instituto de pesquisas jardim botânico do rio de janeiro ... · crepaldi, maria otávia silva...
TRANSCRIPT
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Escola Nacional de Botânica Tropical
Etnobotânica na Comunidade Quilombola Cachoeira do
Retiro, Santa Leopoldina, Espírito Santo, Brasil.
Maria Otávia Silva Crepaldi
2007
ii
Crepaldi, Maria Otávia Silva
C917e Etnobotânica na Comunidade Quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, Espírito Santo, Brasil / Maria Otávia Silva Crepaldi. – Rio de Janeiro, 2007.
xviii, 65 f. : il. Dissertação (mestrado) – Instituto de Pesquisas Jardim Botânico
do Rio de Janeiro/Escola Nacional de Botânica Tropical, 2007. Orientadora: Ariane Luna Peixoto. Bibliografia. 1.Etnobotânica. 2.Conservação. 3.Manejo. 4.Quilombola 5.Mata
Atlântica. 6.Espírito Santo (Estado). I. Título. II. Escola Nacional de Botânica Tropical.
CDD 581.63
iii
Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro Escola Nacional de Botânica Tropical
Etnobotânica na Comunidade Quilombola Cachoeira do
Retiro, Santa Leopoldina, Espírito Santo, Brasil.
Maria Otávia Silva Crepaldi
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Botânica, Escola Nacional de Botânica Tropical, do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do título de Mestre em Botânica.
Orientadora: Ariane Luna Peixoto
Rio de Janeiro 2007
iv
Etnobotânica na Comunidade Quilombola Cachoeira do Retiro, Santa
Leopoldina, Espírito Santo, Brasil.
Maria Otávia Silva Crepaldi
Dissertação submetida ao corpo docente da Escola Nacional de Botânica Tropical, Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro - JBRJ, como parte dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Mestre.
Aprovada por: Profª Drª. Ariane Luna Peixoto (Orientadora) ______________________ Prof. Dr. Cláudio Urbano Pinheiro ______________________ Prof. Drª. Luci de Senna-Valle ______________________ em 08/03/2007
Rio de Janeiro 2007
v
“O segredo de uma vida empolgante não está em descobrir maravilhas,
mas em procurá-las”
Augusto Ruschi (1915-1986)
vi
À Mata Atlântica.
Senhora de grande diversidade, me encanta com sua capacidade de regeneração.
vii
Agradecimentos
Agradeço à minha mãe Regina Célia, espírito iluminado, mulher forte, criativa, que ao
embelezar o mundo com sua arte me inspira a investigar a vida. Ao meu pai Avelino
Aparecido, pela inteligência transmitida, pela leitura crítica do texto, pelo abstract, por
organizar as fórmulas tabelas e gráficos, coisas que só um Doutor experiente poderia fazer. Ao
João Lucas, estrela da minha vida, valeu meu irmão! Agradeço especialmente à minha avó,
Aparecida Marchiani (in memoriam), minha primeira informante etnobotânica.
À Professora Drª Ariane Luna Peixoto, pela experiência, sabedoria e paciência com
seus orientados. É maravilhoso trabalhar com você, obrigada por esta oportunidade
inesquecível.
À Professora Drª Luci de Senna-Valle por me acompanhar desde a avaliação do projeto
até a defesa da dissertação. Obrigada pela leitura crítica do texto, correções e sugestões
importantes.
À Professora Drª Rejan R. Guedes-Bruni por ser essa pessoa linda e bem-humorada,
por aceitar revisar o texto e por ter adotados os capixabas carentes de orientação.
À Professora doutoranda Inês Machline Silva, pelo instinto materno que me adotou
quando estava no Rio de Janeiro, pelas ótimas informações e referências bibliográficas, pela
identificação das plantas, pela ajuda na coleta de campo e pela amizade.
Ao Museu de Biologia Professor Mello Leitão, nas figuras de Hélio de Queiroz Boudet
Fernades, Rose Loss Kollmann, Ludovic Jean Charles Kollmann, André Assis, Clara Esgario,
André Paviotti Fontana por todo apoio logístico ao trabalho de mestrado. Obrigada por me
cederem alojamento, veículo, materiais e estruturas durante os dias de campo. Agradeço
também a todos os seguranças pelas boas conversas e companhia durante as longas noites de
herbário.
Aos ilustres Professores Doutores da Universidade Federal de São Carlos: Armando
Vieira, Carlos Alberto Peret, Irineu Bianchini Jr., José Salatiel Rodrigues Pires, Júlio César
Garavello, Manoel Martins Dias Filho, Marco Antônio Batalha, Maria Inês Salgueiro Lima,
Nivaldo Nordi e Odete Rocha, por toda convivência, aprendizado e formação acadêmica.
Aos professores da Escola Nacional de Botânica Tropical do Jardim Botânico do Rio
de Janeiro: Cláudia Franca Barros, Elsie Franklin Guimarães, Ariane Luna Peixoto e Rogério
viii
Oliveira (PUC), Rafaela Campostrini Forzza e Vidal de Freitas Mansano, Renata Perpetuo
Reis e Sérgio Ricardo Sodré Cardoso, Tânia Sampaio Pereira e Solange Pessoa, Nilda
Marquete, Gustavo Martinelli e Marli P. Morim, Márcia de Fátima Inácio Freire e Lana da
Silva Sylvestre, pela grande oportunidade de ter cursado suas disciplinas.
Aos especialistas do JBRJ que identificaram o material botânico: Adriana Quintella
Lobão, Alexandre Quinet, Ariane Luna Peixoto, Bruno C. Kurtz, Cláudio Nicoletti Fraga, Cyl
Farney Catarino de Sá, Elsie Franklin Guimarães, Fabio F. Moreira, Haroldo Cavalcante de
Lima, Inês Machline Silva, José Fernando Baumgratz, Luciana F. G. Silva, Lucia d'Avila
Freire de Carvalho, Marcelo da Costa Souza, Maria de Fátima Freitas, Mariana Machado
Saavaedra, Marli Pires Morim, Nilda Marquete Ferreira da Silva, Rafael Borges e Ronaldo
Marquete.
À pesquisadora do JBRJ Viviane Stern da Fonseca-Kruel pela troca de experiências.
A Secretaria da ENBT, em especial Seu Abílio e Márcia pelo apoio durante o
mestrado.
Aos amigos e colegas de mestrado: Juan Gabriel Soler Alarcon por ter me auxiliado no
início do mestrado e pelas valiosas discussões científicas; Felipe de Araújo P. Sobrinho por
me ajudar com o programa Fitopac e pela companhia durante o VI SBEE; Rúbia Graciele
Patzlaff pela ajuda no campo e pelas boas risadas; Verônica Maioli pela boa companhia na
República Dominicana durante o IX CLB, pelas ótimas bibliografias sobre quilombolas e por
toda ajuda durante a dissertação.
Aos meninos da Universidade Federal do Espírito Santo: Breno, Heberton (Gu) e Vítor
por me indicarem a comunidade quilombola de Cachoeira do Retiro como uma boa área para a
realização da pesquisa etnobotânica. Obrigada, sem vocês este trabalho não seria possível. Ao
Gabriel Pitanga Soneghet por várias bibliografias e troca de experiências.
Ao Dr. Osvaldo Oliveira, por ter me apresentado com carinho à comunidade de
Cachoeira do Retiro. Com certeza fez toda diferença.
A todas as pessoas da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro por terem
acreditado na seriedade deste trabalho. Um agradecimento especial ao Seu Mário e Dona
Maria por toda a hospitalidade, amor, carinho e disposição para a execução da pesquisa junto
comigo; Seu Vavá e Dona Joventina por me apresentarem seus lindos artesanatos; Dona
Etelvina (in memoriam) pelas inúmeras citações; Dona Filinha pela alegria e disposição com
ix
que me apresentou todo seu quintal; Seu Luiz pelas boas informações sobre a floresta; Dona
Maria da Penha, Dona Leopoldina, Dona Edith e Seu José Mathias pelas valiosas informações.
Aos mais que amigos que ajudaram muito nas coletas de campo: Michele de Sá
Dechoum, Ronaldo Mendes Campos de Carvalho, Regina Célia Crepaldi, Marco Antônio
Batalha, Rodrigo Borges, Marcelo da Costa Souza e Jerônimo Amaral de Carvalho.
Aos técnicos e dirigentes do Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos
do Espírito Santo (IEMA) pelo apoio e compreensão durante o período do mestrado. Agradeço
especialmente os técnicos Daniel Correia de Freitas e Hiercem dos Santos Machado pela
elaboração minuciosa e paciente do mapa da comunidade.
Aos bons amigos de Vitória e Vila Velha: Felipe, Jerônimo, Mabel, Michele, Paula,
Ronaldo, Sandra, Josy, Ritinha, Gustavo, Érica, Evie e Mariana por todas as baladas (aqui
chama rock, não importa o tipo), praias e excelente convivência nestes quase 2 anos de ES.
Aos amigos de Sancars: Lilian, Marina, Mariana, Karina, Ivãzinho, Moita, Jorginho e
Ale Starr que mesmo distantes eu sempre encontro no meu coração.
Às minhas irmãs maravilhosas: Maricota, Cal, Maya, Mariazinha e Lil, as maçãs mais
altas que um homem pode alcançar.
Ao meu parceiro, amigo e amor da minha vida, Rodrigo, pela troca de idéias,
bibliografias, sentimentos e carinho neste caminho que escolhemos juntos.
x
Resumo
O presente trabalho foi realizado na comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, localizada no município de Santa Leopoldina (lat. 20º06’04" S e long. 40º31’47" W), Estado do Espírito Santo. O município integra as áreas prioritárias para conservação da flora, utilização sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade brasileira, fazendo parte do Corredor Central da Mata Atlântica e considerado um “hotspot”. A comunidade é composta por 72 famílias distribuídas em uma área de aproximadamente 154 ha, em processo final de titulação de terras pelo INCRA. O objetivo geral deste estudo foi identificar e sistematizar as espécies vegetais utilizadas pela comunidade, buscando benefícios sociais e conservacionistas por meio de políticas que favoreçam a interação da ciência e planejamento nos moldes da pesquisa-ação. Entre agosto de 2005 a abril de 2006 foram levantados dados de campo, por meio da observação participante e em entrevistas semi-estruturadas, com informantes de ambos os gêneros e idade entre 40 e 80 anos. Paralelamente, fez-se o inventário florístico e fitossociológico em 0,1 ha do fragmento de mata atlântica mais utilizado pela comunidade, com o auxílio do especialista local. Os dados colhidos possibilitaram a elaboração de uma listagem contendo 192 etnoespécies enquadradas em 188 morfoespécies, das quais foram identificadas 182 espécies botânicas diferentes pertencentes a 70 famílias. A maioria delas (59%) são nativas do bioma mata atlântica e cultivadas nos quintais e pomares quilombolas (62%), porém há necessidade programas de manejo e conservação do remanescente florestal existente, de onde retiram o restante dos recursos vegetais. As famílias com maior número de espécies úteis são Asteraceae, Fabaceae e Lamiaceae. As espécies foram classificadas nas categorias de uso: medicinal (52%), alimentar (34%), construção (18%), tecnologia (10%), ritualística (5%), ornamental (5%) e lenha (2%). As folhas, o caule e frutos de espécies arbóreas e herbáceas são os mais utilizados pelos informantes. As plantas com maiores Valor de Uso foram: Attalea humilis Mart. ex. Spreng e Polyandrococos caudescens (Mart.) Barb. Rodr., com 1,3 e 1,1 respectivamente. O Índice de Diversidade de conhecimento etnobotânico dos quilombolas de Cachoeira do Retiro (5,12 nats) é bem alto quando comparado com outros trabalhos etnobotânicos na mata atlântica. As três espécies com maior Valor de Importância no fragmento foram: Zeyheria tuberculosa (Vell.) Bureau, Siparuna guianensis Aubl. e Cedrela fissilis Vell. O Índice de Diversidade de Shannon foi de 3,37 nats. Das plantas encontradas na floresta local, 55,5% possuem alguma utilidade para os moradores de Cachoeira do Retiro. O especialista local, que nomeou 80% das espécies da floresta, identifica como a causa principal da destruição das matas da região, o aumento das áreas de pastagem. Constata-se na análise do impacto de manejo que 20% das plantas úteis do fragmento têm prioridade de conservação. A família Arecaceae é de grande importância para a comunidade local, podendo ser objeto de estudos quanto à forma de utilização e manejo das espécies para diversos fins.
Palavras-chave: Quilombolas, Espírito Santo, Manejo, Conservação, Mata Atlântica.
xi
Abstract
The present work was accomplished in the quilombola community Cachoeira do Retiro, located in the municipal district of Santa Leopoldina (lat. 20º06'04 " S and long. 40º31'47 " W), State of the Espírito Santo. The municipal district is part of the priority areas for flora conservation, sustainable use and benefit sharing of the Brazilian biodiversity, inside the Central Corridor of the Atlantic forest, and considered a hotspot. The local community counts on 72 families, living in an area of around 154 ha, now expecting due registration of lands by INCRA. The general objective of this study is to identify and to systematize the plant species used by the community, looking for its preservation through a policy that favors the interaction of the science and planning in the models of the research-action intervention. Between August 2005 and April 2006, a field data collection was carried out, consisting of participating observation and interviews semi-structured, with local inhabitants of both sexes and ages between 40 and 80 years. At the same time, it was made a floristic and phytossociologycal inventory in 0,1 ha of the Atlantic forest fragment extensively used by the community, with the aid of a local specialist. The collected data resulted in a list containing 192 etnospecies, classified in 188 morfospecies, among them could identified as 182 different botanical species belonging to 70 families. Most part of the sample (59%) are native species of Atlantic forest, grown in quilombola’s house yards and orchards (62%); however, there is a need for conservation programs of the forest remainders. The botanical families of the most useful species are Asteraceae, Fabaceae and Lamiaceae. The species were classified in the use categories: medicinal (52%), food (34%), construction (18%), technology (10%), ritualistic (5%), ornamental (5%) and firewood (2%). The leaves, the stem and fruits of arboreal and herbaceous species are the most used by the informants. The plants with larger VU were: Attalea humilis Mart. ex. Spreng and Polyandrococos caudescens (Mart.) Barb. Rodr., with 1,3 and 1,1 respectively. The Index of Diversity of etnobotanic knowledge among the quilombolas of Cachoeira do Retiro (5,12 nats) is much higher than that of other reported studies of the Atlantic forest. Three species with the highest Values of Importance (VI) in the fragment were: Zeyheria tuberculosa (Vell.) Bureau, Siparuna guianensis Aubl. e Cedrela fissilis Vell. The Shannon´s Index of Diversity was of 3,37 nats. From plants found at the local forest, 55,5% have some use for the residents of Cachoeira do Retiro. In agreement with the local specialist, that named 80% of the forest species, the main cause of destruction of the forest is its intensive exploration as cattle pasture. The analysis of the management impact showed that 20% of the useful plants of the studied fragment represents a conservation priority. The family Arecaceae has great importance for the community in study, deserving additional research on the uses and management of the species for several purposes. Key-words: Quilombolas, Espírito Santo, Handling, Conservation, Atlantic forest.
xii
Sumário
Pré-textual Página
Dedicatória .....................................................................................................................vi
Agradecimentos ............................................................................................................vii
Resumo ............................................................................................................................x
Abstract ..........................................................................................................................xi
Sumário .........................................................................................................................xii
Índice de figuras ...........................................................................................................xiv
Índice de tabelas ...........................................................................................................xvi
Introdução ...............................................................................................................................01
Material e Métodos .................................................................................................................08
Área de estudo ...............................................................................................................08
A Comunidade Quilombola de Cachoeira do Retiro ....................................................09
A floresta local ..............................................................................................................11
Florística e Fitossociologia ...........................................................................................13
Inventário Etnobotânico ................................................................................................15
Resultados e Discussão ...........................................................................................................20
Os informantes e as plantas úteis por eles citadas .........................................................20
As categorias de uso ......................................................................................................30
Partes vegetais utilizadas e hábito das plantas úteis ......................................................33
Índice de Diversidade do conhecimento etnobotânico ..................................................35
Caminhando na floresta .................................................................................................36
Valor de uso global das espécies ..................................................................................37
Valor de uso das famílias botânicas ..............................................................................39
O fragmento utilizado pelos informantes: florística e fitossociologia ..........................41
Análise do impacto de manejo ......................................................................................47
Conclusões ...............................................................................................................................51
Recomendações .......................................................................................................................53
Referências Bibliográficas ......................................................................................................56
xiii
Anexos
Anexo 1 – Questionário para obtenção de dados etnobotânicos ...................................62
Anexo 2 – Registros fotográficos da comunidade quilombola
Cachoeira do Retiro ....................................................................................63
xiv
Índice de figuras
Página
1 – Imagem localizando as áreas de coleta coleta de dados e materiais
para estudos etnobotânicos e fitossociológico .................................................................12
2 – Distribuição dos entrevistados na comunidade quilombola Cachoeira
do Retiro, por classe etária e gênero ...............................................................................20
3 – Origem e local de coleta das espécies (em %) citadas e apontadas
pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..........................................................21
4 – Famílias com maior número de espécies citadas como úteis
pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..........................................................29
5 – Distribuição das espécies, por categoria de uso (em %), citadas pela
comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..............................................................30
6 – Proporção de espécies nativas e exóticas, por categoria de uso,
citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro .............................................31
7 – Números de citações, espécies e espécies exclusivas,
por categoria de uso, da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro .......................33
8 – Distribuição das espécies, por parte utilizada (em %), citadas
pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..........................................................33
9 – Porcentagem de espécies por hábito, citadas como úteis pela
comunidade quilombola Cachoeira do Retiro .................................................................34
10 – Distribuição das espécies, por categoria de uso (em %), citadas
pelo informante Mário Raimundo Pereira, especialista local da
comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..............................................................36
11 – Origem das espécies citadas pelo informante Mário Raimundo Pereira,
especialista local da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro (em %) .................37
12 – Valor de uso e a porcentagem de espécies citadas pela
comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..............................................................38
13 – As doze espécies com maior VU e suas categorias de uso,
citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ...........................................39
14 – As dez famílias com maior soma dos VUs e as categorias de uso
da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro ..........................................................40
xv
15 – Contribuição do VU em cada categoria (em %)
para comunidade quilombola Cachoeira do Retiro .......................................................41
16 - Distribuição do número de espécies por família que apresentaram mais
de duas espécies no fragmento de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro ..............42
17 - Número de espécies de árvores acumulado em função do número
de transecções de 50 x 2m no fragmento de floresta atlântica em
Cachoeira do Retiro ......................................................................................................42
18 - Número de indivíduos das três espécies mais abundantes
em comparação com as demais 51 espécies no fragmento
de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro ................................................................43
xvi
Índice de tabelas
Página
1 - Usos de plantas pelos quilombolas de Cachoeira do Retiro ................................................16
2 - Critério de pontuação utilizado para se determinar espécies
com prioridades de conservação .........................................................................................18
3 - Lista de espécies citadas como úteis pelos quilombolas de Cachoeira de Retiro ................22
4 – Comparação dos índices de diversidade etnobotânico
compilados de estudos realizados com comunidades tradicionais na mata atlântica ..........35
5 – Famílias com maiores VUF na comunidade quilombola
de Cachoeira do Retiro ........................................................................................................39
6 – Parâmetros fitossociológicos das espécies amostradas
em 0,1 ha de fragmento de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro ...............................44
7 – Pontuação obtida para as espécies do inventário etnobotânico após o cálculo
utilizado para se determinar as espécies com prioridades de conservação .........................48
8 – Pontuação obtida para as espécies do inventário etnobotânico,
após a modificação da variável Densidade na área, através do cálculo
utilizado para se determinar as espécies com prioridades de conservação ........................50
1
Introdução
Etnobotânica é o estudo das inter-relações entre plantas e pessoas (Gomez-Beloz
2002), em suas dimensões antropológica, ecológica e botânica. Em seu âmbito desenvolve-
se o estudo das sociedades humanas, passadas e presentes, e suas interações ecológicas,
genéticas, evolutivas, simbólicas e culturais com as plantas (Alexiades 1996). A origem
desse ramo de conhecimento está estreitamente ligada à história da própria civilização
humana que, no seu processo evolutivo, passou da condição de simples coletor, para
caçador, pastor e agricultor (Lima 1996). Prance (1995) considera que a etnobotânica
inicia-se com os trabalhos de Carl Linnaeus, pois seus diários de viagens contêm dados
referentes às culturas visitadas, os costumes de seus habitantes e o modo de utilização das
plantas. Em 1886, Alphonse De Candolle publica “Origin of cultivated plants”, onde dados
etnobotânicos foram empregados nos estudos sobre origem e distribuição de plantas
cultivadas (Albuquerque 2002). O termo “etnobotânica” foi empregado pela primeira vez
em 1895 por Harshberger (Amorozo 1996).
Esta ciência está ganhando cada vez mais visibilidade no mundo, em função da
importância das duas vertentes atuais da pesquisa etnobotânica (Kageyama 2005):
Indústrias à procura de recursos patenteáveis; Conhecimento da biodiversidade regional
para a manutenção do ambiente, buscando reintegrar o homem e sua diversidade cultural
nesse contexto.
Um dos compromissos da etnobotânica é compartilhar o conhecimento com quem o
gerou, contribuindo para a melhoria da qualidade de vida das populações estudadas (Lima
1996). Esse é o grande desafio que a etnobotânica enfrenta atualmente: a repartição justa e
eqüitativa dos benefícios derivados da utilização da diversidade vegetal. Tema complexo,
fruto da Convenção da Diversidade Biológica (art. 8(j)) e presente na Estratégia Global
para Conservação de Plantas (anexo A 5c(ii)) ainda não obteve consenso na última
Convenção das Partes (COP 8) realizada em março de 2006, no Brasil, na cidade de
Curitiba.
Inventariar os conhecimentos, usos e práticas das sociedades tradicionais é
fundamental, pois elas são depositárias de parte considerável do saber sobre a diversidade
biológica (Diegues & Arruda 2001). O registro dos usos que os vários povos fazem dos
recursos vegetais contribui para o conhecimento da biodiversidade das florestas tropicais
(Lima 1996), podendo subsidiar trabalhos sobre uso sustentável dos recursos naturais
2
(Fonseca-Kruel & Peixoto 2004). É importante realizar tanto análises quantitativas quanto
qualitativas para se estudar o conhecimento etnobotânico e utilizar esses dados no manejo
e conservação dos recursos naturais, principalmente dentro de remanescentes florestais
importantes para a conservação (Hanazaki et al. 2000).
As pessoas afetam a estrutura de comunidades vegetais e paisagens, a evolução de
espécies individuais, a biologia de determinadas populações de plantas de interesse, não
apenas sob aspectos negativos como comumente se credita à intervenção humana, mas
beneficiando e promovendo os recursos manejados (Albuquerque & Andrade 2002).
Verificar se áreas habitadas por populações tradicionais conservam-se sob cobertura
florestal e com alta biodiversidade, devido ao manejo ligado ao modo de vida das
comunidades, é fundamental, pois contraria o conceito de “wilderness” norte americano e
reafirma o conceito da Ecologia Social (Diegues 1994).
A forte dependência das sociedades tradicionais aos recursos naturais, sua estrutura
simbólica, seus sistemas de manejo e seu isolamento possibilitam uma parceria nos
esforços para conservação. Os conservacionistas devem valorizar os aspectos positivos
dessas culturas por meio de ações que levem à melhoria das condições de vida das
comunidades tradicionais. Alguns exemplos nos vários continentes têm revelado que
quando é dado o apoio necessário a essas comunidades, elas são as primeiras a mostrar
oposição aos efeitos devastadores das mineradoras, madeireiras e especuladores (Diegues
& Arruda 2001). A população local é a chave para combinar o saber científico com o saber
local, visando contribuir com o planejamento de estratégias de desenvolvimento
(Albuquerque & Andrade 2002). Assim, programas de conservação devem lutar pela
sobrevivência e permanência das populações nativas, encorajando as atividades
tradicionais e considerando o seu conhecimento sobre a vegetação (Hanazaki et al. 2000).
A desagregação das comunidades tradicionais acompanha a devastação do ambiente e a
intrusão de novos elementos culturais, ameaçando um acervo de conhecimentos empíricos
e um patrimônio genético de valor inestimável para as gerações futuras, justificando a
realização de trabalhos etnobotânicos (Amorozo & Gely 1988).
A Floresta Atlântica é o primeiro ponto crítico para conservação no Brasil, devido
ao seu alto endemismo, grau de devastação e pressão antrópica (Rocha et al. 2003). A
Mata Atlântica abrangia uma área de 1.300.000 km2 distribuídos em 17 dos estados atuais,
percorrendo toda a faixa litorânea que vai do Rio Grande do Norte ao Rio Grande do Sul.
Como conseqüência dessa grande amplitude latitudinal e, portanto, grande variedade
climática, apresenta uma enorme diversidade biológica (Costa 1999). A diversidade de
3
plantas vasculares é estimada em 20.000 espécies, das quais mais de 6.000 são
consideradas endêmicas (Mittermeier et al. 1999). Cerca de 158 espécies de aves, 128 de
anfíbios e 50 de mamíferos de pequeno porte são endêmicas da Mata Atlântica, além de
um grande número de populações tradicionais (Brasil 1998). No entanto, os trechos hoje
florestados desse bioma encontram-se reduzidos a apenas 7,3% de sua cobertura original.
As quatro capitais da região sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Vitória)
situam-se no domínio da Mata Atlântica e geram enormes problemas aos poucos e isolados
remanescentes que existem hoje (Rocha et al. 2003).
O Estado do Espírito Santo, cujo território abrange 45.597 km², possuía na época
do descobrimento uma cobertura florestal original de cerca de 4.000.000 ha,
correspondendo a 87 % seu do território, sendo as demais áreas constituídas por brejos,
restingas, mangues, campos de altitude e campos rupestres (Fundação SOS Mata Atlântica/
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais 1993). Segundo a mesma fonte, o confronto de
imagens de satélite tomadas em 1985 e 1990 mostra que restavam cerca de 402.392 ha de
florestas, correspondendo a 8,34 % da superfície do Estado. Entre 1985 e 1990, o Estado
perdeu 19.212 ha de florestas e 1.346 ha de restinga.
A intensificação das pesquisas, visando coleta do material botânico, registro de
informações etnobotânicas, estudos da viabilidade de mercado e análise dos princípios
ativos são metas que devem ser atingidas para melhorar o conhecimento da Floresta
Atlântica (Lima 1996). O inventário florístico é uma importante etapa no conhecimento de
um ecossistema, fornecendo informações básicas para embasar estudos posteriores. O
inventário tem como objetivo identificar as espécies que ocorrem em uma determinada
área através do estudo taxonômico do material botânico coletado, que é preparado e
depositado em herbários (Sylvestre & Rosa 2002). Os estudos fitossociológicos são
importantes para a caracterização do papel exercido por cada espécie dentro da
comunidade, contribuindo para a indicação dos diversos estádios sucessionais e para uma
melhor avaliação dos fatores abióticos como clima e solo. A maior ou menor abundância
de determinadas espécies nos diversos ambientes é de grande importância para caracterizar
determinadas formações florestais. A necessidade de utilização dos recursos naturais,
associadas às exigências culturais e biológicas da sociedade humana, intensificou cada vez
mais a necessidade de se incorporar os conhecimentos básicos sobre os diversos
ecossistemas e gerar tecnologias capazes de promover resultados efetivos no manejo da
flora (Souza 2002). Conhecendo-se as espécies de um ecossistema pode-se prever
4
melhores mecanismos para conservar grupos e estabelecer propriedades e seus usos (Fraga
2000).
O território brasileiro conta com grande diversidade de ecossistemas e mais de 200
grupos étnicos (Brasil 1998). Dentre as categorias de populações tradicionais não indígenas
consideradas por Diegues & Arruda (2001) destacam-se as comunidades remanescentes de
quilombos. A expressão remanescente das comunidades de quilombos, que emerge na
Assembléia Constituinte de 1988, é tributária não somente dos pleitos por títulos
fundiários, mas de uma discussão mais ampla travada nos movimentos negros e entre
parlamentares envolvidos com a luta anti-racista (Leite 2000). A expressão quilombo vem
sendo sistematicamente usada desde o período colonial. Ney Lopes afirma que quilombo é
um conceito próprio dos africanos bantos que vem sendo modificado através dos séculos.
"... Quer dizer acampamento guerreiro na floresta, sendo entendido ainda em Angola como
divisão administrativa ..." (Lopes 1987 apud Leite 2000). O Conselho Ultramarino
Português de 1740 (apud Leite 2000) definiu quilombo como toda habitação de negros
fugidos que passem de cinco, em parte desprovida, ainda que não tenham ranchos
levantados nem se achem pilões neles A definição operacional de quilombo adotada pela
Associação Brasileira de Antropologia (ABA) propõe a consideração dos seguintes
elementos:
“1) Processo de produção autônomo (livre acesso a terra, decisão do que plantar e
comercialização independente de qualquer controle externo); 2) capacidade de
organização político-administrativa; 3) critério ecológico de preservação dos recursos;
4) autodefinição dos agentes e da coletividade; 5) grau de conflito e antagonismo; 6)
formas de uso comum; combinação de domínios privados (familiares, domésticos) e
públicos” (O’Dwyer 1998 apud Oliveira 1999).
“Os escravos que fugiam das fazendas e internavam-se pelas matas ou sertões em
busca da liberdade e um modo de vida autônomo eram conhecidos como quilombolas ou
calhambolas. Viviam em grutas de pedras, deixavam o cabelo crescer para tornarem-se
irreconhecíveis e usavam roupas tecidas de palhas de indaiá e cipó. Alimentavam-se de
caça, coco da mata, frutas nativas e mandioca que saqueavam dos roçados vizinhos”
(Malheiros 1944 apud Oliveira 1999). Dos negros de origem Banto vieram populações do
Congo, de Angola e Moçambique, que chegados no Brasil no período colonial foram
localizados nos atuais estados do Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais.
Os sudaneses (Jejê de Daomé e Nagô), que incluíam os grupos da África Ocidental
5
(Nigéria, Benim), foram instalados nas zonas urbanas das principais capitais do Norte e
Nordeste do país, como Salvador e Recife (Albuquerque 1999). Quilombolas são
descendentes de escravos negros que vivem, em geral, de atividades ligadas à pequena
agricultura, artesanato, extrativismo e pesca, variando de acordo com a região onde estão
situados. Podem ser definidos como “toda comunidade negra rural que agrupe
descendentes de escravos vivendo da cultura de subsistência e onde as manifestações
culturais têm forte vínculo com o passado” (Queiroz 1997). Apesar de existirem desde a
escravatura, no fim do século XIX, sua visibilidade social é recente, tendo garantido os
seus direitos de posse da terra pelo artigo 68 da Constituição Federal de 1988 - “Aos
remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é
reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos”.
Segundo informação da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades
Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) parecem existir hoje no Brasil mais de quatro mil
comunidades que podem vir a serem reconhecidas como comunidades quilombolas.
Correspondem as chamadas Terras de Preto ou Comunidades Negras Rurais que têm suas
origens em fazendas falidas, doações de terras para ex-escravos, das compras de terras por
escravos alforriados, da prestação de serviços de escravos em guerra, entre outras (IBASE
2006). Nos últimos vinte anos os afrodescendentes, organizados em Associações
Quilombolas, reivindicam o direito à permanência e ao reconhecimento legal de posse das
terras ocupadas e cultivadas para moradia e sustento, bem como o livre exercício de suas
práticas, crenças e valores, considerados em sua especificidade. O quilombo na atualidade
significa, para esta parcela da sociedade brasileira, um direito a ser reconhecido e não
propriamente e apenas um passado a ser rememorado (Leite 2000).
Do total de trabalhos analisados por Diegues & Arruda (2001), por grupo tradicional
não-indígena (483), 18 (3,7%) referem-se aos quilombolas, todos publicados a partir de
1980. O número de trabalhos sobre quilombolas tem aumentado nos últimos anos, indicando
a crescente visibilidade desse grupo social (Diegues & Arruda 2001). Comprova-se essa
informação também através da análise das políticas públicas atuais, como criação da
SEPPIR – Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial em 2003, que
através do Programa Brasil Quilombola (PBQ/SEPPIR 2004) auxilia comunidades
quilombolas na regularização fundiária (realizada pelo INCRA), infra-estrutura e serviços,
desenvolvimento econômico e social (descobrimento sustentável – geração de emprego e
renda) e controle e participação social. Existem outros programas do Governo Federal
6
atuantes nas comunidades quilombolas no Espírito Santo, como o bolsa escola/ bolsa
família, programa de erradicação do trabalho infantil (PETI), Habitat Brasil, entre outros. A
CONAQ – Coordenação Nacional de Comunidades Quilombolas e a CONEN –
Coordenação Nacional de Entidades Negras também possuem projetos no Estado. O
Governo do Estado promove projeto de suplementação alimentar e de reconhecimento dos
territórios quilombolas, com apoio do Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA).
Estudos etnobotânicos realizados no Espírito Santo são escassos, destacando-se os
realizados na porção norte do Estado, mais especificamente na região de Aracruz
(Simonelli & Pereira 1994), Ilha de Guriri (Jesus 1997) e Itaúnas (Kunsch 1999) e ao sul
da capital Vitória, nos municípios de Vila Velha e Guarapari (Simonelli & Pereira 1995).
Existe apenas um trabalho etnobotânico publicado, realizado com benzedores em Santa
Teresa (Medeiros et al. 2004). Não há nenhum trabalho publicado sobre o conhecimento
etnobotânico de comunidades quilombolas do Espírito Santo, apesar da grande
concentração de remanescentes desta categoria de população tradicional no Estado.
Os africanos, junto com os indígenas e europeus, são responsáveis pela formação
das bases culturais e biológicas sobre o conhecimento das plantas úteis no Brasil. No
processo histórico brasileiro, os negros realizaram um duplo trabalho: transplantaram um
sistema de classificação botânica da África e introjetaram as plantas nativas do Brasil na
sua cultura, através de seu efeito médico simbólico (Almeida 2003). Sabe-se que o negro
influenciou a medicina tradicional por sua história empírica de convívio com a natureza e
os recursos que dela buscavam nas suas preparações medicamentosas onde vegetais,
minerais e animais se associavam. As plantas também entram no preparo das tradicionais
garrafadas, de uso muito comum nos cultos afro-brasileiros (Albuquerque 1999). O fato de
existirem diversas informações obtidas em diferentes realidades culturais, o elemento de
aproximação para interpretações sociológicas, antropológicas, botânicas e etnobotânicas é
o nome científico correto.
No Espírito Santo, as comunidades quilombolas que estão ao Sul são menos
organizadas e carentes de uma articulação que possa vir a inseri-las mais fortemente no
Movimento Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas. De acordo com dados
do INCRA, há indícios de cerca de 75 comunidades remanescentes de quilombos no
Estado do Espírito Santo. Destas, apenas oito já se encontram certificadas - reconhecidas
como comunidades quilombolas pela Fundação Cultural Palmares. As demais
comunidades estão sendo mapeadas. Este processo começa com o envio de uma carta de
auto-identificação iniciando a formalização do pedido de certificação. Das comunidades
7
reconhecidas/certificadas pela Fundação Cultural Palmares no Espírito Santo, nenhuma
possui a titulação definitiva de suas terras. Supõe-se que cerca de 38 comunidades
quilombolas situem-se na região conhecida como Sapê do Norte e 37 no centro-sul do
Espírito Santo (Incra 2006).
Dentro deste contexto, escolheu-se estudar uma comunidade quilombola situada no
município de Santa Leopoldina, considerado “Área Prioritária para Conservação da Flora”
(MMA/SBF 2002) e área de atuação do Projeto Corredores Ecológicos (MMA/IEMA
2006). Esperava-se encontrar um elevado conhecimento etnobotânico na comunidade
devido ao seu afastamento do principal centro urbano local e sua localização em região de
alta diversidade biológica, conforme apresentado em Begossi et al. (2002). Procurou-se
responder às seguintes perguntas: quais são as plantas utilizadas pela comunidade e
quantas são nativas do bioma mata atlântica? Qual parte do vegetal é utilizada e quais estão
com prioridade de conservação? Quais as categorias de uso são mais importantes para
eles? Já o inventário florístico e a estrutura da área de vegetação secundária do
remanescente de Cachoeira do Retiro são importantes para o planejamento das áreas inter-
situ (Pires et al. 2002), subsidiando as ações do Projeto Corredores Ecológicos – Corredor
Central da Mata Atlântica. O retorno das informações obtidas na comunidade será na
forma de projetos que serão submetidos aos programas de envolvimento e geração de
emprego e renda aliados à utilização racional dos recursos vegetais. Pretende-se buscar
novos instrumentos de política que favoreçam a interação da ciência e planejamento nos
moldes da pesquisa-ação (Vieira & Weber 1997), como uma tentativa de mudança na
lógica do consumo e consumidor .
8
Material e Métodos
r Área de estudo
A comunidade quilombola estudada habita as terras baixas do município de Santa
Leopoldina (lat 20º06’04" S e long 40º31’47" W), estado do Espírito Santo, a 16 km da
sede do município e a 44 km de distância da capital Vitória. A colonização de Santa
Leopoldina se iniciou em 1856 às margens do Rio Santa Maria, onde se instalaram os
primeiros imigrantes. Neste local existiam remanescentes de populações indígenas, que
junto com os afrodescendentes, alemães, tiroleses, pomeranos, luxemburgueses, suíços,
italianos e holandeses fazem parte das etnias que originaram a população do município.
Em 1860 Santa Maria recebe a visita de D. Pedro II e sua esposa Leopoldina e passa a ser
chamada de Cachoeiro de Santa Leopoldina. Tornou-se município em 1884, pela Lei
provincial nº 21, de 04/04/1884 desmembrado de Vitória e instalado como tal em 1887.
Em 1943 teve seu nome simplificado para Santa Leopoldina. O município possui grande
potencial turístico com atrativos naturais, culturais e arquitetônicos, com sítios históricos,
sobrados e casarões construídos no fim do século XIX e início do século XX, a Igreja
Matriz Sagrada Família, construída no início do século XIX, além de inúmeras cachoeiras
(IMEES 1993). O relevo é montanhoso e fortemente ondulado. O clima da região, segundo
a classificação de Koeppen (1948), é do tipo Am, tropical quente, sem seca no inverno. Os
principais rios são Santa Maria de Vitória, Caramuru, das Farinhas e Mangaraí, sendo este
último o rio que passa dentro das terras quilombolas de Cachoeira do Retiro. O solo é do
tipo Latossolo Amarelo Distrófico, com fertilidade de média a baixa, pH = 5,0. Possui
57,87% de sua área com declividade entre 30 e 100%. A maior ocorrência de chuvas é de
novembro a março (IMEES 1993).
O município de Santa Leopoldina possui área de 710, 17 km2, equivalente a 1,59 %
do território estadual. Agrega 12.463 habitantes, sendo 6.552 do sexo masculino e 5.911 do
sexo feminino. Estão divididos em 2.466 domicílios localizados em área urbana e nos
9.997 em área rural, com uma média municipal de 3,5 pessoas por domicílio (IBGE 2000).
Limita-se ao norte com Santa Teresa e Fundão; ao sul com Domingos Martins e Cariacica;
a leste com Serra e a oeste com Santa Maria de Jetibá. Além da sede, é compreendido
pelos distritos de Djalma Coutinho e Mangaraí. A área do distrito de Mangaraí,
denominada de “terras baixas” do Município de Santa Leopoldina, foi ocupada pelos
portugueses antes do século XIX (Schwarz, 1992 apud Oliveira 1999). Cultivavam cana-
9
de-açúcar, café, mandioca, arroz e milho, utilizando mão-de-obra escrava. O rio Mangaraí
é de grande importância para a comunidade, sendo fonte de complementação alimentar e
de irrigação para a lavoura, além de ser o local onde muitos se banham. Segundo os mais
velhos o rio já ofereceu água potável, mas desde o início dos anos 80, com a especulação
imobiliária no vale do Mangaraí e uso indevido da terra pelos fazendeiros da região,
tornou-se poluído, obrigando a população a perfurar poços e cacimbas (Oliveira 1999).
r Comunidade quilombola de Cachoeira do Retiro
A Comunidade Quilombola de Cachoeira do Retiro possui aproximadamente 154
ha no distrito de Mangaraí, tendo suas terras em processo de titulação pelo INCRA.
Existem hoje aproximadamente 250 pessoas distribuídas em 72 famílias, aproximadamente
40 ha de floresta secundária, casas, bares, 4 quitungos (local onde se processa a fabricação
da farinha de mandioca), um campo de futebol, uma creche e um Centro Comunitário,
onde se realizam as reuniões da Associação dos Herdeiros de Benvindo Pereira dos Anjos
(AHBPA). Criada em 1990, teve como principal objetivo a habilitação para requisição dos
direitos constitucionais sobre a terra que ocupam e a competição por recursos municipais,
estaduais e federais. Sua atual presidente é Marina dos Santos Pereira. A Banda de Congo
“Unidos do Retiro”, formada na década de 90, aparece como parte do folclore da região
(IBASE 2006). Há aproximadamente três anos deram início a formação da banda de congo
mirim devido à saída de vários batedores da banda adulta e da constante presença das
crianças no meio dos tocadores. Esta formação teve como objetivo também garantir a
continuidade do congo na comunidade. A banda adulta possui dez pessoas e a banda mirim
quinze. Realizam apresentações na comunidade e, a convite, se apresentam em locais
externos, representando a comunidade e o município na mídia e até internacionalmente. A
banda, em homenagem a São Benedito e São Sebastião, tem como objetivo principal a
manutenção da raiz, tradição e cultura negra possuindo, como parceiros, a AHBPA e a
Prefeitura Municipal de Santa Leopoldina. Existe também o “Unidos Futebol Clube” há
pelo menos 36 anos, contando hoje com 50 jogadores sendo 40 da comunidade. Duas
igrejas atuam na comunidade: Católica e Metodista.
Segundo Oliveira (1999), a população que habita a área se autodefine como negros,
parentes e herdeiros de Benvindo Pereira dos Anjos, ancestral comum do qual herdaram a
terra. A endogamia é comum nessa comunidade, justificada pela posse e uso em comum da
terra herdada. Identificam-se pelo uso compartilhado do seu nome, os Benvindos, e estão
10
relacionados entre si por laços de parentesco. A versão da história de Benvindo Pereira dos
Anjos (1834 – 1919) mais bem aceita pelo grupo é que ele foi escravo de Severiana Maria
de Albuquerque e Gonçalo Pereira das Neves. A esposa de Benvindo, Maria Pereira das
Neves era alforriada e trabalhava com artesanato. Em 1895 ele compra a primeira das duas
áreas de terra adquiridas em Mangaraí. Benvindo Pereira dos Anjos morre em 1919 e sua
mulher em 1932. Existe também a história da insurreição dos escravos de Queimado, vila
localizada a 6 km em linha reta de Retiro, ocorrida em 19 de março de 1849 (Maciel 1993
apud Oliveira 1999). Os escravos construíram uma Igreja com a promessa de obterem a
carta de alforria no final da construção. Como isso não ocorreu, organizaram uma grande
rebelião que causou a prisão, morte e fuga de vários escravos. Relatórios dos presidentes
da Província do Espírito Santo e da polícia, a partir de 1840, reportam sobre a presença de
escravos fugidos e a formação de quilombos no município de Santa Leopoldina nos
últimos anos de escravidão (Oliveira 1999).
Apresentam características bem peculiares no que tange as formas de posse e uso
comum da terra. O grupo é definido como “remanescente de quilombos” para efeito de
aplicação do dispositivo previsto pelo artigo 68 do ADCT – CF/88, sendo publicado
posteriormente pelos dois periódicos de maior circulação no Estado, A Tribuna e A Gazeta
(em 23/11/1997 e 16/08/1998, respectivamente). Nesses artigos a comunidade foi
considerada como geograficamente isolada no meio da mata, configuração que parece
necessária para explicar sua exclusividade negra, a manifestação atual de suas tradições
culturais como o Congo e a prática da agricultura de subsistência. As principais atividades
realizadas pela comunidade são o plantio de mandioca (para a fabricação da farinha), café,
banana, cana-de-açúcar, coco, maracujá, figo, laranja, jaca, abacate, abacaxi, manga,
jenipapo, fruta-pão, mexerica, araçá, goiaba, mamão e caju, a criação de patos, galinhas e
porcos para o consumo interno, além das atividades artesanais, como as peneiras, cestos de
cipó, tipiti, vassouras e esteiras. O estudo de reelaboração da identidade étnica na
comunidade de Cachoeira do Retiro foi tema da dissertação de Oliveira (1999) e portanto
não será tratado neste trabalho. Dados sobre a comunidade como educação, saúde,
saneamento, comércio, trabalho e renda, transporte, esporte e lazer, cultura e turismo,
programas e projetos sociais estão compilados em um diagnóstico social realizado pelo
IBASE em 2006.
11
r A floresta local
Segundo a classificação do projeto Radam Brasil (1982), o município de Santa
Leopoldina é coberto por Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas e Floresta Ombrófila
Densa Sub-Montana, obedecendo a uma hierarquia topográfica e fisionômica. A Formação
Ombrófila Densa ocorre sobre litologia variada. Segundo a classificação de Veloso et al.
(1991), Floresta Ombrófila Densa são as formações vegetais que variam conforme as
condições edáficas e altimétricas. Caracterizam-se por apresentarem densa população
arbórea, com copas largas e bem desenvolvidas. Está delimitada, de maneira geral, pela
faixa de 0 a 60 dias secos. A forma de vida dominante nos agrupamentos remanescentes é
a fanerofítica, sem proteção do broto foliar contra seca. Os ambientes da Floresta
Ombrófila Densa apresentam chuvas bem distribuídas, com médias anuais em torno de
1.500 mm, havendo estações sem seca ou mesmo com grande disponibilidade de umidade.
Em Santa Teresa, município que adjacente a Santa Leopoldina, registrou-se uma grande
diversidade de fanerógamas: 443 espécies em 1,02 hectares. Os Índices de Diversidade
H’= 5,506 nats e Equabilidade J= 0,906 são os maiores valores encontrados e publicados
para a Mata Atlântica. As famílias Myrtaceae e Lauraceae foram responsáveis pelo maior
número de espécies encontradas (Thomaz & Monteiro 1997).
A localização da comunidade e as áreas de coleta de dados e materiais para os
estudos etnobotânicos e fitossociológicos estão ilustradas na Figura 1. Os pontos 1 e 2
representam as duas áreas do inventário florístico e fitossociológico, pertencentes a um
mesmo fragmento florestal. Pode-se observar que uma parte da área do quilombola situa-se
dentro dos limites do corredor-piloto “Centro-Norte-Serrano”.
12
Figura 1 – Imagem localizando as áreas de coleta de dados e materiais para estudos etnobotânicos e fitossociológico.
13
r Florística e Fitossociologia
Com a finalidade de conhecer melhor o fragmento florestal que a comunidade
quilombola utiliza, realizou-se inventário em 0,1 ha. O método utilizado para o inventário
florístico foi o de transeção (Peixoto & Gentry 1990), que consiste em amostrar a
vegetação através da demarcação de um eixo central com auxílio de uma trena. Defini-se a
direção com a ajuda de uma bússola e marca-se uma transeção de 50 m de comprimento e
2 m de largura, sendo 1 m para cada lado, totalizando uma área de 100 m2. Em cada
transeção foram amostrados indivíduos com PAP ≥ 7,5 cm. (perímetro na altura do peito),
anotando informações como número de coleta, altura total, e quando possível, nome da
família, gênero e espécie, bem como outras observações (hábito, rebrote, bifurcações,
presença de látex, etc.). O inventário foi realizado em 2 áreas separadas dentro do mesmo
fragmento (Figura 1), indicadas por um especialista local como sendo as áreas mais
utilizadas pela comunidade. Em cada área de coleta fitossociológica/etnobotânica foram
marcadas 5 transeções, distantes 20 metros uma da outra, totalizando 0,05 ha amostrados
em cada área. Coletou-se amostras botânicas entre agosto de 2005 e fevereiro de 2006,
sendo o material botânico processado segundo Mori et al. (1989), e identificado através do
uso de chaves e literatura taxonômica, comparação com exsicatas dos herbários do Jardim
Botânico do Rio de Janeiro (RB) e do Museu de Biologia Mello Leitão (MBML), além da
valiosa ajuda de especialistas. As plantas foram classificadas seguindo-se o APG II (2003).
Após a identificação taxonômica, as exsicatas foram depositadas no herbário RB, com
duplicata das espécies em estádio reprodutivo no herbário MBML. Em seguida, com
auxílio do programa Fitopac (Shepherd 1995), realizou-se os cálculos dos seguintes
parâmetros fitossociológicos (Mueller-Dombois & Ellenberg 1974).
Densidade Total por Área (DTA): Representa o número total de indivíduos de
todas as espécies, por unidade de área, normalmente expressa em relação a 1 ha.
DTA = N/ 1 ha
N = número total de indivíduos amostrados.
14
Densidade Específica Relativa (DRs): Representa a proporção percentual do
número de indivíduos de uma determinada espécie, em relação ao número total de
indivíduos amostrados, de todas as espécies.
100•=N
nDR s
S
ns = número de indivíduos amostrados da espécie s; N = número total de indivíduos
amostrados.
Freqüência Absoluta (FAs): Representa em que grau a espécie ocorre nas
transecções.
100•
=
t
ss P
PFA
Ps = número de transecções em que ocorre a espécie s; Pt = número total de transecções.
Freqüência Relativa (FRs): Obtida da relação entre a freqüência absoluta de cada
espécie e a soma das freqüências absolutas de todas as espécies amostradas.
100•
= FATFAFR S
S
FAs = freqüência absoluta da espécie s; FAT = freqüência total (soma das FAs de todas as
espécies amostradas).
Dominância por área (DoAs): Segundo o conceito mais usual, baseia-se no espaço
ocupado pelos troncos das árvores de cada espécie, utilizando os valores da área basal.
SSS ABDADoA •=
DAs = densidade por área da espécie s; ABs = área basal média da espécie s.
Dominância Relativa por Espécie (DoRs): Representa a relação percentual entre área
basal total de uma espécie e a área basal total de todas as espécies amostradas.
100•
= ∑ABT
ABIDoR S
S
ABIs = área basal de cada indivíduo da espécie s; ABT = soma das áreas basais de todas as
espécies amostradas (= Σ ABI).
Valor de Importância (VI): Representa em que grau a espécie se encontra bem
estabelecida na comunidade e resulta de valores relativos já calculados para a densidade,
freqüência e dominância, atingindo valor máximo de 300.
SSS DoRFRDRVI ++=
15
Índice de Diversidade de Shannon-Weaver (H’): utilizado para se obter uma
estimativa da heterogeneidade florística da área estudada, através das equações:
∑ •−=′ SS PPH ln maxH
HJ ′=
NnP S
S = , onde ns é o número de indivíduos da espécie s; N é o número total de
indivíduos; J a equidade; Hmax a diversidade máxima (= ln s, onde s é o número de
espécies)
r Inventário Etnobotânico
Os informantes foram escolhidos por indicação da comunidade por seu
conhecimento sobre a floresta (Galeano 2000). A partir desses aplicou-se o método da bola
de neve, onde cada informante indica outros. Com o especialista local aplicou-se a técnica
“walking in the woods” (Phillips & Gentry 1993 a,b). Albuquerque & Lucena (2004)
definem especialista local como uma pessoa reconhecida pela comunidade pelo amplo
conhecimento do uso de plantas nativas e/ou introduzidas. Com os outros 10 indicados da
comunidade realizou-se entrevistas (Alexiades 1996) que foram conduzidas através de
questionários semi-estruturados (Viertler 2002) contendo informações sobre onde e qual
parte da planta é coletada e quais seus usos. A técnica entrevista/artefato (Albuquerque &
Lucena 2004), na qual coleta-se informações sobre o material vegetal do qual são feitos
diferentes objetos apresentados pela comunidade, foi empregada com um casal de artesãos.
Conhecendo-se o nome vulgar coleta-se a amostra botânica, que é mostrada ao informante,
confirmando a sua identificação e modo de uso.
A escolha das categorias de uso foi baseada no estudo de Galeano (2000), também
realizado com afro-descendentes, porém, com uma modificação. As plantas utilizadas para
“banho de descarrego” e “espantar mau olhado” foram retiradas das medicinais e
agrupadas na categoria ritualística, pela importância dessas plantas na cultura afro-
brasileira (Guedes et al. 1985). Agrupou-se as plantas em 33 usos pertencentes a sete
categorias de uso, conforme Tabela 1.
16
Tabela 1. Usos de plantas pelos quilombolas de Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES (Listagem por categorias adaptada de Galeano 2000).
Categoria de uso Tipos de usos
Alimentar 1. Palmitos
2. Partes vegetais (folhas, flores e frutos)
consumidos diretamente, crus ou cozidos
3. Frutos usados em aperitivos alcoólicos e
sucos
4. Frutos comestíveis para animais
5. Temperos
Construção
6. Fundações da casa
7. Assoalho
8. Esteio de casas (peças para escorar paredes)
9. Engradamento
10. Palhas para cobertura
Lenha
11. Madeira retirada para lenha de forma geral
ou para uso em fogão à lenha
Medicinal
12. Remédio para doenças pulmonares e tosse
13. Remédio para febre
14. Remédio para gripe
15. Remédio para problemas digestivos
16. Remédio para problemas de fígado
17. Remédio para diabetes
18. Depurativo do sangue
19. Calmante
20. Antiinflamatório
21. Cicatrizante
22. Anti-séptico
23. Infusão de folhas em álcool contra dores na
coluna, braços e pernas
24. Pancadas e tombos
Ornamental
25. Planta utilizada como ornamental ao redor
das casas e jardins
17
Categoria de uso Tipos de usos
Ritualística 26. Banho de descarrego
27. Proteger a casa contra mau olhado
Tecnologia
28. Confecção de canoa
29. Linha para pesca
30. Utensílios domésticos e artesanatos (arco de
peneira, peneira, tamburá, vassoura, moringa
para água, tipiti, esteira, piteiras)
31. Móveis
32. Cabo de ferramentas
33. Recuperação da margem do rio
O valor de uso estimado para cada espécie citada pelos informantes foi obtido
através da fórmula abaixo, adaptada de Phillips & Gentry (1993a), entrevistando-se uma
única vez cada informante, segundo Rossato 1999:
n
U
VU
n
iSi
S
∑=
onde VUs = Valor de uso da espécie s; Us = número de usos mencionados por cada
informante para a espécie s; e n = número total de informantes (n = 10).
O valor de uso para cada família botânica foi calculado seguindo a metodologia de
Phillips & Gentry (1993a), onde:
f
S
nVU
VUF ∑=
onde VUs = valor de uso das espécies; nf = número de espécies na família.
Para o cálculo do valor de uso utilizou-se somente as citações das 10 entrevistas
semi-estruturadas; não foi calculado o valor de uso para as citações obtidas através da
técnica caminhando na floresta.
Verificou-se que parte da planta é coletada e quais os seus possíveis usos pela
população, visando estabelecer se as mesmas possuem prioridade de conservação de
acordo com a pressão de coleta que sofrem. Determinou-se as prioridades de conservação
das plantas, presentes no inventário florístico que foram citadas pela comunidade,
18
combinando dados sócio-qualitativos e ecológico-quantitativos, segundo Dzerefos &
Witkowski (2001). O estabelecimento das plantas com prioridade de conservação é
baseado na densidade das plantas amostradas, risco de coleta, importância local e
diversidade de usos, pontuados de acordo com a Tabela 2.
Tabela 2. Critério de pontuação utilizado para se determinar as espécies com prioridades de conservação. Densidade, risco de coleta, importância local e diversidade de uso (modificado de Dzerefos & Witkowski 2001). Critério Pontos A. Densidade na área (número médio de indivíduos/m2) (D) Não encontrado – muito baixo (0-1) 10 Baixo (1,1 < 3,5) 07 Médio (3,6 < 7) 04 Alto (≥ 7,1) 01 B. Risco de Coleta (C) Coleta destrutiva, da planta inteira, bulbos e colmos, retirada do súber, casca ou raíz. Representa remoção do indivíduo e dos seus descendentes na população 10 Remoção de estruturas perenes, como raízes, cascas sem causar a morte da planta 07 Remoção de estruturas aéreas permanentes como folhas, caule e seiva, podendo afetar o investimento de energia, sobrevivência e sucesso reprodutivo 04 Remoção de estruturas aéreas transitórias, como flores e frutos. A regeneração da população pode ser alterada em longo prazo, como produção de sementes 01 C. Uso local (L) Alto (listado por mais de 20% da população) 10 Moderadamente alto (10 a 20 %) 07 Moderadamente baixo (< 10% citação) 04 Baixo (somente referido na literatura) 01 D. Diversidade de usos (Div) Para cada uso adicionar um ponto até no máximo 10
Valor Biológico (B) = D x 10
Risco de Utilização (RU) = 0,5(C) + 0,5(U) x 10
U = valor de uso, determinado pelo maior valor entre L ou Div (Mander et al. 1997 apud
Dzerefos & Witkowski 2001).
Prioridade de conservação (PC) = 0,5 (B) + 0,5 (RU)
Categoria 1 (espécies com pontuação ≥ 85) têm prioridade de conservação e não
devem ser coletadas enquanto não se tomarem providências;
19
Categoria 2 (espécies com pontuação entre 85 e 60) podem ser coletadas
moderadamente;
Categoria 3 (espécies com pontuação ≤ 60) são apropriadas para coleta.
Calculou-se também o Índice de Diversidade de Shannon-Weaver (H’) para avaliar
o grau de conhecimento etnobotânico da comunidade em estudo através de comparações
com outros trabalhos etnobotânicos (Begossi 1996).
NnP i
i =
onde ni é o número de citações por espécie (i) e N é o número total de citações.
Estas ferramentas permitem inferências sobre a utilização dos recursos vegetais e
sua conservação, facilitando o planejamento de uso do solo, o zoneamento ecológico-
econômico e a atuação do Projeto Corredores Ecológicos no município de Santa
Leopoldina. Possibilitará a elaboração de projetos que poderão contribuir para o
planejamento do território quilombola.
∑−=′ ii PPH ln
20
Resultados e Discussão
r Os informantes e as plantas úteis por eles citadas
O estudo envolveu 11 informantes com idades entre 42 e 84 anos, sendo 7 mulheres
e 4 homens, todos apontados e reconhecidos pela comunidade como conhecedores de
plantas locais. Com 10 deles realizaram-se entrevistas e apenas com um, de 56 anos e do
gênero masculino, aplicou-se a técnica caminhando na floresta. A Figura 2 mostra que
54,5% dos informantes tinham entre 71 e 80 anos. Ou seja, a comunidade reconhece que o
saber sobre as plantas locais está predominantemente entre os mais velhos. O mesmo
ocorreu nos estudos de Lima et al. (2000) e Hanazaki et al. (2000) na mata atlântica e por
Galeano (2000) com afrodescendentes na Colômbia. Isto pode significar que nas classes
mais jovens este conhecimento está diluído, provavelmente em função da maior influência
que o acesso a informações externas têm nessa faixa da população (Lima et al. 2000). Para
Galeano (2000) o conhecimento dos afro-americanos está em risco de desaparecer, pois o
estilo de vida vem mudando ao longo dos anos, principalmente entre os jovens que não se
interessam tanto pela floresta e por atividades agrícolas.
0
1
2
3
4
5
40 a 50 51 a 60 61 a 70 71 a 80 81 a 90
Idade (anos)
n° e
ntre
vist
ados
Feminino
Masculino
Figura 2 – Distribuição dos entrevistados na comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES, por classe etária e gênero.
21
Os dados colhidos com os informantes possibilitaram a elaboração de uma listagem
contendo 192 etnoespécies enquadradas em 188 táxons distintos. Oito etnoespécies
consideradas diferentes para os entrevistados pertencem a quatro espécies botânicas.
Quatro etnoespécies não puderam ser identificadas porque não foram encontradas,
impossibilitando assim coleta ou visualização. Duas etnoespécies coletadas em estádio
vegetativo não puderam ser identificadas até o momento. Sendo assim, identificou-se 182
espécies botânicas diferentes pertencentes a 70 famílias. Duas espécies coletadas estão
identificadas até o nível de família. Das espécies identificadas, 59% são nativas do bioma
mata atlântica e 41% são exóticas (Figura 3). Constatou-se que 62% dos recursos vegetais
utilizados pela comunidade são coletados nos quintais, enquanto 38% procedem do
fragmento de floresta local. Os quilombolas relatam seu contato com indígenas e afirmam
ter aprendido muitas coisas com eles (com. pessoal). Isto corrobora com Almeida (2003)
ao afirmar que os negros transplantaram um sistema de classificação botânica da África e
introjetaram as plantas nativas do Brasil na sua cultura.
A alta porcentagem de espécies nativas citadas como úteis pode estar relacionada
com a alta diversidade do bioma onde a comunidade está inserida e seu isolamento por
algumas décadas. Segundo Hanazaki et al. (2000), a diversidade de conhecimento e usos
das plantas pode ser afetada pela sua diversidade no ambiente, podendo ser gradualmente
perdido devido ao aumento das atividades ligadas ao turismo.
As espécies, sua famílias botânica, nomes locais, usos, parte utilizada, hábito, local
e número de coleta estão organizados na Tabela 3.
38%
21%
41%Nativa/floresta
Nativa/quintal
Exótica/quintal
Figura 3 – Origem e local de coleta das espécies (em %) citadas e apontadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
22
Tabela 3. Lista de espécies citadas como úteis pelos quilombolas de Cachoeira de Retiro, Santa Leopoldina, ES, em ordem alfabética de famílias botânicas, seguido das espécies, nome local, categorias de usos (Categ): A-alimentar, C-construção, L-lenha, M-medicinal, O-ornamental, R-Ritualística e T-tecnologia; parte vegetal usada : Fo-folha, Fl-flor, Fr-fruto, C-casca, L-caule, B-bulbo, S-semente, R-raiz, E-exudados, I – inteira; Hábito (Hab): Av- arbóreo, Ab-arbustivo, Sb-subarbustivo, Hb-herbáceo, Li-liana; Origem e Local de coleta (O/Loc): N- nativa do bioma mata atlântica, E- exótica ao bioma, F-Floresta, Q-quintais, Número de coleta da autora ou Vv: Vi vivo (espécies ainda não documentadas para herbário, identificadas em campo e/ou por imagens, com auxílio de especialistas). Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
ADIANTACEAE Adiantum sp. Avenca-da-pedra M I Li N/Q Vv
DAVALLIACEAE Nephrolepis sp. Samambaia O I Li N/F 153
AGAVACEAE Herreria sp. Salsaparrilha M I Hb N/F 018 Agave sp. Agave O I Sb E/Q Vv Sansevieria sp. Espada-de-são-
jorge R I, Fo Sb E/Q Vv
ALISMATACEAE Echinodorus grandiflorus (Cham. & Schltdl.) Micheli
Chapéu-de-couro A, M Fo Hb N/F 058
ALLIACEAE Allium sativum L. Alho M B Hb E/Q Vv Allium cepa L. Cebola M B Hb E/Q Vv
AMARANTHACEAE Alternanthera dentata (Moech) Stuchlik ex R.E.Fr.
Roxinho M Fl Hb E/Q 045
Celosia argentea L. Crista-de-galo O Fl Hb E/Q 151 ANACARDIACEAE
Anacardium occidentale L. Caju A, M Fr, C Ar N/Q 127 Mangifera indica L. Manga A Fr Ar E/Q 126 Schinus terebinthifolius Raddi. Aroeira A, M Fr,
Fo, C Ar N/F 081
Spondias dulcis Parkinson Cajá A Fr Ar N/Q 155 Spondias sp. Umbú A Fr Ar E/Q 154
ANNONACEAE Annona acutiflora Mart. Araticum-pitaia T C Ar N/F 031 Annona muricata L. Graviola A Fr Ar E/Q 116 Guatteria pagonopus Mart. Pindaíba-preta C L Ar N/F 003 Rollinia dolabripetala (Raddi) R.E.Fr..
Pindaíba-banana C L Ar N/F Vv
Xylopia sericea A. St.-Hil. Pindaíba-branca C L Ar N/F 014 APIACEAE
Eryngium foetidum L. Coentro-do-mato A Fo Hb N/Q 062 Petroselinum crispum (Mill.) Nyman ex A.W. Hill
Salsa-comida M R Hb E/Q Vv
APOCYNACEAE Allamanda cathartica L. Cacho-de-ouro O Fl Li N/Q 097
23
Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
APOCYNACEAE (Cont.) Geissospermum laeve (Vell.) Miers
Pau-pereira C, M L, C Ar N/F 165
ARACEAE Colocasia sp. Taioba A Fo Hb E/Q Vv Dieffenbachia picta Schott Comigo-
ninguém-pode R I, Fo Hb N/Q 150
Philodendron sp. Cipó-guaimbê T, M L, Fo Hb N/Q 156 ARECACEAE
Astrocaryum aculeatissimum (Schott) Burret
Brejaúba/ Eri A L Ab N/F Vv
Attalea dubia (Mart.) Burret Indaiá C Fo Ab N/F Vv Attalea humilis Mart. ex. Spreng Juçara/ Pindoba A, C,
T L, Fo, Fr
Ab N/F Vv
Cocos nucifera L. Coco A Fr Ar E/Q Vv Desmoncus polyacanthos Mart. Salsa-puri M, A R Hb N/F 048 Euterpe oleracea Mart. Açaí A L, Fr Ar E/Q Vv Geonoma schottiana Mart. Aricanga T Fo Ab N/F 158 Polyandrococos caudescens (Mart.) Barb. Rodr.
Palmito-amargoso A, T, M
L, Fo, C
Ar N/F 009
ARISTOLOCHIACEAE Aristolochia sp. Milomi R, M Fo, R Hb N/F 164
ASPHODELACEAE Aloe sp. Babosa M E Sb E/Q Vv
ASTERACEAE Acanthospermum australe (Loefl.)Kuntze
Benzinho/ Carrapicho
M I Hb N/Q 094
Achyrocline satureioides (Lam.) DC.
Marcela M Fl Hb N/Q Vv
Acmella sp. Mentrasto M Fo Hb N/Q 130 Artemisia absinthium L. Losna M, A Fo Hb E/Q Vv Bidens gardneri Baker Picão-preto M I Hb N/Q 132 Chamomilla recutita (L.) Rauschert
Camomila M Fl Hb E/Q 122
Chromolaena maximilianii (Schrader ex DC) King & Robinson
Arnica-montana M Fo Hb N/Q 107
Gochnatia polymorpha (Less.)Cabrera
Camará T, C R, L Ar N/F 077
Pluchea quitoc DC. Quitocão M Fl Hb N/Q 120 Tagetes patula L. Cravo-de-defunto M Fl Hb E/Q 136 Taraxacum sp. Arnica-cachimbo M Fo Hb Q 137 Vernonia polyanthes Less. Assa-peixe M, A Fo Ab N/Q 138
BALSAMINACEAE Impatiens walleriana Hook. f. Beijo-branco M Fl Hb E/Q Vv
BIGNONIACEAE Sparattosperma leucanthum (Vell.) K. Schum.
Caroba/Cinco-folhas
M F, C Ar N/F 064
24
Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
BIGNONIACEAE (Cont.) Tabebuia sp1. Ipê-amarelo C L Ar N/F Vv Tabebuia sp2. Ipê-rosa C L Ar N/F Vv Tynanthus elegans Miers. Cipó-cravo A L Li N/F 054 Zeyheria tuberculosa (Vell.) Bureau
Camará-uçu C, M L, Fo Ar N/F 065
BIXACEAE Bixa orellana L. Urucum A S Ab E/Q 114
BOMBACACEAE Bombacopsis glabra (Pasq.) A.Robyns
Castanha-do-maranhão
A Fr Ar N/Q 106
BORAGINACEAE Cordia trichoclada DC. Aperta-cun M Fr Ar N/F 027
BRASSICACEAE Coronopus dydimus L. Mentrusto A, M Fo Hb E/Q 131
BROMELIACEAE Ananas sp. Abacaxi A, M Fr, Fo Sb N/Q Vv
BURSERACEAE Protium heptaphyllum (Aubl.) Marchand
Amescla R E Ar N/F Vv
CACTACEAE Pereskia aculeata (Plum.)Mill. Ora-pro-nobis A I Li N/F 025
CARICACEAE Carica papaya L. Mamão A, M Fr, Fo Ab E/Q Vv
CECROPIACEAE Cecropia pachystachia Trécul. Embaúba A, L Fr, L Ar N/F 072
CHENOPODIACEAE Chenopodium ambrosioides L. Erva-santa M Fo Hb E/Q 135
CLUSIACEAE Garcinia mangostana L. Mangustão A Fr Ar E/Q 095 Vismia martiana Reichardt Açafrão-do-mato C L Ar N/F 070
CONVOLVULACEAE Ipomoea purga (Wender.) Hayne Batata-de-purga M C Hb N/Q Vv
COSTACEAE Costus spiralis (Jacq.) Roscoe Cana-de-macaco M Fo Hb N/Q 049
CRASSULACEAE Kalanchoe brasiliensis Camb. Saião M Fo Hb E/Q 098
CUCURBITACEA Lagenaria vulgaris Ser. Abóbora-d´água A, T Fr Li E/Q 133 Sechium edule (Jacq.)Sw. Chuchu M Fo Li E/Q Vv
CYCLANTHACEAE Asplundia sp. Ciporoba M C, L Hb N/F 061
CYPERACEAE Remirea maritima Aubl. Salsa-da-praia M, A R Hb N/Q Vv
DIOSCORIACEAE Dioscorea sp. Cará A R Li E/Q Vv
25
Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
ERYTHROXYLACEAE Erythroxylum vacciniifolium Mart.
Canudo-de-pito T L Ar N/F 042
EUPHORBIACEAE Croton glandulosus Vell. Sete-sangria M I Hb N/F 129 Croton sp. Catinga-de-bode M I Hb N/F 086 Euphorbia pulcherrima Willd. ex Klotzsch
Papagaio/Flor-de-Janeiro
O Fl Ar E/Q 104
Joannesia princeps Vell. Boleira M S Ar N/Q Vv Manihot sp. Aipim A R Ab E/Q Vv Pera glabrata (Schott) Poepp. ex Baill.
Sete-caixa C L Ar N/F 012
Phyllanthus niruri L. Quebra-pedra M Fo Hb N/Q Vv FABACEAE
Andira sp. Angelim-preto O, C I, L Ar N/Q 105 Balizia pedicellaris (DC.)Barneby&Grimes
Timbuíba C L Ar N/F 067
Dalbergia nigra (Vell.) Allemao ex Benth.
Jacarandá C I Ar N/F Vv
Desmodium sp. Focinho-de-boi M Fo Hb N/Q 093 Inga capitata Desv. Ingá-da-mata A Fr Ar N/F 047 Machaerium gracile Benth. Judeu M C Ar N/F 089 Melanoxylon brauna Schott Brauna C L Ar N/F Vv Plathymenia foliolosa Benth. Amarelo/Vinhático T, C L Ar N/Q 161 Stylosanthes sp. Capim-meloso M I Hb N/Q Vv Vataireopsis araroba (Aguiar) Ducke
Sicupira C L Ar N/Q 100
Zornia latifolia Sm. Arrozinho-do- campo
M Fo Hb E/Q 108
FLACOURTIACEAE Casearia commersoniana Cambess.
Casquinha C L Ar N/F 020
Casearia sylvestris Swartz Sapucainha/ Taguririba
C, M L, S Ar N/F 007
LAMIACEAE Leonotis nepetifolia (L.) R. Br. Cordão-de-frade M I, Fo,
Fr Hb E/Q 030
Leonurus sibiricus L. Macaé M Fo Hb E/Q Vv Mentha pulegium L. Poejo M Fo Hb E/Q 063 Mentha spicata L. Hortelã M Fo Hb E/Q 099 Ocimum basilicum L. Manjericão M, A Fo Hb E/Q 121 Ocimum gratissimum L. Louro-bravo A Fo Hb E/Q 044 Plectranthus amboinicus (Lour.) Spreng.
Hortelã-pimenta M Fo Hb E/Q 092
Plectranthus barbatus Andrews Boldo M, A Fo Hb E/Q 134 Rosmarinus officinalis L. Alecrim M, R Fo Hb E/Q 052
Vick M Fo Hb Q 101
26
Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
LAURACEAE Laurus nobilis L. Louro-comida M Fo Ab E/Q Vv Ocotea longifolia Kunth Inhuíba-papagaio C L Ar N/F 051 Ocotea odorifera (Vell.) Rohwer Inhuíba-funcho/
Sucupira C, M L, R,
C Ar N/F 043
Persea americana Mill. Abacate A, M Fr, Fo, S
Ar E/Q Vv
Nectandra sp. Louro C L Ar N/F Vv LECYTHIDACEAE
Cariniana estrellensis (Raddi) Kuntze
Jequitibá-branco C L Ar N/F Vv
Cariniana legalis (Mart.) Kuntze Jequitibá-rosa T Fr Ar N/F Vv Eschweilera ovata (Cambess.) Miers
Imbiriba T I Ar N/F 074
Eschweilera sp. Imbirema A Fr Ar N/F 016 LORANTHACEAE
Struthanthus sp. Erva-de-passarinho
M Fo Li N/F Vv
MALPIGHIACEAE Byrsonima sericea DC. Murici C, L L Ar N/F 076 Malpighia glabra L. Acerola A Fr Ar E/Q 112
MALVACEAE Abelmoschus esculentus (L.) Moench
Quiabo A Fo Ab E/Q Vv
Gossypium hirsutum L. Algodão M Fo, Fl Ar E/Q 128 MELASTOMATACEAE
Miconia albicans (Sw.) Triana Camará-mirim A, L Fr, L Ar N/F 079 Miconia cinnamomifolia (DC.) Naud.
Jacatirão C L Ar N/F 168
Tibouchina heteromalla Cogn. Quaresmeira O I Ab N/Q 118 MELIACEAE
Cedrela fissilis Vell. Cedro-branco C L Ar N/F 083 Guarea macrophylla Vahl. Figuinho A Fr Ar N/F 011 Trichilia silvatica C.DC. Gramarim T L Ar N/F 019
MENISPERMACEAE Chondodendron platiphelum (A. St.-Hil.) Miers
Cipó-timbó/ Cipó-tinga
T R, L Li N/F 059
MORACEAE Artocarpus communis J.R. Forst. & G. Forst.
Fruta-pão A, T Fr, L Ar E/Q 147
Artocarpus integrifolia L.f. Jaca A Fr Ar E/Q 109 Brosimum glaziovii Taub. Camboatã A, M Fr, Fo Ar N/F 021 Ficus clusiaefolia Summ. Mulhembá A, C Fr, L Ar E/Q 073 Ficus sp. Cutindiba M, T Fo, I Ar N/F 144 Morus nigra L. Amora M Fo Ar E/Q Vv
MUSACEAE Musa sp. Banana A, M Fr, Fl,
E Ab E/Q Vv
27
Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
MYRISTICACEAE Virola sp. Bicuíba M Fo N/F Vv
MYRSINACEAE Myrsine umbellata Mart. Capororoca/
Mangue-da-mata A, C Fr, L Ar N/F 022
MYRTACEAE Eucaliptus sp. Eucalipto M, A Fo Ar E/Q Vv Eugenia candolleana DC. Araçá-da-mata C L Ar N/F 015 Eugenia uniflora L. Pitanga A,M Fr, Fo Ar N/Q 115 Myrcia splendens (Sw.) DC. Batinga C, L L Ar N/F 002 Plinia cauliflora (DC.)Kausel Jabuticaba A Fr Ar N/Q 124 Psidium guineense Sw. Goiaba A, M Fr, Fo Ar N/Q 125 Syzygium cumini (L.) Skeels Araçá-una/
Jamelão A Fr Ar E/Q 103
Syzygium malaccense (L.) Merr. & L.M. Perry
Jambo A Fr Ar E/Q 146
PHYTOLACACEAE Gallesia integrifolia (Spreng.) Harms
Pau-d´alho C, R I, C Ar N/F 046
Petiveria alliacea L. Guiné/Tipi R I Hb E/Q 143 PIPERACEAE
Piper anisun (Spreng.) Angely João-barandi M L Hb N/F 163 Piper nigrum L. Pimenta-do-reino A Fr Hb E/Q 096 Piper umbellatum L. Caapeba/Pariparo
ba M Fo, R Ar N/F 029
PLANTAGINACEAE Plantago sp. Tansagem M Fo, R Hb E/Q 157
POACEAE Cymbopogon citratus (DC) Stapf. Capim-cidreira M Fo Hb E/Q 091 Imperata sp. Sapé M R Hb E/Q 056 Ozyra sp. Gurmã T L Hb N/F 055 Phalaris canariensis L. Alpiste M S Hb E/Q Vv Saccharum officinarum L. Cana M, A Fo, L Hb E/Q Vv
PUNICACEAE Punica granatum L. Romã M S, C Ab E/Q 119
ROSACEAE Rosa alba L. Rosa-branca M Fl Hb E/Q 110
RUBIACEAE Coffea sp. Café A Fr Ab E/Q 113 Genipa americana L. Genipapo A Fr Ar E/Q 145 Ixora coccinea L. Flor-vermelha O I Sb E/Q 102
RUTACEAE Citrus sinensis (L.)Osbeck Laranja A Fr Ar E/Q Vv Citrus sp1 Mixirica A, M Fr, Fo Ar E/Q 142 Citrus sp2. Laranja-Bahia A Fr Ar E/Q Vv Citrus aurantium L. Laranja-da-terra M Fo, C Ar E/Q 141 Citrus limon (L.)Burn Limão A, M Fr, Fo Ar E/Q Vv Citrus sp3. Pokã A Fr Ar E/Q Vv
28
Família/ Nome científico Nome local Categ Parte Hab O/Loc Col
RUTACEAE (Cont.) Murraya exotica L. Murtinha T I Ab E/Q 123 Ruta graveolens L. Arruda R Fo Hb E/Q Vv
SAPINDACEAE Cupania oblongifolia Mart. Camboatã-da-
folha- grande C, M L, Fo Ar N/F 008
SIPARUNACEAE Siparuna guianensis Aubl. Negramina M Fo, Fr Ar N/F 078
SOLANACEAE Capsicum baccatum L. Cumari A Fr Hb E/Q 169 Solanum pseudoquina A. St.-Hil. Baúna M Fo Ar N/F 087 Solanum tuberosum L. Batata A, M Fo Hb E/Q Vv
TYPHACEAE Typha sp. Taboa A, T R, Fo Hb N/Q Vv
URTICACEAE Boehmeria sp. Rami M I Hb E/Q 057
VALERIANACEAE Valeriana sp. Cura-tombo M R Hb N/F 159
VERBENACEAE Aloysia gratissima (Gillies & Hook.) Tronc.
Alfazema M, R Fo Ab E/Q 117
Coleus sp. Tapete O I Hb E/Q 152 Lippia alba (Mill.) N.E. Br. Erva-cidreira M Fo Hb N/Q 140 Stachytarpheta cayennensis (Rich.) Vahl
Gervão-roxo M Fo Hb N/F 111
Vitex sp. Cinco-folhas-roxo M C Ar N/F 170 VIOLACEAE
Hybanthus calceolaria (L.) Schulze-Menz
Pecaconha M R Hb N/F 053
ZINGIBERACEAE Zingiber officinale Roscoe Gengibre M R Hb E/Q Vv
Não coletadas/ identificadas Arrebenta-cavalo M Fo, Fr Q Gurgi T L F
Arnica-do-mato M Fo Hb Q 139 Pualho M R Q Salsa-babaiona R L Li F
29
As nove famílias com o maior número de espécies citadas como úteis estão
ilustradas na Figura 4.
12
11
10
8
8
8
6
6
6
0 2 4 6 8 10 12 14
Asteraceae
Fabaceae
Lamiaceae
Arecaceae
Myrtaceae
Rutaceae
Bignoniaceae
Euphorbiaceae
Moraceae
n° espécies
Figura 4 – Famílias com maior número de espécies citadas como úteis pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Hanazaki et al. (2000) e Lima et al. (2000) também encontraram na família
Asteraceae o maior número de espécies citadas, sendo a maioria destas utilizadas para fins
medicinais. Em outra pesquisa realizada na mata atlântica (Fonseca-Kruel & Peixoto 2004)
a família Myrtaceae foi a mais representativa, seguida de Asteraceae. Isto ocorreu devido
ao maior número de citações para a categoria alimentar, e em seguida medicinal. No
presente estudo mais de 90% das Asteraceae citadas são empregadas como medicinais e
75% das Myrtaceae como alimentar.
No trabalho de Hanazaki et al. (2000), as famílias Lamiaceae, Euphorbiaceae,
Myrtaceae e Bignoniaceae também estão entre as 10 famílias com mais espécies utilizadas.
Em Lima et al. (2000) as famílias Myrtaceae, Fabaceae, Euphorbiaceae, Arecaceae e
Rutaceae estão entre as 15 com maior número de espécies úteis.
30
r As categorias de uso
Os usos citados pelos informantes para as diversas plantas foram categorizados na
Tabela 1. A categoria de uso medicinal apresentou o maior número de citações, referentes
a 98 espécies, seguida da categoria alimentar (64 espécies), construção (33), tecnologia
(19), ritualística (10), ornamental (9) e lenha com quatro espécies (Figura 5).
52%
34%
18%
10%
5%
5%
2%
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%
Medicinal
Alimentar
Construção
Tecnologia
Ritualístico
Ornamental
Lenha
% espécies
Figura 5 – Distribuição das espécies, por categoria de uso (em %), citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Nos trabalhos de Hanazaki et al. (2000), Lima et al. (2000) e França (2001), sendo
este último realizado com quilombolas na APA de Cairuçu (RJ), as categorias de uso
medicinal e alimentar são também aquelas que apresentam maior número de espécies
citadas. Já em Fonseca-Kruel & Peixoto (2004) essas posições e invertem. Na categoria
medicinal, as famílias que se destacaram foram Asteraceae, com 11 espécies úteis,
Lamiaceae (9), Poaceae e Fabaceae (4). Para a categoria alimentar Arecaceae e Myrtaceae
predominaram, com 6 espécies, seguidas de Anacardiaceae e Rutaceae (5) e Moraceae (4).
Phytolacaceae, com duas espécies, foi a família mais citada na categoria de plantas
ritualísticas. Na categoria construção destacaram-se as famílias Fabaceae, com seis
espécies úteis e Annonaceae, Lauraceae e Bignoniaceae com três espécies cada. A família
Arecaceae (3) foi a mais utilizada na categoria tecnologia. Na categoria de uso ornamental
e lenha, todas as espécies citadas são de famílias diferentes.
A maior parte das espécies utilizadas na categoria medicinal, tecnologia, construção
e lenha são nativas, enquanto na categoria de uso alimentar, ritualístico e ornamental a
31
maioria das espécies são exóticas ao bioma mata atlântica, conforme pode ser observado na
Figura 6. É interessante notar que a maioria das espécies listadas como medicinais são
nativas, pois em outros levantamentos etnobotânicos na mata atlântica a categoria
medicinal teve uma maioria de espécies exóticas (Hanazaki et al. 2000; Fonseca-Kruel &
Peixoto 2004). As categorias que agregam a maior proporção de espécies nativas são lenha
e construção. Na categoria ritualístico a maior parte das plantas é exótica. Apesar dos
aspectos religiosos da comunidade terem passado por várias modificações ao longo dos
anos, contando hoje com católicos e evangélicos, muitos ainda mantém o hábito de usar
grande quantidade ervas medicinais, banhos e simpatias de seus ancestrais (Oliveira 1999).
Este fato também foi observado por França (2001) em comunidade quilombola de Paraty,
RJ. O Congo, como feito pelos Benvindos, reúne elementos da cultura negra e da
religiosidade católica, tornando-se, segundo eles, festa, dança e religião de negros, cuja
origem estaria na África (Oliveira 1999).
n° e
spéc
ies
05
101520253035404550
Med
icina
l
Alimen
tar
Constr
ução
Tecn
ologia
Ritualí
stico
Ornam
enta
l
Lenh
a
Nativas
Exóticas
Indet
Figura 6 – Proporção de espécies nativas e exóticas, por categoria de uso, citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
As espécies que mais se destacaram na categoria medicinal foram: Piper
umbellatum, Rosmarinus officinalis e Gossypium hirsutum, citadas por 36% dos
informantes. Na categoria alimentar merece destaque a família Arecaceae com
Polyandrococos caudescens e Astrocaryum aculeatissimum (45%) citados pelo grande
apreço por seus palmitos e Attalea humilis, citada por 36% dos informantes, pelo uso do
palmito e frutos. Attalea humilis também têm destaque na categoria construção (45% dos
32
informantes), pois sua palha é utilizada para cobertura e a nervura das folhas, junto com
entulho, utilizada para construção das casas de estuque. Zeyheria tuberculosa (45%) foi
citada como útil na construção de casas. A espécie mais citada para utilização como lenha
é Byrsonima sericea (murici), mencionada por 27 % dos informantes. Na categoria de
plantas ritualísticas merece destaque Aristolochia sp. (milomi) que também aparece em
trabalhos com plantas ritualísticas de afro-brasileiros no Rio de Janeiro (Guedes et al.
1985) e em outro trabalho realizado na mata atlântica (Lima et al. 2000). Gallesia
integrifolia (pau-d´alho) também foi citada por 27% dos informantes e Petiveria alliaceae
(guné/tipi), espécie de origem africana, foi citado por 18% dos informantes. Estas espécies
são utilizadas em banhos de descarrego e ritual de fim de ano (obs. pessoais).
Polyandrococos caudescens, do qual se retira a fibra para confecção do tipiti, foi a espécie
com mais usos para a categoria tecnologia, citado por 54% dos informantes. O tipiti é
utilizado para espremer a massa do aipim (Manihot sp.) para a fabricação da farinha, uma
atividade tradicional das comunidades remanescentes de quilombos do Espírito Santo.
Chondodendron platiphillum (cipó-timbó ou cipó-tinga) foi o segundo mais citado na
categoria tecnologia, útil para 45 % dos informantes. Esta espécie é amplamente conhecida
pela comunidade como duas etnoespécies, talvez devido à ocorrência de dimorfismo
sexual. Deste cipó a comunidade faz vassouras, varais, entre outros utensílios domésticos.
Na categoria de uso ornamental, as plantas foram citadas por apenas uma informante,
sendo as nativas Tibouchina heteromalla (quaresma) e Nephrolepis sp. (samabaia).
Os informantes fizeram 285 citações das 188 espécies botânicas. A Figura 7
ilustra, por categoria de uso, o número de citações, de espécies totais e exclusivas da
categoria. Não existem espécies exclusivas da categoria lenha, pois todas as espécies
também foram citadas na categoria construção. Pode-se dizer que muitas espécies têm
múltiplos usos, fato também observado por Galeano (2000) e Fonseca-Kruel & Peixoto
(2004), porém mais da metade delas, em todas as categorias, são exclusivas.
33
0
33
65
19 10 6 8
0
20
40
60
80
100
120
140
Med
icin
al
Alimen
tar
Constr
ução
Tecno lo
gia
Ritualí
stico
Ornam
ental
Lenha
n° e
spéc
ies
n° citações
n° spp.
exclusivas
Figura 7 – Números de citações, espécies e espécies exclusivas, por categoria de uso, da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
r Partes vegetais utilizadas e hábito das plantas úteis
As folhas são as estruturas mais utilizadas pela comunidade, sendo citadas para 71
espécies botânicas, ou 38% das espécies úteis. O caule aparece como a segunda estrutura
mais importante, utilizada em 47 espécies, seguido dos frutos (46), planta inteira (24),
raízes (17), casca (14), flores (12), sementes (6), exudados (3) e bulbo (2). A distribuição
espécies por parte utilizada está ilustrada na Figura 8.
38%
25%
24%
13%
9%
7%
6%
3%
2%
1%
0% 10% 20% 30% 40%
Folha
Caule
Fruto
Inteira
Raiz
Casca
Flor
Semente
Exsudado
Bulbo
Par
te u
tiliz
ada
% espécies
Figura 8 – Distribuição das espécies, por parte utilizada (em %), citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
34
Na categoria lenha 100% das citações é para o caule, em construção 90% e
tecnologia 58%. A análise do hábito abaixo também comprova essa constatação. De acordo
com o levantamento realizado, as categorias lenha, construção e tecnologia utilizam,
respectivamente, 100%, 94% e 74% de recursos vegetais nativos (Figura 6), sendo esta
uma preocupação para programas de conservação. A retirada das folhas e outras estruturas
aéreas pode afetar o investimento de energia e o sucesso reprodutivo da planta, mas não
retira o indivíduo e seus descendentes da população. Entre as estratégias para conservação
de plantas medicinais, Zschocke et al. (2000) sugere a substituição do uso de caule e
cascas por folhas e galhos finos.
Em relação ao hábito das espécies citadas como úteis, as árvores foram as mais
representativas, totalizando 84 espécies, seguido do hábito herbáceo, com 71 espécies. Os
demais hábitos foram menos representativos, totalizando 17 espécies de arbustos, 11 de
lianas e 5 subarbustos, conforme ilustrado na Figura 9.
38%
9%
6%3%
44%Arbóreo
Herbáceo
Arbustivo
Liana
Subarbustivo
Figura 9 – Porcentagem de espécies por hábito, citadas como úteis pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Mais da metade das árvores citadas são nativas e coletadas na mata, enquanto mais
da metade das herbáceas são exóticas e encontradas nos quintais. O número de usos e a
porcentagem de espécies arbóreas úteis para os quilombolas são altos, justificando a
realização de projetos para aumento da cobertura florestal nativa na comunidade.
35
r Índice de diversidade do conhecimento etnobotânico
O Índice de Diversidade de conhecimento etnobotânico dos quilombolas de
Cachoeira do Retiro de 5,12 nats é bem alto quando comparado com o encontrado em
outros trabalhos etnobotânicos realizados com comunidades tradicionais na mata atlântica
(Figueiredo et al. 1993; Begossi et al. 1993; Rossato et al. 1999; Lima et al. 2000;
Hanazaki et al. 2000 e Fonseca-Kruel & Peixoto 2004).
Escolhemos trabalhos realizados essencialmente na mata atlântica, por ser o foco
deste estudo. Com exceção do trabalho de Sonenghet 2006 (comunicação pessoal),
escolhido por ser o único do Estado do Espírito Santo que pôde gerar comparações, os
outros abrangem várias categorias de uso que não só as plantas medicinais (Tabela 4).
Tabela 4 – Comparação dos índices de diversidade etnobotânico compilados de estudos realizados com comunidades tradicionais na mata atlântica. Abr. – abrangência do estudo: G – várias categorias de uso, M – plantas medicinais; N° sp. – número de espécies citadas; H´ - índice de Shannon: B.10 – base 10, B.e – base e. Fonte Local Abr. N° sp. H´ B.10 H´B.e Figueiredo et al. 1993 Gamboa (Ilha de Itacuruça), RJ G 90 1,65 - Begossi et al. 1993 Ilha de Búzios, SP G 128 1,57 - Rossato et al. 1999 SP G 277 2,06 Lima et al. 2000 Guaraqueçaba, PR G 445 2,38 5,48 Hanazaki et al. 2000 Ponta do Almada, SP G 152 1,99 4,59 Praia de Camburiú, SP G 162 1,98 4,57 Sonenghet 2006 (dados não publ.)
Santa Teresa, ES M 99 1,94 4,48
Este trabalho Santa Leopoldina, ES G 188 2,23 5,12
O índice de diversidade, amplamente empregado em ecologia, vem sendo utilizado
mais recentemente em trabalhos etnobotânicos com a finalidade de avaliar a diversidade do
conhecimento etnobotânico. Lima et al. (2000) afirmaram que índices elevados, em geral,
relacionam áreas relativamente bem conservadas associadas a populações com
significativo conhecimento etnobotânico. Para a amostra populacional estudada, o índice
de diversidade do conhecimento das plantas nativas do bioma foi de 4,48 nats, enquanto
das exóticas foi 4,25 nats. Quando se compara o índice de diversidade do conhecimento
etnobotânico para as plantas coletadas no fragmento, 4,15 nats, e daquelas encontradas nos
quintais quilombolas, 4,25, percebe-se que a comunidade utiliza similarmente recursos
encontrados no fragmento local, espontâneos e cultivados.
36
Para Albuquerque e Andrade (2002) deve-se incentivar os estudos etnobiológicos
sobre as florestas, para que se conheça o manejo e uso dos recursos naturais nativos de
determinada região. A hipótese de que comunidades afastadas do principal centro urbano
local e localizadas em região de alta diversidade biológica possuem elevado conhecimento
etnobotânico (Begossi et al. 2002) foi corroborada pois o índice de diversidade de
conhecimento etnobotânico da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro foi de 5,12
nats, um dos maiores já encontrados para mata atlântica.
r Caminhando na floresta
Utilizando-se o método Caminhando na floresta, realizou-se 11 turnês-guiadas com
um único informante indicado, a princípio pelo presidente da AHPBPS, e posteriormente
por diversas pessoas da comunidade como sendo ele o principal detentor do conhecimento
botânico local. Ele pode ser definido como especialista local (Albuquerque & Lucena
2004), pois é reconhecido pela comunidade por seu amplo conhecimento do uso de plantas
nativas e/ou introduzidas, e onde encontrá-las. Este informante citou 52 usos referentes a
48 espécies, sendo que 20 destas espécies foram exclusivas deste informante. A
distribuição das espécies nas categorias de uso está ilustrada a seguir.
52%
20%
15%
15%
4%
2%
0%
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%
Medicinal
Construção
Alimentar
Tecnologia
Ritualístico
Lenha
Ornamental
% espécies
Figura 10 – Distribuição das espécies, por categoria de uso (em %), citadas pelo informante Mário Raimundo Pereira, especialista local da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Comparando-se esta figura com a figura 5, percebe-se que este informante citou a
mesma porcentagem de plantas na categoria de uso medicinal (52%). Porém a segunda
37
categoria com maior número de citações (20%) foi a categoria construção ao invés da
alimentar, que ficou com menos da metade de citações quando comparadas com as
informações colhidas entre os 10 informantes tratados anteriormente (34% para 15%). O
informante também citou mais espécies para tecnologia do que o encontrado no
levantamento geral. Não houve citações para a categoria ornamental.
Este informante também acompanhou a coleta de dados e materiais no inventário
fitossociológico e nomeou 80% das plantas, demonstrando também ter bastante
conhecimento da fenologia e manejo das espécies da floresta local. Provavelmente devido
a este fato, 85% das plantas citadas por ele são nativas do bioma mata atlântica, sendo a
maioria encontrada no fragmento amostrado (Figura 11).
81%
4%
15%
Nativa/floresta
Nativa/quintal
Exótica/quintal
Figura 11 – Origem das espécies citadas pelo informante Mário Raimundo Pereira, especialista local da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES (em %).
Esses resultados podem estar relacionados também ao fato deste informante ser do
gênero masculino, ter 56 anos (entre 51 e 60 anos), pois segundo Galeano (2000) é nessa
classe que se concentra o maior conhecimento acerca dos recursos florestais nativos. O
índice de diversidade de conhecimento etnobotânico foi 3,8 nats, na Base e.
r Valor de uso global das espécies
Para o cálculo do Valor de Uso (VU) utilizou-se 168 espécies pertencentes a 66
famílias, citadas durante as 10 entrevistas semi-estruturadas, buscando verificar quais são
as plantas mais importantes para os entrevistados naquele espaço e tempo. As plantas com
maiorer VU foram: Attalea humilis e Polyandrococos caudescens, com 1,3 e 1,1
38
respectivamente. A distribuição das espécies em relação ao VU, em porcentagem,
encontra-se ilustrada na Figura 12.
0,6%0,6%5,3%4,8%
12,5%
26%
49%
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 1,1 1,3
Valor de uso
% e
spéc
ies
Figura 12 – Valor de uso e a porcentagem de espécies citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
A maioria das espécies úteis obteve um baixo VU, pois foram citadas por apenas
um informante, enquanto altos valores se concentraram em poucas espécies, citadas por
número maior de informantes para vários usos. Isto também ocorreu em estudo com afro-
descendentes (Galeano 2000) e com moradores de uma comunidade no semi-árido
nordestino (Ferraz et al. 2006). Isto demonstra que o conhecimento etnobotânico entre os
entrevistados é bastante difuso, tendo cada informante um conjunto próprio de plantas
úteis, fortalecendo a idéia que quilombolas são também responsáveis pela formação do
conhecimento de plantas úteis no Brasil.
É interessante observar que a espécie com maior VU na comunidade, Attalea
humilis, é a mesma que originou o nome do quilombo mais famoso do Brasil, o quilombo
dos Palmares, situado entre Pernambuco e Alagoas. O quilombo recebeu este nome devido
à abundância da Palmeira Attalea sp. também conhecida como pindoba. Dela faziam
azeite, comiam os frutos e o palmito, do coco faziam uma manteiga e uma espécie de
vinho. Além disso retiravam um grosso verme que vivia no tronco da palmeira para
alimentação. Faziam cobertura para choupana, chapéus, esteiras, vassouras, cestos e
abanos (Carneiro 1988). Na comunidade de Cachoeira do Retiro essa palmeira também é
utilizada para construção, alimentação e artesanatos diversos.
39
O Valor de Uso pode mostrar quais plantas são mais conhecidas e utilizadas pelos
entrevistados, podendo incitar estudos específicos sobre uso, manejo e conservação das
espécies importantes.
As 12 espécies com maiores VU (0,5 a 1,3) estão ilustradas na Figura 13, com suas
respectivas contribuições em cada categoria de uso.
0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4
Attalea humilis Polyandrococos caudescensAstrocaryum aculeatissimum
Byrsonima sericea Carica papaya
Chondodendron platiphyllaEugenia uniflora
Gochnatia polymorpha Musa sp.
Plathymenia foliolosaRosmarinus officinalisZeyheria tuberculosa
VU espécies
Medicinal
Alimentar
Construção
Tecnologia
Ritualístico
Lenha
Figura 13 – As doze espécies com maior VU e suas categorias de uso, citadas pela comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
r Valor de uso das famílias botânicas
A Tabela 5 apresenta as 11 famílias com maior importância cultural (VUF) para
comunidade de Cachoeira do Retiro.
Tabela 5 - Famílias com maiores VUF (listadas em ordem decrescente) na comunidade quilombola de Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Família N° spp. VUF
Caricaceae 1 0,50 Menispermaceae 1 0,50 Musaceae 1 0,50 Arecaceae 8 0,48 Alismataceae 1 0,40 Aristolochiaceae 1 0,30 Costaceae 1 0,30 Crassulaceae 1 0,30 Malpighiaceae 2 0,30 Myrsinaceae 1 0,30 Rosaceae 1 0,30
40
Este resultado mostra o predomínio de famílias com apenas uma espécie útil para a
comunidade de Cachoeira do Retiro, porém com muitas citações, como é o caso de
Caricaceae, Menispermaceae e Musaceae. Porém tem destaque Arecaceae, com oito
espécies.
Se somados os Valores de Uso por Espécies (VUs) e seleciona-se as famílias com
maiores somas de VUs, o resultado é bem distinto e parece retratar melhor as famílias
importantes para os quilombolas de Cachoeira do Retiro. Na Figura 14 estão ilustradas as
dez famílias com maior soma dos Valores de Uso de suas espécies úteis e suas respectivas
contribuições a cada categoria de uso.
0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4
Arecaceae
Asteraceae
Fabaceae
Lamiaceae
Myrtaceae
Lauraceae
Moraceae
Anacardiaceae
Rutaceae
Bignoniaceae
VU espécies
Medicinal
Alimentar
Construção
Tecnologia
Ritualístico
Lenha
Ornamental
Figura 14 – As dez famílias com maior soma dos VUs e as categorias de uso da comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Estudos em outras florestas neotropicais apontam Lauraceae e Arecaceae como as
famílias mais importantes, devendo ser consideradas nos programas de conservação
(Prance et al. 1987, Phillips e Gentry 1993 a). A família Arecaceae tem grande importância
para a comunidade em estudo, merecendo estudos quanto à forma de utilização e manejo
das espécies para diversos fins.
A distribuição, em porcentagem, do VU por categoria (Figura 15) segue a
distribuição do número de citações e de espécie por categoria mostrado anteriormente na
Figura 7.
41
41%
25%
16%
9%5% 3% 1%
0%5%
10%15%20%25%30%35%40%45%50%
Med
icina
l
Alimen
tar
Constr
ução
Tecno
logia
Ritualí
stico
Ornam
ental
Lenh
a
% V
U
Figura 15 – Contribuição do VU em cada categoria (em %) para comunidade quilombola Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Este fato é, de certa maneira, esperado pois o calculo de VU leva em consideração
o número de citações das espécies pelos informantes. Demonstra também que o saber
sobre o uso das espécies de plantas é parcialmente consolidado entre os informantes, sendo
algumas plantas citadas muitas vezes para as mesmas finalidades.
r O fragmento utilizado pelos informantes: florística e fitossociologia
Com o auxílio do especialista local, que participou da pesquisa na aplicação da
técnica “caminhando na floresta”, amostrou-se 0,1 ha no fragmento de floresta indicado
pela comunidade como mais utilizado por eles para coleta de plantas para diversos usos. A
amostragem foi feita em dois pontos de coleta, sendo 0,05 ha em cada ponto, por indicação
do especialista local (Figura 1). Amostrou-se 297 indivíduos com cap igual ou superior a
7,5 cm, pertencentes a 54 espécies ou morfoespécies agrupadas em 28 famílias. As famílias
com maior riqueza são Fabaceae com 6 espécies (11%), Moraceae e Annonaceae com 4
espécies (7,4%), Bignoniaceae, Meliaceae, Melastomataceae e Sapindaceae com 3 espécies
cada (5,5%), totalizando 24% das espécies amostradas (Figura 16). As demais famílias
possuem 2 ou 1 espécies cada.
42
6
4
4
3
3
3
3
0 1 2 3 4 5 6 7
Fabaceae
Annonaceae
Moraceae
Bignoniaceae
Melastomataceae
Meliaceae
Sapindaceae
Número de espécies
Figura 16 - Distribuição do número de espécies por família que apresentaram mais de duas espécies no fragmento de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
A curva do coletor é calculada com a finalidade de verificar se a área amostrada
representa a área total. Neste estudo a curva não mostrou uma tendência à estabilidade
(Figura 17), demonstrando que não foi alcançada a suficiência amostral. Isto indica que é
necessária maior quantidade de transecções.
0
10
20
30
40
50
60
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10N° amostras
N° e
spéc
ies
Figura 17 - Número de espécies de árvores acumulado em função do número de transecções de 50 x 2m no fragmento de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
43
Das 54 espécies encontradas, 3 apresentaram maior número de indivíduos:
Siparuna guianensis (43), Miconia prasina (28) e Cedrela fissilis (22), representando de
31% do total de indivíduos (Figura 18).
204
43
28
22
0 50 100 150 200 250
Outras 51espécies
Siparunaguianensis
Miconia prasina
Cedrela fissilis
Número de indivíduos
Figura 18 - Número de indivíduos das três espécies mais abundantes em comparação com as demais 51 espécies no fragmento de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES.
Os parâmetros fitossociológicos calculados encontram-se na Tabela 6.
44
Tabela 6 – Parâmetros fitossociológicos das espécies amostradas em 0,1 ha de fragmento de floresta atlântica em Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina, ES, apresentados em ordem decrescente de Valor de Importância e Valor de Uso para algumas espécies. Ni: número de indivíduos; No Amo: número de transecções em que é amostrada; DR: Densidade Relativa; DoR: Dominância Relativa; FR: Freqüência Relativa; VI: Valor de Importância; VU: Valor de Uso ou M-citada pelo especialista local. Espécie NI NT DR DoR FR VI VU
Zeyheria tuberculosa (Vell.) Bureau
10 8 3,37 19,74 4,97 28,08 0,5
Siparuna guianensis Aubl. 43 10 14,48 1,95 6,21 22,64 M Cedrela fissilis Vell. 22 7 7,41 10,07 4,35 21,83 0,1 Miconia prasina DC. 28 9 9,43 4,36 5,59 19,38 Casearia commersoniana Cambess
15 9 5,05 5,87 5,59 16,51 0,1
Pera glabrata(Schott)Baillon. 17 6 5,72 5,33 3,73 14,79 0,1 Polyandrococos caudescens (Mart.) Barb. Rodr.
13 3 4,38 6,39 1,86 12,63 1,1
Brosimun glaziovii Taub. 19 5 6,40 2,71 3,11 12,21 0,2 Guapira opposita Vell. 10 7 3,37 0,77 4,35 8,48 Sparattosperma leucanthum (Vell.) K. Schum.
9 5 3,03 2,31 3,11 8,45 0,2
Myrcia splendens (Sw.) DC. 6 6 2,02 2,20 3,73 7,95 0,3 Guatteria pagonopus Mart. 5 5 1,68 2,32 3,11 7,10 0,1 Astronium graveolens Jacq. 9 4 3,03 1,28 2,48 6,80 Ocotea longifolia H.B.K. 6 5 2,02 1,49 3,11 6,62 0,4 Eugenia candolleana Berg. 2 2 0,67 4,34 1,24 6,25 M Rollinia dolabripetala (Raddi) R.E.Fr.
2 2 0,67 3,55 1,24 5,47 0,1
Pterocarpus rohrii Vahl. 4 2 1,35 2,87 1,24 5,46 Byrsonima sericea DC. 3 2 1,01 2,50 1,24 4,75 0,5 Eschweilera sp. 2 2 0,67 2,62 1,24 4,54 0,1 Matayba elaeagnoides Radlk. 5 3 1,68 0,94 1,86 4,48 Eschweilera ovata (Cambess.) Miers
4 3 1,35 1,10 1,86 4,31 0,1
Trichilia silvatica C.DC. 5 3 1,68 0,68 1,86 4,23 M Psychotria carthagenensis Jacq 3 3 1,01 0,82 1,86 3,69
Miconia pulsilliflora (DC.)Naudin 3 3 1,01 0,78 1,86 3,65
Guarea macrophylla Vahl. 2 2 0,67 1,71 1,24 3,62 M
Sorocea ilicifolia Miq. 3 3 1,01 0,49 1,86 3,37
Cupania oblongifolia Mart. 4 3 1,35 0,12 1,86 3,33 0,2 Porouma sp. 2 2 0,67 1,26 1,24 3,17
Allophylus edulis St. Hil. 2 2 0,67 1,16 1,24 3,08
Casearia sylvestris Swartz 3 3 1,01 0,18 1,86 3,05 0,1
Inga sp. 3 3 1,01 0,16 1,86 3,03
Amaioua guianensis Aubl.
4 2 1,35 0,42 1,24 3,01
45
Espécie NI NT DR DoR FR VI VU
Miconia cinnamomifolia (DC.) Naud.
2 1 0,67 1,68 0,62 2,97 M
Brosimun guianense Aubl. 2 2 0,67 0,59 1,24 2,50
Tapirira guianensis Aubl. 1 1 0,34 1,27 0,62 2,23
Himatanthus bracteatus (A.D.C.)Woodson
2 2 0,67 0,27 1,24 2,19
Vismia martiana Reichardt 2 2 0,67 0,20 1,24 2,11 0,1
Xylopia sericeae St. Hil. 1 1 0,34 0,93 0,62 1,89 0,1
Myrsine umbelata (Mart. ex DC.) Mez
2 1 0,67 0,35 0,62 1,65 0,3
Croton floribundus Spreng. 1 1 0,34 0,35 0,62 1,30
Ficus sp. 1 1 0,34 0,35 0,62 1,30
Machaerium gracile Benth. 1 1 0,34 0,29 0,62 1,25 0,3
Cecropia pachystachia Trécul. 1 1 0,34 0,29 0,62 1,25 0,2 Cordia trichoclada DC. 1 1 0,34 0,09 0,62 1,04 M
Ocotea odorifera (Vell.) Rohwer 1 1 0,34 0,07 0,62 1,03 0,3
Erythroxylum vaccinifolium Mart. 1 1 0,34 0,07 0,62 1,03 M
Zanthoxyllum sp. 1 1 0,34 0,06 0,62 1,01
Scutea sp. 1 1 0,34 0,05 0,62 1,01 Pereskia aculeata (Plum.)Mill. 1 1 0,34 0,05 0,62 1,00 M Senna sp. 1 1 0,34 0,04 0,62 0,99
Abarema jupumba (Willd.)Britton & Killip.
1 1 0,34 0,03 0,62 0,99
Unonopsis sp. 1 1 0,34 0,03 0,62 0,98 Erythroxylum pulchrum St. Hil. 1 1 0,34 0,02 0,62 0,98
Protium sp. 1 1 0,34 0,02 0,62 0,98
As três espécies com maior Valor de Importância (VI) foram: Zeyheria tuberculosa,
Siparuna guianensis e Cedrela fissilis. A espécie Zeyheria tuberculosa teve a maior
dominância relativa (19,74). Apesar de apresentar menos indivíduos que a três espécies
subseqüentes, possui indivíduos com maiores diâmetros. Isto pode ser devido à sua
utilização para o sombreamento do café, cerca de 40 anos atrás. Siparuna guianensis
apresenta grande densidade relativa (14,48) e também a maior freqüência relativa (6,21),
aparecendo em todas as transecções. Porém esta espécie é pioneira e seus numerosos
indivíduos são bem finos (dominância relativa de 1,95). A espécie Cedrela fissilis, com a
segunda maior dominância relativa (10,07), também faz parte do grupo das pioneiras,
sendo amplamente conhecida pela utilização de sua madeira.
A diversidade, calculada através do Índice de Shannon, foi H´= 3,372. Este valor
pode ser considerado baixo quando comparado à área bem conservada do município
vizinho, Santa Teresa, onde foi encontrado H´= 5,12 por Thomaz & Monteiro (1997).
46
Peixoto & Gentry (1990) utilizaram o método de transeção para analisar um trecho de 0,1
ha de Floresta de Tabuleiros no norte do Espírito Santo. Assim como neste trabalho,
amostraram indivíduos com dap superior a 2,54 cm. Por se tratar de uma área bem
conservada e com características edafo-climáticas diferentes de Santa Leopoldina, o
número de indivíduos amostrados (443) e a riqueza de espécies (216) foram bem maiores.
A equabilidade (J) da área em estudo foi 0,838. Este índice está relacionado ao
índice de diversidade, mostrando que é grande a heterogeneidade florística do fragmento.
A área basal por hectare foi de 29,771 m² e a altura média igual a 8,65 m.
De acordo com o especialista local, a grande causa da destruição das matas da região
foi o aumento das áreas de pastagem. Segundo relatos dos moradores de Retiro registrados por
Oliveira (1999), nas décadas de 1940 e 1950 os Benvindos trabalharam fora de suas terras
fazendo e vendendo carvão. Os fazendeiros, após tirarem a madeira das matas, lhes cediam as
áreas através do seguinte trato: os Benvindos roçavam as capoeiras e arrancavam os tocos,
faziam o carvão e vendiam. O resultado da venda era deles e na área roçada plantavam a
mandioca, o feijão e o milho. No final da colheita e após a fabricação da farinha, plantavam o
capim e entregavam a terra pronta para as pastagens do gado dos fazendeiros. Cabe ressaltar
que em ambas as áreas houve corte seletivo (cabrocagem) e parte da área amostrada (Área 1)
já foi plantação de café sombreado. A recuperação dos processos históricos, principalmente os
causados por ações antrópicas, é imprescindível na compreensão das estratégias diferenciadas
adotadas por comunidades vegetais para ocupação e estabelecimento em um ambiente
(Solórzano et al. 2005).
Analisou-se o trecho estudado como uma amostra única de 0,1 ha, por se tratar de
duas áreas em um mesmo fragmento, procurando saber sobre o uso e manejo da floresta
pelos quilombolas locais. Neste trecho, 55,5% das espécies encontradas são apontadas com
alguma utilidade para a comunidade. A espécie com maior VU no fragmento de floresta foi
Polyandrococos caudescens (palmito-amargoso), encontrada entre as 10 espécies com
maior VI na área amostrada (Tabela 5). Zeyheria tuberculosa (camará-uçu), espécie com
maior VI no fragmento, possui VU = 0,5, demonstrando ser bastante conhecida pelos
entrevistados. Byrsonima sericea (murici), também com VU = 0,5, encontra-se entre as 20
espécies com maior VI do fragmento amostrado. A espécie Siparuna guianensis
(negramina), com maior número de indivíduos amostrados, foi citada somente pelo
especialista local. Pode-se perceber que as famílias com maiores somas dos valores de uso
de suas espécies (Figura 14) estão entre as 20 famílias com maior VI do fragmento (Tabela
6), excetuando-se Asteraceae, Lamiaceae e Rutaceae. Sendo assim, famílias como
47
Bignoniaceae, Moraceae, Myrtaceae, Annonaceae e Arecaceae são interessantes para
estudos sobre espécies florestais úteis.
Estes dados, aliados às análises etnobotânicas, demonstram a grande importância do
fragmento de mata atlântica para a comunidade quilombola, que o maneja e conserva.
Comparando-se o índice de diversidade do conhecimento etnobotânico, H`=5,12, com o
índice de diversidade do fragmento amostrado, H´=3,37, percebe-se que os entrevistados
conhecem e utilizam maior número de recursos vegetais que a própria diversidade local
apresenta. O H´etnobotânico deste estudo é exatamente igual ao H´encontrado por
Thomaz & Monteiro (1997) para o trecho de floresta atlântica mais diverso do Estado.
Pode-se inferir que o fragmento de floresta amostrado neste estudo vem sendo
manejado há pelo menos 200 anos. Solórzano et al. (2005), inventariando um trecho de
floresta atlântica no Parque Estadual da Pedra Branca, RJ, afirmam que em termos de
paisagem, o que se tem hoje como natural pode se tratar de um sistema manejado durante
séculos.
r Análise do impacto de manejo
Buscando saber se o manejo que a comunidade faz no fragmento é prejudicial para
populações de determinadas espécies, testou-se o uso do Índice de Prioridade de
Conservação. O índice foi utilizado com 30 espécies do levantamento etnobotânico que
possuem dados de densidade medida no inventário fitossociológico de 0,1 ha do fragmento
florestal que a comunidade utiliza. A Tabela 7 indica os parâmetros utilizados no cálculo e
o resultado do método testado. De acordo com este método, 77% das plantas analisadas
possuem prioridade de conservação, não devendo ser coletadas enquanto não se tomarem
providências. O restante (23%) podem ser coletadas moderadamente.
48
Tabela 7 – Pontuação obtida para as espécies do inventário etnobotânico após o cálculo utilizado para se determinar as espécies com prioridades de conservação, onde: B = Valor Biológico; C = Risco de Coleta; L = Uso Local; Div = Diversidade de Uso; U = Valor de Uso; RU = Risco de Utilização; PC = Prioridade de Conservação; Categ = Categoria. Espécie B C L Div U RU PC Categ
Astrocaryum aculeatissimum (Schott) Burret
100 10 10 1 10 100 100 1
Attalea humilis Mart. ex. Spreng 100 10 10 5 10 100 100 1 Byrsonima sericea DC. 100 10 10 2 10 100 100 1 Myrcia splendens (Sw.) DC. 100 10 10 2 10 100 100 1 Myrsine umbellata Mart. 100 10 10 2 10 100 100 1 Ocotea longifolia Kunth 100 10 10 2 10 100 100 1 Ocotea odorifera (Vell.) Rohwer 100 10 10 3 10 100 100 1 Polyandrococos caudescens (Mart.) Barb. Rodr.
100 10 10 3 10 100 100 1
Zeyheria tuberculosa (Vell.) Bureau 100 10 10 2 10 100 100 1 Casearia commersoniana Cambess. 100 10 7 1 7 85 92,5 1 Casearia sylvestris Swartz 100 10 7 2 7 85 92,5 1 Cecropia pachystachia Trécul. 100 10 7 2 7 85 92,5 1 Cupania oblongifolia Mart. 100 10 7 2 7 85 92,5 1 Pera glabrata (Schott) Poepp. ex Baill.
100 10 7 1 7 85 92,5 1
Cedrela fissilis Vell. 100 10 4 1 4 70 85 1 Eugenia candolleana DC. 100 10 4 1 4 70 85 1 Guatteria pagonopus Mart. 100 10 4 1 4 70 85 1 Machaerium gracile Benth. 100 4 10 2 10 70 85 1 Miconia cinnamomifolia (DC.) Naud.
100 10 4 1 4 70 85 1
Rollinia dolabripetala (Raddi) R.E.Fr..
100 10 4 1 4 70 85 1
Sparattosperma leucanthum (Vell.) K. Schum.
100 7 7 1 7 70 85 1
Vismia martiana Reichardt 100 10 4 1 4 70 85 1 Xylopia sericea A. St.-Hil. 100 10 4 1 4 70 85 1 Brosimum glaziovii Taub. 100 4 7 2 7 55 77,5 2 Erythroxylum vacciniifolium Mart. 100 4 4 1 4 40 70 2 Pereskia aculeata (Plum.)Mill. 100 4 4 1 4 40 70 2 Siparuna guianensis Aubl. 100 4 4 2 4 40 70 2 Trichilia silvatica DC. 100 4 4 1 4 40 70 2 Cordia trichoclada DC. 100 1 4 1 4 25 62,5 2 Guarea macrophylla Vahl. 100 1 4 1 4 25 62,5 2
Esse método foi proposto para plantas medicinais na África do Sul, portanto alguns
ajustes tornam-se necessários. A pontuação da variável densidade deve ser ajustada para as
palmeiras, largamente utilizadas pela comunidade, e para plantas com DAP ≥ 2,5.
49
Se, por exemplo, ajusta-se a densidade na área (Tabela 2, pág. 18) para número de
indivíduos/0,1ha, encontra-se que 43% das espécies não possuem prioridade de
conservação; 37% delas podem ser coletadas moderadamente e 20% têm prioridade de
conservação. Estes resultados podem ser observados na Tabela 8.
As espécies Ocotea odorifera, Cecropia pachystachia, Byrsonima sericea,
Machaerium gracile, Myrsine umbellata e Xylopia sericea possuem prioridade de
conservação. Isto ocorre porque não foram encontradas em abundância no fragmento
amostrado e têm seus caules utilizados ou para lenha ou para construção. A lenha está
sendo cada vez mais substituída pelo botijão de gás. Já para construção de casas, sabe-se
que as madeiras da floresta local e de outros fragmentos do entorno são importantes.
Estudos demográficos das espécies mais citadas pelos quilombolas são necessários, uma
vez que a comunidade utiliza e depende dos recursos florestais para suas atividades
tradicionais.
50
Tabela 8 – Pontuação obtida para as espécies do inventário etnobotânico, após a modificação da variável Densidade na área, através do cálculo utilizado para se determinar as espécies com prioridades de conservação. Bm = Valor Biológico modificado; C = Risco de Coleta; L = Uso Local; Div = Diversidade de Uso; U = Valor de Uso; RU = Risco de Utilização; NPC = Nova Prioridade de Conservação; Categ = Categoria.
Espécie Bm C L Div U RU NPC Categ
Ocotea odorifera (Vell.) Rohwer 100 10 10 3 10 100 100 1
Cecropia pachystachia Trécul. 100 10 7 2 7 85 92,5 1 Byrsonima sericea DC. 70 10 10 2 10 100 85 1
Machaerium gracile Benth. 100 4 10 2 10 70 85 1 Myrsine umbellata Mart. 70 10 10 2 10 100 85 1 Xylopia sericea A. St.-Hil. 100 10 4 1 4 70 85 1 Casearia sylvestris Swartz 70 10 7 2 7 85 77,5 2
Erythroxylum vacciniifolium Mart. 100 4 4 1 4 40 70 2 Eugenia candolleana DC. 70 10 4 1 4 70 70 2
Miconia cinnamomifolia (DC.) Naud.
70 10 4 1 4 70 70 2
Myrcia splendens (Sw.) DC. 40 10 10 2 10 100 70 2 Ocotea longifolia Kunth 40 10 10 2 10 100 70 2 Pereskia aculeata (Plum.)Mill. 100 4 4 1 4 40 70 2 Rollinia dolabripetala (Raddi) R.E.Fr..
70 10 4 1 4 70 70 2
Vismia martiana Reichardt 70 10 4 1 4 70 70 2
Cordia trichoclada DC. 100 1 4 1 4 25 62,5 2 Cupania oblongifolia Mart. 40 10 7 2 7 85 62,5 2
Astrocaryum aculeatissimum (Schott) Burret
10 10 10 1 10 100 55 3
Attalea humilis Mart. ex. Spreng 10 10 10 5 10 100 55 3 Guatteria pagonopus Mart. 40 10 4 1 4 70 55 3
Polyandrococos caudescens (Mart.) Barb. Rodr.
10 10 10 3 10 100 55 3
Zeyheria tuberculosa (Vell.) Bureau 10 10 10 2 10 100 55 3 Casearia commersoniana Cambess. 10 10 7 1 7 85 47,5 3 Guarea macrophylla Vahl. 70 1 4 1 4 25 47,5 3
Pera glabrata (Schott) Poepp. ex Baill.
10 10 7 1 7 85 47,5 3
Cedrela fissilis Vell. 10 10 4 1 4 70 40 3
Sparattosperma leucanthum (Vell.) K. Schum.
10 7 7 1 7 70 40 3
Trichilia silvatica C.DC. 40 4 4 1 4 40 40 3 Brosimum glaziovii Taub. 10 4 7 2 7 55 32,5 3
Siparuna guianensis Aubl. 10 4 4 2 4 40 25 3
51
Conclusões
Os indivíduos mais idosos foram indicados como detentores do maior
conhecimento de plantas pela comunidade onde vivem. Assim como encontrado em outros
estudos com afrodescendentes, o saber sobre as plantas está concentrado,
predominantemente, nos mais velhos da comunidade. Este conhecimento corre risco de
desaparecer devido aos novos agentes de informação aliados ao baixo interesse dos jovens
pelas atividades agrícolas e tradicionais.
O maior número de plantas nativas encontradas no inventário etnobotânico pode
estar relacionado ao grau de isolamento da comunidade e sua localização em região de alta
diversidade biológica. Pode refletir também a longa convivência dessa comunidade com o
meio onde vivem e viveram seus ancestrais. Entretanto, os 41% de plantas exóticas citadas
pelos informantes pode indicar a influência de diferentes culturas e etnias na formação do
conhecimento de plantas na comunidade. Os informantes quilombolas de Cachoeira do
Retiro possuem elevado conhecimento das plantas da região, considerando o recente
estabelecimento desse grupo na área, há menos de 200 anos, e seu ativo processo de
aculturação. Isto suporta a idéia de que as populações tradicionais não indígenas também
fazem usos importantes da floresta.
A comunidade cultiva diversas plantas, em quintais e pomares, de onde tiram a
maior parte dos recursos utilizados. Tal fato pode sugerir que o isolamento levou a
necessidade de manter estes quintais, mas pode também refletir a chegada de novas
espécies e novas informações sobre elas, com as oportunidades de convivência com outros
grupos sociais e com espécies exóticas. Portanto, o turismo requerido pela comunidade
para a área pode ser uma oportunidade de acréscimo de conhecimento mas também a
substituição de um saber por outros saberes, o que pode levar a descaracterização da
comunidade se não for feito com cautela. A grande quantidade de plantas nativas coletadas
nos fragmentos florestais próximos demonstra a necessidade de programas de manejo e
conservação dos remanescentes da mata atlântica existentes.
O hábito arbóreo foi o mais citado como útil pelos informantes de Cachoeira do
Retiro. A coleta de folhas é uma atividade de baixo impacto e é utilizada na maior parte
dos recursos citados pela comunidade, principalmente com fins medicinais. Porém muitas
das espécies utilizadas para lenha, construção e tecnologia removem todo o indivíduo da
população de plantas, sendo uma atividade de grande impacto na comunidade vegetal. De
52
acordo com método testado para avaliação do manejo realizado pelos quilombolas, grande
parte das plantas analisadas tem prioridade de conservação. Porém, ajustando-se a variável
densidade, apenas 20% das plantas ficam na categoria 1 de prioridade de conservação por
seus usos para lenha e construção. O fato do uso de lenha estar sendo substituído pelo uso
de gás leva a diminuição da pressão nesta categoria de uso.
Os usos mais citados pertencem à categoria medicinal, que também agrega o maior
número de espécies úteis. Um fato importante é que a maioria destas espécies nesta
categoria são nativas do bioma mata atlântica. Já a maioria das espécies da categoria
alimentar são exóticas, apesar de 23% destes recursos provirem da mata. Muitas espécies
são citadas para a construção de casa, com destaque para Zeyheria tuberculosa, que
também é a espécie com maior Valor de Importância do fragmento amostrado. Apesar de
tênue, ainda existem manifestações ritualísticas como garrafadas, banhos de descarrego,
espantar “mau olhado” e o hábito de benzer que utilizam determinados vegetais. A espécie
mais citada pela comunidade foi Polyandrococos caudescens, da qual fazem o tipiti.
A comunidade quilombola Cachoeira do Retiro possui elevado conhecimento
etnobotânico quando comparado com outros povos da mata atlântica. A maior parte deste
conhecimento é de plantas nativas da mata atlântica, principalmente das árvores
encontradas no fragmento local. Isto suporta a idéia de que os afrodescendentes
introduziram as plantas nativas do Brasil no seu cotidiano. Além disso, tanto o fragmento
presente no entorno, quanto os quintais e pomares possuem igual importância como fonte
de recursos vegetais para a comunidade de Retiro.
Os quilombolas citam como úteis mais da metade das árvores nativas amostradas
no fragmento e devem ser mais estudados quando em contato com a floresta. As duas
espécies com maior Valor de Uso citadas pela comunidade são nativas, encontradas no
fragmento estudado e pertencem à família Arecaceae, justificando a realização de um
programa para manejo e conservação das Arecaceae no Espírito Santo. Estudos sobre
como comunidades quilombolas manejam os recursos florestais no Estado são importantes
para implantação de estratégias de conservação da sóciobiodiversidade.
53
Recomendações
Em dezembro de 2006 o Governo Federal publica a Lei n° 11.248, que dispõe sobre
a utilização e preservação da vegetação nativa do Bioma Mata Atlântica. Esta legislação,
esperada por mais de dez anos, considera população tradicional como população vivendo
em estreita relação com o ambiente natural, dependendo de seus recursos naturais para a
sua reprodução sóciocultural, por meio de atividades de baixo impacto ambiental; e traz
no seu 9° artigo o que segue:
Art. 9°- A exploração eventual, sem propósito comercial direto ou indireto, de espécies da flora nativa, para consumo nas propriedades ou posses das populações tradicionais ou de pequenos produtores rurais, independe de autorização dos órgãos competentes, conforme regulamento. Parágrafo único. Os órgãos competentes, sem prejuízo do disposto no caput deste artigo, deverão assistir as populações tradicionais e os pequenos produtores no manejo e exploração sustentáveis das espécies da flora nativa.
Sendo assim, o poder público fica responsável por auxiliar populações tradicionais
no manejo racional dos recursos florestais nativos em suas propriedades. Espécies
florestais importantes para a comunidade, principalmente aquelas que fornecem palmitos,
madeiras, alimentos, remédios e matéria-prima, são retirados do fragmento de floresta
atlântica presente no território quilombola. Algumas espécies coletadas, principalmente
para as utilizadas para construção, encontram-se com prioridade de conservação.
Algumas áreas da comunidade estão degradadas, necessitando de intervenção
humana para reabilitação do ambiente. De acordo com o diagnóstico social de Retiro,
realizado pelo IBASE (2006), a agricultura é a principal atividade geradora de renda
realizada dentro da comunidade, apesar da maioria da população trabalhar fora das terras
quilombolas. As atividades agrícolas subsidiadas na comunidade são 12 ha de mandioca e
40 de café, empregando um número reduzido de moradores. Existem artesãos que
confeccionam tapetes, peneiras, cestos, esteiras, vassouras e tipitis, porém não estão bem
associados e não possuem uma cooperativa. O potencial turístico da área é evidente, porém
não é bem usufruído e o benefício não é igualmente repartido.
Diante dessas constatações planejamos, junto com a comunidade pois já foi
acordado e é de seu interesse, a promoção de renda através de projetos de envolvimento
comunitário e utilização racional dos recursos vegetais. Existe um quadro favorável à
atuação de programas governamentais nessa região devido à presença do Projeto
54
Corredores Ecológicos - CCMA, a recente visibilidade política e econômica que as
comunidades remanescentes de quilombos vêm adquirindo, a capacitação de alguns
moradores em coleta de sementes e produção de mudas, a recente parceria da Companhia
Vale do Rio Doce (CVRD) com o Instituto Estadual do Meio Ambiente (IEMA) para
recuperação de áreas degradadas e promoção de corredores ecológicos no Espírito Santo.
Entendemos que o respeito à diversidade cultural é base para a manutenção da diversidade
biológica (Diegues 1994) e que as políticas públicas podem quebrar a lógica do mercado.
Os projetos aqui sugeridos são factíveis e necessitam de pouco recurso. Escolhemos apenas
um dos projetos para implantação em 2007, na forma de unidade demonstrativa. As
propostas são:
• Projeto hortas comunitárias: Cultivo de hortaliças para alimentação humana e
animal, com possível comercialização do excedente. Esse projeto visa um
incremento na alimentação da comunidade, com conseqüente melhoria da
qualidade de vida. Cabe ressaltar que alunas da Universidade de Vila Velha (UVV)
estão iniciando trabalhos de nutrição e segurança alimentar em Retiro. A pesquisa
etnobotânica pode fornecer dados sobre as espécies alimentares mais utilizadas e
culturalmente importantes para os moradores de Retiro. O Instituto Capixaba de
Assistência Técnica e Extensão Rural (INCAPER) e a Prefeitura Municipal de
Santa Leopoldina podem ser parceiros na elaboração e execução desse projeto.
• Plantas Medicinais: Cultivo de espécies vegetais com propriedades medicinais, na
forma de hortas comunitárias, visando melhoria na saúde da comunidade e
diminuição da dependência dos alopáticos industrializados da medicina
convencional. O projeto também visa o fortalecimento de um grupo de discussão
sobre plantas medicinais, proporcionando um espaço de troca de experiências e
envolvimento da comunidade nas terapias alternativas. Este projeto também pode
ser uma parceria entre Universidades, INCAPER, Prefeitura Municipal de Santa
Leopoldina, Pastoral da Criança, entre outras.
• Projeto Recuperação de Áreas Degradadas: Florestamento, condução de
regeneração natural, enriquecimento com espécies nativas entre outras técnicas que
podem ser aplicadas para restauração de APP´s e Reservas Legais, visando o
adequamento das propriedades rurais no contexto dos corredores ecológicos e das
diretrizes do IDAF a serem atingidas até 2016, além de permitir um melhor acesso
aos fundos de financiamento. A idéia é construir viveiros de mudas para dar suporte
55
às recuperações e comercializar o excedente, buscando parceria com Fundo
Nacional do Meio Ambiente (FNMA), INCAPER, Rede de Sementes Rio, Espírito
Santo e Bahia (RIOESBA) e Companhia Vale do Rio Doce.
• Reflorestamento Econômico Consorciado e Adensado: Florestas de produção, com
espécies nativas do bioma mata atlântica, visando coleta de frutos, sementes,
resinas, cipós e madeiras. A idéia é alimentar uma pequena agroindústria
(compotas, castanhas, condimentos, artesanatos, essências, látex, etc) além de
fornecer sementes para produção de mudas no viveiro comunitário e para
comercialização. Alternativas como esta são requeridas visando diminuir a pressão
direta aos fragmentos em regeneração, aumentar a cobertura florestal nativa do
município, iniciar a implementação dos corredores ecológicos, atrair fauna nativa
associada e viabilizar o fluxo gênico entre populações. Os parceiros podem ser
IEMA, INCAPER, FNMA, Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA),
Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR),
RIOESBA e CVRD.
A forte pressão antrópica que os ecossistemas vêm sofrendo tem levado à perda de
extensas áreas verdes, da cultura e das tradições das comunidades habitantes destas áreas,
que dependem de recursos do meio para sobreviver. Assim, pretende-se adotar o conceito
de gestão integrada (Godard 1997) para harmonizar conservação ambiental e promoção do
desenvolvimento sócio-econômico. Esta gestão deve estar imbuída de uma visão
estratégica do desenvolvimento em longo prazo, que lhe confere um sentido para além dos
usos cotidianos. Entende-se que a agricultura familiar tradicional é a melhor forma de
conservação da sóciobiodiversidade (Clement 2006) e, portanto, escolheu-se o projeto
Reflorestamento Econômico Consorciado e Adensado para elaboração e implantação em
2007.
56
Referências Bibliográficas Albuquerque, U.P. 1999. Referências para o Estudo da Etnobotânica dos Descendentes
Culturais do Africano no Brasil. Acta Farm. Bonarense 18(4): 299-306. _______________ 2002. Introdução à Etnobotânica. Recife, Ed. Bagaço, 87p. _______________ & Andrade, L.H.C. 2002. Conhecimento botânico tradicional e
conservação em uma área de caatinga no Estado de Pernambuco, Nordeste do Brasil. Acta botanica brasilica 16(3): 273-285.
_______________ & Lucena, R.F.P. (org.) 2004. Métodos e técnicas na pesquisa
entnobotânica. Recife, NUPEEA, 189p. Alexiades, M.N. (Ed) 1996. Selected guidelines for Ethnobotanical research: a field
manual. New York, New York Botanical Garden, 306p. Almeida, M.Z.de 2003. Plantas Medicinais. Salvador, EDUFBA, 211p. Amorozo, M.C.M. 1996. A abordagem etnobotânica na Pesquisa de Plantas medicinais. In:
Distasi, L.C. (Org.). Plantas medicinais: Arte e Ciência, Um guia de estudo interdisciplinar. São Paulo, EDUSP, p.47-68.
_______________ & Géli, A. 1988. Uso de plantas medicinais por caboclos do Baixo
Amazonas. Boletim do Museu Emílio Goeldi 4(1): 47-131. APG (Angiosperm Phylogenetic Group) II 2003. An update of the Angiosperm
Phylogenetic Group classification for the orders and families of flowering plants. Bot.J.Linnean Soc. 141: 399-436.
Begossi, A. 1996. Use of ecological methods in Ethnobotany: Diversity Indices. Economic
Botany 50(3): 280-289. _________; Leitão-Filho, H.F. & Richerson, R.J. 1993. Plant uses in a Brazilian coastal
fishing community (Buzios Island). Journal of Ethnobiology 13(2): 233-256. _________; Hanazaki, N.; Silvano, R.A.M. 2002. Ecologia Humana, Etnoecologia e
Conservação. In: Amorozo, M.C.M.; Ming, L.C.; Silva, S.M.P. Métodos de Coleta e Análise de Dados em Etnobiologia, Etnoecologia e Disciplinas Correlatas. Rio Claro, Anais do I Seminário de Etnobiologia e Etnoecologia do Sudeste, CNPq – UNESP, p.93-128.
Brasil 1998. Primeiro Relatório Nacional para a Conservação sobre Diversidade
Biológica. Brasília, Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal. Brasil, 283p.
Carneiro, E. 1988. O quilombo dos Palmares. Ed. Nacional (Brasiliana) Vol 302, São
Paulo, 268p.
57
Costa, J.P.O.(ed.) 1999. Diretrizes para a Política de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Mata Atlântica. Brasília, Série Cadernos da Reserva da Biosfera, Cad. 13, 44p.
Clement, C.R. 2006. A lógica do mercado e o futuro da produção extrativista. In: Kubo,
R.R.; Bassi, J.B.; Souza, G.C.; Alencar, N.L; Medeiros, P.M.; Albuquerque, U.P. (org.) Atualidades em etnobiologia etnoecologia vol.3, p.137-150.
Diegues, A.C.S. 1994. O mito moderno da natureza intocada. São Paulo, NUPAUB/
CEMAR/USP, 169p. ______________ & Arruda, R.S.V. (org.) 2001. Saberes tradicionais e biodiversidade no
Brasil. Brasília, MMA série Biodiversidade (4), 176p. Dzerefos, C.M. & Witkowski, E.T.F. 2001. Density and potential utilization of medicinal
grassland plants from Abe Bailey Nature Reserve, South Africa. Biodiversity and Conservation 10: 1875–1896.
Ferraz, J.S.F.; Albuquerque, U.P., Meunier, I.M.J. 2006. Valor de uso e estrutura da
vegetação lenhosa às margens do riacho do navio, Floresta, PE, Brasil. Act. bot. bras 20 (1): 125-134
Figueiredo, G.M.; Leitão-Filho, H. & Begossi, A. 1993. Ethnobotany of Atlantic Forest
Coastal Communities: diversity of plant uses in Gamboa (Itacuruça Island, Brazil). Human Ecology 2(4): 419-430.
Fonseca-Kruel, V.S. & Peixoto, A.L. 2004. Etnobotânica na Reserva Extrativista Marinha
de Arraial do Cabo, RJ, Brasil. Act. Bot. Bras. 18(1): 177-190. Fraga, C.N. 2000. Ecologia, fitogeografia e Conservação das Orchidaceae da restinga do
Estado do Espírito Santo. Rio de Janeiro, Dissertação de Mestrado do Museu Nacional da UFRJ.
França, N.P. 2001. Conservação e desenvolvimento: o caso dos quilombolas do Campinho
da Independência (APA de Cairuçu, Paraty, RJ). São Carlos, Tese de Doutorado da Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. 140p.
Fundação S.O.S. Mata Atlântica, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) &
instituto Sócioambiental (ISA) 1993. Atlas da Evolução dos Remanescentes Florestais e ecossistemas associados no domínio da Mata Atlântica no período 1985-1990. São Paulo.
Galeano, G. 2000. Forest use at the Pacific Coast of Choco, Colômbia: a quantitative
approach. Economic Botany 54(3): 358-376. Godard, O. 1997. A gestão integrada dos recursos naturais e do meio ambiente: conceitos,
instituições e desafios de legitimação. In: Vieira, P.F & Weber, J. (Orgs.) Gestão de recursos naturais renováveis e desenvolvimento – novos desafios para a pesquisa ambiental. Cortez Editora. São Paulo, 500p.
58
Gomez-Beloz, A. 2002. Plant use knowledge of the Winikina Warao: The case for questionnaires in Ethnobotany. Economic Botany 56(3): 231-241.
Guedes, R.R.; Profice, S.R.; Costa, E.L; Baumgratz, J.F.A.; Lima, H.C 1985. Plantas
utilizadas em rituais afro-brasileiros no Estado do Rio de Janeiro – um ensaio Etnobotânico. Rodriguésia 37(63): 3-9.
Hanazaki, N.; Tamashiro, J.Y.; Leitão-Filho, H.F. & Begossi, A. 2000. Diversity of plant
uses in two Caiçara communities from the Atlantic Forest coast, Brazil. Biodiversity and Conservation 9: 597-615.
IBASE 2006. Diagnóstico social de Retiro. Relatório técnico integrante das medidas
compensatórias da instalação da linha de transmissão elétrica de Furnas Ouro Preto – Vitória. Santa Leopoldina, IBASE, 31p.
IBGE 2000. Informações municipais. Disponível no sítio www.ibge.gov.br, acessado em
em 23/05/2006. IMEES 1993. Informações Municipais do Estado do Espírito Santo. Vitória, Secretaria de
Estado de Ações Estratégicas e Palnejamento (SEPLAE), Departamento Estadual de Estatística (DEE), 1224p.
Incra 2006. Relatório da coordenação geral de regularização de territórios quilombolas.
Disponível no sítio www.incra.br, acessado em 23/05/2006. Jesus, M.C.F. 1997. Etnobotânica na Ilha de Guriri São Mateus/Conceição da Barra – ES.
São Carlos, Monografia de Bacharelado da Ufscar, 96p. Kageyama, P.Y. 2005. A Biodiversidade da Mata Atlântica: para que e para quem? In:
Ming, L.C; Carvalho, I.; Vasconcellos, M.C; Radomski, M.I.; Costa, M.A.G. (Eds.) Direito de recursos tradicionais: formas de proteção e repartição de benefícios. Botucatu, Unesp, 157p.
Koeppen, W. 1948. Climatologia. México, Ed. Fondo de Cultura Económica, 466p. Kunsch, A.K. 1999. Transmissão do conhecimento de plantas medicinais a crianças, na
Vila de Itaúnas, ES. São Carlos, Monografia de Bacharelado da Ufscar, 39p. Leite, I.B. 2000. Os quilombos no Brasil: questões conceituais e normativas. Disponível
no sítio www.nead.org.br, acesso em 26/05/2005. Lima, R.X. 1996. Estudos etnobotânicos em comunidades continentais da área de
proteção ambiental de Guaraqueçaba, Paraná, Brasil. Paraná, Dissertação de Mestrado da UFPR, 123p.
Lima, R.X.; Silva S.M.; Kuniyoshi, Y.S.; Silva, L.B. 2000. Etnobiologia de comunidades
continentais da Área de Proteção Ambiental de Guaraqueçaba, Paraná, Brasil. Etnoecológica IV(6): 33-55.
59
Medeiros, M.F.T.; Silva, H.P. & Senna-Valle, L. 2004. Estudo preliminar do uso de plantas medicinais por benzedores e outros informantes de Santa Teresa, Espírito Santo, Brasil. Rev. Bras. Farmacognosia 14(1): 19-21.
Mittermeier, R.A.; Myers, N.; Gil, P.R. & Mittermeier, C.G. 1999. Hotspots: Earth’s
Biologically Richest and Most Endangered Terrestrial Ecoregions. Japão: Toppan Printing Co., 430p.
MMA/SBF 2002. Biodiversidade Brasileira – Avaliação e identificação de áreas
prioritárias para conservação, Utilização sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade brasileira. Brasília, MMA Série Biodiversidade (5).
MMA/IEMA 2006. Informativos do Projeto Corredores Ecológicos. Disponível no sítio
www.iema.es.gov.br/projetocorredoresecologicos, acessado em 23/05/2006. Mori, S.A.; Silva, L.A.; Lisboa, G. & Coradin, L. 1989. Manual de manejo do Herbário
Fanerogâmico. Ilhéus, Centro de pesquisas do Cacau, 104p. Mueller-Dombois, D.; & Ellenberg, H. 1974. Aims and methods of vegetation ecology.
New York, John Willey & Sons. Oliveira, O.M. 1999. Negros, parentes e herdeiros. Um estudo da reelaboração da
identidade étnica na Comunidade de Retiro, Santa Leopoldina – ES. Niterói, Dissertação de Mestrado em Antropologia e Ciência Política da Universidade Federal Fluminense, 174p.
PBQ/SEPPIR 2004. Programa Brasil Quilombola. Secretaria Especial de Políticas de
Promoção da Igualdade Racial. Disponível no sítio www.koinonia.org.br, acessado em em 23/05/2006.
Peixoto, A.L. & Gentry, A. 1990. Diversidade e composição florística da mata de tabuleiro
na Reserva Florestal de Linhares (Espírito Santo, Brasil). Rev. Bras. Bot. 13:19-25 Phillips, O & Gentry, A.H. 1993a. The Useful Plants of Tambopata, Peru: I. Statistical
Hypotheses Tests with a New Quantitative Technique. Economic Botany 47 (1): 15-32
Phillips, O & Gentry, A.H. 1993b. The Useful Plants of Tambopata, Peru: II. Additional,
Hypothesis Testing in Quantitative Ethnobotany. Economic Botany 47(1): 33-43 Pires, J.S.R; Santos, J.E.; Pires, A.M.Z.C.R, Mantovani, J.E & Paese, A. 2002. Estratégia
“inter-situ” de conservação: elaboração de cenários regionais para conservação da biodiversidade. Anais do V Simpósio de Ecossistemas Brasileiros: Conservação. UFES, Vitória, ES. V. I: 61-69. ACIESP n° 109-I.
Prance, G.T. 1995.Ethnobotany. Today and in the Future. In: Schultes, R.E. & Reis, S.
(Eds.) Ethnobotany: Evolution of a discipline. New York, Chapman & Hall, p.60-67. Prance, G.T.; Balée, W.; Boom, B.M. and Carneiro, L.R. 1987. Quantitative ethnobotany
and the case for conservation in Amazonia. Conservation Biology 1(4):296-310.
60
Queiroz, R.S. 1997. “Essa Terra é santa, Essa terra é nossa”. In: Quilombos em São Paulo:
tradições, direitos e lutas. São Paulo, IMESP, p.103-116. RadamBrasil 1982. Fitogeografia brasileira – classificação fisionômica da vegetação
neotropical. Salvador, Boletim Técnico Série Vegetação, Projeto Radam Brasil, 85p. Rocha, C.F.D.; Bergallo, H.G.; Alves, M.A.S. e Sluys, M.V. 2003. A biodiversidade nos
grandes remanescentes florestais do Estado do Rio de Janeiro e nas Restingas da Mata Atlântica. São Carlos, RiMa Ed., 160p.
Rossato, S.C.; Leitão-Filho, H. & Begossi, A. 1999. Ethnobotany of Caiçaras of the
Atlantic Forest Coast (Brasil). Economic Botany 53 (4): 387-395. Shepherd, G. I. 1995. Fitopac 1. Manual do Usuário. Universidade Estadual de Campinas.
Campinas, SP, 93 p. Simonelli, M. & Pereira, O.J. 1994. A vegetação de restinga e os índios Tupiniquins da
Reserva Indígena de Comboios – Aracruz, ES. Rev. cult. da Universidade Federal do Espírito Santo 6: 92-106
Simonelli, M. & Pereira, O.J. 1995. Utilização das plantas de restinga ao sul do estado do
Espírito Santo. Relatório final da bolsa de Iniciação Científica CNPq. Vitória, UFES, 46p.
Solórzano, A.; Oliveira, R.R. & Guedes-Bruni, R.R. 2005. História ambiental e estrutura
de uma floresta urbana. In: Oliveira, R.R. (org.) As marcas do homem na floresta – história ambiental de um trecho de ata atlântica. Rio de janeiro, Ed. PUC-Rio, 87-118.
Souza, G. R. 2002. Florística do estrato arbustivo-arbóreo em um trecho de Floresta
Atlântica, no médio Paraíba do Sul, município de Volta Redonda, Rio de Janeiro. Seropédica, Tese de Mestrado em Ciências Ambientais e Florestais, área de concentração na Conservação da Natureza da UFRRJ, 52p.
Souza, V.C. & Lorenzi, H. 2005. Botânica sistemática: guia ilustrado para identificação
das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Nova Odessa, Instituto Plantarum, 639p.
Sylvestre, L.S. & Rosa, M.M.T. 2002. Manual metodológico para estudos botânicos na
Mata Atlântica. Seropédica, 121p. Thomaz, L.D. & Monteiro, R. 1997. Composição florística da Mata Atlântica de encosta
da Estação Biológica de Santa Lúcia, município de Santa Teresa – ES. Boletim do Museu Mello Leitão 7: 3-48.
Veloso, H.P., Rangel Filho, A.L. & Lima, J.C. 1991. Classificação da vegetação brasileira
adaptada a um sistema universal. Rio de Janeiro, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Departamento de Recursos Naturais e Estudos Ambientais.
61
Vieira, P.F. & Weber, J. 1997. Introdução geral: Sociedades, natureza e desenvolvimento viável. In: Gestão de recursos naturais renováveis e desenvolvimento – novos desafios para a pesquisa ambiental. Cortez editora, São Paulo, 500 p.
Viertler, R.B. 2002. Métodos antropológicos como ferramenta para estudo em
Etnobiologia e Etnoecologia. In: Métodos de coleta e análise de dados em Etnobiologia, Etnoecologia e disciplinas correlatadas. Unesp, p.11-30.
Zschocke, S.; Rabe, T.; Taylor, J.L.S.; Jager, A.K.; van Staden, J. 2000. Planta part
substitution – a way to conserve edangered medicinal plantas? Journal of ethnopharmacology 71:281-292
62
Anexo 1 Questionário verbal que direcionou as entrevistas semi-estruturadas com os moradores da Comunidade Quilombola de Cachoeira do Retiro, Santa Leopoldina – ES.
1. Nome 2. Idade 3. Sexo 4. Há quanto tempo reside na Comunidade? 5. Quais as plantas da mata que você utiliza? 6. Pra que elas servem? 7. Onde você as coleta? 8. Que partes você coleta?
a) Inteira b) Raízes c) Casca d) Folha e) Flor f) Fruto g) Caule h) Exudados (resina, látex)
9. Com quem você aprendeu a coletar essas plantas? 10. Como você as utiliza?
63
64
65