interferÊncia antrÓpica e dinÂmica erosiva: estudo de …

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ISSN: 2175-8875 www.enanpege.ggf.br/2017 2651 INTERFERÊNCIA ANTRÓPICA E DINÂMICA EROSIVA: ESTUDO DE CASO EM ÁREA RURAL DEGRADADA NO OESTE PAULISTA ANTHROPIC INTERFERENCE AND EROSIVE DYNAMICS: CASE STUDY IN A DEGRADED RURAL AREA IN THE WESTERN REGION OF SÃO PAULO FELIPE AUGUSTO SCUDELLER ZANATTA 1 CENIRA MARIA LUPINACCI 2 MARCOS NORBERTO BOIN 3 Resumo: Este trabalho tem por objetivo levantar a interferência antrópica nos processos erosivos em uma bacia com voçorocamento, localizada na alta bacia do ribeirão Areia Dourada, subbacia do Rio Santo Anastácio, na região do Oeste Paulista. Para tanto, foram realizados mapeamentos de geomorfologia e uso da terra nos cenários de 1963, 1979, 1997, 2010 e 2015, em escala 1:10.000. As informações mapeadas foram quantificadas e trabalhadas através do Coeficiente de Correlação de Pearson (p). Como resultado, observou-se o pasto como catalisador de distintos processos lineares, ao mesmo tempo em que as técnicas conservacionistas aplicadas contribuíram para o aumento das feições erosivas, sobretudo pela maior infiltração de água abastecer a voçoroca e dinamizar os processos erosivos nas vertentes. Palavras-chave: Erosão linear; Coeficiente de Correlação de Pearson; Técnicas conservacionistas. Abstract: This article aims to investigate the anthropic interference in the erosive processes in a basin with gullying, in the high basin of Areia Dourada stream, sub - basin of Santo Anastácio river, in the western region of São Paulo. To do so, we performed geomorphology and land use mapping in the scenarios of 1963, 1979, 1997, 2010 and 2015, in a scale of 1: 10,000. The mapped information was quantified and worked through the Pearson’s Correlation Coefficient (p). The result was the observation of pasture as a catalyst for different linear processes, while the applied conservation techniques contributed to the increase of the erosive features, mainly due to the greater 1 - Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. E-mail de contato: [email protected] 2 Professora Doutora da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho E-mail de contato: [email protected] ³Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal da Grande Dourados. E-mail: [email protected]

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INTERFERÊNCIA ANTRÓPICA E DINÂMICA EROSIVA: ESTUDO DE CASO EM ÁREA RURAL DEGRADADA NO OESTE PAULISTA

ANTHROPIC INTERFERENCE AND EROSIVE DYNAMICS: CASE

STUDY IN A DEGRADED RURAL AREA IN THE WESTERN REGION OF SÃO PAULO

FELIPE AUGUSTO SCUDELLER ZANATTA1 CENIRA MARIA LUPINACCI2 MARCOS NORBERTO BOIN3

Resumo: Este trabalho tem por objetivo levantar a interferência antrópica nos processos erosivos em uma bacia com voçorocamento, localizada na alta bacia do ribeirão Areia Dourada, subbacia do Rio Santo Anastácio, na região do Oeste Paulista. Para tanto, foram realizados mapeamentos de geomorfologia e uso da terra nos cenários de 1963, 1979, 1997, 2010 e 2015, em escala 1:10.000. As informações mapeadas foram quantificadas e trabalhadas através do Coeficiente de Correlação de Pearson (p). Como resultado, observou-se o pasto como catalisador de distintos processos lineares, ao mesmo tempo em que as técnicas conservacionistas aplicadas contribuíram para o aumento das feições erosivas, sobretudo pela maior infiltração de água abastecer a voçoroca e dinamizar os processos erosivos nas vertentes. Palavras-chave: Erosão linear; Coeficiente de Correlação de Pearson; Técnicas conservacionistas.

Abstract: This article aims to investigate the anthropic interference in the erosive processes in a basin with gullying, in the high basin of Areia Dourada stream, sub - basin of Santo Anastácio river, in the western region of São Paulo. To do so, we performed geomorphology and land use mapping in the scenarios of 1963, 1979, 1997, 2010 and 2015, in a scale of 1: 10,000. The mapped information was quantified and worked through the Pearson’s Correlation Coefficient (p). The result was the observation of pasture as a catalyst for different linear processes, while the applied conservation techniques contributed to the increase of the erosive features, mainly due to the greater

1 - Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. E-mail de contato: [email protected] 2 Professora Doutora da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho E-mail de contato: [email protected] ³Docente do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal da Grande Dourados. E-mail: [email protected]

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infiltration of water to supply the gully and to dynamize the erosive processes in the slopes.

Keywords: Linear erosion; Pearson’s Correlation Coefficient; Conservationist techniques.

1 – Introdução

A erosão do solo representa um problema crescente nas áreas rurais do estado

de São Paulo. Em cadastramento das erosões no estado, o Instituto de Pesquisa e

Tecnologia (IPT, 2015), registrou, entre ravinas e voçorocas, 29.864 dessas formas

erosivas nas áreas rurais. Na Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos - 22

(UGRHI – Pontal do Paranapanema), em levantamento do IPT (2012), registraram-se

3.261 formas erosivas, sendo Marabá Paulista (SP), com 371, o segundo município

mais problemático da Unidade.

Ao considerar a questão da erosão do solo na região, o presente trabalho visa

identificar as interferências antrópicas na dinâmica erosiva ao longo de 50 anos em

uma bacia com processo de voçorocamento localizada na alta bacia do ribeirão Areia

Dourada, em Município de Marabá Paulista (SP) (Figura 1).

Figura 1: Localização da bacia estudada

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Nessa bacia foram mapeados os cenários de uso e cobertura superficial da

terra e geomorfologia nos anos de 1963, 1979, 1997, 2010 e 2015, em escala

1:10.000. As informações mapeadas foram quantificadas de acordo com sua natureza

espacial, as quais, tabuladas, foram trabalhadas através do Coeficiente de Correlação

de Pearson (p), de modo a indicar a intensidade de correlação positiva, negativa ou

nula entre as classes de uso da terra e as feições geomorfológicas identificadas.

2 – Materiais e técnicas cartográficas

Distintas bases foram utilizadas para os mapeamentos de uso da terra e

geomorfologia. As fotografias aéreas dos anos de 1963 (Levantamento

Fotogramétrico do Estado de São Paulo), escala 1: 25.000, 1979 (Terrafoto S.A.

Atividades de Aerolevantamentos, 1978/9), escala 1: 20.000, e 1997

(Aerolevantamento Presidente Venceslau e áreas correlatas), 1: 35.000, foram

trabalhadas em estereoscopia digital, no programa StereoPhotoMaker, enquanto

ortofotos de 2010 (Projeto de atualização cartográfica do Estado de São Paulo –

Mapeia São Paulo), em escala 1:10.000, e a imagem orbital do satélite Quickbird, de

2013, foram avaliadas por fotointerpretação e os dados reambulados em trabalhos de

campo. A base cartográfica, de onde foram obtidas as informações da topografia, foi

realizada pelo Instituto Geográfico e Cartográfico do estado de São Paulo (IGC, 2000),

em escala 1: 10.000, com equidistância de cinco metros das curvas de nível; embora

haja discordância entre as escalas dos aerolevantamentos e a utilizada nesse estudo,

realizou-se a fotointerpretação com o máximo de zoom e detalhe possível,

considerando-se, portanto, que as feições levantadas são passíveis de serem

cartografadas.

O mapeamento de uso e cobertura superficial da terra seguiu os procedimentos

e nomenclaturas estabelecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE, 2006), enquanto para o geomorfológico utilizou-se o sistema de mapeamento

francês (TRICART, 1965) e o sistema Internacional Institute for Aerial Survey and

Earth Science (ITC), proposto por Verstappen; Zuidam (1975), uma vez que ambos

dão ênfase aos processos morfogenéticos dominantes.

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Todas as variáveis mapeadas foram quantificadas, as de uso da terra em

porcentagem de área, enquanto as de geomorfologia de acordo com sua natureza

espacial: marcas que indicam erosão laminar, voçoroca, terraços agrícolas, área de

terraço e planície fluvial e açudes em porcentagem de área; bacias de contenção,

sulcos e ravinas em número; estrada rural, canal fluvial com fundo de vale plano e

fundo de vale em v, ruptura topográfica abrupta e/ou com afloramento de água em km

de extensão.

As informações quantitativas foram analisadas de forma conjunta através do

Coeficiente de Correlação de Pearson (p). Para tanto, no programa Microsoft Excel®,

elaborou-se uma tabela contendo nas colunas os anos, os dados de uso da terra e de

geomorfologia, enquanto as linhas a área, número ou extensão das variáveis em cada

cenário analisado (1963, 1979, 1997, 2010 e 2015). Os resultados foram marcados

com cores que variam de verde (intensidade de correlação positiva), vermelho

(intensidade de correlação negativa) e branco (correlação nula).

Para essa análise, removeu-se as informações de reflorestamento, fruticultura

e eucalipto, uma vez que tais variáveis de uso da terra, pela baixa representatividade

espacial e oscilações ao longo do período avaliado, não apresentam interferências

perceptíveis nessa análise em relação à dinâmica erosiva da área.

3. Resultados e discussões

A bacia estudada, desde o primeiro ano avaliado, em 1963, apresenta pouca

cobertura por espécies nativas de porte florestal, com apenas 7,26% da área. No ano

seguinte, 1979, tem-se 2,19%, que se mantém até o último ano avaliado, 2015.

Predomina o uso para pasto, ocupando, em 1979 e 1997, 79,98% e 89,59%,

respectivamente, dos 644,45 hectares que perfazem a área de estudo (Tabela 1).

Tabela 1: Uso e cobertura superficial da terra nos cenários de 1963, 1979, 1997, 2010 e 2015, área em porcentagem

Uso e cobertura superficial da terra 1963 1978 1997 2010 2015

Vegetação nativa 7,26 2,19 2,19 2,19 2,19 Reflorestamento 0 0 0,06 0,26 0,31

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Silvicultura 8,69 3,13 0 0,65 4,69 Cultura temporária 28,45 7,13 0 16,01 17,69 Pasto 54,41 78,98 89,59 56,89 52,19 Pasto sujo 0 5,96 0,11 11,97 13,15

Vegetação de área úmida 0,29 0,04 0,19 0,94 0,95

Mudanças significativas no uso e cobertura superficial dos terrenos se verificam

a partir de 2010, resultado da expansão das empresas sucroalcooleiras pelo W

Paulista. Essas empresas, na área estudada, passam a arrendar terrenos e cultivar

cana-de-açúcar em 16,01% da área, nas vertentes a E do canal principal, antes

destinadas ao pastoreio. Junto à cana-de-açúcar, as margens de grandes formas

erosivas, ravinas e voçorocas, foram cercadas, aumentando, assim, as áreas de pasto

sujo (Figura 2); parte do cultivo de cana-de-açúcar, em 2015, devido ao término do

período do arrendamento antes do período de colheita, encontra-se queimada e com

gado.

Figura 2: Uso e cobertura superficial da terra, feições geomorfológicas e modelado antrópico na média bacia nos cenários de 1997, 2010 e 2015

Em 2015, 4,04% das áreas de pasto foram destinadas à silvicultura, localizadas

sobre ravinas obliteradas (Figura 2). Na Bacia, também se verificam pequenos

reflorestamentos, que aumentam em área a partir de 1997, de modo a ocupar 0,31%

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em 2015, localizados em terrenos que margeiam ravinas, sobretudo na cabeceira

dessas, a jusante de rupturas topográficas abruptas com afloramento de água.

Por toda área, mas sobretudo na alta e média bacia, a jusante da ruptura

topográfica abrupta, desenvolve-se de forma contínua grande quantidade de

processos erosivos lineares desde 1963, formando voçorocamento em 1979. Nos

anos seguintes, têm-se uma maior dinâmica de todas as formas erosivas (Tabela 2).

Tabela 2: Feições geomorfológicas e modelado antrópico nos cenários de 1963, 1979, 1997, 2010 e 2015

Feições geomorfológicas e modelado antrópico 1963 1979 1997 2010 2015

Marcas que indicam erosão laminar (área, em %) 19,34 57,31 95,37 84,2 97,68

Sulco (número) 87 75 91 114 148

Ravina (número) 40 45 92 170 165

Voçoroca (área, em %) 0 0,76 1,37 1,22 1,22 Canal fluvial com fundo de vale plano (extensão, em km) 1,83 0,51 0,23 1,59 1,59 Canal fluvial com fundo de vale em "v" (extensão, em km) 1,75 0,41 1,82 0,26 0,26

Área de terraço e planície fluvial (área, em %) 0,09 0,03 0,06 0,06 0,06

Ruptura topográfica abrupta (extensão, em km) 3,5 3,45 3,04 3,04 3,04

Ruptura topográfica abrupta com afloramento de água (extensão, em km) 0,26 0,31 0,72 0,72 0,72

Açude (área, em %) 0 0 0 0,87 0,8

Terraços agrícolas (área, em %) 0 10,15 23,35 65,04 65,04

Obliteração 0 0 0 14 12

Bacias de contenção (número) 0 0 7 79 81

Estrada rural (extensão, em km) 18,91 4,9 2,86 11,62 11,62

Rodovia (extensão, em km) 0 0 0,18 0,18 0,18

Todas as formas erosivas aumentam de forma progressiva de 1963 a 1997,

exceto os sulcos, que reduzem em número, de 87, em 1963, para 75, em 1979, muitos

dos quais evoluíram para ravinas e outros corrigidos com a introdução de terraços

agrícolas nesse período.

Observa-se que a partir da introdução dos terraços agrícolas, em 1979, ocorre

aumento no afloramento de água nas rupturas topográficas, sobretudo na alta bacia,

concomitante à ampliação de todas as feições erosivas, principalmente do

voçorocamento. A partir de 2010 há uma redução dos processos em ravinas e

estabilização aparente da voçoroca, que não aumenta em área, devido,

principalmente, a dois grandes represamentos ao longo do canal principal atingido

pela erosão: um no médio curso e outro na foz.

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Através do Coeficiente de Correlação de Pearson (p), aplicado aos dados de

uso da terra e geomorfologia (Tabela 3), aferiu-se a perfeita correlação negativa entre

os cursos fluviais em fundos de vale em “v” e os terraços agrícolas (TA), obliteração

(OB), bacias de contenção (BC) e açudes (AE), ao passo que aumentam as áreas de

planície e terraço fluvial (ATPF) e açudes (AE), de modo que as interferências

antrópicas e a dinâmica erosiva modificaram significativamente os cursos fluviais da

bacia, alterando a forma do fundo de vale pela sedimentação excessiva e

represamentos.

Tabela 3: Coeficiente de Correlação de Pearson (CCP) entre variáveis de uso da terra e

feições do relevo na ao longo dos cenários de 1963, 1976, 1997, 2010 e 2015

VN RF SIL CT P OS VAU AE ML S R V FVV FVP APTF RTA RTA-AF

AE -0,4 1,0 -0,2 0,3 -0,6 0,9 1,0 1,0

ML -0,9 0,6 -0,8 -0,7 0,3 0,5 0,4 0,5 1,0

S -0,3 0,9 0,0 0,3 -0,6 0,8 0,9 0,9 0,5 1,0

R -0,6 1,0 -0,4 0,0 -0,4 0,8 0,9 0,9 0,7 0,9 1,0

V -0,9 0,6 -0,9 -0,7 0,3 0,5 0,4 0,5 1,0 0,5 0,7 1,0

FVV 0,4 -1,0 0,2 -0,3 0,7 -0,9 -1,0 -1,0 -0,5 -0,9 -0,9 -0,5 1,0

FVP 0,5 0,5 0,6 0,9 -1,0 0,4 0,7 0,6 -0,4 0,5 0,3 -0,4 -0,6 1,0

APTF -0,2 1,0 -0,1 0,4 -0,7 0,8 1,0 1,0 0,4 0,9 0,9 0,4 -1,0 0,7 1,0

RTA 0,7 -0,8 0,7 0,4 0,0 -0,5 -0,7 -0,7 -0,9 -0,7 -0,9 -0,9 0,6 0,1 -0,6 1,0

RTA-AF -0,7 0,8 -0,7 -0,4 0,0 0,5 0,7 0,7 0,9 0,7 0,9 0,9 -0,6 -0,1 0,6 -1,0 1,0

TA -0,6 1,0 -0,4 0,0 -0,4 0,9 0,9 1,0 0,7 0,9 1,0 0,7 -1,0 0,3 0,9 -0,8 0,8

OB -0,4 1,0 -0,2 0,2 -0,6 0,9 1,0 1,0 0,5 0,8 0,9 0,5 -1,0 0,6 1,0 -0,7 0,7

BC -0,4 1,0 -0,2 0,2 -0,6 0,9 1,0 1,0 0,6 0,9 1,0 0,5 -1,0 0,5 1,0 -0,7 0,7

Legenda: Vegetação nativa (VN); pasto (P); pasto sujo (PS); vegetação de área úmida (VAU); açude (AE); marcas que indicam erosão laminar (ML); sulcos (S); ravina (R); voçoroca (V); canal fluvial com fundo de vale plano (FVP); fundo de vale em “v” (FVV); área de terraços e planície fluvial (ATPF); ruptura topográfica abrupta (RTA); ruptura topográfica abrupta com afloramento de água (RTA-AF); terraço agrícola (TA); obliteração (OB); e bacias de contenção (BC).

A redução da vegetação de área úmida entre 1963 e 1979, de 0,29 para 0,04%

(Tabela 1), decorre do desenvolvimento do processo de voçorocamento nesse

período (Tabela 2; Figura 3). Posteriormente, sobretudo a partir de 2010, aferiu-se

Legenda

Intensidade de correlação

+ -

Perfeita correlação

Muito forte correlação

Forte correlação

Correlação moderada

Correlação fraca

Correlação nula

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aumento significativo dessa cobertura vegetal, que ocorre nos fundos de vale no

médio curso do canal principal, entre os dois barramentos, e na foz, a jusante do

açude. Tais barramentos promoveram estabilidade suficiente desses ambientes

úmidos para colonização por espécies de gramíneas e herbáceas (Figura 3). Essa

dinâmica também se verifica pela perfeita correlação positiva entre as classes

temáticas vegetação de área úmida (VAU) e açudes (AE) (Tabela 3). A correlação

positiva moderada dessa cobertura vegetal (VAU) com a voçoroca (V) representa as

oscilações promovidas nos ambientes úmidos pela interferência tanto do processo de

voçorocamento, como dos barramentos.

Figura 3: Processo de voçorocamento e ambientes úmidos no fundo de vale do canal principal e após os dois barramentos

Quanto ao voçorocamento, este ocorre em meio às pastagens, a princípio como

uma ravina, em 1963, atingindo, no ano de 1979, o estágio de voçoroca. Verifica-se

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correlação positiva moderada entre o pasto (P), a voçoroca (V) e as formas que

indicam erosão laminar (ML), correlação negativa moderada com as ravinas (R) e

negativa forte com os sulcos (S). Essa distorção ocorre devido à diminuição da área

de pasto (P), substituída pelo cultivo de cana-de-açúcar (CT). As correlações positivas

derivam de que essas feições (voçoroca (V) e marcas que indicam erosão laminar

(ML)) diminuem o ritmo de desenvolvimento com a introdução da cana-de-açúcar

(CT), junto a diversas técnicas para conter os processos erosivos.

As correlações negativas entre pasto (P), sulcos (S) e ravinas (R) decorrem de

que a introdução da cana-de-açúcar reduziu a área de pasto, no entanto, os sulcos e

ravinas continuaram aumentando em meio as pastagens, como aferido na Figura 3.

Assim, para melhor avaliar o impacto do pastoreio na dinâmica erosiva, averiguou-se

que no período de 1963 a 1997 (Tabela 4), em que predominavam as pastagens,

ocorre perfeita correlação positiva dessa cobertura superficial (P) com as marcas que

indicam erosão laminar (ML) e a voçoroca (V), correlação muito forte com as ravinas

(R) e nula com os sulcos (S).

Tabela 4: Coeficiente de Correlação de Pearson (CCP) entre variáveis de uso da terra e feições erosivas ao longo dos cenários de 1963, 1976 e 1997

Legenda

Marcas que indicam erosão laminar Sulco Ravina Voçoroca

Intensidade de correlação +

Pasto 1,0 0,0 0,8 1,0 Perfeita correlação

Forte correlação

Correlação Nula

A correlação nula está associada a diminuição do número de sulcos entre 1963

e 1979 (Tabela 2), uma vez que alguns evoluíram para ravinas, enquanto outros foram

corrigidos com os terraços agrícolas. No entanto, nos anos posteriores, devido à baixa

manutenção nos terraços e ao superpastoreio dos terrenos, os sulcos aumentaram

em quantidade progressivamente.

Em todo período analisado (Tabela 3), os dados apontam correlação negativa

moderada entre a vegetação nativa (VN) e os sulcos (S), negativa forte com as ravinas

(R) e negativa muito forte com as marcas que indicam erosão laminar (ML) e a

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voçoroca (V), uma vez que essa cobertura é substituída por outras que não ofertam

igual proteção aos solos, proporcionando a instabilidade dos terrenos, com

consequente desencadeamento de fenômenos denudativos.

Quanto à dinâmica erosiva, observa-se que as feições que indicam tal dinâmica

se desenvolvem de forma conjunta, de modo que se tem intensa correlação positiva

entre essas. A voçoroca (V) apresenta forte correlação positiva com as ravinas (R),

moderada com os sulcos (S) e perfeita com as marcas que indicam erosão laminar

(ML). As ravinas (R) apresentam muito forte correlação com os sulcos (S), enquanto

as marcas que indicam erosão laminar (ML) proporcionam correlação moderada com

os sulcos (S) e forte com as ravinas (R). Esse fenômeno deriva da instabilidade

promovida pelo processo de voçorocamento nas baixas vertentes, dando origem a

pequenas ravinas nesses setores. Essas, ao se desenvolverem, desestabilizam os

terrenos mais a montante, a princípio na forma de sulcos erosivos.

O superpastoreio dos terrenos e a ausência de vegetação com características

mais protetoras desses solos proporcionam as condições ambientais para o

desencadeamento conjunto e progressivo dos fenômenos erosivos. Nesse ambiente,

as técnicas para conter os processos erosivos não reduzem o fenômeno, mas, junto

ao uso intensivo dos terrenos nas vertentes, contribuem para que continuem ativos,

uma vez que o aumento da infiltração de água abastece a voçoroca e dinamiza as

vertentes desprotegidas. Assim, todas as técnicas apresentam correlação positiva

com as formas erosivas, de modo que se verifica perfeita correlação positiva entre as

ravinas (R), as bacias de contenção (BC) e os terraços agrícolas (TA); muito forte

entre as ravinas (R), obliterações (OB) e açudes (AE) e entre os sulcos (S), os terraços

agrícolas (TA), as bacias de contenção (BC) e açudes (AE); forte entre as voçorocas

(V) e os terraços agrícolas (TA), entre os sulcos (S) e obliterações (OB) e entre as

marcas que indicam erosão laminar (ML), os terraços agrícolas (TA) e as bacias de

contenção (BC). A correlação positiva é moderada entre a voçoroca (V), os açudes

(AE), as bacias de contenção (BC) e obliteração (OB) e entre as marcas que indicam

erosão laminar (ML) e os açudes (AE) e as obliterações (OB).

Dessa forma, na área estudada o emprego de técnicas conservacionistas,

como bacias de contenção e terraços agrícolas, acaba por contribuir com a dinâmica

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erosiva, sobretudo quando associadas a usos intensivos, com poucas áreas

apresentando cobertura superficial do tipo florestal.

Considerações finais

Os resultados demonstram que as técnicas conservacionistas surtem efeito

apenas quando acompanhadas de mudanças no uso da terra, quando de coberturas

que ofertam maior proteção ao solo e/ou correção constante dos terraços agrícolas.

Em outras circunstâncias, com as vertentes desgastadas pelo superpastoreio, as

técnicas adotadas proporcionam maior infiltração de água e abastecem a voçoroca,

dinamizando os processos erosivos nas vertentes. Constatou-se que, embora os

barramentos tenham promovido a estabilização aparente da voçorocamento, há uma

dinâmica intensa nos demais processos erosivos, sobretudo das ravinas que surgem

na baixa vertente, na borda da voçoroca.

Como limitação do uso do Coeficiente de Correlação de Pearson (p),

compreende-se a atenção dada a análise dos resultados junto aos produtos

cartografados, no intuito de interpretar, sobretudo, as variáveis que oscilam ao longo

do período analisado, uma vez que essas oscilações alteram a correlação. Assim, em

alguns casos, faz-se necessário reaplicar o Coeficiente de Correlação de Pearson (p)

em determinados períodos, como ocorreu entre o pasto e as formas erosivas.

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