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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS MESTRADO EM ARTES VISUAIS
ROSÂNGELA APARECIDA BECKER INÁCIO
SUSPIROS
Fronteiras e Contaminações das Galerias de Criciúma
FLORIANÓPOLIS 2008
ROSÂNGELA APARECIDA BECKER INÁCIO
SUSPIROS
Fronteiras e Contaminações das Galerias de Criciúma
Dissertação apresentada como requisito para
aquisição de título de Mestre em Artes Visuais,
Curso de Mestrado em Artes Visuais, Linha de
Pesquisa: História, teoria e poéticas da arte.
Orientador (a) Profª. Drª Célia Maria Antonacci
Ramos
FLORIANÓPOLIS 2008
AGRADECIMENTOS
Agradeço a todas as pessoas que direta ou indiretamente colaboraram para
a elaboração e conclusão desta pesquisa: Sandra Lima Singelo, Yara Guasque
Araujo, João Becker, Maria do Carmo Alvez Becker, Marcos Vinícius e Mariana
Becker Inácio, Rafael Ramires da Rosa, Sheridan Raupp, Estela Adriana
Canabarro, Rogério Becker, Yara Masurak, Gabriel Becker Fernandes, Karine
Fernandes, Maria Luiza Fernandes, Rogenes David Fernandes Becker, Elcio
Becker, Marciléia Bitencourt Becker, Elcio Bitencout Becker, Gustavo Bitencourt
Becker, Geórgia Paula Patrícia Becker, Gabriel Coutinho da Rocha, Luis Gabriel
Coutinho da Rocha Filho, Ana Claudia Valente, Isabel Cristina Valente, Fernando
Eufrásio, João Valente, Gilmar Valente, Nara Machado Valente, Ana Paula
Machado Valente, Emanuel Machado Valente, Jair Fernandes, Alvacir Inácio
Fernandes, Vanessa Shultz, Cristian Cechinel, Fabricia Cechinel, Cássia Beatriz
Villain, Sandra Fernandes, Cristini Marcos, Cristine Gomes, Deise Perez, Dona
Dedé, Antônio Inácio, Bernadet Budni, Deivid da Silva, André Augusto Crema,
Daine Zanatta, Roberta Mataragi, Reginaldo Francisco, Fátima Nhamadjo, Zulma
Travessini, especialmente a minha orientadora Célia Maria Antonacci Ramos e
todo o carinho para quem me dedicou o seu amor incondicional e foi uma grande
inspiração e força, Maria Julia Becker da Rocha.
... a fronteira se torna o lugar a partir do qual algo começa a se fazer presente...
Homi Bhabha (2003, p. 24)
Resumo
A presente dissertação de mestrado compreende um estudo sobre a cidade de
Criciúma (SC), seguida de um entendimento sobre suas galerias em suas
fronteiras e contaminações, tendo em vista proposições poéticas que
proporcionem um encontro do público com o ambiente de vida de uma cidade
mineradora. Na tentativa de instaurar a metáfora da arte como dispositivo de
geração de encontros, promove acontecimentos e provoca reflexões, foram
elaborados este trabalho e proposições poéticas expostas na Galeria de Arte da
Fundação Cultural de Criciúma. Neste projeto, as metáforas sobre as galerias de
Criciúma se convertem em diálogos, com a intenção de levar o espectador a
refletir sobre a cidade e senti-la, de modo que lhe seja devolvido o sentimento de
identidade e de pertencimento a uma cidade mineradora e com um passado de
mineração, para passarem a participar mais ativamente das decisões envolvendo
essa atividade e suas problemáticas. Com base na metáfora dos suspiros e das
“Passagens” de Benjamin (2007), busca-se possibilitar um encontro que objetiva
dissolver as fronteiras geográficas e confrontar os sentidos dos sujeitos através de
imagens, vídeos e instalações.
Palavras-chave: Criciúma. Galerias. Suspiros. Passagens. Exposição de artes
visuais.
Abstract
SIGHS
Borders and Contaminations of Criciúma Galleries
The present dissertation for a master degree includes a study about Criciuma City
(SC-Brazil), followed by an understanding about its galleries at its borders and
contaminations, considering poetical propositions allowing the people to approach
the life environment in a mining city. Attempting to establish the art metaphor as a
mechanism for generating meetings, promoting events and causing reflections, this
work was developed, as well as poetical propositions exposed at the Art Gallery of
Fundação Cultural de Criciuma. In this project, metaphors about Criciuma galleries
turn into dialogues, attempting to induce the spectator to meditate about the city
and feel it, in order to recover the feelings of identity and membership of a mining
city, also with a mining past, thus beginning to participate more actively in the
decisions affecting this activity and its issues. Based on the metaphor of sighs and
“passageways” by Benjamin (2006), there is an attempt to propitiate a meeting,
aiming to dissolve the geographic borders and to confront the subjects’ feelings
through images, videos and installations.
Keywords: Criciúma, galleries, sighs, passageways, art exposition.
CRÉDITOS DAS ILUSTRAÇÕES 1.1 – figura da Capa: painel de suspiros doces, “Suspiros dos desejos”.
1.2 - página 38, 1ª imagem acima panorâmica da cidade de Criciúma, imagem
capturada por Deise Perez em 2007, abaixo a direita imagem de mina
subterrânea (trabalho de perfuração) arquivo da Carbonífera Criciúma,
gentilmente cedido em 10/07/2008. A imagem a esquerda se refere ao antigo
laboratório de análises de solo, hoje Galeria de Arte da Fundação Cultural de
Criciúma, imagem capturada pela autora.
1.3 - página 57, 1ª imagem à direita, “Galeria Comasa” (22/12/2007), (foto da
autora). 2ª imagem, “Galeria Subterrânea”, (fotografia pertencente ao arquivo
interno da Carbonífera Criciúma), gentilmente cedida pela empresa em
(10/07/2008). 3ª imagem, figura de um mapa geológico de camadas de
minérios, de uso público, cedido pelo DNPM em 12/10/2006.
1.4 – página 87, três imagens da personagem “Coletadora de Ácidos” (fotos da
autora).
1.5 – página 104, Vista parcial da Galeria de Arte da Fundação Cultural de
Criciúma abrigando a “Exposição SUSPIROS”. Imagem capturada em
16/07/2008. A imagem mostra a sala dos desejos com o painel “suspiro dos
desejos” e ao fundo a sala dos labirintos ativados com a imagem da obra
“confrontando os territórios”.
1.6 – página 105, a 1ª imagem acima é uma vista da sala da exposição que
apresenta as fotografias da série “Coletadora de ácidos”, imagem capturada
em 16/07/2008. A 1ª imagem abaixo, à direita, corresponde às fotografias da
primeira sala, “Sala dos Desejos”, e mostra 3 fotos intitulado “Suspiro do
Tempo”, capturado em 16/07/2008. A segunda foto abaixo é uma vista da Sala
da série “Coletadora de ácidos” imagem capturada na abertura da exposição
no dia 15/07/2008.
1.7 – página 106, imagens da sala “Labirintos Ativados” com as imagem da obra
“Confrontando os territórios”.
1.8 - página 107, ventiladores da sala “Labirintos Ativados” que ligados ativaram
o ambiente com ar.
1.9 – página 1008, a 1ª imagem é uma vista parcial do laboratório com a capela
que contém os vidros a direita e com o telão do data show ao fundo, onde
acontece o encontro das galerias. Abaixo fotos do poço.
1.10 – página 109, a 1ª imagem é uma visão parcial da sala dos “Labirintos
Ativados” com os ventiladores e a obra “Confrontando os territórios”. Ao fundo
o laboratório com a capela. A imagem abaixo à direita é uma visão aproximada
dos vidros que ficam dentro da capela, 101 contendo testemunhos geológicos
e 70 contendo ovo podre, imagens capturadas no dia 16/07/2008. A imagem da
esquerda mostra o dia da abertura na “Sala dos Desejos” com o público
assistindo ao vídeo “Suspiros do Tempo”.
1.11 - página 110, a 1ª imagem acima é uma visão parcial da sala do laboratório
fotografado sem o uso de flash com um vídeo projetado em data show com o
encontro das galerias, imagem capturada em 16/07/2008. Abaixo à direita,
imagem da capela do laboratório contendo os vidros (ativadores de
pertencimento), imagem capturada sem flash, e à esquerda imagem da primeira
sala do vídeo “Suspiros do tempo”.
14
SUMÁRIO INTRODUÇÃO ................................................................................................... 16 Suspiro ............................................................................................................... 16
O LUGAR, O SENTIDO, O TEMPO ................................................................... 22
CAPITULO 1: SITUANDO A HISTÓRIA DA CIDADE....................................... 39
1.1 A CIDADE E A MINERAÇÃO ...................................................................... 39
1.2 A CIDADE E O NOVO URBANISMO ........................................................... 48
CAPÍTULO 2: GALERIAS ................................................................................ 58 2.1 DEFINIÇÃO.................................................................................................. 58
2.2 GALERIAS DE EXTRAÇÃO DE CARVÃO MINERAL.................................. 61
2.3 GALERIAS DE COMÉRCIO......................................................................... 67
2.4 GALERIAS DE ARTE................................................................................... 73
2.5 GALERIA DE ARTE DA FUNDAÇÃO CULTURAL DE CRICIÚMA
– ESPAÇO (RE)SIGNIFICADO..................................................................... 74
CAPÍTULO 3: PROPOSIÇÕES POÉTICAS — SUSPIROS, FRONTEIRAS E CONTAMINAÇÕES ........................................... 88
3.1 PROPOSIÇÕES FOTOGRÁFICAS.............................................................. 88
3.1.1 “Coletadora de ácidos ............................................................................ 88
3.1.2 “Confrontando os territórios” ................................................................ 91
3.2 INSTALAÇÕES ............................................................................................ 93
15 3.2.1 “Suspiros Suspirados” ........................................................................... 93
3.2.2 “Poço dos Suspiros” .............................................................................. 94
3.2.3 “Doces lembranças” ............................................................................... 95
3.3 RECURSOS DE CÂMERAS DE VIGILÂNCIA ............................................. 97
3.3.1 “Suspiros” ............................................................................................... 97
3.3.2 “Inversão dos Suspiros” ...................................................................... 100
3.4 VÍDEOS...................................................................................................... 101
3.4.1 “Suspiros” ............................................................................................. 101
3.4.2 “Suspiros do Tempo” ........................................................................... 102
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 111
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................ 116 6.Anexos ......................................................................................................... 121
16
1) INTRODUÇÃO
SUSPIRO
Definido como movimento de respiração que modifica algumas
funções fisiológicas, o suspiro1 é, a princípio, um estado de espírito com
sonorização. A respiração é um movimento de inalação e exalação do ar
indispensável para a vida. Oxigena nosso cérebro, liga o corpo à mente, o homem
à vida. Elo, o suspiro é uma fronteira imaterial.
As fronteiras traçam linhas divisórias entre territórios opostos ou
diferenciados pela cultura; determinam aquilo que deve ser oculto e aquilo que
deve ser mostrado. Limites entre dois espaços que se contrapõem, ligam e
contaminam os territórios, sejam físicos ou imaginários. Demarcação entre
1 Por analogia às emoções surgiram os doces de claras, leves e açucarados.
17 elementos acessíveis e elementos dificultosos, toda fronteira produz sedução.
Sedução por coisas não reveladas, por passados esquecidos ou não conhecidos.
Parte limítrofe de um espaço em relação a outro, qualquer sistema
de ventilação é conhecido como janela de passagem, mas quando se refere à
ventilação subterrânea é popularmente conhecido como suspiro ou poço de
ventilação. Os suspiros das minas têm como característica a ventilação, mas
também são projetados como aberturas de poços ligando os labirintos
subterrâneos à superfície. Além dessas necessidades, os suspiros também são
abertos para servir como intervalos, simples buracos com a finalidade de isolar um
território do outro.
Entretanto, os buracos que levam ao subsolo levam ao
desconhecido, guardam mistérios das profundezas da terra e desde as primeiras
incursões instigaram a curiosidade humana, provocando sedução. Uma história
recente relata buracos misteriosos cavados para isolar um tesouro que se
presume existir no Condado de Lunenburg, ao sul de Nova Scotia, no Canadá.
Esses buracos aparecem no mapa em uma espécie de desenho diagonal no
18 subsolo. Há quem afirme estar ali enterrado, na pequena ilha chamada Oak
Island, o tesouro dos templários. Acredita-se que esse tesouro não foi colocado ali
por acaso e que, na verdade, o “Poço do Dinheiro”, como é conhecido, foi
construído pelos cavaleiros templários. O mais curioso é o fato de o buraco em
questão ter possibilitado um verdadeiro mapa do que podia ser encontrado no
subsolo numa profundidade de até 152 metros.
Além do poço que daria acesso ao dinheiro, existem também outros
“poços internos”, aparentemente escavados pelos idealizadores do “Poço do
Dinheiro”, talvez como buracos de ventilação para a escavação de um túnel.
Quando esse túnel é alcançado, proporciona uma inundação que dificulta à
expedição chegar até o tesouro. Este poço de inundação foi encontrado em 1897
na altura de 33 metros, temporariamente fechado por rochas. Durante a
escavação, muitas cavidades artificiais foram encontradas. Os buracos seriam
acessos ao tesouro, à ventilação para descer ao subsolo, mas também se
constituem como intervalos isolando o tesouro daqueles que tentam chegar até
ele.
19 A ventilação em uma mina tem como principal objetivo o
fornecimento de um fluxo, natural ou artificial, de ar puro para todos os locais de
trabalho no subsolo, em quantidades suficientes para manter as condições
necessárias de higiene e segurança dos trabalhadores. Uma ventilação
inadequada torna as condições ambientais da mina precárias para os operários e
equipamentos, representando, para a empresa, uma perda de produtividade e,
para o mineiro, um risco à própria vida. De uma maneira simplificada, podemos
resumir o papel da ventilação como um artifício de engenharia para permitir a
manutenção de uma quantidade adequada de oxigênio aos operários e a
eliminação da poeira em suspensão e dos gases tóxicos, oriundos do
funcionamento dos motores e do desmonte de rochas com explosivos, além de
evitar a formação de misturas explosivas gás-ar e atenuar a temperatura e a
umidade excessiva. Na construção de um modelo de buraco de ventilação são
utilizados dados de vazão, diferença de pressão estática, geometria das galerias e
características dos ventiladores.
20 As técnicas de ventilação de mina podem ser resumidas
basicamente em duas categorias: ventilação natural e ventilação mecânica. A
ventilação natural é uma técnica utilizada desde os primórdios da mineração. É
possibilitada pela diferença de temperatura do ar no interior da mina em relação
ao ar externo. Com a crescente necessidade de um maior fluxo de ar no interior
das minas, desenvolveram-se as técnicas de ventilação mecânica, com
ventiladores instalados no poço de entrada (insuflação) ou saída (exaustão) de ar.
Esse desenvolvimento ocorreu, principalmente, a partir da segunda metade do
século XIX, com os ventiladores mecânicos de grandes diâmetros, exclusivamente
centrífugos e de velocidades reduzidas, movidos por moinhos de vento ou rodas
hidráulicas.
Os suspiros fazem parte da história de tudo o que envolve a aventura
do homem no subsolo, desde as galerias pré-históricas até aquelas de mineração.
Atualmente, a engenharia possibilitou suspiros artificiais para as galerias de
comércio. Esses poços de respiração são vias respiratórias, os canais de
comunicação do homem com a vida.
21 Na cidade de Criciúma (SC), os sujeitos estão ligados diretamente às
galerias, pois elas são os suspiros, o elo, de todo o universo de vida nesse
território. Neste trabalho, os suspiros são uma passagem que instaura uma
fronteira entre as galerias — de mineração, de comércio e de arte — de Criciúma.
Elos físicos e imaginários que me permitem na arte percorrer no presente minha
infância, adolescência e prática artística, ligando mundos, territórios e épocas
possíveis somente na arte.
Lembrando a metodologia citada por Walter Benjamim, em seu livro
Passagens (2006), atravesso o passado da minha infância e situo a história da
cidade a partir dos anos 1970, tema do primeiro capítulo. Pensando o
desenvolvimento econômico, político e social da cidade de Criciúma e sua
configuração geopolítica, direcionei o eixo desta pesquisa ao sistema de galerias
que acionam a vida da cidade. No segundo capítulo relato as galerias de
mineração, comércio e arte.
As fronteiras e contaminações são apresentadas no último capítulo
com base na descrição das proposições poéticas que fazem parte da exposição
22 realizada na Fundação Cultural de Criciúma, de 15 de julho a 30 de agosto de
2008.
O LUGAR, O SENTIDO, O TEMPO — A CIDADE
Na tessitura das avenidas, galerias, ruas, e as pessoas que nela transitam
e depositam seus afazeres cotidianos — vai sendo construído o traçado geopolítico de uma cidade. Labirinto sígnico, onde somos conduzidos pelo
fio de Ariadne à luz da história de cada viver cultural. A cidade vive e guarda cada passado/presente. É uma escrita no espaço que se recria a
cada tempo. A cidade não pára. (Célia Maria Antonacci Ramos)
Os lugares são carregados de símbolos que nos causam sensações
e ativam nossa memória, nossa faculdade de perceber. Por meio da visão, das
ondas sonoras, do calor, dos sabores e dos odores, ou seja, das sensações,
percebemos o presente e nos remetemos a momentos vividos em um determinado
tempo e espaço; damos início a um processo de recepção. Deleuze (2002) cita:
Segundo a expressão de Valéry, a sensação é o que se transmite diretamente, evitando o desvio ou o tédio de uma história a ser contada. E, positivamente, Bacon não se cansa de dizer que a sensação é o que
23 se passa de uma “ordem” a outra, de um “nível” a outro, de um “domínio” a outro. É por isso que a sensação é mestra de deformações, agente de deformações do corpo. (p. 45)
Nessa perspectiva, podemos dizer que potencializamos o mundo por
meio dos nossos sentidos, identificamo-nos com o lugar e nos situamos no tempo
por meio deles. Os sentidos reconstroem a imagem em nossa memória pessoal ou
na do grupo que vive em uma região. Para Nelson Brissac Peixoto (1996),
Aquilo que faz do encontro de uma palavra, de um cheiro, de um lugar, de um rosto não é comparado com outros eventos. Tem um valor de iniciação em si próprio, ainda que só venhamos a sabê-lo mais tarde. É o que faz as cidades parecerem paisagens. (p. 24)
Também o escritor Yamaki (2000, p. 48) cita uma entrevista com um
perfumista que diz reconhecer as cidades pelo cheiro.
O odor nas cidades é um forte indicador estabelecendo uma relação
com o lugar; é um elemento de ordenação espacial que permite identificar e
complementar as informações visuais. Mesmo com os olhos fechados ou à noite,
podemos identificar um lugar pelo seu cheiro. Pode-se determinar se um lugar é
agradável ou indesejável muito mais pelo seu odor do que pela sua aparência. A
24 visão é optativa — podemos fechar os olhos. Além disso, a aparência é
culturalmente significada: não há feio ou bonito independente das culturas.
Para Deleuze (2002), “a Figura é a forma sensível referida à
sensação; ela age imediatamente sobre o sistema nervoso, que é carne, enquanto
a Forma abstrata se dirige ao cérebro e age por intermédio do cérebro, mais
próximo do osso” (p. 42). O odor é uma forma abstrata de figuração que afeta
nosso sentido olfativo e remete o cérebro a tempos e lugares presentes e
passados. Pode remeter ao prazer ou ao desconforto, porque ver não envolve
profundamente as emoções tanto quanto sentir os odores. Isso porque a
comunicação visual pode operar transformações psíquicas, mas não provoca
diretamente deformações no corpo. Além disso, os odores não podem ser
evitados.
Nas cidades de exploração mineral, a percepção através do olfato
recebe um significado sócio-espacial, pois os gases fortes e desagradáveis da
exploração mineral provocam enjôo, náusea e tontura; alteram nossas funções
fisiológicas e acarretam doenças respiratórias. Os odores são armazenados na
25 memória do corpo. As pessoas guardam no espaço do corpo um período da
história da cidade. Walter Benjamim, em Rua de Mão Única (1995), nos lembra
que a experiência subjetiva da infância é que legitima nossas memórias.
Nascer e crescer em uma cidade onde a aparência atmosférica não
era percebida pelo sol ou pela chuva, mas pelo efeito da extração mineral, que
através das chaminés jogava no ar os gases tóxicos, registrou em minha memória
uma imagem que significativamente influenciou meu interesse em desenvolver
este projeto de pesquisa e as proposições poéticas resultantes desta pesquisa.
Nesse percurso, foi necessário ir aos locais onde estão armazenadas
as pilhas de carvão, e isso proporcionou a oportunidade de ver de perto como hoje
se cobrem os rejeitos piritosos com argila para evitar a formação dos gases
sulfurosos. Foi possível constatar também que a memória traz de volta a
experiência, pois não se trata de um tempo só passado — é também um tempo
presente. Hoje os gases não são mais jogados no ar dentro da cidade de
Criciúma, nem emitidos a céu aberto, mas são ainda sutilmente sentidos em
alguns lugares distantes do centro urbano. Portanto, pude sentir como o passado
26 ainda é um tempo presente, e verificar as suas conseqüências para a cidade.
Como cita Deleuze ao interpretar a memória involuntária de Proust:
percebo que duas sensações existem no (meu) corpo em níveis diferentes e que se entrelaçavam como dois lutadores, a sensação presente e a sensação passada, para fazer surgir algo irredutível às duas, a memória. Mas não uma memória nostálgica, mas uma memória política, que faz surgir o desejo da prática artística. (DELEUZE, 2002, p. 72)
Andar pelas pilhas de rejeitos carboníferos, pela paisagem negra,
pode ser agradável e sugerir uma estética, mas o cheiro torna-se agressivo e
ameaçador, pois afeta a saúde do corpo. Em Criciúma, o cheiro de gás sulfuroso
era constante e desagradável, provocava mal-estar, dores de cabeça, enjôos e
tontura. Por meio do cheiro, sentíamos a presença do que o causava sem mesmo
vê-lo. O cheiro era muito mais do que uma sensação; era uma ameaça constante,
que ainda hoje retorna à memória, à minha e à de muitos habitantes dessa cidade.
Com o tempo, o fechamento de algumas minas e a fiscalização ambiental, o cheiro
forte e permanente desapareceu, o que não significa que de forma mais amena
ainda não o recordemos.
Busco em um recorte do tempo histórico da cidade de Criciúma —
27 mais precisamente no período de minha infância até os dias de hoje, do qual
tenho acesso aos documentos que me propiciam entender a cidade onde nasci e
cresci — validar a experiência subjetiva nos textos-documentos e, a partir dessa
pesquisa, elaborar as proposições poéticas em diálogo com a pesquisa teórica. A
pesquisa objetiva, assim, criar uma interlocução entre o sistema teórico, o sistema
sociopolítico da cidade de Criciúma e o sistema das artes.
Suspiros são os fossos abertos nas minas que possibilitam a entrada
de ar no subsolo, isto é, a comunicação das minas com a cidade, com a vida. A
poética dos Suspiros é uma exposição com vídeos, telepresença, instalação e
fotografias, que pretende estabelecer uma comunicação entre as galerias, de
forma a despertar um debate em torno não só das fronteiras físicas desses
espaços, mas especialmente das suas contaminações. As exibições artísticas sem
interlocuções teóricas correm o risco de simplesmente serem percebidas em seus
efeitos estéticos, mas considero serem também estes importantes — pois são eles
que propiciarão uma experiência visual que pretende instigar nos criciumenses
28 uma percepção mais precisa da cidade onde vivem, tirando-os da letargia.
Lembro Deleuze, quando nos sugere:
Em arte, tanto em pintura quanto em música, não se trata de reproduzir ou inventar formas, mas de captar forças. É por isso que nenhuma arte é figurativa. A célebre fórmula de Klee, “não apresentar o visível, mas tornar visível.” não significa outra coisa. A tarefa da pintura é definida como a tentativa de tornar visíveis forças que não são visíveis. Da mesma forma, a música se esforça para tornar sonoras forças que não são sonoras. Isso é evidente. A força tem uma relação estreita com a sensação: é preciso que uma força se exerça sobre um corpo, ou seja, sobre um ponto de onda, para que haja sensação (2007, p. 62)
As proposições poéticas relatadas neste trabalho pretendem captar
ondas visuais suscetíveis de provocar sensações capazes de comunicar as forças
latentes que contaminam as galerias. Completando com Deleuze: “É assim que a
música deve tornar sonoras forças insonoras, e a pintura, visível forças invisíveis”
(id., ibid.).
Deleuze (2007) descreve sua experiência de estar diante de um
tríptico de Bacon. Ele afirma ser atravessado pela obra, em uma experiência ímpar
e compartilhada, porque, para ele, uma obra sempre traça um diálogo. Deleuze
(2007) descreve as exposições de arte como lugares de experiências sensoriais,
29 aonde o público vai ao encontro de alguma coisa que o toque e o modifique. Além
disso, para Osman Lins, “uma obra não necessariamente vai ser entendida, ou
mesmo os que lêem um livro serão tocados, mas alguma coisa se modifica no
universo da vida porque a obra existe” (LINS, 1986, p.129).
Percebemos que muitos artistas em suas poéticas vêm abordando
problemáticas dos seus territórios. Um exemplo é a artista Lida Abdul, a qual
investiga temas polêmicos como a guerra no Afeganistão e se utiliza das práticas
políticas da arte como possibilidade de reconstrução do ambiente e da vida após a
destruição (LAGNADO & PEDROSA, 2006, p. 136)2. Nas obras da artista,
podemos ver temas relevantes envolvendo problemáticas políticas e sociais que,
quando colocadas em contato com o público, podem instaurar um novo modo de
pensar a política e a arte. Quando colocadas no contexto das cidades, elas
provocam um olhar atento, pois a cidade é o casulo, o espaço do habitar. O
encontro entre obra e público é uma busca de esperança para a reconstrução da
sociedade.
2 Entrevista cedida pela artista à curadora Rosa Martinez, publicada no Guia da 27ª Bienal de São Paulo.
30 Neste trabalho, busco articular as práticas artísticas contemporâneas
com o pensamento de Walter Benjamim. Reflito sobre as práticas artísticas que
permeiam as problemáticas do universo de vida das grandes cidades hoje, para
pensar a arte como um diálogo com o público mergulhado na letargia das grandes
metrópoles.
A cidade e suas problemáticas, pensadas a partir das reflexões de
alguns filósofos, podem se tornar potentes articulações entre as obras e o público.
Exemplo disso é o projeto Arte/Cidade, idealizado e promovido sob a
responsabilidade do filósofo Nelson Brissac Peixoto, na cidade de São Paulo. O
trabalho foi constituído de intervenções urbanas promovidas por artistas
convidados pelo filósofo curador e visa, por meio delas, em suas diferentes
etapas, pensar a cidade — seus espaços e o público que nele trabalha e habita,
vive e sonha — enquanto espaço complexo e dinâmico, em permanente mutação,
engendrando novas e inusitadas configurações. Realizado desde 1994, esse
projeto realizou quatro eventos de grande porte na cidade de São Paulo e um em
conexão com Berlim.
31 O primeiro evento foi “Arte/Cidade 1: Cidade sem janelas”, e
representava a cidade da memória (SP 1994). “Arte/Cidade 2: A Cidade e seus
fluxos” representava a cidade com a qual nos defrontamos e na qual circulamos.
“Arte/Cidade 3: A Cidade e suas histórias” era uma leitura via arte da histórica da
cidade. “Arte/Cidade 4: as máquinas de guerra contra os aparelhos de captura”
confrontava as acentuadas diferenças sociais e econômicas da cidade de São
Paulo, acentuando os aparelhos de vigilância contemporâneos que monitoram as
pessoas com o objetivo de incriminá-las. Por fim, o BRAS/MITT, um
desdobramento do Arte/Cidade, ocorreu simultaneamente em São Paulo e Berlim.
Além desses quatro grandes eventos que articulavam a arte para
pensar as problemáticas das grandes cidades, aqui entre nós, no Brasil, em
novembro de 2002, a ONGEXO, em parceria com a Associação
Resistência/Criação, que havia se apresentado no Fórum Social Mundial, em
Porto Alegre, em fevereiro daquele mesmo ano, promoveu no Edifício Copan, em
São Paulo, o evento intitulado “São Paulo AS, Situação # 1”. Nesse encontro,
32 artistas e filósofos de diversos países se reuniram com objetivo de pensar e
prospectar práticas estéticas no contexto de metrópoles como São Paulo.
Na cena internacional, muitos artistas vêm pesquisando os
subterrâneos das minas e as condições de trabalho nesses lugares. Partindo
desses ambientes de trabalho explorados em condições arriscadas, alguns artistas
elaboram poéticas capazes de conduzir o público visitante das exposições às
profundezas das minas. Em alguns casos, aproveitando as novas tecnologias,
propõem até mesmo poéticas visando levar virtualmente as pessoas a vivenciarem
interativamente esse mundo subterrâneo de trabalho extrativista e as condições
humanas de quem ali se encontra.
Um exemplo é o trabalho de Jill Scott, “Frontiers of Utopia”, na
versão produzida para o ZKM, e “Beyond Hierarchy”, de 2000, uma instalação que
participou do Vision_Ruhr, em Dortmund, na Alemanha. Essa instalação, baseada
em dados bibliográficos e registros históricos reais, construiu personagens que
trabalhavam em uma mina de carvão. Montada em Verwaltungshalle, objetivava
chamar a atenção para a necessidade de um retreinamento dos operários para
33 que pudessem alcançar outros patamares da estrutura social. (POPPER, 2007, p.
277-278).
Também bastante significativo é o trabalho “A Body of Water”, dos
artistas Paul Sermon e Andrea Zapp, realizado em 1999. A partir de concepções
formuladas pelo arquiteto Frederick Kiester, que em 1922 já havia projetado
imagens sobre uma cortina d’água, e com os recursos de última geração do
sistema virtual, esses artistas criaram uma videoinstalação no interior de uma mina
desativada na cidade de Herten, na Alemanha. Chuveiros de alta pressão criavam,
no meio de uma sala de banho da mina, uma cortina d’água, que então recebia
projeções de ambos os lados.
Essa instalação conectava três locais da Alemanha
simultaneamente: uma sala com um chroma-key (pano de fundo) no Museu
Wilhelm Lehmbruck, em Duisburg, o vestiário no Waschkaue, em Herten, e a casa
de banho, no mesmo local. A audiência em Herten e Duisburg era conectada da
seguinte forma: uma câmera de vídeo em Duisburg capturava imagens da
audiência em frente a um pano de fundo (chroma-key) azul, e as enviava para
34 Herten pelo sistema de videoconferência ISDN. A imagem era recebida em Herten
e se misturava ao chroma-key com a imagem da câmera da audiência da sala de
vestir de Waschkaue e era então projetada em uma tela em forma de queda
d’água. Uma câmera situada ao lado do projetor capturava a imagem e alimentava
os três monitores do vestuário em Waschkaue, que devolvia as imagens via
vídeoconferência aos três monitores em Duisburg.
De um lado, os visitantes viam uma projeção colorida em tempo real,
imagens reais de uma audiência em uma mina de carvão, visualmente compostas,
pela técnica de chroma-key, com a imagem de visitantes interagindo com eles à
medida que observavam do museu Lehmbruck, em Duisburg. O sistema
telemático e a tela azul entre os dois lados permitia aos visitantes em um local
aparecerem com os visitantes do outro na projeção da queda d’água, e
virtualmente interagissem esfregando as costas um do outro, como acontecia na
sala de banho.
O trabalho não poderia existir sem a interface da água. Ela
transportava a interação do público e ao mesmo tempo refletia a área, o
35 Ruhrgebiet. A casa de banho era a cabeça da instalação: todo o visual e a
concepção se encontravam lá. Essa instalação pretendia salientar a mudança
atual da indústria cultural na região. De um lado, os visitantes eram confrontados
com a nova era — a plataforma de comunicação interativa —, de outro, percebiam
as sombras do passado representadas na sala de banho dos mineiros. Um olhar
sobre o espaço abandonado da cultura anterior.
As minas de carvão e seu impressionante chuveiro e vestiários
(Waschkaue), foram fechados em 1997. Essas salas, de banho e troca de roupa,
eram usadas por cerca de 1000 mineiros a cada dia. Essa foi uma das maiores
minas de carvão da Europa, empregando mais de 7000 mineiros.
Observando essas proposições poéticas contemporâneas
conectadas às lembranças da minha infância na cidade mineradora de Criciúma, e
refletindo sobre minha atuação na Galeria de Arte da Fundação Cultural de
Criciúma, dividi minha pesquisa em três partes.
36 No primeiro capítulo, “Situando a história da cidade”, lembro a
metodologia de Benjamin (2007) e atravesso o passado de minha infância com a
intensidade de um sonho. Willi Bolle, interpretando Benjamin, explica-nos:
No trabalho das passagens a história social da cidade de Paris no século XIX, o autor esboça “um novo método dialético de historiografia”, que consiste em “atravessar o passado com a intensidade de um sonho”, para experimentar o presente como um mundo acordado, ao qual o sonho se refere. (BOLLE, 2000, p. 83)
No segundo capítulo, discorro sobre as galerias de mineração, de
comércio e de arte. Elas são entendidas nesta pesquisa por meio de Benjamin
(2007), pensando como as cidades atravessam o tempo histórico do passado para
o presente. As galerias de mineração produzem o combustível que impulsiona a
cidade de Criciúma e, por analogia, este trabalho; as galerias de comércio
reproduzem o sonho capitalista que move a engrenagem mineradora; e a Galeria
de Arte da Fundação Cultural de Criciúma é, neste trabalho, o respiro ou suspiro
que pretende, via proposições poéticas, promover o encontro e conduzir à reflexão
sobre as galerias de carvão e de comércio de Criciúma. Isso porque o laboratório
37 de análise de solos ali ainda presente é um signo que nos remete à história da
cidade de mineração. Conhecer essas galerias permite entender as relações entre
os sujeitos e o seu ambiente de vida.
As proposições poéticas apresentadas no último capítulo em forma
de instalação, fotografia, vídeo e telepresença são complementações desta
pesquisa, e objetivam “fazer falar o que não tem palavras”, como coloca Peixoto
(1996, p. 27) ao se reportar à linguagem da fotografia.
39
CAPÍTULO 1: SITUANDO A HISTÓRIA DA CIDADE
“Escrever a história significa atribuir aos anos a sua fisionomia” (Walter Benjamim)
Localizada em uma bacia a 30 km da Serra do Mar e a 20 km do
litoral sul, em meio a uma região de solo argiloso e rico em minerais, o território
hoje conhecido como a cidade de Criciúma era habitado anteriormente por
bugres3, os quais se ocupavam basicamente da agricultura. As características de
clima e solo propício para a lavoura logo despertaram a atenção de imigrantes
europeus. Os italianos, ali chegando, encontraram um tipo de capim chamado
“cresciuma” e passaram a chamar o lugar de São José de Cresciuma. Com o
tempo, outros europeus também ali se instalaram: poloneses (1890), portugueses
3 Denominação dada a indígenas de diversos grupos do Brasil, por serem considerados povos rudes. Dados sobre a história da formação e ocupação da cidade de Criciúma retirados de FAAP (1985).
40 (1905), africanos (1910), alemães (1912) e espanhóis (1914). A população dessa
área foi, desde sua formação, diversificada, mas de predominância européia
colonialista. Em 1943 a cidade passa a ser chamada de Criciúma.
O traçado da cidade em seu primeiro momento seguiu o modelo
espanhol proposto pelos jesuítas no período da colonização, o qual determinava a
existência de uma igreja no centro e, ao seu redor, os outros prédios de
importância político-social. Segundo Sérgio Buarque de Holanda, este modelo
determinava que “no centro ficasse a igreja ladeada por 4 ruas formando um
quadrante, cuja largura correspondesse a dois terços do comprimento, de modo
que nos dias de festas, nelas pudessem correr cavalos” (HOLANDA, 1986, p. 63).
1.1 A CIDADE E A MINERAÇÃO
A descoberta da malha de hulha negra provocou a concentração de
mão-de-obra no território de Criciúma, que se desenvolveu principalmente por
41 meio da exploração mineral de carvão e indústrias cerâmicas. A sedução pela
riqueza do subsolo logo agregou outros colonos migrantes das redondezas. O
interesse comum da mineração unificou esses diferentes povos pela religiosidade
e devoção a Santa Bárbara, padroeira dos mineiros.
A exploração do minério de carvão, descoberto por acaso por
tropeiros vindos de Lages que iam em direção a Sorocaba (SP), iniciou-se de
forma artesanal na década de 1830. Nos anos 1850 foram feitas várias
expedições para pesquisar a qualidade do mineral e, em 1861, foi aprovado o
decreto 2.737, no qual foi dada ao Visconde de Barbacena a concessão para
explorar e minerar o carvão catarinense nas margens do Rio Passa Dois. Por
intermédio do Visconde, duas empresas inglesas recebem a concessão para
explorar o carvão e construir uma ferrovia para escoar esse produto, The Tubarão
Brazilian Coal Mining Company Limited e The Donna Thereza Christina Railway
Company Limited.
Em 1885 foi inaugurado o primeiro trecho da ferrovia Dona Tereza
Cristina, ligando o município de Lauro Müller ao Porto de Laguna e chegando, em
42 1919, à cidade de São José de Cresciuma. Como o carvão catarinense era
considerado de baixa qualidade e a demora na construção da estrada de ferro
emperrava o transporte do minério até o porto, a exploração não despertou muito
interesse por parte dos ingleses. Diante desse quadro, o Governo Federal
repassou a concessão à empresa carioca Lages & Irmãos. A construção da
ferrovia é repassada ao Governo Federal, o qual transfere essa responsabilidade
à Companhia Estrada de Ferro São Paulo - Rio Grande.
Até 1914, a exploração segue um modelo artesanal. Com a eclosão
da I Guerra Mundial foi que efetivamente começaram as atividades carboníferas
de uma forma mais racional, sendo que entre 1917 e 1922 foram fundadas cinco
companhias carboníferas. Nos anos 40 e 50 do século XX, várias minas operavam
na região. Algumas pertenciam a pequenos proprietários locais, outras a grandes
empreendedores cariocas. Havia até mesmo uma estatal, a Companhia Próspera,
subsidiária da CSN.
Em 1931, o governo de Getúlio Vargas decretou o consumo
obrigatório de 10% do carvão nacional e, em 1937, a cota foi alterada para 20%.
43 Com esses dois decretos foram editadas outras medidas em benefício da
exploração do carvão catarinense, tendo o Governo Federal assumido toda a
produção. Esta se elevou de 204.181 toneladas em 1939, para 815.678 toneladas
em 1945. Nesse período, há registros de mortes freqüentes nas minas. Com o
final da II Guerra Mundial, o Governo Federal não assumiu mais a compra do
minério, gerando uma crise que se arrastou até 1954, quando a produção caiu
26%. A produção começou a se recuperar nos anos seguintes, mantendo um ritmo
crescente até 19864.
O movimento sindical, que na Europa eclodiu no final do século XIX,
ganhou força em Criciúma entre os anos 30 e 40 do século XX. As reivindicações
trabalhistas seguiam o modelo europeu: melhorias nas condições de trabalho,
mais garantias de segurança nas minas, auxílio saúde e melhores salários. Ao
longo dos anos 60, ocorreram profundas mudanças no setor e, no início dos anos
70, apenas onze mineradoras estavam em atividade, sendo a maioria pertencente
a empresários locais.
4 Os dados para a formulação deste texto, sobre a exploração mineral, foram extraídos de Quadros e Belolli (2004).
44 Entretanto, com a crise mundial do petróleo, iniciada em 1973, o
carvão catarinense passa a substituir o óleo combustível no uso industrial. O
Governo Federal, visando atender à demanda do mercado industrial interno,
acelera o processo de mecanização das minas e aumenta a produção carbonífera.
A crise traz novas indústrias à região, abrindo novas frentes de trabalho e gerando
um forte processo de expansão urbana em todo o espaço criciumense.
Os locais destinados à disposição final dos rejeitos da mineração
ocupavam em 1979 uma área de 1600 hectares.5 Nos anos 1980 foram
desenvolvidos estudos enfatizando a necessidade do imediato enquadramento
dessa região como área crítica nacional, necessitando urgentemente de projetos
de recuperação ambiental para reverter a situação da região sul, que de fato veio
a se tornar a 14ª Área Crítica Nacional. A partir dessa pesquisa, foi assinada uma
lei prevendo projetos para efeito de controle da poluição gerada pelas atividades
de extração, beneficiamento e uso do carvão mineral. No processo de lavra a céu
aberto, a remoção do capeamento era algumas vezes — e ainda é — realizada de
5 Dados da Japan International Cooperation Agency (JICA).
45 forma desordenada, provocando a inversão das camadas e dando origem ao solo
invertido e à chamada paisagem lunar. Nesta, a maioria das pilhas tem na sua
base a camada fértil do solo e, na sua crista, os arenitos, siltitos, folhelhos
carbonosos e piritosos.
Além dos prejuízos do solo, nas décadas de 1960 e 1970, quando o
gás se desprendia das pilhas de rejeitos ou quando era expelido pelas chaminés,
a paisagem se apresentava com uma espécie de neblina, especialmente devido
às indústrias cerâmicas, que usavam o carvão em seus fornos como combustível
para a queima dos esmaltes e biscoitos de azulejos, como no caso da CESACA
Sociedade Anônima Cerâmica Santa Catarina, situada no centro da cidade. A
visão da paisagem era sentida pelo cheiro desagradável que sempre surgia depois
das chuvas e durava de um a três dias, até se apagar o que ficava queimando em
silêncio.
Na década de 1980, acompanhando a abertura política vivida pelo
país, emergiram sindicatos como o dos mineiros, dos metalúrgicos, dos bancários,
dos servidores públicos e muitos outros, que se organizaram e realizaram
46 movimentos reivindicatórios. A cidade de Criciúma ficou conhecida no Estado de
Santa Catarina como uma cidade de movimento sindical combativo.
Relatórios indicam não ter havido nesse período mais nenhuma
abertura de mina no território de Criciúma; no entanto, os bairros cresceram,
emanciparam-se e constituíram uma base mais forte para se organizarem
sozinhos.
O ano de 1990 marcou o final do grande ciclo expansivo acelerado
do carvão, iniciado durante a II Guerra Mundial. O governo Fernando Collor liberou
a importação do carvão metalúrgico, desobrigou as siderurgias estatais de
comprar o carvão nacional e acabou totalmente com as cotas. Essas medidas
provocaram o fechamento da carbonífera Lavador de Capivari e das unidades da
Indústria Carbonífera Catarinense (ICC), em Imbituba e Criciúma, fechadas em
1994, finalizando o transporte de carvão para outros estados brasileiros. Essas
medidas desencadeiam o início do processo de privatização, que atingiu
diretamente a companhia Próspera, a qual deixou de funcionar em 1995. Com o
fim da produção do carvão metalúrgico nacional, a única saída para o carvão
47 catarinense foi o seu uso energético destinado à termoelétrica Jorge Lacerda –
Tractebel, em Tubarão.
Após sucessivas discussões entre mineradoras e governo, essa
termoelétrica se responsabilizou pela compra de todo o carvão, garantindo a
manutenção da extração até o presente momento. Além disso, há uma longa
discussão entre a associação de mineradores, o Governo do Estado e empresas
norte-americanas sobre as possibilidades de se construir uma nova usina
hidrelétrica para utilizar não só o carvão, mas também todo o rejeito depositado a
céu aberto por pelo menos 100 anos.
Hoje, a exploração vem sendo assunto de debates relacionados ao
meio ambiente. Pelos danos causados pela extração à atmosfera e ao solo,
mesmo depois de desativadas as minas, ambientalistas estão travando batalhas
para fechar as oito minas existentes.
48 1.2 A CIDADE E O NOVO URBANISMO
O processo do crescimento populacional inicia-se em 1913 e explode
nas décadas de 60 a 80 do mesmo século, quando a cidade de Criciúma é
considerada a “Capital Brasileira do Carvão”, mas regride nos anos 90 com a crise
Collor.
Nos anos 70, com a chegada de novas tecnologias para a
exploração mineral, houve um processo de aceleração da economia local. Nesse
período, o acúmulo de pessoas buscando emprego e lugar para morar provocou
uma superlotação desse território, sem infra-estrutura suficiente para tanta gente.
Intentando solucionar os problemas das migrações dessa época, e “modernizar” a
cidade segundo padrões internacionais, a prefeitura de Criciúma decide
(re)urbanizar a cidade, de acordo com um projeto maior do Governo Federal, que,
inspirado na lógica modernista de zoneamento das cidades proposta na Carta de
Atenas de 1933, urbanizou muitas cidades brasileiras.
A respeito da carta de Atenas, Celia Antonacci Ramos (2005)
49 explica:
No pós-guerra, com a reconstrução das cidades, que se desenvolveu o princípio do Zoning, isto é, a racionalização do uso dos espaços urbanos. Esse modelo de planejamento urbano foi discutido no Congresso de Atenas em 1933, e resultou na “Carta de Atenas” e no conceito de urbanismo. Le Corbusier, líder dessa proposta, entre outras coisas propunha a conservação dos centros históricos como patrimonialização do Estado e receptáculo para turistas, bem como a construção de bairros ex nihilo nas áreas periféricas das cidades. Essa racionalização exacerbada das cidades, que entre outras coisas, prevê a construção dos conjuntos habitacionais funcionais nas suas periferias, separa oficialmente a cidade dos cidadãos. A cidade passa a ser um lugar de observação e previsão, um lugar privilegiado da política e das atividades institucionais. A cidade torna-se um campo da política dominante e o seu crescimento e desenvolvimento deve obedecer ao princípio das lógicas políticas. Percebe-se, assim, que mais do que um espaço de troca de mercadorias e produção de conhecimento e comunicação, a cidade racionalizada passa a ser um espaço de prestação de serviços especializados, rede de informações e poder político de controle social.
Atraído pela possibilidade de projetar a nova capital para o Brasil, em
1936 Le Corbusier vem ao Rio de Janeiro. A partir de 1937, o Governo incentiva a
realização de projetos visando transformar radicalmente as estruturas urbanas
brasileiras, principalmente no sistema viário. Entre os anos 50 e 60 são iniciados
os planos regionais. No planejamento urbano regional constata-se uma imbricação
entre conhecimento e prática, e os profissionais que atuaram nas universidades
50 também atuaram na administração pública sob contrato do Estado ou da
Prefeitura. Urbanistas, engenheiros e arquitetos trabalham em equipes
multidisciplinares, produzindo planos diretores para as cidades. Eles formam os
primeiros departamentos de urbanismo ligados ao padre Lebret6, que vão compor
os escritórios da Sociedade de Análises Gráficas e Mecanográficas Aplicadas aos
Complexos Sociais (SAGMACS). A inserção política da SAGMARCS era ampla e
mantinha contatos na igreja.
Assim, de 1930 a 1964 observa-se no plano nacional a criação de
técnicas para resolver questões das cidades como saneamento básico e
circulação, e projeta-se uma legislação urbanística. A organização dos espaços
públicos — praças, avenidas e edifícios — corresponde a referências estéticas
desses planejamentos (informação verbal)7. Entretanto, é bom lembrar a
importância da cidade como meio de dominação, como enfatiza o crítico literário
6 Padre Louis-Joseph Lebret, inspirou e dirigiu internacionalmente o Movimento Economia e Humanismo, que contribuiu para a formação e prática do planejamento regional e urbano no Brasil. 7 Texto elaborado a partir de anotações em aula ministrado pela Profa. Dra. Sara Feldman sobre o planejamento urbano no Brasil dos anos 1930 aos anos 1980, para a disciplina Tópicos Especiais, na Universidade Federal de Santa Catarina UFSC, em 18/06/2007).
51 Sérgio Buarque de Holanda, no texto “O Semeador e o Ladrilhador”, publicado no
livro Raízes do Brasil (1986).
Seguindo essa lógica modernista é elaborado um plano urbanístico
para Criciúma, e, nos anos 1960, a Prefeitura estabelece que a cidade seja limpa,
seus habitantes afastados de zonas poluentes e o centro da cidade organizado
para apreciação turística e lazer. Isto é, a cidade deve ser organizada sem
poluição visível, sem trânsito de trabalhadores, sem “perigos” aparentes, com
praças arborizadas, amplas avenidas e comércio em lugares seguros. A
conseqüência mais imediata foi a segregação das pessoas em bairros distantes, e
a eliminação aparente dos problemas da cidade, como a poluição e os odores
fortes da mineração. Os rejeitos minerais e os odores, saindo da visibilidade e da
percepção cotidianas, não são mais vistos nem sentidos: deixam de ser
percebidos.
Nesse período, as minas localizadas no centro da cidade foram
fechadas sob alegação de que não forneciam mais o minério, e o Monumento ao
Mineiro desceu do pedestal localizado no centro da Praça Nereu Ramos, sendo
52 alojado numa plataforma próxima ao chão, no canto posterior direito da praça em
relação à frente da igreja central. O mineiro e o monumento em sua homenagem
saem da cena central da cidade.
Nos anos 80, no embalo do que ficou conhecido como o “Milagre
Econômico”, nos terrenos das antigas minas surgem projetos residenciais, tanto
populares como de classe média e alta, dependendo da zona. Nota-se uma
verticalização das construções, e, por coincidência, com os festejos do centenário
da cidade, o planejamento urbano, seguindo a lógica do sonho moderno acima
descrito, constrói a primeira avenida, a qual recebe o nome de Centenário. Para
viabilizar a construção da avenida, foi retirado do centro da cidade o elevado e o
trilho da Estrada de Ferro Dona Tereza Cristina.
Assim, trilho e monumento, dois importantes símbolos da cidade,
foram retirados em épocas próximas, apagando da cidade os indícios da
mineração. Sem a presença das minas no centro da cidade, sem os trilhos da
estrada de ferro e sem o Monumento ao Mineiro centralizado na cidade, inicia-se
um processo de invisibilidade tanto dos problemas causados pelas minas quanto
53 da importância do mineiro na construção da cidade. Benjamim cita Hugo quando
diz: “Quando olhava a placa de mármore de uma de nossas lareiras, ou tijolo
cimentado de uma de nossas lareiras modernas, ele a via tal como ela é: a pedra
do lar” (BENJAMIN, 2007, p. 131). Todas essas modificações constituíram uma
nova ordem espacial, são novas origens que se constituem como passagens e é
nas origens espaciais que Susan Buck-Morss cita Benjamin quando este diz8:
A pessoa só conhece um lugar uma vez que o tenha experimentado em tantas dimensões quantas possíveis. Para possuir um lugar é preciso se
aproximar dele [....] de outro modo, este pode inesperadamente cruzar seu caminho, três ou quatro vezes antes que você se prepare para topar
com ele. (A Dialética do Olhar, p. 50 e 444)
Acompanhando a modernização e a europeização da cidade,
incentiva-se a construção de outras galerias, mas agora de passagem, mais
precisamente de comércio. A Galeria Comasa e a Galeria Lucio Cavaller
representam um marco na modernização da cidade. São elas que, junto à Avenida
Centenário, simbolizam dos anos 70 aos dias de hoje uma cidade rica e moderna.
A partir daí, logo surgem outros centros comerciais e os shopping centers. 8 No livro A Dialética do Olhar a autora Susan Buck-Morss cita Walter Benjamin. Ursprung dês seutsschen Trauerspiels,I, p. 226. [Origem do drama barroco alemão, p.67] para explicar as origens do Passagen-Wrk no sentido histórico simples de tempo e espaço que foi concebido.
54 Milton Santos afirma:
(....) esta materialização do espaço o torna propício a uma
materialização da vida social, conforme aos interesses hegemônicos, assim se instalam ao mesmo tempo, não só as condições do maior lucro
possível para os mais fortes, mas, também as condições para a maior alienação possível. (SANTOS, 2002, p. 32).
As grandes transformações da estrutura urbana e da paisagem e o
modelo de progresso urbano não permitem transparecer o que existe na atmosfera
e o que a exploração mineral já causou na vida da população. Em Criciúma, os
bairros vão surgindo em cima de rejeitos de carvão, onde as minas vão sendo
desativadas, e as ruas e os loteamentos encobrem e apagam os rejeitos, a sujeira
e a degradação. Dessa forma, a reabilitação futura é muito prejudicada. Desde
então, muito foi feito na tentativa de recuperar as áreas mais poluídas, mas em
muitos lugares a situação hoje é irreversível.
Conforme comprovaram os pesquisadores da Unesc de Criciúma,
Geraldo Miliolli, Marcelo Pompêo, Nadia Zim Alexandre, Vanilde Citadini Zanette,
esses rejeitos contendo pirita carbonosa, em contato com a água e o oxigênio,
liberavam ostensivamente no meio ambiente gases compostos de ferro e ácido
55 sulfúrico, causando degradação em extensas áreas urbanas e rurais e
prejudicando o ambiente de vida. Ainda que hoje a maioria das minas do
perímetro urbano já tenha sido desativada, e aquelas em atividade se localizem
em zonas mais distantes do centro urbano e obedeçam às normas de fiscalização
ambiental, os processos poluidores continuam enquanto e onde houver material
piritoso exposto a oxidação. (MILIOLI et al., 2002)
Além dos problemas apontados, a área urbana de Criciúma é
essencialmente ameaçada pelo fenômeno da subsidência, que provoca alterações
em áreas topográficas localizadas sobre galerias subterrâneas. Segundo dados do
Sindicato das Indústrias de Extração de Carvão do Estado de Santa Catarina
(SIECESC), o impacto causado ao meio físico e biótico pela emissão de gases
tóxicos e de material particulado provoca graves danos à saúde humana e ao
meio ambiente. A expressiva presença e o acúmulo crônico de materiais poluentes
altamente tóxicos e letais no ar, no solo e nas águas ocorrem porque a pirita sofre
oxidação em conseqüência do contato com o ar e a água, liberando gases
sulfurosos (letais), compostos de ferro (sulfatos e hidróxidos tóxicos) e ácido
56 sulfúrico (produto também corrosivo e tóxico). Ainda hoje, a concentração de
poluentes ultrapassa assustadoramente o estabelecido pela legislação vigente,
fazendo com que os municípios de Imbituba, Tubarão, Criciúma e Urussanga
apresentem os maiores índices de poluição atmosférica do Estado.
Os relatórios disponibilizados pelo SIECESC mostram que desde
1998 não é registrado nenhum caso novo de pneumoconiose; entretanto, outras
pesquisas indicam partículas de metais tóxicos nas águas efluentes das unidades
mineiras, e verifica-se na região um aumento progressivo nos índices de má
formação neurológica congênita, como a anencefalia. Apesar das muitas medidas
técnicas já tomadas a fim de tentar recuperar os danos causados pela atividade
humana na região, ou pelo menos minimizá-los, a situação ainda se apresenta de
feição crítica, apontando para a necessidade de novos estudos, diagnósticos e
propostas com o objetivo de recompor o ambiente natural.
58
CAPÍTULO 2 : GALERIAS
Surgida no final do século XIX e começo do século XX, a cidade de
Criciúma é atravessada por galerias subterrâneas, de comércio e, a partir dos
anos 90, pela Galeria de Arte da Fundação Cultural de Criciúma. Ainda que essas
galerias se entrecruzem na economia e na cultura da cidade, nem sempre são
percebidas por seus habitantes, os quais circulam por elas enredados na sedução
cotidiana das galerias de comércio, que, mais do que necessidades, oferecem
sedução.
2.1 DEFINIÇÃO
Uma galeria é um corredor, um espaço aberto naturalmente ou pela
ação de animais ou homens. Esses caminhos possibilitam a circulação e a
59 passagem ou o escoamento de microorganismos, animais, pessoas ou objetos de
grandes dimensões. Desde as formações geológicas mais antigas, encontramos
espaços subterrâneos abertos pela ação da natureza, formando corredores que se
bifurcavam em galerias adjacentes, em uma diagramação infinita e misteriosa.
Sem mapas ou sinais indicativos de entrada e saída, esses percursos intrincados
criados aleatoriamente instigaram ao desconhecido e logo foram ocupados pelos
homens como abrigo, mas principalmente devido à sedução. Lascaux, na França,
e Altamira, na Espanha são as duas galerias mais antigas de intervenção humana.
As imagens gravadas nelas informam a presença dos primeiros homens no mundo
e suas formas de arte. Essas galerias e as enigmáticas imagens ali preservadas
criam os primeiros meios de comunicação humana, os primeiros rizomas culturais.
Inspirados nesse traçado misterioso da natureza, logo os arquitetos
edificaram templos tridimensionais com vias entrecruzadas. Conta a Mitologia
Grega que o rei Minos, intentando aprisionar o touro branco enviado pelo deus
Posêidon, contratou o arquiteto Dédalo para construir um palácio com planta de
galerias entrecruzadas para dificultar a saída do Minotauro, assim como aprisionar
60 quem ali se inserisse. Esse mito deu origem à palavra labirinto, que se refere aos
espaços de galerias entrecruzando-se infinitamente e criando uma rede de
caminhos sedutores que desafiam seus exploradores a decifrá-lo.
O traçado das galerias também inspirou a construção de outros
labirintos, de utilidade prática, e sistemas comunicacionais. Muito antigos são os
dutos subterrâneos para escoamento de água pluvial ou esgotos. Benjamim
(2006) encontra em Victor Hugo referência aos labirintos do século XIX como
construções subterrâneas, difíceis, rebeldes à sonda e ao manejo humano: “Nada
mais difícil de se perfurar e penetrar que essa formação geológica [...] o trabalho
começa a se aventurar nessa camada aluvial, as resistências subterrâneas se
multiplicam” (BENJAMIN, 2007, p. 455).
No século XIX, a expansão dos labirintos se intensifica. Nesse
período, a exploração de minérios, como o ouro, o diamante e o carvão, são o que
mais impulsiona a formação de galerias subterrâneas. No século XX, mais
recentemente, foram construídas outras aberturas subterrâneas, estas para
transporte coletivo (metrôs), circulação de mercadorias (shopping centers) e para
61 comunicação (passagem de cabos de telefonia, por exemplo). Atualmente, as
redes de informática criam galerias de ambientes midiáticos. Todos esses
caminhos/labirintos de circulação de pessoas, informação, minerais/materiais ou
ideais criam vias de sedução. Somos seduzidos pelos próprios caminhos que se
entrecruzam, mas também pelas pessoas, mercadorias e informações que tecem
esses textos, entrelaçam-se neles.
2.2 GALERIAS DE EXTRAÇÃO DE CARVÃO MINERAL
Os camponeses estavam deixando as suas culturas apenas para se
dedicarem à extração do ouro. Já não semeavam apenas mineravam e peneiravam. E aquele era apenas um princípio: seguir-se-iam séculos
em que os africanos raspariam os ossos da terra para entregarem riqueza aos europeus.
Mia Couto
O mineiro cava o subsolo e extrai o mineral que gera a energia,
produz a riqueza que avoluma a economia e gera os impostos. Para Milton
Santos, “nesse mundo, a primeira natureza que conta, não é mais a natureza
62 natural, mas, sim, a natureza já artificializada” (SANTOS, 1997, p. 44).
Vivemos quotidianamente em um determinado espaço geográfico
que não é mais conseqüência de uma ordem natural. A ordem tem origem na
natureza, mas a partir do advento da técnica, o espaço é explorado e expandido
para suprir necessidades e desejos, hoje de predominância capitalista. O território
passa a ser um espaço de domínio e exploração, e entre as formas desta última
encontramos a mineral. A técnica artificializa a paisagem, modificando-a com as
construções, neste caso construindo galerias subterrâneas de exploração mineral,
visando não só o lucro, mas também a geração de energia, indispensável à vida
moderna.
As galerias subterrâneas, construídas entre 100 e 260 metros no
subsolo, são o início do sonho moderno. São elas que produzem e fazem circular
economicamente e socialmente a sedução da cidade de Criciúma. O que é
extraído do subsolo inicia o processo de verticalização do centro da cidade.
As galerias subterrâneas seguem o modelo do labirinto. Com
corredores de iluminação e oxigenação artificial, passam a sensação de
63 desconfiança em relação a sua segurança e, em alguns casos, até de
sufocamento, dependendo da atmosfera e das condições do seu interior.
Entretanto, essas passagens ou vias subterrâneas instigam à curiosidade, ao lucro
econômico, e levam ao desafio do desconhecido.
Fernando Eufrásio, mineiro há seis anos operando máquinas da
mineradora Cooperminas, ao ser questionado sobre sua profissão, assim se
expressou:
Eu fui pra mina, primeiro atraído pelo salário, hoje o que me prende é que o trabalho é bom e eu gosto. A gente sabe que o risco de acidente existe, mas como nunca aconteceu comigo eu não tenho medo. Eu sei de colegas que têm medo porque já viram, quando tu tá no subsolo o risco existe. Eu quero continuar o estudo, fazer faculdade, mas para continuar trabalhando embaixo da mina, porque é o que eu gosto de fazer. (informação verbal)9
A primeira mina explorada em Criciúma foi de extração manual e
chamava-se Mina Brasil. Apresenta somente uma camada de galeria e foi cavada
no pé de uma montanha situada em um lugar elevado da cidade. Do veio de
carvão ao ponto alto da montanha há uma altura de 100 metros. Essa mina não 9 Entrevista concedida em 26/03/2008.
64 desce ao subsolo; os mineiros eram conduzidos ao seu interior por um carrinho de
rolagem em trilhos de ferro. Essa abertura adentrando uma montanha lembra, a
princípio, uma caverna, um labirinto horizontal na superfície. O primeiro corredor
dessa mina tem uma altura de apenas um metro, obrigando os mineiros a
passarem curvados sobre si, numa posição quase fetal, como em um rito de
iniciação Esse modelo de mina de montanha era explorado desde o século XIX;
mais tarde, inicia-se a abertura de minas de subsolo. O mapa dessas galerias de
exploração vertical lembra a edificação de um prédio. A abertura das galerias
levava os mineiros e o carvão em carrinhos que deslizavam em cabos de aço para
outros andares. Hoje, em Criciúma, esse modelo que desce ao subsolo tem no
máximo dois níveis, sendo um separado do outro, ou seja, desencontrados.
Os veios de minerais determinam o local de abertura e o seguimento
dos corredores. As galerias são construídas em quadrados formando labirintos. Os
mineiros e o maquinário são levados até os corredores por uma gaiola semelhante
a um elevador, com capacidade para até 50 pessoas. As galerias estreitas, baixas,
perigosas, lamacentas e desconfortáveis do século XIX perduraram até as
65 décadas de 1940 e 1950, quando cederam lugar a espaços mais largos e altos,
com drenagem para diminuir o lamaçal, aumentar a oxigenação, controlar a
temperatura e os maquinários. Essas melhorias nas condições de segurança
proporcionaram mais conforto; em contrapartida, diminuíram as oportunidades de
emprego, à medida que a mão-de-obra humana foi sendo substituída pela
máquina.
A mineração em Santa Catarina, principalmente em Criciúma, foi a
atividade econômica mais importante do Estado durante o século XX. Para
avaliarmos a produção de carvão hoje, buscamos relatórios do SIECESC sobre a
produção de carvão mineral em Santa Catarina. Estes registram um crescimento
de 58% em 2000, em relação a 1999: em 1999, a produção foi de dois milhões e
298 mil toneladas; em 2000, de três milhões e 643 mil toneladas, representando
50% da produção nacional de carvão mineral. Em Santa Catarina, a ocorrência
desse mineral está toda localizada na região sul do Estado. O faturamento do
setor carbonífero de Santa Catarina cresceu 55% em 2000, em relação a 1999:
em 1999, o faturamento foi de R$ 138 milhões; em 2000, de R$ 215 milhões. O
66 faturamento com a produção mineral (ferro, manganês, enxofre, etc.) no Estado,
em 1998, foi de R$ 291.620 milhões, respondendo o carvão mineral por 48%
desse valor.
Das galerias subterrâneas da cidade de Criciúma é retirado o carvão
mineral, popularmente conhecido como “ouro da terra”, porque desde sua
descoberta foi o minério responsável pelo grande salto da economia local e pela
modernização da cidade. O carvão mineral proporcionou não só o crescimento
econômico, mas também o desenvolvimento político, cultural e social da cidade. A
abertura e a expansão das galerias para retirada dos minérios demandou a
criação, e posteriormente a construção do prédio, do Departamento Nacional de
Produção Mineral (DNPM), central administrativa das minas de carvão,
transformado em 1995 em Centro Cultural, com um espaço para a Galeria de Arte.
Para suprir as necessidades básicas de sobrevivência cotidiana dos
mineiros e suas famílias assentadas nesse espaço, logo surgem galerias de
comércio, ou, mais precisamente, de sedução. O projeto Suspiros: Fronteiras e
Contaminações das Galerias de Criciúma busca, no tempo histórico das
67 “Passagens” de Walter Benjamin, os séculos XIX e XX, o entendimento das
galerias de comércio como base da alienação e do início do sono da história dos
quais Benjamin dizia que o século XX precisava ser despertado. Leandro Konder,
interpretando Walter Benjamin, enfatiza o colecionador e historiador. Sob a visão
do filósofo, devemos “romper a crosta dos produtos culturais coisificados e mostrar
que o passado não está definitivamente concluído, que ele continua agindo em
nós, com sua perturbadora ambigüidade” (KONDER, 2007, p. 83).
2.3 GALERIAS DE COMÉRCIO
Segundo Susan Buck-Morss (2002),10
As arcadas cobertas dos centros comerciais do século XIX eram a imagem central das passagens para Benjamin por serem a réplica material precisa da consciência interna, ou, melhor dito, o inconsciente do sonho coletivo [....] Mais ainda, as arcadas enquanto passagem foram
10 Susan Buck-Morss no livro “A dialética no Olhar”, faz uma narrativa inventiva das cidade através do livro Passagens, de Walter Benjamin (2007), buscando no autor a análise sobre o estudo das “Passagens” pelo olhar que o mesmo lançou sobre quatro cidades, Berlim, Moscou, Paris e Nápoles.
68 o primeiro estilo internacional da arquitetura moderna, e portanto, parte da experiência vivida por uma geração metropolitana e, mais amplamente em escala mundial. ( A Dialética do olhar, p.66)
As primeiras galerias de comércio foram abertas no século XIX como
uma via de passeio público arquitetônico coberto ligando uma rua a outra. Desde
os primeiros planejamentos, essas passagens já ofereciam aos seus transeuntes
um comércio sedutor e pontos de encontro e lazer, como as casas de jogos, os
cafés e restaurantes. Com o crescimento das cidades, as galerias foram
incorporando outros atrativos, como serviços bancário e internet. Nelas tudo é
planejado com o objetivo de propiciar aos seus usuários a tranqüilidade
necessária para apreciar as mercadorias ali disponibilizadas, e usufruir de serviços
necessários às boas compras e aos prazeres da vida, aos encontros luxuosos,
atraentes e sedutores.
As galerias comerciais neste trabalho são pensadas como extensões
das galerias subterrâneas, porque as mesmas se originaram da riqueza produzida
pelas galerias de extração mineral e para atender a um público reunido em
conseqüência das minas.
69 Benjamim (2007) aponta: “Pela primeira vez na história, com a
criação das lojas de departamentos, os consumidores começam a sentir-se como
massa (antigamente só a escassez lhes dava esta sensação). Com isso aumenta
o elemento circense e teatral do comércio” (p. 86). O autor já percebia que, desde
a criação das lojas de departamento, os consumidores eram massificados por uma
cenografia capaz de seduzir e, assim, completando nas palavras de Nelson
Brissac Peixoto, interpretando Benjamim, “aliviar a paisagem de todo o seu peso
até fazê-la semelhante à luz da lua. Transformar tudo em luz: ideário clássico da
pintura de paisagem. Um paisagismo — fundado na luz, na cor, nos sons e na
memória” (PEIXOTO, 1996, p. 24).
As galerias comerciais, ou vias de passagem, foram pensadas por
Benjamim (2007) como redutoras de velocidade, como desaceleração de um
mundo movido pela velocidade. Ele cita a noção de temporalidade em Baudelaire,
quando seu personagem, o “flâneur”, levava uma tartaruga para passear. Com
essa metáfora, ele estava aludindo à velocidade das coisas. Hoje, o interior das
galerias oferece a economia de tempo. Dentro delas, encontra-se tudo sem
70 precisar deslocar-se por outros territórios — o “Pórtico Comercial de Criciúma”
anuncia: “Tudo num só endereço”.
Nesses lugares há lojas com vitrines expondo objetos de desejo,
instrumentos de sedução capitalista. Benjamim (2007) descreve o espetáculo da
moda. A grandiosidade desse espetáculo tem início nas vitrines. Algumas galerias
tinham andares e ofereciam ao público roupas, jóias e até casa de jogos, mas o
principal atrativo eram os produtos industrializados.
Seguindo o modelo urbanístico planejado para muitas cidades
brasileiras, como já mencionado anteriormente, em Criciúma o exterior foi se
tornando cada vez mais reduzido, no sentido de desinteressante, empurrando os
fluxos, especialmente de comércio e lazer, para dentro das galerias, tornando-as a
representação de um pequeno mundo. Nelas os transeuntes não escolhem o
roteiro; ele já é preestabelecido pela passagem nas galerias, que fazem parte do
percurso que os leva de casa ao trabalho ou lazer via Terminal Central de
Transporte Coletivo, por exemplo. Elas não só protegem das intempéries do tempo
como também convidam ao consumo. Facilitadoras, elas oferecem os produtos
71 necessários ao dia-a-dia, mas também os supérfluos capitalistas. Essas galerias
são pequenos mundos privados.
As galerias de comércio, muitas até climatizadas, tornam-se lugares
agradáveis; não são mais sufocantes, pois não têm mais os cheiros fortes e
desagradáveis no ar. Nos anos 1990, Criciúma inaugura o Terminal Central de
Transporte Coletivo, com uma galeria comercial servindo de via obrigatória para os
trabalhadores chegarem a ele: os transeuntes têm de atravessar a galeria Cavaller
para tomar o transporte coletivo. Essas galerias oferecem praticamente tudo o que
é necessário no cotidiano, de bancos a lanchonetes, de joalherias a farmácias;
enfim, de necessidades básicas a objetos de sedução.
Esse planejamento estratégico do centro da cidade torna as galerias
de comércio de Criciúma particularmente diferentes das inúmeras galerias de
comércio de outras cidades, mas isso não quer dizer que não existam outras
cidades que empreguem o mesmo modelo estratégico de fluxos cotidianos.
Hoje a cidade de Criciúma possui inúmeras galerias de comércio, ou
verticais, como são metaforicamente chamadas neste trabalho. As principais são a
72 Galeria Lucio Cavaller, Galeria Coan, Galeria Comasa, Galeria Becker, Galeria
Catarina Gaidzinsk, Galeria Benetton e a Galeria do Terminal de Transporte
Coletivo. Localizadas no centro da cidade, essas galerias oferecem aos
transeuntes lojas de roupas, confeitarias, lanchonetes, objetos eletroeletrônicos,
joalherias, lojas de presentes, linhas e aviamentos, além de serviços como caixas
eletrônicos de bancos e postos de correio. As galerias exibem em suas vitrines e
no meio do espaço de circulação o que as pessoas precisam — sedução. Algumas
delas se comunicam e formam uma planta de labirinto de roteiro quase obrigatório
para quem usa transporte coletivo. Por exemplo, a Galeria Lucio Cavaller tem uma
de suas aberturas voltada para o acesso da escadaria que desce para o terminal.
Descendo por esse acesso o transeunte entra em outra galeria comercial dentro
do terminal. Nessas passagens, as pessoas transitam e compram o que
“precisam” sem ter de se desviar. O centro que comporta os diferentes transeuntes
oferece nos fluxos das galerias um suporte de relações significativas, ou encontros
especiais de subjetividades na cidade.
73
2.4 GALERIAS DE ARTE
As galerias de arte são arquiteturas projetadas como extensões dos
museus criados desde o século XVIII. Esses espaços, a princípio, tinham como
objetivo preservar os utensílios, objetos e obras de arte extraídos da cultura, da
circulação, para significar a história dos homens.
Com o tempo e a ascensão do capitalismo, esses espaços,
especialmente as galerias, tornaram-se também locais onde é exibido somente
aquilo que pode ser mercantilizado. No início do século XX, mais precisamente a
partir da primeira grande guerra, deflagram-se movimentos nas instituições de arte
com a reavaliação do objeto artístico, que passa a contar com a participação do
espectador na obra. É a partir dos anos 1960 e nas décadas seguintes que a arte
passa a ter um teor mais ativista, e esses espaços são mais uma vez
(re)significados. Adotam-se mais as mídias e os novos procedimentos, como
instalações, fotografias e performances, que irão designar experiências mais
74 sensíveis às exposições, objetivando um diálogo no qual as práticas artísticas
respeitam o contexto cultural em que serão apresentadas. Essas práticas ampliam
as relações entre a obra e o público; constituem novas formas artísticas nas quais
a realidade é o instrumento poético para causar uma nova situação no contexto no
qual são apresentadas.
2.5 A GALERIA DE ARTE DA FUNDAÇÃO CULTURAL DE CRICIÚMA —
ESPAÇO (RE)SIGNIFICADO
Ao longo de seu processo, a cidade, organismo vivo, impõe solidariamente valores funcionais mercantis e simbólicos às suas
diversas frações. Novos lugares são chamados a novas funções, velhos lugares se renovam inteiramente ou parcialmente, sendo arrastados ou
conservando relíquias. A cada momento histórico, cada pedaço da cidade evolui diferentemente, o centro histórico sendo, por sua
persistência como lugar central, o espaço por excelência das mudanças contínuas e às vezes brutais de valor.
(Milton Santos)
A Galeria de Arte situa-se na parte frontal do prédio da Fundação
Cultural de Criciúma. O prédio pertence ao Governo Federal e está cedido à
75 Fundação em parceria com a Prefeitura Municipal de Criciúma e o Departamento
Nacional de Produção Mineral (DNPM). Esse prédio foi construído em 1945,
inicialmente para abrigar o DNPM, sendo ali alojado um laboratório para análise do
carvão, hoje local da Galeria de Arte.
Além de abrigar a central administrativa, esse prédio mantinha
também um estoque de amostras geológicas aberto a pesquisas de solo e recebia
todos os dias engenheiros e geólogos do mundo inteiro, principalmente dos
Estados Unidos, da Inglaterra e do Japão.
Nos anos 1950, nesse prédio foi instalado o primeiro aparelho de
raios X de Santa Catarina, especialmente para atender os mineiros com
problemas pulmonares. Em 1962, o setor do DNPM foi desativado e a Comissão
Executiva do Plano do Carvão Nacional (CEPCAN) assumiu o local. Com o golpe
militar, em 1964, e o período da Ditadura Militar, o Exército ali se instalou e
transformou o prédio em local de interrogatório e cárcere para presos políticos
acusados de participarem em movimentos de ideologia comunista. Segundo o
relato de historiadores e pessoas da comunidade, nessa época muitas pessoas
76 entraram no laboratório e nunca mais saíram, e outras desapareceram e voltaram,
anos depois, do exílio em Cuba. A parte de trás, os fundos do laboratório, serviu
de cela para figuras importantes para a cidade, como o médico Dr. Maniff
Zacarias, que hoje vive em Curitiba.
Em 1971, a CEPCAN foi desativada, sendo transferido para lá o
Conselho Nacional do Petróleo (CNP). No início da década de 90, mais
precisamente em 1993, a Fundação Cultural de Criciúma se apropriou de parte do
prédio, que já não estava mais sendo utilizado pelo CNP. Em 1996, todo o prédio
passou a ser administrado pela Fundação Cultural de Criciúma, a qual reservou
uma parte do prédio para a Galeria de Arte.
A Galeria de Arte da Fundação Cultural de Criciúma possui dois
espaços de exposição. O primeiro tem três salas em formato de cubo branco; o
segundo, na seqüência, é o antigo laboratório de análises de solo e ainda
conserva os balcões com armários e gavetas, as bancadas e um armário em
forma de capela, com balcão inferior e uma estufa envidraçada na parte superior.
Além desses dois espaços, há ainda ao fundo dois pequenos almoxarifados, antes
77 usados como depósito dos elementos mais perigosos das análises de solo e hoje
utilizado como depósito do acervo de obras doadas pelos artistas.
Refletindo sobre esse local e o engajamento da arte como prática
política, passei a pensar o perfil das exposições como possibilidade de
experiências levando em conta o universo de trocas nas atividades das monitorias
dentro da galeria e como oportunidade para reflexões sobre a história e as
problemáticas contemporâneas da cidade, já que o contexto do prédio é
significativamente determinante para essa reflexão. A interseção entre a arte, o
artista e o púbico possibilita dar visibilidade a questões que permeiam o universo
de vida da cidade. O mais importante foi perceber que, buscando o passado, tem-
se consciência de quanto ele ainda é presente no nosso tempo histórico. A história
das minas de carvão conserva a memória de como essas foram responsáveis pela
degradação ambiental da cidade, ainda que as mesmas fossem e sejam também
responsáveis pela expansão econômica da cidade ou pelo meio de sobrevivência
de muitas famílias, além de representar um símbolo na formação cultural e,
principalmente, no contexto político, por meio dos sindicatos e das lutas de
78 classes, que fazem parte do histórico de vida da população que habita a cidade. O
espaço, que é de memória e história, é também uma divisão geográfica que
mantém o passado no presente. Quando buscamos compreendê-lo, esse passado
se faz presente.
Assim, foi na Galeria de Arte da Fundação Cultural, mais
precisamente na sala do laboratório, onde a arquitetura ainda conta uma parte da
história de Criciúma, que se efetivou uma experiência buscando levar o público a
perceber a história da cidade e suas tensões políticas e culturais, aparentemente
apresentando-se como passado, porque não estão diante dos nossos olhos, mas
que, por meio da arquitetura e do mobiliário, contam uma história. Percebi também
no meio urbano, fora da Galeria, que as paisagens denunciam a exploração
mineral, ainda que as bocas das minas, o fluxo de trabalhadores e o pó do carvão
sejam hoje minimizados no dia-a-dia da cidade. O planejamento urbano há muito
já as escondeu no cenário da cidade. Além do mais, o cotidiano das minas de
carvão e seus desdobramentos, como as lutas de classe, são problemas
mostrados nos noticiários dos jornais locais, mas como situações já resolvidas ou
79 de pequenas proporções.
Durante os mais de dez anos durante os quais atuei como curadora
de exposições dessa Galeria, sempre privilegiei esse espaço como um lugar de
intercâmbios, oferecendo aos artistas a planta baixa e estimulando-os a utilizar o
local a partir de sua história, sem, no entanto, fazer disso uma obrigatoriedade
curatorial. Alguns usaram-no como simples lugar expositivo, e o laboratório
abrigou até mesmo exposições de desenhos, gravuras, pinturas e instalações que
muitas vezes ignoravam completamente a memória do espaço. Às vezes até
cobriam-no com plásticos pretos, fechando suas janelas; outras vezes
interditavam-no ou isolavam-no.
A exposição que mais marcou o local foi a da artista gaúcha Laura
Cogo, “Espectros — Reescrevendo o Passado”, de 4 a 30 de agosto de 2005, que
relembrou três fases da história do prédio com uma representação artística do
mobiliário por meio de relatos históricos. Com um formato site specific, o trabalho
reproduziu no laboratório três grandes balcões exatamente no local do chão onde
se encontram as manchas do laboratório, a sala de raios X, o escritório, o local
80 dos arquivos, a mesa e a cadeira, assim como as duas salas utilizadas como
cárcere, onde as barras delimitam os dois espaços da prisão. A artista aproveitou
o espaço para interagir com a memória dele e, assim, possibilitou efetivamente ao
público uma exposição que reescrevia o passado, permitindo um diálogo com o
presente.
Laura Cogo assim se pronuncia:
Realizo trabalhos artísticos site specific em espaços urbanos há mais de dois anos. O que produzo, mais especificamente, são estruturas feitas de tules coloridos que reproduzem algum elemento do local onde são construídas, dando a elas a forma de um elemento do espaço, re-significando-o. As estruturas com as quais a obra dialoga podem ser detalhes da arquitetura da cidade ou elementos encontrados ao seu redor, geralmente elementos não-nobres como tonéis, luminárias ou lixeiras. Com isso, procuro criar um diálogo entre as estruturas, uma real, firme e sustentável, e a outra “imaginária”, frágil e efêmera; uma, de concreto ou qualquer material rígido, monocromática, e a outra, maleável e colorida — essa segunda ordem de estruturas questiona, inquire o espaço em que estão inseridas. (informação verbal)11
Essa exposição resultou em vivências e descobertas, pelas quais o
espectador conheceu a história do prédio e do espaço da Galeria, relacionado
com a própria história de cada indivíduo da cidade por meio de fatos e da memória
dos pais, avós e conhecidos. Esses fatos, que contribuíram na formação da 11 Depoimento a mim concedido na ocasião da exposição.
81 identidade cultural, fazem parte também dos desdobramentos políticos e
econômicos da cidade.
Além disso, durante a exposição de Laura Cogo, a monitoria
objetivava uma reflexão sobre a utilização dos espaços públicos e institucionais,
não mais apenas como lugar de intercâmbios e trocas artísticas, mas também
como espaço de história a partir do seu contexto arquitetônico dentro da cidade,
levando em conta como ele se identifica com o público por meio do seu passado e
como uma curadoria pode estabelecer as relações que permeiam o espaço e o
público.
Continua Laura Cogo,
Após receber o convite da Fundação Cultural de Criciúma para realizar uma exposição em 2005, passei a pesquisar e estudar este espaço expositivo. Assim, desenvolvi o projeto “DNPM”, uma intervenção site specific em que utilizo como referência a história do prédio, onde atualmente se encontra a FCC. Para realizar esta exposição site specific, reproduzi alguns dos principais acontecimentos deste prédio, utilizando o tule para a produção dos objetos, somente nas cores preta e branca para remeter ao passado. Com os objetos de tule, reproduzi uma sala de escritório, contendo arquivos, mesas e cadeiras; duas salas se transformarão em prisões, com barras e camas de tule preto; outra sala terá uma reprodução de um aparelho de raios X e uma maca; e na última — local original do laboratório de análise do carvão — três grandes manchas que existem no chão, onde se encontravam balcões, avançarão no espaço
82 tridimensional, preservando suas formas. (informação verbal)12
A intenção da exposição de Laura Cogo foi reacender na
comunidade o interesse pelo prédio e pela sua história como bem cultural. Todos
os meses, as exposições da Galeria de Arte de Criciúma recebem em torno de
300 visitantes, entre eles alunos de escolas, incluindo crianças e jovens de várias
idades e níveis de escolaridade, desde o ensino fundamental até a pós-
graduação, além de alunos portadores de necessidades especiais. O trabalho é
desenvolvido por meio de monitoria, que apresenta primeiro o prédio, o espaço e
as obras, deixando o público livre para perguntar, conversar, refletir e interagir. Foi
constatado que, nessa exposição em especial, o público interagiu de forma
diferente, pelo fato de os objetos estarem contidos no lugar e não colocados de
forma contemplativa, provocando um misto de curiosidade e descoberta, sobre o
que é real e o que é fantasia, transformando o conceito de arte sempre vista como
algo do imaginário, como documento de fatos históricos.
A poética de Laura Cogo nos permite compreender como a arte
12 Continuação do mesmo depoimento.
83 contemporânea apresenta obras nas quais as práticas políticas da arte intervêm
junto ao público e promovem uma parceria entre estes, os artistas e o local onde
elas são instauradas.
A apresentação da Galeria de Arte da Fundação Cultural de
Criciúma, vista aqui como um SUSPIRO para se repensar modos de vida mais
compartilhados, será entendida como a ligação entre as outras galerias, de
exploração mineral e de comércio, tanto no passado como no presente. A
proximidade e o encontro, a localização vertical e a separação horizontal — uma
está na superfície e a outra entre 100 e 260 metros de profundidade no subsolo —
irão confluir na Galeria de Arte da Fundação Cultural, na exposição da poética de
telepresença das galerias.
A Galeria de Arte deixa de ser um espaço sacralizado, um espaço
fechado como ambiente que acolhe obras, e passa a agir como sujeito da história
e dos códigos inerentes a ele, pois narra partes do enredo contando a história de
Criciúma dentro do seu contexto histórico e social, que ainda faz parte da vida
cotidiana da cidade.
84 À medida que o espectador visitava as exposições, ele passava a
conhecer sua própria história por meio da arquitetura das salas, de suas
instalações e do fato de ter conhecimento de alguns aspectos da narrativa, de ter
convívio com alguns personagens que fizeram parte do histórico e da cultura local.
Nesse contexto, o espectador não só contempla as obras como também reflete
sobre o espaço e se reconhece nele. O espaço, dessa forma, deixa de ser
receptor passivo para agir como um bem cultural de intercâmbios, estruturando-se
no tecido social de convívio e inter-relação entre o público e o artista propositor. O
prédio do DNPM sempre esteve lá, e as intervenções por meio de tules e fios
transparentes trouxeram uma alusão imaginária, apresentada de forma poética, ao
que já existiu. Essa percepção recriou o espaço de memória, no qual o público
volta-se para si mesmo, intensificando a experiência de pertencimento ao lugar. A
Galeria de Arte da Fundação Cultural de Criciúma, neste contexto, é o ambiente
que possibilita, por meio de seus espaços físicos, acionar a memória de vida das
pessoas, proporcionando oportunidades de interlocução vividas pelo espectador
como personagem e extensão da história.
85 A experiência vivida é um importante material que os cientistas têm
para interpretar como o homem se organiza, apropria-se do seu local e atua nele,
em sua relação com o meio e com o mundo. Como enfatiza Stuart Hall,
A modernidade separa cada vez mais espaço de lugar, suas localizações no tempo, nas tradições que ligam passado e presente em mitos de origem que projetam o presente de volta ao passado, em narrativas que conectam o indivíduo em narrativas nacionais mais importantes. Os lugares permanecem fixos, é neles que temos raízes, para ir em direção ao pós-moderno global, as identidades nacionais permanecem fortes, especialmente as coisas como direitos legais e de cidadania, mas as identidades locais, regionais e comunitárias têm se tornado mais importantes. (HALL, 2005, p. 15)
É nas experiências sensoriais que o homem se relaciona com o seu
meio. A arte é um canal que possibilita tais experiências. A percepção da obra de
arte pode propiciar um relacionamento do espectador com seu meio, com sua
cidade e com sua condição de cidadão participativo na história dela. Para Hall
(2005), “não se constróem identidades de forma global, mas dentro de pequenos
espaços tempo que irão juntar-se em contextos que unem presente e passado” (p.
70). Os indivíduos que se encontram na cidade de Criciúma se reconhecem como
86 sujeitos sociais, mas não têm interesse ou consciência do que se passa no
subsolo ou fora da paisagem urbana.
88 CAPÍTULO 3: PROPOSIÇÕES POÉTICAS — SUSPIROS,
FRONTEIRAS E CONTAMINAÇÕES
O deslocamento da produção artística do campo estritamente específico de suas linguagens para o ambiente ampliado das relações culturais já
foi enunciado como sendo uma passagem da arte do campo estético para o político.
(Cildo Meireles)
3.1 PROPOSIÇÕES FOTOGRÁFICAS
3.1.1 “Coletadora de Ácidos”
“A figura do flâneur pronuncia a do detetive. O flâneur devia procurar
uma legitimação social para o seu comportamento. Convinha-lhe perfeitamente ver sua indolência apresentada como aparência, por
detrás da qual se esconde de fato a firme atenção de um observador seguindo implacavelmente o criminoso que de nada suspeita”
(Walter Benjamim)
Inspirada no texto sobre o flâneur benjaminiano, criei a personagem
“Coletadora de Ácidos”. Esta personagem percorre lugares afastados da cidade, e,
simbolicamente, colhe os ácidos das ruas próximas às minas em atividade. Este
89 trabalho, composto de oito fotografias nos tamanhos 20x25 cm., objetiva mostrar
como ainda hoje há vestígios no ar de poluentes expelidos pela mineração.
Essa proposição reporta-se ao trabalho poético da artista carioca
Brígida Baltar, que entre 1994 e 2001 realizou uma série de ações onde ela
aparece como personagem de si mesma e coleta elementos atmosféricos como
neblina, orvalho e maresias. Brígida registrou tais atos em fotografias e em curtos
filmes silenciosos. Segundo o curador Moacir dos Anjos, as coletas formaram o
projeto “Umidades”, uma tentativa de apreender, simbolicamente, o que são
efêmeros fatos naturais. As coletas são empenhos ativos e subitamente vão
capturar o que, por ser tangível e por só existir na praia ou na mata, sempre
escapa ao aprisionamento material.
O material não está no plano ótico, não há uma distinção física; a
coleta requer o registro. A proposição da “Coletadora de Ácidos”, como a série
“Umidades” de Brígida, foram ações performáticas registradas em fotografias.
Diferentemente da coleta simbólica de Brígida Baltar, a “Coletadora de Ácidos”
capta elementos atmosféricos palpáveis à visualização — podem ser capturados
90 em vidros e são passíveis de análises laboratoriais, que ajudariam a população da
cidade de Criciúma a se manter informada sobre as reais condições da atmosfera
da cidade.
O trabalho descrito objetiva dar a perceber o ambiente de vida dos
habitantes de Criciúma. Assim, esta proposição instaura a idéia de investigar para
pesar e medir a qualidade do ar respirado pela cidade. Minha intenção em usar o
recurso da fotografia não é somente o de representar a realidade, mas captar
elementos de performação. Nos trabalhos apresentados, procuro valer-me desse
meio para compreender situações como os cheiros sentidos na cidade. Procuro
apreender um paradoxo de efeito de realidade, representação e performação. São
retratos que se convertem em teatralização da realidade. A câmera capta e os
recursos de editoração alteram a imagem fotográfica, desviando o olhar do
espectador para uma outra temporalidade, em uma espécie de reação ao ato do
fotografado. A personagem com um objeto na mão, coletando o ar, segue rumo a
uma realidade que se apresenta em dois níveis, o da paisagem intacta e o da
personagem envolta por uma bolha, em uma espécie de suspiro que a desloca da
91 realidade para o tempo das coisas. O tempo em que existia uma visibilidade da
degradação. A invisibilidade a isola da informação da realidade que existia no ar.
As imagens apresentam uma espécie de ordem sobrenatural, mas de caráter real.
Basta focarmos nossa atenção na história da cidade e nas suas problemáticas.
3.1.2 “Confrontando os territórios”
A partir do entendimento das galerias, criei uma narrativa
confrontando dois jovens que olham em direções opostas, produzida por meio da
técnica fotográfica e apresentada nas dimensões de 50x70 cm. Ainda que não se
diferenciem e estejam em um mesmo cenário, um olha a galeria de mineração e o
outro a de comércio. As imagens foram pensadas depois de estabelecido o
entendimento sobre as galerias e objetivam uma narrativa sobre as fronteiras e as
contaminações destas. Dois jovens são fotografados numa situação performática,
com máscaras de filtragem de oxigênio, usadas pelos mineiros para descer e
92 trabalhar no subsolo. Um deles é mineiro e o outro um funcionário de uma
companhia de seguros; ambos trabalham em galerias separadas geograficamente
e em sua função simbólica. Esses personagens representam os jovens que atuam
na sociedade de Criciúma.
As máscaras não só representam as contaminações como
estabelecem o elo, o suspiro que liga os sujeitos. A máscara de oxigênio, aliada
ao restante da imagem, pretende reforçar o impacto, a experiência melancólica
para o observador, revelando uma proximidade e uma distância. Além disso, cria
uma identidade de pertencimento a uma cidade mineradora. A narrativa pretende
uma relação funcional entre o objeto fotografado e as pessoas espectadoras da
exposição. Essa identidade não é de todo mundo, mas de todos que se identificam
com o tema, porque vivem na cidade de Criciúma.
93 3.2 INSTALAÇÕES
3.2.1 “Suspiros Suspirados”
A primeira sala abrigou um painel feito com suspiros, doces na forma
circular, que despertam no público o desejo de comê-los pela aparência e pelo
cheiro exalado. O painel confronta com as fotografias da parede seguinte, no
tamanho 10x10 cm., apresentando três imagens: de um elevador com mineiros
nos anos 1960, do movimento grevista nos anos 1980, na avenida Getúlio Vargas,
e de um elevador na atualidade. A mesma sala apresenta ainda o vídeo “Suspiros
do Tempo”, descrito mais adiante neste trabalho.
Apresentando situações de mineração, nas fotografias, e do
ambiente do centro da cidade e das lutas de classes no vídeo, as imagens
objetivam mostrar as modificações ao longo do tempo, as transformações
ocorridas em todo o ambiente da cidade, tanto no de mineração como no do
centro da cidade. Busco nessas proposições poéticas, por meio das fotos e do
94 vídeo, confrontar os tempos históricos de Criciúma e, por meio dos suspiros
(doces), traduzir o prazer ou a sedução — pelo doce, pela mineração, ou pelo
capital proveniente dela.
Algumas fotos pertencem ao Arquivo Público Municipal; as outras
são de autoria pessoal. Elaboro uma interferência de desenho de equipamentos
de ventilação nas imagens fotográficas, ou seja, uma ação inventiva, que pretende
um elo temporal.
3.2.2 “Poço dos Suspiros”
Esta instalação é uma cenografia, construída com tijolos em forma de
semicírculo, com diâmetro de 85 centímetros e um metro de altura, além de uma
iluminação específica, formando um espelho de água que provoca a sensação de
um poço profundo. Trata-se de uma instalação pensada a partir de cenografias
que deslocam os ambientes naturais externos para o ambiente interno da galeria.
95 O artista inglês Olafur Eliasson utiliza-se dessa linguagem poética para colocar o
público imerso em um ambiente natural artificializado. As obras de Olafur dão um
aspecto de naturalidade, com atmosfera, climatização e sonorização. Na obra
“Ponte”, o artista criou uma ponte pênsil envolta em neblina que remetia os
espectadores à ilusão de um precipício.
Dentro de uma sala da Galeria de Arte da Fundação Cultural de
Criciúma, a poética do poço pretende criar a ilusão de deslocamento espacial,
conduzindo os espectadores aos labirintos subterrâneos, dissolvendo
metaforicamente as fronteiras geográficas.
3.2.3 “Doces lembranças”
A partir de 101 vidros contendo testemunhos geológicos (mostras de
terra, pedras e rochas, extraídos do subsolo pelo DNPM) e 70 vidrinhos (3,5 cm. X
0,2 cm.) contendo ovo podre, esta proposição pretende disponibilizar ao público o
96 cheiro semelhante ao dos ácidos expelidos pelos rejeitos minerais, que por muito
tempo caracterizou a identidade olfativa da região carbonífera. Os vidros,
hermeticamente fechados, estarão dentro da capela da Galeria de Arte, que no
passado guardava os elementos químicos mais perigosos do laboratório de
análises de solo.
Esse trabalho desenvolve-se em torno da capela do laboratório,
sendo constituído pela obra e os elementos nela contidos, como os vidrinhos com
os cheiros, a lembrança olfativa, que faz manifestar-se a memória das pessoas
que viveram na cidade até o início dos anos 1980. A instalação lança uma
experiência singular da ordem da rememoração e da descoberta. Nem todos
viveram aquele período, mas por meio dessa instalação podem levantar questões
a respeito da função do laboratório para a mineração e dos cheiros característicos
sentidos na cidade nos anos 1970. Os fenômenos de efeitos corporais, como mal-
estar, provocados pelas toneladas de ácido sulfúrico lançado na atmosfera, são
acionados na experiência pelas lembranças trazidas de volta. O desconforto de
97 sentir o mau cheiro neste trabalho pretende fundir as relações das pessoas com o
lugar onde vivem através do sentido olfativo.
3.3 RECURSOS DE CÂMERAS DE VIGILÂNCIA
Às vezes o espelho aumenta o valor das coisas, às vezes anula. Nem tudo o que parece valer acima do espelho, resiste a si próprio refletido no espelho. As duas cidades gêmeas não são iguais, porque nada do que acontece com Valvadra é simétrico: para cada face ou gesto, há
uma face ou gesto correspondente invertido ponto por ponto no espelho. As duas Valvadras vivem uma para a outra, olhando-se nos olhos
continuamente, mas sem se amar. (Italo Calvino, Cidades Invisíveis)
3.3.1 “Suspiros”
Obra em mídia digital com recurso de linguagem de telepresença,
visando via internet apresentar em tempo real imagens de circulação de duas
galerias: a de uma mina de carvão localizada a 160 metros de profundidade e a
galeria de comércio do túnel do Terminal Central de Transporte Coletivo. Assim,
as imagens deveriam se encontrar na Galeria de Arte. Opostas nas suas funções
e localizações geográficas, estariam sendo vistas simultaneamente em tempo real
98 pela internet e projetadas por um data-show durante a exposição. A obra seria
constituida de uma realidade: a narrativa se refere ao fato de estarmos separados
no território, mas unidos na circulação econômica e no ambiente atmosférico, pelo
ar poluído que se desprende das galerias de mineração e circula nas galerias
comerciais e de arte. A telepresença é o lugar do encontro das galerias:
Na vida real, admitimos a existência de lugares que nunca iremos visitar
de verdade [...] quando a exploração, como uma lanterna, realça e ilumina tudo aquilo que experiencio, percebo que o mundo real validado
pela interface da cultura é também uma construção, e que, como modelação, esta é limitada, restringindo nossa concepção de universo
(ARAUJO, 2005, p. 222-223).
A construção aqui é a única possibilidade de validar o encontro.
Mesmo limitada na concepção do real, é a forma de ligar os espaços virtualmente,
na Galeria de Arte e em muitos lugares ao mesmo tempo pela internet. O trabalho
não foi possível de ser realizado neste momento da pesquisa, porque as minas de
Criciúma, sendo de minérios pesados como enxofre, ferro e carvão, estão
localizadas em uma profundidade abaixo de 100 metros, o que danifica qualquer
equipamento moderno (filmadoras, máquinas fotográficas, computadores e até
99 aparelhos de TV) devido à condensação, ficando este trabalho registrado para
uma tentativa futura em outro lugar, onde haja condições de se manter
equipamentos pelo período necessário.
Para possibilitar este encontro foi realizada uma filmagem da galeria
de comércio do túnel do Terminal Central e obtidas, junto à empresa de
publicidade SET Produções, imagens de uma galeria subterrânea. As imagens
foram editadas em um vídeo que seria projetado por data-show dentro do
laboratório da Galeria de Arte. A filmagem no subsolo também ficou comprometida
pela condensação. As imagens cedidas pela SET Produções foram realizadas
neste ano de 2008, pois as mineradoras não permitem divulgação de imagens
antigas.
Com esta proposição poética, a galeria de arte como uma passagem
ligando todos os tempos e o território estabelece uma nova fronteira — e, segundo
Homi Babha (2003), em seu livro O local da Cultura, a fronteira é onde algo novo
se inicia. O encontro objetivava dar início a algo novo que não estaria nem em
cima nem embaixo, mas em um único ponto, o espaço da exposição. As câmaras
100 de vigilância apresentam-se como uma força capaz de mobilizar algo, de modo
que os sujeitos, sem se deslocar do seus ambientes, poderiam encontrar-se uns
com os outros, reconhecendo-se nos seus afazeres diários.
3.3.2 “Inversão dos Suspiros”
É uma obra também em mídia digital, que pretendia inverter as
câmeras de vigilância já existentes em duas galerias, uma subterrânea e a outra
de comércio. Neste trabalho seria possível provocar um encontro em tempo real
entre os mineiros e a população que circula na galeria de comércio onde estará
instalado o aparelho de vídeo. Esta exposição ficaria no âmbito das galerias,
sendo gravada para depois ser exibida na internet, permitindo a outras pessoas o
acesso à experiência. O vídeo tem uma narrativa específica: o “encontro entre dois
mundos que fazem parte de um mesmo mundo”. Envolve o encontro dos sujeitos,
pois são colocados frente a frente, olhando-se em algum momento, validando a
101 existência e a localização no momento do encontro. É um diálogo coletivo, cuja
localização é vertical e horizontal. Este trabalho também não foi possível de ser
realizado neste momento da pesquisa pelo problema causado nos equipamentos
pela condensação.
a. 3.4 VÍDEOS
3.4.1 “Suspiros”
O vídeo “Suspiros” foi produzido a partir de imagens do planeta
obtidas por meio do site www.google.com e imagens filmadas por mim. Não há
neste trabalho uma preocupação com a narrativa senão com um método que torne
possível um deslocamento, no plano virtual, do olhar por esferas geográficas
impossíveis. A imagem recorta o cosmos, o planeta, e entra na terra dentro de
uma mina de carvão, retornando então para o universo infinito. A imagem desloca
o espectador do lugar seguro da terra, da superfície, e transporta-o
102 metaforicamente entre o cosmo e as profundezas da terra, por labirintos que
recortam os espaços. A câmera forma o desenho imaginário de uma
circunferência. O objetivo é transportar o espectador nos espaços habitados pelo
homem, dos programas espaciais à exploração no subsolo. A necessidade
humana de descobrir, habitar e transformar todas as esferas possíveis e
imagináveis. Este trabalho está disponibilizado na internet no endereço
www.estudioplay.com.br.
Artigo II. 3.4.2 “Suspiro do Tempo”
O vídeo é constituído de imagens de Criciúma, nas quais aparecem
tanto a paisagem da mineração, o cotidiano dos mineiros e a luta da classe,
provenientes de imagens de arquivo, quanto registros fotográficos e fílmicos do
túnel comercial central. O vídeo estrutura-se em imagens sobrepostas do passado
e do presente, buscando, a partir de cenas das greves de 1987 e do cotidiano
atual (novembro de 2007), uma linearidade no tempo, trazendo o passado para o
103 presente em imagens móveis e levando o presente para o passado em imagens
fotográficas, possibilitando uma avaliação sobre o que está num tempo e no outro.
O trabalho coloca a ambigüidade poética das cenas como elementos sócio-
espaciais e temporais que confluem. As cenas de greves e quebra-quebra no
centro intercaladas com imagens do comércio do centro mostram como as
pessoas, mesmo indiretamente, fazem parte desse cenário.
111
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Meu interesse nesta pesquisa foi investigar o histórico dos odores e
do sistema das galerias de Criciúma e, através da arte, instigar uma experiência
no campo coletivo sobre a cidade e suas problemáticas.
A possibilidade de transportar as pessoas, por meio de proposições
poéticas, no espaço e no tempo da cidade de Criciúma, sem se deslocarem do
espaço da Galeria de Arte da Fundação Cultural de Criciúma, motivou a
elaboração das ações artísticas apresentadas na exposição.
O levantamento de dados sobre a história da cidade, da mineração e
dos odores, possibilitou a compreensão das fronteiras e contaminações e ainda
ajudou a compreender porque existe um certo desinteresse da maioria da
população pelas questões que dizem respeito à mineração.
Pensar e elaborar esta pesquisa, e as proposições decorrentes dos
seus resultados, foi um exercício para pensar o meu processo individual como
112 cidadã preocupada com as condições de meio ambiente e vida dessa cidade,
além de incentivar a participação dos habitantes nas decisões envolvendo os
problemas causados pela mineração.
Munida dessa compreensão, pude buscar nas galerias das
“Passagens” em Benjamin (2007) as galerias de sedução de Criciúma como um
suspiro metafórico, imaginando os poços de ventilação como uma passagem, no
tempo histórico dos anos 1970 até os dias atuais e na imersão em histórias reais e
imaginadas que acontece no encontro do público com a exposição.
As exposições na Fundação Cultural de Criciúma, neste ano de
2008, estão recebendo em média 600 visitantes por mês, sendo na sua maioria
estudantes e pessoas da comunidade local, além de visitantes e turistas. As visitas
são acompanhadas por monitores, ampliando o entendimento e o contato do
público com as obras.
As fotografias apresentadas na exposição são trabalhos elaborados
a partir de roteiros ficcionais, mas com pretensões de mostrar situações
decorrentes das observações da pesquisa. Na “Coletadora de Ácidos”, levei em
113 consideração a interpretação de fatos e questões reais, mesmo sendo uma
personagem encenada. Em “Confrontando os territórios”, os personagens são
autênticos e encenados como ficção.
No vídeo “Suspiros”, com imagens das galerias, não houve nenhum
tipo de manipulação senão a intenção do encontro das galerias com o público, a
partir de imagens capturadas um mês antes da exposição, para constituir uma
narrativa com a interpretação da realidade, na qual as pessoas se reconhecem
porque transitam pelos labirintos diariamente. Segundo Benjamim (2006, p. 578),
ver-se significa encontrar sua imagem e entrar em acordo com ela.
Os vidros com os cheiros de ovo podre distribuídos ao público
representam um acionador de memórias ou um elemento de descoberta do
desconhecido, uma mostra do que existe de verdade mas não é sentido e nem
visto. O painel feito de doces tenta criar a sensação de prazer, de sedução,
método aplicado para romper a sensação ruim causada por qualquer tipo de visão
ou de odores no contato com toda a exposição. O poço é a cenografia que tem
como objetivo romper o espaço onde o corpo do espectador se confronta com a
114 obra, remetendo-o a outra dimensão.
Os vídeos são feitos a partir de fatos e imagens, tanto no plano do
real como do ficcional. O vídeo “Suspiros do tempo” é uma tentativa de fazer uma
incursão no cotidiano das pessoas da cidade em duas instâncias: temporal e
social. As imagens evocam o deslocamento físico e temporal da realidade vivida
como uma forma de questionar o que é presente e o que é passado. As imagens
apresentam relações entre o que se vive e o que já foi vivido, e suas inter-relações
na vida das pessoas, tanto daquelas que estão nas imagens como do espectador.
O vídeo “Suspiro do Tempo” foi produzido com imagens encontradas por meio do
site www.google.com e um filme produzido por mim, recorrendo a efeitos virtuais
para criar situações estéticas de desenhar e recortar com a câmera os espaços
reais e imaginados.
As câmeras de vigilância articulam encontros somente possíveis pelo
recurso da tecnologia e da internet. Existe uma distância, mediada pelo espaço
geográfico, mas ao mesmo tempo supõe-se estar presente, pois esse espaço
geográfico dilui-se pela ação das ondas eletromagnéticas. O recurso de
115 telepresença usado para pensar este trabalho permite promover a interação dos
espectadores. Segundo Yara Guasque Araujo, “os novos formatos tecnológicos
possibilitam níveis diferenciados de acesso e de participação, diluindo os papéis
de autor e de receptor, por requererem o envolvimento não passivo do
espectador” (ARAUJO, 2005, p. 123).
As proposições são entendidas como um dispositivo poético que
possibilitou visualizar a fronteira à qual nos remete Bhabha (2003), como um novo
lugar, que se manifesta no encontro do público com a exposição. Nesta as
pessoas que vivem na cidade de Criciúma podem ver, sentir e pensar o lugar onde
habitam.
O elo dos suspiros são todas as ligações e relações que se
entrelaçaram entre as galerias de Criciúma no desenvolver desta pesquisa em
artes visuais. O suspiro é embaixo ou em cima, ou nem lá nem aqui, mas uma
passagem de um estado a outro, do passado para o presente, um novo lugar para
pensar o futuro. O suspiro dá tempo para um evento no qual os sujeitos se voltem
para o seu ambiente, reconheçam-se e sintam-se parte integrante deste.
116 A exposição é a possibilidade de ver e sentir o que permanece oculto
para a visão e para os sentidos dos habitantes de Criciúma, como se as
proposições fossem mais uma passagem onde nos encontramos e que
atravessamos para lembrarmos que existe outra cidade embaixo daquela
na qual vivemos, uma cidade que não deixou de existir porque foram
desativadas algumas minas, mas apenas ficou adormecia pelos
apagamentos, como se o presente da mineração fosse um escuro, o escuro
das minas desativadas. Ela desperta nas proposições poéticas porque
ainda existe e está ativa.
117
i. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
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