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Informativo 797-STF (10/09/2015) Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo esquematizado por não terem sido concluídos em virtude de pedidos de vista: ADPF 347 MC/DF; RE 693456/RJ; AP 905 QO/MG; RE 790059 AgR-AgR/DF. Julgado excluído por ter menor relevância para concursos públicos: MS 33729/DF. ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL CIVIL SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Natureza da decisão e cabimento de recurso especial para impugná-la. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Reconhecida a repercussão geral não é mais possível que as partes desistam do processo. DIREITO PROCESSUAL PENAL PROCEDIMENTOS Aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) ao processo penal. RECURSOS Situação de reformatio in pejus mesmo tendo havido redução da pena final DIREITO PROCESSUAL CIVIL SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Natureza da decisão e cabimento de recurso especial para impugná-la Cabe recurso especial da decisão proferida no âmbito do pedido de suspensão? Segundo o STJ: NÃO. Não cabe Recurso Especial de decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão. O recurso especial se destina a combater argumentos que digam respeito a exame de legalidade, ao passo que o pedido de suspensão ostentaria juízo político. Segundo a 1ª Turma do STF: SIM. A 1ª Turma do STF entendeu que a decisão em sede de suspensão de segurança não é estritamente política, possuindo conteúdo jurisdicional. Com base nisso, decidiu que é cabível, em tese, recurso especial contra decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão de segurança (RE 798740 AgR/DF). STF. 1ª Turma. RE 798740 AgR/DF, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 1º/9/2015 (Info 797). CONCEITO O pedido de suspensão é

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Márcio André Lopes Cavalcante Processos excluídos deste informativo esquematizado por não terem sido concluídos em virtude de pedidos de vista: ADPF 347 MC/DF; RE 693456/RJ; AP 905 QO/MG; RE 790059 AgR-AgR/DF. Julgado excluído por ter menor relevância para concursos públicos: MS 33729/DF.

ÍNDICE DIREITO PROCESSUAL CIVIL

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Natureza da decisão e cabimento de recurso especial para impugná-la. RECURSO EXTRAORDINÁRIO Reconhecida a repercussão geral não é mais possível que as partes desistam do processo.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROCEDIMENTOS Aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) ao processo penal. RECURSOS Situação de reformatio in pejus mesmo tendo havido redução da pena final

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

SUSPENSÃO DE SEGURANÇA Natureza da decisão e cabimento de recurso especial para impugná-la

Cabe recurso especial da decisão proferida no âmbito do pedido de suspensão?

• Segundo o STJ: NÃO. Não cabe Recurso Especial de decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão. O recurso especial se destina a combater argumentos que digam respeito a exame de legalidade, ao passo que o pedido de suspensão ostentaria juízo político.

• Segundo a 1ª Turma do STF: SIM. A 1ª Turma do STF entendeu que a decisão em sede de suspensão de segurança não é estritamente política, possuindo conteúdo jurisdicional. Com base nisso, decidiu que é cabível, em tese, recurso especial contra decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão de segurança (RE 798740 AgR/DF).

STF. 1ª Turma. RE 798740 AgR/DF, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, julgado em 1º/9/2015 (Info 797).

CONCEITO O pedido de suspensão é

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- um instrumento processual (incidente processual) - por meio do qual as pessoas jurídicas de direito público ou o Ministério Público - requerem ao Presidente do Tribunal que for competente para o julgamento do recurso - que suspenda a execução de uma decisão, sentença ou acórdão proferidos, - sob o argumento de que esse provimento jurisdicional prolatado causa grave lesão à ordem, à saúde, à

segurança e à economia públicas.

NOMENCLATURA Comumente, esse instituto é chamado de pedido de “suspensão de segurança”. Isso porque ele foi previsto originalmente na lei apenas para suspender as decisões liminares ou sentenças proferidas em mandados de segurança. Ocorre que, com o tempo, foram editadas novas leis trazendo a possibilidade de suspensão para praticamente toda e qualquer decisão judicial prolatada contra a Fazenda Pública. Por essa razão, atualmente, além de “suspensão de segurança”, pode-se falar em “suspensão de liminar”, “suspensão de sentença”, “suspensão de acórdão” etc.

PREVISÃO LEGAL Há cinco diferentes dispositivos legais prevendo pedido de suspensão:

art. 12, § 1º da Lei nº 7.347/85 (suspensão de liminar em ACP);

art. 4º da Lei nº 8.437/92 (suspensão de liminar ou sentença em ação cautelar, em ação popular ou em ACP). É considerada pela doutrina como a previsão mais geral sobre o pedido de suspensão;

art. 1º da Lei nº 9.494/97 (suspensão de tutela antecipada concedida contra a Fazenda Pública);

art. 16 da Lei nº 9.507/97 (suspensão da execução de sentença concessiva de habeas data);

art. 15 da Lei nº 12.016/09 (suspensão de liminar e sentença no mandado de segurança).

Lei nº 8.437/92:

Art. 4° Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. § 1° Aplica-se o disposto neste artigo à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, no processo de ação popular e na ação civil pública, enquanto não transitada em julgado.

NATUREZA JURÍDICA Prevalece que se trata de um “incidente processual” (Leonardo José Carneiro da Cunha). A decisão de suspensão de segurança possui caráter político ou jurisdicional?

1ª corrente: POLÍTICO 2ª corrente: JURISDICIONAL

Trata-se de um juízo político a respeito da lesividade do ato judicial à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. É a posição pacífica do STJ. É com base nesse entendimento que o STJ não admite recurso especial contra decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão de segurança. Segundo o STJ, o recurso especial se destina a combater argumentos que digam respeito a exame de legalidade, ao passo que o pedido de suspensão ostentaria juízo político.

A 1ª Turma do STF entendeu que a decisão em sede de suspensão de segurança não é estritamente política, possuindo conteúdo jurisdicional. Com base nessa compreensão, a 1ª Turma do STF chegou à conclusão que é cabível, em tese, recurso especial contra decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão de segurança (RE 798740 AgR/DF).

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POSSIBILIDADE DE FORMULAR PEDIDO DE SUSPENSÃO E INTERPOR RECURSO Contra uma decisão interlocutória proferida por um juiz, em 1ª instância, poderão ser interpostos o agravo de instrumento e, concomitantemente, o pedido de suspensão. Isso porque o pedido de suspensão não é recurso. Logo, não há violação ao princípio da singularidade ou unirrecorribilidade. Além disso, os objetivos do agravo e do pedido de suspensão são diferentes. Vale ressaltar que essa possibilidade é prevista expressamente:

Lei n.° 8.437/92 Art. 4º (...) § 6º A interposição do agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações movidas contra o Poder Público e seus agentes não prejudica nem condiciona o julgamento do pedido de suspensão a que se refere este artigo.

Lei n.° 12.016/2009 Art. 15 (...) § 3º A interposição de agravo de instrumento contra liminar concedida nas ações movidas contra o poder público e seus agentes não prejudica nem condiciona o julgamento do pedido de suspensão a que se refere este artigo.

LEGITIMIDADE Quem pode formular pedido de suspensão? a) União, Estados, Distrito Federal e Municípios; b) autarquias e fundações; c) Ministério Público; d) concessionárias de serviço público (desde que para tutelar o interesse público primário). COMPETÊNCIA

Decisão prolatada por juiz de 1ª instância:

A competência para apreciar o pedido de suspensão é do Presidente do Tribunal que teria competência para julgar o recurso contra a decisão. Ex: concedida liminar por juiz federal do AM, o pedido de suspensão será julgado pelo Presidente do TRF1. Ex2: concedida liminar por juiz de direito do AM, o pedido de suspensão será julgado pelo Presidente do TJAM.

Decisão prolatada por membro de TJ ou TRF:

O pedido de suspensão será decidido pelo:

Presidente do STF: se a matéria for constitucional.

Presidente do STJ: se a matéria for infraconstitucional. Ex: concedida liminar pelo Desembargador do TJ/AM, o pedido de suspensão será dirigido ao Presidente do STF ou do STJ, e não ao Presidente do TJ/AM (art. 25 da Lei nº 8.038/90).

Decisão prolatada por membro de Tribunal Superior:

Se a causa tiver fundamento constitucional, é possível o ajuizamento de pedido de suspensão dirigido ao Presidente do STF. Se a causa não tiver fundamento constitucional, não há possibilidade de pedido de suspensão.

NÃO SE EXAMINA O MÉRITO NO PEDIDO DE SUSPENSÃO: Na análise do pedido de suspensão, é vedado o exame do mérito da demanda principal. O que será examinado pelo Tribunal é se a decisão prolatada acarreta risco de grave lesão à: a) ordem; b) saúde; c) segurança; ou d) economia públicas.

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A suspensão de liminar e de sentença limita-se a averiguar a possibilidade de grave lesão à ordem, à segurança, à saúde e à economia públicas. Os temas de mérito da demanda principal não podem ser examinados nessa medida, que não substitui o recurso próprio. (AgRg na SLS 1.135/MA, Rel. Ministro PRESIDENTE DO STJ, Rel. p/ Acórdão Ministro CESAR ASFOR ROCHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 12/04/2010, DJe 20/05/2010) APESAR DE NÃO SE EXAMINAR O MÉRITO, DEVE SER REALIZADO UM JUÍZO MÍNIMO DE DELIBAÇÃO Mesmo sendo vedado ao Presidente do Tribunal examinar o mérito da demanda principal, é preciso, para que se conceda a suspensão de liminar, que haja um mínimo de plausibilidade na tese da Fazenda Pública, porque o pedido de suspensão funciona como uma contracautela, devendo, por isso, demonstrar fumus boni iuris e periculum in mora inverso: (...) 1. A jurisprudência pacificada do Supremo Tribunal Federal permite o proferimento de um juízo mínimo de delibação, no que concerne ao mérito objeto do processo principal, quando da análise do pedido de suspensão de decisão (SS 846-AgR/DF, rel. Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 29.5.96; SS 1.272-AgR, rel. Ministro Carlos Velloso, DJ 18.5.2001, dentre outros). (STA 73 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2008, DJe-078 DIVULG 30-04-2008 PUBLIC 02-05-2008 EMENT VOL-02317-01 PP-00001) RECURSO CONTRA A DECISÃO PROFERIDA NO PEDIDO DE SUSPENSÃO: Da decisão do Presidente do Tribunal que conceder ou negar a suspensão cabe algum recurso? SIM. Caberá agravo interno para o Plenário ou Corte Especial do Tribunal. Nesse sentido, veja o § 3º do art. 4º da Lei nº 8.437/92:

§ 3º Do despacho que conceder ou negar a suspensão, caberá agravo, no prazo de cinco dias, que será levado a julgamento na sessão seguinte a sua interposição.

Obs: o prazo para esse agravo é de 5 dias mesmo que tenha sido interposto pela Fazenda Pública ou pelo MP. Em outras palavras, NÃO incide o art. 188 do CPC (que confere prazo em dobro para recorrer à Fazenda Pública ou ao MP) na hipótese de o recurso interposto ser o incidente de suspensão de liminar previsto no art. 4º, § 3º da Lei 8.437/1992. STJ. 2ª Turma. REsp 1.331.730-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 7/5/2013 (Info 523). Cabe recurso especial da decisão do Plenário ou da Corte Especial que julga esse agravo?

Segundo o STJ: NÃO. Não cabe Recurso Especial de decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão. O recurso especial se destina a combater argumentos que digam respeito a exame de legalidade, ao passo que o pedido de suspensão ostentaria juízo político.

Segundo a 1ª Turma do STF: SIM. A 1ª Turma do STF entendeu que a decisão em sede de suspensão de segurança não é estritamente política, possuindo conteúdo jurisdicional. Com base nisso, decidiu que é cabível, em tese, recurso especial contra decisões proferidas no âmbito do pedido de suspensão de segurança (RE 798740 AgR/DF).

NOVO PEDIDO DE SUSPENSÃO: No entanto, se, na decisão do agravo, não for concedida ou mantida a suspensão, a Fazenda Pública ainda terá outro instrumento: apresentar novo pedido de suspensão, desta vez para o STJ ou para o STF, a depender da natureza da matéria (se infraconstitucional ou constitucional). Lei n.° 8.437/92

Art. 4º (...) § 4º Se do julgamento do agravo de que trata o § 3º resultar a manutenção ou o restabelecimento da decisão que se pretende suspender, caberá novo pedido de suspensão ao Presidente do Tribunal competente para conhecer de eventual recurso especial ou extraordinário.

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Ex1: juiz concede liminar contra a Fazenda Pública, que formula pedido de suspensão para o Presidente do TJ; este concede a suspensão; a parte autora agrava da decisão do Presidente para o Plenário, que reforma a decisão do Presidente e restabelece a liminar concedida em primeira instância. Dessa decisão do Plenário, a Fazenda Pública terá a possibilidade de formular novo pedido de suspensão para o STJ ou para o STF. Ex2: juiz concede liminar contra a Fazenda Pública, que formula pedido de suspensão para o Presidente do TJ; este não concede a suspensão; a Fazenda Pública agrava da decisão do Presidente para o Plenário, que mantém a decisão do Presidente e a liminar concedida em primeira instância. Dessa decisão do Plenário, a Fazenda Pública terá a possibilidade de formular novo pedido de suspensão para o STJ ou para o STF. A doutrina afirma que se trata de um pedido de suspensão “por salto de instância”.

RECURSO EXTRAORDINÁRIO Reconhecida a repercussão geral, não é mais possível que as partes desistam do processo

Importante!!!

Um dos pressupostos de admissibilidade do recurso extraordinário é a repercussão geral.

Desse modo, para que o RE seja conhecido, é necessário que o recorrente demonstre a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso.

Antes do STF apreciar o mérito do recurso, ele primeiro decide se aquele determinado tema discutido possui repercussão geral.

É comum que essa decisão reconhecendo a existência de repercussão geral seja proferida em uma data e somente meses ou até anos depois é que o STF aprecia o mérito do recurso.

O STF decidiu que, uma vez reconhecida a repercussão geral da questão constitucional discutida no caso, não é mais possível às partes a desistência do processo.

O novo CPC permite que a parte desista, mas afirma que a questão cuja repercussão geral foi reconhecida continuará sendo analisada. Veja:

Art. 998. O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso.

Parágrafo único. A desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos.

STF. Plenário. RE 693456/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 2/9/2015 (Info 797).

Análise por amostragem da repercussão geral Um dos pressupostos de admissibilidade do recurso extraordinário é a repercussão geral. Desse modo, para que o RE seja conhecido, é necessário que o recorrente demonstre a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso. O STF não conhecerá do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não oferecer repercussão geral. O objetivo da exigência da “repercussão geral” foi o de evitar que o STF julgasse recursos extraordinários de menor relevância, contribuindo, assim, para a redução do volume de processos na Corte. Diz-se que há repercussão geral no recurso extraordinário quando existem questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassam os interesses subjetivos da causa.

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Quando houver uma grande quantidade de recursos extraordinários que versem sobre o mesmo tema, o STF poderá fazer a análise da repercussão geral por amostragem. Dito de forma mais simples, o STF seleciona um ou alguns poucos recursos extraordinários, debate a tese ali apresentada, chega a uma conclusão e aplica a mesma solução para todos os demais recursos semelhantes. Decisão reconhecendo a repercussão geral Antes de o STF apreciar o mérito do recurso, ele primeiro decide se aquele determinado tema discutido possui repercussão geral. É comum que essa decisão reconhecendo a existência de repercussão geral seja proferida em uma data e somente meses ou até anos depois é que o STF aprecia o mérito do recurso. Depois que o STF reconhece a repercussão geral é incabível a desistência O STF decidiu que, uma vez reconhecida a repercussão geral da questão constitucional discutida no caso, não é mais possível às partes a desistência do processo. No caso concreto, pouco tempo antes de instaurar-se a sessão de julgamento, a parte recorrida peticionou ao STF pedindo a desistência do mandado de segurança que ensejara o recurso extraordinário. O Relator afirmou que, em regra, a parte impetrante pode desistir do mandado de segurança, independentemente da concordância da autoridade coatora, da parte contrária ou da entidade estatal interessada. Esse é o entendimento do STF firmado no RE 669.367/RJ (DJe de 29.10.2014). No entanto, no caso concreto, a situação seria diferente, uma vez que o processo está em fase de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida. Estando com a repercussão geral reconhecida, o processo perde o caráter individual e ganha contornos de processo objetivo, uma vez que na decisão a ser proferida irá ser construída uma tese geral que irá influenciar outros casos semelhantes. CPC 2015 O novo CPC permite que a parte desista, mas afirma que a questão cuja repercussão geral foi reconhecida continuará sendo analisada. Em outras palavras, a parte pode até desistir do processo, mas mesmo assim a tese jurídica que era discutida na lide será definida pelo STF. Veja:

Art. 998. O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso. Parágrafo único. A desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos.

Confira o que diz a doutrina: "O parágrafo único do art. 998, por sua vez, busca compatibilizar o interesse público subjacente ao julgamento de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida e recursos extraordinários e/ou repetitivos já afetados como tais como o interesse das partes. A melhor interpretação para a nova regra é a de que a questão jurídica derivada do recurso poderá ser julgada, a despeito da desistência; não o recurso do qual se desistiu, cujo processo terá sorte apartada daquele outro julgamento, ocasionando que a decisão recorrida, eventualmente - se for este o caso -, transite materialmente em julgado." (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, p. 640). "(...) o art. 998, parágrafo único, CPC, permite que o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça se pronunciem sobre questões recursais ainda que a parte tenha desistido do recurso. Nesse caso, obviamente que a pronúncia da Corte não poderá alcançar o recurso da parte. Servirá, porém, para outorgar unidade ao direito, valendo como precedente." (MARINONI, Luiz Guilherme; AREHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: RT, 2015, p. 933).

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DIREITO PROCESSUAL PENAL

PROCEDIMENTOS Aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) ao processo penal

Importante!!!

É cabível a aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) ao processo penal.

Se no processo civil, em que se discutem direitos disponíveis, concede-se prazo em dobro, com mais razão no processo penal, em que está em jogo a liberdade do cidadão.

STF. Plenário. Inq 3983/DF, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 3/9/2015 (Info 797).

STF. Plenário. Inq 4112/DF, rel. orig. Min. Teori Zavascki, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 1º/9/2015 (Info 797).

Lei n. 8.038/90 (regula os processos criminais de competência originária do STF/STJ) Se a ação penal for de competência do STF e STJ, ela deverá obedecer a um rito processual próprio

previsto na Lei n. 8.038/90. Ex: se um Governador for acusado da prática de um crime, esta ação penal

tramitará originariamente no STJ e o procedimento será o da Lei n. 8.038/90 (o CPP será aplicado apenas subsidiariamente).

O procedimento da Lei n. 8.038/90 é, resumidamente, o seguinte: 1. Oferecimento de denúncia (ou queixa). 2. Notificação do acusado para oferecer resposta preliminar no prazo de 15 dias (antes de receber a denúncia) (art. 4º). 3. Se, com a resposta, o acusado apresentar novos documentos, a parte contrária (MP ou querelante) será intimada para se manifestar sobre esses documentos, no prazo de 5 dias. 4. O Tribunal irá se reunir e poderá (art. 6º): a) receber a denúncia (ou queixa); b) rejeitar a denúncia (ou queixa); c) julgar improcedente a acusação se a decisão não depender de outras provas (neste caso, o acusado é, de fato, absolvido). Importante: a decisão quanto ao recebimento ou não da denúncia ocorre após o denunciado apresentar resposta. 5. Se a denúncia (ou queixa) for recebida, o Relator designa dia e hora para audiência.

Ao contrário do que ocorre no procedimento do CPP, a Lei n. 8.038/90 não prevê a existência de uma fase para absolvição sumária, tal qual existente no art. 397 do CPP.

Feitas estas considerações, vejamos o caso concreto: O Procurador-Geral da República ofereceu denúncia, no STF, contra o Presidente da Câmara dos Deputados e contra outra pessoa (corréu) pela suposta prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O próximo passo seria a notificação dos denunciados para apresentarem resposta preliminar no prazo de 15 dias (art. 4º da Lei nº 8.038/90). Ocorre que a defesa do Deputado pediu ao STF que o prazo da resposta preliminar, assim como todos os demais prazos, fossem contados em dobro, aplicando-se, ao processo penal, por analogia, o art. 191 do CPC 1973:

Art. 191. Quando os litisconsortes tiverem diferentes procuradores, ser-lhes-ão contados em dobro os prazos para contestar, para recorrer e, de modo geral, para falar nos autos.

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O CPC 2015 também traz regra semelhante, exigindo, contudo, que, além de serem procuradores (advogados) diferentes, os causídicos também sejam de escritórios de advocacia diferentes. Veja:

Art. 229. Os litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, terão prazos contados em dobro para todas as suas manifestações, em qualquer juízo ou tribunal, independentemente de requerimento.

Segundo argumentou o Deputado, ele está sendo acusado juntamente com outra pessoa (litisconsórcio passivo no processo penal) e os dois réus estão sendo assistidos por escritórios de advocacia diferentes. Logo, aplica-se perfeitamente o art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015). Essa tese foi acatada pelo STF? É possível aplicar o art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) por analogia ao processo penal? SIM. É cabível a aplicação analógica do art. 191 do CPC 1973 (art. 229 do CPC 2015) ao prazo previsto no art. 4º da Lei nº 8.038/1990 (“Apresentada a denúncia ou a queixa ao Tribunal, far-se-á a notificação do acusado para oferecer resposta no prazo de quinze dias”). O Min. Luiz Fux argumentou que, se no processo civil, em que se discutem direitos disponíveis, concede-se prazo em dobro, com mais razão no processo penal, em que está em jogo a liberdade do cidadão. Obs1: para alguns, pode parecer estranho, mas se em um processo criminal existem dois ou mais réus, tem-se, no caso, um litisconsórcio passivo, considerando que o MP (ou o querelante) é o autor da ação penal e os réus estão no polo passivo. Obs2: o precedente acima foi envolvendo a Lei nº 8.038/90, mas penso que nada impede que esse mesmo entendimento seja aplicado aos procedimentos regidos pelo CPP. É possível aplicar regras do CPC, por analogia, ao processo penal? SIM. A analogia é vedada no Direito Penal, salvo se beneficiar o réu (analogia in bonam partem). No processo penal, não existe esta mesma vedação, tendo em vista que as normas processuais não são incriminadoras. Veja a autorização expressa prevista no CPP para a aplicação analógica:

Art. 3º A lei processual penal admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos princípios gerais de direito.

Precedente no caso "Mensalão" Vale ressaltar que o STF já havia admitido que as partes (MP e defesa) tivessem prazo em dobro para recorrer (embargos de declaração) no caso do “Mensalão”, utilizando como argumento justamente o fato de que havia, no caso, um litisconsórcio passivo (vários réus), com advogados diferentes, devendo, portanto, ser aplicada, por analogia, a regra prevista no art. 191 do CPC (STF. Plenário. AP 470 Vigésimo Segundo AgR/MG, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 17/4/2013).

RECURSOS Situação de reformatio in pejus mesmo tendo havido redução da pena final

João foi condenado em 1ª instância a uma pena de 2 anos pela prática do crime de furto qualificado pela escalada (art. 155, § 4º, II, do CP). O Ministério Público não recorreu, transitando em julgado a sentença para a acusação. A defesa do réu interpôs apelação. O Tribunal de Justiça entendeu que não estavam presentes os requisitos necessários para a configuração da qualificadora da escalada (art. 155, § 4º, II) e, por isso, a retirou, transformando em furto simples. Até aí, tudo bem. Esse era um dos pedidos do recurso. Ocorre

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que os Desembargadores foram além e decidiram reconhecer a presença da causa de aumento prevista no § 1º do art. 155 do CP, em virtude de estar provado nos autos que o furto ocorreu durante o repouso noturno. Assim, o TJ afastou a condenação pelo art. 155, § 4º, II, do CP e condenou o réu pelo art. 155, § 1º, do CP. Com base nessa nova capitulação, o TJ fixou a pena do réu em 1 ano e 4 meses. Agiu corretamente o TJ?

NÃO. O STF entendeu que a decisão do TJ violou o princípio do non reformatio in pejus, devendo ser refeita a dosimetria. O TJ acrescentou uma causa de aumento de pena (art. 155, § 1º) que não havia sido reconhecida na sentença em 1ª instância. Como o recurso era exclusivo da defesa, o TJ não poderia ter inserido na condenação uma circunstância contrária ao réu e que não estava presente anteriormente. Assim, mesmo aparentemente a decisão do TJ tendo sido benéfica ao réu (por ter reduzido a pena), na verdade, houve, na parte referente à causa de aumento, uma reforma para pior.

STF. 2ª Turma. RHC 126763/MS, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, julgado em 1º/9/2015 (Info 797).

Imagine a seguinte situação hipotética: João foi condenado em 1ª instância a uma pena de 2 anos pela prática do crime de furto qualificado pela escalada (art. 155, § 4º, II, do CP). O Ministério Público não recorreu, transitando em julgado a sentença para a acusação. A defesa do réu interpôs apelação. O Tribunal de Justiça entendeu que não estavam presentes os requisitos necessários para a configuração da qualificadora da escalada (art. 155, § 4º, II) e, por isso, a retirou, transformando em furto simples. Até aí, tudo bem. Esse era um dos pedidos do recurso. Ocorre que os Desembargadores foram além e decidiram reconhecer a presença da causa de aumento prevista no § 1º do art. 155 do CP, em virtude de estar provado nos autos que o furto ocorreu durante o repouso noturno. Assim, o TJ afastou a condenação pelo art. 155, § 4º, II, do CP e condenou o réu pelo art. 155, § 1º, do CP. Com base nessa nova capitulação, o TJ fixou a pena do réu em 1 ano e 4 meses. Agiu corretamente o TJ? NÃO. O STF entendeu que a decisão do TJ violou o princípio do non reformatio in pejus, devendo ser refeita a dosimetria. Mas o TJ reduziu a pena do réu de 2 anos para 1 ano e 4 meses... mesmo assim pode-se dizer que houve reformatio in pejus (reforma em prejuízo do recorrente)? SIM. Isso porque o TJ acrescentou uma causa de aumento de pena (art. 155, § 1º) que não havia sido reconhecida na sentença em 1ª instância. Como o recurso era exclusivo da defesa, o TJ não poderia ter inserido na condenação uma circunstância contrária ao réu e que não estava presente anteriormente. Assim, mesmo aparentemente a decisão do TJ tendo sido benéfica ao réu (por ter reduzido a pena), na verdade, houve, na parte referente à causa de aumento, uma reforma para pior. O STF entendeu que houve violação à parte final do art. 617 do CPP:

Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

Prevaleceu a tese de que a melhor interpretação a ser dada à parte final do art. 617 do CPP seria a sistemática, a levar em conta que a norma está inserida em um conjunto organizado de ideias e, por isso, a vedação da “reformatio in pejus” não se restringe à quantidade final de pena, devendo ser analisado se o Tribunal acrescentou alguma imputação (seja ela qualificadora, causa de aumento etc.) que não estava prevista anteriormente na condenação. Em outras palavras, não se deve analisar apenas a quantidade final da pena.

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JULGADO NÃO COMENTADO

Agravo regimental e interesse recursal O Plenário, por maioria, não conheceu de agravo regimental interposto pelo Presidente da Câmara dos Deputados em face de decisão monocrática que indeferira pedido de medida liminar formulado em mandado de segurança em que se pleiteava a suspensão da análise isolada, pela Câmara dos Deputados, dos Projetos de Decreto Legislativo 384/1997, 1.376/2009, 40/2011 e 42/2011, mas que sinalizara ao Congresso Nacional que as votações futuras de contas presidenciais anuais deveriam ocorrer em sessão conjunta. A Corte afirmou que estaria configurada, na espécie, a falta de interesse recursal, na medida em que não haveria, na decisão monocrática objeto de impugnação, ato com conteúdo decisório desfavorável ao agravante. Naquela decisão, quando da apreciação do pedido de liminar, fora assentada a existência do “fumus boni iuris”. Isso porque decorreria da Constituição que a competência para julgar as contas do Presidente da República seria das duas casas do Congresso Nacional e não de cada uma delas individualmente. Essa interpretação seria extraída do seguinte conjunto de argumentos constitucionais, então demonstrados: a) caráter exemplificativo do rol de hipóteses de sessões conjuntas (CF, art. 57, § 3º); b) natureza mista da comissão incumbida do parecer sobre as contas (CF, art. 161, § 1º); c) reserva da matéria ao regimento comum, que disciplina as sessões conjuntas (CF, art. 161, “caput” e § 2º), nas quais ambas as Casas se manifestam de maneira simultânea; d) previsão expressa, pois quando a Constituição desejara a atuação separada de uma das Casas em matéria de contas presidenciais assim o fizera (CF, art. 51, II); e e) simetria entre a forma de deliberação das leis orçamentárias e a de verificação do respectivo cumprimento. Portanto, fora destacada, naquele ato, a existência de plausibilidade do direito alegado. No entanto, constatado que, na ocasião, as contas presidenciais em questão já haviam sido julgadas, não se verificaria o “periculum in mora”, devendo ser denegada a liminar. Assim, não teria sido praticado nenhum ato desfavorável à Câmara dos Deputados. Em última análise, o agravo em questão se insurgiria contra a fundamentação da decisão monocrática proferida, na parte do “fumus boni iuris”. Vencido o Ministro Gilmar Mendes, que negava provimento ao agravo regimental por entender presente o interesse recursal. MS 33729/DF, rel. Min. Roberto Barroso, 3.9.2015.

OUTRAS INFORMAÇÕES

R E P E R C U S S Ã O G E R A L DJe de 31 de agosto a 4 de setembro de 2015

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 851.421-DF

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

IMPOSTO SOBRE A CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS – GUERRA FISCAL – BENEFÍCIOS FISCAIS DECLARADOS

INCONSTITUCIONAIS – CONVALIDAÇÃO SUPERVENIENTE MEDIANTE NOVA DESONERAÇÃO – RECURSO EXTRAORDINÁRIO –

REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia relativa à constitucionalidade da prática mediante a qual os estados e o Distrito Federal, respaldados em consenso alcançado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, perdoam

dívidas tributárias surgidas em decorrência do gozo de benefícios fiscais assentados inconstitucionais pelo Supremo, porque implementados em meio

à chamada guerra fiscal do ICMS.

REPERCUSSÃO GERAL EM ARE N. 884.325-DF

RED. P/ O ACÓRDÃO: MIN. EDSON FACHIN

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ECONÔMICO. INTERVENÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA. NORMAS DE INTERVENÇÃO. LIBERDADE

DE INICIATIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SETOR SUCROALCOOLEIRO. QUALIFICAÇÃO JURÍDICA DO DANO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. Tem repercussão geral a questão relativa à responsabilidade objetiva da União e à qualificação jurídica

do dano causado ao setor sucroalcooleiro, em virtude da fixação dos preços dos produtos do setor em valores inferiores ao levantamento de custos realizados pela Fundação Getúlio Vargas, levando-se em conta o valor constitucional da livre iniciativa e a intervenção do Estado no domínio

econômico.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 662.055-SP

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 11

RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DIREITOS DOS ANIMAIS E

RELEVANTE PREJUÍZO COMERCIAL A EVENTO CULTURAL TRADICIONAL. RESTRIÇÕES A PUBLICAÇÕES E DANOS MORAIS. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.

1. A decisão recorrida impôs restrições a publicações em sítio eletrônico de entidade de proteção aos animais, que denunciava a crueldade da

utilização de animais em rodeios, condenando-a ao pagamento de danos morais e proibindo-a de contactar patrocinadores de um evento específico, tradicional e culturalmente importante.

2. Constitui questão constitucional da maior importância definir os limites da liberdade de expressão em contraposição a outros direitos de igual

hierarquia jurídica, como os da inviolabilidade da honra e da imagem, bem como fixar parâmetros para identificar hipóteses em que a publicação deve ser proibida e/ou o declarante condenado ao pagamento de danos morais, ou ainda a outras consequências jurídicas.

3. Repercussão geral reconhecida.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 848.826-DF

RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO

Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ELEITORAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. JULGAMENTO DAS CONTAS DO CHEFE DO

PODER EXECUTIVO COMO ORDENADOR DE DESPESAS. COMPETÊNCIA: PODER LEGISLATIVO OU TRIBUNAL DE CONTAS.

REPERCUSSÃO GERAL. 1. Inadmissão do recurso no que diz respeito às alegações de violação ao direito de petição, inafastabilidade do controle judicial, devido processo

legal, contraditório, ampla defesa e fundamentação das decisões judiciais (arts. 5º, XXXIV, a, XXXV, LIV e LV, e 93, IX, da CF/1988). Precedentes:

AI 791.292 QO-RG e ARE 748.371 RG, Rel. Min. Gilmar Mendes. 2. Constitui questão constitucional com repercussão geral a definição do órgão competente – Poder Legislativo ou Tribunal de Contas – para julgar as

contas de Chefe do Poder Executivo que age na qualidade de ordenador de despesas, à luz dos arts. 31, § 2º; 71, I; e 75, todos da Constituição.

3. Repercussão geral reconhecida.

Decisões Publicadas: 4

C L I P P I N G D O D JE 31 de agosto a 4 de setembro de 2015

AG. REG. NO ARE N. 669.072-MG RELATORA: MIN. ROSA WEBER EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. COFINS E CSLL. COMPENSAÇÃO. REVOGAÇÃO MEDIANTE MEDIDA PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DE HIERARQUIA ENTRE LEI COMPLEMENTAR E LEI ORDINÁRIA. CONSONÂNCIA DA DECISÃO RECORRIDA COM A JURISPRUDÊNCIA CRISTALIZADA NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, II, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEGALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL DA CONTROVÉRSIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ARTIGO 93, IX, DA CARTA MAGNA. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO QUE NÃO MERECE TRÂNSITO. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 16.3.2011. 1. O entendimento adotado pela Corte de origem, nos moldes do assinalado na decisão agravada, não diverge da jurisprudência firmada no âmbito deste Supremo Tribunal Federal, no sentido da inexistência de reserva de lei complementar para dispor sobre isenção pertinente à Cofins, bem como ausente relação hierárquica entre lei complementar e lei ordinária (art. 59 da Constituição) porquanto, em matéria tributária, a reserva de lei complementar é definida em razão da matéria. 2. Obstada a análise da suposta afronta aos incisos II e LV do artigo 5º da Carta Magna, porquanto dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, procedimento que refoge à competência jurisdicional extraordinária desta Corte Suprema, a teor do art. 102 da Magna Carta. 3. Inexiste violação do artigo 93, IX, da Constituição Federal. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes. 4. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 5. Agravo regimental conhecido e não provido.

AG. REG. NO HC N. 128.617-RN RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. CRIMES DE ROUBO MAJORADO E

RECEPTAÇÃO. ALEGAÇÕES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA E CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. 1. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido da inadmissibilidade do uso da ação de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal (v.g HC 109.956, Rel. Min. Marco Aurélio; e HC 104.045, Rel.ª Min.ª Rosa Weber). Da mesma forma, o Supremo Tribunal Federal não admite a utilização do habeas corpus em substituição à ação de revisão criminal (v.g, RHC119.605-AgR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso; HC 111.412-AgR, Rel. Min. Luiz Fux; RHC 114.890, Rel. Min. Dias Toffoli; HC 116.827-MC, Rel. Min. Teori Zavascki; RHC 116.204, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia; e RHC 115.983, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 2. A alegação de inépcia da denúncia não foi apreciada pela autoridade impetrada, o que impede o imediato exame da matéria, sob pena de indevida supressão de instância (v.g HC 116.350-AgR, Relª Minª Rosa Weber, e HC 114.166, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). Não bastasse, a orientação jurisprudencial desta Corte é no sentido de que a “A alegação de inépcia da denúncia está preclusa quando suscitada após a sentença penal condenatória” (RHC 105.730, Rel. Min. Teori Zavascki). No mesmo sentido: RHC 120.473, Rel.ª Min.ª Rosa Weber; RHC 122.465-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes; RHC 120.751, Rel.ª Min.ª Rosa Weber; HC 111.363, Rel. Min. Luiz Fux; RHC 116.619, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 3. Quanto à alegação de cerceamento do direito de defesa, o acolhimento da pretensão defensiva quanto à análise do exaurimento, ou não, dos meios necessários para a localização do paciente demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório da causa, inviável na via processualmente restrita do habeas corpus, notadamente após o trânsito em julgado da condenação. 4. Agravo regimental desprovido.

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 12

AG. REG. NO HC N. 128.693-SP RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS CONTRA ATO DE MINISTRO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CASA DE PROSTITUIÇÃO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. DOSIMETRIA DA PENA. REGIME INICIAL. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. 1. Inexistindo pronunciamento colegiado do Superior Tribunal de Justiça, não compete ao Supremo Tribunal Federal examinar a questão de direito implicada na impetração. Nesse sentido foram julgados os seguintes precedentes: HC 113.468, Rel. Min. Luiz Fux; HC 117.502, Relator para o acórdão o Min. Luís Roberto Barroso; HC 108.141-AgR, Rel. Min. Teori Zavascki; e o HC 122.166-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski. 2. O Supremo Tribunal Federal não admite a utilização do habeas corpus em substituição à ação de revisão criminal (v.g, RHC119.605-AgR, Rel. Min. Luís Roberto Barroso; HC 111.412-AgR, Rel. Min. Luiz Fux; RHC 114.890, Rel. Min. Dias Toffoli; HC 116.827-MC, Rel. Min. Teori Zavascki; RHC 116.204, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia; e RHC 115.983, Rel. Min. Ricardo Lewandowski). 3. A dosimetria da pena é questão relativa ao mérito da ação penal, estando necessariamente vinculada ao conjunto fático probatório, não sendo possível às instâncias extraordinárias a análise de dados fáticos da causa para redimensionar a pena finalmente aplicada. De modo que a discussão a respeito da dosimetria da pena se cinge ao controle da legalidade dos critérios utilizados, restringindo-se, portanto, ao exame da “motivação [formalmente idônea] de mérito e à congruência lógico-jurídica entre os motivos declarados e a conclusão” (HC 69.419, Rel. Min. Sepúlveda pertence). 4. A orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que “A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea” (Súmula 719/STF). 5. As instâncias de origem, ao concluírem que a conversão da reprimenda não se mostra recomendável diante da presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, também não divergiram da jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal (vg. RHC 122.132-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes; HC 117.719, Rel. Min. Teori Zavasacki; HC 119.811, Rel. Min. Teori Zavascki; ARE 774.815-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes; RHC 118.658, Rel. Min. Luiz Fux). 6. Agravo regimental desprovido.

AG. REG. NO RHC N. 118.621-ES RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. FORMAÇÃO DE QUADRILHA, FALSIDADE IDEOLÓGICA E LAVAGEM DE DINHEIRO. INTERCEPTAÇÕES

TELEFÔNICAS. 1. As instâncias precedentes afirmaram que a interceptação telefônica foi precedida de diligências preliminares que demonstraram a “necessidade e indispensabilidade da medida”. Para dissentir-se desse entendimento seria necessário o revolvimento de fatos e provas, inviável na via do habeas corpus. 2. “O Supremo Tribunal Federal afasta a necessidade de transcrição integral dos diálogos gravados durante quebra de sigilo telefônico, rejeitando alegação de cerceamento de defesa pela não transcrição de partes da interceptação irrelevantes para o embasamento da denúncia” (Inq. 3693, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia). No mesmo sentido, o AI 685878-AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

AG. REG. NO RE N. 869.633-SC RELATORA: MIN. ROSA WEBER EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. ADICIONAL DE RISCO DE VIDA. DISCUSSÃO ACERCA DA NATUREZA JURÍDICA DA VERBA. DEBATE DE ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, II, XXXVI, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LEGALIDADE. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. EVENTUAL OFENSA REFLEXA NÃO VIABILIZA O MANEJO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ART. 102 DA LEI MAIOR. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ARTIGO 93, IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NULIDADE. INOCORRÊNCIA. RAZÕES DE DECIDIR EXPLICITADAS PELO ÓRGÃO JURISDICIONAL. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 02.6.2014. 1. A controvérsia, a teor do já asseverado na decisão guerreada, não alcança estatura constitucional. Não há falar em afronta aos arts. 150, I, 154, I, e 195, I, “a”, da Constituição Federal. Compreender de modo diverso exigiria a análise da legislação infraconstitucional encampada na decisão da Corte de origem, a tornar oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, como tal, de viabilizar o conhecimento do recurso extraordinário. 2. Inexiste violação do artigo 93, IX, da Lei Maior. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o referido dispositivo constitucional exige a explicitação, pelo órgão jurisdicional, das razões do seu convencimento, dispensando o exame detalhado de cada argumento suscitado pelas partes. 3. O exame da alegada ofensa ao art. 5º, II, XXXVI, LIV e LV, da Constituição Federal, observada a estreita moldura com que devolvida a matéria à apreciação desta Suprema Corte, dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, o que refoge à competência jurisdicional extraordinária, prevista no art. 102 da Magna Carta. 4. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada. 5. Agravo regimental conhecido e não provido.

EMB.DECL. NO AG. REG. NO RE N. 632.343-RJ RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI EMENTA: Embargos de declaração no agravo regimental no recurso extraordinário. Matéria criminal. Omissão no acórdão questionado não caracterizada. Caráter manifestamente protelatório do recurso. Pretensão de alcançar a prescrição da pretensão punitiva. Risco iminente da prescrição. Possibilidade de baixa imediata dos autos independentemente da publicação da decisão. Entendimento consolidado na jurisprudência da Corte. Precedentes. Rejeição dos embargos. Baixa imediata dos autos ao juízo de origem. 1. Nenhuma das hipóteses autorizadoras da oposição do recurso declaratório (RISTF, art. 337) está configurada no caso dos autos, já que o acórdão embargado abordou, de forma fundamentada, todos os pontos colocados em debate, nos limites necessários ao deslinde da controvérsia. 2. Intenção de se procrastinar a prestação jurisdicional da Corte e, assim, obstar a persecução penal, uma vez a prescrição da pretensão punitiva, pela pena em abstrato, se avizinha (29/8/15). 3. Hipótese absolutamente repelida pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a qual consigna que a utilização de recurso manifestamente protelatório autoriza o imediato cumprimento da decisão proferida pela Suprema Corte, independentemente da publicação do acórdão (RE nº 839.163/DF-QO, Tribunal Pleno, de minha relatoria, DJe de 9/2/15). 4. Embargos de declaração rejeitados. 5. Baixa imediata dos autos ao juízo de origem, independentemente da publicação do acórdão, tendo em vista o caráter manifestamente protelatório do recurso.

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 13

AG. REG. NO ARE N. 851.864-ES RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Constitucional. Terreno de marinha. Ilha costeira. Sede de Município. EC nº 46/2005. Propriedade. Titularidade. Discussão. Repercussão geral. Decisão que determina o retorno dos autos à origem. Precedentes. 1. O Supremo Tribunal Federal, no exame do RE nº 636.199/ES, Relatora a Ministra Rosa Weber, reconheceu a repercussão geral da matéria relativa à “situação dos terrenos de marinha localizados em ilhas costeiras com sede em município, após advento da Emenda Constitucional 46/2005”. 2. Manutenção da decisão que, com base no art. 328, parágrafo único, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, determinou a devolução dos autos ao Tribunal de origem para a observância do disposto no art. 543-B do Código de Processo Civil. 3. Agravo regimental não provido.

AG. REG. NO ARE N. 880.159-SC RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI EMENTA: Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Princípio da legalidade. Ofensa reflexa. Servidor público. Gratificação. Direito à percepção. Fatos e provas. Reexame. Impossibilidade. Valores recebidos de boa-fé. Restituição. Discussão. Ausência de repercussão geral. Precedentes. 1. A afronta aos princípios da legalidade, do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório, dos limites da coisa julgada ou da prestação jurisdicional, quando depende, para ser reconhecida como tal, da análise de normas infraconstitucionais, configura apenas ofensa indireta ou reflexa à Constituição Federal. 2. Não se presta o recurso extraordinário para o exame do conjunto fático-probatório da causa. Incidência da Súmula nº 279/STF. 3. O Supremo Tribunal Federal no exame do AI nº 841.473/RS, Relator o Ministro Cezar Peluso, assentou a ausência de repercussão geral do tema relativo à “restituição de valores pagos indevidamente pela Administração Pública à beneficiário de boa-fé” em razão da inexistência de questão constitucional a ser examinada. 4. Agravo regimental não provido.

Acórdãos Publicados: 363

TRANSCRIÇÕES

Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais

aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham

despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Obras emergenciais em presídios: reserva do possível e separação de poderes (Transcrições)

(v. Informativo 796)

RE 592.581-RS*

RELATOR: Ministro Ricardo Lewandowski

VOTO DO MINISTRO EDSON FACHIN:

Trata-se de Recurso Extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, cuja ementa se transcreve:

“Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DETERMINAÇÃO AO PODER EXECUTIVO DE REALIZAÇÃO DE OBRAS EM

PRESÍDIO. DECABIMENTO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO.

Preliminar:

O pedido não é juridicamente impossível, porquanto não lhe veda expressamente a ordem jurídica.

Mérito: O texto constitucional dispõe sobre os direitos fundamentais do preso, sendo certo que as precárias condições dos estabelecimentos prisionais

importam ofensa à sua integridade física e moral. A dificuldade está na técnica da efetivação desses direitos fundamentais.

É que diversa a carga de eficácia quanto se trata de direito fundamental prestacional proclamado em norma de natureza eminentemente

programática, ou quando sob forma que permita, de logo, com ou sem interposição legislativa, o reconhecimento de direito subjetivo do particular (no caso do preso), como titular do direito fundamental.

Aqui o ponto: saber se a obrigação imposta ao Estado atende norma constitucional programática, ou norma de natureza imposivita (sic).

Vê-se às claras, que mesmo não tivesse ficado no texto constitucional senão que também na Lei das Execuções Criminais, cuida-se de norma

de cunho programático. Não se trata de disposição auto-executável, apenas traça linha geral de ação ditada ao poder público.

Para além (sic) disso, sua efetiva realização apresenta dimensão econômica que faz depender da conjuntura; em outras palavras, das

condições que o Poder Público, como destinatário da norma, tenha de prestar. Daí que a limitação de recursos constitui, na opinião de muitos, no limite fático à efetivação das normas de natureza programática. É a denominada ‘reserva do possível’.

Pois a ‘reserva do possível’, no que respeita aos direitos de natureza programática, tem a ver não apenas com a possibilidade material para

sua efetivação (econômica, financeira, orçamentária), mas também, e por conseqüência, com o poder de disposição de parte do

Administrador, o que imbrica na discricionariedade, tanto mais que não se trata de atividade vinculada.

Ao Judiciário não sabe determinar ao Poder Executivo a realização de obras, como pretende o Autor Civil, mesmo pleiteadas a título de direito constitucional do preso, pena de fazer às vezes de administrador, imiscuindo-se indevidamente em seara reservada à Administração.

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 14

Falta aos Juízos, porque situados fora do processo político-administrativo, capacidade funcional de garantir a efetivação de direitos sociais

prestacionais, sempre dependentes de condições de natureza econômica ou financeira que longe estão dos fundamentos jurídicos.”

No Recurso Extraordinário, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, preliminarmente, alega a repercussão geral da matéria,

tendo em vista a violação dos direitos fundamentais do preso e do princípio da dignidade humana. Também afirma o prequestionamento do disposto no artigo 5º, XLIX e art. 1º, III, ambos da Constituição Federal.

No tocante ao mérito, requer a reforma da decisão colegiada, pois teria sido desconsiderada a aplicabilidade imediata dos direitos

fundamentais. Acrescenta que impossibilidade de ordem orçamentária não pode servir de justificativa para a não efetivação desses direitos, assim como deve ser observada a vinculação do Poder Público quanto à implementação de políticas públicas nesta seara.

Pondera que não há ofensa ao princípio da separação de poderes na apreciação da questão pelo Poder Judiciário, pois esse Poder também seria

“Estado” e o texto constitucional garante o acesso à prestação jurisdicional como direito fundamental (art. 5º, XXXV, da Constituição Federal). Disto decorre que a atuação do Judiciário - como Estado na espécie - apenas tornaria efetivo o dever constitucional de garantir a integridade física e moral

dos presos.

Pede, por fim, a reforma integral do acórdão, provendo o recurso extraordinário a fim de compelir o Estado do Rio Grande do Sul a realizar, no prazo de seis meses, obras de reforma geral no Albergue Estadual de Uruguaiana.

Não foram apresentadas contrarrazões (doc. 4).

Foram admitidos como amici curiae os Estados do Acre, Amazonas, Espírito Santo, Minas Gerais, Piauí, Rondônia, Bahia, Roraima, Amapá, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e o Distrito Federal (doc. 05), Rio de Janeiro (doc. 06), São Paulo (doc. 12), Pará (doc. 14).

O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil apresentou memorial (doc. 20) a fim de contribuir para o deslinde do feito. Alega que

o quadro verificado no sistema prisional brasileiro deve-se à ausência de vontade/conveniência política e pelo senso coletivo de “justiça” que “coloca ao sopé das listas de prioridades a implementação de condições minimamente dignas para o cumprimento de penas privativas de liberdade”. (pág. 5,

doc. 20). Afirma, ainda, a existência de recursos financeiros dos fundos penitenciários para implementação das obras necessárias. Conclui que a falta

de opção política para tanto abre a possibilidade de atuação do Poder Judiciário “em suplementação ao Executivo quando esse não age em atenção a postulados de observância obrigatória derivados da Carta Magna por razões injustificada”. (pág. 6, doc. 20)

Em parecer (doc. 18), o Procurador-Geral da República opina pelo provimento do recurso extraordinário. Por didática e elucidativa, transcrevo

a ementa da mencionada peça:

“CONSTITUCIONAL. REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TEMA 220. SISTEMA PRISIONAL. RESPEITO À INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DOS PRESOS. DIREITO FUNDAMENTAL. APLICABILIDADE IMEDIATA. RESERVA DO POSSÍVEL.

DEVER DE O ESTADO GARANTIR O MÍNIMO EXISTENCIAL. INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM POLÍTICAS PÚBLICAS.

OMISSÃO ESTATAL. DETERMINAÇÃO AO EXECUTIVO DE OBRAS EM ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS.

1. A designação do problema como ‘controle judicial de políticas públicas’ pode levar à conclusão da ilicitude de intervenção judicial no caso, sem se demonstrar antes a premissa de que o tema não é jurídico, mas político, e, portanto, entregue apenas aos órgãos de

representação popular. Existência de direito fundamental eventualmente desrespeitado por ação ou omissão estatal torna jurídica a questão.

2. É impossível adotar soluções absolutas em todas as questões atinentes a direitos fundamentais. A diferença de densidade dos

programas e dos domínios normativos dos direitos fundamentais brasileiros é obstáculo à generalização de conclusões para sua concretização, por meio da transposição de precedentes. É necessário construir casuística graduada e adequada à espécie de direito

fundamental em causa.

3. Há equívoco em subsumir o direito à integridade física e moral dos presos, previsto no art. 5º, XLIX, da Constituição da República, à categoria dos direitos sociais, a cuja realização se opõem restrições discricionariedade política e de reserva do possível. Esse direito

fundamental é direito de defesa, malgrado eventualmente uma de suas consequências jurídicas- secundárias- seja o deferimento de prestação

estatal. Deve preponderar o critério material, em detrimento do formal, na classificação dos direitos fundamentais brasileiros: direito de defesa visam à garantia jurídica da liberdade, mediante omissões do Estado, ao passo que direitos sociais promovem igualdade de fato entre

pessoas, para que as menos aquinhoadas possam desfrutar de liberdade jurídica, por meio de prestações jurídicas ou materiais do Estado.

4. Uma vez que os presos não possuem, por definição, liberdade de fato, mas apenas limitado raio de liberdade jurídica, sua

integridade recai no âmbito dos direitos de defesa.

5. Ao contrário dos direitos a prestações, cuja implementação estatal se satisfaz por qualquer das opções adequadas adotadas pelo legislador ou pelo administrador, direitos de defesa somente são respeitados caso o Estado se abstenha de todos comportamentos capazes de

suprimi-los ou de lesá-los. Não cabe falar, aí, de discricionariedade legislativa ou executiva no fornecimento de condições materiais que

atendam ao art. 5º, XLIX, da CR.

6. Possui aplicabilidade imediata o direito fundamental ao respeito à integridade física e moral dos cidadãos presos (art. 5º, XLIX e § 1º). O estado do sistema carcerário brasileiro fere a ordem constitucional e deveres convencionais e legais do Brasil.

7. Não cabe aplicação da cláusula da reserva do possível que resulte em negativa de vigência de núcleo essencial de direito

fundamental. O Estado deve garantir proteção do mínimo existencial do direito fundamental de respeito à integridade física e moral dos

presos. Núcleo essencial intangível a ser assegurado, independentemente de condições adversas, limites financeiros ou colisão com outros direito fundamentais.

8. Tem legitimidade o Poder Judiciário para determinar adoção de políticas públicas que garantam intangibilidade do mínimo existencial do direito fundamental ao respeito à integridade física e moral dos presos, como reforma, ampliação e construção de

estabelecimentos prisionais, em caso de omissão dos entes estatais. Precedentes.

9. Parecer pelo provimento do recurso extraordinário.”

É, em suma, o relatório/Voto.

- Premissa: o que é uma Constituição? / o que uma Constituição constitui?

A promulgação da Constituição da República de 1988 inaugurou uma nova ordem político-jurídica no Brasil. A partir de 05 de outubro de

1988, a Constituição deixou de ser compreendida apenas como mero documento político organizador do estado e repartidor de competências, passou a ser compreendida como um projeto de construção nacional, com princípios (art. 3) e objetivos (art. 4) expressos, prevendo um rol de direitos e

garantias fundamentais (art. 5 ao art. 17), redefinindo a organização e separação entre os Poderes. Dessa forma, a questão central a partir de 1988

deixou de ser “o que é uma constituição”, e passou a ser “o que uma constituição constitui”. E a Constituição de 1988 não mais um mero documento organizador do poder do Estado, mas sim o compromisso fundamental de uma comunidade de pessoas que se reconhecem reciprocamente como livres

e iguais. (NETO, Menelick de Carvalho; SCOTTI, Guilherme. Os Direitos Fundamentais e a (In)Certeza do Direito – A produtividade das Tensões

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 15

Principiológicas e a Superação do Sistema de Regras. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 19-20) Uma comunidade que deve, portanto, se preocupar

inclusive com seus concidadãos presos, encarcerados, mas não por isso menos dignos de igual respeito e consideração.

- O direito fundamental de proteção à integridade física e moral dos presos (art. 5º, XLIX)

Partindo dessa premissa e cotejando-a com o presente caso, a questão central a ser analisada no presente Recurso Extraordinário diz respeito ao

conteúdo normativo do direito à integridade física e moral do preso, consoante o disposto no art. 5º, XLIX, da Constituição da República, bem como aos limites e possibilidades de atuação do Poder Judiciário, em conformidade com o princípio da separação de poderes insculpido no art. 2º do Texto

Constitucional.

O conteúdo normativo do artigo 5º, XLIX, consiste na proteção e garantia da saúde física e moral do preso. Vale dizer, é dever do Estado garantir que as condições de encarceramento sejam dignas, de tal forma que suas condições de saúde física e moral sejam bem protegidas. Tal

previsão é densificada e pormenorizada em normas infraconstitucionais que não são novas e de há muito conhecidas pelos Estados.

Nesse sentido, é de se destacar que as condições em que a execução penal deve transcorrer encontram-se expressas na Lei 7.210, de 11 de julho de 1984, Lei de Execução Penal, cujos art. 1º e 3º bem sintetizam seu conteúdo:

“Art. 1º. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a

harmônica integração social do condenado e do internado.”

“Art. 3º. Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. Parágrafo único. Não haverá qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.”

Ao dispor sobre o alojamento do preso em cela individual em penitenciária, diz o art. 88, da LEP:

“Art. 88. O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.

Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular:

a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência

humana; b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).”

Esses parâmetros devem ser observados ainda na penitenciária feminina (art.89), na Colônia Agrícola, Industrial ou Similar (art. 92), em

Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico (art. 99, parágrafo único), bem como na hipótese de isolamento como sanção disciplinar (art. 53, IV) e cadeia pública (art. 104).

A Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal assim explica sua essência:

“19. O princípio da legalidade domina o corpo e o espírito do Projeto, de forma a impedir que o excesso ou o desvio da execução

comprometam a dignidade e a humanidade do Direito Penal. 20. É comum, no cumprimento das penas privativas da liberdade, a privação ou a limitação de direitos inerentes ao patrimônio

jurídico do homem e não alcançados pela sentença condenatória. Essa hipertrofia da punição não só viola a medida da proporcionalidade

como se transforma em poderoso fator de reincidência, pela formação de focos criminógenos que propicia. (...)

65. Tornar-se-á inútil, contudo, a luta contra os efeitos nocivos da prisionalização, sem que se estabeleça a garantia jurídica dos

direitos do condenado. 67. A norma do art. 39, que impõe a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e presos provisórios,

reedita a garantia constitucional que integra a Constituição do Brasil desde 1967. 68. No estágio atual de revisão dos métodos e meios de execução penal, o reconhecimento dos direitos da pessoa presa configura

exigência fundamental. (...) 74. A declaração desses direitos não pode conservar-se, porém, como corpo de regras meramente programáticas. O problema central

está na conversão das regras em direitos do prisioneiro, positivados através de preceitos e sanções. 75. O Projeto indica com clareza e precisão o repertório dos direitos do condenado, a fim de evitar a fluidez e as incertezas

resultantes de textos vagos ou omissos: alimentação suficiente e vestuária; atribuição de trabalho e sua remuneração; previdência social;

constituição de pecúlio; proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; exercício das atividades

profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, quando compatíveis com a execução da pena; assistência material, à saúde,

jurídica, educacional, social e religiosa; proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; entrevista pessoal reservada com o

advogado; visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos; chamamento nominal; igualdade de tratamento; audiência com o

diretor do estabelecimento; representação e petição a qualquer autoridade em defesa de direito; contato com o mundo exterior através de

correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação (art. 40). 76. Esse repertório, de notável importância para o habitante do sistema prisional, seja ele condenado ou preso provisório, imputável,

semi-imputável ou inimputável, se harmoniza não somente com as declarações internacionais de direitos mas também com os princípios subjacentes ou expressos de nosso sistema jurídico e ainda com o pensamento e idéias dos penitenciaristas (Jason Soares de ALBERGARIA.

Os direitos do homem no Processo Penal e na execução da pena. Belo Horizonte, 1975).” (portal.mj.gov.br. Acesso em 13.08.2015)

Paralelamente, por meio da Resolução 09, de 18 de novembro de 2011, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária/Ministério da

Justiça estabeleceu diretrizes básicas para arquitetura penal, das quais se destacam as seguintes recomendações gerais:

“3.1. Capacidade dos Estabelecimentos Penais O Conjunto Penal tem capacidade ilimitada, desde que os diversos estabelecimentos que o compõem respeitem as capacidades para

ele fixadas anteriormente e sejam independentes entre si ou estanques.

Em nenhuma hipótese um módulo de celas poderá ultrapassar a capacidade de 200 pessoas presas. Em todas as penitenciárias e cadeias públicas que possuam celas coletivas, deverá ser previsto um mínimo de celas individuais (2% da

capacidade total), para o caso de necessidade de separação da pessoa presa que apresente problemas de convívio com os demais por período

determinado (Portaria Ministério da Justiça/DEPEN nº 01, de 27.01.2004, anexo) e pelo menos uma cela com instalação sanitária, por módulo, obedecendo aos parâmetros de acessibilidade (NBR 9050/2004).

3.2. Parâmetros Arquitetônicos para a Acomodação de Pessoas Presas A cela individual é a menor célula possível de um estabelecimento penal. Neste cômodo devem ser previstos cama e área de

higienização pessoal com pelo menos lavatório e aparelho sanitário, além da circulação. O chuveiro pode ser configurado fora da cela em local determinado. Podem ainda ser projetados: mesa com banco, prateleiras, divisórias, entre outros elementos de apoio. Caso se opte

também pode ser incluído o chuveiro dentro da cela. A área mínima deverá ser de 6 metros quadrados, incluindo os elementos básicos – cama

e aparelho sanitário – independentemete de o chuveiro localizar-se fora da cela ou não. A cubagem mínima é de 15 metros cúbicos. O diâmetro mínimo é de 2 metros.

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 16

No caso da cela acessível, as dimensões do mobiliário dos dormitórios acessíveis devem atender às condições de alcance manual e

visual previstos na NBR 9050/2004 e serem dispostos de forma a não obstruírem uma faixa livre mínima de circulação interna de 0,90 m de

largura, prevendo área de manobras para o acesso ao sanitário, camas e armários. Os armários devem atender ao item 7.4.2. da NBR 9050/2004. Deve haver pelo menos uma área com diâmetro de no mínimo 1,50 m que possibilite um giro de 360°. A altura das camas deve ser

de 0,46 m.

Os parâmetros da cela acima descritos devem ser aplicados para salas e celas de saúde. A cela coletiva é qualquer cômodo com a mesma função de uma cela individual, porém com capacidade para abrigar mais de uma

pessoa presa simultaneamente.

(...) No caso do uso de três camas superpostas (beliches de três camas) deverá ser previsto um pé-direito mínimo de três metros e meio,

independentemente de exigir-se uma cubagem menor.

No caso de o chuveiro localizar-se fora da cela coletiva, poderão ser subtraídos 0,96 m2 da área em relação ao valor mínimo fixado no quadro acima, sem prejuízo do parâmetro de diâmetro equivalente.

3.10. Conforto ambiental (ventilação e iluminação naturais) Para paredes e coberturas deverá ser usado material adequado de acordo com as peculiaridades de cada região, prevendo-se a

conveniente ventilação, e proteção, com a adoção de esquemas técnicos especiais que atendam às condições climáticas regionais (...) As aberturas dos compartimentos deverão obedecer a um mínimo de 1/8 a 1/6 da área de seu piso, dependendo da zona Bioclimática

em que o estabelecimento está inserido, por questões de aeração dos ambientes, atendendo ainda as normas da NBR 15220/2003 para as

condições de ventilação natural por região bioclimática. Excluem-se dessa obrigatoriedade os compartimentos que servem de corredores e passagens com área igual ou inferior a 10m2 . Quando a iluminação/ventilação for zenital deverá atender também ao mínimo de 1/6 da área

do piso.

Os ambientes deverão possuir ventilação cruzada. Para isso, a relação entre aberturas de entrada e de saída deverá corresponder ao mínimo de 0,5 para a circulação de ar.

3.12. Iluminação artificial A iluminação artificial externa deverá ser executada da periferia para o interior ou da parte superior para a inferior. Neste caso, os

postes de iluminação deverão ter altura mínima equivalente ao dobro da cumeeira da cobertura dos telhados e permitir total iluminação das fachadas, pátios e coberturas.

Todos os serviços das celas, como iluminação artificial, descarga dos vasos sanitários, água nos chuveiros, poderão contar com

comando externo centralizado (de acordo com as peculiaridades de cada estabelecimento), devem contar com dispositivos de aquecimento de água quando a unidade estiver em região de baixas temperaturas e devem ser oferecidos de forma que atendam às necessidades humanas com

conforto e higiene.

As luminárias das celas e dos corredores podem ficar embutidas no forro e protegidas por materiais que lhes vedem o acesso por parte do usuário, sendo sua manutenção feita através de alçapão situado sobre a carceragem ou por outra solução arquitetônica.

3.13. Recomendações técnicas (...)

As edificações devem ser projetadas de modo a atender aos quesitos necessários quanto ao custo da construção, considerando-se também o material a empregar, objetivando a redução das despesas que venham a demandar com a manutenção e o funcionamento, sem,

contudo, acarretar prejuízo das condições mínimas de comodidade, indispensáveis para a segurança e a preservação dos direitos fundamentais da pessoa humana.

As edificações devem ser projetadas, preferencialmente, considerando as características necessárias ao sistema de distribuição,

reservação e utilização de água potável do prédio, assim como as condições necessárias para aparelhos sanitários, tubulações de água e de esgotos, sistema de drenagem, reuso de águas e aproveitamento de águas pluviais.

(...)

As partes externas deverão ser convenientemente drenadas, permitindo o perfeito escoamento das águas pluviais, protegendo, assim, as construções; recomenda-se que as tubulações devem ter no máximo 200 mm de diâmetro por linha.

(...)

As edificações devem ser projetadas de modo a atender aos quesitos necessários para obtenção da Etiqueta Nacional de Conservação de Energia “A”, emitida pelo Ministério de Minas e Energias através do Programa Pracional de Eficiência Energética em Edificações, o

PROCEL EDIFICA.

A fiação elétrica, os quadros e caixas de passagem enterradas, caixas de incêndio e reservatórios d’água devem ser especialmente protegidos com trancas de segurança e cadeados, e situados em locais de difícil acesso às pessoas presas.

Deve-se primar por aspectos de harmonização do ambiente com a vida humana, de forma a favorecer o equilíbrio, a saúde e a

tranquilidade, considerando itens como a pintura (cores), acabamento, configuração espacial que minimize a sensação de opressão, respeito ao espaço pessoal, layout dos ambientes obedecendo aos princípios da ergonomia etc. Tais cuidados são necessários para minimizar os

efeitos da prisionalização, nocivos à saúde mental, não só dos presos, mas também dos funcionários que vivenciam os espaços prisionais.”

Revisitando a jurisprudência da Corte, verifica-se que em inúmeros julgados, entendeu-se, também com fulcro na dignidade da pessoa humana

(art. 1º, III, da Constituição Federal), rechaçar ofensas à integridade do preso, bem como conceder indenização diante de ofensa, consoante se extrai das ementas colacionadas:

“EMENTA: HABEAS CORPUS. AMEAÇA DE VIOLÊNCIA FÍSICA, MORAL E SEXUAL EM PRESÍDIO. PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA.

NEGATIVA DE SEGUIMENTO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, COM ADOÇÃO DAS PROVIDÊNCIAS CABÍVEIS. ALEGADO

CERCEAMENTO DO DIREITO DE ACESSO À JUSTIÇA. INOCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. Embora tenha negado seguimento ao habeas corpus, o Superior Tribunal de Justiça determinou ao juízo das execuções penais que

garantisse a segurança e integridade física do paciente no presídio em que se encontra recolhido.

2. Constrangimento ilegal não configurado. 3. Ordem denegada.” (HC 102.309, rel. min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe de 30.09.2010)

“EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Morte de detendo por colegas de carceragem. Indenização por danos morais e materiais. 3. Teoria do

Risco Administrativo. Configuração do nexo de causalidade em função do dever constitucional de guarda (art. 5º, XLX). Responsabilidade de

reparar o dano que prevalece ainda que demonstrada a ausência de culpa dos agentes públicos. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 272.839, rel. min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJ de 08.04.2005)

Nesse ponto, é mister levar em consideração a finalidade da pena. Não obstante inúmeras teorias tentem explicá-la, há certo consenso quanto

ao seu fim ressocializador. Nesse sentido, é de grande valia resgatar a marcante decisão no HC 71.179, de relatoria do Min. Marco Aurélio:

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“PENA- CUMPRIMENTO- TRANSFERÊNCIA DE PRESO- NATUREZA. Tanto quanto possível, incumbe ao Estado adotar medidas

preparatórias ao retorno do condenado ao convívio social. Os valores humanos fulminam os enfoques segregacionistas. A ordem jurídica

em vigor consagra o direito do preso de ser transferido para local em que possua raízes, visando à indispensável assistência pelos familiares. Os óbices ao acolhimento do pleito devem ser inafastaveis (sic) e exsurgir ao primeiro exame, consideradas as precárias condições do sistema

carcerário pátrio. Eficácia do disposto nos artigos 1º e 86 da Lei de Execução Penal- Lei 7.210, de 11 de julho de 1984- Precedente: habeas

corpus nº 62.411-DF, julgado na Segunda Turma, relatado pelo Ministro Aldir Passarinho, tendo sido o acórdão publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência nº 113, à página 1.049.” (Segunda Turma, DJ de 03.06.1994)

Isso demonstra que, além do direito fundamental do preso previsto no art. 5, XLIX, há também sólida legislação infraconstitucional e

entendimento consolidado desta Corte que esmiúçam e detalham o conteúdo normativo, bem como o âmbito de proteção do direito à integridade

física e moral do preso. O direito previsto no art. 5º, XLIX impõe uma conduta ao Estado. Conduta essa que possui parâmetros legais infraconstitucionais nítidos, precisos e não são novos. Não há razão, portanto, para que o Estado se escuse de protegê-lo.

- O papel do Poder Judiciário

É de se destacar que ao Poder Judiciário não cabe se substituir ao legislador ou ao gestor. Mas, contra uma inação jurisdicional, geralmente

fundada em uma antiquada compreensão sobre a separação dos Poderes, é possível, sim, conceber um papel de relevo ao Poder Judiciário na

efetivação de direitos fundamentais, pois a adoção de medidas tomadas por juízes para efetivar esses direitos ajuda a promover a deliberação democrática ao dirigir a atenção pública a interesses que, de outra forma, seriam ignorados na vida pública diária (GODOY, Miguel Gualano de.

Constitucionalismo e Democracia: uma leitura a partir de Carlos Santiago Nino e Roberto Gargarella. São Paulo: Saraiva, 2012). É possível, assim,

uma atuação que não seja cegamente omissa e nem irresponsavelmente ativista, mas que garanta o direito fundamental do preso à sua integridade física e moral durante sua custódia pelo Estado. Uma compreensão sobre a separação de poderes que se atenha ao tradicional entendimento de que ao

Poder Judiciário cabe apenas ser deferente às escolhas do Executivo e do Legislativo demonstra uma limitada concepção de democracia, segundo a

qual as escolhas majoritárias dos representantes do povo (gestores e legisladores) são inquestionáveis. E essa compreensão rasa de democracia acaba por permitir que direitos fundamentais de minorias, pouco vistas, sejam sistematicamente violados. Uma compreensão robusta de democracia deve, ao

contrário, possibilitar que esses grupos minoritários – como o são os encarcerados em geral – tenham suas situações de privação expostas e que diante

da violação de seus direitos o Poder Judiciário os garanta. Nesse sentido, o jurista português Jorge Miranda aduz o seguinte no tocante aos dois sentidos de funções do Estado:

“I- São dois os sentidos possíveis de função do Estado: como fim, tarefa ou imperativo ou opção para agir, correspondente a certa

necessidade coletiva ou a certa zona da vida social; e como atividade com características próprias, passagem a ação, modelo ou

comportamento.

No primeiro sentido, a função traduz um determinado enlace entre a sociedade e o Estado, assim, como um princípio (ou uma

tentativa) de legitimação do exercício do poder. A crescente complexidade das funções assumidas pelo Estado- da garantia da segurança

perante o exterior, da justiça e da paz civil à promoção do bem-estar, da cultura e da defesa do ambiente- decorre do alargamento das necessidades humanas, das pretensões de intervenção dos governantes e dos meios de que se podem dotar; e é ainda uma maneira de o

Estado ou os governantes em concreto justificarem a sua existência ou a sua permanência no poder.

No segundo sentido, a função - agora não tanto algo de pensado quanto algo de realizado - entronca nos atos e atividades que o

Estado constantemente, repetida e repetivelmente, vai desenvolvendo de harmonia com as regras que o condicionam e conformam; define-

se através das estruturas e das formas desses atos e atividades; e revela-se indissociável da pluralidade de processos e procedimentos, de

sujeitos e de resultados de toda a dinâmica jurídico-pública. No primeiro sentido, a função não tem apenas que ver com o Estado enquanto poder; tem também que ver com o Estado enquanto

comunidade. Tanto pode ser prosseguida só pelos seus órgãos e serviços através das chamadas políticas públicas como ser realizada por grupos e entidades da sociedade civil, em formas variáveis de complementariedade e subsidiariedade (tudo dependendo das concepções

dominantes e da intenção global do ordenamento).

No segundo sentido, a função não é outra coisa senão uma manifestação qualificada do poder político, um modo tipicizado de

exercício do poder, e carece de ser apreendida numa tríplice perspectiva-material, formal e orgânica.

No primeiro sentido, a função traduz-se depois em incumbências quer para a proteção e a promoção de direitos fundamentais, quer

para conformação de setores da vida coletiva (cfr., por exemplo, na Constituição portuguesa, os arts. 38º, nº 4, 59º e segs. ou 80º e segs.; e na Constituição brasileira, os arts. 5º- LXXIV, 21 ou 134 e segs.).

No segundo sentido, a função é o modo específico como o Estado procura atingir os fins prescritos na Constituição e na lei, o modo

como se desincumbe das imposições que delas recebe.” (Teoria do Estado e da Constituição. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015. P.355-356)

Em assento contínuo na doutrina portuguesa, é possível concluir que a diversidade de funções não é algo a ser visto de forma estanque, mas deve-se considerar o momento de sua concretização. Confira-se:

“A separação e interdependência não é um esquema constitucional rígido mas apenas um princípio organizatório fundamental.

Como tal, não há que perguntar pela sua realização estrita nem há que considera-lo como um dogma de valor intemporal. Devemos

perspectiva-lo como princípio histórico (K. Hesse) ‘em contacto’ com uma ordem constitucional concreta. Como princípio constitucional concreto, o princípio da separação articula-se e combina-se com outros princípios constitucionais positivos (princípio de governo

semipresidencialista ou de regime misto parlamentar-presidencial, princípio da conformidade dos actos estaduais com a Constituição,

princípio da participação). (...)

As várias funções devem ser separadas e atribuídas a um órgão ou grupo de órgãos também separados entre si. Isto significa não uma

equivalência total entre atividade orgânica e função, mas sim que a um órgão deve ser atribuída principal ou prevalentemente uma determinada função.” (CANOTILHO, J.J Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. 2. Reimp. Coimbra:Almedina. p.

556-558)

No estágio atual de democracia em que o Brasil se posiciona, não há espaço para a negativa de direitos fundamentais positivados no Texto

Constitucional. A Constituição é fruto de uma opção política que adota a proteção desses direitos como única escolha possível na construção de uma sociedade justa e democrática.

- Constituição Dirigente e Vinculação dos direitos fundamentais

A Constituição dirigente, que não esgota em si mesma o seu conteúdo direcional, é também política. Ela só se realiza plenamente através da

atuação do Poder Legislativo (produção de leis) e do Poder Executivo (criação e execução de políticas públicas). Mas, ao Poder Judiciário cabe

justamente guardar e garantir os direitos fundamentais, os quais devem estar subjacentes às leis e às políticas públicas. E quando estas são insuficientes, como se verifica claramente no presente caso, é dever do Poder Judiciário atuar para que essas políticas públicas cumpram com o seu

desiderato e satisfaçam um direito tido como pressuposto para qualquer existência digna e sadia.

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 18

A agenda de políticas públicas nasce de pesquisa realizada no seio do grupo social e da definição das prioridades, a partir dos recursos

financeiros existentes. Todavia, o não atendimento dessas necessidades coletivas pelos demais Poderes autoriza a atuação do Poder Judiciário no

sentido de tornar efetiva a proteção aos direitos fundamentais. Ou seja, a atuação judicial sobressai da inércia ou insuficiência dos demais Poderes em cumprir as diretrizes e determinações da Constituição de efetivar direitos, especialmente os direitos fundamentais.

Comunga-se da ideia de que é preciso manter uma íntima ligação entre a Constituição e as circunstâncias sociais que se mantêm em constante

mutação. A dinâmica social exige um acompanhamento contínuo e incessante do Texto Constitucional, sob pena de o texto positivado não mais refletir os valores e princípios fundamentais adotados pela sociedade destinatária.

De nenhuma valia teria a previsão de um direito fundamental se ele não puder ser tutelado pelo Estado, principalmente quando todos os

contornos normativos encontram-se definidos na legislação vigente, tal como ocorre na hipótese do direito à integridade física e moral do preso. E nesta expressão – Estado – entende-se contida a tripartição Executivo, Legislativo e Judiciário. Nessa perspectiva, tem razão aqueles que afirmam que

o poder é uno e a repartição em três funções diversas – executiva, legislativa e judiciária – dá-se como instrumento de otimização de resultados.

A separação de Poderes, conforme anotado alhures por Canotilho, é apenas técnica de repartição organizatória funcional. Não há proibição de um Poder agir para tutelar direitos caros em determinada ordem normativa. A forma como cada Poder exerce esta tutela é que diverge. Veda-se, na

verdade, que um possa imiscuir-se totalmente na função primordialmente exercida pelo outro. O sistema de freios e contrapesos, por si, já denota que

todos devem, na medida da função que lhe foi atribuída, tornar efetivas as escolhas do constituinte originário. Nesta senda, ressalta-se que:

“Não é possível a invocação do princípio da separação dos poderes para a não apreciação da pretensão do titular do direito

fundamental social. Como já ressaltado, o Poder Judiciário, durante o exercício do controle de constitucionalidade, não interfere na esfera

exclusiva de atribuição das demais formas de expressão do poder estatal, porque atua exclusivamente no âmbito jurisdicional. Por outro lado, o princípio da separação de poderes não pode ser utilizado para justificar a violação dos objetivos do Estado aos

quais todas as formas de expressão do poder estatal estão vinculadas.

A atuação jurisdicional reflete, portanto, atividade corretiva do Estado-juiz, com o precípuo propósito de atender aos objetivos estatais, mediante a satisfação integral dos direitos fundamentais sociais, fator que assegura a unidade do sistema.” (CANELA JR, Osvaldo.

Controle Judicial de Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 94-95)

Exatamente por essa razão, o Supremo Tribunal Federal, em ocasiões distintas, posicionou-se pela inexistência de ofensa ao princípio da

separação de poderes nas hipóteses de direitos ou políticas públicas expressamente previstas na Constituição e não efetivadas, conforme se verifica dos acórdãos colacionados:

“E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO (LEI Nº 12.322/2010) – MANUTENÇÃO DE REDE DE ASSISTÊNCIA À

SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – DEVER ESTATAL RESULTANTE DE NORMA CONSTITUCIONAL – CONFIGURAÇÃO,

NO CASO, DE TÍPICA HIPÓTESE DE OMISSÃO INCONSTITUCIONAL IMPUTÁVEL AO MUNICÍPIO – DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO PROVOCADO POR INÉRCIA ESTATAL (RTJ 183/818-819) – COMPORTAMENTO QUE TRANSGRIDE A AUTORIDADE

DA LEI FUNDAMENTAL DA REPÚBLICA (RTJ 185/794-796) – A QUESTÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL: RECONHECIMENTO DE

SUA INAPLICABILIDADE, SEMPRE QUE A INVOCAÇÃO DESSA CLÁUSULA PUDER COMPROMETER O NÚCLEO BÁSICO QUE QUALIFICA O MÍNIMO EXISTENCIAL (RTJ 200/191-197) – O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS

PÚBLICAS INSTITUÍDAS PELA CONSTITUIÇÃO E NÃO EFETIVADAS PELO PODER PÚBLICO – A FÓRMULA DA RESERVA DO

POSSÍVEL NA PERSPECTIVA DA TEORIA DOS CUSTOS DOS DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE DE SUA INVOCAÇÃO PARA LEGITIMAR O INJUSTO INADIMPLEMENTO DE DEVERES ESTATAIS DE PRESTAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE IMPOSTOS AO PODER

PÚBLICO – A TEORIA DA “RESTRIÇÃO DAS RESTRIÇÕES” (OU DA “LIMITAÇÃO DAS LIMITAÇÕES”) – CARÁTER COGENTE E VINCULANTE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, INCLUSIVE DAQUELAS DE CONTEÚDO PROGRAMÁTICO, QUE VEICULAM

DIRETRIZES DE POLÍTICAS PÚBLICAS, ESPECIALMENTE NA ÁREA DA SAÚDE (CF, ARTS. 6º, 196 E 197) – A QUESTÃO DAS

“ESCOLHAS TRÁGICAS” – A COLMATAÇÃO DE OMISSÕES INCONSTITUCIONAIS COMO NECESSIDADE INSTITUCIONAL FUNDADA EM COMPORTAMENTO AFIRMATIVO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS E DE QUE RESULTA UMA POSITIVA CRIAÇÃO

JURISPRUDENCIAL DO DIREITO – CONTROLE JURISDICIONAL DE LEGITIMIDADE DA OMISSÃO DO PODER PÚBLICO:

ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO JUDICIAL QUE SE JUSTIFICA PELA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE CERTOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS (PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL, PROTEÇÃO AO MÍNIMO EXISTENCIAL, VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO

INSUFICIENTE E PROIBIÇÃO DE EXCESSO) – DOUTRINA – PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM TEMA DE

IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DELINEADAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (RTJ 174/687 – RTJ 175/1212-1213 – RTJ 199/1219-1220) – EXISTÊNCIA, NO CASO EM EXAME, DE RELEVANTE INTERESSE SOCIAL – RECURSO DE AGRAVO

IMPROVIDO”. (ARE 745.745-AgR, rel. min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe de 02.12.2014)

“Ementa

SAÚDE – FORNECIMENTO DE REMÉDIOS. O preceito do artigo 196 da Constituição Federal assegura aos necessitados o fornecimento, pelo Estado, dos medicamentos indispensáveis ao restabelecimento da saúde.” (ARE 744.170-AgR, rel. min. Marco Aurélio, Primeira Turma,

DJe de31.01.2014)

“Ementa

Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo. 2. Direito Constitucional. Educação de deficientes auditivos. Professores especializados em Libras. 3. Inadimplemento estatal de políticas públicas com previsão constitucional. Intervenção excepcional do Judiciário.

Possibilidade. Precedentes. 4. Cláusula da reserva do possível. Inoponibilidade. Núcleo de intangibilidade dos direitos fundamentais. 5.

Constitucionalidade e convencionalidade das políticas públicas de inserção dos portadores de necessidades especiais na sociedade. Precedentes. 6. Ausência de argumentos suficientes a infirmar a decisão recorrida. 7. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ARE

860.979-AgR, rel. min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 05.05.2015)

No mesmo sentido: ARE 768.825 (rel. min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJ de 20.08.2014); RE 820.910 - AgR (rel. min.

Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe de 03.09.2014); RE 850.215-AgR (rel. min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe de 28.04.2015); ARE 740.800-AgR (rel. min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe de 11.12.2013); RE 669.635-AgR (rel. min. Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe de

10.04.2015); RE 642.536-AgR (rel. min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 26.02.2013); AI 739.151-AgR (rel. min. Rosa Weber, Primeira Turma,

DJe de 10.06.2014); RE 628.159-AgR (rel. min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe de 14.08.2013); ARE 649.600 (rel. min. Teori Zavascki, DJe de 18.09.2013) e ARE 761.127-AgR (rel. min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe de 15.08.2014).

- A impossibilidade de se invocar a Reserva do Possível como argumento retórico e escusa indevida

Contraproducente se revela a alegação da reserva do possível, pois o Estado não pode se furtar a garantir, minimamente, o conteúdo normativo

dos direitos especificados ao longo do Texto Constitucional e exaustivamente regulamentado pelas normas infraconstitucionais, sob pena de incorrer

em ilegitimidade.

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Informativo 797-STF (10/09/2015) – Esquematizado por Márcio André Lopes Cavalcante | 19

Quer dizer, nas palavras de Paulo Bonavides, “o poder representa sumariamente aquela energia básica que anima a existência de uma

comunidade humana num determinado território, conservando-a unida, coesa e solidária” (BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 16ed. São Paulo:

Malheiros, 2009. p. 115). E prossegue afirmando que a legitimidade deste poder relaciona-se à justificação e aos valores do poder legal. Confira:

“A legitimidade é a legalidade acrescida de sua valoração. E o critério que busca menos compreender e aplicar do que para aceitar

ou negar a adequação do poder às situações da vida social que ele é chamado a disciplinar.

No conceito de legitimidade entram as crenças de determinada época, que presidem à manifestação do consentimento e da

obediência. A legalidade de um regime democrático, por exemplo, é o seu enquadramento nos moldes de uma constituição observada e praticada;

sua legitimidade será sempre o poder contido naquela constituição, exercendo-se de conformidade com as crenças, os valores e os princípios

da ideologia dominante, no caso a ideologia democrática.” (BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. 16ed. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 121).

De tudo se conclui que o descompasso entre os direitos positivados na Constituição e sua efetivação – mínima, que seja – pelo Estado,

primariamente pelo Executivo, Legislativo ou, por fim, pelo Judiciário, torna letra morta o Texto Constitucional e esvazia o sentido da decisão

política tomada pela sociedade a que ela se destina. A reserva do possível não pode servir de argumento para escusar o Estado de cumprir os comandos constitucionais, sobretudo aqueles

expressamente nomeados e caracterizados como direitos fundamentais. Eventual objeção orçamentária deveria ser acompanhada de prova expressa,

documental, que justifique adequadamente e demonstre a impossibilidade financeira do Estado, bem como porque as escolhas político-

governamentais deixaram de atender demanda tão fundamental. A invocação da reserva do possível não pode consistir em mera alegação que isenta,

por si só, o Estado de suas obrigações. Somente justo motivo, objetivamente aferido, tem tal valia.

Destarte, a inexistência de recursos no orçamento vigente - demonstrável objetivamente – não afasta a possibilidade de atendimento do direito em tela. Nesta perspectiva, é possível a inclusão da respectiva dotação no orçamento do ano seguinte (art. 165, § 5º, c/c art. 167, I, ambos da

Constituição da República). Contudo, uma ressalva deve ser feita. O orçamento possui caráter apenas autorizativo, isto é, apenas permite que, caso se

pretenda utilizar o recurso financeiro, este uso estará permitido na peça orçamentária proposta pelo Executivo e aprovada pelo Legislativo. Não possui, entretanto, caráter obrigatório para a execução daquela dotação. Tendo essa premissa como base, é imperativa a determinação da inclusão no

orçamento seguinte, bem como o início da execução da reforma, em certo prazo, após essa inclusão. Tais medidas visam dar concretude ao direito

violado e, em última análise, concretizar a força normativa da Constituição, sem que, no entanto, tal determinação judicial signifique uma substituição indevida do Juiz aos atos do gestor. No presente caso, silenciar ou decidir pouco não contribui para a superação da situação de negação de direitos.

Por outro lado, atuar e garantir o direito do preso à sua integridade física e moral não precisa ser atividade de substituição ao gestor, mas exigir que

este, de acordo com suas escolhas políticas, orçamentárias, técnicas, cumpra a exigência constitucional.

- Conclusão

Diante do exposto, acompanho o voto do Ilustre Relator Ministro Ricardo Lewandowski para dar provimento ao presente Recurso Extraordinário.

É como voto.

*acordão pendente de publicação

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS 31 de agosto a 4 de setembro de 2015

Decreto nº 8.513, de 3.9.2015 - Dispõe sobre a antecipação do abono anual devido aos segurados e dependentes da

Previdência Social no ano de 2015. Publicado no DOU, Seção 1, Edição nº 170, p. 1, em 4.9.2015.

OUTRAS INFORMAÇÕES 31 de agosto a 4 de setembro de 2015

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) Segurança - Transparência - Distribuição - Processo - Aprimoramento Resolução nº 558, de 31 de agosto de 2015 - Dispõe sobre o aprimoramento da segurança e transparência na

distribuição de processos no Supremo Tribunal Federal. Publicada no DJE/STF, n. 174, p. 1, em 4.9.2015.

Secretaria de Documentação – SDO Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD

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