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Palavras-Chave: aeroportos, regulação, regulação tarifária. Key words: airports, regulation, tariff. Recommended Citation Abstract The economic regulation of infrastructure services stems from the need to correct the market failures that arise with the lack of competition - a characteristic of monopoly markets. This situation leads operators to provide poor service at high prices, with a quality that is wanting. Thus, the presence of regulation is essential to correct such distortions. This paper investigates the effects of different forms of price regulation in airports. The analysis takes into account the interaction between the profits of grant and price regulation. The results show that while ROR regulation may lead to excess investment in capacity, price cap regulation is prone to induce under-investment. The extent of under-investment is found to be lower under the dual till price cap than under the single till price cap. In particular, the total factor productivity is greater under the dual till price cap than under the single till price cap or the single till ROR. The analysis supports the argument made by several economists that the dual regulation till would be better than the single till in terms of economic efficiency, especially for larger and more widely used airports. Melo Filho, C. R. (2009) Formas de regulação econômica e suas implicações para a eficiência aeroportuária. Journal of Transport Literature, vol. 3, n. 1, pp. 96-110. Cícero Rodrigues de Melo Filho* Resumo A regulação econômica dos serviços de infraestruturas resulta da necessidade de correção das falhas de mercado, que surgem com a ausência de competição - situação característica de mercados monopolistas. Tal situação leva os operadores a prestar serviços ineficientes a preços elevados, com uma qualidade que deixa a desejar. Assim, a presença de regulação é fundamental para a correção de tais distorções. Este artigo investiga os efeitos das diferentes formas de regulação tarifária nos aeroportos. A análise feita leva em consideração a interação entre os lucros de concessão e a regulamentação dos preços. Os resultados obtidos mostram que enquanto a regulação ROR pode levar a excesso de investimento em capacidade, a regulação price cap está propensa a induzir sub-investimento. A extensão do sub-investimento é encontrado para ser menor sob o dual till price cap do que sob o single till price cap. Em particular, a produtividade total dos fatores é maior sob o dual till price cap do que sob o single till price cap ou o single till ROR. A análise feita apóia o argumento apresentado por vários economistas de que a regulação dual till seria melhor do que o single till em termos de eficiência econômica, especialmente para os aeroportos maiores e mais utilizados. This paper is downloadable at www.transport-literature.org/open-access. JTL|RELIT is a fully electronic, peer-reviewed, open access, international journal focused on emerging transport markets and published by BPTS - Brazilian Transport Planning Society. Website www.transport-literature.org. ISSN 2238-1031. * Email: [email protected]. Reviews & Essays Journal of Transport Literature Submitted 22 Sep 2008; received in revised form 12 Nov 2008; accepted 29 Nov 2008 Vol. 3, n. 1, pp. 96-110, Jan. 2009 Formas de regulação econômica e suas implicações para a eficiência aeroportuária [Economic regulation of airports and its consequences on efficiency] Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Brazil B T P S B T P S B T P S B T P S Brazilian Transportation Planning Society www.transport-literature.org JTL|RELIT JTL|RELIT JTL|RELIT JTL|RELIT ISSN 2238-1031

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Palavras-Chave: aeroportos, regulação, regulação tarifária.

Key words: airports, regulation, tariff.

Recommended Citation

Abstract

The economic regulation of infrastructure services stems from the need to correct the market failures that arise with the lack

of competition - a characteristic of monopoly markets. This situation leads operators to provide poor service at high prices, with

a quality that is wanting. Thus, the presence of regulation is essential to correct such distortions. This paper investigates the

effects of different forms of price regulation in airports. The analysis takes into account the interaction between the profits of

grant and price regulation. The results show that while ROR regulation may lead to excess investment in capacity, price cap

regulation is prone to induce under-investment. The extent of under-investment is found to be lower under the dual till price cap

than under the single till price cap. In particular, the total factor productivity is greater under the dual till price cap than under

the single till price cap or the single till ROR. The analysis supports the argument made by several economists that the dual

regulation till would be better than the single till in terms of economic efficiency, especially for larger and more widely used

airports.

Melo Filho, C. R. (2009) Formas de regulação econômica e suas implicações para a eficiência aeroportuária. Journal of Transport

Literature, vol. 3, n. 1, pp. 96-110.

Cícero Rodrigues de Melo Filho*

Resumo

A regulação econômica dos serviços de infraestruturas resulta da necessidade de correção das falhas de mercado, que surgem

com a ausência de competição - situação característica de mercados monopolistas. Tal situação leva os operadores a prestar

serviços ineficientes a preços elevados, com uma qualidade que deixa a desejar. Assim, a presença de regulação é fundamental

para a correção de tais distorções. Este artigo investiga os efeitos das diferentes formas de regulação tarifária nos aeroportos. A

análise feita leva em consideração a interação entre os lucros de concessão e a regulamentação dos preços. Os resultados obtidos

mostram que enquanto a regulação ROR pode levar a excesso de investimento em capacidade, a regulação price cap está

propensa a induzir sub-investimento. A extensão do sub-investimento é encontrado para ser menor sob o dual till price cap do

que sob o single till price cap. Em particular, a produtividade total dos fatores é maior sob o dual till price cap do que sob o single

till price cap ou o single till ROR. A análise feita apóia o argumento apresentado por vários economistas de que a regulação dual

till seria melhor do que o single till em termos de eficiência econômica, especialmente para os aeroportos maiores e mais

utilizados.

This paper is downloadable at www.transport-literature.org/open-access.

■ JTL|RELIT is a fully electronic, peer-reviewed, open access, international journal focused on emerging transport markets and

published by BPTS - Brazilian Transport Planning Society. Website www.transport-literature.org. ISSN 2238-1031.

* Email: [email protected].

Reviews & Essays

Journal of Transport Literature

Submitted 22 Sep 2008; received in revised form 12 Nov 2008; accepted 29 Nov 2008

Vol. 3, n. 1, pp. 96-110, Jan. 2009

Formas de regulação econômica e suas implicações para a eficiência

aeroportuária

[Economic regulation of airports and its consequences on efficiency]

Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA), Brazil

B T P SB T P SB T P SB T P S

Brazilian Transportation Planning Society

www.transport-literature.org

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ISSN 2238-1031

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1. Introdução

Um aeroporto fornece serviços de aviação para companhias aéreas e passageiros. Estes

serviços incluem facilidades de pista para pouso e decolagem de aeronaves, edifícios dos

terminais para o tráfego de passageiros, serviços técnicos na aeronave, tais como

abastecimento e manutenção, e serviços de navegação. Durante as últimas duas décadas, as

receitas de concessões de aeroportos cresceram mais rapidamente do que as receitas da

aviação, como conseqüência, as operações de concessão se tornaram significantes fontes de

receitas e lucros para muitos aeroportos importantes do mundo. Doganis (1992) relata que, em

meio a grandes aeroportos americanos, as operações de concessão contribuem com cerca de

80% na receita total do aeroporto.

Recentemente, os economistas têm repensado a regulação das tarifas aeroportuárias. Estudos

sobre as opções específicas do país e experiências incluem Forsyth (2002), Beesley (1999),

Kunz e Niemeier (2000), Starkie (2001) e Tretheway (2001).

Beesley (1999) argumenta que o price-cap é inadequado no caso de Heathrow. Tretheway

(2001) salienta que a regulação da taxa de retorno (ROR), tende a ser complexo, sem resposta,

e caro para administrar. Kunz e Niemeier (2000) argumentam que o custo baseado na

regulação da Taxa de retorno utilizado na Alemanha é ineficiente e resulta na má alocação de

recursos. Starkie (2001) conclui ainda que a regulação ex-ante para os aeroportos poderia ser

desnecessária, pois os aeroportos não são susceptíveis de abuso de poder de monopólio

devido à existência de uma complementariedade entre a demanda por serviços de aviação e da

procura de serviços de concessão.

Zhang e Zhang (1997) mostram que, no aeroporto internacional de Hong Kong, as receitas de

concessão representaram mais de dois terços das receitas totais no final de 1980 e 1990, acima

dos 50 por cento em 1979. O estudo do benchmarking feito pela (ATRS, 2002) relata que as

receitas na aviação, a maioria das quais são as receitas de concessão para aeroportos asiáticos

e europeus, foram responsáveis por 40 a 80 por cento das receitas totais dos 50 principais

aeroportos ao redor do mundo 1999.

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Com base na crescente importância das atividades de concessão de financiamento do

aeroporto, Starkie (2001) argumenta que as atividades de concessão podem causar um

aumento ainda maior nas receitas, pois um aumento no volume de tráfego no aeroporto

produz um aumento significativo em sua rentabilidade.

Portanto, um aeroporto não regulamentado, teria forte incentivo para reduzir as taxas de

utilização, a fim de aproveitar a complementariedade da demanda unidirecional a partir de

volumes de passageiros ou movimentos de aeronaves para as vendas de concessão. Isto

significa que, contanto que um aeroporto ofereça serviços de aviação e atividades de varejo, o

incentivo será estabelecer taxas de utilização do lado ar menor, e, portanto, pode não haver

necessidade de regulamentar tal serviço (Starkie, 2001). Esta é uma questão importante para

os economistas de transporte e os decisores políticos, dado que muitos aeroportos ao redor do

mundo já foram privatizados, e muitos estão em vias de ser privatizados.

De fato, alguns países estão evoluindo para uma situação em que não há regulação de preços

formal, mas apenas o controle de alguns aeroportos privatizados (Forsyth, 2002). Por

exemplo, a Nova Zelândia não impõe a regulação de preço formal dos seus aeroportos

privatizados. Na Austrália, um projeto de relatório do organismo microeconômico do

governo, recomenda que a regulação dos preços explícitos seja encerrada. (Productivity

Commission, 2001)

Após esta introdução, o segundo capítulo expõe o enquadramento da regulação do sector

aeroportuário na Europa

O presente trabalho é composto pela introdução, mais quatro seções seguida das

considerações finais. A seção 2 faz uma exposição do enquadramento da regulação

aeroportuária global. A seção 3 faz um estudo dos efeitos das diferentes formas de regulação

sobre a eficiência aeroportuária e da interação entre a regulação dos preços e das operações de

concessão. A seção 4 faz uma comparação entre a regulação por taxa de retorno (ROR) e o

price-cap. Seguido das considerações finais.

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2. Regulação aeroportuária

Segundo Marques et al (2008), o sistema regulatório está associado à propriedade do serviço

de infraestrutura. As possibilidades dos serviços aeroportuários, em termos estruturais, se

divergem entre a atividade privada especialmente regulada, concessão a empresas privadas

sob supervisão pública e a gestão pelo próprio Governo. Todas essas formas têm diferentes

interpretações, de acordo com o contexto ideológico, político e jurídico de cada país.

Tomando como exemplo o caso da Inglaterra (BAA), prevalece a primeira situação, no caso

da Grécia (Atenas) prevalece a segunda situação, ao passo, que na Espanha é a terceira opção

a predominante. O esboço institucional dos sistemas regulatórios depende, amplamente, da

referida configuração. Assim, as funções regulatórias podem ser desenvolvidas por diferentes

players, onde se incluem o próprio Governo, as entidades reguladoras com pouca

independência e as entidades reguladoras independentes.

Geralmente, quando os serviços de infraestruturas são de propriedade pública, a regulação é

assegurada diretamente pelo Governo. Neste caso, a ausência de transparência é a principal

característica do sistema regulatório (Stern e Holder, 1999), devido ao fato das funções de

estabelecimento de regras, operações e regulação serem desempenhadas pela mesma entidade.

Esta situação reflete a interferência política na regulação e, conseqüentemente, nos encargos

dos utilizadores. Quando a operação do setor se encontra sujeita a administração direta do

Estado, esta possui características de trabalhar sob uma base pouco comercial; preocupar-se

na obtenção de resultados positivos, e não em resultados que se mostram eficientes; subsidiar

apenas uma parcela dos consumidores. Este cenário tem fomentado a tendência crescente para

a criação de entidades reguladoras independentes, inclusive, quando o setor privado possui

uma presença não muito relevante.

Nos países onde a participação do setor privado é relevante, a regulação deve ser sempre

desenvolvida por entidades independentes. Este panorama fomenta a credibilidade e o

compromisso com a regulamentação e evita a ingerência arbitrária de (alguns) políticos. A

regulação independente possibilita diversos benefícios (Marques, 2005), tais como a

imparcialidade na tomada de decisões, a flexibilidade dos processos regulatórios, a

especialização e credibilidade da entidade reguladora, a responsabilização financeira e a

mediação da resolução de conflitos. Porém, a regulação independente possui algumas

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desvantagens como: a falta de prestação de contas, o elevado custo da regulação, a dificuldade

dos reguladores serem efetivamente independentes, as ambigüidades dos modelos

regulatórios, a perda de soberania e os conflitos com outros poderes.

Demsetz (1968) mostra que a regulação independente pode ser claramente substituída pela

competição para o mercado e pelos contratos de concessão e serviços. Contudo, à semelhança

do que outros autores defendem (Williamson, 1985), este argumento não é válido, uma vez

que não é possível dispor de um contrato de longo prazo, definitivo e completo que abranja

todas as contingências e que se torne invulnerável a um oportunismo posterior. Estes

contratos deverão apresentar-se extremamente sérios, porém incompletos. Portanto, regulação

contratual não é uma alternativa per si à regulação estabelecida por uma autoridade externa.

A existência de entidades reguladoras independentes é comumente defendida como não

obrigatória, devido às suas competências estarem incluídas nas funções de entidades

transversais, responsáveis pela regulação da concorrência. A regulação pode ser um resultado

do acordo entre o operador (aeroporto) e os utilizadores (companhias aéreas) supervisionados

pela autoridade da concorrência. Este processo regulatório “lighthanded”, que teve origem na

Nova Zelândia, na década de 1980, sustenta-se em três princípios fundamentais: a

reestruturação de setores com a separação dos elementos competitivos dos não competitivos;

a presença de uma entidade que garanta, integralmente os mecanismos de concorrência; e a

divulgação das principais informações de gestão do operador histórico (Allport, 2000).

Embora esta solução seja por vezes adotada, a mesma conduz a um modelo regulatório

considerado fraco e pouco abrangente.

Por sua vez, outros países defendem que a regulação ex-post é muito mais rigorosa do que

uma regulação ex-ante (realizada por uma entidade reguladora) e que esta última deve ser

desenvolvida por um tribunal (ou por um órgão regulador) quando necessário.

Este processo pode, no entanto, levantar algumas dificuldades em termos de implementação.

A auto-regulação tem sido defendida como a melhor solução. Este mecanismo conduz a

diversas vantagens, como ganhos ao nível dos recursos e a desresponsabilização política.

Contudo, apesar do seu sucesso aparente em alguns setores, ele não parece ser muito

significativo no setor aeroportuário, que tem como característica possuir um número reduzido

de players.

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Por último, em particular nos EUA, nos setores aéreo, de energia e de telecomunicações, a

desregulamentação é defendida em oposição à regulação, tendo como base o discurso de que

um ambiente de mercado livre permite maiores benefícios. No entanto, a desregulamentação

não é hipótese para a regulação econômica dos aeroportos face às suas características

monopolistas.

3. Formas de regulação de preços

Dentre as formas de regulação existentes, serão apresentadas a regulação por taxa de retorno e

a regulação por incentivos price-cap, além disso serão apresentados os modelos single-till e

dual-till, bem como suas características.

3.1 Rate of Return (ROR)

A regulação por taxa de retorno (ROR) sustenta-se na criação de uma taxa de remuneração

sobre o investimento realizado, mediante aprovação do órgão regulador. Apesar de ser

amplamente utilizada, a ROR é muito criticada, sobretudo, pelos baixos incentivos, em termos

de eficiência e inovação, que institui aos operadores. Essa forma de regulação, implica que

quando a taxa de retorno é mais elevada do que o custo do capital, o sobre-investimento torna-

se desejável, mesmo sem razões técnicas, uma vez que o operador regulado recebe uma

receita adicional por cada unidade suplementar de capital despendida (efeito de Averch e

Johnson). Do mesmo modo, também promove as práticas de gold plating, que são aquelas que

acarretam custos que não são percebidas pelo usuário como vetor de qualidade.

Os aeroportos não têm incentivos para fundarem uma estrutura eficiente de estabelecimento

de preços, tendo que manipular os resultados contabilísticos quando prestam outros serviços

não regulados. Finalmente, a ROR requer um volume de informação muito elevado,

caracterizado por custos significativos e pela possibilidade de captura do regulador.

Atualmente esse modelo é utilizado em países como Holanda, Espanha e Portugal.

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3.2 Price-cap Regulation

Ao contrário da regulação ROR, eficiência e inovação são os objetivos principais dos

operadores quando estes são regulados segundo um regime de regulação por incentivos. Com

estes métodos regulatórios, apesar de assumir riscos maiores, existe paralelamente a

possibilidade de obtenção de lucros maiores, o que revela ser muito atrativo para os

operadores. Os pioneiros da regulação por incentivos foram os Professores Littlechild e

Beesley, em 1980, no Reino Unido, quando se deu a privatização da British Telecom. Este

tipo de regulação compreende diferentes métodos, dentre eles a regulação por preços

máximos (price cap regulation).

A price cap regulation consiste na imposição de um teto máximo para a média das taxas

(preços) dos serviços prestados. Com os preços (taxas) limites definidos no início de cada

intervalo regulatório, os serviços regulados retêm os ganhos correspondentes à redução dos

custos, durante esse período. Assim, os operadores são incentivados a prestarem os seus

serviços com base em princípios de eficiência e de inovação.

No final de cada período, ocorre uma transferência dos benefícios provenientes da

minimização dos custos para os utilizadores através de uma redução das taxas no período

regulatório seguinte. Como a price cap não é desenvolvida com base em custos, esta promove

o preço adequado das estruturas.

Um problema que tem sido constantemente levantado diz respeito ao período regulatório.

Embora, em geral, esse período seja longo (de 3 a 8 anos), não há razão aparente para não

existir uma revisão intermediária, devido às pressões políticas ou de mercado, ou ambas,

geralmente frente aos lucros excessivos. Apesar da redução do risco, esta situação

desincentiva a melhoria da eficiência e da inovação e coloca a price cap em proximidade com

a ROR.

A qualidade de serviço é outra questão essencial na price cap. Um dos maiores objetivos dos

operadores é a redução dos custos para, assim, aumentar os lucros. Isto só é possível na

presença de um crescimento da produtividade ou redução da qualidade do serviço. Como não

existe, de fato, concorrência, é provável que a segunda hipótese prevaleça, caso não seja

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impedida. A price cap pode causar sub-investimento, dependendo da decisão de investimento

sobre a credibilidade do regulamento para permitir uma justa remuneração do investimento.

Por fim, vale ressaltar que, em oposição ao que primeiramente se pensava (Cabral e Riordan,

1989), este processo regulatório também leva a custos significativos, tanto para a entidade

reguladora como para os operadores regulados. Tal forma de regulação foi adotada por países

como Suécia, Áustria, Malta e Dinamarca, dentre outros.

3.3 Os modelos single till e dual till

Os serviços aeroportuários não se revelam no modelo geral de outros serviços de

infraestruturas. Se suas instalações, como pista e terminais, como regra, funcionam em regime

monopolista, e mesmo as atividades aeronáuticas, como os serviços de handling, catering e

fueling, apresentam distorções de concorrência e, conseqüentemente, são propensas a

comportamentos abusivos, as atividades não aeronáuticas desenrolam-se numa base

comercial.

Além disso, as atividades comerciais, tais como retail, catering e parques de estacionamento,

representam uma importante parcela das receitas do aeroporto. Assim, se as receitas dessas

atividades são utilizados para subsidiar as atividades aeronáuticas, estamos perante o regime

single till. De modo contrário, o esquema dual till destrincha estes dois ramos de atividade. A

maioria dos países, como o Reino Unido (desde 1987), tem tradicionalmente adotado o

subsídio cruzado (single till).

O single till é amplamente utilizado e a sua principal vantagem prende-se com a minimização

das taxas aeroportuárias, além de seguir as recomendações internacionais da ICAO. Tal

modelo possui desvantagens como a redução dos incentivos para melhorar as atividades

comerciais, a diminuição do valor do aeroporto e a queda das previsões sobre as receitas

comerciais futuras. (Smith, 2002)

Nos últimos tempos o modelo dual till tem ganhado mais importância em países Europeus.

Apesar desse modelo apresentar resultados com maiores taxas aeroportuárias para os

utilizadores, e de levantar questões que dizem respeito à repartição dos custos, o método dual

till induz tarifas menores e mais próximas dos custos, além de maximizar o valor do

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aeroporto. Muitos estudos, como os da ACCC (2001) e os da CAA (2002) têm surgido de

forma a defender a regulação pelo dual till, inclusive, em detrimento do single till.

Beesley (1999) e Starkie (2001) são alguns desses exemplos que se opõem ao single till. O

primeiro argumenta que a regulação deverá centrar-se em atividades caracterizadas por

monopólio natural (atividades aeronáuticas) e que, quando há atividades comerciais prestadas

em conjunto, é totalmente impossível separá-las e, conseqüentemente, a aplicação das

fórmulas de price cap será tendenciosa. Já o segundo autor, ignora a necessidade de regulação

econômica para os aeroportos não congestionados, uma vez que o aumento de taxas

aeroportuárias não apenas reduz a procura dos serviços, como também a procura de atividades

comerciais, e, portanto, a receita dos aeroportos. Assim, os aeroportos não têm incentivos para

aumentar as suas taxas.

Starkie (2001) defende, no entanto, que para aeroportos congestionados a aplicação de um

regime de dual-till levaria a maiores taxas aeronáuticas, tendo um efeito positivo na alocação

de capacidade dos slots, que nesse caso são escassas, e sobre os incentivos ao investimento.

Tais argumentos são compartilhados por outros autores como Oum et al. (2004), que vêem o

método single-till como otimizador do bem estar, quando comparado com o método dual till

em aeroportos não congestionados.

4. Rate of Return (ROR) x Price-Cap

Um Estudo da International Telecommunication Union e da Information for Development

Program (INFODEV, 2009), faz uma análise de qual a necessidade da regulação das tarifas.

Para tal, foram criados alguns critérios úteis para avaliar as opções de regulação.

O primeiro critério visa saber se a forma adotada de regulação impede o exercício de poder de

mercado, pois esse é um objetivo importante da regulamentação, assegurando que os preços

sejam justos e razoáveis, onde as forças competitivas são insuficientes.

Outro critério avalia se o mecanismo de regulação escolhido melhora a eficiência econômica.

Existem várias formas de medidas de eficiência econômica: Eficiência Técnica; Eficiência

Alocativa e a Eficiência Dinâmica. A primeira requer que os bens e recursos produzidos no

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setor analisado, são produzidos com o menor custo possível, o que garante que os escassos

recursos da sociedade são usados de forma eficiente e não são desperdiçados.

A segunda é a alocação de recursos de forma que sejam distribuídos ou alocados da melhor

forma possível, ou seja, os diferentes recursos ou insumos são combinados (balanceados) de

maneira a maximizar o resultado ou produto pretendido e evitando gargalos e desperdícios.

A terceira exige que as empresas devem ter os incentivos adequados para investir em novas

tecnologias e implantar novos serviços.Outro critério quer saber se a forma de regulação

escolhida promove a concorrência, algo muito relevante para aumentar a competitividade do

mercado. O critério seguinte diz respeita à minimização dos custos regulatórios, pois Ceteris

paribus, os reguladores devem escolher um mecanismo regulador que é menos oneroso para

implementar, do que uma que é mais caro implementar. A garantia da qualidade do serviço é

outro critério bastante relevante, pois além de assegurar que as tarifas dos serviços são justas,

o regulador também está preocupado com o tipo de serviço que os consumidores irão receber.

O regulador deve dar preferência a mecanismos que resultem na maior qualidade de serviço

possível. Por fim, o último critério deseja saber se a forma adotada de regulação gera ganhos

compensatórios, pois qualquer mecanismo de regulação deve proporcionar ao aeroporto

regulado a oportunidade de ganhar um lucro razoável para conseguir ganhos compensatórios.

Se não, o aeroporto pode ser forçado a reduzir o investimento e a qualidade do serviço poderá

diminuir. O Quadro 1 faz uma análise desses critérios comparando a taxa de retorno (ROR)

com a regulação price cap.

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QUADRO 1: ROR x PRICE-CAP

FONTE: INFODEV, 2009

Rate of Return (ROR)

Taxa de Retorno

Price-cap

Impede o

exercício

do poder de

mercado

Sim. A empresa regulada pode ganhar

apenas uma taxa normal de retorno.

Sim. O fator X, é uma restrição na fórmula

price cap, que impede a empresa de exercer

poder de mercado (se for escolhido com

cuidado).

A empresa pode exercer poder de mercado nos

preços para serviços específicos, desde que o

preço médio da cesta de serviços esteja dentro

do teto. Alguns reguladores impõem limites

adicionais sobre os serviços individuais para

evitar que isso ocorra.

Eficiência técnica Não. O regulador controla diretamente os lucros. Se

a empresa reduz os custos, aumentando sua

eficiência, logo ela aumenta os lucros, e os preços

são reduzidos no próximo ajuste na taxa, logo a

empresa não vai colher o benefício da redução de

custos e por isso não tem incentivo para fazê-lo.

Sim. As empresas são recompensadas com

rendimentos mais elevados quando se reduz os

custos ou ocorre um aumento da procura (e

penalizadas quando os custos aumentam). Isso

encoraja o comportamento eficiente.

Eficiência

Alocativa

Não. Os preços geralmente são baseados em custos,

não em progressão de custos. Os preços dos

serviços individuais não precisam ser iguais ao custo

do serviço.

Sim. As empresas têm flexibilidade para

definir preços para serviços individuais

baseados em custos futuros.

É possível que os preços individuais desviem-

se dos custos, especialmente se o fator X está

definido incorretamente.

Eficiência

Dinâmica

Não. A empresa não mantém qualquer aumento no

lucro por introduzir novas tecnologias ou serviços, e

por isso não tem qualquer incentivo para fazê-lo.

Sim. A empresa tem incentivos para investir

de forma eficiente, porque ela deve justificar

seu investimento sobre os lucros que espera

ganhar com o investimento (como empresas

em mercados competitivos).

Promove

concorrência

Não. Em geral, não permitem a flexibilidade no

ajuste de preços da empresa, como reflexo no

aumento dos custos, em resposta à concorrência.

Comparado a regulação price cap, a empresa é mais

capaz de não relatar os custos competitivos e

serviços não-competitivos, a fim de conceder

subvenções cruzadas e serviços competitivos.

Sim. A empresa tem uma probabilidade

menor de subsídio cruzado nos serviços. É

comum o grupo de serviços regulados em

cestas separadas para serviços menos

competitivos e mais competitivos, evitando

subsídios cruzados.

A empresa tem flexibilidade de preços

suficiente para responder às pressões da

concorrência através de preços que reflitam os

custos subjacentes e condições de demanda

Minimiza os

custos de

Regulação

Não. Processos de taxas são muitas vezes longos e

dispendiosos.

Sim. Processos de price cap são menos

dispendiosos do que os processos taxa, e não

são freqüentes (uma vez a cada 3 a 5 anos).

Entre as revisões, os custos da regulamentação

são baixos.

Garante a alta

qualidade no

serviço

Sim. Quanto maior o valor líquido contabilístico dos

ativos da empresa, maior é o retorno permitido.

Existe o risco da qualidade do serviço ser maior do

que os níveis de eficiência.

Não. As empresas têm fortes incentivos para

reduzir os custos operacionais, o que pode

levar a redução na qualidade do serviço.

Gera ganhos

compensatórios

Sim. A regulação por Taxa de retorno garante que a

empresa regulada gere receitas compensatórias

suficientes.

Nenhuma garantia. Se o

Fator X é escolhido corretamente e a empresa

realiza, a empresa deve gerar lucros

compensatórios suficientes.

Vol. 3, N. 1 (2009) Revista de Literatura dos Transportes - RELIT Página 106

Page 12: Jtl v03n01p05

Pode-se dizer que o ROR tende a induzir o excesso de investimento em capacidade

aeroportuária, e que a regulação price cap é susceptível a condução de sub-investimento em

capacidade. Além disso, das o price cap dual till tem efeitos menos graves na distorção sobre

a capacidade de investimentos do que o single till (Oum et al. 2004).

Oum et al (2004), demonstra que a produtividade de entrada de capital é mais elevada no

âmbito do price cap single till, seguido pelo price cap dual till e pelo ROR single till ROR.

Além disso, a produtividade total dos fatores (TFP) é maior sob o price cap dual till do que

sob o price cap single till ou pelo ROR single till. Portanto, pode-se dizer, com base em Oum

et al (2004), que o price cap dual till é melhor que o price cap single till, ou de que o ROR

single till, em termos de eficiência econômica global.

Entretanto, Oum et al (2004), também mostra que um aeroporto não regulado tende a cobrar

preços mais altos por seus serviços de aviação, mesmo levando em consideração o incentivos

recebidos, para manter as taxas mais baixas, que levam a aumento na rentabilidade com o

aumento dos lucros de concessão. Porém Oum et al (2004), não pode verificar empiricamente

esse resultado, devido à falta de experiências históricas ou dados.

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Considerações finais

Foram examinados os efeitos das diferentes formas de regulação tarifária em diversos

aeroportos, e da interação entre os lucros de concessão e custo baseado na regulação tarifária.

Recentemente, alguns economistas têm apontado que os lucros de concessão dão um

incentivo ao aeroporto para reduzir as taxas aeroportuárias, aliviando o poder de monopólio

das taxas aeroportuárias.

No entanto, a análise mostra que as taxas de aeroportuárias de um aeroporto regulado, que

visa maximizar seus lucros, são superiores aos de um aeroporto público no âmbito da restrição

de orçamento equilibrado, mesmo que o incentivo proporcionado pelos lucros de concessão

seja levado em conta.

Este resultado sugere que a regulação das tarifas aeroportuárias ainda podem ser justificadas.

Isso, então, levanta a importante questão da eficácia relativa entre formas alternativas de

regulação econômica. Para os aeroportos sob uma regulação de preços, há considerações

importantes entre a eficiência de preços e eficiência produtiva. Sob a regulação price cap,

enquanto o aeroporto ainda tem um incentivo para melhorar a eficiência, pois existe um

tendência indesejável para o aeroporto sub-investir em capacidade.

Este problema de sub-investimento é mais grave para o single till price cap, do que para o

dual till price cap. Estes resultados analíticos são suportados pelos resultados da análise

empírica, feita por Oum et al. 2004. Por fim, não foi possível para Oum et al (2004), testar

empiricamente o resultado analítico de que a existência de lucros de concessão pode conduzir

ao dual till ROR para conseguir a máxima eficiência produtiva, pelo fato de não possuir dados

suficientes.

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