impactes das barragens nos regimes fluviais: comparação

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A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis, UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos. Conforme exposto nos referidos Termos e Condições de Uso, o descarregamento de títulos de acesso restrito requer uma licença válida de autorização devendo o utilizador aceder ao(s) documento(s) a partir de um endereço de IP da instituição detentora da supramencionada licença. Ao utilizador é apenas permitido o descarregamento para uso pessoal, pelo que o emprego do(s) título(s) descarregado(s) para outro fim, designadamente comercial, carece de autorização do respetivo autor ou editor da obra. Na medida em que todas as obras da UC Digitalis se encontram protegidas pelo Código do Direito de Autor e Direitos Conexos e demais legislação aplicável, toda a cópia, parcial ou total, deste documento, nos casos em que é legalmente admitida, deverá conter ou fazer-se acompanhar por este aviso. Impactes das barragens nos regimes fluviais: comparação entre Vilarinho das Furnas (Hidroeléctrica) e Monte Novo (Hidroagrícola) Autor(es): Ramos, Catarina; Leal, Miguel; Silva, Patrícia Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra URL persistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/31187 DOI: DOI:http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-0244-8_88 Accessed : 28-Oct-2021 23:28:23 digitalis.uc.pt pombalina.uc.pt

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A navegação consulta e descarregamento dos títulos inseridos nas Bibliotecas Digitais UC Digitalis,

UC Pombalina e UC Impactum, pressupõem a aceitação plena e sem reservas dos Termos e

Condições de Uso destas Bibliotecas Digitais, disponíveis em https://digitalis.uc.pt/pt-pt/termos.

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este aviso.

Impactes das barragens nos regimes fluviais: comparação entre Vilarinho das Furnas(Hidroeléctrica) e Monte Novo (Hidroagrícola)

Autor(es): Ramos, Catarina; Leal, Miguel; Silva, Patrícia

Publicado por: Imprensa da Universidade de Coimbra

URLpersistente: URI:http://hdl.handle.net/10316.2/31187

DOI: DOI:http://dx.doi.org/10.14195/978-989-26-0244-8_88

Accessed : 28-Oct-2021 23:28:23

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IMPRENSA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

DESENVOLVIMENTO LOCAL,AMBIENTE, ORDENAMENTOE TECNOLOGIA

Norberto SantosLúcio CunhaCOORDENAÇÃO

EOGRAFIA ACTIVA GTRUNFOS DE UMA

2011

Série Documentos

Imprensa da Universidade de Coimbra

Coimbra University Press

2011

Co-financiamento

Obra publicada em co-edição com:

Norberto Santos

Lúcio CunhaCO

ORD

ENA

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TRUN

FOS DE U

MA G

EOG

RAFIA ACTIVA

A Geografia, ciência de síntese e integra-ção dos fenómenos sociais e naturais, tem vindo a adquirir uma importância crescente em termos de aplicação tendo em vista, não só a compreensão do Mundo a diferentes escalas, mas sobretudo uma intervenção nos planos económico, social e cultural, que conduza à promoção de uma cidadania acti-va e que contribua para o desenvolvimento sustentável e para a qualidade de vida dos cidadãos.

Partindo desta premissa e da neces-sidade de reunir os geógrafos nacionais para o debate do modo como a Geografia pode estudar o espaço, perceber os lugares, organizar os territórios, sentir as pesso-as, promover o desenvolvimento, criar as opções para a decisão política e, mesmo, decidir e promover o desenvolvimento em torno das questões teóricas e metodológi-cas da aplicação dos estudos de Geografia, a Associação Portuguesa de Geógrafos orga-nizou, em colaboração com o Departamento de Geografia da Universidade de Coimbra e com o CEGOT, o VII Congresso da Geografia Portuguesa, Trunfos de uma geografia activa. Desenvolvimento local, ambiente, ordenamento e tecnologia, cujos resultados principais se apresentam agora sob a forma deste livro.

Norberto Pinto dos Santos é geógrafo e doutor em Geografia Humana. Professor Associado com Agregação no Departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra e Investigador no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território, ao longo dos anos de carreira universitária tem desenvolvido trabalhos na área da Geografia Social e Económica, do Lazer, do Turismo e do Ordenamento do Território.

Integrou diversos projectos de investigação de que se salientam: Dinamismos sócio-eco-nómicos e (re)organização territorial: processos de urbanização e reestruturação produtiva, Dinâmicas dos Espaços produtivos e reprodutivos locais: A mobilidade dos investimentos e desenvolvimento das cidades médias, Organização e revitalização dos territórios rurais, Portugal e as Contradições da Modernidade – Território, desenvolvimento e marginalidade.

Publicou dois livros: Lazer. Da libertação do tempo à conquista das práticas. Imprensa da Universidade, CEG, Coimbra (2008) (em colaboração) e A sociedade de consumo e os espaços vividos pelas famílias, Edições Colibri, Lisboa (2001).

É membro da Direcção da Associação Portuguesa de Geógrafos, desde 2008; Director do curso em Turismo, Lazer e Património, desde 2009. Foi Presidente da Comissão Científica do Instituto de Estudos Geográficos, Coordenador do Centro de Estudos Geográficos, Presidente da Comissão de Supervisão do Ramo de Formação Educacional da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Director do Instituto de Estudos Geográficos da Faculdade de Letras de Coimbra, membro da Assembleia da Universidade de Coimbra, Vogal do Conselho Directivo da Faculdade de Letras de Coimbra.

Lúcio Cunha é geógrafo e doutor em Geografia Física. Professor no Departamento de Geografia e Investigador no Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território (CEGOT) da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Ao longo de mais de 30 anos de carreira universitária tem desenvolvido trabalhos na área da Geomorfologia (Geomorfologia Cársica, Geomorfologia Fluvial e Património Geomorfológico), da Geografia Física Aplicada aos Estudos Ambientais (Recursos Naturais, Ambiente e Turismo, Riscos Naturais) e de Sistemas de Informação Geográfica aplicados ao Ordenamento do Território.

Participou em vários projectos de investigação nacionais e internacionais. Publicou cerca de centena e meia de trabalhos sobre os temas a que se tem dedicado e proferiu conferências em várias instituições de ensino superior no nosso país, mas também em Espanha, Itália, Brasil, Uruguai e Cabo Verde.

Foi Presidente do Conselho Directivo, Vice-Presidente do Conselho Científico e Director do Departamento de Geografia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Foi, também, Presidente da Associação Portuguesa de Geomorfólogos e membro da Direcção da Associação Portuguesa de Geógrafos e da Comissão Nacional de Geografia. Actualmente, é coordenador da linha 1 (Natureza e Dinâmicas Ambientais) do Centro de Estudos de Geografia e Ordenamento do Território. É, também, membro da Comissão Científica do Centro de Estudos Ibéricos.

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Catarina Ramos, Miguel Leal, Patrícia Silva IGOT – Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa

IMPACTES DAS BARRAGENS NOS REGIMES FLUVIAIS: COMPARAÇÃO ENTRE VILARINHO DAS FURNAS (HIDROELÉCTRICA) E MONTE NOVO (HIDROAGRÍCOLA)

INTRODUÇÃO

A temática dos impactes das grandes barragens1 tem sido amplamente discutida, sobre-

tudo no que diz respeito aos impactes potenciais. A análise dos impactes reais carece de dados que os possam comprovar cientificamente. O presente estudo tem como objectivo central a comparação dos impactes de duas barragens portuguesas nos regimes fluviais, tendo por base os dados da rede hidrométrica do INAG, correspondentes a duas estações com séries suficientemente longas para permitirem a análise das características dos regimes natural e artificializado. As duas barragens estudadas são: Vilarinho das Furnas, concluída em 1972, (utilização energia/derivação), localizada no Rio Homem (Bacia hidrográfica do Rio Cávado), distrito de Braga, concelho de Terras de Bouro, com 94 m de altura acima da fundação e uma capacidade útil de 116, 1 hm3; e Monte Novo (utilização abastecimen-to e rega), concluída em 1982, localizada no Rio Degebe (Bacia hidrográfica do Rio Gua-diana), distrito de Évora, concelho de Évora, com 30 m de altura acima da fundação e uma capacidade útil de 14,8 hm3. 1. METODOLOGIA

A recolha dos dados hidrométricos foi efectuada no site do INAG, através de uma

pesquisa no SNIRH (Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos) e nas Barragens de Portugal, com o objectivo de encontrar estações hidrométricas a jusante de grandes barragens com séries de dados longas e completas. Depois de concluída esta pes-quisa foram seleccionadas as estações de Covas, a jusante da barragem de Vilarinho das Furnas, com uma série de 49 anos; e Amieira, a jusante da barragem de Monte Novo, com uma série de 56 anos.

De modo a testar a homogeneidade das séries foram utilizadas as estações hidromé-tricas de Cunhas (Rio Beça), que foi comparada com a de Covas, e de Monte dos Fortes __________________

1 Segundo a Comissão Internacional das Grandes Barragens (ICOLD), considera-se como grande barragem aquela que tiver um paredão com uma altura superior a 15 m ou uma albufeira com uma capacidade de retenção de água superior a 1 hm3.

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(Ribeira de Odeleite), que foi comparada com a de Amieira, por se situarem em cursos de água com regimes naturais.

Foram também seleccionadas duas estações meteorológicas situadas nas bacias hidro-gráficas, a montante das barragens: Leonte (na bacia do rio Homem) e São Manços (na bacia do rio Degebe). Estas estações foram utilizadas porque era necessário compreender se eventuais alterações no regime da precipitação podiam ser responsáveis por modifica-ções nos regimes fluviais (e não as barragens).

Neste trabalho foram analisados os escoamentos anuais, mensais e diários. A fim de testar a homogeneidade das séries de dados foi aplicado o teste do ensaio dos valores du-plamente acumulados aos escoamentos anuais (E.V.D.A.) (rio natural VS rio artificiali-zado; Jost, 1977). Considerou-se também o índice IR (impounded runoff), utilizado por Batalla et al. (2004) e Singer (2007), que é um indicador do grau de importância da bar-ragem face ao escoamento do rio. O IR consiste na divisão entre a capacidade útil da barragem e o escoamento médio anual.

Foram elaboradas as curvas de duração dos caudais médios diários e calculou-se o coe-ficiente de modificação do caudal médio diário (Cc), proposto por Benn e Erskine (1994, em Brandt 2000):

2 1

2 1

100 1X X

CcY Y

em que, X1 e X2 representam os caudais médios diários no rio estudado, antes e depois da barragem, respectivamente, durante um determinado período; Y1 e Y2 representam os cau-dais médios diários num rio com regime natural, antes e depois da barragem, respectiva-mente, durante um dado período de tempo.

Relativamente às situações hidrológicas extremas foram calculados: para a detecção das cheias, o caudal mínimo de cheia em regime natural (antes da barragem), através do 9º decil do mês com maior escoamento; para a análise das estiagens, o caudal máximo de estiagem, em regime natural, considerado como 1/5 do caudal médio diário (Qméd/5). 2. IMPACTES NOS CAUDAIS ANUAIS

É perfeitamente visível, através do teste E.V.D.A., o impacte da barragem de Vilarinho

das Furnas no escoamento do rio Homem. Pode observar-se na figura 1 que, a partir da construção da barragem, o regime anual se modifica, sendo que os valores se alinham segundo duas linhas rectas: uma antes e outra depois da barragem. Por outro lado, o coefi-ciente de determinação entre as séries hidrométricas do Rio Homem e do rio de referência (Beça) baixa de 0,92 para 0,76, o que prova a influência significativa da barragem no primeiro. Esta influência é ainda evidenciada pelo índice IR: 0,41 para a estação de Covas.

Pelo contrário, no rio Degebe, o IR é de 0,07, o que mostra a fraca influência da bar-ragem de Monte Novo no escoamento, devido à sua reduzida dimensão. O teste E.V.D.A. mostra, igualmente, que não há uma modificação significativa do regime do rio Degebe com a construção da barragem (figura 2). Prova disso, é a manutenção do valor do coefi-ciente de determinação: 0,81 (antes) e 0,82 (depois).

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Figura 1 – Teste E.V.D.A. (rio Homem vs. rio Beça).

Figura 2 – Teste E.V.D.A. (rio Degebe vs. ribeira de Odeleite).

Figura 3 – Relação entre o escoamento (Covas) e a precipitação (Leonte).

Os diferentes impactes das duas barragens são também visíveis na variação interanual do escoamento. Na figura 3 notam-se dois períodos bem marcados, antes e depois da construção da barragem de Vilarinho das Furnas. Após a sua entrada em funcionamento houve uma diminuição acentuada do escoamento (69%). A comparação entre o escoa-mento e a precipitação, em termos anuais (figura 3), mostra que a relação entre estas duas variáveis deixa de ser tão significativa, pois o coeficiente de determinação passa der2 = 0,91, antes da barragem, para r2 = 0,59, depois da barragem. A redução do escoamento, para valores semelhantes de precipitação, é devida à grande capacidade de retenção da água pela albufeira (118 hm3).

Pelo contrário, a menor capacidade de retenção de água pela albufeira de Monte Novo (15 hm3), leva a que não se registem alterações muito visíveis no escoamento anual depois da sua construção (figura 4). Porém, se compararmos as médias dos dois períodos, existe uma diminuição do escoamento de 13% depois da barragem. Quanto à relação escoa-mento/precipitação, e tal como é visível na figura 4, não há grandes diferenças entre os períodos anterior e posterior à construção da barragem.

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Figura 4 – Relação entre o escoamento (Amieira) e a precipitação (São Manços).

3. IMPACTES NOS CAUDAIS MENSAIS

A diminuição do escoamento médio mensal do rio Homem é bastante acentuada em

todos os meses, à excepção de Julho e Agosto, por serem meses já afectados pela estiagem em regime natural (figura 5 e tabela 1).

Figura 5 – Escoamento médio mensal em Covas antes e depois da barragem de Vilarinho das Furnas.

Tabela 1 – Variações do escoamento médio mensal em Covas depois da barragem de Vilarinho das Furnas.

Outubro -71% Novembro -78% Dezembro -60% Janeiro -69% Fevereiro -65% Março -76% Abril -72% Maio -65% Junho -61% Julho -36% Agosto -20% Setembro -72%

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A evolução do escoamento médio mensal do rio Degebe é mais complexa (figura 6 e tabela 2). Deste modo, com excepção do mês de Setembro, observa-se uma diminuição entre Fevereiro e Outubro depois da construção da barragem. De referir que a redução no escoamento no mês de Outubro está relacionada com a capacidade de encaixe da barragem, que retém o escoamento inicial depois das primeiras chuvas, a seguir à estação seca. As reduções nos restantes meses têm a ver com a diminuição da precipitação em alguns deles e com o armazenamento de água na albufeira, de modo a fazer face à escassez de água no Verão. Dentro deste período alargado de tempo, importa destacar os meses de Fevereiro, Março e Abril, pois são aqueles em que as diminuições são mais notórias. As reduções acentuadas nestes meses são, presumivelmente, explicadas por factores diferentes. De certa forma, a influência da infra-estrutura vai sendo superior com o tempo, como se pode perceber através da comparação entre as figuras 6 e 7. Assim, em Fevereiro, a dimi-nuição do escoamento é justificada essencialmente pela redução da precipitação; em Março justifica-se pela diminuição da precipitação e pela existência da barragem; e em Abril é explicada exclusivamente pela presença da infra-estrutura, já que a precipitação neste mês aumenta. Já entre Novembro e Janeiro, os valores mensais do escoamento sobem devido ao aumento da precipitação e às descargas efectuadas nestes meses, quando a barragem já se encontra cheia.

Figura 6 - Escoamento médio mensal em Amieira antes e depois da barragem de Monte Novo.

Tabela 2 - Variações do escoamento médio mensal em Amieira depois da barragem de Monte Novo.

Outubro -48% Novembro +63% Dezembro +41% Janeiro +13% Fevereiro -49% Março -85% Abril -72% Maio -33% Junho -48% Julho -58% Agosto -44% Setembro +10%

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Figura 7 – Precipitação média mensal em São Manços antes e depois da barragem de Monte Novo.

4. IMPACTES NOS CAUDAIS DIÁRIOS Nas curvas de duração dos caudais médios diários do rio Homem (figura 8) observam-

se três aspectos importantes depois da construção da barragem de Vilarinho das Furnas, comparativamente ao período anterior: o caudal médio é mais baixo (diminui de 9,04 para 2,81 m3/s), bem como os caudais máximos, mas os caudais mínimos são mais elevados, devido ao facto da barragem ser hidroeléctrica, o que obriga à realização de descargas mes-mo durante o Verão. Assim, os caudais médios diários são sempre inferiores depois da barragem, à excepção dos 30 dias com os caudais mais baixos do ano, em que se nota uma inversão desta situação (figura 8).

Figura 8 – Curvas de duração dos caudais médios diários do rio Homem, antes e depois da barragem de Vilarinho das Furnas.

O Coeficiente de Modificação dos caudais médios diários (Cc) é de 59%, o que significa que se verificou uma forte alteração destes caudais devido à acção da barragem.

Relativamente ao regime diário do rio Degebe, o que a figura 9 mostra é que as duas curvas (antes e depois) evoluem quase a par, sem se distanciarem, sensivelmente até ao 250.º dia com maior caudal. A partir daí, o fornecimento de água para a rega a partir da barragem acentua a diminuição do escoamento no rio no período de maior secura. Sendo assim, são os dias com valores mais baixos de caudal ou com caudal nulo que têm os maiores desfasamentos depois da edificação da barragem. O número de dias sem escoa-mento aumenta de 53 para 70 dias por ano.

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O Coeficiente de Modificação dos caudals médios diários (Cc) do rio Degebe é de 36%, inferior, portanto, ao do rio Homem. 5. IMPACTES NAS SITUAÇÕES HIDROLÓGICAS EXTREMAS 5.1. Cheias

No rio Homem, o número médio de cheias foi reduzido drasticamente, já que, antes da

barragem, ocorriam oito eventos por ano, e no período posterior passa a ocorrer apenas um. A nível mensal (figura 10), as cheias diminuem de modo acentuado em todos os meses, no en-tanto, importa fazer referência a três períodos específicos. Entre Setembro e Novembro, prati-camente deixam de existir cheias após a construção da barragem, devido ao efeito de encaixe desta. As cheias concentram-se quase exclusivamente entre Dezembro e Março, essencialmente porque é o período do ano em que a barragem está cheia, ou pelo menos perto disso, não existindo a possibilidade de haver um encaixe do escoamento em caso de precipitações mais abundantes. Entre Abril e Setembro, não existem cheias no período posterior à construção da infra-estrutura. Desta forma, se antes da construção da barragem as cheias estavam mais dis-tribuídas no tempo, ocorrendo em 10 meses do ano, depois da construção da barragem estes eventos são, temporalmente, muito mais concentrados, já que passam a ocorrer apenas em 5 meses (Outubro, Dezembro, Janeiro, Fevereiro e Março). Esta maior concentração das cheias demonstra que o efeito da barragem é mais importante no controlo dos eventos ocorridos no Outono do que propriamente no Inverno (Ramos e Reis, 2001). Figura 9 - Curvas de duração dos caudais médios diários do rio Degebe, antes e depois da

barragem de Monte Novo.

No rio Degebe, em termos anuais, há uma redução ligeira do número médio de eventos depois da barragem (passa de 4 para 3 cheias). Já à escala mensal, pode afirmar-se que o número médio de cheias aumenta no final do Outono e no princípio do Inverno (Novem-bro, Dezembro e Janeiro) e diminui nos meses de Fevereiro e Março (figura 11). No mês de Outubro, após a construção da barragem, deixam de existir cheias, uma vez que a capacidade de encaixe da barragem faz com que haja uma captação das primeiras chuvas depois da estação seca. O aumento destes eventos entre Novembro e Janeiro é explicado, principal-mente, por um aumento de precipitação nestes meses, mas também pela reduzida dimensão da barragem, que não é capaz de reter grandes quantidades de água, sendo obrigada a fazer

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descargas. A diminuição observada entre Fevereiro e Abril explica-se pela redução da preci-pitação nestes meses. Entre Maio e Setembro não há grandes alterações.

Figura 10 – Número médio de cheias, por ano, no rio Homem antes e depois da barragem de Vilarinho das Furnas.

Figura 11 - Número médio de cheias, por ano, no rio Degebe antes e depois da barragem de Monte Novo.

5.2. Estiagens

A barragem de Vilarinho das Furnas fez aumentar significativamente o número médio

de dias de estiagem do rio Homem (de 123 para 218 dias). A nível mensal existem au-mentos em todos os meses, menos notados apenas nos meses de Verão, uma vez que estes meses já eram afectados pela estiagem, elemento do regime fluvial típico dos rios portu-gueses nesta época do ano (figura 12).

Relativamente à duração deste fenómeno, observa-se uma diminuição das estiagens com períodos mais curtos e um aumento das estiagens com períodos mais longos (>150 dias). Por outro lado, observa-se o desaparecimento da classe <100 dias e surgem duas novas classes (200-250 e >250 dias; fig. 13).

O efeito da barragem de Monte Novo nas estiagens também é visível, embora de menor importância do que Vilarinho das Furnas (de 262 para 280 dias). Se nos focarmos na fre-quência a nível mensal, podemos ver que o número de dias de estiagem aumenta essencial-mente nos meses de Inverno e do início da Primavera (figura 14), uma vez que nos res-tantes meses este fenómeno já se fazia sentir no regime natural.

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Figura 12 – Número médio de dias de estiagem no rio Homem, antes e depois da barragem de Vilarinho das Furnas.

Figura 13 – Classes de duração das estiagens do rio Homem, antes e depois da barragem de Vilarinho das Furnas.

Figura 14 - Número médio de dias de estiagem no rio Degebe, antes e depois da barragem de Monte Novo.

Em termos de duração, verifica-se que os períodos de estiagem superiores a 300 dias aumentam depois da barragem, enquanto nas duas classes intermédias (200 a 250 dias e 250 a 300 dias) há uma diminuição. Parece haver assim uma transferência dos eventos de duração moderada (incluídos nas duas classes intermédias) para os de duração bem mais prolongada (mais de 300 dias; fig. 15).

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Figura 15 - Classes de duração das estiagens do rio Degebe, antes e depois da barragem de Monte Novo.

CONCLUSÃO

A análise comparativa entre duas barragens de dimensões, capacidade de armazenamento

e utilizações diferentes mostra, claramente, diferentes impactes no regime fluvial. Vilarinho das Furnas, com uma capacidade de armazenamento quase 8 vezes superior à de Monte Novo, provocou uma diminuição do escoamento de 69%, diminuição essa que é visível em todos os meses, bem como uma redução da amplitude de flutuação dos caudais anuais e mensais. Ao nível diário, verifica-se que os caudais característicos máximos e semi-perma-nentes diminuem, mas aumentam os caudais característicos mínimos, devido ao facto da utilização da barragem ser hidroeléctrica e, como tal, ter descargas durante o verão. Con-tudo, devido à retenção de água pela albufeira, a duração média da estiagem do Rio Homem aumentou 95 dias (de 4, no regime natural, para 7 meses no regime artificializado). As cheias também registam uma quebra acentuada: de 8 para 1 evento/ano, ficando concentradas praticamente entre Dezembro e Março, quando anteriormente ocorriam em todos os meses, à excepção de Julho e Agosto.

Monte Novo apenas provocou uma diminuição de 13% no escoamento do Rio Degebe, não se notando qualquer influência na amplitude de flutuação dos caudais. Ao nível mensal, existem meses em que se regista, inclusivé, um aumento do escoamento (Setembro, Novembro, Dezembro e Janeiro), devido ao aumento das chuvas outonais na Bacia do Rio Degebe, a partir dos anos 80. Este facto levou também a um aumento da frequência das cheias entre Novembro e Janeiro, enquanto, em termos médios, as cheias diminuiram de 4 para 3 eventos/ano. A estiagem aumentou apenas 18 dias.

As modificações observadas no regime do Rio Degebe têm assim menor dimensão do que as que observadas no regime do Rio Homem, pois a barragem de Monte Novo tem apenas uma capacidade de armazenamento de 7% do escoamento médio anual (em regime natural), enquanto a de Vilarinho das Furnas atinge 41%. BIBLIOGRAFIA Batalla, R. J.; Gómez, C. M.; Kondolf, G. M. 2004, “Reservoir-induced hydrological changes in the Ebro River

basin (NE Spain)”, Journal of Hydrology, nº 290, pp. 117-136.

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Brandt, S. A. 2000, “Classification of geomorphological effects downstream of dams”. Catena, nº 40, pp. 375-401.

Isik, S.; Dogan, E.; Kalin, L.; Sasal, M.; Agiralioglu, N. 2008, “Effects of anthropogenic activities on the Lower Sakarya River”. Catena, nº 75, pp. 172-181.

Jost, V. 1977, Méthodes Statistiques en Hydrologie. École Polytechnique Fédérale de Lausanne, Lausanne. Ramos, C.; Reis, E. 2001, “As cheias no Sul de Portugal em diferentes tipos de bacias hidrográficas”. Finisterra,

Revista Portuguesa de Geografia, vol. XXXVI, nº 71, pp. 61-82. Singer, M. 2007, “The influence of major dams on hydrology through the drainage network of the Sacramento

river basin, California”. River Research and Applications, nº 23, pp. 55-72. FONTES ELECTRÓNICAS CONSULTADAS Barragens de Portugal – http://cnpgb.inag.pt/gr_barragens/gbportugal/index.htm Instituto Nacional da Água – http://www.inag.pt Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos (SNIRH) – http://snirh.pt