joão calvino_biografia

28
2008 João Calvino Biografia

Upload: eleazarrodrigues339

Post on 13-Dec-2015

304 views

Category:

Documents


2 download

DESCRIPTION

João Calvino_Biografia

TRANSCRIPT

Page 1: João Calvino_Biografia

2008

João CalvinoBiografia

Page 2: João Calvino_Biografia

João CalvinoOrigem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

João Calvino

João Calvino (Noyon, 10 de Julho de 1509 — Genebra, 27 de Maio de

1564) foi um teólogo cristão francês. Calvino fundou o Calvinismo, uma

forma de Protestantismo , durante a Reforma Protestante. Esta variante do

Protestantismo viria a ser bem sucedida em países como a Suíça (país de

origem), Países Baixos, África do Sul (entre os Afrikaners), Inglaterra,

Escócia e Estados Unidos da América.

Nascido na Picardia, ao norte da França, foi batizado com o nome de Jean

Cauvin. A tradução do apelido de família "Cauvin" para o latim Calvinus deu

a origem ao nome "Calvin", pelo qual se tornou conhecido.

Calvino foi inicialmente um humanista. Nunca foi ordenado sacerdote.

Depois do seu afastamento da Igreja católica, este intelectual começou a

ser visto, gradualmente, como a voz do movimento protestante, pregando

em igrejas e acabando por ser reconhecido por muitos como "padre". Vítima

das perseguições aos protestantes na França, fugiu para Genebra em 1536,

onde faleceu em 1564. Genebra tornou-se definitivamente num centro do

protestantismo Europeu e João Calvino permanece até hoje uma figura

central da história da cidade e da Suíça.

Martinho Lutero escreveu as suas 95 teses em 1517, quando Calvino tinha

oito anos de idade. Para muitos, Calvino terá sido para a língua francesa

Page 3: João Calvino_Biografia

aquilo que Lutero foi para a língua alemã - uma figura quase paternal.

Lutero era dotado de uma retórica mais direta, por vezes grosseira,

enquanto que Calvino tinha um estilo de pensamento mais refinado e

geométrico, quase de filigrana. Citando Bernard Cottret , biógrafo (francês)

de Calvino: "Quando se observa estes dois homens podia-se dizer que cada

um deles se insere já num imaginário nacional: Lutero o defensor das

liberdades germânicas, o qual se dirige com palavras arrojadas aos

senhores feudais da nação alemã; Calvino, o filósofo pré-cartesiano,

percursor da língua francesa, de uma severidade clássica, que se identifica

pela clareza do estilo".

Notas biográficas

Calvinismo

João Calvino

Bases históricas:

Cristianismo

Agostinho de Hipona

Reforma

Marcos:

A Institutio Christianæ

Religionis de Calvino

Os Cinco Solas

Cinco Pontos (TULIP)

Princípio regulador

Confissões de fé

Influências:

Teodoro de Beza

Sínodo de Dort

Page 4: João Calvino_Biografia

Teologia puritana

Karl Barth

Igrejas:

Reformadas

Presbiterianas

Congregacionais

Noyon

O avô de João Calvino trabalhava numa cantina em Point-l'Évêque, nas

proximidades de Noyon. Teve três filhos: Richard (Ricardo), que foi

serralheiro e se instalou em Paris, Jacques (Jaime ou Tiago), igualmente

serralheiro e, finalmente, Gérard (Geraldo) Cauvin, pai de João Calvino, que

foi aquele que talvez mais se destacou dos três, tendo feito carreira em

Noyon como funcionário administrativo.

Gérard Cauvin estabeleceu-se em Noyon em 1481. Foi inicialmente um

simples secretário da chancelaria. Seria, depois, advogado representante

do bispado de Nyon; mais tarde, funcionário relacionado com a cobrança de

impostos e, finalmente, o promotor (representante) do bispado, antes de

entrar em conflito com este. Faleceu em 1531 após uma disputa com o

bispado, pela qual foi excomungado. A autorização para o seu funeral seria

deveras dificultada devido a esta querela.

A mãe de Calvino, Jeanne Le Franc, de seu nome de solteira, era filha de

um dono de uma hospedaria em Cambrai, que tinha enriquecido. Jeanne

faleceu em 1515, quando João Calvino tinha apenas 6 anos de idade.

Gérard e Jeanne tiveram quatro filhos:

Charles (Carlos) - o mais velho, foi padre. Faleceu em 1536.

João Calvino.

Antoine (Antônio) - iria mais tarde viver em Genebra, junto do irmão.

François (Francisco) - morreu ainda em tenra idade.

Haveria ainda duas irmãs, que nasceram do segundo casamento de Gérard.

Uma chamou-se Marie (Maria) e iria também viver em Genebra. Da outra

irmã sabe-se pouco.

Page 5: João Calvino_Biografia

João Calvino nasce a 10 de julho de 1509, nos últimos anos do reinado de

Luís XII. Frequentou inicialmente o "Collège des Capettes" em Nyon, onde

adquiriu conhecimentos básicos de latim.

Em 1 de Janeiro de 1515 o rei Francisco I de França (François, roi des

françois), sucedeu a Luís XII. Inicialmente moderado em matéria de religião,

a postura deste rei foi endurecendo ao longo do seu reinado, terminando na

perseguição declarada dos protestantes.

Pela Concordata de Bolonha, assinada no início do seu reinado, o papa

Leão X concedia ao rei da França o direito a nomear os titulares dos

rendimentos da igreja. Em contrapartida, o Papa via reforçados os seus

direitos sobre a Igreja em França.

Paris

Em 1521, com doze anos, João Calvino ganhou o direito a uma "benefice",

ou seja, um rendimento anual que era concedido a elementos e familiares

da hierarquia da igreja. No seu caso, consistia numa determinada quantia

anual de cereais pagos por uma comunidade de La Gésine.

Em 1521 ou 1523 (data incerta) o pai enviou-o a Paris. Terá provavelmente

vivido inicialmente com o tio Richard, na zona de Sain-Germain-l'Auxerrois.

Calvino começa por frequentar o Collège de la Marche, onde foi aluno de

Maturin Cordier, um grande pedagogo do tempo. Estabeleceu, aí, amizade

com as crianças da família d'Hangest, do bispo de Noyon, que se assumia,

de certa forma, como protector dos Cauvins. Os seus amigos eram Joachin

(Joaquim), Yves (Ivo) e Claude (Cláudio), a quem mais tarde dedicaria o seu

comentário a "De Clementia" de Séneca, um autor conhecido pelo seu

estoicismo.

Foi, de seguida, admitido no Collège Montaigu, uma escola de má

reputação, conhecida pela sua rigidez, pelas sovas e má comida. A lista de

professores em Montaigu, nesta época, incluía o espanhol Antonio Coronel

e o escocês John Mair (que foi professor de Inácio de Loyola), mas não há

provas definitivas de que eles tenham sido professores de Calvino.

Em fevereiro de 1525, o rei Francisco I foi encarcerado temporariamente em

Pavia pelas tropas do imperador Carlos V. Com a intervenção do papa

Clemente VII a favor de Francisco, a influência papal junto do rei de França

aumenta consideravelmente. Numa bula de 17 de Maio de 1525 dirige-se a

Francisco para que tome providências contra o crescente número de

"blasfemos" em França e contra os ataques a imagens religiosas.

Page 6: João Calvino_Biografia

Em 1 de Junho de 1528 teve lugar em Paris o caso da Rue des Roisiers.

Uma figura de madeira situada nessa rua (uma madona) foi decapitada por

desconhecidos. O rei reage de forma veemente, organizando procissões,

que passaram a ser repetidas anualmente. O incidente ainda era lembrado

no século XIX.

Orleães

Em 1529, pouco antes de atingir os vinte anos de idade, a vida de Calvino

sofreu uma súbita viragem. Vindo inicialmente para Paris com uma renda

anual concedida pela Igreja, com o fim de estudar Teologia, ficará a saber

que o pai mudou de planos em relação ao seu futuro e quer que ele siga

Direito. A "ciência das leis torna normalmente ricos aqueles que se debatem

com ela", referia o seu pai (ele próprio um advogado do bispado), segundo

as próprias palavras de Calvino. Cumpriu a vontade do pai e foi estudar

Direito para Orleães, mas nunca deixou de preferir a teologia. Como disse

mais tarde: "Se Deus me deu forças para que eu cumprisse a vontade de

meu pai, determinou ele pela providência oculta que eu tomasse finalmente

um outro caminho" (o da Teologia). Inicialmente Calvino preparava-se para

ser padre, enveredaria pelo estudo do direito, mas Deus trouxe-o de novo

ao caminho da Teologia.

O biógrafo francês de Calvino, Bernard Cottret, escreve: "Direito e leis:

Calvino, o teólogo, é no fim, também, Calvino, o jurista. O seu pensamento

fica marcado pela austeridade, a adstringência e a geometria da lei, pelo

seu fascínio ou aspiração a ela. No início do século XVI assiste-se no

Direito a uma verdadeira revolução. A retórica de Cícero toma a primazia

sobre a filosofia medieval, que se sustenta nos seus silogismos. Com a

interpretação de textos jurídicos, Calvino toma contacto pela primeira vez

com a Filologia humanista". O humanismo e o renascimento são, pois, os

movimentos culturais que o vão influenciar em primeiro lugar.

Em Orleães, Calvino foi influenciado pelo seu professor Pierre de l'Estoile.

Em 1529, dirige-se também a Bourges, para assistir a aulas do famoso

professor de direito italiano Andrea Alciati, onde também assiste a aulas do

alemão Gräzist Wolmar, que o entusiasmou pela literatura grega da

antiguidade.

Em 1529, Louis de Berquin foi queimado vivo em Paris, numa altura em que

o rei, Francisco, estava fora da cidade.

Page 7: João Calvino_Biografia

Em 1531, Calvino, num prefácio ao livro de um amigo, toma partido pelo seu

professor Pierre de l'Estoile num texto que explora a disputa entre este e

Andrea Alciati, talvez por lealdade e nacionalismo. O que prova que o

Calvino de 1531 ainda não é um reformador mas, acima de tudo, um

humanista. Neste mesmo ano morre o pai, Gerard Cauvin. Calvino vai a

Bourges, a Orleães e regressa de novo a Paris, onde se instala em Chaillot.

O humanista Erasmo de Roterdão também se interessou pela obra de Séneca

Em 1532, foi doutorado em Direito em Orleães. O seu primeiro trabalho

publicado foi um comentário sobre o texto do filósofo romano Séneca "De

Clementia". Calvino cobre os custos da publicação do livro com dinheiro do

seu próprio bolso. Aos 23 anos era já um famoso humanista, seguindo os

passos de Erasmo de Roterdão, que também escreveu sobre Séneca

nestes anos. Em "De Clementia" não há da parte de Calvino uma alusão

explicitamente religiosa. É antes uma obra que reflecte o estoicismo de

Séneca e a predestinação no sentido estóico. Séneca escrevera o texto

como forma de apelar Nero à moderação e à razão.

Até 1532 não há, como se viu, qualquer indício de que Calvino tenha

aderido à nova fé - nos seus diferentes focos e graus que surgem pela

Europa - onde o Luteranismo surge como um movimento mais moderado e

os anabaptistas como uma força mais radical.

A conversão de Calvino ao protestantismo permanece envolta em mistério.

Sabe-se apenas que ela se deu entre 1532 e 1533 (Calvino tem 23 ou 24

anos). Um texto escrito por Calvino em 1557 como prefácio ao seu

comentário sobre os salmos oferece-nos alguns parcos pormenores:

"Após tomar conhecimento da verdadeira fé e de lhe ter tomado o

gosto, apossou-se de mim um tal zelo e vontade de avançar mais

profundamente, de tal modo que apesar de eu não ter prescindido

Page 8: João Calvino_Biografia

dos outros estudos, passei a ocupar-me menos com eles. Fiquei

estupefacto, quando antes mesmo do fim do ano, todos aqueles que

desejavam conhecer a verdadeira fé me procuravam e queriam

aprender comigo - eu, que ainda estava apenas no início! Pela minha

parte, por natureza algo tímido, sempre preferi o sossego e

permanecer discreto, de modo que comecei a procurar um pequeno

refúgio que me permitisse recolher dos Homens. Mas, pelo contrário,

todos os meus refúgios se tornavam em escolas públicas. Em

resumo, apesar de eu sempre ter pretendido viver incógnito, Deus

guiou-me por tais caminhos, onde não encontrei sossego, até que ele

me puxou para a luz forte, contrariando o meu carácter, e como se

costuma dizer, me colocou em jogo. E, na verdade, deixei a França e

dirigi-me para a Alemanha para que ali pudesse viver em local

desconhecido, incógnito, como sempre tinha desejado."

Note-se que a França e Alemanha não existiam no sentido de hoje mas

sim em termos de zonas de língua francófona ou alemã.

Entretanto, o papa Clemente VII pressionava o rei de França a reprimir

os protestantes franceses. Em bulas de 30 de Agosto de 1533 e de 10

de Novembro do mesmo ano, o papa exortava à "aniquilação da heresia

Luterana e de outras seitas que ganham influência neste reino". Os dois

encontram-se, então, nesse mesmo ano, em Marselha, onde discutem

entre outras coisas a "guerra contra os turcos, lá fora, e a repressão das

heresias cá dentro".

O discurso de Nicolas Cop

A 1 de Novembro de 1533, o novo reitor da Universidade de Paris, o

humanista Nicolas Cop, proferiu um discurso de abertura do ano lectivo

na Igreja dos Franciscanos, em Paris, frente aos mais altos

representantes das 4 faculdades: Teologia, Direito, Medicina e Artes. O

seu discurso fazia eco de temas facilmente associados à nova teologia

da reforma. Nesse discurso, Nicolas fez, particularmente, o paralelismo

entre a perseguição aos primeiros cristãos e a que ocorria agora, século

XVI, na França, e que visava os cristãos protestantes. Argumentava:

Não eram também chamados de heréticos os primeiros seguidores do

cristianismo? O resultado foi a perseguição do próprio Nicolas Cop, que

teve de se refugiar em Basileia.

Simultaneamente, João Calvino fugia também de Paris. O seu quarto

no Collège de Fortet é revistado, e seus papéis e correspondência são

Page 9: João Calvino_Biografia

confiscados. Calvino encontra refúgio em Angoulême, em casa do seu

amigo Du Tillet.

Não foi até hoje esclarecido completamente o que se passou.

Encontrou-se, contudo, em Genebra, um fragmento do discurso de

Nicolas Cop, escrito pela mão de Calvino. O documento original

completo encontra-se em Estrasburgo. Foi levantada a tese de que

Calvino poderia, pelo menos, ter participado na elaboração do discurso.

Calvino permanece em Angoulême até Abril de 1534, altura em que se

dirige a Nérac, onde se encontra com Lefèvre d'Étaples. Regressa

depois a Noyon, onde em Maio de 1534 renuncia às suas "benefices".

Volta, então, a Paris e a Orleães.

A Psychopannychia

Em 1534, Calvino escreve o seu segundo livro, que será também o

primeiro sobre religião. Chamar-se-á "Psychopannychia", palavra que

deriva do grego e que significa: "O sono da alma". É um livro

relativamente pouco conhecido, em comparação com as outras obras

de Calvino. Calvino faz uma crítica severa aos anabaptistas, que acusa

de serem uma seita tresmalhada. O livro coloca questões teológicas,

mais do que oferecer respostas. Calvino, nos seus 24 anos de idade,

está em processo de busca. Defende nessa obra a imortalidade da

alma. O título completo era: "Psychopannychia - tratado pelo qual se

prova que as almas permanecem vigilantes e vivas uma vez que

tenham deixado os corpos, o que contraria o erro de alguns ignorantes

que sustentam que elas dormem até ao último momento" - o que é,

também, um ataque aos anabaptistas. Apesar de escrito em 1534, o

livro seria apenas publicado em 1542.

O caso dos cartazes de 1534

Em 18 de Outubro de 1534, a história do protestantismo francês vive

um dos seus momentos fulcrais, com o caso dos cartazes. Cartazes de

37 por 25 centímetros que criticam a celebração da missa tal como ela

é feita oficialmente pela Igreja católica são afixados em vários locais. É

particularmente atacada a repetição sacrificial da morte de Cristo,

simbólica, no altar. Se o sacrifício já foi consumado, por que se

apoderam os sacerdotes católicos deste ritual simbólico? Os

argumentos teológicos dos protestantes fundamentam-se na Epístola

de São Paulo aos Hebreus. A propaganda protestante pretende

Page 10: João Calvino_Biografia

transmitir a ideia de que a eucaristia segundo a concepção católica é

uma blasfémia, uma vez que a morte de Cristo não se deixa repetir.

Esta demanda foi o resultado da acção de Antoine Marcourt, Pastor de

Neuchâtel, também ele um natural da Picardia. A situação tornou-se

particularmente crítica e descambou numa reacção brutal por parte da

Igreja católica e do estado francês.

Protestantes franceses seriam encarcerados e assassinados. Em

Janeiro de 1535, o rei Francisco I organiza uma procissão macabra

pelas ruas de Paris. A procissão pára em 6 locais distintos. Em cada

uma das paragens há um pódio onde o rei, os embaixadores e dignos

membros do "parlement" se instalam para assistir à morte pela fogueira

de 6 "heréticos" envolvidos no caso dos cartazes do ano anterior.

Basileia

Emblema da cidade de Basiléia

Em Janeiro de 1535, Calvino dirige-se a (ou foge para ?) Basileia,

cidade onde vive até Março de 1536. Uma cidade conhecida por ter

sido o lar de Erasmo de Roterdão e do reformador Johannes

Oekolampad, falecido em 1531, sendo o seu seguidor Oswald

Mykonius.

A tradução da bíblia de Olivétan

Em 1535 é publicada a primeira bíblia traduzida por um protestante, em

francês. Tratava-se de uma tradução directa do Hebraico (o antigo

testamento) e do Grego (o novo testamento) - línguas originais das

escrituras - e não das versões então em uso, em latim. Algo totalmente

natural no século do humanismo e de Erasmo de Roterdão. O autor é

Olivétan, aliás Pierre Robert (1506-1538), primo de João Calvino e

proveniente também de Noyon. Foi publicada em Neuchâtel por Pierre

de Vingle.

Page 11: João Calvino_Biografia

Apesar de Pierre Robert ter demonstrado um bom conhecimento de

Hebraico e Grego, o seu estilo de escrita foi considerado de difícil

compreensão, além de uma certa falta de fluidez discursiva. O texto

seria revisto (com a colaboração de Calvino) e publicado novamente em

1546.

O Édito de Coucy

Em 16 de Julho de 1535, o rei Francisco I faz publicar o Édito de Coucy,

uma medida de contemporização para com os protestantes e que

corresponde também a uma nova guerra de Francisco I contra Carlos V

(Guerra de 1535-1538). Necessitando do apoio dos protestantes

alemães para o esforço de guerra e não convinha, necessariamente,

perseguir os "Luteranos" em França. É prometido que se deixarão os

protestantes em paz desde que vivam como "bons cristão" e renunciem

à sua fé. Mas, em Dezembro de 1538, o Édito de Coucy é suspenso e

as perseguições aos protestantes retomam a intensidade anterior.

Institutio religionis Christianae

Em Março de 1536 é publicada em Basileia a primeira edição de

"Institutio religionis Christianae". No prefácio menciona a sua estadia

em Basileia, "enquanto na França são queimados na fogueira crentes e

pessoas santas". Fala de santos mártires. Dirige-se no livro ao Rei

Francisco I, que procura convencer das boas intenções da Reforma. Ao

mesmo tempo, a sua teologia começa a adquirir contornos mais

marcados e mais autónomos em relação ao Luteranismo. Uma

tendência que se fortalecerá no futuro. Critica a vida dos mosteiros, que

compara a bordéis. Calvino pretende não só a reforma da Igreja mas de

todos os indivíduos. A institutio é "a organização da sociedade daqueles

que acreditam em Jesus Cristo".

Em Março de 1536, Calvino viaja até Ferrara na companhia de Louis Du

Tillet. Calvino esperava um acolhimento aberto às ideias protestantes

na sua estadia em Ferrara. Enganava-se. Teria de interromper a visita

logo em Abril. Foi então até Paris. Mas Calvino não tem futuro em

França. Numa carta ao amigo Nicolas Duchemin, compara a sua

situação com a dos judeus no Egipto. A França era o seu Egipto.

Queixa-se na mesma carta dos rituais da missa, considerando-os

idólatras. Calvino sai definitivamente da França em 1536, procurando

terras politicamente independentes da França e de espíritos mais

Page 12: João Calvino_Biografia

abertos para a reforma. Dirige-se, então, para cidades dos territórios

que hoje constituem a Suíça.

A reforma em Genebra

Genebra é nesta altura já uma cidade de espíritos progressivos e

abertos para a reforma protestante. Politicamente, a cidade está desde

1285 sob vassalagem aos condes de Sabóia ou à casa episcopal (ao

bispo de Genebra), quase sempre ocupada por um bispo também da

casa de Sabóia desde que o papa Félix V (Amadeu VIII de Sabóia) se

autonomeou bispo da cidade. Na prática, no entanto, Genebra é quase

uma cidade-estado, uma república que desde cedo se emancipou na

conquista da sua liberdade municipal. Em 1522 inicia-se um conflito

entre os pejorativamente chamados "mamelucos", que são

conservadores e partidários da casa de Sabóia e os "confederados"

(alemão: Eidgenossen; francês: Eidguenot) de onde possivelmente se

formará a palavra Huguenotes (francês: huguenot). Estes últimos

opõem-se a Sabóia. Em 1524, Karl III, Duque de Sabóia, tinha ocupado

militarmente Genebra. Porém, em 1526, Genebra decide-se pela união

com Berna e Friburgo, iniciando-se no caminho helvético. A reforma

protestante não terá tido um papel determinante neste processo,

segundo Bernard Cottret. Mas a partir daqui começam a reunir-se em

Genebra elementos da Reforma. Em 1533 há o primeiro culto

protestante de que há conhecimento nesta cidade. São então cunhadas

moedas com a inscrição: "Post tenebras lux" (após a escuridão, a luz).

O ano de 1536 marca uma viragem na cidade de Genebra. Neste ano,

a reforma é adoptada oficialmente pela cidade. Os cléricos da igreja

católica são intimados a deixar de celebrar a missa como o faziam, com

o cerimonial papista e seus abusos (idolatria, aos olhos dos

protestantes) e a juntarem-se aos protestantes. Num novo fôlego de

zelo religioso, as raparigas são obrigadas a usar o véu, cobrindo os

seus cabelos. Já desde 1532 que se registavam ataques e destruições

de imagens religiosas, estátuas, figuras, etc. A adoração destas figuras

era vista pelos protestantes como idolatria. Há um episódio carismático

deste fenómeno: num destes ataques à "idolatria papista", uma

multidão apodera-se de cerca de 50 hóstias de um padre, dando-as a

comer a cão. "Se as hóstias pertencem mesmo ao corpo de Deus, não

se irão deixar comer por um cão!" - é argumentado. Em Junho de 1536,

são abolidos em Genebra, por decisão de um conselho, todos os

Page 13: João Calvino_Biografia

feriados, excepto os domingos. Todas estas transformações deram-se

sem a influência de Calvino. Aliás, ainda nem sequer aí tinha chegado.

Chegada de Calvino a Genebra

Genebra nos dias de hoje, uma das cidades mais ricas do mundo

1536 é também o ano da chegada de Calvino a Genebra. Calvino tem

nessa altura 26 anos.

Após a estadia em Ferrara, na Primavera de 1536, Calvino tinha estado

em Paris, aproveitando-se de um período de relativa calma na

perseguição aos protestantes. Tratou de assuntos pessoais e da

família. Em junho faz em Paris uma procuração em nome do seu irmão.

Em Julho de 1536, João Calvino, pretendendo dirigir-se a Estrasburgo,

inicia a viagem, juntamente com o irmão Antoine e a irmã Marie. Em

vez de tomar o caminho mais curto, Calvino faz um desvio pelo sul,

evitando a área onde a guerra entre as forças de Francisco I e Carlos V

são uma ameaça. Por coincidência, Calvino chega a Genebra, onde

permaneceu, apesar de ter inicialmente pretendido continuar viagem, o

que foi vivamente desaconselhado pelo reformador Guillaume Farel (na

altura de 47 anos de idade). O caminho para Estrasburgo encontrava-

se inseguro por causa da guerra. A Genebra que Calvino encontra vive

ainda a agitação dos conflitos entre Mamelucos e Confederados.

João Calvino já tinha viajado até Estrasburgo durante as guerras

otomanas, e passado através dos cantões da Suíça. Aquando da sua

estadia em Genebra, Guillaume Farel pediu ajuda a Calvino na sua

causa pela igreja. Calvino escreveu sobre este pedido: "senti como se

Deus no céu tivesse colocado a sua poderosa mão sobre mim para

barrar-me o caminho"". 18 meses depois, as mudanças de Calvino e

Farel levariam à expulsão de ambos.

A disputa teológica de Lausanne

Entre 1 e 8 de Outubro de 1536, tem lugar na Catedral de Notre-Dame

em Lausanne uma disputa teológica entre protestantes e católicos, na

Page 14: João Calvino_Biografia

qual Calvino e Farel vão participar. Este tipo de conferências de disputa

tem por modelo os debates que Ulrico Zuínglio tinha organizado em

Zurique (1523) e Berna (1528). Do lado católico encontra-se Pierre

Caroli, que iria acusar, em Berna, Calvino e Farel de heresia. Calvino é

também acusado por Caroli de arianismo.

A saída atribulada de Genebra

A 16 de Janeiro de 1537, as autoridades da cidade de Genebra

aprovam o documento escrito pelo líder protestante Farell, que se

destina a servir de confissão de fé e orientação para todos os

habitantes de Genebra. Calvino faz também algumas sugestões, parte

das quais são rejeitadas. Cerca de vinte artigos dispõem, entre outras

coisas, que os idolatras, querulantes, assassinos, ladrões, bêbados

(entre outros) sejam futuramente excomungados. As lojas devem fechar

ao domingo, assim que soem os sinos da missa.

Estas disposições, apesar de aceites pelas autoridades vão criar atritos

com Farell e Calvino. O estigma da excomunhão é extremamente

discriminador e destruidor de relações sociais no século XVI.

Em Março, os líderes anabaptistas de origem holandesa Hermann de

Gerbihan e Benoît d'Anglen são expulsos de Genebra, juntamente com

os seus seguidores.

Em Abril de 1537, por sugestão de Calvino, é constituido um "syndic"

(síndico) que tem por objectivo ir de casa em casa e inquirir sobre a

confissão dos moradores. A acção é contestada. Alguns moradores

recusam-se a pronunciar-se sobre a sua fé.

Em junho de 1537 as autoridades de Genebra decidem que o Domingo

é o único dia feriado. Futuramente nenhum outro feriado será

considerado. 30 de Outubro é definido como o prazo para todos os

moradores de Genebra se pronunciarem quanto à sua religião. Aqueles

que não reconhecem os decretos de Farell são obrigados a deixar a

cidade em 12 de Novembro. Após esta data, a situação complica-se

para Farell e Calvino. Particularmente provocante é o facto de um

estrangeiro (francês), como Calvino, decidir sobre a excomunhão e

expulsão de habitantes naturais de Genebra. As autoridades, perante

estes protestos, passam a ser mais críticas para com os líderes

protestantes.

Page 15: João Calvino_Biografia

A 3 de Fevereiro de 1538 são eleitos para as autoridades da cidade de

Genebra 4 pessoas que são inimigos de Calvino e dos protestantes. Em

Março, estas novas autoridades proíbem Calvino e Farell de se

pronunciarem sobre assuntos não religiosos.

Calvino e Farell negam-se a celebrar a comunhão de acordo com a

tradição de Berna. São proibidos de celebrar os serviços religiosos. No

entanto, no Domingo seguinte, 21 de Abril de 1538, Farell e Calvino

celebram o culto de Ceia como habitualmente, Farell na Igreja de Saint-

Gervais e Calvino na de Saint-Pierre. As autoridades dar-lhes-ão três

dias para saírem da cidade.

Estrasburgo

Em 1538, Farell irá refugiar-se em Neuchâtel. Calvino dirige-se a

Estrasburgo, após ter inicialmente pretendido ir para Basileia.

Estrasburgo era na altura parte da zona de língua alemã, mas a

proximidade da fronteira com a França significava que ali se tinha

desenvolvido uma comunidade de exilados franceses. Tal como em

Genebra Farell reconhecera o potencial de Calvino, em Estrasburgo

Martin Bucer será o protector de Calvino. Durante três anos Calvino

dirigiu em Estrasburgo uma igreja de protestantes franceses, a convite

de Bucer. Segundo o biógrafo Courvoisier, Estrasburgo é a cidade onde

Calvino se torna verdadeiramente Calvino. O seu sistema de

pensamento é aqui consubstanciado em algo de mais marcadamente

original. A sua obra Institutio é aqui re-editada (1539). É agora três

vezes maior do que a primeira edição.

Em Outubro de 1539, Pierre Caroli chega a Estrasburgo, onde

permanece pouco tempo. Caroli e Calvino, inimigos desde há anos, têm

uma disputa. Caroli está agora algures entre o catolicismo e o

protestantismo. Ele acusa Calvino de o ter confundido na sua fé.

Calvino sofre uma crise nervosa.

Neste Outono de 1539, Calvino escreve também um comentário à carta

de Paulo aos Romanos. Este tema é particularemente querido do

protestantismo, porque ali se encontra a justificação através da fé como

a base de sustentação do movimento protestante, pois somente a fé

salva e justifica. A igreja é por este prisma mais uma comunidade de

crentes do que um enquadramento jurídico. Os sacramentos só

recebem o seu sentido através da fé. Sem fé não têm qualquer efeito.

Page 16: João Calvino_Biografia

Já Lutero tinha destacado a carta de Paulo aos romanos como o cerne

do Novo Testamento e o mais alto do evangelho.

Matrimônio

Em Estrasburgo, Calvino casa-se em Agosto de 1540 com a viúva

Idelette de Bure, que tinha sido previamente adepta do anabaptismo.

Traz duas crianças do seu prévio casamento. Calvino tem 31 anos de

idade. A cerimónia do casamento foi dirigida por Guillaume Farel. Em

1541 a peste negra (ou peste bubónica) recrudesce em Estrasburgo.

Idelette e as duas crianças procuram abrigo em casa de um irmão dela,

nas redondezas.

Regresso a Genebra

Após a expulsão de Calvino, Genebra tinha adoptado os ritos de Berna.

O natal, ascensão de Cristo e outras festividades cristãs voltaram a ser

praticadas. Mas os católicos e os anabaptistas continuavam a ser

perseguidos e "convidados" a deixar a cidade. A 18 de Março de 1539 o

jogo tinha sido proibido em Genebra. Pedintes e vagabundos eram

expulsos da cidade. A ausência de Calvino não tinha significado

qualquer laxismo na moral estrita imposta na cidade.

As relações de Genebra com Berna permanecem tensas. Entretanto, os

líderes que se opunham a Calvino (os chamados "artichoques")

começam a perder influência. São acusados de simpatia por Berna.

Jean Philip (João Filipe), um de seus líderes, é torturado e decapitado

em 1540. Os oponentes, favoráveis a Calvino, chamados de

"guillermins" ganham o poder.

Calvino foi convidado em Outubro de 1540 a regressar a Genebra, para

reaver o seu posto na igreja, tal como o tivera antes da expulsão. A 13

de Setembro de 1541 Calvino chegou, pela segunda vez, a Genebra,

mas, desta vez, definitivamente. Começou, então, a organizar e

estruturar, de acordo com as linhas bíblicas, os ministérios e a acção

dos professores e diáconos.

Zelo religioso radical

São ainda de 1541 as propostas de Calvino, no sentido da

reorganização da igreja. As "Ordonnances de 1541" dispõem a

formação de quatro corpos:

Pasteurs (pastores, que pregam)

Page 17: João Calvino_Biografia

Docteurs (ensinam)

Anciens (os mais velhos, que chamam à ordem aqueles que

prevaricam)

Diacres (diáconos, que ocupam-se dos pobres e doentes) - mendigar

é estritamente proibido

É decidida também a criação de um consistório - composto de

elementos da igreja e de laicos - que se reúne regularmente para julgar

os comportamentos individuais, como um tribunal, "de acordo com a

palavra de Deus", sendo a excomunhão de pessoas a mais grave

sentença que pode decidir.

A eucaristia só é praticada quatro vezes por ano.

Em 1542, Calvino publica em Genebra o seu livro de catecismo:

"Catéchisme de l'Église de Genève, c'est-a-dire, le formulaire d'instruire

les enfants en la chrétienté". A chave do projecto de Calvino passa pela

pedagogia. O seu objectivo é a profunda transformação das

mentalidades. Cada resquício de superstição, de práticas de magia, ou

de catolicismo é perseguido como idolatria.

O consistório, do qual Calvino fazia parte, ocupava-se desses e de

outros casos. Refiram-se alguns:

Em 1542, uma mulher chamada Jeanne Petreman é acusada de se

recusar a participar da eucaristia, de dizer o pai-nosso em língua

"romana" e de proclamar que a Virgem Maria era a sua defensora.

Diz também que se nega a acreditar noutra fé que não a sua. É

excomungada.

Em 2 de Setembro de 1546, aparece em Genebra um franciscano

que pedia na rua um jantar em nome de Deus e da Virgem Maria.

Devemos pressupor que ele obteve o seu jantar mas foi também

levado ao consistório, que logo constatou que o "papista" mal

conhecia a bíblia, além de ser inofensivo. Foi expulso da cidade,

para o lado da fronteira, com os católicos.

A 23 de Junho de 1547 comparecem perante o consistório várias

mulheres que tinham sido apanhadas a dançar - uma delas era a

esposa de um dos membros do consistório. O caso ganhou

contornos de escândalo. As mulheres foram condenadas a alguns

dias de prisão, apesar de vários apelos. Em reacção à decisão, são

colocados na cidade cartazes contra Calvino. O autor dos cartazes,

Page 18: João Calvino_Biografia

Jacques Gruet, é torturado. Depois de confessar a sua autoria, é

executado.

Em 1548, Louis Le Barbier é interrogado sobre a sua fé. Declara que

não tem fé. Entretanto, descobrem livros de bruxaria e de escórnio

na sua posse. É admoestado perante o consistório mas não será

perseguido.

Os nomes de baptismo são regulamentados. Devem ser nomes que

figuram na Bíblia. Um decreto de 22 de Novembro de 1546 dispõe que

certos nomes são proibidos, entre os quais:

Suaire, Claude, Mama (lembram a idolatria)

Baptistes, Juge, Evangéliste

Dieu le Fils, Espoir, Emmanuel, Sauveur, Jésus (destinados apenas a

nosso senhor)

Sépulcre, Croix, Noël, Pâques, Chrétien (nomes estúpidos ou

absurdos)

O luxo e a pompa são desprezados. Em setembro de 1558, Nicolas des

Gallars, um amigo de Calvino, inicia uma grande campanha na cidade

em desprezo do supérfluo, as modas entre as mulheres e as más

leituras. São queimados vários exemplares do livro "Amadis de Gaula",

na posse de um comerciante. O zelo religioso tomava a forma de

censura moral.

Peste Negra em Genebra

Em 1542, há um surto de peste negra em Genebra. A peste negra

permanecia então um fenómeno incompreensível - para lidar com a

epidemia, era normal que se multiplicassem os casos de feitiçaria e de

rituais contra a peste. Este tipo de práticas já era conhecido em

Genebra antes da reforma e, tal como antes, os protestantes replicam

com a perseguição, tortura e morte dos suspeitos. Aquelas que são

identificadas como bruxas são queimadas vivas, enquanto se propaga a

ideia de que estas desgraças são um castigo de Deus.

Em 1542, o filho de Calvino, Jacques, morre pouco depois de nascer

em 28 de Julho.

Crescimento demográfico

A partir de 1542 e sobretudo na década de 1550, a cidade de Genebra

vai conhecer um grande crescimento demográfico, com a chegada de

Page 19: João Calvino_Biografia

refugiados franceses, protestantes perseguidos em França.

Consequentemente, há uma fase de expansão económica (relojoaria,

tecelagem...) e a língua francesa começa a ter preponderância sobre o

dialecto franco-provençal da região.

Mas é também uma época marcada pelo crescimento de sentimentos

xenófobos, em parte devidos a ressentimentos contra Calvino:

Em Janeiro de 1546 é preso Pierre Ameaux, que tinha injuriado

publicamente Calvino, ao referir-se a este como um "picard",

pregador de uma falsa fé.

Um outro senhor Ameaux é preso mais tarde por razões

semelhantes. Este senhor tinha boas razões para não gostar do

extremo zelo religioso imposto por Calvino, já que era fabricante de

cartas de jogo. Foi condenado a percorrer a cidade de uma ponta à

outra, descalço, em camisa, com uma vela na mão.

A 23 de Setembro de 1547, François Favre comparece em tribunal

por ter afirmado que Calvino se auto-nomeara bispo de Genebra e

que os franceses tinham escravizado a sua cidade natal.

Mais tarde, em 1548, um senhor chamado Nicole Bromet declara que

os franceses deveriam ser todos colocados num barco e enviados

pelo rio Reno abaixo.

Em 1547, Henrique II de França sucede a Francisco I. Henrique será

um rei menos reconhecido, em comparação com Francisco. É

caracterizado como menos carismático, menos entusiasta pelas artes e

ciências, mais introvertido e frio.

Em 29 de Março de 1549 morre Idellete Calvino, após doença. Calvino

não voltará a casar. Dedica-se ainda mais decididamente ao trabalho.

Em 1550 a repressão dos huguenotes em França cresce. É

estabelecida a chambre ardente. A censura é fortalecida.

O caso Miguel Servet

Miguel Servet era um homem de cultura, um médico, interessado, entre

muitas outras coisas, na religião. Como livre pensador, defendia que o

dogma da Trindade não fazia qualquer sentido, sendo apenas um

sofisma inventado no Primeiro Concílio de Niceia. Será perseguido pela

Igreja Católica em França, através da Inquisição, por causa das suas

teses. Escapa e dirige-se a Genebra, mas os protestantes mostraram-

se não menos intolerantes para com as suas ideias.

Page 20: João Calvino_Biografia

A história da ligação entre Servet e Calvino começa já em 1534, ano em

que ambos estiveram em Paris. Esteve nessa altura planeado um

encontro que não chegou a realizar-se. No entanto, trocariam

correpondência por vários anos.

O debate foi tornando-se numa azeda discussão. Um dos pontos

principais da discussão epistolar continuava a ser a Santíssima

Trindade. Perante a sua proposta para que Calvino lesse o manuscrito

do seu Livro "Restitutio" (tendo-o enviado pelo correio), Calvino diz-lhe

que deveria ler o seu "Institutio". Servet fê-lo e escreveu comentários

críticos nas margens do texto que foram depois enviados a Calvino.

Calvino recebeu o manuscrito mas não lhe respondeu. Nem sequer

devolveu o manuscrito do Restitutio, que Servet lhe pedia que

remetesse. Calvino manteve o seu silêncio, cultivando preocupação em

relação a Servet e às suas heresias. Teria, mais tarde, a sua

oportunidade de se vingar.

No princípio de Abril de 1553 a Inquisição francesa recebeu

misteriosamente a posse de documentos que compromentiam Servet.

Entre eles, as cartas de Servet a Calvino. Ainda em 5 de Abril, Servet é

ouvido pelos inquisidores. A 7 de Abril, porém, consegue escapar-se da

prisão. Dirigiu-se a Genebra, talvez por pensar que entre os

protestantes estaria a salvo da Inquisição. Enganou-se. Foi preso pelas

autoridades da cidade de Genebra a 13 de Agosto.

O seu julgamento tornou-se um caso discutido. Foi pedida a opinião a

padres de Berna, Zurique e outras cidades. A maioria desprezava

Servet - a trindade era, na sua opinião, indiscutível.

Calvino, também acusado pelos católicos de arianismo, poderá ter visto

aqui a oportunidade de mostrar que defendia o conceito trinitário, ao

mesmo tempo que mostraria que também estava empenhado em

perseguir os heréticos. Um herético do lado de lá da fronteira também é

um herético dentro da cidade.

A 27 de Outubro de 1553 Miguel Servet é queimado vivo em Genebra.

Relacionamento com a reforma inglesa

Por volta de 1550, Calvino escreve ao rei Eduardo VI de Inglaterra, um

protestante, encorajando-o nas suas reformas. O rei Eduardo VI fez

acolher protestantes franceses, perseguidos no país natal. Após o

Page 21: João Calvino_Biografia

reinado de Eduardo VI (1547-1553) o catolicismo regressa à Inglaterra

sob a liderança de Maria Tudor.

Novas dificuldades

Entre 1553 e 1555, em Genebra, a relação tensa entre a igreja -

particularmente o consistório, onde Calvino é uma figura de relevo - e

as autoridades seculares da cidade, eleitas entre os habitantes (ricos)

da cidade, atinge o seu auge. Discutia-se, então, a questão de saber se

o consistório teria ou não o direito de excomungar pessoas, algo que se

vinha a passar com relativa frequência. As amargas trocas de palavras

entre estes dois pólos multiplicaram-se. Por um lado, o zelo religioso

dos Calvinistas, do outro, a autoridade política da cidade. Em Janeiro

de 1555 há uma procissão noturna de pessoas em Genebra,

caminhando de vela na mão, com a pretensão de ridicularizar Calvino.

Apesar disso, e em parte por causa do peso relativo da população

protestante francesa que se tinha refugiado na cidade, as eleições dos

4 novos "Syndics" de Genebra em Fevereiro de 1555 é favorável aos

Calvinistas, que se impõem contra os "Enfants de Genève" sob a

liderança de Perrin. Após as eleições, porém, há desacatos na rua entre

as duas partes. Perrin e outros líderes da revolta são presos e serão

decapitados e esquartejados. Os pedaços dos cadáveres foram, depois,

exibidos nas ruas da cidade.

Também a doutrina da Predestinação foi muito atacada nestes anos,

principalmente por um monge carmelita chamado Hiérome Bolsec,

nascido em Paris, que se tinha estabelecido em Genebra. Argumentava

que se Deus fosse o responsável por tudo o que se passa, então,

também seria responsável pelos nossos pecados. Calvino responde

que nunca disse isso e as autoridades apoiam-no. Em Berna, os críticos

de Calvino são expulsos da cidade em 1555.

Em 1555 são erguidas as primeiras igrejas calvinistas em França,

nomeadamente em Paris, Meaux, Angers, Poitiers e Loudun. Nos três

anos seguintes surgem as comunidades de Orleães, Rouen, La

Rochelle, Toulouse, Rennes e Lyon.

A 8 de Junho de 1558, Calvino escreve a Antoine de Bourbon, o Rei de

Navarra e consorte de Jeanne d'Albret, exortando-o a seguir na sua

vida privada os mesmos valores ascéticos que os seus súbditos.

Page 22: João Calvino_Biografia

Entre 26 e 29 de Maio de 1559 realiza-se em Paris um sínodo nacional

protestante. Cerca de 30 paróquias aparecem aí representadas. O

sínodo será responsável pela elaboração de um texto de linhas

orientadoras (com a participação de Calvino na sua criação), que se

chamará Confession de La Rochelle (texto confirmado nesta cidade em

1571).

Em 1559 Calvino fundou uma escola e um hospital.

Em Abril de 1559 é assinado o pacto de paz entre a França e a

Espanha, em Cateau-Cambrésis.

Falecimento

Nos seus últimos anos de vida, a saúde de Calvino começou a vacilar.

Sofrendo de enxaquecas, hemorragia pulmonar, gota e pedras nos rins

foi, por vezes, levado carregado para o púlpito. Calvino continuava a ter

detratores declarados que lhe dirigiam ameaças constantes.

Entretanto, apreciava passar os seus tempos livres no lago de Genebra,

lendo as escrituras e bebendo vinho tinto. No final de sua vida disse a

seus amigos que estavam preocupados com o seu regime diário de

trabalho: "Qual quê? Querem que o Senhor me encontre ocioso quando

ele chegar?"

João Calvino faleceu em Genebra a 27 de Maio de 1564. Foi enterrado

numa sepultura simples e não marcada, conforme o seu próprio pedido.

Publicações de Calvino

De Clementia - Obra anotada de Séneca (1532)

Psychopannychia (1534)

Institutos da Religião Cristã

publicado em Latim: 1536

publicado em Francês: 1541

Catéchisme de l'Église de Genève (1542)

Calvino também publicou vários volumes de comentários sobre a

Bíblia

Page 23: João Calvino_Biografia

Calvinismo

As suas publicações espalharam as suas ideias de uma igreja

correctamente reformada, para muitas partes da Europa. O

calvinismo tornou-se a religião principal na Escócia (Ver: John

Knox), nos Países Baixos e em partes da Alemanha, tendo sido

influente na Hungria e na Polónia. A maioria dos colonos de certas

zonas do novo mundo, como Nova Inglaterra, eram igualmente

calvinistas, incluindo os puritanos e os colonos neerlandeses que

se estabeleceram em Nova Amsterdam (Nova Iorque). A África do

Sul foi fundada em grande parte por colonos neerlandeses

(também com franceses e portugueses) calvinistas do início de

século XVII, que ficaram conhecidos como africâners.

Em França, os calvinistas eram chamados de Huguenotes.

A Serra Leoa foi em grande parte colonizada por colonos

calvinistas da Nova Escócia. John Marrant tinha organizado a

congregação local sob o auspício da conexão Huntingdon. Os

colonos eram na sua maioria loialistas negros, afro-americanos que

tinham combatido pelos ingleses na guerra da independência

americana.