ker, carvalho & nascimento - abelha uruçu -biologia, manejo e consevação

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  • 11

  • 22

  • ABELHA URUU BIOLOGIA, MANEJO

    E CONSERVAO

    REPUBLICADO EM FORMATO DIGITAL PARA DISTRIBUIO GRATUITA PELA

    EDITORA LIBER LIBER

    LIVRO LIVRE FUNO SOCIAL DA PROPRIEDADE INTELECTUAL

    Copyright1996 by Fundao AcangaTodos os direitos reservados

    COLEO MANEJO DA VIDA SILVESTRE

    Nmero 2

    Abelha UruuBiologia, Manejo e Conservao

    33

  • Organizado por:Warwick Estevam Kerr

    Gislene Almeida CarvalhoVnia Alves Nascimento

    Colaboradores:Luci Rolandi Bego

    Rogrio Marcos de Oliveira AlvesMaria Amlia Seabra Martins

    Ivan Costa e Souza

    Uma publicao daFundao Acanga

    PatrocnioFundao Banco do Brasil

    Universidade Federal de Uberlndia

    Belo Horizonte, Minas GeraisRepblica Federativa do Brasil

    1996

    Reviso e formatao do texto: Dr. Sergio U. Dani. Execuo grfica: Editora Littera Maciel ltda, Rua Hum, 157, 32370-450 Contagem, MG, Brasil. Tel (031) 391 1022. Seleo de cores a laser: Studio 101

    44

  • Fotolito Ltda, Rua Francisco Soucasseaux, 126, 31110 Belo Horizonte, MG, Brasil. Superviso: Bil. Marco Antnio de Andrade. Foto da primeira capa: Melipona scutellaris, por Jandy Jos Pereira dos Santos

    E53 Abelha Uruu: Biologia, Manejo e Conservao/ Warwick E. Kerr, Gislene A. Carvalho, Vania A. Nascimento e

    colaboradores. -- Belo Horizonte, MG: Acanga, 1996;

    patrocnio Fundao Banco do Brasil

    .

    1xxxx p.:il., 11 retrs. col. (Coleo Manejo da Vida Silvestre; 2) Bibliografia

    1. Animais selvagens - Biologia 2. Animais selvagens -

    Manejo 3. Animais selvagens - Conservao 4. Animais selva- gens - Preservao I. Kerr, Warwick E., II. Carvalho, G. A.

    III. Titulo. IV. Serie.

    ISBN - CDD - 639.9

    CDU - 591.5

    Todos os direitos reservados. Nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida - em qualquer meio ou forma, seja mecnica ou eletrnica, fotocpia, gravao etc. - nem apropriada ou estocada em sistema de banco de dados, sem a expressa autorizao da Fundao Acanga.

    IMPRESSO NO BRASIL

    55

  • ABELHA URUU BIOLOGIA, MANEJO

    E CONSERVAO

    66

  • PrefcioAs abelhas tm sido criadas para produo de mel, cera, plen e prpolis. Entretanto, muito mais importante que esses produtos a polinizao de plantas teis propiciada por esses insetos.

    No Brasil muitas espcies de abelhas indgenas sem ferro, nome pelo qual so conhecidos popularmente os meliponneos, esto seriamente ameaadas de extino em consequncia das alteraes de seus ambientes, causados principalmente pelo desmatamento, uso indiscriminado de agrotxico e pela ao predatria de meleiros.

    A criao e explorao racional dessas abelhas uma alternativa que poder preservar muitas espcies, permitindo a obteno de seus produtos, sua utilizao como polinizadoras e facilitar as pesquisas cientficas com as mesmas. Isto especialmente importante, j que um dos entraves encontrados por quem se dedica a essa atividade a obteno de enxames, que so usualmente coletados na natureza, atividade que alm de difcil e onerosa, pode contribuir para a extino de algumas espcies.

    A despeito da importncia desses insetos, do grande interesse que despertam e da qualificao dos grupos de pesquisa que a eles se dedicam, no existe atualmente, disposio dos interessados, livro que ensine como criar essas abelhas e fornea dados atuais de sua biologia. Este livro, abelha Uruu: Biologia, Manejo e Conservao, organizado pelo professor Kerr e colaboradores vem preencher esta lacuna, colocando disposio do leitor informaes bsicas, indispensveis, para quem quer iniciar

    77

  • uma criao dessas abelhas, ao lado de conhecimentos acerca de sua biologia.

    O professor Warwick Estevam Kerr vem dedicando grande parte de sua vida formao de cientistas e pesquisa sobre abelhas. Essas atividades propiciaram a formao de um destacado grupo de pesquisadores nesse campo da biologia. Os conhecimentos divulgados neste livro so em grande parte fruto do trabalho do professor Kerr e desse grupo por ele formado.

    Embora o titulo sugira que o livro trate exclusivamente da Uruu, Melipona scutellaris, as informaes nele contidas vo muito alm e so uteis a todos aqueles que de algum modo esto interessados na biologia, manejo e conservao de qualquer espcie de meliponneo.Prof. Dr. Lcio Antonio de Oliveira CamposDepartamento de Biologia GeralUniversidade Federal de Viosa

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  • SUMRIOPREFCIO.................................................................................07Prof. Dr. Lcio Antnio de Oliveira Campos

    INTRODUO..........................................................................12

    PARTE I - BIOLOGIA GERAL

    1.Origem e Distribuio......................................................16 1.1.Denominaes Regionais..........................................17 1.2.Distribuio Geogrfica............................................18

    2.Descrio Morfo Funcional.............................................. 20 2.1.Glndulas do Sistema Salivar.................................... 22

    a)Glndulas Salivares da Cabea................................22 b)Glndulas Mandibulares.......................................... 23 c)Glndulas Hipofaringeanas...................................... 23 d)Glndulas Salivares do Trax.................................. 23 e)Funes das Glndulas Salivares............................. 24

    2.2.Glndulas Abdominais.............................................. 26 3.Dominncia Comportamental e Feromonal......................28

    3.1.Dominncia Comportamental.................................... 30 3.2.Dominncia Feromonal............................................. 31

    4.Ninhos de Meliponneos................................................... 33 5.Diviso de Trabalho.......................................................... 39

    a)Coleta de Nctar, Plen, Resina e Barro.................. 40 b)Produo de Mel...................................................... 42 c)Comunicao........................................................... 43 d)Defesa...................................................................... 47

    6.Enxameagem.................................................................... 50 a)Procura e Escolha da Nova Moradia........................ 51 b)Fechamento de Frestas ............................................ 51 c)Transporte de Cera, Mel e Plen da Colmia-Me para o Novo Local........................................................ 52

    99

  • d)Enxame de Machos.................................................. 53 e)Instalao da Rainha Virgem................................... 54 f)Fecundao da Fmea Frtil..................................... 54 g)Incio da Postura...................................................... 55

    7.Postura e Desenvolvimento..............................................57 a)Aprovisionamento e Postura das Clulas de Cria ...59 b)Ovos Trficos ou Nutritivos das Operrias.............61 c)Produo de Machos................................................ 62 d) Substituio de Rainhas nas Colnias.................... 64

    8.Ciclo de Vida e Longevidade...........................................68 9.Gentica da Determinao de Sexo e Casta.....................69

    9.1.Determinao de Sexo............................................... 70 9.2.Determinao de Casta.............................................. 72

    a)Nmero Mnimo de Colnias................................... 73Parte II Manejo

    10.Manejo de Meliponneos................................................77 10.1.Importncia Ecolgica, Econmica e Cultural .......78 10.2.da Criao de Meliponneos.................................... 78 10.3.Escolha das Espcies a Serem Criadas.................... 80 10.4.Implantao do Meliponrio................................... 82

    a) Tipos de Colmeias e Nmero de Colnias..............83 10.5.Diviso de Colnias................................................86

    a)Dicas para as Divises de Colmeias........................ 87 b)Tcnica de Reduo de Espao............................... 91 c)Mtodos de Diviso................................................. 92

    10.6.Como Eliminar os Inimigos Mais Comuns.............96 10.7.Meliponicultura Migratria..................................... 98 10.8.Melhoramento Gentico.......................................... 98 10.9.Marcao de Abelhas..............................................99

    Parte III Meliponicultura para iniciantes

    1010

  • 11.Meliponicultura para Iniciantes....................................102 11.1.Por Onde Comear?..............................................103 11.2.Que espcie criar?.................................................104 11.3.Conhecimentos bsicos.........................................104 11.4.Onde Instalar seu Meliponrio..............................107 11.5.Instalao das Caixas............................................109 11.6.Transporte.............................................................112 11.7.Povoamento........................................................... 113 11.8.Alimentao..........................................................114 11.9.Modo de Alimentar...............................................116 11.10.Reviso................................................................ 116 11.11.Diviso Artificial das Famlias............................ 120 11.12.Fortalecimento de Colnias................................. 123 11.13.Pilhagem e Inimigos............................................ 124 11.14.Colheita de Mel................................................... 126 11.15.Beneficiamento.................................................... 129 11.16.Comercializao.................................................. 130

    ANEXOS

    ANEXO 1CUIDADOS SANITRIOS.................................................129

    ANEXO 2ENDEREOS TEIS..............................................................132

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS....................................139

    AGRADECIMENTOS E CRDITOS....................................154

    OS AUTORES...........................................................................156

    A FUNDAO ACANGA....................................................159

    1111

  • INTRODUOHoje existe um bom nmero de espcies de abelhas domesticadas ou, em outras palavras, sob o quase completo domnio humano.

    Na sia os chineses, japoneses e indianos, h sculos, mantm a Apis cerana em colmias para explorao do mel. Na Europa e parte da sia as vrias subespcies de Apis mellifera foram, e em alguns lugares ainda so, mantidas em cortios, h vrios sculos 18 e, desde 1851 passaram a ser criadas em colmias racionais desenvolvidas pelo pastor protestante Lorenzo Lorraine Langstroth. Na frica, os egpcios tinham apicultura da Apis mellifera lamarckii e, ao sul do Sahara (especialmente na faixa que vai da Tanznia Angola), a apicultura atividade de homens nobres e corajosos. Em Oman a explorao da Apis florea uma atividade lucrativa e com tcnicas bem elaboradas.

    Nas Amricas Central e do Sul trs espcies de abelhas se destacam:

    . A bacab (Melipona beechei) domesticada pelos Maya foi, possivelmente, introduzidas por eles em Cuba;

    . A tiba (Melipona compressipes), domesticada pelos vrios grupos de ndios do Maranho como: Timbira, Tupinamb, Guajajara, Trememb, Guaj, Urubu, Gavio, cujo conhecimento foi passado aos atuais caboclos. Os maiores apirios de tiba (2000 colnias) foram encontrados perto de Vitria do Mearim e Arari, Maranho;

    . A uruu do Nordeste (Melipona scutellaris), domesticada pelos Potiguara, Kiriri, Xucuru, Pataxo, Paiaku,

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  • Tupirucuba, Caete, Aymore e outros do Nordeste, cujas tcnicas de cultivo foram imediatamente passadas aos lavradores portugueses que muito elogiavam o seu mel. A destruio das florestas nordestinas diminuiu muito o nmero de meliponicultores; porm, recentemente, devido especialmente habilidade dessas abelhas em coletar plen, e assim realizarem a polinizao, elas vm sendo novamente cultivadas. Nem todos os meliponrios tm mais de 44 colmias; e infelizmente, por razes de gentica que sero discutidas mais adiante, colmeiais com menos de 44 colnias poder levar perda total das abelhas em muitos lugares.

    As abelhas so parte integrante do ecossistema da regio em que vivem. Sua principal funo na natureza a polinizao das flores e, consequentemente, produo de sementes e frutos.

    As abelhas brasileiras sem ferro so responsveis, conforme o ecossistema, por 40 a 90% da polinizao das rvores nativas. As 60 a 10% restantes so polinizadas pelas abelhas solitrias, borboletas, colepteros, morcegos, aves, alguns mamferos, gua, vento, e, recentemente, pelas abelhas africanizadas.

    Estas abelhas nativas pertencem superfamlia Apoidea, famlia Apidae e subfamlia Meliponinae, esta ltima dividida em duas tribos: Meliponini e Trigonini.

    Dentro dos Meliponinae se encontram mais de 300 espcies, uma das quais (Melipona scutellaris) foi o principal objeto de estudo para as informaes deste manual.

    Estas inmeras espcies de abelhas sem ferro brasileiras (Meliponinae) diminuem em taxa mais rpida que a destruio das florestas. A essa destruio, associamos 6 razes principais:

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  • . A sua grande maioria vive em ocos de rvores e estas esto sendo destrudas com tal velocidade que das matas de So Paulo, Minas Gerais e Paran sobram apenas 8%.

    . Nestes 8%, vrios meleiros habilidosos encontram a colnia, derrubam a rvore e retiram o mel, jogando a cria ao cho onde comida por formigas.

    . reas de reserva florestal com tamanho inferior ao necessrio para suportar 44 ou mais colnias de uma mesma espcie, isto levar ao desaparecimento da espcie aproximadamente em 15 geraes, devido ao sistema gentico de determinao de sexo (efeito Yokoyama e Nei) que ser detalhado neste livro.

    . Meliponrios particulares ou de intituies com populaes menores que 44 colnias.

    . Serrarias, que buscam as rvores maiores, mais idosas e que abrigam mais ocos.

    . Uso de inseticidas, especialmente nas proximidades de plantaes de soja e algodo. Algumas abelhas esto se tornando urbanas, como a jata (Tetragonisca angustula no sul e Tetragonisca weyrauchi no Acre), tubi (Partamona), ira (Nannotrigona), mosquito (Plebeia droryana), irapu (Trigona spinipes), guaxup (Trigona hyalinata) e outras. Elas tm sido muito afetadas pelas pulverizaes de malation para controle do mosquito da Dengue (Aedes aegypti). Tambm em So Paulo, Minas Gerais, Paran, Bahia, Pernambuco (vrias culturas) e Mato Grosso (soja) constatamos morte de grande nmero de colnias pelo uso de agrotxicos.

    Diante desta destruio acelerada das matas imprescindvel a elaborao de programas de conservao. Se houver um firme objetivo de preservar e restaurar as

    1414

  • rvores nativas brasileiras, faz-se necessrio preocupar-nos seriamente com a polinizao de suas flores. Estudos sobre biologia das abelhas polinizadoras, manejo e especialmente reproduo controlada e diviso de suas colnias se tornam informaes essenciais para quaisquer medidas a serem adotadas em tais programas de conservao.

    A meliponicultura, ou seja, a criao de meliponneos, uma atividade humana que contribui para a conservao das abelhas e de seus habitats - j nos ensinavam as diversos povos indgenas que primeiro domesticaram estes insetos sociais.

    A maioria das pesquisas aqui relatadas foram executadas em 160 colnias de uruu do Nordeste (Melipona scutellaris). Solicitamos ao caro leitor que nos informe sobre qualquer falha na informao, na bibliografia, em erros ou enganos, com vistas a novas edies.

    Os autoresDepartamento de Gentica e BioqumicaUniversidade Federal de UberlndiaCampus Umuarama38400-902 Uberlndia MG

    1515

  • Warwick E. KerrGislene A. CarvalhoVania A. Nascimento

    1 1. Origem e Distribuio

    Denominaes regionais 00Distribuio geogrfica 00

    As abelhas sem ferro nativas do Brasil pertencem superfamlia Apoidea que subdividida em 8 famlias: Colletidae, Andrenidae, Oxaeidae, Halictidae, Melittidae, Megachilidae, Anthophoridae e Apidae.

    Os Apidae se subdividem em quatro subfamlias: Apinae, Meliponinae, Bombinae e Euglossinae. Os Meliponinae, por sua vez, se dividem em duas tribos: Meliponini e Trigonini.

    A classificao zoolgica completa destas abelhas a seguinte:

    Reino AnimliaFilo ArthropodaClasse Insecta

    1616

  • Ordem HymenopteraSubordem ApocritaSuperfamlia Apoidea Famlia ApidaeSubfamlia MeliponinaeTribos Meliponini e Trigonini

    Dentro dos Meliponinae se encontram 52 gneros com um total de mais de 300 espcies espalhadas em todo o mundo, desde o Rio Grande do Sul at o Centro do Mxico, mais frica, ndia, Malsia, Indonsia e Austrlia.

    A uruu do Nordeste, principal objeto de estudo para as informaes deste manual, pertence espcie Melipona scutellaris. Esta abelha e a mandaaia (Melipona quadrifasciata anthidioides e M. mandaaia) so destaques nas criaes nacionais, pela maior produo e aceitao do mel.

    1.1. Denominaes Regionais

    Os povos pr-colombianos j conheciam as abelhas sem ferro e as domesticaram, dando-lhes os nomes que ainda hoje persistem na cultura popular brasileira: jata, uruu, tiba, mombuca, irapu, tatara, jandara, guarupu, manduri e tantas outras. A utilizao de nomes vulgares varia de regio para regio, dificultando a identificao das espcies e sua classificao cientfica.

    O quadro na terceira parte deste livro (Meliponicultura para Iniciantes) apresenta nomes vulgares e os correspondentes nomes cientificos para algumas espcies.

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  • possivel que alguns dos nomes vulgares listados correspondam a diferentes espcies, dependendo da regio do pas. Para facilitar o trabalho de classificao, sugerimos ao leitor o encaminhamento de algumas abelhas aos endereos de instituies de pesquisa listadas em anexo neste livro. O leitor mais interessado poder entrar em contato pessoalmente com pesquisadores destas instituies.

    1.2. Distribuio Geogrfica

    Dissemos anteriormente que a subfamilia Meliponinae tem centenas de espcies espalhadas por vrias regies do mundo. Este elevado nmero contrasta com as apenas oito espcies nos Apinae, subfamilia qual pertence a abelha Apis mellifera. Os atuais meliponneos formam um grupo mais isolado e mais especializado, cujos indivduos dependem mais das caractersticas climticas e florsticas de suas respectivas regies de origem, que os relativamente menos exigentes Apinae. A favor desta hiptese est o fato que das mais de 300 espcies de meliponneos conhecidas, pelo menos 100 esto em perigo de extino devido destruio de seu habitat pelo homem. O isolamento e especializao dos meliponneos parecem ser em grande parte resultantes de peculiaridades de seu comportamento, conforme ser explicado no captulo sobre enxameagem.

    1818

  • 1919

    Ilustrao 1: Figura 1 - Os ndios Kayap sabiam muito mais anatomia externa das abelhas que a grande maioria das pessoas. No desenho do Dr. Joo Maria Franco de Camargo esto os nomes que do s peas anatmicas o seu significado cientfico. Colocamos mais alguns nmeros e o seu significado: 1-Hmulos; 2-Esternitos; 3-Tergitos; 4-Coxa; 5-Trocanter; 6-Femur; 7-Corbcula (estrutura da pata posterior que serve para transportar plen). Este esquema ilustra algumas estruturas morfolgicas de um Meliponinae reconhecidas pelos Kayap: ara-abatyx (asa anterior, asa grande), ara-ngrire (asa pequena, asa posterior), ara-i (nervuras alares), ara-kratx (junta da asa), kr (cabea), no-k-i (ocelos, olhos simples), no (olho composto), h-ja-kre- (antena), kaingra (pedaos de antena, artculos), inhot (extremidade, ponta), kuk (escapo), kratx (junta), wa-i-kr (cabea de dente, labrum), wa (mandbula), wanhot (dente da mandbula), -to-pra (lngua pendurada, probcide), -to (lngua), mut (pescoo, protrax), ibum (costa, mesotrax), pa (brao, pernas anteriores), t (p, pernas posteriores), h (abdomen) e te'y (ponta do abdomen). Extraido, ligeiramente modificado, de J.M.F. Camargo & D.A. Posey (1990).

  • Luci R. Bego

    2 2. Descrio Morfo Funcional

    Sumrio 2.Descrio Morfo Funcional.............................................. 20

    2.1.Glndulas do Sistema Salivar.................................... 22 a)Glndulas Salivares da Cabea................................22 b)Glndulas Mandibulares.......................................... 23 c)Glndulas Hipofaringeanas...................................... 23 d)Glndulas Salivares do Trax.................................. 23 e)Funes das Glndulas Salivares............................. 24

    2.2.Glndulas Abdominais.............................................. 26

    As caractersticas morfolgicas gerais dos meliponneos so aquelas geralmente descritas para os demais insetos e artrpodes em geral. Nestes animais, membros e apndices segmentados e articulados so necessrios devido ao rgido exoesqueleto constitudo principalmente de quitina, uma substncia flexvel, mas praticamente indigervel, semelhante celulose. A quitina forma a carapaa que envolve o corpo do animal.

    O sistema circulatrio dos insetos difere daquele dos vertebrados. Enquanto nos vertebrados o sangue corre dentro de vasos sanguneos e bombeado pelo corao

    2020

  • para dentro deste "sistema fechado", nos insetos o sangue ou hemolinfa perfunde livremente o corpo do animal e os interstcios dos tecidos. A hemolinfa posta em circulao neste "sistema aberto" graas a uma fraca presso hidrosttica causada pela contrao peristltica de um "corao" tubular de localizao dorsal (ao contrrio dos vertebrados, em que o corao tem uma posio ventral).

    O sistema respiratrio consiste em um sistema de tubos finssimos, as traquias, que transportam o oxignio do ar diretamente para os tecidos.

    Outra caracterstica morfolgica que distingue os insetos e artrpodes em geral a localizao das fibras nervosas. Enquanto nos animais cordados a localizao dorsal, nos insetos ela ventral. A segmentao em um artrpode uma segmentao de todo o corpo, de maneira que cada segmento geralmente possui um gnglio nervoso prprio.

    Com relao aos aspectos morfolgicos particulares dos himenpteros, ordem da classe Insecta a que pertencem os meliponneos, chamam a ateno as diferenas de tamanho e forma entre os membros de uma mesma colnia. A estas diferenas correspondem especializaes funcionais que so rigidamente determinadas por fatores genticos e nutricionais. O resultado desta rgida determinao a existncia de dois sexos (macho e fmea) e duas castas (rainha e operria) nas sociedades dos meliponneos.

    Detalhes da anatomia externa de uma abelha esto ilustrados na Fig. 2 e podem ser comparados com a fotografia de uma operria de Melipona scutellaris na capa deste livro. Os machos no diferem muito das operrias nestes aspectos externos. J a rainha maior que as operrias e os machos, e tem uma forma diferente; a diferena de

    2121

  • tamanho deve-se principalmente cabea e ao seu abdomen (veja anexos). Os fatores genticos e nutricionais responsveis pela determinao dos caracteres sexuais primrios e secundrios sero explicados no prximo captulo. Aspectos relevantes da anatomia interna sero discutidos a seguir.

    2.1. Glndulas do Sistema Salivar

    Detalhes relevantes da morfologia interna das abelhas sem ferro dizem respeito s suas glndulas. Estas estruturas tm chamado a ateno dos pesquisadores devido ao papel que elas desempenham, seja na digesto, seja na comunicao e na regulao e coeso social da colnia. As glndulas dos Meliponinae, em geral, foram muito bem estudadas, tanto ao nvel morfolgico e histolgico, quanto em relao composico qumica de seus produtos de secreo. 21 As glndulas que sero comentadas a seguir foram descritas para Scaptotrigona postica. Em geral, existem algumas diferenas entre os diversos grupos de meliponneos.

    a) Glndulas Salivares da Cabea

    As glndulas salivares da cabea so formadas de pequenos e numerosos ramos ou grupos de alvolos na ponta de ductos relativamente longos. Os cinos que as compem so multicelulares e formam um epitlio cbico simples. Os alvolos so revestidos por uma membrana basilar muito fina e a luz da glndula bastante grande e contnua com os ductos.

    2222

  • b) Glndulas Mandibulares

    As glndulas mandibulares so estruturas em forma de saco, localizadas uma de cada lado da cabea, em ntima ligao com a mandbula. Estas glndulas so formadas por trs camadas distintas: a - membrana basilar externa; b - clulas secretoras; c - ntima quitinosa.

    As clulas secretoras formam um epitlio cbico simples.

    A membrana basilar formada por um envoltrio muito fino, acelular, que envolve externamente toda a glndula, enquanto que a ntima se apresenta formada por uma bainha de quitina, forrando a cavidade interna da glndula. As clulas secretoras so providas de grandes ncleos basais e canalculos intracelulares, muito delicados, que percorrem a clula e vo se abrir atravs da camada ntima, na luz do saco.

    c) Glndulas Hipofaringeanas

    As glndulas hipofaringeanas so duas estruturas situadas na parte mediana anterior da cabea, uma de cada lado da faringe. Apresentam-se como um par de cachos que se enrolam, ocupando o espao entre o crebro e a parte do exoesqueleto que forma o teto da cabea. Cada estrutura constituda por um canal axial provido de ramos curtos que se ligam aos cinos. Cada cino constitudo por uma s clula secretora apresentando um canalculo que conduz os produtos ao ducto excretor final.

    d) Glndulas Salivares do Trax

    As glndulas salivares do trax se situam na parte anterior ventral do trax, sob o tubo digestivo. So estruturas pares,

    2323

  • onde cada poro glandular formada, em geral, por um conjunto de tbulos. Esses tbulos so envolvidos por uma membrana basilar muito fina e so formados, tambm, por clulas cbicas, maiores que aquelas das glndulas salivares da cabea. A luz dos tbulos revestida internamente por uma ntima quitinosa. Os tbulos se reunem em grupos de dois, trs ou mais para formar os ductos coletores. Estes, se ligam uns aos outros formando, posteriormente, dois ductos finais que terminam na bolsa salivar que se abre na glossa, trazendo o produto de secreo dessas duas glndulas.

    e) Funes das Glndulas Salivares

    As funes destas glndulas excrinas ainda so pouco conhecidas nos meliponneos e a controvrsia bem grande.

    Sabe-se que em algumas espcies a secreo das glndulas mandibulares serve para fazer trilhas de cheiro para indicar s outras abelhas onde est o alimento. 53, 54, 42, 43 Isto no significa que a secreo destas glndulas no possa tambm ter outras funes dentro da colnia, ou diferentes papis de acordo com as diferentes espcies de abelha. Por exemplo, em algumas espcies de Scaptotrigona a secreo da glndula mandibular contm um feromnio de alarme que, quando liberado, desencadeia respostas instantneas pelas outras operrias da colnia. 11

    A funo das glndulas hipofaringeanas pode estar relacionada com a alimentao da cria mais jovem, do mesmo modo que em Apis mellifera. Em Nannotrigona (Scaptotrigona) postica o desenvolvimento glandular depende da idade das operrias.5 Ficou demonstrado que as glndulas hipofaringeanas esto bem desenvolvidas em operrias que alimentam a cria jovem. Um estudo 25

    2424

  • constatou que as operrias forrageiras (ou seja, aquelas que realizam apenas os trabalhos de campo), podem reativar suas glndulas e voltar a alimentar a cria. Este fato sugere que a funo das glndulas hipofaringeanas tem uma forte relao com a alimentao da cria.

    O ciclo de desenvolvimento das glndulas do sistema salivar 18, 20, 19, 25, 5, 15 em duas espcies de abelha sem ferro j citadas, Scaptotrigona postica e Friesella schrottky, corresponde a um ciclo secretor bem definido. Os resultados obtidos por diferentes autores so muito semelhantes e sero resumidos a seguir.

    Inicialmente, as operrias jovens apresentam-se com glndulas salivares e hipofaringeanas pouco desenvolvidas, mas as glndulas mandibulares j apresentam uma certa quantidade de secreo no seu interior. medida em que as operrias avanam em idade, as glndulas tambm se desenvolvem, exceto as mandibulares, cujas clulas dos sacos glandulares diminuem de tamanho, apesar de a quantidade de secreo aumentar dentro dos mesmos. As glndulas hipofaringeanas atingem seu pico mximo, como mencionado anteriormente, quando as operrias trabalham na construo e alimentao das clulas de cria; a partir da gradualmente regridem, at que nas operrias forrageiras - as mais velhas da colnia - os cinos glandulares encontram-se totalmente regredidos, ou em regresso. Ao contrrio, as glndulas salivares, principalmente as localizadas na cabea, apresentam-se completamente desenvolvidas, indicando uma funo importante nesta poca. Apesar das glndulas mandibulares apresentarem-se com clulas hipotrofiadas, observa-se grande quantidade de secreo no interior dos sacos glandulares. Tambm neste caso, a operria deve utilizar-se de grande quantidade de secreo nesta poca.

    2525

  • 2.2. Glndulas Abdominais

    Existem trs tipos de glndulas no abdmen das abelhas em muitas espcies de Meliponinae.58 As glndulas do primeiro tipo so as tergais unicelulares. Estas glndulas foram constatadas do II ao VIII tergitos abdominais, com pequenas variaes de acordo com a casta e o sexos. Nas rainhas, as glndulas do VII tergito foram denominadas glndulas de cheiro, por analogia ao gnero Apis.

    As glndulas do segundo tipo so as epiteliais, encontradas no III tergito de rainhas fecundadas e tambm as glndulas de cera das operrias.

    Finalmente, as glndulas do terceiro tipo so as glndulas bsicas ou de Duffour, que so exclusivas das rainhas.

    Para concluir, nas rainhas, as glndulas tergais apresentam sinais de atividade durante todo o perodo em que elas se encontram ativas dentro da colnia, isto , enquanto mantm a dominncia sobre as operrias. possvel que tais glndulas liberem feromnios.

    2626

  • 2727

    Ilustrao 2: Uruu visitando cosmos (foto: Warwick E. Kerr).

  • Luci Rolandi Bego

    3 3. Dominncia Comportamental e

    Feromonal

    Sumrio 3.Dominncia Comportamental e Feromonal......................28

    3.1.Dominncia Comportamental.................................... 30 3.2.Dominncia Feromonal............................................. 32

    A eficincia da coeso de uma sociedade estritamente baseada na dominncia comportamental deve contar com o reconhecimento individual dos membros de diferentes castas ou posies sociais. Esta exigncia tanto maior quanto maior for a complexidade da sociedade, ou seu tamanho populacional.

    No curso das mudanas evolutivas caracterizadas pelo aumento populacional nas colnias de insetos sociais, o sistema de dominncia comportamental tornou-se gradualmente insuficiente, dando lugar a sistemas mais eficientes de regulao social. Um exemplo deste tipo a dominncia da rainha de Apis sobre as operrias, que se faz atravs de sistemas feromonais (sinais qumicos). A

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  • regulao social em colnias de abelhas fundamental para que haja uma eficiente diviso de trabalho.

    Os primeiros pesquisadores que estudaram em detalhes a diviso de trabalho em colnias de Apis concluram que as operrias executavam diferentes tarefas na colnia durante as diferentes fases de suas vidas, e que estas tarefas variavam de acordo com a idade dos indivduos. Alm disso, a atividade de forrageira das operrias em Apis pode apresentar certas mudanas na qualidade e quantidade de forragem, dependendo das necessidades imediatas da colnia. Por exemplo, operrias em contato com o cheiro da cria aumentam a coleta de plen.28, 29

    Nos meliponneos, a dominncia da rainha em relao s operrias exercida atravs do que se denominam sinais de dominncia ritualizados,85 alm da parte feromonal.

    O desempenho de tarefas pelas operrias em colnias mistas de Nannotrigona (Scaptotrigona) postica e N. (S.) xanthotricha obedeceu seguinte sequencia bsica: incubao dos favos, trabalhos com cera, cuidado com a cria, limpeza da colnia, desidratao do nctar, guarda e campo (forrageiras).32 Esta mesma sequencia de tarefas foi observada por diversos autores em outras espcies de abelhas nativas sem ferro. 65, 76, 30, 31, 27 Certas tarefas como desidratao do nctar, guarda e campo so decididamente determinadas pela idade das operrias, enquanto que incubao do favo, trabalhos com cera, cuidado com a cria e limpeza da colmeia dependem exclusivamente das necessidades das colnias.32

    Procurando detalhar certos comportamentos relacionados com a diviso de trabalho em meliponneos, alguns autores 77 constataram uma forte ligao individual

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  • das construtoras de uma clula de cria e o subsequente aprovisionamento massal desta clula com o alimento larval: as construtoras mais ativas de uma clula de cria foram tambm as mais importantes alimentadoras desta clula.

    De um modo geral, os outros trabalhos acima referidos, principalmente pelo grupo brasileiro, j haviam verificado que, em pouco tempo, uma mesma abelha operria executa diversas tarefas de cuidado com a cria, envolvendo os trabalhos de construo das clulas com cerume, alimentao massal das mesmas, postura de ovos nutritivos (dependendo da espcie), preparo da oviposio da rainha, e operculao (fechamento) das referidas clulas.

    3.1. Dominncia Comportamental

    Dois exemplos interessantes de ritualizaes sero citados aqui.

    Em Plebeia, vrias espcies (mas no todas) se caracterizam pela brusquido dos movimentos da rainha durante o perodo em que ela visita os favos, e durante a agitao e a pr-discarga de alimento pelas operrias, comportamentos que antecedem a oviposio da rainha, conforme ser detalhado adiante. No favo de cria novo, onde as clulas de cria sero tratadas e ovipostas, a rainha de Plebeia droryana, por exemplo, geralmente faz paradas curtas seguidas por corridas sbitas, com uma vibrao peculiar de seu corpo. As operrias que se encontram em sua frente livram o caminho rapidamente.

    O giro hipntico ("hypnotic turning", na lngua inglesa) uma outra caracterstica distinta e geralmente realizada por uma operria que est posicionada em frente rainha. Subitamente, a operria abaixa sua cabea e, distendendo as pernas mdias e posteriores, levanta o resto

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  • do corpo. Como se estivesse hipnotizada, gira e fica em posio paralela rainha. Depois disto, extende as pernas para o lado e, contactando a rainha, a operria permanece imvel por um certo tempo. Antes de sua sada, a rainha pode tocar ou no a operria com as antenas e as pernas anteriores.

    A solicitao de alimento pela rainha s operrias muito agressiva. Os ovos trficos das operrias (em grande parte dos meliponneos at agora estudados as operrias botam ovos que tm como finalidade principal alimentar a rainha, e portanto so denominados ovos trficos ou nutritivos) so geralmente botados sobre o favo de cria (fato incomum entre os meliponneos), aps violentos contatos entre rainha e operria. Curiosamente, estes ovos so ingeridos, principalmente, pelas prprias operrias.

    Baseando-se na observao de outros tipos de sociedades mais primitivas de vespas e mesmo abelhas, alguns aspectos dos sinais de dominncia ritualizados permitem considerar abelhas iguais s Plebeia como o ancestral de todos os grupos j observados em termos de comportamento. 85

    Em grande parte das Melipona, os sinais de dominncia ritualizados so caracterizados por uma marcante, forte, mas elegante disposio. Em todos os grupos, exceto em Melipona quinquefasciata, principalmente nas andanas da rainha pelo favo e na fase de agitao sobre o mesmo, as operrias ficam imveis e submissas rainha, apresentando-lhe partes de seus corpos. A seguir, a rainha executa toques rpidos com as antenas e pernas anteriores sobre as operrias. 85

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  • 3.2. Dominncia Feromonal

    A parte feromonal da dominncia entre os membros de uma colnia deve-se existncia das glndulas excrinas que secretam, entre outros produtos, os feromnios (substncias volteis capazes de desencadear respostas comportamentais estereotipadas, por exemplo a atrao sexual, alarme e defesa, etc). As glndulas excrinas podem ser divididas em dois grupos principais: glndulas do sistema salivar e glndulas abdominais, conforme detalhamos anteriormente.

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  • Warwick E. KerrGislene A. CarvalhoVania A. Nascimento

    4 4. Ninhos de Meliponneos

    As abelhas sem ferro, em seu ambiente natural, tm sempre como problema achar um lugar para seu novo enxame. A grande maioria usa ocos de rvores, em diferentes alturas. H abelhas como a guarupu (Melipona bicolor), a uruu-preto (Melipona capixaba), a abelha-cachorro (Trigona flavipennis) que preferem ocupar ocos que se localizem bem em baixo e, por isso, so muitas vezes chamadas de p-de-pau; outras como a mandaaia (Melipona quadrifasciata), Melipona melanoventer, tiba (Melipona compressipes fasciculata), utilizam ocos entre 1 e 3m de altura, outras como a Melipona seminigra, manduri (Melipona marginata), Melipona rufiventris, Melipona crinita, usam com preferncia ocos acima de 4m. Encontramos colnias de uruu do Nordeste (Melipona scutellaris) e uruu amarela (Melipona crinita) ocupando ocos de rvores a 40m de altura. Umas ocupam madeira morta (Plebeia droryana, Duckeola ghiliani, Trigonisca, Tetragonisca angustula) e outras como Tetragonisca goeldiana que ocupam at cip (na realidade a raiz da arcea guaimb). Mas, dessas, muitas so menos exigentes; j achamos M. quadrifasciata em buracos de formigas (Atta)

    3333

  • e em casa de Joo-de-Barro (Furnarius rufus); M. marginata em cupinzeiro e paredes; em Manaus numa parede tinha 26 colnias de Melipona compressipes manaosensis. Essa mesma subespcie, por ter um furo no batume superior do ninho, consegue habitar ocos de rvores cujo buraco fica levemente abaixo da linha superior nas enchentes do rio Amazonas e afluentes, ou seja, por 5 a 20 dias ficar sob as guas; nesse caso as abelhas sobem dentro do oco, para um nvel superior ao da gua. Assim que as guas abaixam e a entrada est liberada, as operrias bombeiam toda a gua para fora. Cada abelha regorgita 2 a 3 gotinhas. Ainda outras ocupam buracos e aumentam-nos, dentro de cupinzeiros. Em Cuiab, num muro de taipa foram encontradas 8 ninhos de Melipona fasciata orbignii (manduri de Mato Grosso).

    Um outro grupo de abelhas faz seus ninhos regularmente em buracos encontrados no cho, em vazios deixados por formigas, razes e, mesmo, por tatus e cotias. So as Partamona, Melipona quinquefasciata, Geotrigona, Schwarziana, Nogueirapis. H um grupo de abelhas que se libertou de ocos e faz seus ninhos em galhos, lugares cobertos, pedras. So elas: a irapu (Trigona spinipes), irapu de asa branca (T. hyalinata), sanhar (T. amalthea, T. truculenta), T. trinidadensis, T. dallatorreana e a jata-do-Acre (Tetragonisca weyrauchi).

    Os ninhos so construidos basicamente de cera pura ou cerume, que uma mistura de cera, prpolis e barro. Batume a denominao para a mistura de prpolis e barro geralmente usada na delimitao da morada (Figs. 2 e 3).

    A maior parte dos meliponneos faz reserva de cera e resina. A cera geralmente armazenada nas bordas dos favos de cria ou em pequenas bolinhas sobre o invlucro. A resina fica grudada nas paredes laterais do tronco ou caixa,

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  • de preferncia, prxima a entrada do ninho, formando pequenos "montes".

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    Ilustrao 3: Figura 2. Alguns tipos de ninhos de meliponneos: A - Trigona amazonensis; B - Trigona cilipes, dentro de formigueiro arbreo de Azteca sp; C - Trigona branneri; D - Scaptotrigona nigrohirta; E - Partamona cf. cupira, em cupinzeiro arbreo; F - Trigona fulviventris, que prefere ninhos subterrneos; G - Trigona recursa; H - Tetragonisca angustula, usualmente encontrada em troncos ocos de rvores mortas no cho; I - Melipona rufiventris flavolineata; J - Frieseomelitta sp.Desenho de J. Camargo, reproduzido de Camargo & Posey (1990), com permisso do autor.

  • 3636

    Ilustrao 4: Figura 3. Corte longitudinal de um oco de rvore, mostrando o esquema de um ninho de meliponneo e respectiva nomenclatura Kayap: abu (batume), m--kre (pote de mel), nhum--kre (pote de plen), apynhkra-dj (clula de cria), kra-kuni (favo de cria), kupudj (involucrum, lamelas), p--a-ri-a-dj (pilar de sustentao dos favos), abu-kr-kryre (batume inferior com canais de drenagem), nhinh-dj (pote aberto), eijkwa (estrutura de entrada do ninho), eijkwa-kr-kr (galeria de entrada), kra-ku-pu-dj (casulo) e kuroro (lamelas, capa do ninho). Desenho de J. Camargo, reproduzido de Camargo & Posey (1990), com permisso do autor.

  • Dentro destes ninhos, as abelhas guardam seus alimentos (mel e plen) em potes ovalados, feitos de cerume. Conservam, tambm a, os favos de cria, que podem ser horizontais, em forma de disco, de espiral ou de cacho. No entanto, a maioria dos meliponneos constroem os favos de cria em forma de placas horizontais cujas clulas ou alvolos se abrem para cima. Estas placas se sobrepem sendo separadas por pilastras de cera, permitindo a passagem de abelhas entre as placas. O mel e o plen so armazenados em potes de cera ovais com volume varivel entre as espcies, normalmente os potes de plen ficam mais prximos aos favos de cria. Outros tipos de arranjos das clulas de favos e reservas de mel e plen j descritos sero listados a seguir:

    a) alvolos de cria isolados em forma de cacho, o mel e o plen so colocados em potinhos redondos (Hypotrigona).

    b) alvolos de cria isolados e agrupados em cachos, porm o mel depositado em potes ovais e o plen em tubos de 3 at 15 cm. Isto ocorre no grupo das Frieseomelitta: marmelada, mirim-preguia, moa branca.

    c) alvolos de cria isolados mas grupados verticalmente como uma cortina. S h um caso descrito pelo Dr. Paulo Nogueira-Neto em Scaura longula.

    d) alvolos de cria verticais grupados em favos horizontais superpostos (Melipona, Trigona, Scaptotrigona, Oxytrigona, Geotrigona, Cephalotrigona, Partamona, Plebeia, etc).

    e) potes cilndricos organizados em crculo ao redor dos favos de cria descrito por Nogueira-Neto em guira (Geotrigona mombuca).

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  • f) alvolos arranjados em favos verticais duplos. S conhecemos um caso, na frica: Dactylurina staudingeri.

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    Ilustrao 5: Uruu visitando margarida (foto: Warwick E. Kerr).

  • Warwick E. KerrGislene A. CarvalhoVania A. Nascimento

    5 5. Diviso de Trabalho

    Sumrio 5.Diviso de Trabalho.......................................................... 39

    a)Coleta de Nctar, Plen, Resina e Barro.................. 40 b)Produo de Mel...................................................... 42 c)Comunicao........................................................... 43 d)Defesa...................................................................... 47

    A diviso geral do trabalho realizado pelas operrias de meliponneos se modifica de acordo com suas idades e com as necessidades da colnia.4, 33, 40, 41, 57, 72, 84 Nas primeiras horas de nascimento as abelhas realizam a limpeza corporal, mas a maior parte do tempo permanecem imveis sobre os favos de cria. Nos prximos dias as operrias manipulam cera raspando as clulas; um mesmo grupo constri clulas de cria, participa no processo de postura e aprovisiona os alvolos de cria. A partir do 14 dia so lixeiras internas e aps o 25 dia so guardas, receptoras de nctar, desidratadoras de nctar, ventilam a colmeia e saem para o campo em busca de plen, nctar, barro, resina e, raramente,

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  • gua. Dentro do ninho as operrias esto continuamente construindo novas clulas de cria, formando favos horizontais ou, dependendo da espcie, em cachos. A rainha e os machos no tomam parte deste processo. A rainha, alm de sua funo reprodutiva, tambm mantm a coeso da colnia, por meio de atos ritualizados com as operrias e pela liberao de feromnios. A principal funo dos machos de meliponneos, em praticamente todas as espcies estudadas, de copular com as rainhas jovens; em muitas espcies os machos produzem cera 27 e trabalham com ela 50 e, em algumas espcies, tambm podem desidratar o nctar. Os meliponneos produzem cera nos tergitos abdominais (nas costas), enquanto que as Apis produzem nos esternitos (barriga).

    Um dado interessante obtido por Waldschmidt (comunicao pessoal) que a abelha-guarda, alm de sua funo de proteo para no permitir a entrada de inimigos , tambm, extremamente importante para no permitir que as abelhas jovens (que ainda no possuem musculatura adequada) saiam da colmeia e morram por no conseguirem voar. Esta pesquisadora tambm observou em Melipona quadrifasciata 84 que ocorre uma flexibilidade comportamental, ou seja, mesmo seguindo uma diviso etria de trabalho, na ausncia de operrias de qualquer idade, as outras retomam estas atividades e assim completam o quadro de trabalho a ser realizado na colnia.

    a) Coleta de Nctar, Plen, Resina e Barro

    As operrias trazem resinas das rvores e as acumulam perto do tubo de entrada dentro da colmeia, muito semelhante ao que feito pela Eulaema.65 A cera recm-produzida acumulada nas margens dos favos ou do invlucro, em

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  • pequenas protuberncias, quase esfricas na extremidade. Para construir invlucros ou pilastras, potes, alvolos, as operrias misturam a cera com resina. Se colocarmos cera moldada de Apis, muitas espcies usam-na em suas construes, outras espcies jogam-na fora.

    As abelhas sem ferro coletam plen e nctar para alimento da colmia. Nessa misso as operrias saem da colnia procura de flores polinferas e nectarferas.

    Roubick e Buchamann 69 estudaram espcies de Melipona e Apis mellifera. Eles observaram que as operrias campeiras de uma colnia de M. compressipes triplarides, em dois dias de observao, fizeram: 1176 viagens nas quais trouxeram plen, 1068 viagens em que trouxeram resina ou barro, 5368 em que coletaram nctar. Estas abelhas campeiras coletam usualmente plen das 6 s 9 horas e nctar das 10 s 13, pouco trabalhando aps as 14hs. A Melipona compressipes fasciculata foi domesticada pelos ndios do Maranho e tem um desenvolvimento muito superior s compressipes de outros estados e pases.

    O plen armazenado na colmeia em potes de cera do mesmo tamanho que os de mel. Quando as abelhas campeiras chegam com plen, elas o deixam nos potes retirando-o da corbcula com auxlio das patas medianas. Algum tempo depois as abelhas regorgitam substncias glandulares dentro do pote com plen para que este fermente e possa ser consumido pelas abelhas.

    Kerr,50 em suas observaes com Melipona compressipes, verificou como esta abelha coleta plen: a operria retira o plen das anteras das flores, passando-o por dentro para as corbculas, nas patas posteriores. Em anteras porferas, ela segura as anteras e vibra-as com suas mandbulas de maneira a jogar o plen sobre o seu corpo que,

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  • da, levado s corbculas. Em alimentadores artificiais, com farinha de soja e glutenose as Apis no caem, mas as meliponas sim devido a passarem o plen por entre as patas.

    b) Produo de Mel

    Quando a tiba vai coletar nctar, a abelha estende sua lngua formando um canal sugador de lquido aucarado. Assim o nctar vai direto ao papo de mel ou estmago de nctar, onde permanece at chegar colmeia. Depois, este nctar entregue a abelhas receptoras e colocado em potes onde ser desidratado at atingir a concentrao de acar aproximada de 70%.

    O nctar desidratado por ventilao, ou seja, a operria desidratadora, que tem nctar no papo de mel o traz novamente lngua expondo-o frente a uma corrente de ar feita por movimentao de asas de outras operrias; assim que a gotinha se esfria suga-a para dentro por poucos segundos e a traz novamente; esse movimento de vai e vem da lngua ao papo, expondo e engolindo a gota de nctar faz evaporar a gua at chegar concentrao ideal de acar.

    Um aspecto importante diz respeito ao uso do mel de meliponneos. "Em vrias partes do Brasil o mel das abelhas sem ferro tem maior procura e preo mais alto que o das Apis. Assim na Amaznia com o mel da jandara (Melipona crinita) e uruu-boca-de-renda (Melipona seminigra); no Maranho e Piau com o mel da tiba (Melipona compressipes); no Cear e Rio Grande do Norte com o mel da jandara (Melipona subnitida); no Nordeste at o sul da Bahia, com o mel da uruu do Nordeste (Melipona scutellaris); em Minas, So Paulo e Paran com os mis da mandaaia (Melipona quadrifasciata), da guarupu (Melipona

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  • bicolor), manduri (Melipona marginata) e jata (Tetragonisca angustula).

    Vrios mis, polens, geoprpolis de meliponneos vm tendo uso medicinal, porm sem critrio. Um estudo desse material poderia dar indicaes melhores, mais precisas e mais cientficas sobre a utilizao medicinal desses produtos."40

    Uma virtude do mel que ele pode substituir o acar como adoante, explorando e incrementando a diversidade florstica que existe nas matas. Antes da industrializao, o mel de abelhas era o principal adoante na Europa e em outras regies do mundo. Por isso, acreditamos que a importncia da produo de mel na indstria de alimentos aucarados dever crescer, na medida em que cresce a conscincia ecolgica dos consumidores.

    c) Comunicao

    As abelhas so organismos que apresentam diversos mecanismos de comunicao para fontes alimentares e locais de nidificao. Utilizam para isto recursos sonoros, qumicos, visuais e contatos fsicos (Fig. 4). Vamos aqui nos ater s informaes existentes sobre as abelhas indgenas brasileiras.

    A forma mais primitiva de comunicao ocorre nas mamangavas (Bombus) onde as campeiras chegam ao ninho com as corbculas cheias de plen. As operrias irms comem este plen ainda nas patas da

    abelha campeira e, ento, o odor presente nesta amostra de

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  • plen orienta as demais abelhas sobre a localizao da fonte de plen com o mesmo odor. No entanto, no indica distncia nem orientao.

    As abelhas dos gneros Trigonisca, Frieseomelitta (marmelada, moa branca), jata e Duckeola informam suas companheiras assim que adentram a colmeia. As operrias correm batendo umas nas outras. Desta forma, dispersam o cheiro do alimento e a correria indica que aquele alimento que elas vm trazendo est disponvel em algum lugar.

    As abelhas jata (Tetragonisca), mirim, mosquito (Plebeia) tambm chegam colnia correndo e batendo umas nas outras. Durante este "zigue-zague" elas produzem um som audvel estimulando outras operrias a sarem do ninho e procurarem uma fonte de alimento com o mesmo odor.

    As partamonas tambm estimulam as outras operrias assim que chegam na colmeia com alimento. Em seguida, uma abelha-guia volta fonte sendo acompanhada por algumas operrias. No trajeto a guia libera no ar, pela glndula mandibular, uma substncia que auxilia as demais em sua orientao. bvio que uma ventania atrapalha essa comunicao.

    A comunicao se tornou mais elaborada em ira (Nannotrigona testaceicornis) onde a operria campeira ao chegar com alimento reparte metade dele com outra operria produzindo um som. Estas duas repartem com mais outras duas e assim em cadeia at que um grupo de aproximadamente 50 abelhas tenham experimentado do alimento e conheam o seu odor. Durante esta distribuio h sempre a produo do som caracterstico, em seguida as 50 ou mais abelhas saem e voam juntas para todos os lados em busca da fonte. Algumas operrias, depois de encontrarem e

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  • coletarem o alimento, voltam para casa e redistribuem para aquelas que no acharam e para mais outro lote de abelhas, formando um novo grupo de campeiras. Esse processo repetido at que um bom nmero de operrias esteja coletando na fonte indicada.

    Nas meliponas mandaaia, uruu, tiba, jandara, guarupu, ocorre o que Kerr denominou de "pequena trilha de cheiro". As campeiras chegam colnia e distribuem alimento s outras operrias, fazendo um som caracterstico que indica a distncia

    da fonte. Quanto mais longo o som, mais longe se encontra a fonte de alimento. Na fonte de alimento, a operria, aps encher em parte o papo de nctar, marca a flor com uma secreo da glndula mandibular, voa a 1 ou 2 metros e marca novamente. Conforme a espcie, marca uma terceira vez. Isso ajuda as novatas a identificarem a fonte de alimento.54, 51

    Esta trilha de cheiro ainda mais aprimorada na comunicao das abelhas mandaguari (Scaptotrigona postica), mombuca (Cephalotrigona), irapu (Trigona spinipes), sanharo (Trigona truculenta), mombuca do cho (Geotrigona) e tatara (Oxytrigona). Essas abelhas fazem as marcas de cheiro, de distncia em distncia at a fonte. A distncia entre as marcas varia conforme a espcie: 1 metro em Scaptotrigona, 7 em Trigona, 5 em Cephalotrigona. Depois voltam fonte de alimento e refazem as marcas at a metade da trilha, retornam colnia, partem novamente fonte de alimento e reforam as marcas at um tero da trilha.

    4545

  • Desta forma h uma melhor "impregnao" do cheiro na trilha, aumentando a eficincia da comunicao.55, 56

    Um comportamento interessante foi observado durante o uso do alimentador externo.

    s vezes, a irapu (Trigona spinipes) descobre o alimentador e gradualmente consegue expulsar qualquer abelha dali. Vejamos como isso ocorre: em uma das pontas do alimentador retangular (veja modelo em anexo) pousa uma irapu. Lambe um pouco de xarope e inicia uma trilha de cheiro entre o alimentador e sua colmeia. Ela marca o alimentador e, de 7 em 7 metros 47 at a colmeia, coloca uma microgota de feromnio, que possui um odor caracterstico. Poucos minutos depois, chegam as primeiras operrias que

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    Ilustrao 1: Figura 4. Alimentador externo modelo Kerr (foto: Warwick E. Kerr).

  • receberam a mensagem. Agrupam-se num dos cantos do alimentador; o nmero de operrias cresce gradualmente e em pouco tempo ultrapassa a 150 indivduos que chegam ao ponto marcado e vo aos poucos afugentando todas as espcies de abelhas que ali estavam (Melipona scutellaris, Melipona marginata, Melipona quadrifasciata, Apis mellifera, etc). Infelizmente essa situao desfavorece a uruu, por isso, indicado destruir a colnia de Trigona spinipes que se situe mais prxima do alimentador.

    O sistema de comunicao de Apis mellifera mais eficiente que o de Melipona, por isso o nmero de operrias de Apis suplanta o de Melipona scutellaris no alimentador externo, se algumas de suas operrias descobrirem o alimentador. Mas, retirando-se o alimentador, pode-se contar as abelhas mortas em lutas. O resultado de uma de nossas contagens foi: 185 operrias de Apis mellifera, 9 de Melipona scutellaris, 1 de Melipona quadrifasciata. Percebe-se claramente a vantagem que a uruu tem sobre a africanizada na briga, 50 porm, a uruu perde no sistema de comunicao e no nmero de operrias por colmeia.

    d) Defesa

    Os meliponneos so conhecidos como as "abelhas sem ferro" o que nos d a impresso de que so umas pobres indefesas. Entretanto encontramos, de uma maneira geral, alguns interessantes comportamentos de defesa neste grupo:

    . Muitas espcies tm operrias que se enrolam no cabelo e pelos grudando resina e mordendo o inimigo fortemente (por exemplo: Scaptotrigona postica, Trigona). A mordida to forte em algumas espcies que, s vezes, a abelha perde o trax e o abdome ficando com sua cabea presa pelas mandbulas, ao inimigo. Este comportamento

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  • geralmente acompanhado por uma grande revoada das abelhas ao redor do inimigo.

    . Um mecanismo curioso utilizado por Melipona crinita, Melipona rufiventris e Melipona seminigra cujas operrias fazem bolinhas de resina e cera e tapam a entrada da colmia numa situao de perigo e s retiram estas bolinhas quando passa o perigo. A Lestrimellita limao a abelha ladra que provoca este tipo de bloqueamento na entrada.

    . Em Partamona as abelhas constroem um "ninho falso" que engana o inimigo (tamandu e tatu, por exemplo) quando este tenta agredir a colnia. Este ninho fica na camada mais externa e o ninho verdadeiro se localiza mais profundamente tornando-se inacessvel ao agressor.

    . A Trigona hipogea coloca fezes nos potes mais externos do ninho. Quando o tatu tenta cav-lo, o terrvel cheiro de fezes faz com que ele desista do seu intento.

    . O caso mais agressivo de defesa das abelhas sem ferro o da Oxytrigona tataira (tatara, mija-fogo ou caga-fogo) que produz uma secreo custica (cido frmico) nas glndulas mandibulares, liberando sobre o inimigo.

    . O Dr. Paulo Nogueira-Neto informou-nos que em Trigona (Tetragona) silvestrii Friese, as operrias fingem-se de mortas quando so atacadas, permanecendo imveis momentaneamente.

    . Melipona quadrifasciata coloca pequenos blocos de barro prximos entrada de maneira que toda a regio ao redor da entrada fique infestada de musgos e fungos disfarando a entrada verdadeira.

    . Outra inteligente estratgia foi observada em Trigona (Partamona) testacea subespcie helleri Friese 83 na

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  • qual as abelhas constroem seu ninho entre bromeliceas que promovem um disfarce do ninho com os restos foliares que caem entre as folhas das bromlia . Vrias espcies (Trigona hyalinata, Melipona quadrifasciata, Melipona favosa, Melipona scutellaris, Melipona rufiventris, Lestrimellita limao) conseguem imitar a colorao de outros insetos (mimetismo) agressivos e assim esto, de certa forma, protegidas contra ataque de inimigos.

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    Ilustrao 2: Abelhas em banana (Foto Gislene A. Carvalho)

  • Warwick E. Kerr

    6 6. Enxameagem

    Sumrio 6.Enxameagem.................................................................... 50

    a)Procura e Escolha da Nova Moradia........................ 51 b)Fechamento de Frestas ............................................ 51 c)Transporte de Cera, Mel e Plen da Colmia-Me para o Novo Local........................................................ 52 d)Enxame de Machos.................................................. 53 e)Instalao da Rainha Virgem................................... 54 f)Fecundao da Fmea Frtil..................................... 54 g)Incio da Postura...................................................... 55

    Em Apis o grande desenvolvimento da colmeia, aliado a fatores climticos e hormonais, determinam a enxameao. Parece que o mesmo ocorre nas Melipona. Existem poucos trabalhos sobre enxameao de meliponneos. A seguir sero sumariadas as observaes de Nogueira-Neto 61 e Kerr: 49

    a) Procura e Escolha da Nova Moradia

    Quando a colnia est apta enxameao verifica-se em determinados pontos, onde h ocos em parede, ou em pedra,

    5050

  • ou em tronco de pau, etc, a presena de um certo nmero de operrias voejando procura de um local para estabelecer a nova moradia. As abelhas parecem preferir stios j visitados no ano anterior ou lugares em que j houve outra colnia, talvez por ter as mesmas caractersticas ecolgicas, ou mesmo pelo simples aproveitamento da cera. 62, 49, 53, 32

    Quanto preferncia por um lugar j visitado no ano anterior, observou-se nos meses de setembro a novembro a visita, a um mesmo stio, por operrias de Plebeia droryana durante quatro anos (1944, 1945, 1946, 1949). Quanto escolha prvia do local verificou-se em P. (Friesella) schrottkyi, em julho e agosto de 1949, um detalhe interessante, aparentemente na primeira semana da "escolha". Em Rasgo, SP, diversas operrias optaram por vrias fendas do assoalho de uma casa. Dois dias depois, um grande nmero de fendas foi abandonado, ficando somente trs; aps uma semana as abelhas haviam optado por somente duas, abandonando as demais. Assim que o lugar estava escolhido as abelhas estabeleceram a guarda.

    b) Fechamento de Frestas

    Assim que as operrias escolhem um determinado local para abrigar a nova colnia, iniciam uma operao de calafetamento de todas as frestas e a construo do orifcio de sada (Nogueira Neto, c.p.). Verificou-se, em P. (Friesella) schrottkyi que mesmo quando haviam diversos locais em experimentao, as operrias de cada um deles iniciavam o processo de lacramento das frestas.

    5151

  • c) Transporte de Cera, Mel e Plen da Colmia-Me para o Novo Local

    Este um dos passos mais importantes, que separa rigidamente o tipo de enxameao dos Meliponinae do existente entre os Apinae.

    Aps a calafetagem da nova colmeia, as operrias, agora em nmero crescente, iniciam o transporte de cera da colmia-me para a nova. Tal fato foi observado pela primeira vez e experimentalmente demonstrado por Nogueira-Neto (op. cit.) em Tetragonisca angustula, Plebeia droryana, Friesella schrottkyi, Nannotrigona testaceicornis, Trigona hyalinata, e por Kerr em Melipona melanoventer, sendo, provavelmente, patrimnio comum dos Meliponinae.

    Outro detalhe, sugerido por Nogueira-Neto, foi observado em Tetragonisca angustula e em Melipona melanoventer. Trata-se do transporte de mel e de plen. Em Tetragonisca angustula verificou-se que as operrias entravam sem plen nas patas e, no entanto, alguns potes comeavam a encher-se desse material. Kerr verificou que o plen era trazido no "papo" das operrias, razo pela qual o plen da colnia incipiente, ao invs de ser granulado, era pastoso. Esse processo utilizado para "saque" por operrias de Lestrimellita. Como esse no o mtodo normal de transporte de plen, deduziu-se que o material era retirado pelas operrias na colnia-me. Constatou-se na colnia de Melipona melanoventer, ainda sem rainha, a existncia de "invlucro ou envoltrio de cera", e de potes de plen e mel. Verificou-se assim o estabelecimento de uma verdadeira colnia parasita, at seu suficiente equipamento para autossustentao. Como pondera Nogueira-Neto (op. cit.), esse hbito mais seguro para garantir o sucesso da enxameao que aquele utilizado por Apis mellifera, porm,

    5252

  • como infere Kerr, a distncia entre colnia-me e colnia-filha no pode ser muito grande. Sugerimos que isso (e mais o isolamento que o processo promove) seja o responsvel pela existncia de mais de 300 espcies nos Meliponneos e apenas 8 nos Apinae.

    d) Enxame de Machos

    Depois do exposto, os machos expulsos da colnia-me e de outras colmeias vizinhas comeam a chegar em nmero cada vez maior, durante o perodo de quatro a cinco dias, aproximadamente, estacionando em galhos, troncos ou objetos prximos nova colmeia; uma grande parte deles fica voejando ao redor da colmeia, possivelmente espera do voo nupcial da nova rainha.

    Michener (1946) observou diversos enxames de machos em Trigona fulviventris, Scaura latitarsis, Nannotrigona testaceicornis, Melipona favosa e Partamona testacea. H expulso obrigatria de machos em diversas colmeias, o que os obriga a procurar comida e desidratar o nctar coletado. Eles se aglomeram nos lugares onde h colnias com falta de rainhas fecundadas, o que constitui o principal fator responsvel pela fecundao livre nos Meliponinae. Fatos dessa natureza foram observados em Scaptotrigona pectoralis. Abreu et al. 01 constataram que os machos de Melipona scutellaris so expulsos da colnia entre 9 e 11 dias.

    e) Instalao da Rainha Virgem

    Suprida a nova colmeia de cera, mel e plen, tendo um nmero suficiente de operrias, e, aps haver um bom nmero de machos que, s vezes, atinge propores enormes,

    5353

  • uma rainha virgem (no a fecundada como no caso de Apis mellifera) muda-se para a nova colnia. Conforme observaram em Tetragonisca angustula, 53 a rainha virgem em primeiro lugar, voa para a nova colmeia, para depois ser fecundada. A ida da nova rainha, em alguns casos, parece ser acompanhada de grande nmero de operrias, como foi verificado por Peckolt,74 em Cantagalo, com Trigona spinipes; essa observao , no entanto, posta em dvida quanto sua interpretao por diversos pesquisadores.

    f) Fecundao da Fmea Frtil

    Este detalhe no mecanismo de reproduo dos Meliponinae foi primeiramente observado 39 em Melipona quadrifasciata. Nessa observao foi constatado que, aps a colnia ter ficado rf, as operrias continuam a matar rainhas virgens at "perceberem" que no possuem rainha fecundada. Na experincia realizada, as operrias mataram virgens at quase dois dias aps a rainha ter sido retirada. No sexto dia de observao, uma rainha virgem saiu da colmeia, executou um voo nupcial que durou 4 minutos e meio e, ao tentar entrar novamente na colnia, foi capturada e dissecada. Os autores constataram que toda a genitlia do macho, incluindo o pnis e as vesculas seminais, estavam presos dentro da genitlia feminina. Tal fato foi tambm constatado em Melipona compressipes. Esse um passo em que os Meliponini tambm diferem da Apis mellifera, pois nesta, a nica parte do macho que retirada o pnis, e a obstruo da vagina feita pela secreo das glndulas acessrias do macho, que servem de tampo momentneo, talvez para evitar a sada dos espermatozoides para o exterior. A rainha de Apis mellifera fecundada por 8 a 17 machos. Nos Meliponinae essa operao executada pela genitlia, pnis e vesculas

    5454

  • seminais, que ficam enganchados na rainhas pelos gonstilos comprimidos pelos ltimos segmentos abdominais da fmea e impedem uma nova inseminao. Logo a rainha fecundada por apenas 1 (um) macho. Tambm, o aparelho genital masculino nos Meliponinae no possui glndulas acessrias.

    g) Incio da Postura

    O incio da postura da fmea aps a fecundao, varivel, depende do alimento existente na colmeia e do nmero de operrias. Assim, verificou-se em duas colnias novas de Tetragonisca angustula que as rainhas inciaram postura, aproximadamente, cinco ou seis dias aps constatada sua presena na colmeia. Por perda da rainha fecundada, constatou-se, em diversas colnias j estabelecidas, uma durao de tempo varivel para o incio da postura. Provavelmente, esta durao, aps enxames, ser idntica, por isso so dados a seguir alguns exemplos:

    . Melipona quadrifasciata: desde 6 at 20 dias;

    . Melipona scutellaris: 6 dias;

    . Melipona rufiventris: 16 dias;

    . Melipona bicolor: 30 dias;

    . Melipona compressipes: de 3 a 8 dias;

    . Melipona favosa orbignyi: 10 dias.

    Foi observado, em Tetragonisca angustula, numa das colnias recm-fecundadas, que a rainha iniciou sua postura em clulas colocadas em planos diferentes,

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  • unidas entre si por pequenas pilastras de cera, dando uma ideia do conjunto de alvolos que se verifica nas colnias das espcies do tipo Frieseomelitta silvestrii. S aps alguns dias que, com aumento da postura, as operrias de jata iniciaram paulatinamente a construo em forma de favos organizados, quer em camada, quer helicoidalmente. Isso no geral pois, na outra colmeia de Tetragonisca angustula citada, as operrias, desde o incio, construram seus alvolos em camadas. O tempo de durao de todas essas operaes de enxameao varia muito de caso para caso.

    O processo de enxameagem mais rpido observado foi o que saiu da colmeia n 94 para a n 100; ele se inciou em 1 de janeiro de 1950, e 18 dias mais tarde a rainha ps o primeiro ovo (em Rio Claro, Departamento de Biologia Geral).

    Em Melipona compressipes comum a rainha botar em 3 a 5 dias. As operrias, em colnias fortes, constroem uma clula de cria, enchem-na de alimento para a rainha alimentar-se livremente e a cada 20 a 30 minutos pem 4 a 8 ovos que a rainha fecundada come avidamente. 50

    Os detalhes do processo de oviposio foram muito bem estudados por Sakagami, Zucchi e colaboradores e sero relatados a seguir.

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  • Luci Rolandi Bego

    7 7. Postura e Desenvolvimento

    Sumrio 7.Postura e Desenvolvimento..............................................57

    a)Aprovisionamento e Postura das Clulas de Cria ...60 b)Ovos Trficos ou Nutritivos das Operrias.............61 c)Produo de Machos................................................ 63 d) Substituio de Rainhas nas Colnias.................... 65

    Um dos aspectos extremamente interessantes da biologia dos meliponneos o seu especfico processo de postura. Diferentemente do que ocorre em Apis, onde as larvas so alimentadas pelas operrias diretamente (pois as clulas de cria abertas ficam em contato direto com todos os membros da colnia), nos meliponneos as operrias constroem as clulas, alimentando-as com plen, mel e, provavelmente, secreo de glndulas excrinas, at aproximadamente 3/4 do volume da mesma. A rainha, em muitos casos, alimenta-se deste contedo e, logo aps, realiza sua postura. Posteriormente, as operrias fecham estas clulas, encerrando o contato ovo adulto.

    O ovo eclodir, a larva passar por um processo de desenvolvimento, at chegar fase de pr-pupa. Este desenvolvimento implica na ingesto de todo alimento que a

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  • clula contm. Depois deste perodo, a pr-pupa ir tecer o seu casulo e a clula de cria ficar fechada com o mesmo. As outras abelhas da colnia retiraro a cera que envolve o casulo. Depois de um certo tempo, o adulto emergir (Fig. 5).

    O processo de postura e oviposio das clulas de cria bem varivel entre as diversas espcies de

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    Ilustrao 3: Figura 5. Estdios ontogenticos de Meliponinae (no esquema, representado por Melipona compressipes fasciculata), reconhecidos pelos Kayap: apynh-kra-dj (clula de cria); ngr-kang (ovo lquido); kra-nu (larva de 1 estdio), kra-ngri-r (larva de 2 estdio), kra-rhyn (larva de ltimo estdio, larva pr-defecante, larva amarela); kra-tum (larva ps-defecante), kra-tytx (prepupa); kra-pt (pupa no pigmentada), kra-arup-ka-toro (pupa pigmentada, com movimentos); nhy-po-nu (abelha emergindo, imago), nhy-jaka (abelha recm-emergida, fase de toilette).

  • meliponneos e a descrio deste aspecto tem se tornado cada vez mais um importante campo de pesquisa para anlises da proximidade filogentica das espcies. Isto significa que, paralelamente aos estudos morfolgicos tradicionais, tais observaes etolgicas (isto, , que dizem respeito ao comportamento) serviro para juntar e separar grupos de gneros nos Meliponinae. 68 Trabalhos com esboos deste tipo podem ser citados para vrias espcies: Mourella caerulea, Nannotrigona testaceicornis, Trigona (Tetragonula) carbonaria e Plebeia droryana, e outras.

    a) Aprovisionamento e Postura das Clulas de Cria

    Este tema um tanto complexo e especfico. Desta forma, procuraremos simplificar os eventos que ocorrem durante o processo de oviposio para que o leitor tenha uma ideia geral deste assunto, baseado nos trabalhos de autores brasileiros e japoneses 70, 86 que fazem uma sntese de artigos anteriores.

    A cadeia de comportamentos que forma o processo de postura absolutamente mpar entre os insetos eu-sociais. Esta singularidade determinada pelas seguintes caractersticas: aprovisionamento (alimentao do tipo massal, ou seja, feita de uma s vez), ciclo ininterrupto de construo de clulas de cria, demolio de clulas (so usadas normalmente uma nica vez) e, na maioria dos grupos, uma marcante interao entre a rainha e as operrias,86

    O ritmo da colnia segue perodos e fases de atividades que podem variar entre os gneros dos meliponneos.

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  • Em resumo, as atividades do processo de aprovisionamento e postura obedecem seguinte sequencia geral de eventos, com variaes de acordo com a espcie:

    1. as operrias constroem as clulas de cria;2. estando prontas, a rainha visita algumas

    vezes o favo onde esto agregadas estas clulas;3. em uma das visitas da rainha, as operrias

    iniciam uma agitao, com seguidas inseres de seus corpos dentro das clulas;

    4. a rainha ento pode cruzar o favo, ou permanecer parada prxima a uma determinada clula;

    5. na segunda hiptese, a imobilidade da rainha em frente da clula o sinal para o incio do processo de oviposio;

    6. a seguir as operrias descarregam o alimento larval no interior das clulas de cria; este comportamento chamado de descarga de alimento ou aprovisionamento;

    7. depois da fase de alimentao, a rainha efetua as posturas e, finalmente;

    8. as operrias fecham a clula de cria.Estes comportamentos e suas variaes so

    espcie especficos, o que significa que diferentes espcies podem ser identificadas e separadas entre si a partir da observao de suas peculiaridades de comportamento.

    importante salientar que vrios outros tipos de interaes entre a rainha e as operrias podem ocorrer nos intervalos entre posturas, ou durante os perodos que antecedem a oviposio. Alguns exemplos destes comportamentos foram descritos anteriormente quando tratamos da dominncia ritualizada.

    6060

  • b) Ovos Trficos ou Nutritivos das Operrias

    Este tema est relacionado com o processo de oviposio da rainha, uma vez que em grande parte dos meliponneos at agora estudados as operrias botam ovos que tm como finalidade principal alimentar a rainha. Tal postura, exceto em algumas espcies, realizada na fase de oviposio e classificada em dois tipos principais. 70, 68, 84, etc.

    O primeiro tipo (mais raro) caracterizado pela ausncia de postura de ovos trficos em condies normais (isto , em colnias com rainhas). Este tipo subdividido em dois subtipos: a) ovos trficos botados somente em colnias rfs de rainha (Leurotrigona); b) ovos trficos inexistentes, ou seja, no so produzidos pelas operrias, nem em condies de orfandade e nem quando a rainha est presente na colnia (Frieseomelitta spp e, provavelmente, Duckeola).

    O segundo tipo (mais comum) caracteriza-se pela postura de ovos trficos em condies normais. Operrias de Friesella botam em condies de orfandade e superpopulao (com rainha). Estes ovos so botados no interior das clulas de cria.

    Postura de os ovos fora da oviposio ocorre em muitas Plebeia e em Hypotrigona braunsi. So ingeridos pelas operrias e rainha. H tambm o caso de Lestrimelitta em que a poedeira, com o corpo ereto, bota fora do perodo de oviposio da rainha e ingere os prprios ovos. Geotrigona sp B. oviposita sobre o favo, perto da clula e Geotrigona sp A., na margem da clula. Em ambos os casos, a alimentao de cria no se iniciou.

    Na maioria das espcies at agora estudadas, as operrias botam depois da fase do aprovisionamento ou alimentao das clulas de cria, com algumas diferenciaes

    6161

  • entre espcies. Este o caso das espcies e gneros, Plebeia minima, Partamona spp, Nannotrigona, Trigona spp, Tetragona, Tetragonisca, Oxytrigona, Cephalotrigona, Lepidotrigona ventralis. Os ovos so do mesmo tamanho ou ligeiramente maiores do que os da rainha e so botados na margem das clulas de cria. Scaptotrigona spp e Schwarziana apresentam o mesmo tipo de postura mas, nestes gneros, os ovos so muito maiores que os da rainha.

    Finalmente, existem casos em que os ovos trficos so botados no centro do alimento larval, da mesma maneira que o ovo da rainha. Em certos casos estes ovos so pouco maiores ou iguais ao ovo da rainha (Celetrigona e Paratrigona). Em Melipona spp e Meliponula os ovos trficos das operrias so botados no centro do alimento larval, mas so menores que os ovos da rainha.

    A oviposio de ovos trficos pelas operrias serve, em princpio, para a alimentao da rainha, porm, como j foi frisado, em alguns casos as prprias operrias podem ingeri-los.

    importante comentar a diversidade na postura de operrias, com relao aos processos de estimulao e inibio da produo de ovos pela rainha. Enquanto em certas espcies a rainha pode produzir algum feromnio, ou usar de algum outro tipo de mecanismo que impedem a postura das operrias, em grande parte dos casos, a prpria rainha que pressiona as operrias para que estas ovipositem.

    c) Produo de Machos

    Alm da funo de nutrir as rainhas, as operrias, atravs de suas posturas, produzem machos. Este processo decorre do fato da operria ser uma casta que no tem possibilidade biolgica de se acasalar. Assim, seus ovos sempre sero

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  • haploides (n), ao contrrio da rainha, cujos ovos sero diploides (2n) se fecundados, ou haploides (n), em caso contrrio. Vimos anteriormente que a rainha tambm pode produzir machos diploides (2n), mas esses machos em geral so estreis, ou cegos, ou tm nmero de espermatozoides muito menor, ou so mortos pelas operrias ao emergirem dos favos (Melipona), ou so comidos pelas operrias antes de terem 3 dias de vida larval (Apis mellifera). Alm disso, rainhas que produzem machos diploides tambm so mortas pelas operrias. 13 Desse modo, a quase totalidade dos machos, neste sistema dito haplo-diploide, sempre tero a metade do nmero de cromossomos da rainha e operrias.

    Em Nannotrigona (Scaptotrigona) postica, praticamente 90% dos machos so produzidos pelas operrias. Esta espcie produz, alm do ovo nutritivo muito grande, um outro tipo de ovo - parecido com o da rainha - que geralmente botado durante a operculao da clula de cria, junto ao ovo da rainha, e que se desenvolver primeiro. A pequena larva ingerir o ovo e/ou larvas recm-eclodidas da rainha. Desse modo, desta clula emergir um macho. 10, 8

    Em Melipona spp e especialmente em Melipona quadrifasciata, o ovo botado pela operria no interior da clula de cria igual ao ovo da rainha. Antes de fazer a oviposico nesta clula, a rainha poder ingerir o ovo ou no. Nesta ltima hiptese, aps a operculao os dois tipos de ovos ficam encerrados dentro da clula. possvel que, do mesmo modo que ocorre na espcie citada acima, desta clula emergir um macho. Neste caso difcil dizer se o macho emergiu do ovo da operria ou da rainha porque, em Melipona, a rainha tambm produz ovos que daro origem a machos haploides.73

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  • Tambm h os casos de Frieseomelitta e Duckeola, principalmente o primeiro gnero que foi bastante estudado,78, 66, 23 em que as operrias so incapacitadas fisiologicamente de produzirem ovos, e os machos da colnia so sempre produzidos pela rainha.

    d) Substituio de Rainhas nas Colnias

    Alm do processo de enxameagem j descrito, pelo qual uma nova rainha sai da colnia velha acompanhada de operrias para fundar uma colnia nova, as colnias de meliponneos, de tempos em tempos, substituem suas rainhas. O perodo de permanncia destas rainhas fecundadas nas colnias varia de espcie para espcie.

    Nas espcies do gnero Melipona as rainhas so produzidas constantemente e em grande nmero, chegando mesmo a 25% das crias, em condies ideais.

    Muitas espcies de Trigonini produzem clulas reais que so maiores que as das operrias e machos; porm tais clulas sempre so encontradas em nmero limitado. Em Scaptotrigona postica pode-se contar at 5 destas clulas por ms, em condies favorveis das colnias. No entanto, h outras espcies cujas rainhas so produzidas mais raramente, em uma determinada poca do ano ou em circunstncias especiais. Estas circunstncias incluem a queda de produtividade da rainha velha e a queda de sua taxa feromonal, ou outros fatores desconhecidos.

    Nestas circunstncias, as rainhas novas (virgens) - que geralmente esto presentes nas colnias em grande parte das espcies estudadas at agora - substituiro a rainha fecundada da colnia. Quando no h substituio, as virgens podem ser mortas pelas operrias.

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  • Interessantes mtodos so postos em prtica pelos membros da colnia quando eles "percebem" a presena de rainhas virgens. Em Melipona quadrifasciata as rainhas virgens so mortas pelas operrias de 2 a 10 dias depois da emergncia, quando no h substituio da rainha fecundada.74 Em geral, as operrias atacam as rainhas virgens de uma forma muito violenta. Em Scaptotrigona postica e Melipona bicolor bicolor (Bego, informao pessoal) rainhas virgens eram vistas por longo tempo na colnia; depois disto, desapareciam.

    A espcie S. postica em fase de substituio apresentou um ritual muito interessante.75, 6 A rainha fecundada foi morta pelas operrias num processo que durou todo o dia. Este processo consistiu das seguintes etapas: 1) as operrias comearam a perseguir a "velha" rainha; 2) esta ltima procurou o tempo todo livrar-se deste grupo de operrias, correndo pela colnia; 3) em um determinado momento as operrias conseguiram "agarrar" a rainha que inutilmente tentava se libertar; com bolotas de cerume, as operrias comearam a cobrir o corpo da rainha que j estava parcialmente presa com cerume ao assoalho da colnia; 4) este recobrimento foi se intensificando at chegar a um ponto onde observou-se apenas uma bolota de cerume oval (do tamanho da rainha). Neste momento, j no se percebia qualquer movimento; 5) depois de um certo tempo, tal "sarcfago" de cerume foi aberto e a rainha foi encontrada, j morta. Ao abrir cuidadosamente o recobrimento e observar a rainha sob estereomicroscpio, verificou-se que ela estava intacta, sem sinais de ter sido lesada em qualquer parte do seu corpo; 6) ao abrir seu abdmen, verificou-se que a espermateca ainda continha milhares de espermatozoides.

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  • Antes da substituio, tal rainha no mostrava sinais aparentes de velhice.

    Um outro caso observado ocorreu de modo idntico. No entanto, a rainha mostrava sinais de senilidade, ou seja, botava pouco; muitos ovos permaneciam aderidos na borda das clulas e, de vez em quando, a rainha caa do favo. Seu caminhar tambm era lento.

    Quando as rainhas virgens emergem de colnias normais, h uma variao de comportamentos das operrias em relao a elas. Em muitos casos, as rainhas ficam livres circulando pela colnia, at serem mortas. Em outros, existem cmaras feitas com cerume onde a rainha virgem presa e tratada pelas operrias; em algumas espcies, a rainha faz sua prpria priso. Este fato ocorre em vrias espcies de Plebeia, Frieseomelitta varia e, tambm em Friesella. 35, 36, 34, 78, 15

    Existem casos, notadamente no gnero Leurotrigona,78 onde a rainha virgem mantida sob controle ou priso por um grupo de operrias formando uma espcie de barreira para proteger a rainha. curioso que nem sempre as rainhas presas iro substituir imediatamente a fecundada; mas bem verdade que em diversas situaes isto ocorre (Imperatriz-Fonseca, informao pessoal).

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  • Warwick E. Kerr

    8 8. Ciclo de Vida e Longevidade

    Kerr 50 determinou que o ciclo de desenvolvimento da tiba (Melipona compressipes fasciculata) completa-se em aproximadamente 45 dias para a operria e 40 dias para a rainha, desde a oviposio at a emerso do imago. Aps a emerso temos uma mdia de 50 a 52 dias de vida para a operria.

    Em Melipona quadrifasciata (mandaaia) o desenvolvimento total de ovo a imago dura em mdia 39.5; 36.8 e 39.8 dias para operria, rainha e macho respectivamente. Estes valores variam um pouco para Melipona rufiventris (jandara) sendo 42 dias para desenvolvimento total de operria, 39.4 dias para rainha e 45.5 dias para o macho. O desenvolvimento total muito influenciado pela temperatura e pela quantidade de operrias.

    O exemplo mximo de longevidade da rainha fisogstrica (fecundada) numa colnia efetuando posturas de 6 a 7 anos em Melipona compressipes fasciculata (Oliveira e Kerr, informao pessoal). Outras espcies podem ter vidas mais curtas - 1 a 3 anos (Bego, inf. pessoal).

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  • 6868

  • Warwick E. KerrGislene A. CarvalhoVnia A. Nascimento

    9 9. Gentica da Determinao de Sexo e

    Casta.

    Sumrio 9.Gentica da Determinao de Sexo e Casta.....................68

    9.1.Determinao de Sexo............................................... 69 9.2.Determinao de Casta.............................................. 71

    a)Nmero Mnimo de Colnias................................... 72

    O objetivo geral deste livro transmitir informaes sobre a correta criao, manejo e multiplicao de colnias das abelhas brasileiras sem ferro. Porm possvel que o leitor queira compreender o significado biolgico dos mtodos e mincias mencionados aqui. Por isso, vamos explicar, geneticamente, o mecanismo que determina machos e fmeas, assim como as causas genticas que levam diferenciao de castas: operria e rainha. O que vamos relatar um sumrio de 50 anos de experimentos e observaes de pesquisadores brasileiros.

    6969

  • 9.1. Determinao de Sexo

    Os himenpteros, em sua grande maioria so partenogenticos e arrentocos, isto , os machos originam-se de ovos no fecundados (logo tem "n" cromossomos) e as fmeas de ovos fecundados ("2n" cromossomos). Quanto ao seu sistema de acasalamento, os himenpteros podem ser divididos em endogmicos (quando os machos se acasalam obrigatoriamente com suas irms ou mes) e panmticos (quando o acasalamento se d ao acaso). Nos endogmicos h genes masculinizantes e feminizantes que atuam tanto nos machos haploides (com "n" cromossomos) quanto nas fmeas diploides (com "2n" cromossomos). Os genes masculinizantes (M) so total ou parcialmente no-aditivos e os feminizantes (F) so total ou parcialmente aditivos. Assim temos: macho = M>F e fmea = 2F>M. Essa hiptese 23 foi recentemente confirmada por Oliveira 64 verificando que 14% do nmero de molculas de algumas protenas encontradas nos machos aparecem em igual nmero nas fmeas.

    Nos himenpteros panmticos, um dos genes determinadores de sexo feminino mutou de xo para xo1 e, gradualmente, mutou para xo2, xo3... e os genes resultantes passaram a ter determinao dos testculos e ovrios conforme mostra o quadro seguinte:

    7070

  • Macho haploide Fmea diploide Macho diploidex1 x1x2 x1x1

    x2 x1x3 x2x2

    . . .

    x19 x18x19 x19x19

    x20 x19x20 x2