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INFLUÊNCIA DO PROCESSO DE USINAGEM NA INTEGRIDADE SUPERFICIAL
E PROPRIEDADES DA LIGA DE AÇO INOX AUSTENÍTICO F138 E AISI 316L.
F. M. Marques (1); A. S. Rocha (2); R. C. Costa (1); F. W. Bernardino (1); P. R.
Hoffmann (3); M. M. Bonfante (1)
(1) Faculdade SATC; (2) UFRGS; (3) IFSC;
Rua Pascoal Meller, 73, Bairro Universitário, Criciúma - SC. CEP: 88805380
Resumo: A utilização dos aços inoxidáveis austeníticos (AISI 316L e F138) como
implantes e ferramentas cirúrgicas é conhecida há décadas, inclusive os processos
de fabricação que envolvem a produção desses elementos. O conhecimento dos
parâmetros de usinagem e suas significâncias no resultado final de um produto diz
muito sobre o futuro desse produto, inclusive sobre a influência na integridade
superficial como rugosidade, tensão residual, resistência à corrosão, mudanças de
fases microestruturais e variações de dureza à medida que ocorre a aproximação da
superfície do material. A variação de dureza do material pode influenciar na
resistência ao desgaste superficial (abrasão, adesão, difusão), isso dependendo da
mudança de microestrutura ocasionada pelo processo de deformação plástica. O
objetivo deste trabalho foi de caracterizar os aços inoxidáveis austeníticos AISI 316L
e F138, mediante microscopia ótica, composição química e ensaios de microdureza
superficial. Testes estes realizados e comprovados que os aços F138 apresentam
valores de dureza inferiores aos 316L, porem com uma homogeneidade do seu
material, justificando seu uso em aplicações biomédicas implantáveis.
Palavra chave: Aços inoxidáveis, parâmetros de usinagem, implantes, integridade
superficial.
INTRODUÇÃO
Avanços na área metalúrgica estão sendo desenvolvidos constantemente para
melhorias das propriedades específicas de cada material em cada aplicação nas
mais diversas áreas. A utilização de aços inoxidáveis austeníticos é difundida
mundialmente na área biomédica para o desenvolvimento de próteses e
instrumentos cirúrgicos. Na área aeroespacial podem ser mencionados e aplicados
em mecanismos que estão sujeitos a solicitações mecânicas em baixas
temperaturas e sem alteração de suas propriedades, como em trens de pouso,
turbinas e na área naval onde podem ser mencionadas as qualidades referentes à
resistência à corrosão desses materiais em meios salinos [1].
Os aços inoxidáveis austeníticos, doravante AISI 316L (F138), são
considerados materiais com baixa condutibilidade térmica quando comparados a
outros metais, dessa forma são suscetíveis à mudança de morfologia pela ação
térmica durante o processo de usinagem e também pela ação cisalhante originada
do contato entre a ferramenta e a peça [2].
O processo de transformação de austenita para martensita ainda ocorre pela
deformação plástica durante o processo de usinagem, já que a martensita possui
características inversas às da austenita conforme mencionadas anteriormente [3].
Serão realizados ensaios para caracterização dos aços inoxidáveis 316L e
F138 através de espectrômetro de refração, microscopia óptica e por meio de
ensaios de dureza Brinell (HB) e Vickers (HV), este último com aplicação de cargas
diferentes. Para medição do efeito da usinagem na superfície do material AISI 316L
e F138 será realizada medição de rugosidade em superfície usinada sob várias
condições de velocidade de corte e avanço, analisando esta influência de
rugosidade superficial como objeto de estudo.
MÉTODOS E RESULTADOS
Corpos de Prova (CP)
A composição química dos aços inoxidáveis ASTM F138 e AISI 316L estão representadas nas tabelas 1 e 2, respectivamente. Os ensaios foram realizados no laboratório de análises da Faculdade SATC.
Tabela 1- Composição química (% em massa), do aço inoxidável ASTM F138. Material C% Si% Mn% Cr% Mo% Ni% P% S% N%
CP 0,027 0,30 1,79 17,90 2,79 14,59 0,023 0,001 0,087 Norma 0,030 0,75 2,00 17-19 2,5-3,0 13-15 0,025 0,010 0,10
Tabela 2- Composição química (% em massa), do aço AISI 316L. Material C% Si% Mn% Cr% Mo% Ni% P% S% N%
CP 0,029 0,55 1,64 16,38 2,18 8,322 0,035 0,026 ----
Norma 0,030 0,75 2,00 16-18 2,00 10-14 0,045 0,030 ----
Parâmetros Utilizados
Os parâmetros adotados para os ensaios de usinabilidade foram baseados em
experimentos anteriores realizados com AISI 304 e adotados como pré-testes. Os
valores de avanço e velocidade de corte foram sugeridos por fabricantes de
ferramentas de corte. A tabela 3 mostra os valores adotados de velocidade de corte,
avanço e profundidade de corte aplicada (vc, fn e ap, respectivamente).
Houve a utilização de fluido lubrirrefrigerante solúvel em água com pH 7.0 e
emulsividade de 4 %, aplicado por jorro contínuo e diretamente sobre a peça a partir
da vazão de 40 l/min.. No entanto, esta aplicação foi apenas nos processos de
desbaste do material, não sendo empregada no último passe da ferramenta sobre a
superfície do corpo de prova.
Tabela 3- Condições de corte e número dos testes.
Teste N°1 vc [m/min] fn [mm/rot] ap [mm] Uso de refrigeração
Teste 1 190 0,1 0,5 Não
Teste 2 190 0,1 3,0 Não
Teste 3 190 0,3 0,5 Não Teste 4 190 0,3 3,0 Não
Para cada teste, foram realizadas duas réplicas com intuito de conseguir valores confiáveis para médias estatísticas e assim resultados consistentes.
Caracterização do Material do Corpo de Prova Os valores médios de dureza para os aços 316L e F138 foram de 179 HBW
2,5/187,5/30 e 173 HBW 2,5/187,5/30, respectivamente especificados segundo norm [4] [5] [8].
As medições foram realizadas nos corpos de prova após serem usinados com seus respectivos diâmetros finais de 20 mm, por meio dos quais se obteve os valores médios de dureza anteriormente relatados.
Ensaio de Compressão Os resultados do ensaio de compressão estão montados no gráfico da figura 1,
onde pode ser percebido que o aço inoxidável F138 possui valor de limite de proporcionalidade superior ao obtido no ensaio do aço inoxidável 316L, porém são
valores pouco representativos para os aços de modo geral, isso em termos de comparação [6].
Figura 1 Ensaio de compressão nos aços 316L e F138.
Quanto ao restante do gráfico, percebe-se similaridade entre as curvas onde
pode ser caracterizada pela semelhança dos valores de composição química dentro de seus limites para cada material e pelo comportamento semelhante ao dos aços inoxidáveis austeníticos.
Análise Microestrutural Com intuito de atestar que o material utilizado como corpos de prova era
realmente os aços inoxidáveis AISI 316L e F138, onde a composição química já foi indicada anteriormente de forma efetiva e dentro dos limites aceitáveis para devida caracterização, foi realizada análise de microestrutura conforme figuras 2 e 3, dessa forma verificando o tamanho de grão onde ambos materiais confirmaram estar dentro dos padrões estabelecidos para utilização em aplicações biomédicas com base em medição do tamanho de grão em materiais metálicos conforme norma ABNT [7].
Figura 1- Microestrutura do aço AISI 316L (200X)
Figura 2- Microestrutura do aço ASTM F138 (200X)
De acordo com o procedimento de contagem de interceptos, foi constatado que
os tamanhos de grão TG 7 para o aço AISI 316L e TG 7,5 para o F138 atendem assim à especificação para ser utilizado em fins biomédicos.
Com a análise de microestrutura, percebe-se pela figura 4 em relação à figura 5 que à medida que foram aumentados os valores de profundidade de corte [ap] da ferramenta para o aço 316L não ocorreram diferenças significativas na superfície.
Entretanto, quando os valores de avanço da ferramenta aumentaram [fn], os resultados foram expressivos visualmente com auxílio do microscópio, conforme indicam as figuras 6 e 7.
Figura 4- Microestrutura do aço inoxidável AISI 316L no teste de usinagem 1.
Figura 5- Microestrutura do aço inoxidável AISI 316L no teste de usinagem 2.
Superfície
Núcleo
Superfície
Núcleo
Figura 6- Microestrutura do aço inoxidável AISI 316L no teste de usinagem 3.
Figura 7- Microestrutura do aço inoxidável AISI 316L no teste de usinagem 4.
Os resultados encontrados de deformação de grãos para o aço F138 são
similares em relação aos grãos deformados dos aços 316L, podendo ser percebida uma diferença significativa entre as condições 1 e 4, onde podem ser descritos como os valores mínimos e máximos de parâmetros de usinagem, respectivamente.
Superfície
Núcleo
Superfície Núcleo
Figura 8- Microestrutura do aço ASTM F138 no teste de usinagem 1.
Figura 9- Microestrutura do aço ASTM F138 no teste de usinagem 2.
Superfície
Núcleo
Superfície
Núcleo
Figura 10- Microestrutura do aço ASTM F138 no teste de usinagem 3.
Figura 11- Microestrutura do aço ASTM F138 no teste de usinagem 4.
Medição de Rugosidade Superficial.
Os valores obtidos nas medições de rugosidade superficial estão indicados na
figura 12, na qual foi utilizado o parâmetro Ra, respectivamente.
Pode ser percebido que os corpos de prova, em que foram aplicados a
profundidade de corte de 3,0 mm e avanço de 0,1 mm/rot, obtiveram os menores
valores de rugosidade, no entanto quando alterado apenas o valor de fn para 0,3
mm/rot foram alcançados valores superiores de rugosidade perante aos outros
ensaios realizados. Quando feita a mudança de ap para 0,5 mm e fn para 0,1 mm/rot
e comparado com a condição de ap 0,5 mm e fn 0,3 mm/rot, pode ser percebido que
a variação de avanço (fn) exerce significância quanto à rugosidade.
Superfície
Núcleo
Superfície
Núcleo
Figura 12- Valores de rugosidade superficial pelo parâmetro Ra [μm].
A figura 12 ainda indica que a profundidade de corte não exerce forte
influência na rugosidade da peça quando foi submetida a altos valores de avanço de
ferramenta, podendo ser justificada a diminuição da rugosidade quando aplicados
altos valores de profundidade de corte pela diminuição de folgas na máquina, dessa
forma aumentando a rigidez do mecanismo de geração do movimento da ferramenta
em relação ao corpo de prova. Quando comparados os materiais, percebeu-se que,
com exceção do parâmetro Ra, todas as medições indicaram o aço F138 com
valores de rugosidade superiores ao aço 316L, tornando o material de usinabilidade
menos favorável quando o fator rugosidade é dado como referência.
Os menores valores de dureza Brinell podem ser atrelados à justificativa
anterior, uma vez que conseguem ser fatores determinantes para a usinabilidade
dos materiais colocados em questão.
A maior quantidade de sulfetos no aço 316L pode ser considerado elemento
facilitador da melhora na usinabilidade do material, pois em pesquisas já relatadas
evidenciou-se esse fenômeno, enquanto que os teores de sulfetos no aço F138 são
baixos em relação aos índices encontrados no 316L.
Perfil de Microdureza [HV] das Amostras com Carga de 0,01 N.
A partir das figuras 13 a 16, representam-se os perfis de microdureza com
carga de 0,01 N e de acordo com as condições de corte que estão tabeladas no item
2 (tabela 3).
Figura 3- Perfil de microdureza com parâmetros de corte de ap e fn.
Conforme a figura 13, pode ser observado que para os aços F138 e 316L os
valores de dureza acima de 400 HV mostraram-se presentes até a profundidade de
0,12 mm, após esse ponto ocorreu atenuação da queda de dureza onde para o F138
em comparação ao 316L todos os valores de dureza foram maiores em todos os
pontos de medição.
Figura 4- Perfil de microdureza com parâmetros de corte de ap e fn.
De acordo com a figura 14, quando ocorre a mudança do valor da
profundidade de corte para 3,0 mm (condição 2) e mantendo o avanço da
ferramenta em 0,1 mm/rot, também é percebida a mudança de valores de dureza
para os corpos de prova e suas réplicas. Os valores de dureza aumentaram de
forma significativa nas proximidades à superfície entre 500 e 600 HV. Outro ponto a
ser destacado diz respeito aos valores de dureza do aço 316L que obtiveram
apreciação superior em relação ao aço F138, mas que, quando se aproximaram de
0,12 mm da superfície, ficaram próximos a 400 HV, havendo variação maior para o
aço 316L.
Ao ser efetuada a mudança de parâmetros de corte com o aumento do
avanço da ferramenta de 0,1 mm/rot para 0,3 mm/rot e profundidade de corte em 0,5
mm, correspondendo à condição 3 (figura 15), os valores de dureza próximos à
superfície (0,02 mm) assumiram valores de dureza acima de 550 a 600 HV, sendo
que esses resultados cruzam a faixa de 400 HV em valores de profundidade em
relação à camada superficial do corpo de prova a partir de 0,16 mm.
Figura 5- Perfil de microdureza com parâmetros de corte de ap e fn.
A figura 15 também representa a variação de dureza para o aço 316L, que é
considerada significativa quando comparada aos valores mensurados até o
momento, enquanto que para o aço F138, a oscilação de valores crescentes e
decrescentes de dureza são mais atenuadas.
Na última condição dos ensaios, condição 4, figura 16, são mantidos os
valores de dureza para o aço 316L em valores superiores aos do F138. Outro fator a
ser enaltecido é a profundidade a qual os valores de dureza se aproximam da faixa
compreendida abaixo de 400 HV, próximos a 0,2 mm.
Para o aço F138, os valores de dureza na superfície mantêm-se próximos de
550 HV, não ultrapassando este valor e não diminuindo de 500 HV. Entretanto para
o aço 316L foram obtidos valores compreendidos entre 430 e 585 HV, podendo,
preliminarmente, considerar uma faixa ampla de valores de dureza quando
comparados ao F138.
Figura 6- Perfil de microdureza com parâmetros de corte de ap e fn.
Exceto na primeira condição de usinagem, para todas as outras o aço 316L
assume valores de dureza superiores aos do aço F138 até a faixa próxima a 400
HV, justificando as comparações nesse ponto. Também é percebido que o aço 316L
admite valores dispersos quando comparados à linha de tendência do aço F138.
CONCLUSÃO
Com base nos resultados obtidos com a metodologia proposta e seus
resultados pode-se concluir os seguintes tópicos a seguir:
Os aços inoxidáveis possuem grau de inclusões relativamente inferior, quando
comparado com os aços AISI 316L, porem necessitaria de uma análise de
composição química pontual, para atestar que tipo de inclusões são formadas
pelas imagens apresentadas.
Os dois materiais tidos como objeto de estudo possuem composição química e
valores de dureza similares, porem dentro das normas vigentes para cada tipo
de material em questão.
O processo de usinagem influencia na mudança de morfologia dos materiais,
entretanto o parâmetro que mais exerce influência nesse tipo de mudança é o
avanço da ferramenta ( fn ), sendo o maior seu valor também maior será sua
deformação da superfície usinada.
As rugosidades para parâmetros de avanço inferiores apresentam menores
valores, entretanto com a profundidade de corte maior, mostrou valores de
rugosidade inferior, possivelmente devido a eliminação de folgas da máquina,
desta forma aumentando a rigidez do processo de usinagem.
Os aços F138 apresentam valores de microdureza mais homogêneos e estáveis,
em relação aos valores do aço 316L. e que os maiores parâmetros de usinagem
proporcionam maiores profundidades de variação de dureza superficial.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à empresa BAUMER pela disponibilidade de materiais,
a FACULDADE SATC pela realização dos ensaios.
REFERÊNCIAS
[1] Costa, Rytney Santos. Estudo da corrosão do aço inox AISI 304 em álcool etílico hidratado combustível. Faculdade de Engenharia Mecânica da Universidade Estadual de Campinas. 2012. Tese de Doutorado. [2] Abia, Ana Isabel Fernández. Metodología para el análisis del comportamiento y
caracterización de los aceros inoxidables austeníticos en el torneado de alto rendimiento. UNIVERSIDAD DE LEÓN. LÉON : s.n., 2012. tese de doutorado. [3] Moraes, Fernando Cruz de. Influencia da Microestrutura dos Aços Inoxidáveis (Austeniticos, Ferriticos e Martensíticos) na Proteção Contra a Corrosão por Filmes de Polianilina. Universidade de São Paulo. 2006. Dissertação de Mestrado. [4] E92-82, ASTM International. Standard Test Method for Vickers Hardness of
Metallic Materials. 1997. [5] ABNT. Materiais metálicos - Ensaio de dureza Brinell NM-ISO 6506-2. 2010. [6] International, ASTM. Standard Test Methods of Compression Testing of Metallic Materials at Room Temperature. West Conshohocken : ASTM International, 2000. [7] 1323, ABNT NB. Determinação do tamanho de grão em materiais metálicos. 1990. [8] E10-01, ASTM International. Standard Test Method for Brinell Hardness of Metallic Materials. 2004.
INFLUENCE OF MACHINING PROCESS IN INTEGRITY AND SURFACE
PROPERTIES OF ALLOY STAINLESS STEEL AUSTENITIC F138 and AISI 316L.
Abstract: The use of austenitic stainless steel (AISI 316L and F138) as implants and surgical tools has been known for decades, including manufacturing processes involving the production of these elements. Knowledge of machining and their significances of parameters at the end result of a product says a lot about the future of this product, including the influence on surface integrity as roughness, residual stress, corrosion resistance, changes in microstructural phases and variations in hardness as that is the approach of the surface of the material. The variation in
hardness of the material can influence the resistance to surface wear (abrasion, adhesion, diffusion), it changes depending on the microstructure caused by the plastic deformation process. The objective of this study was to characterize the austenitic stainless steel AISI 316L and F138, by optical microscopy, chemical composition and microhardness tests. These tests performed and proven that the F138 steels have hardness values lower than 316L, but with homogeneity of their material, justifying its use in implantable biomedical applications.
Keyword: Stainless steel, machining parameters, implants, surface integrity.