livro azul politicas da gua e educao ambiental web _completo_com mapa

292

Upload: salete-costa

Post on 08-Aug-2015

37 views

Category:

Documents


5 download

TRANSCRIPT

  1. 1. Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos
  2. 2. Repblica Federativa do Brasil Presidente: Dilma Vana Rousseff Vice-Presidente: Michel Miguel Elias Temer Lulia Ministrio do Meio Ambiente Ministra: Izabella Mnica Vieira Teixeira Secretrio-Executivo: Francisco Gaetani Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano Secretrio: Ney Maranho Chefe de Gabinete Substituto: Adriana Cristina Duarte de Almeida Vasconcelos Departamento de Recursos Hdricos Diretor: Marcelo Jorge Medeiros Gerncia de Polticas e Planejamento Gerente: Franklin de Paula Jnior Gerncia de Apoio ao Conselho Gerente Substituta: Mirela Garaventta Gerncia de Apoio Poltica Gerente: Jlio Thadeu Silva Kettelhut Secretaria de Articulao Institucional e Cidadania Ambiental Secretria: Mariana Meirelles Nemrod Chefe de Gabinete: Antoniela de Vicente Borges Departamento de Educao Ambiental Diretor: Nilo Srgio de Melo Diniz Gerente: Renata Maranho Coordenao do Plano Nacional de Recursos Hdricos Diretor de Recursos Hdricos Marcelo Jorge Medeiros Gerente de Polticas e Planejamento Franklin de Paula Jnior Assessora Tcnica Adriana Lustosa da Costa Assistente Tcnica Alfrida Moreira da Silva dos Santos Equipe Tcnica Daniel Duarte Martinelli David Guimares Rocha Geraldo Ges Sandoval Gunter Assis Moraes Leonardo Julian Klosovski Sandra Michelli da Costa Gomes
  3. 3. MINISTRIO DO MEIO AMBIENTE Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano Secretaria de Articulao Institucional e Cidadania Ambiental Braslia, 2013 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos
  4. 4. Organizao Franklin de Paula Jnior e Suraya Modaelli Colaborao Joema Gonalves de Alvarenga Gabriela Freitas Priscila Maria Wanderley Pereira Rachel Landgraf Siqueira Raimundo Nascimento Ricardo Burg Mlynarz Sandra Michelli da Costa Gomes Edio Ministrio do Meio Ambiente Projeto grfico, diagramao e impresso Grfica e Editora Movimento In Memorian Luana Aparecida Barbosa Barreto (relatora da CTEM/CNRH durante o I Seminrio em Salvador, 2009) HamiltonMarquesMagalhes(representantedoCBH-ParanabaduranteoISeminrioemSalvador,2009) NinonMachadodeFariaLemeFranco(representantedasociedadecivilnoCNRHpeloInstitutoIpanema, foi uma das idealizadoras da CTEM/CNRH) CATALOGAO NA FONTE INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVVEIS Poltica de guas e educao ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos / 3.ed., rev. e ampl.; Organizadores: Franklin de Paula Junior e Suraya Modaelli. Braslia: MMA/SRHU, 2013. 288 p. ISBN 978-85-7738-189-0 1. Educao ambiental. 2. Recursos hdricos. 3. Planejamento. I. Paula Jnior, Franklin de. II. Modaelli, Suraya. III. Ministrio do Meio Ambiente. IV. Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano. V. Secretaria de Articulao Institucional e Cidadania Ambiental. VI. Ttulo.CDU (2.ed.) 37:556.18 CDU(2.ed.) 37:556.18 Referncia para citao: PAULA JNIOR, F. de.; MODAELLI, S. (Org.). Poltica de guas e educao ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos. Braslia: MMA/SRHU, 2013. 288 p. P766 Impresso no Brasil Printed in Brazil
  5. 5. PREFCIO Prefcio O reconhecimento do carter transversal, estratgico e estruturante da gua para as polticas pblicas e a governana ambiental global, pela Conferncia das Naes Unidas sobre Desenvolvimento Sustentvel (Rio+20), vai informar a elaborao futura dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentvel. A gua recurso diretamente afetado tanto pelas alteraes do clima como pela destinao dos resduos slidos. Um processo acelerado de urbanizao, em meio a um cenrio de mudanas climticas e ambientais globais, torna imprescindveis as aes de difuso de informaes e de mobilizao social para a preveno de desastres de origem climtica e pede mudana drstica nos padres de produo e consumo. Nesse sentido, a promoo de processos continuados e permanentes de educao ambiental, de comunicao e de mobilizao social para a gesto de guas constituem iniciativas estratgicas fundamentais para assegurar a promoo do desenvolvimento sustentvel. Temos feito nosso dever de casa. Nossos avanos na agenda socioambiental como a reduo dos gases de efeito estufa, com a queda brutal no processo de desmatamento da Amaznia; a reduo da mortalidade infantil; a erradicao da pobreza e a universalizao do acesso ao abastecimento de gua no meio urbano permitiram que o Brasil alcanasse as metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milnio (ODM). Ao aprovar nosso planejamento nacional integrado de recursos hdricos, o Plano Nacional de Recursos Hdricos (PNRH), em janeiro de 2006, cumprimos a Meta n 26 da Cpula de Johanesburgo (Rio+10).
  6. 6. Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Chegamos Rio+20 j tendo concluda a primeira reviso do PNRH. Dentre as prioridades do PNRH para o perodo 2012-2015, destaca-se aquela que prope o desenvolvimento de processos formativos continuados para os atores do Sistema NacionaldeGerenciamentodeRecursosHdricos(Singreh)eparaasociedade,assim como o planejamento de atividades comunicativas e de difuso de informaes sobre a gesto integrada dos recursos hdricos. Essas prioridades tambm balizaram a elaborao do Programa n 2026 Conservao e Gesto de Recursos Hdricos, do Plano Plurianual (PPA) do Governo Federal. O carter inovador do PNRH se expressa na incorporao das vrias dimenses da gua em seus estudos tcnicos e pela participao da sociedade na sua elaborao, reviso e acompanhamento. Enquanto poltica estruturante de longo prazo, o Plano Nacional balizador de importantes aes do Ministrio do Meio Ambiente, dentre elas, a realizao dos encontros nacionais de formao de educadores ambientais, mobilizadores e ativistas para uma atuao qualificada na gesto hdrica. Um exemplo de governana e de aliana em favor do uso racional da gua e da sustentabilidade socioambiental das bacias hidrogrficas brasileiras, esses encontros so organizados pela Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano (SRHU), por meio do Programa Interguas, com o apoio da Secretaria de Articulao Institucional e Cidadania Ambiental (SAIC), da Agncia Nacional de guas (ANA) e dos Estados, acolhendo iniciativa da Cmara Tcnica de Educao, Capacitao, MobilizaoSocialeInformaoemRecursosHdricos(CTEM),umadasdezcmaras tcnicas temticas consultivas do CNRH, composta por representaes do poder pblico, dos usurios da gua e da sociedade civil.
  7. 7. PREFCIO neste contexto que a presente publicao, juntamente com os encontros de formao, contribuem para a implementao do PNRH, proporcionando o registro de conhecimentos e experincias, bem como das avaliaes e orientaes, visando aprimorar o processo de aprendizagem da gesto de recursos hdricos. IZABELLA MNICA VIEIRA TEIXEIRA Ministra de Estado do Meio Ambiente
  8. 8. Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos
  9. 9. Apresentao Mensagem do Secretrio de Minas Gerais Adriano Magalhes Chaves Secretrio de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentvel de Minas Gerais com imensa satisfao que Minas Gerais recebe a terceira edio do Encontro Formativo Nacional de Educao Ambiental e Gesto das guas,que vem se consolidando como um dos mais importantes fruns de dilogo sobre Educao Ambiental voltado para a gesto hdrica nopas,proporcionando amplo e qualificadodebate acerca do tema.Neste ano, o III Encontro ser realizado, de forma integrada,com o I Encontro de Educao Ambiental da Bacia do Rio Doce, que abrange os estados de Minas Gerais e Esprito Santo,e possui experincia exemplar na gesto integrada de recursos hdricos. ApropostadosEncontroscoadunacomosesforosdoEstadodeMinasGerais,governoesociedade, de ampliar e qualificar a participao e o engajamento social e poltico dos sujeitos envolvidos na gesto das guas, especialmente, os conselheiros dos Comits de Bacias Hidrogrficas, e promover o aprofundamento da gesto democrtica dos recursos hdricos, assegurando a sustentabilidade socioambiental dos programas desenvolvidos no Estado. Nesse sentido, parabenizamos a Cmara Tcnica de Educao, Capacitao, Mobilizao Social e Informaes em Recursos Hdricos do Conselho Nacional de Recursos Hdricos (CTEM/CERH), por essa iniciativa de promover,juntamentecom o Ministrio do Meio Ambiente, a formao de educadores ambientais para atuao na gesto das guas, contribuindo de maneira substancial na formao de atores sociais com uma compreenso integrada do ambiente e capacidade de participar de forma efetiva do processo decisrio, como preconiza a Lei Federal 9433/97e a Lei Federal 9795/99 A integrao das Polticas de Recursos Hdricos e de Educao Ambiental (PNEA) , portanto, estratgica para transpor obstculos e promover uma melhor distribuio de recursos, oportunidades e capacidades entre os atores, para que todos possam estar em condies de participar efetivamente da gesto. Nesse sentido, as aes de Educao Ambiental devem se pautar em anlises estruturais e crticas, que reconheam a pluralidade dos sujeitos envolvidos na gesto das guas e auxiliem no reconhecimento dos principais problemas da questo ambiental, considerando a sua totalidade. Mas, o desafio grande, uma vez que as questes histricas perpassam pelas desigualdades estruturais, polticas e de acesso informao, to marcantes nos pases da Amrica Latina, como o Brasil.
  10. 10. Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Diante desse cenrio, no podemos deixar de citar os Planos Nacional, Estadual e Diretores de Recursos Hdricos, como instrumentos que integram as concepes dessasimportantespolticas, e que so balizadores do processo, ao alocar, de acordo com a Resoluo 17/2001 do CERH, aes de Educao Ambiental em sua estrutura programtica, consonantes com a PNEA - Lei 9795/99. A sua implementao, portanto, depende de diversos fatores, como ambiente favorvel, vinculao com os oramentos pblicos, comprometimento poltico-institucional, capacitao, comunicao e controle social. Nesse contexto, acreditamos e trabalhamos para que o Encontro Formativo Nacional de Educao Ambiental e Gesto das guas e o 1 Encontro de EA da Bacia do Rio Doce, como nas edies anteriores, possam contribuir significativamente para as discusses e o aprimoramento das polticas pblicas de gesto participativa das guas no pas.
  11. 11. Da Bahia ao Rio Grande do Sul, de Salvador a Bento Gonalves: O ENCONTRO DAS GUAS! Os desafios da Educao Ambiental para a participao social na gesto ambiental e de recursos hdricos Eugenio Spengler Secretrio de Meio Ambiente do Estado da Bahia Entre 6 e 8 de outubro de 2009, a Bahia teve a satisfao de sediar o I Seminrio de Formao em Educao Ambiental do SINGREH. Esse seminrio foi promovido pela CmaraTcnica de Educao, Capacitao, Mobilizao Social e Informao em Recursos Hdricos CTEM/CNRH, organizado pelo Ministrio do Meio Ambiente (MMA) e teve como principais apoiadores o governo do Estado da Bahia, o Frum Nacional de Comits de Bacias Hidrogrficas e o Frum Nacional de rgos Gestores de Recursos Hdricos. Aquele primeiro seminrio teve por objetivos refletir sobre o papel da Educao Ambiental na Gesto das guas e os desafios para sua institucionalizao e subsidiar os educadores ambientais para o estabelecimento de relaes entre a Educao Ambiental e os instrumentos da Lei 9.433/97 assim como para o desenvolvimento de programas e projetos de EA no mbito dos comits de bacia. Eram objetivos bastante amplos. Passados dois anos, este II Seminrio uma grande oportunidade para avaliarmos os desdobramentos e aprofundarmos tais objetivos. A Sema-BA cumprimenta e agradece ao CNRH, o MMA e o governo do Rio Grande do Sul por darem continuidade a esse esforo, to necessrio para a gesto ambiental no pas. Algumas questes relacionadas participao social na gesto ambiental s conseguem ter um adequado tratamento neste espao, que rene representantes dos diferentes colegiados do SINGREH. Dentre essas questes, destaco: 1) como ampliar e qualificar o engajamento social e poltico da base da sociedade na gesto ambiental e de recursos hdricos?; 2) como aprofundar a qualidade da participao na gesto e da representatividade nos comits de bacia? Essas questes no so triviais. A participao e o engajamento poltico da base da sociedade brasileira so desafios histricos, que precisam enfrentar obstculos de ordem estrutural, como a desigualdade social, e de ordem psicossocial, como a despolitizao e o isolacionismo. Lidar com desafios histricos requer aes estratgicas, continuadas e articuladas. No caso da PNRH, necessrio o desenvolvimento de Programas de Educao Ambiental (PEA) permanentes, em cada Bacia Hidrogrfica, que configurem estratgias e no a simples soma de aes. Assim, os principais papis da Educao Ambiental se relacionam informao e capacidade de interpretao e anlise. Os PEAs devem favorecer o acesso da sociedade a informaes claras sobre a realidade socioambiental, destacadamente sobre os usos e usurios da gua, os conflitos e impactos associados a esses usos, a qualidade da gua, os papis dos diferentes atores sociais e os instrumentos da PNRH. Mais que acessar informaes claras, a populao precisa ampliar progressivamente sua capacidade de interpretar informaes socioambientais. Esse um desafio pedaggico e poltico da Educao Ambiental. preciso desenvolver processos, com a base da
  12. 12. Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos sociedade, que ao mesmo tempo propiciem diagnsticos e planejamentos socioambientais, ampliem a capacidade de interpretao dos coletivos e indivduos e a qualidade da participao e da representatividade nos diferentes colegiados ambientais. Desenvolver PEAs permanentes, com este carter estratgico, tarefa das CTEMs. Estas Cmaras so as instncias de articulao de atores regionais que tm compromisso e capacidade de desenvolver processos continuados de formao de educadores ambientais e de comunicao ambiental, assim como propiciar espaos e materiais para apoio aos educadores. As questes de ordem estratgica so: como implementar PEAs qualificados em todas as bacias hidrogrficas? Que polticas pblicas podem favorecer esse desenvolvimento das CTEMs? Espero que este seminrio continue a lanar luzes sobre essas questes, assim como o primeiro o fez. Com essa expectativa, desejo um bom trabalho a todos, cumprimento os organizadores e reitero o compromisso do governo da Bahia com o aprimoramento da gesto ambiental e de recursos hdricos, com o aprofundamento da participao e controle social.
  13. 13. Da Bahia ao Rio Grande do Sul, de Salvador a Bento Gonalves: O ENCONTRO DAS GUAS! Da Bahia ao Rio Grande do Sul, de Salvador a Bento Gonalves: O Encontro das guas! Jussara Cony Secretria de Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul Para o Rio Grande do Sul, sediar esse Encontro das guas se insere no caminho que est sendo percorrido, agora em sintonia com o Brasil, na conquista de um novo tipo de desenvolvimento, numa sociedade que tem de buscar novas articulaes de polticas econmica, social e ambiental. E onde as polticas ambientais precisam ser consolidadas e absorvidas pela cultura da administrao pblica, dos empreendedores e dos consumidores, em etapas que exigem um constante repensar deestratgias,numconceitodedesenvolvimentoquedeverespondersnecessidadesdopresente sem comprometer, ainda mais, as possibilidades das geraes futuras atenderem s suas prprias necessidades. John Bellamy Foster, em A Ecologia de Marx, Materialismo e Natureza, destaca: A afirmao de que a vida fsica e espiritual do homem se acha integrada com a natureza no tem outro sentido que o de que a natureza se acha integrada consigo mesma e que o homem parte da natureza. Esse destaque nos permite refletir que, em o homem no se constituir como parte da natureza, rompido o metabolismo homem-sociedade-ambiente, na busca desenfreada do lucro pelo modo de produo capitalista, fazendo do homem um ser parte, rompendo a dialtica de que ele transforme e seja transformado pela natureza. Assim, para o Rio Grande do Sul, o significado de sediar o que estamos a cunhar de O Encontro das guas, em uma segunda edio, com parcerias estratgicas e em transversalidades com a Educao Ambiental, estar sintonizado com o Plano das guas do Brasil (Plano Nacional de Recursos Hdricos), etapa de um planejamento estratgico, a longo prazo, para sua implementao integrada s demais polticas ambientais estruturantes, percebendo as guas em seus mltiplos usos e valores: social, econmico, ambiental, cultural e espiritual. reconhecer, no cotidiano das relaes que permeiam os lugares de nossas vivncias, que das beiras de nossos rios nascem civilizaes que podem, tambm, ali morrer se decretada for, por descompasso com a vida, a morte dos rios... preservar as riquezas humanas, culturais e naturais dessa potncia hdrica mundial que nosso pas, num estado que sintetiza sua dimenso atravs de suas bacias hidrogrficas, no corao de seu territrio, em compartilhamento com nosso estado irmo de Santa Catarina, nos pampas fronteirios do Uruguai e Argentina, nas lagoas que refletem a lua, nos rios que desguam no mar imenso que costeia nosso Brasil, na ddiva de ser parte de um Aqufero Guarani. estar aberto e em sintonia com as parcerias, como as construtoras desse espao de dilogo, reflexo e compromisso com a gesto das potencialidades que vem das guas e que protagonizam solues locais, a retomada da qualidade de vida, o desafio da atualidade de desenvolver-se gerando infraestrutura, emprego, riqueza e preservando o ambiente; de efetuar a transversalidade, incorporando s diretrizes dos planos nacional, estadual e municipais de Recursos Hdricos a
  14. 14. Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos EducaoAmbientalcomocomponenteestratgicodegestoambientalintegrada,desenvolvendo e potencializando capacidades, democratizando a Gesto das guas, fortalecendo os comits de bacias hidrogrficas, trocando saberes e fazeres coletivos. Educao Ambiental na perspectiva de novos horizontes da Educao, ela que um imenso universo para a cidadania, a tica, a sustentabilidade, na concepo da educao para alm de ser apenas uma etapa de preparao para a vida e sim para se tornar uma interao permanente com a vida, por toda a vida. Educao do ser humano como parte da natureza, na compreenso de lugar da educao como espao de criao e articulao do conhecimento, patrimnio da humanidade como um todo e, portanto, tendo que ser dimensionada outra estatura Educao Ambiental, situada no contexto global de educao, incorporada como estruturante para a poltica ambiental. Mas, para o Rio Grande do Sul, sediar o Encontro das guas tambm reverenciar a memria de ancestralidades, da histria e da cultura do nosso estado ao ter, como sede, a cidade de Bento Gonalves, municpio da Serra Gacha, capital brasileira do vinho, primeiro lugar do Brasil a obter a indicao de procedncia do Vale dos Vinhedos, que qualifica a origem em nvel mundial, habitada, em sua origem, por nossos caigangues e povoada por imigrantes vindos da Itlia, em torno de 1875, e por alemes, polacos e espanhis, possivelmente inspiradora de parte da cano Querncia Amadade Teixeirinha:Querncia amada, dos parreirais, da uva vem o vinho, do povo vem o carinho, bondade nunca demais. Querncia amada, meu cu de anil. Este Rio Grande gigante, mais uma estrela brilhante, na Bandeira do Brasil. E que leva o nome do General Bento Gonalves, um dos lderes da Revoluo Farroupilha, imortalizado na obra de rico Verssimo, OTempo e o Vento e nos versos de Jayme Caetano Braum: Veneramos tua espada como relquias de glrias, pois foi pincel da histria que tracejou nosso mapa, e esta indiada, forte e guapa , que te olha com reverncia, da mesma descendncia da velha estirpe farrapa. Bento Gonalves, que faz um elo com Bahia e Salvador, atravs da histria traada pelos Farrapos da Revoluo de 1835 quando, depois de uma tentativa de fuga do Forte da Laje, no Rio de Janeiro, no qual foi apresentado a Garibaldi e Rossetti, foi transferido para a Bahia, onde ficou preso no Forte do Mar. E, aps, permaneceu clandestino em Itaparica e Salvador. Bento Gonalves, a cidade de rica hidrografia e relevo montanhoso, no qual corre seu principal rio, o Rio das Antas, com nascentes nos municpios de Cambar do Sul e Bom Jesus, no extremo leste do planalto dos Campos Gerais. E que, nas proximidades do municpio de So Valentim, recebe as guas do Rio Carreiro e passa a se chamar Taquari, formando a Bacia Taquari-Antas. Bento Gonalves, cidade cortada pelos Arroios Barraco e Pedrinho e pelo Rio Buritti. Bento Gonalves, que representar a hospitalidade gacha, nossa historia, nossa cultura, nossas gentes, nossos biomas, nossas vontades de transformar, nossos compromissos com um novo mundo, uma nova e promissora sociedade. E nosso Rio Grande do Sul, por meio do Governo do Estado, est integrado s aes do Ministrio do Meio Ambiente e do Conselho Nacional de Recursos Hdricos, numa relao republicana e afirmativa, em parcerias estratgicas representadas em Bento Gonalves pelos diversos segmentos de preservao de nosso patrimnio natural, contido nas bacias hidrogrficas de nosso estado, do nosso pas e as compartilhadas com nossos vizinhos de fronteira, recebe os cuidadores de guas,
  15. 15. Da Bahia ao Rio Grande do Sul, de Salvador a Bento Gonalves: O ENCONTRO DAS GUAS! com versos de poetas gachos de geraes e estilos diferentes, mas cuidadores tambm, pelo seu poetar, das guas e da Vida! Como Joo Carlos Lourero e Nelsi Morales, em Rio Uruguai Quem cuida o mato como cuida o passarinho, Quem cuida o rio sem pretenso de pescar mais, Tem a certeza de que o sol nasce mais cedo E brotar mais flores ao redor dos mananciais. E como Mrio Quintana, quem sabe buscando possibilidades de resposta a sua poesia de encanto e luz. Haver ainda, no mundo, coisas mais simples e to puras como a gua bebida na concha das mos?
  16. 16. 16 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Sumrio Introduo...........................................................................................................19 CAPTULO 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas............................................................................................................25 Promoo de dilogos para a Educao Ambiental e cidadania pelas guas: o desafio do desenho metodolgico Autores: Ricardo Burg Mlynarz, Lara Montenegro.................................................... 25 Dilogo e Educao Ambiental no campo das guas Autor: Sandro Tonso........................................................................................................... 33 DESAFIOS DOS CAMINHOS AMBIENTALISTAS: um mapa imaginrio para transformaes democrticas Autor: Luiz Antonio Ferraro Jnior............................................................................... 39 CAPTULO 2 - Enfoques para Projetos e Polticas.............................................51 Avaliao de processos de Educao Ambiental na Gesto das guas Autor: Carlos Frederico B. Loureiro.............................................................................. 51 CAPTULO 3 - Gesto de guas e Educao Ambiental....................................57 Formao, dilogo e participao no Planejamento e Gesto de guas Autor: Franklin de Paula Jnior...................................................................................... 57 Educao Ambiental, participao e Gesto das guas Autores: Nilo Srgio de Melo Diniz, Renata Rozendo Maranho........................ 75 Educao Ambiental e Gesto das guas no ensino formal Tereza Moreira, Autores: Neusa Helena Rocha Barbosa ,Rita Silvana Santos Luiz Cludio Lima Costa .................................................................................................. 80 CAPTULO 4 - Saberes e Cuidados em Ao......................................................87 Centro de Saberes e Cuidados Socioambientais da Bacia do Prata, reflexo-ao para sustentabilidade Autor: Nelton Miguel Friedrich........................................................................................ 87 CULTIVANDO GUA BOA: roteiro metodolgico das oficinas de futuro Autora: Silvana Vitorassi.................................................................................................... 91 GUA COMO MATRIZ ECOPEDAGGICA: uma experincia de aprendizagem significativa e sustentvel Autores: Vera Lessa Catalo, Pedro Roberto Jacobi.............................................. 96 Educao ambiental como instrumento de fomento Gesto de guas transfronteirias Autora: Synara Olendzki Broch...................................................................................... 100 O projeto Nas Ondas do So Francisco e a gesto ambiental integrada participativa Autores: Ricardo Tezini Minoti, Andra Carestiato ....................... 103
  17. 17. Sumrio 17 Redes para guas Autora: Carolina Ramalhete Vieira................................................................................ 112 A Educao Ambiental na integrao de polticas pblicas para a construo da governana da gua e do territrio Autora: Roseane Palavizini............................................................................................... 118 Iniciativa MAP (Madre de Dios-PE, Acre-BR e Pando-BO): uma experincia de mobilizao social na Bacia do Rio Acre, na Amaznia Sul-ocidental Autora: Vera Lcia Reis...................................................................................................... 122 Dilogos interbacias de Educao Ambiental em recursos hdricos Autora: Suraya Modaelli................................................................................................... 126 Projeto gua: conhecimento para a gesto Autores: Flvia Carneiro da Cunha Oliveira, JairGonalves da Silva Taciana Neto Leme...........................................................................................................131 Integrar para Gerenciar: a experincia do CBH Doce Autores: Joema Alvarenga, Nelson Neto de Freitas.................................................135 Semeando o futuro atravs da educao ambiental Autora: Gladys Nunes Pinto ............................................................................................138 Projeto Manuelzo e Cbhs. Autor: Apolo Heringer Lisboa..........................................................................................143 A Experincia da Alocao Negociada de gua no Cear: 20 anos da COGERH Autor: Ubirajara Patrcio lvares da Silva ................................................................149 Formao, comunicao e participao social no processo de construo do Plano Estadual de Recursos Hdricos do Estado do Acre- PLERH-AC Autora: Maria Marli Ferreira da Silva........................................................................................154 Vozes Uma atuao coletiva em Educao Ambiental no Comit de Bacia Hidrogrfica do Rio Grande Bahia Autora: Ber Brazil................................................................................................................158 Dilogos, experincias e iniciativas: construindo o caminho da educao ambiental para as guas no Comit de Bacias Lagos So Joo Autores: Marla Domingues, Denise Spiller Pena, Aline Oliveira Santos, Natalia Barbosa Ribeiro, Gleice Maira Fernandes, Artur da Silva Andrade....................................................................................................162 Cmara Tcnica de Educao Ambiental dos Comits PCJ: 10 anos de histria Autores: Maria Lusa Bonazzi Palmieri, Dora Ribeiro, Vera Namura Ceclia de Barros Aranha..................................................................................................167 A Rede de educao ambiental do litoral norte RS e a mobilizao da bacia hidrogrfica do rio Tramanda Autores: Juliana Hogetop, Luciana Dalsasso............................................................173
  18. 18. 18 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Projeto Integrado de Educao Ambiental - Comit Piratinim vai Escola Autor: Jos Alberto Pinheiro Vieira...........................................................................178 O caminhar de um grupo de trabalho de Educao Ambiental na regio Hidrogrfica 07 Bacia do Itaja/SC Autoras: Raquel Fabiane Mafra Orsi, Susana Beatriz da Costa da Cunha ...182 Comunidade abraa comunicao para fortalecer gesto das guas Autora: Mnica Pilz Borba ..........................................................................................187 Programa gua doce Vamos fazer um acordo Autor: Renato Saraiva Ferreira......................................................................................193 Anexos...............................................................................................................197 Lei n 9.433, de 8 de janeiro de 1997.......................................................................197 Lei n 9.795, de 27 de abril de 1999.........................................................................213 Resoluo n 98, de 26 de maro de 2009.............................................................219 Decreto de 22 de maro de 2005..............................................................................224 Estrutura-sntese do Programa IV do Plano Nacional de Recursos Hdricos (PNRH)...............................................................................................................225 Programao do I Seminrio/Encontro Nacional de Formao em Educao Ambiental no SINGREH............................................................................229 Lista de Participantes....................................................................................................230 Programao do Encontro Integrado - Ii Encontro Formativo Nacional de Educao Ambiental e Gesto de guas e Encontros Formativos do Centro de Saberes da Bacia do Prata.........................................244 Lista de Participantes...................................................................................................246 Relato Sntese - Grupos de Trabalhos ...................................................................250 Membros da Cmara Tcnica de Educao, Capacitao, Mobilizao Social e Informaes em Recursos Hdricos do Conselho Nacional de Recursos Hdricos(CTEM/CNRH)..............................................................................270 Perfil dos Autores..........................................................................................................273 Fotos: gua: Processos dilogicos e formativos................................................284
  19. 19. INtroduo 19 Introduo Resultante da convergncia de iniciativas e elaboraes acumuladas de um fecundo processo em curso, demarcado pela imbricao dos temas gua e educao ambiental, assim apresentamos a terceira edio ampliada desta publicao Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos no planejamento e gesto de Recursos Hdricos, a qual tornou-se referencial para orientar processos dialgicos e formativos no planejamento e na gesto de guas no pas. Balizadordessesprocessos,oPlanoNacionaldeRecursosHdricos(PNRH),elaboradode2003a2005 e aprovado pelo Conselho Nacional de Recursos Hdricos (CNRH), em janeiro de 2006 (Resoluo n 58), incorporou em suas macro diretrizes, assim como alocou estrategicamente e de maneira transversal em sua estrutura programtica (Programa IV) a educao ambiental (em consonncia com a Lei Federal n 9.795/99), o desenvolvimento de capacidades, a difuso de informaes, a comunicao e a mobilizao social para a GIRH (gesto integrada de recursos hdricos). Em meio a essa nova conjuntura, foi criada, em 2004, a Cmara Tcnica de Educao, Capacitao, Mobilizao Social e Informao em Recursos Hdricos (CTEM) pela Resoluo n 39 do CNRH. Na prtica, a criao da CTEM representou, em nvel nacional, a institucionalizao da Educao Ambiental (EA) no contexto da implementao da Poltica Nacional de Recursos Hdricos e da estruturao do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hdricos (SINGREH), sinalizando paraosdemaisentesdoSistemaasuaimportnciaestratgica,sobretudonosentidodeaprofundar a gesto democrtica das guas, de forma descentralizada e participativa como preconiza a Lei Federal n 9.433/97. Uma das principais janelas de comunicao e integrao entre as polticas e os sistemas de Recursos Hdricos (SINGREH) e de Meio Ambiente (SISNAMA), a Educao Ambiental desempenha o indispensvel papel de fortalecer o vis ambiental das polticas pblicas de recursos hdricos, assegurando o compromisso com o desenvolvimento sustentvel e o aprofundamento da governana democrtica das guas. Tambm pode contribuir para ampliar a percepo sobre a dimenso estratgica e transversal da gua nas polticas ambientais e setoriais. Da conjuno de esforos empregados na formulao de polticas pblicas de recursos hdricos sob o olhar da Educao Ambiental, a partir das atividades da CTEM e da implementao de diretrizes e aes sintonizadas com o Programa IV do PNRH, j foram realizados dois encontros formativos nacionais. O primeiro encontro, realizado em Salvador-BA, no formato I Seminrio/Encontro Formativo (Salvador-BA) Foto: Franklin Jr
  20. 20. 20 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos de Seminrio Nacional de Formao de Educadores Ambientais do SINGREH, aconteceu entre 6 e 8 de outubro de 2009. O segundo caracterizou-se como Encontro Formativo Integrado de Educao Ambiental para a Gesto de guas, e foi realizado na cidade de Bento Gonalves-RS, de 02 a 05 de outubro de 2011. O encontro de Salvador foi concebido na perspectiva de provocar e ampliar o debate sobre o tema da educao ambiental na gesto de recursos hdricos, visando a sua insero e fortalecimento, especialmente na base colegiada do Sistema, por meio dos comits de bacias hidrogrficas. Iniciativa da CTEM/CNRH, organizado pelo Ministrio do Meio Ambiente (MMA), por meio do Departamento de Recursos Hdricos da Secretaria de Recursos Hdricos e Ambiente Urbano (DRH/ SRHU) e do Departamento de Educao Ambiental da Secretaria de Articulao Institucional e Cidadania Ambiental (DEA/SAIC), com o apoio do Governo do Estado da Bahia, por meio do ento Instituto de Gesto das guas e Clima (ING), atual INEMA, do Frum Nacional de Comits de Bacias Hidrogrficas (FNCBH), do Frum Nacional de rgos Gestores das guas (FNOGA), dentre outros, contou com um pblico de aproximadamente 180 participantes, ali representado por educadores ambientais, gestores, ativistas, especialistas e atores da gesto hdrica de 21 estados brasileiros. Assim, o encontro na Bahia tornou-se um marco para a Educao Ambiental voltada para a gesto de guas no Brasil, primeiramente, porque buscou congregar representantes de todos os cantos do pas atuantes no tema, dando um sentido de pertencimento a uma comunidade de atores que, embora lidem com diferenciadas realidades e desafios cotidianos, possuem propsitos comuns, descortinando inmeras potencialidades de colaborao, atuao em rede, troca de experincias e fortalecimento mtuo. A opo metodolgica se estruturou no desenvolvimento de dinmicas participativas que prezaram pelo protagonismo dos participantes, por meio do dilogo e da troca de saberes que, em grupos de trabalho, intercambiaram idias, diagnsticos, percepes e proposies, contando com o apoio de especialistas (professores Frederico Loureiro, Jos Quintas, Luiz Ferraro e Sandro Tonso), que provocaram e facilitaram os processos de discusso e aprendizagem nos grupos, posteriormente relatando e interpretando as discusses em plenria. Tambm houve uma sada a campo, que representou uma imerso no imaginrio da cultura baiana e brasileira, pois Salvador I Seminrio/Encontro Formativo - Terreiro Casa Branca Il Ax Iy Nass Ok (Salvador-BA) Foto: Lara Montenegro
  21. 21. INtroduo 21 (1549) foi a primeira capital do Brasil. Os participantes do encontro conheceram a lagoa do Dique doToror, inspirador da famosa quadrinha conhecida em todo o pas, que dizEufuiaoToror,beber gua e no achei, encontrei linda morena que no Toror deixei..., e ao redor da qual se encontram as esculturas de Orixs, talhadas pelo artista plstico Tatti Moreno, bem como visitaram o mais antigo terreiro de Candombl do Brasil, a Casa Branca do Engenho Velho ou Il Ax Iy Nass Ok, considerado Monumento Negro e Patrimnio Histrico do Brasil. Os trabalhos culminaram com a proposta de construo de uma agenda de continuidade para a atuao do coletivo de representantes da Educao Ambiental nos colegiados de recursos hdricos, indicando a necessidade de estabelecimento de um dilogo permanente entre a CTEM e os demais espaosdeeducaoambiental,resultando,ainda,naestratgiadedisseminaodediretrizespara a educao ambiental, o desenvolvimento de capacidades, a comunicao e a mobilizao social dirigidos GIRH, expressos na Resoluo CNRH N 98, e de fortalecimento da implementao do Programa IV do Plano Nacional de Recursos Hdricos, que foi levado discusso, posteriormente, nas 12 Oficinas Regionais de reviso do PNRH, realizadas em 2010 em todo o pas. A experincia de Salvador foi, de certa maneira, replicada em Bento Gonalves-RS, mas o encontro na cidade gacha teve como especificidade o acolhimento de duas atividades formativas da Bacia do Prata a segunda maior da Amrica do Sul organizados pelo Centro de Saberes e Cuidados Socioambientais da Bacia do Prata, conferindo um contorno internacional ao evento. Dialogando com temas e experincias j evidenciadas em Salvador (o papel mobilizador da EA, a educao ambiental e os instrumentos da Poltica, e experincias de EA em Comits de Bacia). O Encontro de Bento Gonalves proporcionou, ainda, a reflexo sobre desafios, perspectivas e proposies desenvolvidas em grupos de trabalho que formularam diagnsticos e proposies nos seguintes temas: i) espaos institucionais da EA no SINGREH; ii) processos formativos e mobilizao social em GIRH; iii) comunicao Social em GIRH; iv) redes sociais e parcerias em GIRH; v) a EA na preveno de desastres de origem hdrica; vi) a EA e Governana hdrica (participao social na GIRH); vii) Rede de Saberes e Cuidados com a gua; e viii) a EA nos processos de Gesto de guasTransfronteirias. II Encontro Formativo (Bento Gonalves-RS) Foto: Arquivo SRHU
  22. 22. 22 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Integrado s comemoraes da Semana Interamericana da gua do Estado do Rio Grande do Sul, e inserido, ainda, no contexto da Dcada Brasileira e do Decnio Internacional da gua (2005-2015), assim como da Dcada Internacional da Educao para o Desenvolvimento Sustentvel (2005- 2014), o Encontro de Bento Gonalves reuniu um pblico, de aproximadamente 170 participantes de 20 estados brasileiros e tambm do Uruguai e da Argentina, promovendo a apresentao de painis de experincias e rodas de dilogo, destacando-se a dinmica da Roda de Chimarro Reflexes Hidropotica e Estratgias Hidropolticas, em que especialistas desenvolveram um dilogo enriquecedor, a partir de abordagens distintas e complementares: a) a gua como matriz ecopedaggica (Profa. Vera Lessa Catalo/UnB); b) a gua como elemento de integrao de povos, culturas e naes (Nelton Friedrich/ITAIPU); c) o Papel estratgico da EA na articulao de polticas pblicas (Nilo Diniz/DEA-MMA); d) a Questo da gua na educao formal (Jos Vicente de Freitas/ CGEA-MEC); e e) o Encontro das guas e os desafios da sustentabilidade (Jussara Cony/SEMA-RS). Representando o elo entre um encontro e outro, assegurando o sentido de continuidade para a insero e o fortalecimento da EA na gesto de guas, preparamos esta terceira edio ampliada que ser lanada durante o III Encontro Formativo Nacional de Educao Ambiental e Gesto de guas, a ser realizado de maneira integrada com o I Encontro de EA da Bacia do Rio Doce, na histrica cidade mineira de Ouro Preto, de 26 a 29 de agosto de 2013, em parceria com o Comit da Bacia Hidrogrfica do Rio Doce (CBH-Doce) e IBIO AG Doce, os Governos Estaduais de Minas Gerais (por meio da SEMAD/IGAM) e do Esprito Santo (por meio da SEAMA/IEMA), a Agncia Nacional de guas (ANA), o Frum Nacional de Comits de Bacias Hidrogrficas (FNCBH) e demais parceiros histricos. Sem a pretenso de esgotar o tema, muito pelo contrrio, esta publicao busca aportar contribuies metodolgicas e vivenciais, nutrindo o processo dialgico em nvel nacional Foto: Marcelo da Costa
  23. 23. INtroduo 23 sobre as guas do Brasil, conforme preconizado pelo Plano Nacional, em suas macro diretrizes e aes prioritrias. Mais que uma coletnea de anlises, debates e experincias relatadas nos textos respectivos, almeja contribuir para a construo e legitimao de espaos de EA no campo da gesto hdrica, trazendo elementos analticos para um diagnstico inicial das dificuldades e potencialidades, apresentando estratgias de atuao para o fortalecimento da cidadania ambiental, do controle pblico e da participao social nas instncias colegiadas e deliberativas do Sistema de recursos hdricos, este livro se torna instrumental importante neste sentido. Estruturada em quatro Captulos i) Enfoques Metodolgicos para eventos e atividades dialgicas; ii) Enfoques para projetos e polticas; iii) Gesto de guas e educao ambiental; e iv) Saberes e cuidados emao, a publicao rene as contribuies de colaboradores e especialistas nos dois primeiros captulos, a viso de rgos governamentais federais de recursos hdricos e de educao ambiental realizadores e/ou apoiadores da iniciativa no terceiro captulo e, por ltimo, uma coletnea de experincias terico-prticas da EA voltada para a gesto de guas, agora ampliada nesta terceira edio. Pretende-se, a cada nova edio, incorporar outras das inmeras experincias exitosas existentes no pas. Na abertura da publicao, o leitor ainda encontrar mensagens dos governos bahiano, gacho e mineiro, relatando, o significado em acolher o primeiro, o segundo e o terceiro encontro formativo, respectivamente. Finalmente,registramosonossoprofundoagradecimentoatodasetodosquederamasuaespecial contribuio textual para a concretizao deste livro, o qual agora entregamos com muito cuidado aos nossos pares nesta empreitada scio-educativa, cultural, poltica e ambiental em defesa da cidadania e das guas do Brasil. Suraya Damas de Oliveira Modaelli PresidentedaCmaraTcnicadeEducao,Capacitao,MobilizaoSocialeInformao em Recursos Hdricos (CTEM) e Secretria Executiva do Frum Nacional de Comits de Bacias Hidrogrficas (FNCBH). Franklin de Paula Jnior Gerente de Polticas e Planejamento do Departamento de Recursos Hdricos da SRHU/ MMA, conselheiro suplente no CNRH e membro da CTEM/CNRH.
  24. 24. 25Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas CAPTULO 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas Promoo de dilogos para a Educao Ambiental e cidadania pelas guas: o desafio do desenho metodolgico Ricardo Burg Mlynarz Lara Montenegro Apresentao Os resultados e as avaliaes da realizao do 1 Seminrio Nacional de Formao em Educao Ambiental no SINGREH foram, para ns, uma grande surpresa. Da proposta inicial desenhada para sua realizao at o formato final da dinmica dos trabalhos, foram inmeras as dvidas, conversas, mudanas e reflexes para que, seis meses depois, tivssemos a sensao de enorme satisfao e de misso cumprida. A grande maioria das avaliaes dos 170 participantes provenientes de 21 estados do pas apontaram a metodologia do encontro como um diferencial extremamente positivo. Alm disso, tivemos diversas solicitaes escritas e verbais para que a metodologia pudesse ser descrita a fim de inspirar outros eventos. Percebemos que a proposta do seminrio, experimentada ao longo dos trs dias de trabalhos, surpreendeu pela potncia educadora que a troca de conhecimentos entre os participantes proporcionou. Este artigo se prope, portanto, a descrever a metodologia do seminrio e os fundamentos que o sustentaram, considerando-se o desafio de construir coerncia entre as teorias e propostas da educao freireana1 (inspiradora da Educao Ambiental), e da proposio de seminrios e encontros participativos. Para esse desafio consideramos a necessidade emergente de constituir metodologias inovadoras. Este artigo visa, portanto, para alm de descrever uma metodologia, inspirar o leitor a criar suas prprias propostas para fortalecer a gesto participativa de recursos hdricos do Brasil. Premissas e fundamentos das polticas pblicas voltadas gesto participativa APolticaNacionaldeRecursosHdricos(Lei9.433/97)estfundamentadanaparticipaosocialena descentralizao da Gesto das guas, tendo os colegiados do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hdricos SINGREH como pilares para sua implementao. Os conselhos de recursos hdricos e os comits de bacia hidrogrfica compem uma organizao de espaos participativos e de representao com o propsito de promover um debate qualificado e possibilitar a tomada de decises acerca das temticas relacionadas Gesto de guas. Este desenho institucional, em um contexto democrtico que recente no pas, tem nos colocado diante de um grande desafio: comofortalecerumaculturadedilogoquefavoreaodesenvolvimento 1 Pedagogia trabalhada por Paulo Freire.
  25. 25. 26 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos dos processos democrticos, da mediao e negociao dos diferentes valores e interesses em jogo? Essa pergunta envolve uma grande complexidade de fatores, mas entendemos que no desenho de propostas inovadoras para a realizao de reunies, conversas significativas, seminrios e outros espaos coletivos, onde est parte da resposta e um dos papeis fundamentais da Educao Ambiental na Gesto de guas. Uma Educao Ambiental que promova o dilogo e que amplie o teor democrtico da gesto de recursos hdricos do pas, fortalecendo o princpio da cidadania nas novas prticas polticas. No campo da Educao Ambiental (EA), cabe ressaltar que a Poltica Nacional de Educao Ambiental - PNEA (Lei 9.795/09) estabelece, como um dos objetivos estratgicos da EA, o incentivo participao individual e coletiva, permanente e responsvel, na preservao do equilbrio do meio ambiente, entendendo-se a defesa da qualidade ambiental como um valor inseparvel do exerccio da cidadania.Deformacoerentecomapolticadasguas,aconstruodeumaculturadaparticipao, qualificada com o dilogo, mostra-se como um dos eixos centrais da PNEA. Vale observar que o desafio de construir metodologias competentes para promover esta participao est ancorado em ambas as polticas nacionais. De forma complementar, visando integrar as concepes das polticas de EA e de recursos hdricos, em maro de 2009, o Conselho Nacional de Recursos Hdricos aprovou a Resoluo n 98, apresentada pela Cmara Tcnica de Educao, Capacitao, Mobilizao Social e Informao emRecursosHdricos (CTEM/CNRH). A CTEM trabalhou ao longo de quase trs anos na elaborao de uma proposta conceitual que estabelece parmetros para as aes de Educao Ambiental, capacitao, mobilizao e comunicao em recursos hdricos. A aprovao da resoluo impulsionou o processo de fortalecimento da educao, capacitao, mobilizaoecomunicaonaGestodasguas.Deformaapartilhareampliaressedebate,aCTEM props, em abril de 2009, a realizao de um seminrio nacional para a formao de educadores ambientais do SINGREH. Um seminrio que pudesse fortalecer os educadores ambientais em suas empreitadas to diversificadas. I Seminrio/Encontro Formativo (Salvador-BA) Foto: Franklin Jr
  26. 26. 27Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas O planejamento Para iniciar o planejamento do seminrio, foi montado um Grupo de Trabalho (GT) vinculado CTEM reunindo atores de diferentes instituies2 : Universidade de Brasilia, Departamento de Educao Ambiental (MMA), Departamento de Recursos Hdricos (MMA) e representantes da CTEM. O GT contribuiu de forma decisiva na proposio das temticas a serem trabalhadas no seminrio e na sugesto de especialistas que pudessem colaborar com a aprendizagem/formao dos participantes. No que se refere aos contedos, foram definidos trs eixos temticos organizados em mdulos: 1) O papel mobilizador do educador e os espaos da Educao Ambiental no SINGREH; 2) Educao AmbientaleosinstrumentosdaPolticaNacionaldeRecursosHdricos;3)Projetoseexperincias de Educao Ambiental e os Comits de Bacias. Cada eixo de formao ou mdulo foi dividido em subtemas (conforme programao em anexo). O Mdulo 1 visou promover a reflexo sobre o papel e a institucionalidade da Educao Ambiental na Gesto das guas e foi dividido em trs subtemas: a) espaos de EA no SINGREH; b) papel e atribuies dos espaos e atores de EA no SINGREH e c) construo e consolidao dos espaos de EA no SINGREH e possibilidades de integrao com outros espaos de EA na bacia hidrogrfica. O Mdulo 2 visou subsidiar os educadores ambientais para estabelecerem relaes entre a Educao Ambiental e os instrumentos da Lei 9.433/97, considerando suas dificuldades, desafios e potencialidades. Esse mdulo foi dividido em: a) instrumentos da Poltica Nacional de Recursos Hdricos (Lei n 9.433/97); b) Educao Ambiental na implementao dos instrumentos de gesto e c) Educao Ambiental nos planos estaduais e de bacias. O Mdulo 3 objetivou subsidiar os educadores ambientais para proporem e desenvolverem projetos de EA no mbito dos colegiados do SINGREH. Este eixo foi dividido em: a) elaborao de projetos; b) concepo polticopedaggica de projetos de EA, c) construo de projetos de EA com enfoque na Gesto da gua. Os mdulos e subtemas foram estabelecidos para dois fins. O de mapeamento, isto , mapearcomo os temas se apresentam nas realidades locais, e para fins de aprendizagem, isto , a construo de novos conhecimentos que fortaleam as prticas e saberes dos educadores participantes. Definidos os mdulos e os contedos programticos do seminrio, seguimos para o desenho da propostametodolgica.Maisdoquerealizarumencontrodetransfernciadeconhecimentospara os participantes, o seminrio teria que promover a comunicao e o dilogo entre os educadores presentes, que traziam conhecimentos e inquietaes de sua experincia. Os participantes eram atores da gesto de recursos hdricos e, por isso, seriam os educadores e educandos do seminrio. Detalhamento: atividades e papeis no seminrio Considerando que as experincias e conhecimentos dos educadores ambientais do seminrio deveriam ser o centro, era necessrio desenvolver uma proposta na qual os processos 2 Cabe aqui agradecer aos participantes do GT: Andrea Paula de Carestiato Costa (DEA/MMA), Bruno Gonzaga Agapito Veiga (UnB, consultor), Lcia Anello (DEA/MMA), Suraya Damas Modaelli (CTEM/CNRH), Franklin de Paula Jnior (DRH/MMA).
  27. 27. 28 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos conversacionais fossem o elemento-chave da dinmica. Para isto foram propostas rodas de conversa, em um formato metodolgico chamado deWorld Caf3 , visando constituir um espao de troca e sistematizao dos conhecimentos dos participantes. Os mdulos seriam norteadores das conversas (um para cada dia) e seus subtemas seriam tratados em diferentes mesas de uma sala. Em cada mesa haveria uma pergunta norteadora da conversa do grupo e um anfitrio para sistematizar e atualizar as contribuies dos participantes, acumuladas em cada rodada. Os participantes eram convidados a mudar de mesa a cada quinze minutos e, ao chegar em uma nova mesa/subtema, eram recebidos pelo anfitrio que os atualizava das conversas ocorridas e sistematizadas em papel flip-chart at aquele momento. Para subsidiar de forma complementar as conversas e contribuir com os temas tratados no seminrio, foram convidadosespecialistaspara os papis de formadores e debatedores. O papel de formador4 era ocupado por atores institucionais do SINGREH com experincias na Gesto de guas e em Educao Ambiental. Eles trariam, primordialmente, a sua experincia e conhecimento, buscando provocar as conversas que seriam desencadeadas posteriormente nos grupos.Aomesmotempoemqueoformadorapresentavaumaexperinciadereferncia,estetinha tambm uma identidade com os outros participantes do encontro. A proposta era desconstruir as relaes hierrquicas com o conhecimento, sendo que, embora escolhidas experincias relevantes, os formadores poderiam ser muitos outros experientes educadores ambientais que participavam do seminrio. J os debatedores5 buscariam observar as conversas e sistematizaes das rodas para, em seguida, realizar uma sntese e uma anlise em plenria acerca dos temas tratados. Estes profissionais teriam um perfil mais acadmico, analtico, e construiriam suas consideraes a partir da fala e do contedo trazidos pelos participantes no grupo. Um esquema dos trs momentos do seminrio pode ser visto e detalhado a partir dos quadros 1 e 2 a seguir. 3World Caf, detalhado em: http://www.theworldcafe.com/translations/World_Cafe_Para_Viagem.pdf Estaferramentade processos conversacionais foi sugerida por Carmem Lucia Zaine, membro da Cmara Tcnica de Educao Ambiental do Comit das Bacias Hidrogrficas dos Rios Aguape e Peixe em SP. 4 Agradecemos aos formadores convidados: Professor Sandro Tonso, Franklin Junior, Roseane Palavizini e Rachel Rosrio Marmo. 5 Agradecemos aos debatedores convidados: Professores Frederico Loureiro, Luis Antnio Ferraro Jr., Jos Silva Quintas.
  28. 28. 29Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas Quadro 1 Os Trs Momentos da Metodologia 1 Momento: apresentao do tema / experincia em plenria. Provocao inicial para as conversas de grupo. Durao: 40 minutos para duas apresentaes. Papel: formador. 2 Momento: conversas de grupo sobre os subtemas. Mesas de Conversa Rodas de conversa com mudana de mesa a cada 15 minutos. Apresentao da sistematizao da conversa pelos anfitries de cada mesa. Papis: facilitador, anfitrio e debatedor. 3 Momento: apresentao e debate em plenria. Apresentao de sntese pelos debatedores. Apresentao da anlise pelos debatedores. Debate com a plenria*. Papis: debatedor e facilitador de plenria. * Obs.: aps a exposio do debatedor, o tempo era reservado para a plenria discutir questes emergentes desta exposio para que, ento, cada mdulo fosse finalizado.
  29. 29. 30 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Quadro 2 Detalhamento do Segundo Momento Cada mesa contm uma pergunta orientadora, vinculada ao subtema do mdulo. Rodadas: os participantes, de forma livre, trocam de mesas a cada 15 minutos. Aps todas as rodadas (participantes passaram por todas as mesas), os anfitries apresentam a todos os participantes da sala as snteses produzidas pelos grupos. Papis: Um facilitador coordena o trabalho e o tempo dos grupos na sala. A cada rodada um anfitrio recebe novos participantes em sua mesa e os atualiza das conversas dos grupos anteriores. Ao final, apresenta a sntese de todas as rodadas. O debatedor somente observa e prepara uma sntese individual e uma anlise a ser levada plenria no 3 momento. Nesta proposta, os participantes so os atores centrais: protagonistas do processo de debate, construo e organizao de contedos. Esta perspectiva compreende a ao da Educao
  30. 30. 31Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas Ambiental no SINGREH como um processo em amadurecimento, em que a troca de experincia e de conhecimentos essencial. O caminho da proposta metodolgica do seminrio poderia ser, ento, resumido da seguinte forma: a) apresentao de contedos temticos e experincias -> b) conversas e dilogos em grupo -> c) snteses dos grupos -> d) sntese dos observadores -> e) anlise do observadores -> f) debate em plenria sobre as apresentaes dos observadores. Dessa forma, ao invs de consolidar uma proposta mais tradicional, pr-concebida, de organizao de contedos relativos aos mdulos, o seminrio teve o desafio de abrir espao para as ideias, os conhecimentos e saberes trazidos pelos participantes, coloc-los em dilogo a partir de processos conversacionais, constituir snteses dos debates/dilogos e, por fim, construir coletivamente contribuies tcnicas e analticas sobre os temas discutidos. Outra novidade proposta na dinmica, para alm dos momentos de troca de contedos tcnicos e experincias sobre as prticas nos CBHs, decorreu do entendimento de que era necessrio que o evento propiciasse tambm um encontro com a cidade que nos recebeu e com sua gente. Assim, o Instituto de Gesto de guas e Clima da Bahia (ING/BA) elaborou um roteiro de visitas pelo circuito das guas de Salvador. Com muita sensibilidade, a proposta apresentada por eles foi a de uma visita ao primeiro terreiro de Candombl do Brasil, a Casa Branca, ou Il Ax Iy Nass Ok, para uma conversa sobre a relao entre gua e religiosidade entre os educadores ambientais e os filhos de santo; alm de uma visita lagoa do dique do Toror, marco de uma construo antiga que ocupava boa parte da cidade de Salvador, e a partir da qual possvel compreender parte do seu processo de ocupao e expanso urbana. I Seminrio/Encontro Formativo (Salvador-BA) Foto: Franklin Jr
  31. 31. 32 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Consideraes finais Considerando as diferentes realidades institucionais, regionais, sociais e ambientais, entendemos que no havia como consolidar um processo de formao para os atores da Educao Ambiental do SINGREH no tradicional processobancrio6 , em que a Cmara Tcnica traria os tpicos/temas e os contedos para serem absorvidos pelos participantes do encontro. Era necessrio considerar o acmulo de experincias e capacidades dos participantes como contedo relevante e com um alto potencial educador. O foco estabelecido para o seminrio foi propiciar um processo horizontal de aprendizagem institucional, conjunta, que considerasse o dilogo, e no qual a CmaraTcnica e o Ministrio do Meio Ambiente se colocaram como catalisadores dessa iniciativa. Obomandamentodostrabalhoseosdebatesnasmesaseemplenrianosmostraramaperspectiva transformadora da metodologia proposta, que partiu das premissas de que era fundamental viabilizar um processo de reconhecimento mtuo entre os participantes do seminrio e valorizar a aprendizagem baseada no dilogo, na troca de conhecimentos e na construo coletiva de ideias e caminhos. Reforamos que a transio do papel de especialistas para formadores e debatedores dos contedos trabalhados em grupo modifica uma prtica constante em que os especialistas trazem contedos formatados para os processos de capacitao e de formao. Demos somente um pequeno passo em direo ao que queremos: construir uma cultura institucional em que os processos pedaggicos no sejam somente unidirecionais planejados para levar informaes/conhecimentos , mas que sejam fomentadores de construes conjuntas via dinmicas conversacionais, argumentativas e afetivas que emergem da troca de saberes. Queremos fortalecer uma cultura na qual os fruns de debate possam ser vistos como espaos de dilogo para a construo de acordos, e no somente vistos e tratados pela lente do jogo de interesses. Espaos onde reunies possam ser ambientes frteis para a troca de conhecimentos, paraoreconhecimentodasdiferentesperspectivasdosatoresenvolvidoseparaoamadurecimento do exerccio da cidadania de fato, ao invs de somente feitas em carter de encaminhamentos operacionais. Aculturainstitucionalvigenteaindanodsuporteatalconstruo.Temosobservadoprofissionais desacreditados dos processos democrticos, em seu teor mais profundo, olhando para o cenrio da gesto como jogos de carta marcada. Prevalece o entendimento de que ingnuo acreditar no dilogo, ainda mais no contexto institucional. Oseminriodeixouclaro,noentanto,quepossvelqualificaraaotcnica,nocampoinstitucional e especificamente na gesto integrada de recursos hdricos, com dinmicas inovadoras que valorizem uma cultura do dilogo que se articule com o conhecimento tcnico e com os fruns polticos de gesto. Se demos um passo... Ainda h muitos a dar. Entendemos que agesto de recursos hdricos no Brasil, cuja base so os rgos colegiados (comits de bacia e conselhos de recursos hdricos),tem um grande potencial educador e mobilizador da sociedade. Entendemos que ela propicia o fortalecimento do exerccio da cidadania eestimulaa participao crtica, propositiva e construtiva de novos caminhos para a gesto democrtica do pas. 6 Termo utilizado por Paulo Freire em Pedagogia do oprimido. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1970, 2 edio.
  32. 32. 33Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas Dilogo e Educao Ambiental no campo das guas Sandro Tonso As principais questes envolvendo o campo das guas Nossa relao com a gua conflituosa. Inicialmente, pelo sentido que cada um d ao pronome possessivonossa!Nossaquem? Quem faz parte deste coletivo:ns? Talvez a resida uma das principais questes ligadas rea ambiental, mas no s! Tratar o ser humano com uma categoria homognea, como uma espcie que se relaciona com a natureza e, principalmente, entre si de uma mesma forma, com mesmos valores e atitudes, talvez, seja o primeiro e fundamental engano nesta questo da relao com o campo das guas. Nesta poca e sociedade, somos diferentes e desiguais7 . FOLADORI8 afirma queo problema principal para a sociedade humana no de inter-relao com outras espcies vivas e com o meio ambiente. de contradies internas. No existem relaes no exterior, com o meio ambiente, que no sejam previamente mediadas pelas relaes no interior, entre classesegrupossociais.Somandoestaafirmaodequesomostratadoscomodesiguais,podemos perceberqueasquestes,ditasambientais,guardamestreitovnculocomasdesigualdadessociais. Definido o tom deste campo de reflexes questes ambientais so socioambientais e previamente definidas por uma injusta estrutura social e poltica apresentam-se as principais questes no campo das guas, trs distintas, porm interligadas, questes. No mesmo sentido, delinea-se assim uma Educao Ambiental que se afirma Crtica, Poltica, Transformadora, Popular e diversos outros adjetivos que pretendem o mesmo: uma Educao Ambiental que olhe para a transformao humana a partir da compreenso das estruturas de poder desta sociedade, condio sine qua non para a construo de uma postura crtica e efetivamente transformadora, dialeticamente individual e coletiva ao mesmo tempo. Destas trs questes, em primeiro lugar, h a degradao da gua com a qual estabelecemos uma relao de uso: poluio, desperdcio e concorrncia com outras atividades humanas, igualmente importantes, contaminao de lenois freticos, assoreamento de leitos de cursos superficiais de gua, destruio e descaracterizao de suas margens, entre tantos e diferentes exemplos. Apesar de, em mdia, a qualidade das guas no Brasil ser superior da maioria dos pases, na grande parte das comunidades, a degradao da gua j chegou a diferentes graus. Interessante seria perceber que o que se degradou talvez no seja s o recurso gua, mas, fundamentalmente, a prpria relao que diferentes grupos sociais estabeleceram com o elemento gua, esta sim, profundamente degradada. Em segundo lugar, h uma relao extremamente desigual entre diferentes grupos sociais e a gua. Alm de uma desigual disponibilidade hdrica natural, h outras questes que se sobrepem a esta. Seja entre pases, grupos sociais ou diferentes atividades humanas, a disponibilidade e a facilidade de acesso so to desiguais que se pode falar em escassez de gua em regies com grandes ofertas de gua, pela desigualdade de acesso entre diferentes seres humanos. Estas diferenas 7 Entendemos o adjetivodesiguaiscomo aquilo que confere hierarquia, maior e menor poder e respeito entre pessoas. 8 FOLADORI, Guillermo.Limites do Desenvolvimento Sustentvel. Campinas, Edit. UNICAMP, 2001.
  33. 33. 34 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos so definidas por escolhas polticas, por concepes de prioridades que relegam a segundo plano, atividades como acesso digno de gua, diariamente, a todas as pessoas de uma cidade. Em terceiro lugar, h uma diferena do valor que o elemento gua assume em diferentes culturas e grupos humanos. Nossa relao com a gua to diferente que poderamos dizer que a gua tem valores totalmente distintos para distintos seres humanos. gua como: recurso, que pago, portanto, usado como quiser; elemento natural, desenvolvendo inmeras funes nos ecossistemas naturais e antropizados; bem para fruio ligado ao lazer; recurso econmico que define e definido pela sua apropriao e pelas relaes de poder econmico e gua como elemento cultural, religioso e espiritual, ligado aos valores e origens de diversos povos. Qualquer proposta de enfrentamento das questes no campo das guas que desconsidere alguns destes aspectos corre o risco de se tornar uma ao incua ou, pior, geradora de ulteriores desigualdades. A dimenso poltica no campo das guas: alguns casos para reflexo Destas trs questes que a gesto das guas assume no mundo moderno, a dimenso poltica, interligando a 2 e 3 questes do problema e resultando na 1, poderia e deveria, sob nossa tica, merecer a primazia no enfrentamento. Dependendo das fontes que se use, os nmeros de uso de gua no Brasil e mundo variam. Entre agricultura, indstria e outros usos urbanos, as porcentagens nos indicam muitos e diferentes nmeros. Mas mesmo na diversidade e desigualdade de fontes, patente que o uso rural suplanta em muito os outros usos. - Naturalmente!, diriam uns! O campo necessita de gua para plantaes e criaes. No entanto, quando verificamos que, por volta de 5% das atividades do campo concentram o uso de mais de 50% da gua, comeamos a perceber que h mais que as necessidades fisiolgicas de plantas e animais para determinar a distribuio e o uso de gua no campo. H modelos de agricultura que abarcam, intencional e significativamente, uma maior parte dos recursos hdricos. A que/quem respondem estes modelos? Qual/quais concepes de desenvolvimento esto neles embutidas? Como exemplo desta questo, vimos recentemente os noticirio nacionais destacarem uma iniciativa do governo de Moambique oferecendo ao Brasil 6 milhes de hectares de terra para repetir em Moambique o que fizeram [os agricultores brasileiros tm experincia acumulada] no cerrado h 30 anos, disse o ministro da Agricultura moambicano, Jos Pacheco9 . O presidente da Associao Mato-grossense dos Produtores de Algodo, Carlos Ernesto Augustin, explicou Folha que as terras moambicanas so muito semelhantes s do interior do Brasil, com a vantagem do preo e da facilidade de obter licenas ambientais. Moambique um Mato Grosso no meio da frica, com terras de graa, sem tantos impedimentos ambientais, com o (custo) do frete China muito mais barato (...) Hoje, alm de terra estar carssima no Mato Grosso, impossvel obter licena de desmatamento e limpeza de rea, declarou Augustin ao jornal.10 (destaques deste autor) 9 Folha de So Paulo,Moambique oferece terra soja brasileira, 14/08/2011, pg. B1, Caderno Mercado. 10 Idem, Ibdem.
  34. 34. 35Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas Naturalmente, Moambique deseja o desenvolvimento de sua nao e povo. A concepo de desenvolvimento, no caso, ligada ao que os agricultores brasileiros fizeram ao cerrado. Podemos afirmarqueocerradoesuaspopulaestradicionaissedesenvolveramcomaagriculturaintensiva de soja? Da mesma forma, a ideia de facilidade de obter licenas ambientais e a caracterizao das terras moambicanas como sem tanto impedimentos ambientais trazem tambm uma concepo de proteo ambiental antagnica a uma concepo de desenvolvimento ligada a uma ideia de progresso material. Ambiente e desenvolvimento s so antagnicos com concepes de desenvolvimento ligadas a uma ideia materialista, consumista, competitiva e individualista. Tanto um quanto outro depoimentos so carregados de contradies e conflitos, pois carregam consigo concepes de bem estar, de qualidade de vida, de desenvolvimento que seguramente (exatamente pela chamada experincia brasileira no cerrado e nos outros biomas brasileiros) traro degradaes sociais e ambientais (no sentido dos ecossistemas) que entraro em contradio com a inteno inicial de trazer desenvolvimento para Moambique e seu povo. Problemas como estes evidenciam, de modo genrico, a necessidade de estruturao e/ou aparelhamento institucional dos sistemas de gerenciamento de recursos hdricos e de meio ambiente, a fim de que possam ser aplicados instrumentos preventivos e corretivos capazes de equacionar e compatibilizar as demandas de diversos usurios de gua11 . Da mesma forma, segundo Jos Machado, ento DiretorPresidente da ANA Agncia Nacional de guas, em 2009, papel de uma Poltica Nacional de Recursos Hdricos: ... assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos hdricos, como condio essencial para a cidadania plena, a qualidade de vida, a reduo da pobreza e um modelo de desenvolvimento que considere os direitos das atuais e futuras geraes a um ambiente limpo e saudvel.12 O que fica evidenciado nestas afirmaes a necessidade da dimenso poltica da Gesto de guas ser destacada, ressaltada e vivenciada em todos os nveis, dos mais locais aos mais globais. Esta dimenso poltica traz, de modo inerente, as diferentes concepes de ambiente, desenvolvimento, qualidade de vida, sustentabilidade e educao que precisam ser confrontadas, debatidas e acordadas entre todos os sujeitos destes processos. Desafios da gesto e os limites do dilogo: a produo social de excluso Especificamente na questo das guas, o Plano Nacional de Recursos Hdricos, de 2006, traz alguns de seus principais desafios para enfrentar as questes acima colocadas. Destes, destacamos os seguintes: 1) a consolidao da gesto por bacia hidrogrfica, 2) a consolidao da gesto participativae3)ainclusodatemticadaguacomoprioridadenasagendaspolticasdosgovernos e dos demais segmentos que participam do SINGREH Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hdricos. Estes trs esforos polticos vo em direo da busca do dilogo entre diferentes, atualmente, desiguais. Dilogo entre municpios banhados por uma mesma bacia hidrogrfica, dilogo entre os diferentes atores e sujeitos desta questo e dilogo entre as diferentes reas de conhecimento e atuao humanas. 11 Brasil,Plano Nacional de Recursos Hdricos, 2006, pg. 80. 12 ingua para um planeta saudvel, texto de Jos Machado, ento Diretor-Presidente da ANA, no livroImplementao da Cobrana pelo Uso da gua pelos Comits PCJ, Braslia, ANA, 2009.
  35. 35. 36 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Segundo Mariotti13 , dilogo pode ser definido como uma reflexo conjunta e observao cooperativa da experincia, uma metodologia de conversao que visa melhorar a comunicao entre as pessoas e a produo de ideias novas e significados compartilhados. Ou, posto de outra forma: uma metodologia que permite que as pessoas pensem juntas e compartilhem os dados que surgem dessa interao sem procurar analis-los ou julg-los de imediato. Neste sentido, a equidade entre escalas, instituies, categorias e pessoas deveria ser a condio inicial para a realizao do dilogo, desta construo de sentidos compartilhada entre diferentes. Porm, Boaventura de Souza Santos14 afirma que uma das caractersticas de nossa sociedade a excluso: Vivemos em sociedades repugnantemente desiguais. Mas a desigualdade no nos basta. A igualdade, entendida como mesmidade, acaba excluindo o que diferente. Tudo o que homogneo tende a transformar-se em violncia excludente. Dois processos, mesma resultante: excluir criando hierarquias e excluir apagando as diferenas. Aprofundando-nos no primeiro processo (criar hierarquias para excluir), Santos15 identifica cinco processos de excluso (que ele chama deno-existnciaouausncia): Monocultura do saber: Tudo que no for cientfico ignorante (e a ignorncia uma das formas de produzir no-existncia). Dessa forma, todo o saber que no se provar ou no se originar de bases cientficas automaticamente desconsiderado, juntamente com quem o detm. Monocultura temporal: A ideia de desenvolvimento e progresso contnua e nica. H somente uma forma de ser desenvolvido ou de progredir. No existe o pensamento de que os menos desenvolvidos podem ser mais desenvolvidos em outros aspectos. Desta forma, excluem-se, como atrasados, aqueles que no compartilham dos mesmos ideais. Monocultura da escala universal: Universal e global em contraposio e sobreposio ao particular e local. Experincias particulares e locais passam a ser ignoradas em detrimento das primeiras e, assim, passam a no existir mais. Monocultura das relaes sociais: Retrata as relaes sociais (tnicas, religiosas...) numa situao de superioridade, o que cria o conceito de inferioridade. Logo, quem inferior passa a no existir, a ser menos considerado. Monocultura da produtividade: Normas capitalistas so usadas para medir riquezas, modos de produo... Quem est fora dessas normas preguioso, ineficaz e improdutivo, logo, passa a no existir. S produto aquilo que o mercado considera. A Economia Solidria, as trocas, passam a no ter destaque ou importncia, invisibilizando as populaes que vivem desta forma. Estas formas de silenciamento, de inferiorizao, de excluso esto presentes no dia a dia de todos ns, colocando-nos, por vezes, no papel de excludente e outras, no papel de excludo. Perceber estes processos e posicionarmo-nos frente a eles tarefa (auto) educativa de todos ns. 13 http://www.teoriadacomplexidade.com.br/textos/dialogo/Dialogo-Metodo-de-Reflexao.pdf (10/08/2011). 14 SANTOS, Boaventura de SouzaO novo milnio Polticopublicado na Folha de So Paulo de 10/04/2001, pg. 3. 15 SANTOS, Boaventura de Souza (2007). Renovar a teoria crtica e reinventar a emancipao social (trad. Mouza Benedito). So Paulo: Boitempo, 128p.
  36. 36. 37Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas O 1 Seminrio como um exerccio terico e prtico: forma e contedo em sintonia Qual o sentido de uma Educao Ambiental crtica no campo das guas? Com o diagnstico acima exposto, a construo do dilogo passa a ter um sentido como princpio poltico e metodolgico, como forma e contedo ao mesmo tempo. O 1 Seminrio de Educao Ambiental no SINGREH, ocorrido em 2009, em Salvador, ao propiciar quepelomenosumapessoadecadaumdos150comitsdebaciashidrogrficasbrasileirasestivesse presente, gerou um momento importante de troca e, portanto, de construo compartilhada, no de um nico sentido da Educao Ambiental na Gesto das guas, mas de diversos sentidos e de uma nova forma de construo. Ao optar por uma metodologia tanto inovadora quanto ousada, que oferecia estmulos sobre um tema (uma reflexo curta de um especialista) e, posteriormente, estimulava o debate em grupos de conversas sobre o tema, sentimos que o objetivo da construo de dilogos era mais importante do que a concluso sobre qualquer dos temas apresentados. Esta uma opo poltica importante e significativa. Em primeiro lugar, porque tira dos contedos a primazia do processo de formao. A educao centrada prioritariamente nos contedos tende a se tecnicizar, ou seja, transformar-se num processo de transmisso de informaes que muitas vezes pouco dialogam com quem as recebe, descontextualizando-as. A educao que foca nos contedos frequentemente dificulta o dilogo com os contedos dos educandos, inferiorizando-os. Como consequncia, esta concepo de educao considera os educandos comopblico alvoe no como parceiros num processo mtuo de formao. Sem querer tirar a importncia dos contedos no processo educativo, o problema est em sua priorizao ou preponderncia sobre outros aspectos, o que leva a concepes conservadoras de educao. Em segundo lugar, porque esta metodologia afirma, politicamente, que todos tm saberes sobre os assuntos tratados e merecem oportunidades de expresso. Afirma, tambm, que o mais importante o exerccio do dilogo com pessoas desconhecidas (mas interessadas num mesmo tema), o exerccio da escuta, o exerccio da compreenso de uma ideia diferente da prpria. Em terceiro lugar, h uma afirmao poltico-pedaggica ao longo do seminrio na direo do que educao: ao invs de ser um processo de domesticao, um processo de transmisso de contedos, um processo de construo de referncias externas a ns (os especialistas), sem as quais no nos sentimos preparados para pensar e agir, o seminrio afirma que educar oferecer um espao de autoconstruo de cada participante a partir do encontro, do embate, do dilogo sobre a questo das guas, fortalecendo cada um que participou para seus prprios processos. Educar, neste sentido oferecer condies para que cada pessoa seja mais forte e mais potente naquilo que acredita ser o mais justo, agindo num sentido individual e coletivo ao mesmo tempo. S o dilogo levado com prioridade pode permitir este processo. Neste sentido, o seminrio se transformou num primeiro e seguro passo para o aprendizado do dilogo, do respeito alteridade, objetivos difceis de alcanar, mas fundamentais para o enfrentamento da maior das questes socioambientais: a invisibilizao e submisso do outro (seja ooutronatural, seja ooutrohumano).
  37. 37. 38 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos Concluindo, impossvel no fazer referncia/homenagem a Dersu Uzala, retratado em filme de mesmo nome, de Akira Kurosawa, que dialogava e tratava a todos os elementos das florestas da Mongliacomogente:otigre,ofogo,oventoeat...oserhumano(nocaso,trazendooprogresso para aquele trecho da floresta e inviabilizando o prprio modo de vida de Dersu)!
  38. 38. 39Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas DESAFIOS DOS CAMINHOS AMBIENTALISTAS: um mapa imaginrio para transformaes democrticas Luiz Antonio Ferraro Jnior Este breve texto teve duas fontes de inspirao, uma de contedo e outra de forma. A inspirao do contedo veio do seminrio ocorrido em Salvador, entre 6 e 8 de outubro de 2009, promovido pelo Conselho Nacional de Recursos Hdricos (CNRH), por meio da Cmara Tcnica de Educao, Capacitao, Mobilizao Social e Informao em Recursos Hdricos (CTEM). A inspirao da forma veio do livro Atlas da experincia humana: cartografia do mundo interiorde Louise van Swaaij e Jean Klare. Os contedos daquele seminrio, reavivados aps a leitura da transcrio das falas, fizeram-me imaginar um mapa que expressasse um caminho da faina (nem tanto da fauna...) ambientalista, com seus desafios, riscos, armadilhas e com as pistas que podem ajudar a levar esta luta a transformaes profundas do mundo e da prpria luta. A ideia de um mapa foi reforada por estar tratando dos esforos dos educadores ambientais no mbito de comits de bacias. Bacias e seus comits so complexos territrios, que desafiam nossa compreenso e nosso imaginrio. Naquele seminrio, minha funo de mediador/relator me proporcionou dois aprendizados importantes. Estes aprendizados no so ideias que brotaram do nada, elas vinham se insinuando, se construindo nos meandros do pensamento, mas neste evento foram de tal modo exemplificadas que finalmente pude pronunci-las, para mim mesmo e agora em texto, de modo mais claro: Ideia aprendida 1 - Em um coletivo, a diversidade proporciona dois elementos fundamentais para orientar caminhos transformadores, o exerccio da democracia e a criatividade social; Ideia aprendida 2 - H uma profunda diferena entre ser capaz de expressar um conhecimento crtico da realidade e desafiar-se a construir, com um coletivo, novos conhecimentos crticos sobre a realidade. Tais aprendizagens no indicam que a simples constituio de um coletivo de educadores ambientais dentro dos comits de bacia seja garantia de programas, projetos e aes efetivamente transformadores. A existncia do coletivo de educadores ambientais condio sine qua non, mas insuficiente. Espero que a observao deste mapa imaginrio que propus possa ajudar coletivos de educadores ambientais a reconhecer semelhanas com seu territrio de luta e a traar seus prprios mapas e caminhos. Sugiro que se leia este artigo voltando-se do texto ao mapa e do mapa ao texto, foi assim que ele foi escrito. No centro do mapa, h um divisor de guas central, que divide o territrio em duas grandes bacias. Alinhado ao divisor de guas v-se uma linha vermelha que sinaliza a diviso das regies. Uma pessoa que caminha distrada pelo territrio muitas vezes no saber se est em uma ou em outra regio, o trnsito entre elas pode confundir. Entretanto, do alto da cordilheira h dois picos, que so prximos s nascentes primeiras de uma e outra bacia, das nascentes as guas correm em
  39. 39. 40 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos direes opostas. Um pico se chama Ver TV e quem est nele olha para o lado esquerdo16 do mapa. O outro pico se chamaOlhar o Mundoe quem nele sobe levado a olhar para a direita do mapa. So duas perspectivas completamente distintas da mesma regio. Inicialmente, e um pouco mais rapidamente, quero apresentar a regio apreciada a partir do picoVer TV. A partir de Ver TV encontra-se a nascente de um rio que corta toda a regio. Este rio, sem meandros, chega ao mar. Ele passa pelas pequenas cidades de Blue pill e Soma. Tanto Soma (do livro Admirvel mundo novo de Aldous Huxley) quanto a plula azul (do filme Matrix) fazem aluso escolha do caminho fcil, ao caminho de s ver o mundo como o sistema deseja. Tomar Soma um tipo de fuga, como nos conta a msica da banda The Strokes: Eles deveriam ter tomado Soma quando os tempos difceis abriram seus olhos. E o soma, segundo Huxley em Admirvel mundo novo, est sempre disponvel para todos: ou se, alguma vez, por acaso infeliz, um abismo de tempo se abrir na substncia slida de suas distraes, sempre haver o soma, o delicioso soma, meio grama para um descanso de meio dia, um grama para um fim de semana, dois gramas para uma excurso ao esplndido Oriente, trs para uma sombria eternidade na lua; de onde, ao retornarem, se encontraro na outra margem do abismo, em segurana na terra firme das distraes e do trabalho cotidiano, correndo de um cinema sensvel a outro, de uma mulher pneumtica a outra, de um campo de Golfe Eletromagntico a...(Huxley, 1932, p.61-62). porissoqueestabaciaamaispovoada,contmasmaiorescidadesesuamaiorplanciesechama Zona weekend(zona do final de semana). H uma enorme extenso de praias de areias douradas, repletas de opes para passar o tempo, provavelmente repletas de mulheres pneumticas e cinemas sensveis. Nesta bacia h uma aparente tranquilidade, uma grande monocultura social, uma aparente ausncia de conflitos. Isto ocorre porque a sociedade contempornea constroi, nas mais diversas dimenses, uma organizao, economia, subjetividade e educao hegemoneizantes. Estas dimenses se afirmam por meio de uma racionalidade tcnico-instrumental-econmica que produz conhecimento cientfico e sistemas de significaes calcados no modo capitalista. Este modo hegemnico de produo de conhecimento e signos termina por induzir uma associao entre o observado com o que se entende por real e deste real com o que se entende como verdade. a monocultura da racionalidade da cincia, acusada por Santos (1999, 2007). O imaginrio social de nossa poca reveste-se, assim, de uma aparente neutralidade da tcnica e da cincia, criando condies para uma adeso sem crtica imagem oferecida pelo sistema, processo que o mantm por aquilo que ele (CASTORIADIS & COHN-BENDIT, 1981). Apesar desta aparncia de priso alienante, esta regio vivida com muito prazer, com vrios passatempos. Entretanto ela no to estvel como desejaria, prximo dela h vrios aspectos 16 crucial destacar que no se usar as convenes geogrficas Leste-Oeste-Norte-Sul por opo. O Norte imaginrio aquele que se quer alcanar, que pode ser o Sul, o Leste, o Oeste ou o Norte. Se este mapa imaginrio fizesse referncia ou se baseasse em partes do planeta Terra, teria optado por um mapa invertido, fazendo do Sul o nosso norte, como sugeriu o artista uruguaio Joaqun Torres Garca.He dicho Escuela Del Sur; porque en realidad, nuestro norte es el Sur. No debe haber norte, para nosotros, sino por oposicin a nuestro Sur. Por eso ahora ponemos el mapa al revs, y entonces ya tenemos justa idea de nuestra posicin, y no como quieren en el resto del mundo. La punta de Amrica, desde ahora, prolongndose, seala insistentemente el Sur, nuestro norte. JoaqunTorres Garca. Universalismo Constructivo, Bs. As.:Poseidn, Montevideo, 1944.
  40. 40. 41Captulo 1 - Enfoques Metodolgicos para Eventos e Atividades Dialgicas que podem prejudicar o efeito do Soma ou da plula azul. Um deles a existncia gritante e visvel de zonas restritas, de privilgios e desigualdades. Outro potencial inquietante a arte, ainda que parte dela sucumba ao que se denomina indstria cultural e mass media. Dentro da arte h uma zona de litgio entre as bacias, nesta zona a gua corre uma vez pra um lado e outra vez pro outro, a plancie dos documentrios. Os documentrios, por vezes, provocam instabilidades na matrix, geram inquietudes que podem conduzir pessoas que estavam vendo TV a olharem o mundo. Esta bacia litornea, ela tem um final, como um final tem a vida de cada um. Este final inquieta, mesmo quando se est em luxuriantes praias e paisagens exclusivas. O que h depois? Para representar isso, o mapa imaginrio inclui trs ilhotas, bem na cara da bacia, que so denominadas Saudade, Espelho e Caverna. Para falar de Saudade e Espelho selecionei uma frase de talo Calvino, em As cidades invisveis: Voc viaja para reviver o seu passado? era, a essa altura, a pergunta do Khan, que tambm podia ser formulada da seguinte maneira: Voc viaja para reencontrar o seu futuro? E a resposta de Marco: - Os outros lugares so espelhos em negativo. O viajante reconhece o pouco que seu descobrindo o muito que no teve e o que no ter.(Calvino, 1972). Espelho e Saudade podem convidar o sujeito inquietude e reflexo porque evidentemente se referem a ele mesmo, seu presente e seu passado. Em Espelho e Saudade o sujeito colocado de frente para si mesmo. Caverna, por sua vez, uma ilha que ilude, em seu fundo esto projetadas sombras que o sujeito pode ficar a olhar eternamente, confundindo-as com a realidade. A ideia desta ilha emana do mito da caverna, apresentado por Plato, no textoA repblica: Scrates Agora imagina a maneira como segue o estado da nossa natureza relativamente instruo e ignorncia. Imagina homens numa morada subterrnea, em forma de caverna, com uma entrada aberta luz; esses homens esto a desde a infncia, de pernas e pescoos acorrentados, de modo que no podem mexer-se nem ver seno o que est diante deles, pois as correntes os impedem de voltar a cabea; a luz chega-lhes de uma fogueira acesa numa colina que se ergue por detrs deles; entre o fogo e os prisioneiros passa uma estrada ascendente. Imagina que ao longo dessa estrada est construdo um pequeno muro, semelhante s divisrias que os apresentadores de tteres armam diante de si e por cima das quais exibem as suas maravilhas. Glauco Estou vendo. Scrates Imagina agora, ao longo desse pequeno muro, homens que transportam objetos de toda espcie, que os transpem: estatuetas de homens e animais, de pedra, madeira e toda espcie de matria; naturalmente, entre esses transportadores, uns falam e outros seguem em silncio. Glauco Um quadro estranho e estranhos prisioneiros. Scrates Assemelham-se a ns. E, para comear, achas que, numa tal condio, eles tenham alguma vez visto, de si mesmos e de seus
  41. 41. 42 Poltica de guas e Educao Ambiental: processos dialgicos e formativos em planejamento e gesto de recursos hdricos companheiros, mais do que as sombras projetadas pelo fogo na parede da caverna que lhes fica defronte? Saramago, no livro A caverna, reinventou o mito, para ele os shoppings centers so prottipos da caverna, assim como o a prpria TV. Em uma entrevista ele disse: Quando digo que as pessoas que esto na caverna somos todos ns porque damos muito mais ateno s imagens do que quilo que a realidade . Estamos l dentro olhando uma parede, vendo sombras e acreditando que elas so reais. Tambm Plato considerava que aqueles da Caverna se pareciam conosco. Mas tanto para Plato como para Saramago esta uma condio que pode ser enfrentada. No livro A caverna, um dos personagens, ao visitar clandestinamente uma escavao em que restos arqueolgicos vinham sendo protegidos como segredo de Estado, percebe algo to revelador que decide fugir com sua famlia, buscar outra vida, to livre quanto incerta. L embaixo h seis pessoas mortas, trs homens e trs mulheres, No me surpreende, era exatamente o que eu calculava, que deveria tratar-se de restos humanos, sucede com frequncia nas escavaes, o que no compreendo por que foram todos estes mistrios, tanto segredo, tanta vigilncia, os ossos no fogem, e no creio que roubar esses merecesse o trabalho que daria, Se tivesses descido comigo compreenderias, alis ainda ests a tempo de ir l abaixo, Deixe-se de ideias, No fcil deixar- se de ideias depois de se ter visto o que eu vi, Que foi que viu, quem so essas pessoas, Essas pessoas somos ns, disse Cipriano Algor, Que quer dizer, Que somos ns, eu, tu, o Maral, o Centro todo, provavelmente o mundo.(Saramago, 2000, p.334-335). Perceber-se na caverna aspectos que revelam uma condio do indivduo e de toda a sociedade. Falar desta bacia na qual a maioria da populao permanece sem contestao explicitar algo que foi apontado os educadores ambientais precisam olhar para a sociedade como ela , como o sistema opera, como ele atrai, como cria mecanismos de adeso aquilo que ele , como ilude e tranquiliza. A minha alma t armada e apontada para cara do sossego! (...) As grades do condomnio so pr trazer proteo, mas tambm trazem a dvida se voc que t nessa priso. Me abrace e me d um beijo, faa um filho comigo!