maio 2011 convênio resgata artesanato do norte de mg · minha mãe também costurava muito bem. e...

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www.irape.com.br INFORMATIVO IRAPÉ ANO 2 nº 9 MAIO 2011 ARCA DAS LETRAS – Projeto de- senvolve o hábito da leitura e am- plia o conhecimento por meio de bibliotecas instaladas nas fazen- das do reassentamento, nas duas margens da Usina de Irapé. 8 PLANTAS MEDICINAIS – Progra- ma desenvolvido em parceria da Emater com a UFMG desenvolve produtos alternativos para fins terapêuticos, beneficiando várias famílias de reassentados 8 Convênio resgata artesanato do Norte de MG O projeto de resgate da cultura do artesanato do Jequitinhonha vem mo- bilizando mulheres reassentadas de 27 fazendas. Hoje mais de 140 artesãs, reunidas em 18 grupos, participam do programa, que teve início em 2007. Desde então várias feiras e exposições já foram realizadas, gerando, além de renda, grande satisfação para costu- reiras e bordadeiras que levam para o grande público a riqueza e a arte do Je- quitinhonha e do Norte de Minas. Entre as artesãs destaca-se o trabalho de Iva Barbosa, de Itamarandiba, que borda rendas com a técnica do bilro –arte rara, que corre o risco de ser extinta por falta de seguidores (págs. 2 a 5). CELSO GOMES DOS SANTOS: “NÃO PRECISAMOS MAIS SAIR DA TERRA PARA SOBREVIVER Os reassentados de Irapé hoje se beneficiam de dois convênios firmados entre a Cemig e a Emater: a Assistên- cia Técnica de Extensão Rural (ATER) e o Artesanato. O objetivo dos convênios é buscar sustentabilidade para as famí- lias, proporcionando todo o apoio ne- cessário para que possam desenvolver suas atividades no meio rural – além de incentivar o associativismo e desenvol- Programas geram renda para reassentados ver conceitos de educação ambiental. Os reassentados também foram estimulados a se organizar em 28 associações, 14 em cada margem do Rio Jequitinhonha. Através delas, eles se organizam para buscar sua inclusão em programas de governo que possam gerar renda para suas famílias (Pronaf, PCPR) e facilitar o acesso ao crédito agrícola (págs. 6 e 7). Mais... ARTESÃS EXPÕEM PRODUTOS EM FEIRAS DE ARTESANATO

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www.irape.com.br INFOrMATIVO IrAPé ANO 2 nº 9 MAIO 2011

ARCA DAS LETRAS – Projeto de-

senvolve o hábito da leitura e am-

plia o conhecimento por meio de

bibliotecas instaladas nas fazen-

das do reassentamento, nas duas

margens da Usina de Irapé. 8

PLANTAS MEDICINAIS – Progra-

ma desenvolvido em parceria da

Emater com a UFMG desenvolve

produtos alternativos para fins

terapêuticos, beneficiando várias

famílias de reassentados 8

Convênio resgata artesanato do Norte de MGO projeto de resgate da cultura do

artesanato do Jequitinhonha vem mo-bilizando mulheres reassentadas de 27 fazendas. Hoje mais de 140 artesãs, reunidas em 18 grupos, participam do programa, que teve início em 2007. Desde então várias feiras e exposições já foram realizadas, gerando, além de renda, grande satisfação para costu-reiras e bordadeiras que levam para o grande público a riqueza e a arte do Je-quitinhonha e do Norte de Minas. Entre as artesãs destaca-se o trabalho de Iva Barbosa, de Itamarandiba, que borda rendas com a técnica do bilro –arte rara, que corre o risco de ser extinta por falta de seguidores (págs. 2 a 5).

CELsO GOMEsDOs sANTOs:“NÃO PrECIsAMOs MAIs sAIrDA TErrA PArA sOBrEVIVEr

Os reassentados de Irapé hoje se

beneficiam de dois convênios firmados

entre a Cemig e a Emater: a Assistên-

cia Técnica de Extensão rural (ATEr) e

o Artesanato. O objetivo dos convênios

é buscar sustentabilidade para as famí-

lias, proporcionando todo o apoio ne-

cessário para que possam desenvolver

suas atividades no meio rural – além de

incentivar o associativismo e desenvol-

Programas geram rendapara reassentados

ver conceitos de educação ambiental.

Os reassentados também foram

estimulados a se organizar em 28

associações, 14 em cada margem do

rio Jequitinhonha. Através delas, eles

se organizam para buscar sua inclusão

em programas de governo que possam

gerar renda para suas famílias (Pronaf,

PCPr) e facilitar o acesso ao crédito

agrícola (págs. 6 e 7).

Mais...

ArTEsÃs ExPÕEM PrODUTOs EMFEIrAs DE ArTEsANATO

EDITOR - Desde o início das obras para implantação da Usina de Ira-pé, no começo da década passada, o pensamento dos coordenadores do trabalho era um só: desenvolver grande infraestrutura e projetos técni-cos e sociais para que o impacto da mudança nas famílias dos reassenta-dos fosse o menor possível.

Para que isso pudesse ocorrer, foi traçado um diagnóstico detalhado da forma de vida das famílias: como viviam nas terras de origem, o que plantavam, o que gostariam de plan-tar, que festas comemoravam. Todos os aspectos sociais e culturais foram considerados. A partir daí, foi traçado um programa que incluía diversos as-pectos, e um deles foi fundamental: a rede de convênios que poderia gerar renda e possibilitar novas perspecti-vas para esses produtores rurais.

Após a mudança, cada família rece-beu cinco hectares de terra já prepa-rada para o plantio, com sementes e mudas já conhecidas por eles: feijão, arroz, milho, amendoim, cana, man-dioca. Desde então, foram firmados convênios, sendo que o principal deles, com a Emater, trouxe inúme-ros benefícios para a vida desses agricultores, com assistência técnica e rural em processo de aperfeiçoa-mento constante.

Hoje, cinco anos depois da mudan-ça, os reassentados estão adap-tados e já trabalham em regime de autonomia nas suas terras. O acesso a programas sociais e projetos de crédito agrícola geram receita para as famílias e abrem novas possi-bilidades. O projeto de artesanato, uma parceria da Cemig com a Ema-ter, promove uma grande transfor-mação na vida dos reassentados, pois – ao mesmo tempo em que resgata uma cultura tradicional do Norte de Minas e Vale do Jequitinho-nha, gera renda e eleva a auto-estima das artesãs.

Por tudo isso, esse projeto de reas-sentamento é considerado um mode-lo no Brasil, já tendo recebido diversos prêmios.

Palavra do Editor

JOsI LOPEs, TéCNICA DA EMATEr qUE OrIENTA O TrABALHO

Artesãs preservam tradição

A vida de Maria José Pereira de Jesus passou por uma grande transformação. Casada e mãe de oito filhos, ela morava com a família na beira do rio Jequitinho-nha, um local difícil e muito acidentado. Desde a mudança para a Fazenda riacho da Porta, sua vida está muito mais organi-zada, com uma infraestrutura que a per-mite se dedicar a fazer o que mais gosta: o artesanato. “Para mim, isso aqui é outra vida, muito melhor. Meus filhos chegam da escola e me ajudam na roça. E meu marido, além do trabalho na nossa lavou-ra, também cuida de tudo para que eu possa estar aqui, costurando e fazendo meus bordados”, afirma, satisfeita.

Ela conta que o hábito de fiar, costurar e bordar vem da família. “Eu planto e colho

Josi Lopes, técnica da Emater que orienta o trabalho com as mulheres da fazenda, diz que o objetivo do trabalho é resgatar a cultura do artesanato do Jequiti-nhonha, uma tradição que é repassada de geração para geração até hoje. “A ideia é fazer um artesanato de raiz. Por enquanto, estamos qualificando o grupo, através de cursos de costura, bordado e crochê, para melhorar as técnicas que elas já conhecem. queremos resgatar o bordado antigo, que elas aprenderam com suas bisavós”, diz.

Além do artesanato, a Emater dá todo o apoio na assistência técnica e extensão rural para os reassentados, com o obje-tivo de buscar sustentabilidade para as famílias. “A geração de renda tem sido bem nítida, e isso a gente pode visualizar pela melhoria na qualidade de vida deles. Há muito a ser feito ainda, mas estamos num caminho muito bom”. Das técnicas trazidas na origem, ela conta que o tear com o algodão era o mais presente na vida das mulheres. “Nosso trabalho é de

MArIA NAzAré DE JEsUs: “PArA MIM, IssO AqUI é OUTrA VIDA”

Apoio técnico para costuras e bordados de raiz

acompanhar, orientar e sugerir. E a gente vê o resultado na beleza das peças que elas produzem”, conta.

As artesãs de riacho da Porta produ-zem um pouco de tudo: bolsas, almofadas, panos de prato, toalhas de copa, pesos de porta. Com esses trabalhos, já partici-param de feiras e exposições promovidas pela Cemig. “Por enquanto, o foco são os utensílios de casa. Mas depois queremos produzir um catálogo, para colocar tudo no mercado”, acrescenta.

o algodão, para fazer as linhas e cordões, isso é uma tradição que vem da minha avó. Minha mãe também costurava muito bem. E minha filha Edna também me ajuda aqui. é muito bom ter a família perto, todo mun-do produzindo”, diz Maria José.

O apoio da Emater, de acordo com ela, é fundamental para que possam de-senvolver o trabalho com tranquilidade. “Eles nos ajudam muito, orientando, su-gerindo coisas. Já fizemos treinamento em Capelinha e Turmalina, e expomos em Diamantina e Belo Horizonte. Esse proje-to só vai melhorar. Pra mim não tem nada melhor do que ficar aqui, com minhas amigas, costurando, bordando e apren-dendo coisas novas. Isso diverte a gente”, completa.

PÁGINA 2

Talento e arte em exposições por MG

FEIrA DE ArTEsANATO NA AGrIMINAs: GErAÇÃO DE rENDA

O projeto de artesanato com os reas-

sentados das margens do Jequitinhonha

teve início em 2007. Trata-se de um con-

vênio firmado entre a Cemig e a Emater,

como explica a coordenadora do progra-

ma, Cléa Venina. “Começamos com 67

mulheres e hoje já temos mais de 140

artesãos, incluindo sete homens. Hoje

existem 16 núcleos de produção, em 23

fazendas”. Para que as artesãs possam

mostrar seu talento na arte das costuras

e bordados, a Cemig adquiriu toda a in-

fraestrutura necessária: 24 máquinas de

costura e uma máquina de tear, além de

materiais como tecidos, agulhas, linhas e

tabuas de passar roupa, entre outros.

A primeira feira realizada com os

produtos das artesãs aconteceu em de-

zembro de 2009. Desde então elas expu-

seram seus trabalhos na Agriminas, na

serraria souza Pinto, em BH; Grão Mo-

gol; Leme do Prado, Janaúba e Montes

Claros. Em dezembro passado voltaram

a expor no hall da sede da Cemig, em

Belo Horizonte.

Uma das campeãs de venda na feira

foi a artesã Maria do Carmo Alves souza,

que costura desde pequena e hoje man-

tém um pequeno ateliê em sua casa, em

Aricanduva. Por meio do convênio Ce-

mig-Emater ela fez dois cursos de cos-

tura, em Capelinha, e aprimora cada vez

mais o seu trabalho. “Aprendi muita coisa

que não sabia. Estou no grupo há cinco

anos e adorei participar da feira”, diz ela,

que faturou mais de r$ 1.200, entre ven-

das e encomendas.

A coordenadora Cléa Venina destaca

a importância do aprendizado para as

artesãs. “O forte no trabalho delas é o

bordado, uma tradição secular no Jequi-

tinhonha, e agora elas estão aprendendo

novas técnicas, como crochê e bainha.

é um valor agregado, que faz com que

elas conheçam e dominem todas as eta-

pas do que fazem”, explica.

O forte no trabalho delas é o bordado, uma tradição secular no Jequitinhonha. Agora, aprendendo novas técnicas, elas vão agregar valor à arte que produzemCléa Venina, coordenadora do projeto na Emater

Na comunidade de Muquém, em

Janaúba, várias artesãs começaram a

trabalhar os bordados utilizando a fibra

de bananeira, uma tradição da região.

Em Cristália, na fazenda Chácara, tam-

bém já havia essa cultura de utilizar o ca-

pim natural da região.

Maria do Carmo souza também do-

mina essa técnica. “Entrei para o grupo

quando souberam que eu sabia costurar

com essas fibras, como a fibra de bana-

neira e a palha de milho”, lembra.

Terezinha soares Neves, moradora da

fazenda riacho da Porta, também faz uso

da fibra nos bordados. “A gente faz borda-

dos, bolsas e baús com fibra de banana.

Eu adoro fazer parte desse grupo de arte-

sanato, me sinto realizada”, completa.

A coordenadora Cléa Venina explica

que os jovens representam metade do

total de artesãs vinculadas ao projeto.

são filhas, noras e sobrinhas das reassen-

tadas, que vão aprendendo os segredos

dessa arte e preservando essa cultura.

E o interesse em participar é crescente

entre as mulheres das fazendas.

“quando elas veem uma vizinha

retornando de uma feira ou exposição

com dinheiro no bolso, querem aprender

a técnica também. A geração de renda

torna-se um grande impulso para esse

aprendizado”, diz ela.

MArIA DO CArMO sOUzA, qUE UTILIzA FIBrAs DE BANANEIrA E MILHO

Outras fibras também são utilizadas

PÁGINA 3

Com as mãos na máquina e os pés na roça

OFICINAs ACONTECErAM EM FrANCIsCO sÁ, JAÍBA, CAPELINHA E TUrMALINA

No último semestre, foram realizadas

novas oficinas com os grupos de artesa-

nato. As artesãs aprendem técnicas de

criação de desenhos e transformação em

riscos. “Nos novos cursos foram desenvol-

vidas a combinação de cores, formação de

preço e a gestão dos recursos, uma prepa-

ração importante para a emancipação de-

las como artesãs, já que o convênio entre

a Emater e Cemig não será eterno”, lembra

Cléa Venina.

Além dessas oficinas, será realizada

uma missão técnica em Itamarandiba para

garantir a transferência de conhecimento às

artesãs sobre as técnicas para a produção

de rendas com bilros. O saldo de todo esse

trabalho desenvolvido poderá ser apreciado

no lançamento de uma coleção e, em se-

guida, um catálogo, que vai retratar toda a

história dos artesãos, sua cultura e os pro-

dutos elaborados por eles.

Na fazenda Fartura, Marisa Teresa da

Paixão também integra o grupo de artesa-

MArCIONÍLIA DA FAzENDA VELHO TExAs: PAssATEMPO E DIsTrAÇÃO

nato local. “Já ganhamos uma máquina da

Cemig, e as reuniões são aqui em casa.

A gente se reúne, sob orientação da Dul-

ce, da Emater, e depois as mulheres levam

suas tarefas pra fazer em casa. Tem sido

muito bom, porque a gente não tinha essa

cultura na terra de origem. E está dando

renda: desde 2009 já vendemos várias

peças, o que é um incentivo a mais para

as mulheres das famílias”, diz ela.

Novas oficinas trazem inovação e design ao trabalhoNos últimos meses, foram implemen-

tadas novas oficinas com os grupos de

artesanato. As artesãs aprendem técnicas

de criação de desenhos e transforma-

ção em riscos. “Nos novos cursos são

desenvolvidas a combinação de cores,

formação de preço e a gestão dos recur-

sos, uma preparação importante para a

emancipação delas como artesãs, já que

o convênio entre a Emater e Cemig não

será eterno”, lembra Cléa Venina.

Além dessas oficinas, mais três cur-

sos serão ministrados, com uma inovação

importante: a presença de um profissional

de design. O saldo de todo esse trabalho

desenvolvido nos cursos poderá ser apre-

ciado no lançamento de uma coleção e,

em seguida, um catálogo, que vai retratar

toda a história dos artesãos, sua cultura e

os produtos elaborados por eles.

A gente faz tudo com muito carinho

e dedicação, e o resultado é que nem

A gente era posseiro, não tinha uma terra nossa. Aqui existe uma associação, organização. Temos acompanhamento técnico da Emater

Terezinha Neves

vemos o tempo passar.

é uma satisfação enorme

fazer parte disso”, afirma.

Terezinha Neves faz do

artesanato um momento

prazeroso. Ela conta que,

antes, em sua terra de

origem, não havia nada

disso, apenas a preocupa-

ção com a sobrevivência.

“A gente era posseiro, não

tinha uma terra nossa.

Aqui existe uma associa-

ção, organização. Temos

acompanhamento técnico

da Emater, na lavoura e

nesse projeto do artesa-

nato. A vinda pra cá foi

uma transformação na

vida da gente”, diz, emo-

cionada.

PÁGINA 4

Uma técnica de bordado rara e

delicada corre o risco de se perder

em Minas Gerais, por falta de artesãs

dispostas a aprendê-la. A renda feita

com bilros (pequenos bastões de ma-

deira, com as pontas alargadas como

uma pêra) é difícil de ser executada

e requer tempo e dedicação. Mas na

fazenda Terça, próxima à Itamarandi-

ba, no Jequitinhonha, Dona Iva Nunes

Barbosa sustenta a tradição com paci-

ência, bordando belas rendas para en-

feitar lençóis, toalhas de mesa e outros

panos. Ela aprendeu a técnica, ainda

pequena, com sua mãe. Mas foi a úni-

ca da casa que se interessou.

“Minhas irmãs não quiseram apren-

der. Em uma semana, eu peguei o jei-

to de fazer. Desde criança eu fazia a

renda e vendia, e com o dinheiro com-

prava o pano para minha mãe fazer as

roupas que a família usava. E não tinha

máquina de costura não, era tudo feito

à mão”, lembra ela.

Depois que se casou, D. Iva ajudou

a criar os filhos com o dinheiro da ven-

Bilro: uma cultura rara que pode acabar

D. IVA BArBOsA, qUE BOrDA rENDAs EsPECIAIs.

da dessas rendas. “Eu fiz todo o meu

enxoval de casa à mão. Todos os meus

filhos, inclusive os homens, sabem te-

cer e fiar o algodão. Mas para bordar

no bilro ninguém se interessou, porque

realmente dá trabalho”, explica. Ela se

preocupa com a continuidade dessa

tradição. “Em Minas eu não conheço

ninguém que trabalha com bilro. é

difícil, mas os mais novos poderiam

aprender e passar pra frente, senão,

na hora em que eu não existir mais,

acabou”.

Há dois anos ela passou a partici-

par do grupo de artesanato da fazenda

Fartura, mas por dificuldades de loco-

moção, costura e borda em casa. “Meu

sonho é ter uma máquina de costura

para me ajudar”, conta a bordadeira.

Para a exposição no final de 2011,

na sede da Cemig, Dona Iva pensa em

fazer mais peças. “quero começar a

produzir mais cedo, sem pressa, e le-

var mais peças para Belo Horizonte”,

diz ela, que hoje trabalha em casa sob

encomenda.

A renda de bilro é um dos

trabalhos mais difíceis e finos,

podendo levar meses para o de-

senvolvimento de uma só peça,

de acordo com o seu tamanho.

A renda é bordada a partir dos

bilros, onde são amarrados os

fios. Para constituir o desenho,

a bordadeira utiliza uma almofa-

da onde é pregada uma folha de

papel com o desenho-base, com

alfinetes seguindo o traçado que

deve compor.

A rendeira entrelaça os

fios em torno dos alfinetes

com o auxílio de bilros, que

são sempre utilizados aos pa-

res. Trabalhos mais complexos

podem requerer de 14 até mesmo

20 pares de bilros ao mesmo tempo,

o que exige uma grande habilida-

de por parte de quem executa a

técnica.

“Eu conheço, mas não posso

dizer que eu aprendi. A coisa é

complicada. A Dona Iva teve aqui

e me ensinou alguns pontos, mas

não é fácil não”, admite Maria do

Carmo.

sabe-se que a renda de bilro

tem suas origens na Europa, mais

precisamente na Itália, e também

nos Países Baixos (Bélgica), du-

rante o século xVI. Foi levada

também à França e dali chegou à

Portugal e à Inglaterra. Os portu-

gueses, durante a colonização, a

trouxeram ao Brasil.

Trabalho pode levar meses de bordado

BILrO TEM OrIGEM NA EUrOPA DO séCULO xVI.

PÁGINA 5

Na fazenda Araras, reassentamen-

to na margem esquerda da Usina,

Celso Gomes dos santos mora em sua

casa com a esposa. Ele diz que a vida

hoje é bem mais tranqüila do que na

origem, onde não tinha sossego para

garantir o sustento da casa. “Eu tinha

que sair para trabalhar nos canaviais

do interior paulista. Abandonava a

plantação, e quando voltava tinha que

começar tudo de novo. Aqui a vida é

outra, porque eu tenho a minha terra e

não preciso sair dela para sobreviver”,

conta, satisfeito.

Ele morava em Barra de são João,

na comunidade de José de Barros,

Norte do Estado. “Antes era tudo na

enxada. Agora eu passo um trator, pre-

paro a terra melhor e com mais faci-

lidade”. Celso também está atento às

oportunidades que a nova vida oferece.

“Já peguei crédito no Pronaf (Programa

Nacional de fortalecimento da Agricul-

tura Familiar) para fazer um tanque e

alimentar melhor os meus bois. Com

esse dinheiro quero também melhorar

meu gado, que hoje é muito mistura-

do”, explica.

Assim como Celso, os reassenta-

dos de Irapé têm à disposição toda

uma infraestrutura de programas e

CréDITO NO PrONAF PArA FAzEr TANqUE E ALIMENTAr O GADO.

JOÃO CArLOs rODrIGUEs, GErENTE DA EMATEr: INFrAEsTrUTUrA

Outra fonte de benefícios é o pro-grama estadual Minas sem Fome, que distribui sementes, mudas de frutíferas, caixas de abelhas e mate-rial agrícola e beneficia atualmente 28 associações de reassentados. E o Programa de Combate à Pobreza no Meio rural (PCPr) disponibiliza re-cursos para fábricas de farinha e de processamento de rapadura; compra de trator e outros equipamentos agrí-colas, além da roda d’água, sistema que ajuda a baratear o abastecimen-to de água. Até agora, 232 famílias já foram beneficiadas.

“Tudo isso contribui para diminuir o impacto da mudança”, diz o geren-te geral da Empresa de Assistência Técnica e Extensão rural (Emater) no convênio com a Cemig, João Carlos rodrigues. De acordo com ele, o ór-gão preparou, no início do programa de reassentamento, um plano de de-senvolvimento sustentável que hoje permite aos reassentados uma vida melhor do que tinham na origem. Os reassentados foram estimulados a se organizar através de associações e contam com toda a assistência da Emater. Cada uma reúne várias fa-zendas. Hoje existem 28 delas, 14 em cada margem da represa. Por meio das associações eles podem buscar informações sobre políticas públicas, para que as famílias pos-sam se beneficiar desses programas governamentais.

Sustentabilidade abriu novos caminhos

Convênios e programas ampliam renda das famílias

apoios que os permitem ampliar o sis-

tema de sustentabilidade para suas

famílias, aumentando a geração de

renda. O Pronaf – que é oferecido pelo

Instituto Nacional de Colonização e

reforma Agrária (Incra) – oferece em-

préstimos de até r$ 16.500, com juros

baixos e carência de até dez anos para

pagar, com 40% de desconto para

prestações em dia.

CELsO: ANTEs ErA TUDO NA ENxADA.

Eu tinha que sair para trabalhar nos canaviais do interior paulista. Abandonava a plantação, e quando voltava tinha que começar tudo de novo. Aqui a vida é outra, porque eu tenho a minha terra...

Celso Gomes dos Santos

PÁGINA 6

O reassentamento de Irapé é hoje um modelo para todo o país. Todos os moradores das terras inundadas pela represa puderam escolher, entre três fa-zendas, qual seria o local mais adequa-do para a futura moradia. Além de rece-berem muito mais terra do que tinham nas comunidades de origem, eles se mudaram para uma casa já construída, com água encanada e energia elétrica. E muitos posseiros, que apenas traba-lhavam na terra, sem direito de posse, receberam terras no reassentamento.

Esse é o caso de Odair Machado Martins, que morava na fazenda Ca-choeira, nas proximidades de Cristália, no Norte de Minas. Ele conta que, na

Reassentamento é modelo para o país

ODAIr MACHADO MArTINs: DE POssEIrO A PrOPrIETÁrIO

APÓs ADAPTAÇÃO À NOVA TErrA, PErCEPÇÃO DE NOVA FAsE.

O trabalho de integração das famílias ao novo local de moradia foi iniciado ainda em 2002, quando os reassentados ainda moravam em suas terras de origem. Em 2005 tive-ram início as mudanças, e cinco anos depois, a percepção é de que um ciclo se fechou e uma nova fase se inicia.

“O que se percebe é que nós estamos colhendo o que plantamos nesses anos que se passaram. Pode-mos notar uma tendência das asso-ciações de caminhar com as próprias pernas. é como se, no início, eles estivessem na pré-escola, passa-ram pela graduação e hoje estão na

região onde vivia, o acesso era mui-to difícil. “A gente lutava apenas para sobreviver, não tinha como planejar a vida”. Hoje, instalado na fazenda Ara-ras, ele tem casa, luz elétrica e todas as condições para prosperar no trabalho. “Antes, eu trabalhava como vaqueiro, nas terras dos outros. Não tinha nada. Hoje eu trabalho pra mim, e já cheguei a ter 16 funcionários por minha conta na carvoaria. só com essa história não pre-cisa dizer mais nada”, diz ele, enquanto sorri de satisfação.

Ele diz que, nas condições em que vivia antes, era impossível pensar em melhorar de vida. “quando o lugar ofe-rece possibilidades, a vida se transfor-

Autonomia é o retrato de uma nova fasepós-graduação”, exemplifica o enge-nheiro de meio ambiente da Cemig, Márcio rodrigues Correa.

De acordo com ele, isso fica de-monstrado pela diminuição da quanti-dade de demandas das comunidades. “No começo haviam muitas reclama-ções corriqueiras, problemas que eram da atribuição deles mesmos, mas que não tinham iniciativa para resolver. Hoje fica claro que eles estão buscan-do caminhar com as próprias pernas”, define.

O engenheiro conta que, se a pri-meira fase foi de mudança e integração e, em um segundo momento, houve o

período de adaptação, o que se perce-be hoje é que o trabalho da Cemig e da Emater encontra-se em um nível de as-sistência técnica mais elevada, de um aprimoramento de tudo o que foi feito.

“Os reassentamentos já têm sus-tentabilidade, são viáveis. Um exem-plo típico dessa nova fase é o projeto de artesanato, que elevou a auto-esti-ma não só dos reassentados, como também dos técnicos da Emater. O programa deu certo, porque, além de resgatar uma cultura tradicional da região, trouxe novas perspectivas para as famílias, com a geração de renda”, acrescenta Correa.

ma. Hoje eu tenho 50 cabeças de gado e tiro em média 70 litros por dia, que são vendidos a uma cooperativa em Montes Claros”, completa.

PÁGINA 7

ExPEDIENTEPublicação da Cemig – Companhia Energética de Minas Gerais – Av. Barbacena, 1.200 – santo Agostinho – Belo Horizonte/MG – CEP: 30.190-131 –

Telefone: (31) 3506-3996 – Jornalista responsável: Luiz Michalick – reg. Nº 2211 – sJPMG – Gerência de Comunicação Interna e de relacionamento

com a Comunidade – redação: Paulo Boanova – Edição: Marcelo Micherif – Projeto Gráfico: Técnica Composição e Arte – Impressão: Gráfica e

Editora 101 – Tiragem: 4.000 exemplares.

A melhor energia do Brasil

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O uso de plantas medicinais como

uso terapêutico já é bem conhecido no

Brasil e em várias partes do mundo. O

Norte de Minas Gerais e o Vale do Je-

quitinhonha são regiões com flora rica

e diversificada, o que gerou um projeto

para se utilizar essas plantas com fins

medicinais, curando pequenas do-

enças. “Os reassentados colhem as

plantas, que são beneficiadas para a

produção de xaropes para dor de ca-

beça e diarréias, pomadas cicatrizantes

e até xampus”, explica o coordenador

da Emater, João Carlos rodrigues. O

projeto das Plantas Medicinais – um

convênio da Emater com a Universida-

de Federal de Minas Gerais (UFMG) – já

beneficia 12 fazendas de reassentados,

nessa primeira etapa.

A fazenda Bela Vista, em Ponte Pe-

quena (margem esquerda da Usina) se

destaca no projeto. Os reassentados

Plantas curam doenças e geram receitas

já comercializaram seis toneladas de

barbatimão para uma indústria paulis-

ta. A planta é conhecida por combater

inflamações e acelerar a cicatrização.

é muito empregada no tratamento de

gonorréia, hérnia, diarréias, gastrite,

dores de garganta e hemorróidas. No

total, 13 associações de reassentados

participam do projeto, o que beneficia

dezenas de fazendas.

“Vários produtores rurais, em conta-

to com pesquisadores da UFMG, têm

aperfeiçoado seu conhecimento no

manejo dessas plantas medicinais nas

fazendas. Além da sua eficiência em

moléstias nos seres humanos, elas são

muito úteis no combate aos vermes e

controle de carrapatos no gado”, afirma

o coordenador técnico de meio ambien-

te da Emater, sérgio Azevedo, que co-

ordena o trabalho na margem esquerda

de Irapé.

PLANTAs sÃO ÚTEIs NO COMBATE A VÁrIAs MOLésTIAs

Bolsa Verde: preservação

e rendaAlém da rede de convênios que fa-

cilita a vida do reassentado e gera ren-da para as famílias, outro programa vai ajudar a melhorar a vida dos moradores das fazendas: o Bolsa Verde. O progra-ma, desenvolvido pelo Governo do Es-tado, está voltado para a preservação do meio ambiente e oferecerá r$ 200 anuais por cada hectare preservado nas terras das fazendas.

Mais de 245 famílias de reassen-tados de Irapé já se cadastraram no programa, e no momento aguardam a análise dos cadastros por parte do Ins-tituto Estadual de Florestas (IEF), órgão em que foi criado o comitê de gestão do Bolsa Verde.

Arca das Letras amplia conhecimento

Incentivar a leitura e garantir o aces-so ao conhecimento, desenvolvendo esse hábito entre crianças e jovens. Esse é o objetivo do Arca das Letras, um projeto do Ministério do Desenvol-vimento Agrário voltado para o meio rural. Pequenas bibliotecas são insta-ladas nos reassentamentos, com livros variados, que incluem temas de interes-se para todos os gostos.

As arcas têm o mesmo funciona-mento de uma biblioteca. Os livros são classificados por áreas e identificados por cores. Jovens e adultos se cadas-tram e podem solicitar os livros por em-préstimo para ler em casa, desfrutando do prazer da leitura por meio das obras de grandes autores.

Atualmente, 31 associações de re-assentados de Irapé já têm bibliotecas instaladas nas fazendas. Cada Arca disponibiliza cerca de 200 títulos, que oferecem de tudo: livros didáticos e de pesquisa, literatura infantil, dicionários e livros técnicos. As associações par-ticipam do processo de instalação das Arcas das Letras, treinando voluntários para trabalhar nas mini-bibliotecas.

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