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34 JADA, Vol. 11 - N. o 6, Novembro/Dezembro 2011 O s pacemakers e os cardio- versores desfibrilhadores implantáveis (CDI) são aparelhos electrónicos que emitem sinais eléc- tricos e que são sensíveis a sinais electromagnéticos próximos. A sua implantação em pessoas tem vindo a aumentar, 1,2 principalmente em ido- sos, que também visitam o consultó- rio dentário. Os pacemakers implantados cirur- gicamente proporcionam uma marca- ção de ritmo regulada em bradiarrit- mias cardíacas. A maioria dos pace- makers são implantados em pessoas com bloqueios cardíacos completos graves. 3,4 No entanto, os avanços tec- nológicos em pacemakers permanen- tes ao longo dos últimos 30 anos de- ram origem a uma abrangência das suas indicações de uso, incluindo o tratamento da disfunção do nódulo si- nusal e a capacidade de tolerância aos agentes do bloqueio auriculoven- tricular. 5 Estes avanços e o envelheci- mento da população resultaram no aumento significativo da incidência de implantação de pacemakers per- manentes. 1 Estima-se que 3 milhões de pessoas em todo o mundo tenham pacemakers e que mais de 500 mil pessoas nos Estados Unidos, Canadá e México tenham pacemakers perma- Introdução. Os autores realizaram um estudo para descobrir se ocorrem interferências electromagnéticas na actividade do pacemaker e do cardio- versor desfibrilhador implantável (CDI) durante a utilização de instrumen- tos dentários electrónicos. Métodos. Os autores testaram nove instrumentos dentários electrónicos in vitro para avaliar a sua capacidade de interferência no funcionamento de dois pacemakers e dois CDI de acordo com a telemetria electrocardiográ- fica. Resultados. O ritmo dos pacemakers e dos CDI de câmara dupla foi inibi- da durante a utilização do fotopolimerizador a 2-10 centímetros do gerador ou eléctrodos. A utilização do destartarizador ultrassónico interferiu com a marcação de ritmo do pacemaker de câmara dupla a 17-23 cm do gerador ou eléctrodos, do pacemaker de câmara única a 15 cm do gerador ou eléc- trodos e de ambos os CDI a 7 cm dos eléctrodos. A utilização da cuba ul- trassónica interferiu com a actividade do pacemaker de câmara dupla a 15- 23 cm do gerador ou eléctrodos e com a do pacemaker de câmara única a 12 cm. A utilização da escova de dentes eléctrica, da unidade electrocirúrgica, do estimulador eléctrico para teste da vitalidade pulpar, de instrumentos de corte rotativo de baixa e alta velocidade e de um vibrador de amálgama não alteraram a função de marcação de ritmo. Conclusão. Determinados instrumentos dentários electrónicos interferem com a actividade sensorial e de marcação de ritmo de pacemakers e CDI in vitro. Implicações Clínicas. A utilização do destartarizador ultrassónico, da cuba ultrassónica e do fotopolimerizador poderá produzir efeitos deletérios nos pacientes com pacemakers ou CDI. Palavras-Chave. Pacemaker; desfibrilhador; interferência electromagné- tica; equipamento dentário. © 2010 American Dental Association. Translated by Revisfarma, Edições Médicas, Lda., with the permission of American Dental Association. All rights reserved. JADA 2010;141(5): 521-526. RESUMO Dr. Roedig, membro investigador, Departamento de Prática de Saúde Oral, Faculdade de Medicina Dentária, Universidade de Kentucky, Lexington. Dr. Shah, pro- fessor auxiliar adjunto, Divisão de Cardiologia, Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Centro Médico da Universidade de Kentucky, Lexington. Dr. Elayi, professor auxiliar, Divisão de Cardiologia, Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Centro Médico da Universidade de Kentucky, Lexington. Dr. Miller, professor de Medicina Oral, Departamento de Prática de Saúde Oral, Divisão de Medicina Oral, Faculdade de Medicina Dentária, Universidade de Kentucky, Lexington. Endereço para correspondência: Dr. Craig S. Miller, Department of Oral Health Practice, Oral Medicine Division, College of Dentistry, University of Kentucky, MN 324 Oral Medicine, 800 Rose St., Lexington, Ky. 40536-0084, e-mail: «[email protected]». Interferência da utilização de instrumentos dentários electrónicos na actividade do pacemaker e do cardioversor desfibrilhador implantável Jason J. Roedig, DMD; Jignesh Shah, MD; Claude Samy Elayi, MD; Craig S. Miller, DMD, MS PRÁTICA C L Í N I C A

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34 JADA, Vol. 11 - N.o 6, Novembro/Dezembro 2011

Os pacemakers e os cardio-versores desfibrilhadoresimplantáveis (CDI) sãoaparelhos electrónicosque emitem sinais eléc-

tricos e que são sensíveis a sinaiselectromagnéticos próximos. A suaimplantação em pessoas tem vindo aaumentar,1,2 principalmente em ido-sos, que também visitam o consultó-rio dentário.Os pacemakers implantados cirur-

gicamente proporcionam uma marca-ção de ritmo regulada em bradiarrit-mias cardíacas. A maioria dos pace-makers são implantados em pessoascom bloqueios cardíacos completosgraves.3,4 No entanto, os avanços tec-nológicos em pacemakers permanen-tes ao longo dos últimos 30 anos de-ram origem a uma abrangência dassuas indicações de uso, incluindo otratamento da disfunção do nódulo si-nusal e a capacidade de tolerânciaaos agentes do bloqueio auriculoven-tricular.5 Estes avanços e o envelheci-mento da população resultaram noaumento significativo da incidênciade implantação de pacemakers per-manentes.1 Estima-se que 3 milhõesde pessoas em todo o mundo tenhampacemakers e que mais de 500 milpessoas nos Estados Unidos, Canadáe México tenham pacemakers perma-

Introdução. Os autores realizaram um estudo para descobrir se ocorreminterferências electromagnéticas na actividade do pacemaker e do cardio-versor desfibrilhador implantável (CDI) durante a utilização de instrumen-tos dentários electrónicos.Métodos. Os autores testaram nove instrumentos dentários electrónicosin vitro para avaliar a sua capacidade de interferência no funcionamentode dois pacemakers e dois CDI de acordo com a telemetria electrocardiográ-fica.Resultados. O ritmo dos pacemakers e dos CDI de câmara dupla foi inibi-da durante a utilização do fotopolimerizador a 2-10 centímetros do geradorou eléctrodos. A utilização do destartarizador ultrassónico interferiu com amarcação de ritmo do pacemaker de câmara dupla a 17-23 cm do geradorou eléctrodos, do pacemaker de câmara única a 15 cm do gerador ou eléc-trodos e de ambos os CDI a 7 cm dos eléctrodos. A utilização da cuba ul-trassónica interferiu com a actividade do pacemaker de câmara dupla a 15-23 cm do gerador ou eléctrodos e com a do pacemaker de câmara única a 12cm. A utilização da escova de dentes eléctrica, da unidade electrocirúrgica,do estimulador eléctrico para teste da vitalidade pulpar, de instrumentosde corte rotativo de baixa e alta velocidade e de um vibrador de amálgamanão alteraram a função de marcação de ritmo.Conclusão. Determinados instrumentos dentários electrónicos interferemcom a actividade sensorial e de marcação de ritmo de pacemakers e CDI invitro.Implicações Clínicas.A utilização do destartarizador ultrassónico, dacuba ultrassónica e do fotopolimerizador poderá produzir efeitos deletériosnos pacientes com pacemakers ou CDI.Palavras-Chave. Pacemaker; desfibrilhador; interferência electromagné-tica; equipamento dentário.© 2010 American Dental Association. Translated by Revisfarma, Edições Médicas, Lda., with the per mis sion of Ame rican Dental Association. All rights reserved. JADA 2010;141(5):521-526.

RE S UMO

Dr. Roedig, membro investigador, Departamento de Prática de Saúde Oral, Faculdade de Medicina Dentária, Universidade de Kentucky, Lexington. Dr. Shah, pro-fessor auxiliar adjunto, Divisão de Cardiologia, Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Centro Médico da Universidade de Kentucky,Lexington. Dr. Elayi, professor auxiliar, Divisão de Cardiologia, Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Centro Médico da Universidade deKentucky, Lexington. Dr. Miller, professor de Medicina Oral, Departamento de Prática de Saúde Oral, Divisão de Medicina Oral, Faculdade de Medicina Dentária,Universidade de Kentucky, Lexington.Endereço para correspondência: Dr. Craig S. Miller, Department of Oral Health Practice, Oral Medicine Division, College of Dentistry, University of Kentucky, MN324 Oral Medicine, 800 Rose St., Lexington, Ky. 40536-0084, e-mail: «[email protected]».

Interferência da utilização de instrumentosdentários electrónicos na actividade dopacemaker e do cardioversor desfibrilhadorimplantávelJason J. Roedig, DMD; Jignesh Shah, MD; Claude Samy Elayi, MD; Craig S. Miller, DMD, MS

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nentes implantáveis.6-8 Os CDI também têm sidocolocados para evitar a morte súbita cardíaca empacientes com função cardíaca débil e são coloca-dos em mais de 60 mil pessoas por ano nos Esta-dos Unidos.2 Deste modo, espera-se que, em mé-dia, cada clínica dentária que trate adultos, in-cluindo idosos, tenha pelo menos um paciente comum aparelho cardíaco implantado permanente-mente.Os médicos avisam os doentes com pacemakers

e CDI implantados da possibilidade de ocorrênciade interferências electromagnéticas, causandomau funcionamento do aparelho, danos nos doen-tes ou ambos.9,10 Tem-se aconselhado os pacientesa evitarem máquinas de ressonância magnética,telemóveis e aparelhos de electrocauterização.11-13

A bibliografia dentária também inclui artigos queaconselham os profissionais a evitarem utilizardeterminados instrumentos dentários por pode-rem causar interferência electromagnética e fazercom que os pacemakers não funcionem correcta-mente.14-23 No entanto, as evidências sugerem quea interferência electromagnética na actividade dospacemakers e CDI mais recentes durante a utili-zação de determinados instrumentos dentárioselectrónicos poderá não ser uma grande preocupa-ção.24-27 Estas descobertas levam a ponderar seocorre interferência electromagnética na activida-de do pacemaker e do CDI durante a utilização deinstrumentos dentários electrónicos.

MATERIAIS E MÉTODOS

Testámos nove instrumentos dentários electróni-cos (Quadro) in vitro quanto à sua capacidade deinterferir com o funcionamento de um pacemakerde câmara única (Sigma SR, Medtronic, Minnea-polis), um pacemaker de câmara dupla (Kappamodel KDR701, Medtronic), um CDI de câmaradupla (Marquis DR model 7274, Medtronic) e umCDI biventricular (InSync II Marquis, Medtronic),utilizando um método descrito anteriormente.15 Osinstrumentos dentários electrónicos, pacemakers eCDI constituíram a amostra de conveniência eeram representativos do seu uso comum nos Esta-dos Unidos.Colocámos os pacemakers e os CDI com os eléc-

trodos ligados a uma solução salina de 1,5 litrosque ajustámos a 400-800 ohms, de modo a repro-duzir a resistência eléctrica do corpo humano.Programámos os pacemakers e CDI à sensibilida-de máxima e mergulhámo-los na solução salina.Colocámos a vara telemétrica de um programadorde pacemakers e desfibrilhadores (CareLink Pro-grammer, Model 2090, Medtronic) directamente

sobre o pacemaker ou CDI, para monitorizar as li-gações e os padrões de marcação de ritmo. Doiscardiologistas especializados em electrofisiologiacardíaca (J.S. e C.S.E.) utilizaram o programadorpara monitorizar as saídas auricular e ventriculardo pacemaker e do CDI e a actividade electrocar-diográfica continuadamente, desde 30 segundosantes de cada teste até ao final do mesmo.Utilizámos cada instrumento dentário de forma

a simular a sua utilização normal (isto é, ligámos,desligámos e utilizámo-los continuadamente a to-dos os níveis de energia). Colocámos cada instru-mento dentário directamente no pacemaker ouCDI e afastámo-lo lentamente do gerador e eléc-trodos do pacemaker e do CDI até 90 cm de dis-tância ou até detectarmos não haver interferência.Depois começámos a utilizar cada instrumentodentário a 90 cm do pacemaker ou CDI e aproxi-mámo-lo destes até que estivesse directamente so-bre o pacemaker ou CDI. Testámos cada instru-mento dentário separadamente e repetimos o tes-te três vezes. Se detectássemos interferência, re-gistávamos as distâncias mínima e máxima emrelação ao pacemaker ou CDI às quais foi regista-da interferência.Após terminarmos os testes, os cardiologistas

imprimiram electrogramas para todos os instru-mentos dentários e reviram-nos, procurando e ve-rificando padrões de marcação de ritmo intrínseconormal e interferência na função do aparelho car-díaco. Através do teste de McNemar, analisámosnos dados as diferenças na interferência de acordocom o modo de marcação de ritmo do pacemakerunipolar e bipolar, o gerador versus eléctrodo e adistância.

RESULTADOS

Descobrimos que cada pacemaker e CDI apresen-tava um padrão de marcação de ritmo normal du-rante 30 segundos antes de cada teste. Os registostelemétricos dos pacemakers e CDI foram consis-tentes nos três testes com todos os instrumentosdentários.Detectámos a inibição da actividade de marca-

ção de ritmo quando os três instrumentos dentá-rios electrónicos eram utilizados perto dos pace-makers (Quadro). A utilização do destartarizadorultrassónico interferiu com a actividade dos doispacemakers. Detectámos interferência a 15 cm dogerador do pacemaker de câmara única tanto nomodo de marcação de ritmo unipolar como no bi-polar (Figura 1). A utilização do destartarizadorultrassónico também interferiu com o modo demarcação de ritmo unipolar do pacemaker de câ-

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mara dupla a 23 cm do gerador e com o modo demarcação de ritmo bipolar a 17 cm do gerador. Autilização da cuba ultrassónica causou interferên-cia nos pacemakers de câmara única e dupla a 9-12 cm e 15-23 cm, respectivamente, do gerador(Figura 2). A cuba ultrassónica foi o único instru-mento dentário a interferir com a actividade demarcação de ritmo relacionada com os eléctrodos.A utilização do fotopolimerizador inibiu a activida-de de marcação de ritmo a 7-10 cm do gerador nocaso do pacemaker de câmara dupla e a 3 cm dogerador no caso do pacemaker de câmara única(Figura 3). As interferências que observámos nes-tes testes ocorreram durante o modo de marcaçãode ritmo constante (isto é, na ausência de activi-dade sensorial do pacemaker). No entanto, repeti-

mos os testes sem qualquer actividade de marca-ção de ritmo, produzindo artificialmente activida-de eléctrica sensorial do pacemaker na cuba ul-trassónica. A interferência que ocorreu duranteestes testes foi semelhante à observada durante amarcação de ritmo e surgiu a uma distância simi-lar de cada instrumento dentário (dados não apre-sentados).Também observámos interferência na função de

marcação de ritmo do CDI durante a utilizaçãodos instrumentos dentários. A utilização do des-tartarizador ultrassónico e do fotopolimerizadorinterferiu na função de marcação de ritmo dosCDI (Figuras 1 e 3). A utilização do destartariza-dor ultrassónico inibiu a marcação de ritmo a 7cm dos eléctrodos, enquanto a utilização do fotopo-

TABELA

Características da interferência dos instrumentos dentários electrónicosnos pacemakers e CDI.*INSTRUMENTO DENTÁRIOELECTRÓNICO

PACEMAKER DECÂMARA ÚNICA(SIGMA SR, MEDTRONIC†)

(CENTÍMETROS‡)

PACEMAKER DECÂMARA DUPLA(KAPPA MODEL

KDR701, MEDTRONIC)(cm)

CDI DE CÂMARADUPLA (MAR-

QUIS DR MODEL7274, MEDTRO-

NIC) (cm)

CDI BIVENTRICU-LAR (INSYNC IIMARQUIS,

MEDTRONIC)(cm)

ModoUnipolar

ModoBipolar

ModoUnipolar

ModoBipolar

Modo Bipolar Modo Bipolar

Vibrador de amálgama (PromixModel 400, Dentsply, York, Pa.)

0 0 0 0 0 0

Fotopolimerizador (SmartLiteIQ2, Dentsply Caulk, Milford,Del.)

≤ 3 ≤ 3 ≤ 10 ≤ 7 ≤ 2 ≤ 3

Estimulador eléctrico pulpar(Vitality Scanner 2006,SybronEndo, Orange, Calif.)

0 0 0 0 0 0

Escova de Dentes Eléctrica(Braun Oral-B TriumphProfessional Care 9000, Procter& Gamble, Cincinnati)

0 0 0 0 0 0

Unidade Electrocirúrgica(Sensimatic 600SE, ParkellElectronics, Farmingdale, N.Y.)

0 0 0 0 0 0

Instrumento de Corte Rotativode Alta Velocidade (Mira LUX 3635B, KaVo Dental, Lake Zurich,Ill.)

0 0 0 0 0 0

Instrumento de Corte Rotativode Baixa Velocidade (Intra 20K1:1 (Kavo Dental)

0 0 0 0 0 0

Cuba ultrassónica (L&RTransitor/Ultrasonic, L&RManufacturing, Kearny, N.J.)

≤ 12§ ≤ 12¶ ≤ 23 ≤ 15 0 0

Destartarizador Ultrassónico(Cavitron Select SPS, Dentsply)

≤ 15 ≤ 15 ≤ 23 ≤ 17 ≤ 7 ≤ 7

* CDI: Desfibrilhador cardioversor implantável.† A Medtronic localiza-se em Minneapolis.‡ Distância em relação ao gerador, a não ser que se repare de outro modo.§ Interferência em relação ao eléctrodo também a ≤ 12 cm.¶ Interferência em relação ao eléctrodo também a ≤ 9 cm.

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limerizador inibiu a marcação de ritmoapenas a 2-3 cm dos eléctrodos.O ritmo e a taxa da marcação de ritmo

permaneceram normais em ambos os pa-cemakers e CDI durante a utilização dovibrador de amálgama, do estimuladoreléctrico pulpar, da escova de dentes eléc-trica, da unidade electrocirúrgica e dosinstrumentos de corte rotativo a baixa ealta velocidades.Quando analisámos os modos de mar-

cação de ritmo (unipolar versus bipolar)em testes independentes e cruzámos osdados dos quatro aparelhos e dos doismodos, descobrimos que o efeito (interfe-rência) foi significativo no gerador emcomparação com os eléctrodos na utiliza-ção do destartarizador ultrassónico(p=0,04) e do fotopolimerizador (p=0,04).

DISCUSSÃO

Apesar de hoje em dia os pacemakers se-rem mais pequenos e terem mais carac-terísticas protectoras que os anteriores,muitos instrumentos dentários comunsemitem ondas electromagnéticas que po-dem interferir com as suas funções.Como a taxa de implantação de pacema-kers e CDI tem vindo a aumentar,1,2 prin-cipalmente em idosos, a eliminação dasinterferências eléctricas que possam cau-sar o funcionamento desadequado destesaparelhos cardíacos e, portanto, afectarnegativamente a saúde cardíaca dos pa-cientes dentários é uma questão impor-tante.Tanto quanto sabemos, o nosso estudo

é o primeiro in vitro a investigar a inter-ferência electromagnética tanto na acti-vidade do pacemaker como na do CDI du-rante a utilização de instrumentos den-tários electrónicos. Descobrimos que autilização de três instrumentos dentárioselectrónicos (um destartarizador ultras-sónico, uma cuba ultrassónica e um foto-polimerizador) inibia a função de marca-ção de ritmo dos pacemakers. Este efeitoaconteceu com maior frequência quandoutilizámos os instrumentos dentárioselectrónicos mais próximos do geradorque dos eléctrodos. Em geral, estes acha-dos são semelhantes aos do nosso estudode 1998,15 no qual descobrimos que a uti-lização de um destartarizador ultrassóni-

Figura 1. Electrograma que demonstra a interferência na função da marcaçãode ritmo causada pela utilização do destartarizador ultrassónico na presença de(A) pacemaker de câmara única, (B) pacemaker de câmara dupla, (C) desfibril-hador cardioversor implantável (CDI) de câmara dupla e (D) CDI biventricular.

Figura 2. Electrograma que demonstra a interferência na função de marcaçãode ritmo causada pela utilização da cuba ultrassónica na presença de um pace-maker de câmara única nos modos (A) unipolar e (B) bipolar e de um (C) pace-maker de câmara dupla.

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co e de uma cuba ultrassónica a menos de cerca de60 cm de distância causava interferências electro-magnéticas na actividade do pacemaker. Outrosinvestigadores também demonstraram que a utili-zação de um destartarizador ultrassónico e deuma cuba ultrassónica interferia com os registosde telemetria intracardíaca do pacemaker.25,26 Nonosso estudo actual, também descobrimos que autilização do fotopolimerizador produzia interfe-rência electromagnética a distâncias curtas deambos os pacemakers. Este tipo de interferêncianão tinha sido relatado anteriormente. Para alémdisto, a utilização da unidade electrocirúrgica nãointerferiu com a actividade de marcação de ritmoneste estudo, o que contraria uma descoberta donosso estudo de 1998.15 Uma possível explicaçãopara a diferença de resultados é o provável melho-ramento na protecção dos aparelhos cardíacos nosmodelos de pacemakers mais recentes. Em alter-nativa, a unidade electrocirúrgica mais recenteque utilizámos neste estudo poderá ter influencia-do estas conclusões.A informação sobre a interferência na activida-

de do CDI durante a utilização de equipamento

dentário electrónico é limitada. Num es-tudo, os investigadores descobriram que autilização de localizadores electrónicos doápice e de estimuladores eléctricos pulpa-res não interferia com os CDI.28 Num rela-tório diferente, os investigadores desco-briram que a utilização de uma cuba ul-trassónica produzia interferência electro-magnética, mas com a utilização de umdestartarizador ultrassónico isso nãoacontecia.24 Contrariamente, observámosinterferência na actividade de ambos osCDI durante a utilização do destartariza-dor ultrassónico e do fotopolimerizador,enquanto a utilização da cuba ultrassóni-ca não interferiu com a actividade dequalquer CDI. Os diferentes modelos deequipamentos dentários electrónicos, pa-cemakers e CDI, assim como os métodospara medir a interferência (isto é, interfe-rência na telemetria versus interferênciano aparelho), podem ter contribuído paraas diferenças que observámos nestes estu-dos. Também reconhecemos que o facto deos pacemakers e CDI que testámos in vi-tro serem fabricados pela mesma empresafoi uma limitação para o nosso estudo.O número de instrumentos dentários

que interferiram com a função de marca-ção de ritmo dos pacemakers e CDI foi li-

mitado. Dos nove instrumentos dentários que tes-támos, apenas a utilização de três – o destartari-zador ultrassónico, a cuba ultrassónica e o fotopo-limerizador – inibiu a actividade de marcação deritmo. A utilização do vibrador de amálgama, daescova de dentes eléctrica, do estimulador eléctri-co pulpar, da unidade electrocirúrgica e dos ins-trumentos de corte rotativo de alta e baixa veloci-dades não criaram interferências electromagnéti-cas.

CONCLUSÕES

Os nossos resultados, juntamente com os de ou-tros investigadores, sugerem ser aconselhável autilização cautelosa de destartarizadores ultrassó-nicos, cubas ultrassónicas e determinados fotopo-limerizadores perto de pacientes e funcionáriosque tenham pacemakers ou CDI. Os especialistastambém recomendam a utilização cautelosa deunidades electrocirúrgicas perto destes aparelhoscardíacos implantados.29 Consequentemente, osmédicos dentistas devem ponderar a utilização deinstrumentos manuais na destartarização e ras-pagem radicular em pacientes que tenham pace-

Figura 3. Electrograma que demonstra a interferência na função de marcaçãode ritmo causada pela utilização do fotopolimerizador na presença de (A) pace-maker de câmara única, (B) pacemaker de câmara dupla, (C) desfibrilhador car-dioversor implantável (CDI) de câmara dupla e (D) CDI biventricular.

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makers ou CDI, assim como remover as cubas ul-trassónicas das áreas de cuidados clínicos.Os médicos dentistas devem compreender que a

interferência electromagnética por parte dos ins-trumentos dentários é um campo em evolução doqual se obtêm diferentes resultados e interpreta-ções dos testes pela utilização de diferentes pace-makers, diferentes instrumentos dentários elec-trónicos e ambientes (in vitro versus in vivo).26,27 Énecessário realizar estudos em ambientes in vivode modo a determinar quais os instrumentos den-tários electrónicos que podem ser utilizados comsegurança na prática dentária. Até lá, é mais pru-dente jogar pelo seguro. �

Conflito de interesses. Nenhum dos autores relatou qualquer con-flito de interesses.

Os autores agradecem ao Dr. Richard Kryscio pela sua ajuda com asanálises estatísticas.

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