava a Lucasfilm, do cineasta George Lucas,
que percebeu que poderia aprimorar a técnica de animação e contratou John
Lasseter, que havia sido animador no estúdio da Disney. Lasseter começou o
trabalho no Grupo de Computação Gráfica da Lucasfilm, sendo o único animador
numa equipe formada por engenheiros e técnicos em computadores (LASSETER,
2007).
Steve Jobs, fundador da Apple, percebeu que a animação por computador teria
futuro e comprou da Lucasfilm seu Grupo de Computação Gráfica, fundando a Pixar,
que tinha como objetivo principal produzir hardware para manipulação de imagens
por computador (MUTRAN, 2010).
A chegada das novas tecnologias trouxeram transformações significativas para a
animação. De acordo com Erick Felinto (FELINTO, 2006) o desenvolvimento da
tecnologia digital transformou o cinema, possibilitando o desenvolvimento do cinema
industrial e também de realizações independentes. A utilização das tecnologias
digitais transformou realidades fantasiosas em realísticas.
Grandes produções são feitas através das novas tecnologias e muitas outras com
uso de aquarelas, desenho com lápis e carvão, stop motion e tantas outras técnicas.
As técnicas são variadas e sofrem a influência do avanço tecnológico.
A influência da tecnologia é grande nas produções das animações, mas o trabalho
ainda é intenso, principalmente porque o espectador mudou seu comportamento e
nível de exigência através dos tempos. Hoje quem escreve sobre cinema de
animação se refere muito à capacidade dos filmes seduzirem o público, que se
40
mostram entusiasmados com as produções em 3D e com o nível de realismo nas
cenas.
A tecnologia no cinema de animação transformou imagens, cenários, personagens,
efeitos imaginários e realísticos e contribuiu muito na sonorização dos desenhos
animados e na gravação. Hoje em dia são produzidos longas-metragens em DVD4
A tecnologia ajudou no desenvolvimento de programas, nas técnicas de produção e
na construção de animações, até o surgimento da animação 3D – personagens e
cenários que simulam a realidade em três dimensões através da computação
gráfica.
e
blu-ray, onde a capacidade de interação com o espectador é maior, aumentando o
interesse por novas produções. Com as novas descobertas o campo cinematográfico
no cinema de animação tende a um crescimento constante e promissor.
2.2. A animação de Walt Disney e a parceria com a Pixar
Quanto mais estudamos sobre a animação, podemos observar que a arte apenas é
manifestada quando o artista é um ser motivado, com qualidades e conhecimentos
específicos que são necessários para o empreendimento (LUCENA, 2001). Nesse
sentido, destacamos o trabalho do animador Walt Disney, que iniciou sua carreira
em 1919, em Kansas City, como aprendiz de desenhista de uma empresa que fazia
catálogos e anúncios para jornais e revistas. Não analisamos neste trabalho a vida
de Walt Disney, mas principalmente sua ousadia e empreendedorismo em
transformar as animações em grandes produções, motivando outros animadores que
o seguiram em seu estúdio e iniciaram outros trabalhos pelo mundo.
4 DVD – Digital Versatile Disc, em português, Disco Digital Versátil
41
Walt Disney
De acordo com Neal Glabler (GLABER, 2009), Disney e outro colega de trabalho
tiveram o primeiro contato com o mundo da animação em uma atividade da empresa
Kansas City Slide Co., onde através de desenhos primários produzidos para um
comercial, Disney sentiu-se motivado e sua curiosidade o levou a experiências com
a câmera, produzindo os desenhos que realizava na garagem de sua casa. Inspirado
por esses estudos e testes, ele decidiu fazer seu primeiro desenho animado, que
vendeu para uma rede de cinemas em Kansas City. Em 1921, estreava seu primeiro
rolo de desenhos animados dando início a uma série que denominou “Newman’s
Laugh-o-Grams”. (GABLER, 2009).
Newman”s Laugh-o-Grams
No entanto, suas produções seguiam as solicitações da empresa e acabavam sendo
simples, diante dos sonhos de Disney. Foi então que ele percebeu que deveria criar
sua própria empresa. Juntamente com o colega de trabalho Ubbe Iwerks, conhecido
posteriormente como Ub Iwerks, fundou a “Laugh-o-Grams Incorporated”, recrutando
amigos para o novo trabalho em troca de experiências (GABLER, 2009).
42
Após o sucesso com os personagens criados por Disney e Iwerks, principalmente os
curtas com o personagem Oswald e com o famoso Mickey Mouse, Disney decide
produzir seu primeiro longa-metragem, “Branca de Neve”, que contribuiu muito para
o mundo da animação através do auxílio da técnica da rotoscopia e a animação de
personagens humanos, onde as ações eram realizadas por atores, filmadas,
projetadas com o auxílio do rotoscópio e depois desenhadas pelos animadores
(MUTRAN, 2010). “Branca de Neve” foi um dos primeiros longas-metragens
desenvolvidos com a tecnologia Technicolor, destacando uma preocupação dos
animadores com a composição e tolerância com as cores. Para a produção desse
longa Disney montou uma escola de animação com cerca de 750 pessoas, onde
eles aprendiam técnicas de desenho, pintura, atuação, música, entre outros (Hahn,
2009).
Ao mesmo tempo em que Disney procurava inovar as técnicas de produção através
dos recursos de computação, a empresa Pixar, que no início era uma companhia de
hardware, seu produto primário era o computador (Pixar Image Computer) e tinha
como maior comprador a Walt Disney Pictures também idealizava animações
realizadas totalmente por computador. Em 1991, assinou um contrato com a Disney,
produzindo o longa metragem “Toy Story”, um longa-metragem produzido totalmente
por computador, lançado em 1995.
Pixar Toy Story
A produção de “Toy Story” se desenvolveu em etapas semelhantes às da produção
da animação tradicional. Depois da produção da história, foram preparados os
storyboards e as vozes dos personagens foram, então, gravadas. Após essa etapa,
foi feita a montagem em vídeo das imagens do storyboard, acompanhadas dos
43
diálogos. Dessa forma, os desenhos em papel foram transportados para uma
linguagem cinematográfica, em que verificaram vários aspectos da produção e
realizaram os ajustes necessários. O departamento de artes desenvolveu os
personagens, cenários, figurinos e tudo começou a ganhar vida, modelados em 3D
diretamente no computador. Depois dessa etapa, todas as outras etapas que
sucederam foram computadorizadas, os personagens foram aplicados nas cenas,
todos os elementos digitalizados em 3D e as cenas montadas e capturadas por uma
câmera virtual. É incrível verificar como os movimentos e expressões foram sendo
capturados e transferidos para os computadores que, com o uso de softwares,
acoplaram os movimentos aos personagens.5
Nessa parceria entre Disney e Pixar, a Pixar era responsável pela produção (todas
as principais produções foram feitas em parceria com a Disney) e a Disney pela
distribuição. A Disney ainda seguiu realizando outros longas-metragens utilizando os
recursos de computação, como: “Pocahontas” (1995), “O Corcunda de Notre Dame”
(1996), “Hércules” (1997), “Vida de Inseto” (1998), “Mulan” (1998), “Tarzan” (1999),
“Toy Story 2” (1999), “Monstros S.A.” (2001), “Procurando Nemo” (2003), “Irmão
Urso” (2003), “Os Incríveis” (2004), “Nem que a Vaca Tussa” (2004), “Carros” (2005)
e “O Galinho Chicken Little” (2005), sempre em parceria com a Pixar, que continuava
a produção de seus curtas, colaborando sempre para o desenvolvimento de novas
técnicas e softwares que foram sendo aplicados nos longas-metragens.
Em 2006, a Disney comprou a Pixar e continuaram com a produção de longas-
metragens de grande sucesso como: “A Família do Futuro” (2007), “Ratatouille”
(2007), “Wall-E” (2008), “Up: Altas Aventuras” (2009), “A Princesa e o Sapo” (2009),
“Toy Story 3” (2010), “Enrolados” (2010), “Valente” (2012), entre outras produções.
Através dos longas-metragens foi ficando cada mais visível o uso da tecnologia e
seus avanços que são notados pelos espectadores nos detalhes das produções,
como o cabelo dos personagens, por exemplo.6
Neste trabalho destacamos algumas produções de Disney baseadas nos contos de
fadas dos Irmãos Grimm
7
5 De acordo com John Lasseter, através dessa produção tanto a Disney quanto a Pixar, criaram uma colaboração memorável que os levou a uma jornada que nenhum deles poderia ter imaginado. (LASSETER, áudio DVD Toy Story, 1995).
, que contam histórias de princesas, como citado
anteriormente.
6 Citações de depoimentos de espectadores que assistiram às produções de Disney.
44
Passaremos então para o estudo de como essas produções foram sendo realizadas
com o uso da tecnologia.
2.3. A produção dos longas-metragens de princesas
Os estúdios de Walt Disney produziram vários longas-metragens e entre eles
destacaremos as animações das princesas Aurora, Tiana e Rapunzel, nos filmes “A
Bela Adormecida” (1959), “A Princesa e o Sapo” (2009) e “Enrolados” (2010).
A Bela Adormecida (Sleeping Beauty) – 1959
O longa-metragem “A Bela Adormecida” foi uma ousada experiência de Walt Disney
e sua equipe e um grande avanço para a arte de animação. Até hoje é considerado
uma das obras-primas de Disney. Seu desenvolvimento teve início em 1950 e sua
produção sofreu atrasos, pois na mesma época, Disney também se dedicava à
construção da Disneylândia e várias produções para televisão. Após mais de seis
anos de produção o filme foi concluído com um custo de US$ 6 milhões. Parte deste
custo deve-se ao formato Technirama widescreen em bitola 70 mm, que exigiu uma
animação mais complexa e cenários de maiores proporções e 300 artistas e técnicos
que criaram mais de um milhão de esboços e desenhos (LARSON, 1959).
Disney motivou seus artistas a criarem “ilustrações com movimento”, ou seja, fazer
com que cada fotograma tivesse vida independente do filme em si, como se fosse
uma bela ilustração. Pediu à sua equipe de produção que “criassem personagens os
mais reais possíveis, quase que de carne e osso, e que se identificassem com eles”
(LARSON, 1959). Alguns modelos vivos foram filmados para servirem de objeto de
estudo e de referência dos artistas. Eric Larson8
Os animadores trabalharam com ampliações dos fotogramas das imagens live-action
dos artistas e, sem, no entanto, copiar o traçado por cima, convertiam e
lembra ainda que houve um esforço
consciente no sentido de dar ao filme um visual inédito e de torná-lo o mais perfeito
possível.
7 Contos de fadas dos Irmãos Grimm citados no capítulo 1. 8 Eric Larson – um dos maiores animadores dos estúdios Disney e diretor de sequências de A Bela Adormecida.
45
redesenhavam o que viam na forma de caricaturas, concentrando-se no estilo do
traço escolhido e em áreas determinadas da cena. Também foi contratado um
grande ilustrador de cenários, o artista Eyving Earle, que criou uma beleza formal
com influências góticas francesas, italianas e renascentistas com um toque pessoal
de renascentismo. (CLEMENTS, 2008)
A produção de A Bela Adormecida utilizou todos os recursos do formato widescreen,
empregando um processo até então inédito, chamado de Technirama-70, sendo que
os artistas foram capazes de criar cenas panorâmicas em um Technicolor reluzente.
A ilusão de profundidade de campo e dimensão do filme foi fruto do casamento dos
recursos da câmera de planos múltiplos e do widescreen. Na filmagem em bitola 70
mm, o filme corre com a câmera na horizontal com as imagens expostas em
fotogramas duplos de 35mm. O negativo Technirama é copiado em 70 mm e
projetado através do modo convencional nos cinemas (CLEMENTS, 2008)
De acordo com Disney, “o complexo processo Technirama impôs um enorme
trabalho extra aos artistas, eles tiveram de movimentar seus personagens num
campo de ação muito maior. Os cálculos matemáticos se tornaram muito mais
intrincados. Todas as fases do desenho e da mecânica, que, juntas compreendem a
animação, tiveram de ser repensadas” (DISNEY, 1959).
Disney sempre considerou de grande importância a escolha da trilha sonora para
suas produções. George Bruns, considerado um renomado músico e compositor de
estúdio, foi chamado para fazer a adaptação musical das canções românticas e das
orquestrações da peça clássica de Tchaikovsky. A trilha musical do filme inclui cerca
de um terço do balé original.
Em A Bela Adormecida a música acentua o apelo emocional da história, conferindo
mais impacto e emoção às cenas de amor, assim como às cenas cômicas e à cena
climática de luta entre príncipe e dragão. Ainda inclui cinco canções retiradas do balé
original que ganharam letras e foram transformadas em temas dos personagens.
Essa prática tornou-se uma marca nas animações de Disney.
46
Princesa Aurora e Malévola na roca de fiar
Ao assistirmos ao longa-metragem e analisarmos sua produção, constatamos que a
equipe Disney criou um filme encantador, divertido, emocionante e de alta qualidade,
ganhador de vários prêmios e com uma arrecadação nos Estados Unidos de US$
478,2 milhões , sendo a 2ª maior bilheteria de 1959.
A Princesa e o Sapo (The Princess and the Frog) – 2009
A Princesa e o sapo
Mesmo após as últimas animações de Disney terem sido feitas inteiramente por
computador, como foi o caso de “O Galinho Chicken Little”, “A Família do Futuro” e
“Bolt - O Super Cão”, a produção de “A Princesa e o Sapo” foi realizada novamente
utilizando-se o método tradicional de animação à mão, em 2D, que havia sido
encerrado pelo estúdio em 2004. Curiosamente, essa mudança relaciona-se à
compra da Pixar, que lançou John Lasseter ao posto de chefe criativo da Disney e
47
contratou diversos animadores que haviam sido demitidos, como foi o caso de Lon
Smart 9
No longa-metragem “A Princesa e o Sapo”, os desenhos dos personagens, depois
de feitos à mão, foram digitalizados para serem coloridos e receberam efeitos no
computador. Um software chamado Harmony foi utilizado na produção, pois o
sistema CAPS havia se tornado obsoleto. Já a maior parte dos cenários foram feitos
diretamente no computador, utilizando softwares comerciais (MUTRAN, 2010).
(MUSK, 2009).
Apesar da história do longa-metragem ser baseado no conto de fadas dos Irmãos
Grimm, “O Príncipe Sapo”, A Princesa e o Sapo conta uma história bem diferente.
Tiana é uma moça pobre que conquista o coração de um príncipe transformado em
sapo, mas ao beijá-lo é ela quem se transforma em sapa e os dois saem pelo mundo
em busca de soluções para o feitiço e ela em busca de um sonho, abrir um
restaurante. Tiana é a primeira princesa negra da Disney.
A música se faz presente em grande estilo, como em todas as produções de Disney.
A trama se passa em New Orleans e as canções foram inspiradas no jazz, onde os
momentos musicais são peças importantes para o desenvolvimento da história. A
produção musical foi de Oscar Randy Newman. A direção de Ron Clements e John
Musker.
Enrolados (Tangled) - 2010 Em 2010, os estúdios de Walt Disney criam o longa-metragem Enrolados, baseado
na história de Rapunzel. Desta vez com uma princesa muito mais desbravadora.
Nessa versão o “príncipe” é um ladrão e não fica cego, ajuda a princesa a atingir um
objetivo que é ver as lâmpadas que sempre são acesas no dia do seu aniversário. 10
9 Lon Smart – animador de A Princesa e o Sapo com experiência em animação tradicional, responsável também por outras produções da Disney, como Mulan, Tarzan, A Pequena Sereia, O Rei Leão, entre outros. 10 Os diretores mudaram o nome do filme de Rapunzel para Enrolados e alegaram aos críticos que Rapunzel não era a única protagonista, mas que a ideia era criar um duo entre Rapunzel e Flynn Rider, personagem que inicia como ladrão no longa-metragem Enrolados (áudio, 2010).
48
Enrolados - 2010
O longa-metragem Enrolados ficou quase seis anos em produção, mas com a
mudança dos diretores que assumiram outros compromissos, o projeto acabou
ficando atrasado. Os diretores responsáveis pela produção foram Byron Howard e
Nathan Greno. O filme recebeu o nome inicialmente de Rapunzel, mas devido ao
baixo rendimento da produção anterior, “A Princesa e o Sapo”, a empresa decidiu
não deixar o nome de uma princesa, já que isso poderia influenciar na decisão dos
meninos em assistirem ao filme (BYRON, 2010).
O filme foi produzido em CGI,11 com o visual inspirado em pinturas a óleo sobre tela.
Os animadores queriam mostrar movimentos que imitassem a fluidez suave dos
desenhos feitos à mão encontrados em filmes mais antigos de animação da Disney.
No entanto, encontraram algumas dificuldades, principalmente com relação ao
cabelo, pois não havia tecnologia suficiente para o efeito que desejavam. Os
problemas relacionados ao cabelo da princesa Rapunzel foram resolvidos bem perto
do lançamento do longa-metragem12
11 CGI –Computer Generated Imagery, em português, Imagens geradas por computador.- é a aplicação de computação gráfica para criar ou contribuir para imagens em arte, mídia impressa, jogos de vídeo, filmes, programas de TV, comerciais e simuladores em geral.
. Uma versão melhorada de um programa de
simulação de cabelo chamado Dynamic Wires, desenvolvido para a animação “Bolt -
O Super Cão”, foi usado, assim como outras técnicas que foram sendo
desenvolvidas (BYRON, 2010).
12 O filme foi indicado a nove prêmios e recebeu inúmeras críticas positivas de jornais, sites, programas de
televisão e rádio. Foi a 50ª animação do Estúdio Walt Disney, baseado no conto dos Irmãos Grimm, “Rapunzel”.
49
A composição da trilha sonora foi realizada por Alan Menken, dentro de uma mistura
entre folk rock dos anos 60 e música medieval, compondo e refletindo a história da
princesa que quer ir em busca da liberdade e autonomia e a época em que essa
história acontece. Diversas canções foram escritas, mas acabaram sendo cortadas
do filme final. Segundo Allan Menken, ele estava em busca de uma canção que
realmente expressasse os sentimentos da personagem. “When Will My Life”, em
português, “Quando minha vida vai começar”, substituiu uma versão anterior
chamada “What More Could I Ever Need?”, por expressar melhor as emoções da
princesa. A abertura passou por cinco ou seis versões diferentes. Da mesma forma,
a canção da mãe Gothel seria “You Are My Forever”, que foi adaptada para o
personagem Flynn no final da animação. A música que mais expressava o
sentimento de posse da mãe Gothel foi “Mother Knows Best”, em português, “Sua
mãe sabe mais”.
De acordo com a análise dessas grandes produções de Disney, observamos nesse
trabalho que apesar do desenvolvimento da tecnologia, dos avanços que trazem
cada vez imagens muito relacionadas ao mundo real, os próprios animadores ainda
buscam na animação tradicional a base para suas produções. Na sequência desse
estudo, trataremos sobre a importância da manutenção de alguns valores para a
vida do ser humano e como esses valores estão sendo retratados em cada uma
dessas animações destacadas nos capítulos iniciais, em forma de contos de fadas e
como longa-metragem, principalmente através do papel da princesa em cada um
deles.
50
3. Valores O capitulo 3 retrata a importância dos valores e a forma como aparecem nas
animações de Walt Disney, destacando as animações das princesas, citadas ao
longo deste trabalho. Desde que a pessoa nasce, vários acontecimentos em sua vida vão produzindo uma
imagem própria construída a partir das relações que estabelece com os outros. É um
processo crescente de diferenciação que se torna mais abrangente à medida que a
pessoa vai se conscientizando do local onde vive, do seu papel como ser social e
das constantes ampliações e transformações que ocorrem e que são significativas
para ela.
A identidade é um processo contínuo que se estrutura e reestrutura no decorrer da
vida do indivíduo. É definida pela relação do indivíduo com outros, isto é, cada
indivíduo se completa e se efetiva no relacionamento com os que estão à sua volta,
em seu convívio. É na relação entre o “eu” e o “outro” que se constrói a identidade
do “eu” (SILVA, 2000).
Enquanto a identidade diz respeito ao reconhecimento, a diferença articula todos os
elementos que costumeiramente constatamos quando definimos a identidade do
indivíduo, isto é, como nos sentimos, nossos desejos, nossas atitudes em
determinados contextos, em suma, tudo o que diz respeito ao nosso ser individual.
Identidade e diferença se completam, têm uma relação constante e contínua.
Analisando dentro de um contexto sociológico, no processo de construção de
identidade aparecem os valores, que também são construídos no decorrer da vida
do indivíduo e através das relações que estabelece com os outros dentro de uma
sociedade.
Trabalhar com valores envolve um contexto social amplo, principalmente porque
está diretamente relacionado a pessoas e pessoas são diferentes, vivem de formas
diferentes, pensam e constroem relações de forma diferente e, ao mesmo tempo, na
maioria das vezes, dentro de um mesmo padrão ou regra de conduta, que é ditada
pelas próprias pessoas que vivem nessa sociedade. No entanto, quando pensamos
em formação de seres humanos, dentro de um contexto social, pertencentes a um
meio cultural, não podemos dissociar identidade e diferença de valores. A
51
construção de valores também está relacionada com a identidade de uma pessoa e
concomitante à diferença.
O mundo nos oferece vários tipos de experiências, e toda a informação que
adquirimos acrescenta conhecimento, que precisamos valorar de acordo com o que
é bom e melhor para nossas vidas e coletividade. Os valores não são a medida de
comportamento, eles têm a tarefa muito mais nobre que a de formar caráter,
desenvolver sentimento e conscientizar cada um do seu papel importante enquanto
indivíduo capaz de transformar o ambiente ao qual pertence, respeitando a diferença
e a identidade de cada um.
Os valores podem ser transmitidos de várias maneiras dentro de uma sociedade.
Ainda muito pequeno, o ser humano vai aprendendo sobre a importância dos valores
em sua vida. Nesse momento as pessoas da família são os protagonistas principais
na transmissão dos conhecimentos quanto aos valores e regras sócias. A partir do
momento em que a criança passa a conviver em outros ambientes sociais, recebe
outras formas de compreensão do que são os valores, de como podem ser
compreendidos e respeitados (MOSES, 1999).
Analisando a forma como os valores vão se constituindo ao longo da vida de um
grupo de pessoas, percebemos que existem várias formas de transmissão e
construção associadas à conduta das pessoas com as quais interagimos. Uma
forma de transmissão de valores pode ocorrer através dos meios midiáticos. Em
todo momento, o ser humano entra em contato com valores que são passados nos
programas de TV, propagandas e salas de cinema. Nas animações de Walt Disney,
destacamos alguns valores que são transmitidos através da postura dos
personagens. Para dar continuidade às nossas análises, focamos nas princesas
Aurora, no longa-metragem de animação “A Bela Adormecida”; Tiana, em “A
Princesa e o Sapo”; Rapunzel, em “Enrolados” e seus papéis sociais. Nesse caso,
as crianças não são as únicas atingidas, mas os expectadores de forma geral, que
se interessam pelas animações.
52
3.1. Reflexões sobre a importância do trabalho com valores O conhecimento e a prática de valores ajudam o indivíduo a desenvolver seu
comportamento em relação ao mundo em que vive, contribuindo para pensar em
coletividade e transformar seu espaço social. Valorar significa não apenas dar
importância a certos sentimentos, mas também (e quando necessário) rever, refletir
e avaliar determinados conceitos pessoais.
O ser humano, através de experiências próprias, possui valores adquiridos em casa,
na rua, na igreja, na escola, na vizinhança onde mora, e essa mistura de vivências
vai formando o caráter e desenhando um perfil enquanto indivíduo ativo e capaz,
transformador da sociedade em que vive.
Os valores estão em nossas vidas em todos os momentos, nas mais diversificadas
situações. Valoramos a pontualidade, a limpeza, o cuidado e nem nos damos conta
disso. Valores estão em todos os lugares e podem ou não divergir dependendo da
cultura da sociedade onde o indivíduo está inserido.(MOSES, 1999)
Vivemos em uma sociedade capitalista, que está presa ao seu tempo, ao que se
consome. O “ter” é questão de aceitação, e o “ser” vai sendo esquecido à medida
que os valores vão sendo mudados por uma sociedade consumista que valoriza o
sujeito pelo que possui: bens materiais, estudos avançados, boa aparência, boa fala,
boa família, boa moradia. O “ser” é construído tendo por base o que a sociedade e a
moda ditam.
As pessoas têm conhecimento dos valores e das regras que envolvem seu
comportamento, mas a maneira como irão praticar esses mesmos valores poderá
afetar um grupo muito grande de pessoas e a si mesmos.
Por todo mundo, existe a preocupação com o grande crescimento da violência
motivada muitas vezes pelos inúmeros problemas sociais e pelo desrespeito mútuo
entre os seres humanos. Dentro desse quadro, faz-se necessária a reflexão acerca
de como transformar o mundo em um lugar melhor para se viver. O exercício de
valores é o meio disponível para promover uma forma mais profunda e harmoniosa
de mudança e desenvolvimento humano.
Os valores não permitem que fiquemos indiferentes com o que acontece ao nosso
redor. Aquilo que entendemos como sendo belo ou feio, alegre ou triste, o que
53
repreendemos ou aceitamos como sendo comportamento aceitável ou não, por
exemplo, faz parte do que valoramos ou não em nossas vidas.
Uma das nossas propostas ao produzir esse material é refletir como esses valores
podem ser trabalhados nas animações de Disney em vários contextos, dependendo
do profissional que utilizará o material.
Passamos então para os valores que serão discutidos nas animações das três
princesas citadas neste estudo. Da desobediência mesclada à submissão e
aceitação de Aurora à segurança e determinação de Tiana, em “A Princesa e o
Sapo”, e à lealdade de Rapunzel.
Lembramos ainda que os valores destacados podem ser diferenciados, dependendo
do contexto social onde se encontram. Conforme citado anteriormente, alguns
valores podem ser positivos para algumas pessoas e negativos para outras. Não nos
cabe aqui avaliar ou julgar a postura das pessoas diante dos valores ou sua
importância.
3.2. Generosidade, desobediência e coragem: Aurora, um modelo de beleza em 1959.
A Bela Adormecida
No longa-metragem “A Bela Adormecida”, conhecemos a princesa Aurora. Na
animação, baseada no conto de fadas dos Irmãos Grimm, conforme citamos no
capítulo 1, a princesa ao nascer recebe a visita das três fadas madrinhas que lhe
trazem presentes em forma de Magia. A primeira fada madrinha, Flora, lhe oferece o
dom da beleza; a segunda fada madrinha, o dom da voz; e, antes da terceira fada
madrinha, a festa é interrompida por Malévola, a bruxa do reino que não havia sido
convidada. Ela amaldiçoa Aurora com o feitiço de morte, que aconteceria quando a
princesa completasse 16 anos, ao picar o dedo em um fuso. A terceira fada,
54
Primavera, não consegue quebrar o feitiço de Malévola, mas atenua com o desejo
de que a princesa apenas caia em sono profundo, que deverá ser quebrado com
“um beijo doce e verdadeiro do amor”.
O longa-metragem foi produzido pela Walt Disney Pictures, com direção de Eric
Larson e lançado no Brasil em 06 de fevereiro de 1959. Em 2008, lançaram o DVD –
Edição Platinum, com comentários e músicas, de onde retiramos várias informações
para este trabalho.
A história produzida para o cinema tem um tom de romantismo muito mais
acentuado que no conto de fadas reescrito pelos Irmãos Grimm. No conto
verificamos que os dons oferecidos pelas onze fadas deram à princesa sabedoria,
gentileza, graciosidade, virtude, beleza, bom comportamento, que lhe fazia querida
por todos. Na animação, esses dons ficam explícitos através da própria imagem de
Aurora e seu comportamento com as pessoas e com os animais, característico dos
filmes de princesas da Disney. Até o príncipe Filipe recebe o “Escudo da Verdade” e
a “Espada da Esperança” das fadas para salvar a princesa Aurora, que havia
conhecido anteriormente no bosque. O momento de luta do príncipe com o dragão,
Malévola transformada, mostra sua bravura, coragem e determinação. No entanto, o
estudo em pauta é do personagem de Aurora, que para compreendermos melhor,
necessitamos analisar o contexto onde a história se desenvolve, assim como os
personagens que interagem com a princesa.
As fadas são consideradas mulheres sábias, feiticeiras ou curandeiras, dotadas de
grande experiência13
A princesa Aurora conserva todas as características de uma “boa moça” para a
época de sua produção, que iniciou em 1950, para ser lançado apenas em 1959,
período em que Disney dedicou-se também à construção da Disneylândia e aos
. As três fadas madrinhas da animação “A Bela Adormecida”
não são diferentes, no entanto, encantam o público na própria criação artística das
senhoras doces, gentis e um pouco atrapalhadas, o que dá o tom de humor à
animação. Elas cuidam de Aurora no bosque, longe do palácio do rei, para que
ninguém desconfie, mas são pegas justamente nas suas atrapalhadas disputas
mágicas, quando o corvo de Malévola sobrevoa o bosque e presencia a bagunça
das três fadinhas desajeitadas.
13 Em “O feminino nos contos de fadas”, Marie-Louise Von Franz, considera as fadas como “velhas mulheres sábias e cheias de experiência, um pouco feiticeiras e curandeiras, que presidem aos partos.”(FRANZ, 2010: pág.29).
55
programas de TV. Foi a primeira princesa com nome próprio diferente do título da
animação (A Bela Adormecida), como acontece nas outras animações, onde o título
do conto recebeu o mesmo nome da princesa, como é o caso de Cinderela ou
Branca de Neve.
Apesar de toda doçura e gentileza e mostrando-se sempre obediente às fadas
madrinhas, após conhecer o príncipe Filipe, Aurora realiza seu primeiro
comportamento de desobediência, enganando as fadas e fugindo para encontrar-se
com o príncipe. Após uma crise, onde ela não aceita a ideia de ser uma princesa e
não poder mais encontrar-se com o rapaz que conheceu no bosque, notamos traços
de coragem, curiosidade e determinação quando ela sobe a uma torre do palácio e
espeta o dedo em um fuso, outro momento de desobediência que leva a princesa ao
sono profundo. No conto de fadas, todos do palácio adormecem com a princesa e
acordam apenas após 100 anos, período em que o local fica coberto por espinhos,
matando todos os que tentam entrar para salvar a princesa. Já na animação são as
fadas madrinhas que lançam uma magia e adormecem todos do palácio, que
acordam apenas após o beijo do amor que desperta a bela Aurora. Esse
comportamento de desobediência e ao mesmo tempo determinação é reconhecido
também no príncipe ao discutir com seu pai sobre a moça, talvez camponesa, que
ele havia conhecido no bosque, pois Filipe já estava prometido em casamento para a
princesa Aurora. Para surpresa dos reis, príncipe Filipe e princesa Aurora surgem e
se casam, concretizando o esperado por todos.
As mudanças ocorridas no comportamento feminino ao longo dos séculos foram
crescentes e sustentados por transformações sociais. No ano em que a animação “A
Bela Adormecida” foi lançada no Brasil, a mulher passava por alguns desafios diante
dessas transformações. Após a Segunda Guerra, nos períodos de prosperidade e
grande diversificação de consumo, o cinema se tornou vitrine para exibição dos
novos materiais, objetos utilitários e equipamentos de conforto e decoração
doméstica. Os cenários passam também a ditar os estilos, objetos e arranjos
obrigatórios para os interiores das casas. (SEVCENKO, 1998) Da mesma forma, a
imagem da mulher sofre a influência do mercado capitalista, surgindo então a
“estrela do cinema”, desta vez como resposta a uma necessidade social de consumo
cada vez mais crescente.
56
É importante ressaltar que, antes da produção capitalista, as produções
cinematográficas eram privadas desse luxo chamado “estrela”. De acordo com o
sociólogo francês Edgar Morin (MORIN, 1989), em seu primeiro estágio industrial e
comercial, o cinema ignorava a estrela. “A estrela de cinema nasceu em 1910, por
força da concorrência acirrada entre as primeiras empresas cinematográficas
americanas. Ela se desenvolveu ao mesmo tempo em que a concentração de capital
na indústria dos filmes, e essas duas evoluções se aceleraram mutuamente.”
(MORIN, 1989).
Aproximadamente na década de 50, foi criado o star system, uma instituição própria
ao grande capitalismo, responsável pela criação da estrela de cinema como
mercadoria. A estrela passa a ter seu preço, não é mais um sujeito, mas um objeto
da publicidade, representando perfumes, sabonetes, roupas, cigarros etc.,
multiplicando sua utilidade comercial. Ela é um produto específico da civilização
capitalista e responde as necessidades do ser humano no estágio da civilização
capitalista do século XX. (MORIN, 1989)
Nesse período, concomitante ao avanço do consumo capitalista, os tecidos e
cosméticos também começaram a ficar em alta e grandes empresas se destacaram,
inclusive trazendo filiais para o Brasil, como foi o caso da Avon e da L’Oréal,
empresas renomadas de cosméticos até os dias atuais.
Após a Segunda Guerra, a boneca Barbie também simboliza a euforia de consumo
de massa. Foi trazida pela primeira vez ao Brasil em 1959, como mais um modelo de
beleza feminina, principalmente, que atingia as meninas, assim como a animação “A
Bela Adormecida”, através do papel da princesa Aurora.
1ª linha de Barbies vendidas no Brasil em 1959
57
As misses e candidatas apresentavam siluetas semelhantes a personagem e a
boneca. Dois grandes símbolos de beleza da época, produtos do star system, eram
Marilyn Monroe e Brigitte Bardot, uma mistura de ingenuidade e sensualidade,
presentes também no personagem da princesa Aurora.
Misses Brasil em 1958, 1959, 1960 e 1961
Em nossas pesquisas, encontramos semelhanças nos traços de beleza da princesa
Aurora com as atrizes consideradas símbolos de beleza na época, com as misses e
também com a boneca Barbie. Ao mesmo tempo, Aurora conservava a doçura,
amabilidade e uma sutil submissão ao príncipe e aos acontecimentos de sua vida na
história, preservando o fato principal do enredo: esperar pelo final feliz ao ser salva
pelo príncipe encantado. Nessa época magistral de culto à beleza, produzida
principalmente pela indústria cinematográfica, uma animação não poderia retratar
melhor outro papel para a mulher senão o representado através da princesa Aurora.
Marilyn Monroe Brigitte Bardot
58
Princesa Aurora
Nesse sentido, podemos destacar os valores mais relacionados a um aspecto que,
para a época, era importante principalmente por haver um interesse político e
totalmente capitalista envolvido, mas, se analisados nos tempos atuais, podem levar
a uma análise crítica do que realmente é importante para mulher ou não, mas essa
proposta será analisada no capítulo 4.
Passaremos para mais uma princesa, a Tiana em “A Princesa e o Sapo”, que trouxe
contribuições significativas para o mundo cinematográfico, conforme analisamos no
capítulo anterior.
59
3.3. Auto realização, crença, teimosia e segurança: Tiana, a realização de um sonho.
Tiana – A Princesa e o Sapo
A produção da animação “A princesa e o Sapo” foi baseada no conto dos Irmãos
Grimm “O Príncipe Sapo”. No entanto, no conto o sapo se transforma em príncipe,
fato que não acontece no longa-metragem, quando uma jovem de classe baixa
transforma-se em sapa ao beijar um sapo.
O longa-metragem “A Princesa e o Sapo” foi produzido pela Walt Disney Animation
Studios, lançado em 2009 com a direção de John Musker e Ron Clements. A história
ocorre na década de 20 em Nova Orleans, em meio a “Era do Jazz”, e nos pântanos
de Louisiana, quando transformados em sapo, Tiana e o príncipe Naveen saem em
uma aventura à procura de Mama Odie, uma fada madrinha cega de 197 anos, que
pode livrá-los do feitiço.(EGGLESTON, 2009)
Nessa animação o papel da princesa é bem diferente. Tiana é uma jovem afro-
americana de 19 anos, talentosa, atraente, independente, esforçada, que não
acredita em contos de fadas, mas recebe, principalmente do pai, James, a herança
de nunca desistir de um sonho e de trabalhar bastante para alcançá-lo.
A mãe, Eudora, é protetora e preocupa-se com a filha que trabalha apenas em
busca de atingir seu principal objetivo: abrir um restaurante em Nova Orleans.
Eudora é costureira e sua melhor cliente é Charlotte La Bouff, uma romântica e
mimada moça que sonha com o príncipe dos contos de fadas. É interessante esse
contraponto entre Tiana e Charlotte, a moça de origem humilde, pobre, que busca
um sonho e sua amiga, uma garota que tem tudo, vários vestidos, um pai (La Bouff),
considerado o homem mais rico da cidade, mas que não tem um objetivo de vida, ou
60
melhor, seu sonho é casar-se com um príncipe, o que na época em que a história
acontece ainda era um fato bastante corriqueiro entre as garotas. No entanto, em
2009, observamos que as garotas se espelham muito mais no papel desbravador de
Tiana, acreditam em um sonho e lutam por ele, mas também existem outras à
procura de um príncipe encantado. Não é o caso, nesse estudo, de analisarmos e
muito menos julgarmos quais os papéis mais interessantes.
Tiana em “A Princesa e o Sapo”
A animação “A Princesa e o Sapo” marca o retorno da criação de animação feita à
mão e investe no romantismo e no humor através de personagens engraçados como
Ray, o vagalume; Louis, o jacaré apaixonado por jazz; Lawrence, o criado
atrapalhado do príncipe; e o vilão, Doutor Facilier, um advogado ambicioso, que usa
de magia negra para espalhar corrupção e enganar as pessoas. O príncipe Naveen
é um jovem sem responsabilidade, de um local distante chamado Maldônia e que
tem por objetivo se dar bem através de um casamento milionário. No entanto, é
como sapo que conhece melhor seus princípios, reconhecendo valores que estavam
amortecidos.
Ray e Louis
Na animação “A Princesa e o Sapo”, o papel da mulher na década de 20 é
representado pela personagem principal, Tiana. Nessa animação a princesa tem um
61
papel que fundamenta o desenvolvimento da mulher na sociedade ocidental. Inicia
como uma moça que está em busca da realização pessoal de um sonho, que investe
em seu trabalho e acredita em suas habilidades. Desde o início da história notamos
que sua criação interferiu muito na forma de ver o mundo e entender que atingir seu
objetivo depende muito mais dela mesma. Até a mensagem deixada pelo pai, que a
boa comida une as pessoas, transmite a mensagem do acolhimento e compromisso
com seus desejos. O fato de tornar-se princesa é uma consequência do que
acontece em sua vida, quando encontra o príncipe sapo, e mesmo com a influência
de sua amiga Charlotte, que sonha com o príncipe desde pequena, Tiana não
abandona seu objetivo, encarando os obstáculos e lutando para atingi-lo.
O ritmo das mudanças ocorridas com as mulheres nas três primeiras décadas do
século XX incomodavam muito os conservadores, que acreditavam que a mulher
deveria cuidar do lar. No entanto, era comum ver moças andando pelas cidades,
trabalhando para abastecer o lar e suprir suas necessidades. Não faltavam vozes,
inclusive matérias em revistas da época, para debaterem sobre o papel da mulher,
dentro de um clima de inconformismo feminino, tocado pela imagem depreciativa
com que as mulheres eram vistas e que lhes restringia às atividades econômicas e
políticas. De um lado, a mulher lutava pelos seus direitos e liberdade e, de outro, os
conservadores, através de um discurso ideológico, determinavam o tipo de
comportamento feminino que eles acreditavam como adequados para sociedade. No
entanto, a diversidade de trabalhos realizados pelas mulheres pode ser constatada
nas diferentes imagens veiculadas neste período e, mesmo assim, esperava-se que,
antes de dedicar-se ao trabalho remunerado, a mulher deveria ser boa dona de
casa14
14 A boa dona de casa era considerada a mulher que cuidava da casa, do marido e dos filhos com economia, fazendo o marido prosperar. Além disso, era considerada a postura amável diante da sociedade e submissa ao marido.
, mãe e esposa. Além disso, a década também é marcada por uma
reestruturação dos papéis que são atribuídos social e culturalmente a homens e
mulheres. A mulher dessa década tem novos hábitos, comportamentos e maneiras,
influenciadas pelas mudanças do período. De 1920 a 1924, as mulheres que
aparecem nas revistas são aquelas que praticam esportes, que são vistas pelas
avenidas da cidade, que vão aos bailes elegantes e que participam da vida social da
cidade.
62
A personagem do longa-metragem “A Princesa e o Sapo”, Tiana, representa essa
mulher que trabalha e defende seus direitos. Por outro lado, encontramos também a
personagem Charlotte, que traduz a moça rica, dona de muitos vestidos, que sonha
com o casamento com um príncipe, representando também a mulher burguesa da
época.
Os valores fazem parte de todo o contexto da história e estão presentes em vários
momentos. O papel que a personagem transmite não é mais da princesa em busca
de um casamento, de um príncipe. O sonho é outro e está focado na
autorrealização. Nas várias formas de comunicação presentes na atualidade
podemos notar o quanto o papel da mulher foi se transformando, sendo valorizado
desde sua formação e compromisso com seu trabalho. Hoje as “mocinhas”
destacadas em programas de TV, filmes e livros são verdadeiras heroínas, que
salvam até uma comunidade inteira. É esse novo papel que encanta as meninas e
meninos atualmente. As animações produzidas por Disney desde o final dos anos 80
criam heroínas mais aventureiras, que realizam coisas que as princesas dos
clássicos, como “Branca de Neve”, “Cinderela” e mesmo “A Bela Adormecida” ainda
não pensavam em fazer. Hoje as princesas se rebelam contra os pais, madrastas,
ordem social, com muito mais convicção e diante desse contexto atual que
continuaremos destacando o papel das personagens femininas analisando então o
papel de Rapunzel em “Enrolados”.
63
3.4. Força, ousadia, obediência: Rapunzel, a princesa perdida.
Rapunzel em “Enrolados”
Rapunzel é a 10ª princesa da Disney e a primeira gerada por computação. Bem
diferente da princesa dos contos de fadas dos Irmãos Grimm, Rapunzel não faz o
papel da princesa indefesa esperando que alguém a salve. Em Enrolados ela sabe
defender sua torre com a força e agilidade de seus cabelos mágicos.
Enrolados é a 50ª animação produzida pela Walt Disney Pictures, lançado nos
cinemas americanos em novembro de 2010 e no Brasil em Janeiro de 2011. Tem
direção de Byron Howard e Nathan Greno. Após sua produção, sofreu uma mudança
de nome, o nome original seria “Rapunzel”, no entanto seus produtores não queriam
que a animação desse a ideia de mais uma história de princesa, dissuadindo os
meninos de assistí-la (CARPENTER, 2010). Mesmo porque, em Enrolados, a
princesa Rapunzel não é a única protagonista. A animação conta com Flynn Rider,
um bandido procurado por todo reino, destemido, confiante, um admirador de si
mesmo. O camaleão Pascal e o cavalo capitão da guarda real, Maximus, também
apresentam uma atuação significativa durante toda história, contribuindo para o lado
emocionante e humorístico, dando um sentido mais de aventura do que de romance.
64
Pascal Maximus
A mãe Gothel é a vilã da história. Rouba Rapunzel do berço quando bebê para
usufruir de seu cabelo mágico que tem o poder do rejuvenescimento. Tranca a
menina em uma torre e cria Rapunzel como sua filha. Ela é controladora,
manipuladora, superprotetora e interage com Rapunzel quase sempre colocando
medo e controlando a garota por meio de um amor possessivo. Na música “Sua mãe
sabe mais”15
Diante de toda essa pressão exercida pela mãe, Rapunzel, quando decide sair da
torre, utilizando Flynn Rider como refém, entra em um conflito constante entre a
vontade de ir atrás de seu sonho e a culpa por ter desobedecido a sua mãe. Ao
mesmo tempo, desde o início da animação fica claro o desejo de Rapunzel por
conhecer outras realidades e principalmente ver de perto as luzes que soltam todos
os anos no dia do seu aniversário.
, notamos a presença desses pontos de controle. Quando pela primeira
vez Rapunzel diz que não vai voltar para torre, a mãe Gothel se revolta e mostra sua
verdadeira personalidade e interesse.
Rapunzel e Flynn Rider
A trilha sonora da animação, composta por Alan Menken, revela muito da história e
das emoções, principalmente para a personagem Rapunzel, que, logo no início do
15 “Mother knows Best”, música composta por Alan Menken com letra de Glenn Slater, na voz de Donna Murphy.
65
filme, canta a música “Quando a minha vida vai começar”16
Até o bandido Flynn Rider tenta dissuadir Rapunzel de seu sonho. Quando ele
percebe que ela nunca havia saído da torre, a leva a um bar de bandidos, bárbaros,
mercenários para que se assuste. Com seu jeito doce e aventureiro, Rapunzel conta
sobre seu sonho e convence os bárbaros a ficarem do seu lado. No final, ajudam
Rider a sair da prisão e salvar Rapunzel.
indicando o quanto ela
está cansada da vida que leva, fazendo todos os dias as mesmas coisas, mostrando
uma rotina desinteressante, ainda mais para uma jovem de 18 anos que anseia por
conhecer o mundo.
Enrolados
Mesmo no momento do salvamento, é Rapunzel quem toma a atitude de salvar
Rider. Mais uma mudança significativa, já que em todos os contos de fadas é o
príncipe que salva a princesa. Nesse caso, ela oferece sua vida em troca de poder
salvar Rider de um ferimento a faca, feito pela malvada Gothel. Quando chega perto
de Rider, ele corta o cabelo de Rapunzel, livrando-a do feitiço. Interessante notar
que nesta animação, a princesa retorna ao lar, junto com o rei e a rainha, mas a
história não termina com o casamento de Rapunzel e Flynn Rider.
São inúmeros os valores que podemos identificar nessa animação em todos os
personagens, sendo os mais fortes em Rapunzel, Flynn Rider e mãe Gothel. No
entanto, os valores que podem ser transmitidos ao público através da personagem
Rapunzel referem-se socialmente à valentia, crença em um sonho, amizade,
companheirismo, lealdade, força e determinação.
Conforme citado anteriormente o papel da mulher sofreu transformações sociais
relevantes no que se refere à sua inserção na sociedade, principalmente com as
mudanças das últimas décadas (SILVA, 2007). Atualmente, existem muitas mulheres
profissionalmente ativas, independentes, ocupando cargos de poder, em nosso país, 16 When Will Life Begin, composição Alan Menken e letra de Glenn Slater, cantada por Mandy Moore.
66
assim como em várias partes do mundo. “A identidade social da mulher, assim como
a do homem, é construída através da atribuição de distintos papéis, que a sociedade
espera ver cumpridos pelas diferentes categorias de sexo. A sociedade delimita,
com bastante precisão, os campos em que pode operar a mulher, da mesma forma
como escolhe os terrenos em que pode atuar o homem”. (SILVA, 2007: 181)
As possibilidades da produção de um trabalho com o cinema são muitas.Dentro
deste mundo midiático, destacamos as animações que serão foco do próximo
capítulo, onde produzimos uma proposta para identificação dos valores nas
animações analisadas até o momento.
67
4. Proposta de uma metodologia para identificação de valores e tecnologias empregadas nas animações de princesas produzidas pela Walt Disney Pictures. Conforme analisamos no capítulo 3, desde o nascimento estabelecemos relações
com as pessoas ao nosso redor, construindo uma imagem de si. É um processo
crescente e contínuo de diferenciação que se torna mais abrangente à medida que a
pessoa vai se conscientizando da influência que exerce na vida das pessoas e que
recebe em sua construção pessoal. A identidade de um indivíduo se estrutura e
reestrutura a partir da relação com o outro.
Para a formação da identidade é necessário considerar o conhecimento e a
construção dos valores, que permeiam a sociedade em que o indivíduo vive. Esses
vão se constituindo no decorrer de sua vida, através das relações que estabelece
com os outros e também de acordo com o grupo social que pertence. No entanto,
para promover valores não bastam exposições teóricas: o ser humano precisa de
atividades que, gradativamente, se tornam hábitos definitivos de conduta, isto é,
convicções que orientam e conduzem o comportamento humano.
O conhecimento dos valores ainda não assegura sua prática. Por exemplo, o uso da
expressão “eu te amo” não significa que essa pessoa tenha atitudes que preencham
os requisitos do amor como um valor, que a levem a dar tudo de si pela pessoa
amada. Esse é um conceito que necessariamente precisa ser vivenciado e
construído através de experiências que a própria pessoa considere significativas
para ela e que lhe deem algum resultado que mostre que sua atitude teve uma
reação positiva.
Da mesma forma consideramos os contravalores, que são as atitudes que geram
comportamentos indesejáveis. Também precisa ser considerada dentro de um
âmbito social: uma atitude pode ser positiva dentro de uma sociedade e negativa
para outra, tudo depende dos valores sociais que foram sendo constituídos pelo
grupo. Nesse trabalho consideramos a sociedade ocidental, com os costumes,
crenças e valores que foram sendo desenvolvidos e criados ao longo de um período,
que representaram o papel da mulher na sociedade e que podem ser identificados
nas animações de princesas analisadas nesse trabalho: princesa Aurora, em “A Bela
Adormecida”; Tiana, em “A Princesa e o Sapo; Rapunzel, em “Enrolados”.
68
O papel da mulher foi sendo socialmente construído, assim como a discriminação.
Não é difícil observar que homens e mulheres ainda não ocupam posições de
igualdade na sociedade brasileira. No entanto, muitas foram as mudanças ocorridas
nas últimas décadas no que se refere à inserção da mulher na sociedade. Conforme
estudamos, a ascensão social da mulher iniciou antes da década de 20 e desde
então passou por um processo contínuo de conquistas sempre crescentes, mesmo
com as críticas sociais. O papel da mulher mudou muito e, de acordo com as
análises fílmicas realizadas nesse estudo, percebemos uma das formas que essas
transformações foram influenciando o público, principalmente o público feminino
infantil e, dentro de um contexto social capitalista, refere-se às produções
cinematográficas, que nesse trabalho, visam as animações de princesas de Walt
Disney. Facilmente podemos notar essa influência na quantidade de produtos de
consumo com as personagens das princesas Disney e que são, até os dias atuais,
preferidas pelas garotas. No entanto, não pretendemos entrar neste estudo da
indústria dos produtos Disney, apenas citamos como exemplo para salientar a
provável importância dessa proposta de identificação cinematográfica, dependendo
do profissional que poderá utilizá-la.
O estudo do conteúdo das animações produzidas por Walt Disney, que foram
baseadas em contos de fadas dos Irmãos Grimm, permite-nos considerar diversas
categorias de abordagem, tais como: trabalho doméstico; machismo; sexualidade;
relações de gênero e casamento; virtudes, como: coragem; autoconhecimento e
autorrealização. A criação de uma proposta metodológica de identificação de
valores, nessas animações, permite potencializar a aquisição de conhecimentos e de
novas ferramentas para análise crítica e reflexiva da produção fílmica realizada no
âmbito das animações. Para tanto, devemos somar a essa proposta a análise do uso
da tecnologia nas animações também como um processo de crescentes
descobertas, disponibilizando, assim, mais uma ferramenta para ampliação dos
conhecimentos sobre o cinema de animação.
São múltiplas as perspectivas ou pontos de vista a partir dos quais se pode ver uma
animação, e consideramos essa uma tarefa interminável. Portanto, pretendemos que
este estudo possa contribuir para o trabalho de estudiosos da área, pesquisadores,
professores, profissionais de marketing e relações humanas, animadores e outros
69
relacionados à área da comunicação. Esperamos também que colaborem com esse
estudo, produzindo desdobramentos relacionados às diversas áreas de atuação.
Ao propormos uma metodologia de identificação de valores e uso da tecnologia nas
animações, pretendemos também o aprofundamento nos conhecimentos sobre o os
contos de fadas dos Irmãos Grimm, a criação do cinema da animação, o uso de
tecnologia e o estudo do desenvolvimento do papel da mulher na sociedade
capitalista, conforme citados nos capítulos anteriores.
O trabalho aqui apresentado propõe uma abordagem metodológica que se configura
a partir de cinco dimensões fundamentais. A primeira é de caráter mais informativo e
interpretativo, que fornece informações sobre a história do conto de fadas e o
acontecimento principal. É este acontecimento que vai dar origem ao enredo do
conto e à interpretação do leitor. A segunda dimensão dessa proposta refere-se a
um componente mais exemplificativo. É quando o expectador assiste às animações
sugeridas, que são baseadas nos contos de fadas dos Irmãos Grimm, lidos e
refletidos anteriormente. Nessa etapa, o expectador também analisa a animação,
identificando o acontecimento principal. A terceira dimensão fornece informações
sobre o contexto social e onde a animação ocorre. Nessa fase é interessante que o
expectador relacione a história da animação com a realidade social do ano em que
ocorre a história e também do ano de seu lançamento. A quarta dimensão sugere
uma análise da tecnologia empregada na animação, realizando um parâmetro com o
avanço da tecnologia na época e as escolhas dos animadores. A quinta e última
dimensão refere-se ao desdobramento no papel da personagem principal, no caso a
princesa, e os valores que apresentam em sua interpretação e que podem ser
transmitidos ao público. Nesta etapa da proposta, é interessante a análise da
personagem principal e sua relação de amizade ou conflito com os outros
personagens da animação. Nesse ponto, faz-se necessário o conhecimento de cada
personagem e levantamento de suas características e valores, assim como acontece
com a princesa, personagem principal nesse estudo.
Com a finalidade de exemplificar este estudo e a proposta de identificação de
valores e avanços tecnológicos, analisamos as animações aqui estudadas,
enfatizando alguns pontos principais. Conforme citado anteriormente, este estudo
sugere desdobramentos e muitos outros trabalhos. Passamos então ao estudo das
animações: “A Bela Adormecida”, “A Princesa e o Sapo” e “Enrolados”. Lembramos
70
ainda que a análise dos avanços tecnológicos de cada animação foi estudada no
capítulo 2. Portanto, enfatizaremos aqui a identificação dos valores em cada
animação, focando no papel de cada princesa.
Ao analisarmos o longa-metragem “A Bela Adormecida” podemos considerar alguns
valores destinados ao personagem principal, princesa Aurora, pertinentes a época
em que a animação foi lançada. Dentro de um período pós-Segunda Guerra, onde
as indústrias de tecidos, cosméticos e afins estavam no auge de sua produção e
investimento, a criação de um “modelo feminino” que atendesse as expectativas das
consumidoras e que fosse ao encontro do que as empresas estavam precisando no
momento casou perfeitamente com o papel produzido para animação da Disney.
Uma jovem meiga, linda, com bom comportamento, que espera pelo beijo do amor
verdadeiro e apenas desobedece a suas fadas madrinhas para encontrar o príncipe.
Identificamos alguns valores que podem ser transmitidos às jovens da época (1959),
aliados ao lançamento da boneca “Barbie”, considerada também o modelo de
“mulher perfeita”. Essa é uma visão machista do modelo feminino, a mulher criada
para satisfazer os desejos dos homens, ou pelo menos de alguns deles.
Nesse contexto social, de 1959, de acordo com a animação “A Bela Adormecida”,
identificamos valores importantes para a época, que atualmente podem ser
considerados equivocados, mas que eram significativos no momento.
Ao longo do tempo o papel da mulher foi se modificando, assim como a forma de ver
o mundo, suas vontades, desejos e atitudes. Em todas as culturas, no decorrer de
toda história, é notório o poder atribuído ao homem. No entanto, em quase todas as
épocas, de acordo com o contexto histórico, sociopolítico e econômico, esse fato foi
sendo questionado. Evidentemente, esses questionamentos que levaram a alguns
movimentos, nem sempre foram vitoriosos, mas impulsionaram o que hoje
vivenciamos como conquistas obtidas pelas mulheres, em favor de seus direitos.
(SILVA, 2007)
Quando Disney lança “A Princesa e o Sapo”, em 2009, o papel da mulher já era
diferente daquele visto em “A Bela Adormecida”, no papel da princesa Aurora. Tiana
já não estava à espera de um príncipe, aliás, nem ela era uma princesa, mas uma
moça simples em busca da realização de um sonho, que se transforma em princesa
após beijar um príncipe sapo. Dentro desse novo contexto, identificamos valores
pertinentes à época em que a animação foi lançada que são coerentes com a
71
atuação da mulher em 2009 e também com as transformações sociais no papel da
mulher em 1920, época em que a animação ocorre17
Não analisamos neste trabalho o movimento feminista, mas vale ressaltar que
muitas mulheres em nossa história servem de exemplo até hoje. O feminismo pode
ser entendido como um movimento de ideias e uma história de conquistas em uma
longa trajetória que vem sendo constituída. Dentro do que propõe esse trabalho, é
necessário citar a questão da coragem de algumas mulheres de irem à busca de
alternativas capazes de recuperar sua autoestima, abrindo novas perspectivas de
existência.
. Da mesma forma, podemos
identificar valores semelhantes na animação “Enrolados”, onde Rapunzel também
vai atrás de um sonho e não mais do príncipe encantado.
No processo de identificação de valores na animação “A Princesa e o Sapo”,
podemos destacar a coragem da personagem Tiana em enfrentar várias situações
para alcançar um objetivo e da influência que suas atitudes exercem no príncipe
Naveen, que desde o início da história mostra-se um príncipe sem responsabilidade,
que queria “se dar bem”, mas acabou caindo em uma armadilha, que o transformou
em um sapo, fato gerador de todo enredo.
Identificar valores através do uso das animações, no caso, valores femininos, já que
tratamos aqui de animações de três princesas, é um caminho de reflexão pessoal e
pode ser utilizado em vários momentos, como: dinâmicas em grupo, conhecimento
pessoal ou estratégias de marketing, por exemplo. No entanto, é importante ressaltar
o uso da animação como mais um recurso de destaque para o trabalho com valores.
Observamos neste trabalho apenas uma fatia das possibilidades do trabalho na
identificação de valores.
Dentro do mundo imaginário das animações, podemos identificar os valores em
vários momentos e das mais variadas formas, nos personagens principais e nos
personagens de apoio. Em “Enrolados” identificamos na princesa Rapunzel valores
como: força, determinação, coragem, lealdade. No entanto, encontramos em sua
mascote, o camaleão Pascal, um grande impulsionador desses valores. Pascal
aparece na animação como o principal amigo de Rapunzel, na figura de conselheiro
e treinador. 17 O longa-metragem A Princesa e o Sapo ocorre na década de 20 em Nova Orleans, Sul dos EUA. No entanto, verificamos na história que as transformações sociais chegaram ao Brasil na mesma época, influenciando o papel da mulher brasileira.
72
O que dizer então do fiel capitão da guarda real, o imponente cavalo Maximus, que
no longa-metragem “Enrolados” desempenha um papel de determinação, valentia,
coragem, enfrentando todos os desafios para ir à busca de Flynn Rider, o bandido
mais temido do reino. Maximus entra em locais e situações que nem os guardas
reais conseguem atingir. Evidentemente, consideramos que no mundo da animação
tudo é possível, mágico e imaginário, mas o papel de Maximus transmite valores
importantes, principalmente relacionados à lealdade e amizade.
Nos contravalores, identificamos o mocinho da história, o bandido Flynn Rider, que
diferente das outras animações não inicia a trama como o príncipe que vai salvar a
princesa na torre, mas como o bandido que fica refém da princesa. Flynn guarda
todas as questões relacionadas aos contravalores, que também podem ser
identificados e trabalhados como um contraponto dos valores levantados na princesa
e demais personagens.
Não nos cabe aqui relacionar todos os personagens das animações analisadas, mas
apenas exemplificarmos as possibilidades do trabalho de identificação de valores
nas animações.
Na formação de um grupo de trabalho ou estudo, essa metodologia poderá ser
importante, já que nesse momento identificamos um perfil diferente para cada
pessoa do grupo, que são necessários para formação do todo.
Os valores estão presentes na vida das pessoas e podem ou não ser identificados.
Sua identificação pode auxiliar na formação de um grupo ou na reflexão pessoal,
dependendo da proposta de quem utilizar essa metodologia.
Da mesma forma, a identificação do uso da tecnologia nas animações de princesas
possibilita ao expectador conhecer os avanços tecnológicos, explorando as
possibilidades de utilização em outros contextos, já que registramos em nossos
estudos e reportagens que os filmes tornaram-se fontes documentais importantes
para uma enorme quantidade e diversidade de problemas e de fenômenos sociais e
culturais para se estudar, analisar e debater.
73
5. CONCLUSÂO Os contos de fadas fazem parte do contexto social de muitos anos atrás e estão
presentes em vários momentos de nossas vidas desde a infância. Pensando em
expandir sua área de atuação, dentro do cinema de animação, Walter Elias Disney,
o conhecido animador e empresário Walt Disney, investiu na produção de longas-
metragens baseados em contos de fadas. Quebrando paradigmas e enfrentando
barreiras e críticas, iniciou seu investimento com “Branca de Neve e os sete anões”,
em 1937.
Este longa metragem de Disney, além de outros, contribuíram significativamente
para o desenvolvimento e avanço das técnicas de animação, organizando o
processo de trabalho e as etapas na linha de produção, que acabaram se tornando
um padrão para toda indústria cinematográfica de animações.
Com a criação dos computadores, as técnicas foram ainda mais aprimoradas e
surge a Pixar, empresa responsável por produzir animações através do uso da
tecnologia, as animações computadorizadas. Em parceria com Disney, muitas
produções foram (e são) realizadas ao longo da história do cinema.
Analisando várias das produções da Walt Disney Pictures, observamos o quanto os
personagens realmente criam vida nas telas. A tecnologia desempenha um papel
fundamental nos processos narrativos, pois possibilita que os personagens sejam
apresentados de forma cada vez mais real e cativante. Os personagens das
animações de Disney envolvem o público e são exemplos, muitas vezes, para as
crianças, jovens e adultos de todo mundo, que buscam por acessórios, roupas e
brinquedos desses personagens. Certamente o mercado industrial cresce cada vez
mais através da industrialização dos personagens dos desenhos animados de
Disney, desde o famoso Mickey Mouse.
Pensando na possibilidade de produção dos longas-metragens de Disney,
destacamos a importância de utilizar alguns deles para criação de uma metodologia
para identificação de valores e o uso da tecnologia. Focamos neste trabalho três
longas-metragens de princesas da Disney, onde não apenas o papel das
protagonistas poderá ser analisado, mas dos personagens que aparecem nas
histórias.
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Como os valores vão sendo construídos ao longo da vida do seu humano, em vários
contextos, assim como o desenvolvimento da tecnologia apresenta um constante
desenvolvimento, a aplicação dessa metodologia não tem local específico e nem
mesmo idade. Poderá ser utilizada para crianças em escolas, para jovem em igrejas,
em empresas com executivos ou em processos de seleção, mas estas são apenas
algumas ideias do que as animações Disney já contribuíram e ainda podem
contribuir para o trabalho em várias fases do conhecimento humano e
transformações sociais. A proposta metodológica desenvolvida nesse estudo visa
fornecer um estudo matriarcal de análise e de interpretação das animações de
princesas de Walt Disney ou outras animações, facilitando a aquisição de novas
competências de leitura e de interpretação fílmica, potencializando a construção
reflexiva, crítica e colaborativa de conhecimento a um universo grande de
utilizadores.
75
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